UNESP - Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Faculdade de Odontologia de Araraquara João Felipe Besegato Avaliação de dispositivo de ultrassom associado à terapia fotodinâmica e vidros bioativos na remoção, descontaminação e remineralização de lesões artificiais de cárie em dentina Araraquara 2021 UNESP - Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Faculdade de Odontologia de Araraquara João Felipe Besegato Avaliação de dispositivo de ultrassom associado à terapia fotodinâmica e vidros bioativos na remoção, descontaminação e remineralização de lesões artificiais de cárie em dentina Tese apresentada à Universidade Estadual Paulista (Unesp), Faculdade de Odontologia, Araraquara para obtenção do título de Doutor em Ciências Odontológicas, na Área de Dentística Restauradora Orientadora: Profa. Dra. Alessandra Nara de Souza Rastelli Araraquara 2021 B554a Besegato, João Felipe Avaliação de dispositivo de ultrassom associado à terapia fotodinâmica e vidros bioativos na remoção, descontaminação e remineralização de lesões artificiais de cárie em dentina / João Felipe Besegato. -- Araraquara, 2021 142 p. : il., tabs. Tese (doutorado) - Universidade Estadual Paulista (Unesp), Faculdade de Odontologia, Araraquara Orientadora: Alessandra Nara de Souza Rastelli 1. Ultrassom. 2. Fotoquimioterapia. 3. Cárie dentária. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca da Faculdade de Odontologia, Araraquara. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. João Felipe Besegato Avaliação de dispositivo de ultrassom associado à terapia fotodinâmica e vidros bioativos na remoção, descontaminação e remineralização de lesões artificiais de cárie em dentina Comissão julgadora Tese para obtenção do grau de Doutor em Ciências Odontológicas Presidente e orientador: Profa. Dra. Alessandra Nara de Souza Rastelli 2º Examinador: Profa. Dra. Michelli Alexandra Chinelatti 3º Examinador: Prof. Dr. Marcelo Ferrarezi de Andrade 4º Examinador: Dra. Caroline Coradi Tonon 5º Examinador: Prof. Dr. Clovis Wesley Oliveira de Souza Araraquara, 15 de dezembro de 2021. DADOS CURRICULARES João Felipe Besegato NASCIMENTO: 16/10/1993 – São João – Paraná FILIAÇÃO: Edilson Besegato e Suzana Brusamarello Besegato 2011 – 2015: Graduação em Odontologia Universidade Estadual de Londrina (UEL), Londrina, Paraná, Brasil. 2016 – 2018: Mestrado em Clínica Odontológica Universidade Estadual de Londrina (UEL), Londrina, Paraná, Brasil. 2018 – 2021: Doutorado em Ciências Odontológicas Faculdade de Odontologia de Araraquara, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FOAr/UNESP), Araraquara, São Paulo, Brasil. Dedico este trabalho à minha família, amigos e a todos aqueles que de alguma maneira tornaram este sonho possível. AGRADECIMENTOS À Deus, por me conceder o dom da vida, por não me deixar desanimar e me manter firme nos meus propósitos. Sem a graça divina, de nada valeria um título de doutor. Aos meus pais, Edilson Besegato e Suzana Besegato, o meu mais sincero e genuíno agradecimento. Desde que saí de casa para estudar, encontrei dificuldades, amadureci, me tornei cirurgião-dentista, mestre e agora doutor. Entretanto, nenhuma dessas conquistas ou títulos seriam possíveis, ou fariam sentido, sem o apoio incondicional que recebo de vocês. Por diversas vezes vocês renunciaram ao conforto e estabilidade para prover a mim o melhor possível. Sendo assim, nenhuma palavra ou agradecimento serão capazes de expressar a minha gratidão por tudo isso. De qualquer forma, preciso dizer que todas as minhas conquistas são consequências dos princípios, exemplos e ensinamentos que recebi de vocês. Por isso, obrigado por serem vocês, cada um a seu modo. Espero um dia retribuir cada incentivo, motivação, subsídio, palavras de carinho e gestos de amor. Pai, mãe... eu amo vocês com todo o meu coração, todos os dias de minha vida. Obrigado por tudo e por tanto. Ao meu irmão, José Vitor Besegato, que mesmo tão diferente de mim, sempre me apoiou, entendeu e incentivou minhas escolhas. Desejo que o mundo descubra e reconheça a pessoa maravilhosa que és e o coração enorme que tens. Seu irmão te ama e estará contigo em todos os momentos. Aos meus avós, Euclides, Izaías, Leonira e Realda. Obrigado por entenderem minha ausência durante todo este período. E principalmente, obrigado por serem exemplos de humildade, generosidade, carinho e admiração. À toda a minha família, que sempre me apoiou incondicionalmente. Sou eternamente grato a Deus por tê-los em minha vida. À minha orientadora, Profa. Dra. Alessandra Nara de Souza Rastelli, pela orientação deste trabalho, pela confiança em mim depositada e por me ensinar a importância do comprometimento, da dedicação e da autossuficiência. Ao Magnífico Reitor Prof. Dr. Pasqual Barreti e Vice-Reitora Profa. Dra. Maysa Furlan da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. À Faculdade de Odontologia de Araraquara da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, representada pelo diretor Prof. Dr. Edson Alves de Campos e pela vice-diretora Profa. Dra. Patrícia Petromilli Nordi Sasso Garcia, por oferecer estrutura física e de pessoal, assim como condições adequadas para a realização de nossas atividades. Ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Odontológicas, representado pela coordenadora Profa. Dra. Andreia Bufalino. À Seção Técnica de Pós-Graduação, pela atenção, empenho e organização dispendida para cada um dos discentes. Agradeço em especial ao assistente administrativo Sr. Cristiano Afonso Lamounier, pela gentileza, educação, empatia e solicitude com quem trata todos os discentes, sendo um exemplo de servidor público e ser humano. A todos os servidores da Faculdade de Odontologia de Araraquara, que se empenham diariamente de maneira primorosa para fornecer um ambiente de trabalho adequado. À assistente administrativa do Departamento de Odontologia Restauradora da Faculdade de Odontologia de Araraquara, Sra. Creusa Maria Hortenci. Minha querida e amada Creusa, obrigado pela convivência diária, pelos conselhos e palavras de amparo, por zelar do Departamento como se fosse sua casa, e por cuidar dos alunos como se fossem seus filhos. Você estará eternizada em meu coração pela sua sensibilidade, empatia, e talento nato em acolher. Obrigado por tudo e por tanto. Te amo! Aos docentes da disciplina de Dentística Restauradora, Profa. Dra. Alessandra Nara de Souza Rastelli, Profa. Dra. Andrea Abi Rached Dantas, Prof. Dr. Edson Alves de Campos, Prof. Dr. José Roberto Cury Saad, Prof. Dr. Marcelo Ferrarezi de Andrade, Prof. Dr. Osmir Batista de Oliveira Júnior, pelas oportunidades e convívio diário ao longo deste período. A todos os docentes da Faculdade de Odontologia de Araraquara, por compartilharem seus conhecimentos e contribuírem para o meu crescimento técnico- científico. Agradeço em especial à Profa. Dra. Josimeri Hebling, Profa. Dra. Elaine Maria Sgavioli Massucato, Profa. Dra. Gisele Faria, Prof. Dr. Paulo Cerri, por me ajudarem e me incentivarem em momentos marcantes do doutorado. Ao Departamento de Odontologia Restauradora da Faculdade de Odontologia de Araraquara, representado pela chefe Profa. Dra. Alessandra Nara de Souza Rastelli. À Profa. Dra. Andrea Abi Rached Dantas, pela confiança em meu trabalho, por me dar a oportunidade de ministrar aulas durante o doutorado, e principalmente, pela humildade e empatia com quem trata a todos. Ao Prof. Dr. Marcelo Ferrarezi de Andrade, por estimular e dar oportunidades da prática clínica. À Dra. Caroline Coradi Tonon, que mesmo distante, me ajudou sempre que possível e de quem tenho um grande carinho. Você vai longe, Carol. Espero um dia lhe encontrá-la pessoalmente. Obrigado por aceitar o convite de fazer parte de minha banca avaliadora. Ao Prof. Dr. Clovis Wesley Oliveira de Souza, por aceitar fazer parte da banca avaliadora. Mesmo não o conhecendo pessoalmente, estou certo que seu conhecimento e competência irão contribuir significativamente para a melhoria deste trabalho. Muito obrigado. À Profa. Dra. Michelli Alexandra Chinelatti, pela agradável colaboração durante as reuniões do grupo de pesquisa e por aceitar o convite de fazer parte de minha banca avaliadora. Mesmo não a conhecendo pessoalmente, saiba que tenho uma grande admiração e respeito pela professora. Ao Prof. Dr. Adilson César Abreu Bernardi, pelas contribuições ao longo do doutorado, principalmente nas bancas de pré-qualificação e qualificação. Obrigado pela maneira humilde, acessível e gentil que sempre me tratou. À Profa. Dra. Angela Cristina Cilense Zuanon, pelas contribuições em minha banca de pré-qualificação. À Profa. Dra. Elisa Maria Aparecida Giro, por gentilmente emprestar o dispositivo para análise de microcisalhamento. Ao técnico Diego, por dobrar os fios ortodônticos utilizados para indução de lesão de cárie. À Dra. Paula Aboud Barbugli, por todo o suporte técnico nas análises de microscopia confocal, pela atenção e disponibilidade em ajudar, e principalmente, pela agradável companhia. Ao Prof. Dr. Milton Carlos Kuga, pela confiança em mim depositada e por toda a ajuda e amparo que me deu sem qualquer obrigação. Ao Prof. Dr. Márcio Grama Hoeppner, por ser meu maior exemplo profissional e incentivador. Meu eterno orientador, que se faz presente mesmo longe e continua me dando todo o suporte mesmo após o mestrado. Obrigado por acreditar, desde muito cedo, em meu potencial no ambiente acadêmico. Jamais serei grato o suficiente por todos os ensinamentos e ajuda. Espero um dia ser um profissional, e ser humano, tão bom quanto o senhor. Ao Laboratório de Análise Histopatológica para cortes não descalcificados da Faculdade de Odontologia de Araraquara, por permitir acesso para realização das análises de microscopia de luz polarizada. Ao Departamento de Odontologia Restauradora da Faculdade de Odontologia de Ribeirão Preto (FORP) da Universidade de São Paulo (USP). Agradeço em especial ao Laboratório de Pesquisa em Dentística, à Profa. Dra. Regina Guenka Palma Dibb, e à servidora Patrícia Marchi, por permitirem a utilização do microdurômetro. Ao Instituto de Química de Araraquara da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (IQ-UNESP) e ao Laboratório Multiusuário de Análises Químicas, em especial aos servidores Naira Canevarolo Pesquero e Alberto Camilo Alécio, por todo o suporte técnico oferecido durante as análises de FT- Raman. À Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Araraquara (FCFAr) da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), em especial ao Laboratório CMAF (Ciência dos Materiais Aplicada à Farmácia), por permitir o acesso e fornecer subsídios para preparação das micelas poliméricas. Ao Prof. Dr. Marlus Chorilli, do Departamento de Fármacos e Medicamentos da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Araraquara (FCFAr) da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), por confiar em meu trabalho e estar sempre disposto a ajudar com sua gentileza e humildade. À mestre Amanda Letícia Polli Silvestre, por me dar oportunidades de participar em seus trabalhos e por ter se tornado uma grande amiga. Ao amigo Gabriel Garcia de Carvalho, por sanar muitas dúvidas durante os meus experimentos. Não tenho dúvidas do seu sucesso profissional, pois ele será consequência da sua competência e dedicação. À amiga Vivian Tellaroli Minhaco, com quem tive o prazer de conhecer melhor durante os empréstimos da Biotable. Sua simpatia, educação e generosidade me fizeram ser um grande admirador de sua pessoa. Que sua vida seja repleta das melhores coisas que este mundo possa oferecer. À Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB) da Universidade de São Paulo (USP), em especial ao Laboratório de Bioquímica, e à técnica Larissa Grizzo, pelo suporte técnico durante as análises de microradiografia transversal. Ao Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da Universidade de São Paulo (USP), pelo desenvolvimento, fornecimento e manutenção do dispositivo de ultrassom. Agradeço