UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS Curso de Graduação Farmácia-Bioquímica ANA CLAUDIA BRAGA DIAS DIFERENÇAS SEXUAIS EM RESPOSTAS RELACIONADAS AOS COMPONENTES SENSORIAIS E AFETIVOS EMOCIONAIS DA DOR CRÔNICA EM CAMUNDONGOS SUBMETIDOS AO ISOLAMENTO SOCIAL Araraquara, SP 2023 ANA CLAUDIA BRAGA DIAS DIFERENÇAS SEXUAIS EM RESPOSTAS RELACIONADAS AOS COMPONENTES SENSORIAIS E AFETIVOS EMOCIONAIS DA DOR CRÔNICA EM CAMUNDONGOS SUBMETIDOS AO ISOLAMENTO SOCIAL Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Farmácia Bioquímica da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Araraquara, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, para obtenção do grau de Farmacêutica Bioquímica. Orientador: Prof. Dr. Ricardo Luiz Nunes de Souza Coorientadora: Dra. Daniela Baptista de Souza Araraquara, SP 2023 Diretoria do Serviço Técnico de Biblioteca e Documentação – Faculdade de Ciências Farmacêuticas UNESP Campus de Araraquara Dias, Ana Claudia Braga. D541d Diferenças sexuais em respostas relacionadas aos componentes sensoriais e afetivos emocionais da dor crônica em camundongos submetidos ao isolamento social / Ana Claudia Braga Dias. – Araraquara: [s.n.], 2023. 44 f. : il. Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação – Farmácia Bioquímica) – Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. Faculdade de Ciências Farmacêuticas. Orientador: Ricardo Luiz Nunes de Souza. Coorientadora: Daniela Baptista de Souza. 1. Dor crônica. 2. Isolamento social. 3. Diferenças sexuais. I. Souza, Ricardo Luiz Nunes de, orient. II. Souza, Daniela Baptista de, coorient. III. Título. Esta ficha não pode ser modificada DEDICATÓRIA A minha família, meus pais e irmão que me incentivaram e apoiaram durante toda a minha jornada, torcendo e celebrando cada uma das minhas vitórias. Dedicar esse trabalho a vocês é meu agradecimento por sempre acreditarem em mim. AGRADECIMENTOS A Deus, por me ajudar a enfrentar todos os desafios e obstáculos ao longo do curso. A minha família, meu pai José Cláudio e meu irmão José Henrique por todo o apoio e carinho, mas em especial agradeço a minha mãe Ana Maria, é por causa do seu esforço que consegui alcançar os meus objetivos, ela sempre acreditou em mim e me incentivou, espero um dia conseguir retribuir todo o seu esforço. Muito obrigada também à Simone e ao Ricardo, que em conjunto com a minha família me auxiliaram nesta jornada. Aos meus amigos, por causa de vocês, viver em Araraquara se tornou mais fácil, obrigada pela cumplicidade e pelas risadas, vou levar vocês sempre no coração. Um agradecimento especial também a Anna Beatriz, uma amiga que infelizmente o destino levou de nós, mas tenho certeza de que você está em um lugar bem melhor torcendo por todos. A Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Araraquara, todos os seus funcionários e professores, que ajudaram no meu crescimento pessoal e profissional. Levo com carinho também os projetos de extensão que fizeram parte da minha graduação, um agradecimento especial a AFEP, PAFE e a UniverSoja. Aos membros do laboratório de Neuropsicofarmacologia, obrigada por toda a ajuda durante o desenvolvimento do meu projeto. Agradeço especialmente ao meu orientador Prof. Dr. Ricardo Luiz Nunes de Souza, a minha coorientadora Dra. Daniela Baptista de Souza e a minha parceira de experimentos Silvia Cardenas, obrigada por todo o apoio e incentivo, tornando possível o desenvolvimento deste trabalho. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) edital nº4/2022 6366 pelo apoio financeiro. E por fim, agradeço a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) processo nº 2022/12932-4 pelo auxílio financeiro ao projeto. RESUMO Os quadros de dor crônica apresentam alta prevalência mundial, afetando em maior proporção indivíduos do sexo feminino. Experimentar uma ameaça social elevada pode manter e exacerbar dores crônicas. Além disso, os quadros de dores crônicas são constantemente relacionados com psicopatologias, desencadeando nos diferentes sexos alterações progressivas emocionais e de humor, como ansiedade e comportamentos do tipo depressivo. Desta forma, o estudo tem como objetivo avaliar alterações nas respostas dolorosas e nos componentes afetivos emocionais de camundongos fêmeas e machos que foram submetidos ao estresse do isolamento social. Para realizar essa investigação, a constrição do nervo isquiático foi utilizada como modelo para a indução de dor crônica nos animais; o teste de Von Frey para avaliar a hipersensibilidade mecânica e a escala facial de dor como um parâmetro para a quantificação de aspectos afetivos da dor. O teste de labirinto em cruz elevado foi utilizado para a análise das respostas associadas com ansiedade; e o teste de esguicho de sacarose, construção de ninho, ganho de peso e estado da pelagem para avaliação de comportamentos relacionados à depressão. Os resultados demonstraram que a constrição do nervo isquiático e o isolamento social foram capazes de induzir hiperalgesia mecânica e aumento de respostas relacionadas à ansiedade e à depressão nos camundongos fêmeas e machos. Quanto ao dimorfismo sexual, foi observado que apenas as fêmeas apresentaram aumento na expressão facial de dor, piora no estado da pelagem e prejuízo na construção do ninho quando alojadas individualmente. Demonstrando assim que o isolamento social é capaz de induzir alterações comportamentais sexualmente dimórficas em animais submetidos à constrição do nervo isquiático. Palavras-chave: dor crônica; isolamento social; diferenças sexuais. ABSTRACT Chronic pain conditions have a huge worldwide prevalence, affecting women in a higher proportion. The experience of high social stress can maintain and exacerbate chronic pain. In addition, there is a relevant correlation between chronic pain and psychopathologies, triggering progressive emotional and mood changes sex- dependent, such as anxiety and depressive-like behaviors. The study aims to evaluate changes in pain responses and emotional affective components in female and male mice that have been subjected to the stress of social isolation. For the investigation, sciatic nerve constriction was used as a model for the induction of chronic pain in mice; the Von Frey test was used to assess mechanical hypersensitivity and the facial pain scale was used as a parameter for the quantification of affective aspects of pain. Moreover, the elevated plus maze test was used to analyze responses associated with anxiety; the sucrose splash test and nest building test were used to assess depression- related behaviors. The results showed that constriction of the sciatic nerve and social isolation were able to induce mechanical hyperalgesia and increased anxiety- and depression-like responses in female and male mice. Regarding sexual dimorphism, it was observed that only females showed an increase in the facial expression of pain, a worsening coat state, and impaired nest building when housed individually. These results demonstrate that social isolation can induce sexually dimorphic behavioral changes in animals subjected to sciatic nerve constriction. Keywords: chronic pain; social isolation; sexual differences. LISTA DE FIGURAS Figura 1- Aparato Von Frey................................................................................... 18 Figura 2- Microfilamentos de Von Frey ................................................................. 18 Figura 3- Labirinto em Cruz Elevado .................................................................... 19 Figura 4- Representação escore de construção de ninho .................................... 