Humberto Regis de Paula Faleiros Retalho Retroauricular em ilha a pedículo superior. Estudo anatômico e novos conceitos Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Cirurgia, Área de Concentração em Bases Gerais da Cirurgia e Cirurgia Experimental da Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP, para obtenção do título de Mestre. Orientador: Prof. Dr. Fausto Viterbo de Oliveira Neto Co-orientadores (França): Prof. Dr. Jacques Baudet e Prof. Dr. Vincent Casoli Botucatu – SP 2003 Dedicatória FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA SEÇÃO DE AQUIS. E TRAT. DA INFORMAÇÃO DIVISÃO TÉCNICA DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAÇÃO - CAMPUS DE BOTUCATU - UNESP BIBLIOTECÁRIA RESPONSÁVEL: Elza Numata Faleiros, Humberto Regis de Paula. Retalho retroauricular em ilha a pedículo superior. Estudo anatômico e novos conceitos / Humberto Regis de Paula Faleiros. – 2003. Dissertação (mestrado) – Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista, 2003. Orientador: Fausto Viterbo de Oliveira Neto Assunto CAPES: 40102149 1. Face - Cirurgia CDD 617.520592 Palavras-chave: Retalho retroauricular; Vasos temporais superficia is; Vasos auriculares; Pavilhão auricular; Reconstrução facial Dedicatória Dedicatória Dedicatória edico este trabalho à minha filha Mariana, única razão de minha luta diária pela vida, pela felicidade e pelo sucesso. DD Agradecimentos Agradecimentos os Professores Fausto Viterbo, Jacques Baudet e Vincent Casoli, pelos conselhos e orientações na elaboração deste trabalho; Ao pessoal do laboratório de anatomia da Faculadade de Medicina Victor Pachon, da Universidade de Bordeaux II, pela gentileza e disponibilidade; Ao meu amigo Dr. Vincent Pistré, pela sua ajuda incansável na elaboração do trabalho em língua francesa; Aos meus pais, Maria Daise e José Faleiros, pelo apoio e formação durante toda a minha vida; E a Mariângela, minha esposa, pelo apoio indispensável durante a minha carreira e quando da realização deste trabalho. AA Sumário Sumário 1. Introdução ................................................................................... 09 2. Histórico ...................................................................................... 14 2.1. Retalho retroauricular a pedículo inferior .............................. 15 2.2. Retalho retroauricular a pedículo superior ........................... 17 3. Bases anatômicas ...................................................................... 27 3.1. Vascularização cutânea ....................................................... 28 3.2. O “SCALP” ......................................................................... 34 3.3. Vasos temporais superficiais ............................................... 49 3.3.1. Artéria temporal superficial ........................................ 49 3.3.2. Drenagem venosa da região temporal ....................... 51 3.4. Vasos auriculares posteriores .............................................. 52 3.4.1. Artéria auricular posterior ........................................... 52 3.4.2. Veias auriculares posteriores ..................................... 54 3.5. Vasos auriculares anteriores ................................................. 55 4. Objetivos ..................................................................................... 57 5. Método ......................................................................................... 59 5.1. Sistema Temporal Superficial ................................................ 60 5.2. Sistema Auricular Posterior ................................................... 62 5.3. Metodologia Estatistica .......................................................... 64 6. Resultados................................................................................... 66 6.1. Artéria temporal superficial .................................................. 67 6.2. Artéria auricular posterior ..................................................... 86 6.3. Drenagem venosa da região temporal ............................... 89 6.3.1. Coletor venoso têmporal-parietal .............................. 89 6.3.2. Coletor venoso retroauricular .................................... 94 6.4. Vascularização do pavilhão auricular após a elevação do retalho .................................................................................. 96 7. Dissecção do retalho .................................................................. 98 8. Discussão .................................................................................... 108 9. Conclusão ................................................................................... 124 10. Referências bibliográficas ....................................................... 126 11. Resumo ...................................................................................... 143 12. Abstract ..................................................................................... 145 13. Anexo ......................................................................................... 147 Introdução 9 Introdução Introdução 10 1. INTRODUÇÃO O retalho retroauricular é bem conhecido em cirurgia reparadora, tanto na sua versão loco-regional pediculada, como na sua versão livre. Trata-se de um retalho cutâneo da região retroauricular e mastoidiana. Suas características, como sua espessura, textura e coloração, assim como sua área doadora com poucas seqüelas cicatriciais visíveis, orientam este retalho como uma excelente opção em reconstrução facial1-17. A pele das regiões retroauricular e mastoidiana é vascularizada principalmente pelos vasos auriculares posteriores1-21. Assim, o retalho retroauricular deve ser baseado nos vasos auriculares posteriores ou, a fluxo retrógrado, nos vasos temporais superficiais, apoiando-se no fato da existência de anastomoses entre os vasos temporais superficiais e auriculares posteriores. Esse retalho, apesar de seu nome, não é estritamente um retalho retroauricular, pois a pele da região mastoidiana pode ser igualmente incluída. Sua extensão cutânea pode incluir toda a pele da região retroauricular e mastoidiana, podendo se extender, posteriormente, até 2 cm para dentro da linha do cabelo1,2,6,7,14 e, inferiormente, até 2 cm abaixo do lóbulo da orelha, na região cervical1-4,6,7,15,17, embora esta área possa apresentar deficiência circulatória (considerada randomizada). Sua dimensão máxima já descrita é de 12 por 7 cm17 (Fig. 1). Introdução 11 FIGURA 1 - Dimensões do retalho retroauricular. A área cutânea pode incluir toda a região retroauricular e mastoidiana. A pele da região cervical (em cinza) é considerada de risco (randomizada). (Martin D. Evolution des techniques de transfert. Nouvelles autoplasties décrites pendant cette période. In 1984-1994: dix ans de lambeaux cutanés, 40e Congrès de la Société Française de Chirurgie Plastique, Reconstructrice et Esthétique, Paris; 1995. p. 527-82). Introdução 12 A área doadora deve ser enxertada com pele total ou parcial. Por isso, no momento da elevação do retalho, a preservação do pericôndrio auricular posterior e do periósteo mastoidiano é mandatória. Apesar de algumas complicações na área doadora, como perda de pequenas áreas de enxerto18, o resultado estético é considerado excelente na grande maioria dos casos1-21. O retalho retroauricular baseado nos vasos temporais superficiais é considerado um retalho cutâneo a fluxo retrógrado1,2,7,8,14. Ele já foi descrito com pedículo baseado no ramo frontal da artéria temporal superficial3,4,6,9, com o objetivo de aumentar o seu comprimento e atingir o terço médio e a região mediana da face. Seu pedículo pode ser cutâneo1-4,6,7,9 (nesses casos, um segundo tempo cirúrgico é necessário para a secção do pedículo) ou fascio-subcutâneo, incluindo o tecido subcutâneo e a fáscia têmporo-parietal8,10,14. Esse retalho também já foi descrito de maneira livre, reanastomosando os vasos temporais superficiais14,17. O retalho a pedículo superior pode ser considerado como um retalho randomizado, pois as anastomoses entre os sistems temporal superficial e auricular posterior não são descritas de maneira sistemática e sua grande largura em relação ao seu comprimento demonstra este princípio. Introdução 13 O retalho retroauricular baseado nos vasos auriculares posteriores é um retalho cutâneo axial a fluxo anterógrado e já foi descrito de maneira pediculada e microcirúrgica5,13,14,17,18. O retalho retroauricular pode ser composto, com a inclusão de cartilagem do pavilhão auricular, geralmente da concha1- 6,13,17,21. Ele já foi empregado principalmente nas reconstruções de cabeça e pescoço para a reconstrução nasal, do terço superior e médio da face, mucosa oral, preenchimento da cavidade orbitária e reconstrução traqueal1-21. Em 1996, Song et al16 descreveram o retalho retroauricular em ilha e a fluxo retrógrado baseado no ramo frontal da artéria temporal superficial, porém, incluindo no pedículo, o ramo auricular superior da artéria temporal superficial. Este é um novo princípio do retalho retroauricular a pedículo superior, agora considerado um retalho axial. 14 Histórico Histórico 15 2. HISTÓRICO A idéia de utilizar a pele retroauricular e mastoidiana como um retalho segue duas correntes quanto ao pedículo: Pedículo inferior: retalho a fluxo anterógrado, baseado nos vasos auriculares posteriores5,11,13,14,18,21, iniciada por Fujino et al, em 19765. Pedículo superior: retalho a fluxo retrógrado, baseado nos vasos temporais superficiais1-4,6,14,16, iniciada por Washio, em 19691; 2.1. RETALHO RETROAURICULAR A PEDICULO INFERIOR Em 1976, Fujino et al5 descreveram o retalho retroauricular axial a fluxo anterógrado baseado no eixo vascular principal retroauricular, ou seja, artéria e veias auriculares posteriores. Esse retalho foi utilizado de maneira livre na reconstrução do nariz. Em 1987, Kolhe & Leonard11,18 descreveram o retalho retroauricular, pediculado e em ilha, baseado nos vasos auriculares posteriores, com dissecção cervical extensa. Os autores transferiram 12 retalhos para a reconstrução da cavidade oral, sendo onze pediculados e um livre, em que todos sobreviveram completamente. Porém, foram Histórico 16 observadas quatro complicações na área doadora, sendo três exposições de cartilagem e uma paralisia facial completa com recuperação total ao final de 6 meses. Seguindo a mesma corrente, Park13, em 1989, realizou estudo anatômico dos vasos auriculares posteriores. Baseado nesse estudo, transferiu com sucesso o retalho retroauricular composto condrocutâneo a fluxo anterógrado para a reconstrução do nariz. O autor relata que, para diminuir as seqüelas estéticas cervicais, ele prefere a utilização do retalho de maneira microcirúrgica, porém, a dissecção cervical limitada reduz o comprimento do pedículo e o diâmetro dos vasos. Mais recentemente, Kobayashi et al14, em 1995, utilizaram o retalho retroauricular (baseado tanto no pedículo auricular posterior quanto no pedículo temporal superficial) na reconstrução pré-auricular, fronto-temporal e superciliar em sete pacientes. O retalho foi transferido de maneira livre em seis casos (em dois casos utilizando o pedículo temporal superficial e em quatro casos o pedículo auricular posterior) e de maneira pediculada em ilha em um caso, segundo a técnica de Guyuron8, que descreveremos na sequência. Na sua transferência pediculada, os autores relatam sofrimento venoso, havendo a necessidade da realização subseqüente de anastomose microcirúrgica venosa na urgência para evitar a perda do retalho. Histórico 17 Ninkovic et al17, em 1998, utilizaram o retalho retroauricular livre para a reconstrução da região perinasal e nasogeniana. Os autores realizaram o maior retalho retroauricular já descrito (12 por 7 cm) com anastomoses arterial e venosa nos vasos auriculares posteriores e no ramo parietal dos vasos temporais superficiais. Os resultados foram julgados excelentes. Duas razões talvez expliquem a baixa popularidade desse retalho a pedículo inferior. Aprimeira seria a pouca extensão de seu pedículo5,13, não permitindo atingir o terço superior e a região mediana da face. Pode-se estender a dissecção aos níveis mais baixos do pescoço a fim de aumentar o comprimento do pedículo e o transferir em ilha18. Porém, a dissecção se torna difícil e aumentam-se os riscos de lesão do nervo facial18 e de seqüelas estéticas na região cervical13. Além disso, nas transferências microcirúrgicas, as dificuldades são ligadas ao pequeno diâmetro e à variabilidade do pedículo, sobretudo do ponto de vista venoso, causas principais dos insucessos5,13,18. 