UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA Instituto de Geociências e Ciências Exatas Campus de Rio Claro A MATEMÁTICA É FEMININA? UM ESTUDO HISTÓRICO DA PRESENÇA DA MULHER EM INSTITUTOS DE PESQUISA EM MATEMÁTICA DO ESTADO DE SÃO PAULO Mariana Feiteiro Cavalari Orientador: Prof. Dr. Sergio Roberto Nobre Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Educação Matemática, área de concentração Ensino e Aprendizagem da Matemática e seus Fundamentos Filosóficos- Científicos, como parte integrante dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Educação Matemática. Rio Claro (SP) 2007 Comissão Examinadora Sergio Roberto Nobre Suzinei Aparecida Siqueira Marconato Maria Margaret Lopes Rio Claro, 08 de março de 2007. Resultado: Aprovado Agradecimentos Agradeço à minha mãe, Rosa Maria, ao meu pai, Luiz Carlos, e à minha irmã Ana Luisa, pelo apoio emocional e financeiro, além do incentivo em todas as etapas de minha vida e, em especial, durante a realização desta pesquisa. Ao meu namorado, Wadley, pelo apoio, paciência, compreensão e auxílio (principalmente com os gráficos e tabelas). Ao meu orientador Sergio Nobre, primeiramente, por ter acreditado na minha capacidade para desenvolver uma pesquisa com este tema e pela orientação e apoio nos momentos difíceis da realização deste trabalho. Aos professores da Pós-Graduação, Marcos Teixeira, Rosa Baroni e Pedro Paulo Scandiuzzi, aos que participaram da banca de qualificação, Suzinei Aparecida Siqueira Marconato e Maria Margaret Lopes, que influenciaram direta e indiretamente nos rumos desta pesquisa. Aos meus amigos de grupo de pesquisa e colegas de Pós-Graduação dentre os quais destaco Carlos Moraes, Joselene, Neirelise, Regiane e Sabrina Helena. Ao William, Rosangela e Antônio Carlos pela compreensão e apoio durante a realização desta pesquisa. Aos meus amigos de sempre Amanda, Carla Sabrina, Carol (Pira), Cris, Denise (Campinas), Denise (Rio Claro), Eliza, Fafá, Galo, Graziele, Layla, Lu, Milton, Nelson, Patrícia, Renata, Sônia, Taciana, Taty, Vanelise e Vanilde, pelo apoio e pelas contribuições a este trabalho. Agradeço especialmente a Taci pelas correções de português e a Amanda, Carla Sabrina e Grazie pelo auxílio à bibliografia. Às minhas colegas de trabalho na E. E. “Prof. Francisco Mariano da Costa”, Denise, Fia, Fernanda, Flávia, Inês e Nelci, e, em especial, à minha diretora, Solange. Ao diretor, Pe. Aramis, e às Coordenadoras Pedagógicas do Colégio Dom Bosco Salesiano Assunção de Piracicaba, Eliana, Rosana e Luci, pelo apoio e valorização de um trabalho dessa natureza. Às professoras que prontamente se dispuseram para as entrevistas, Maria Aparecida Soares Ruas, Ofélia Alas, e Ítala D’Ottaviano. E, finalmente, às pessoas que possibilitaram meu acesso aos arquivos institucionais, Elisa, Ana (Departamento de Matemática), e Geraldo (UNESP – Rio Claro), Neusa, Maysa Furlan e Valquíria (UNESP - Araraquara), e Karina (UNESP – São José do Rio Preto), Faggiani, João Frederico da Costa Meyer, Josélia, Emerson e Silvio de Souza II (UNICAMP), Leka, Lucilene Héctor Goldschimidt e Elisabete (USP – São Paulo) e Plácido Táboas, José Ângelo, Beth, Priscila e Siumara (USP – São Carlos). Agradeço à Coordenadoria de Apoio ao Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior - CAPES e a Secretaria de Estado de Educação de São Paulo, pelo apoio financeiro parcial desta pesquisa. Finalmente, agradeço a todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização deste trabalho. Citá-los nominalmente seria impossível. A Matemática é uma atividade humana que é inevitavelmente influenciada pela subjetividade e pelas normas sociais. Claudia Henrion SUMÁRIO Índice ii Índice de Tabelas iv Índice de Gráficos vi Resumo viii Abstract ix Introdução 01 Capítulo 1 - Biografia de algumas mulheres que se dedicaram à Matemática 12 Capítulo 2 - Breve Histórico da Instrução Feminina no Estado de São Paulo 40 Capítulo 3 - Presença Feminina em Institutos de Pesquisa em Matemática do Estado de São Paulo 55 Capítulo 4 - Professoras Titulares em Matemática no Estado de São Paulo 110 Considerações Finais 128 Fontes e Referências Bibliográficas 131 Anexos 137 ÍNDICE INTRODUÇÃO 01 Capítulo 1 - Biografia de algumas mulheres que se dedicaram à Matemática 12 1.1- Hipátia de Alexandria ( 370? – 415? ) 13 1.2 - Maria Gaetana Agnesi (1718 –1799) 15 1.3 - Sophie Germain (1776 – 1831) 17 1.4 - Mary Faifax Somerville (1780-1872) 19 1.5 - Sophia Kurvin-Krukosvsky Kovalevskya (1850-1891) 22 1.6 - Amalie Emmy Noether (1882 – 1935) 24 1.7 - Mary Ellen Rudin (1924- ) 27 1.8 - Leonore Blum (1942- ) 30 1.9 - Karen Uhlenbeck (1942 - ) 32 1.10 - Elza Furtado Gomide (1925- ) 34 1.11- Maria Laura Mousinho Leite Lopes (1917- ) 35 1.12 - A condição das mulheres que se dedicaram à Matemática 37 Capítulo 2 - Breve Histórico da Instrução Feminina no Estado de São Paulo 40 2.1 - Instrução Feminina na Colônia (1500-1822) 40 2.2 - Instrução Feminina no Império (1822-1889) 43 2.3- A Feminização do Magistério 48 2.4 - A Instrução Feminina nas primeiras décadas da República (1889 –1934) 50 2.4.1 - A Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de São Paulo e o Ensino Superior feminino 53 Capítulo 3 - A Presença Feminina em Institutos de Pesquisa em Matemática do Estado de São Paulo 55 3.1- Presença feminina na Graduação em Matemática 55 3.1.1 - Bacharelado 55 3.1.2 - Licenciatura 63 3.1.3 – Matemática Aplicada 69 3.2 - Presença feminina na Pós-Graduação Stricto-sensu em Matemática 73 3.2.1 - Mestrado 73 3.2.1.1 – Mestrado em Matemática Pura 73 3.2.1.2 - Mestrado em Matemática Aplicada 77 3.2.2- Doutorado 80 3.2.2.1 - Doutorado em Matemática Pura 80 3.2.2.2 - Doutorado em Matemática Aplicada 84 3.3 - A Presença da mulher na docência no Ensino Superior em Matemática 86 3.4- A Mulher no Ensino Superior em Matemática 90 Capítulo 4 - Professoras Titulares em Matemática no Estado de São Paulo 110 4.1 - Ayda Ignes Arruda (1936 - 1983) 110 4.2 - Ofélia Teresa Alas (1943 - ) 113 4.3 - Ítala Maria Loffredo D´Ottaviano (1944 -) 115 4.4 - Maria Aparecida Soares Ruas (1948 - ) 120 4.5 - Condição das mulheres brasileiras na Matemática 125 CONSIDERAÇÕES FINAIS 128 FONTES E REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 131 ANEXOS 137 Anexo a 138 Anexo b 145 ÍNDICE DE TABELAS Tabela I: Média anual de concluintes do Bacharelado em Matemática 56 Tabela II: Porcentagem de concluintes do sexo feminino, modalidade Bacharelado, na USP – São Paulo por décadas. 60 Tabela III: Porcentagem de concluintes do sexo feminino por décadas 61 Tabela IV: Média anual de concluintes da Licenciatura em Matemática 63 Tabela V: Porcentagem de concluintes do sexo feminino nas décadas 1930, 1940, 1950 e 1960. 68 Tabela VI: Porcentagem de concluintes do sexo feminino nas décadas 1970 e 1980 69 Tabela VII: Média anual de concluintes em Matemática Aplicada 69 Tabela VIII: Porcentagem de concluintes do sexo feminino em Matemática Aplicada por décadas. 71 Tabela IX: Porcentagem de mulheres concluintes por modalidade e por instituição 72 Tabela X: Média de concluintes do Mestrado em Matemática Pura por instituição 74 Tabela XI: Porcentagem de concluintes do sexo feminino no Mestrado em Matemática Pura, por décadas, nas diferentes instituições 76 Tabela XII: Média de concluintes do Mestrado em Matemática Aplicada por instituição 77 Tabela XIII: Porcentagem de concluintes do sexo feminino no Mestrado em Matemática Pura, por décadas, nas diferentes instituições. 79 Tabela XIV: Média de concluintes do Doutorado em Matemática Pura, até 1990, por instituição. 81 Tabela XV: Porcentagem de concluintes do sexo feminino no Doutorado em Matemática Pura, por décadas e por instituição. 83 Tabela XVI: Porcentagem de mulheres concluintes por curso e por instituição 85 Tabela XVII: Porcentagem de professores do sexo feminino na docência em Matemática e Matemática Aplicada, por instituição, até 1990. 86 Tabela XVIII: Porcentagem de professores do sexo feminino na docência em Matemática e Matemática Aplicada na UNICAMP, até 2004. 86 Tabela XIX: Porcentagem de professores do sexo feminino na docência em 87 Matemática e Matemática Aplicada, por categoria na USP, campus São Paulo até 1990. Tabela XX: Porcentagem de professores do sexo feminino na docência em Matemática, por categoria na USP, campus São Carlos até 2004. 88 Tabela XXI: Porcentagem de professores do sexo feminino na docência em Matemática por categoria na UNESP, campus de Rio Claro até 2004. 88 Tabela XXII: Porcentagem de professores do sexo feminino na docência em Matemática e Matemática Aplicada, por categoria na UNICAMP até 2004. 88 ÍNDICE DE GRÁFICOS Gráfico I: Concluintes do Bacharelado em Matemática da USP – São Paulo 57 Gráfico II: Concluintes do Bacharelado em Matemática da UNICAMP 58 Gráfico III: Formados em Bacharelado em Matemática UNESP – Rio Claro 58 Gráfico IV: Concluintes do Bacharelado em Matemática da USP – São Carlos 59 Gráfico V: Concluintes de Matemática, Bacharelado e Licenciatura em Matemática da UNESP - São José do Rio Preto 60 Gráfico VI: Concluintes do Bacharelado 62 Gráfico VII: Concluintes da Licenciatura em Matemática da USP – São Paulo 64 Gráfico VIII: Concluintes de Licenciatura em Matemática da FFCL de Araraquara 65 Gráfico IX: Formados em Licenciatura em Matemática UNESP – Rio Claro 66 Gráfico X: Concluintes da Licenciatura em Matemática da UNICAMP 67 Gráfico XI: Concluintes da Licenciatura em Matemática 68 Gráfico XII: Concluintes da Matemática Aplicada da UNICAMP 70 Gráfico XIII: Concluintes da Matemática Aplicada da USP – São Paulo 71 Gráfico XIV: Concluintes da Matemática Aplicada 72 Gráfico XV: Concluintes do Mestrado em Matemática Pura da UNICAMP 74 Gráfico XVI: Concluintes do Mestrado em Matemática da USP – São Carlos 75 Gráfico XVII: Concluintes do Mestrado em Matemática da USP – São Paulo 75 Gráfico XVIII: Concluintes do Mestrado em Matemática por décadas 76 Gráfico XIX: Número de Concluintes de Matemática Aplicada da UNICAMP 78 Gráfico XX: Concluintes de Matemática Aplicada da USP – São Paulo 79 Gráfico XXI: Concluintes de Matemática Aplicada por décadas 80 Gráfico XXII: Número de Concluintes do Doutorado em Matemática Pura da UNICAMP 81 Gráfico XXIII: Concluintes do Doutorado em Matemática da USP – São Carlos 82 Gráfico XXIV: Concluintes do Doutorado em Matemática da USP – São Paulo 82 Gráfico XXV: Concluintes do Doutorado em Matemática Pura 83 Gráfico XXVI: Concluintes do Doutorado em Matemática Aplicada da USP – São Paulo 84 Resumo Esta investigação tem como objetivo mapear a presença feminina nos cursos e Departamentos de Matemática e Matemática Aplicada da USP (São Paulo e São Carlos), UNESP (Rio Claro e São José do Rio Preto), FFCL de Araraquara e UNICAMP. Desta forma, foram coletados dados relativos à Graduação, Pós-Graduação e Docência, a partir da criação dos cursos de Matemática nestes institutos, até 1990. Estes dados mostraram que quanto mais alto o posto/nível da carreira acadêmica, menor é a presença feminina, por exemplo, as mulheres são mais numerosas entre os Professores Assistentes Doutores que entre os Professores Titulares, afinal, até 2004, somente quatro professoras obtiveram o título de Professoras Titulares nestas instituições. Diversos estudos sobre Gênero na Ciência afirmam que esta é uma tendência mundial e que, independente da área de conhecimento analisada, a quantidade de mulheres é inversamente proporcional ao aumento do grau de instrução/reconhecimento destas, mas que, no entanto, esta situação é mais marcante nas Ciências Exatas. Sendo assim, acreditou-se por muito tempo que as mulheres não tinham predisposição biológica para este ramo da ciência. Portanto, atualmente, acredita-se que este fenômeno é decorrente de diversos fatores sociais. Palavras Chaves: Mulheres na Matemática, História da Matemática no Brasil. Abstract This research aims at investigating the female presence in the Mathematics