UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FERNANDA APARECIDA BICUDO DA SILVA METODOLOGIAS ATIVAS NO ENSINO DE CIÊNCIAS: contribuições para construção de hábitos alimentares saudáveis BAURU 2021 FERNANDA APARECIDA BICUDO DA SILVA METODOLOGIAS ATIVAS NO ENSINO DE CIÊNCIAS: contribuições para construção de hábitos alimentares saudáveis Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do título de Mestre a Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – Faculdade de Ciências, Campus de Bauru – Programa de Pós- graduação em Docência para a Educação Básica, sob orientação da Profa. Dra. Denise Fernandes de Mello. BAURU 2021 Silva, Fernanda Aparecida Bicudo da. Metodologias Ativas no Ensino de Ciências: contribuições para construção de hábitos alimentares saudáveis / Fernanda Aparecida Bicudo da Silva, 2021 114 f. Orientadora: Denise Fernandes de Mello Dissertação (Mestrado)–Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências, Bauru, 2021. 1. Alimentação. 2. Ensino Remoto. 3. Ferramentas Digitais. 4. Pandemia. I. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências. II. Título. Dedico esse trabalho aos meus pais que sempre me apoiaram e incentivaram para os estudos, e a minha irmã Maria da Graça. AGRADECIMENTOS Em primeiro lugar quero agradecer a Deus por ter me concedido saúde, coragem e discernimento para a realização deste trabalho. Agradeço minha família pelo estímulo e apoio aos meus estudos. De modo especial, ao meu grande amigo Marcos Paulo Pepe, por ter me ajudado muito, sendo companheiro, não me deixando desanimar e também como meu motorista para que eu conseguisse ir para a Unesp realizar as disciplinas e participar das reuniões e eventos científicos. A minha querida amiga e excelente profissional, a Nutricionista Karina de Jesus Antonio, agradeço pela sua participação e colaboração na pesquisa. Agradeço ao Setor de Educação do Município de Bariri-SP e a Gestão da minha escola, Diretor Lauriberto de Jesus Bertoni Junior pela concessão para a realização da pesquisa, e de modo especial a Coordenadora Luciene Tavares, pela confiança e apoio. De modo especial sou muito grata a minha amiga de trabalho, a professora Nayara Campos Jugeick por ter permitido que a pesquisa fosse realizada em sua sala de aula, e também pela sua contribuição nas atividades desenvolvidas, assim como a liberdade, espaço e confiança que me concedeu. À Ester Rodrigues de Camargo pelo empenho e dedicação no design e ao William Gustavo Carlini pela contribuição e trabalho no desenvolvimento do Produto Educacional. E as demais pessoas e amigos queridos que contribuíram de forma direta como Guilherme Dadalto Bilancieri e Priscila Bertholo, ou indiretamente, em todos os processos de realização da pesquisa e do Mestrado Profissional. Gratidão aos membros da banca, Profa. Dra. Ketilin Mayra Pedro, Prof. Dr. Alexandre de Oliveira Legendre e a Profa. Dra. Fabiana Aparecida Heincklein, pelas grandes contribuições no trabalho. E tenho muito que agradecer a minha orientadora, a Professora Doutora Denise Fernandes de Mello, pelo conhecimento compartilhado, carinho e amizade durante todo esse processo de aprendizado. RESUMO Conteúdos sobre corpo humano, saúde e alimentação fazem parte do Ensino de Ciências como componentes curriculares definidos pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN). Já no primeiro ciclo do ensino fundamental, o conteúdo de hábitos alimentares saudáveis está presente, considerando a importância de estes serem construídos desde a infância. Estudos associam a má alimentação a diversos problemas de saúde da população em geral, tanto do Brasil como do mundo. No Brasil, em 2006 foi criado o Guia Alimentar para a População Brasileira, pelo Ministério da Saúde. No entanto, tanto a realidade escolar observada por esta professora e pesquisadora, assim como a literatura sobre o tema, evidencia a falta de estratégias de aprendizagem ativa pelos alunos. As propostas de ensino abordando o conteúdo de alimentação saudável, em geral constituem-se por um ensino expositivo, com poucas atividades interativas, reflexivas, em que o aluno é o sujeito protagonista. Neste trabalho elaboramos, desenvolvemos e analisamos um conjunto de 15 atividades lúdicas e interativas envolvendo conteúdo sobre alimentação saudável e corpo humano, com base nos princípios de metodologias ativas, utilizando recursos físicos e digitais. Três atividades foram desenvolvidas presencialmente com recursos físicos e doze atividades foram realizadas de forma remota, utilizando ferramentas digitais como o Padlet e o Jamboard, em aulas síncronas pelo Google Meet, e assíncronas usando o WhatsApp para comunicação e envio de atividades no período de suspensão das aulas presenciais durante a Pandemia da Covid-19. Esta pesquisa caracteriza-se como qualitativa descritiva, com características de pesquisa participante. Participaram das atividades, vinte e um alunos de uma turma do quinto ano do Ensino Fundamental I, de uma escola pública municipal de uma cidade do interior paulista. Os resultados obtidos com o desenvolvimento das atividades, evidenciam evolução da linguagem oral, da argumentação e do pensamento crítico pelos alunos, especificamente no tema alimentação saudável e sua relação com o corpo humano. Observamos nas discussões e na realização dos desafios propostos, evidências de mudanças de atitudes em relação ao consumo de alimentos. Ademais houve a aprendizagem e utilização de novas ferramentas digitais pelos alunos, e por meio dessas a descoberta de diferentes possibilidades de adquirir conhecimento além da sala de aula, de uma forma ativa. Consideramos que este trabalho pode servir como orientação para professores que queiram implementar atividades com base em metodologias ativas que proporcionem um ensino mais motivador, contextualizado na realidade dos alunos, para uma aprendizagem significativa de diferentes conteúdos. Palavras-Chave: Alimentação. Ensino Remoto. Ferramentas Digitais. Pandemia. ABSTRACT Contents about the human body, health and food are part of Science Education as curricular components defined by the National Common Curricular Base (BNCC) and by the National Curriculum Parameters (PCN). In the first cycle of elementary school, the content of healthy eating habits is present and is considered the importance of being built since childhood. Studies associate bad eating habits with several health problems of the general population, as much in Brazil as in the world. In Brazil, the Alimentar Guide for the Population was created by the Ministry of Health, in 2006. However, as scholar reality observed by this teacher and researcher as literature about the theme evidences the lack of active learning strategies by students. Teaching proposals that address the content of healthy food, in general are constituted by an expositive teaching with few interactive and reflective activities which the student is the protagonist subject. We elaborate, develop and analyze a group of 15 ludic and interactive activities in this work that involves content about healthy eating and the human body, based on the principles of active methodologies, using physical and digital resources. Three activities were developed in person with physical resources and twelve were realized remotely using digital tools, as Padlet and Jamboard, in synchronous classes by Google Meet and asynchronous by Whatsapp to communication and sending activities in the period of suspension presential classes during the Covid-19 pandemic. This is a descriptive qualitative research, with characteristics of participant research. Twenty-one students from a fifth grade class of Elementary School I participated in the activities at a public school in a city in the interior of São Paulo. The obtained results with the development of the activities highlights the evolution of oral language, argumentation and critical thinking by students, specifically on the topic of healthy eating and its connection with the human body. We observed in the discussions and in the realization of the proposed challenges, evidence of changes in attitudes towards food consumption. In addition, there was the learning and use of new digital tools by the students, and through them the discovery of different possibilities to acquire knowledge beyond the classroom, in an active way. We consider this work can be used as orientation to other teachers that want to implement activities based on active methodologies which provide more motivating teaching, contextualized in the students' reality, for a meaningful learning of different contents. Keywords: Healthy Food. Remote Teaching. Digital Resources. Pandemic. LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Fluxograma da organização das atividades ............................................ 32 Figura 2 – Alimentos que os alunos gostam de comer ............................................. 37 Figura 3 – Alimentos consumidos pelos alunos ........................................................ 39 Figura 4 – Experimentação Olfato ............................................................................ 42 Figura 5 – Registro dos alunos – alimentos identificados pelo olfato ....................... 43 Figura 6 – Experimentação Tato .............................................................................. 44 Figura 7 – Anotação da aluna ................................................................................... 44 Figura 8 – Cookies de abobrinha .............................................................................. 46 Figura 9 – Degustação do cookie ............................................................................. 46 Figura 10 – Dificuldades sentidas na quarentena ..................................................... 50 Figura 11 – Aumento do consumo de comida na pandemia .................................... 51 Figura 12 – Alimentos mais consumidos na casa ..................................................... 51 Figura 13 – Aumento de peso na quarentena .......................................................... 52 Figura 14 – Dificuldades em relação a alimentação dos filhos ................................. 52 Figura 15 – Print de tela Padlet 5º ano ..................................................................... 54 Figura 16 – Pirâmide dos alimentos ......................................................................... 55 Figura 17 – Print de tela vídeo sobre a classificação dos alimentos ........................ 55 Figura 18 – Jamboard “Mapa Mental Coletivo 5º ano” ............................................. 59 Figura 19 – Produtos da Horta Aluno A2 .................................................................. 65 Figura 20 – Charges sobre alimentação ................................................................... 67 Figura 21 – Print de tela slides – Pesquisa obesidade no Brasil .............................. 68 Figura 22 – Print de tela slides – Obesidade no Brasil ............................................. 68 Figura 23 – Obesidade Infantil .................................................................................. 69 Figura 24 – Pesquisa doenças Aluno A1 .................................................................. 69 Figura 25 – Pesquisa doenças Aluno A2 .................................................................. 70 Figura 26 – Alunos na aula pelo Google Meet.......................................................... 71 Figura 27 – Gráfico do Quiz ...................................................................................... 71 Figura 28 – 1ª Etapa Experiência osmose da batata ................................................ 73 Figura 29 – 2ª Etapa Experiência osmose da batata ................................................ 73 Figura 30 – Indústria alimentícia e valores ............................................................... 74 Figura 31 – Desenho aluno A1 ................................................................................. 