20 Figura 5- Esquema representativo dos grupos experimentais .............................. 21 Figura 6- Esquema representativo do protocolo experimental ….......................... 22 Figura 7- Avaliação hiperalgesia mecânica - Fêmeas …...................................... 23 Figura 8- Avaliação hiperalgesia mecânica - Machos ........................................... 24 Figura 9- Avaliação expressão facial de dor - Fêmeas ......................................... 25 Figura 10- Avaliação expressão facial de dor - Machos ....................................... 26 Figura 11- Avaliação exploração aos braços do LCE - Fêmeas …....................... 27 Figura 12- Avaliação exploração aos braços do LCE - Machos ........................... 28 Figura 13- Avaliação comportamento de autolimpeza - Fêmeas ......................... 29 Figura 14- Avaliação comportamento de autolimpeza - Machos …...................... 30 Figura 15- Avaliação qualidade da construção de Ninho - Fêmeas ….................. 31 Figura 16- Avaliação qualidade da construção de Ninho - Machos ...................... 31 Figura 17- Avaliação estado da pelagem - Fêmeas ............................................. 32 Figura 17- Avaliação estado da pelagem - Machos .............................................. 33 Figura 19- Avaliação ganho de peso - Fêmeas .................................................... 33 Figura 20- Avaliação ganho de peso - Machos .................................................... 34 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS CCI Constrição Nervo Isquiático CEUA Comitê de Ética no Uso de Animais CONCEA Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal DPN Dias Pós-Natal EBA Entrada Braços Abertos EBF Entrada Braços Fechados FCFar Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Araraquara IASP Associação Internacional para o Estudo da Dor LCE Labirinto em Cruz Elevado TBA Tempo Braços Abertos Unesp Universidade Estadual Paulista SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 13 2 JUSTIFICATIVA .................................................................................................... 16 3 OBJETIVO ............................................................................................................ 16 3.1 Objetivos específicos ...................................................................................... 16 4 MATERIAL E MÉTODOS ...................................................................................... 16 4.1 Animais ........................................................................................................... 16 4.2 Constrição Crônica do Nervo Isquiático (CCI) ................................................. 17 4.3 Avaliação de hiperalgesia mecânica (Teste de Von Frey) ............................... 17 4.4 Escala Facial de Dor para camundongos ........................................................ 18 4.5 Teste Labirinto em Cruz Elevado (LCE) .......................................................... 18 4.6 Teste do Esguicho de Sacarose ..................................................................... 19 4.7 Teste de Construção do Ninho (Nesting Building) ........................................... 19 4.8 Avaliação do Estado da Pelagem ................................................................... 20 4.9 Avaliação do Ganho de Peso .......................................................................... 21 4.10 Procedimento experimental .......................................................................... 21 4.12 Análise Estatística ......................................................................................... 22 5 RESULTADOS ...................................................................................................... 22 6 DISCUSSÃO ......................................................................................................... 34 7 CONCLUSÃO ....................................................................................................... 40 REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 41 ANEXO A – Escala Facial de Dor para camundongos ............................................. 46 13 1 INTRODUÇÃO A pandemia da COVID-19 causada pelo vírus SARS-CoV-2 mudou a maneira com que as pessoas se relacionam e convivem em sociedade, sendo o distanciamento físico uma forma eficaz encontrada para desacelerar a disseminação da COVID-19 (YIP; CHAU, 2020). Neste sentido, as mudanças sociais provocadas pela COVID-19 afetaram indivíduos que vivem em condições dolorosas a longo prazo (KAROS et al., 2020). A dor pode ser definida como “uma experiência sensorial e emocional desagradável associada, ou semelhante àquela associada, a uma lesão tecidual real ou potencial” (IASP [...], 2020). A dor crônica é aquela que persiste ou recorre por mais de 3 meses, é multifatorial, sendo influenciada por fatores biológicos, psicológicos e sociais (TREEDE et al., 2019). Sob esse aspecto, experimentar uma ameaça social elevada pode manter e exacerbar dores crônicas (KAROS et al., 2018). Os quadros de dor crônica possuem alta prevalência mundial. Estima-se que 25% dos adultos sofrem de dor crônica, e que outros 10% são diagnosticados com a patologia a cada ano. Observa-se ainda que a prevalência geral da dor crônica é maior no sexo feminino que no masculino (CARVALHO et al., 2018). Diversos estudos mostram que as mulheres apresentam taxas mais altas de dor e estresse pós- traumático em comparação aos homens. No entanto, observa-se que a grande maioria dos estudos pré-clínicos (79%) utiliza machos como sujeitos experimentais. Desta forma, a exclusão de fêmeas dos experimentos pré-clínicos levou ao desenvolvimento de terapias que possuem alvos e processos identificados apenas em machos (BURMA et al., 2017; LINHER-MELVILLE; SHAH; SINGH, 2020). Outro aspecto importante do ponto de vista epidemiológico relaciona-se às taxas de comorbidade de quadros de dores crônicas com psicopatologias, principalmente relacionadas aos transtornos afetivos. Neste aspecto, estima-se que 20-40% dos pacientes com dor crônica apresentam juntamente com a patologia quadros de ansiedade e depressão (BURMA et al., 2017). O transtorno depressivo maior é caracterizado principalmente por sentimentos persistentes de tristeza, anedonia, diminuição de apetite, energia e sono, enquanto o transtorno de ansiedade, em especial o transtorno de ansiedade generalizada, é caracterizado por preocupação generalizada ou excessiva, interferindo nas atividades diárias, no sono e na concentração do indivíduo (TILL; AS-SANIE; SCHREPF, 2019). Ademais, estudos 14 evidenciam uma maior prevalência de ansiedade e depressão como comorbidade com dor crônica em mulheres do que em homens (TSANG et al, 2008). Adicionalmente, na literatura existem evidências demonstram que o isolamento social é capaz de interferir em respostas nociceptivas em estudos com animais (PUGLISI-ALLEGRA; OLIVERIO, 1983) e com humanos (KARAYANNIS et al., 2019; SMITH et al., 2019). Além disso, do ponto de vista experimental, sob o aspecto das diferenças sexuais, estudos apontam que fêmeas são mais suscetíveis a comportamentos semelhantes à ansiedade quando induzidas à dor crônica (SIEBERG et al, 2018). Embora, ainda não são descritas na literatura evidências que apontem se o isolamento social é capaz de promover efeitos comportamentais que diferem a depender do sexo do sujeito experimental. Uma importante ferramenta para indução de dor crônica em roedores é a constrição crônica do nervo isquiático, modelo