especialmente ao Laboratório de Apoio Tecnológico (LAT), e aos servidores Thiago Moretti e Paulo Estevão, por sempre prestarem apoio técnico quando necessário. Ao Laboratório de Materiais Vítreos (LaMav) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), pelo preparo e fornecimento dos vidros bioativos. Agradeço em especial à Dra. Marina Trevelin Souza, pela atenção, solicitude e gentileza de sempre. Foi um grande prazer conhecê-la Marina, mesmo que virtualmente. À CAPES: O presente trabalho foi realizado com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de financiamento 001. À FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Processo nº 2013/07276-1) pelo apoio financeiro essencial para realização dessa pesquisa. Aos colegas e amigos de pós-graduação, por tornarem o doutorado mais leve e feliz. Agradeço em especial aos amigos Camila Lebre, Diego Dantas, Eran Almeida, Joatan Costa, Jessica Katarine, Lucas Portela, Thais Piragine, Juliana Proença e Lorena Gutierrez. Levarei cada um de vocês em meu coração, assim como os momentos marcantes e felizes que vivemos. Aos amigos César Cuniyochi e Keli Frondaroli, pela inesperada, porém agradável amizade. Entre treinos e exercícios, vocês ouviram meus desabafos, me aconselharam, e se tornaram pessoas especiais em minha vida. Aos alunos da graduação, com quem tive a oportunidade de aprender e ensinar. À minha inseparável amiga de infância, Luana Pires Pinheiro, que mesmo longe se fez presente. Obrigado por ouvir meus desabafos e torcer pelas minhas conquistas desde sempre. Que nossa amizade perdure e se fortaleça ao longo do tempo. Às amigas de longa data, Laiane Navarro, Nathana Wendy e Gabriella Sieni, por continuarem me incentivando e me ouvindo. Meus presentes da graduação que guardo em meu coração independentemente de onde estiver. À minha querida amiga Básia Rabelo Nogueira. Dona de uma personalidade única e coração imenso, você soube me ouvir, apoiar e ajudar. Sentirei saudade da sua companhia diária e até mesmo das implicâncias mútuas que dividíamos. Saiba que você ganhou um amigo para a vida. Obrigado! À fiel colega de pesquisa e grande amiga, Priscila Borges Gobbo de Melo. Ninguém conhece melhor os caminhos percorridos ao longo do doutorado do que você, com quem dividi praticamente tudo. Você viveu e sentiu na pele cada dificuldade que tivemos que enfrentar. Mas você também comemorou comigo cada conquista. Obrigado pelas milhares de horas ao meu lado no laboratório, escrevendo artigos, realizando análises e tendo a paciência e humildade de ensinar e aprender. Pri, você é um ser humano lindo. Sua generosidade, paciência, comprometimento e competência me encantam. Eu não conseguiria ter feito nada disso sem a sua ajuda e companhia. Por isso, desejo que em todos os lugares que passar, ou que todas as pessoas que encontrar, saibam reconhecer e aproveitar todas as suas qualidades e competências. Saiba que sou eternamente grato pela amizade que construímos. Obrigado por tudo e por tanto. Ao meu grande amigo, Aryvelto Miranda Silva. Estivemos lado ao lado desde o primeiro dia do doutorado, literalmente. Até chegar a este agradecimento, vivemos muita coisa juntos, e me orgulho de cada uma delas. Juntos percorremos terrenos desconhecidos, e muitas vezes desafiadores, que eu jamais iria percorrer sozinho. Obrigado por cada incentivo e conselho, mas principalmente por estar ao meu lado em todos os momentos. Orgulho de quem você é e de tudo aquilo que ainda irá se tornar. Estarei sempre aqui por você. Obrigado! Alguns laços são tão fortes, bonitos e intensos, que ao tentar explicar, conseguimos apenas agradecer. Por isso, meu mais sincero agradecimento às inseparáveis e queridas amigas, Joissi Ferrari Zaniboni e Tatiane Miranda Manzoli. Vocês já sabem da minha gratidão e carinho por tudo o que fizeram e pelo tanto que nossa amizade representa para mim. Por isso, quando ouvirem meu nome, peço que se lembrem de cada risada no sofá, de cada festa, de cada desabafo coletivo, de cada momento compartilhado. E após lembrarem, tenham a certeza que boa parte desta conquista e desta etapa de minha vida, eu devo a vocês, minhas grandes amigas. Obrigado por cruzarem meu caminho. Amo vocês. Por fim, o meu mais sincero agradecimento a cada um que me ajudou a chegar até aqui e me fez enxergar claramente que não importa o que você tem na vida, mas quem você tem na vida. Obrigado! “Construirás os labirintos impermanentes que sucessivamente habitarás. Todos os dias estarás refazendo o teu desenho. Não te fatigues logo. Tens trabalho para toda a vida... Somos sempre um pouco menos do que pensávamos. Raramente, um pouco mais.” Cecília Meireles  Meireles C. Retrato natural. São Paulo: Editora Global; 1949. Besegato JF. Avaliação de dispositivo de ultrassom associado à terapia fotodinâmica e vidros bioativos na remoção, descontaminação e remineralização de lesões artificiais de cárie em dentina [tese de doutorado]. Araraquara: Faculdade de Odontologia da UNESP; 2021. RESUMO O objetivo deste estudo foi avaliar a eficácia do uso de aparelho de ultrassom na remoção de tecido cariado, da terapia fotodinâmica antimicrobiana (TFDA) na descontaminação da dentina e da aplicação de materiais bioativos na remineralização dentinária, assim como as influências dessas terapias na resistência adesiva, em lesões artificiais de cárie induzidas por modelo biológico. Espécimes de dentina bovina (4x4x2 mm) foram obtidos e aleatorizados em grupos de acordo com o método de remoção do tecido cariado: fresa (FR) ou ultrassom (ULT); método de descontaminação: com ou sem a aplicação de TFDA; e a aplicação de vidros bioativos para remineralização dentinária (45S5 ou F-18). Sendo assim, os espécimes foram aleatorizados em 14 grupos: cárie dentária (controle); dentina hígida (controle); FR; FR+TFDA; ULT; ULT+TFDA; FR+45S5, FR+F-18; ULT+45S5, ULT+F-18; FR+TFDA+45S5; FR+TFDA+F-18; ULT+TFDA+45S5; ULT+TFDA+F-18. Após os tratamentos, os espécimes foram avaliados por meio de microradiografia transversal, microdureza longitudinal, FT-Raman e microscopia confocal. Os dados foram submetidos à avaliação dos pressupostos de normalidade e homoscedasticidade. Para comparação entre os grupos, ANOVA dois fatores seguido de pós-teste de Tukey foram utilizados em nível de significância de 5%. A análise das imagens de microscopia confocal foi realizada qualitativamente. De acordo com os resultados, a média da microdureza superficial dos espécimes foi de 40,86 ± 8,74 KHN. A microradiografia transversal revelou que a profundidade média das lesões foi de 213,9 ± 49,5 µm. Já a porcentagem de perda mineral foi de 4929,3 %vol.µm. A microdureza longitudinal evidenciou uma tendência geral em que a microdureza de um mesmo grupo aumenta em função da profundidade, independentemente do grupo avaliado (p < 0,05). Os grupos removidos com FR (24,40 – 63,03 KHN) apresentam dureza maior em comparação aos removidos com ULT (20,01 – 47,53 KHN), independentemente da profundidade (p < 0,05). Em geral, a TFDA não promoveu efeito significativo na microdureza (p > 0,05). Não houve diferença entre FR associada com 45S5 ou F-18 (p > 0,05). No entanto, na associação entre ULT e os vidros bioativos, diferenças mostram que F-18 apresentou valores maiores em relação ao 45S5. Os dados de FT- Raman mostram que para o componente fosfato não foi observado nenhuma diferença estatística significante (p > 0,05). Já para o componente carbonato, na profundidade de 200 µm houve diferença entre os grupos FR+TFDA e ULT+TFDA+45S5 (0,0355 e 0,0003 respectivamente (p < 0,05). Quanto às ligações C-H, diferença significante foi observada entre os grupos FR e ULT+TFDA (0,1869 e 0,0457 respectivamente (p < 0,05), na profundidade de 40 µm. A microscopia confocal revelou a eficácia da TFDA em inativar bactérias residuais. Os resultados de resistência adesiva evidenciaram que não houve diferença entre os grupos experimentais (p > 0,05). Falha do tipo adesiva foi predominante para a maioria dos grupos. Pôde-se concluir que a remoção com ULT é mais conservadora em relação a FR e a TFDA é eficaz como estratégia de descontaminação. Ambos os vidros mostraram resultados similares, embora alguns grupos tenham evidenciado melhores resultados para o F-18. Nenhuma das terapias influenciaram negativamente a adesão de materiais resinosos à dentina. Sendo assim, a abordagem combinada das diferentes estratégias parece ser promissora e minimamente invasiva no tratamento da lesão de cárie em dentina. Palavras – chave: Ultrassom. Fotoquimioterapia. Cárie dentária. Besegato JF. Evaluation of ultrasound device associated with photodynamic therapy and bioactive glasses in the removal, decontamination and remineralization of caries- like dentin [tese de doutorado]. Araraquara: Faculdade de Odontologia da UNESP; 2021. ABSTRACT This study aimed to evaluate the efficacy of an ultrasound device to remove caries dentin, antimicrobial photodynamic therapy (TFDA) to decontaminate dentin and the application of bioactive materials to remineralize the dentin, as well as the influences of these therapies on bonding strength in artificial caries lesions. Bovine dentin specimens (4x4x2 mm) were obtained and randomized into groups according to the removal methods of caries dentin: bur (FR) or ultrasound (ULT); decontamination method: with or without the application of TFDA; and the application of bioactive glasses for dentin remineralization (45S5 or F-18). Thus, specimens were randomized into 14 groups: dental caries (control); sound dentin (control); FR; FR + TFDA; ULT; ULT + TFDA; FR + 45S5, FR + F-18; ULT + 45S5, ULT + F-18; FR + TFDA + 45S5; FR + TFDA + F-18; ULT + TFDA + 45S5; ULT + TFDA + F-18. After treatments, the specimens were evaluated by transverse microradiography, cross-sectional microhardness, FT-Raman and confocal microscopy. Data were submitted to the assessment of the assumptions of normality and homoscedasticity. For comparison between groups, two-way ANOVA followed by Tukey's post-test were used at a significance level of 5%. The analysis of confocal microscopy was performed qualitatively. According to the results, the surface microhardness mean was 40.86 ± 8.74 KHN. Transverse microradiography revealed that the average depth of the lesions was 213.9 ± 49.5 µm. The percentage of mineral loss was 4929.3% vol.µm. Cross- sectional microhardness showed a trend in which the microhardness of the same group increases as a function of depth, regardless of the group (p < 0.05). Groups removed with FR (24.40 - 63.03 KHN) have greater hardness compared to those removed with ULT (20.01 - 47.53 KHN), regardless of depth (p < 0.05). In general, TFDA did not have a significant effect on microhardness (p > 0.05). There was no difference between RF associated with 45S5 or F-18 (p > 0.05). However, in the association between ULT and bioactive glasses, F-18 showed higher values compared to 45S5. FT-Raman data show that for the phosphate component, no statistically significant difference was observed (p> 0.05). For the carbonate component, at 200 µm depth there was a difference between FR+TFDA and ULT+TFDA+45S5 groups (0.0355 and 0.0003 respectively (p < 0.05). The C-H bonding revealed a difference between FR and ULT+TFDA groups (0.1869 and 0.0457 respectively (p < 0.05), at 40 µm depth. Confocal microscopy images showed the effectiveness of TFDA in inactivating residual bacteria. No differences among the experimental groups were observed after microshear bond strength test (p > 0,05). Adhesive failure was the most predominant failure mode. It can be concluded that ULT removal is conservative, preserving caries- affected dentin. TFDA is effective as a decontamination strategy prior restoration. Both bioactive glasses showed similar results, although some groups have shown better results for F-18. Any of the experimental treatments negatively affected the adhesion to dentin. In conclusion, the combing approach using ultrasound, TFDA and bioactive glasses is promising to provide a minimally invasive treatment. Keywords: Ultrasonics. Photodynamic therapy. Dental caries. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................. 21 2 OBJETIVO ........................................................................................................ 25 2.1 Objetivo Geral............................................................................................... 25 2.2 Objetivos Específicos ................................................................................. 25 3 REVISÃO DE LITERATURA ........................................................................... 27 3.1 Doença Cárie Dentária ................................................................................ 27 3.2 Remoção de Tecido Cariado ...................................................................... 29 3.3 Modelos Artificias de Indução de Cárie .................................................... 32 3.4 Instrumentação Cavitária ........................................................................... 34 3.5 Terapia Fotodinâmica Antimicrobiana (TFDA) ......................................... 38 3.6 TFDA no Tratamento da Doença Cárie ..................................................... 41 3.7 Vidros Bioativos .......................................................................................... 45 4 MATERIAIS E MÉTODOS ............................................................................... 48 4.1 Delineamento Experimental ....................................................................... 48 4.2 Fase Inicial ................................................................................................... 50 4.2.1 Obtenção e preparo dos espécimes de dentina bovina ....................... 50 4.2.2 Seleção das bactérias e preparo da suspensão bacteriana padronizada ....................................................................................................... 51 4.2.3 Método de preparação das micelas poliméricas ................................... 52 4.2.4 Fotossensibilizador e fonte de luz a ser utilizada para TFDA .............. 54 4.2.5 Determinação da concentração inibitória mínima (CIM) e da concentração bactericida (CBM) ..................................................................... 54 4.2.6 Indução da lesão de cárie artificial ......................................................... 56 4.2.7 Microradiografia transversal (MT) .......................................................... 59 4.2.8 Métodos para remoção e descontaminação do tecido cariado ........... 61 4.2.9 Aplicação de vidro bioativo como agente remineralizante .................. 64 4.3 Fase Experimental ....................................................................................... 65 4.3.1 Microdureza Knoop longitudinal ............................................................. 65 4.3.2 Microscopia Raman com transformada de Fourier (FT-Raman) ........... 66 4.3.3 Microscopia confocal de varredura a laser (MC) .................................... 68 4.3.4 Preparo dos corpos de prova em resina composta ................................ 69 4.3.5 Resistência adesiva .................................................................................. 73 4.3.6 Padrão de falha .......................................................................................... 73 4.4 Análise Estatística ....................................................................................... 74 5 RESULTADOS ................................................................................................. 75 5.1 Fase Inicial ................................................................................................... 75 5.1.1 Microdureza Knoop superficial ................................................................ 75 5.1.2 Determinação da concentração inibitória mínima (CIM) e da concentração bactericida (CBM) ..................................................................... 75 5.1.3 Microradiografia transversal .................................................................... 77 5.2 Fase Experimental ....................................................................................... 79 5.2.1 Microdureza Knoop longitudinal .............................................................. 79 5.2.2 FT-Raman .................................................................................................. 83 5.2.3 Microscopia confocal a laser .................................................................... 85 5.2.4 Resistência adesiva ................................................................................. 100 5.2.5 Padrão de falha ......................................................................................... 101 6 DISCUSSÃO .................................................................................................... 107 7 CONCLUSÃO .................................................................................................. 121 REFERÊNCIAS ................................................................................................... 122 ANEXO ................................................................................................................ 142 21 1 INTRODUÇÃO A cárie dentária é uma doença biofilme-açúcar-dependente que resulta na desmineralização dos substratos dentários. A produção de ácidos pelos microrganismos presentes no biofilme bacteriano compromete o equilíbrio do processo de desmineralização e remineralização1-3, resultando na destruição/dissolução da estrutura dentária. Por ser uma das doenças orais mais prevalentes4, a etiologia, prevenção, controle e tratamento da doença cárie deve ser estudada, a fim de identificar e investigar fatores e terapias que contribuam na diminuição de sua prevalência nas populações. Aproximadamente 700 a 800 espécies de bactérias têm sido identificadas na microbiota oral, tornando a cavidade bucal o meio com maior diversidade microbiológica do corpo humano5. Essa complexidade propicia o desenvolvimento de biofilme devido a fatores como potencial hidrogeniônico (pH), localização dos dentes e tipo de substrato6. Idealmente, o biofilme e suas interações com fatores internos e externos são melhores estudados em seu ambiente natural. Diferentes modelos de indução de cárie podem ser utilizados, os quais apresentam diferentes padrões de desenvolvimento da lesão de cárie7. O método químico utilizando gel/solução ácida8,9 ou solução tampão10 é comumente empregado no desenvolvimento de cárie artificial. Entretanto, esse método não é capaz de reproduzir o processo de desenvolvimento natural da cárie, como a presença de biofilme7. Para promover ambiente ácido e simular de maneira mais fidedigna às condições naturais do desenvolvimento da lesão de cárie11, emprega-se o uso de microrganismos produtores de ácidos na indução de lesões artificiais. Conhecido como modelo biológico, sua utilização é pertinente devido à conhecida importância de alguns microrganismos, em especial o Streptococcus mutans, no desenvolvimento da cárie primária e cárie recorrente12. Ainda mais fiel às condições naturais, o biofilme de microcosmo produzido a partir dos microrganismos presentes na saliva humana, possibilita alto número de espécies e interações entre elas13. Além do mais, modelos desse tipo permitem avaliar o efeito antimicrobiano ou anticariogênico de substâncias e/ou terapias ainda em testes iniciais14, em ambiente controlado e exposto a menor variabilidade. O conceito de odontologia minimamente invasiva somado ao conhecimento atual sobre a doença cárie possibilitou a transformação do paradigma em relação ao 22 seu tratamento restaurador. Portanto, a preservação máxima de estrutura dentária hígida e passível de remineralização com o intuito de manter a integridade pulpar por meio da remoção parcial do tecido cariado, se tornou o tratamento restaurador de escolha15. Dessa forma, a otimização dos métodos convencionais de prevenção de cárie e o desenvolvimento de novas estratégias são fundamentais para a promoção da saúde bucal16. Os métodos conservadores de tratamento de lesão de cárie preconizam a remoção da dentina infectada e preservação da dentina afetada, passível de remineralização17. Clinicamente, a diferenciação entre esses dois tipos de substratos dentinários é muito subjetiva, principalmente em lesões mais profundas. Tal limitação é capaz de promover a remoção excessiva e desnecessária do tecido afetado18. Um método alternativo à remoção mecânica e invasiva dos microrganismos presentes na lesão seria a possibilidade de erradicação ou redução dos patógenos com potencial cariogênico18. A descontaminação cavitária têm sido proposta com o intuito de inibir o crescimento e proliferação bacteriana após a remoção seletiva de tecido cariado19. A substância antibacteriana mais utilizada para tal finalidade é a clorexidina19, que além de inibir a atividade bacteriana é capaz de inibir as metaloproteinases da matriz dentinária, prevenindo a degradação da camada híbrida e melhorando a adesão ao longo do tempo20. No entanto, o uso da clorexidina como desinfetante cavitário está atrelado há alguns efeitos indesejáveis que restringem sua aplicação clínica. Xerostomia, alteração do paladar, descoloração da língua, descamação da mucosa, sensação de queimação, pigmentação do elemento dentário, aumento da formação de cálculo e desenvolvimento de reações alérgicas21-24 são algumas das limitações relacionadas ao uso da clorexidina na prática clínica. Considerando as limitações da clorexidina, a terapia fotodinâmica antimicrobiana (TFDA) apresenta-se como uma opção promissora e viável como técnica antibacteriana sobre patógenos cariogênicos, principalmente em lesões profundas18,25-28. A reação fotodinâmica é baseada na associação entre uma droga, conhecida como fotosensibilizador (FS), e uma fonte de luz em comprimento de onda específico capaz de levar a molécula do FS a um estado excitatório29. A absorção dos fótons pelo FS induz uma série de reações envolvendo a formação de radicais livres e espécies reativas de oxigênio30. Essas espécies altamente reativas são tóxicas e causam danos às proteínas, lipídios, ácido nucleico e outros componentes celulares 23 de microrganismos, assumindo papel importante no dano e morte celular dos mesmos31. Dessa forma, acredita-se que seja improvável que a TFDA promova resistência antibiótica das bactérias, já que nos microrganismos os radicais livres e espécies reativas de oxigênio interagem com várias estruturas celulares por meio de diferentes vias metabólicas1,32. Além disso, esta técnica é altamente seletiva, pois apenas as células que interagem com o FS e são expostas à fonte de luz serão danificadas e levadas à morte celular33,34. Sendo assim, a TFDA pode ser utilizada como uma estratégia de descontaminação cavitária sem promover resistência bacteriana e os efeitos indesejáveis da clorexidina. Embora os lasers sejam muito utilizados para a sensibilização dos FS26, os diodos emissores de luz (LED) representam uma fonte de luz alternativa e viável26,27. Os dispositivos de luz LED têm como vantagens menor custo, tecnologia mais simples e possibilidade de serem configurados para diferentes funções26. Em geral, os FS são classificados como derivados ou não das porfirinas. Na odontologia, os FS mais utilizados são o azul de metileno e azul de toluidina. Recentemente, o composto fenólico natural curcumina, membro da família das curcuminoides, tem apresentado grande potencial como FS devido ao seu potencial de absorver luz no espectro azul36,37. Entretanto, ainda é pouco conhecido se os radicais livres liberados na reação fotodinâmica são capazes de afetar negativamente a interface adesiva38 quando da restauração de cavidades com materiais adesivos após a remoção de tecido cariado. As fresas de corte acopladas em instrumentos rotatórios são amplamente utilizadas na prática clínica para remover tecido cariado. No entanto, a