76 Figura 32 – Desenho aluno A2 ................................................................................. 76 Figura 33 – Desenho Aluno A3 ................................................................................. 77 Figura 34 – Desenho Aluno A4 ................................................................................. 77 Figura 35 – Aluno A6 ................................................................................................ 77 Figura 36 – Cartaz colaborativo “Alimentação e vida saudável” ............................... 78 Figura 37 – Apresentação do produto ...................................................................... 81 Figura 38 – Apresentação do produto ...................................................................... 81 Figura 39 – Apresentação do produto ...................................................................... 82 Figura 40 – Quiz ....................................................................................................... 82 Figura 41 – Tela de acerto........................................................................................ 83 Figura 42 – Tela de erro ........................................................................................... 83 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Caracterização dos participantes da pesquisa ...................................... 29 Quadro 2 – Desenvolvimento da pesquisa (cronograma das atividades) ................. 34 Quadro 3 – Atividades desenvolvidas ...................................................................... 35 Quadro 4 – Questões atividade diagnóstica ............................................................. 36 Quadro 5 – O que é ser saudável? ........................................................................... 47 Quadro 6 – Texto final da atividade 15 ..................................................................... 76 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS BNCC Base Nacional Comum Curricular CEP Comitê de Ética em Pesquisa IDEC Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional OMS Organização Mundial da Saúde PCN Parâmetros Curriculares Nacionais TDIC Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação UNICEF Fundo das Nações Unidas para a Infância SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 12 2 O ENSINO DE CIÊNCIAS NO BRASIL ................................................................. 15 2.1 Metodologias Ativas.......................................................................................... 22 2.2 Recursos e ferramentas digitais em metodologias ativas ............................. 26 3 METODOLOGIA DA PESQUISA ........................................................................... 28 3.1 Local da pesquisa ............................................................................................. 28 3.2 Caracterização dos sujeitos da pesquisa ....................................................... 29 3.3 Etapas da pesquisa ........................................................................................... 30 3.3.1 Questionário para a professora da turma ......................................................... 30 3.4 Procedimentos éticos ....................................................................................... 30 3.4.1 Coleta de dados e análise ................................................................................ 30 3.4.2 Planejamento de atividades presenciais, início das intervenções e a Pandemia do Novo Coronavírus ................................................................................................ 31 4 DESCRIÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DAS ATIVIDADES ............................... 35 5 PRODUTO EDUCACIONAL .................................................................................. 80 5.1 Título do Produto .............................................................................................. 80 5.2 Público-alvo ....................................................................................................... 80 5.3 Resumo do Produto .......................................................................................... 80 5.4 Metodologia do Produto ................................................................................... 80 5.5 Apresentação geral da primeira parte do Produto ......................................... 81 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 84 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 86 APÊNDICE A ............................................................................................................ 91 APÊNDICE B ............................................................................................................ 94 APÊNDICE C ............................................................................................................ 95 APÊNDICE D .......................................................................................................... 106 ANEXO A ................................................................................................................ 109 ANEXO B ................................................................................................................ 112 12 1 INTRODUÇÃO O ensino de Ciências como componente curricular dos anos iniciais no Ensino Fundamental, segundo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) tem como objetivo promover o letramento científico, ou seja, o aluno deve ser capaz de interpretar o mundo natural, social e tecnológico, sendo que para tal, o professor deve utilizar diferentes metodologias e recursos (BRASIL, 2018). Os conteúdos sobre corpo humano, saúde e alimentação fazem parte do Ensino de Ciências definidos pela BNCC e pelos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), Ciências Naturais no volume quatro e Temas Transversais (Saúde), volume oito, e com critérios que possibilitam autonomia para o professor no desenvolvimento desses conteúdos e temas relacionados, que podem ser adequados em função do ano, realidade local e material didático utilizado pela escola. O Brasil, assim como demais países do mundo, passou por diversas transformações, e uma delas está relacionada aos hábitos alimentares da população. Em função de várias enfermidades associadas a hábitos alimentares não saudáveis, ações e políticas públicas têm sido desenvolvidas. O Guia Alimentar para a População Brasileira foi criado em 2006, e teve como objetivo a conscientização sobre a importância de hábitos saudáveis como prevenção de doenças e promoção de saúde, correspondendo às primeiras diretrizes alimentares oficiais para a nossa população, mas foi apenas em 2014 que passou por uma reformulação ampla e esta segunda edição é a que foi divulgada de forma mais ampla, e continua válida até os dias atuais. (BRASIL, 2014). Como parte integrante do ensino de Ciências, o tema alimentação escolhido para esta pesquisa, surgiu diante das experiências vividas pela proponente como professora dos anos iniciais (1º ao 5º ano) da educação básica em uma Unidade Escolar de Ensino Fundamental, em uma cidade do interior paulista. A realidade observada por esta professora e pesquisadora, e compartilhada com colegas de trabalho, sobre os hábitos alimentares dos alunos durante os intervalos, e também do comportamento deles em relação à posse de “junk foods” (alimentos ricos em gordura e pobre em nutrientes), levou a proposição deste estudo. A relevância desta proposta está associada tanto às observações citadas anteriormente, como a escassez na literatura de estratégias no ensino de ciências, que tenham se mostrado efetivas para 13 a aprendizagem e desenvolvimento de hábitos alimentares saudáveis por alunos cursando ensino fundamental - primeiro ciclo. Criamos estratégias de ensino práticas e objetivas, utilizando diferentes recursos físicos e digitais, contextualizadas na realidade dos alunos para envolvê-los em uma aprendizagem ativa e crítica, que contribua para mudança de hábitos, desde a infância. Ao longo dos últimos anos, observamos que mesmo tendo garantia da merenda escolar, muitos alunos compram fora da escola, e trazem como lanche alimentos industrializados, na sua maioria com alto teor de açúcar, carboidratos simples, sódio e gorduras. Este é um problema grave, visto que segundo a Organização Pan-Americana Mundial da Saúde (OPAS, 2019), o número de crianças e adolescentes obesos no mundo aumentou dez vezes mais em quarenta anos. Soma-se a isso ainda o fato de que na referida escola, comprar e trazer esses alimentos para consumo no recreio, aparenta gerar nos alunos uma “sensação de poder”. A compra e o consumo destes produtos podem também estar associados à influência das propagandas pela mídia televisiva e digital. Uma pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor e pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância em outubro de 2019 (IDEC; UNICEF, 2019) verificou a influência dos rótulos de alimentos ultraprocessados na percepção, preferências e escolha alimentares das crianças brasileiras. Os resultados alertam para a necessidade de regulamentações à publicidade abusiva direcionada ao público infantil, respaldada em literatura científica robusta e reforçada por instituições internacionais (IDEC; UNICEF, 2019). Considerando que os componentes curriculares de Ciências, especificamente para o 5º ano do Ensino Fundamental, compreende o conteúdo do corpo humano e o funcionamento dos seus sistemas, escolhemos como público alvo para a intervenção desta pesquisa os alunos desse ano, com a finalidade de abordar em conjunto o quão importante e necessário se faz ter uma alimentação saudável, sensibilizando-os para o grave problema de saúde mundial, de modo individual e coletivo, no contexto da realidade cotidiana deles, e conscientizando-os sobre o consumo próprio e de sua família. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), se nada for feito, no ano de 2025 o número de crianças com sobrepeso e obesidade no mundo pode chegar a 75 milhões (ABESO, 2019). Portanto, o objetivo principal desta pesquisa foi elaborar, aplicar e avaliar atividades envolvendo conteúdos de ciências utilizando metodologias ativas que contribuíram para a aprendizagem, reconhecimento e construção de hábitos 14 alimentares saudáveis. Como objetivos específicos: diagnosticar como os hábitos alimentares dos alunos estão relacionados às suas experiências sensoriais; promover uma maior compreensão e conscientização dos alunos sobre o seu corpo, e como uma alimentação adequada pode ser determinante para saúde individual e coletiva. As atividades elaboradas, desenvolvidas e analisadas tiveram como base “estratégias de ensino centradas na participação efetiva dos estudantes na construção da própria aprendizagem, de forma flexível, interligada e híbrida” (MORAN, 2013, p. 4). As metodologias ativas tão citadas atualmente, não são tão recentes. Vários autores, desde Pierce, Dewey, Piaget, Vigotsky, e no Brasil Freire e Anísio Teixeira já discutiam a importância de o aluno ser sujeito ativo na própria aprendizagem, e a importância do professor não apenas como expositor de conteúdo, mas como mediador no processo de construção de conhecimento do aluno. O professor como aquele que diante da realidade de seus alunos, consiga promover um ensino contextualizado, de forma estreita a considerar os problemas reais, com o objetivo de desenvolver cidadãos críticos e atuantes na sociedade (HARTMAN, 2015). O levantamento bibliográfico foi realizado através da base de dados da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, periódicos da Capes e Scielo, assim como a legislação educacional vigente e materiais didáticos. Analisamos os documentos curriculares oficiais da área da educação e ensino de Ciências, e também pesquisas recentes na área da saúde e informação nutricional. No capítulo 2 abordamos os referenciais teóricos e metodológicos que dão sustentação ao trabalho. Iniciamos fazendo um resumo do ponto de vista histórico sobre o ensino de Ciências no Brasil, com base em documentos oficiais nacionais sobre os hábitos alimentares e saúde. Na sequência, discutimos metodologias ativas no ensino de Ciências e sobre as ferramentas digitais, como podem ser utilizadas de forma ativa para potencializar a aprendizagem. No capítulo 3 apresentamos a metodologia de pesquisa, com descrição do local, caracterização dos participantes da pesquisa e as etapas de realização. No capítulo 4 a apresentação das atividades elaboradas e desenvolvidas por meio da descrição, análise, síntese e interpretação dos resultados, no capítulo 5 a apresentação do Produto Educacional. Em sequência, no capítulo 6 as considerações finais e para finalizar, as Referências. 