2.2. RETALHO RETROAURICULAR A PEDICULO SUPERIOR A utilização do retalho retroauricular a fluxo retrógrado começa com Washio, em 19691. Este autor descreveu o retalho cutâneo têmporo-retroauricular, pediculado na artéria e veia temporais superficiais, incluindo no pedículo a pele e a fáscia têmporo-parietais de toda a porção Histórico 18 cutânea elevada (Fig. 2). Washio realizou estudo anatômico e arteriográfico em 2 cadáveres frescos bilateralmente, demonstrando a existência de numerosas conexões vasculares entre os sistemas temporal superficial e retroauricular, principalmente através do ramo parietal dos vasos temporais. Assim, descreveu um retalho da região aurículo- mastoidiana, pediculado nos vasos temporais superficiais, com um pedículo amplo (6 cm) na região têmporo-parietal, incluindo, na sua profundidade, a fáscia têmporo-parietal e a gálea. O autor apresentou com sucesso duas aplicações clínicas, uma na reconstrução da porção distal do nariz e outra na reconstrução da região frontal. Em 1972, Washio2 publicou sua experiência na utilização desse retalho em 11 pacientes para a reconstrução do nariz, da região frontal e da pálpebra inferior. Como complicações, obteve uma necrose total do retalho devido à trombose da artéria temporal superficial. O autor discute ainda a possibilidade de inclusão da cartilagem auricular na porção profunda do retalho. Em 1982, Maillard & Montandon7, publicaram sua experiência com o retalho têmporo-retroauricular de Washio1,2. Eles utilizaram o retalho cutâneo e condrocutâneo na reconstrução da região geniana, da pálpebra inferior, da ponta nasal (columela, asa e septo nasais) e na reconstrução das perdas parciais e totais do nariz. Os autores relataram necrose marginal de meio centímetro em um caso e discutiram sobre a boa segurança do retalho e sua qualidade nas reconstruções faciais. Histórico 19 Em 1985, Van der Meulen19,20 utilizou o retalho de Washio1,2 na reconstrução da cavidade orbitária após a exenteração do globo ocular. O autor salientou a boa qualidade deste retalho em reconstruções faciais. Porém, relatou um caso de necrose parcial do retalho devido a sofrimento venoso, em que o pedículo foi desepidermizado. FIGURA 2 - Retalho de Washio1,2: retalho cutâneo têmporo-retroauricular a fluxo retrógrado pediculado nos vasos temporais superficiais, incluindo, no pedículo, a pele e a fáscia têmporo- parietal. (Washio H. Retroauricular-temporal flap. Plast Reconstr Surg 1969; 43: 162-6). Histórico 20 Em 1971, Orticochea3 descreveu um retalho condrocutâneo a fluxo retrógrado, incluindo a pele da região aurículo- mastoidiana e a concha auricular, pediculado no ramo frontal da artéria e veia temporal superficial. O autor descreveu o retalho em três etapas. A primeira foi a autonomização do retalho, deixando-o pediculado na região frontal e retroauricular. Uma transposição dos vasos temporais superficiais foi realizada, seccionando-os na região pré-auricular e suturando-os na face profunda do retalho, a fim de aumentar sua vascularização. A segunda etapa foi a transposição do retalho para a área receptora e a terceira, a secção do pedículo. As complicações encontradas foram edema do retalho no pós-operatório, podendo persistir por alguns meses e a contratura da pele do retalho na área receptora. FIGURA 3 - Retalho de Orticochea3: retalho retroauricular condrocutâneo a fluxo retrógrado transferido em três etapas e pediculado no ramo frontal da artéria temporal superficial. (Orticochea M. A new method for total reconstruction of the nose: the ears as donor areas. Br J Plast Surg 1971; 24: 225-32). Histórico 21 Galvão, em 19816, também descreveu um retalho retroauricular cutâneo e condrocutâneo a fluxo retrógrado de maneira semelhante a Washio1,2 e Orticochea3,4, porém pediculado nos vasos temporais superficiais contralaterais (Fig. 4). Este autor provou a existência de anastomoses entre os dois vasos temporais superficiais e também descreveu a transposição do retalho em três etapas. A primeira foi a autonomização do retalho, porém sem fazer a transposição dos vasos temporais superficiais como preconizado por Orticochea3,4. A segunda foi a transposição do retalho com um pedículo amplo, incorporando toda a região fronto-parietal até a região temporal contralateral e, a terceira, a secção do pedículo. O autor descreve a utilização do retalho em oito casos clínicos com duas complicações, uma necrose total, atribuída a múltiplas cicatrizes no couro cabeludo, e uma necrose parcial com evolução favorável. Ele ressalta a excelente qualidade da pele aurículo-mastoidiana para a reconstrução facial, a possibilidade de elevar um retalho condrocutâneo para a reconstrução do nariz e o grande comprimento do pedículo, atingindo facilmente a região cervical. Como inconvenientes, relata ser um procedimento longo em três etapas e haver problemas de sofrimento venoso em alguns casos. Utilizando o mesmo princípio de Galvão6, Dias & Chhajlani9 descreveram o mesmo retalho em dois tempos operatórios, ou seja, sem o tempo da autonomização. Os autores reportaram cinco casos clínicos com três necroses distais dos retalhos. Histórico 22 FIGURA 4 - O retalho de Galvão6. Retalho retroauricular cutâneo e condrocutâneo a fluxo retrógrado em três etapas, de maneira semelhante a Washio1,2 e Orticochea3,4. Este retalho é pediculado nos vasos temporais superficiais contralaterais. (Galvao MSL. A postauricular flap based on the contralateral superficial temporal vessels. Plast Reconstr Surg 1981; 68: 891-97). Histórico 23 Até o momento, os retalhos descritos a pedículo superior foram transpostos em no mínimo dois tempos cirúrgicos. O principal inconveniente foi a necessidade de um tempo operatório suplementar para a secção do pedículo do retalho. Alguns anos mais tarde, Guyuron8, em 1985, descreveu o retalho retroauricular a fluxo retrógrado e em ilha, pediculado nos vasos temporais superficiais. Um triângulo de pele da região temporal foi desepidermizada até seis centímetros acima do sulco auricular superior, seguindo o trajeto do ramo parietal da artéria temporal superficial, incluindo este ramo no pedículo fasciosubcutâneo juntamente com suas veias comitantes (Fig. 5). O autor se apoiou no fato da existência de anastomoses entre o ramo parietal e os vasos auriculares posteriores. A dissecção chegou até abaixo do arco zigomático para aumentar o comprimento do pedículo. O pedículo foi transposto pelo subcutâneo. O autor descreveu oito casos clínicos, com necrose cutânea de três a quatro milímetros em somente um caso. Ele ressaltou a qualidade da pele para a reconstrução facial, descrevendo como possível complicação a lesão do ramo frontal do nervo facial. Em 1995, Kobayashi et al14 utilizaram o retalho de Guyuron8 de maneira livre na reconstrução facial. Nos dois casos descritos, os autores relataram a necessidade de anastomose da veia auricular posterior devido ao sofrimento venoso quase sistemático do retalho. Histórico 24 Koshima et al21 também utilizaram o retalho condrocutâneo retroauricular a pedículo superior de maneira livre para a reconstrução traqueal, em dois casos, com sucesso. Porém, descreveram um caso de congestão venosa no pós-operatório. FIGURA 5 - Retalho de Guyuron8 : retalho retroauricular a fluxo retrógrado e em ilha, pediculado nos vasos temporais superficiais. Um triângulo de pele é desepidermizado na região temporal até 6 cm acima do sulco auricular superior, incluindo no pedículo o ramo parietal da artéria temporal superficial. (Guyuron B. Retroauricular island flap for eye socket reconstruction. Plast Reconstr Surg 1985; 76: 527-30). Histórico 25 Até o presente momento, todos os retalhos descritos a pedículo superior podem ser considerados randomizados, pois as anastomoses entre os vasos auriculares posteriores e temporais superficiais não foram descritas de maneira sistemática e clara, não sendo possível a dissecção de um pedículo vascular. Logo, o raio tissular que engloba o pedículo deve ser largo, a fim de reunir as anastomoses vasculares. Daí o alto índice de sofrimento vascular relatado pela maioria dos autores, sobretudo venoso. A grande dispersão dos sistemas de drenagem venosa no raio tissular elevado e a ausência de um eixo vascular definido a seguir durante a dissecção são alguns dos problemas. Em 1996, Song et al16 descreveram um retalho cutâneo retroauricular a fluxo retrógrado pediculado no ramo frontal da artéria temporal superficial, porém com um novo princípio jamais descrito até o momento, ou seja, a inclusão no pedículo do ramo auricular superior da artéria temporal superficial. Os autores realizaram estudo anatômico em que a artéria auricular superior foi encontrada de maneira constante. Ela se dirige para a região superior da hélice auricular e está sempre acompanhada de uma veia comitante. Possui calibre médio de meio a um milímetro e se anastomosa com a artéria auricular posterior. A técnica de elevação deste retalho impõe a dissecção dos vasos temporais superficiais, que são ligados abaixo da emergência dos vasos auriculares superiores. A dissecção segue o ramo frontal da artéria temporal superficial, que é o pedículo do retalho. O retalho é Histórico 26 vascularizado pelas anastomoses existentes entre o ramo frontal e os vasos supra-orbitários e supra-trocleares (Fig. 6). Os autores realizaram sete retalhos na reconstrução facial com sucesso, apesar de edema prolongado em alguns casos. Outra crítica a este retalho é o sacrifício dos dois eixos vasculares do pavilhão auricular (vasos temporais superficiais e auriculares posteriores), o que poderia, teoricamente, em alguns casos, acarretar a necrose do pavilhão. FIGURA 6 - Retalho de Song et al16 : retalho cutâneo retroauricular a fluxo retrógrado, pediculado no ramo frontal da artéria temporal superficial, incluindo no pedículo a artéria auricular superior, um vaso constante que se anastomosa com a artéria auricular posterior. (Song R, Song Y, Qi K, Jiang H, Pan F. The superior auricular artery and retroauricular arterial islands flaps. Plast Reconstr Surg 1996, 98: 657-667). 27 Bases anatômicas Bases Anatômicas 28 3. BASES ANATÔMICAS 3.1. VASCULARIZAÇÃO CUTÂNEA A vascularização cutânea tem sido alvo de inúmeros estudos, principalmente nos últimos trinta anos, após a descrição dos primeiros retalhos axiais. Entre outros, merecem destaque os trabalhos de Manchot22 e Salmon23. Essas obras permaneceram quase esquecidas até meados dos anos 70, quando a descrição dos primeiros retalhos axiais livres24,25 desencadeou um novo interesse pelo estudo da vascularização cutânea26-30. Na década de 80, um novo conceito de retalho foi introduzido, que foram os retalhos pediculados em vasos septocutâneos26,30. Esses vasos foram os mais estudados durante os últimos anos e vários retalhos, seja a fluxo anterógrado ou retrógrado, foram descritos seguindo esse princípio31-33. Classicamente, existem 4 tipos de artérias que se destinam à vascularização cutânea34 (Fig. 7): Artérias cutâneas diretas, que se destinam diretamente à pele, partindo da artéria principal ou secundária; Artérias fasciocutâneas, que podem ser longitudinais ou transversais (septocutâneas) e atingem a pele através do septo muscular; Bases Anatômicas 29 Artérias musculocutâneas, ou perfurantes musculocutâneas, que perfuram o músculo para atingir a pele; Artérias neurocutâneas, que acompanham os nervos sensitivos cutâneos. Todas estas artérias dão origem a retalhos correspondentes: retalho cutâneo (artéria cutânea direta), retalho fasciocutâneo (artéria fasciocutânea), retalho musculocutâneo (artéria perfurante musculocutânea) e retalho neurocutâneo (artéria neurocutânea). Todas estas artérias nutrem, de maneira variável, a pele, formando inúmeros plexos vasculares que se anastomosam entre si (Fig. 7). Os plexos cutâneos são os seguintes (partindo da superfície para a profundidade)34: Plexos dérmico e sub-dérmico, alimentados pelas artérias sagitais e longitudinais das artérias cutâneas diretas e indiretas; Plexos supra e sub-fascial, alimentados pelas artérias perfurantes músculo, fascio e septo-cutâneas, sendo o plexo supra-fascial o mais rico e com maior número de anastomoses. Bases Anatômicas 30 FIGURA 7 - Vascularização cutânea. A) Corte longitudinal. B) Corte tranversal. 