UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA ÁREA DE ENSINO E APRENDIZAGEM DA MATEMÁTICA E SEUS FUNDAMENTOS FILOSÓFICO-CIENTÍFICOS INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS E CIÊNCIAS EXATAS RIO CLARO – SP 2023 ... E TEKO E ARANDU E PRODUÇÃO DE SUBJETIVIDADES E EDUCAÇÃO SUPERIOR E EDUCAÇÕES OUTRAS...: MODOS DE VIDA CRIADOS E AFIRMADOS POR KAIOWÁS E GUARANIS JORGE ISIDRO ORJUELA-BERNAL Kaiowás e Guaranis Jorge Isidro Orjuela Bernal Orientador: Dr. Roger Miarka PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO MATEMÁTICA Rio Claro 2023 ... e teko e arandu e produção de subjetividades e Educação Superior e educações outras...: UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “Júlio de Mesquita Filho”, Instituto de Geociências e Ciências Exatas Câmpus de Rio Claro JORGE ISIDRO ORJUELA BERNAL ... E TEKO E ARANDU E PRODUÇÃO DE SUBJETIVIDADES E EDUCAÇÃO SUPERIOR E EDUCAÇÕES OUTRAS...: MODOS DE VIDA CRIADOS E AFIRMADOS POR KAIOWÁS E GUARANIS Tese de Doutorado apresentada ao Instituto de Geociências e Ciências Exatas do Câmpus de Rio Claro, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Educação Matemática. Orientador: Prof. Dr. Roger Miarka Rio Claro – SP 2023 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “Júlio de Mesquita Filho”, Instituto de Geociências e Ciências Exatas Câmpus de Rio Claro JORGE ISIDRO ORJUELA BERNAL ... E TEKO E ARANDU E PRODUÇÃO DE SUBJETIVIDADES E EDUCAÇÃO SUPERIOR E EDUCAÇÕES OUTRAS...: MODOS DE VIDA CRIADOS E AFIRMADOS POR KAIOWÁS E GUARANIS Tese de Doutorado apresentada ao Instituto de Geociências e Ciências Exatas do Câmpus de Rio Claro, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, como parte dos requisitos para obtenção do título de Doutor em Educação Matemática. Comissão Examinadora Prof. Dr. ROGER MIARKA IGCE / UNESP/Rio Claro (SP) Profa. Dra. SONIA MARIA CLARETO FE/UFJF/Juiz de Fora (MG) Prof. Dr. LEVI MARQUES PEREIRA FAIND/UFGD/Dourados (MS) Profa. Dra. MARIA APARECIDA MENDES DE OLIVEIRA FAIND/UFGD/Dourados (MS) Profa. Dra. ALIK WUNDER FE/UNICAMP/Campinas (SP) Conceito: Aprovado Rio Claro (SP)- 29 de setembro de 2023 A meus pais, Blanca e Germán, por terem me ensinado, através de seus atos, sobre a esperança. Aos povos indígenas, em especial aos Kaiowá e Guarani, por me ensinarem, ao longo da nossa caminhada, que ela é infinita. Esta tese, ainda que produzida por mim, é entendida como uma composição coletiva, nessa medida ela foi realizada junto ao Tekoha Takuapiry e Kaiowás e Guaranis e Cronopies+! e... e Da mesma forma, ela se forjou entre diferentes geografias, tempos e espaços que envolvem diferentes climas, intensidades e afetos, entre Rio Claro – São Paulo e Tekoha Takuapiry – Mato Grosso do Sul e Dourados – Mato Grosso do Sul e Bogotá – Colômbia e Estocolmo – Suécia e Helsinki – Finlândia e ... e Aguyjevete – Agradecimentos – Atima aos povos Guarani e Kaiowá, em particular à comunidade do Tekoha Takuapiry, não apenas por terem me aberto as portas de sua comunidade, de suas escolas, de suas casas, mas por terem me permitido caminhar e aprender junto a eles. Atima Porã a toda a comunidade educativa das escolas indígenas Ñande Reko Arandu e M´bo eroy Arandu. Em especial a seus docentes e diretivos Enoque Batista, Claudemiro Lescano, Gildo Martins, Ananir Lescano, Ronaldo Lopes, Josiane Batista, Marcilene Lescano, Elias Lopes, Edimar Araujo, Adélcio Araujo, Úrsula Velasques, Ademar Villalba, Vanessa Martins, Geison Texeira, Osmar Marques, Genei Domingues, Adelia Rocha, Erasmo De Souza, Witor Domingues, Jaquiele Texeira, Geraldo Domingues, Andreia Martins, Lucio Martins, Giselle Martins, Zunilda Aquino, Laide Lopes, Isaias Ramirez, Michael Rocha, Eldo Ramirez, Leonida Quintana, Valdemir Irineu, Silvam Souça, Ezequiel Morais, Vandalicia Oliveira, Delfina Torales, Rogerio Rodrigues, Marileia Candi, Celia Fernandes, Ediludio Espindola, Anderson Lopes, Kleberson Ramirez, Rosangela Gama e, in memoriam, a Jaime Irineu e Saúl Velasque; pelas conversas, trocas, acolhimentos, parcerias e reflexões. Atima Porã às lideranças e agentes de saúde e demais pessoas do Tekoha Takuapiry, assim como às pessoas das áreas de retomada de terra indígena de Kurusu Ambá I e II, pelas conversas-tereré-chimarrão assim como pelos diversos espaços-tempos compartilhados. Em particular a Daniel Lescano, Jonas Batista, Tasio Velasque, Rosangela Texeira, Shirley Vargas, Orida, Celso, Celeida, Eduardo, Andressa, Daniela, Graziela, Inocêncio, Casilda, Jorge, Beatriz e in memoriam a seu Atánasio. Atima Porã a Beatriz Vera, por me socorrer, inúmeras vezes, com o guarani. Obrigado aos docentes e discentes do curso de Licenciatura Intercultural Indígena Teko Arandu por terem me dado a oportunidade de participar de seu importante e necessário programa de formação, por terem possibilitado aprender de e junto a eles. Meu agradecimento especial a Maria Aparecida de Oliveira, Rosa Colman, Levi Pereira, Eliel Benites e Heiracles Mariano. Agradezco a mis padres, Germán y Blanca, y a mis hermanas y hermanos, por su apoyo incondicional en este que también es su camino, por comprender mis ausencias y por creer en mí. A Natalia, un agradecimiento especial, por las tantas y tantas horas dedicas a trabajar juntos, por la paciencia para movilizarse en el camino de comprender mis ideas artísticas y por la fuerza y energía destinadas a que estas tomaran forma en la producción estética de esta tesis. Agradeço ao Brasil por ter-me acolhido e brindado novas e valiosas oportunidades para continuar aprendendo e compartilhando. Agradeço a Roger Miarka, meu orientador, pela confiança depositada, pelo apoio constante, pelas conversas, conselhos, respeito e carinho brindados, que têm sido fundamentais no meu processo formativo acadêmico e de vida desde que cheguei no Brasil. Agradeço também a meu grupo de pesquisa o Coletivo Cronopies+! Pelas discussões, as parcerias, os afetos, as confidencias e o suporte dado durante todos estes anos de trabalho-composição. Agradeço, especialmente, aos cronopies+! Ronilce Lopes, Heinrich Santos, Wanderson Lopes, Joao Casal, Lucas Cruz, Maieli Masteloto, Camila Hardt e Claudia Canto, que têm acom- panhado, em diferentes intensidades, mais de perto meu processo. Gracias a mis amigos y padres académicos en Colombia, Aldo Parra y Blanca Peralta, por estar siempre guiándome, por la alegría de aprender de y con ellos. Por ayudarme a nunca olvidar de dónde vengo. Obrigado a todas, todos e todes quem compõem o Programa de Pós-graduação em Educação Matemática da Unesp – Rio Claro. Discentes, professores e pessoal administrativo, foram muitas e múltiplas as ajudas recebidas, foram muitos os aprendizados, os momentos compartilhados, os risos e sorrisos, sem vocês estar aqui não teria sido tão especial como foi. Em particular, muito obrigado a Inajara e Elisa, a Heloisa da Silva, Marcos Texeira, Rosa Monteiro, Rubia Schio e Cesar Leite. Obrigado também a Alessandra e Clotilde, por me socorrer, no nosso PPGEM, sempre. Obrigado a todos esses amigos e amigas que conheci em Rio Claro, por me dar sua amizade, carinho e respeito, e por fazer de minha estadia aqui, passada por tempos de conquistas e adversidades, de alegrias e tristezas, um lar. Obrigado, “aos antigos”, Douglas, Davison, Maroni, Ronilce, Diego Gondim, Diego Rojas, Alejandra, Swanny, Blanca e sua família, Gabi e Amílcar, Diego Escobar, Carolina Botello, Iria e Guilherme. Obrigado também aos mais, Adrielen, Carolina, João, Heinrich, Wanderson, Julia, Diana, Tiele, Adriana, Hernán, y Rosangela. Gracias a Ana María, por acompañarme en buena parte de este camino, por el importante apoyo y la comprensión dada, principalmente durante mi tiempo de trabajo de campo, y por ser voz y escucha activa-afectiva en mi proceso formativo y de vida. I want to express my gratitude to my supervisors during my exchange, Paola Valero from the Stockholm University (SU), and Pirjo Virtanen from the University of Helsinki (UH), for welcoming me to their universities and facilitating the exchange of ideas. I'd also like to thank Bruna Nunes, Farouq Mensah, Harita Raval, Kicki Skog and Laura Caligari from SU, as well as Heidi Niva, Reetta Toivanen, and Victoria Peemot from UH, for making my time there even more enriching with our conversations, coffees, and funny moments. Thank you to Tamsin Meaney and Rune Herheim for accepting me into your course at the Western Norway University of Applied Sciences, for the insightful discussions and new ideas. Muchas gracias a Paola Piedra por su amistad y por darme la bienvenida, haciéndome sentir como en casa en un lugar tan distante, tanto geográfica como culturalmente. Agradeço à Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP –, que foi a principal instituição financiadora da minha pesquisa, processo nº 2018/24911-6, e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq –, assim como à Pró-Reitoria de Pós-graduação –PROPG– em conjunto com a Coordenadoria de Permanência Estudantil – COPE –, pela concessão parcial de apoio financeiro para o desenvolvimento deste trabalho. Lucha. Decía el Viejo Antonio que la lucha es como un círculo. Se puede empezar en cualquier punto, pero nunca termina. Subcomandante Marcos Ko tembiapo ogueru ha oheka tape tembiapope ojejapova ichupe umi oñembosako´i va´ekuere, Avá oñembokatupyry va´ekue, mba´éichapa ou jevyvo itekohápe. Pe mba’ápo jejapo ogueru ojehaurivo pe jeiko otro reko yvy ape ari guava reko, hesãkavo ko’áva pu’áka oñondive ha ikatuvo tekotevea oiko tekohape, oñemoi hekope'yva ouva okaguio jejapo hagua ha ha’éva ndouiva hekopeguavagui pe tembiaporã ha’égui teko renda aty ha ounte ojejapo hagua, péicha. Péicha, jegueru mokõi joavy, peteiva oguerahava pe tekorãme- terã iñambueva itekope hekope yvy porá háicha, ojeporekavo ikatupyryre ha oiva opaichagua teko marane'yvare- ouva teko Avágui, oñembokatupyry mbo’éhao Guasupe Ijyvatevape (Educação Superior), ha oi oikova ipa’ísano kuéra mbytepe ndie ha avei pe tape mbo’épy regua Educação Matemática mba’éichapa ikatu ojeporu ha oi pe teko oikova pe tekohape. Upevarã aguata umi Kaiowá ha Guarani Tekoha Takuapiry ygua ndie, opytava município Coronel Sapucaia, Mato Grosso do Sulpe. Ha’éva pe mokoiha tuichavea renda yvy oikova Avá, pe estado brasileirope ojehecha péicha. Ha ojehecha ave oiveaha okakuaavea oikea Avá oñembokatupyrype Mbo’éhao Guasupe Ijyvatevape. Ko ojejapova ha ave oñemaña umi oivare, mba’éichapa oi jehái pyre ha’éva oñondive tembiapo, petei tekove jeiko iñambueva ramo mbo’épy Matemática ha Antropologia, pe tembiapo añeteva ndive amoivo haípyre ohasavape ojehuva umi yvy aperegua ojejapovape tetãre ha comunidade-re oje’évare ha oivare haí pyre. Ñe´e mbotyha: Mbo´epy ijyvateva, Ojejapova ichupe, Tekove jeiko ndaha´éiva ojohekuáva. ÑE´E MBYKY Esta pesquisa persegue pistas na produção de subjetividades de indígenas que se formaram na Educação Superior e se encontram nas suas comunidades de origem. Tal produção implica abrir-se a vivenciar modos outros de ser e estar no mundo, entendendo que estes devêm no interior de campos de forças que se relacionam, e possibilitam a emergência de existências singulares de vida que subvertem aquelas submetidas a ordens sociais preestabelecidas. Assim, ressaltam-se duas problematizações, uma na direção das afirmações de vida – ou seja das diferentes dimensões da experiencia humana, da busca pelas expressões de sua potência e da valorização da diversidade e individualidade como expressões de vida –, que são produzidas por esses indígenas que, tendo se formado na Educação Superior, continuam a viver nas suas comunidades; e outra, no caminho de indagar por como a Educação Matemática pode operar tanto com esses