de dor neuropática desenvolvido por Bennett e Xie (1988). A aplicação deste método resulta no desenvolvimento de comportamentos semelhantes a alodinia, hiperalgesia e comportamentos semelhantes a dor espontânea, que atingem o pico máximo 10-14 dias após a cirurgia (CHALLA, 2015). Após o procedimento cirúrgico, são verificadas alterações no comportamento afetivo que persistem por 15-30 dias (SUZUKI et al., 2007). Estes achados reforçam que este procedimento experimental é capaz de induzir dor crônica e alterações progressivas de humor, incluindo ansiedade e comportamentos do tipo depressivo (GONZÁLEZ-SEPÚLVEDA et al., 2016), assemelhando-se aos quadros que acometem humanos. Considerando que a experiência da dor envolve diversos aspectos, tanto físicos quanto emocionais, para análise desses componentes um dos testes utilizados é o teste de Von Frey, que auxilia na determinação da hiperalgesia mecânica, avaliando a presença e aumento de comportamento aversivo nos roedores em resposta a aplicação de um estímulo mecânico (DEUIS; DVORAKOVA; VETTER, 2017). O outro teste utilizado é a Escala Facial de Dor para camundongos, desenvolvida por Langford et al. (2010a), avaliando aspectos afetivos da dor. Nessa escala são observadas alterações na expressão facial dos animais em cinco principais regiões, sendo elas o estreitamento orbital, a protuberância nasal e da bochecha, o posicionamento das orelhas e alteração nas vibrissas. A quantificação da dor observada é realizada por meio de uma escala que varia entre a classificação de dor não visível e dor obviamente visível. 15 O Labirinto em Cruz Elevado (LCE) é uma ferramenta utilizada para análise de comportamentos do tipo ansioso (LISTER, 1987). Este modelo é baseado na preferência dos roedores por espaços escuros e fechados, e aversão ao incondicionado por altura e espaços abertos. O LCE é caracterizado por uma plataforma em formato de cruz elevada, composta por dois braços abertos e dois fechados. O comportamento do tipo ansioso é avaliado através da exploração do animal aos braços abertos, refletindo entre a motivação inata dos roedores para explorar ambientes novos, e sua preferência por áreas protegidas (WALF; FRYE, 2007). Para análise dos comportamentos do tipo depressivo, foram utilizados os testes de Esguicho de Sacarose, Construção de Ninho (Nesting Building), análise da Condição da Pelagem e Peso. O Teste do Esguicho de Sacarose avalia o comportamento de autolimpeza do animal (grooming). Por ser uma solução viscosa, a sacarose borrifada na pelagem do animal leva a um comportamento de autolimpeza, o qual serve como índice para avaliar o autocuidado e o comportamento motivacional dos animais, já que ao consumir a solução adocicada o animal sentiria prazer (ISINGRINI et al., 2010). A avaliação do estado da pelagem também é utilizada como um índice de autocuidado, a deterioração do estado da pelagem pode estar relacionada com uma diminuição de cuidados de higiene, um comportamento observado em animais com perfil do tipo depressivo (SURGET; BELZUNG, 2009). Além disso, a construção do ninho para pequenos roedores é importante para a conservação de temperatura, reprodução e abrigo contra predadores (DEACON, 2006). Estudos demonstram relação entre o prejuízo na construção do ninho a comportamentos de apatia em animais com perfil comportamental do tipo depressivo (PLANCHEZ; SURGET; BELZUNG, 2019). Adicionalmente, a depressão está constantemente associada a alterações de peso, sendo perda ou ganho significativo de peso um dos critérios para o diagnóstico de transtorno depressivo maior segundo o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5). Para isso, a pesagem regular dos camundongos permite a análise do potencial perda/ganho, ou a relativa falta/aumento de ganho de peso (PLANCHEZ; SURGET; BELZUNG, 2019). 16 2 JUSTIFICATIVA Considerando as evidências apontadas acima, o estudo se mostra pertinente visto a importância de investigar quais seriam as alterações sobre as respostas perceptivas discriminativas e dos componentes afetivos-emocionais de camundongos de diferentes sexos submetidos ao isolamento social. Desta forma, a investigação busca avaliar o impacto do isolamento social sobre os animais, analisando alterações em suas respostas dolorosas e nos componentes afetivos-emocionais, com destaque para respostas relacionadas com ansiedade e depressão, e se haveriam diferenças sexuais que seriam observadas quando analisado esses componentes. 3 OBJETIVO O estudo tem como objetivo avaliar alterações nas respostas dolorosas e nos componentes afetivos emocionais de camundongos fêmeas e machos submetidos à constrição do nervo isquiático e ao isolamento social. 3.1 Objetivos específicos - Avaliar respostas de hiperalgesia mecânica e expressão facial de dor induzida pela constrição do nervo isquiático em camundongos fêmeas e machos submetidos ao estresse de isolamento social. - Avaliar possíveis alterações nos componentes afetivos e emocionais da dor crônica, através de testes utilizados para analisar respostas relacionadas com ansiedade e depressão de camundongos submetidos ao estresse de isolamento social. 4 MATERIAL E MÉTODOS 4.1 Animais Foram utilizados 88 camundongos heterogênicos fêmeas e machos da linhagem Swiss-Webster, com 21 dias pós-natal (DPN) provenientes do biotério central da Universidade Estadual Paulista, UNESP. Os animais foram mantidos em condições controladas de temperatura (23 ± 2 °C), ciclo de luz 12h/12h (luzes acesas às 7:00h) e tiveram livre acesso ao alimento e à água, exceto durante os períodos de teste. Os experimentos foram iniciados mediante aprovação prévia pelo Comitê de 17 Ética no Uso de Animais (CEUA) da Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Araraquara (FCFAr) da UNESP (Protocolo: CEUA/FCF/CAr 07/2022), e foi conduzido conforme os princípios do Conselho Nacional de Controle de Experimentação Animal (CONCEA). 4.2 Constrição Crônica do Nervo Isquiático (CCI) Foi utilizado o método estabelecido por Bennett e Xie (1998) para a reprodução do modelo de dor neuropática. Sob anestesia com isoflurano (concentração de indução de 4-5% + 0,8-1 L/min e concentração de manutenção de 2-3% + 0,8-1 L/min), é realizada uma incisão na fáscia entre o glúteo e o bíceps femoral direito dos animais, expondo o nervo isquiático próximo a sua trifurcação. O tecido ao redor do nervo é cuidadosamente cortado a uma distância de aproximadamente 8 mm, realizando a compressão do nervo através de três ligaduras com fio estéril não inflamatório mononylon 6.0. Os animais do grupo SHAM passam pelo mesmo procedimento de exposição do nervo descrito acima, porém o nervo não é constrito. 4.3 Avaliação de hiperalgesia mecânica (Teste de Von Frey) Para o teste de Von Frey, os animais são colocados em caixas de acrílico transparente, com fundo composto por uma malha de arame vazado, que permite o acesso as suas patas. Após o período de 30 minutos, tempo necessário para a habituação dos animais no aparato, são aplicados microfilamentos de Von Frey de forças variáveis em ordem crescente na superfície plantar da pata traseira direita do animal, com força suficiente para causar uma leve curvatura. Ao todo foram realizadas um total de 5 aplicações com aproximadamente 6-8 segundos cada. No teste são consideradas respostas positivas quando o animal exibe comportamentos nocifensivos, como a retirada brusca da pata, e agitação da pata após a retirada do microfilamento (DEUIS; DVORAKOVA; VETTER, 2017). Para avaliação é utilizado o cálculo estabelecido por Chaplan e seus colaboradores (1994), que normaliza os registros obtidos durante o teste em um único valor para o limiar de retirada da pata em gramas. 