FILLIP CORTAT ALVES Influência da porosidade nas propriedades de fluência em compósitos vidro/epóxi processados via RTM Guaratinguetá – SP 2021 FILLIP CORTAT ALVES Influência da porosidade nas propriedades de fluência em compósitos vidro/epóxi processados via RTM Dissertação apresentada à Faculdade de Engenharia do Campus de Guaratinguetá, Universidade Estadual Paulista, para obtenção do título de Mestre em Engenharia Mecânica na área de Materiais. Orientador: Prof.ª. Dr.ª Maria Odila Hilário Cioffi Coorientadores: Prof. Dr. Herman Jacobus Cornelis Voorwald Dr. Heitor Luiz Ornaghi Junior Guaratinguetá - SP 2021 unesp UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA CAMPUS DE GUARATINGUETÁ FILLIP CORTAT ALVES ESTA DISSERTAÇÃO FOI JULGADA ADEQUADA PARA A OBTENÇÃO DO TÍTULO DE “MESTRE EM ENGENHARIA MECÂNICA” PROGRAMA: ENGENHARIA MECÂNICA CURSO: MESTRADO APROVADA EM SUA FORMA FINAL PELO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO Prof. Dr. Manoel Cleber de Sampaio Alves C oordenador B A N C A E X A M I N A D O R A: Profª. Drª. MARIA ODILA HILARIO CIOFFI Orientador - UNESP participou por videconferência Profª. Drª. MIDORI YOSHIKAWA PITANGA COSTA UNESP participou por videconferência Profª. Drª. ANA PAULA CYSNE BARBOSA Universidade Federal do Rio Grande do Norte participou por videconferência Novembro de 2021 DADOS CURRICULARES FILLIP CORTAT ALVES NASCIMENTO 11.03.1992 – Resende / RJ FILIAÇÃO Valter Correa Alves Marcia Cortat Lima 2012/2018 Bacharelado em Engenharia de Produção com Ênfase em Mecânica Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) Dedico este trabalho em especial a Deus, aos meus pais, professores e amigos. AGRADECIMENTOS Em primeiro lugar agradeço a Deus, por manter-me firme e nos caminhos corretos, à minha orientadora, Professora Dra. Maria Odila Hilário Cioffi, pelo apoio e ensinamentos para meu crescimento profissional e pessoal. ao meu co-orientador Professor Dr. Herman Jacobus Cornelis Voorwald, por toda contribuição científica no desenvolvimento deste trabalho. ao meu co-orientador Dr. Heitor Luiz Ornaghi Junior, por todo apoio, ajuda, pela paciência, motivação e contribuição científica para a elaboração deste trabalho. aos meus pais, em especial a minha mãe Marcia Cortat Lima, pelo apoio, instrução dos caminhos certos. aos amigos Francisco Maciel Monticeli, Roberta Motta Neves e Professora Dra. Midori Yoshikawa Pitanga, pelos ensinamentos, colaborações e apoio. à minha família, em especial aos meus irmãos, pelo apoio que esteve sempre presente, pela confiança e ajuda em todas as situações. aos amigos do Grupo de Fadiga e Materiais Aeronáuticos Roberto Ferreira Motta Junior, Ana Carolina Mendes Quintanilha Silva Santos, Daniel de Oliveira Magalhães, Anne Shayene Campos de Bomfim, Martin Ferreira Fernandes, Paulo Henrique Fernandes Pereira e Verônica Mara de Oliveira Velloso, que compartilharam alegrias e frustrações, pelo apoio científico e pessoal, trabalhos em conjunto e conhecimento científico. a todos os professores da UNESP - Faculdade de Engenharia do Campos de Guaratinguetá, por contribuírem na minha formação acadêmica, e aos funcionários, por sua disponibilidade em sempre nos auxiliar. à Universidade de Caxias do Sul, por disponibilizar equipamentos para a realização deste trabalho, em especial ao Laboratório de Polímeros, com o equipamento de DMA. ao Laboratório Nacional de Nanotecnologia (LNNano) (Proposta Micro CT-25706) pelo teste de Microtomografia Computadorizada de Raios X. à CAPES, pelo suporte financeiro durante o mestrado. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coodernação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior- Brasil (CAPES) - código de financiamento: 88882.433472/2019-01. “Cada sonho que você deixa para trás, é um pedaço do seu futuro que deixa de existir” Steven Paul Jobs RESUMO O desenvolvimento de compósitos de matrizes poliméricas reforçados com fibras sintéticas cresce e se destaca em diversos segmentos da indústria moderna, graças às suas propriedades, como baixa massa específica e elevada resistência mecânica específica. Para aplicações estruturais, uma investigação extensa dos compósitos é requerida, com o objetivo de garantir a segurança e o bom desempenho mecânico do material. No presente estudo, compósitos de fibra de vidro/resina epóxi manufaturados através da técnica de moldagem por transferência de resina (RTM) foram avaliados quanto à influência de diferentes teores de vazios no comportamento mecânico por meio de análise dinâmico-mecânica e ensaios de fluência. A microtomografia computacional de raios X (MCT) foi utilizada para reconstrução em 3D do compósito, de modo a determinar a posição e as características morfológicas dos poros. Os resultados mostraram que o conteúdo de vazios interfere na transferência