modos de vida que são produzidos quanto com as teorizações sobre as relações entre matemática e cultura. Para isso caminhei junto à comunidade indígena – (auto) reconhecida como – Kaiowá e Guarani do Tekoha Takuapiry, o qual se localiza no município de Coronel Sapucaia no Mato Grosso do Sul; sendo este o segundo estado brasileiro com maior presença de população indígena no país e um dos quais tem apresentado, nos últimos anos, um crescimento constante de estudantes indígenas que ingressam na Educação Superior. A produção e a análise de dados, assumida de acordo com um dos operantes teóricos como uma composição, é feita junto à Filosofia da Diferença, à Educação Matemática, à à Antropologia e a estudos decoloniais e com eles me propondo cartografar e experienciar os acontecimentos e as transformações que se compõem junto às produções de mundo que são geradas na e pela comunidade referida. Palavras-chave: Indígenas. Educação Superior. Produção de subjetividades. Filosofia da Diferença. Ko tembiapo ogueru ha oheka tape tembiapope ojejapova ichupe umi oñembosako´i va´ekuere, Avá oñembokatupyry va´ekue, mba´éichapa ou jevyvo itekohápe. Pe mba’ápo jejapo ogueru ojehaurivo pe jeiko otro reko yvy ape ari guava reko, hesãkavo ko’áva pu’áka oñondive ha ikatuvo tekotevea oiko tekohape, oñemoi hekope'yva ouva okaguio jejapo hagua ha ha’éva ndouiva hekopeguavagui pe tembiaporã ha’égui teko renda aty ha ounte ojejapo hagua, péicha. Péicha, jegueru mokõi joavy, peteiva oguerahava pe tekorãme- terã iñambueva itekope hekope yvy porá háicha, ojeporekavo ikatupyryre ha oiva opaichagua teko marane'yvare- ouva teko Avágui, oñembokatupyry mbo’éhao Guasupe Ijyvatevape (Educação Superior), ha oi oikova ipa’ísano kuéra mbytepe ndie ha avei pe tape mbo’épy regua Educação Matemática mba’éichapa ikatu ojeporu ha oi pe teko oikova pe tekohape. Upevarã aguata umi Kaiowá ha Guarani Tekoha Takuapiry ygua ndie, opytava município Coronel Sapucaia, Mato Grosso do Sulpe. Ha’éva pe mokoiha tuichavea renda yvy oikova Avá, pe estado brasileirope ojehecha péicha. Ha ojehecha ave oiveaha okakuaavea oikea Avá oñembokatupyrype Mbo’éhao Guasupe Ijyvatevape. Ko ojejapova ha ave oñemaña umi oivare, mba’éichapa oi jehái pyre ha’éva oñondive tembiapo, petei tekove jeiko iñambueva ramo mbo’épy Matemática ha Antropologia, pe tembiapo añeteva ndive amoivo haípyre ohasavape ojehuva umi yvy aperegua ojejapovape tetãre ha comunidade-re oje’évare ha oivare haí pyre. Ñe´e mbotyha: Mbo´epy ijyvateva, Ojejapova ichupe, Tekove jeiko ndaha´éiva ojohekuáva. RESUMO This research pursues clues in the production of subjectivities of indigenous people who graduated from Higher Education and who returned to their communities of origin. Such production implies being open to experiencing other ways of being in the world, understanding that these come within fields of forces that are related, and enabling the emergence of unique existences of life that subvert those subjected to pre-established social orders. Thus, two problematizations are highlighted, one in the direction of life affirmations – that is, of the different dimensions of human experience, of the search for expressions of its power, and the appreciation of diversity and individuality as expressions of life – which are produced by these indigenous people who, having graduated in Higher Education, continue to live in their communities and the other, in the way of inquiring for how Mathematics Education can operate both with these ways of life that are produced and with theorizations about the relations between mathematics and culture. For that, I walked with the indigenous community – (self) recognized as – Kaiowá and Guarani of Tekoha Takuapiry, which is located in the municipality of Coronel Sapucaia in Mato Grosso do Sul; this being the second Brazilian state with the largest presence of indigenous population in the country and one of which has shown, in recent years, the constant growth of indigenous students entering Higher Education. The production and analysis of data (assumed as a composition according to one of the used theoretical references) are done together with the Philosophy of Difference, Mathematics Education, Anthropology, and decolonial studies and with them proposing to map and experience the events and transformations that are composed together with the productions of the world that are generated in and by the referred community. Keywords: Indigenous. Higher Education. Production of Subjectivities. Philosophy of Difference. ABSTRACT No decorrer da tese você se deparará com diferentes palavras e/ou conceitos que podem ser que lhe sejam desconhecidos. Em alguns casos haverá um esclarecimento do seu significado na mesma linha ou uma nota explicativa; em outros, ao final do trabalho, encontrará um breve glossário que pode lhe ajudar a operar com tais termos. Minha sugestão é que siga as afeiçoes e os fluxos que se passam nos vínculos que esses vocábulos estabelecem junto ao contexto geral no qual estarão inseridos. Assim, as notas apresentadas não têm como objetivo explicar ou representar, mas de movimentar. Flua. Solte-se. As fotografias e vídeos que aparecem na tese foram, na sua maioria, produzidas pelo autor. Contudo, muitas também foram produzidas por diferentes membros do Tekoha Takuapiry e não existe um registro específico de sua autoria. Não tome isso como uma “falta de registros”, mas como uma característica de uma prática situada que entende a autoria de outro modo. A câmera fotográfica foi passando de mão em mão, de olho em olho, de corpo em corpo... Neste sentido, assumo a produção de todas as imagens e vídeos de modo coletivo. Como parte dessa eleição, tais produções não contaram com nenhum tipo de referência com respeito à autoria ou ao lugar em que foram feitas, salvo nos casos em que estas não tenham sido realizadas na autoria coletiva aqui assumida ou tenham sido produzidas fora do Tekoha Takuapiry. Da mesma maneira esclareço que a decisão de tomar as produções imagéticas como uma produção coletiva se fundamenta no assumir a própria pesquisa desse mesmo modo, ou seja, em operar a produção do sujeito-pesquisador como um agenciamento coletivo de afetos, no qual se não se trata de um lobo atuante, mas sempre oito ou dez lobos, seis ou sete lobos... múltiplos lobos, que são, cada um, uma multiplicidade. Eu, sujeito-pesquisador, entendo-me nesta alcateia de multiplicidades múltiplas. Nessa direção, se renunciamos a uma autoria individual, destacamos que o que resulta importante nesse processo de devir-lobo é a posição de aquele que escreve em relação a matilha, em relação à multiplicidade-lobo, a maneira de ele aí entrar ou não, à maneira em que este conecta à multiplicidade, ou, no caso especifico desta tese, em operar, principalmente, mas não apenas, junto aos Kaiowá e Guarani e ao Coletivo de pesquisa Cronopies+!, produzindo rizoma como estes e outros (DELEUZE, 2011, p. 55). A escolha pelo uso do nome Takuapiry no lugar de Taquaperi ou Taquapiri (que são as formas comumente usadas em diferentes textos ou documentos acadêmicos e por entidades federais como a Fundação Nacional dos Povos Indígenas - FUNAI ao se referir à aldeia), se dá porque é o modo pelo qual as pessoas da mesma comunidade reconhecem e usam o nome do lugar no qual vivem. No entanto, esta preferência estará em movimento dependendo dos contextos nos quais seja convocada. Peço, na medida do possível, que acompanhe este movimento, pois ele também diz de capturas, de escapes, de aproximações e de distanciamentos. A opção de escrever Kaiowá-Guarani ou Kaiowá e Guarani se ampara em que a maioria das pessoas no Tekoha Takuapiry se reconhecem como Kaiowá e poucas como Guarani, mais especificamente, Guarani Ñandeva. Nos casos em que é usado Guarani e Kaiowá trata-se mais de uma certa generalidade e uma correspondência – que não contempla uma distinção em termos quantitativos entre estes dois povos – com o modo em que lideranças dentro do movimento indígena, numa aposta política de junção de lutas, se manifestam. Educação Matemática, Educação Indígena etc., demarcados ao longo do texto com a letra inicial maiúscula, são tomados como cenários institucionalizados, reconhecidos ou bem catalogados dentro de tópicos preestabelecidos, como algo maior. Quando grafados em letra minúscula, por vezes de modo pluralizado, como educações matemáticas, educações indígenas etc., são assumidos como movimentos que podem ser associados aqueles domínios “maiores” grafados em maiúsculas, mas com possibilidades de fissuras e de aberturas para gerar espaços outros, entendimentos outros que se produzem em zonas de fronteira, que escapam a cânones ou hegemonias e que afirmam vidas, como algo menor (CLARETO; SILVA; CLEMENTE, 2013, CLARETO; MIARKA, 2015, GALLO, 2002; MIARKA, 2017; ORJUELA-BERNAL; MIARKA, 2018; ORJUELA-BERNAL, 2018; entre outros). Estas distinções entre maiúsculas e minúsculas – maior e menor – vão ao encontro da proposta de uma literatura menor dos pensadores franceses Deleuze e Guattari (1977); uma literatura que faz uma minoria numa língua maior, ou seja, uma desterritorialização, com valor político e coletivo. As interlocuções que mantive com os Kaiowá e Guarani se deram na língua portuguesa, devido, vale esclarecer, meu pouco conhecimento, no momento do trabalho de campo, da língua guarani, a língua materna destes povos. Nesse caminho também informo que os nomes das pessoas do Tekoha Takuapiry que são mencionadas na tese são seus nomes reais – tal e como fora acordado com elas – e que as transcrições das interações que são convocadas para compor esta pesquisa mantêm o formato original em que as narrações foram feitas, em que não realizei nenhuma alteração que responda – se é que o há – a um modo “correto” de falar ou de dizer. Assim, fazendo uma analogia a um texto de um reconhecido jornalista colombiano quando se refere à língua espanhola, cabe dizer que quando a língua portuguesa foi trazida de Portugal pelos conquistadores, ela mudou de âmbito geográfico e anímico, pelo que os registros aqui presentes não contemplam o “falar incorretamente” como alguns poderiam assumi-lo; pelo contrário, trata-se de falar de maneiras outras, como o fazem os Kaiowá e Guarani. Tais maneiras, além de serem totalmente legítimas – dado que surgem, neste caso, entre imposições e necessidades – procuram dar conta, mais do que uma homogeneidade ou consenso de forma, de modos de expressão que contribuem às lutas dos povos indígenas. Assim, cabe lembrar também que estas maneiras outras de falar estão na areia dos enfrentamentos às falsas verdades de pretensa única língua nacional falada oficial, vinculadas tanto à criação e consolidação dos estados-nação, quanto à defesa de uma certa identidade que termina por excluir, negar, e segregar a diversidade. Por fim, no que se refere a esta nota, é importante mencionar que as interações que são convocadas e estão presentes nesta tese são, na maioria dos casos, resultado das entrevistas-conversas, das quais tive a devida autorização para gravá-las e utilizá-las na pesquisa, que mantive com as pessoas do Tekoha Takuapiry. Com o intuito de facilitar a identificação dessas interações e de não tornar repetitivas estás informações, cada uma delas estará acompanhada tanto do nome da pessoa como da data em que a entrevista-conversa ocorreu. i) ii) Notas políticas Preliminares Por último, y casi como un corolario de las dos últimas notas, el texto aqui presente opera com o uso de diferentes línguas, por vezes de modo híbrido, como resposta a uma produção política e de afetos. Este modo de agir lleva en consideración la condición de extranjería en que, de um ou outro