18 Figura 1. Aparato Von Frey. Fonte: autoria própria Figura 2. Microfilamentos de Von Frey. Fonte: autoria própria 4.4 Escala Facial de Dor para camundongos A escala facial de dor para camundongos foi desenvolvida por Langford et al. (2010a), sendo utilizada para quantificação de aspectos afetivos da dor. Para avaliação, são considerados aspectos como o estreitamento orbital, a protuberância nasal e da bochecha, o posicionamento das orelhas e alteração nas vibrissas. Após a análise desses aspectos os animais são classificados em (0) ausente/não visível; (1) dor moderadamente presente; (2) dor obviamente presente (ANEXO A). 4.5 Teste Labirinto em Cruz Elevado (LCE) Conforme modelo descrito por Lister (1987), o LCE é uma plataforma em formato de cruz elevada a 38,5 cm do solo, que possui dois braços fechados nas laterais por vidro transparente (30 x 5 x 15 cm) e dois braços abertos (30 x 5 x 0,25 cm), dispostos perpendicularmente e interligados por uma plataforma central (5 x 5 cm). No teste, os animais são colocados no centro da plataforma com a cabeça voltada para um dos braços abertos e podem explorar livremente o aparato por um 19 intervalo de 5 minutos. As sessões são gravadas por um sistema de filmagem e posteriormente analisadas no software "X-plo-Rat 2005", desenvolvido pelo grupo de pesquisa do laboratório do Dr. Silvio Morato, da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, em Ribeirão Preto-Brasil (o software pode ser baixado livremente em http://Scotty.FFCLRP.USP.br/X-plo-Rat.html) (TEJADA et al., 2018). Durante o teste são mensuradas as respostas de porcentagem do número de entrada e do tempo gasto pelos animais nos braços abertos, e de locomoção, através do registro da frequência de entradas nos braços fechados. Figura 3. Labirinto em Cruz Elevado. Fonte: autoria própria 4.6 Teste do Esguicho de Sacarose O teste de esguicho de sacarose consiste em esguichar uma solução de sacarose a 10% no dorso dos animais, avaliando seu comportamento de autolimpeza (grooming) (ISINGRINI et al., 2010). Para o teste, os camundongos são colocados individualmente em uma caixa de vidro (30 x 21 x 24,5 cm), com 10 minutos para habituação. As sessões são gravadas e duram 5 minutos a partir do primeiro comportamento de grooming apresentado após a aplicação da solução de sacarose 10%. Os vídeos são analisados pelo software X-plot-Rat, sendo obtidos os índices de frequência e o tempo de grooming, além da latência apresentada para início do comportamento de grooming. 4.7 Teste de Construção do Ninho (Nesting Building) O protocolo utilizado para realização do teste é baseado no estudo desenvolvido por Nollet, Le Guisquet e Belzung (2013). Inicialmente os animais são http://scotty.ffclrp.usp.br/X-plo-Rat.html http://scotty.ffclrp.usp.br/X-plo-Rat.html 20 isolados em caixas moradia e submetidos a 24 horas de habituação com um retângulo de algodão (43g, Marca Comercial: Needs®). Passado o período de habituação, o algodão é trocado por um novo, e após mais 24 horas são feitas avaliações para classificação da qualidade do ninho construído. A avaliação é realizada pelo seguinte escore, em que o camundongo: (1) não interagiu com o ninho de algodão, que está intacto; (2) interagiu parcialmente o ninho de algodão; (3) espalhou o algodão, mas não há ninho; (4) juntou o algodão para formar um ninho plano; (5) juntou o algodão para formar um ninho "confortável" com paredes e uma pequena entrada. Figura 4. Representação escore de construção de ninho. Imagem A: escore 1. Imagem B: escore 2. Imagem C: escore 3. Imagem D: escore 4. Imagem E: escore 5. Fonte: autoria própria. 4.8 Avaliação do Estado da Pelagem Para avaliação do estado da pelagem realizou-se uma adaptação do protocolo estabelecido por Nollet, Le Guisquet e Belzung (2013). Foi observado o estado da pelagem dos camundongos em diferentes regiões do corpo, incluindo a cabeça, pescoço, costas, abdome e cauda, e para cada uma dessas regiões foi atribuído um 21 escore para o estado de pelagem que pode ser: (0) bom, pelo liso e brilhante, sem pelos desgrenhados e espetados; (0.5) moderadamente ruim, encontram-se algumas partes espetadas no pelo do animal; (1) ruim, o pelo possui uma aparência suja e manchada com muitas partes espetadas. 4.9 Avaliação do Ganho de Peso Para avaliação do ganho de peso aferiu-se o peso dos animais em dois diferentes momentos, a saber: previamente a realização da cirurgia de constrição do nervo isquiático, e após 11 dias do procedimento cirúrgico. Para tal, foi utilizada uma balança semi analítica com precisão de 0,001g (PLANCHEZ; SURGET; BELZUNG, 2019). 4.10 Procedimento experimental O protocolo experimental iniciou-se com a chegada dos animais ao biotério (com aproximadamente 21 DPN), onde foi realizada a distribuição dos animais de acordo com o tipo de alojamento em que cada um foi submetido, se isolado ou em grupo, e a condição cirúrgica, se sob constrição do nervo isquiático (CCI) ou não (SHAM). Figura 5. Esquema representativo dos grupos experimentais. CCI: grupo que passou pela constrição crônica do nervo isquiático. SHAM: grupo controle da cirurgia. Imagem criada com BioRender. Após 6 semanas de isolamento, quando atigem a idade adulta com 63 DPN (LAVIOLA et al., 2003), os animais foram avaliados pelo teste de Von Frey, Escala Facial de Dor, Estado da Pelagem e Peso, para os registros das medidas basais. Na sequência, o grupo de animais CCI foi submetido a cirurgia para constrição do nervo isquiático, e outro grupo denominado “SHAM” passou pelo mesmo procedimento cirúrgico, porém não foi realizada a constrição do nervo isquiático. Após o 22 procedimento, os animais foram acompanhados por 10 dias (período necessário para a instalação do quadro de dor crônica), para então serem expostos as avaliações comportamentais dos componentes sensitivos e afetivos emocionais, conforme discriminado na figura 6. Figura 6. Esquema representativo do protocolo experimental. CCI: grupo que passou pela constrição crônica do nervo isquiático. SHAM: grupo controle da cirurgia. Imagem criada com BioRender. 4.12 Análise Estatística Os dados foram analisados através da ANOVA de duas vias (fator 1: condição; fator 2: tipo de alojamento), e ANOVA de duas vias para medidas repetidas, para os testes de Von Frey, Escala Facial de Dor, Avaliação do Estado da Pelagem e Peso. Nos casos de significância, as análises foram seguidas pelo teste de comparações múltiplas de Duncan. Os valores de p menores ou iguais a 0,05 foram considerados como significativos. Para as análises dos escores obtidos na avaliação da qualidade de construção do ninho foi utilizado teste não paramétrico de Mann-Whitney. 