and Applied Mathematics courses and Departments of USP (Sao Paulo and Sao Carlos), UNESP (Rio Claro and Sao Jose do Rio Preto), Araraquara FFCL and UNICAMP. In this way, data related to the Graduation, Post-graduation and Teaching were collected until 1990. These facts showed that how higher the position and/or level of the academic career is, the lower is the female presence. For example, women are in higher numbers among Doctors Assistant Professors than among the Titular Professors, as until 2004 only four professors got the title of Titular Professors in these institutions. Several studies on Genders in Science affirm that this is a world-wide trend and, independent of the analyzed area of knowledge, the amount of women is inversely proportional to the increase of their instruction/recognition degree, but nevertheless this situation is more outstanding in Accurate Sciences. Thus, it has been believed that women didn’t have biological predisposition for this sector of the science for a long time. However, nowadays it is believed that this phenomenon is a result of several social factors. Key-Words: Women in Mathematics. Mathematics History in Brazil INTRODUÇÃO Ao iniciar a leitura de um trabalho histórico, o leitor deve estar ciente que está conhecendo uma parte da história sob determinado ponto de vista. Grande parte da História escrita até os dias atuais reflete o ponto de vista do homem branco (ocidental). Este fato, possivelmente, resultou no esquecimento de importantes personagens históricos. Portanto, freqüentemente, é sentida a necessidade de reescrever a história de um determinado povo ou civilização, utilizando um novo olhar. A história das mulheres, sua “inclusão” na Educação e na carreira acadêmica foi excluída da história oficial por muitos anos. Rodrigues (1962) enfatiza este fato ao iniciar seu livro A Instrução feminina em São Paulo: Subsídios para a sua História até a Proclamação da República com a seguinte afirmação: “A mulher é a grande ausente da história do Brasil e de São Paulo. [...] Parece-nos que melhor acertaríamos considerando-a a ‘grande desconhecida’” (p. 11). Apesar de este livro ter sido escrito em 1962, pode-se considerar este discurso atual. Existem poucos trabalhos que abordam especificamente a presença feminina na Educação. São ainda menos numerosos trabalhos que abordam a presença da mulher na Educação em campos específicos, como por exemplo, Ciências Exatas ou Matemática. Segundo Almeida (1998), a mulher no Brasil, ainda hoje, continua a ser ignorada enquanto sujeito histórico, e esta situação é ainda pior quando se analisa a história da educação brasileira. A mulher pode também ser considerada ausente na escrita da História da Ciência, “[...] quando se fala em mulher e ciência, a reação imediata é de indicar a ausência de mulheres no desenvolvimento desta atividade ao longo da história”. (PÉREZ-SEDEÑO e GARCIA, 1992. Tradução nossa). No entanto, a História da Ciência tem resgatado a história de várias mulheres que tiveram influência na produção do conhecimento científico, como por exemplo, a física Lise Meitner (1878 - 1968), a matemática Mileva Maric (1875 - 1948), e a física e matemática Madame de Châtelet (1706-1749), dentre outras. Nas décadas de 1960 e 1970, as mulheres começaram a reivindicar o registro de sua participação na História. Nestas décadas, o movimento feminista ganhou força, e com ele as mulheres começaram a se sentir sujeitos históricos. Sendo assim, as feministas começaram a lutar para que as mulheres fossem colocadas como protagonistas da história e não somente como agentes passivos desta. Assim, reivindicavam “[...] uma história que estabelecesse heroínas, prova da atuação das mulheres, e também explicações sobre a opressão [...]” (SCOTT, 1992: 64). A necessidade de registrar uma nova história, focando a mulher como sujeito, evidencia que o domínio que temos sobre o passado é parcial e, além disto, pode comprovar a existência de uma lacuna na escrita oficial da história. Assim, surgiu a História das Mulheres como campo de estudos que objetivava integrar a mulher à história, ou seja, transformá-las em objeto de estudos, vale dizer, em sujeitos históricos. Este fato, segundo algumas autoras, Tilly (1994) e Scott (1992), fez com que se ampliassem os limites da história, afinal não se desejava acomodar as mulheres nas histórias estabelecidas. A presença da mulher era imprescindível para corrigir a História. Nas palavras de Scott, [...] A ameaça radical colocada pela história das mulheres situa-se exatamente neste tipo de desafio à historia estabelecida; as mulheres não podem ser adicionadas sem uma remodelação fundamental dos termos, padrões e suposições daquilo que passou para a história objetiva, neutra e universal no passado, porque esta visão da história incluía em sua própria definição de si mesma a exclusão das mulheres.(SCOTT, 1992: 90). Para a reescrita da história oficial sob nova perspectiva, eram necessárias re- conceitualizações que, no entanto, nem mesmo os historiadores das mulheres estavam preparados para realizar, “[...] era necessário um modo de pensar sobre a diferença e como a sua construção definiria as relações entre os indivíduos e os grupos sociais”. (SCOTT, 1992: 86). Foi nesse contexto que, de acordo com Rago (1998), nas décadas de 1980 e 1990, foi elaborada a categoria Gênero. O termo “gênero” foi utilizado para teorizar a questão da diferença entre os sexos. Os estudiosos de gênero preferiram enfatizar as conotações sociais ao invés das biológicas. Enquanto o sexo biológico é determinado antes no nascimento, “[...] o gênero é um produto cultural adquirido e transmitido nas estruturas sociais” (ALMEIDA: 1998, 43). Desta forma, “estudos de gênero permitem pensar que a construção social de gênero se faz arbitrariamente em relação à diferenciação de sexos de homens e mulheres” (MACHADO: 1998, 108). Para estes estudos, não é possível definir mulher se não em relação aos homens e nem homens sem considerar a relação com as mulheres. “[...] A masculinidade e a feminilidade são encaradas como posições dos sujeitos, não necessariamente restritas a machos ou fêmeas biológicas” (SCOTT, 1992: 89). Assim, tornar-se mulher ou homem faz parte das relações de gênero. Segundo Saffioti (1992), pessoas nascidas com genitália feminina podem tornar-se homens e pessoas com genitálias masculinas podem tornar-se mulheres. Assim, enquanto o sexo é imutável, o gênero, por ser relacional, é variável. Afinal, acreditar que as diferenças sexuais são fenômenos naturais e, portanto, imutáveis, ao invés de sociais, segundo Scott (1994), pode ser utilizado para justificar a discriminação sexual. Embora o conceito de gênero, em muitos momentos, esteja relacionado aos estudos que tomam a mulher como objeto, em um sentido amplo “[...] este deve ser entendido como uma construção social, histórica e cultural, elaborada sobre as diferenças sexuais” (ALMEIDA: 1998, 41). Assim, o conceito de gênero não se refere especificamente a nenhum dos sexos, e sim às relações constituídas socialmente entre eles. Acredita-se que estas relações recebem influências das relações de poder, de classe ou raça. De acordo com SMITH (2003), a historiografia, geralmente, evita personalidades femininas e questões de gênero. Para esta autora, torna-se necessária “[...] uma versão da historiografia que reconheça o gênero - uma versão que nos permitirá dar novo polimento em nosso espelho sobre o passado” (p. 37). Foi sob esta perspectiva que este trabalho foi realizado. Seu intento é, em linhas gerais, abordar a inserção feminina no Ensino Superior e no meio acadêmico matemático no Estado de São Paulo. Cumpre destacar que a educação das meninas das camadas populares no Brasil, até meados do século XIX, resumia-se a prendas domésticas e ao ensino das primeiras letras. Este ensino era desenvolvido em escolas “femininas” e realizado por mestras que, segundo Saffioti (1979), tinham uma formação precária. O currículo das escolas destinadas a ensinar meninos e meninas era diferenciado. Em 1827, um projeto de ensino isentava “[...] a mestra da necessidade de ensinar noções de Geometria e restringe o ensino de Aritmética nas escolas de meninas ‘às 4 operações’” (SAFFIOTI, 1979: 192). A educação feminina era voltada para preparar a mulher para atuar no espaço doméstico e incumbir-se do cuidado do marido e dos filhos. Desta forma, bastava a ela saber assinar seu próprio nome e fazer algumas leituras missais. Nesta época, não se cogitava a hipótese de que a mulher pudesse desempenhar uma profissão assalariada. No final do século XIX e início do século XX, praticamente não existia no Brasil uma rede oficial de ensino. Um nível mais avançado de ensino para mulheres era possível apenas em colégios confessionais. Estes colégios mantinham, para o ensino das meninas, disciplinas consideradas de cunho feminino, tais como, corte e costura e culinária. A existência de currículos diferenciados entre as escolas femininas e masculinas, segundo Godinho (2005), trazia dificuldades às mulheres na hora de reivindicar o ingresso no Ensino Superior. Embora as mulheres brasileiras tenham adquirido o direito legal de cursar o Ensino Superior, em 1879, e algumas mulheres tenham cursado este nível de ensino, sobretudo em medicina, devido às dificuldades já citadas e à realidade brasileira, o marco do acesso feminino ao Ensino Superior, somente ocorreu em 1934, com a criação da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da Universidade de São Paulo. Já no final da década de 1930, as mulheres se encontravam matriculadas em todos os níveis de ensino, sobretudo, nos cursos superiores (Azevedo e Ferreira, 2006). Em poucas décadas, elas conquistaram espaço neste nível de ensino, chegando, inclusive, a serem responsáveis pela maioria das matrículas, durante as últimas décadas do século XX. Entretanto, estas matrículas se concentravam em cursos “tradicionalmente femininos”, como Ciências Humanas, Ciências Sociais e Enfermagem, sendo ainda reduzidas em cursos de Ciências Exatas. Diversos estudos sobre gênero na ciência afirmam que nos cursos de Pós- Graduação e na carreira acadêmica, independente da área de conhecimento analisada, a quantidade de mulheres é inversamente proporcional ao aumento do grau de instrução e reconhecimento. No entanto, esta situação é mais acentuada nas Ciências Exatas. Sendo assim, acreditou-se por muito tempo que as mulheres não tinham predisposição biológica para este ramo da ciência. Atualmente, acredita-se que a reduzida escolha das mulheres por estas carreiras esteja associada a fatores sociais e não a fatores biológicos. Buscando formular um panorama da presença feminina nos maiores centros de Ensino Superior e de pesquisa em Matemática do Estado de São Paulo, decidiu-se, inicialmente, pesquisar os cursos de Graduação e Pós-Graduação em Matemática existentes nas seguintes universidades: Universidade de São Paulo – USP, campus de São Paulo e de São Carlos, Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” – UNESP, campus de Rio Claro e de São José do Rio Preto, Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Araraquara, Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP, Pontifícia Universidade Católica de Campinas - PUC - Campinas e Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC - São Paulo. Estas instituições foram escolhidas por oferecerem os cursos de Matemática mais antigos e reconhecidos do Estado. Inicialmente, pensou-se em delimitar o período desse estudo a partir da criação destes cursos até a década de 1980. No entanto, em função de dificuldades de acesso aos arquivos da PUC - São Paulo e da PUC - Campinas, que serão expostas posteriormente, estas universidades foram excluídas da pesquisa, tendo o período sido ampliado até a década de 1990. Esta investigação foi realizada a partir da questão norteadora a Matemática é feminina?1 e tem como