15 2 O ENSINO DE CIÊNCIAS NO BRASIL A educação brasileira e o ensino de Ciências, especificamente como componente curricular na educação básica, é fruto de um processo histórico com determinações legais, indicando alterações de conteúdo e metodológicas para atender as necessidades e realidade do país, em cada época. No Brasil Imperial, a construção do Colégio Pedro II em 1838, foi um grande marco histórico, sendo modelo de instituição educacional. Em relação ao currículo, o “ensino de Ciências era puramente expositivo e se baseava no uso de manuais didáticos estrangeiros ou traduzidos, destacando-se obras portuguesas e francesas” (SILVA; PEREIRA, 2011, p. 3). No Brasil República, tivemos a influência do positivismo, e o ideário da construção de um novo mundo e de um novo homem (SILVA; PEREIRA, 2011). Desse modo, “a escola seria o poderoso instrumento civilizador, responsável pela disseminação das ciências para todo o povo brasileiro” (SILVA; PEREIRA, 2011, p. 4). Mais à frente, na década de 30, no governo de Getúlio Vargas, com a Reforma Francisco de Campos, o ensino secundário foi organizado em séries e dividido em dois ciclos (SILVA; PEREIRA, 2011). E em relação ao currículo, Ciências Naturais, foi organizado com base em “um conjunto de verdades clássicas, constituído de conceitos e definições” (SILVA; PEREIRA, 2011, p. 5). Somente, a partir da década de 50, por conta da crescente industrialização e desenvolvimento tecnológico no país, um novo olhar para Ciências surge, no intuito de uma formação técnica e profissional. Após a 2ª Guerra Mundial, novas reformas educacionais aconteceram, principalmente nos Estados Unidos e Inglaterra, enquanto que: No Brasil, a necessidade de preparação dos alunos mais aptos era defendida em nome da demanda de investigadores para impulsionar o progresso da ciência e tecnologias nacionais das quais dependia o país em processo de industrialização. A Lei 4024 – Diretrizes e Bases da Educação de 1961 refletindo o espírito da época, ampliou a participação das ciências no currículo escolar, que passaram a figurar desde o primeiro ano do curso ginasial aumentando-se também a carga horária de física, química e biologia. (SILVA; PEREIRA, 2011, p. 5). 16 De acordo com a legislação de 1961, o país tinha a necessidade de avançar no conhecimento científico por meio de alteração no currículo e ampliação da carga horária das aulas de Química, Física e Biologia. Segundo Delizoicov, Angotti e Pernambuco (2018), a partir da década de 70 houve o início de um processo democratização do ensino e o novo desafio era levar o conhecimento científico a um público oriundo de “todos os segmentos sociais e com maioria expressiva oriunda das classes e culturas que até então não frequentaram a escola, salvo exceções” (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2018, p. 26). No entanto, não houve mudanças efetivas no processo educacional para que o ensino de ciências fosse apenas focado na formação de “futuros cientistas”. Ainda hoje são necessárias mudanças na atuação dos docentes da área, que continuam voltados para um ensino direcionado a “formar cientistas” que, “não só direcionou o ensino de Ciências, mas ainda é fortemente presente nele, hoje é imperativo ter como pressuposto a meta de uma ciência para todos” (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2018, p. 26). Em 1996, com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) (BRASIL, 2018b), a educação básica e a gratuidade do ensino foram regularizadas como direito para todos. Nela estão as diretrizes que organizam o ensino em todas as etapas, da Educação Infantil ao Ensino Superior. Em 1997, temos a divulgação do (PCN) norteando os conteúdos básicos de ensino por disciplina para cada série/ano1. Especificamente para Ciências Naturais, o PCN define conteúdos, procedimentos e métodos, bem como a importância do ensino de atitudes e valores pelo professor, para que os mesmos “sejam desenvolvidos tendo em vista o aluno que se tem a intenção de formar” (BRASIL, 1997a, p. 29). O PCN para o ensino fundamental primeiro ciclo, (1ª a 4ª série), atualmente 1º ao 5º ano, está dividido em quatro blocos temáticos, sendo eles: Ambiente, Ser Humano e Saúde, Recursos Tecnológicos e Terra e Universo. Dentre os objetivos de aprendizagem para que os alunos adquiram novos conhecimentos destaca-se: “valorizar atitudes e comportamentos favoráveis à saúde, em relação à alimentação e a higiene pessoal, desenvolvendo a responsabilidade no cuidado com o próprio corpo e com os espaços que habita” (BRASIL, 1997a, p. 47). Desta forma espera-se que o aluno compreenda a relevância do conteúdo, assim como construa a visão do 1 Alteração de nomenclatura série para ano, por meio da Lei nº 11.274 de 2006 que regulamentou o Ensino Fundamental de Nove Anos em todas as escolas brasileiras 17 seu próprio corpo enquanto um sistema integrado, individual e que depende dos cuidados de cada um sobre si: O fato é que o corpo, objeto de estudos das ciências biológicas e humanas, para além de sua importância enquanto fonte (ou objeto) do conhecimento científico ocupa na vida de cada um, um “lugar singular”, ou melhor, é o lugar singular a partir do qual compreendemos o mundo, interagimos com ele. É a base para desenvolvimento da noção de “Eu”, para a constituição das identidades e, portanto, é sobre o corpo que as diversas formas de poder presentes nas sociedades irão investir. (TALAMONI; BERTOLLI FILHO, 2008, p. 306). A questão da singularidade e individualidade de cada ser, a descoberta da identidade e consciência corporal na vida do indivíduo é mediada em parte na escola, portanto, esse conteúdo deve estar associado ao conhecimento do aluno sobre o seu próprio corpo e os cuidados para com ele. Para o segundo ciclo, (5ª a 8ª série), que atualmente compreende do 6º ao 9º ano do ensino fundamental, os conteúdos do Bloco “Ser Humano e Saúde” destacam a importância da aprendizagem por meio de estratégias que possibilitem aos alunos compreenderem o corpo humano como um sistema integrado e individual em que “saúde depende de um conjunto de atitudes e interações com o meio, tais como alimentação, higiene pessoal e ambiental, vínculos afetivos, inserção social, lazer e repouso adequados” (BRASIL, 1997a, p. 62). Em relação a alimentação, destaca-se a importância da mesma para a manutenção e funcionamento saudável do corpo: Um tema extremamente importante a ser considerado é a alimentação. Alunos desse ciclo podem investigar aspectos culturais e educacionais dos hábitos alimentares, as principais substâncias alimentares, suas funções e a importância da higiene na alimentação. (BRASIL, 1997a, p. 64). O PCN reconhece a relevância do tema da alimentação e sugere práticas de ensino por meio de pesquisas sobre hábitos alimentares em outras culturas, e nas comunidades em que vivem, verificando os alimentos mais consumidos, gosto pessoal e o motivo do maior consumo de determinados alimentos/produtos, assim como a investigação sobre as substâncias que os alimentos possuem, e qual a função de cada uma função no corpo. Assim, sugere-se que por meio de experimentos simples, os alunos possam verificar a presença de água, açúcares e amido em diferentes 18 alimentos (BRASIL, 1997a). Propõe também a elaboração de cardápios adequados de acordo com as informações e recursos disponíveis na pesquisa. Conforme os conteúdos dispostos para o segundo ciclo em Ciências relativos a fatos, conceitos, procedimentos, valores e atitudes destacamos: • estabelecimento de relações entre os diferentes aparelhos e sistemas que realizam as funções de nutrição para compreender o corpo como um todo integrado: transformações sofridas pelo alimento na digestão e na respiração, transporte de materiais pela circulação e eliminação de resíduos pela urina; • estabelecimento de relações entre aspectos biológicos, afetivos, culturais, socioeconômicos e educacionais na preservação da saúde para compreendê-la como bem-estar psíquico, físico e social; • identificação de limites e potencialidades de seu próprio corpo, compreendendo-o como semelhante mas não igual aos demais para desenvolver autoestima e cuidado consigo próprio; • reconhecimento dos alimentos como fontes de energia e materiais para o crescimento e a manutenção do corpo saudável valorizando a máxima utilização dos recursos disponíveis na reorientação dos hábitos de alimentação; • estabelecimento de relações entre a falta de higiene pessoal e ambiental e a aquisição de doenças: contágio por vermes e microrganismos. (BRASIL, 1997a, p. 66). Os conteúdos como explicitados acima, perpassam por definições, conceitos, mas também por valores e atitudes para a saúde e cuidado com o próprio corpo. A autoestima, vinculando a manutenção de um corpo saudável com a utilização de recursos disponíveis e reorientação de hábitos, sendo esse último de grande importância pois, hábitos e costumes são aspectos culturais e diversificados em cada família, sendo importante o aluno conhecê-los para poder adequá-los no sentido de obtenção e escolha de uma alimentação saudável de acordo com possibilidades reais. Os PCN também se subdividem em eixos designados como Temas Transversais, sendo eles: Ética, Saúde, Meio Ambiente, Orientação Sexual, Trabalho e Consumo, e Pluralidade Cultural. Esses temas não são vistos como novos conteúdos ou disciplinas, mas complementos para serem aplicados com o objetivo de serem trabalhados nas áreas já existentes e no trabalho educativo da escola (BRASIL, 1997a), ou seja, por meio de projetos interdisciplinares. O tema transversal “Saúde”, está inserido nos conteúdos de Ciências, e evidencia a elaboração do documento como um apoio educacional em medidas de conhecimento, cuidados com o corpo e prevenção de doenças: 19 A promoção da saúde ocorre, portanto, quando são asseguradas as condições para a vida digna dos cidadãos, e, especificamente, por meio da educação, da adoção de estilos de vida saudáveis, do desenvolvimento de aptidões e capacidades individuais, da produção de um ambiente saudável, da eficácia da sociedade na garantia de implantação de políticas públicas voltadas para a qualidade da vida e dos serviços de saúde. (BRASIL, 1997b, p. 255). A adoção de um estilo de vida saudável e condições dignas por meio da educação influenciam na garantia de políticas públicas voltadas para a saúde. Desse modo, o eixo “Saúde”, compreende uma abordagem definida de acordo com as necessidades da população brasileira. Os conteúdos foram selecionados de acordo com os critérios de: ● a relevância no processo de crescimento e desenvolvimento em quaisquer condições de vida e saúde particulares à criança e ao adolescente em sua realidade social; ● os fatores de risco mais significativos na realidade brasileira e na faixa etária dos alunos do ensino fundamental; ● a possibilidade de prestar-se à reflexão conjunta sobre as medidas de promoção, proteção e recuperação da saúde; ● a possibilidade de tradução da aprendizagem em práticas de cuidado em saúde e exercício da cidadania ao alcance do aluno. (BRASIL, 1997b, p. 270). Os critérios de seleção dos conteúdos abordados nos temas