1. Artéria principal ou secundária. 2. Artéria cutânea direta. 3. Artéria muscular. 4. Perfurantes musculocutâneas. 5. Perfurantes septocutâneas. 6. Artéria fasciocutânea longitudinal. 7. Rede anastomótica sub-aponeurótica. 8. Rede anastomótica supra- aponeurótica. 9. Artéria recorrente de Shäfer. 10. Plexo anastomótico hipodérmico. 11. Plexo anastomótico sub-dérmico. 12. Plexo anastomótico supra-dérmico. E: epiderme. D: derme. H: hipoderme. F : fáscia superficial. A : aponeurose (fáscia profunda). M : músculo. (Cariou JL. Les progrès et évolutions conceptuels ou évolution des concepts vasculaires, des classifications et des concepts cliniques. In 1984-1994: dix ans de lambeaux cutanés, 40e Congrès de la Société Française de Chirurgie Plastique, Reconstructrice et Esthétique ; 1995. Paris :Societé Francaise de Chirurgie Plastique; 1995. p. 447-525). Bases Anatômicas 31 A vascularização venosa foi menos estudada que a arterial devido principalmente à sua variabilidade e complexidade. Porém, podemos também isolar as diferentes fontes de retorno venoso (da superfície à profundidade) (Fig. 8): Rede hipodérmica superficial; Rede hipodérmica média; Rede hipodérmica profunda; Rede peri-fascial. As redes superficiais drenam para as veias segmentares profundas e para a rede peri-fascial. Esta última comunica-se com a rede suprajacente para drenar nas veias profundas musculocutâneas, fasciocutâneas e septocutâneas (Fig. 8). Bases Anatômicas 32 FIGURA 8 - Drenagem venosa cutânea. 1. Rede hipodérmica superficial. 2. Rede hipodérmica média. 3. Veia segmentar superficial. 4. Veia segmentar profunda. 5. Rede venosa peri-aponeurótica ou peri-fascial. 6. Anastomose profunda trans-fascial. 7. Veia profunda. E : epiderme. D : derme. H : hipoderme. F : fáscia superficial. A : aponeurose (fáscia profunda). M : músculo. (Cariou JL. Les progrès et évolutions conceptuels ou évolution des concepts vasculaires, des classifications et des concepts cliniques. In 1984-1994: dix ans de lambeaux cutanés, 40e Congrès de la Société Française de Chirurgie Plastique, Reconstructrice et Esthétique ; 1995. Paris :Societé Francaise de Chirurgie Plastique; 1995. p. 447-525). Com um melhor conhecimento da vascularização cutânea, alguns autores tentaram elaborar uma classificação dos retalhos cutâneos mais abrangente que as já existentes, como é o caso de Cormack & Lamberty26, Nakajima30 e Taylor35 (Fig. 9). No que diz respeito ao retalho retroauricular, podemos classificá-lo como um retalho cutâneo1-21, pois as artérias temporal superficial e auricular posterior são consideradas artérias cutâneas diretas36. Bases Anatômicas 33 FIGURA 9 - Classificação dos retalhos fasciocutâneos segundo Cormack & Lamberty26. Tipo A: o retalho é pediculado e sua base contém inúmeras arteríolas fasciocutâneas longitudinais, orientadas segundo o eixo do retalho. Tipo A modificado (A’) : o mesmo retalho tipo A, porém a pedículo fascio-subcutâneo. Tipo B : o retalho pode ser pediculado ou livre, dependendo de um único pedículo cutâneo-aponeurótico. No tipo B modificado (B’), o pedículo pode ser isolado na sua origem na artéria fasciocutânea, na altura do tronco principal, permitindo a transferência livre. Tipo C : retalho pediculado ou livre a meso-vascular, em que a ilha cutânea é vascularizada por múltiplas pequenas artérias perfurantes, provenientes de uma artéria principal de trajeto septocutâneo. Tipo D : uma extensão do tipo C, porém com retalhos compostos osteomiofasciocutâneos. (Cariou JL. Les progrès et évolutions conceptuels ou évolution des concepts vasculaires, des classifications et des concepts cliniques. In 1984-1994: dix ans de lambeaux cutanés, 40e Congrès de la Société Française de Chirurgie Plastique, Reconstructrice et Esthétique ; 1995. Paris :Societé Francaise de Chirurgie Bases Anatômicas 34 Plastique; 1995. p. 447-525). 3.2. O “SCALP” É uma região formada por diversas camadas de tecido. Seus limites são os seguintes37: Anterior: margem supra-orbital, inferiormente ao processo zigomático do osso frontal; Lateral: margem superior do arco zigomático e do conduto auditivo externo; Posterior: passa superiormente à inserção dos músculos esternocleidomastóideo e trapézio, até a linha superior da nuca. As camadas do “scalp”: São em número de cinco e assim denominadas: S: “Skin” (pele); C: “Subcutaneous tissue” (tecido subcutâneo); A: “Aponevrosis and muscle” (aponeurose e músculo); L: “Loose areolar tissue” (tecido frouxo areolar); P: “Pericranium” (pericrânio). Bases Anatômicas 35 No “scalp” existe uma região bastante particular, a região temporal, onde ocorre uma mudança anatômica de camadas e, por essa razão, merece uma discussão mais aprofundada. A região temporal é a região situada na parte lateral do crânio, limitada, ao alto e posteriormente, pela linha curva temporal superior, inferiormente pelo arco zigomático e, anteriormente, pela apófise orbitária externa e a margem póstero-superior do osso zigomático ou malar39. Esta região delimita uma fossa, a fossa temporal, onde podemos identificar também diversas camadas de tecido (Fig. 10), que são as seguintes (da superfície para a profundidade): Pele; Fáscia têmporo-parietal ou temporal superficial; Fáscia inominada; Aponeurose do músculo temporal, fáscia temporal ou fáscia temporal profunda; Músculo temporal; Pericrânio. Bases Anatômicas 36 FIGURA 10 - Anatomia da região temporal, corte coronal. 1. Tecido celular subcutâneo. 2. Fáscia têmporo-parietal. 3. Fáscia temporal. 4. Folheto superficial da fáscia temporal. 5. Folheto profundo da fáscia temporal. 6. Camada gordurosa temporal superficial. 7. Músculo temporal. 8. Camada gordurosa temporal profunda. 9. Pericrânio. (*). Fáscia inominada. STA: atéria temporal superficial. MTA(m): ramo muscular da artéria temporal média (seccionado). MTA(f): ramo fascial da artéria temporal média. DTA: artérias temporais profundas. ZOA: ramo zigomático-orbitário. MMA: artéria meníngea média. TFA: artéria facial transversa. AZ: arco zigomático. CM: côndilo mandibular. Observar as anastomoses entre os vasos das quatro camadas (músculo temporal, fáscia temporal, fáscia inominada e fáscia têmporo-parietal) a aproximadamente 2 cm abaixo da linha curva temporal superior (A). (Nakajima H, Imanishi N, Minabe T. The arterial anatomy of the temporal region and the vascular basis of various temporal flaps. Br J Plast Surg 1995; 48: 439-50). O músculo temporal é um músculo plano que participa da Bases Anatômicas 37 função mastigatória. Ele se origina na linha curva temporal inferior e do terço superior da face interna da aponeurose temporal e está situado entre o pericrânio e a aponeurose que o recobre. Suas fibras convergem inferiormente para se inserir na apófise coronóide da mandíbula. Sua vascularização é totalmente independente da fáscia têmporo-parietal que recobre sua aponeurose, sendo vascularizado por 3 pedículos vasculares dominantes, fontes de duas artérias diferentes: as artérias temporais profundas anterior e posterior (ramos da artéria maxilar interna) e a artéria temporal média, ramo da artéria temporal superficial, além de inúmeros pedículos acessórios provenientes da artéria temporal superficial e seus ramos terminais40,41. Os ramos temporais profundos emergem da artéria maxilar interna e circulam na face profunda do músculo. Esses ramos são os responsáveis pela vascularização dos dois terços anteriores do músculo. A artéria temporal média origina-se da artéria temporal superficial abaixo do arco zigomático, cruzando este último para então se aprofundar em direção ao músculo. Na sua porção terminal se divide em dois ramos, um ramo fascial, que caminha abaixo da aponeurose do músculo temporal, e um ramo muscular, que circula na face profunda do músculo e se anastomosa com os ramos temporais profundos. A artéria temporal média é a responsável pela vascularização do terço posterior do músculo37,38,40,41. Existem inúmeras anastomoses entre estes vasos, Bases Anatômicas 38 formando uma verdadeira rede anastomótica no interior do músculo temporal (Fig. 10 e 11). O retalho do músculo temporal já foi descrito e utilizado para a reanimação da face em pacientes com paralisia facial43-46 e para a reconstrução craniofacial como meio de cobertura de feridas40,41,47-49. FIGURA 11 - Arteriografia da rede vascular do músculo temporal, mostrando as anastomoses entre as artérias temporais profundas (DTA) e a artéria temporal média (MTA), na superfície profunda do músculo. (Nakajima H, Imanishi N, Minabe T. The arterial anatomy of the temporal region and the vascular basis of various temporal flaps. Br J Plast Surg 1995; 48: 439-50). A aponeurose do músculo temporal (ou fáscia temporal Bases Anatômicas 39 profunda ou simplesmente fáscia temporal) recobre o músculo temporal. Acima da linha curva temporal inferior o músculo termina, porém a aponeurose continua até sua inserção na linha curva temporal superior. A partir daí, a aponeurose prossegue com o pericrânio superiormente37,38. No seu terço inferior ela se divide em dois folhetos, um superficial e um profundo, que se inserem na margem lateral e medial do arco zigomático, respectivamente. Entre os dois folhetos, encontramos uma pequena camada de tecido adiposo, chamada de gordura temporal superficial42,50. Entre o folheto profundo e o músculo temporal, encontramos outra camada de tecido adiposo, a gordura temporal profunda, que prossegue na face com a chamada “bola de Bichat”37,42,50. A aponeurose do músculo temporal é vascularizada pelo ramo fascial da artéria temporal média e por alguns ramos provenientes das artérias zigomático-facial, zigomático-temporal e transversa da face42. Essas artérias também se anastomosam entre si, formando uma rede vascular entre os dois folhetos da aponeurose41,42 (Fig. 10 e 12). Bases Anatômicas 40 FIGURA 12 - Arteriografia da rede anastomótica da fáscia temporal, formada pelo ramo fascial da artéria temporal média (MTA) e ramos das artérias zigomático-temporal (ZTA), zigomátido-facial (ZFA) e transversa da face (TFA). 