5 RESULTADOS A análise dos resultados obtidos no teste de Von Frey das fêmeas pela ANOVA de duas vias para medidas repetidas revelou efeitos para os fatores: tipo de alojamento (F(1,39)=6.70 P<0.05), condição (F(1,39)=7.36 P<0.05), interação entre os 23 fatores tipo de alojamento e condição (F(1,39)=6.78 P<0.05), dia (F(1,39)=77.85 P<0.05) e interação entre os fatores dia e tipo de alojamento (F(1,39)=5.30 P<0.05). A análise post hoc Duncan revelou que as fêmeas dos grupos CCI-GRUPO, SHAM-ISOLADO e CCI-ISOLADO possuem menores limiares de retirada da pata após o procedimento cirúrgico quando comparado aos seus respectivos grupos nas condições basais. Além disso, após a cirurgia também foi demonstrado que os animais submetidos à cirurgia de constrição do nervo isquiático e alojados em grupo possuem menores limiares de retirada da pata em comparação àqueles do grupo SHAM alojados na mesma condição, demonstrando a presença de hiperalgesia mecânica induzida pela constrição do nervo isquiático. Na pós cirurgia, também foi observado que as fêmeas SHAM isoladas possuem menores latências de retirada da pata quando comparado às fêmeas na mesma condição alojadas em grupo. (Figura 7) Figura 7. Avaliação da hiperalgesia mecânica avaliada no Von Frey expressa pela pressão necessária para retirada da pata (n= 9-13/GRUPO) em camundongos fêmeas. As barras representam as médias e o erro padrão da média (M+EPM). *P < 0,05 comparado ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento. #P < 0,05 comparado ao grupo de animais na mesma condição alojados em grupo. &P < 0,05 comparado ao respectivo grupo na condição basal. Para os machos, a análise dos resultados do teste de Von Frey pela ANOVA de duas vias para medidas repetidas também revelou efeitos para os fatores: tipo de alojamento (F(1,40)=6.83 P<0.05), condição (F(1,40)=6.73 P<0.05), interação entre os fatores tipo de alojamento e condição (F(1,40)=4.28 P<0.05) e dia (F(1,40)=71.46 P<0.05). A análise post hoc Duncan revelou também para os machos que os grupos CCI-GRUPO, SHAM-ISOLADO e CCI-ISOLADO possuem menores limiares de retirada da pata após o procedimento cirúrgico quando comparado aos seus 24 respectivos grupos nas condições basais. Além disso, após a cirurgia também foi demonstrado que os animais submetidos à cirurgia de constrição do nervo isquiático e alojados em grupo possuem menores limiares de retirada da pata em comparação àqueles do grupo SHAM alojados na mesma condição, demonstrando a presença de hiperalgesia mecânica induzida pela constrição do nervo isquiático. E igualmente as fêmeas, também foi observado que os machos SHAM isolados possuem menores latências de retirada da pata quando comparado aos camundongos na mesma condição alojados em grupo (Figura 8). Figura 8. Avaliação da hiperalgesia mecânica avaliada no Von Frey expressa pela pressão necessária para retirada da pata (n= 9-12/GRUPO) em camundongos machos. As barras representam as médias e o erro padrão da média (M+EPM). *P < 0,05 comparado ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento. #P < 0,05 comparado ao grupo de animais na mesma condição alojados em grupo. &P < 0,05 comparado ao respectivo grupo na condição basal. Para os resultados obtidos com a avaliação da expressão facial de dor das fêmeas a ANOVA de duas vias para medidas repetidas revelou significância para os fatores: tipo de alojamento (F(1,39)=7.54 P<0.05), dia (F(1,39)=56.73 P<0.05), e interação entre os fatores dia e tipo de alojamento (F(1,39)=7.65 P<0.05), e dia e condição (F(1,39)=7.65 P<0.05). A análise post hoc Duncan revelou que as fêmeas dos grupos CCI-GRUPO, SHAM-ISOLADO e CCI-ISOLADO possuem maiores escores de expressão facial de dor após o procedimento cirúrgico quando comparada aos seus respectivos grupos nas condições basais. Além disso, após a cirurgia também foi demonstrado que os animais submetidos à cirurgia de constrição do nervo isquiático e alojados em grupo possuem maiores escores, ou seja maior expressão facial de dor, em comparação aqueles do grupo SHAM alojadas na mesma condição. Após o 25 procedimento cirúrgico também foi observado que as fêmeas SHAM isoladas possuem maiores expressões faciais de dor quando comparado às fêmeas na mesma condição alojadas em grupo (Figura 9). Figura 9. Avaliação da expressão facial de dor exibida pela média de escores dado a cada região facial (n= 9-13/GRUPO) em camundongos fêmeas. As barras representam as médias e o erro padrão da média (M+EPM). *P < 0,05 comparado ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento. #P < 0,05 comparado ao grupo de animais na mesma condição alojados em grupo. &P < 0,05 comparado ao respectivo grupo na condição basal. Para os machos, a ANOVA de duas vias para medidas repetidas na análise da escala de expressão facial de dor revelou significância para os fatores: tipo de alojamento (F(1,39)=6.74 P < 0.05), condição (F(1,39)=9.06 P < 0.05), dia (F(1,39)=58.40 P<0.05), e interação entre os fatores dia e tipo de alojamento (F(1,39)=5.81 P<0.05), e dia e condição (F(1,39)=9.06 P<0.05). A análise post hoc Duncan revelou que os grupos CCI-GRUPO e CCI-ISOLADO possuem maiores escores de expressão facial de dor após o procedimento cirúrgico quando comparados aos seus respectivos grupos nas condições basais. Além disso, após a cirurgia também foi demonstrado que os animais submetidos à cirurgia de constrição do nervo isquiático independente da condição de alojamento possuem maiores escores em comparação àqueles do grupo SHAM. Após o procedimento cirúrgico também foi observado que os animais que passaram pela constrição do nervo alojados individualmente possuem escores de expressão facial de dor mais elevados em comparação aqueles na mesma condição alojados em grupo (Figura 10). 26 Figura 10. Avaliação da expressão facial de dor expressa pela média de escores dado a cada região facial (n= 9-12/GRUPO) em camundongos machos. As barras representam as médias e o erro padrão da média (M+EPM). *P < 0,05 comparado ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento. #P < 0,05 comparado ao grupo de animais na mesma condição alojados em grupo. &P < 0,05 comparado ao respectivo grupo na condição basal. A ANOVA bifatorial na análise da exploração aos braços do LCE das fêmeas revelou que para o número de entradas nos braços fechados não foram observadas significância para nenhum dos fatores. Para %EBA foram observadas significância para os fatores: tipo de alojamento (F(1,44)=7.81 P < 0.05), condição (F(1,44)=9.40 P < 0.05) e interação entre os fatores (F(1,44)=6.38 P < 0.05). A análise post hoc Duncan revelou que os animais submetidos à cirurgia de constrição do nervo e alojados em grupo apresentam uma diminuição %EBA comparadas ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento. Além disso, também foi observado que as fêmeas SHAM isoladas apresentam diminuição nesta resposta em comparação às fêmeas SHAM alojadas em grupo. Para as respostas relacionadas à %TBA foram observadas significância para o tipo de alojamento (F(1,44)=6.54 P < 0.05) e condição (F(1,44)=7.58 P < 0.05). Semelhante ao observado para a %EBA foi observado que as fêmeas submetidas à cirurgia de constrição do nervo e alojadas em grupo apresentam uma diminuição na %TBA comparadas ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento, e que as fêmeas do grupo SHAM isoladas apresentam diminuição nesta resposta em comparação aquelas na mesma condição, mas alojadas em grupo (Figura 11). 