objetivos identificar o número percentual de mulheres concluintes dos cursos de Graduação em Matemática Aplicada, Licenciatura ou Bacharelado em Matemática e Pós-Graduação stricto-sensu em Matemática Pura ou Aplicada, identificar o percentual de mulheres que atuaram como docentes nestes institutos, destacando as que chegaram ao cargo de Professoras Titulares2 e, finalmente, apontar algumas das possíveis razões para estas porcentagens. Assim sendo, este trabalho pretende apresentar dados estatísticos sobre a participação feminina nos Cursos e Departamentos de Matemática dos grandes institutos de pesquisa do Estado de São Paulo. De acordo com LOPES (2005), trabalhos desta natureza são importantes por três motivos: [...] primeiro porque as pessoas reais, independentemente de todos os avanços das teorias de gênero, continuam assumindo identidades de gênero como Homens ou Mulheres nos sistemas de Ciência e Tecnologia e, como tais continuam a ser discriminadas. Segundo, porque a ausência destes indicadores perpetua o falso mito da ciência como reserva quase que exclusivamente masculina. E finalmente, porque, [...] embora 1 Este título foi inspirado no livro: “A ciência é masculina? É sim senhora!” CHASSOT (2003) 2 Este é o mais alto posto da carreira acadêmica. O Mestrado e Doutorado são títulos obtidos mediante defesa de dissertação ou tese (respectivamente). A Livre-Docência pode ser obtida através de defesa de tese ou pelo conjunto da obra e o cargo de Titular é obtido mediante concurso. disponíveis, [alguns dados brasileiros] não foram ainda implementados como subsídios para políticas de Ciências e Tecnologias. (LOPES: 2005, 79-80). Através de um mapeamento da participação feminina na Matemática nos grandes institutos de pesquisa do Estado de São Paulo, este trabalho pode auxiliar futuras investigações sobre o ainda incipiente tema “Gênero na Ciência Matemática”. Pois, “[...] olhar para a inserção da mulher no contexto educacional brasileiro atual, mesmo que dentro dos limites de uma década, pode constituir-se num importante instrumento para uma análise das relações de gênero e das conquistas feministas”. (GODINHO, 2005: 15). Além disso, no Brasil, existem poucos trabalhos que abordam as relações entre mulher e ciência. LOPES (2000) enfatiza que “Gênero, ciência, história, em seus entendimentos múltiplos tem convivido pouco entre si no Brasil” (p. 7) e que, apesar das poucas publicações, o número trabalhos desta natureza vem crescendo lentamente no Brasil. (LOPES, 2005). A partir do destaque que será dado a algumas mulheres que chegaram ao posto de Professoras Titulares em Matemática nas Universidades Paulistas, esta investigação pode também contribuir para pesquisas que visem estudar a vida e a obra de algumas mulheres que tiveram importante participação no desenvolvimento da Matemática e da Educação Matemática Brasileira e, conseqüentemente, pretende contribuir para a escrita da História da Matemática no Brasil. De acordo com SILVA (1992), é necessário escrever a História da Matemática dos países periféricos, como por exemplo, o Brasil, para acabar com a “errônea crença” de que a ciência é produzida somente nos países centrais. Além de superar esta “errônea crença”, este trabalho visa, também, se contrapor à idéia de que pouquíssimas mulheres tiveram importante participação no desenvolvimento da Matemática. A fim de atingir os objetivos propostos, a coleta dos dados para esta investigação realizou-se por meio dos seguintes instrumentos: levantamento bibliográfico, pesquisa nos arquivos das instituições analisadas e entrevistas semi-estruturadas com as professoras que chegaram ao cargo de Professoras Titulares. No segundo semestre de 2005, iniciou-se a coleta de dados, que representou a etapa mais demorada e trabalhosa desta pesquisa, devido principalmente às inúmeras viagens realizadas. Tendo em vista que as instituições pesquisadas são regidas por normas diferentes, adotou-se uma forma diferenciada de coleta de dados para as diferentes instituições. Na UNESP de Araraquara após alguns contatos iniciais, descobriu-se que os arquivos do antigo curso de Matemática da Faculdade de Filosofia e Ciências e Letras de Araraquara (hoje UNESP-Araraquara) estavam sob responsabilidade do Instituto de Química da UNESP – Araraquara. Sendo assim, o ofício solicitando a autorização ao acesso aos arquivos foi enviado à Diretora deste instituto. Após a aprovação do pedido, entrou-se em contato com a seção de Graduação e com a seção de Comunicações, a fim de conseguir os dados relativos aos formandos e aos professores, respectivamente. Os dados do corpo discente foram obtidos, inicialmente, por meio de uma listagem e, posteriormente, por meio de consulta aos processos dos alunos cujos nomes suscitavam dúvidas em relação ao sexo. Este trabalho somente foi possível devido à extrema organização do arquivo do antigo curso de Matemática da FFCL - Araraquara, atualmente mantido pelo IQ – UNESP- Araraquara. Já, os dados sobre o corpo docente não puderam ser consultados. Para o campus da UNESP de São José do Rio Preto, foi enviado um ofício ao diretor do Instituto de Biociências Letras e Ciências Exatas – IBILCE, explicando os objetivos da pesquisa e solicitando autorização para obtenção dos dados. A partir dessa autorização, entrou-se em contato com a seção de Graduação e de Pessoal. A listagem dos formados por ano e modalidade foi enviada por correio eletrônico, no entanto, a seção de Pessoal não liberou os dados para consulta. Na UNESP, campus de Rio Claro, o ofício solicitando o acesso aos arquivos, foi enviado ao Diretor do Instituto de Geociências e Ciências Exatas de Rio Claro (IGCE), tendo sido rapidamente autorizado. A seção de alunos disponibilizou uma fotocópia dos arquivos que continham todos os matriculados e formandos de Matemática (Licenciatura e Bacharelado) até 2003. A seção de Recursos Humanos disponibilizou uma lista com nomes dos professores constantes da folha de pagamentos da UNESP, ou seja, professores que se encontram na ativa ou aposentados. As informações relativas aos professores falecidos ou contratados por tempo determinado foram obtidas nas fichas cadastrais. Foram realizadas dez visitas ao arquivo desta Unidade. Para a USP, campus de São Carlos também foi enviado um ofício, solicitando autorização para o acesso aos arquivos, ao Diretor do Instituto de Ciências Matemática e de Computação (ICMC). Tão logo obtida esta autorização, entrou-se em contato com a seção de Graduação, seção de Pós-Graduação e de Recursos Humanos. A seção de Graduação enviou por correio eletrônico o número de formados em Matemática por ano, até 1990, no entanto, estes dados não eram suficientes para a pesquisa. Após um segundo pedido, foi enviado, também por meio eletrônico, um arquivo contendo os nomes dos ingressantes e formados em Matemática por ano, porém, sem distinção entre licenciados e bacharéis. Após um terceiro contato, descobriu-se que os formados, até 1990, eram somente do curso de bacharelado. A seção de Pós-Graduação enviou, por correio, um documento com os nomes dos ingressantes, por ano e um outro com os nomes dos concluintes da Pós-Graduação, data da defesa, título da dissertação/tese e nome do orientador. A seção de Recursos Humanos enviou por correio eletrônico a listagem de professores do Departamento de Matemática. Tendo em vista os dados obtidos, não foi necessária nenhuma visita ao campus. O primeiro contato com a USP, campus de São Paulo, foi um encontro com o vice-diretor do Instituto de Matemática e Estatística (IME), que, para autorizar a pesquisa solicitou o envio de um ofício. Após a aprovação deste, em uma segunda visita a USP – São Paulo foram obtidas cópias dos catálogos de Graduação com o nome de todos os professores que lecionaram por ano no curso de Matemática da USP, no período de 1970 a 1990. A fim de conseguir os dados da Pós-Graduação, conversou-se com o Presidente da Comissão de Pós-Graduação do IME, que, após apresentação de um ofício, permitiu o acesso aos arquivos posteriores a 1970. Na seção de Graduação, depois de grande insistência, conseguiu-se obter uma cópia do “Livro de atas de colação de grau” (manuscrito). Os arquivos com dados anteriores a 1970 pertencem à Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLECH), assim sendo, foi necessária a autorização do diretor deste instituto. Na FFLECH, foi encontrada uma lista com os nomes dos concluintes em Matemática, mas não existia registro nem dos pós-graduados, nem dos docentes da FFCL São Paulo. Estes dados foram parcialmente encontrados nos anuários da FFCL existentes3 no Centro de Apoio à Pesquisa Histórica da USP. Finalmente, para a UNICAMP, foi enviado um oficio ao Diretor Acadêmico, solicitando o acesso aos nomes dos alunos ingressantes e de formandos. Tal solicitação foi negada. Entretanto, após um encontro com o Diretor Acadêmico, foram obtidos dois arquivos informatizados (excel), um contendo os nomes dos alunos de Graduação e outro os de Pós-Graduação. O arquivo relativo aos alunos de Graduação contém as seguintes informações: curso, nível, modalidade, ano de ingresso e término4, nome do aluno, sexo. O dos alunos de Pós-Graduação: curso, nível, área, ano de ingresso e de término5, nome e sexo. Também foi enviado um oficio ao diretor do Instituto de Matemática Estatística e Computação Científica (IMECC), solicitando autorização aos arquivos que permitissem conhecer os nomes de professores do IMECC. Este instituto enviou três arquivos por correio eletrônico. O primeiro continha nome, função, ano de início e término, no caso dos aposentados. O segundo, nome, cargo, situação, titulação, departamento e data de admissão e no terceiro, nome e formação. Percebeu-se que estes arquivos excluíam os professores que trabalharam com Lógica no IMECC, como é o caso da Profa. Dra. Ítala D’Ottaviano, Prof. Dr. Newton C. A. da Costa, Prof. Dr. Antonio Mario Sette e Profa. Dra. Ayda Arruda, dentre outros. Tendo em vista que neste trabalho considerou-se a Lógica como uma área da Matemática, não se pôde excluir os professores da UNICAMP que trabalharam e/o trabalham com Lógica, somente pelo fato de estes não pertencerem ao IMECC. Desta forma, foi feito um levantamento, junto ao Centro de Lógica e Epistemologia (CLE), dos nomes dos professores que trabalharam com a disciplina Lógica, na UNICAMP, independente de estarem ou não lotados no IMECC. Para conseguir estes documentos, foram necessárias quatro visitas a UNICAMP. Conforme já explicitado anteriormente, a proposta inicial desta dissertação incluía a PUC – Campinas e a PUC – São Paulo, mas devido à não autorização do acesso aos arquivos necessários à realização da pesquisa, tornou-se impossível manter tais instituições neste trabalho. 3No entanto, este arquivo não possui todos os anuários da FFCL de São Paulo. 