UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – UNESP Faculdade de Ciências e Letras - Araraquara MARCUS VINÍCIUS RIGONATO DA SILVA Reformas Neoliberais no Brasil: projeto político-econômico e impactos do Governo Temer (2016 – 2018) Araraquara, SP 2024 MARCUS VINÍCIUS RIGONATO DA SILVA Reformas Neoliberais no Brasil: projeto político-econômico e impactos do Governo Temer (2016 – 2018) Dissertação apresentada à Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara para obtenção do título de Mestre em Economia Área de Concentração: Desenvolvimento socioeconômico, instituições e políticas econômicas. Orientador(a): Prof. Dr. Eduardo Strachman Araraquara, SP 2024 S586r Silva, Marcus Vinícius Rigonato da Reformas Neoliberais no Brasil : projeto político-econômico e impactos do Governo Temer (2016 – 2018) / Marcus Vinícius Rigonato da Silva. -- Araraquara, 2024 59 p. : tabs. Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Ciências e Letras, Araraquara Orientador: Eduardo Strachman 1. Economia brasileira. 2. Neoliberalismo. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Dados fornecidos pelo autor(a). MARCUS VINÍCIUS RIGONATO DA SILVA Reformas Neoliberais no Brasil: projeto político-econômico e impactos do governo Temer (2016 – 2018) Dissertação apresentada à Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara, SP, para obtenção do título de grau acadêmico Mestre em Economia. Área de Concentração: Desenvolvimento socioeconômico, instituições e políticas econômicas. Orientador(a): Prof. Dr. Eduardo Strachman. Data da defesa: 23/08/2024 Banca Examinadora: ______________________________________ Prof. Dr. Eduardo Strachman UNESP – Faculdade de Ciências e Letras - Campus de Araraquara, SP. ______________________________________ Prof. Dr. Celso Pereira Neris Júnior UNESP – Faculdade de Ciências e Letras – Araraquara, SP. ______________________________________ Prof. Dr. Fabiano Abranches Silva Dalto Universidade Federal do Paraná – Curitiba, PR Dedico este trabalho a todos aqueles que enxergam na economia uma ciência humana. AGRADECIMENTOS Primeiramente agradeço meus pais pelos valores transmitidos e pelo suporte ao longo de minha vida. Agradeço também a minha namorada que além de me apoiar emocionalmente, também ampliou minha visão para outras realidades. Por fim, agradeço todos os professores que já passaram pela minha vida, da educação básica até a pós-graduação, pois a educação é um processo gradual e infindo. Deixo especiais agradecimentos aos professores do departamento de pós- graduação em economia da Faculdade de Ciências e Letras de Araraquara, pois suas aulas foram fundamentais para minha formação. Ademais, agradeço carinhosamente a coordenadora Tatiana Massaroli de Melo pela sua sensibilidade e empatia e meu orientador Eduardo Strachman pelo apoio fornecido para a realização de minha pesquisa. RESUMO Em 2015, um documento assinado pela Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB, atual MDB) é lançado, ainda sob o governo da Presidente Dilma, com o nome “Uma Ponte para o Futuro”. No ano seguinte, devido ao impeachment, Dilma é tirada da presidência e, o Vice-Presidente, Michel Temer, assume o poder executivo. O Presidente Michel Temer assumiria então a tarefa de promover as reformas neoliberais presentes em “Uma Ponte para o Futuro”, aprofundando a política econômica do país que, desde Dilma, apresentava tendências neoliberais. O presente trabalho investiga as reformas do Governo Temer – teto de gastos e reforma trabalhista - em seus aspectos teóricos e práticos, neste último caso, de modo limitado, dado o curto distanciamento histórico e encerramento de algumas políticas. Ainda assim, a análise do período indica um aprofundamento do projeto neoliberal sem os resultados macroeconômicos esperados pelos defensores das políticas implementadas. Palavras-chave: Economia brasileira; Neoliberalismo. ABSTRACT In 2015, a document signed by the Brazilian Democratic Movement Party (PMDB, now MDB) was released under President Dilma’s government, titled “A Bridge to the Future.” The following year, due to the impeachment, Dilma was removed from the presidency, and Vice President Michel Temer took over the executive power. President Michel Temer then undertook the task of promoting the neoliberal reforms outlined in “A Bridge to the Future,” deepening the country’s economic policy, which had already shown neoliberal tendencies during Dilma’s term. This paper examines Temer’s reforms— the Spending Cap and the Labor Reform — in both their theoretical and practical aspects, although the latter is limited due to the short historical distance and the conclusion of some policies. Nevertheless, an analysis of this period indicates a deepening of the neoliberal project without achieving the macroeconomic results expected by the proponents of the implemented policies. Keywords: Brazilian economy; Neoliberalism. LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 – Variação do PIB e IPCA no Brasil (2008 - 2017) - valor em % 27 Gráfico 2 – Brasil: capacidade instalada da indústria (2011 – 2017) média anual em % 28 Gráfico 3 – Taxa SELIC - Fechamento Anual (2015-2021) - em % 43 Gráfico 4 – PIB (Preços de Mercado) - Variação contra o ano anterior (%) 48 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Brasil: exportações, importações e saldo (2009 – 2017) - em US$ milhões FOB 23 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS BCB Banco Central do Brasil CLT Consolidação das Leis Trabalhistas CNI Confederação Nacional da Indústria COPOM Comitê de Política Monetária COVID-19 Coronavírus 19 DIAP Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar DIEESE Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos DPF Dívida Pública Federal EC Emenda Constitucional EUA Estados Unidos da América FBCF Formação Bruta de Capital Fixo FGV Fundação Getúlio Vargas IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IPCA Índice de Preços ao Consumidor Amplo LRF Lei de Responsabilidade Fiscal MBL Movimento Brasil Livre MDB Movimento Democrático Brasileiro MPT Ministério Público do Trabalho NME Nova Matriz Econômica PIB Produto Interno Bruto PMDB Partido do Movimento Democrático Brasileiro PT Partido dos Trabalhadores SELIC Sistema Especial de Liquidação e de Custódia STN Secretaria do Tesouro Nacional UNICAMP Universidade Estadual de Campinas SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................... 14 2 CAPÍTULO 1 - NEOLIBERALISMO ...................................................... 16 2.1 RACIONALIDADE ................................................................................. 17 2.2 PRÁTICAS ............................................................................................. 19 3 CAPÍTULO 2 - ASPECTOS POLÍTICO-ECONÔMICOS DO TRIÊNIO 2015-17, NO BRASIL ............................................................................................... 22 3.1 FATORES EXTERNOS ......................................................................... 22 3.2 FATORES INTERNOS .......................................................................... 24 4 CAPÍTULO 3 - “UMA PONTE PARA O FUTURO” .............................. 30 5 CAPÍTULO 4 - IMPLICAÇÕES TEÓRICO-PRÁTICAS DAS REFORMAS DE TEMER 36 5.1 A PEC 241, DO “TETO DE GASTOS” ................................................... 36 5.2 A REFORMA TRABALHISTA ................................................................ 45 6 CONCLUSÃO ........................................................................................ 51 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 54 14 1 INTRODUÇÃO O ano de 2013 marca o início de um processo importante na política brasileira. A partir dos protestos contra o aumento da tarifa do transporte público, na cidade de São Paulo, várias pautas emergem, muitas sem relação com as tarifas em si, surgindo também, nesse cenário, de forma crescente, movimentos de cunho liberal e/ou conservador, não somente nos protestos nas ruas, mas também online, como o Black Bloc, Vem pra Rua, Movimento Brasil Livre (MBL), sendo algumas pessoas deste último grupo, posteriormente eleitas para cargos públicos. Outro processo, de mais longo prazo, que vinha e vem ocorrendo, no país, e merece destaque, é o aumento da bancada evangélica (DIAP, 2018), defensora de pautas conservadoras nos costumes e neoliberais na economia, fato que também somou a outros fatores de desgaste do governo da Presidente Dilma, dada as diferenças ideológicas. Nesse cenário de aglomeração de ideais conservadores e agentes críticos aos governos petistas, emerge o documento peemedebista (atual MDB) “Uma Ponte para o Futuro” (2015), reiterando críticas econômicas e propondo caminhos para a crise brasileira. Nesse documento, ideias de reformas conservadoras são propostas como meio de salvação, reativação e dinamização da economia brasileira. Dessa maneira, de modo a cumprir com os objetivos deste trabalho. Procuramos organizar o texto da seguinte forma: no primeiro capítulo, procuramos abordar o neoliberalismo em sua racionalidade e práticas, buscando estabelecer um consenso teórico sobre essa vertente ideológica da economia. Em seguida, busca-se compreender o cenário econômico brasileiro no triênio 2015-2017, analisando as políticas econômicas praticadas internamente e seus respectivos resultados. Além disso, o cenário externo do período também é examinado, considerando a integração do Brasil na economia global e os impactos dos eventos internacionais. O capítulo aborda dados sobre comércio exterior, incluindo exportações e importações, bem como indicadores de inflação e crescimento econômico. Embora o foco seja o triênio 2015-2017, são apresentados dados de um período mais abrangente, de 2008 a 2017, permitindo uma análise mais profunda dos efeitos da crise de 2008 e das políticas econômicas pós-crise. Esta abordagem temporal mais extensa visa proporcionar uma compreensão mais completa das dinâmicas econômicas que influenciaram o Brasil durante o período em questão. 15 O documento “Uma Ponte para o Futuro” é o foco de análise do terceiro capítulo. Além de examinar o discurso presente no documento, realizamos comparações entre este e a narrativa neoliberal, estabelecendo conexões entre o conteúdo do documento e os temas abordados no primeiro e terceiro capítulos. Essa análise visa evidenciar como o documento se alinha ou diverge dos princípios neoliberais e como essas ideias se manifestam nas políticas econômicas e sociais propostas. As reformas empreendidas pelo Governo Temer são examinadas no quarto capítulo, seja em seus efeitos práticos – análise limitada por fatores como o curto período de duração, no qual foram implementadas, e/ou encerramento de políticas iniciadas – seja em questões mais teóricas, que buscam o cerne dos argumentos defendidos em tais medidas. Neste capítulo, contrastamos também as reformas executadas com a lógica neoliberal, de modo a compreender se efetivamente podem ser caracterizadas como reformas neoliberais. Nas considerações finais, buscamos, sobretudo, examinar as consequências do Governo Temer e suas respectivas reformas, não exclusivamente os efeitos na economia, mas também sobre o saldo do período no que tange aos aspectos políticos, ou seja, o que simbolizou, para a política e sociedade brasileira o período que se estende do impeachment da Presidente Dilma Roussef até as reformas do Governo Temer. 