de tensão, permitindo maior armazenamento de energia na região vítrea para as mostras menos porosas. Além disso, na região de transição vítrea, o menor conteúdo de vazio apresentou um decaimento mais abrupto da rigidez, devido à maior dissipação de energia em um menor intervalo de tempo. A tendência do comportamento de fluência é igualmente afetada pelo conteúdo e morfologia do vazio. Foram utilizados os modelos de ajuste de curva de Findley, Burger e Weibull para as curvas de fluência, e os resultados indicaram que os modelos se ajustaram bem às curvas experimentais de fluência. Os parâmetros obtidos por cada modelo foram relacionados ao comportamento viscoelástico dos compósitos e associados com os demais resultados deste estudo. PALAVRAS-CHAVE: Compósitos poliméricos. Teor de vazios. Porosidade. Análise dinâmico-mecânica. Fluência. ABSTRACT The development of polymer composite reinforced with synthetic fibers grows and is becoming prominent in several modern industry segments, due to the low specific mass and high relative mechanical resistance. For structural application, an in-depth investigation of composites is required. In the present study, glass fiber/epoxy composites were manufactured by resin transfer molding (RTM) with different volume fraction of voids and evaluated by dynamic-mechanical analysis and the creep behavior. The X-ray computational microtomography (MCT) was used to reconstruct the composite in 3D to determine the pore's position and morphological characteristics. The dynamic-mechanical analyzes were performed over a wide temperature range and creep tested from different temperatures and stress levels. The results showed that the void content influences the transfer of tensions, allowing higher energy storage in the vitreous region. In addition, at the glass transition temperature, a more abrupt decay is observed due to higher energy dissipation in a shorter period. The creep behavior is also influenced by the content and morphology of the void. The Findley, Burger and Weibull curve fitting models were used for creep curves. The results indicated that the models fitted well to the experimental creep curves. The parameters obtained by each model were related to the composites viscoelastic behavior and associated with the other results of this study. KEYWORDS: Polymeric composites. Void content; Porosity. Dynamic mechanical analysis. Creep behavior. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 – Classificação dos materiais compósitos quanto ao reforço. .................................... 22 Figura 2 - Estrutura química da resina epóxi DGEBA. ............................................................ 25 Figura 3 - Estrutura de um tecido NCF (Non-Crimp Fabric). .................................................. 27 Figura 4 - Representação dos tipos de poros presentes em materiais referentes à forma: (PT) poros de transporte, (PA) poros abertos, (PF) poros fechados e (PG) poros do tipo gaiola. .... 31 Figura 5 - (a) Esquema da formação de vazios durante o fluxo longitudinal e transversal na moldagem de compósito líquido de um reforço fibroso de dupla escala, exibindo a competição entre o fluxo viscoso e o fluxo capilar – as setas inclinadas demonstram a impregnação transversal dos feixes; (b) micrografia demonstrando microporos dentro dos feixes de fibras; (c) micrografia demostrando mesoporos entre os feixes de fibras. .......................................... 33 Figura 6 - Vazios em um compósito com de carbono/epóxi caracterizado por microtomografia de raios X, exibidos em (a) topo, (b) 3D, (c) frente e (d) vista lateral. .................................... 36 Figura 7 - Tensão (σ) aplicada em um material, deformação (ε) resultante e ângulo de defasagem (δ) entre a tensão e a deformação. .......................................................................... 37 Figura 8 - Representação das regiões comumente encontradas em um polímero junto ao módulo de armazenamento, módulo de perda e fator de perda. ............................................... 39 Figura 9 - Representação das funções senoidal da deformação aplicada (γ) e da tensão resposta (σ) para materiais: (a) elásticos lineares, (b) viscosos lineares e (c) viscoelásticos. .. 40 Figura 10 - Relação trigonométrica entre o módulo complexo (E*), módulo de armazenamento (E’) e módulo de perda (E’’) com o ângulo (δ). ............................................. 40 Figura 11 - Curva típica para a deformação por fluência e taxa de fluência em função do tempo, com as três etapas do processo de fluência de um material. ......................................... 44 Figura 12 - Diagrama com esquema do modelo de Burger. ..................................................... 46 Figura 13 - Exemplos de imagens obtidas por microtomografia das amostras. ....................... 