4 Para os alunos que não concluíram, no campo destinado ao ano de formatura, aparece o número zero. 5 Idem. Após conseguir os documentos institucionais citados anteriormente, em alguns casos, foi necessário montar uma lista de nomes, como por exemplo, os alunos concluintes da Graduação em Matemática da USP, após 1970, e professores do IME – USP. Em todas as listas, foi analisada a categoria sexo. Como alguns nomes não permitiam a identificação da categoria feminino ou masculino, foram desconsiderados do total e colocados na categoria não-identificados. Tendo em vista que os nomes não identificados totalizaram apenas 1,49 % do total de nomes analisados, pode-se concluir que eles não alteraram, significativamente, os resultados. Foram elaboradas tabelas (anexo a e b) com formados e/ou concluintes por modalidade e ano, que continham o número total de concluintes, o número de mulheres e a porcentagem de mulheres. O mesmo foi feito com relação às décadas estudadas. Foram traçados gráficos para auxiliar a visualização dos resultados. O período temporal inicialmente adotado para a análise dos dados das Professoras Titulares era até 1990, no entanto, tendo em vista que, nas instituições estudadas, até 1990, existiam somente duas professoras Titulares: Ayda Ignez Arruda (1936 - 1983) – Professora Titular da UNICAMP em Lógica e Ofélia Teresa Alas (1943 -) – Professora Titular da USP – São Paulo em Topologia, decidiu-se ampliar o período até 2004. Assim, foi permitido incluir, neste estudo, mais duas professoras: Itala Maria Loffredo D'Ottaviano (1944 -) - Professora Titular da UNICAMP em Lógica e Maria Aparecida Soares Ruas (1948 - ) – Professora Titular da USP, campus de São Carlos em Geometria e Topologia. A partir destes dados, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas6 com estas professoras. As entrevistas foram gravadas e transcritas, todas as transcrições foram enviadas às professoras para a revisão do texto. Somente, então, foi elaborado o texto final das entrevistas. Após a tabulação dos dados institucionais e da redação final das entrevistas, foi realizada a análise dos dados, sempre considerando que as diferenças dos indicadores acadêmicos existentes entre homens e mulheres são resultado de fatores sociais e não biológicos. 6 Foi realizada também uma entrevista “piloto”, na UNESP de Rio Claro, com o objetivo de avaliar o roteiro de entrevistas e a postura da entrevistadora. Para apresentação destes resultados, esta dissertação é dividida em quatro capítulos. O primeiro capítulo refere-se à biografia de onze mulheres que se dedicaram a Matemática, são elas: Hipátia de Alexandria (370? – 415?), a italiana Maria Gaetana Agnesi (1718–1799), a francesa Sophie Germain (1776 – 1831), a escocesa Mary Faifax Somerville (1780-1872), a russa Sophia Kurvin-Krukosvsky Kovalevskya (1850-1891), a alemã Emmy Noether (1882 – 1935) e as estadunidenses Mary Ellen Rudin (1924 - ), Leonore Blum (1942- ) e Karen Uhlenbeck (1942 - ), além das brasileiras Elza Furtado Gomide (1925- ) e Maria Laura Mouzinho Leite Lopes (1917- ). No capítulo II, apresenta-se um breve histórico da educação formal feminina, nos diversos níveis de ensino no Estado de São Paulo, desde o Brasil Colônia até 1934. Neste ano, houve a promulgação da Constituição de 1934 e a criação da Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de São Paulo, tais iniciativas resultaram em profundas modificações no panorama educacional da mulher paulista. A participação feminina na Matemática nas três maiores instituições públicas do Estado de São Paulo, USP, UNESP - campi de Rio Claro, São José do Rio Preto, Araraquara - e UNICAMP, até 1990, é abordada no capítulo III desta dissertação. São apresentados dados sobre a presença da mulher entre os concluintes da Graduação em Matemática (Bacharelado, Licenciatura e Matemática Aplicada) e Pós-Graduação stricto-sensu (Mestrado e Doutorado em Matemática Pura e Mestrado e Doutorado em Matemática Aplicada). Os dados relativos à participação feminina na docência e carreira acadêmica destes institutos, também, são abordados neste capítulo. E, finalmente, no capítulo IV, são apresentadas as biografias das Professoras Titulares pertencentes às instituições investigadas. CAPÍTULO I: Biografia de algumas mulheres que se dedicaram à Matemática O capítulo que se inicia tem o intuito de apresentar um breve resumo da vida e da obra de onze mulheres que se dedicaram à Matemática, em diferentes contextos históricos e geográficos, são elas: Hipátia de Alexandria (370? – 415?), Maria Gaetana Agnesi (1718–1799), Sophie Germain (1776–1831), Mary Faifax Somerville (1780- 1872), Sophia Kurvin-Krukosvsky Kovalevskya (1850-1891), Emmy Noether (1882 – 1935)7, Mary Ellen Rudin (1924- )8, Leonore Blum (1942- ) e Karen Uhlenbeck (1942 - )9. Além destas, serão apresentadas breves biografias das pioneiras em pesquisa em Matemática no Brasil, Elza Furtado Gomide (1925- ) e Maria Laura Mouzinho Leite Lopes (1917- ). Existem, entretanto, outras mulheres que reconhecidamente tiveram importante participação no desenvolvimento da Matemática e não puderam, infelizmente, ser abordadas neste capítulo, devido a este não ser o foco desta pesquisa. Dentre elas, pode-se destacar: Caroline Herschal (1750-1848), Emilie de Breteuil (Marquesa du Châtelet) (1706-1749), Augusta Ada Lovelace (1815-1852) e Charlotte Angas Scott (1858-1931). A escrita de biografias e uma reflexão sobre a exclusão da mulher na ciência, para PÉREZ-SEDEÑO e GARCIA (1992), são os primeiros esforços para avaliar a participação feminina na ciência. Apesar de existirem inúmeras biografias destas mulheres10, torna-se necessário apresentá-las neste capítulo, pois a escassez destes trabalhos em língua portuguesa ainda é grande. Há, possivelmente, mulheres que se dedicaram ao estudo da Matemática e da Ciência, que contribuíram significativamente para essas áreas e que, no entanto, não têm reconhecimento histórico. De acordo com Schiebinger (2001), o problema do reconhecimento científico das mulheres é antigo. Muitas mulheres que, invisivelmente, colaboraram com os trabalhos de seus irmãos e companheiros foram injustamente 7 Estas foram escolhidas, pois são as mais freqüentemente citadas como grandes matemáticas. 8 Indicada, juntamente com Emmy Noether, por Ofélia Alas, em entrevista, como a maior matemática do século XX. 9 Estas mulheres contemporâneas são freqüentemente citadas como pertencentes ao seleto grupo das maiores matemáticas do século XX. 10 Com exceção das seguintes matemáticas: Mary Ellen Rudin, Leonore Blum e Karen Uhlenbeck, Elza Furtado Gomide e Maria Laura Mouzinho Leite Lopes. “esquecidas” na escrita da História, como por exemplo, Margaret Huggins (1848 - 1915), esposa do astrônomo britânico William Huggins (1824-1910), Mileva Maric (1875 - 1948), esposa de Albert Einstein (1879-1955), e Edith Clements (1874 – 1971), esposa do ecologista Frederic Clements (1874–1945). Desta forma, torna-se relevante escrever a biografia de mulheres que se destinaram ao estudo da Matemática, pois, a partir destas, pode-se repensar a participação e a, ainda desconhecida, contribuição feminina para esta Ciência. No entanto, esta é apenas uma etapa de um trabalho que se destina ao estudo da presença feminina nesta ciência. 1.1 - Hipátia11 de Alexandria ( 37012? – 415? ) 13 Hipátia viveu em Alexandria, quando esta estava sob domínio Romano14 e aceitava oficialmente o cristianismo. Segundo Eves (2004), os cristãos se opunham a investigações científicas, pois não era raro estas contradizerem os dogmas religiosos. Possivelmente foi, educada por seu pai, Theon de Alexandria15, o qual desejava que sua filha fosse um ser humano perfeito, para isto, investiu muito em sua educação. Durante a primeira parte de sua vida, Hipátia permaneceu praticamente isolada no Instituto Museum16. Seu treinamento foi completo em Artes, Literatura, Ciências, Filosofia e Retórica, também realizava fortes treinamentos físicos17, que incluíam natação, caminhadas e montaria. Hipátia, segundo Rothman (1996), estudou em Atenas e na Itália. 11 Em algumas obras, seu nome aparece grafado como Hipácia de Alexandria. 12 Não há um consenso sobre a data de seu nascimento, alguns autores aceitam o fato de ela ter nascido em 355 e ter morrido aos 60 anos. 13 Todas as fotos presentes neste texto foram retiradas do sítio: 14 Alexandria foi dominada pelos Gregos de 336 – 31 a.C e pelos romanos de 31 a.C – 476 d.C. 15 Professor de Matemática e diretor da Universidade de Alexandria. Possivelmente, nascido em 335, não foram encontrados dados sobre a data de sua morte. 16 Segundo Osen (1994), era considerado o maior centro de Ciências da Antigüidade. 17 Pois Theon desejava que o corpo de sua filha tivesse condições de acompanhar seu raciocínio. As mulheres que viveram na época de Hipátia não eram, sequer, consideradas como indivíduo. Viviam submissas aos homens. Poucas tinham a ousadia de freqüentar aulas fora de seus lares e se exporem publicamente. No entanto, algumas mulheres lutavam para modificar esta realidade. Apesar de ter recebido inúmeros convites de casamento de príncipes e intelectuais, de acordo com Osen (2004), ela nunca se casou, pois já se considerava “casada com a verdade”. Hipátia era Geômetra, Astrônoma e grande divulgadora dos trabalhos de Platão (427-347 a.C) e Aristóteles (383 – 322 a. C). Foi professora da Escola Neoplatônica e lecionou Matemática e Filosofia na Faculdade de Alexandria. Comentou grandes obras, tais como, Aritimética de Diofanto18, As seções Cônicas de Apolônio19 (ca 262 a.C – 190 a.C), e acredita-se que tenha ajudado seu pai a comentar o segundo e terceiro dos treze livros do Almagesto de Ptolomeu (ca 150). De acordo com Osen (1994), a maior parte de seus trabalhos foram preparados como livros- textos para seus alunos. Além destes comentários, acredita-se que ela foi autora de vários trabalhos em Matemática, afinal, Osen (1994) afirma que o lexicógrafo-historiador-compilador Suidas (976-1028) listou vários títulos escritos por ela que, infelizmente, não chegaram intactos a contemporaneidade, a maior parte deles foi destruída quando a Biblioteca Ptolemaica e o Templo de Serapis foram saqueados. Somente restaram fragmentos de sua produção20. Hipátia, segundo Rothman (1996), interessou-se por Mecânica e Tecnologia Prática. As correspondências com seu discípulo mais ilustre, Synesius de Cyrene (ca 400) permitiu creditar a ela o modelo do Astrolábio21, um aparelho que destila água, um medidor do nível de água e um aparelho que media densidade dos líquidos chamado Aerômetro. Segundo Osen (1994), este último, hoje, pode ser entendido como uma Clepsdra22 ou um Hidrômetro.23 Os cristãos consideravam Hipátia uma filósofa herege e quando Cyril (376-444), tornou-se patriarca de Alexandria, em 415, e “[...] iniciou um programa sistemático de opressão aos hereges”. (OSEN, 1994: 28, tradução nossa). Assim, criou-se um grupo 18 Ela comentou seis dos 13 livros que compunham esta obra. Acredita-se que Diofanto tenha vivido no século III. 19 Era composto por oito livros dos quais quatro foram comentados por ela. 20 Parte do trabalho original dela sobre o Cânon Astronômico de Diofanto foi encontrado no século XV na Biblioteca do Vaticano. 21 Instrumento para medir a posição das estrelas e o sol e é usado para calcular o tempo e o signo ascendente do Zodíaco. 22 Relógio que mede o tempo com relação ao escoamento de água. 23 Relógio que mede quantidade de água consumida. que se revoltou contra ela e esperaram-na no caminho da universidade. Assassinaram- na, esquartejaram e queimaram seu corpo. Entre o início do século V e o século XVIII, não há registros de mulheres que tenham se dedicado ao estudo, ou contribuído para a Matemática. No entanto, como foi explicitado anteriormente, não significa que não tenham existido. 