transversais sugerem a importância deles em relação a vida e a saúde, no desenvolvimento do aluno do ensino fundamental, bem como os fatores de risco a que estão expostos nessa faixa etária, e as medidas possíveis de prevenção e recuperação da saúde, e a se destacar “a tradução da aprendizagem em práticas de cuidado”. Em relação a alimentação, reforça a ideia central do documento já explicitada e considera ainda: Hábitos alimentares precisam ser criticamente debatidos em grupos como forma de avaliar a geração artificial de “necessidades” pela mídia e os efeitos da publicidade no incentivo ao consumo de produtos energéticos, vitaminas e alimentos industrializados. Em especial, é preciso reconhecer a possibilidade de ocorrência simultânea de obesidade — problema de dimensões orgânicas e afetivas — e carências nutricionais, decorrentes principalmente do consumo habitual de alimentos altamente calóricos oferecidos pelo mercado, desprovidos de nutrientes adequados ao consumo humano. (BRASIL, 1997b, p. 277). A má alimentação, os novos hábitos impostos pela mídia e o consumo exagerado de alimentos altamente calóricos e carente de nutrientes necessários 20 para o funcionamento do corpo, podem causar diversas doenças, como a obesidade, diabetes e hipertensão, por exemplo, dentre outras, relacionadas com a alimentação que podem ou não, fazer parte do cotidiano do aluno. O texto ainda inclui medidas de conhecimento e prevenção, assim como alerta para a importância do exercício físico aliado à alimentação para se ter uma boa saúde. Devido às mudanças no comportamento de compra e consumo de alimentos, em função das rotinas familiares brasileiras, foram criadas novas diretrizes curriculares e ações governamentais, fazendo-se necessário uma alteração na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) Lei n. 9.394/1996 (BRASIL, 2018b). E no artigo 26º foi incluído no § 9º A, a educação alimentar e nutricional como tema transversal no currículo escolar. Essa alteração foi feita por meio de emenda, pela Lei nº 13.666 de 16 de maio de 2018. No ano de 2018, com a divulgação da BNCC, temos um compilado de diretrizes para orientação da base curricular para todo o país. Portanto, a BNCC não se configura como um currículo pronto e acabado para ser seguido, mas sim, compreende os conteúdos e aprendizagens básicas para cada etapa de ensino, orientando para a elaboração do próprio currículo com adequações à realidade local e “considerando a autonomia dos sistemas ou das redes de ensino e das instituições escolares, como também o contexto e as características dos alunos.” (BRASIL, 2018a, p. 16). A Base visa o desenvolvimento integral do aluno e de competências gerais, dentre elas a de: Exercitar a curiosidade intelectual e recorrer à abordagem própria das ciências, incluindo a investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação e a criatividade, para investigar causas, elaborar e testar hipóteses, formular e resolver problemas e criar soluções (inclusive tecnológicas) com base nos conhecimentos das diferentes áreas (BRASIL, 2018a, p. 9). A investigação, elaboração e análise crítica, bem como a capacidade de resolver problemas até mesmo criando soluções perpassa pelas diferentes áreas, mas com uma linguagem própria das ciências. Para o ensino fundamental, foco deste trabalho, o documento descreve as habilidades específicas a serem desenvolvidas para cada ano. Em Ciências, a Base apresenta um comprometimento com o letramento científico que envolve a capacidade de compreender o mundo natural, social e 21 tecnológico (BRASIL, 2018a). Está organizada em Unidades Temáticas, Objetos do Conhecimento e Habilidades. Para o 5º ano do ensino fundamental, na Unidade Temática “Vida e Evolução”, tem como Objetos do Conhecimento: “a nutrição do organismo, hábitos alimentares e a integração entre os sistemas digestório, respiratório e circulatório” (BRASIL, 2018a, p. 341). Dentro desses conteúdos, visa desenvolver as habilidades de: (EF05CI06) Selecionar argumentos que justifiquem por que os sistemas digestório e respiratório são considerados corresponsáveis pelo processo de nutrição do organismo, com base na identificação das funções desses sistemas. (EF05CI07) Justificar a relação entre o funcionamento do sistema circulatório, a distribuição dos nutrientes pelo organismo e a eliminação dos resíduos produzidos. (EF05CI08) Organizar um cardápio equilibrado com base nas características dos grupos alimentares (nutrientes e calorias) e nas necessidades individuais (atividades realizadas, idade, sexo etc.) para a manutenção da saúde do organismo. (EF05CI09) Discutir a ocorrência de distúrbios nutricionais (como obesidade, subnutrição etc.) entre crianças e jovens a partir da análise de seus hábitos (tipos e quantidade de alimento ingerido, prática de atividade física etc.). (BRASIL, 2018a, p. 342). Essas habilidades envolvem o que os alunos necessitam saber, aplicar e identificar dentro dos conteúdos selecionados. Orientação de atividades sobre a alimentação e a elaboração de um cardápio equilibrado para a manutenção da saúde do organismo. A importância de discutir a ocorrência dos distúrbios nutricionais e doenças como a obesidade ou a desnutrição, entre os próprios alunos, pela análise de seus hábitos. O Guia Alimentar para a População Brasileira foi criado em 2006, como ação governamental com diretrizes e orientação para uma melhor alimentação da população. Dentre as recomendações pertinentes enfatiza o consumo de alimentos in natura, e de como fazer a escolha, manipulação e conservação desses. Cita também a importância da valorização da agricultura agroecológica familiar, e a compra desses produtos, direto de produtores ou hortas comunitárias (BRASIL, 2014). A legislação educacional brasileira, bem como os documentos oficiais e a BNCC, que orientam os currículos escolares no país, denotam uma preocupação com a questão de saúde e os bons hábitos alimentares como forma de prevenção. A escola é vista como o canal de comunicação, e os componentes curriculares de Ciências o caminho para que ocorra essa aprendizagem e a conscientização dos alunos. 22 Em uma pesquisa realizada em 2015 por nutricionistas de Goiânia-Goiás, intitulada: “Promoção da Alimentação Saudável na escola: realidade ou utopia?”, as autoras colocam que: “as políticas de promoção de alimentação saudável reconhecem a escola como um espaço privilegiado por sua contribuição para a conquista da autonomia e a adoção de hábitos saudáveis” (CAMOZZI et al., 2015, p. 32). Entretanto, mesmo com todas essas intenções e o desenvolvimento de ações governamentais e documentos reguladores, não provoca mudanças significativas, segundo (CAMOZZI et al., 2015, p. 33) “sendo necessário considerar o grau de sensibilização da comunidade quanto à PAS2 ou mesmo qual a sua percepção sobre o tema”. Diante dessa atual e necessária aprendizagem e conscientização sobre alimentação saudável dentro da escola, na disciplina de Ciências, questionamos: como promover atividades adequadas à realidade e que tenham sentido para a vida do aluno? Quais as metodologias utilizadas e como o professor pode ensinar esses conteúdos, é o que veremos a seguir. 2.1 Metodologias Ativas Nos últimos anos, muito se tem falado no meio educacional sobre metodologias ativas, em geral como algo novo e revolucionário na escola. No século XIX Rousseau (1712-1778), é considerado um dos precursores das principais ideias que norteiam as metodologias ativas, tirando o “centro do processo de aprendizagem do docente e dos conteúdos, para as necessidades e interesses dos educandos” (LIMA, 2017, p. 423). John Dewey, filósofo e educador americano (1859-1952) é um marco na educação moderna, com a proposta de uma aprendizagem em que o aluno tem participação ativa, e a ideia de unir teoria e prática para estímulo da criatividade e do pensamento crítico. Em contraponto ao ensino tradicional e a memorização de conteúdos, o ideário da Escola Nova (também chamada de escola progressista ou escola ativa), que surgiu no final do século XIX e ganhou forças nas primeiras décadas do século XX, colocava “o aluno no centro do processo, enfatizando a necessidade do protagonismo durante a aprendizagem” (CAMARGO; DAROS, 2018, p. 9). 2 PAS - Programa de Alimentação Saudável na Escola. 23 Decroly (1871-1932) além de ser um médico belga, foi também um educador combatente da escola vigente na sua época, e pregava um modelo de escola centrada no aluno, baseada nos chamados “centros de interesse”, em que o estudante deveria aprender o que lhe era de interesse próprio. Foi um dos grandes “precursores da educação transdisciplinar, do ensino globalizado, centrado no aluno” (CAMARGO; DAROS, 2018, p. 9). David Ausubel (1982), e a sua teoria da aprendizagem significativa, enfatiza a valorização dos conhecimentos prévios dos alunos para que ocorra realmente o engajamento dos mesmos em um conteúdo escolar significativo (CAMARGO; DAROS, 2018). Esses autores, segundo Camargo e Daros (2018, p. 9), “constituem uma pequena amostra de vários outros do século XX que se dedicaram à construção de metodologias inovadoras”. Essas metodologias aplicadas ao ensino, tem a finalidade de se construir uma prática pedagógica para formação de um indivíduo crítico e reflexivo: Podemos entender que as Metodologias Ativas baseiam-se em formas de desenvolver o processo de aprender, utilizando experiências reais ou simuladas, visando às condições de solucionar, com sucesso, desafios advindos das atividades essenciais da prática social, em diferentes contextos. (BERBEL, 2011, p. 28). Para Berbel (2011), as metodologias ativas visam promover a aprendizagem por meio de situações reais ou simuladas para solução de problemas. Segundo Moran (2013, p. 2) “a vida é um processo de aprendizagem ativa, de enfrentamento de desafios cada vez mais complexos”. Ou seja, aprendemos nas situações diárias, dentro e fora da escola: Sabe-se com base na vivência cotidiana, que as pessoas aprendem o tempo todo. Instigadas pelas relações sociais ou por fatores naturais, aprendem por necessidades, interesses, vontade, enfrentamento, coerção. Sabe-se até que aprendem não só tópicos e assuntos, conhecimentos no sentido mais tradicional, mas também habilidades manuais e intelectuais, o relacionamento com outras pessoas, a convivência com os próprios sentimentos, valores, formas de comportamento e informações, constantemente e ao longo de toda vida. (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2018, p. 95). Diante dessa multiplicidade de espaços e formas de aprender, a escola não se constitui mais somente como o único espaço de educação, porém é nela que o saber acontece de forma sistematizada: 24 Os processos de aprendizagem são múltiplos, contínuos, híbridos, formais e informais, organizados e abertos, intencionais e não intencionais. O ensino regular é um espaço importante, pelo peso institucional, anos de certificação e investimentos envolvidos, mas convive com inúmeros outros espaços e formas de aprender mais abertos, sedutores e adaptados às necessidades de cada um. (MORAN, 2013, p. 3). Os espaços e formas de aprender com maior interatividade e comunicação são atraentes para a criança ou jovem aprendiz, como cita Moran (2013), e confronta-se com o ensino escolar sistematizado e com o ensino tradicional em que apenas o professor é o detentor de todo o saber e deposita os conteúdos (FREIRE, 1996). As metodologias ativas promovem a participação e colocam o aluno como protagonista do seu próprio processo de aprendizagem, e podem ser assim definidas: Metodologias ativas são estratégias de ensino centradas na participação efetiva dos estudantes na construção do processo de aprendizagem, de forma flexível, interligada e híbrida. As metodologias ativas, num mundo conectado e digital, expressam-se por meio de modelos de ensino híbridos, com muitas possíveis combinações. A junção de metodologias ativas com modelos flexíveis e híbridos traz contribuições importantes