281 Braz. J. Vet. Res. Anim. Sci., São Paulo, v. 48, n. 4, p. 281-288, 2011 Introdução O processamento de peixe produz diariamente uma grande quantidade de resíduos que gera problemas de poluição ambiental, sendo fundamental o processa- mento destes subprodutos para diminuir o impacto ambiental1. Uma alternativa para o aproveitamento de resíduo de pescado é a sua transformação em silagem de peixe para posterior utilização como fonte de pro- teína na alimentação animal1,2,3. A utilização de resíduos para produção de silagem Histologia e histoquímica do intestino anterior de tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus) alimentadas com dietas contendo silagem de peixe Histology and histochemical the medium intestine in Nile tilapia (Oreochromis niloticus) fed diets with fish silage Claucia Aparecida HONORATO1; Claudinei da CRUZ2; Dalton José CARNEIRO3; Márcia Rita Fernandes MACHADO4 1Faculdade de Ciências Biológicas e da Saúde do Centro Universitário da Grande Dourados , Dourados – MS, Brasil 2Núcleo de Estudos e Pesquisas Ambientais em Matologia da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista, Jaboticabal - SP, Brasil 3Laboratório de Nutrição de Organismos Aquáticos do Departamento de Zootecnia da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista, Jaboticabal - SP, Brasil 4Departamento de Morfologia e Fisiologia Animal da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista, Jaboticabal - SP, Brasil Resumo O objetivo deste trabalho foi avaliar a histologia e a histoquímica do intestino anterior de tilápia do Nilo alimentadas com dietas contendo farinha de peixe ou silagem de peixe como fonte de proteína de origem animal. A espessura da vilosidade intestinal dos peixes alimentados com silagem fermentada de resíduo de tilápia foi influenciada pelos teores proteicos, independente das proporções de proteína de origem animal das dietas. Observou-se que a variação da intensidade de secreção de glicoproteínas pelas células caliciformes está diretamente ligada com o tipo de dieta fornecida aos animais. O intestino médio de Oreochromis niloticus apresentou diferenças no padrão de secreção de muco glicoproteico neutro, glicoproteínas ácidas e glicoconjugados, dependendo da origem da proteína e da porcentagem utilizada na dieta, demonstrando que esta espécie pode adaptar seu sistema de secreção para a proteção do aparelho digestório durante a absorção de diferentes fontes proteicas. Palavras-chave: Oreochromis niloticus. Histologia do intestino. Silagem de peixe. Abstract This work was carried out to evaluate the action of the fermented fish silage and fish meal in the histochemical of the middle intestine of O. niloticus. A great epithelium intestinal was present in fishes fed with fish silage, independent of the animal origin protein proportions in diets. It was observed that the variation of the goblet cells secretion glicoproteic intensity is linked directly to the diet supplied to animals. The middle intestine of Oreochromis niloticus showed differences in the neutral mucus glicoproteic, acid glicoproteic and glicoconjugated secretion pattern, depending on the protein origin and the percentage used in the diet, demonstrating that this species can adapt its secretion system for the protection of the digesting apparatus during the absorption of different protein sources. Keywords: Oreochromis niloticus. Histology of intestine. Fish silage. Correspondência para: Claucia Aparecida Honorato Centro Universitário da Grande Dourados (UNIGRAN) Faculdade de Ciências Biológicas e da Saúde Hospital Veterinário, Laboratório de Produção Animal Rua Balbina de Matos, 2121 – Jd. Universitário CEP 79.824-900 – Dourados/MS Fone: (0xx67) 3411-4122 / Fax: (0xx67) 3411-4167 e-mail: clauciahonorato@yahoo.com.br Recebido: 23/06/2009 Aprovado: 10/08/2011 Braz. J. Vet. Res. Anim. Sci., São