modo, sempre nos encontramos e, explora, ao mesmo tempo a potência de dizer ou expressar de diferentes modos o que se siente, se piensa y se hace. Trata-se de uma escrita como potência criadora, como invenção, que se entrega a operar como multiplicidade e que não procura explicar, mas [que serve] para afetar, para dar vazão a uma multidão que habita quem escreve (AMARIS-RUIDIAZ, MIARKA, 2018, p.14). No decorrer da tese você se deparará com diferentes palavras e/ou conceitos que podem ser que lhe sejam desconhecidos. Em alguns casos haverá um esclarecimento do seu significado na mesma linha ou uma nota explicativa; em outros, ao final do trabalho, encontrará um breve glossário que pode lhe ajudar a operar com tais termos. Minha sugestão é que siga as afeiçoes e os fluxos que se passam nos vínculos que esses vocábulos estabelecem junto ao contexto geral no qual estarão inseridos. Assim, as notas apresentadas não têm como objetivo explicar ou representar, mas de movimentar. Flua. Solte-se. As fotografias e vídeos que aparecem na tese foram, na sua maioria, produzidas pelo autor. Contudo, muitas também foram produzidas por diferentes membros do Tekoha Takuapiry e não existe um registro específico de sua autoria. Não tome isso como uma “falta de registros”, mas como uma característica de uma prática situada que entende a autoria de outro modo. A câmera fotográfica foi passando de mão em mão, de olho em olho, de corpo em corpo... Neste sentido, assumo a produção de todas as imagens e vídeos de modo coletivo. Como parte dessa eleição, tais produções não contaram com nenhum tipo de referência com respeito à autoria ou ao lugar em que foram feitas, salvo nos casos em que estas não tenham sido realizadas na autoria coletiva aqui assumida ou tenham sido produzidas fora do Tekoha Takuapiry. Da mesma maneira esclareço que a decisão de tomar as produções imagéticas como uma produção coletiva se fundamenta no assumir a própria pesquisa desse mesmo modo, ou seja, em operar a produção do sujeito-pesquisador como um agenciamento coletivo de afetos, no qual se não se trata de um lobo atuante, mas sempre oito ou dez lobos, seis ou sete lobos... múltiplos lobos, que são, cada um, uma multiplicidade. Eu, sujeito-pesquisador, entendo-me nesta alcateia de multiplicidades múltiplas. Nessa direção, se renunciamos a uma autoria individual, destacamos que o que resulta importante nesse processo de devir-lobo é a posição de aquele que escreve em relação a matilha, em relação à multiplicidade-lobo, a maneira de ele aí entrar ou não, à maneira em que este conecta à multiplicidade, ou, no caso especifico desta tese, em operar, principalmente, mas não apenas, junto aos Kaiowá e Guarani e ao Coletivo de pesquisa Cronopies+!, produzindo rizoma como estes e outros (DELEUZE, 2011, p. 55). A escolha pelo uso do nome Takuapiry no lugar de Taquaperi ou Taquapiri (que são as formas comumente usadas em diferentes textos ou documentos acadêmicos e por entidades federais como a Fundação Nacional dos Povos Indígenas - FUNAI ao se referir à aldeia), se dá porque é o modo pelo qual as pessoas da mesma comunidade reconhecem e usam o nome do lugar no qual vivem. No entanto, esta preferência estará em movimento dependendo dos contextos nos quais seja convocada. Peço, na medida do possível, que acompanhe este movimento, pois ele também diz de capturas, de escapes, de aproximações e de distanciamentos. A opção de escrever Kaiowá-Guarani ou Kaiowá e Guarani se ampara em que a maioria das pessoas no Tekoha Takuapiry se reconhecem como Kaiowá e poucas como Guarani, mais especificamente, Guarani Ñandeva. Nos casos em que é usado Guarani e Kaiowá trata-se mais de uma certa generalidade e uma correspondência – que não contempla uma distinção em termos quantitativos entre estes dois povos – com o modo em que lideranças dentro do movimento indígena, numa aposta política de junção de lutas, se manifestam. Educação Matemática, Educação Indígena etc., demarcados ao longo do texto com a letra inicial maiúscula, são tomados como cenários institucionalizados, reconhecidos ou bem catalogados dentro de tópicos preestabelecidos, como algo maior. Quando grafados em letra minúscula, por vezes de modo pluralizado, como educações matemáticas, educações indígenas etc., são assumidos como movimentos que podem ser associados aqueles domínios “maiores” grafados em maiúsculas, mas com possibilidades de fissuras e de aberturas para gerar espaços outros, entendimentos outros que se produzem em zonas de fronteira, que escapam a cânones ou hegemonias e que afirmam vidas, como algo menor (CLARETO; SILVA; CLEMENTE, 2013, CLARETO; MIARKA, 2015, GALLO, 2002; MIARKA, 2017; ORJUELA-BERNAL; MIARKA, 2018; ORJUELA-BERNAL, 2018; entre outros). Estas distinções entre maiúsculas e minúsculas – maior e menor – vão ao encontro da proposta de uma literatura menor dos pensadores franceses Deleuze e Guattari (1977); uma literatura que faz uma minoria numa língua maior, ou seja, uma desterritorialização, com valor político e coletivo. As interlocuções que mantive com os Kaiowá e Guarani se deram na língua portuguesa, devido, vale esclarecer, meu pouco conhecimento, no momento do trabalho de campo, da língua guarani, a língua materna destes povos. Nesse caminho também informo que os nomes das pessoas do Tekoha Takuapiry que são mencionadas na tese são seus nomes reais – tal e como fora acordado com elas – e que as transcrições das interações que são convocadas para compor esta pesquisa mantêm o formato original em que as narrações foram feitas, em que não realizei nenhuma alteração que responda – se é que o há – a um modo “correto” de falar ou de dizer. Assim, fazendo uma analogia a um texto de um reconhecido jornalista colombiano quando se refere à língua espanhola, cabe dizer que quando a língua portuguesa foi trazida de Portugal pelos conquistadores, ela mudou de âmbito geográfico e anímico, pelo que os registros aqui presentes não contemplam o “falar incorretamente” como alguns poderiam assumi-lo; pelo contrário, trata-se de falar de maneiras outras, como o fazem os Kaiowá e Guarani. Tais maneiras, além de serem totalmente legítimas – dado que surgem, neste caso, entre imposições e necessidades – procuram dar conta, mais do que uma homogeneidade ou consenso de forma, de modos de expressão que contribuem às lutas dos povos indígenas. Assim, cabe lembrar também que estas maneiras outras de falar estão na areia dos enfrentamentos às falsas verdades de pretensa única língua nacional falada oficial, vinculadas tanto à criação e consolidação dos estados-nação, quanto à defesa de uma certa identidade que termina por excluir, negar, e segregar a diversidade. Por fim, no que se refere a esta nota, é importante mencionar que as interações que são convocadas e estão presentes nesta tese são, na maioria dos casos, resultado das entrevistas-conversas, das quais tive a devida autorização para gravá-las e utilizá-las na pesquisa, que mantive com as pessoas do Tekoha Takuapiry. Com o intuito de facilitar a identificação dessas interações e de não tornar repetitivas estás informações, cada uma delas estará acompanhada tanto do nome da pessoa como da data em que a entrevista-conversa ocorreu. iii) v) iv) Por último, y casi como un corolario de las dos últimas notas, el texto aqui presente opera com o uso de diferentes línguas, por vezes de modo híbrido, como resposta a uma produção política e de afetos. Este modo de agir lleva en consideración la condición de extranjería en que, de um ou outro modo, sempre nos encontramos e, explora, ao mesmo tempo a potência de dizer ou expressar de diferentes modos o que se siente, se piensa y se hace. Trata-se de uma escrita como potência criadora, como invenção, que se entrega a operar como multiplicidade e que não procura explicar, mas [que serve] para afetar, para dar vazão a uma multidão que habita quem escreve (AMARIS-RUIDIAZ, MIARKA, 2018, p.14). No decorrer da tese você se deparará com diferentes palavras e/ou conceitos que podem ser que lhe sejam desconhecidos. Em alguns casos haverá um esclarecimento do seu significado na mesma linha ou uma nota explicativa; em outros, ao final do trabalho, encontrará um breve glossário que pode lhe ajudar a operar com tais termos. Minha sugestão é que siga as afeiçoes e os fluxos que se passam nos vínculos que esses vocábulos estabelecem junto ao contexto geral no qual estarão inseridos. Assim, as notas apresentadas não têm como objetivo explicar ou representar, mas de movimentar. Flua. Solte-se. As fotografias e vídeos que aparecem na tese foram, na sua maioria, produzidas pelo autor. Contudo, muitas também foram produzidas por diferentes membros do Tekoha Takuapiry e não existe um registro específico de sua autoria. Não tome isso como uma “falta de registros”, mas como uma característica de uma prática situada que entende a autoria de outro modo. A câmera fotográfica foi passando de mão em mão, de olho em olho, de corpo em corpo... Neste sentido, assumo a produção de todas as imagens e vídeos de modo coletivo. Como parte dessa eleição, tais produções não contaram com nenhum tipo de referência com respeito à autoria ou ao lugar em que foram feitas, salvo nos casos em que estas não tenham sido realizadas na autoria coletiva aqui assumida ou tenham sido produzidas fora do Tekoha Takuapiry. Da mesma maneira esclareço que a decisão de tomar as produções imagéticas como uma produção coletiva se fundamenta no assumir a própria pesquisa desse mesmo modo, ou seja, em operar a produção do sujeito-pesquisador como um agenciamento coletivo de afetos, no qual se não se trata de um lobo atuante, mas sempre oito ou dez lobos, seis ou sete lobos... múltiplos lobos, que são, cada um, uma multiplicidade. Eu, sujeito-pesquisador, entendo-me nesta alcateia de multiplicidades múltiplas. Nessa direção, se renunciamos a uma autoria individual, destacamos que o que resulta importante nesse processo de devir-lobo é a posição de aquele que escreve em relação a matilha, em relação à multiplicidade-lobo, a maneira de ele aí entrar ou não, à maneira em que este conecta à multiplicidade, ou, no caso especifico desta tese, em operar, principalmente, mas não apenas, junto aos Kaiowá e Guarani e ao Coletivo de pesquisa Cronopies+!, produzindo rizoma como estes e outros (DELEUZE, 2011, p. 55). A escolha pelo uso do nome Takuapiry no lugar de Taquaperi ou Taquapiri (que são as formas comumente usadas em diferentes textos ou documentos acadêmicos e por entidades federais como a Fundação Nacional dos Povos Indígenas - FUNAI ao se referir à aldeia), se dá porque é o modo pelo qual as pessoas da mesma comunidade reconhecem e usam o nome do lugar no qual vivem. No entanto, esta preferência estará em movimento dependendo dos contextos nos quais seja convocada. Peço, na medida do possível, que acompanhe este movimento, pois ele também diz de capturas, de escapes, de aproximações e de distanciamentos. A opção de escrever Kaiowá-Guarani ou Kaiowá e Guarani se ampara em que a maioria das pessoas no Tekoha Takuapiry se reconhecem como Kaiowá e poucas como Guarani, mais especificamente, Guarani Ñandeva. Nos casos em que é usado Guarani e Kaiowá trata-se mais de uma certa generalidade e uma correspondência – que não contempla uma distinção em termos quantitativos entre estes dois povos – com o modo em que lideranças dentro do movimento indígena, numa aposta política de junção de lutas, se manifestam. Educação Matemática, Educação Indígena etc., demarcados ao longo do texto com a letra inicial maiúscula, são tomados como cenários institucionalizados, reconhecidos ou bem catalogados dentro de tópicos preestabelecidos, como algo maior. Quando