27 Figura 11. Avaliação da exploração aos braços do labirinto em cruz elevado (n= 9-15/GRUPO) em camundongos fêmeas. O gráfico A representa o número de entradas nos braços fechados (EBF). O gráfico B representa a porcentagem de entradas nos braços abertos(%EBA). O gráfico C representa a porcentagem de tempo gasto nos braços abertos (%TBA). As colunas representam as médias (±EPM). As barras representam as médias e o erro padrão da média (M+EPM). *P < 0,05 comparado ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento. #P < 0,05 comparado ao grupo de animais na mesma condição alojados em grupo. A análise da exploração aos braços do LCE dos camundongos machos (figura 12) pela ANOVA bifatorial revelou que para o número de entradas nos braços fechados não foram observadas significância para nenhum dos fatores. Para a %EBA foram observadas significância para os fatores: tipo de alojamento (F(1,40)=7.70 P < 0.05) e interação entre os fatores (F(1,44)=7.02 P < 0.05), e para %TBA houve significância para o tipo de alojamento (F(1,40)=15.99 P < 0.05), condição (F(1,40)=5.29 P < 0.05) e interação entre os fatores (F(1,40)= 11.94 P < 0.05). As análises post hoc Duncan revelaram que os animais submetidos à cirurgia de constrição do nervo e 28 alojados em grupo apresentam uma diminuição na porcentagem de entradas e tempo nos braços abertos comparados ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento, e que os animais SHAM isolados também apresentam diminuição nesta resposta em comparação aos animais SHAM alojados em grupo (Figura 12). Figura 12. Avaliação da exploração aos braços do labirinto em cruz elevado (n= 10-13/GRUPO) em camundongos machos. O gráfico A representa o número de entradas nos braços fechados (EBF). O gráfico B representa a porcentagem de entradas nos braços abertos(%EBA). O gráfico C representa a porcentagem de tempo gasto nos braços abertos (%TBA). As barras representam as médias e o erro padrão da média (M+EPM). *P < 0,05 comparado ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento. #P < 0,05 comparado ao grupo de animais na mesma condição alojados em grupo. Para o teste de esguicho de sacarose das fêmeas, na análise do comportamento de autolimpeza a ANOVA bifatorial revelou significância na latência para início da autolimpeza para o fator condição (F(1,39)=13.931 P < 0.05). O post hoc de Duncan revelou que os animais submetidos a constrição do nervo isquiático e alojados individualmente apresentaram uma diminuição da latência em comparação ao grupo SHAM também alojados individualmente. Na análise da frequência e tempo 29 de autolimpeza foram observadas significância apenas para interação entre os fatores (F(1,39)= 29.59 P < 0.05) e (F(1,39)= 18.04 P < 0.05), respectivamente. Para estas repostas, análise post hoc Duncan revelou que as fêmeas submetidas à cirurgia de constrição do nervo e alojadas em grupo apresentam uma diminuição na frequência e tempo gasto realizando a autolimpeza quando comparadas ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento, e que aquelas do grupo SHAM isoladas apresentam também diminuição nesta resposta em comparação às fêmeas SHAM alojadas em grupo (Figura 13). Figura 13. Avaliação do comportamento de autolimpeza (n= 9-13/GRUPO) em camundongos fêmeas. O gráfico A representa a latência para o início do grooming. O gráfico B a frequência de grooming. O gráfico C representa o tempo de grooming. As barras representam as médias e o erro padrão da média (M+EPM). *P < 0,05 comparado ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento. #P < 0,05 comparado ao grupo de animais na mesma condição alojados em grupo. No teste de esguicho de sacarose dos machos, a ANOVA bifatorial revelou que para a latência do início da autolimpeza não foram observadas significância para 30 nenhum dos fatores. Na análise da frequência de autolimpeza foram observadas significância para a condição (F(1,40)= 9.93 P<0.05) e para a interação entre os fatores (F(1,40)=12.90 P<0.05), em relação ao tempo gasto com a autolimpeza foi observado significância apenas para a interação entre os fatores (F(1,40)= 5.39 P<0.05). A análise post hoc Duncan revelou que os machos submetidos à cirurgia de constrição do nervo e alojados em grupo apresentam diminuição na frequência e tempo gasto realizando autolimpeza quando comparados ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento, e que os machos SHAM isolados apresentam também diminuição nesta resposta em comparação aos machos SHAM alojados em grupo (Figura 14). Figura 14. Avaliação do comportamento de autolimpeza (n= 9-14/GRUPO) em camundongos machos. O gráfico A representa a latência para o início do grooming. O gráfico B a frequência de grooming. O gráfico C representa o tempo de grooming. As barras representam as médias e o erro padrão da média (M+EPM). *P < 0,05 comparado ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento. #P < 0,05 comparado ao grupo de animais na mesma condição alojados em grupo. 31 Para a análise dos dados obtidos na avaliação da qualidade do ninho nas fêmeas foi realizada análise não paramétrica de Mann-Whitney em que foi observada significância para a condição (U=113,50 P<0.05). Na comparação pela variável condição nos grupos isolados, foi observada uma piora na qualidade do ninho nas fêmeas SHAM isoladas quando comparadas com as fêmeas submetidas a cirurgia de constrição do nervo no mesmo tipo de alojamento (Figura 15). Figura 15. Avaliação da qualidade de construção do ninho (n= 9-13/GRUPO) em camundongos fêmeas. As barras representam as médias e o erro padrão da média (M+EPM). *P < 0,05 comparado ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento. Na avaliação dos scores obtidos na qualidade de construção do ninho para os camundongos machos a análise estatística não paramétrica de Mann-Whitney revelou que não há significância para nenhum dos fatores (Figura 16). Figura 16. Avaliação da qualidade de construção do ninho (n= 14-10) em camundongos machos. As barras representam as médias e o erro padrão da média (M+EPM). A ANOVA de duas vias para medidas repetidas na análise do estado na pelagem das fêmeas revelou significância para os fatores: tipo de alojamento 32 (F(1,39)=22.99 P<0.05), dia (F(1,39)= 82.69 P<0.05) e interação entre os fatores tipo de alojamento e dia (F(1,39)= 20.28 P<0.05). A análise post hoc Duncan revelou que as fêmeas dos grupos CCI-GRUPO, SHAM-GRUPO, SHAM-ISOLADO e CCI-ISOLADO demonstram uma piora da condição da pelagem após o procedimento cirúrgico, apresentando um maior score de estado da pelagem quando comparado aos seus respectivos grupos nas condições basais. Além disso, após a cirurgia também foi observado que as fêmeas alojadas individualmente apresentaram um pior estado da pelagem quando comparado com aquelas com a mesma condição, mas alojadas em grupo (Figura 17). Figura 17. Avaliação do estado da pelagem (n= 9-13/GRUPO) em camundongos fêmeas. As barras representam as médias e o erro padrão da média (M+EPM). #P < 0,05 comparado ao grupo de animais na mesma condição alojados em grupo. &P < 0,05 comparado ao respectivo grupo na condição basal. Para os machos, a ANOVA de duas vias para medidas repetidas na análise do estado na pelagem revelou significância para os fatores: condição (F(1,40)= 6.78 P<0.05), dia (F(1,40)= 87.85 P<0.05), e interação entre os fatores dia e condição (F(1,40)= 8.20 P<0.05) e dia, condição e alojamento (F(1,40)= 7.94 P<0.05). A análise post hoc Duncan revelou que os machos dos grupos CCI-GRUPO, SHAM-GRUPO, SHAM- ISOLADO e CCI-ISOLADO demonstram uma piora da condição da pelagem após o procedimento cirúrgico, apresentando um maior score de estado da pelagem quando comparado aos seus respectivos grupos nas condições basais. Após a cirurgia também foi observado que os machos submetidos à cirurgia de constrição do nervo isquiático e alojados em grupo possuem um pior estado da pelagem em comparação àqueles do grupo SHAM com o mesmo tipo de alojamento. Ademais, foi observado que os animais que passaram pela constrição do nervo isquiático isolados apresentam 33 um pior estado da pelagem quando comparados com aqueles na mesma condição alojados em grupo (Figura 18) . Figura 18. Avaliação do estado da pelagem (n= 9-13/GRUPO) em camundongos machos. As barras representam as médias e o erro padrão da média (M+EPM). *P < 0,05 comparado ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento. #P < 0,05 comparado ao grupo de animais na mesma condição alojados em grupo. &P < 0,05 comparado ao respectivo grupo na condição basal. A ANOVA de duas vias para medidas repetidas na análise do ganho de peso das fêmeas indicou significância para o fator condição (F(1,38)= 5.18 P<0.05). A análise post hoc Duncan revelou que os as fêmeas que passaram pela cirurgia de constrição do nervo isquiático alojadas em grupo apresentaram um menor ganho de peso quando comparados com as fêmeas SHAM com sob o mesmo tipo alojamento (Figura 19). Figura 19. Avaliação do ganho de peso (n= 8-13/GRUPO) em camundongos fêmeas. As barras representam as médias e o erro padrão da média (M+EPM). *P < 0,05 comparado ao grupo SHAM no mesmo tipo de alojamento. 