16 2 Capítulo 1 - Neoliberalismo A fim de entender se as reformas do Governo Temer podem ser caracterizadas como neoliberais, é preciso antes, buscar definições sobre esse conceito. Dada a impossibilidade de esgotar todas as interpretações acerca do neoliberalismo1, abordaremos as principais definições a fim de, ao menos, encontrar consensos ou pontos de convergência entre estas. Cabe ressaltar que quando falamos em neoliberalismo não há um “tipo ideal” (ANDRADE, 2019) ou um modelo estrito a ser seguido Portanto, devemos considerar o neoliberalismo em sua forma plural ("neoliberalismos") como um programa de pesquisa complexo. Isso não é diferente de outros programas de pesquisa em economia, como liberalismo clássico, neoclássico, marxismo e institucionalismo, cujas concepções diferem dependendo de suas gerações, debates internos e contexto - tanto histórico quanto nacional (ARCHELA, 2016, p. 58- 59, tradução nossa). Ou seja, há de fato variações a depender do momento, região, forma, intenção etc. em que se aborda esse conceito. Ainda que o “neoliberalismo” alemão, chamado de ordoliberalismo ou o neoliberalismo americano tenham sido modelos de referência (DARDOT e LAVAL, 2016). Andrade (2019) afirma que: Nem mesmo o modelo americano pode ser tomado como referência, pois o neoliberalismo é polimórfico. Não é possível antecipar a forma que o Estado irá assumir, sendo necessário analisá-lo histórica e geograficamente. O único modo de compreender o fenômeno é seguir os movimentos que se desenrolam na triangulação entre ideologias, políticas e práticas institucionais (ANDRADE, 2019, p. 232). Entretanto, ainda que haja variações, é possível encontrar pontos em comum. Teoricamente há diferenças entre o liberalismo e o neoliberalismo, sendo importante não confundir como sinônimos, 1 A criação da Sociedade Mont-Pèlerin, em 1947, é citada com frequência, e erroneamente, como o registro de nascimento do neoliberalismo. Na realidade, o momento fundador do neoliberalismo situa- se antes, no Colóquio Walter Lippmann, realizado durante cinco dias em Paris, a partir de 26 de agosto de 1938, no âmbito do Instituto Internacional de Cooperação Intelectual (antecessor da Unesco), na rue Montpensier, no centro de Paris. A reunião de Paris distingue-se pela qualidade de seus participantes, que, na maioria, marcarão a história do pensamento e da política liberal dos países ocidentais após a guerra, quer se trate de Friedrich Hayek, Jacques Rueff, Raymond Aron, Wilhelm Röpke, quer se trate de Alexander von Rüstow (Dardot e Laval, 2016). 17 O neoliberalismo, portanto, não é o herdeiro natural do primeiro liberalismo, assim como não é seu extravio nem sua traição. Não retoma a questão dos limites do governo do ponto em que ficou. O neoliberalismo não se pergunta mais sobre que tipo de limite dar ao governo político, ao mercado (Adam Smith), aos direitos (John Locke) ou ao cálculo da utilidade (Jeremy Bentham), mas, sim, sobre como fazer do mercado tanto o princípio do governo dos homens como o do governo de si (Parte I). Considerado uma racionalidade governamental, e não uma doutrina mais ou menos heteróclita, o neoliberalismo é precisamente o desenvolvimento da lógica do mercado como lógica normativa generalizada, desde o Estado até o mais íntimo da subjetividade (Parte II) (DARDOT e LAVAL, 2016). Poderíamos ainda complementar a ideia do neoliberalismo não como algum tipo de lei natural, mas como algo efetivamente construído, artificial, uma “escolha política”. Sobre essa visão, Dardot e Laval (2016) comentam sobre os ordoliberais: O mais importante, porém, é a atitude essencialmente antinaturalista e antifatalista que decorre desse reconhecimento da lógica da concorrência que rege a economia de mercado: enquanto os velhos economistas liberais concluíram pela necessidade de uma não intervenção do Estado, os ordoliberais transformaram a livre concorrência em objeto de uma escolha política fundamental (DARDOT e LAVAL, 2016). De modo complementar, Dardot e Laval (2016) destacam que “o neoliberalismo está muito distante de se resumir a um ato de fé fanático na naturalidade do mercado.” Ainda sobre esse aspecto, temos que: O neoliberalismo não pressupôs uma força natural que impulsionaria e selecionaria os interesses individuais (laissez-faire), mas recomendou um arcabouço institucional para viabilizar esse processo empreendedor (BOETTKE e LEESON, 2009, p. 448, apud ARCHELA, 2016, p. 64, tradução nossa). Se o Estado neoliberal não surge de forma natural, designando restrições legais à economia, mas é elaborado por seres humanos com base em uma racionalidade e aplicado através de certas práticas. Portanto, qual seria essa racionalidade? Quais seriam essas práticas? 2.1 Racionalidade 18 Nos trechos de Dardot e Laval (2016) supracitados, há recorrência de termos como mercado e concorrência e, de fato, estes compõem de modo consensual a racionalidade neoliberal, entendendo racionalidade como a lógica ou a razão de ser. Sobre essa lógica: A ideologia é de que todos, ou virtualmente todos, os problemas econômicos e sociais têm uma solução de mercado, ou uma solução na qual os processos de mercado terão um papel proeminente. Os defensores do neoliberalismo nem sempre consideram os mercados como perfeitos, mas negam o reconhecimento de falhas de mercado argumentando que falhas estatais são geralmente muito piores (HOWARD e KING, 2008, pp. 1 e 3, tradução nossa). Reside aí um exemplo da exaltação do mercado, da elevação deste como parâmetro para outros aspectos da vida social, ademais: Não se trata exatamente da mercadorização de tudo, pois o mercado mantém sua limitação e singularidade, mas da difusão do modelo de mercado para além do próprio mercado, reformando o Estado, as políticas públicas, as instituições, a gestão e as subjetividades (DARDOT e LAVAL, 2009: 5; BROWN, 2003: 50, apud ANDRADE, 2019 p. 219). A lógica seria disseminar o modelo mercadológico de eficiência e competição, mas diferentemente do que se possa pensar, não necessariamente reduzindo o tamanho do Estado, mas redirecionando suas políticas, leis, práticas e entre outros mecanismos estatais para os objetivos neoliberais, tais como: o mercado e a concorrência como princípios organizadores da sociedade. Nesse sentido: O funcionamento da concorrência não apenas requer a organização adequada de certas instituições como a moeda, os mercados e os canais de informação - algumas das quais nunca poderão ser convenientemente geridas pela iniciativa privada, mas depende sobretudo da existência de um sistema legal apropriado, estruturado de modo a manter a concorrência e a permitir que ela produza os resultados mais benéficos possíveis. Não basta que a lei reconheça o princípio da propriedade privada e da liberdade de contrato; também é importante uma definição precisa do direito de propriedade aplicado a questões diferentes. (HAYEK, 1990 p.59) De modo complementar, Friedman (2002) defende a necessidade do Estado para o funcionamento adequado da dinâmica do livre mercado: 19 A existência de um mercado livre, é claro, não elimina a necessidade de governo. Pelo contrário, o governo é essencial tanto como um fórum para determinar as 'regras do jogo' quanto como um árbitro para interpretar e fazer cumprir as regras decididas. O que o mercado faz é reduzir consideravelmente a gama de questões que devem ser decididas por meios políticos e, assim, minimizar a extensão em que o governo precisa participar diretamente do jogo. (FRIEDMAN, 2002 p. 15 – tradução nossa) Em síntese, a análise dos trechos destacados acima aponta para a centralidade do mercado na lógica neoliberal, que não apenas propõe soluções de mercado para desafios sociais, mas também difunde esse modelo para toda a esfera não econômica, remodelando o Estado e suas práticas. Contrariando a expectativa de uma redução do Estado, a implementação neoliberal muitas vezes resulta, como visto, em uma expansão das políticas públicas com foco na competitividade nacional. Portanto, deve- se levar em conta que: Há uma posição dominante nas análises sobre o “neoliberalismo realmente existente”: não se trata de um desmantelamento do Estado, mas de sua reestruturação, mantendo um papel forte e bastante ativo, mas que sofre variações conforme sua configuração histórica específica (ANDRADE, 2019, p. 216). Assim, o Estado neoliberal não seria aquele mínimo, enxuto, mas influenciado por uma lógica mercadológica transcendente ao próprio Estado na medida em que reconfigura as estruturas e dinâmicas deste para atender aos princípios de eficiência e competição. Assim, redefine-se não somente o Estado, mas a relação entre ele e a sociedade e mesmo entre membros da própria sociedade. 2.2 Práticas Há de se explorar ainda as práticas neoliberais, se de modo resumido estamos falando de um Estado e sociedade com parâmetros mercadológicos de eficiência e concorrência, quais medidas devem ser colocadas em curso na construção de um Estado neoliberal? Antes de investigarmos algumas definições sobre tais práticas, cabe reafirmar a inexistência de um “tipo ideal” de Estado neoliberal (ANDRADE, 2019 p. 218). Contudo, ainda que possa haver diferenças entre experiências de neoliberalização, há certos movimentos gerais no processo de implantação de medidas neoliberais. 20 O que os neoliberais enfatizam é que a atividade estatal deve ser significativamente reestruturada e redirecionada. As autoridades políticas continuarão a arrecadar quantias substanciais em impostos, financiar, supervisionar e regular uma ampla variedade de bens e serviços. No entanto, os bens e serviços serão fornecidos principalmente por corporações privadas e, se a prestação permanecer pública, será realizada por meio de mercados ou mecanismos semelhantes ao mercado (HOWARD e KING, 2008, pp. 1 e 3 - tradução nossa). Ou seja, o papel do Estado é essencial para o funcionamento do modelo neoliberal. Ademais, a iniciativa privada se utiliza do Estado neoliberal não somente para a regulação de contratos, padrões de qualidade e privatizações. O Estado neoliberal pode até auxiliar nos lucros de alguns setores da inciativa privada, como afirma Harvey (2014 p. 87): O Estado produz tipicamente legislação e estruturas regulatórias que privilegiam as corporações e, em alguns casos, interesses específicos, como energia, produtos farmacêuticos, agronegócios etc. Em muitos casos das parcerias público-privadas, em especial no nível dos municípios, o governo assume boa parte do risco enquanto o setor privado fica com a maior parte dos lucros. Se necessário, o Estado neoliberal além disso recorre a legislações coercivas e táticas de policiamento (por exemplo, regras antipiquete) para dispersar ou reprimir formas coletivas de oposição ao poder corporativo. Os mecanismos de concorrência não se supõem válidos somente às empresas, mas também a toda a sociedade, impactando assim as relações entre as pessoas de uma mesma comunidade. Sobre tal aspecto, Andrade (2019) ressalta que: Os métodos de gestão flexíveis impõem a precarização dos vínculos trabalhistas e promovem a concorrência entre os funcionários, definindo metas, formas de avaliação e de remuneração individuais. Esse mundo de competição darwiniana com ameaça de demissão mina a solidariedade e dociliza os trabalhadores ao autocontrole e à autoexploração (ANDRADE, 2019 p. 225). A convergência entre as visões de Howard e King (2008), Harvey (2014) e Andrade (2019) sobre as práticas estatais neoliberais, destaca a interação entre setor privado e público, em que o último realiza concessões ao primeiro, além de mimetizar seus mecanismos de 21 competição que passam também a fazer parte da lógica da relação entre trabalhadores. Isso ilustra a influência profunda da lógica neoliberal sobre estruturas estatais e relações sociais. Como já foi destacado, o Estado neoliberal se constrói por meio de uma racionalidade concentrada na concorrência, comércio e propriedade privada (Harvey, 2014, p. 12). E, ao se construir desta forma, não apenas se desfaz de algumas partes – reduzindo seu tamanho, por meio de privatizações ou enxugamento de gastos/investimentos – mas também pode se ampliar em outras áreas, como a segurança pública. Nesse sentido: [...] o Estado tem de garantir, por exemplo, a qualidade e a integridade do dinheiro. Deve também estabelecer as estruturas e funções militares, de defesa, da polícia e legais requeridas para garantir direitos de propriedade individuais e para assegurar, se necessário pela força, o funcionamento apropriado dos mercados (HARVEY, 2014, p.12) Ou seja, o Estado deve assegurar, por meio da força, caso necessário a integridade e inviolabilidade da propriedade privada; logo, um setor de segurança eficiente na função de proteger a propriedade privada é fundamental num Estado neoliberal. Antes de querer abordar a operação do Estado neoliberal em todas as esferas da vida em sociedade (educação, saúde, segurança etc.) procuramos agora evidenciar os modos mais gerais da lógica neoliberal e do processo de neoliberalização. No quarto capítulo, contrastaremos as políticas do Governo Temer com a racionalidade e práticas neoliberais. 