grafados em letra minúscula, por vezes de modo pluralizado, como educações matemáticas, educações indígenas etc., são assumidos como movimentos que podem ser associados aqueles domínios “maiores” grafados em maiúsculas, mas com possibilidades de fissuras e de aberturas para gerar espaços outros, entendimentos outros que se produzem em zonas de fronteira, que escapam a cânones ou hegemonias e que afirmam vidas, como algo menor (CLARETO; SILVA; CLEMENTE, 2013, CLARETO; MIARKA, 2015, GALLO, 2002; MIARKA, 2017; ORJUELA-BERNAL; MIARKA, 2018; ORJUELA-BERNAL, 2018; entre outros). Estas distinções entre maiúsculas e minúsculas – maior e menor – vão ao encontro da proposta de uma literatura menor dos pensadores franceses Deleuze e Guattari (1977); uma literatura que faz uma minoria numa língua maior, ou seja, uma desterritorialização, com valor político e coletivo. As interlocuções que mantive com os Kaiowá e Guarani se deram na língua portuguesa, devido, vale esclarecer, meu pouco conhecimento, no momento do trabalho de campo, da língua guarani, a língua materna destes povos. Nesse caminho também informo que os nomes das pessoas do Tekoha Takuapiry que são mencionadas na tese são seus nomes reais – tal e como fora acordado com elas – e que as transcrições das interações que são convocadas para compor esta pesquisa mantêm o formato original em que as narrações foram feitas, em que não realizei nenhuma alteração que responda – se é que o há – a um modo “correto” de falar ou de dizer. Assim, fazendo uma analogia a um texto de um reconhecido jornalista colombiano quando se refere à língua espanhola, cabe dizer que quando a língua portuguesa foi trazida de Portugal pelos conquistadores, ela mudou de âmbito geográfico e anímico, pelo que os registros aqui presentes não contemplam o “falar incorretamente” como alguns poderiam assumi-lo; pelo contrário, trata-se de falar de maneiras outras, como o fazem os Kaiowá e Guarani. Tais maneiras, além de serem totalmente legítimas – dado que surgem, neste caso, entre imposições e necessidades – procuram dar conta, mais do que uma homogeneidade ou consenso de forma, de modos de expressão que contribuem às lutas dos povos indígenas. Assim, cabe lembrar também que estas maneiras outras de falar estão na areia dos enfrentamentos às falsas verdades de pretensa única língua nacional falada oficial, vinculadas tanto à criação e consolidação dos estados-nação, quanto à defesa de uma certa identidade que termina por excluir, negar, e segregar a diversidade. Por fim, no que se refere a esta nota, é importante mencionar que as interações que são convocadas e estão presentes nesta tese são, na maioria dos casos, resultado das entrevistas-conversas, das quais tive a devida autorização para gravá-las e utilizá-las na pesquisa, que mantive com as pessoas do Tekoha Takuapiry. Com o intuito de facilitar a identificação dessas interações e de não tornar repetitivas estás informações, cada uma delas estará acompanhada tanto do nome da pessoa como da data em que a entrevista-conversa ocorreu. vi) Por último, y casi como un corolario de las dos últimas notas, el texto aqui presente opera com o uso de diferentes línguas, por vezes de modo híbrido, como resposta a uma produção política e de afetos. Este modo de agir lleva en consideración la condición de extranjería en que, de um ou outro modo, sempre nos encontramos e, explora, ao mesmo tempo a potência de dizer ou expressar de diferentes modos o que se siente, se piensa y se hace. Trata-se de uma escrita como potência criadora, como invenção, que se entrega a operar como multiplicidade e que não procura explicar, mas [que serve] para afetar, para dar vazão a uma multidão que habita quem escreve (AMARIS-RUIDIAZ, MIARKA, 2018, p.14). No decorrer da tese você se deparará com diferentes palavras e/ou conceitos que podem ser que lhe sejam desconhecidos. Em alguns casos haverá um esclarecimento do seu significado na mesma linha ou uma nota explicativa; em outros, ao final do trabalho, encontrará um breve glossário que pode lhe ajudar a operar com tais termos. Minha sugestão é que siga as afeiçoes e os fluxos que se passam nos vínculos que esses vocábulos estabelecem junto ao contexto geral no qual estarão inseridos. Assim, as notas apresentadas não têm como objetivo explicar ou representar, mas de movimentar. Flua. Solte-se. As fotografias e vídeos que aparecem na tese foram, na sua maioria, produzidas pelo autor. Contudo, muitas também foram produzidas por diferentes membros do Tekoha Takuapiry e não existe um registro específico de sua autoria. Não tome isso como uma “falta de registros”, mas como uma característica de uma prática situada que entende a autoria de outro modo. A câmera fotográfica foi passando de mão em mão, de olho em olho, de corpo em corpo... Neste sentido, assumo a produção de todas as imagens e vídeos de modo coletivo. Como parte dessa eleição, tais produções não contaram com nenhum tipo de referência com respeito à autoria ou ao lugar em que foram feitas, salvo nos casos em que estas não tenham sido realizadas na autoria coletiva aqui assumida ou tenham sido produzidas fora do Tekoha Takuapiry. Da mesma maneira esclareço que a decisão de tomar as produções imagéticas como uma produção coletiva se fundamenta no assumir a própria pesquisa desse mesmo modo, ou seja, em operar a produção do sujeito-pesquisador como um agenciamento coletivo de afetos, no qual se não se trata de um lobo atuante, mas sempre oito ou dez lobos, seis ou sete lobos... múltiplos lobos, que são, cada um, uma multiplicidade. Eu, sujeito-pesquisador, entendo-me nesta alcateia de multiplicidades múltiplas. Nessa direção, se renunciamos a uma autoria individual, destacamos que o que resulta importante nesse processo de devir-lobo é a posição de aquele que escreve em relação a matilha, em relação à multiplicidade-lobo, a maneira de ele aí entrar ou não, à maneira em que este conecta à multiplicidade, ou, no caso especifico desta tese, em operar, principalmente, mas não apenas, junto aos Kaiowá e Guarani e ao Coletivo de pesquisa Cronopies+!, produzindo rizoma como estes e outros (DELEUZE, 2011, p. 55). A escolha pelo uso do nome Takuapiry no lugar de Taquaperi ou Taquapiri (que são as formas comumente usadas em diferentes textos ou documentos acadêmicos e por entidades federais como a Fundação Nacional dos Povos Indígenas - FUNAI ao se referir à aldeia), se dá porque é o modo pelo qual as pessoas da mesma comunidade reconhecem e usam o nome do lugar no qual vivem. No entanto, esta preferência estará em movimento dependendo dos contextos nos quais seja convocada. Peço, na medida do possível, que acompanhe este movimento, pois ele também diz de capturas, de escapes, de aproximações e de distanciamentos. A opção de escrever Kaiowá-Guarani ou Kaiowá e Guarani se ampara em que a maioria das pessoas no Tekoha Takuapiry se reconhecem como Kaiowá e poucas como Guarani, mais especificamente, Guarani Ñandeva. Nos casos em que é usado Guarani e Kaiowá trata-se mais de uma certa generalidade e uma correspondência – que não contempla uma distinção em termos quantitativos entre estes dois povos – com o modo em que lideranças dentro do movimento indígena, numa aposta política de junção de lutas, se manifestam. Educação Matemática, Educação Indígena etc., demarcados ao longo do texto com a letra inicial maiúscula, são tomados como cenários institucionalizados, reconhecidos ou bem catalogados dentro de tópicos preestabelecidos, como algo maior. Quando grafados em letra minúscula, por vezes de modo pluralizado, como educações matemáticas, educações indígenas etc., são assumidos como movimentos que podem ser associados aqueles domínios “maiores” grafados em maiúsculas, mas com possibilidades de fissuras e de aberturas para gerar espaços outros, entendimentos outros que se produzem em zonas de fronteira, que escapam a cânones ou hegemonias e que afirmam vidas, como algo menor (CLARETO; SILVA; CLEMENTE, 2013, CLARETO; MIARKA, 2015, GALLO, 2002; MIARKA, 2017; ORJUELA-BERNAL; MIARKA, 2018; ORJUELA-BERNAL, 2018; entre outros). Estas distinções entre maiúsculas e minúsculas – maior e menor – vão ao encontro da proposta de uma literatura menor dos pensadores franceses Deleuze e Guattari (1977); uma literatura que faz uma minoria numa língua maior, ou seja, uma desterritorialização, com valor político e coletivo. As interlocuções que mantive com os Kaiowá e Guarani se deram na língua portuguesa, devido, vale esclarecer, meu pouco conhecimento, no momento do trabalho de campo, da língua guarani, a língua materna destes povos. Nesse caminho também informo que os nomes das pessoas do Tekoha Takuapiry que são mencionadas na tese são seus nomes reais – tal e como fora acordado com elas – e que as transcrições das interações que são convocadas para compor esta pesquisa mantêm o formato original em que as narrações foram feitas, em que não realizei nenhuma alteração que responda – se é que o há – a um modo “correto” de falar ou de dizer. Assim, fazendo uma analogia a um texto de um reconhecido jornalista colombiano quando se refere à língua espanhola, cabe dizer que quando a língua portuguesa foi trazida de Portugal pelos conquistadores, ela mudou de âmbito geográfico e anímico, pelo que os registros aqui presentes não contemplam o “falar incorretamente” como alguns poderiam assumi-lo; pelo contrário, trata-se de falar de maneiras outras, como o fazem os Kaiowá e Guarani. Tais maneiras, além de serem totalmente legítimas – dado que surgem, neste caso, entre imposições e necessidades – procuram dar conta, mais do que uma homogeneidade ou consenso de forma, de modos de expressão que contribuem às lutas dos povos indígenas. Assim, cabe lembrar também que estas maneiras outras de falar estão na areia dos enfrentamentos às falsas verdades de pretensa única língua nacional falada oficial, vinculadas tanto à criação e consolidação dos estados-nação, quanto à defesa de uma certa identidade que termina por excluir, negar, e segregar a diversidade. Por fim, no que se refere a esta nota, é importante mencionar que as interações que são convocadas e estão presentes nesta tese são, na maioria dos casos, resultado das entrevistas-conversas, das quais tive a devida autorização para gravá-las e utilizá-las na pesquisa, que mantive com as pessoas do Tekoha Takuapiry. Com o intuito de facilitar a identificação dessas interações e de não tornar repetitivas estás informações, cada uma delas estará acompanhada tanto do nome da pessoa como da data em que a entrevista-conversa ocorreu. vii) Por último, y casi como un corolario de las dos últimas notas, el texto aqui presente opera com o uso de diferentes línguas, por vezes de modo híbrido, como resposta a uma produção política e de afetos. Este modo de agir lleva en consideración la condición de extranjería en que, de um ou outro modo, sempre nos encontramos e, explora, ao mesmo tempo a potência de dizer ou expressar de diferentes modos o que se siente, se piensa y se hace. Trata-se de uma escrita como potência criadora, como invenção, que se entrega a operar como multiplicidade e que não procura explicar, mas [que serve] para afetar, para dar vazão a uma multidão que habita quem escreve (AMARIS-RUIDIAZ, MIARKA, 2018, p.14). PRIMEIRA PARTE I. [UMA] VIAGEM II. [UM] MAPA PARA A VIAGEM III. AHAPYPERE REKA PE TAPE – AVESSO DO CAMINHO PYTU'U I RESPIRO/PAUSA/DESCANSO JAHA JAGUATA VAMOS CAMINHAR 21 25 27 40 53 61 65 70 92 131 119 147 151 203 213 243 251 255 281 287 291 TERCEIRA PARTE JAGUATA TAPE PASSOS E CAMINHOS I. ... ENTRE UM PASSO E OUTRO ENTRE UMA PISADA E OUTRA ... II. ... ENTRE ESCOLAS E ESCOLHAS E VIDAS E RE-EXISTÊNCIAS