remoção com fresa tende a promover remoção excessiva de tecido39, dificultando uma abordagem conservadora por meio de uma remoção precisa e controlada. Considerando essas limitações, dispositivos que utilizam energia ultrassônica também podem ser utilizados para remover tecido cariado40, apesar de poucos estudos relatarem seu uso e eficácia. Sendo assim, esse estudo apresenta um protótipo de aparelho ultrassônico descariador, com o intuito de permitir e facilitar a remoção conservadora do tecido cariado de maneira mais precisa. Ainda no contexto da necessidade de uma abordagem conservadora e ao mesmo tempo que promova sucesso no tratamento da cárie, materiais bioativos como os biovidros tem sido utilizados como agentes dessensibilizantes e remineralizantes16,41. Embora tenham sido inicialmente desenvolvidos para auxiliar e 24 melhorar a regeneração óssea42, a similaridade de composição entre o tecido ósseo e os tecidos duros do dente, levam a suposição de que os vidros bioativos podem ser eficientes na regeneração de esmalte e dentina41. Entretanto, a eficácia da remineralização e o tempo necessário para que isso ocorra, ainda necessitam de investigação43. Considerando o cenário exposto, não existem informações na literatura atual em relação ao uso de um dispositivo ultrassônico descariador com o intuito específico de promover a remoção conservadora do tecido cariado. Além disso, estudos prévios têm avaliado a eficácia da TFDA como agente antimicrobiano no tratamento de cárie18,26,27. Adicionalmente, a eficácia da remineralização dos materiais bioativos43 no tratamento de cárie e suas influências na adesão de materiais restauradores à dentina ainda necessitam de investigações. Dessa forma, esse estudo possibilita obter informações relevantes sobre a eficácia e viabilidade dos tratamentos/terapias empregadas, assim como pode ser capaz de encorajar a realização de ensaios clínicos futuros. 25 2 OBJETIVO 2.1 Objetivo Geral Avaliar a eficácia de diferentes abordagens, combinadas ou isoladas, para tratamento de lesões de cárie em dentina. Avaliou-se um dispositivo de ultrassom para remoção de dentina cariada, a TFDA como estratégia de descontaminação de dentina e a aplicação de vidros bioativos para remineralização dentinária. A influência dessas abordagens na dureza e composição da dentina, na viabilidade celular bacteriana e na resistência adesiva à dentina foram também avaliadas. 2.2 Objetivos Específicos • Determinar as concentrações inibitória mínima e bactericida máxima a fim de determinar a concentração de fotossensibilizador a ser utilizado na aplicação da TFDA; • Avaliar a profundidade das lesões e a perda mineral promovida pela indução artificial de cárie por meio de microradiografia transversal; • Analisar a dureza Knoop superficial dos espécimes de dentina com o intuito de padronizar e selecionar os espécimes a serem utilizados nos experimentos futuros; • Avaliar o efeito da associação entre remoção com ultrassom, aplicação de TFDA e materiais bioativos na microdureza longitudinal da dentina após os diferentes tratamentos; • Avaliar a capacidade de remineralização dos vidros bioativos por meio das alterações no conteúdo orgânico e inorgânico da dentina após os diferentes tratamentos de remoção, descontaminação e remineralização por meio da análise de FT-Raman; • Avaliar o impacto da TFDA na viabilidade celular por meio de análise de microscopia confocal; • Avaliar se o emprego dos métodos de remoção, descontaminação e remineralização da dentina afetada por cárie influencia a resistência adesiva 24 horas após a confecção de corpos de prova em resina composta por meio de testes de microcisalhamento; 26 • Avaliar o padrão de falha da interface adesiva sobre a superfície dentinária após a fratura dos corpos de prova de resina composta por meio de imagens de microscopia ótica e ilustrá-las com imagens de microscopia eletrônica de varredura (MEV). 27 3 REVISÃO DA LITERATURA 3.1 Doença Cárie Dentária De acordo com o último levantamento global, a cárie em dentes permanentes é a doença humana mais prevalente no mundo4. Devido a isso e com o avanço do conhecimento acerca do processo saúde-doença, importantes mudanças de paradigma ocorreram em relação aos conceitos etiológicos e fatores determinantes da doença cárie5. Dessa forma, o conceito de doença infecciosa e transmissível e focado principalmente no Streptococcus mutans foi substituído por um paradigma que enfatiza a interação ecológica-bacteriana na patogênese da cárie5. No final do século XIX aceitava-se que a doença cárie era causada pelo crescimento inespecífico da placa bacteriana, também chamada de hipótese da placa inespecífica44. De acordo com essa hipótese, a quantidade de placa bacteriana presente na cavidade bucal era determinante nos níveis de patogenicidade da doença, desconsiderando os diferentes níveis de virulência existentes entre os microrganismos da placa44. Nesse sentido, recomendava-se a maior remoção mecânica possível da placa bacteriana como estratégia principal de controle e prevenção da doença cárie45. Em meados do século XX, estudos utilizando modelo animal revolucionaram os conceitos etiológicos da doença cárie, proclamando-a como doença transmissível e infecciosa46,47. Posteriormente, Loesche48 (1976) publicou a hipótese da placa específica, postulando que a doença cárie era uma “infecção” causada por bactérias específicas da placa dentária48. Como resultado, o diagnóstico, a prevenção e o tratamento da doença cárie foi por décadas baseado e focado no controle das bactérias do grupo Streptococcus48. Com o avanço do conhecimento, os conceitos e hipóteses relacionados à doença cárie foram revistos, alterados ou até mesmo refutados por meio da condução de pesquisas e obtenção de novas evidências científicas. Dessa forma, o conceito da cárie como doença infecciosa e de etiologia bacteriana específica é hoje inaplicável para doenças ocasionadas por comunidades microbianas, como a cárie dentária5. Embora a relação entre Streptococcus e doença cárie seja importante e inegável, ela é mais uma relação de associação do que de causa5,49, já que indivíduos apresentando altos níveis de Streptococcus não necessariamente desenvolverão lesões de cárie. 28 Sendo assim, os conceitos atuais de etiologia e patogênese incluem a cárie dentária no grupo de doenças complexas ou multifatoriais, sem apresentar agente e/ou mecanismo causal único50. Dessa forma, seu tratamento e prevenção devem ir além de estratégias de eliminação de tipos específicos de bactérias ou de aumento da resistência dos substratos50. Atualmente a cárie dentária é definida como uma doença endógena, dinâmica, mediada por biofilme, açúcar-dependente51,52 e influenciada por fatores biológicos, comportamentais, psicossociais e ambientais53. A doença cárie desenvolve-se quando microrganismos acidogênicos e acidúricos da microbiota oral beneficiam-se ecologicamente de outras espécies microbianas promovendo o desequilíbrio do biofilme e o início do processo de instalação da doença51. Análises moleculares e microbiológicas têm demonstrado que diversas espécies microbianas, além do Streptococcus, podem contribuir no desenvolvimento e progressão da doença cárie em diferentes estágios, como os Lactobacillus54. Até mesmo espécies fúngicas como Candida albicans são capazes de promover o aumento da virulência do biofilme cariogênico55. O processo de desenvolvimento da doença cárie envolve mudanças do microambiente bucal, culminando em respostas biológicas adaptativas. Em resumo, o biofilme sobre a superfície dentária, quando em uma condição de simbiose, apresenta acidificação leve. Entretanto, a presença frequente de açúcares, provenientes principalmente da dieta, acidifica o microambiente bucal, tornando-o propício para a colonização de bactérias acidogênicas e acidúricas. Estas alterações, ao longo do tempo, contribuem para o desequilíbrio do processo de desmineralização e remineralização, no qual a perda mineral é acentuada, levando ao início da formação da lesão de cárie56. De acordo com os paradigmas atuais, vêm sendo consensual a adoção de medidas preventivas e de tratamento que vão além das convencionais, com o intuito não apenas de interromper o processo de disbiose do biofilme da placa bacteriana, mas que contribuam também para a manutenção de uma microbiota diversa, em equilíbrio e saudável57,58. 29 3.2 Remoção de Tecido Cariado Quando o processo de desenvolvimento da doença cárie não é interrompido por algum motivo, a formação da sequela da doença (lesão de cárie) é inevitável. A partir deste momento, estratégias curativas com o intuito de remover o tecido cariado e restaurar a forma e a função do elemento tornam-se necessárias, aliadas, claro, ao controle dos demais fatores envolvidos no processo de instalação e desenvolvimento da doença. Embora pareça tecnicamente simples, o procedimento de remoção do tecido cariado é permeado por inúmeros desafios clínicos que vão desde a subjetividade dos parâmetros de remoção até em como este tecido deve ser removido e em que ponto a remoção deve ser cessada59,60. Para entender as mudanças de paradigmas e a evolução dos métodos e técnicas de remoção, faz-se necessário regressar aos ensinamentos de um dos fundadores da odontologia moderna, Greene Vardiman Black, publicados há mais de um século. Segundo ele, todo o tecido deveria ser removido durante o preparo cavitário a fim de atingir tecido hígido. Além disso, nos casos de lesões profundas a exposição pulpar seria mais desejável ao invés de deixá-la coberta por tecido amolecido (de alguma forma alterado pela doença cárie), confirmando assim a visão curativa, invasiva e tecnicista da época frente ao tratamento restaurador61. Durante décadas a filosofia de Black permaneceu sendo praticada. Entretanto, na década de 70, estudos de Fusayama et al.62,63 identificaram a presença de duas camadas morfologicamente distintas na denina cariada. A camada mais interna da dentina, também chamada de dentina afetada, apresentava baixa quantidade de microrganismos e alta capacidade de remineralização64,65. Em contrapartida, a camada mais superficial, ou dentina infectada, era altamente infectada por microrganismos viáveis e apresentava desnaturação e desorganização tecidual irreversíveis66,67. Com base nestas distintas morfologias e características das duas camadas, a remoção apenas da zona infectada e preservação da zona afetada durante a remoção da lesão vem sendo preconizada até os dias atuais66-68. Esta estratégia foi crucial para a evolução e alteração de como os cirurgiões-dentistas removiam o tecido cariado. Entretanto, ainda hoje dúvidas permeiam os clínicos no que diz respeito a que ponto a remoção deve ser interrompida e os parâmetros para a distinção clínica entre dentina afetada e infectada. 