Paulo, v. 48, n. 4, p. 281-288, 2011 282 de peixe é vantajoso por ser um processo simples e econômico, o que o torna o produto competitivo no mercado1. A silagem de peixe como ingrediente nas dietas para organismos aquáticos, demonstrou-se como proteínas de boa qualidade, elevada digesti- bilidade4,5 e altamente hidrolisada6, quando com- parada com a farinha de peixe que atualmente é a principal fonte de proteína de origem animal para espécies aquáticas. A avaliação de novos ingredientes para alimentação animal depende primeiramente das respostas zootéc- nicas dos animais alimentados com estes produtos7. As diferenças no desempenho dos peixes podem ser atribuídas às diferenças interespecíficas, das caracte- rísticas de seus tratos digestórios e à eficiência com que o alimento ingerido é capaz de ser digerido e assimilado. A habilidade dos peixes em processar os alimentos é fundamental ao seu desenvolvimento e depende da estrutura do epitélio e das vilosidades in- testinais, do perfil enzimático de seu canal alimentar e de sua capacidade adaptativa8. Na tentativa de aperfeiçoar o aproveitamento dos ingredientes ingeridos, os peixes apresentam ca- pacidade de adaptação dos processos digestivos, tais como: perfil e secreção enzimáticos; absorção e transporte de nutrientes. O estudo morfológico reve- la o desempenho no processo digestivo, absortivo e metabólico dos diferentes animais9, além de ser uma barreira seletiva que permite absorção de nutrientes e exclui muitas substâncias tóxicas10 e revela as diferen- tes adaptações do trato digestório em função a dieta ofertada11,12. Portanto, o estudo histológico é essencial para a tomada de decisão quanto ao tipo de fonte de alimento que pode ser recomendada para alimenta- ção de peixes13,14. O objetivo deste trabalho foi avaliar a ocorrência de possíveis alterações histológicas no intestino anterior de tilápia do Nilo alimentadas com dietas contendo silagem fermentada de resíduo de tilápia ou farinha de peixe como fonte de proteína de origem animal. Material e Método O experimento foi conduzido no Laboratório de Nutrição de Organismos Aquáticos do Centro de Aqüicultura da UNESP e as análises histológicas no setor de técnicas morfológicas do Departamento de Morfologia e Fisiologia Animal da FCAV/UNESP, Campus de Jaboticabal. Para a produção de silagem fermentada, foram uti- lizados resíduos de filetagem de tilápia (cabeça, vísce- ras, restos de musculatura, espinhas, pele, escamas e nadadeiras), previamente moídos, e adicionados 15% (p/p) de melaço de cana-de-açúcar, 5% (p/p) de Lac- tobacillus plantarum e 0,25% (v/p) de ácido sórbico3. Esta mistura foi armazenada por 30 dias. Foram confeccionadas doze dietas com três níveis de proteína bruta (20, 24 e 28%), duas proporções de proteína de origem animal (¼ ou ½), duas fontes de proteína (farinha de peixe - FP ou a silagem fermen- tada de resíduo de tilápia- SP). As dietas (Tabela 1) foram denominadas como: As dietas foram peletizadas em máquina de moer carnes do Centro de Aquicultura da UNESP e pos- teriormente, os pellets foram secos e conservados em freezer para o fornecimento durante o período expe- rimental. O arraçoamento dos peixes foi à vontade, duas vezes ao dia (manhã e tarde) em pequenas quan- tidades até a saciedade aparente, para que a quantida- de fornecida fosse considerada a consumida. Para a realização do ensaio biológico foram utiliza- dos 360 alevinos de tilápia com o peso médio inicial de 1,17 ± 0,05 g distribuídos em 36 aquários com ca- D01 - 20%PB ¼ FP; D04 - 20%PB ½ FP; D02 - 24%PB ¼ FP; D05 - 24%PB ½ FP; D03 - 28%PB ¼ FP; D06 - 28%PB ½ FP; D07 - 20%PB ¼ SP; D10 - 20%PB ½ SP; D08 - 24%PB ¼ SP; D11 - 24%PB ½ SF; D09 - 28%PB ¼ SP; D12 - 28%PB ½ SP 283 Braz. J. Vet. Res. Anim. Sci., São Paulo, v. 48, n. 4, p. 281-288, 2011 pacidade de 150 L, abastecidos continuamente com água proveniente