E... E PYTU’U III PYTU’U IV QUARTA PARTE ARANDUKAPURUPYRE – OPERANTES/BIBLIOGRAFIA – ÑEHA'ARÕ IJOJAHA'YVA I. EDUCAÇÃO SUPERIOR E EDUCAÇÕES OUTRAS II. EDUCAÇÕES OUTRAS E EDUCAÇÕES MATEMÁTICAS OUTRAS A ESPERANÇA É INFINITA PYTU’U V SEGUNDA PARTE I. PASSADO [E] PRESENTE II. ALDEIA INDÍGENA TAQUAPIRI III. A IRREDUTIBILIDADE DA VIDA NO TEKOHA TAKUAPIRY PYTU’U II TEKOHA E TEKO TERRITÓRIO E MODOS DE SER RESPIRO/PAUSA/DESCANSO RESPIRO/PAUSA/DESCANSO RESPIRO/PAUSA/DESCANSO RESPIRO/PAUSA/DESCANSO Glossário IV. ÑAMAÑA IMI ÑANDE JEHASARE – UM BREVE OLHAR HISTÓRICO – Sumário jaha jaguata - vamos caminhar - PRIMEIRA PARTE Caminhante Área de retomada Kurusu Ambá I Produção Coletiva – Você não quer ir à casa da minha mãe para tomar um chimarrão? – perguntou-me Gildo. Para aquele tempo, levava um pouco mais de uma semana morando em sua casa em Takuapiry e, com exceção de uma de suas filhas, ainda não conhecia ninguém de sua família. Compreendi, mais tarde, que tal gesto abrigava muito mais do que um convite informal para partilhar uma bebida quente junto ao fogo. Gildo, o professor que, sem me conhecer, tinha me recebido em sua residência, me abria naquele instante as portas de seu verdadeiro lar, pois o domicílio que dividíamos era o local que ele usava para dormir e para descansar, mas não era lugar onde de fato vivia. O caminho que me levou até ali, até o Tekoha Takuapiry – ou Aldeia Indígena Taquapiri como é reconhecida institucionalmente – no Mato Grosso do Sul, até a casa de Gildo, de Rosângela, de Claudemiro, de Shirley, de Oswaldo, de Andressa, de Geraldo e de tantas e tantas outras pessoas, tem sido um caminho de longa data, comprido, em alguns pontos sinuoso, mas definitivamente tem sido, como diria o sábio Don Juan em A Erva do Diabo, um caminho com coração. Quer dizer, tem sido um caminho que tem me moldado, que tem me deixado forte e no qual, entre momentos de adversidade e prazer, de aventuras e desventuras, tenho sido feliz. Ocupo-me aqui – nesta tese – com uma parte desse caminho, com o trecho percorrido junto aos Kaiowá e Guarani. Com o sendeiro feito junto a uma comunidade inteira que me deu um voto de confiança ao receber-me e que, nos movimentos gerados para que encontros viessem acontecer, me aceitaram em suas casas, me atravessaram com sua palavra cantada1 , me ensinaram da infinidade da esperança2 e me lembraram a importância que têm tanto o cuidado constante – de si e dos outros – como a força que possuem as mãos dadas. Ora, este afazer demanda que, da mesma forma em que Kaiowás e Guaranis me cuidaram de diversos modos, eu assuma com você a mesma responsabilidade. Ou seja, que na relação que estamos estabelecendo desde agora, você possa se adentrar neste caminho – se é que decide fazê-lo3 – com uma certa segurança. Uma que o convide a novos e intensos passos. Nesse exercício de cuidado, pergunto-lhe, leitor, leitora: Você não quer tomar um chimarrão, um café ou um vinho e vir comigo, na verdade conosco, à casa da mãe do Gildo? Não gostaria de escutar e aprender de e com as escolas dentro do Tekoha Takuapiry? Não estaria interessado em acompanhar o tão valioso Oguata ou Ojeguata4 dos Kaiowá e Guarani, ou seja, de se fazer parte do caminhar destes povos para juntar-se a nós pelas trilhas e e caminhos de suas resistências e lutas, de suas vidas e modos de ser? Não gostaria de fundir-se com outros corpos, outras línguas, que se expressam e inventam formas outras de ser, de sentir-pensar? Não se lançaria à aventura de se tornar, por instantes, indígena, criança estrangeiro, estrangeira? De vivenciar, viajando no tempo e com ajuda das palavras, a resistência centenária que Kaiowás e Guaranis mantêm até hoje por uma vida digna? De acompanhar e questionar, desde outras vozes, os privilégios de uns em detrimento da própria vida de outros?... E, ao mesmo tempo, confidencialmente, lhe dou algumas dicas para a viagem: convido-o não só a procurar uma bebida, mas também a preparar-dispor o corpo, a desnudar sua alma, a afiar seus sentidos, a desafiar sua imaginação e suas crenças durante todo o tempo de leitura. Também pode ser que precise se esquecer, pelo menos um pouco, da academia, de suas estruturas e formalismos, do que sabe ou acredita que sabe. E, sobretudo, convido-o a se fazer de uma bússola de afetos que lhe ajude a identificar, marcar e acentuar pontos em que diversas manifestações de afirmações de vida acontecem. Confio que tais conselhos possam ajudar para que o fogo presente na cozinha da mãe de Gildo consiga atingi-lo – tal e como o fizera comigo – e lhe dar calor, luz e energia suficiente para pular e mergulhar no pluriverso dos Kaiowá e Guarani, para junto a eles, partilhar um instante-chimarrão no qual se fala, entre tudo, de vidas e resistências. 25 I [UMA] VIAGEM Salta, ya aparecerá el piso Poema Navajo – Você não quer ir à casa da minha mãe para tomar um chimarrão? – perguntou-me Gildo. Para aquele tempo, levava um pouco mais de uma semana morando em sua casa em Takuapiry e, com exceção de uma de suas filhas, ainda não conhecia ninguém de sua família. Compreendi, mais tarde, que tal gesto abrigava muito mais do que um convite informal para partilhar uma bebida quente junto ao fogo. Gildo, o professor que, sem me conhecer, tinha me recebido em sua residência, me abria naquele instante as portas de seu verdadeiro lar, pois o domicílio que dividíamos era o local que ele usava para dormir e para descansar, mas não era lugar onde de fato vivia. O caminho que me levou até ali, até o Tekoha Takuapiry – ou Aldeia Indígena Taquapiri como é reconhecida institucionalmente – no Mato Grosso do Sul, até a casa de Gildo, de Rosângela, de Claudemiro, de Shirley, de Oswaldo, de Andressa, de Geraldo e de tantas e tantas outras pessoas, tem sido um caminho de longa data, comprido, em alguns pontos sinuoso, mas definitivamente tem sido, como diria o sábio Don Juan em A Erva do Diabo, um caminho com coração. Quer dizer, tem sido um caminho que tem me moldado, que tem me deixado forte e no qual, entre momentos de adversidade e prazer, de aventuras e desventuras, tenho sido feliz. Ocupo-me aqui – nesta tese – com uma parte desse caminho, com o trecho percorrido junto aos Kaiowá e Guarani. Com o sendeiro feito junto a uma comunidade inteira que me deu um voto de confiança ao receber-me e que, nos movimentos gerados para que encontros viessem acontecer, me aceitaram em suas casas, me atravessaram com sua palavra cantada1 , me ensinaram da infinidade da esperança2 e me lembraram a importância que têm tanto o cuidado constante – de si e dos outros – como a força que possuem as mãos dadas. Ora, este afazer demanda que, da mesma forma em que Kaiowás e Guaranis me cuidaram de diversos modos, eu assuma com você a mesma responsabilidade. Ou seja, que na relação que estamos estabelecendo desde agora, você possa se adentrar neste caminho – se é que decide fazê-lo3 – com uma certa segurança. Uma que o convide a novos e intensos passos. Nesse exercício de cuidado, pergunto-lhe, leitor, leitora: Você não quer tomar um chimarrão, um café ou um vinho e vir comigo, na verdade conosco, à casa da mãe do Gildo? Não gostaria de escutar e aprender de e com as escolas dentro do Tekoha Takuapiry? Não estaria interessado em acompanhar o tão valioso Oguata ou Ojeguata4 dos Kaiowá e Guarani, ou seja, de se fazer parte do caminhar destes povos para juntar-se a nós pelas trilhas e e caminhos de suas resistências e lutas, de suas vidas e modos de ser? Não gostaria de fundir-se com outros corpos, outras línguas, que se expressam e inventam formas outras de ser, de sentir-pensar? Não se lançaria à aventura de se tornar, por instantes, indígena, criança estrangeiro, estrangeira? De vivenciar, viajando no tempo e com ajuda das palavras, a resistência centenária que Kaiowás e Guaranis mantêm até hoje por uma vida digna? De acompanhar e questionar, desde outras vozes, os privilégios de uns em detrimento da própria vida de outros?... E, ao mesmo tempo, confidencialmente, lhe dou algumas dicas para a viagem: convido-o não só a procurar uma bebida, mas também a preparar-dispor o corpo, a desnudar sua alma, a afiar seus sentidos, a desafiar sua imaginação e suas crenças durante todo o tempo de leitura. Também pode ser que precise se esquecer, pelo menos um pouco, da academia, de suas estruturas e formalismos, do que sabe ou acredita que sabe. E, sobretudo, convido-o a se fazer de uma bússola de afetos que lhe ajude a identificar, marcar e acentuar pontos em que diversas manifestações de afirmações de vida acontecem. Confio que tais conselhos possam ajudar para que o fogo presente na cozinha da mãe de Gildo consiga atingi-lo – tal e como o fizera comigo – e lhe dar calor, luz e energia suficiente para pular e mergulhar no pluriverso dos Kaiowá e Guarani, para junto a eles, partilhar um instante-chimarrão no qual se fala, entre tudo, de vidas e resistências. 1. Para os Kaiowá e os Guarani a importância da palavra cantada na formação da pessoa está ligada à importância na constituição dos seres (CHAMORRO, 2017, p. 205). 2. Durante o estágio que realizei no ano 2020, no curso de Licenciatura Intercultural Indígena Teko Arandu, na habilitação na área de Matemática, na Universidade Federal da Grande Dourados, numa classe junto à Profa. Dra. Maria Aparecida Méndez de Oliveira, enquanto discutíamos noções introdutórias do Cálculo Infinitesi- mal, os estudantes se pronunciaram dizendo que para eles, indígenas Kaiowá e Guarani, a esperança é infinita. 3. Inspiração decorrente das palavras do poeta espanhol Antonio Machado e da interpretação músical Cantares do Manuel Serrat: Caminante no hay caminho, se hace caminho al andar. Ver: https://www.youtube.com/wat- ch?v=vvFNinNkFsw 26 – Você não quer ir à casa da minha mãe para tomar um chimarrão? – perguntou-me Gildo. Para aquele tempo, levava um pouco mais de uma semana morando em sua casa em Takuapiry e, com exceção de uma de suas filhas, ainda não conhecia ninguém de sua família. Compreendi, mais tarde, que tal gesto abrigava muito mais do que um convite informal para partilhar uma bebida quente junto ao fogo. Gildo, o professor que, sem me conhecer, tinha me recebido em sua residência, me abria naquele instante as portas de seu verdadeiro lar, pois o domicílio que dividíamos era o local que ele usava para dormir e para descansar, mas não era lugar onde de fato vivia. O caminho que me levou até ali, até o Tekoha Takuapiry – ou Aldeia Indígena Taquapiri como é reconhecida institucionalmente – no Mato Grosso do Sul, até a casa de Gildo, de Rosângela, de Claudemiro, de Shirley, de Oswaldo, de Andressa, de Geraldo e de tantas e tantas outras pessoas, tem sido um caminho de longa data, comprido, em alguns pontos sinuoso, mas definitivamente tem sido, como diria o sábio Don Juan em A Erva do Diabo, um caminho com coração. Quer dizer, tem sido um caminho que tem me moldado, que tem me deixado forte e no qual, entre momentos de adversidade e prazer, de aventuras e desventuras, tenho sido feliz. Ocupo-me aqui – nesta tese – com uma parte desse caminho, com o trecho percorrido junto aos Kaiowá e Guarani. Com o sendeiro feito junto a uma comunidade inteira que me deu um voto de confiança ao receber-me e que, nos movimentos gerados para que encontros viessem acontecer, me aceitaram em suas casas, me atravessaram com sua palavra cantada1 , me ensinaram da infinidade da esperança2 e me lembraram a importância que têm tanto o cuidado constante – de si e dos outros – como a força que possuem as mãos dadas. Ora, este afazer demanda que, da mesma forma em que Kaiowás e Guaranis me cuidaram de diversos modos, eu assuma com você a mesma responsabilidade. Ou seja, que na relação que