34 Para os machos, a ANOVA de duas vias para medidas repetidas na análise do ganho de peso não revelou significância para nenhum dos fatores (Figura 20). Figura 20. Avaliação do ganho de peso (n= 10-13/GRUPO) em camundongos machos. As barras representam as médias e o erro padrão da média (M+EPM). 6 DISCUSSÃO Os resultados obtidos neste estudo demonstraram que a constrição do nervo isquiático foi capaz de promover hiperalgesia mecânica e aumento de respostas relacionadas aos componentes emocional (ansiedade) e afetivo (depressão) da dor em machos e fêmeas. Além disso, também foi observado que o isolamento social é capaz de diminuir os limiares de retirada da pata em animais machos e fêmeas e acentuar respostas relacionadas à ansiedade e depressão em animais que não foram submetidos à constrição do nervo isquiático. Adicionalmente, os dados aqui apresentados também revelaram que apenas as fêmeas, também nessa condição, apresentaram aumento dos escores de expressão facial de dor. Especificamente, com o teste de Von Frey foi possível observar que a cirurgia de constrição do nervo isquiático foi capaz de promover hiperalgesia mecânica independente do tipo de alojamento e do sexo dos animais. Tal resultado confirmam achados da literatura em que foi demonstrado que o procedimento cirúrgico é capaz de induzir uma redução da latência de retirada da pata após o estímulo mecânico (BENNETT; XIE, 1988; KINGERY; VALLIN, 1989; TAVARES et al., 2023). Entretanto, também foi observada em fêmeas e em machos, redução da latência para retirada da pata nos animais do grupo SHAM que estavam alojados individualmente. Este 35 resultado demonstra que o isolamento social por si aumenta a sensibilidade mecânica de camundongos expostos ao teste de Von Frey. Cabe destacar que estudos prévios já demonstraram resultados semelhantes, onde a privação social foi capaz de induzir aumento da hiperalgesia mecânica pelo teste de Von Frey em camundongos machos submetidos ao modelo de dor neuropática de lesão do nervo poupada (NORMAN et al., 2010). De modo similar, em modelos de estresse precoce, onde camundongos fêmeas e machos que foram submetidos a um protocolo de separação maternal e isolamento social, após a constrição parcial do nervo isquiático, apresentaram maior alodinia e hiperalgesia, avaliados pelos testes de estimulação plantar e Von Frey, respectivamente (NISHINAKA; NAKAMOTO; TOKUYAMA, 2015). Contudo, a resposta aumentada à dor observada para os animais SHAM isolados pode também ser um indicativo de prejuízo da recuperação do quadro de dor aguda provocada pelo procedimento cirúrgico. Na literatura, estudos apontam que o estresse sofrido em procedimentos cirúrgicos pode aumentar a magnitude e a duração da hipersensibilidade a dor (CUSACK; BUGGY, 2020; BELLA et al., 2023). Além disso, trabalhos demonstram que o isolamento social prejudica a recuperação de camundongos fêmeas e machos após lesão tecidual (PYTER et al., 2014a; PYTER et al., 2014b). A escala facial de dor para camundongos é uma ferramenta desenvolvida por Langford et al. (2010a) que auxilia na quantificação de aspectos afetivos da dor. Essa escala é amplamente utilizada, sendo aplicada em trabalhos que utilizam modelos dor neuropática em conjunto com testes como Von Frey para a quantificação de diferentes aspectos da dor (AKINTOLA et al., 2017; HEINSINGER et al., 2020). Entretanto, ainda não foram descritas diferenças sexuais significativas entre as respostas na escala facial de dor para fêmeas e para os machos (MOGIL et al., 2020). No presente estudo, foi observado que a cirurgia de constrição do nervo promoveu aumento na expressão facial de dor em ambos os sexos, reforçando que este modelo de dor neuropática é capaz de induzir alterações afetivas relacionadas a dor crônica e não apenas sensitivas (BURMA et al., 2017; TAPPE-THEODOR; KING; MORGAN, et al., 2019). Os resultados obtidos com o teste da expressão facial de dor das fêmeas são semelhantes àqueles observados no teste de hiperalgesia mecânica. Após o procedimento cirúrgico, as fêmeas isoladas SHAM apresentaram maiores escores de expressão facial de dor em comparação aos animais SHAM, que estavam 36 alojadas em grupo. Este resultado indica que, para as fêmeas, o isolamento social pode influenciar tanto nas respostas físicas quanto afetivas da dor, sugerindo a presença de um dimorfismo sexual, especificamente no componente emocional e especialmente em fêmeas. Além disso, tal evidência pode indicar que para os machos o isolamento afeta principalmente respostas físicas à dor, possuindo menor influência em seus aspectos afetivos, uma vez que os animais SHAM Isolados, cuja única condição é o próprio isolamento, apresentaram respostas de hiperalgesia mecânica, porém sem alterar a resposta afetiva à dor. Na literatura, achados apontam que as mulheres apresentam maior sensibilidade e menor tolerância à dor do que os homens, reportando índices de dor mais elevados e maior capacidade de discriminar diferentes níveis de dor (MOGIL, 2012; BARTLEY; FILLINGIM, 2013; OSBORNE; DAVIS, 2022). Além disso, estudo desenvolvido por Langford e seus colaboradores (2010b), que correlacionou a interação social e a dor em camundongos, demonstrou que fêmeas apresentam maior interação com um camundongo familiar com dor que os machos. Tais evidências podem indicar que as fêmeas sejam mais capazes de identificar expressões de dor e, consequentemente, apresentam maior repertório na expressão destas respostas. Nos dados obtidos com os testes de avaliação de respostas relacionadas à ansiedade (LCE) e à depressão (esguicho da sacarose), foi observado que o procedimento de constrição do nervo promoveu um aumento dessas respostas, com a diminuição da exploração aos braços abertos do labirinto e diminuição do comportamento de autolimpeza. O impacto emocional induzido por processos de dor crônica é descrito em humanos (BURMA et al., 2017) e em animais (GONZÁLEZ- SEPÚLVEDA et al., 2016). Recentemente, o estudo desenvolvido por Tavares et al. (2023), com o modelo de constrição crônica do nervo isquiático, revelou um aumento nas respostas relacionadas à ansiedade e depressão nos testes de LCE e esguicho de sacarose em animais que foram submetidos à constrição do nervo. De modo interessante, também foram observados no presente estudo que os animais do grupo SHAM e alojados individualmente apresentam um aumento de respostas relacionadas à ansiedade e à depressão. Estes resultados sugerem que o isolamento social pode ser caracterizado como um estressor relevante sobre respostas emocionais. Cabe destacar que estudos prévios já demonstraram que o isolamento social é capaz de induzir um aumento nas respostas relacionadas à ansiedade e à depressão em camundongos machos (DU PREEZ et al., 2021; AMIRI et al., 2015). 