para o desenho de soluções atuais para os aprendizes de hoje. (MORAN, 2013, p. 4). A construção do processo de aprendizagem do aluno ocorre com a junção de metodologias ativas, ou seja, estratégias de ensino com a participação efetiva dos alunos e que combinadas e conectadas no mundo digital, contribuem para o desenvolvimento e resolução de problemas atuais. O professor assume o papel de mediador do conhecimento, não é mais ele que detém todo o saber. Segundo Moran (2013, p. 4), “o seu papel é ajudar os alunos a irem além de onde conseguiriam ir sozinhos, motivando, questionando e orientando”. Para promover uma aprendizagem ativa, apresentaremos algumas das estratégias mais conhecidas, e que vêm sendo utilizadas. São elas: Aprendizagem Baseada em Problemas (Problem-Based Learning-PBL), Problematização, Aprendizagem Baseada em Projetos (Project-Based Learning), Aprendizagem Baseada em Times (Team- Based Learning - TBL), Instrução por Pares (Peer Instruction) e a Sala de Aula Invertida (Flipped Classroom). Aprendizagem Baseada em Problemas (Problem-Based Learning - PBL) a metodologia surgiu no Canadá, no final dos anos 60, na McMaster University Medical School (LOVATO et al., 2018). Consiste na resolução de problemas reais apresentados para o grupo, e estabelece algumas fases/etapas como: identificação 25 dos problemas, formulação de hipóteses, reformulação de processo, síntese e avaliação (BACICH; MORAN, 2018). Aprendizagem Baseada em Projetos (Project-Based Learning) foi idealizada e desenvolvida por John Dewey, em meados de 1900. Defendia a aprendizagem e a capacidade de pensar dos alunos pelo “aprender a fazer” (LOVATO et al., 2018). A Aprendizagem Baseada em Projetos (PBL) tem como objetivo envolver os alunos na resolução de problemas ou tarefas por meio de desafios ou “desenvolver um projeto que tenha ligação com a sua vida fora da sala de aula” (BACICH; MORAN, 2018, p. 16). Problematização - a metodologia da problematização, similar a PBL, porém nela os “alunos identificam os problemas por meio da observação da realidade, na qual as questões de estudo estão ocorrendo” (LOVATO et al., 2018, p. 162). Aprendizagem Baseada em Times (Team- Based Learning - TBL) como o próprio nome revela, é uma metodologia para times ou equipes, sendo uma estratégia de ensino que foi criada em 1970 por Larry Michaelsen para cursos de Administração com classes numerosas. A turma é dividida em grupos, de no mínimo cinco e no máximo oito alunos, e a aprendizagem é favorecida por meio da interação do grupo (LOVATO et al., 2018, p. 164). A metodologia é desenvolvida por meio de etapas a serem seguidas e acompanhadas pelo professor, sendo importantes por possibilitar ao aluno adquirir e aplicar os conhecimentos por meio da sequência de atividades (BOLLELA et al., 2014). São três etapas: Preparação, Garantia de Preparo e Aplicação de Conceitos, com duração de cinquenta a noventa minutos cada. Instrução por Pares (Peer Instruction) - desenvolvida pelo professor Eric Mazur da Universidade de Harvard na década de 1990, consiste numa metodologia em que os alunos discutem conteúdos para explicar para os colegas da sala. Sala de Aula Invertida (Flipped Classroom) criada e desenvolvida pelos educadores Jonathan Bergmann e Aaron Sams nos Estados Unidos, com a finalidade de sanar dificuldades de aprendizagem de seus alunos e otimizar o tempo em sala de aula, principalmente para salas com grande quantidade de alunos, diante das dificuldades e ausência de alguns deles, que consequentemente perdiam o conteúdo. Na sala de aula invertida, os alunos se preparam, têm contato com conteúdo antes da aula (BERGMANN; SAMS, 2019). Os professores perceberam que podiam gravar suas aulas, conteúdos, e disponibilizar em ambientes virtuais 26 para que os alunos tivessem acesso para assistir aos vídeos em casa e nos horários adequados à sua realidade, para depois em sala de aula sanar as dúvidas e realizar a aplicação prática desse conteúdo, e não mais utilizar o tempo para uma aula expositiva. Ou seja, uma modalidade de e-learning, com instruções online “e a sala de aula sendo o local para trabalhar os conteúdos já estudados de forma colaborativa” (LOVATO et al., 2018, p. 165). Segundo Bacich e Moran (2018), nessa modalidade é importante engajar os alunos com resolução de problemas, desafios e atividade bem planejadas com feedback imediato, além de combinar “problemas reais e jogos com a aula invertida é muito importante para que os alunos aprendam fazendo, aprendam juntos e aprendam, também, no seu próprio ritmo” (BACICH; MORAN, 2018, p. 15). 2.2 Recursos e ferramentas digitais em metodologias ativas A globalização e os avanços tecnológicos mudaram o mundo e revolucionaram principalmente as formas de comunicação. A tecnologia está ligada ao desenvolvimento da Ciência, que “se associou ao conhecimento tecnológico, isto é, a tecnologia é a aplicação do conhecimento científico para se obter um resultado prático” (BRITO; PURIFICAÇÃO, 2015, p. 22) E tudo isso realizado pelo próprio homem que “criou ciências e tecnologia (desde a roda até o computador) que trouxeram mudanças significativas em suas relações com outros seres humanos e com a natureza” (BRITO; PURIFICAÇÃO, 2015, p. 22). Cada qual a seu tempo e para suprir as necessidades do homem, desde a roda, o livro, até os grandes artefatos tecnológicos; o computador e os dispositivos móveis sem fio, como os celulares smartphones conectados à internet são exemplos de Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDICs). Diante das mudanças, hiperconexão por meio da internet e a grande interação virtual, geraram transformações no modo de ensinar e aprender, ou seja, novos desafios: A convivência nos espaços híbridos, multimodais da hiperconexão provoca mudanças no modo de interagir, representar o pensamento, expressar emoções, produzir e compartilhar informações e conhecimentos, assim como aporta novos elementos à aprendizagem, podendo trazer novas contribuições e desafios aos processos educativos (VALENTE; ALMEIDA; GERALDINI, 2017, p. 458). 27 A educação diante desses novos desafios e, no sentido de superar o modo de ensino tradicional, centrado apenas no professor e que coloca o aluno como um mero telespectador, professores podem associar o uso do computador, por exemplo, como algo inovador. Porém, apenas usar a tecnologia em sala de aula sem um objetivo de aprendizagem coerente e o professor continuar sendo apenas um transmissor de informações, “mantendo o aluno na perspectiva de memorizador e de reprodutor fidedigno de conteúdos, não modifica o processo de ensino e aprendizagem. O uso de tecnologia não é metodologia ativa de aprendizagem” (CAMARGO; DAROS, 2018, p. 15-16), ou seja, o uso da tecnologia, por meio dos recursos e ferramentas digitais potencializa a aprendizagem, conecta e atraí os alunos nessa nova realidade, quando há um propósito e metodologia bem aplicada. Os adolescentes de hoje, mostram-se habilidosos no uso do celular e de computadores para jogos ou para apreciar vídeos de “Youtubers” famosos, por exemplo. Porém, segundo (BANNEL et al., 2016), o mesmo não tem sido identificado no desenvolvimento escolar, para “busca, seleção, avaliação e análise de informações novas ou de conhecimentos formais (escolares, acadêmicos, científicos)” (BANNEL et al., 2016, p. 70). Portanto, é preciso que o professor defina objetivos claros e a intencionalidade no uso de ferramentas digitais, para que os alunos também aprendam e desenvolvam essas habilidades de busca, análise e seleção de conteúdo nas atividades escolares para ampliar conhecimentos, por exemplo, por meio mediação do professor, ou seja, de pessoas que já as possuem ou já internalizaram (BANNEL et al., 2016). Nesse sentido, o professor atua como um mediador, problematizador, auxiliando os alunos na aprendizagem, como é o propósito das metodologias ativas. As redes sociais, como o Facebook, e os aplicativos de bate-papo, o WhatsApp, antes utilizadas para comunicação e lazer, atualmente têm sido importantes ferramentas para o desenvolvimento de atividades pedagógicas em tempo real. 28 3 METODOLOGIA DA PESQUISA A pesquisa realizada caracterizou-se por ter uma abordagem qualitativa, com características de observação participante e descritiva das intervenções. A “observação participante ocorre pelo contato direto do pesquisador com o fenômeno observado. Obtém informações sobre a realidade dos atores sociais em seus próprios contextos” (GERHARDT; SILVEIRA, 2009, p. 40). 3.1 Local da pesquisa A pesquisa foi realizada em uma escola Municipal de Ensino Fundamental de uma cidade do interior paulista. Atende alunos do 1º ao 5º ano do – primeiro ciclo no período matutino e vespertino, e a Educação de Jovens e Adultos (EJA) no período noturno. No total de aproximadamente 486 alunos. O prédio escolar possui doze salas de aulas em funcionamento durante o dia e duas salas à noite. A estrutura conta ainda com sala de diretoria, sala dos professores, secretaria, cozinha, biblioteca, sala de recursos multifuncionais para atendimento especializado (AEE), laboratório de informática, banheiros para professores e funcionários e banheiros para alunos, inclusive adequados para pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida. Quadra de esportes e pátio coberto, extensa área verde e jardim. Alguns equipamentos como: copiadora, impressora, TV, retroprojetor, projetor multimídia (data show), rádio e máquina fotográfica. A escola possui Associação de Pais e Mestres (APM) e o Conselho de Escola, formado por professores, funcionários e pais de alunos. A escola também desenvolve alguns projetos, como aulas de música, coral e flauta. Em relação ao meio ambiente, trabalho com a reciclagem e ajuda ao próximo, realizando a coleta de lacres de metal, doados a instituições como um Hospital em uma cidade no interior paulista, revertendo na aquisição de cadeira de rodas. O material didático utilizado é do tipo apostilado e é escolhido mediante processo de avaliação do Setor de Educação e licitação pela Prefeitura Municipal. A partir de janeiro de 2018, a rede municipal adquiriu o material do sistema Anglo de Ensino e é fornecido gratuitamente aos alunos. 29 3.2 Caracterização dos sujeitos da pesquisa Os sujeitos da pesquisa foram vinte alunos matriculados em uma turma do 5º ano do Ensino Fundamental, do período vespertino, com idades entre 11 e 12 anos, sendo 8 meninos e 12 meninas, resumido no Quadro 1, com as respectivas siglas utilizadas. Quadro 1 – Caracterização dos participantes da pesquisa SUJEITOS GÊNERO SIGLA Aluno 1 Feminino A1 Aluno 2 Masculino A2 Aluno 3 Feminino A3 Aluno 4 Feminino A4 Aluno 5 Feminino A5 Aluno 6 Feminino A6 Aluno 7 Feminino A7 Aluno 8 Masculino A8 Aluno 9 Masculino A9 Aluno 10 Feminino A10 Aluno 11 Masculino A11 Aluno 12 Feminino A12 Aluno 13 Masculino A13 Aluno 14 Feminino A14 Aluno 15 Feminino A15 Aluno 16 Feminino A16 Aluno 17 Masculino A17 Aluno 18 Masculino A18 Aluno 19 Feminino A19 Aluno 20 Masculino A 20 Fonte: Elaborado pela autora. 30 A turma de quinto ano escolhida por esta pesquisadora, deu-se pelo fato desta atuar como professora auxiliar (que ministra aulas em vários anos como substituta e/ou aula de reforço escolar), e já ter contato com esses alunos desde 2018, e também da professora titular desta turma em 2020, ser a mesma desde o 3º ano do Ensino Fundamental. Estes dois pontos foram considerados como facilitadores para implementar a proposta desta pesquisa, visto que já havia um entrosamento prévio entre todos os envolvidos. 3.3 Etapas da pesquisa 3.3.1 Questionário para a professora da turma Inicialmente elaboramos um questionário, que foi respondido pela professora titular da sala, com o objetivo de identificar as percepções dela sobre a turma e informações importantes, como as dificuldades de aprendizagem dos alunos, sua prática e em relação ao tempo de trabalho com os mesmos alunos. 