1 e 2: ramos terminais do ramo fascial da artéria temporal média (MTA). (Nakajima H, Imanishi N, Minabe T. The arterial anatomy of the temporal region and the vascular basis of various temporal flaps. Br J Plast Surg 1995; 48: 439-50). Bases Anatômicas 41 Em 1986, Casanova et al51 descreveram a fáscia inominada (ou fáscia sub-galeal de Hong-Kong, ou espaço de Merckel). Trata-se de uma fina camada de tecido intercalada entre a aponeurose do músculo temporal, abaixo, e a fáscia têmporo-parietal, acima. Essa estrutura anatômica foi descrita somente na região temporal. Na região parietal ela prossegue com o espaço sub-galeal37,38,42,52-54. Anteriormente, se prolonga com a fáscia profunda do músculo orbicular dos olhos e, lateralmente, se insere na margem superior do arco zigomático37-39. Na sua porção inferior, encontramos uma camada de tecido adiposo que se prolonga, na face, com o tecido adiposo encontrado abaixo dos músculos da expressão facial e o sistema músculo-aponeurótico superficial (SMAS)42. Acima da linha curva temporal superior, o espaço sub-galeal é vascularizado por ramos da artéria temporal superficial (ramos descendentes) e ramos da artéria meníngea média (que perfuram a calota craniana inferiormente). Abaixo da linha curva temporal superior, a fáscia inominada recebe ramos das artérias temporal superficial, zigomático- orbitária e ramos fasciais da artéria temporal média42,51, formando uma outra rede vascular nessa região (Fig. 10 e 13). Essa fáscia já foi utilizada como retalho local e microcirúrgico para a reconstrução facial, reconstrução de orelha, preenchimento de seio frontal e para a cobertura de mão52,54. Bases Anatômicas 42 FIGURA 13 - Arteriografia da fáscia inominada mostrando sua vascularização proveniente dos ramos oblíquos e descendentes das artérias temporal superficial e zigomático-orbitária (1) e ramos descendentes perpendiculares da artéria temporal superficial (2). A artéria temporal média também participa da vascularização, mas não está ilustrada na figura. (Nakajima H, Imanishi N, Minabe T. The arterial anatomy of the temporal region and the vascular basis of various temporal flaps. Br J Plast Surg 1995; 48: 439-50). Bases Anatômicas 43 Acima da fáscia inominada e abaixo da hipoderme, existe um tecido denominado fáscia têmporo-parietal ou fáscia temporal ou fáscia temporal superficial. Consiste de uma fina lâmina de tecido conjuntivo que contém os vasos temporais superficiais na sua espessura (Fig. 10). Anteriormente, a fáscia se prolonga com o músculo frontal, superiormente, com a gálea e, posteriormente, com o músculo occipital. Inferiormente, se prolonga com o sistema músculo-aponeurótico superficial (SMAS) anteriormente ao conduto auditivo externo, e com o músculo auricular posterior e fáscia cervical superficial, posteriormente ao conduto auditivo externo. A vascularização da fáscia têmporo-parietal é bastante rica e proveniente da artéria temporal superficial e seus ramos terminais, frontal e parietal, que caminham na sua face profunda na região zigomática. Esses vasos se tornam mais superficiais à medida que se dirigem à região parietal e formam outra rede anastomótica vascular37- 39,42,51-56 (Fig. 14). Essa fáscia também já foi utilizada como retalho local e microcirúrgico fascial ou fasciocutâneo para a reconstrução facial (órbito- palpebral, pavilhão auricular e orofaringe) e para a reconstrução dos membros superiores e inferiores55,57-65. Bases Anatômicas 44 FIGURA 14 - Esquerda: arteriografia da pele e fáscia têmporo-parietal mostrando sua vascularização e sua rica rede anastomótica. Direita: retalho de fáscia têmporo-parietal pediculado na artéria temporal superficial. STA: artéria temporal superficial. TFA: artéria temporal transversa. ZOA: ramo zigomático-orbitário. SOA: artéria supra- orbitária. ZTA: artéria zigomático-temporal. ZFA: artéria zigomático-facial. S: tecido celular subcutâneo. FTP (verde): fáscia têmporo-parietal. FI: fáscia inominada. OP: osso parietal. FT: fáscia temporal. TM: músculo temporal. (Nakajima H, Imanishi N, Minabe T. The arterial anatomy of the temporal region and the vascular basis of various temporal flaps. Br J Plast Surg 1995; 48: 439-50). Bases Anatômicas 45 Todas estas redes vasculares presentes nas camadas muscular, aponeurótica, sub-galeal e fáscia têmporo-parietal comunicam- se entre si através de ramos verticais, principalmente no terço superior da região temporal, 1,5 a 2 cm, inferiormente à linha curva temporal superior41,42 (Fig. 10 e 15). Este dado anatômico permite a confecção de vários retalhos compostos nessa região (Fig. 16 e 17), a fluxo anterógrado ou retrógrado, pediculados nos vasos temporais superficiais, através da fáscia têmporo-parietal, ou seja, retalhos compostos de fáscia e músculo, fáscia e osso parietal, ou mesmo os três associados40-42,49,51,54,66-76. Bases Anatômicas 46 FIGURA 15 - Arteriografia da região temporal (fáscia temporal, fáscia inominada e fáscia têmporo-parietal), demonstrando o plexo vascular vertical (setas brancas) que faz a comunicação vascular entre as diversas camadas de tecido dessa região, principalmente 2 cm inferiormente à linha curva temporal superior (LCTS). STA: artéria temporal superficial. (Nakajima H, Imanishi N, Minabe T. The arterial anatomy of the temporal region and the vascular basis of various temporal flaps. Br J Plast Surg 1995; 48: 439-50). Bases Anatômicas 47 FIGURA 16 - Fotografia e desenho das comunicações vasculares da região têmporo-parietal. I) Anastomoses entre os ramos das artérias temporais profundas (A: amarelo) e os ramos da artéria temporal superficial (B: laranja) na altura da fáscia inominada, permitindo a elevação de um retalho da fáscia inominada pediculado nos vasos temporais superficiais (II). III) Anastomoses entre a artéria meningea média (B: amarelo) e a artéria temporal superficial (A: laranja) na altura do osso parietal, permitindo a elevação também de um retalho composto com osso parietal pediculado nos vasos temporais superficiais (IV). STA: artéria temporal superficial. FTP: fáscia têmporo-parietal. FI: fáscia inominada. OP: osso parietal. TM: músculo temporal. (Casanova R, Cavalcante D, Grotting JC, Vasconez LO, Psillakis JM. Anatomic basis for vascularized outer-table calvarial bone flaps. Plast Reconstr Surg 1986; 78: 300-308). Bases Anatômicas 48 FIGURA 17 - I) Dissecção mostrando as anastomoses verticais principalmente a 2 cm inferiormente à linha curva temporal superior. II) Estas anastomoses permitem a elevação de um retalho de músculo temporal a fluxo retrógrado, pediculado na fáscia têmporo-parietal e vasos temporais superficiais. FTP: fáscia têmporo- parietal. FI: fáscia inominada. MT: músculo temporal. STA: artéria temporal superficial. OP: osso parietal. S: tecido celular subcutâneo. (Nakajima H, Imanishi N, Minabe T. The arterial anatomy of the temporal region and the vascular basis of various temporal flaps. Br J Plast Surg 1995; 48: 439-50). Bases Anatômicas 49 3.3. VASOS TEMPORAIS SUPERFICIAIS 3.3.1. Artéria temporal superficial A artéria temporal superficial já foi alvo de inúmeros estudos anatômicos por diversos autores22,23,77,78. É um dos dois ramos terminais da artéria carótida externa, possuindo diâmetro médio de 2,4 mm (2,2 a 2,8 mm) na sua origem39. Nasce da carótida externa na altura da margem posterior do colo do côndilo mandibular e se dirige superficial e superiormente para se tornar subcutânea em um ponto bem definido por Eustathianos77, entre 4 e 5 mm anteriormente ao trago, sobre uma linha que une a margem superior do conduto auditivo externo à parte média da margem superior da órbita. Após a sua emergênica, dá origem a alguns ramos: Artéria transversa da face, que caminha no interior da glândula parótida e contribui na sua vascularização; Artéria temporal média, que se origina na altura do trago e se aprofunda na direção do músculo temporal, participando de sua vascularização; Artéria zigomático-orbitária, que se direciona à região zigomático-orbitária, para vascularizar a pele dessa região. Em alguns casos essa artéria pode originar-se do ramo frontal da artéria temporal superficial; Bases Anatômicas 50 Artérias auriculares anteriores. São em número de três e caminham em direção ao pavilhão auricular, participando de sua vascularização. Após cruzar o arco zigomático, a artéria temporal superficial se divide em dois ramos terminais: ramo parietal, ou posterior, e ramo frontal, ou anterior. Em aproximadamente 10% dos casos, esta divisão é baixa (ocorre abaixo do arco zigomático) e, em 90% dos casos, a divisão é alta, ocorrendo superiormente ao arco zigomático78,79. Inicialmente, a artéria temporal superficial caminha na porção profunda da fáscia têmporo-parietal, tornando-se mais superficial à medida que se aproxima da região parietal, onde seus ramos terminais se arborizam no tecido subcutâneo53. O ramo parietal se dirige para cima em direção ao vértex. Durante o seu trajeto, emite alguns ramos oblíquos descendentes que se dirigem à região mastoidiana, anastomosando-se com os ramos terminais, ipsilaterais, da artéria auricular posterior e occipital. Seus ramos terminais também se anastomosam com os ramos frontais ipsilaterais, e ramos das artérias occipitais, frontais e parietais contralaterais1,2,6,8,39. O ramo frontal se dirige à região frontal, passando, aproximadamente, a dois centímetros do supercílio79. Na região frontal, emite alguns ramos que se anastomosam com ramos terminais das Bases Anatômicas 51 artérias supra-orbitária e supra-troclear ipsi e contralaterais e ramos da artéria frontal contralateral. Após estas anastomoses, o ramo frontal se orienta em direção ao vértex para se anastomosar com ramos terminais da artéria occipital e artéria parietal ipsi e contralaterais. 3.3.2. Drenagem venosa da região temporal A rede vascular venosa desta região também já foi tema de inúmeros estudos anatômicos. Porém, sua grande variabilidade torna difícil um delineamento anatômico preciso39. Os coletores venosos da região temporal drenam em direção às veias temporal superficial e auricular posterior80,81. Na região têmporo-parietal, o principal coletor venoso é representado pelo coletor têmporo-parietal. Trata-se de uma veia de grosso calibre que acompanha o ramo parietal da artéria temporal superficial. Recebe afluentes venosos anteriores, provenientes da rede venosa frontal, e afluentes venosos póstero-superiores, representados pelas veias da região parietal, occipital e aurículo-mastoidiana. O coletor têmporo-parietal drena para a veia temporal superficial que, por sua vez, termina em confluência com a veia maxilar interna. Segundo Sandre80, o principal coletor é representado pela veia temporal superficial em 60% dos casos, pela veia retroauricular em 10% dos casos e, em 30% dos casos, existe um equilíbrio de drenagem entre os dois coletores. Bases Anatômicas 52 Na região frontal, segundo Delgove et al81, não existe uma veia frontal que segue o trajeto do ramo frontal arterial. A drenagem venosa desta região é menos desenvolvida que a região posterior têmporo-parietal. Em 58% dos casos, existe na região têmporo-frontal, não somente uma veia única, mas sim diversos afluentes venosos que se anastomosam entre si formando uma verdadeira rede venosa nessa região que circunda o ramo frontal arterial. Em 34% dos casos, uma única veia frontal é encontrada na região temporal alta, que também, por sua vez, não segue o ramo frontal arterial, e drena no coletor têmporo-parietal. Em 8% dos casos, esta região é muito pobre em veias e a drenagem venosa é assegurada pela veia zigomático-orbitária. Como a rede arterial, a rede venosa também possui inúmeras anastomoses com os sistemas venosos da vizinhança, representados pelos coletores venosos têmporo-parietal contralateral, supra-orbitário, auricular posterior e occipital81. 3.4. VASOS AURICULARES POSTERIORES 3.4.1. Artéria auricular posterior A artéria auricular posterior é um ramo da artéria carótida externa que emerge acima dos músculos digástrio e estilohióideo. Caminha sobre a superfície destes músculos, no interior da glândula parótida, passando sob o processo estilóide e cruzando o nervo facial para atingir o sulco auricular posterior, entre a cartilagem do conduto Bases Anatômicas 53 auditivo externo e a mastóide11,15,82. Seu diâmetro na origem é de 1 a 2 mm82. Durante o seu trajeto, a artéria auricular posterior emite alguns ramos: Ramos para os músculos estilohióideo, digástrico e esternocleidomastóideo; Ramos para a glândula parótida; Um ramo que penetra o forame estilomastóideo para participar da vascularização da mastóide; Após a sua emergência no sulco auricular posterior, a artéria auricular posterior emite um ramo para a região mastoidiana, que tem um trajeto ascendente e posterior, anastomosando-se com a artéria occipital e com os ramos descendentes da artéria parietal. No sulco auricular posterior, essa artéria emite também três a quatro ramos para a superfície posterior do pavilhão auricular23,82,83, sendo um ramo inferior (ramo para o lóbulo da orelha), um médio e outro superior. Esses ramos, sobretudo o inferior, emitem por sua vez, alguns outros ramos que penetram e transfixam a cartilagem auricular, participando da vascularização da pele da superfície anterior do pavilhão auricular82. A artéria auricular posterior continua seu trajeto superior no sulco auricular posterior onde termina, seja no próprio sulco, seja na região têmporo-parietal, onde se anastomosa com ramos da artéria parietal e da artéria auricular superior, ramos diretos da artéria temporal superficial82. Bases Anatômicas 54 3.4.2. Veias auriculares posteriores As veias auriculares posteriores também apresentam maior variabilidade anatômica que as artérias, dificultando uma classificação. Classicamente, existem dois caminhos de drenagem venosa na região aurículo-mastoidiana82: 1) Uma veia superficial. A mais calibrosa, presente em 55% dos casos, segundo Park et al82, localizada na região mastoidiana. Segundo esses autores, esta veia apresenta três tipos de distribuição: a) Distribuição longitudinal na região mastoidiana, anastomosando-se com as veias comitantes auriculares posteriores ou terminando diretamente na veia jugular externa. b) Distribuição superior na região mastoidiana, drenando para o sistema temporal superficial. c) Distribuição inferior sobre a superfície posterior do lóbulo da orelha e drenagem na veia retromandibular. 