30 Alicerçada nos princípios da odontologia de mínima intervenção69, as recomendações atuais no manejo da doença cárie encorajam uma abordagem baseada na causa da doença e com o objetivo de manter a função do elemento dentário e promover a saúde do indivíduo. O manejo eficaz da doença cárie caracteriza-se pela detecção de lesões em estágio inicial e diagnóstico preciso por meio da avaliação do risco e da atividade de cárie a fim de evitar a ocorrência de novas lesões59. A patogenicidade da cárie como doença dependente do biofilme deve ser levada em consideração no manejo da mesma, unindo esforços em ações de controle e prevenção do biofilme ao invés de ações puramente curativas70. Nos casos de lesões já cavitadas, o tratamento deve objetivar o controle e restauração destas lesões por meio de uma abordagem minimamente invasiva. De modo geral, o tratamento deve ser calcado na inativação/controle do processo de desenvolvimento da doença; preservação máxima da estrutura dentária; evitar que o ciclo restaurador se inicie e novas restaurações sejam necessárias; e preservação do elemento dentário em boca pelo maior tempo possível59. Durante a remoção do tecido cariado, recomenda-se que o cirurgião-dentista preserve ao máximo tecido não desmineralizado e também aquele passível de remineralização (dentina afetada)71,72. Além disso, o preparo cavitário deve apresentar margens em dentina hígida e/ou em esmalte, a fim de promover selamento adequado da restauração, controlando a lesão e inativando os microrganismos. Ao longo de todo o procedimento clínico, técnicas de manejo do paciente são recomendadas para evitar dor, desconforto, estresse e ansiedade, capazes de interferir no prognóstico, colaboração e aceitação ao tratamento59,70. No que diz respeito as técnicas de remoção do tecido cariado, podemos citar como principais as seguintes: não seletiva, seletiva e “step-wise” 59,70. Durante a remoção não seletiva, ou também chamada de remoção completa, toda a extensão da cavidade é removida seguindo os mesmos parâmetros e critérios. Nesta técnica, remove-se todo o tecido cariado até atingir dentina hígida, dura e aparentemente livre de bactérias. No entanto, atualmente não se recomenda a remoção não seletiva devido ao grande número de evidências científicas que consolidam esta técnica como sendo invasiva e que promove remoção tecidual desnecessária59,68,70,73,74. As técnicas de remoção seletivas são as mais recomendadas e seguem os princípios de mínima intervenção e preservação máxima da estrutura dentária. De acordo com a profundidade da cavidade, este tipo de técnica pode variar de duas 31 formas. Para cavidades rasas e médias, recomenda-se remover as paredes circundantes da cavidade até atingir dentina dura e resistente a ação de instrumentos cortantes manuais, enquanto que uma remoção menos invasiva é realizada na parede de fundo com o intuito de promover uma dentina remanescente firme, removida em “lascas” 70. No entanto, em casos de cavidades profundas, o risco de exposição pulpar no momento da remoção da dentina da parede de fundo torna-se iminente. Nestes casos, tecido amolecido é deixado sobre a câmara pulpar, e a remoção é feita apenas nas margens cavitarias. Esta estratégia visa evitar a exposição e irritação pulpar, proporcionando a vitalidade da polpa, enquanto as paredes circundantes da cavidade em dentina dura e/ou esmalte hígido promovem selamento adequado e melhor prognóstico restaurador70. Estudos clínicos, revisões sistemáticas e meta-análises têm evidenciado que as técnicas de remoção seletiva são efetivas em diminuir clínica e consideravelmente os riscos de exposição pulpar68,75,76. A técnica “step-wise” consiste na remoção completa do tecido cariado em dois momentos distintos com o intuito de controlar a progressão da lesão isolando os microrganismos do microambiente oral por meio de uma restauração provisória. Desta forma, o risco de exposição pulpar torna-se menos susceptível, já que o período entre as sessões clínicas visa estimular reações do complexo dentina-polpa, como a formação de dentina terciária e esclerose dentinária77,78, criando uma barreira biológica e protegendo a câmara pulpar. Embora a técnica “step-wise” possa ser realizada de maneira seletiva ou não- seletiva dependendo da forma como o tecido dentinário sobre a câmara pulpar é removido, é difícil estabelecer como a maioria dos procedimentos utilizando esta técnica são realizados77. Além disso, necessidade de retorno do paciente, aumento do tempo operatório, falha da restauração provisória e exposição pulpar acidental durante a segunda intervenção são algumas das limitações relatadas75,78,79. Embora tenha eficácia, têm-se destacado que não há necessidade de um novo acesso cavitário para evitar a exposição pulpar, sendo recomendado a remoção seletiva em sessão única75,77,80. Em resumo, as atuais evidências científicas encorajam o uso de técnicas de remoção seletivas com o intuito de evitar exposição pulpar e propiciar tratamento minimamente invasivo68,75,77,80-82. Entretanto, fatores como avaliação microbiológica, qualidade e longevidade da restauração e deposição da dentina, parecem ser 32 similares independentemente da técnica de remoção utilizada77,81. Vale ressaltar que a remoção seletiva pode impactar na adesão dos materiais restauradores a dentina, visto que a dentina afetada por cárie possui resistência adesiva menor em comparação à dentina hígida83,85. Desta forma, a avaliação clínica, crítica e individual de cada caso pelo cirurgião-dentista, assim como sua capacidade técnica, assumem papel fundamental na escolha e execução da técnica de remoção do tecido cariado, impactando direta ou indiretamente no prognóstico restaurador e controle da doença cárie. 3.3 Modelos Artificiais de Indução de Cárie A complexidade fisiológica e as inúmeras interações químicas e microbianas da cavidade bucal, assim como as limitações éticas e robustez metodológica relacionadas à experimentação animal e à condução de ensaios clínicos, encorajaram o estudo e desenvolvimento de modelos laboratoriais capazes de simularem as condições clínicas in vivo por meio de ambientes in vitro controlados86-90. No entanto, diversos fatores relacionados ao substrato utilizado (humano ou bovino; hígido ou desmineralizado; esmalte ou dentina), característica e profundidade das lesões formadas, severidade e frequência do desafio cariogênico e microbiota podem influenciar no desenvolvimento e progressão da lesão artificial, resultando em variabilidade nos resultados experimentais7,11. Diferentes modelos in vitro de indução de cárie podem ser empregados. Entretanto, cada modelo simula as condições naturais de forma distinta e parcial, resultando em diferentes padrões de desenvolvimento das lesões7. O modelo químico é considerado um modelo estático de indução7, empregando soluções ácidas para promover a queda do pH e a consequente desmineralização do tecido dentário. De modo geral, o modelo químico propõe-se a reproduzir os episódios de desmineralização e remineralização, de maneira relativamente simples e fácil7,11, por não necessitarem de muitos aparatos de pesquisa. No entanto, o modelo químico torna-se limitado por não conseguir simular todas as condições e fatores envolvidos no processo natural de desenvolvimento da lesão de cárie. Presença de biofilme, saliva e degradação colagenolítica são algumas das situações em que o modelo químico é incapaz de reproduzir7. 33 Como tentativa de superar as limitações do modelo químico e reproduzir de maneira mais fidedigna as condições naturais, o modelo biológico foi proposto. Neste modelo, microrganismos acidogênicos são utilizados para indução da lesão de cárie baseados no conhecido e importante papel do Streptococcus mutans no desenvolvimento tanto de lesões primárias quanto recorrentes12,91. Embora o modelo biológico não reproduza as interações com o ambiente oral, como: presença de fluoretos, aspectos dietéticos, e quantidade e qualidade da saliva, este modelo reproduz adequadamente o ambiente ácido produzido pelo biofilme cariogênico. No entanto, mimetizar todos os aspectos e condições clínicas é o grande desafio dos modelos de indução92. Idealmente, o modelo escolhido deve simular o potencial cariogênico e as alterações microbianas causadas por variáveis físicas e fisiológicas durante o desenvolvimento do biofilme92, assim como a habilidade em responder aos tratamentos e medidas preventivas utilizados na prática clínica88. Além disso, as condições de crescimento das cepas de microrganismos utilizadas devem ser padronizadas, reduzindo a variabilidade nos resultados devido à distinta capacidade de adaptação fisiológica dos microrganismos em diferentes condições92. Modelos in situ também vêm sendo utilizados para a formação de lesões de cárie semelhantes às lesões naturais. O modelo in situ aparenta ser promissor pelo fato de conseguir reproduzir as trocais minerais, fatores de virulência microbiana, potencial cariogênico da dieta e componentes da saliva7. Considerando as limitações inerentes, os modelos de indução permitem um delineamento experimental flexível, maior facilidade no trâmite das questões éticas e logísticas, menor custo quando comparado aos ensaios clínicos, obtenção de resultados em menor tempo e maior reprodutibilidade dos mesmos, permitindo comparações por outros centros de pesquisa93. Sendo assim, a utilização de modelos de indução de lesões de cárie é essencial principalmente no desenvolvimento de estudos pré-clínicos92. Devido aos diversos modelos de indução propostos na literatura, torna-se complexo definir qual o melhor método para testar hipóteses específicas de pesquisa. No entanto, recomenda-se a escolha de métodos mais simples quando da condução de estudos experimentais iniciais e de métodos mais complexos e fidedignos quando da condução de estudos finais pré-clínicos previamente aos estudos in situ e ensaios clínicos92. Vale ressaltar que cada modelo de indução apresenta limitações e distinções na maneira como simulam a complexidade do meio bucal, reproduzindo apenas 34 parcialmente os inúmeros eventos que ocorrem em condições in vivo92. Dessa forma, tais limitações devem ser consideradas com cautela na metodologia de pesquisa, assim como na extrapolação dos resultados obtidos. Adicionalmente, análises de microdureza, sobretudo longitudinal, e FT-Raman tem sido utilizadas para avaliar as características microestruturas, químicas e orgânicas da dentina94-101. 3.4 Instrumentação Cavitária A remoção do tecido cariado pode ser realizada com o auxílio de diferentes instrumentos ou agentes. Convencionalmente, a lesão de cárie é removida de forma mecânica por meio de instrumentos cortantes manuais (curetas e escavadores) e/ou fresas acopladas em turbinas de alta e baixa rotação102,103. No entanto, nem sempre esses instrumentos possibilitam a instrumentação cavitária e remoção do tecido cariado pelo cirurgião-dentista de maneira discriminada, seletiva e conservadora, respeitando os princípios de odontologia minimamente invasiva. Sendo assim, instrumentos e técnicas alternativas como fresas poliméricas, abrasão a ar e agentes químicos têm sido sugeridas para promover uma remoção mais conservadora104, visto que uma remoção menos invasiva é capaz de promover menor alteração térmica, menor vibração e desconforto ao paciente, assim como remoção apenas da dentina infectada105-109. A fresa é o instrumento mais utilizado na prática clínica para remoção de tecido cariado e instrumentação cavitária. A produção em escala industrial de fresas data-se de 1891 e revolucionou o mercado odontológico, sendo confeccionadas em ligas metálicas110. No entanto, o descobrimento do processo de endurecimento do aço com carboneto de tungstênio em 1917 revolucionaria a indústria metalúrgica. Quatro décadas depois, este método foi aplicado na fabricação de fresas odontológicas com eficiente capacidade de corte e maior resistência à corrosão110,111. As fresas atuais contém micropartículas de carboneto de tungstênio unidas a uma matriz de níquel- cobalto em sua ponta ativa, que por sua vez contém lâminas de corte em formato espiral com ou sem cortes transversais110,111. Durante o preparo cavitário e remoção do tecido cariado, recomenda-se o uso de fresas esféricas de diâmetro compatível ao da lesão e início de sua remoção pela dentina periférica em direção ao centro da lesão. Além disso, fresas de maior diâmetro são preferíveis para evitar exposição pulpar acidental112. Ainda hoje as fresas 35 acopladas em turbinas de baixa rotação permanecem como o método mais eficaz de remoção de lesão de cárie no que diz respeito ao tempo operatório dispendido102. Em relação as características da dentina residual após a remoção com fresa, estudo empregando microscopia eletrônica de varredura evidenciou uma superfície dentinária com rugosidade uniforme, smear layer homogênea e túbulos dentinários visivelmente obstruídos113. Contudo, estudo empregando método de diagnóstico por fluorescência, demonstrou que a remoção com fresa tende a promover remoção excessiva de tecido39. Posteriormente, as características intrínsecas e limitações das fresas de carboneto