22 3 Capítulo 2 - Aspectos político-econômicos do triênio 2015-17, no Brasil 3.1 Fatores externos Em um mundo globalizado, há de se esperar que choques, crises, booms e demais eventos econômicos oriundos de um país ou região afetem outros, dada a conexão entre as economias não somente no campo do comércio, mas também no tocante aos mercados financeiros. Dessa forma, em 2008 uma crise estoura nos EUA, esta logo se espalha pelo mundo. Nas origens da crise de 2008, encontrava-se o mercado imobiliário e todo o arcabouço de empréstimos com base em hipotecas imobiliárias, bem como a venda dessas dívidas como produtos financeiros (PIRES, 2013). Muitos dos empréstimos eram feitos a pessoas sem garantias materiais de pagamento. Há na língua inglesa, uma expressão que se refere a essas pessoas sem tantas garantias: ninja. O termo é uma contração de no income (sem renda), no job (sem emprego) e no assets (sem ativos) (WRAY, 2011). Como os bancos concediam empréstimos e tinham a possibilidade de vender tais dívidas para serem embaladas em carteiras podres, eles o faziam: O momento de baixa no ciclo desse mercado (principalmente a partir do subprime) se deu quando a elevação da inadimplência nas hipotecas, junto com a elevação das taxas de juros americanas, em 2004, redundaram na redução dos preços dos imóveis e da oferta de crédito imobiliário, o que elevou ainda mais a inadimplência e transformou o círculo “virtuoso” em vicioso. Era a manifestação da crise (financeira) atual porque passa o capitalismo contemporâneo. (CARCANHOLO, 2011, p. 77) Em setembro de 2008 a bolha imobiliária estoura. Sendo os Estados Unidos a principal economia mundial e importante centro financeiro internacional, outras partes do mundo sentiriam os efeitos da crise, com diferenças quanto à intensidade, tempo de duração e respostas em políticas econômicas. O Brasil contava com um bom nível de reservas, da ordem de US$ 160 bilhões em 2007, pouco antes da crise, o que reduziu a vulnerabilidade externa (PIRES, 2013). Ademais, o Governo Lula, em meio à crise, promoveu uma política econômica anticíclica. Pelo lado fiscal, reduziu impostos indiretos de alguns setores, como o IPI 23 (imposto sobre produtos industrializados). No que tange à política monetária, o governo seguiu uma política de redução da taxa básica de juros (SELIC) se utilizando de bancos públicos (Caixa Federal e Banco do Brasil) para pressionar os bancos privados a reduzirem seus spreads. (PIRES, 2013). Ou seja: A resposta dada a crise mundial baseou-se no incentivo ao consumo, na ampliação do crédito, na isenção fiscal para vários setores, no incremento do gasto público e na lenta redução dos juros. Estas medidas pareciam indicar que Lula esboçava um rompimento (ou pelo menos uma maior flexibilização) com a política macroeconômica neoliberal, seguindo certa tendência que parecia firmar-se no início da crise, mas que esmoreceria à medida que os interesses da fração financeira, que ocupa a posição hegemônica no capitalismo global, não foram suficientemente abalados pela crise de sobreacumulação. (CORSI, 2016 p.4) Ainda sobre a crise de 2008 e a recuperação de países e regiões afetadas, a zona do Euro, por exemplo, somente superaria o PIB médio do período 2007-8 em 2015, o que o Japão faria em 2013 e os EUA, mais cedo, em 2011 (SICSU, 2019, p.9). Nesse período de depressão econômica global, a demanda mundial por bens foi reduzida e o Brasil sentiu os efeitos dessa depressão na redução de suas exportações, como é possível ver na tabela 1: Tabela 1 - Brasil: exportações, importações e saldo (2009 – 2017) - em US$ Milhões FOB Ano Exportações Importações Saldo 2008 195.764,6 174.707,1 21.057,5 2009 151.791,7 129.397,6 22.394,1 2010 200.434,1 183.337,0 17.097,2 2011 253.666,3 227.969,8 25.696,6 2012 239.952,5 225.166,4 14.786,1 2013 232.544,3 241.500,9 -8.956,6 2014 220.923,2 230.823,0 -9.899,8 2015 186.782,4 173.104,3 13.678,1 2016 179.526,1 139.321,4 40.204,8 2017 214.988,1 158.951,4 56.036,7 Fonte: Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (2024). Adaptado de: balanca.economia.gov.br Apesar de notarmos queda nas exportações e importações de 2008 a 2009, ano subsequente à crise, de 2009 até 2011, as exportações cresceram. Contudo, a partir de 2012, já sob o Governo Dilma, percebemos uma queda nas exportações brasileiras, apresentando saldos negativos em 2013 e 2014 e a tendência de queda nas exportações seguiu até o último ano de Dilma no poder. Fato pertinente, portanto, que somente após 2011 o Brasil veria suas exportações serem reduzidas. Aliás, até 24 2011 a crise foi vista por alguns como uma simples "marolinha" 2. No entanto, durante o Governo Dilma, essa "marolinha" se intensifica, transformando-se em uma onda mais forte. Desse modo, o que mudou a partir de 2011? A condução do governo. Pois ainda sob o Governo Lula, houve a execução de uma política anticíclica e crescimento do investimento estatal durante a crise (CORSI, 2016). Já no primeiro ano do Governo Dilma, veríamos mudanças na execução das políticas econômicas. Portanto, é possível que a crise de 2008, por si só, não explique completamente a deterioração da economia brasileira durante os governos de Dilma Rousseff, especialmente no final do primeiro mandato e início do segundo. A próxima seção do capítulo irá explorar e analisar essas mudanças com mais profundidade. 3.2 Fatores internos A partir de 2013, no campo político, a sociedade brasileira começa a experimentar crescimento de ideias radicais. Fuks e Marques (2022) apontam que tal radicalização se restringiu a somente um lado dos polos políticos, a direita, e complementam: [...] o antagonismo entre grupos políticos no Brasil é assimétrico, acompanhando a recente reorganização da direita e, desde 2006, a moderação do principal partido de esquerda do país. Por fim, as lideranças políticas são referências mais claras do que os partidos no caso brasileiro, como se esperaria em um sistema partidário fragmentado, instável e com uma frágil base social (FUKS e MARQUES, 2022, p. 579) Em um cenário de crescente radicalização da direita, o Governo do Partido dos Trabalhadores (PT), havia mais de uma década no poder, sofreria um impeachment, em 2016. Contudo, convém abordar os aspectos econômicos do período, de 2011, primeiro ano do Governo Dilma, passando pela execução da Nova Matriz Econômica (NME) até sua brusca reversão e a nomeação de Joaquim Levy, como Ministro da 2 Termo utilizado pelo Presidente Lula ao se referir aos efeitos da crise de 2008. Em uma carreata na cidade de São Bernardo do Campo, SP, o presidente teria dito: Lá (nos EUA), ela é um tsunami; aqui, se ela chegar, vai chegar uma marolinha que não dá nem para esquiar. 25 Fazenda, marcando um aprofundamento na orientação econômica do governo que, como veremos, já indicava ter contornos neoliberais. Em 2011, Dilma optou por uma elevação gradual dos juros, que passaram de 11,17% em janeiro para 12,42% em julho (BCB) visando seguir a política de metas de inflação. Além disso, implementou medidas como restrição ao crédito, elevação do compulsório e das exigências de capital dos bancos, aumento do IOF sobre o crédito pessoal e contenção de gastos públicos, preservando, contudo, os programas sociais. O objetivo dessas ações visava controlar a inflação sem aumentar expressivamente os juros. A política cambial, que promovia a valorização da moeda, também foi mantida. (CORSI, 2016) e (BASTOS, 2017). Todavia, no mesmo ano, o governo aposta num pacote de medidas de fomento à indústria: a Nova Matriz Econômica (NME). Com o início da NME, a postura mais contracionista, do início de 2011, sofreria alterações. (CORSI, 2016) A Nova Matriz Econômica se assentava numa política de apoio à indústria pelo lado da oferta com incentivos fiscais para as empresas: Foram inúmeras as medidas colocadas em prática dentro do arcabouço das políticas pelo lado da oferta, mas se destacaram: extensos programas de desonerações fiscais empresariais, redução do spread bancário e diminuição das tarifas de energia elétrica.35 Desonerações fiscais empresariais representam a essência da adoção de políticas pelo lado da oferta em oposição às políticas de administração da demanda. Nesse caso, o governo abriu mão de recursos e de sua capacidade de impulsionar a economia com o objetivo de reduzir custos das empresas (talvez na esperança de que empresários optassem por fazer investimentos com os recursos que deveriam ter sido recolhidos na forma de tributos) (SICSU, 2019, p. 31). Fato que merece destaque no que tange aos incentivos fiscais ofertados às empresas foi a “falta de contrapartidas formais em termos de produção, exportações ou investimentos” (BIANCARELLI e ROSSI, 2015 p.5). Ou seja, as isenções não foram condicionadas a compromissos de aumento produtivo ou de investimento. Mesmo em meio a inúmeros incentivos, o empresariado nacional não respondeu positivamente às intenções da NME, em vez de promoverem investimentos, os empresários apenas usaram os incentivos para manter suas margens de lucros. Vale lembrar que havia baixas expectativas de demanda – em certa medida, esta havia sido afetada, tendo em vista a depressão pós-crise – e, em 26 um cenário como esse, os empresários tendem a utilizar os incentivos para manter suas margens de lucros. (CARVALHO, 2018) e (BIANCARELLI e ROSSI, 2015) Cabe ressaltar que a Nova Matriz Econômica apostava na industrialização através do investimento privado, desse modo: Em termos reais, o investimento público caiu 13,4% (ou R$8,6 bilhões), o gasto com pessoal caiu 0,7%, o gasto em custeio nada cresceu e o investimento das empresas estatais caiu 8,6%. Entretanto, os subsídios aumentaram 35%, ou R$ 11,2 bilhões, sendo R$ 9,3 bilhões para o programa Minha Casa Minha Vida. Entre 2011 e 2014, o padrão foi seguido: o investimento público cairia 1,1% a.a., mas os subsídios aumentaram 23,8% a.a.14 (BASTOS, 2017 p. 19) A expectativa de que o setor privado aumentasse a produção com os incentivos da NME foi frustrada. O Estado reduziu seu grau de investimento, diminuindo também seu papel de gerador de demanda. Nesse sentido, a transferência da responsabilidade para o setor privado e redução do investimento público se relaciona aos pressupostos neoliberais de aposta no setor privado, conforme apontam Andrade (2019), Howard e Kind (2008) e Dardot e Laval (2016). Seja pela falta de acompanhamento do empresariado nacional às propostas do I Governo Dilma, seja pela rápida reversão da NME, em 2014, a economia brasileira sentiria um aumento da taxa de inflação, na medida em que subsídios e isenções fiscais estavam presentes na NME e seu abandono gerou aumento no custo da produção de bens. (CARVALHO, 2018). O gráfico 1 apresenta as taxas de crescimento e inflação, desde o ano da crise até 2017. 