estamos estabelecendo desde agora, você possa se adentrar neste caminho – se é que decide fazê-lo3 – com uma certa segurança. Uma que o convide a novos e intensos passos. Nesse exercício de cuidado, pergunto-lhe, leitor, leitora: Você não quer tomar um chimarrão, um café ou um vinho e vir comigo, na verdade conosco, à casa da mãe do Gildo? Não gostaria de escutar e aprender de e com as escolas dentro do Tekoha Takuapiry? Não estaria interessado em acompanhar o tão valioso Oguata ou Ojeguata4 dos Kaiowá e Guarani, ou seja, de se fazer parte do caminhar destes povos para juntar-se a nós pelas trilhas e e caminhos de suas resistências e lutas, de suas vidas e modos de ser? Não gostaria de fundir-se com outros corpos, outras línguas, que se expressam e inventam formas outras de ser, de sentir-pensar? Não se lançaria à aventura de se tornar, por instantes, indígena, criança estrangeiro, estrangeira? De vivenciar, viajando no tempo e com ajuda das palavras, a resistência centenária que Kaiowás e Guaranis mantêm até hoje por uma vida digna? De acompanhar e questionar, desde outras vozes, os privilégios de uns em detrimento da própria vida de outros?... E, ao mesmo tempo, confidencialmente, lhe dou algumas dicas para a viagem: convido-o não só a procurar uma bebida, mas também a preparar-dispor o corpo, a desnudar sua alma, a afiar seus sentidos, a desafiar sua imaginação e suas crenças durante todo o tempo de leitura. Também pode ser que precise se esquecer, pelo menos um pouco, da academia, de suas estruturas e formalismos, do que sabe ou acredita que sabe. E, sobretudo, convido-o a se fazer de uma bússola de afetos que lhe ajude a identificar, marcar e acentuar pontos em que diversas manifestações de afirmações de vida acontecem. Confio que tais conselhos possam ajudar para que o fogo presente na cozinha da mãe de Gildo consiga atingi-lo – tal e como o fizera comigo – e lhe dar calor, luz e energia suficiente para pular e mergulhar no pluriverso dos Kaiowá e Guarani, para junto a eles, partilhar um instante-chimarrão no qual se fala, entre tudo, de vidas e resistências. 4. Para os Kaiowá e Guarani o caminhar é uma “prática” fundamental, um movimento de conexão-comuni- cação que é de notada importância no seu próprio modo de viver (COLMAN, 2015), conforme destaco por intermédio das palavras do pesquisador Kaiowá Celuniel Valiente (2019, p.52), quem nós lembra que, por onde os Kaiowá andam – oguata – produzem e deixam marcas de trilhas – tape po´i heta – que ligam sua residência - hóga – aos outros locais que fazem parte da sua rede socioespacial, antes da ocupação dos latifundiários. Esse tape po´i é uma rede física que dá condição de criar relações para a fabricação e reprodução da parentela e, através dele, também criar diálogos com outros parentes e seres não humanos – jára kuéra. 27 II [UM] MAPA PARA A VIAGEM – Você não quer ir à casa da minha mãe para tomar um chimarrão? – perguntou-me Gildo. Para aquele tempo, levava um pouco mais de uma semana morando em sua casa em Takuapiry e, com exceção de uma de suas filhas, ainda não conhecia ninguém de sua família. Compreendi, mais tarde, que tal gesto abrigava muito mais do que um convite informal para partilhar uma bebida quente junto ao fogo. Gildo, o professor que, sem me conhecer, tinha me recebido em sua residência, me abria naquele instante as portas de seu verdadeiro lar, pois o domicílio que dividíamos era o local que ele usava para dormir e para descansar, mas não era lugar onde de fato vivia. O caminho que me levou até ali, até o Tekoha Takuapiry – ou Aldeia Indígena Taquapiri como é reconhecida institucionalmente – no Mato Grosso do Sul, até a casa de Gildo, de Rosângela, de Claudemiro, de Shirley, de Oswaldo, de Andressa, de Geraldo e de tantas e tantas outras pessoas, tem sido um caminho de longa data, comprido, em alguns pontos sinuoso, mas definitivamente tem sido, como diria o sábio Don Juan em A Erva do Diabo, um caminho com coração. Quer dizer, tem sido um caminho que tem me moldado, que tem me deixado forte e no qual, entre momentos de adversidade e prazer, de aventuras e desventuras, tenho sido feliz. Ocupo-me aqui – nesta tese – com uma parte desse caminho, com o trecho percorrido junto aos Kaiowá e Guarani. Com o sendeiro feito junto a uma comunidade inteira que me deu um voto de confiança ao receber-me e que, nos movimentos gerados para que encontros viessem acontecer, me aceitaram em suas casas, me atravessaram com sua palavra cantada1 , me ensinaram da infinidade da esperança2 e me lembraram a importância que têm tanto o cuidado constante – de si e dos outros – como a força que possuem as mãos dadas. Ora, este afazer demanda que, da mesma forma em que Kaiowás e Guaranis me cuidaram de diversos modos, eu assuma com você a mesma responsabilidade. Ou seja, que na relação que estamos estabelecendo desde agora, você possa se adentrar neste caminho – se é que decide fazê-lo3 – com uma certa segurança. Uma que o convide a novos e intensos passos. Nesse exercício de cuidado, pergunto-lhe, leitor, leitora: Você não quer tomar um chimarrão, um café ou um vinho e vir comigo, na verdade conosco, à casa da mãe do Gildo? Não gostaria de escutar e aprender de e com as escolas dentro do Tekoha Takuapiry? Não estaria interessado em acompanhar o tão valioso Oguata ou Ojeguata4 dos Kaiowá e Guarani, ou seja, de se fazer parte do caminhar destes povos para juntar-se a nós pelas trilhas e e caminhos de suas resistências e lutas, de suas vidas e modos de ser? Não gostaria de fundir-se com outros corpos, outras línguas, que se expressam e inventam formas outras de ser, de sentir-pensar? Não se lançaria à aventura de se tornar, por instantes, indígena, criança estrangeiro, estrangeira? De vivenciar, viajando no tempo e com ajuda das palavras, a resistência centenária que Kaiowás e Guaranis mantêm até hoje por uma vida digna? De acompanhar e questionar, desde outras vozes, os privilégios de uns em detrimento da própria vida de outros?... E, ao mesmo tempo, confidencialmente, lhe dou algumas dicas para a viagem: convido-o não só a procurar uma bebida, mas também a preparar-dispor o corpo, a desnudar sua alma, a afiar seus sentidos, a desafiar sua imaginação e suas crenças durante todo o tempo de leitura. Também pode ser que precise se esquecer, pelo menos um pouco, da academia, de suas estruturas e formalismos, do que sabe ou acredita que sabe. E, sobretudo, convido-o a se fazer de uma bússola de afetos que lhe ajude a identificar, marcar e acentuar pontos em que diversas manifestações de afirmações de vida acontecem. Confio que tais conselhos possam ajudar para que o fogo presente na cozinha da mãe de Gildo consiga atingi-lo – tal e como o fizera comigo – e lhe dar calor, luz e energia suficiente para pular e mergulhar no pluriverso dos Kaiowá e Guarani, para junto a eles, partilhar um instante-chimarrão no qual se fala, entre tudo, de vidas e resistências. La tarea de ablandar el ladrillo todos los días, la tarea de abrirse paso en la masa pegajosa que se proclama mundo, cada mañana topar con el paralelepípedo de nombre repugnante, con la satisfacción perruna de que todo esté en su sitio, la misma mujer al lado, los mismos zapatos, el mismo sabor de la misma pasta dentífrica, la misma tristeza de las casas de enfrente, del sucio tablero de ventanas de tiempo con su letrero “Hotel de Belgique”. Meter la cabeza como un toro desganado contra la masa transparente en cuyo centro tomamos café con leche y abrimos el diario para saber lo que ocurrió en cualquiera de los rincones del ladrillo de cristal. Negarse a que el acto delicado de girar el picaporte, ese acto por el cual todo podría transformarse, se cumpla con la fría eficacia de un reflejo cotidiano. Hasta luego, querida. Que te vaya bien. Apretar una cucharilla entre los dedos y sentir su latido de metal, su advertencia sospechosa. Cómo duele negar una cucharita, negar una puerta, negar todo lo que el hábito lame hasta darle suavidad satisfactoria. Tanto más simple aceptar la fácil solicitud de la cuchara, emplearla para revolver el café. Y no que esté mal si las cosas nos encuentran otra vez cada día y son las mismas. Que a nuestro lado haya la misma mujer, el mismo reloj, y que la novela abierta sobre la mesa eche a andar otra vez en la bicicleta de nuestros anteojos, ¿por qué estaría mal? Pero como un toro triste hay que agachar la cabeza, del centro del ladrillo de cristal empujar hacia fuera, hacia lo otro tan cerca de nosotros, inasible como el picador tan cerca del toro. Castigarse los ojos mirando eso que anda por el cielo y acepta taimadamente su nombre de nube, su réplica catalogada en la memoria. No creas que el teléfono va a darte los números que buscas. ¿Por qué te los daría? Solamente vendrá lo que tienes preparado y resuelto, el triste reflejo de tu esperanza, ese mono que se rasca sobre una mesa y tiembla de frío. Rómpele la cabeza a ese mono, corre desde el centro hacia la pared y ábrete paso. ¡Oh cómo cantan en el piso de arriba! Hay un piso de arriba en esta casa, con otras gentes. Hay un piso de arriba donde vive gente que no sospecha su piso de abajo, y estamos todos en el ladrillo de cristal. Y si de pronto una polilla se para al borde de un lápiz y late como un fuego ceniciento, mírala, yo la estoy mirando, estoy palpando su corazón pequeñísimo, y la oigo, esa polilla resuena en la pasta de cristal congelado, no todo está perdido. Cuando abra la puerta y me asome a la escalera, sabré que abajo empieza la calle; no el molde ya aceptado, no las casas ya sabidas, no el hotel de enfrente; la calle, la viva floresta donde cada instante puede arrojarse sobre mí como una magnolia, donde las caras van a nacer cuando las mire, cuando avance un poco más, cuando con los codos y las pestañas y las uñas me rompa minuciosamente contra la pasta del ladrillo de cristal, y juegue mi vida mientras avanzo paso a paso para ir a comprar el diario a la esquina. Manual De Instrucciones - Julio Cortázar [Los destaques en el texto son míos] 2828 Esta tese – este caminho –, opera no entre 5. ... entre o compromisso e a responsabilidade acadêmica de dar conta de uma pergunta de investigação, de alguns objetivos, de um marco teórico e outro metodológico, de uma análise e de produzir conclusões que correlatem o que foi feito, a forma em que foi realizado, e os desenlaces que derivaram desses processos durante toda a pesquisa. Ou seja, entre a necessidade de apresentar de modo atento, sério e rigoroso, em um manuscrito final, tanto a origem como os percursos e ecos da pesquisa desenvolvida. ... entre o abandono ou a rendição a uma composição narrativa e imagética que responda, de forma sensível, aos afetos e efeitos da própria pesquisa. Sendo que, o que é amplamente conhecido como trabalho de campo, tomado junto ao que pode ser interpretado como a metodologia e que se corresponde aqui com a cartografia6, possuem uma grande responsabilidade neste ato de entrega. Ora, tendo em conta o anterior, cabe esclarecer que a composição na qual se desdobra a tese nada tem a ver com uma simples questão cosmética que proponha ou constitua uma versão mais “chamativa” dela. Muito pelo contrário, a materialidade na qual ela se expressa se inscreve numa aposta ético-estético-política (RONILK, 1993) que compreende uma entranhada série de relações com as quais se procura dar conta de uma partilha sensível (RANCIÈRE, 2009) que se constitui, precisamente, entre partes exclusivas em espaços, tempos e tipos de atividades que se passaram no próprio processo de pesquisar e intenciona propor – ao mesmo tempo e entre outros elementos – planos de experimentação que possibilitem visibilizar os modos outros em que Kaiowás e Guaranis afirmam a vida (DELEUZE, 2020). Porém, os entres mencionados anteriormente não são os únicos que têm lugar neste caminhar. De fato, eles se compõem e são possíveis graças a movimentos em outros entres: aqueles que se encarnam tanto nas “conexões” entre diversos espaços ou espacialidades, entre geografias, entre territórios, entre campos ou conjuntos – sejam todos estes espaços físicos, áreas de saber, conceitos, seres etc. –, entre diferentes planos7 – sejam estes de referência, sejam de imanência ou sejam estético ou de composição – como aqueles que se passam entre os “vínculos” que atravessam esses outros entres. 