2) Duas veias comitantes, que são constantes, seguem o trajeto da artéria no sulco auricular posterior e são de menor calibre que a veia superficial. Segundo Kolhe & Leonard11, estas veias drenam na veia jugular externa em 92% dos casos, na veia jugular posterior em 4% dos casos e na veia jugular interna nos outros 4% dos casos. Bases Anatômicas 55 3.5. VASOS AURICULARES ANTERIORES Os vasos auriculares anteriores foram alvo de poucos estudos anatômicos no decorrer da história. A maioria dos livros de anatomia os descrevem de maneira simples, mais didática que científica84-88. Foram Salmon23 e Testut83 que demonstraram algum interesse e realizaram alguns estudos sobre estes vasos. Com a evolução e a descrição dos retalhos axiais, alguns autores realizaram estudos anatômicos desses vasos, pesquisando a possibilidade de novas áreas doadoras de retalhos axiais para a reconstrução facial e do pavilhão auricular16,79,89-91. Os vasos auriculares anteriores são em número de três, inferior, médio e superior. São ramos diretos da artéria temporal superficial e participam da vascularização da superfície anterior e posterior do pavilhão auricular. Park et al90, em 1992, descreveram três tipos de distribuição dos vasos auriculares anteriores: em 27% dos casos, os vasos inferior e médio emergem de um tronco único; em 27% os três vasos emergem de um tronco único; e, em 44% dos casos, cada vaso tem a sua origem distinta. Os autores descrevem uma comunição a pleno canal entre o ramo auricular superior e a artéria auricular posterior, demonstrando a importância da artéria auricular posterior na vascularização da superfície anterior do pavilhão auricular. Bases Anatômicas 56 O ramo auricular superior foi o alvo de maiores estudos anatômicos entre os ramos auriculares anteriores. Um retalho condrocutâneo da hélice auricular, pediculado nesta artéria, foi descrito para a reconstrução do nariz por Parkhouse & Evans89, em 1985. Estes autores realizaram, com sucesso, duas transferências livres desse retalho. Mais recentemente, Bakhach et al79, em 1999, transferiram esse retalho pediculado em forma de ilha e a fluxo retrógrado, pediculado no ramo frontal da artéria temporal superficial, para a reconstrução nasal em sete pacientes, com sucesso. Em 1996, Song et al16 descreveram o retalho retroauricular em ilha e a fluxo retrógrado, baseado igualmente neste vaso, via ramo frontal da artéria temporal superficial. O retalho foi utilizado em sete pacientes para a reconstrução nasal. Segundo esses autores, o ramo auricular superior possui calibre de 0,2 a 1mm e caminha sobre a margem superior da hélice, contornando-a. Durante o seu trajeto, abandona vários ramos para a superfície anterior do pavilhão e continua na região retroauricular para se anastomosar a pleno canal com a artéria auricular posterior16,90,91. Nos estudos de Parkhouse & Evans89, a artéria auricular superior foi encontrada em 90% dos casos. Já Park et al90, Song et al16 e Bakhach et al79 encontraram o vaso em todas as suas dissecções. Segundo Parkhouse & Evans89, Song et al16 e Bakhach et al79, existe sempre uma ou duas veias comitantes que acompanham a artéria. 57 Objetivos Método 58 4. OBJETIVOS Os objetivos deste trabalho foram: 1) Estudar os vasos temporais superficiais, auriculares anteriores e auriculares posteriores; 2) Pesquisar as anastomoses vasculares entre os sistemas temporal superficial e auricular posterior. 3) Estudar o prejuízo funcional (vascular) na área doadora (pavilhão auricular) na elevação do retalho a pedículo superior. 4) Estabelecer, de maneira prática, a técnica de elevação do retalho retroauricular axial em ilha a pedículo superior. Método 59 Método Método 60 5. MÉTODO Foram utilizados 15 cadáveres, sendo sete formolizados e oito frescos. A média de idade dos cadáveres foi de 78,53 ± 13,38 anos (69,86 – 87,21). Seis cadáveres do sexo feminino (40% dos casos) e nove do sexo masculino (60% dos casos) constituíram o grupo de estudo (tabela 1). As dissecções foram realizadas no Laboratório de Anatomia médico-cirúrgica da Faculdade de Medicina Victor Pachon da Universidade de Bordeaux II, na cidade de Bordeaux, na França. Em todos os casos, os sistemas temporal superficial e auricular posterior foram dissecados. As anastomoses entre estes sistemas foram identificadas e as medidas seguintes foram realizadas: 5.1. SISTEMA TEMPORAL SUPERFICIAL a) Nível de emergência, no plano da fáscia têmporo- parietal, da artéria temporal superficial, em relação à margem superior do trago. Essa medida foi realizada sobre a linha C, uma linha tangente ao ponto mais Método 61 anterior do trago e perpendicular à linha B (descrita no item d) (Fig. 18); b) Nível de divisão entre os dois ramos terminais da artéria temporal superficial: ramos frontal e parietal. Divisão alta: acima do arco zigomático; e divisão baixa: sobre ou abaixo do arco zigomático. A presença e a origem do ramo zigomático-orbitário foram também observadas; c) Distância entre o ramo frontal e a margem superior do supercílio, medida tomada sobre a linha A, uma linha paralela à linha mediana, passando pela comissura externa do olho (Fig. 18); d) Distância, medida sobre a linha B (linha passando pela comissura externa do olho e pelo sulco auricular superior), entre o ponto mais anterior do sulco auricular superior e o ramo arterial mais volumoso na região mastoidiana (Fig. 18); e) Tipos de emergência dos ramos auriculares anteriores, se emergiam separadamente ou em tronco único; f) Nível de emergência do ramo auricular superior em relação à margem superior do trago, medida sobre a linha C. A distribuição dos vasos auriculares superiores, a presença de anastomoses entre estes vasos e os vasos auriculares posteriores e a medida Método 62 do calibre destes vasos na sua origem foram também observados. 5.2. SISTEMA AURICULAR POSTERIOR a) Distribuição destes vasos na região aurículo- mastoidiana e identificação das anastomoses entre este sistema e o sistema temporal superficial. b) Distância do ponto mais anterior do sulco auricular posterior até o ramo arterial mastoidiano mais calibroso, medido sobre a linha B (Fig. 18) Nos oito cadáveres frescos, as artérias carótidas comuns foram dissecadas, reparadas e canuladas com cânula plástica número 18. O sistema arterial foi lavado com água em alta pressão, sendo a água injetada do lado direito e recolhida do lado esquerdo até o clareamento do líquido recolhido. Após a lavagem, foram realizadas injeções com corante de azul de metileno, látex colorido em azul de metileno e com a solução radiopaca de Rees & Taylor92 (solução à base de óxido de chumbo aquecida a 50°C), como descrito a seguir: UM CADAVER (2 LADOS): Injeção de azul de metileno no ramo frontal, após a ligadura da artéria temporal superficial abaixo da emergência do ramo Método 63 auricular superior, com o objetivo de determinar o território cutâneo vascularizado por esta última artéria; DOIS CADAVERES (4 LADOS) 1) Injeção de azul de metileno na artéria carótida externa após ligadura da artéria temporal superficial (abaixo da emergência de seu ramo auricular superior) e da artéria auricular posterior (na sua emergência no sulco auricular posterior, acima da emergência do ramo do lóbulo), com o objetivo de constatar a contribuição dos ramos auriculares anteriores, médio e inferior, na vascularização do pavilhão auricular; 2) Dissecção do retalho e, após, injeção de azul de metileno no ramo frontal, a fim de determinar a viabilidade do retalho a fluxo retrógrado baseado no ramo frontal; DOIS CADAVERES (4 LADOS): Injeção na artéria carótida comum da solução radiopaca de Rees & Taylor92 e realização de arteriografia para visualizar a rede vascular arterial da região têmporo-aurículo-mastoidiana. Após, foi realizada a elevação em bloco desta região com os limites seguintes: Método 64 Superior: linha curva temporal superior ; Anterior: rebordo lateral da órbita e zigoma ; Posterior : 5cm posteriormente ao sulco auricular posterior ; Inferior : 3 cm inferiormente ao lóbulo da orelha. Estes blocos foram também submetidos a exames de radiografias simples. TRÊS CADAVERES (6 LADOS) Injeção na artéria carótida comum de solução de látex colorido em azul de metileno, com o objetivo de facilitar a dissecção e precisar a vascularização arterial desta região. 5.3. METODOLOGIA ESTATÍSTICA Foi realizada análise descritiva dos achados anatômicos, tais como o percentual de ocorrência, a média e desvio padrão dos dados encontrados com seus respectivos intervalos de confiança de 95%, além do teste t pareado de Student para comparação entre os lados direito e esquerdo (p<0,05). Método 65 FIGURA 18 - Parâmetros. 1) Distância entre o ramo frontal (RF) e a margem superior do supercílio (*), medida sobre a linha A: linha paralela à linha mediana, passando pela comissura externa do olho. 2) Distância, medida sobre a linha B (linha que passa pela comissura externa do olho e pelo sulco auricular superior), entre o ponto mais anterior do sulco auricular superior (*) e o ramo arterial de maior calibre na região mastoidiana, podendo ser, ou um ramo descendente da artéria parietal (RD) ou um ramo Método 66 mastoidiano inferior (RMI) ou mastoidiano superior (RMS). 3) Altura de emergência na face ou de superficialização da artéria temporal superficial (ATS), em relação à margem superior do trago (*), medido sobre a linha C: linha tangente ao ponto mais anterior do trago e perpendicular à linha B. 4) Altura de emergência do ramo auricular superior (RAS), em relação à margem superior do trago (*), medido sobre a linha C. 67 Resultados Resultados 68 6. RESULTADOS Em nossas dissecções, estudamos os vasos temporais superficiais e seus ramos (auriculares anteriores, frontal, parietal e zigomático-orbitário) e os vasos auriculares posteriores na região aurículo-têmporo-mastoidiana. 