37 Na literatura, o impacto do isolamento social sobre alterações comportamentais para os diferentes sexos não está totalmente elucidado. A revisão realizada por Grigoryan, Pavlova e Zaichenko (2022) demonstrou que fêmeas e machos apresentam respostas distintas de acordo com o modelo de isolamento e estresse utilizado. Nishinaka, Nakamoto e Tokuyama (2015) avaliaram as alterações comportamentais provocadas pela dor neuropática com um modelo de separação materna e isolamento social, em que observaram um comportamento semelhante à depressão no teste de nado forçado apenas para as fêmeas. Todavia, até o momento, nenhum outro estudo havia avaliado o impacto do isolamento social sob as respostas comportamentais de fêmeas e machos com o modelo de dor neuropática pelos testes de LCE e esguicho de sacarose. O prejuízo na construção de ninho é amplamente descrito em trabalhos que utilizam modelos de estresse (NOLLET; LE GUISQUET; BELZUNG, 2013), e em quadros de dor pós-cirurgia (TURNER; PANG; LOFGREN, 2019; JIRKOF, 2014; ROCK et al., 2014). Entretanto, para o teste de construção do ninho, não foram observadas diferenças significativas entre os grupos nos camundongos machos, e para as fêmeas, apenas as do grupo SHAM e em isolamento social apresentaram um prejuízo na qualidade da construção do ninho. Tomados em conjunto, estes resultados são sugestivos de que a dor sofrida pela constrição do nervo ciático parece não alterar o perfil de construção de ninhos em camundongos machos e fêmeas. Estes resultados mostram-se em discordância com os achados prévios na literatura (TURNER; PANG; LOFGREN, 2019; JIRKOF, 2014; ROCK et al., 2014; NOLLET; LE GUISQUET; BELZUNG, 2013), e com os resultados dos demais testes comportamentais realizados, onde foi observado um aumento no comportamento do tipo depressivo nos animais que passaram pela constrição crônica do nervo isquiático e pelo isolamento social. Todavia, não foram encontrados trabalhos que associam o quadro de dor neuropática e o isolamento social como um fator para o prejuízo na construção de ninho, desta forma os fatores que culminaram nesse comportamento precisam ser investigados mais profundamente. A análise do estado da pelagem tem sido um teste amplamente utilizado na literatura para avaliar respostas do tipo depressivo em camundongos em modelos de estresse, sendo a qualidade da pelagem influenciada pela frequência e extensão do comportamento de autolimpeza (grooming), uma medida motivacional e de autocuidado, altamente sensível ao estresse (COSTA et al., 2023; ELIWA et al., 2021; 38 CARDINAL et al., 2021, NOLLET; LE GUISQUET; BELZUNG, 2013). Após o procedimento cirúrgico, foi observado uma piora do estado da pelagem em relação às suas condições basais, indicando que este ato invasivo provocou uma diminuição do autocuidado levando a deterioração do estado da pelagem dos animais tanto machos como fêmeas. Sobre as diferenças sexuais, foi observado que as fêmeas isoladas apresentam um pior estado da pelagem que as alojadas em grupo. Em contrapartida, para os machos, foi observado um pior estado da pelagem para os animais que passaram pela constrição crônica do nervo isquiático. Além disso, os machos com a mesma condição alojados em grupo apresentaram um pior escore de pelagem que os isolados. Tais resultados indicam que o isolamento social possui maior influência sobre o autocuidado da pelagem para as fêmeas do que para os machos. Na literatura, não foram encontrados estudos que abordem a deterioração da pelagem em modelos de dor, e as diferenças sexuais do autocuidado nesses quadros para fêmeas e machos, evidenciando a possibilidade de utilização deste teste em outros modelos. A análise do peso corporal é utilizada como um componente para a caracterização de comportamento do tipo depressivo (PLANCHEZ; SURGET; BELZUNG, 2019). Diferentes estudos apontam perda (SURGET; BELZUNG, 2009; WILLNER, 2017) e ganho de peso (COSTA et al., 2023; MOLES et al., 2006) em camundongos submetidos a fatores estressores. Curiosamente, para a avaliação do ganho de peso não foram encontradas alterações significativas para os machos. Para as fêmeas, no entanto, foi observado apenas a diminuição do peso daquelas que passaram pela constrição do nervo ciático e alojadas em grupo, quando comparadas com as fêmeas SHAM sob a mesma condição de alojamento. Em conjunto, estes achados demonstram que para o presente estudo o peso corporal não foi influenciado pelo isolamento social. Os resultados obtidos neste estudo demonstraram que as diferenças sexuais nas respostas relacionadas aos aspectos emocionais tendem a ser específicas para determinados testes. Essa característica foi recentemente apontada pela revisão de Lovick e Zangrossi Jr. (2021), em que foi observado que as fêmeas tendem a ser mais responsivas em testes que envolvem estímulos incondicionados (tal qual o LCE) em comparação aos machos. Tais evidências reforçam a necessidade de esclarecimento sobre os mecanismos neurais que podem determinar tais respostas e suas potenciais diferenças sexuais. 39 Considerando os achados obtidos neste trabalho, é possível observar que modelos animais para estudo da dor são uma excelente alternativa à experimentação humana, pois estes possuem respostas comportamentais que podem ser consideradas equivalentes à dor em humanos, possibilitando assim o estudo dos mecanismos relacionados à dor e suas correlações com alterações nos comportamentos afetivos-emocionais (KREMER et al., 2021; DEUIS; DVORAKOVA; VETTER, 2017). Com os resultados obtidos, foi possível observar que os efeitos promovidos pelo isolamento social podem ocorrer de modo sexualmente distinto em respostas relacionadas à dor após procedimentos cirúrgicos, afetando de modo particular a recuperação dos animais. Tal evidência aponta para a relevância do ambiente social, em procedimentos pós-cirúrgicos que são frequentes na experimentação animal. Além disso, considerando que em humanos, evidências apontam que o isolamento social é capaz de agravar quadros de dor crônica (BANNON et al., 2019), o presente estudo ressalta ainda que o isolamento pode influenciar de maneira distinta ambos os sexos. Desta forma, a investigação dos mecanismos que levam a esse dimorfismo se mostra interessante para compreender o impacto do isolamento nos diferentes sexos, e contribui também para o desenvolvimento de estratégias para auxiliar indivíduos que convivem com a dor. 40 7 CONCLUSÃO Com os resultados obtidos no estudo é possível concluir que a constrição do nervo isquiático e o isolamento social foram capazes de induzir hiperalgesia mecânica e aumento de respostas relacionadas à ansiedade e à depressão em ambos os sexos. Quanto ao dimorfismo sexual, foi observado que apenas as fêmeas apresentaram aumento na expressão facial de dor, piora do estado pelagem e prejuízo na construção do ninho quando alojadas individualmente. Estes achados indicam que a condição de alojamento também exerce importante influência sobre as respostas comportamentais de camundongos. 41 REFERÊNCIAS AKINTOLA, T. et al. The grimace scale reliably assesses chronic pain in a rodent model of trigeminal neuropathic pain. Neurobiology of pain, v. 2, p. 13–17, 2017. AMERICAN Psychiatric Association (APA). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais: DSM-5. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014. AMIRI, S. et al. Co-occurrence of anxiety and depressive-like behaviors following adolescent social isolation in male mice; possible role of nitrergic system. Physiology & Behavior, v. 145, p. 38-44, 2015. BANNON, S. et al. The role of social isolation in physical and emotional outcomes among patients with chronic pain. 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