5. O entre é operado aqui no sentido de Deleuze e Guattari, quer dizer [...] não designa uma correlação localizável que vai de uma (coisa) para outra, mas uma direção perpendicular, um movimento transversal que as carrega uma e outra, riacho sem início nem fim, que rói suas duas margens e adquire velocidade no meio. (DELEUZE; GUATTARI, 2012, p.49). 6. A cartografia é assumida na perspectiva de Deluze e Guattari (2011), que, junto ao conceito de rizoma, a propõem como possibilidade para construir e percorrer mapas de relações e de forças. No rizoma, quaisquer dois pontos podem se conectar sem se impor condição alguma e, ao mesmo tempo os “elos” que juntam ou relacionam tais pontos, são considerados multiplicidades que também são, por sua vez, rizomas. No rizoma, como num livro “há linhas articulação ou segmentaridade, estratos, territorialidades, mas também linhas de fuga, movimentos de desterritorialização e desertificação” (DELEUZE: GUATTARI, 2011, p.18). 7. Segundo Deleuze e Guattari (2010), a filosofia [...] é a arte de formar, de inventar de fabricar conceitos, porém a invenção de tais conceitos requer, ao mesmo tempo a construção de um “cenário” no qual estes operam [...] um campo, um plano, um solo, que não se confunde com eles, mas que abriga seus germes e os personagens que os cultivam. O construtivismo exige que toda criação seja uma construção sobre um plano que lhe dá uma existência autônoma. (DELEUZE; GUARATTARI, 2010, p. 8, 13-14). Na mesma linha, o conceito território, o qual será abordado como maior detalhe mais adiante, escapa na perspectiva destes autores, à configuração da espacialidade de um lugar com fronteiras – bem – definidas, para ser assumido como “algo” em constante transformação em dependência do espaço e do tempo e com a característica fundamental de comportar processos de desterritorialização e reterritorialização; daí que faça a distinção do operar entre espaço ou espacialidades e territórios. Por último, na mesma proposta filosófica os autores descrevem como operam a filosofia, a arte e a ciência, sendo no caso, correspondentemente, junto a um plano de imanência, um plano estético ou de consistência e um plano de referência. (DELEUZE; GUARATTARI, 2010). A proposta desta tese não é assumir nem negar nenhum especificamente, mas transitar e produzir neste caminho, entre estes planos. 29 * * * 29 ... entre... E(e)tnomatemática(s) Assim, os passos que aqui damos, operam entre: ... entre Universidade(s) e comunidade(s) e aldeia(s) e cidade (s). ... entre Brasil e Paraguai e Colômbia. ... entre o português e o guarani e o espanhol. ... entre nativos e estrangeiros. ... entre diferentes sistemas de conhecimento. ... entre E(e)ducação e E(e)ducação M(m)atemática e E(e)ducação (escolar) I(i)ndígena e ... entre história(s) e memória(s). ... entre geografia(s) e antropologia(s) e filosofia(s). ... entre terra(s) e território(s) e tekoha(s). ... entre o Tekoha Takuapiry e o curso de Licenciatura Intercultural Indígena Teko Arandu da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e as Escolas Ñande Reko Arandu e M´bo Eroy Arandu. ... entre áreas demarcadas e áreas de retomada de terra. ... entre a casa grande e a família extensa. ... entre tradição e modernidade. ... entre afetos e intensidades e tensões. ... entre o próprio e o comum e o alheio e o imposto. ... entre entrevistas e conversas ... entre fotografias e gravações ... entre protestas e celebrações ... entre chimarrão e tereré. ... entre danças e guachire. ... entre modos de ser e teko(s) ... entre ritmos vitais e tons de morte. 5. O entre é operado aqui no sentido de Deleuze e Guattari, quer dizer [...] não designa uma correlação localizável que vai de uma (coisa) para outra, mas uma direção perpendicular, um movimento transversal que as carrega uma e outra, riacho sem início nem fim, que rói suas duas margens e adquire velocidade no meio. (DELEUZE; GUATTARI, 2012, p.49). 6. A cartografia é assumida na perspectiva de Deluze e Guattari (2011), que, junto ao conceito de rizoma, a propõem como possibilidade para construir e percorrer mapas de relações e de forças. No rizoma, quaisquer dois pontos podem se conectar sem se impor condição alguma e, ao mesmo tempo os “elos” que juntam ou relacionam tais pontos, são considerados multiplicidades que também são, por sua vez, rizomas. No rizoma, como num livro “há linhas articulação ou segmentaridade, estratos, territorialidades, mas também linhas de fuga, movimentos de desterritorialização e desertificação” (DELEUZE: GUATTARI, 2011, p.18). 7. Segundo Deleuze e Guattari (2010), a filosofia [...] é a arte de formar, de inventar de fabricar conceitos, porém a invenção de tais conceitos requer, ao mesmo tempo a construção de um “cenário” no qual estes operam [...] um campo, um plano, um solo, que não se confunde com eles, mas que abriga seus germes e os personagens que os cultivam. O construtivismo exige que toda criação seja uma construção sobre um plano que lhe dá uma existência autônoma. (DELEUZE; GUARATTARI, 2010, p. 8, 13-14). Na mesma linha, o conceito território, o qual será abordado como maior detalhe mais adiante, escapa na perspectiva destes autores, à configuração da espacialidade de um lugar com fronteiras – bem – definidas, para ser assumido como “algo” em constante transformação em dependência do espaço e do tempo e com a característica fundamental de comportar processos de desterritorialização e reterritorialização; daí que faça a distinção do operar entre espaço ou espacialidades e territórios. Por último, na mesma proposta filosófica os autores descrevem como operam a filosofia, a arte e a ciência, sendo no caso, correspondentemente, junto a um plano de imanência, um plano estético ou de consistência e um plano de referência. (DELEUZE; GUARATTARI, 2010). A proposta desta tese não é assumir nem negar nenhum especificamente, mas transitar e produzir neste caminho, entre estes planos. 30 O caminho que aqui fazemos começa pelo meio. ...entre povos indígenas e Educação Superior8 (ES); mas também poderia ser, por exemplo, entre os modos de ser – a produção de subjetividades – e os movimentos dos professores indígenas no Brasil ou bem, entre os povos Kaiowá e Guarani e suas lutas e resistências pelo direito à terra, à vida. Contudo, esta escolha não é aleatória. Ela responde diretamente às motivações que deram passo ao caminho que aqui – também junto a você lendo, operando esta materialidade – construímos. Logo, é preciso dizer que quando formulava o projeto de pesquisa, tinha diversos interesses em torno aos indígenas que ingressavam na Educação Superior9; em quem concluía os cursos ou programas nos quais se matriculava; sobre quem retornava a sua comunidade; pelo que fazia após concluir sua formação; e que efeitos seu retorno produzia em sua comunidade. Tais predileções – como fruto da pesquisa do mestrado, mas com raízes muito mais profundas10 – foram desdobrando-se em questionamentos vários: Quais eram os alcances que a Educação Superior tinha nos indígenas que se formavam academicamente e como evidenciá-los? Quais eram os impactos que, no caso de que retornassem a seus lugares de origem, tinham nas suas comunidades? Que possibilidades de criação – entendida no sentido deleuziano, quer dizer, como as necessidades que dão passo a invenções num determinado espaço-tempo (DELEUZE, 1999) – eram ou poderiam ser geradas nos movimentos de vida desses indígenas que se formavam na Educação Superior e estavam presentes nas suas comunidades? Como a E(e)ducação M(m)atemática11 poderiam operar com os modos de vida produzidos por esses indígenas? Daí que, tratando de assumir essas questões e pensando nas potências que cada uma delas poderia albergar, constituíra, quase de modo corolário, a pergunta central que me ocuparia durante boa parte do processo de doutoramento: Que efeitos tem a formação de indígenas de uma mesma comunidade na Educação Superior, tanto na produção de subjetividades como nas transformações da própria comunidade, e, ao assumir esses efeitos, como operar a E(e)ducação M(m)atemática? Visibilizar – a partir de acompanhar, vivenciar e cartografar – efeitos que produz a formação de indígenas de uma mesma comunidade na Educação Superior, tanto na produção de subjetividades como nas transformações da própria comunidade, e, a partir dos elementos emergentes, problematizar a Educação Matemática de maneira a vislumbrar possibilidades de educações matemáticas outras. 5. O entre é operado aqui no sentido de Deleuze e Guattari, quer dizer [...] não designa uma correlação localizável que vai de uma (coisa) para outra, mas uma direção perpendicular, um movimento transversal que as carrega uma e outra, riacho sem início nem fim, que rói suas duas margens e adquire velocidade no meio. (DELEUZE; GUATTARI, 2012, p.49). 6. A cartografia é assumida na perspectiva de Deluze e Guattari (2011), que, junto ao conceito de rizoma, a propõem como possibilidade para construir e percorrer mapas de relações e de forças. No rizoma, quaisquer dois pontos podem se conectar sem se impor condição alguma e, ao mesmo tempo os “elos” que juntam ou relacionam tais pontos, são considerados multiplicidades que também são, por sua vez, rizomas. No rizoma, como num livro “há linhas articulação ou segmentaridade, estratos, territorialidades, mas também linhas de fuga, movimentos de desterritorialização e desertificação” (DELEUZE: GUATTARI, 2011, p.18). 7. Segundo Deleuze e Guattari (2010), a filosofia [...] é a arte de formar, de inventar de fabricar conceitos, porém a invenção de tais conceitos requer, ao mesmo tempo a construção de um “cenário” no qual estes operam [...] um campo, um plano, um solo, que não se confunde com eles, mas que abriga seus germes e os personagens que os cultivam. O construtivismo exige que toda criação seja uma construção sobre um plano que lhe dá uma existência autônoma. (DELEUZE; GUARATTARI, 2010, p. 8, 13-14). Na mesma linha, o conceito território, o qual será abordado como maior detalhe mais adiante, escapa na perspectiva destes autores, à configuração da espacialidade de um lugar com fronteiras – bem – definidas, para ser assumido como “algo” em constante transformação em dependência do espaço e do tempo e com a característica 8. A Educação Superior de acordo à Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, atual Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional, é um dos dois grandes grupos de níveis escolares no Brasil (I - educação básica, formada pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio; II - educação superior) e tem por finalidade (Art. 43): I - estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do pensamento reflexivo; II - formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua; III - incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica, visando o desenvolvimento da ciência e da tecnologia e da criação e difusão da cultura, e, desse modo, desenvolver o entendimento do homem e do meio em que vive; IV - promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicações ou de outras formas de comunicação; V - suscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento cultural e profissional e possibilitar a correspondente concretização, integrando os conhecimentos que vão sendo adquiridos numa estrutura intelectual sistematizadora do conhecimento de cada geração; VI - estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em particular os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade; VII - promover a extensão, aberta à participação da população, visando à difusão das conquistas e benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na instituição. VIII - atuar em favor da universalização e do aprimoramento da educação básica, mediante a formação e a capacitação de profissionais, a realização de pesquisas pedagógicas e o desenvolvimento de atividades de extensão que aproximem os dois níveis escolares. (Incluído pela Lei nº 13.174, de 2015)(BRASIL,1996, 2015). Adicionalmente, de acordo com a categorização dada pela lei, esta abrange: cursos sequenciais por campo de saber; de graduação; de pós-graduação e de extensão. Todos eles ofertados por instituições de Ensino Superior. 