27 Fonte: elaboração própria, com base em dados de IBGE (2024) Portanto, o ano de 2014 mostra uma aceleração da inflação, que aumenta de 6,41% em 2014 para 10,67% em 2015. Observamos também uma queda no PIB, que passa de um crescimento de 3% em 2013 para uma trajetória de declínio, atingindo 3,3% em 2016. Somado aos dados acima, havia ainda o crescimento da oposição em relação ao Governo Dilma o que desgastou politicamente a imagem do governo petista. Com o insucesso da NME, um cenário externo de queda na demanda, PIB em queda e aceleração da inflação, o governo opta por mudar de direção e nomeia Joaquim Levy como Ministro da Fazenda. Assim, o governo caminharia para políticas econômicas mais restritivas: No início de 2015, o Brasil adotou de forma declarada políticas de austeridade para supostamente combater uma crise fiscal iniciada em 2014.40 O governo chamou aquele conjunto de políticas de ajuste fiscal. Foram adotadas medidas para reduzir os gastos do governo. Cortes de gastos públicos foram feitos em todas as áreas.41 E, além disso, duas Medidas Provisórias (MP nº 664/2015 e MP nº 665/2015) foram enviadas ao Congresso Nacional e, logo em seguida, foram aprovadas. Tais MP reduziram o acesso ao seguro-desemprego e a benefícios da Previdência Social (SICSU, 2019, p. 33). Com a Nova Matriz Econômica, a ideia do governo era incentivar investimentos do setor privado e impulsionar a indústria nacional. Percebemos, porém, que os objetivos da NME não foram alcançados, como é possível ver pelo gráfico abaixo: -6 -4 -2 0 2 4 6 8 10 12 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017 Gráfico 1 - Variação do PIB e IPCA no Brasil (2008 - 2017) - valor em % PIB IPCA 28 Fonte: Elaboração própria, com base em dados de CNI (2024). Desde 2011 a capacidade instalada da indústria seguiu trajetória de queda, o que, para além de fatores de demanda e da própria resposta do empresariado brasileiro à NME, pode ser explicado pela trajetória dos investimentos públicos do Governo Dilma que, no que diz respeito à formação bruta de capital fixo (FBCF), entre 2010 e 2013, a relação FBCF/PIB apresentou um crescimento discreto, variando apenas de 20,5% para 20,9%. No entanto, a partir de 2013, inicia-se uma queda acentuada, com a FBCF recuando para 19,9% em 2014 e chegando a 15,5% em 2016, indicando uma redução significativa no investimento em relação ao PIB (IBGE). Com a nomeação de Joaquim Levy para o Ministério da Fazenda, o governo abandona a Nova Matriz Econômica. E, a partir desse momento, adota uma postura contracionista, ao cancelar as medidas da NME. Sobre esse momento: A cada revisão bimestral da política fiscal em meio à queda de arrecadação, Levy insistia em seu esforço de ganhar a confiança empresarial e do mercado financeiro cortando ainda mais o gasto público. Mesmo depois de conhecido o déficit fiscal de 0,63% do PIB em 2014, ele continuou se comprometendo com a meta fiscal de 1,2% do PIB, o que levaria o esforço fiscal em 2015 para 1,83% do PIB [...] O compromisso com a meta irrealista implicava responder à queda do gasto privado e da arrecadação tributária pró-ciclicamente, ou seja, com novos cortes concentrados em investimento público, ou gastos discricionários em saúde e educação (BASTOS, 2017, p. 48). 73,00 74,00 75,00 76,00 77,00 78,00 79,00 80,00 81,00 82,00 83,00 84,00 2011 2013 2014 2015 2016 2017 Gráfico 2 - Brasil: capacidade instalada da indústria (2011-2017) - média anual em % 29 No setor externo, a demanda estava comprometida dados os processos de recuperação dos países da zona do Euro (tabela 1). No setor interno, havia alta na taxa de inflação, baixo crescimento (gráfico1) e políticas recessivas. Dessa maneira, o cenário econômico teve peso negativo na imagem do governo, inclusive entre as classes populares 3 Outro fator de relevância do período, com impactos não apenas políticos, mas econômicos, foi a Operação Lava-Jato4, a qual influenciou negativamente no setor de construção civil e petróleo/gás (SICSU, 2019), como se sabe, a área de atuação das empresas investigadas na operação. Politicamente, o Governo Dilma sofreu ainda mais desgaste. É difícil saber se o ajuste fiscal foi mais importante que a Operação Lava-Jato para enfraquecer governo, mesmo porque suas operações e vazamentos eram calculadas para reforçar sua oposição política e social. No plano econômico, a resistência da Lava-Jato a acordos de leniência contribuiu com a queda do preço do petróleo para a crise na cadeia de petróleo e gás, associada à decisão intempestiva da direção da Petrobras de interromper encomendas de empresas denunciadas (BASTOS, 2017, p. 50). Durante o período de desgaste do segundo governo Dilma e abertura do processo de impeachment da presidente por crime da responsabilidade, o documento “Uma Ponte para o Futuro” é apresentado pelo PMDB (atual MDB), em 2015. Neste, um balanço da situação econômica é feito, assim como justificativas para o cenário de crise do período e possíveis remédios para a solução da situação econômica. Esse documento serve não somente como análise e crítica da conjuntura econômica do período, mas como plataforma política, visto que algumas das medidas contidas nele - a PEC 95 (teto de gastos), de 2016 e a reforma trabalhista, de 2017 - foram promovidas no Governo Temer. O próximo capítulo detalha essa plataforma política. 3 Ver FARAH, Tatiana. Datafolha: 62% reprovam o governo Dilma jornal o Globo, 2015. Disponível em: https://oglobo.globo.com/politica/datafolha-62-reprovam-governo-dilma-15627030 4 “[...] iniciada no ano de 2014, teve como principal objetivo investigar estratégias de lavagem de dinheiro e desvio de recursos públicos na política brasileira. Foram cumpridos mais de mil mandados de busca e apreensão, prisão temporária, prisão preventiva e condução coercitiva, além de a operação ter revelado um esquema de corrupção na Petrobras.” (JORNAL DA USP, 2023) 30 4 Capítulo 3 - “Uma ponte para o futuro” Para compreendermos o sentido e caráter da guinada promovida a partir do governo Temer, o qual assume após o impeachment de Dilma, precisamos antes analisar seu projeto político, exposto no já referido documento “Uma Ponte para o Futuro”. Sobre o lançamento da plataforma política “Uma Ponte para o Futuro”, Cavalcanti e Venerio (2017) chamam atenção para a cronologia do impeachment da Presidente Dilma. Nesta, a publicação de “Uma Ponte para o Futuro” ocorre 8 dias após o pedido de impeachment feito por Miguel Reale Júnior e Janaina Paschoal, em 21 de outubro, de 2015. Essa informação é relevante por explicitar que já antes do pedido de impeachment havia um projeto político, como exposto pelo “Uma Ponte para o Futuro”. Michel Temer, em carta enviada à Presidente Dilma, em dezembro de 2015, desabafa sobre o sentimento de ser um Vice-Presidente “decorativo”, de não ter “protagonismo” de outros tempos e de sentir desconfiança por parte da Presidente (CAVALCANTI e VENERIO, 2017). Não faz parte do escopo desta dissertação um aprofundamento narrativo sobre todo o processo de impeachment da Presidente Dilma, além do que já foi abordado. Passemos, então, para a análise do documento “Uma Ponte para o Futuro”. Logo no início de “Uma Ponte para o Futuro”, encontramos seus objetivos para a economia brasileira: Este programa destina-se a preservar a economia brasileira e tornar viável o seu desenvolvimento, devolvendo ao Estado a capacidade de executar políticas sociais que combatam efetivamente a pobreza e criem oportunidades para todos (PMDB, 2015 p. 1). Cabe destacar a palavra “programa” para afirmar que o documento não consiste somente numa análise crítica da situação econômica brasileira com sugestões, mas sim em um programa, ou plataforma. No trecho acima notamos uma visão de insuficiência do Estado para gerar desenvolvimento e efetuar de modo efetivo políticas sociais. Em seguida, o texto apresenta alguns problemas econômicos enfrentados pelo Brasil, com algum destaque para problemas sociais. Entretanto, essa preocupação 31 social logo se desfaz quando se toca na questão fiscal e na institucionalização de certas despesas, como as da Previdência Social. Nesse momento, o documento mostra de fato suas intenções precípuas. No que se refere ao enfrentamento dos problemas econômicos, afirma: Para isso é necessário em primeiro lugar acabar com as vinculações constitucionais estabelecidas, como no caso dos gastos com saúde e com educação, em razão do receio de que o Executivo pudesse contingenciar, ou mesmo cortar esses gastos em caso de necessidade, porque no Brasil o orçamento não é impositivo e o Poder Executivo pode ou não executar a despesa orçada (PMDB, 2015 p. 9). A discussão entre autorizativo e impositivo é importante. Mas seria realmente plausível desvincular tais despesas, ainda mais em um país subdesenvolvido? Note- se que estas despesas são vinculadas considerando uma ideia de um mínimo a ser despendido e há grandes e conhecidos problemas no provimento de serviços como saúde e educação. Segue-se a isso, a ideia de revisão constitucional destas despesas, as quais passariam também a depender do cenário econômico e de decisões do Parlamento, já que desindexariam do valor dos benefícios sociais do salário mínimo (PMDB, 2015 p. 10). Além disso, o texto aponta que os programas sociais passariam a ser avaliados por comitês independentes e por votação do congresso para sua continuação ou encerramento: “Hoje os programas e projetos tendem a se eternizar, mesmo quando há uma mudança completa das condições.” (PMDB, 2015 p. 10). Claro que os contextos socioeconômicos mudam ao longo dos anos; revisar políticas e programas é fundamental. Mas como garantir que programas sociais essenciais para a dignidade humana não sejam encerrados sem adequada avaliação quanto à sua eficácia? Perceba-se que não há menção alguma em “Uma Ponte para o Futuro” quanto às medidas para avaliações de programas ou mesmo uma análise mais aprofundada com estatísticas de programas disfuncionais e ineficientes quanto aos seus objetivos. Nesse sentido, o documento apenas afirma que esses programas “tendem a se eternizar”. Ainda sobre revisão de programas sociais, cabe uma pergunta retórica: e se a relevância social e eficiência fossem deixadas de lado e o único peso a ser 32 considerado fosse o saneamento das finanças públicas levado a cabo por interesses e/ou pela ideologia?5 O documento ressalta também problemas no que se refere à Previdência, bem como na relação dívida pública/PIB ignorando a ideia de que o gasto público pode reduzir a proporção dessa relação – pelo impulso que dá exatamente ao crescimento econômico, mas, adicionalmente, à ampliação da arrecadação tributária - afinal “O Estado cria moeda e a entrega ao setor privado que somente então pode fazer pagamentos ao Estado, pagando impostos ou comprando dívidas remuneradas” (CONCEIÇÃO; DALTO, 2022, p. 25) - ou mesmo expandir os investimentos totais podendo assim aumentar os ganhos e o capital disponível às empresas e toda a economia. Ademais, em uma perspectiva keynesiana, várias despesas do governo podem ser contabilizadas como investimentos. Segundo Blyth (2017), políticas fiscais restritivas tendem a afetar os mais pobres, os quais dependem mais dos serviços públicos, inclusive os mais essenciais para a vida e dignidade humanas.6 Cattoni e Costa Júnior (2021) observam no documento pemedebista a culpabilização do Estado, mais precisamente de seus gastos, pela crise brasileira: A culpa da crise seria do Estado, tal como desenhado na Constituição, prolongando-se as suas prestações positivas. “As despesas públicas primárias, ou não financeiras, têm crescido sistematicamente acima do crescimento do PIB, a partir da Constituição de 1988. Em parte, estes aumentos se devem a novos encargos atribuídos ao Estado pela Constituição” (PMDB, 2015, p. 6-7). (CATTONI e COSTA JUNIOR, 2021, p. 221). Com afirmações deste tipo o documento vem a servir como uma proposta pós- impeachment, para o qual o substituto constitucional da Presidente viria a ser seu Vice-Presidente, Michel Temer, que se tornaria o responsável por promover as propostas enunciadas na plataforma pemedebista. Os gastos estatais levaram a culpa pela crise, mesmo que tais gastos não sejam especificados quanto a programas e/ou políticas públicas. Assim, ao longo do documento, não se explica os fatores para a crise, que teve seu estopim em um evento forâneo: a recessão mundial desencadeada pela crise iniciada em setembro de 2008, 5 A questão da “saúde” das finanças públicas será abordada no capítulo 4, no qual a PEC 241 (teto de gastos) é analisada. 6 Essa discussão será aprofundada no próximo capítulo, onde abordamos a PEC 241 (teto de gastos). 