6.1. ARTÉRIA TEMPORAL SUPERFICIAL A artéria temporal superficial torna-se superficial na face a 0,32 ± 0,32 cm (0,18 – 0,46) acima do trago, sobre a linha C, sendo que não houve diferença estatisticamente significante na comparação entre os lados direito e esquerdo (p=0,86) (Tabela 1). Ela se situa anteriormente à veia temporal superficial e ao nervo aurículo-temporal e caminha na espessura da fáscia têmporo-parietal, tornando-se mais superficial em direção ao vértex, na altura de seus ramos terminais parietal e frontal. Sua divisão terminal em seus ramos parietal e frontal foi considerada baixa em 26,6% dos casos (ou seja, quando a divisão se deu na altura ou abaixo do arco zigomático) e alta, em 73,3% dos casos (divisão acima do arco zigomático) (Fig. 19, tabela 1). Resultados 69 FIGURA 19 - Tipos de divisão da artéria temporal superficial em seus dois ramos terminais frontal e parietal. Divisão alta, acima do arco zigomático: 73,3%. Divisão baixa, na altura ou abaixo do arco zigomático: 26,6%. ATS: artéria temporal superficial. RF: ramo frontal. RP: ramo parietal. RZO: ramo zigomático-orbitário. Baixa: 26,6%Alta: 73,3% Resultados 70 PO : percentual de ocorrência. M : média. DP : desvio padrão. IC 95 : intervalo de confiança de 95%. MLD : média lado direito. ATS: artéria temporal superficial. RF: ramo frontal. RP: ramo parietal. RZO: ramo zigomático-orbitário. Au: ausente. MLE : média lado esquerdo. DPD: desvio padrão lado direito. DPE: desvio padrão lado esquerdo. TP (p<0,05): teste t pareado de Student. TABELA 1 - Artéria temporal superficial e seus ramos frontal, parietal e zigomático-orbitário. Sujeito Sexo Idade (anos) Lado Artéria temporal superficial Altura divisão ATS Emegência ATS em relação ao trago (cm, linha C) Relação diâmetro RF/RP Distância RF- supercílio (cm, linha A) Origem RZO 1 (látex) F 91 D Alta 0 RF=RP 2,3 ATS E Alta 0 RF=RP 2,5 ATS 2 (látex) F 100 D Alta 0,5 RF=RP 2,2 ATS E Alta 0 RF=RP 2,7 ATS 3 (formol) M 71 D Alta 0,5 RFRP 2,2 RF 6 (Rees F 55 D Alta 0 RFRP 3,7 ATS E Baixa 0 RF>RP 3,2 ATS 8 (azul) M 89 D Baixa 0 RF>RP 3,0 ATS E Baixa 0 RF>RP 2,8 ATS 9 (azul) F 78 D Alta 0,5 RF=RP 2,0 Ausente E Alta 0 RF=RP 2,1 RF 10 (formol) M 63 D Baixa 0,2 RF=RP 4,8 ATS E Alta 0,5 RF=RP 3,2 ATS 11 (formol) M 87 D Alta 0,9 RF=RP 4,3 ATS E Alta 0,8 RF=RP 3,1 ATS 12 (látex) M 88 D Baixa 0,5 RFRP 2,7 ATS E Alta 0,7 RF>RP 2,0 ATS 15 (Rees F 58 D Alta 0,6 RF=RP 2,6 ATS & Taylor) E Alta 0,5 RF=RP 2,9 ATS Total=15 15 15 30 30 30 30 30 30 PO 9 m. (60%) 6 f. (40%) 22 altas (73,33%); 8 baixas (26,66%) = 17 (56,6%) < 6 (20%) > 7 (23,3%) ATS: 21 (70%) RF: 5 (16,6%) Au.: 4 (13,3%) M 78,53 0,32 2,81 DP 13,38 0,32 0,82 IC 95 69,86- 87,21 0,18-0,46 2,45-3,16 MLD 0,33 2,92 DPD 0,32 0,98 MLE 0,31 2,69 DPE 0,34 0,63 TP (p<0,05) p=0,86 p=0,16 Resultados 71 a) Ramo parietal. É um dos ramos terminais da artéria temporal superficial. Em nosso estudo, foi o ramo de maior diâmetro, em relação ao ramo frontal, em 23,3% dos casos (Tabela 1). Tem um trajeto superior em direção ao vértex ou ligeiramente posterior, e caminha na espessura da fáscia têmporo-parietal, na região temporal, e na espessura da gálea, na região parietal. Durante o seu trajeto, torna-se mais superficial, portando-se na espessura da hipoderme, na região parietal, onde se divide em vários ramos terminais. Nas proximidades da linha média, forma uma verdadeira rede, que se anastomosa a pleno canal com os ramos terminais das artérias occipital e frontal, ipsilateralmente, e com as artérias occipital, parietal e frontal, contralateralmente. Foi dada maior atenção às anastomoses deste vaso com a artéria auricular posterior. Na região temporal alta, o ramo parietal emite dois a três ramos que tomam trajeto posterior e descendente (ramos descendentes). Em nossas dissecções, estes ramos descendentes atingem a porção póstero-superior da região mastoidiana em 70% dos casos, participando da vascularização do terço superior desta região. O ramo descendente mais calibroso atinge a região mastoidiana passando a 3,81 ± 0,88 cm (3,34 – 4,28) posteriormente ao ponto mais anterior do sulco auricular superior, sobre a linha B (Fig. 20, tabela 2), e se anastomosa a pleno canal com a artéria mastoidiana inferior, ramo da auricular posterior, e com a artéria mastoidiana superior, ramo da auricular superior. Em, respectivamente, 20% e 10% dos casos, são as artérias mastoidiana inferior e superior que atingem a linha B para se anastomosarem com os ramos descendentes acima desta linha. Nestes casos, os ramos descendentes não participam da vascularização mastoidiana (Fig. 21, tabela 2). Resultados 72 FIGURA 20 - Arteriografia do pavilhão auricular e da fáscia têmporo-parietal. Limites de elevação da peça anatômica: superior: linha curva temporal superior; anterior: rebordo orbitário e região pré-auricular; posterior: 5 cm posteriormente ao sulco auricular posterior; inferior: 3 cm abaixo do lóbulo da orelha. Observar os ramos descendentes que atingem a região mastoidiana na sua porção póstero-superior, a anastomose do RAS com AAP e as anastomoses entre o RF com VSO e VST. RP: ramo parietal. RF: ramo frontal. ATS: artéria temporal superficial. AAP: artéria auricular posterior. RAS: ramo auricular superior (ramo da ATS). RMI: ramo mastoidiano inferior da AAP. RMS: ramo mastoidiano superior (ramo do RAS). VSO: vasos supra-orbitários. VST: vasos supra-trocleares. Cadáver n° 15, F., 58 anos Direita Esquerda Resultados 73 FIGURA 21 - A vascularização da região mastoidiana, em 70% dos casos, é formada pelos ramos descendentes e mastoidianos inferiores e superiores. Em 30%, somente os ramos mastoidianos inferior e superior vascularizam a região. A) Os ramos descendentes atingem a região mastoidiana e ultrapassam a linha B (70%). B) O ramo mastoidiano inferior é o dominante e ultrapassa a linha B para se anastomosar com os ramos descendentes na região temporal (20% dos casos). C) O ramo mastoidiano superior é o dominante e também se anastomosa com os ramos descendentes na região temporal (10% dos casos). Como podemos observar, existe uma espécie de compensação entre os dois sistemas temporal superficial e auricular posterior (tabela 2). ATS: artéria temporal superficial. AAP: artéria auricular posterior. RMI: ramo mastoidiano inferior. RMS: ramo mastoidiano superior. RD: ramo descendente. RF: ramo frontal. RP: ramo parietal. RZO: ramo zigomático-orbitário. RAS: ramo auricular superior. A) 10% B) 70% 20% C) Resultados 74 TABELA 2 - Ramos vasculares da região mastoidiana. Os ramos descendentes foram constantes e atingem a região mastoidiana em 70% dos casos. O ramo de maior calibre atinge a região mastoidiana passando a 3,81 ± 0,88 cm posteriormente ao sulco auricular superior sobre a linha B. O ramo mastoidiano inferior também foi achado constante e o ramo principal desta região em 20% dos casos, atingindo a linha B a 3,50 ± 1,48 cm posteriormente ao sulco auricular superior. O ramo mastoidiano superior, também constante, é o ramo principal desta região em 10% dos casos, atingindo a linha B a 2,37 ± 0,06 cm posteriormente ao sulco auricular superior. Ver figuras 20 e 21. Sujeito Lado RD (cm) RMI (cm) RMS (cm) 1 D ARM 2,5 PC E ARM 3,0 PC 2 D 3,5 PC PC E 3,2 PC PC 3 D 3,9 PC PC E 4,1 PC PC 4 D 4,0 PC PC E 4,2 PC PC 5 D 3,5 PC PC E ARM 2,0 PC 6 D ARM PC 2,4 E ARM 2,8 PC 7 D 1,2 PC PC E 3,2 PC PC 8 D 4,6 PC PC E 4,2 PC PC 9 D 3,8 PC PC E 3,9 PC PC 10 D 2,4 PC PC E 3,2 PC PC 11 D 4,2 PC PC E 4,3 PC PC 12 D 4,1 PC PC E 4,2 PC PC 13 D ARM 5,5 PC E ARM 5,2 PC 14 D ARM PC 2,4 E ARM PC 2,3 15 D 5,5 PC PC E 4,8 PC PC Total=15 30 30 30 30 PO 21 dissecções=70% 6 dissecções =20% 3 dissecções =10% M 3,81cm 3,5cm 2,37cm DP 0,88 1,48 0,06 IC 95 3,34-4,28 1,59-3,57 0,00-2,37 RD: ramo descendente da artéria parietal. RMI: ramo mastoidiano inferior. RMS: ramo mastoidiano superior. ARM: ausente na região mastoidiana. PC: pequeno comprimento. PO: percentual de ocorrência. M : média. DP : desvio padrão. IC 95 : intervalo de confiança de 95%. Resultados 75 b) Ramo frontal: trata-se de um outro ramo terminal da artéria temporal superficial. Em nosso estudo, foi o ramo vascular mais calibroso, em relação ao ramo parietal, em 23,3% dos casos. Possui um trajeto para frente e oblíquo em direção à região frontal, passando a 2,81 ± 0,82 cm (2,45 – 3,16) acima do supercílio, sobre a linha A, sendo que não houve diferença estatisticamente significante quando os lados direito e esquerdo foram comparados (p=0,16) (Tabela 1). Na região frontal, termina em vários pequenos ramos que se anastomosam a pleno canal com os ramos terminais das artérias zigomático-orbitária, parietal, supra- orbitária e supra-troclear, ipsilateralmente (Fig. 20), e com as artérias frontal, parietal, supra-orbitária e supra-troclear, contralateralmente. Em 16,6% dos casos, a artéria zigomático-orbitária é um ramo direto da artéria frontal (Tabela 1). c) Ramo zigomático-orbitário. É outro ramo terminal da artéria temporal superficial que caminha na espessura da fáscia têmporo- parietal em direção à margem superior da órbita, onde termina em vários ramos que se anastomosam com os ramos terminais das artérias frontal e supra-orbitária. Em 16,6% dos casos, se origina do ramo frontal da artéria temporal superficial e, em 70% dos casos, vem diretamente da artéria temporal superficial. Em 13,3% dos casos, foi ausente em nossas dissecções (Tabela 1). Resultados 76 d) Ramo auricular inferior. É um ramo arterial que se origina da artéria temporal superficial no interior da glândula parótida. Possui trajeto transversal e superficial, perfurando a fáscia superficial para atingir a porção inferior do pavilhão auricular. Tem origem direta da artéria temporal superficial em 63,3% dos casos (Tipo I e III), a partir de um tronco único, com o ramo auricular médio, em 30% dos casos (Tipo II), ou a partir de um tronco único com os outros dois ramos auriculares superior e médio, em 6,6% dos casos (Tipo IV) (Fig. 22, tabela 3). e) Ramo auricular médio. Emerge na altura do trago e caminha na espessura da fáscia superficial para atingir a porção média do pavilhão auricular. Foi constante em nosso estudo. Em 36,6% dos casos, emerge diretamente da artéria temporal superficial (Tipo I). Origina-se de um tronco único com o ramo auricular inferior em 30% dos casos (Tipo II), com o ramo auricular superior, em 26,6% dos casos (Tipo III), ou de um tronco único com os três ramos, em 6,6% dos casos (Tipo IV) (Fig. 22, tabela 3). f) Ramo auricular superior. Foi o ramo auricular anterior mais estudado em nossas dissecções. Foi um ramo constante e se origina diretamente da artéria temporal superficial em 36,6% dos casos (Tipo I) (Fig. 22, tabela 3). Quando a divisão da artéria temporal superficial em seus ramos parietal e frontal foi classificada como baixa (divisão sobre ou inferiormente ao arco zigomático), o ramo auricular superior originou-se diretamente da artéria parietal (30% dos casos). Sua emergência ocorreu Resultados 77 a 1,17 ± 0,67 cm (0,87 – 1,46) acima do trago, sobre a linha C, possuindo um calibre de 0,84 ± 0,29 mm (0,72 – 0,96) e está sempre acompanhado de uma ou duas veias comitantes (Fig. 23, tabela 4). A comparação entre os lados direito e esquerdo, tanto da distância de sua emergência em relação ao trago, como de seu calibre, não mostrou diferença estatisticamente significante (p=0,22 e 0,36 respectivamente). Caminha em direção ao sulco auricular superior passando profundamente aos músculos auriculares anterior e superior, portando-se, em alguns casos, logo acima do conduto auditivo externo (Fig. 24). No decorrer de seu trajeto, antes de anastomosar a pleno canal com a artéria auricular posterior no sulco auricular posterior, emite, além de alguns pequenos ramos para a porção súpero-anterior do pavilhão auricular, dois ramos vasculares principais e constantes (Fig. 25 e 26): Um ramo que se dirige à porção superior da hélice, o chamado ramo da hélice. Este ramo se anastomosa com os ramos auriculares da artéria auricular posterior na região retroauricular e contribui com a vascularização do terço superior do pavilhão auricular. Um ramo mastoidiano superior, que se origina na altura do terço superior do sulco auricular posterior e possui um trajeto ascendente para se anastomosar com os ramos descendentes da artéria parietal (Fig. 25 e 26). Participa da vascularização do terço superior da região mastoidiana e da região temporal. Em 10% dos casos, é o ramo vascular mais calibroso da região mastoidiana, passando a 2,37 ± 0,06 Resultados 78 cm (1,59 – 3,57) posteriormente ao sulco auricular superior, sobre a linha B (Tabela 2). Esse ramo pode receber uma grande contribuição da artéria auricular posterior, pois, em vários casos, encontramos grande dificuldade de definir, com exatidão, onde começam e terminam as artérias auricular superior e auricular posterior, devido à grande anastomose a pleno canal, entre estes dois vasos, no sulco auricular posterior (Fig. 26). O ramo mastoidiano superior contribui com a vascularização do terço superior do pavilhão auricular. Com a injeção de azul de metileno retrogradamente pelo ramo frontal, após a ligadura da artéria temporal superficial abaixo da emergência do ramo auricular superior, a pele dos terços médio e inferior da região retroauricular e mastoidiana (com exceção do lóbulo) foram também coradas (Fig. 27). Isso demonstra a comunicação importante entre o ramo auricular superior e a artéria auricular posterior. Na arteriografia, podemos também observar a anastomose a pleno canal entre estas duas artérias, formando um arco anastomótico no sulco auricular posterior (Fig. 20). Resultados 79 FIGURA 22 - Tipos de