3.4 Procedimentos éticos Considerando os procedimentos éticos para início das intervenções na escola, enviamos para os pais dos alunos o Termo de Consentimento com autorização para realização da pesquisa e o Termo de Assentimento que foi lido e assinado pelos participantes. O projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Parecer nº 3.705.519, conforme Anexo A. 3.4.1 Coleta de dados e análise A coleta de dados foi realizada por meio dos seguintes instrumentos: questionários físicos e online com questões abertas (dissertativas) e fechadas (múltipla escolha), individuais e em grupo; gravação em áudio de rodas de conversa e entrevistas, assim como aulas síncronas pelo Google Meet que foram gravadas, descritas, o uso de ferramentas digitais para realização das atividades durante a Pandemia do Covid-19, e o ensino remoto emergencial, com registros escritos, desenhos e fotografias. 31 A análise foi realizada por meio da descrição e interpretação das atividades, segundo Gil (2008, p. 178) “o que se procura na interpretação é a obtenção de um sentido mais amplo para os dados analisados, o que se faz mediante sua ligação com conhecimentos disponíveis derivados principalmente de teorias”. 3.4.2 Planejamento de atividades presenciais, início das intervenções e a Pandemia do Novo Coronavírus Inicialmente, as atividades programadas foram desenvolvidas de modo presencial, de outubro a dezembro de 2019. No retorno às aulas em 04 de fevereiro de 2020, tivemos um período para a organização da grade curricular escolar e da concessão do horário de aulas que poderíamos utilizar. Retomamos a intervenção com as atividades de Ciências, conforme o planejamento, em março de 2020, e após uma aula, tivemos uma interrupção por conta de uma situação que atingiu o mundo todo, a Pandemia do Novo Coronavírus, a Covid-19. O Coronavírus é um vírus comum em diferentes espécies de animais. Em dezembro de 2019, foi identificado um Novo Coronavírus (SARS-CoV-2), na cidade de Wuhan, na China, com transmissão entre humanos, o que deu origem ao nome, Covid-19. A Covid-19 é uma doença em que a transmissão ocorre no contato com a pessoa doente ou infectada, por meio do toque e da saliva. Os sintomas iniciais são parecidos com um resfriado ou Síndrome Gripal e que pode evoluir para uma pneumonia (BRASIL, 2020). E em outros casos, as pessoas podem não apresentar sintomas, (assintomáticos); desse modo, houve a recomendação das autoridades sanitárias para o uso de máscaras e higienização das mãos com álcool 70º, para toda população mundial para proteção e evitar o contágio pelo vírus. No início de 2020, muitos casos de Covid foram aumentando no mundo todo, e “em 11 de março de 2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou que o mundo passava por uma pandemia” (SOUZA, 2020, p. 111). A partir desse momento, houve a suspensão de atividades dos diversos setores, permanecendo abertos os serviços essenciais (supermercados, hospitais, farmácias e postos de combustíveis), um forte isolamento social, no sentido de frear a transmissão do Novo Coronavírus. 32 Diante da nova realidade imposta e a suspensão das aulas presenciais, tivemos que reestruturar a proposta das atividades da pesquisa. Para entendimento do processo de retomada da coleta de dados, na Figura 1 ilustramos o percurso. Figura 1 – Fluxograma da organização das atividades Fonte: Elaborada pela autora. A partir desse momento, a escola aguardou as novas orientações da Secretaria Estadual de Educação de São Paulo e da Secretaria Municipal para dar continuidade às aulas. Desse modo, passaram-se algumas semanas, até que foi definido que os conteúdos do material apostilado e os complementares, seriam planejados e enviados para a Coordenação da escola e depois compilados em um arquivo que seria disponibilizado para os pais por meio de uma página da rede social, o Facebook, para verificarem as páginas e os exercícios que deveriam ser realizados em casa pelos alunos. O objetivo era facilitar o acesso e visualização dos conteúdos e atividades por meio de uma rede popular e de fácil acesso. A comunicação entre pais, alunos e professores ficou aberta para que cada docente realizasse com a sala de aula da qual é responsável. A professora da sala da turma do quinto ano em que estávamos realizando a pesquisa, criou um grupo no aplicativo de bate-papo WhatsApp para estabelecer e facilitar essa comunicação com os pais e alunos, também orientar e tirar dúvidas sobre o conteúdo ou de algum exercício específico. 33 Em parceria com a professora titular da turma, iniciamos o processo de retomada de contato com os alunos por meio de um vídeo gravado e enviado para os alunos com palavras de acolhimento e mensagem com a finalidade de motivá-los para os estudos e a participação, diante dessa nova situação. Reforçamos a importância dos cuidados e que para a preservação da saúde de todos, tínhamos que estar em casa. Todo esse processo se deu entre final de março e abril. Quando retomamos esse contato para execução de atividades conforme a nova realidade, novamente tivemos que parar, pois, diante da prorrogação da quarentena no Estado de São Paulo, a Prefeitura Municipal, juntamente com a Secretaria Municipal de Educação decidiram adiantar as férias de julho. Portanto, no período de 11 a 30 de maio, os alunos, professores e funcionários estavam de férias. A terceira retomada das aulas foi realizada a partir de primeiro de junho, momento em que as atividades foram novamente reelaboradas diante dos novos desdobramentos. Pois, nesse momento, houve quebra do consumo de salgadinhos e outros alimentos industrializados para consumo na escola no lugar da merenda, o novo contexto envolvia a alimentação e o consumo exclusivamente em casa e com a família. Desse modo, para compreender o contexto da alimentação, a realidade e até mesmo dificuldades enfrentadas pelos pais, agora, com os filhos e parte da família o dia todo em casa, necessitamos realizar uma mudança de estratégias: o foco no momento era a alimentação e como estar saudável em casa. Para isso, em meio a pandemia, construímos/elaboramos outras estratégias, sendo que primeiro tivemos que contar com o apoio dos pais e utilizamos, conforme será descrito na atividade 4, um formulário com sete questões (APÊNDICE C), com o objetivo de saber como estava a alimentação da família e quais as dificuldades encontradas nesse momento. O Quadro 2 apresenta um resumo cronológico das intervenções realizadas. 34 Quadro 2 – Desenvolvimento da pesquisa (cronograma das atividades) Item Data Local/Realização Descrição da atividade 1. Outubro 2019 Sala de multimídias da escola Roda de conversa para aproximação e sensibilização (Diagnóstica) Atividade 1 2. Novembro/dezembro 2019 Sala de multimídias Caixa dos Sentidos Atividade 2 3. Fevereiro 2020 ---------- Início das aulas e organização dos horários 4. Março Sala de aula/ Informática Encontro para retomada das atividades com o desafio de escreverem sobre o que é ser saudável. e comparar com a OMS Atividade 3 5. Março - 23 até 30 Interrupção pelo COVID-19 Suspensão das aulas e verificação para retomada de contato com alunos e família 6. Abril Postagem no Facebook Atividades/ páginas do material divulgadas pela página da Escola para os alunos realizarem em casa *professora da sala criou grupo no WhatsApp para contato 7. Abril Contato via WhatsApp Retomada de atividades adaptadas para ensino remoto 8. Maio Prefeitura antecipou as férias Suspensão de atividades 9. Junho Ensino Remoto via WhatsApp /meet. Atividade 4, 5, 6, 7 10. Julho Ensino Remoto via WhatsApp /meet. Atividade 8, 9, 10,11 11. Agosto Ensino Remoto via WhatsApp /meet. Atividade 12, 13, 14 e 15 Fonte: Elaborado pela autora. No capítulo seguinte, descrevemos e analisamos as atividades realizadas. 35 4 DESCRIÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DAS ATIVIDADES Apresentamos no Quadro 3 uma síntese das atividades realizadas. No total desenvolvemos 15, incluindo as que foram feitas anteriormente à pandemia de forma presencial e as realizadas na modalidade remota com uso das ferramentas digitais, durante o período de isolamento. Quadro 3 – Atividades desenvolvidas PRESENCIAIS 1- Roda de Conversa - Diagnóstica 2- A Caixa dos Sentidos 3- O que é ser saudável? REMOTAS COMUNICAÇÃO VIA WHATSAPP – AULAS PELO GOOGLE MEET (50 MINUTOS) 4- Questionário para os pais/ responsáveis (Retomada de contato e acolhida durante a Pandemia da Covid-19) 5- Conhecendo e explorando o Padlet (Mural Virtual) 6- Google Meet/ Slides (Revisão e vídeo) 7- Alimentos Ultraprocessados 8- Sala de Aula Invertida – “De onde vem a goma de mascar?” 9- Mapa mental colaborativo utilizando o Jamboard 10- Bate-papo com a Nutricionista 11- Ultraprocessados, o que podem causar no nosso corpo? 12- Gamificação - Quiz interativo online (Google Forms) 13- Experimento - consumo de sal e a “Pressão Sanguínea” - pesquisa das doenças/ socialização da tabela 14- Propagandas e a influência da mídia no consumo de alimentos 15- Cartaz Colaborativo “Para uma alimentação e vida saudável” – divulgação online Fonte: Elaborado pela autora. 36 Atividade 1 - “Roda de conversa” Número de alunos participantes: 21 Na atividade 1 de caráter diagnóstico, correspondente a roda de conversa, após as respostas individuais dos alunos ao questionário (APÊNDICE A) pudemos observar os conhecimentos sobre alimentação saudável que os alunos já possuíam. O recurso utilizado foi apresentação do Power Point para conduzir a dinâmica da aula e nortear as perguntas. Os alunos responderam o questionário individualmente e com base no que já aprenderam sobre alimentação saudável, conteúdo ministrado no 1º bimestre de 2019, no material didático do sistema ANGLO de ensino, sendo o caderno 1 de Ciências somente referente ao tema, e os conteúdos abordados foram: • Nutrientes e Classificação dos alimentos; • Pirâmide Alimentar; • Embalagens e Rótulos; • Prazo de validade dos alimentos/conservação; • Higiene no preparo dos alimentos/ Segurança Alimentar. Apresentamos as respostas às questões que foram categorizadas no Quadro 4, nas Figuras 2 e 3, contendo a pergunta, resposta e o números de alunos que responderam a mesma. Quadro 4 – Questões atividade diagnóstica (continua) PERGUNTA RESPOSTAS/ NÚMERO DE ALUNOS 1- Por que sentimos fome? Comida é fonte de energia (9) Necessidade do corpo (4) Estômago vazio ( dói e sentimos fome) (7) Não vivemos sem comida (1) 2- A comida é apenas fonte de energia? Sim ( 9) Não (12) 3- Você vê diferença entre “ estar com fome” ou estar com “vontade de comer algo” Por quê? Sem repostas/ confusas na elaboração 4- Essa vontade de comer, a que pode estar relacionada? Ansiedade (10) Falta de atividades (9) Para acompanhar o grupo (2) 37 Quadro 4 – Questões atividade diagnóstica (conclusão) PERGUNTA RESPOSTAS/ NÚMERO DE ALUNOS 5- O que você gosta de comer? Figura 2 6- Comer esses alimentos têm a ver com a sensação de prazer? Sim (19) Não (2) 7- Quais desses alimentos você consome? Figura 3 8- O que você sentiu ao ver as imagens? Fome (2) Vontade de comer (8) Fome e vontade de comer (11) Nada (0) Fonte: Elaborado pela autora. Para a pergunta 5: O que você gosta de comer? Cada aluno respondeu escrevendo os alimentos preferidos e reunimos no gráfico os alimentos escolhidos e o número de alunos que citaram, conforme a Figura 2. Figura 2 – Alimentos que os alunos gostam de comer Fonte: Elaborada pela autora. 