33 nos EUA. Quanto aos fatores nacionais, não há análise mais aprofundada como políticas contracionistas no início do Governo Dilma, falhas da chamada “Nova Matriz Econômica” e sua brusca reversão. Portanto, a ausência de melhores explicações sobre os fatores da crise, leva os leitores do documento a uma má compreensão do cenário econômico do período em questão. E, a partir desta “análise”, emerge a necessidade de um ajuste fiscal: No Brasil de hoje a crise fiscal, traduzida em déficits elevados, e a tendência do endividamento do Estado, tornou-se o mais importante obstáculo para a retomada do crescimento econômico. O desequilíbrio fiscal significa ao mesmo tempo: aumento da inflação, juros muito altos, incerteza sobre a evolução da economia, impostos elevados, pressão cambial e retração do investimento privado. Tudo isto somado significa estagnação ou retração econômica. Sem um ajuste de caráter permanente que sinalize um equilíbrio duradouro das contas públicas, a economia não vai retomar seu crescimento e a crise deve se agravar ainda mais (PMDB, 2015, p. 5). O documento segue nessa linha reforçando que: Nos últimos anos é possível dizer que o Governo Federal cometeu excessos, seja criando novos programas, seja ampliando os antigos, ou mesmo admitindo novos servidores ou assumindo investimentos acima da capacidade fiscal do Estado. A situação hoje poderia certamente estar menos crítica (PMDB, 2015, p. 5). Busca-se estabelecer, portanto, forte relação entre gastos estatais e crise; diante disso, emerge a necessidade de “saneamento” das contas públicas; de “enxugamento” dos gastos estatais, de ajuste fiscal, até mesmo os direcionados a programas sociais e contratação de funcionários, a fim de não aumentar a “já muito elevada tributação”. Há de certo modo não apenas um ataque ao Estado em suas práticas, muitas dessas impulsionadoras da economia, na medida em que injetam dinheiro nesta, seja em programas de redistribuição de renda, seja na contratação de mão de obra ou ainda matéria-prima para construção de obras públicas. Além disso, há uma crítica à matriz dessas práticas, a Constituição de 1988: Ora, a Constituição que se propunha dirigir – leia-se, obrigar – os governos a implementarem políticas públicas que pusessem em marcha o que foi pactuado em 1988 é entendida como prejudicial aos 34 interesses do país, causadora última das crises econômicas, do déficit público e da “ingovernabilidade” (STRECK, 2016). Assim, mais uma vez, além da culpabilização do Estado pela crise, há a responsabilização deste como indutor de ineficiência e insustentabilidade. Consequentemente, há um forte apelo concomitante à iniciativa privada, como destacam Cavalcanti e Venério (2017) ao comentarem sobre as doze medidas fundamentais para a retomada da economia, presentes em “Uma Ponte para o Futuro”, sendo uma delas: d) executar uma política de desenvolvimento centrada na iniciativa privada, por meio de transferências de ativos que se fizerem necessárias, concessões amplas em todas as áreas de logística e infraestrutura, parcerias para complementar a oferta de serviços públicos e retorno ao regime anterior de concessões na área de petróleo, dando-se à Petrobras direito de preferência (PMDB, 2015, p. 18-19, apud CAVALCANTI e VENÉRIO, 2017 p. 156). Dessa forma, o documente salienta para uma clara oposição entre público e privado. Sobre tais afirmações, Cavalcanti e Venério (2017) lançam mão da metodologia de nuvem de palavras a fim de melhor analisar “Uma Ponte para o Futuro” e quais ideias são mais repetidas no texto. Visitar os resultados obtidos pelos autores nos ajuda a compreender de forma mais detalhada as preocupações expostas no documento, bem como as já referidas oposições. Assim, a dupla “mercado-privado” supera o trio “cidadania-pessoas- assistência” pelo placar de 23 a 10 – uma verdadeira “goleada”. E, apesar de palavras como “público” (45 vezes, 1a posição), “sociedade” (19 vezes, 10ª posição) e “social” (13 vezes, 13a posição) apresentarem alta frequência, não se percebe uma real preocupação com a desigualdade social. Na maior parte das suas ocorrências, o primeiro termo aparece associado a “gastos”, “despesas”, “contas”, “endividamento”, “orçamento”, “servidores” etc. “Sociedade”, por seu turno, na maioria das vezes é utilizada de forma genérica, sem se referir à questão das suas divisões – por renda, gênero, etnia ou escolaridade, por exemplo. E “social” é mais relacionada a termos como “previdência”, “assistência” e “benefícios”, todos relativos ao contexto previdenciário – ou seja, ao regime público de Previdência Social. E, ainda assim, a ideia central é a desindexação dos benefícios, o que traz sérios riscos aos aposentados e pensionistas em caso de hiperinflação (CAVALCANTI e VENERIO, 2017, p. 157). 35 Desse modo, o caráter neoliberal do documento “Uma Ponte para o Futuro” fica evidente, na medida em que uma suposta maior eficiência do privado é contrastada com o chavão especular da ineficiência do Estado. Como será abordado mais à frente, essa plataforma política é posta em prática, a partir do impeachment de abril de 2016 com a PEC 241 (do “teto de gastos”) e a Reforma Trabalhista. Ou seja, parte do que já se defendia no documento de 2015 foi efetivamente posto em prática, logo na troca de Governo. 36 5 Capítulo 4 - Implicações teórico-práticas das reformas de Temer 5.1 A PEC 241, do “Teto de Gastos” Em meio a um contexto em que alterações na Constituição e na política econômica estavam no horizonte, era necessário fazer propaganda das políticas pretendidas, sendo uma delas, a PEC 241, a PEC do “teto de gastos”. Esta foi aprovada e se tornou a Emenda Constitucional nº 95/2016 (EC 95/2016). Cabe ressaltar que a EC n°95/2016 não foi o primeiro dispositivo de regra fiscal praticado no Brasil. Na história recente, poderíamos citar a Lei de Responsabilidade Fiscal7 (LRF), aprovada no Governo Fernando Henrique Cardoso, em 2000. Antes de explicar o funcionamento do “teto de gastos”, PEC 241, analisemos o slogan das propagandas da referida PEC, veiculadas em jornais, em meados de 2016, com a seguinte frase “Vamos tirar o Brasil do vermelho e voltar a crescer” (RODRIGUES, 2016). O slogan faz, portanto, referência não somente à ideia de ajuste das contas públicas, mas do desejo de marginalização do Partido dos Trabalhadores (PT. Essa propaganda gerou, assim, críticas entre alguns políticos, como o senador Lindbergh Farias que, entre outras coisas, afirmou que o slogan era “ofensivo”, gerava “ódio” e constituía-se em “crime eleitoral” (SENADO NOTÍCIAS, 2016). Após essa reclamação, o Governo Temer alterou o slogan para "Equilibrar as contas públicas, isso é governar com responsabilidade" (BRASIL 247, 2016). O novo slogan perdeu as nuances de alfinetada política, mas a defesa do equilíbrio fiscal ainda estava presente. Havia ainda expectativas do mercado no que se refere à aprovação da PEC 241. Linhares e Gervasoni (2022) analisaram8 as reações do mercado durante a 7 A referida lei estabeleceu em seu art.14, inciso II que toda a renúncia de receita tributária, por meio de uma redução de alíquota por exemplo, deve ser acompanhada por uma medida compensatória, como a criação de um novo tributo. Outro controle orçamentário também encontra-se no artigo 17 §2°, no qual a criação de despesas com efeitos por mais de 2 anos deve ser acompanhada por medidas de compensação de aumento de receita ou de redução de despesa. (WOLF, 2021 p.62) 8 A amostra foi construída com base na análise do processo legislativo, no ano de 2016, em cada uma das casas do Congresso Nacional. Nesse sentido, foram separadas datas contemplando os momentos mais importantes do trâmite legislativo como, por exemplo, proposição, votação, dentre outros. Na sequência, comparou-se a variação do índice Ibovespa e da Taxa de Câmbio no Brasil em relação à data anterior àquele marco temporal separado, utilizando-se o sinal de menos (-) no caso de queda em relação ao dia anterior e o sinal de mais (+) quando, ao contrário, verificou-se o aumento do valor (LINHARES e GERVASONI, 2022 p. 487). 37 tramitação da PEC n°241 (teto de gastos), observando uma série de movimentos que indicaram como os atores privados reagiam durante a tramitação da proposta. Desde a apresentação da PEC nº 241, em 15 de junho de 2016, notou-se um aumento no índice Ibovespa e a valorização da moeda brasileira, evidenciando uma resposta positiva do mercado. Em momentos-chave, como na aprovação da PEC em primeiro turno, houve variações importantes nos índices econômicos. Embora o Ibovespa tenha caído ligeiramente no dia da aprovação inicial, ele se recuperou rapidamente, refletindo a confiança do mercado nas medidas de austeridade (LINHARES e GERVASOINI, 2022) Além disso, durante o processo legislativo, a análise de Linhares e Gervasoni (2022) mostra que o mercado oscilava conforme as expectativas em torno das decisões políticas. A aprovação definitiva da PEC em segundo turno, em 13 de dezembro de 2016, trouxe uma resposta clara: aumento do índice Ibovespa e queda na taxa de câmbio. Isso confirma, segundo as autoras, a influência dos interesses privados na aprovação de medidas consideradas essenciais para a recuperação econômica. O estudo conclui que o mercado se comportava de maneira estratégica, pressionando o Congresso através da desvalorização do índice Ibovespa em momentos de incerteza, enquanto revertia essa tendência em ocasiões de maior segurança e aprovação das medidas de ajuste fiscal. A PEC 241/2016 visava estabelecer um controle sobre as despesas do governo brasileiro, estabelecendo que as despesas primárias para 2017 seriam limitadas pelas do ano anterior, ajustadas somente pelo IPCA. As despesas dos anos subsequentes seguiriam a mesma lógica, partindo do ano anterior, o que se manteria por 20 anos (BRASIL, 2016). Durante o trâmite da PEC 241, várias Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) foram feitas contra a PEC 241, entre os argumentos delas, encontramos: Em alguns ADIs são mencionados o aumento da população, e a consequente necessidade de aumento real dos gastos em políticas públicas para manutenção desses direitos. Em outros ADIs é mencionado que os serviços sociais já se encontram precarizados e o Teto aumentaria essa precarização. (WOLF, 2021 p.79) Além dos argumentos acima, Wolf (2021) também comenta sobre ADIs que alegavam o caráter antidemocrático da PEC 241, na medida em que esta limitaria a capacidade de atuação de governos eleitos. 38 Se o objetivo da Emenda Constitucional n°95/2016 era controlar a questão fiscal, podemos analisar alguns dados referentes ao período inicial de vigência da lei, aprovada em 2016, para termos ideia se os efeitos esperados ocorreram ou não. Veloso (2019) expõe os seguintes dados fiscais dos primeiros meses do Governo Temer: Entre maio de 2016 e agosto de 2018, o déficit primário acumulado em 12 meses caiu de 2,5% para 1,3% do PIB. No mesmo período, houve queda do déficit nominal de cerca de 10% para 7,5% do PIB. Os subsídios financeiros, creditícios e tributários, que tinham atingido 6,7% do PIB em 2015, foram reduzidos para 5,4% do PIB em 2017. Ou seja, num curto período, houve redução tanto do déficit primário quanto do déficit nominal, mas sem se aproximar do objetivo de déficit nulo. Seria difícil analisar dados para além de 2018, pois em 2019 o Governo Bolsonaro “furou” o teto e, a partir de 2020, devido à Pandemia do Coronavírus, este mesmo Governo realizou outros gastos para além do que o teto propunha (SCHREIBER, 2022). Mas se os fatos nos impedem de analisar os efeitos práticos dessa política ao longo de vários anos, o que, como visto não ocorreu – seja pelas vezes que o Governo Bolsonaro “furou” o teto, seja pela elaboração do novo “Arcabouço Fiscal”, do ministro Haddad, em 2023 – ainda assim podemos analisar o argumento do teto de gastos bem como as implicações de políticas de ajuste e controle fiscal e seus possíveis desdobramentos. Alguns agentes podem se preocupar com cenários de expansiva política fiscal, mas seriam essas políticas inevitavelmente geradoras de déficits que abalam as contas públicas e a sociedade? Ou, ao promover gastos/investimentos, o Estado induz um efeito cíclico que acompanha o mesmo sentido do gasto, resultando em ampliação da receita, até mesmo acima dos gastos? Em suma, uma expansão fiscal pode gerar aumento da arrecadação por parte do Estado? Sobre a questão dos gastos públicos ou relação despesas-receitas, segundo nota técnica do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), de 2016, com base em dados do IBGE e da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), houve, de fato, expansão das despesas primárias, de 1998 a 2015, mas estas se viram acompanhadas de expansão de receitas primárias também, com exceção de 1999 e 2011. 