1.2 - Maria Gaetana Agnesi (1718 –1799) Como nesta época as mulheres somente eram educadas em conventos, o pai de Agnesi cuidou dos estudos dela pessoalmente, mas, ao perceber o talento especial de sua filha, Dom Pietro contratou um tutor para educá-la. Seu pai organizava reuniões acadêmicas com intelectuais da época, nas quais apresentava os filhos, dentre os quais Maria Gaetana se destacava. Estas reuniões tinham como língua oficial o latim, no entanto, muitas vezes ela respondia às perguntas dos participantes de diferentes nacionalidades em suas línguas natais. Agnesi foi uma excelente lingüista, segundo Katz (1993), aos onze anos falava sete idiomas. Aos catorze anos, trabalhou em comentários sobre a obra Traité analytique dês sections coniques de L’Hospital (1661-1704), que, apesar de ser considerado excelente por alguns professores, nunca foi publicado. Agnesi também se dedicou ao estudo dos trabalhos de Newton (1642-1727), Leibniz (1646-1716), Euler (1707-1783), Fermat (1601-1665), Descartes (1595-1650), irmãos Bernoulli, além de Física e outros ramos da ciência. Em 1738, publicou Propositiones Philosofhicae, que, de acordo Eves (2004), era uma coletânea de 190 ensaios, sobre variados assuntos, como: Lógica, Mecânica, Hidromecânica, Elasticidade, Gravitação, Mecânica Celeste, Química, Botânica, Zoologia e Mineralogia. Maria Gaetana Agnesi nasceu em Milão, em 16 de maio de 1718, era a mais velha dos três filhos de Anna Fortunato Brivio e Dom Pietro Agnesi Mariami, um professor de Matemática da Universidade de Bologna que incentivava muito seus filhos ao estudo. Neste ano, ela possuía como tutor o Professor Don Ramiro Rampinelli24, um dos membros da Ordem dos Beneditinos. Agnesi começou a demonstrar interesse em ser religiosa, mas encontrou muita resistência de seu pai. Nunca se casou e, após a morte de sua mãe, se dedicou a cuidar da casa e da educação dos irmãos, em especial, de sua irmã Maria Thereza Agnesi (1724-1780), afinal, ela acreditava que as mulheres poderiam ser educadas em diversos ramos da ciência.25 Durante 10 anos, dedicou-se intensamente à Matemática e, em 1748, publicou seu livro mais importante: Instituzioni analitche ad uso della gioventù, obra de 1070 páginas em 2 volumes, que era destinado à educação de seu irmão mais novo, interessando em estudar Matemática. De acordo com Osen (1994), humildemente, na introdução deste livro, Agnesi deixa claro que nem todas as idéias apresentadas ali eram originais. Ainda, segundo esta autora, o primeiro volume desta obra aborda Álgebra, Aritmética, Geometria Analítica, Trigonometria e, principalmente, Cálculo e o segundo enfoca Séries Infinitas e Equações Diferenciais. É neste livro que Agnesi trabalha a curva cúbica, a qual seu nome é freqüentemente associado. Esta obra é “[...] uma síntese clara e concisa de matemática, como um livro texto próprio para jovens”. (ROTHMAN, 1996: 10, tradução nossa). A Curva de Agnesi, na notação atual, seria representada pela equação cartesiana, y (x2 + a2 ) = a3 e segundo Eves (2004), foi estudada por Fermat, que não a nomeou, o que foi feito posteriormente, por Guido Grandi (1672-1742) que a nomeou de versoria, uma palavra latina obsoleta, que significa “uma corda de manobrar vela de embarcação”. Agnesi, ao escrever seu livro Instituzioni analitche, confundiu versoria com versiera que em latim significa “vó do diabo”. Jonh Colson, ao traduzir esta obra para o inglês, traduziu versiera como witch que significa feiticeira, por isso em muitas línguas esta curva é chamada “witch of Agnesi” (feiticeira de Agnesi), no entanto, o nome mais usual é Curva de Agnesi.26 A Academia Francesa de Ciência, de acordo com Rothman (1996), elogiou o trabalho de Agnesi e o considerou como sendo o suficiente para admiti-la como tutora 24 Trabalhava da Universidade de Pávia. 25 Eves (2004) afirma que aos nove anos publicou um discurso, em Latim, defendendo a Educação Superior para as mulheres. 26 A curva pode ser definida como “uma circunferência de raio a e diâmetro OK, sobre o eixo y onde o O é a origem do sistema de coordenadas. Seja AO uma secante variável por O, sendo A a sua interseção com a tangente à circunferência por K. Se Q é a segunda intersecção por AO com a circunferência, então a curva de Agnesi é o lugar dos pontos P de intersecção das retas QP e AP paralelas e perpendiculares, respectivamente, ao eixo x”. (EVES, 2004: 504). da academia, no entanto, esta instituição não permitia a adesão de mulheres como um de seus membros. Em 1749, o Papa Benedito XIV ofereceu à Agnesi uma coroa de flores de ouro com pedras preciosas e uma medalha de ouro em homenagem ao seu livro, e ainda a indicou, em 1750, para ser professora de Matemática e Filosofia Natural na Universidade de Bologna. Todavia, ela não assumiu este cargo, pois logo após a morte de seu pai, em 1752, Agnesi abandou a Ciência e se dedicou somente à vida religiosa. Tornou-se, em 1771, diretora da Casa Pio Trivulzio, que se destinava a cuidar de idosos e a ajudar indigentes em Milão. No ano de 1783, lá se recolheu, onde permaneceu até a morte em 09 de janeiro de 1799. Agnesi pode ser considerada a primeira mulher a dar contribuições significativas à Matemática. 1.3 - Sophie Germain (1776 – 1831) Durante estas horas, permanecia na grande biblioteca de seu pai e foi ali que teve contato com a lenda da morte de Arquimedes27 (287 a.C – 212 a.C). Este fato fez com que ela achasse que a Matemática deveria ser fascinante e se interessasse pelo estudo desta ciência. Entretanto, os pais de Sophia não aprovaram sua decisão de estudar, todavia, seu esforço e determinação fizeram com que estes permitissem que ela realizasse tal estudo, porém, sem tutor. Sophia foi autodidata em Cálculo Diferencial, Latim e Grego. Em 1794, foi inaugurada em Paris a École Polythechnique, que não aceitava mulheres como alunas. Sophie conseguiu e comentou as notas de aula do curso de 27 Acredita-se que Arquimedes foi morto por soldados romanos em um saque a Siracusa em 212 a.C, quando estava extremamente envolvido com um problema de Geometria. Em 1o. de abril de 1776, nasceu em Paris, Sophie Germain, filha de Ambroise-François e Marie Germain Gruguelu. Quando tinha 13 anos, a Bastilha foi invadida durante a revolução francesa e devido à boa condição financeira de sua família, ela conseguiu manter-se longe da violência das ruas parisienses. No entanto, este isolamento resultou-lhe longas horas de solidão. Análise ministrado por Lagrange (1736–1813), enviou-os para o citado professor com o pseudônimo M. Le Blanc, nome de um estudante da escola. O professor ficou impressionado com o material, e após conhecê-la, tornou-se seu conselheiro matemático. Por volta de 1804, Germain enviou a Gauss (1777-1855), uma correspondência sob o pseudônimo M. Le Blanc. Nesta carta, comentava o livro de Teoria dos Números Disquisitiones Arithmeticae, publicado por ele em 1801. Eles se corresponderam por muito tempo, porém nunca se encontraram. Gauss descobriu a verdadeira identidade de M. Le Blanc, somente em 1807. Sophie também escreveu a Legendre, sobre o livro Théorie dês Nombres, e, na segunda edição deste, o autor incluiu algumas das descobertas de Germain. A Análise, Teoria dos Números, Álgebra e Geometria fascinavam Sophie, em especial, as duas últimas. Em sua memória, ela afirmou “[...] a Álgebra não é senão a Geometria escrita e a Geometria não é senão a Álgebra figurada.” (EVES, 2004: 525). Germain se dedicou ao estudo de outras ciências, segundo Osen (1994), também se interessou em estudar Psicologia, Astronomia, Física, Geografia e História. Além de possuir um vasto conhecimento em Literatura, Biologia e Filosofia28. Em 1811, submeteu um trabalho sobre as leis matemáticas referentes à Superfície Elástica, visando ingressar na Academia de Ciências da França, mas devido ao fato de Lagrange ter avaliado este trabalho como inexato, o ingresso de Germain não foi permitido. No entanto, em 1813, após a reformulação do citado trabalho, sua inserção na academia foi votada com menção honrosa. As idéias apresentadas neste trabalho foram fundamentais para o desenvolvimento da Teoria Geral da Elasticidade. Sophie ganhou um concurso proposto pela Academia de Ciências da França, em 1816, sobre vibrações de membranas. Ainda, neste ano, trabalhou em um caso particular do Teorema de Fermat. Com a publicação, em 1821, do artigo Remarques sur la nature, lês bornes et l´étendue de la question dês surfaces élastiques et équation générale de ces surfaces, que apresentava a lei geral das Vibrações da Superfície Elástica, como uma equação diferencial de 4a. ordem, foi considerada uma grande matemática francesa. Posteriormente a esta publicação, ela foi convidada a assistir as sessões da Academia 28 Dois artigos de Filosofia escritos por ela foram publicados postumamente. Francesa de Ciência. Esta admissão era uma honra grandiosa, em especial, para uma mulher. Gauss tentou convencer a Universidade de Göttingen a conceder um doutorado honoris causa à Germain, no entanto, ela morreu, em Paris em 26 de junho de 1831, antes de receber este título. Pode-se afirmar que Sophie Germain foi a primeira mulher a realizar um trabalho inédito em Matemática. 1.4 - Mary Faifax Somerville (1780-1872) De acordo com Osen (1994), Mary e seu tio Dr. Somerville eram companheiros de leitura e foi através dele que ela teve acesso a textos de cunho político, e que incluíam a temática da Educação Feminina. Mary, segundo Rothman (1996), foi grande defensora da educação e emancipação da mulher, tanto que após a sua morte foi criada, em Oxford, uma faculdade feminina com seu nome. Quando contava com treze ou catorze anos, ao ler uma revista de moda feminina, que em algumas edições apresentavam problemas e desafios, ela deparou com símbolos estranhos que chamaram sua atenção, estes pareciam uma aritmética com letras29. Assim, Mary começou a se interessar por Matemática, no entanto, nunca teve o apoio de sua família para os estudos, somente conseguiu cópia dos exemplares Álgebra de Bonnycastle e Elementos de Euclides (ca. 285 a.C), livros que desejava estudar, através do tutor de seu irmão mais novo. De posse destes livros, começou a estudar sozinha, também se dedicou ao estudo, sem tutor, do latim, mas não obteve sucesso. Em maio de 1804, casou-se com seu primo Samuel Greig, e mudou-se para Londres, onde o marido tinha sido indicado para ser Cônsul da Rússia. Ele era mais liberal que os pais de Mary, com os trabalhos matemáticos dela. Após três anos, Mary ficou viúva e voltou para a Escócia, financeiramente independente. Segundo Osen 29 Denominada Álgebra. Filha de William e Margaret Chaters, Mary Fairfax, nasceu na Escócia, em 26 de dezembro de 1780. Mary somente teve acesso ao estudo formal aos 10 anos de idade, quando foi enviada a uma escola para garotas em Musselburgh, na Escócia. (1994), foi neste período que ela se sentiu mais livre para realizar seus estudos matemáticos e astronômicos. Entrou em contato com a Trigonometria Plana e Esférica, Secções Cônicas e começou a estudar o Principia de Newton. Em 1812, casou-se com outro primo, Somerville e, em 1816, eles se mudaram, novamente, para Londres. Osen (1994) afirma que, ela, finalmente, encontrou alguém que a apoiava em seu trabalho com Matemática e Ciências. O casal teve três filhos, um menino, Greig, e duas meninas, Martha e Mary. As filhas de Somerville nunca se casaram, cuidaram e apoiaram a mãe até sua morte. A primeira publicação de Somerville foi em um popular jornal de Matemática, no qual era apresentada a solução para um problema premiado das Equações Diofantinas. Por esta resolução, Mary foi presenteada com uma medalha de prata em seu nome. Publicou, em 1826, o artigo The magnetic Properties of the Violet Rays of the Solar Spectrum, que foi louvado por sua genialidade, e, no ano seguinte, quando já tinha uma reputação estabelecida, Lord Brougham, em nome da Society for the Diffusion of Useful Knowlege, pediu-lhe para traduzir para o inglês o livro Mécanique Celeste de Laplace (1749-1827). Esta tradução foi a maior contribuição da época para a Matemática inglesa, pois, além de traduzir, ela acrescentou informações e descreveu conceitos em uma linguagem compreensível até para leigos. Este foi publicado em 1831, e usado como livro texto em Cambridge. (OSEN, 1994). Ainda, neste ano, publicou The Mecanisms of the Heavens, uma exposição geral do principio do universo, da teoria planetária lunar e do satélite de Júpiter, e, após a publicação deste texto “[...] ela foi colocada no primeiro rank entre os escritores científicos da época”. (OSEN, 1994: 110, tradução nossa). No ano de 1834, escreveu The tides of the Ocean and Atmosphere e publicou um resumo sobre pesquisas de fenômenos físicos, denominado The conecction of the Physical Sciences, que, segundo Moraes Filho (1996), foi bastante elogiado por Clerk Maxwell (1831-1879) e por John Couch Adams (1819-1892), o descobridor do planeta Netuno, que atribuiu as primeiras noções da existência deste a uma passagem deste livro. Foi aceita em sociedades científicas do mundo inteiro, inclusive na Sociedade Astronômica Real30, em 1835. Além disto, a Sociedade Real Inglesa de Ciências construiu uma estátua dela em seu Hall de entrada, porém, Somerville nunca conheceu tal estátua devido ao fato de mulheres não poderem entrar neste prédio. Mary publicou On the magtizing power of refrangible solar rays, em 1836, e On the Transmission of chemical rays of the solar spectrum through different media, no ano seguinte. Ainda escreveu On the Theory of Differences e The form and rotation of the Earth. Devido à doença de W. Somerville, em 1844, Mary e sua família se mudaram para a Itália, onde em 1848, ela escreveu Physical Geography e um grande número de monografias cujos assuntos eram entes Matemáticos, dentre os quais destaca-se On Curves and Surfaces of Higher Orders. Mary perdeu o filho em 1960 e o marido em 1965 e, ainda neste ano, teve o lado esquerdo de seu corpo paralisado. Devido a estes fatos, ela isolou-se e, somente por insistência de sua filha, continuou trabalhando. Escreveu Molecular and Microscopic Science, publicado em 1869, que era um resumo das mais recentes descobertas em Física e Química. Neste mesmo ano, recebeu da Sociedade Real de Geografia e Sociedade Italiana de Geografia uma medalha de ouro em louvor a sua contribuição à Ciência. Ela conquistou o respeito e admiração daqueles que estavam envolvidos no campo da Ciência. Nos últimos anos de sua vida, Mary dedicou-se a escrever suas memórias, a rever os manuscritos de seu trabalho On the Theory of Differences e a estudar um artigo sobre quaternários. Mary Faifax Somerville morreu em 29 de novembro de 1872. 