9. Cabe recordar que este acesso no Brasil é recente e tem sido limitado. Há somente pouco mais de trinta anos que esta demanda se tornou oficial por meio da Lei Nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 e foi reforçada pela Lei nº 12.711, de 29/09/2012, popularmente conhecida como Lei de Cotas. Adicionalmente, para citar um exemplo, de acordo com os dados do último censo da Educação Superior realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), o total de estudantes matriculados no ano 2016, nas instituições de ES públicas e privadas do Brasil, foi de 8.052.254 pessoas. Das quais apenas 49.026 eram indígenas, o que perfaz, na época, apenas 0,6% do total de matriculados. (BRASIL,1996, 2012). 10. Estás raízes são contempladas com maior detalhe na seguinte seção denominada III AHAPYPERE REKA PE TAPE – Avesso do caminho –. fundamental de comportar processos de desterritorialização e reterritorialização; daí que faça a distinção do operar entre espaço ou espacialidades e territórios. Por último, na mesma proposta filosófica os autores descrevem como operam a filosofia, a arte e a ciência, sendo no caso, correspondentemente, junto a um plano de imanência, um plano estético ou de consistência e um plano de referência. (DELEUZE; GUARATTARI, 2010). A proposta desta tese não é assumir nem negar nenhum especificamente, mas transitar e produzir neste caminho, entre estes planos. 31 O caminho que aqui fazemos começa pelo meio. ...entre povos indígenas e Educação Superior8 (ES); mas também poderia ser, por exemplo, entre os modos de ser – a produção de subjetividades – e os movimentos dos professores indígenas no Brasil ou bem, entre os povos Kaiowá e Guarani e suas lutas e resistências pelo direito à terra, à vida. Contudo, esta escolha não é aleatória. Ela responde diretamente às motivações que deram passo ao caminho que aqui – também junto a você lendo, operando esta materialidade – construímos. Logo, é preciso dizer que quando formulava o projeto de pesquisa, tinha diversos interesses em torno aos indígenas que ingressavam na Educação Superior9; em quem concluía os cursos ou programas nos quais se matriculava; sobre quem retornava a sua comunidade; pelo que fazia após concluir sua formação; e que efeitos seu retorno produzia em sua comunidade. Tais predileções – como fruto da pesquisa do mestrado, mas com raízes muito mais profundas10 – foram desdobrando-se em questionamentos vários: Quais eram os alcances que a Educação Superior tinha nos indígenas que se formavam academicamente e como evidenciá-los? Quais eram os impactos que, no caso de que retornassem a seus lugares de origem, tinham nas suas comunidades? Que possibilidades de criação – entendida no sentido deleuziano, quer dizer, como as necessidades que dão passo a invenções num determinado espaço-tempo (DELEUZE, 1999) – eram ou poderiam ser geradas nos movimentos de vida desses indígenas O coração desta pesquisa está junto aos povos Kaiowá e Guarani. Seu ritmo, suas acelerações e desacelerações, respondem aos passos dados, ao caminho feito, particularmente, junto à comunidade do Tekoha Takuapiry. Este Tekoha, oficialmente conhecido como Reserva Indígena Taquapiri, está localizado no município Coronel Sapucaia em Mato Grosso do Sul – o segundo estado brasileiro com maior população indígena no país –, e foi demarcado por meio do Decreto Estadual 825 de 1928 pelo extinto órgão institucional Serviço de Proteção ao Índio. Para o tempo da demarcação foi estabelecida sua extensão territorial em 1777 hectares, mas atualmente conta com uma área de aproximadamente 2000 dessas unidades de mediação, ali, nesse território geográfico e delimitado, vivem ao redor de 3400 pessoas que se auto reconhecem como Kaiowá e Guarani. Cheguei ali depois que, por diferentes meios e durante vários meses, estivera estabelecendo contato com indígenas de diferentes povos, tanto no Brasil (Guarani, Kaiowá, Terena, Umutina e Xavante) como na Colômbia (Arhuaco, Embera Katio, Nasa, Puinave e Sicuane), de quem sabia tinham algum tipo de formação na Educação Superior e estavam nas suas comunidades. Pergunta que, na procura de um caminho para abordá-la, propus-me a: que se formavam na Educação Superior e estavam presentes nas suas comunidades? Como a E(e)ducação M(m)atemática11 poderiam operar com os modos de vida produzidos por esses indígenas? Daí que, tratando de assumir essas questões e pensando nas potências que cada uma delas poderia albergar, constituíra, quase de modo corolário, a pergunta central que me ocuparia durante boa parte do processo de doutoramento: Que efeitos tem a formação de indígenas de uma mesma comunidade na Educação Superior, tanto na produção de subjetividades como nas transformações da própria comunidade, e, ao assumir esses efeitos, como operar a E(e)ducação M(m)atemática? Visibilizar – a partir de acompanhar, vivenciar e cartografar – efeitos que produz a formação de indígenas de uma mesma comunidade na Educação Superior, tanto na produção de subjetividades como nas transformações da própria comunidade, e, a partir dos elementos emergentes, problematizar a Educação Matemática de maneira a vislumbrar possibilidades de educações matemáticas outras. 5. O entre é operado aqui no sentido de Deleuze e Guattari, quer dizer [...] não designa uma correlação localizável que vai de uma (coisa) para outra, mas uma direção perpendicular, um movimento transversal que as carrega uma e outra, riacho sem início nem fim, que rói suas duas margens e adquire velocidade no meio. (DELEUZE; GUATTARI, 2012, p.49). 6. A cartografia é assumida na perspectiva de Deluze e Guattari (2011), que, junto ao conceito de rizoma, a propõem como possibilidade para construir e percorrer mapas de relações e de forças. No rizoma, quaisquer dois pontos podem se conectar sem se impor condição alguma e, ao mesmo tempo os “elos” que juntam ou relacionam tais pontos, são considerados multiplicidades que também são, por sua vez, rizomas. No rizoma, como num livro “há linhas articulação ou segmentaridade, estratos, territorialidades, mas também linhas de fuga, movimentos de desterritorialização e desertificação” (DELEUZE: GUATTARI, 2011, p.18). 7. Segundo Deleuze e Guattari (2010), a filosofia [...] é a arte de formar, de inventar de fabricar conceitos, porém a invenção de tais conceitos requer, ao mesmo tempo a construção de um “cenário” no qual estes operam [...] um campo, um plano, um solo, que não se confunde com eles, mas que abriga seus germes e os personagens que os cultivam. O construtivismo exige que toda criação seja uma construção sobre um plano que lhe dá uma existência autônoma. (DELEUZE; GUARATTARI, 2010, p. 8, 13-14). Na mesma linha, o conceito território, o qual será abordado como maior detalhe mais adiante, escapa na perspectiva destes autores, à configuração da espacialidade de um lugar com fronteiras – bem – definidas, para ser assumido como “algo” em constante transformação em dependência do espaço e do tempo e com a característica 11. Se sugere ao leitor rever a Nota [política] Preliminar nº v). fundamental de comportar processos de desterritorialização e reterritorialização; daí que faça a distinção do operar entre espaço ou espacialidades e territórios. Por último, na mesma proposta filosófica os autores descrevem como operam a filosofia, a arte e a ciência, sendo no caso, correspondentemente, junto a um plano de imanência, um plano estético ou de consistência e um plano de referência. (DELEUZE; GUARATTARI, 2010). A proposta desta tese não é assumir nem negar nenhum especificamente, mas transitar e produzir neste caminho, entre estes planos. 32 Nesse sentido, esta tese: Procura Por produções e transformações e invenções e... Por potencias e possibilidades de existência e afirmações de vida e... Por problematizações e movimentos e movimentações e... Procura Um caminho que se faz junto. Tendo em conta que parte dos interesses desta pesquisa13 orienta-se à visibilização dos efeitos – assumidos, de modo geral, como as mudanças, influências, consequências, impactos e transformações – que se produzem numa comunidade indígena com a formação de alguns de seus membros na Educação Superior, faz-se necessário esclarecer que sua abordagem se dá em, ao menos duas vias que são complementares. Por um lado, desde as transformações de diferente natureza que se apresentam, no caso, no Tekoha Takuapiry – como por exemplo, no aumento da gestão ou administração das escolas ao interior da comunidade por parte dos habitantes dela ou o melhoramento de algumas condições de vida que são mediadas pelo fator econômico ao acessaram a empregos mais bem remunerados – e, por outro lado, desde as subjetividades que são produzidas neste mesmo espaço e que afirmam a vida dos Kaiowá e Guarani, e que aqui de modo geral, denominou como re-existências. Re-existências que, vale esclarecer, levam em consideração, entre outros elementos, tanto as lutas e resistências que Kaiowás e Guarani mantêm frente ao sistema colonialista e neoliberal que os oprime – e que se manifestam de diferentes maneiras, como por exemplo, por meio de suas reivindicações pelo direito à terra, à preservação de sua língua, de suas práticas espirituais e seus conhecimentos etc.– quanto as diversas configurações dos modos de vida destes povos com as quais transformam e produzem seus territórios existenciais. Ou seja, trata-se de existências dinâmicas que se atualizam e que levam em consideração, seguindo o perspectivismo ameríndio proposto por Viveiros de Castro (2018, p.66), os afetos que atravessam cada espécie de corpo, as afecções de que ele é capaz, suas potencias e disposições. Daí que a pesquisa seja um caminho que se faz junto aos Kaiowá e Guarani e não um no qual discursa-se sobre eles. Assim, neste caminhar junto, os interesses se orientam a perceber as re-existências destes povos. Trata-se, pois, de uma viagem a pé14 , sem usar sapatos procurando por uma maior conexão com a terra, na qual os passos se dão – em geral, mas não apenas – junto à comunidade do Tekoha Takuapiry, mas também, junto a aliados e militantes do movimento indígena, da Educação Matemática e de diversas lutas que pregam por um mundo mais equitativo, democrático e justo, e se atenta a perceber as fissuras que se criam no médio do habitual e do cotidiano e o que aflora delas. Ora, faz-se necessário dizer também que tal procura por possibilidades de re-existências exige diversos movimentos. Reclamam-se lançamentos e demandam-se entregas. Precisam-se solturas