39 Além da relação despesa-receita, podemos observar a relação gastos/investimento-PIB no mesmo período. Notaremos, portanto, que: [...] ao se comparar com a variação nominal do PIB, verifica-se que apenas em quatro anos a despesa teve crescimento inferior a esse indicador (1999, 2003, 2008 e 2011). Vale notar que, com exceção de 2008, os três outros momentos em que as despesas ficaram abaixo do PIB foram os primeiros anos de mandato presidencial, em que, via de regra, os governantes implementam políticas restritivas contando com o apoio adquirido na eleição anterior (DIEESE, 2016, p. 5). Portanto, é possível perceber um efeito cíclico que, se levado no sentido oposto à expansão, a retração, tende a levar a um nível ainda menor de receitas, bem como de crescimento. Cabe ressaltar, porém, que, desde 2012, há descolamento entre despesas totais e receitas totais, tanto pelos efeitos da crise internacional quanto pela perda de dinamismo da economia interna e do ajuste recessivo (DIEESE, 2016). Além dos pontos mencionados acima, poderíamos trazer à tona as implicações presentes da busca por um superávit primário como um fim em si mesmo ou como objetivo fundamental e indispensável para que uma economia possa dinamizar-se e desenvolver-se. Podemos encontrar dentro da corrente econômica dominante determinadas crenças a respeito das questões fiscais. Algumas delas residem na ideia de: Acreditar que o problema do gasto público está em garantir o seu financiamento é uma superstição que provoca dois tipos de equívocos igualmente perniciosos. Primeiro, acreditar que não se pode gastar sem contrapartida de receitas, mesmo quando os gastos são plenamente justificados. (...) O primeiro equívoco mantém o governo de mãos atadas diante do desemprego, da capacidade ociosa, da deterioração da infraestrutura, da falta de saúde, de saneamento e de segurança pública (RESENDE, 2019) Adicionalmente, em um cenário de rápido desenvolvimento tecnológico e maior competição econômica entre os países, uma política restritiva ou de desinvestimento em uma economia emergente poderia afetar seu desenvolvimento tecnológico, tornando-a menos competitiva. Sobre esse aspecto, Niosi e Faucher (1990) destacam que: : 40 As políticas estatais nos campos da indústria, tecnologia e finanças são orientadas no sentido de fortalecer a dotação nacional de fatores e prover uma estrutura de mercado ordenada, em que os recursos nacionais possam ser combinados para melhorar a competitividade internacional da economia (NIOSI e FAUCHER, 1990, p. 90). Ainda no que tange à ação estatal, os autores sustentam que: As principais razões para o subsidiamento público maciço à pesquisa e desenvolvimento são contribuir para o surgimento de campeões nacionais e defender a competitividade internacional da sua produção nacional (NIOSI e FAUCHER, 1990 p. 95-6). Com suas políticas, o Estado também tem grande papel na educação e formação de uma classe técnica e qualificada para o trabalho e inovação. A respeito disso, Niosi e Faucher (1990) apontam os exemplos de Japão, Coréia do Sul e Taiwan, os quais procuram perenemente inovação e formação de profissionais qualificados. Aliás, como percebido, em 2008 e em anos posteriores, em resposta à crise econômica internacional, gastos governamentais surgiram como uma necessidade a fim de se evitar problemas socioeconômicos maiores. Portanto: O aumento dos gastos públicos e, consequentemente, do déficit público tem como função essencial expandir a renda total da economia quando o nível de atividade não está suficientemente alto para empregar as pessoas dispostas a trabalhar (GALVÃO, 2020 p. 60). Ou seja, os gastos públicos têm a função de expandir a demanda (consumo) e/ou a oferta (produção e investimento), principalmente em momentos de fragilidade, crise ou incapacidade do setor privado, como proposto por Keynes: À medida que a renda real aumenta, tanto a pressão das necessidades atuais diminui quanto a margem em relação ao padrão de vida estabelecido se amplia. Quando a renda real diminui, ocorre o oposto. Assim, é natural — pelo menos em média na comunidade — que o consumo atual se expanda quando o emprego aumenta, embora em um montante menor do que o incremento total da renda real; e que diminua quando o emprego cai, mas em um montante inferior ao decremento total da renda real. Além disso, o que se aplica à média dos indivíduos é também provável que se aplique aos governos, especialmente em uma época em que um aumento progressivo do desemprego geralmente força o Estado a fornecer assistência por meio de recursos emprestados. (KEYNES, 2022, p. 130 – tradução nossa) 41 De modo contrário a Keynes (2022), Buchanan e Wagner (2000) defendem de regras fiscais claras e constitucionalizadas para garantir a responsabilidade orçamentária. Os autores argumentam que, sem regras formais, os políticos tendem a ceder às pressões por maiores gastos públicos e menores impostos, resultando em déficits fiscais permanentes. Nesse sentido, "os orçamentos não podem ser deixados à deriva no mar da política democrática. Devem ser construídos dentro de restrições que imponham forma e coerência externas" (BUCHANAN e WAGNER, 2000 p.125 - tradução nossa). Sendo assim, tais regras serviriam como uma barreira contra pressões por aumentos de gastos sem a contrapartida em receitas. Outro ponto favorável à ideia de responsabilidade fiscal é a do peso fiscal que futuras gerações poderiam herdar: O governo não deve gastar sem impor impostos; e o governo não deve colocar as gerações futuras em escravidão através do financiamento deficitário de despesas públicas destinadas a proporcionar benefícios temporários e de curta duração.(BUCHANAN e WAGNER, 2000 p.11 – tradução nossa) Todavia, futuras gerações poderiam se beneficiar de infraestrutura, emprego, e outros fatores de produção maiores em comparação aos do passado, incorrendo também em chances de PIBs mais elevados e, nessa lógica, dívida pública menor na razão PIB/dívida pública. Portanto, deve-se considerar o crescimento do PIB e demais fatores de uma economia através das despesas públicas, visto que o PIB não é estático e, ainda que por dívida, seu crescimento pode ser induzido como aponta Keynes (2022) pelo Estado e não necessariamente gerar benefícios apenas temporários, mas duradouros, haja vista os fatores de produção mencionados. Ademais, ao longo de sua história, a humanidade passou por inúmeras crises e, nesses períodos, todos os agentes são afetados tanto em sua capacidade de investimento quanto de consumo. Assim, cabe destacar o papel do Estado na promoção de crescimento, especialmente em momentos de incapacidade ou fragilidade do setor privado no que se refere a manutenção de investimentos, empregos, contratações e outros aspectos da vida socioeconômica. [...] nas crises econômicas é o governo quem socorre o sistema financeiro e não o contrário. Se durante as crises os governos monetariamente soberanos não encontram dificuldade em se financiar, seria curioso se tivessem dificuldades de fazê-lo em épocas de estabilidade e crescimento. 42 Os gastos do governo monetariamente soberano estão condicionados, apenas, por: i) suas próprias prioridades políticas; ii) por restrições de disponibilidade de recursos “reais” compráveis com a moeda do Estado; e iii) por restrições legais autoimpostas (CONCEIÇÃO e DALTO, 2022, p. 4). Os autores acima observam um aspecto a se considerar no que concerne ao financiamento do Estado, pois é sobre tal funcionamento que a ideia de ajustes fiscais se justificaria. Afinal, tendo soberania monetária e disponibilidade de recursos reais, o Estado não precisa de arrecadação ou de poupança de seus recursos. Quanto ao aspecto iii) do trecho acima, a EC 95/2016 corresponderia justamente a essa restrição legal, mas haveria motivos reais para sua adoção? Não podemos esquecer que o Estado gasta ou emite moeda antes de arrecadar, e não o contrário: “O Estado cria moeda e a entrega ao setor privado que somente então pode fazer pagamentos ao Estado, pagando impostos ou comprando dívidas remuneradas” (CONCEIÇÃO e DALTO, 2022, p. 25). Cabe ressaltar que, dada a explicação sobre financiamento e gasto estatal, Conceição e Dalto (2022) não defendem gastos irrestritos, pois: Isto não significa que não haja limites funcionais para o tamanho dos gastos estatais e que o desrespeito a tais limites não possa produzir desequilíbrios econômicos indesejáveis. Mas significa, simplesmente, que não há risco de esgotamento inevitável da capacidade estatal de seguir realizando seus pagamentos na moeda que somente o próprio Estado cria. Logo, resultados fiscais deficitários podem ser economicamente imprudentes por motivos outros, mas nunca por ameaçarem o equilíbrio orçamentário intertemporal do Estado (CONCEIÇÃO e DALTO, 2022, p. 12, grifos no original). A partir de então, partimos para um exemplo empírico sobre essa questão. Afinal, a pandemia do COVID-19 nos deixou lições sobre inúmeras esferas da vida e do funcionamento das relações em sociedade, inclusive no campo econômico. Durante a pandemia, o Governo Bolsonaro, subsequente ao de Temer “furou” o teto de gastos, contra sua vontade – dada sua matriz arqui-conservadora – pois basicamente não tinha como deixar o fazer, diante das necessidades da sociedade naquele período. Gastos foram promovidos além da regra fiscal estabelecida dentro de um contexto em que se preconizava necessidade de saneamento das contas públicas para, segundo esta vertente de ideias, evitar-se o “caos econômico”. 43 Porém, não ocorreram efeitos catastróficos, pelo contrário: os gastos do fora do teto de gastos, no período pandêmico, acabaram amortecendo os efeitos econômicos do coronavírus e do necessário lockdown (isolamento), por conta dele - fato esse que corrobora apontamentos anteriores sobre o papel do Estado em momentos de crise. Sobre os gastos além do permitido pela EC n°95/2016 em números, a “expansão dos gastos do governo em 2020 fez com que o déficit primário nominal chegasse a impressionantes 743 bilhões de reais.” (CONCEIÇÃO e DALTO, 2022, p. 10): É mais do que razoável, portanto, exigir que os defensores da austeridade fiscal expliquem como foi possível que um governo brasileiro, que estava supostamente esgotado fiscalmente, praticasse o maior déficit primário da sua história, ao mesmo tempo em que caíram tanto a taxa de juros referencial da economia como o custo médio da dívida pública federal (CONCEIÇÃO e DALTO, 2022, p. 10). Sobre isso, percebamos, no Gráfico 3, a variação da taxa de juros básica da economia brasileira (SELIC), de acordo com a última reunião de cada ano do Comitê de Política Monetária (COPOM), no período de 2015 a 2021. Fonte: elaboração própria, com base em dados de Banco Central do Brasil (2024). Cabe ressaltar que a pandemia teve influência na redução da taxa básica de juros em 2020, fechando o ano em 1,9%, resultado marcante, haja vista o histórico brasileiro de juros elevados, o que, possui peso nos índices macroeconômicos, pois a 0 2 4 6 8 10 12 14 16 2015 2016 2017 2018 2019 2020 2021 Gráfico 3 - Taxa SELIC - Fechamento Anual (2015-2021) - em % 44 elevação da SELIC aumenta o custo de financiamento da dívida pública, visto que parte da dívida é composta por títulos indexados na SELIC. Sendo assim, quando a taxa SELIC sobe, o governo se vê obrigado a desembolsar valores mais elevados para o pagamento dos juros, o que resulta em um crescimento acentuado da dívida pública. Além disso, taxas de juros mais altas tendem a