de tungstênio impulsionaram o desenvolvimento de fresas com capacidade de remoção menos invasiva e mais seletiva. Neste sentido, fresas “plásticas”, confeccionadas em polímero com dureza (~ 50KHN) superior a dentina cariada (0 – 30 KHN) e inferior a dentina hígida (70 – 90 KHN)108. Desta forma, sugeria-se que as fresas poliméricas removeriam apenas dentina infectada, preservando dentina afetada, assim como dispensaria a necessidade de anestesia local durante o procedimento. No entanto, embora as fresas poliméricas tenham diminuído a administração de anestesia local, queixas de sensibilidade e dor durante o procedimento continuaram a serem relatadas por pacientes114, somado também a sua vida útil reduzida. Além disso, estudos evidenciaram que cavidade removidas com fresas poliméricas apresentaram maior ocorrência de cárie recorrente, diminuição da resistência adesiva e presença de remanescentes do tecido cariado na interface dente/restauração quando comparadas com fresas de carboneto de tungstênio108,115. A filosofia de odontologia minimamente invasiva continuou encorajando o desenvolvimento de métodos alternativos, dando surgimento aos métodos químico- mecânicos de remoção. Neste sentido, solubilizantes químicos foram empregados com o intuito de agir seletivamente na dentina cariada116, removendo-a por meio da desproteinização. O agente químico mais utilizado para tal finalidade foi a solução de hipoclorito de sódio tamponada com uma mistura de aminoácidos contendo ácido aminobutírico, cloreto de sódio e hidróxido de sódio116. Embora o hipoclorito de sódio seja considerado um agente desproteinizante inespecífico, sua capacidade de remover seletivamente a dentina cariada foi atribuída ao efeito tampão da mistura de aminoácidos. Esse tamponamento reduz a ação do hipoclorito de sódio na dentina hígida ao mesmo tempo que aumenta o efeito de degeneração colagenolítica no interior da dentina cariada117. Como consequência da ação do hipoclorito e o efeito 36 sobre o colágeno, as fibrilas colágenas tornam-se mais friáveis e suscetíveis à remoção com instrumentos manuais (curetas)118. No entanto, esta primeira tentativa de remoção químico-mecânica não foi bem aceita clinicamente devido à ineficácia de remoção, dificuldade de manipulação e aplicação do agente na cavidade, meia-vida curta, aumento do tempo operatório e de custos do procedimento119. Para superar as limitações da técnica, uma nova formulação foi introduzida no mercado. O Carisolv consiste em um gel contendo 0,5% peso/volume de hipoclorito de sódio, 0.1M de mistura de aminoácidos (ácido glutâmico, leucina e lisina) e água112. Sua utilização consiste na aplicação do gel na cavidade e posterior remoção do tecido cariado com instrumentos manuais. O método tem sido eficaz na remoção de cárie e obtendo boa aceitação pelos pacientes, principalmente pediátricos120,121. No entanto, sua utilização continua promovendo o aumento do tempo clínico em comparação com fresas convencionais, já que se repete a aplicação do gel e posterior remoção com curetas até que todo o tecido cariado seja removido122. Embora o Carisolv apresente eficácia, grandes quantidades de bactérias residuais têm sido relatadas123. No entanto, a viabilidade bacteriana aparenta ser baixa, visto que Carisolv apresenta atividade antibacteriano devido a formação de compostos a base de cloramina. Inclusive, Carisolv reduziu a quantidade de bactérias viáveis na dentina residual em comparação com a remoção com fresas convencionais120,124. Os sistemas de abrasão a ar para preparo cavitário utilizam energia cinética de partículas abrasivas (em geral de óxido de alumínio) para promover o desgaste da estrutura dentária de maneira conservadora, sendo utilizados principalmente para remoção de manchas nos dentes e preparo de cavidades rasas. Fatores como tipo e tamanho das partículas abrasivas, velocidade da partícula, ângulo de contato com a estrutura dentária e características intrínsecas do substrato em questão podem influenciar diretamente a eficácia de desgaste do sistema. No entanto, a principal desvantagem da abrasão a ar reside na sua maior eficiência em remover dentina hígida ao invés de dentina cariada125. A menor eficiência de desgaste do tecido cariado é atribuída à sua consistência macia que parece absorver a energia das partículas, reduzindo o impacto e sua capacidade de desgaste112. Embora ainda remova dentina hígida, o risco de remoção desnecessária foi reduzido devido à diferença na taxa de remoção entre dentina cariada e hígida126. 37 A remoção de cárie por meio de dispositivos de ultrassom é baseada no uso de pontas de desgaste acopladas em dispositivos de alta frequência, os quais oscilam na região ultrassônica (25 – 40 kHz)127. O tempo operatório dispendido para o preparo cavitário utilizando ultrassom é similar à instrumentação manual com curetas, porém maior em comparação com fresas convencionais39. Com relação a eficiência de remoção, tem sido relatado que a sono-abrasão tende a proporcionar um preparo insuficiente da cavidade. Aparentemente a oscilação da ponta de corte é transferida como uma pequena vibração na superfície da estrutura dentária resultando em compactação do tecido cariado ao invés do corte39. No entanto, outros estudos sugerem que a utilização de dispositivos de ultrassom promove uma remoção mais conservadora, facilidade de acesso, baixo ruído e alteração térmica e maior conforto ao paciente128,129. Com relação a morfologia da dentina residual após sono-abrasão, nenhuma alteração química ou estrutural foi encontrada, assemelhando-se às características da dentina residual após preparo com fresas convencionais130. Além disso, avaliação topográfica de superfície evidenciou pequena ou até mesmo nenhuma formação de smear layer113,131, o que pode favorecer procedimentos adesivos dependendo do sistema adesivo utilizado. Vale ressaltar que a manipulação dos dispositivos de ultrassom requer conhecimento e habilidade do operador, sendo imprescindível a utilização por meio de movimentos firmes, constantes e exercendo leve força física111,132. Esses procedimentos minimizam ou eliminam ruído, vibração, calor e pressão133,134. Além do mais, estudo prévio relatou que dispositivos de ultrassom promovem aumento similar da temperatura pulpar em comparação com fresas convencionais em alta rotação. No entanto, o tempo necessário para preparo da cavidade utilizando ultrassom foi quatro vezes maior135. Embora minimamente invasivo, algumas limitações são associadas aos dispositivos de ultrassom, como: aparente ineficiência em remover tecido cariado amolecido136, sendo necessária a utilização adicional de instrumentos manuais137,138; custo elevado do dispositivo de ultrassom e das pontas ultrassônicas137; e a imprescindível necessidade de treinamento do operador previamente à utilização do dispositivo. Atualmente há uma escassez de estudos com o intuito de desenvolver e investigar a eficiência de dispositivos de ultrassom com a finalidade de remoção de 38 tecido cariado. Além disso, uma revisão sistemática apontou a necessidade de estudos bem conduzidos a fim de aprimorar as recomendações de instrumentos oscilatórios, como os dispositivos de ultrassom, para a remoção de tecido cariado139. 3.5 Terapia Fotodinâmica Antimicrobiana (TFDA) De acordo com o exposto anteriormente, a cárie dentária é uma doença progressiva, biofilme-açúcar-dependente e que caso não controlada, pode resultar na perda mineral do esmalte e consequente cavitação do elemento dentário53. O biofilme consiste em uma complexa comunidade microbiana multiespécies envolta por uma matriz extracelular e desempenha papel fundamental no desenvolvimento e progressão da doença140,141. As comunidades bacterianas do biofilme da placa são aderidas a superfície e revestidas pela altamente hidratada matriz extracelular de polissacarídeos, que torna os microrganismos tolerantes às terapias antibacterianas convencionais142-144. Relata-se que o Streptococcus mutans desempenha papel importante na virulência do biofilme cariogênico por meio da sua capacidade de adesão às superfícies145, formação do biofilme146, uso da sacarose para criação de ambiente ácido147 e síntese de polissacarídeos extracelulares por ação de enzimas glicosiltransferases148,149. Esses fatores contribuem para a manutenção da integridade e estabilidade da estrutura do biofilme, dificultando o seu controle e inativação. Além do mais, considerando a importância do biofilme na patogenicidade da doença cárie, estratégias adicionais de controle do biofilme podem potencializar o efeito e melhorar o prognóstico terapêutico. Com o advento da odontologia minimamente invasiva e os conhecimentos acerca da etiologia da doença cárie, têm sido preconizado o foco na prevenção da progressão de lesões não cavitadas e no controle do biofilme cariogênico, encorajando a busca por terapias complementares no tratamento da doença cárie150. Desta forma, o uso de agentes como clorexidina, triclosan e óleos essenciais vêm sendo proposto com o objetivo de promover efeito antimicrobiano, reduzindo a quantidade de microrganismos cariogênicos no microambiente oral151. No entanto, o desenvolvimento de mecanismos de resistência antimicrobiana tem limitado a utilização e eficácia destes agentes na prática clínica25,152. 39 Com o intuito de superar as limitações relacionadas aos agentes antimicrobianos convencionais, a terapia fotodinâmica antimicrobiana (TFDA) tem sido proposta como terapia alternativa para o controle de biofilme cariogênico por meio de abordagem não invasiva e sem promover resistência bacteriana153. Embora seu uso em odontologia seja relativamente recente, a descoberta da TFDA aconteceu no longínquo início dos anos 1900154, sendo utilizada principalmente como terapia oncológica155. No entanto, a preocupação com a crescente de casos de resistência antimicrobiana no início dos 1990 reacendeu o interesse em pesquisa na TFDA, redescobrindo seu potencial terapêutico e expandindo sua aplicação em diferentes áreas e finalidades156. A TFDA é baseada na aplicação local e sistêmica de um composto fotossensível, chamado de fotossensibilizador, que se acumula no tecido alvo. Esta molécula de fotossensibilizador absorve luz em comprimento de onda específico, que por sua vez desencadeia um processo de destruição/agressão seletiva de células157, geralmente envolvendo moléculas de oxigênio e estresse oxidativo. Resumidamente, a TFDA consiste na interação entre três componentes (fotossensibilizador, fonte de luz e oxigênio), resultando em reações foto-físicas e fotoquímicas com alta capacidade oxidativa podendo causar danos às proteínas, lipídios, ácido nucléico e outros componentes celulares de microrganismos, assumindo papel importante no dano e morte celular158. Além disso, a TFDA apresenta benefícios que incluem o controle e inativação instantâneos de bactérias de maneira segura, não invasiva e sem apresentar riscos de toxicidade e/ou de distúrbios sistêmicos36,159. A reação fotodinâmica pode ocorrer por diferentes vias dependendo da forma como o fotossensibilizador interage com a célula alvo. O estresse oxidativo resultado da reação pode ocorrer direta ou indiretamente. As reações diretas (tipo I e II) dependem necessariamente da presença de oxigênio, diferentemente das reações indiretas (tipo III e IV)160. Durante a TFDA, o fotossensibilizador é excitado por meio da absorção de fótons emitidos pelas fontes de luz, fazendo com que a molécula seja convertida de seu estado original para um estado singleto excitado. Após essa conversão inicial, a molécula de fotossensibilizador pode retornar ao seu estado original pela liberação de fluorescência ou calor por meio de uma conversão interna, ou pode ainda converter- se para um estado ainda mais excitado (estado tripleto) por meio de uma conversão entre os sistemas. Quando atinge o estado excitado tripleto, a molécula de 40 fotossensibilizador pode também retornar ao seu estado original por meio da emissão de