30 Caroline Heschel e Somerville foram as primeiras mulheres a serem aceitas nesta Academia. 1.5 - Sophia Kurvin-Krukosvsky Kovalevskya31 (1850-1891)32 Em 1867, fez um curso de Cálculo sob a orientação de Aleksandr N. Strannolyubsky33, que logo reconheceu seu talento. No entanto, ela não pôde freqüentar a universidade, pois, naquela época, as mulheres não podiam estudar na Universidade da Rússia. Inconformada com esta situação, Sophia fez parte de um movimento de jovens que lutava pela emancipação feminina e acreditava que um dos meios das mulheres fugirem do controle masculino era casar-se, por conveniência, para poder sair do país e estudar. Sendo assim, em 1868, Sophia casou-se com um jovem paleontólogo Vladimir Kovalevsky34. Um ano após o casamento, o casal mudou-se para Heidelberg (Alemanha), onde Sophia participou de cursos de Matemática e Física, lecionados por Leo Köenigsberger (1837-1921), Paul Du Boris-Rreymond (1818-1896), Gustav R. Kirchhhoff (1824-1887) e Hermann L. F. Von Helmholtz (1821-1894). Sophia, em 1871, foi para Berlin, indicada por Köenigsberger para estudar sob a orientação de Weierstrass (1815-1897). A princípio, este professor não quis aceitá-la, mas, após Sophia resolver uma lista de exercícios de matemática avançada, em pouco tempo, conquistou o direito de ser orientada por ele. Segundo Osen (1994), eles dedicaram-se ao campo de Análise e aplicações de técnicas de Análise em questões de Física-Matemática. Ela permaneceu sobre a orientação deste, até 1874, e escreveu os seguintes trabalhos: On the Reduction of a Definite Class of Abilian Integrals of the Third Range 31 Em algumas referências encontra-se Sophia Kurvin-Krukosvsky Kovalevsky, Sonya Kurvin- Krukosvsky Kovalevsky ou Sonya Kurvin-Krukosvsky Kovalevskya. 32 Osen (1994) afirma que não há um consenso entre os estudiosos quanto a data de nascimento de Sophia, alguns afirmam que ela nasceu em 1850 e outros em 1853. 33 Professor de Matemática da Academia Naval de Saint Petersburgo. 34 Posteriormente, foi professor na Universidade da Rússia Sophia Kurvin-Krukosvsky, filha do rico general Vasily Kurvin-Krukosvsky e de Yelizaveta Shubert, nasceu em 15 de janeiro de 1850. Devido à boa situação financeira da família, ela pôde ser educada em casa. que apresentava as condições de redução de uma integral ultra-elíptica, Supplementary Research and Observations on Laplace´s Research on the Form of the Saturn Ring, no qual mostrava que os anéis de Saturno, não têm secções na forma elíptica, e sim na forma oval e On the Theory of Partial Differential Equations, que demonstrava a condição necessária e suficiente para a solução da equação diferencial parcial existir e ser única. Hoje, o resultado deste trabalho é chamado do Teorema de Cauchy- Kovalevskya35. Devido à qualidade deste último trabalho, em 1874, a Universidade de Göttingen outorgou a ela, in absentia, o grau de Doutora em Filosofia, mesmo sem realizar o exame oral. Segundo Tobies (2001), Sophia foi a primeira mulher a conseguir este título em Matemática. Em seus trabalhos contribuiu para expressar algumas Integrais Abelianas em termos de integrais elípticas relativamente simples e generalizou o problema de rotação de um Corpo Rígido sobre um ponto fixo36. Após alguns anos, Sophia voltou a morar com seu marido, na Rússia. Neste mesmo período, Weierstrass se empenhou para que ela fosse aceita no meio acadêmico russo, mas tal esforço foi em vão, os russos não admitiam que mulheres participassem do meio acadêmico. Assim, ela começou a dedicar-se ao estudo literário e escreveu quatro obras37, que, segundo Osen (1994), foram centradas na discussão dos direitos da mulher e foram consideradas de excelente qualidade. A única filha do casal, Fufa ou Foufie (como era chamada por Sophia), nasceu em 1878, e após cinco anos, Vladimir se suicidou, devido a um investimento financeiro mal sucedido. Devido à morte do marido, Sophia ficou em uma situação financeira delicada e voltou a ser assistente de Weierstrass. Nesta época, tornou-se amiga de Gösta Mittag-Leffler (1846-1927) e escreveu The refraction of Light in a Crystalline Medium. Este trabalho foi muito bem recebido na época. Foi convidada, em 1884, para ser professora da Universidade de Estocolmo. Sophia foi uma das primeiras mulheres a assumir o cargo de professora em uma universidade européia. Posteriormente, assumiu o cargo de editora do jornal Acta 35 Já que Cauchy (1789-1857) tinha examinado a questão da existência de uma solução. 36 Casos particulares deste problema tinham sido estudados por Euler (1707-1783), Poison (1781-1840) e Lagrange (1736 – 1813). 37 The University Lecture, The Nihilist (não terminada), The Woman Nihilist e A Story of the Riviera. Mathematica. Tobies (2001), afirma que ela foi a primeira mulher profissional em Matemática. No período de 1887 a 1889, Sophia escreveu suas três últimas obras literárias, sendo que o livro The Rayevsky Sister foi muito elogiado e publicado em três idiomas. Em 1888, ganhou o Prêmio Bordin, da Academia de Ciências de Paris, com o trabalho On the Rotation of a Solid Body about a Fixed Point of Sciences. A qualidade deste foi tamanha que a Academia aumentou o prêmio de 3000 para 5000 Francos. Ainda sobre este tema, ela ganhou um prêmio da Academia Sueca de Ciências. Devido à sua excelente produção matemática, foi permitido à Sophia ser membro associado da Academia de Ciências da Rússia. Mas, ela nunca pôde nem participar das reuniões e nem ser professora da Universidade da Rússia, pois estas atividades eram proibidas para uma mulher. Sophia faleceu em 1891, em decorrência de uma pneumonia. Após sua morte, a Rússia a homenageou com um selo de postagem com estampa comemorativa com seu nome, ela foi a única mulher a receber esta honra. Segundo Osen (1994), Sophia era brilhante, excelente matemática, ótima escritora, falava vários idiomas e possuía um vasto conhecimento em Astronomia e em Física-Matemática. 1.6 - Amalie Emmy Noether (1882 – 1935) Recebeu a educação típica de uma mulher de classe média, na época, que incluía atividades manuais e domésticas. Nos anos de 1900 a 1903, assistiu, como ouvinte, aulas de Aritmética e Línguas Estrangeiras na Universidade de Erlanger, pois ainda não era permitida a matrícula de mulheres nesta instituição. Em 1903, já era proficiente em inglês e francês. Amalie Noether, mais conhecida como Emmy Noether, nasceu em uma família judia, no dia 23 de março de 1882, na cidade de Erlanger na Alemanha. Era filha de Ida Amália Kaufmann e do conhecido matemático Max Noether. Neste mesmo ano, Emmy decidiu dedicar-se ao estudo de Matemática. Sendo assim, em 1904, matriculou-se na Universidade de Erlangen, sob a orientação de um amigo da família Paul Gordon (1837-1912). Após três anos, concluiu sua tese de doutorado denominada On completes Systems of Invariants for Ternary Biquadratic Forms. Devido a diferentes interesses, entre ela e Gordon, Emmy passou a ser orientada por Ernest Fischer (1875-1954) e Erhard Schimidt (1876-1959). Em 1908, foi escolhida membro da organização Italiana do Círculo Matemático de Palermo e, em 1909, membro da Associação Alemã de Matemáticos. Conheceu por intermédio de seu pai, David Hilbert (1862-1943) e Felix Klein (1849-1925), em Göttingen, no ano de 1913. Estes matemáticos convidaram-na para trabalhar com eles, devido ao fato de ela ter grande conhecimento em Teoria dos Invariantes e em Resolução de Problemas. Após três anos, ela se mudou para Göttingen, a fim de trabalhar com estes matemáticos, que estavam, juntamente, com Albert Einstein (1879- 1955), desenvolvendo a formulação matemática da Teoria Geral da Relatividade. Emmy proferiu várias conferências e cursos em Göttingen, mas sempre como assistente de Hilbert, pois esta instituição não aceitava mulheres como professoras. Os matemáticos de Göttingen, principalmente Hilbert, tentaram, sem sucesso, que ela fosse contratada como professora. Noether foi a primeira mulher a tentar esta autorização. Nos anos seguintes, ela continuou a trabalhar como assistente de Hilbert e a lecionar em seu nome. Nesta época, a universidade de Frankfurt ofereceu-lhe um cargo. Os matemáticos de Göttingen intercederam, pois acreditavam que esta universidade perderia um grande matemático. Então, em 1919, ela tornou-se, não oficialmente, membro da associação de professores de Göttingen. Sendo assim, poderia ensinar Álgebra, fazer exames e supervisionar dissertações. Emmy, em 1920, publicou um artigo sobre Operador Diferencial, que, segundo Osen (1994), marcou seu trabalho, pois, além de mostrar seus interesses em abordagens axiomáticas, evidenciou que ela estava entre os grandes matemáticos da época. No ano seguinte, publicou The Theory of Ideals in Rings. Este trabalho é considerado por muitos matemáticos como o mais importante de sua carreira. Foi nomeada, em 1922, professora extraordinária não-oficial de Göttingen, tal fato não mudou a sua posição na universidade, mas possibilitou a ela uma pequena remuneração, que não correspondia ao do cargo que ocupava. Emmy, juntamente com Maria Goeppert Mayer (1906-1972), eram as únicas mulheres no corpo docente desta universidade. Ainda, neste ano, Noether foi honrada com uma coroa em Álgebra e realizou uma conferência sobre o Teorema de Noether38, um teorema importante para a Física Quântica, que é mais conhecido entre os físicos. Emmy trabalhou, no período de 1927 a 1929, com a Teoria das Representações, a qual trabalha com a representação de Anéis Não Comutativos por meio de matrizes. Nos anos de 1928 e 1929, lecionou Álgebra Abstrata e Geometria Algébrica, como professora visitante da Universidade de Moscou e, em 1930, foi professora visitante em Frankfurt. Um dos anos mais importantes da carreira de Emmy foi 1932, pois, neste ano, ela ganhou um prêmio em Matemática de 500 francos, foi a única mulher a ser convidada a dirigir a Assembléia Geral de Matemática em Zurique e escreveu, conjuntamente com Richard Brauer (1901-1977) e Helmut Hasse (1898-1979), um artigo sobre Álgebra Elementar que mostrava através de um campo numérico formal da Álgebra, que esta é cíclica. Este artigo é considerado por muitos algebristas como um marco na história da Álgebra. Por ser judia e politicamente liberal, em 1933, foi afastada da Universidade de Göttingen. Recebeu convite para trabalhar em Oxford, no Somerville College e em Bryn Mawr College, uma universidade de Mulheres na Pensilvânia, Estados Unidos. Emmy preferiu a segunda opção. Embora vinculada a esta universidade, ela proferia seminários no Instituto de Estudos Avançados de Princeton, New Jersey. Em 1935, estava em andamento um processo para transferi-la para o citado instituto, porém, em 14 de abril deste mesmo ano, ela morreu devido a uma infecção pós-operatória de uma cirurgia para a retirada de um cisto no ovário. Segundo Kramer (1991d), ela escreveu 44 trabalhos. Emmy foi uma das fundadoras da Álgebra Abstrata e trabalhou com Teoria de Conjuntos, Teoria dos 38 Este teorema mostra que as leis fundamentais da conservação de energia da quantidade de movimento são iguais às leis das simetrias. Anéis, Representações de Conjuntos e Teoria dos Números. De acordo com Moraes Filho (1997), ela orientou 13 doutorados, dentre os quais sete foram oficiais. Emmy, quando morreu, era admirada e respeitada publicamente, foi elogiada por inúmeros cientistas como Albert Einstein (1879-1955), Hermann Klaus Hugo Weyl (1885-1955) e Bartel Leendert van der Waerden (1903-1996). O matemático francês Jean Alexandre Eugène Dieudonné (1906-1992) afirmou que Noether foi “[...] de longe, a melhor mulher matemática de todos os tempos e, dentre homens e mulheres, a maior matemática do século XX”. (MORAES FILHO, 1997: 6). 