de poço artesiano, com renovação de aproximadamente 20 vezes ao dia e aeração cons- tante, por um período de 75 dias. No final do período experimental (75 dias), todos os peixes foram anestesiados em benzocaína (100 mg/L) até completa perda dos sentidos para a bio- metria e abate em gelo. Para as análises histológicas foram separados nove exemplares de cada tratamento para a retirada de amostras do intestino anterior. Pos- teriormente, as amostras foram fixadas em solução de Bouin, por 24 horas. Após a fixação, procedeu-se à lavagem em álcool 70% para desidratação em série alcoólica crescente, diafanização em série de xilóis, inclusão em Histosec e cortados em espessura varian- do entre 5 a 7 µm de espessura. Para cada tratamento (dieta experimental) foram confeccionadas três lâmi- nas por peixe, com total de 27 lâminas por tratamento. A coloração das lâminas foi realizada pela técnica Hematoxilina - Eosina. Para realização da histoquí- mica utilizaram-se os métodos de PAS/H (Ácido peri- ódico de Shiff), Alcian-Blue PAS, Alcian-Blue pH 0,5 e pH 2,5. Foi realizada a análise de sete secções por lâmina. O material foi analisado e fotodocumentado em fotomicroscópio Axioskop- Zeiss. Foi realizada a comparação visual da altura das vilosidades intesti- nais dos peixes submetidos a distintas dietas experi- mentais. As comparações foram realizadas agrupando os tratamentos em três classes de altura denominadas de pequena, mediana e alta. O experimento foi conduzido em delineamento in- teiramente casualizado (DIC), com doze tratamentos em esquema fatorial 3x2x2, correspondendo a três ní- veis de proteína bruta (20, 24 e 28%), duas proporções de proteína de origem animal (¼ ou ½), duas fontes de proteína (farinha de peixe - FP ou a silagem fermenta- da de resíduo de tilápia- SP) nas dietas experimentais, com três repetições. Quando a análise de variância mostrou diferenças significativas entre tratamentos (P < 0,05), as médias foram comparadas pelo teste Tukey,  Ingredientes (%) D01 D02 D03 D04 D05 D06 D07 D08 D09 D10 D11 D12 Farinha de peixe 8,3 10,0 11,6 16,6 20,0 23,3 - - - - - - Silagem de peixe - - - - - - 11,1 13,3 15,5 22,1 26,5 31,0 Milho moído 47,0 36,5 25,9 50,9 60,7 31,3 46,9 52,5 41,4 52,2 51,7 40,8 Farelo de soja 13,3 22,0 30,6 1,7 12,9 14,3 14,7 27,7 36,4 5,0 14,1 20,6 Farelo de trigo 25,0 25,0 25,0 25,0 0,2 25,0 21,3 - - 15,0 2,0 2,0 Quirera de arroz 5 5 5 5 5 5 5 5 5 5 5 5 Óleo de soja 0,6 0,9 1,2 0,1 0,5 0,4 0,4 0,9 1,1 - - - Suplemento vitamínico 1/ 0,4 0,4 0,4 0,4 0,4 0,4 0,4 0,4 0,4 0,4 0,4 0,4 Suplemento Mineral 2/ 0,3 0,3 0,3 0,3 0,3 0,3 0,3 0,3 0,3 0,3 0,3 0,3 Composição Calculada3/ Matéria seca (%) 92,6 92,3 92,0 93,2 93,0 92,9 93,3 93,1 93,0 94,4 94,7 95,0 Proteína bruta (%) 20 24 28 20 24 28 20 24 28 20 24 28 Extrato etéreo (%) 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5 4,9 4,7 4,6 Energia bruta (kcal.kg-1) 4219 4261 4303 4182 4216 4251 4209 4249 4289 4184 4202 4230 1/ Composição do suplemento mineral para 1 kg de ração: Ferro 1500 mg, Cobre 5000 mg, Iodo 500 mg, Manganês 17000 mg, Zinco 12000 mg, Selênio 70 mg, veículo 1000 g. 2/ Composição do suplemento vitamínico para 1 kg de ração: Vitamina A 12000 UI, Vitamina D3 1500 UI, Vitamina E 50 mg, Vitamina K 4 mg, Vitamina B12 7 mg, Ácido Pantotênico 60 mg, Ácido. Nicotínico 120 mg, Cloreto de Colina 600 mg, Metionina 700 mg, veículo 1000 g. 3/ Composição calculada com base nos dados obtidos em análises realizadas no Laboratório de Nutrição de Organismos Aquáticos do CAUNESP, Jaboticabal, segundo AOAC (2000). D01 - 20% PB ¼ FP; D02 - 24% PB ¼ FP; D03 - 28% PB ¼ FP; D04 - 20% PB ½ FP; D05 - 24% PB ½ FP; D06 - 28% PB ½ FP; D07 - 20% PB ¼ SP; D08 - 24% PB ¼ SP; D09 - 28% PB ¼ SP; D10 - 20% PB ½ SP; D11 - 24% PB ½ SF; D12 - 28% PB ½ SP Tabela 1 – Formulação e composição das dietas experimentais Braz. J. Vet. Res. Anim. Sci., São