origem dos ramos auriculares anteriores. Tipo I: todos os ramos emergem direta e separadamente da artéria temporal superficial (36,6% dos casos). Tipo II: os ramos auriculares inferior e médio emergem de um tronco único (30% dos casos). Tipo III: os ramos auriculares médio e superior emergem de um tronco único (26,6% dos casos). Tipo IV: os três ramos emergem de um tronco único (6,6% dos casos). Ver tabela 3. Tipo I Tipo II Tipo III Tipo IV 36,6% 30% 26,6% 6,6% Resultados 80 TABELA 3 - Tipos de origem dos ramos auriculares anteriores. Ver figura 22. Ramos auriculares anterioresSujeito Lado Tipo I Tipo II Tipo III Tipo IV 1 D NÃO NÃO NÃO SIM E NÃO NÃO NÃO SIM 2 D NÃO NÃO SIM NÃO E NÃO NÃO SIM NÃO 3 D SIM NÃO NÃO NÃO E SIM NÃO NÃO NÃO 4 D NÃO SIM NÃO NÃO E NÃO SIM NÃO NÃO 5 D NÃO SIM NÃO NÃO E NÃO NÃO SIM NÃO 6 D SIM NÃO NÃO NÃO E NÃO NÃO SIM NÃO 7 D NÃO NÃO SIM NÃO E NÃO NÃO SIM NÃO 8 D SIM NÃO NÃO NÃO E SIM NÃO NÃO NÃO 9 D NÃO SIM NÃO NÃO E NÃO SIM NÃO NÃO 10 D NÃO SIM NÃO NÃO E NÃO SIM NÃO NÃO 11 D SIM NÃO NÃO NÃO E SIM NÃO NÃO NÃO 12 D NÃO SIM NÃO NÃO E NÃO SIM NÃO NÃO 13 D NÃO NÃO SIM NÃO E NÃO NÃO SIM NÃO 14 D SIM NÃO NÃO NÃO E SIM NÃO NÃO NÃO 15 D SIM NÃO NÃO NÃO E SIM NÃO NÃO NÃO Total=15 30 30 30 30 30 PO 11 (36,6%) 9 (30%) 8 (26,6%) 2 (6,6%) PO: percentual de ocorrência. Resultados 81 FIGURA 23 - Origem do ramo auricular superior (RAS). Em 70% dos casos, esse ramo é proveniente da artéria temporal superficial (ATS) e, em 30% dos casos, do ramo parietal, quando a divisão da artéria temporal superficial em seus dois ramos terminais, parietal e frontal, foi considerada baixa (divisão sobre ou inferiormente ao arco zigomático). Este ramo emerge a 1,17 ± 0,67 cm acima do trago, sobre a linha C, e está sempre acompanhado de uma ou duas veias comitantes (VC). VTS: veia temporal superficial. Cadáver n° 6, F., 55 anos, orelha direita, injetado com a solução de Rees & Taylor92. Anterior Cranial Caudal Posterior Resultados 82 TABELA 4 - Origem do ramo auricular superior da artéria temporal superficial e freqüência dos seus dois ramos principais, mastoidiano superior e ramo da hélice. Ramo auricular superior Sujeito Lado Origem Distância do trago em cm (linha C) Calibre (mm) RMS RH 1 D ATS 0 1,4 SIM SIM E ATS 0 1,3 SIM SIM 2 D ATS 1,0 0,8 SIM SIM E ATS 0,5 0,8 SIM SIM 3 D ATS 0,9 1,0 SIM SIM E ATS 0,6 1,0 SIM SIM 4 D ATS 0,5 0,9 SIM SIM E ATS 0,5 1,1 SIM SIM 5 D RP 0,7 0,7 SIM SIM E RP 0,8 0,5 SIM SIM 6 D ATS 1,3 1,2 SIM SIM E RP 1,2 0,3 SIM SIM 7 D RP 2,7 0,6 SIM SIM E RP 1,8 0,5 SIM SIM 8 D RP 1,2 0,8 SIM SIM E RP 1,8 0,8 SIM SIM 9 D ATS 0,9 0,6 SIM SIM E ATS 0,7 0,5 SIM SIM 10 D RP 2,4 1,1 SIM SIM E ATS 2,2 1,0 SIM SIM 11 D ATS 1,8 0,7 SIM SIM E ATS 1,9 0,6 SIM SIM 12 D RP 1,2 0,8 SIM SIM E ATS 1,3 1,2 SIM SIM 13 D ATS 1,5 1,0 SIM SIM E ATS 1,8 0,8 SIM SIM 14 D ATS 0,9 0,6 SIM SIM E ATS 0,6 1,2 SIM SIM 15 D ATS 1,1 1,1 SIM SIM E ATS O,6 0,3 SIM SIM Total=15 30 30 30 30 30 30 PO ATS=21 (70%) RP=9 (30%) 30 (100%) 30 (100%) M 1,17cm 0,84mm DP 0,67 0,29 IC 95 0,87-1,46 0,71-o,96 MLD 1,20 0,88 DPD 0,69 0,24 MLE 1,08 0,79 DPE 0,67 0,33 TP (p<0,05) p=0,22 p=0,36 ATS: artéria temporal superficial. RP: ramo parietal. RMS: ramo mastoidiano superior. RH: ramo da hélice. PO: percentual de ocorrência. M : média. DP : desvio padrão. IC 95 : intervalo de confiança de 95%. MLD : média lado direito. MLE : média lado esquerdo. DPD: desvio padrão lado direito. DPE: desvio padrão lado esquerdo. TP (p<0,05): teste t pareado de Student. Resultados 83 FIGURA 24 - O ramo auricular superior contorna o sulco auricular superior sob os músculos auriculares anterior e superior, portando- se, em certos casos, logo acima do conduto auditivo externo. ATS: artéria temporal superficial. RAS: ramo auricular superior. RP: ramo parietal. RF: ramo frontal. Cadáver n° 1, F., 91 anos, orelha esquerda, injetado com látex colorido com azul de metileno. Cranial Caudal Anterior Posterior Resultados 84 FIGURA 25 - Fotografia e desenho mostrando os dois ramos principais da artéria auricular superior: o ramo da hélice e o ramo mastoidiano superior. Neste caso, a artéria auricular superior penetra profundamente no sulco auricular superior e os ramos da hélice e mastoidiano superior emergem de Postérieur Resultados 85 um tronco único. ATS: artéria temporal superficial. AAP: artéria auricular posterior. RAS: ramo auricular superior. RH: ramo da hélice. RMS: ramo mastoidiano superior. RMI: ramo mastoidiano inferior. Cadáver n° 1, F., 91 anos, orelha esquerda, injetado com látex colorido com azul de metileno. FIGURA 26 - Trajeto da artéria auricular superior na região retroauricular. Esta artéria passa ladeando o conduto auditivo externo e se anastomosa a pleno canal com a artéria auricular posterior. RAS: ramo auricular superior. RH: ramo da hélice. RMS: ramo mastoidiano superior. RMI: ramo mastoidiano inferior. AAP: artéria auricular posterior. Cadáver n° 6, F., 55 anos, orelha esquerda, injetado com a solução de Rees & Taylor92. Caudal Cranial PosteriorAnterior Resultados 86 FIGURA 27 - Injeção de azul de metileno no ramo frontal, após a ligadura da artéria temporal superficial abaixo da emergência do ramo auricular superior, mostrando que este ramo contribui com a vascularização do terço superior do pavilhão auricular. De maneira menos intensa, a pele dos terços médio e inferior da região retroauricular e mastoidiana (com exceção do lóbulo da orelha) também foram coradas, demonstrando assim, a comunicação entre as artérias auricular superior e auricular posterior. Cadáver n° 7, F., 87 anos, orelha direita Resultados 87 6.2. ARTÉRIA AURICULAR POSTERIOR Em nosso trabalho, a artéria auricular posterior foi estudada somente na sua porção aurículo-mastoidiana. A artéria auricular posterior emerge na profundidade do sulco auricular posterior, logo acima do periósteo, ladeando o conduto auditivo externo. Possui um trajeto superior, sempre no sulco auricular posterior, onde se anastomosa a pleno canal com a artéria auricular superior. Durante seu trajeto, emite a artéria mastoidiana inferior e mais três ramos vasculares para o pavilhão auricular (inferior, médio e superior): a) Artéria mastoidiana inferior. Vaso de grosso calibre, similar ou às vezes até superior ao da artéria auricular posterior. É um ramo constante que emerge na região inferior do sulco auricular posterior, dirigindo-se para cima e posteriormente, e caminha alguns centímetros no interior da fáscia cervical superficial, para então, atingir o plano dos músculos auricular posterior e occipital na região mastoidiana. No início de seu trajeto, emite um ramo que se dirige posteriormente e se anastomosa com a artéria occipital. Em 20% dos casos, é a principal artéria da região mastoidiana, de bom calibre, passando a 3,50 ± 1,48 cm (1,59 – 3,57) do sulco auricular superior, sobre a linha B, para então atingir a região temporal e se dividir em vários ramos que se Resultados 88 anastomosam com os ramos descendentes da artéria parietal (Fig. 21 e 22, tabela 2). b) Ramos auriculares posteriores (Fig. 28): Ramo inferior (para o lóbulo da orelha): emerge da artéria auricular posterior na porção superior do lóbulo e se dirige na direção da margem livre da hélice, onde termina em vários ramos terminais (aproximadamente 0,5 cm antes de atingir a margem livre da hélice). Esses ramos terminais dirigem-se, ou para cima, anastomosando- se com os ramos terminais das outras artérias auriculares posteriores, ou para baixo, participando da vascularização do lóbulo da orelha. Durante seu trajeto, emite constantemente um ramo que perfura a cartilagem da concha e participa da vascularização da superfície anterior do pavilhão auricular. Ramo médio. Emerge da artéria auricular posterior na altura do terço médio da concha e se dirige para a margem livre da hélice, para também se dividir em vários ramos terminais a aproximadamente 0,5 cm da margem livre. Estes ramos também se dirigem para cima e para baixo, para se anastomosarem, respectivamente, com os ramos superior e inferior da artéria auricular posterior. Na altura de sua emergência, também foram observados ramos que perfuram a concha e também participam da vascularização da superfície anterior do pavilhão auricular. Resultados 89 Ramo superior. Emerge da porção superior da artéria auricular posterior e possui o mesmo trajeto e a mesma distribuição dos ramos médio e inferior. Em alguns casos, encontramos uma origem em comum com o ramo médio. FIGURA 28 - Ramos retroauriculares da artéria auricular posterior. Observar a anastomose a pleno canal da AAP e o RAS. AAP: artéria auricular posterior. RI: ramo inferior (ramo para o lóbulo). RM: ramo médio. RS: ramo superior. RMI: ramo mastoidiano inferior. RAS: ramo auricular superior da artéria temporal superficial. RH: ramo da hélice. RMS: ramo mastoidiano superior. Cadáver n° 12, M., 88 anos, orelha esquerda, injetado com látex colorido com azul de metileno. Postérieur Antérieur Caudal Posterior Cranial Anterior Resultados 90 6.3. DRENAGEM VENOSA DA REGIÃO TEMPORAL Neste estudo, encontramos uma variabilidade muito grande na vascularização venosa da região têmporo-aurículo- mastoidiana. As veias são bem mais variáveis que as artérias, tornando mais difícil a sistematização da distribuição venosa. As veias também circulam na espessura da fáscia têmporo-parietal, como as artérias. Porém, acima do terço médio da região temporal, elas se tornam mais superficiais que as artérias, situando-se logo abaixo da hipoderme. Foram notados dois coletores venosos principais nesta região: o coletor têmporo-parietal e o coletor auricular posterior. 6.3.1. Coletor venoso têmporo-parietal O coletor têmporo-parietal segue o eixo do ramo parietal da artéria temporal superficial. Ele recebe as veias das regiões parietal, frontal (através das veias frontais) e occípito-mastoidiana (através das veias descendentes que se localizam sempre abaixo da linha curva temporal superior e acompanham as artérias descendentes correspondentes). O fluxo venoso segue pela veia temporal superficial, que se encontra posteriormente à artéria correspondente. O coletor têmporo-parietal foi o principal coletor venoso em 83,3% dos casos, em nossas dissecções (Fig. 29, tabela 5). Resultados 91 FIGURA 29 - Drenagem venosa da região temporal. A) O coletor têmporo-parietal foi o coletor venoso principal em 83,3% de nossas dissecções. B) Em 16,6% dos casos, o coletor retroauricular foi o mais desenvolvido. CTP: coletor têmporo-parietal. VTS: veia temporal superficial. VAP: veia auricular posterior. 83,3% 16,6% Resultados 92 TABELA 5 - Drenagem venosa da região têmporo-frontal. Col. principal Região têmporo-frontalSujeito Lado T-P AP Tipo I Tipo II Tipo III 1 D SIM NÃO SIM NÃO NÃO E SIM NÃO SIM NÃO NÃO 2 D SIM NÃO NÃO SIM NÃO E SIM NÃO NÃO SIM NÃO 3 D SIM NÃO SIM NÃO NÃO E SIM NÃO SIM NÃO NÃO 4 D SIM NÃO NÃO SIM NÃO E SIM NÃO NÃO SIM NÃO 5 D SIM NÃO SIM NÃO NÃO E SIM NÃO SIM NÃO NÃO 6 D SIM NÃO SIM NÃO NÃO E SIM NÃO SIM NÃO NÃO 7 D SIM NÃO SIM NÃO NÃO E SIM NÃO SIM NÃO NÃO 8 D SIM NÃO SIM NÃO NÃO E SIM NÃO SIM NÃO NÃO 9 D SIM NÃO SIM NÃO NÃO E SIM NÃO SIM NÃO NÃO 10 D NÃO SIM NÃO SIM NÃO E NÃO SIM NÃO SIM NÃO 11 D NÃO SIM NÃO SIM NÃO E NÃO SIM NÃO SIM NÃO 12 D SIM NÃO SIM NÃO NÃO E SIM NÃO SIM NÃO NÃO 13 D NÃO SIM NÃO SIM NÃO E SIM NÃO SIM NÃO NÃO 14 D SIM NÃO NÃO NÃO SIM E SIM NÃO NÃO SIM NÃO 15 D SIM NÃO NÃO SIM NÃO E SIM NÃO NÃO NÃO SIM Total=15 30 30 30 30 30 30 PO 25 (83,3%) 5 (16,6%) 17 (56,6%) 11 (36,6%) 2 (6,6%) T-P: têmporo-parietal. AP: auricular posterior. PO: percentual de ocorrência. Resultados 93 As veias frontais também são bastante variáveis e não seguem o mesmo eixo da artéria correspondente. Elas se comunicam, de maneira constante, com as veias supra-orbitárias, supra-trocleares e zigomático-orbitárias, ipsilateralmente, e com as veias frontais, supra- orbitárias e supra-trocleares, contralateralmente. Segundo nossos achados, sistematizamos um tipo de distribuição para estas veias (Fig. 30, tabela 5): 1) Tipo I (56,6% dos casos): não existe uma veia dominante. Encontramos várias veias que se distribuem nesta região, na sua grande maioria, situadas superiormente à artéria frontal. 