1.7 – Mary Ellen Rudin (1924 - ) Durante a infância, viveu na cidade que nasceu, e estudou em uma pequena escola. Nesta época, Mary Ellen não se interessou por Matemática e, de acordo com Henrion (1997), nunca imaginou que se tornaria uma matemática. Em 1941, ingressou na Universidade do Texas e, segundo O’Connor e Robertson (2002), quase por acidente, foi cursar Matemática. Nesta universidade, conheceu o professor R. L. Moore, que apesar de utilizar um método de ensino muito criticado, que incentivava a autonomia e competitividade, teve uma importância singular em sua carreira matemática. Afinal, ele percebeu o talento matemático de Mary Ellen e, desde o início, a incentivou. Segundo ela, “[...] eu sou matemática porque Moore escolheu-me e exigiu que eu tornasse uma matemática”. (HENRION, 1997: 88, tradução nossa). Em 1944, concluiu o Bacharelado e iniciou as pesquisas de seu Doutorado em Topologia sob a supervisão de Moore. Segundo Henrion (1997), durante todo o Doutorado, Mary não leu nenhum artigo matemático. Ao concluir o Doutorado, em 1949, foi indicada por Moore, para trabalhar como professora na escola feminina da Mary Ellen Estill nasceu em uma família presbiteriana, no dia 7 de dezembro de 1924, na cidade Hillsboro no Texas, nos Estados Unidos da América. Seus pais, Joe Jefferson Estill, engenheiro civil, e Irene Shook, professora de inglês de uma Escola Secundária, valorizavam muito a educação de seus filhos1. Universidade de Duke em Durham, na Carolina do Norte. Foi aceita e iniciou suas atividades neste mesmo ano. Na Universidade de Duke, conheceu um aluno chamado Walter Rudin, que, em 1953, tornou-se seu marido. Após a conclusão da Graduação, Walter foi designado professor na Universidade de Rochester e Mary abdicou seu cargo de professora em Duke e o acompanhou. Nesta Universidade, ela assumiu o cargo de professora em período parcial. Em 1954, nasceu sua primeira filha, Catherine e, no ano seguinte, Eleanor. A família se mudou novamente, em 1958, pois Walter foi designado para trabalhar na Universidade de Wisconsin. Após um ano, ela começou a trabalhar nesta universidade como professora conferencista, em tempo parcial. Em 1961 e 1964, nasceram, respectivamente, seus outros dois filhos Jefferson e Charles Michael. Mary Ellen, de acordo com Carr (2000), apesar da sua importante produção, nunca deixou a carreira afetar sua grande devoção à casa e à família. Ela possuía uma excelente babá, Lilá Hilgendorf, que a ajudava a cuidar das crianças, mesmo assim, trabalhava em casa para poder, caso necessário, resolver os problemas domésticos. Segundo ela: Eu nunca me importei de fazer Matemática no sofá no meio da sala de estar com as crianças escalando ao meu redor. Eu gosto de saber, mesmo quando eu estou trabalhando em Matemática, o que está acontecendo. Eu gosto de ser o centro das coisas, então a casa serve perfeitamente para minha Matemática [...] Eu me sinto mais confortável e confiante quando eu estou no meio das coisas, e para fazer Matemática você tem que sentir confortável e confiante. (HENRION, 1997: 93, tradução nossa) Ela começou a publicar artigos matemáticos após a conclusão do seu Doutorado. Em 1950, publicou o artigo Concerning Abstract Spaces no Duke Mathematical Journal, este abordou espaços que satisfazem um subconjunto dos axiomas de R. L. Moore. Continuou abordando temas relativos às implicações dos sistemas de Axiomas de R. L. Moore e publicou as seguintes obras: em 1951, Separation in non-separable spaces e em 1952, A primitive Dispersion set of the plane e Concerning a Problem of Souslin e, em 1955, publicou, já com o nome de casada, Countable paracompactness na Soulin’s problem. Mary Ellen ficou muito conhecida na comunidade matemática pela sua habilidade para construir contra-exemplos. Em 1974, ela proferiu uma série de conferências sobre Topologia Geral na Universidade de Wyoming, Laramie. As notas destas conferências foram publicadas pela Sociedade Americana de Matemática (American Mathematical Society) no ano seguinte. Durante sua carreira Mary publicou mais de oitenta artigos sobre Topologia Geral e, nos últimos anos, produziu artigos muito profundos. Ela é reconhecida internacionalmente como uma matemática de primeira classe. Sua reputação na comunidade matemática tornou-se tão grande que, em 1971, a Universidade de Wisconsin sentiu a necessidade de promovê-la de professora conferencista à professora de tempo integral. Em 1981, tornou-se a primeira proprietária de Grace Chisholm Young Professorship em Wisconsin. Permaneceu nesta universidade até o final de sua carreira e, tornou-se professora emérita. Também foi professora visitante na Nova Zelândia, México e China. Mary Ellen, durante sua carreira, segundo uma biografia publicada pela Associação das Mulheres na Matemática (AWM), em 2005, mostrou-se uma excelente professora e orientou diversos Doutorados. Além disto, foi vice-presidente da Sociedade de Matemática Americana em 1980-1981, governadora da Associação de Matemática da América, foi eleita membro da Academia Americana de Artes e Ciência, Academia Húngara de Ciências e da Associação de Lógica Simbólica. Participou como conferencista na Associação das Mulheres na Matemática. Além disso, pertenceu ao Comitê da Academia Nacional de Ciências da Europa Oriental e do Conselho Nacional de Pesquisa, na área de Ciências Matemáticas. Em 1963, a Sociedade de Matemática dos Países Baixos (Society of the Netherlands) lhe concedeu o Prêmio de Nieuwe Archief voor Wiskunk. Segundo Carr (2000), Mary Ellen já recebeu inúmeras honrarias, como doutorados honorários, e pela qualidade de seus trabalhos matemáticos ainda receberá muitas outras. Mary Ellen é um excelente exemplo de determinação no trabalho matemático e uma mulher que conseguiu conciliar perfeitamente o casamento, a maternidade e a carreira acadêmica em Matemática, mas, em muitos momentos, ela sentiu a necessidade de abdicar empregos em tempo integral. 1.8 – Leonore Blum (1942- ) De acordo com Hayes (1998), ela era uma criança que se interessou, desde cedo, por Matemática, Arte e Música. Quando tinha nove anos, a família de Leonore, devido aos negócios do pai, mudou-se de Nova Iorque para Caracas – Venezuela. Esta mudança foi muito importante para ela, pois foi na Venezuela que conheceu Manoel Blum, que, após alguns anos, tornou-se seu marido. Ao terminar o Ensino Médio, Leonore tentou, sem sucesso, ingressar no instituto que Manoel trabalhava - Instituto de Massachusetts de Tecnologia - MIT. Assim, em 1959, matriculou-se no curso de Arquitetura do College at Carneigie Tech em Pittsburgh. Durante este curso, ela descobriu, segundo O’Conner e Robinson (2002), sua verdadeira paixão - a Matemática. Em 1961, para acompanhar o marido, ela transferiu o curso para a Matemática, em Simmons, uma faculdade de mulheres em Boston. Leonore concluiu a Graduação em 1963. Neste mesmo ano, ingressou no Doutorado no MIT, concluído em 1968, com a tese intitulada Generalized Algebraic Theories:A Model Theoretic Approach. Durante o Doutorado, nasceu seu único filho, Avrim Blum39. Após a conclusão do Doutorado, ela recebeu uma proposta para ser professora conferencista e estudante de Pós-Doutorado na Universidade da Califórnia, em Berkeley. Leonore teve grande dificuldade para participar da comunidade matemática desta instituição, sendo assim, ela só permaneceu em Berkeley por dois anos. Em 1973, foi contratada para ensinar Álgebra na Faculdade de Mills e, no ano seguinte, ela criou e encabeçou por 13 anos o Departamento de Matemática e Ciências Computacionais desta instituição. Em 1979, ela foi premiada com a Cadeira de Letts- Villard na Faculdade Mills. Leonore sempre trabalhou para aumentar a participação de mulheres na Matemática, segundo HENRION (1997): 39 Bacharel em informática pelo MIT e professor do Carnegie Mellon. Em dezoito de dezembro de 1942, nasceu, em Nova Iorque, Leonore, filha de Rose, uma professora de Ciências da Escola Secundária e de Irving, um comerciante. Durante a década de 1970, Blum tornou-se uma líder nacional no campo da mulher na Matemática. [...] Ela era uma dinâmica porta- voz do país no tópico de mulheres na Matemática e criou muitos novos programas e instituições para promover e encorajar as mulheres na Matemática. (p. 146, tradução nossa) Durante sua vida profissional, Blum colaborou com a criação de diversas comunidades, no período de 1975 a 1978, tornou-se presidente da Associação de Mulheres na Matemática, entre 1975 e 1981, uma organização que ajudou a fundar. Foi co-diretora da Math/Science Network que, de acordo com O’Conner e Robinson (2002), objetivava, por meio de conferências, expandir os horizontes das alunas do Ensino Médio. A criação destas comunidades, segundo Henrion (1997), era um mecanismo para dar voz aos problemas existentes para as mulheres que decidiam trabalhar com Matemática. Estas comunidades, além de ajudar muitas matemáticas, abriu portas para outras mulheres que decidiram se dedicar a esta ciência. Leonore, em 1988, foi cientista participante do Grupo de Teoria do Instituto de Informática Internacional, recentemente formado em Berkeley. De 1992 a 1996, foi diretora do Instituto de Pesquisa de Ciências Matemáticas (MSRI) em Berkeley. Segundo Riddle (2006), neste período ela se esforçou muito para eliminar o estigma negativo existente com relação à mulher que trabalha com pesquisa em Matemática. Nos anos de 1996-1998, trabalhou como professora Visitante na Universidade da Cidade de Hong Kong (CityU). Leonore proferiu conferências em eventos internacionais realizados nos Estados Unidos, Europa, China, Ásia, antiga União Soviética, América Latina e África. Foi a primeira editora do Diário Internacional de Álgebra e Computação (1989- 1991). Leonore, também, foi eleita membro da Associação Americana para o Avanço da Ciência, em 1979 e participou da Seção de Matemática nos anos 1998 e 1999. Ela é sócia da Sociedade Americana de Matemática, da qual foi conselheira e vice-presidente, no período de 1990 a 1992. Após representar esta sociedade no congresso Africano de Matemática (Nairobi – 1991), desenvolveu um ativo trabalho para construir e manter ligações entre os pesquisadores em Matemática da África e dos Estados Unidos. Ela também, segundo Henrion (1997), lutou ativamente para a introdução de sessões de História da Matemática e de Educação Matemática em encontros internacionais de Matemática. Em 1983, um prêmio da Fundação de Ciência Nacional permitiu a Leonore trabalhar com Mike Shub. Nas décadas de 1980 e 1990, ela desenvolveu novas teorias de computação e complexidade. Em 1998, publicou o livro Complexity and Real Computation, escrito conjuntamente com Steve Smale, Mike Shub, e Felipe Cucker. Neste livro, segundo O’Conner e Robinson (2002), os autores discutem que “[...] a teoria de complexidade clássica, baseada no modelo de Turing, é inadequada para estudar muitos problemas e algoritmos em Computação Científica Moderna; o livro desenvolve uma teoria de complexidade que pode ser aplicada a estas áreas”. (tradução nossa). Blum, em 1999, foi designada Professora da cadeira de Informática na Universidade Carnegie Mellon. Em 2005, recebeu do presidente, George Bush, o Prêmio Presidencial por Excelência em Ciência, Matemática e Engenharia. Além de ter uma vasta produção Matemática, Leonore, teve grande importância administrativa nas instituições em que trabalhou e uma participação singular na luta pela maior aceitação da mulher na comunidade científica americana. 