fosforescência ou dar origem a duas reações que terão como produto final espécies reativas de oxigênio155,156,161-164. Na reação tipo I, a molécula de fotossensibilizador em seu estado excitado interage com moléculas e tecidos vizinhos. Essa reação ocorre por meio da transferência de elétrons, formando radicais superóxidos (O2 -). Esses radicais podem sofrer reações químicas de redução e transformar-se em peróxido de hidrogênio (H2O2), uma molécula altamente reativa e que funcionará como precursora de radicais livres hidroxila. Sendo assim, a formação dos radicais hidroxila é resultante do processo oxidativo ocasionado pela decomposição do peróxido de hidrogênio (H2O2) 155,156,161-163. Na sequência, esses radicais livres poderão interagir com qualquer biomolécula presente nas regiões circundantes e causar a morte celular165. Em contrapartida, na reação tipo II, a energia do fotossensibilizador em seu estado tripleto excitado é diretamente transferida para um estado tripleto de oxigênio (3O2) ocasionando a geração de oxigênio singleto (1O2)155. Esta molécula de 1O2 é altamente reativa e pode interagir com diferentes moléculas no interior da célula166,167. Desta forma, a reação tipo II causa uma reação rápida e indiscriminada em todos os tipos de biomoléculas, tornando inviável o desenvolvimento de mecanismos de defesa pelas células alvo, ocasionando assim a morte celular168. Após o ciclo de absorção e geração de radicais livres se completar, o fotossensibilizador retorna para o seu estado original e estará novamente disponível para ser absorvido pelos fótons e dar início a um novo ciclo, fazendo com que uma única molécula de fotossensibilizador possa originar milhares de moléculas de 1O2 antes de ser destruído155. As reações do tipo I e II podem ocorrer concomitantemente e o equilíbrio entre ambas as reações é diretamente influenciado pelos substratos intracelulares, pelas características dos fotossensibilizadores utilizados e pela concentração de oxigênio presente no ambiente celular. As reações tipo III e IV não dependem do oxigênio, pois promovem dano ou morte celular pela ativação direta do fotossensibilizador. Na reação tipo III, o fotossensibilizador em seu estado excitado tripleto interage com radicais livres promovendo eventos citotóxicos no interior da célula. Já na reação tipo IV, o fenômeno chamado de “foto-isomeria” ocorre, o qual consiste em um rearranjo intramolecular após a excitação do fotossensibilizador que auxilia na sua ligação e interação com a célula alvo160. 41 3.6 TFDA no Tratamento da Doença Cárie A TFDA em odontologia tem sido empregada para o tratamento de infecções bacterianas e fúngicas, câncer bucal, diagnóstico de alterações malignas em lesões orais, desinfecção da cavidade bucal e lesões de cárie18,30,31,169-176. Além das inúmeras aplicações clínicas, a TFDA é considerada uma técnica relativamente simples, apresentando vantagens que incluem: amplo espectro de ação (fotossensibilizadores agem sobre diversos microrganismos); efeito antibacteriano; poucos efeitos colaterais; e ausência de resistência ao tratamento170. No que diz respeito à efetividade da TFDA no tratamento da doença cárie, os resultados são promissores e sugerem a TFDA como terapia complementar principalmente no manejo de lesões profundas18. Considerando que bactérias podem persistir na cavidade e contribuir na progressão de lesões mesmo após a remoção177,178 e restrição de nutrientes179, a TFDA pode ser efetiva para a inativação dessas bactérias e prevenção de cárie recorrente180,181. Uma revisão sistemática seguida de meta-análise teve como objetivo avaliar o efeito da TFDA sobre microrganismos envolvidos na etiologia e desenvolvimento da doença cárie. De acordo com os 34 estudos incluídos, os resultados evidenciaram que o microrganismo mais avaliado foi o Streptococcus mutans (82%). Em relação aos parâmetros da TFDA, a fonte de luz mais utilizada foi o LED vermelho em comprimento de onda variando entre 625 a 670 nm. Já o fotossensibilizador mais utilizado foi o azul de metileno, enquanto que o tempo de pré-irradiação foi de 5 minutos. Com relação ao efeito da TFDA sobre os microrganismos, apenas 11 dos 34 estudos relataram redução da viabilidade celular maior ou igual a 99,9%. Sendo assim, os resultados evidenciam o desafio existente em inativar microrganismos organizados na forma de um biofilme. Além disso, a falta de padronização nos protocolos de aplicação da TFDA dificultou a execução da meta-análise e sugerem a necessidade de definição de protocolos específicos para TFDA. Deve-se ressaltar que a maioria dos artigos incluídos tratavam-se de estudos in vitro apresentando risco alto ou moderado de viés, sendo necessário cautela na interpretação dos resultados obtidos. Por fim, os autores evidenciaram que a TFDA vem sendo sugerida como uma opção promissora para potencializar a desinfecção oral de microrganismos relacionados à doença cárie. Adicionalmente, destacou-se a importância da realização de ensaios clínicos 42 controlados e randomizados a fim de confirmar os resultados obtidos em condições in vivo para uma melhor qualidade e confiabilidade de evidência científica182. Diferentes modelos de biofilme podem ser utilizados durante investigações envolvendo TFDA. No entanto, uma revisão de literatura apontou que, de maneira geral, biofilmes multi-espécies são mais tolerantes à ação da TFDA devido a sua complexidade e espessura. Já para biofilmes mono-espécies, o efeito da TFDA é mais pronunciado, sendo efetivo em reduzir a contagem de colônias de Streptococcus mutans183. Idealmente um fotossensibilizador deve ser de fácil síntese, baixo custo e apresentar estabilidade de armazenamento. Além disso, o pico de absorção do fotossensibilizador deve estar na região entre 650 e 800 nm, já que acima de 800 nm a energia fornecida não é suficiente para promover a excitação do oxigênio184. Não apresentar toxicidade intrínseca e no escuro, assim como ser eliminado rapidamente dos tecidos para evitar qualquer efeito foto-tóxico185 são características cruciais para viabilizar a aplicação clínica. A falta de padronização nos protocolos de aplicação da TFDA motivou a condução de uma revisão sistemática a fim de determinar qual fotossensibilzador apresenta maior potencial antibacteriano contra um biofilme cariogênico. De acordo com os 12 estudos incluídos, os fotossensibilizadores azul de metileno e azul de toluidino (aplicados com tempo de incubação e de irradiação de 5 minutos) apresentam os melhores resultados de redução bacteriana. Os dados expressos em logaritmo (log) de base 10 evidenciaram que a curcumina e o Photogem® também apresentaram redução significativa da viabilidade bacteriana em comparação aos grupos controles (p = 0,042). No entanto, os dados de redução de log apontaram que a redução para Streptococcus mutans não foi significativa para nenhum dos fotossensibilizadores avaliados (p = 0,679). Embora a falta de padronização metodológica dos estudos tenha dificultado a definição de qual fotossensibilizador apresenta maior eficiência antibacteriana, os estudos sugerem que azul de metileno, azul de toluidino, curcumina e Photogem® apresentaram melhores resultados em relação à redução de espécies bacterianas envolvidas na doença cárie151. Diferentes fotossensibilizadores são utilizados na TFDA, tanto de origem sintética como natural. Embora os fotossensibilizadores sintéticos apresentem maior estabilidade, a utilização de compostos naturais tem sido aceita e amplamente estudada devido à menor possibilidade de interação medicamentosa e efeitos 43 colaterais27,33,37,186-189. Neste sentido, a curcumina apresenta-se como um fotossensibilizador em potencial, principalmente no tratamento de infecções orais30. Muito conhecida como tempero culinário, a curcumina é um composto extraído da Curcuma longa L. e possui importantes propriedades terapêuticas, incluindo: anti- inflamatórias, antissépticas, antivirais e antitumorais30,190-195. Além disso, a curcumina não tem apresentado toxicidade contra diversas culturas celulares e modelos animais27. Seu pico de absorção concentra-se no comprimento de onda azul (300 – 500 nm) com absorção máxima em 430 nm, podendo exercer efeito foto-tóxico em concentrações na escala de micromolar e sendo um fotossensibilizador indicado para o tratamento de infeções locais e superficiais presentes na cavidade oral e pele30,196. Somado a isso, a curcumina apresenta vantagens como baixo custo, síntese simples e adequada efetividade27. No entanto, baixa biodisponibilidade na cavidade oral, rápida degradação e baixa estabilidade em meio aquoso são relatados como características que restringem sua aplicação clínica197-203. Para superar essas limitações do fotossensibilizador, o uso de sistemas de liberação de droga utilizando nanotecnologia tem sido relatado como promissor204-206. Considerando a gama de fotossensibilizadores existentes, a curcumina destaca-se na odontologia, principalmente no tratamento da doença cárie. Estudos prévios apontam sua efetividade contra microrganismos cariogênicos organizados em uma estrutura de biofilme ou presentes em lesões artificiais de cárie27,172. Em um estudo in vitro, lesões artificiais de cárie foram induzidas por modelo biológico contendo Streptococcus mutans e Lactobacillus acidophilus em espécimes de dentina humana. Para a aplicação da TFDA, diferentes concentrações de curcumina foram testadas (0,75; 1,5; 3,0; 4,0 e 5,0 g/L) e fotoativadas com luz LED azul (450 nm) em dose de luz de 5,7 J/cm2. As porcentagens de sobrevivência de S. mutans e L. acidophillus evidenciaram que as concentrações de 0,75, 1,5 e 3,0 g/L não foram suficientes para promover uma redução significativa dos microrganismos (p > 0,05). Em contrapartida, a concentração de 5,0 g/L promoveu uma redução significativa de aproximadamente 70% (p < 0,05). Nenhum efeito tóxico foi observado para a curcumina na ausência de luz, excluindo a possibilidade de toxicidade intrínseca do composto. Concluiu-se que a curcumina possui efeito foto-tóxico para os microrganismos testados, embora a concentração máxima tenha sido necessária para promover efeito significativo172. 44 Outro estudo propôs-se a avaliar o efeito da TFDA mediada por curcumina contra S. mutans e L. acidophillus organizados na forma de biofilme ou em lesões artificiais de cárie. Novamente diferentes concentrações de curcumina foram testadas 0,75; 1,5; 3,0; 4,0 e 5,0 g/L) e irradiadas com LED azul (5,7 J/cm2). Os resultados de viabilidade celular evidenciaram que na fase de biofilme todas as concentrações de curcumina sob irradiação promoveram reduções significativas de viabilidade (p < 0,05). No entanto, quando os microrganismos estavam presentes nas lesões de cárie, apenas a maior concentração de curcumina (5,0 g/L) foi capaz de promover efeito antibacteriano. Nenhum efeito foi observado para curcumina no escuro. Sendo assim, pôde-se concluir que a dificuldade de penetração da luz e difusão do fotossensibilizador na lesão de cárie tornam os microrganismos menos suscetíveis à TFDA em comparação à fase de biofilme, sendo necessário uma concentração maior de fotossensibilzador27. A TFDA como método alternativo de desinfecção da cavidade a fim de erradicar ou minimizar a viabilidade bacteriana da dentina afetada por cárie previamente à restauração têm demonstrado resultados favoráveis181. No entanto, os impactos da TFDA na adesão dos diferentes materiais restauradores ao substrato dentinário ainda são incertos, conflitantes e merecem investigações mais aprofundadas. Em geral, os testes de resistência adesiva como o de microcisalhamento são utilizados para avaliar a adesão dos materiais após diferentes tratamentos de superfície207. Empregando estes testes, resultados divergentes foram relatados nos quais evidenciaram diminuição da resistência adesiva a dentina afetada por cárie de diferentes materiais restauradores (cimento de ionômero de vidro modificado por resina e resina composta) 208,209. Embora haja divergência nos achados relacionados aos impactos da TFDA na adesão, quando a TFDA é mediada por curcumina, nenhum efeito significativo nos valores de resistência adesiva foi encontrado180,181, sugerindo a curcumina como um fotossensibilizador adequado para desinfecção e descontaminação cavitária. No entanto, estudos que avaliem o efeito da TFDA na integridade da camada híbrida a longo prazo são cruciais para confirmar os resultados. Desta forma, as evidências científicas demonstram um potencial promissor da curcumina como fotossensibilizador para a TFDA no tratamento da doença cárie. Toxicidade intrínseca do composto na ausência de luz não vem sendo relatada. Além disso, a TFDA mediada por curcumina parece não afetar negativamente a adesão de 45 materiais restauradores à dentina, embora estudos com azul de metileno tenham provocado uma diminuição dos valores de resistência adesiva. Relata-se ainda que as características das lesões de cárie podem dificultar a ação e efetividade da curcumina. Ademais, é consenso na literatura que a falta de ensaios clínicos ou envolvendo modelos animais limita a comprovação e confirmação dos resultados in vitro em condições mais fidedignas, sendo essencial para a que a aplicação da TFDA mediada por curcumina seja indicada como uma opção clínica viável. 