Paulo, v. 48, n. 4, p. 281-288, 2011 284 realizados no Statistical Analysis System (SAS Intitule Inc., version 6.12, 1999)15. Resultados A qualidade da água apresentou as médias de oxigê- nio dissolvido de 5,70 ± 0,2 mg de O2 L -1, de tempera- tura de 29,27 ± 1,20 °C, pH de 7,95 ± 0,03 e conduti- vidade de 127,17 ± 0,04 μs/cm. O ganho de peso dos peixes durante o período ex- perimental foi 17,13 ± 4,18. Os peixes alimentados com as dietas contendo farinha de peixe apresenta- ram o ganho em peso de 20,3 g superior aos que re- ceberam a dieta contendo silagem de peixe (13,9 g) como fonte de proteína de origem animal (POA). Os níveis de proteína bruta e proporção de proteína de origem animal apresentaram interação, sendo que os peixes alimentados com a dieta contendo 24% PB com ½ POA (D05 e D11) independente da proveniên- cia da fonte de POA (silagem de peixe ou farinha de peixe) apresentaram as maiores médias de ganho em peso (Figura 1). O intestino anterior de tilápia do Nilo caracteri- za-se por apresentar quatro camadas: a mucosa, a submucosa, a muscular e a serosa. A camada muco- sa éconstituída por epitélio cilíndrico simples com borda em escova e células caliciformes, com lâmina própria contendo linfócitos intraepiteliais; a submu- cosa é formada por células, fibras colágenas e vasos sanguíneos; a camada muscular, de músculo liso em disposição circular e externamente à camada serosa, que é caracterizada por tecido conjuntivo e células pavimentosas. Estas estruturas não apresentaram di- ferenças na tilápia do Nilo submetidas às dietas ex- perimentais (Figura 2). A mucosa exibiu um epitélio prismático simples composto por enterócitos entremeados por células caliciformes PAS (positivo), AB (positivo) em pH 0,5 e 2,5 e PAS/AB (positivo), indicando a secreção de glicoproteínas neutras e glicoproteínas ácidas sulfa- tadas e carboxiladas e glicoconjugadas. A submucosa apresentou tecido conjuntivo frouxo PAS (positivo). A camada muscular apresentou uma camada interna * 0 5 10 15 20 25 20% PB 24% PB 28% PB G an ho e m p es o (g ) ¼ POA ½ POA Figura 1 - Ganho em peso de tilápia do Nilo (Oreochromis nilóticos), interação entre os fatores níveis de proteína (%PB) e proporção de proteína de origem animal (POA). Valores expressos em média (n = 20) ± D.P. Níveis de proteína bruta (20, 24 e 28% PB) e proporção de proteína de origem animal na dieta (¼ e ½ POA). (*) diferença estatística. 24% PB contendo ½ POA corresponde à dieta D05 e D11 285 Braz. J. Vet. Res. Anim. Sci., São Paulo, v. 48, n. 4, p. 281-288, 2011 com fibra muscular lisa orientada circularmente e ou- tra externa com fibras orientadas longitudinalmente. Observou-se que a variação da intensidade de se- creção de glicoproteínas pelas células caliciformes apresentou-se diretamente correlacionada com o tipo de dieta ofertada aos animais. A secreção de glicopro- teínas ácidas e glicoconjugadas (AB/PAS) apresenta- ram o mesmo padrão para os peixes que receberem as dietas D01, D03 e D04 (contendo farinha de peixe) e os peixes que se alimentaram com as dietas D07, D09 e D10 (contendo silagem de peixe). Observou-se que a intensidade de reação da secreção glicoconjugada (AB/PAS) nos animais alimentados com dietas con- tendo silagem de peixe (D07, D09 e D10) foi superior quando comparada aos demais tratamentos. As células caliciformes produtoras de glicoproteínas ácidas (AB pH 0.5, pH 2.5) e glicoconjugadas (AB/ PAS) apresentaram baixa intensidade de reação, en- quanto que as secretoras de muco glicoproteico (PAS) e glicoproteínas glicoconjugadas (AB/PAS) apresen- taram intensidade alta de reação nos peixes alimen- tados com as dietas D08 e D12, ambas contendo sila- gem de peixe como fonte de POA (Tabela 2). Os peixes alimentados com a dieta D05 e D11, apesar da diferença na fonte de POA utilizada, fa- rinha de peixe e silagem de