1.9 – Karen Uhlenbeck (1942 - ) Durante a infância, gostava muito de ler sobre variados assuntos, como Ciências, Matemática e biografias de cientistas. Ingressou na Universidade de Michigan com o intuito de estudar Física, mas, durante a Graduação, descobriu o prazer de estudar Matemática. Assim, ela decidiu cursar Matemática e concluiu a Graduação nesta mesma instituição, em 1964. Após a conclusão da graduação, Karen continuou os estudos no Karen Keskulla Uhlenbeck nasceu no dia 24 de agosto de 1942 em Cleveland, Ohio. Era a primogênita dos quatro filhos de Edward Keskulla, um engenheiro, e Carojyn Windeler Keskulla, uma artista. Em sua família, existiam segundo Henrion (1997), modelos de mulheres fortes e independentes, como sua avó e sua mãe. Courant Institute em Nova Iorque. No entanto, ao casar-se com Olke Uhlenbeck, um biofísico que trabalhava no MIT, ela decidiu acompanhá-lo, mas ela não conseguiu ingressar neste instituto, que, neste período, ainda, não aceitava matrículas femininas. Assim, ela ingressou na Universidade de Brandeis, na qual obteve o Grau de Mestre em 1966 e o de Doutora em 1968. Seu doutorado realizou-se sob a orientação de Dick Palais, e sua tese foi intitulada The Calculus of Variations and Global Analysis. Segundo Riddle (2006), este trabalho trouxe contribuições pioneiras à Análise Global e à Teoria de Medida que resultaram em avanços na Física-Matemática e na Teoria de Equações Diferenciais Parciais. Trabalhou temporariamente no MIT, nos anos 1968-69, na Universidade de Califórnia, Berkeley durante 1969-71 e na Faculdade Urbana-Champaign de 1971 a 1976. De acordo com Henrion (1997), teve grandes dificuldades para ingressar na comunidade científica desta última, o que dificultava muito seu trabalho. Então, Karen e seu marido decidiram se mudar para a Universidade de Illinois em Chicago, na qual ela foi promovida a professora em tempo integral. Em Illinois, Karen não encontrou grandes dificuldades em ingressar na comunidade matemática, pois lá encontrou outras matemáticas, Vera Pless, Louise Hay e Shing Tung Yau, que tiveram grande importância na consolidação de sua carreira. Segundo O’Connor e Robertson (2002), Karen acredita que somente com a ajuda de Yau, ela finalmente tornou-se uma matemática. Apesar de estar bem adaptada à comunidade matemática de Illinois, em 1983, Karen transferiu-se para a Universidade de Chicago. Neste mesmo ano, ela ganhou o prêmio MacArthur. Em 1988, ela mudou novamente de instituição, tornando-se professora da Universidade do Texas em Austin, na qual ocupa a Cadeira de Matemática. Foi professora visitante em diversas universidades e recebeu diversas honras, tais como: ser membro do Instituto de Estudos Avançados de Princeton, ser sócia da Academia Americana de Artes e Ciência e da Academia Nacional de Ciências, além de participar do conselho editorial de diversos diários de Matemática. Segundo uma biografia publicada pela AWM, ela foi a segunda mulher a proferir uma Conferência Plenária em um Congresso Internacional de Matemática, realizado em Kyoto – Japão, em 1990. A primeira foi Emmy Noether, em 1932. De acordo com seus biógrafos, Karen é determinada, independente e é considerada, atualmente, uma das maiores pesquisadoras em Matemática dos Estados Unidos. Durante seus estudos, ela era basicamente autodidata e se interessava pelas áreas de Geometria, Topologia, Física e Análise. Daniel Freed afirma em um pós-escrito sobre a pesquisa de Karen, em Henrion (1997), que, através dos trabalhos dela, foram realizadas pesquisas que revolucionaram o campo da Topologia de quatro dimensões e auxiliaram pesquisas sobre Geometria Algébrica e trabalhos que conectam a Física Teórica a campos abstratos da Matemática. 1.10 – Elza Furtado Gomide (1925 - ) Elza Furtado Gomide nasceu em São Paulo em 20 de agosto de 1925, filha de Cândido Gonçalves Gomide e Sophia Furtado Gomide. Tanto os pais, quantos os avós de Elza eram professores, de Matemática ou de Ciências, sendo assim, desde cedo ela teve muito incentivo ao estudo. Segundo ela: “[...] meu envolvimento com a matemática é coisa de família e felizmente minha família, meus pais, em particular, não tinham nenhum preconceito contra o estudo das mulheres” (MENDONÇA, 1998: 262). Aos onze anos Elza falava inglês, francês e se dedicava muito à leitura e ao estudo de história. Seu pai era professor de Matemática e teve grande influência na escolha da profissão da filha. Cursou o ginásio no Colégio D. Pedro na capital paulista. Ingressou, em 1942, no curso de Física na Faculdade de Filosofia Ciências e Letras - FFCL de São Paulo, o qual concluiu em 1944. Neste mesmo ano, devido ao seu ótimo desempenho na Graduação, foi convidada pelo Prof. Omar Catunda para ser professora assistente de Cálculo nesta instituição. Em 1945, Elza trabalhava como professora assistente e cursava o último ano do Bacharelado em Matemática. Ingressou no Doutorado, sob a orientação de Jean A. F. Delsarte, e sua tese intitulada A hipótese de Artin-Weil sobre corpos finitos e o número de soluções de tais equações foi defendida com distinção, em 27 de dezembro de 1950. Ela foi a primeira Professora Catedrática (interina) na FFCL de São Paulo e, também, a primeira doutora, mediante defesa de tese, em Matemática no Brasil. A professora Elza é sócia fundadora da Sociedade de Matemática de São Paulo, da Sociedade Brasileira de Matemática e do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas. É apaixonada pelo ensino de Matemática, trabalhou na USP – São Paulo, até completar 70 anos, a partir de então trabalha como “professora voluntária”. Ela tem uma importância singular na História dos cursos de Matemática da USP e da Matemática Brasileira. 1.11 - Maria Laura Mouzinho Leite Lopes (1917 -) Maria Laura nasceu em 18 de janeiro de 1917, em Timbaúba dos Mocós, Pernambuco. Filha de Oscar Mousinho e Laura Moura Mousinho, que se empenhavam muito para dar aos oito filhos uma educação esmerada. Maria Laura cursou o primário no Grupo Escolar João Barbado, em Recife, no qual teve aulas com o Prof. Luiz de Barros Freire. Em 1935, sua família mudou-se para o Rio de Janeiro, onde ela iniciou o secundário no Instituto Lafayette e concluiu no Colégio Sion em Petrópolis. Em 1938, foi aprovada no vestibular nas disciplinas de Matemática e Física, mas não em desenho, assim, não pôde se matricular no curso de Matemática da Escola de Ciências do Distrito Federal - UDF. No ano seguinte, por indicação de seu antigo professor o Luiz de Barros Freire (agora decano desta instituição), matriculou-se neste curso. Após 15 dias de aula, esta instituição foi fechada, e os professores e alunos foram transferidos para a recém criada Faculdade Nacional do Filosofia da Universidade do Brasil (FNFi). Concluiu o Bacharelado em Matemática, em 1941, e a licenciatura, em 1942, na Faculdade Nacional de Filosofia. Neste ano, surgiu uma vaga de professora assistente em Geometria e a professora Moema Lavínia Mariani de Sá Carvalho foi nomeada. A professora Moema dividiu a função e o salário com a Maria Laura até 1943, ocasião em que foi aberta outra vaga para professor assistente de Geometria, para a qual Maria Laura foi nomeada. Ainda, na década de 1940, Maria Laura foi professora de Geometria Analítica da Escola Técnica do Exército. Em 1947, matriculou-se em um curso de Topologia com o professor português António Aniceto R. Monteiro, que, posteriormente, a orientou para o concurso de Livre- Docência. Neste período, devido ao decreto no. 8.659 de abril de 1911, era concedido o grau de doutor ao candidato aprovado no concurso de Livre-Docência. Os encontros de orientação eram realizados [...] aos sábados na casa do orientador. [...] A amizade entre orientador e aluno continuou por muitos anos e Maria Laura, seguindo os passos do mestre, tornou-se uma grande educadora matemática contribuindo para o desenvolvimento do ensino da matemática no Brasil (SILVA, C. M. S: 1997, 118) Maria Laura obteve o título de livre-docência em Geometria, e, conseqüentemente, o Doutorado em Ciências pela FNFi, em 1949, ao defender a tese Espaços Projetivos-Reticulados de seus subespaços. Segundo SILVA, C. M. S (1997), esta foi a segunda tese defendida por uma mulher no Brasil. Em 1950, realizou Pós-Doutorado na University of Chicago - USA. No ano seguinte, foi eleita membro Associado da Academia Brasileira de Ciências – ABC. Em 1953, foi admitida como Professora Catedrática da Cadeira de Geometria da FNFi e, com a Reforma Universitária (Lei 5540/68) que extinguiu a cátedra, tornou-se professora Titular do Instituto de Matemática da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sucessora da Universidade do Brasil. Nesta época, Maria Laura já se interessava pelo estudo do Ensino de Matemática. Uma forma de colaborar com o ensino de Matemática foi escrever notas de aula, estas, posteriormente, foram publicadas no livro Conceitos fundamentais da Geometria, em 1962, pela universidade Bahia Blanca - Argentina. No período de 1961 a 1967, assumiu aulas no Ensino Secundário da Guanabara e, segundo Mendonça (1998), teve a possibilidade de integrar o Ensino Universitário com o Secundário. Em 1964, acompanhou o marido, o físico José Leite Lopes (1918 - 2006), na França, onde conheceu Luciane Felix, professora francesa que se dedicava ao estudo de Educação Matemática. O casal voltou ao Brasil, em 1967, e, devido à ditadura militar, após dois anos, foram aposentados, compulsoriamente, pelo Ato Institucional número cinco (AI -5). Assim, deixaram o Brasil e instalaram-se em Estraburgo – França. Em 1973, Maria Laura reencontrou Luciane Felix, que a apresentou a George Glaeser do Instituto de Pesquisa em Ensino de Matemática IREM – Universidade Louis Pasteur de Estraburgo. Neste ano, ela começou a aprofundar seus estudos sobre o ensino de matemática e nos anos de 1973 e 1974, foi professora visitante do IREM. Em 1976, Maria Laura foi uma das fundadoras do Grupo de Estudos em Pesquisa de Educação Matemática - GEPEM, que, segundo ela, “[...] foi o pioneiro no pensar em uma Educação Matemática voltada para a realidade brasileira” (MENDONÇA: 1998, 215). Foi Professora Titular da Universidade Santa Úrsula, de 1978 a 1980, quando recebeu anistia e pôde voltar a trabalhar como Professora Titular no Departamento de Matemática da UFRJ. Ao voltar para esta instituição, começou um projeto em Educação Matemática denominado “Fundão”, do qual era coordenadora. Este projeto é uma “[...] iniciativa inovadora por ser multidisciplinar, congregando os setores de Biologia, Física, Geografia, Matemática e Química [...] seu objetivo é a formação inicial e continuada”. (SILVA, C., 2006: 95). O projeto Fundão existe ainda hoje e, desde 1993, realiza um curso de especialização no Instituto de Matemática da UFRJ. Aos 70 anos, foi aposentada pela UFRJ e foi contratada como Professora Titular aposentada e como Pesquisadora Titul