3.7 Vidros Bioativos Os biomateriais e suas funções têm evoluído significativamente nos últimos anos. Inicialmente, a primeira geração de biomateriais calcava-se no princípio da inércia biológica, objetivando o desenvolvimento de materiais que não desencadeassem qualquer tipo de resposta biológica no hospedeiro210. Nesse contexto, metais resistentes à corrosão e insolúveis, assim como polímeros não tóxicos eram os materiais de escolha. No entanto, todo material biologicamente inerte apresenta a limitação de incompatibilidade na interface existente entre o material e o tecido vivo210. Os princípios da engenharia tecidual e o desenvolvimento de biomateriais foram revolucionados no ano de 1969. Naquele ano, desenvolveu-se o vidro bioativo, sendo o primeiro material com capacidade de ligação óssea e alta capacidade de adesão211,212. Desde então, uma mudança de paradigma ocorreu, priorizando não mais a inércia, mas a interação biológica do material para com os tecidos. Dessa forma, o desenvolvimento de materiais que pudessem interagir de maneira benéfica com o tecido do hospedeiro a fim de conduzir e/os estimular processos de reparo e regeneração tornaram-se prioridade213. A partir de então, houve crescimento de materiais bioativos, principalmente vítreos e cerâmicos, incluindo vidros bioativos modificados, cálcio fosfato214,215, hidroxiapatita216-218 e silicato de cálcio219-221. Diferentes estudos têm objetivado investigar o mecanismo de ação e a alta bioatividade destes materiais. Em geral, a capacidade de adesão dos vidros bioativos é atribuída à liberação de íons pelo material, formando hidroxiapatita com deficiência de cálcio que ligar-se-á no colágeno tecidual211, podendo ocorrer de forma gradual222. Além disso, esses mesmos íons também podem funcionar como reguladores de genes que expressam fatores de 46 crescimento e estimulam a atividade osteogênica de células secretoras de matriz óssea211. Devido as suas características, a aplicação de vidros bioativos foi concentrada em abordagens de reparação e regeneração óssea e cartilaginosa, desenvolvimento de scaffolds e revestimento de implantes223-230. Após sua aplicação e efetividade na área de regeneração óssea, os vidros bioativos expandiram sua aplicabilidade para o campo da odontologia. A perda mineral de esmalte e/ou dentina decorrente de doenças como a cárie e erosão dentária representa um grande desafio clínico. Em face disto, os vidros bioativos emergiram como uma alternativa de tratamento promissora, visto que os íons liberados e a consequente formação de hidroxiapatita possibilitaram sua indicação como material capaz de promover a remineralização dos tecidos dentários213. Atualmente os vidros bioativos são incorporados em dentifrícios e apresentam eficácia comprovada contra sensibilidade dentária231,232 e capacidade remineralizante do esmalte233,234. Além disso, partículas de vidro bioativo também estão sendo incorporadas em cimentos de ionômero de vidro, compósitos de base resinosa e sistemas adesivos235-240, com o objetivo de obstruir túbulos dentinários expostos, melhorar a adesão à dentina e, mais importante, remineralizar a dentina. No entanto, no que diz respeito ao tecido dentinário, os desafios para os vidros bioativos promoverem a remineralização tecidual são maiores devido às diferenças estruturais e de composição em comparação ao esmalte213. É amplamente conhecido que o esmalte dentário é composto essencialmente de mineral apatita (96% em peso), fazendo com que o conteúdo mineral determine as propriedades e comportamentos mecânicos do tecido. Por outro lado, a dentina além de apresentar menor porcentagem de mineral (70% em peso), é composta também de matriz colágena, proteínas e água213. Ademais, a estrutura dentinária consiste de uma morfologia peculiar, na qual o seu conteúdo mineral está envolto em um arcabouço de fibrilas colágenas, sendo depositado de maneira extra e intrafibrilar. Portanto, as propriedades mecânicas da dentina não dependem apenas da quantidade de mineral existente, mas principalmente na disposição desses minerais dentro do arcabouço de colágeno241. Pelos motivos supracitados, a capacidade dos vidros bioativos em remineralizar dentina não é comparável ao esmalte. Vale ressaltar também que a incorporação de partículas de vidro bioativo em materiais resinosos e sistemas adesivos é complexa, visto que a presença de 47 monômeros ácidos podem reagir com as partículas242. Além disso, o efeito da incorporação de vidro bioativo na resistência adesiva dos materiais resinosos tem demonstrado resultados controversos242-244, o que pode ser justificado pela incompatibilidade dos monômeros ácidos e das partículas de vidro245. Nesse contexto, a aplicação direta de vidro bioativo em suspensão aquosa ou em gel na dentina, previamente à aplicação do sistema adesivo, tem apresentado resultados mais adequados em termos de resistência adesiva244,245. A aplicação direta do vidro bioativo permite uma maior difusão das partículas no interior da dentina, promovendo um contato íntimo entre o vidro e a dentina hígida (encontrada abaixo da zona mais desmineralizada) sendo essencial para induzir o processo de remineralização246,247. Vale destacar que a presença de vidros bioativos na interface adesiva pode controlar/inibir o crescimento bacteriano245,248-250 devido ao aumento do pH local, assim como prevenir a ocorrência de cárie recorrente251. 48 4 MATERIAIS E MÉTODOS 4.1 Delineamento Experimental Este trabalho consiste em um estudo laboratorial (in vitro) randomizado, tendo como variáveis dependentes a: avaliação da profundidade das lesões artificiais de cárie por meio de microradiografia transversal; análise da viabilidade celular por meio de microscopia confocal; análise estrutural da dentina por meio de testes de dureza longitudinal; avaliação química da dentina por meio de espectroscopia FT-Raman; e avaliação da resistência adesiva e padrão de falha por meio de testes de microcisalhamento e imagens de MEV. A variável independente do estudo foi o método de remoção (fresa ou ultrassom), descontaminação (aplicação de TFDA), e remineralização (aplicação de vidros bioativos) da dentina cariada. Espécimes de dentina bovina foram aleatorizados em diferentes grupos de estudo de acordo com o método de remoção, descontaminação e/ou remineralização da dentina afetada. Os métodos de remoção foram: fresa esférica (FR) e dispositivo de ultrassom (ULT). Para descontaminação, foi aplicado TFDA mediada por curcumina. Já os vidros bioativos utilizados foram o Bioglass® 45S5 e F-18. A associação destas terapias totalizou 14 grupos de estudos: dentina hígida (controle); cárie dentária (controle); FR; FR+TFDA; ULT; ULT+TFDA; FR+45S5; FR+F-18; ULT+45S5; ULT+F-18; FR+TFDA+45S5; FR+TFDA+F-18; ULT+TFDA+45S5; ULT+TFDA+F-18. A Tabela 1 ilustra os grupos de estudos. 49 Tabela 1 – Grupos de estudo. Grupo Método de remoção Método de descontaminação Aplicação de vidro bioativo Lesão de cárie - - - Dentina hígida - - - FR Fresa esférica - - FR+TFDA Fresa esférica TFDA (curcumina associada ao DMSO e irradiada com LED azul) - ULT Ultrassom - - ULT+TFDA Ultrassom TFDA (curcumina associada ao DMSO e irradiada com LED azul) - FR+F-18 Fresa esférica - F-18 durante 5 minutos sobre a dentina FR+TFDA+F-18 Fresa esférica TFDA (curcumina associada ao DMSO e irradiada com LED azul) F-18 durante 5 minutos sobre a dentina FR+45S5 Fresa esférica - 45S5 durante 5 minutos sobre a dentina FR+TFDA+45S5 Fresa esférica TFDA (curcumina associada ao DMSO e irradiada com LED azul) 45S5 durante 5 minutos sobre a dentina ULT+F-18 Ultrassom - F-18 durante 5 minutos sobre a dentina ULT+TFDA+F-18 Ultrassom TFDA (curcumina associada ao DMSO e irradiada com LED azul) F-18 durante 5 minutos sobre a dentina ULT+45S5 Ultrassom - 45S5 durante 5 minutos sobre a dentina ULT+TFDA+45S5 Ultrassom TFDA (curcumina associada ao DMSO e irradiada com LED azul) 45S5 durante 5 minutos sobre a dentina Fonte: Elaboração própria. 50 4.2 Fase Inicial Nesta fase foram realizados o preparo dos espécimes, assim como experimentos com o intuito de estabelecer protocolos e concentrações a serem utilizadas nas etapas experimentais subsequentes. 4.2.1 Obtenção e preparo dos espécimes de dentina bovina Incisivos bovinos sem defeitos e/ou trincas de esmalte visíveis em estereomicroscópio (aumento de 10x) foram utilizados para a obtenção dos espécimes de dentina (Figura 1A). Sendo assim, este estudo foi submetido à apreciação ética pela Comissão de Ética no Uso de Animais (CEUA) da Faculdade de Odontologia de Araraquara (FOAr) da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP e devidamente aprovado sob o número de registro 27/2018. Após o aceite pelo CEUA, o estudo foi iniciado (ANEXO). Os dentes bovinos foram armazenados em solução de timol a 0,1% durante 24 horas. Após, o esmalte da face vestibular da coroa foi removido, a fim de obter blocos de dentina bovina com dimensões de 4x4x2 mm e 13x7x2 mm (Figura 1B-C), utilizando máquina de cortes de precisão (IsoMet 1000 Precision Cutter, Buehler Ltd, Lake Bluff, IL, EUA) sob constante refrigeração. Após a obtenção dos espécimes, os mesmos foram submetidos à avaliação da dureza Knoop superficial com o intuito de padronizar a dureza dentinária e evitar possíveis vieses de amostra. Para tanto, foi utilizado microdurômetro com indentador do tipo Knoop (HMV-2, Shimadzu, Japão), com carga de 10 gramas durante 10 segundos252. Três indentações foram realizadas em cada espécime, preferencialmente no centro da superfície dentinária. Após o término das mensurações, obteve-se a média geral de dureza, sendo incluído no estudo somente os espécimes que apresentaram dureza entre 10 KHN a mais ou a menos em relação à média. Em seguida os espécimes foram armazenados em água destilada e geladeira até o início dos experimentos. 51 Figura 1 – Espécimes de dentina. A) Coroas de incisivos bovinos. B) Espécimes de dentina bovina cortados nas dimensões de 4x4x2 mm e C) 13x7x2 mm. Fonte: Arquivo pessoal do autor. 4.2.2 Seleção das bactérias e preparo da suspensão bacteriana padronizada Cepa de Streptococcus mutans (ATCC 25175) e Lactobacilus acidophillus (ATCC 4356) foram fornecidas pela Fundação FioCruz (Departamento de Microbiologia, Laboratório de Materiais de Referência, Setor de Bactérias de Referência localizado na Fundação Oswaldo Cruz, Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde – INCQS, Rio de Janeiro, RJ, Brasil) e utilizadas para preparar as suspensões bacterianas com absorbância padronizada. As bactérias foram reativadas e cultivadas em placas de Petri contendo ágar de infusão cérebro-coração (BHI, KASVI, São José dos Pinhais, PR, Brasil, Lote n