2) Tipo II (36,6% dos casos): existem várias pequenas veias, porém uma dominante, situada também, superiormente à artéria frontal, podendo ser logo acima, ou na região temporal alta. 3) Tipo III (6,6% dos casos): onde há escassez venosa na região, encontrando-se apenas pequenas veias e pouco numerosas. Por outro lado, talvez num mecanismo de compensação, o coletor têmporo-parietal não segue exatamente o eixo da artéria parietal, situando-se mais anteriormente e, portanto, mais próximo da artéria frontal. Nesses casos, geralmente, existe uma predominância do coletor retroauricular. As veias responsáveis pela drenagem venosa da superfície anterior do pavilhão auricular seguem o ramo arterial correspondente. Encontramos sempre uma ou duas veias comitantes para cada artéria auricular anterior. A veia comitante da artéria auricular superior foi achado constante em nossas dissecções e se anastomosa com as veias comitantes auriculares posteriores no sulco auricular posteror. Resultados 94 FIGURA 30 - Tipos de drenagem venosa da região têmporo-frontal. Tipo I (56,6% dos casos): não existe uma veia dominante. Encontramos várias veias que se distribuem nesta região, em sua maioria, situadas superiormente à artéria frontal. Tipo II (36,6% dos casos): existem várias pequenas veias, porém uma dominante, situada também, superiormente à artéria frontal, podendo ser logo acima, ou na região temporal alta. Tipo III (6,6% dos casos): onde há uma escassez venosa na região, encontrando-se apenas pequenas veias e pouco numerosas. Por outro lado, talvez num mecanismo de compensação, o coletor têmporo- parietal não segue exatamente o eixo da artéria parietal, situando-se mais anteriormente e, portanto, mais próximo da artéria frontal. CTP: coletor têmporo-parietal. CF: coletor frontal. VTS: veia temporal superficial. VAP: veia auricular posterior. Resultados 95 6.3.2. Coletor venoso retroauricular O coletor venoso auricular posterior foi encontrado em todas as dissecções, sendo o principal coletor em 16,6% dos casos (Fig. 29, tabela 5). É formado por (Fig. 31): 1) Uma veia superficial na região mastoidiana, denominada veia mastoidiana superficial, que segue o eixo da artéria mastoidiana inferior e se anastomosa a pleno canal com as veias descendentes do coletor têmporo-parietal na altura da região mastoidiana superior, onde se torna mais superficial. Esta veia segue a mesma distribuição arterial e, igualmente, comunicam-se constantemente com as veias occipitais. 2) Duas veias comitantes, que seguem a artéria auricular posterior no sulco auricular posterior e se anastomosam com as veias auriculares superiores e as veias parietais descendentes. Essas veias drenam a superfície posterior do pavilhão auricular. Resultados 96 FIGURA 31 - Foto e desenho do coletor auricular posterior, formado por: 1) uma veia superficial na região mastoidiana, denominada veia mastoidiana superficial (VMS); 2) Duas veias comitantes (VC), que seguem o eixo da artéria auricular posterior (AAP). Cadáver n° 5, M. 88 anos, orelha direita. Caudale AntérieurPostérieur Resultados 97 6.4. VASCULARIZAÇÃO DO PAVILHÃO AURICULAR APÓS A ELEVAÇÃO DO RETALHO Para a demonstração da viabilidade vascular do pavilhão auricular após a elevação do retalho, lançamos mão de dois métodos: 1) Arteriografia do pavilhão auricular, com a injeção da solução de Rees & Taylor92 pela artéria carótida comum; 2) Injeção de azul de metileno pela carótida externa após a ligadura das artérias temporal superficial (abaixo da emergência da artéria auricular superior) e auricular posterior na porção inferior do sulco auricular posterior (acima da emergência do ramo do lóbulo). A visualização vascular na arteriografia, assim como a pronta coloração de azul de metileno das superfícies anterior e posterior do pavilhão auricular após a elevação do retalho, demonstram que os ramos auriculares anteriores inferior e médio, assim como o ramo do lóbulo, são capazes de assegurar a vascularização do pavilhão auricular após a elevação do retalho. O ramo do lóbulo emite perfurantes que atravessam a concha e também contribuem com a vascularização da superfície anterior do pavilhão (Fig. 32). Resultados 98 FIGURA 32 - Arteriografia do pavilhão auricular com a injeção de Rees & Taylor92 pela artéria carótida comum (abaixo). Injeção de azul de metileno (acima), pela carótida externa, após a ligadura das artérias temporal superficial (abaixo da emergência da artéria auricular superior) e auricular posterior na porção inferior do sulco auricular posterior (acima da emergência do ramo do lóbulo). Os achados nos permitem demonstrar que os ramos auriculares anteriores, inferior e médio, assim como o ramo do lóbulo, são capazes de assegurar a vascularização do pavilhão remanescente. Houve excelente coloração, com azul de metileno, tanto da superfície anterior, como posterior do pavilhão auricular. ATS: artéria temporal superficial. AAP: artéria auricular posterior. RAI: ramo auricular inferior. RAM: ramo auricular médio. RMI: ramo mastoidiano inferior. RL: ramo do lóbulo. Acima: cadáver n° 9, F., 78 anos, orelha direita, injetado com azul de metileno pela artéria carótida externa. Abaixo: cadáver n° 15, F., 58 anos, orelha esquerda, injetado na carótida externa com a solução de Rees & Taylor92. 99 Dissecção do retalho Dissecção do Retalho 100 7. DISSECÇÃO DO RETALHO A avaliação pré-operatória segue os mesmos princípios do retalho de fáscia têmporo-parietal93. O interrogatório e o exame físico devem detectar, entre outros dados, a presença de cicatrizes na região, antecedentes de cirurgia ou traumatismo de crânio, cirurgia cervical ou sobre a glândula parótida (onde pode ter havido lesão da artéria temporal superficial ou carótida externa) e radioterapia loco-regional. O exame do couro cabeludo permite a previsão de uma eventual alopécia no pós- operatório. A artéria temporal superficial e seus ramos terminais, frontal e parietal, são palpados e marcados. A avaliação clínica das veias dessa região é praticamente impossível e não pode ser realizada de rotina, a não ser se lançarmos mão de exames complementares como o “duplex scan”. O retalho compreende a pele da região retroauricular e mastoidiana. Sobre a superfície auricular posterior, a elevação do retalho compreende, lateralmente, a pele que se estende do sulco auricular superior até aproximadamente 0,5 cm da margem livre da hélice e, inferiormente, até a porção inferior da concha auricular. Na região mastoidiana, a pele elevada se estende, lateralmente, até a linha de implantação do cabelo e, distalmente, até a projeção cutânea mastoidiana do lóbulo auricular. A seguir, o traçado da marcação sobe em direção ao Dissecção do Retalho 101 sulco auricular superior, ladeando a linha de implantação do cabelo (Fig. 33). A incisão começa na altura do sulco auricular superior, a partir do qual, realizamos duas incisões, uma descendente pré-auricular, que se estende até a 0,5 cm anterior ao trago, e outra ascendente, que se estende até a aproximadamente 1 cm abaixo da linha curva temporal superior. A partir deste último ponto, realizamos uma incisão transversal, de aproximadamente 6 cm de comprimento (3 cm para frente e 3 cm para trás) (Fig. 33). Essa incisão se configura em um “T” na região temporal, com uma extensão pré-auricular. A partir do trago, os vasos temporais superficiais são identificados e a incisão prossegue no sentido cranial com a elevação da pele da região temporal no plano da hipoderme (tecido de coloração amarelada), abaixo dos folículos pilosos. Este plano de dissecção é muito importante e deve ser feito com bastante precisão e precaução, pois o pedículo situa-se na espessura da fáscia têmporo-parietal (tecido de coloração rósea), que não pode ser lesada, principalmente na região temporal alta, onde os vasos são mais superficiais. Ao mesmo tempo, devemos ficar atentos para não lesarmos os folículos pilosos da região. A dissecção prossegue por toda a região temporal até a linha curva temporal superior (limite superior do pedículo), de maneira a expor toda a fáscia têmporo-parietal. A partir da linha curva temporal superior, a disseção prossegue no sentido descendente, passando a 5 cm Dissecção do Retalho 102 posteriormente ao sulco auricular superior, até atingirmos o retalho na região mastoidiana (Fig. 34). Até este ponto, a pele da região temporal já foi totalmente rebatida, assim como a exposição de toda a fáscia têmporo- parietal. A elevação do retalho se faz de distal para proximal, começando pela superfície auricular posterior. O plano de dissecção nesta região é supra-pericondral, a fim de podermos enxertar a área doadora. Não existe a necessidade de esqueletização dos vasos auriculares superiores. Assim, a partir do trago, identificamos os vasos temporais superficiais e elevamos todo o tecido celular subcutâneo pré- auricular que circunda os vasos auriculares superiores, a fim de não fragilizar o retorno venoso. Para um retalho condrocutâneo, toda a cartilagem da concha auricular pode se incluída. A dissecção prossegue até a margem posterior do conduto auditivo externo, incluindo assim no pedículo, os vasos auriculares posteriores situados na proximidade do conduto (Fig. 34). Prosseguimos então até o terço inferior da concha, onde os vasos auriculares posteriores são ligados (acima da emergência do ramo para o lóbulo, para preservarmos a vascularização remanescente do pavilhão auricular). O limite inferior do retalho é incisado e a dissecção continua na região mastoidiana no plano supra-periostal, elevando, juntamente com a ilha cutânea, uma porção da fáscia cervical superficial e do músculo occipital , pois essas estruturas se continuam com a fáscia têmporo-parietal superiormente. Ainda na região mastoidiana, a artéria Dissecção do Retalho 103 mastoidiana inferior e sua veia comitante (veia mastoidiana superficial) são ligadas e elevadas com o retalho. O nervo auricular magno também é seccionado neste momento. Após, incisa-se a margem posterior da ilha cutânea e o retalho é elevado de distal para proximal. Na região temporal, a elevação do retalho se faz no plano logo abaixo da fáscia têmporo- parietal, prosseguindo até a região frontal. A ligadura dos vasos parietais é feita no limite superior do pedículo, ou seja, na altura da linha curva temporal superior. Os vasos temporais superficiais são primeiramente clampeados, a fim de se verificar a viabilidade do retalho, e posteriormente ligados. O nervo aurículo-temporal é automaticamente sacrificado devido a sua íntima relação com os vasos temporais superficiais. Este ato poderá ocasionar hipoestesia na região temporal, sem grandes consequências, porém os pacientes devem ser alertados previamente à cirurgia. O pedículo frontal é então dissecado. O limite anterior da elevação do pedículo frontal situa-se a 0,5 cm anteriormente à artéria frontal, tomando-se cuidado de não descermos muito a dissecção, a fim de se preservar o ramo frontal do nervo facial. A largura do pedículo fascial na região frontal deverá possuir entre 3 a 5 cm, permitindo assim, a inclusão do maior número possível de coletores venosos da região (Fig. 33 e 34). Dissecção do Retalho 104 Se houver a necessidade da inclusão do nervo auricular magno, a fim de confeccionarmos um retalho sensível, é necessária a sua dissecção com o maior comprimento possível, ou seja, até a sua emergência na margem lateral do músculo esternocleidomastóideo, com o objetivo de facilitar a neurorrafia na área receptora. Para a tunelização do retalho em direção à face, é necessária a criação de uma zona de descolamento sub ou supra- periostal, a fim de preservarmos a integridade dos ramos nervosos do nervo facial. Esse túnel pode ser confeccionado passando tanto pela região lateral da órbita (atingindo assim a região médio-facial), como pela região glabelar (atingindo mais facilmente a região nasal). O túnel deve ser largo para não comprimir os vasos do pedículo. O retalho poderá, assim, atingir com tranquilidade a região frontal contralateral, o nariz, a região geniana, o corpo da mandíbula e o lábio superior (Fig. 35 e 36).