peixe, respectivamente, apresentaram secreções semelhantes de muco glico- conjugado (AB/PAS). A secreção de glicoproteínas ácidas (AB pH 0.5; 2.5) e neutra (PAS) revelou-se de intensidade fraca para os peixes alimentados com as Figura 2 - Foto micrografia de intestino anterior de juvenis de tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus). (A) D01 – 20% PB ¼ FP, PAS/H células caliciformes (seta), (B) D05 – 24% PB ½ FP, PAS/H, (C) D10– 20% PB ½ SP, AB pH 0,5 células caliciformes AB positiva (seta), (D) D12 – 28% PB ½ SP, PAS/AB muscular longitudinal (ml), camada muscular interna (mi), membrana serosa (*), epitélio da mucosa (ep), células caliciformes glicoconjugadas (seta). (X 400) Braz. J. Vet. Res. Anim. Sci., São Paulo, v. 48, n. 4, p. 281-288, 2011 286 dietas contendo silagem de peixe (D07, D08, D09, D10, D11 e D12) (Tabela 2). A visualização dos cortes histológicos demonstrou que a altura das vilosidades intestinais foi influencia- da principalmente pela fonte de POA utilizada nas dietas. Nos peixes alimentados com dietas contendo farinha de peixe como fonte de POA não houve al- teração na altura do epitélio intestinal. Os peixes ali- mentados com dietas contendo silagem de peixe apre- sentaram diferentes classificações de altura do epitélio intestinal. Os peixes alimentados com a dieta D08 e D11 apresentaram a altura das vilosidades intestinais classificada como alta. Discussão A qualidade da água manteve-se dentro dos padrões para o cultivo de peixes tropicais16, proporcionando o bem-estar e qualidade para sua criação durante o perí- odo experimental. O ganho de peso inferior dos peixes alimentados com as dietas contendo silagem de peixe como fonte proteica pode ser atribuído à presença de substâncias como aminoácidos livres, geradas durante o processo de ensilagem17, que podem não ser aproveita- dos eficientemente por falta de estrutura de absorção14,18. A silagem de peixe na alimentação de tilápia do Nilo demonstrou alterações do trato digestório, que são in- dicativos de adaptações do trato digestório para me- lhorar a capacidade de utilização de nutrientes. Alguns trabalhos vêm demonstrando a adaptação morfológi- ca do intestino frente às variações nutricionais para o Piaractus mesopotamicus18, Ictalurus punctatus13, Ra- chycentron canadum14, S. aurata5, Pagrus pagrus19. Po- rém, ainda são muito incipientes os dados que correla- cionam alimentação e adaptações histológicas do trato gastro-intestinal de organismos aquáticos9. A estrutura da mucosa intestinal está relacionada com os processos fisiológicos de digestão e absorção, e as regiões de pregas mais complexas estariam en- volvidas nos processos absortivos devido ao aumento da área efetiva para absorção de nutrientes20. O au- mento da altura das vilosidades intestinais dos peixes alimentados com as dietas contendo silagem de peixe como fonte de POA pode ser atribuído à estratégia de melhorar a absorção dos nutrientes, que já se encon- travam hidrolisados devido o processo de ensilamen- to da massa de resíduo17,21. A adaptação da altura das vilosidades intestinais superior dos peixes submetidos a dietas contendo si- Dietas Altura AB/PAS   AB pH 2,5   AB pH 0,5   PAS N A C   N A C   N A C   N A C D 01 * + + + +   - + -   - + -   + + + - - D 02 * * + + + + + - + - - + - + + - - D 03 * * + + - + + - + + - - + + + - + + - - D 04 * + + + - + + - - + + - + + - - D 05 * * + + + + + + + - + + + - - + + + - + + + - - D 06 * * + + + + + - + + + - - + + + - + + + - - D 07 * + + + + + + - + + - - + + - + + + - - D 08 * * * + + + + - + + - - + + - + + + - - D 09 * * + + + - + - - + - + + - - D 10 * + - + - + - - + - + - - D 11 * * * + + + + - + + - - + + - + + + - - D 12 * * + + + +   - + + -   - + + -   + + + - - Altura das vilosidades intestinais: * (pequena), ** (mediana) e *** (alta) Reações: Neutra (N); Ácida (A); Conjugada (C). Intensidade