desacelerar o ritmo de crescimento econômico, o que pode reduzir a arrecadação tributária e agravar o desequilíbrio fiscal. Consequentemente, a elevação da SELIC impõe uma pressão adicional sobre o orçamento público e pode levar ao aumento da relação dívida/PIB. A partir da amostra de resultados abordados por Conceição e Dalto (2022), no que tange à capacidade estatal de praticar gastos e não gerar inflação e elevação da taxa de juros, podemos retomar a observação feita por ambos autores no que se refere à austeridade refletindo sobre o endividamento público e regras rígidas para ele: teria sido econômica e socialmente viável respeitar o teto de gastos em meio a uma pandemia? Visto que, durante o período de lockdown em que muitas pessoas tiveram que parar de trabalhar, houve comprometimento da situação socioeconômica de uma grande parcela da sociedade e, sem os “furos do teto de gastos”, haveria impactos ainda maiores em aspectos como consumo, crescimento econômico, moradia, saúde, alimentação etc., dada a necessidade de respeitar o lockdown. Portanto, não “furar o teto” seria uma decisão condenatória para muitos brasileiros. Sobre os resultados macroeconômicos do período, estes nos mostram que políticas expansivas no campo fiscal podem ser promovidas, em cenários de crise, sem causar resultados macroeconômicos catastróficos. Na verdade, tais gastos podem ser favoráveis na medida em que ativam uma política anticíclica em um momento de crise. Para além do exemplo da pandemia do coronavírus, poderíamos ainda aprofundar certos aspectos da discussão sobre os impactos sociais de medidas como a do teto de gastos sobre os impactos na população de baixa renda principalmente, visto que: Os que estão mais acima na distribuição de renda e têm alternativas privadas (e mais deduções) são obviamente menos dependentes desses serviços, mas até eles acabarão por sentir as consequências dos cortes da despesa do Estado quando o impacto da austeridade subir na escala da distribuição do rendimento na forma de crescimento menor, de maior desemprego, de infraestruturas desgastadas e de 45 uma distribuição mais distorcida de recursos e oportunidades de vida (BLYTH, 2017). Ou seja, além do impacto social à população de baixa renda, há ainda o aspecto de redução da demanda por parte dessa parcela da população, o que, após certo tempo, também afeta a parcela da população com renda mais elevada (KALECKI, 1983). No Brasil, por exemplo, segundo a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS), desenvolvida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): Em 2019, ao buscarem atendimento de saúde, 76,5% das pessoas costumavam procurar o mesmo lugar, médico ou serviço de saúde, sendo que 69,8% delas procuram estabelecimentos públicos de saúde. Dentre os tipos de estabelecimentos indicados, a Unidade Básica de Saúde (UBS) foi a mais citada, com 46,8%, chegando a 55,3% no Norte e 54,1% no Nordeste (AGÊNCIA IBGE NOTÍCIAS, 2020). A pesquisa ainda concluiu que: Apenas 28,5% da população do país (59,7 milhões de pessoas) tinham algum plano de saúde, médico ou odontológico em 2019. Na população com rendimento mensal de até ¼ de salário mínimo, somente 2,2% tinham plano de saúde médico. Já na faixa de mais de cinco salários mínimos, 86,8% tinham plano (AGÊNCIA IBGE NOTÍCIAS, 2020). Dessa forma, limitar a certo nível o investimento estatal em serviços públicos pode ter impactos danosos principalmente entre os mais pobres, como no exemplo acima, ou em outras áreas, como: segurança, educação, lazer, cultura, meio ambiente, etc. Portanto, diante da configuração da sociedade brasileira e, de acordo com a argumentação de Mark Blyth (2017), seria possível produzir resultados de prosperidade e desenvolvimento econômico através de uma trava fiscal como o teto de gastos? A resposta parece ser indiscutivelmente negativa. 5.2 A reforma trabalhista Há uma tendência global de uma nova forma de trabalho, menos regulada, de menor rentabilidade e risco ao trabalhador, apontados como “empreendedor” (de si 46 mesmo) por alguns defensores dessa nova modalidade, conhecida de forma mais ou menos caricata como “uberização”9 do trabalho, na qual, além dos aspectos mencionados acima, as empresas acabam terceirizando sem custos a fiscalização destes trabalhadores “uberizados” (o termo plataformizados também pode ser usado) a partir de seus sistemas de avaliação (ABÍLIO, 2020). Um levantamento divulgado em 2023, do IBGE, em conjunto com a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e o Ministério Público do Trabalho (MPT) indica desigualdades quanto ao perfil dos trabalhadores “uberizados”, sendo 81,3% homens, 55,1% pretos ou pardos e 61,3% com ensino médio ou superior completo (CASTRO e LOPES, 2023). Há desigualdade em relação à remuneração também, trabalhadores “plataformizados”, no geral, ganham cerca de 37% a menos por hora em relação a trabalhadores em funções similares fora de plataformas digitais. Tal situação leva os trabalhadores “uberizados” a trabalharem mais horas, com isso, na média, ganham mais que seus similares, mas trabalham mais horas sem dispor de garantias no tocante a acidentes (CASTRO e LOPES, 2023). A reforma trabalhista de 201710, outra política defendida e executada no Governo Temer, intensifica, no Brasil, todo esse processo de abrangência internacional de transferências de riscos aos trabalhadores, precarização e desmonte de garantias legais, ou seja, de flexibilização das leis trabalhistas, pois: A reforma trabalhista estimula a terceirização ao (1) estabelecer maior distanciamento entre as responsabilidades legais do tomador do serviço e do contratante e (2) permitir que ocorra em qualquer nível de atividade (KREIN et al., 2018, p. 109). Nesse sentido, devemos levar em consideração a ampliação das formas atípicas de trabalho11 a partir da reforma trabalhista, seja pela terceirização mencionada acima, seja pelo estímulo à pejotização12, 9 Termos derivado do modelo de negócio da empresa Uber. Os trabalhadores da empresa trabalham de acordo com diretrizes de um aplicativo. O trabalhador “uberizado” não escolhe o valor do seu trabalho e assume os riscos por eventuais acidentes/danos envolvendo sua atividade. Em caso de impossibilidade de trabalhar por doenças, o trabalhador não recebe nenhum auxílio. Esse modelo tem se disseminado pelo mundo, sendo adotado por outras empresas 10 Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017. 11 Cabe salientar a aprovação pela Câmara dos Deputados e Senado da “Lei da Terceirização” (Lei n°13.429/217) sancionada pelo presidente Temer. Essa lei modifica a Lei n° 6.019/74, ampliando a terceirização para diversos setores. 12 Termo que se refere à prática de empresas contratarem trabalhadores como pessoas jurídicas (PJ), em vez de contratá-los como funcionários com carteira assinada (CLT). 47 [...] se, por um lado, a pejotização promove a perda de direitos, como horas extras remuneradas, intervalos e descanso remunerados, décimo terceiro salário, direitos e benefícios previdenciários; por outro, o não reconhecimento do vínculo empregatício e a transfiguração do trabalhador em uma empresa introduz a possibilidade de sua sobrevivência ser inteiramente atrelada às demandas do capital, em uma espécie de remuneração baseada no “salário por peça” (nos termos contemporâneos, “por metas” ou “por produto”), tornando, assim, a força de trabalho utilizável de acordo com as exatas necessidades do contratante no setor privado e também público (KREIN et al., 2018, p. 104). Além desses efeitos, devemos notar que “No perfil dos contratados por modalidade atípica, destacam-se os mais jovens e os que têm menor escolaridade, em comparação ao perfil dos contratados por prazo indeterminado.” (KREIN et al., 2018, p. 101). A reforma trabalhista, bem como a expansão de modalidades de trabalho atípicas, deixou postos de trabalho com garantias de benefícios extras, típicos de contratação formal, mais escassos (Simões, 2019). Logo, seja pela precarização para trabalhadores de diversos setores, seja pela ampliação das desigualdades, as reformas em curso no Brasil têm uma orientação neoliberal ao apostar no setor privado e na ênfase sobre o congelamento de gastos, como destacado em “Uma Ponte para o Futuro”, na PEC do “teto de gastos” e em uma política trabalhista menos regulamentada. Pois, essas políticas convergem para o que Dardot e Laval (2016), Howard e King (2008), Archela (2016) e Andrade (2019) caracterizam como neoliberalismo. Devemos ainda levar em consideração a ideia de competição espúria, presente em tais reformas, as quais conduzem a uma queda no padrão de vida de grandes parcelas da população e, consequentemente, do consumo, como forma de competitividade internacional. Portanto, o que ocorreu, de fato, foi um o enfraquecimento do poder dos trabalhadores, um crescimento de relações de trabalho informais e/ou processo de pejotização, com baixo crescimento econômico, como podemos ver no gráfico abaixo: 48 Fonte: Elaboração própria com base em Contas Nacionais Trimestrais, disponível em Agência IBGE Notícias. É necessário pensar os efeitos quantitativos das medidas de Temer (até onde o horizonte temporal nos permite atualmente) e contrastar os resultados alcançados aos professados pela equipe do governo de transição. Por exemplo, antes da reforma trabalhista, a equipe de transição anunciava a criação de seis milhões de empregos após a aprovação da reforma trabalhista, promessa esta não efetivada. Em 2019, em entrevista ao programa Roda Viva, da Cultura, o ex-presidente Temer foi questionado pela jornalista Maria Cristina Fernandes sobre os pífios efeitos da reforma trabalhista, em oposição ao que era afirmado acerca da geração de emprego, ao que Temer rebate que se não gerou empregos, serviu como contenção ao desemprego. Porém, a jornalista insiste na estimativa inicial, contrastada com o impacto pouco significativo no que se refere ao desemprego, ao que Michel Temer respondeu: É, estimou, mas estimou mal, não foi pela minha palavra. Na verdade, o que eu quis fazer foi modernizar a legislação trabalhista. Interessante, as forças motrizes do nosso sistema, são os trabalhadores e os empresários, você sabe que muito empresário, Cristina, você sabe melhor do que eu, eles não queriam investir temerosos das chamadas reclamações trabalhistas, não é? E na verdade isso diminuiu em cerca de 40 % as reclamações trabalhistas, ou seja, reduziu a litigiosidade social entre trabalhador e empregador, primeiro ponto. O segundo ponto é que isso incentiva o investimento. Em terceiro ponto, porque quando eu digo isto as pessoas dizem “Temer, vem cá, você acabou com os direitos dos trabalhadores” Eu digo: desculpe, não quero chama-lo de ignorante, mas basta ler o artigo 7° da Constituição Federal, para verificar que todos os direitos estão elencados no artigo 7°, e nenhuma lei infraconstitucional, e a 2015 2016 2016 2018 2019 2020 2021 PIB -3,5 -3,3 1,3 1,8 1,2 -3,9 4,6 -5 -4 -3 -2 -1 0 1 2 3 4 5 6 V a ria çã o (% ) Gráfico 4 - PIB (Preços de Mercado) - Variação contra o ano anterior (%) 49 reforma é lei infraconstitucional, pode modificar esses direitos. Os direitos mantidos, e a possibilidade de produção tendo significativamente aumentado (RODA VIVA, 2019). Há, acima, um ponto mencionado pelo ex-presidente e realmente observado na realidade: a redução das reclamações trabalhistas. Poderíamos relembrar a discussão aqui já empreendida a respeito da deterioração do poder dos trabalhadores. Sobre os números dos anos subsequentes à reforma trabalhista, de 2017, neste ano, a taxa de desemprego era de 12,7%, caindo discretamente para 12,3%, em 2018, e 11,9%, em 201913. Todavia, em 2019: A informalidade – soma dos trabalhadores sem carteira, trabalhadores domésticos sem carteira, empregador sem CNPJ, conta própria sem CNPJ e trabalhador familiar auxiliar – atingiu 41,1% da população ocupada, o equivalente a 38,4 milhões de pessoas, o maior contingente desde 2016. (AGÊNCIA IBGE NOTÍCIAS, 2020) A informalidade cresceu, além disso, em 2024, segundo pesquisa da FGV, 67,7% dos trabalhadores autônomos alegaram desejar emprego com carteira assinada.14 Cabe ressaltar que a pandemia do COVID-19 fez a taxa de desemprego crescer novamente, em 2020, atingindo 13,5%.15 Contudo, a esse crescimento devemos atribuir o impacto da pandemia na economia no que a postos de trabalhos, visto a necessidade do lockdown. Durante o programa Roda Viva, antes de encerrar o bloco em que Michel Temer dá a resposta anteriormente citada, a coordenadora da entrevista, Daniela Lima, comenta sobre “Uma Ponte para o Futuro” na seguinte e marcante frase “a ex- Presidente achou que era um gesto de oposição e o mercado achou que era uma carta de compromisso”. Interessante, portanto, pensar nesta ideia de carta de compromisso e relacioná-la aos anseios de certos grupos sociais (“o mercado”) e ao tipo de estrutura socioeconômica preferida por estes, no caso, ajuste fiscal com menor regulação trabalhista. 