Casa Vida Viva - Oficinas terapêuticas

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Data

2001

Autores

Luzio, Cristina Amélia [UNESP]

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Editor

Universidade Estadual Paulista (Unesp)

Resumo

Este projeto é um relato de uma práxis de oficinas terapêuticas com os usuários do programa de saúde mental do Centro de Saúde de Cândido Mota, realizado em conjunto ao Departamento de Psicologia Clínica da UNESP- Assis. As atividades foram iniciadas em 1998 e destinadas aos usuários adultos do programa, sem crises agudas, com ou sem história de internações psiquiátricas. As atividades de oficinas contêm um potencial terapêutico, que pode provocar em seus participantes, a circulação da palavra, troca de afetos e de experiência de vida, possibilitando a expressão e a comunicação. Nelas prioriza-se as potencialidades e a reinserção social dos usuários. Como atividades iniciais, escolheu-se a "horta" e a "escolinha" . Para esses usuários o cultivo da terra faz parte de suas experiências, além de ser uma atividade de trabalho integradora. Por outro, "a escolinha" por intermédio de atividades pedagógicas possibilita o resgate dos conhecimentos dos usuários, sua aplicação no seu cotidiano, bem como permite a reconexão com suas histórias de vida. A equipe desde o início é composta por uma psicóloga do Centro de Saúde, responsável pelo projeto, dois estagiários em 1998 (atualmente apenas um) e um técnico em agrícola da Secretaria da Agricultura ( no caso da horta). As atividades são semanais com duração de aproximada de 2 horas. Na oficina da horta houve várias tentativas para conseguir espaço físico. Conseguiu-se um terreno junto ao SAAE do município. Inicialmente, foi indicado 20 usuários para a atividade. O grupo iniciou-se com 7 usuários, onde estabeleceu-se um contrato: as atividades eram definidas no início do trabalho e avaliadas no final de sua execução . Apresentou-se um vídeo sobre horta, quando se discutiu o conhecimento do grupo, sua opinião sobre a atividade, dificuldades. Estas se referiram ao fato de terem que acordar cedo; medo de participar da atividade e, isso se caracterizar trabalho e consequentemente impedir o recebimento do benefício da aposentadoria e não receber pelo trabalho realizado uma vez que nas internações pelas quais passaram, os usuários relataram que desenvolviam atividades nos hospitais, não recebiam nada por isso e, portanto sentiam "usados" pela instituição. Foi discutido e trabalhado esses temores e preocupações, principalmente no que se referia a aposentadoria e à exploração de sua força de trabalho. Ficou claro para todos que toda a produção ali colhida seria dividida entre os participantes da atividade. Houve a visita ao local , preparação do solo, plantio e colheita. No início das atividades os usuários decepcionaram-se com o estado do terreno (a terra seca e apenas grama). Existiram também dificuldades técnicas-operacionais, temor dos usuários em sair da instituição, emergência de crises, abandonos e dúvidas da equipe do serviço para integrar essa atividade com o trabalho terapêutico-medicamentoso. Em 1999, as atividades da horta continuam, com encaminhamento pela equipe de outros usuários. No entanto permanece ainda as dificuldades de adesão dos usuários , maior envolvimento da equipe, e algumas dificuldades técnicas-operacionais. Porém, é possível constatar situações onde espaços de produção de vida naquele coletivo brotam e desabrocham no mesmo ritmo das próprias plantas ali cultivada. Na oficina da "escolinha" houve menos dificuldades iniciais do que as encontradas na horta. Elas são realizadas na própria instituição, em uma sala cedida por um outro departamento do Centro de Saúde. A participação dos usuários é estável, com maior adesão nas atividades. Os temas desenvolvidos nessa oficina são escolhidos pelos próprios participantes, abrangendo matemática, português, conhecimentos gerais, desenho e pintura e passeios pela cidade ( na horta, biblioteca pública, piquenique na piscina pública). O primeiro momento da atividade é o aquecimento, a interação inicial, onde é retomada o tema do dia que foi decidida na semana anterior. Depois é realizado a atividade onde é utilizado materiais gráficos, revistas, xerox de dinheiro, sucatas que os próprios participantes levam para dramatizarem situações cotidianas de compras e vendas e outras. No final todos avaliam a atividade do dia e escolhem o tema da próxima semana. É importante destacar que as atividades não são concluídas em apenas uma semana. Sua duração depende do ritmo da produção do coletivo. Essa oficina despertou interesse em algumas pessoas em voltar a estudar, interesse por leitura, filiação na biblioteca pública, interesse e valorização do desenvolvimento profissional. Além disso, apontou para a necessidade de se criar mais outras duas oficina: uma para os usuários analfabetos e semi-analfabetos e outra para que desenvolvam outras formas de expressão criativa. Existiram dificuldades técnicas em estabelecer o tipo de usuário que poderiam participar da atividade, assim como trabalhar com as singularidades diversas. A prática de reabilitação e reinserção social é bastante complexa e implica no "desmonte" de uma prática instituída de tratamento norteado na restrição dos espaços sociais ou mesmo a exclusão social dos usuários da saúde mental e na medicalização e a "psicoterapeutização" dos tratamentos em instituições de saúde. A saída do usuário da instituição Centro de Saúde também provoca dificuldades pois significa reiniciar e inventar novas formas de contato com a sociedade e, portanto adquirir seu poder contratual. Antes o essencial era a saída do hospital e a volta à casa, agora tem-se novas possibilidades, momentos de criação, ação, desenvolvimentos, tomadas de decisões, novos relacionamentos, amizades e responsabilidade. Enfim, trocas de mensagens afetivas, sociais e de bens materiais. É a ruptura do processo de "negatividade" em que a doença os colocou e a construção do processo de vida enquanto o viver com a saúde interior e com a capacidade de ter experiências culturais diversas. Apesar das atividades das oficinas estarem ainda restrito a um pequeno número de usuários elas apontam sua viabilidade e importância como tratamento na área de saúde mental enquanto uma prática substitutiva que supõe a ruptura das práticas psicológicas tradicionais. Esta importância é maior ainda quando estas atividades são desenvolvidas por uma equipe de saúde mental de um Centro de Saúde de uma cidade pequena ( com aproximadamente 29.000 habitantes), onde geralmente o tipo de serviço oferecido na área de saúde mental é de triagem de pacientes para internamentos, acompanhamento medicamentoso e tratamento psicoterápico individual. Para universidade é importante sua participação neste tipo projeto, uma vez que ela pode contribuir não apenas na melhor formação dos futuros psicólogos como na discussão e na construção de propostas que possam resolver os graves problemas não apenas de saúde, mas social das pessoas com intenso sofrimento psíquico. Isto porque o poder contratual desses usuários será transformado e ampliado na relação que se estabelece entre eles e os membros da equipe de profissionais formados pelas universidades. Além disso, a universidade em sua função de pesquisa e de extensão deve contribuir para o rompimento do modelo manicomial, desenvolvendo projetos e ações substitutivas que promovam a qualidade de vida dos cidadãos.

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