da reação positiva: (+) fraca; (++) intermediária; (+++) forte; (-) sem reação Tabela 2 – Altura das vilosidades intestinais e histoquímica das células caliciformes do intestino médio de juvenis de tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus) submetidos às dietas experimentais 287 Braz. J. Vet. Res. Anim. Sci., São Paulo, v. 48, n. 4, p. 281-288, 2011 lagem de peixe pode estar associada às características de um produto liquefeito e hidrolisado. Para tilápia do Nilo, a silagem de peixe resulta em aumento do coeficiente de digestibilidade da proteína e da energia em comparação a farinha de peixe4. As alterações morfológicas no trato digestório tam- bém são observadas no intestino anterior de Rachycen- tron canadum submetidos a dietas com diferentes fontes de proteína14. A utilização de fontes de concen- trado proteico de soja e farelo de soja na alimentação de Onchorinchus mykiss e do Piaractus mesopotamicus acarretou em aumento da camada de absorção das duas espécies18. Em controvérsia, o uso de fontes de soja (ex- trato solúvel de soja e extrato concentrado de soja) e de glúten (glúten de milho e glúten de trigo), como fonte proteica não modificou a estrutura histológica do in- testino de bacalhau do Atlântico22. A altura das vilosi- dades intestinais está associada ao processo de absor- ção de nutrientes assim como a capacidade enzimática, responsável pelo processo digestivo23. A digestão intestinal depende da secreção de subs- tâncias glicoproteicas das células caliciformes, da ação proteolítica do suco pancreático e também da digestão intracelular, que está associada à presença de glândulas gástricas24. A presença de células caliciformes no intes- tino de peixes está relacionada a diferentes condições de alimentação e à proteção contra a atividade bacte- riana25, a proteção do epitélio (fluxo laminar) contra o alimento proveniente do estômago, rico em enzimas digestivas e com pH acentuadamente ácido8,26. A se- creção das células caliciformes foi influenciada pela fonte de proteína da dieta, o que pode ser atribuído às características do produto ensilado. A acidificação da dieta contendo silagem de peixe refletiu em redução da atividade proteolítica dos intestinos de truta arco-íris (Salmo gairdneri)21, o que consequentemente alterou a estrutura de digestão e absorção. Tilápias do Nilo alimentadas com as dietas conten- do silagem fermentada de resíduo de peixe demons- tram respostas de alterações nas estruturas morfo- lógicas e na secreção, com a finalidade de melhorar o aproveitamento do alimento, tornando-a um ali- mento viável a ser utilizado como fonte de proteína de origem animal. Conclusão Os resultados indicam que a utilização de silagem de resíduo de peixe em dietas para tilápia do Nilo propor- cionou alterações histológicas benéficas que refletiram em maior desenvolvimento dos peixes. Conclui-se que a silagem de resíduo de peixe é um alimento que pode ser utilizado em dietas para tilápia do Nilo. 1. BOSCOLO, W. R.; HAYASHI, C.; MEURER, F.; FEIDEN, A.; WOLFF, L. Desempenho e características de carcaça de machos revertidos de tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus), linhagem tailandesa e comum, nas fases iniciais e crescimento. Revista Brasileira de Zootecnia, v. 30, n. 5, p. 1391-1396, 2001. 2. SECCO, E. M.; STÉFANI, M. V.; VIDOTTI, R. M. Substituição da farinha de peixe pela silagem de peixe na alimentação de girinos de rã touro (Rana catesbiana). Ciência Rural, v. 32, n. 3, p. 505-509, 2002. 3. VIDOTTI, R. M.; VIEGAS, E. M. M.; CARNEIRO, D. J. Amino acid composition of processed fish silage using different raw materials. Animal Feed Science and Technology, v. 105, n. 1/4, p. 199-204, 2003. 4. OLIVEIRA, M. M.; PIMENTA, M. E. S. G.; PIMENTA, C. J.; CAMARGO, A. C. S.; FIORINI, J. E.; LOGATO, P. V. R. 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