13 Agência IBGE Notícias. Desemprego cai para 11,9% na média de 2019; informalidade é a maior em 4 anos. Rio de Janeiro, 31 jan. 2020. 14 SOBRINHO, Wanderley Preite. 7 anos após reforma trabalhista, 70% dos informais querem carteira assinada UOL.São Paulo, 26 de ago. 2024. 15 BRASIL, Cristina Indio do. Desemprego registrou taxa média de 13,5% em 2020: pandemia provocou a alta do desemprego no mercado de trabalho. Agência Brasil, Rio de Janeiro, 10 mar. 2021. 50 A partir da EC 95/2016, da reforma trabalhista e dos pontos expressos no “Uma Ponte para o Futuro” (2015), torna-se evidente a ideia da busca por dinamismo econômico através da desregulamentação econômica e de políticas fiscais restritivas. Ao somarmos tais reformas e ideias com o tripé macroeconômico praticado no Brasil, desde 1999 – constituído de câmbio flexível, metas de inflação e busca por superávit primário – constrói-se um cenário limitado no campo fiscal para políticas industrializantes ou de construção de infraestrutura, inclusive no que se refere aos investimentos em serviços básicos e políticas sociais. A reforma trabalhista, de 2017, mal completa sete anos, à época da escrita desta dissertação. Contudo, a EC 95/2016 já não existe mais, substituída pelo arcabouço fiscal do novo Governo Lula. 51 6 CONCLUSÃO O Governo Temer com suas reformas deu novo fôlego ao neoliberalismo no Brasil. Desde o conteúdo da plataforma política do PMDB (atual MDB), “Uma ponte para o futuro”, até a EC 95/2016 (teto de gastos) e a aprovação da reforma trabalhista (Lei nº 13.467/2017), percebemos uma convergência com os pressupostos neoliberais. A reforma trabalhista não só flexibilizou as relações de trabalho, como também priorizou acordos individuais sobre as convenções coletivas, enfraquecendo o papel dos sindicatos, especialmente com o fim da obrigatoriedade da contribuição sindical. Essa reforma favoreceu modalidades de trabalho como o temporário, intermitente e autônomo, que oferecem menos garantias em comparação ao regime tradicional da CLT. Isso resultou em uma precarização das relações trabalhistas, ampliando o número de trabalhadores sem direitos como férias remuneradas e seguro- desemprego. O teto de gastos, embora não tenha sido plenamente aplicado e não exista mais, foi concebido com o intuito de controlar as despesas primárias, congelando-as nos patamares de 2016, sendo corrigidas apenas pela inflação. A medida visava limitar os gastos públicos por 20 anos, o que, na prática, com o crescimento populacional, levaria à redução proporcional dos investimentos em áreas essenciais, como saúde e educação. Essa política, vista com otimismo pelo mercado financeiro, como destacado por Linhares e Gervasoni (2022), acabava impondo barreiras ao crescimento dos gastos sociais. O documento "Uma ponte para o futuro" promovia, como explorado no segundo capítulo, uma visão de que a iniciativa privada com o princípio da concorrência seria mais eficiente do que o Estado, ao qual se atribuiu a responsabilidade por crises econômicas. O texto reforça uma crítica às despesas públicas, sobretudo aquelas ligadas a programas sociais, mas sem oferecer justificativas claras ou especificações de quais programas eram disfuncionais ou ineficientes. Tal narrativa defende a diminuição do papel do Estado na economia, alinhando-se aos princípios neoliberais de menor intervenção estatal e foco no mercado como defendiam Hayek (2002) e Friedman (1990). O projeto neoliberal iniciado no Governo Temer não se encerrou com a saída de Michel Temer da presidência, visto que seu sucessor, Jair Bolsonaro, assumiu a 52 tarefa de continuar com o projeto de “Uma ponte para o futuro”, ao aprovar a reforma da previdência (Emenda Constitucional 103/2019) também defendida em “Uma ponte para o futuro”. Todavia, essa reforma não faz parte do objeto de análise deste texto. No campo político, seja na regra fiscal (EC 95/2016), seja em “Uma ponte para o futuro”, fica evidente o peso atribuído ao Estado no sentido de gestor ineficiente e gerador de crises. Juntamente com isso, há a “demonização da política”, intensificada nos anos mais recentes: a demonização da política é fruto de uma estratégia bem montada das elites (desconfiança/suspeita generalizada da política, polarização da sociedade, desqualificação e eliminação do adversário) para manter mais facilmente seu domínio e seus privilégios na sociedade e impedir qualquer reforma social, por mínima que seja (AQUINO JÚNIOR, 2022, grifos no original). Ao retornarmos ao ponto da demonização da política como algo estratégico, Tiburi (2018) concorda com Aquino Júnior, no sentido de ser um processo guiado pelas elites e enaltecer o papel da economia sobre a política: essa “noção ruim da política” não se deve apenas à corrupção e ineficiência de alguns políticos, mas também a uma estratégia que visa enfraquecer a política e subordiná-la à economia (AQUINO JÚNIOR, 2022, grifos no original). Ainda sobre esse aspecto: a economia é idealizada como uma ciência que atende apenas a fórmulas matemáticas. Um saber “neutro” que independe de opções políticas. Mais uma mistificação. Esconde-se a política, mais uma vez, onde ela é essencial. Não há economia desassociada de opções políticas. A grosso modo, é a política que vai definir o crescimento econômico ou a recessão, se o dinheiro estatal vai ser investido em proveito do povo ou se a política econômica vai atender ao desejo de enriquecimento ilimitado daqueles que já são muito ricos. Subjaz a esse processo um maniqueísmo, como se a política fosse o mal e a economia fosse um bem, uma solução final (TIBURI, 2018). Neste sentido, para alguns, o “Neoliberalismo é a busca do desencantamento da política pela economia” (Davies, 2014, apud ANDRADE, 2019, p. 228). Assim, vários aspectos do período apontam para um processo de neoliberalização do Brasil a partir do Governo Temer. 53 Futuras investigações acadêmicas poderão dispor de resultados mais concretos dado uma maior vigência temporal da Lei nº 13.467/2017. Em outros trabalhos, poderá haver também a necessidade de analisar outras regras fiscais, como por exemplo, o Novo Arcabouço Fiscal, do Ministro da Fazenda Fernando Haddad. E, tendo em vista o distanciamento histórico, bem como políticas similares às analisadas neste trabalho, pesquisas futuras poderão levantar outras questões sobre o período de análise ou mesmo tirar outras conclusões. Desse modo, espera-se que este trabalho possa contribuir para trabalhos similares, seja sobre o período abordado, seja sobre períodos em que medidas neoliberais são colocadas como respostas a situações de crise. 54 REFERÊNCIAS ABÍLIO, Ludmila C. Uberização: A era do trabalhador just-in-time? Revista de Estudos Avançados, São Paulo, v. 34, n. 98, p.111-126, 2020. DOI: 10.1590/s0103- 4014.2020.3498.008. Agência IBGE Notícias. Desemprego cai para 11,9% na média de 2019; informalidade é a maior em 4 anos. Rio de Janeiro, 31 jan. 2020. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de- noticias/noticias/26741-desemprego-cai-para-11-9-na-media-de-2019-informalidade- e-a-maior-em-4-anos Acesso em: 08 de jun. de 2024 Agência IBGE Notícias. Em 2017, PIB cresce 1,3% e chega a R$ 6,583 trilhões. Estatísticas econômicas. 08/11/2019. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de- noticias/releases/25921-em-2017-pib-cresce-1-3-e-chega-a-r-6-583-trilhoes Agência IBGE Notícias: PIB cresce 4,6% em 2021 e supera perdas da pandemia. Editoria: Estatísticas Econômicas. 04/03/2022. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-agencia-de- noticias/noticias/33066-pib-cresce-4-6-em-2021-e-supera-perdas-da-pandemia Agência IBGE Notícias. PNS 2019: sete em cada dez pessoas que procuram o mesmo serviço de saúde vão à rede pública. Editoria: Estatísticas Sociais. 04/09/ de setembro de 2020. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia- sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/28793-pns-2019-sete-em-cada- dez-pessoas-que-procuram-o-mesmo-servico-de-saude-vao-a-rede-publica ANDRADE, Daniel Pereira. O que é o neoliberalismo? A renovação do debate nas ciências sociais. Revista Sociedade e Estado – Volume 34, Número 1, Janeiro/Abril 2019 AQUINO JÚNIOR, Francisco de. A quem interessa a demonização da política? Instituto Humanitas Unisinos, 2022. Disponível em: https://www.ihu.unisinos.br/categorias/620737-a-quem-interessa-a-demonizacao-da- politica ARCHELA, Danielle Cristina Guizzo. Keynes, keynesian economics and the political economy of Power of the postwar world. Tese de Doutorado. Universidade Federal do Paraná. Curitiba. 2016. BANCO CENTRAL DO BRASIL (BCB). Vários dados. Disponível em: https://www.bcb.gov.br/controleinflacao/historicotaxasjuros BASTOS, Pedro Paulo Zahluth. Ascensão e crise do governo Dilma Rousseff e o golpe de 2016: poder estrutural, contradição e ideologia Rev. Econ. Contemp., núm. esp., 2017: elocation - e172129, p. 1-63 55 BIANCARELLI, André. ROSSI, Pedro. Do industrialismo ao financismo. Revista Política Social e Desenvolvimento. 13 A Virada Neoliberal do Governo Dilma. ano 03 Jan. 15. BLYTH, M. Austeridade: a história de uma ideia perigosa. Tradução: Freitas e Silva. Autonomia Literária, 2017, São Paulo, para a presente edição. Mark Blyth 2013 BRASIL 247, Temer desiste do slogan “vamos tirar o Brasil do vermelho”. Brasil 247, 01 de outubro de 2016. Disponível em: https://www.brasil247.com/poder/temer- desiste-do-slogan-vamos-tirar-o-brasil-do-vermelho BRASIL Constituição (1988). Emenda Constitucional n°241, de 15 de jun. de 2016. Disponível em: https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1468431& filename=PEC%20241/2016 BRASIL, Cristina Indio do. Desemprego registrou taxa média de 13,5% em 2020: pandemia provocou a alta do desemprego no mercado de trabalho. Agência Brasil, Rio de Janeiro, 10 mar. 2021. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2021-03/desemprego-registrou- taxa-media-de-135-em- 2020#:~:text=A%20taxa%20m%C3%A9dia%20de%20desemprego,s%C3%A9rie%2 0hist%C3%B3rica%20iniciada%20em%202012. Acesso em 08 de jun. de 2024 BRASIL. Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017. Altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015- 2018/2017/lei/L13467.htm. Acesso em: 12 out. 2024. BRASIL. Portal Brasileiro de Comércio Exterior. Dados consolidados. 2024 Disponível em: https://balanca.economia.gov.br/balanca/publicacoes_dados_consolidados/pg.html. BUCHANAN, James M.; WAGNER, Richard E. Democracy in Deficit: The Political Legacy of Lord Keynes. Indianapolis: Liberty Fund, 2000. Disponível em: https://oll.libertyfund.org/titles/wagner-democracy-in-deficit-the-political-legacy-of- lord-keynes. CARCANHOLO, Marcelo Dias. Conteúdo e Forma da crise atual do capitalismo: lógica, contradições e possibilidades. Crítica e sociedade: revista de cultura política, v.1, n.3, ed. Especial, dez. 2011. CARVALHO, Laura. Valsa brasileira: do boom ao caos econômico. São Paulo: Todavia. 2018 CASTRO, Mayra; LOPES, Letícia. Pesquisa inédita do IBGE mostra que Brasil tem 2,1 milhões de trabalhadores por aplicativo. Jornal o Globo. Rio de Janeiro, 2023. Disponível em: https://oglob