38 Os alimentos mais citados foram: bolo de brigadeiro, lasanha, pizza e lanche. Em sequência, com o mesmo número de escolha, o salgadinho, hambúrguer e chocolates. Essa atividade diagnóstica foi desenvolvida em uma aula de cinquenta minutos. No dia seguinte, retomamos o conteúdo, repensando e dialogando em roda de conversa sobre as questões que os alunos tiveram dificuldade para responder, no caso a nº 4, sobre diferenciar quando estamos com fome ou vontade de comer. Após ouvi-los, anotamos as respostas na lousa e continuamos com a atividade. Nesse momento, projetamos slides com as imagens de alimentos previamente selecionados pelo critério de análise da pesquisadora, elencando os alimentos mais comuns do cotidiano dos alunos e também alguns que estão presentes na merenda escolar. Concomitantemente, os alunos receberam uma folha com o nome desses alimentos na sequência idêntica das imagens, para que fizessem referência e assinalassem os que eram consumidos por eles. O objetivo pretendido foi de perceber as reações dos alunos ao verem as imagens dos alimentos, bem como sensações que sentiram e consequentemente levá-los a pensar sobre essa questão da fome ou vontade de comer e a influência da escolha dos alimentos consumidos, e se houve alteração em relação a atividade anterior em que escreveram quais gostavam de comer, sem apoio visual. A pergunta 7: Quais desses alimentos você consome? Os alimentos na ordem que foram apresentados nos slides e escritos na folha para os alunos assinalarem, assim como a respectiva quantidade estão apresentados na Figura 3. 39 Figura 3 – Alimentos consumidos pelos alunos Fonte: Elaborada pela autora. Em uma análise com relação à escolha dos alunos, foi possível perceber a unanimidade de consumo de pizza, pastel, bolo de chocolate, lanche, pão, refrigerante, balas e pirulitos. Em segundo plano, o baixo consumo de frutas, verduras e legumes, principalmente da abobrinha, item menos escolhido. Importante ressaltar que a carne, os alunos associam ao churrasco, espetinhos e bife, que geralmente é a forma mais consumida por eles. Outro fator é o gosto pelo pastel, principalmente por ser tradicional o consumo aos domingos, onde no bairro, especificamente, na avenida em frente à escola ocorre a feira livre com venda dos alimentos como legumes, verduras e frutas, mas também pastel, caldo de cana, sorvetes, doces e variedades como brinquedos, canecas, etc... As frutas escolhidas, como por exemplo, a laranja, se deu por ser uma fruta mais comum e barata para o consumo, assim como a maçã que ao menos uma vez na semana está presente no cardápio da merenda escolar. Na sequência foi realizada a seguinte pergunta: O que você sentiu ao ver as imagens? Após esse levantamento, ficou bem claro que os alunos realmente não haviam conseguido responder à pergunta 3 da atividade diagnóstica, pois ainda confundiam o que é ter fome e o que é sentir vontade de comer. Onze alunos assinalaram as duas opções, fome e vontade de comer. Desse modo, foi possível 40 perceber a influência da imagem na manifestação de reações nas crianças, fato que não ocorreu na proposta anterior de apenas escrever os alimentos mais consumidos por eles. A partir da coleta desses dados, realizamos uma roda de conversa, e como pesquisadora e professora mediadora conduzimos os alunos a refletirem sobre o que viram e sentiram, suas sensações e as reações. Essa atividade foi feita oralmente de modo que a partir da reflexão sobre suas próprias experiências, os alunos conseguiram perceber a diferença entre fome e vontade de comer, pois foi realizada logo após o recreio propositalmente com o objetivo dessa verificação, afinal, os alunos já haviam se alimentado, ou pela merenda da escola ou pelo lanche que levaram, teoricamente não estariam com fome, e sim, ao ver as imagens, principalmente de pizza, pastel, doces, etc. Reagiram querendo consumir naquele momento o alimento, ou seja, uma vontade de comer. Nesse momento, os alunos manifestaram o entendimento pessoal desta intervenção pela nossa condução de ideias e a participação ativa deles. O que observamos é que inicialmente não conseguiam fazer a distinção entre fome e vontade de comer. Após as intervenções/atividades dialogadas, os alunos entenderam por meio da vivência/experimentação as diferenças. Isso é importante, inclusive do ponto de vista da nutrição e endocrinologia hoje, onde as estratégias para tratar distúrbios alimentares convergem para que o paciente se conscientize da diferença entre fome e vontade de comer ligada a situações de recompensa, comida conforto, ou seja, a fome é uma necessidade fisiológica do nosso corpo e a vontade de comer depende de outros fatores, como hábitos sociais, sentimento de vazio, ansiedade, depressão, higidez ou doença física, oferta ou restrição de alimentos, comemorações, etc. (ABCMED, 2019). Em seguida, questionamos: por que alguns alunos quando viram as imagens, disseram sentir o gosto, o cheiro daqueles alimentos? Induzimos a dúvida e instigamos os alunos a falarem o que estavam pensando sobre, porém, inicialmente eles não sabiam como organizar as ideias. Então, foi nesse momento que chegamos ao conteúdo de Ciências planejado, introduzir os cinco sentidos e a sua relação com a alimentação, bem como a função cerebral e o registro da memória gustativa. Essa breve explicação foi realizada por meio de um vídeo curto e didático sobre o assunto, que consta para consulta nas referências deste trabalho. https://www.abc.med.br/p/psicologia-e-psiquiatria/220225/transtorno+de+ansiedade+generalizada+o+que+e.htm https://www.abc.med.br/p/psicologia-e-psiquiatria/226970/depressoes+o+que+sao.htm 41 Em sequência planejamos atividades envolvendo os cinco sentidos do corpo humano e a sua relação com os alimentos e a alimentação, corpo e sensações. As atividades foram realizadas em quatro aulas de cinquenta minutos cada, e com a participação de 21 alunos. O objetivo central das atividades foi introduzir de forma lúdica os sentidos visão, tato, olfato, paladar e audição, e a relação destes com uma alimentação saudável. Como objetivos específicos: estimular a curiosidade, o desenvolvimento do pensamento crítico e a colaboração entre pares, para uma aprendizagem significativa. Na primeira aula, foi realizada uma introdução ao tema por meio de uma atividade diagnóstica e utilizamos como recursos um projetor multimídia para mostrar imagens de diferentes alimentos: frutas, verduras, arroz, feijão, pizza, sanduíches, refrigerantes, pastel entre outros. As mesmas imagens foram impressas em papel e os alunos marcaram os alimentos que mais consumiam de forma individual. Realizamos depois uma roda de conversa e colocamos as questões: “Quais desses alimentos você consome frequentemente?”, “Quais alimentos você mais gosta?”, “Quais as sensações que cada um desses alimentos causa em você?” A roda de conversa foi utilizada para estimular a oralidade, a participação de cada um e a interação entre o grupo. A cada imagem projetada os alunos reagiam com expressões: “nossa que fome”, “que delícia!”, “quero”, “eu gosto”. Conversamos sobre sensações, e questionamos quais eles sentiam quando visualizavam as imagens. As respostas foram: “cheiro”, “gosto na boca” da comida em questão. A análise das respostas individuais mostrou os alimentos mais consumidos por eles: pizza, macarrão, chocolate, coxinha, salgadinhos e refrigerantes. Finalizamos essa primeira atividade falando sobre memória afetiva, e relembrando os cinco sentidos que os mesmos já haviam estudado anteriormente, sempre de forma dialogada propiciando os relatos individuais. A atividade 1/ 2 sobre os sentidos, relacionamos a audição e a visão aos alimentos. Solicitamos aos alunos a observação atenta ouvindo o barulho do “crack” da mordida, ao som dos alimentos sendo picados, ralados, panela de pressão, líquido despejado no copo. A visão, diretamente relacionada em todos os momentos, ou seja, pelas imagens e pelas sensações causadas quando vemos belo bolo no balcão da padaria, as frutas em uma cesta, uma propaganda na televisão. 42 A próxima atividade foi desenvolvida utilizando como instrumento de aprendizagem a “Caixa dos Sentidos”, construída com materiais simples como a caixa de papelão decorada com e.v.a. colorido. Importante destacar que ela foi pensada com o objetivo de trabalhar os sentidos do corpo humano sobre a ótica apenas dos alimentos (sons, cheiro, textura) e não com o uso de outros materiais e objetos como podemos encontrar em outros trabalhos. Dentro da caixa (fechada com uma tampa) colocamos um elemento surpresa, para trabalhar os sentidos relacionando-os apenas aos alimentos, e cada aluno pode manusear para descobrir o que tinha dentro. A maioria dos alunos respondeu que tinha comida, pizza, pirulitos, doce, etc. Um aluno destampou a caixa e verificou que havia cinco copinhos iguais, não transparentes e tampados, com furo, conforme a Figura 4. Questionamos os alunos sobre qual dos sentidos iríamos trabalhar e todos responderam olfato, já que não era possível ver o que havia dentro dos copos. Após revelar com quais sentidos iríamos trabalhar a partir da resposta dos alunos, os copos foram colocados em uma mesa para observação. Cada aluno pôde fazer a experiência individualmente de vir até a mesa, cheirar e anotar na folha quais alimentos reconheceu apenas pelo olfato. Ao voltar para o lugar, podiam comentar com os pares o que haviam anotado, quais suas impressões, diferenças e semelhanças, enquanto aguardavam os demais realizarem a experiência. Figura 4 – Experimentação Olfato Fonte: Arquivo pessoal da autora (2019). Os alimentos que estavam dentro de cada um dos copos idênticos eram: cebola, canela, chocolate em pó, café e orégano. Os alunos conseguiram identificar a maioria dos alimentos/temperos. Porém, em alguns casos citaram o nome das marcas de temperos e de chocolate em pó. O que podemos evidenciar ao enraizamento da 43 propaganda e associação feita pelos alunos aos nomes. Também foi possível perceber que havíamos comentado sobre as memórias sensoriais, conforme a Figura 5, apresentamos o registro dos alunos dos alimentos identificados pelo olfato. Figura 5 – Registro dos alunos – alimentos identificados pelo olfato Fonte: Arquivo pessoal da autora (2019). É possível identificar como já citado a associação do olfato (cheiro do alimento) com o nome de marcas de produtos. O aluno colocou pontos de interrogação para o que não conseguiu descobrir, porém, logo em cima de um ponto, escreveu “arroz doce”, porque ao ser questionado se estava com dúvidas sobre aquele alimento, o aluno disse: “não sei o nome disse, mas sei que minha mãe coloca no arroz doce”. Ou seja, ele não soube no momento dizer que era canela, mas sua memória gustativa, que pode ser definida como: A memória gustativa pode ser definida como o sabor e/ou cheiro que desperta um fragmento de memória, ou seja, um estímulo capaz de resgatar inconscientemente um fato, acontecimento, sentimento ou pessoa. Ela resulta de alguma lembrança relacionada a uma comida, cheiro, aroma, sabor, textura que faz rememorar alguma situação passada. (GONZALEZ, 2016, p. 11). A importância do estímulo e dessa memória gustativa, no caso desse aluno, revelou o “cheiro” de um alimento preparado em casa pela mãe, ou seja, cheio de sentimento, carinho e outras sensações que podem ser resgatadas através da comida. Na semana seguinte, a caixa dos sentidos foi utilizada para explorar o tato. Nessa versão a caixa possuía um furo, pelo qual cada aluno podia colocar a mão dentro, e através do tato identificar qual era o alimento que estava dentro da mesma caixa. Os alimentos selecionados foram: kiwi, batata, maçã e pão. A escolha foi realizada para trabalhar as diferentes formas e texturas. O kiwi, uma fruta com 44 “pelinhos” em linguagem popular. A batata e a maçã pelos formatos curvos, e o pão por ser macio e fofinho. As reações dos alunos foram diversas, alguns sentiram arrepio, outros medo de colocar a mão, enquanto alguns já tiveram a curiosidade aguçada para descobrir o que era. Nesse momento, o registro foi feito coletivamente em um cartaz. Todos os alunos participaram e gostaram da atividade. Terminada a fase de identificação, realizamos algumas questões oralmente, como: Você conhece esses alimentos? Gosta de quais? Com que frequência você come cada um deles? Quais os nutrientes e como podemos classificá-los? As respostas foram feitas oralmente, o alimento mais desconhecido foi o kiwi, alguns já haviam visto, mas não tinham comido. Quanto aos nutrientes e classificação, os alunos foram divididos em duplas para pesquisa na sala de informática, retomando o conteúdo já trabalhado no primeiro bimestre em sala de aula. As Figuras 6 e 7 ilustram a realização da experimentação pelo tato e a anotação da aluna, respectivamente. Na Figura 6 a aluna está tentando identificar através do tato os alimentos que estão na caixa e falava em voz alta para que a colega (Figura 7) anotasse suas percepções. E assim foi feito com todos os alunos. Ao final, fizemos a socialização das respostas e o que as sensações e impressões sentidas durante essa experiência. Em seguida revelamos quais eram os alimentos. Esse momento gerou muitas Figura 6 – Experimentação Tato Figura 7 – Anotação da aluna Fonte: Arquivo pessoal da autora (2019). Fonte: Arquivo pessoal da autora (2019). 45 reações e discussões sobre quem tinha acertado, errado, um momento livre entre os pares e o grupo para essa interação. Para finalizar as atividades dos cinco sentidos faltava o paladar. A proposta nesse momento teve como objetivo que os alunos percebessem a degustação dos alimentos através do paladar; a importância de todos os sentidos no ato de comer; e as possibilidades de comer um alimento de diversas maneiras e novas receitas. Desse modo, contamos com o auxílio e participação da nutricionista Karina de Jesus Antonio, planejamos a execução de uma receita “disfarçada”, para que os alunos percebessem quais ingredientes continham. A receita escolhida foi o Cookie de Abobrinha, por dois motivos: primeiro, os alunos gostarem de cookies de chocolate, como apareceu no diagnóstico, assim como o alimento menos consumido por eles foi justamente a abobrinha. Os cookies foram preparados pela nutricionista Karina, com todos cuidados de higiene e conservação do alimento para levarmos para a escola. Dentro da caixa, os alunos não podiam ver o que havia dentro. Após algumas dicas, sentados em roda, mostramos o alimento que seria experimentado. Orientamos para que os alunos, ao pegarem o cookie na mão, explorassem o que haviam aprendido sobre os sentidos e a alimentação. Que cheirassem, percebessem a textura, antes de degustar, cores desse alimento e que falassem quais ingredientes notaram ou imaginavam que fazia parte dessa receita. Conforme os alunos foram falando oralmente os ingredientes, as respostas que mais apareceram foram: chocolate, massa de bolo pronta, leite condensado, farinha, raspas de limão e açúcar. Logo após, puderam degustar o cookie e gostaram muito, querendo até comer mais uma porção, e curiosos para saber quais os ingredientes reais da receita. O ato de comer esse alimento todos juntos no grupo, foi divertido e prazeroso para os alunos, colocamos em prática a comensalidade, que pode ser definida como o momento de partilha de alimentos (GONZALEZ, 2016). E o que nos diferencia dos animais em relação a prática da comensalidade é que atribuímos sentidos aos atos da partilha e eles se alteram com o tempo (CARNEIRO, 2005, p. 72). Em seguida, revelei aos alunos que a receita que eles haviam degustado era de um cookie de abobrinha com aveia. Para surpresa, às reações imediatas foram de “nojo”, alguns alunos até “incitaram vômito” como se tivessem comido algo muito ruim, sendo que haviam apreciado muito o alimento enquanto não sabiam a receita, ou acreditavam ser um cookie de chocolate. 46 Novamente, questionei-os sobre, perguntando oralmente: Vocês não gostaram dos cookies? Por que ao saber os ingredientes não gostaram mais? E fizemos uma reflexão sobre experimentar novos alimentos ou comer novamente aqueles que julgamos e não apenas dizer “não gosto”, “não quero”. A importância de usar todos os sentidos e apreciar a comida e também de perceber que o alimento é versátil e podemos prepará-los e consumi-los de diferentes formas. Figura 8 – Cookies de abobrinha Figura 9 – Degustação do cookie Fonte: Arquivo pessoal da autora (2019). Fonte: Arquivo pessoal da autora (2019). Encerramos as atividades dos cinco sentidos, juntamente com o ano letivo de 2019. Conforme previsão, a continuidade da pesquisa e das atividades em 2020, no 5º ano, fazendo a correlação entre o corpo humano, funcionamento dos sistemas e a alimentação. A atividade 3, conforme breve descrição no plano de aulas, relembramos as atividades da caixa, referente aos sentidos. Destaque para que os alunos lembraram com detalhes a experiência, principalmente a surpresa com o “Cookie de Chocolate”, que na verdade era de Abobrinha com aveia. Contaram com detalhes para o colega novo na turma, recém chegado por transferência. Os alunos conseguiram fazer conexões e observaram que o Caderno 1 de Ciências do Material do 1º Bimestre que iniciava o conteúdo do Corpo Humano retomando sobre a importância dos cinco sentidos, ou seja, houve uma aprendizagem significativa, pois os alunos conseguiram expressar o que sabiam sobre o assunto de maneira não-arbitrária, com qualquer ideia prévia, mas sim com 47 algum conhecimento especificamente relevante já existente na estrutura cognitiva do sujeito que aprende (MOREIRA, 2010, p. 2). Dando continuidade as atividades em sala de aula (atividade 3), os alunos divididos em duplas puderam trocar ideias e responder individualmente na folha algumas questões (APÊNDICE B), sendo elas: O que é ser saudável? Quais alimentos são saudáveis? E não saudáveis? Deixamos que os alunos respondessem livremente, o Quadro 9 evidencia as respostas dos alunos, para preservar a identidade, estão elencados por números, fazendo referência Aluno 1 (A1). Quadro 5 – O que é ser saudável? (continua) Alunos O que é ser saudável? Quais alimentos são saudáveis? E não saudáveis? A1 Comer frutas Arroz, feijão e bife Pizza, pastel A2 Tomar vitamina, comer frutas e legumes Cenoura, alface, brócolis, repolho, frutas Salgados, batatas fritas, salgadinhos, refrigerante e pizza A3 Comer de forma saudável e fazer exercícios, não ser sedentário Vegetais, legumes, frutas, carboidratos, verduras, tubérculos Refrigerantes, massas, doces, lanches e tudo de alto valor calórico A4 Se alimentar bem Arroz, feijão, alface, abóbora, repolho, brócolis, pepino, banana, maçã, manga, kiwi Hambúrguer, batata frita, sorvete, doces A5 Comer frutas, legumes, para não causar uma doença: obesidade Frutas e legumes: maçã, banana, brócolis Chocolate, balas, e tudo de alta caloria A6 Comer muita fruta, verdura, arroz e feijão todo dia Verdura, legumes e frutas. Como batata, tomate, alface, maçã, banana, mamão, laranja, berinjela Doces como o chocolate, pão de mel, pé-de-moleque, chiclete e doce de leite A7 É a pessoa que não fica doente Arroz, feijão, brócolis, pepino, mandioca, cenoura, beterraba, mamão etc...frutas Chocolates, pizza, doces como bala, chiclete 48 Quadro 5 – O que é ser saudável? (conclusão) Alunos O que é ser saudável? Quais alimentos são saudáveis? E não saudáveis? A8 Muito bom Maçã, pera, morangos, etc. Pastel, Hambúrguer, pizza e chiclete A9 Comer frutas e coisas boas Pera, maçã, alface, feijão e “kiwi” Ovo frito e doces A10 Ter boa saúde e alimentação Legumes, verduras, frutas e de vez em quando carnes Doces, gorduras e carboidratos A11 Comer as coisas saudáveis, se alimentar bem Cenoura, beterraba, quiabo... Chocolates e doces A12 Comer comida saudável Frutas, verduras e legumes Doces, gordura, refrigerante e carnes A13 Comer pepino, salada Pepino, alface, tomate Hambúrguer, doces A14 É se cuidar Tem vários alimentos saudáveis, mas para mim são: frutas e verduras Frituras, glúten e doces A15 Comer bem e fazer academia Maçã, banana, iogurte, verduras Comer muito doce, fritura e chocolates A16 É legal, é bom “Não comer salgadinho e chocolate” Chocolate, lanche, refrigerante, brigadeiro, salgadinho A17 Comer coisas que faz bem a saúde Frutas Doces A18 Comer coisas boas Verduras, arroz, feijão e frutas Coisas com gordura A19 Se alimentar bem, não comer muito doces, dormir e beber bastante água Mamão, beterraba, cenoura, feijão, arroz, brócolis e batata Doces A20 -------------------------- Arroz, feijão, maçã Alho e vinagre Fonte: Elaborado pela autora. Como pode-se observar pelas respostas dos alunos através do Quadro 9, no geral, compreendem e sabem diferenciar os alimentos saudáveis e não saudáveis. 49 Os alunos A3 e A 15 incluíram a importância dos exercícios físicos (academia), e não ser “sedentário”, como hábito saudável. Aluno A19, incluiu dormir e “beber bastante água”. Alimentos saudáveis, elencaram frutas, verduras e legumes, na maioria das vezes citando nomes de algumas delas. Em relação aos alimentos não saudáveis, aparecem termos como: alto valor calórico, carboidratos, glúten e gorduras. Após os alunos responderem, socializamos as respostas oralmente, e no momento, por condições de internet, fizemos uma pesquisa conjunta e colaborativa, apresentada em lousa digital, sobre a definição sobre o que é ser saudável de acordo com a Constituição da Organização Mundial da Saúde (OMS), sendo um conceito de saúde mais abrangente, considerando o bem-estar físico, mental e emocional e não apenas ausência de doenças (OMS, 1946). A partir dessa definição, após a leitura, a aluna A7 levantou a mão e disse: “professora, o meu tá errado eu coloquei que ser saudável é só não ter nenhuma doença”. Nesse momento a própria aluna conseguiu fazer uma reflexão a partir do seu pensamento e da nova aprendizagem por meio da leitura do texto e a apropriação de novos conceitos e definições, bem como do que é a OMS, desconhecida pelos alunos até esse momento. Durante as discussões, os alunos também tiveram acesso ao conhecimento do Guia Alimentar para a População Brasileira e breve explanação sobre seu conteúdo e apresentação do vídeo dos “10 passos para uma alimentação saudável”, do Ministério da Saúde. A partir desse momento, conforme já descrito, por conta da Pandemia do Novo Coronavírus, a Covid-19, tivemos uma interrupção das atividades e coleta dos dados por conta da suspensão das aulas. Após readaptação e retomada do contato com os alunos, analisamos as condições pertinentes aos sujeitos da pesquisa quanto ao acesso a internet, participação da família e colaboração nas atividades escolares, para prosseguir com a pesquisa de forma remota, com atividades síncronas e assíncronas, utilizando como meio de comunicação aplicativo Whatsapp e o Google Meet. A atividade 4 envolveu os alunos e principalmente seus pais ou responsáveis, visto que, inicialmente, estávamos analisando a alimentação sobre uma percepção da realidade escolar, e agora, diante da nova realidade, estava direcionada para a casa. Portanto, se fez necessário, além da aproximação e acolhimento, entender as 50 necessidades, dificuldades, a realidade dos alunos naquele momento, segundo (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2018), é preciso pensar sobre quem é esse aluno e sua família, nesse caso, em relação a alimentação e a rotina da casa. Enviamos pelo Whatsapp um formulário com sete perguntas direcionadas para os pais e responsáveis. Iniciamos um processo de engajamento e letramento digital dos mesmos, por meio de um pequeno tutorial explicativo sobre como abrir o link e responder a pesquisa. Listamos abaixo os gráficos com as perguntas e resultados obtidos pelas respostas de 13 pais/responsáveis. A Figura 10 apresenta as principais dificuldades sentidas no período da quarentena. Figura 10 – Dificuldades sentidas na quarentena Fonte: Elaborada pela autora. De acordo com as respostas desses pais/responsáveis, o medo de ser infectado pelo vírus e a auxiliar os filhos nas atividades escolares obteve a mesma porcentagem de votos (38,5%) relatados como as principais dificuldades. 51 Figura 11 – Aumento do consumo de comida na pandemia Fonte: Elaborada pela autora. O aumento do consumo de comida com os filhos, provavelmente se deve a família reunida por mais tempo em casa. Figura 12 – Alimentos mais consumidos na casa Fonte: Elaborada pela autora. Para esta pergunta, diante das respostas, o básico da alimentação como o arroz, feijão, ovos e leite é consumido pela maioria das famílias, seguido de carnes e massas. E em relação às frutas, verduras e legumes, não aparece como alimen