50 Figura 14 - Tecido de fibra de vidro utilizado no presente trabalho. ....................................... 54 Figura 15 - Fluxograma das etapas do projeto. ........................................................................ 56 Figura 16 - Equipamento RTM utilizado para processar o compósito. .................................... 59 Figura 17 - Equipamento de microscopia por inspeção acústica utilizado no ensaio dos compósitos. ............................................................................................................................... 61 Figura 18 - Esquema do ensaio de fluência. ............................................................................. 63 Figura 19 - Equipamento de microtomografia SkyScan/Bruker modelo 1272. ....................... 64 Figura 20 - Diagrama representativo das vistas coronal, sagital e transaxial das amostras analisadas. ................................................................................................................................. 66 Figura 21 - Tratamento das imagens de microtomografia para análise quantitativa de porosidade. ................................................................................................................................ 67 Figura 22 - TGA e DTG da resina RTM6. ............................................................................... 68 Figura 23 - Curva de DSC dinâmico da resina epóxi RTM6. .................................................. 69 Figura 24 – Curvas de DSC isotérmico da resina epóxi RTM6. .............................................. 70 Figura 25 - Resultado da viscosimetria da resina epóxi RTM6. .............................................. 71 Figura 26 - Resultado da microscopia por inspeção acústica das placas produzidas. .............. 73 Figura 27 – Representação 3D e 2D dos compósitos estudados por meio da análise de microtomografia computadorizada de raios X. ........................................................................ 78 Figura 28 - Morfologia dos vazios: (a) 2D esférico, (b) 3D esférico, (c) 2D elíptico, (d) 3D elíptico, (e) 2D irregular, (f) 3D irregular ................................................................................ 79 Figura 29 - Perspectiva do compósito A. a) vista coronal; b) vista transaxial; c) vista sagital. .................................................................................................................................................. 81 Figura 30 - Perspectiva do compósito B. a) vista coronal; b) vista transaxial; c) vista sagital. 84 Figura 31 - Perspectiva do compósito C. a) vista coronal; b) vista transaxial; c) vista sagital. 87 Figura 32 - Representação 3D dos compósitos e dos poros presentes em cada amostra em diferentes ângulos. .................................................................................................................... 90 Figura 33 - Histograma de distribuição de diâmetro de poros. (a) distribuição de tamanho de vazio, (b) porosidade maior (> 100 μm) destacada. ................................................................. 91 Figura 34 - Histograma dos formatos dos poros dos compósitos. ............................................ 93 Figura 35 - Curvas de DMA (módulo de armazenamento, módulo de perda e tan δ versus temperatura) para o compósito vibra de vidro/epóxi com diferentes volumes de poros. ......... 95 Figura 36 - Módulo de armazenamento em função da temperatura para os compósitos vidro/epóxi com diferentes volumes de poros. ......................................................................... 99 Figura 37 - Módulo de perda em função da temperatura para os compósitos vidro/epóxi com diferentes volumes de poros. .................................................................................................. 100 Figura 38 – Tangente de perda em função da temperatura para os compósitos vidro/epóxi com diferentes volumes de poros. .................................................................................................. 102 Figura 39 - Gráfico Cole-Cole das curvas da tangente de perda das amostras estudadas. ..... 104 Figura 40 - Resultados da análise de fluência das amostras A, B e C em diferentes tensões e temperaturas. ........................................................................................................................... 105 Figura 41 - Resultados da análise de fluência dos compósitos A, B e C em diferentes tensões a 50 ºC, 170 ºC e 210 ºC. a) 1 MPa; b) 5 MPa; c) 10 MPa. ...................................................... 106 Figura 42 - Influência da porosidade na deformação por fluência. ........................................ 109 Figura 43 - Ajuste das curvas baseadas nos modelos de Findley, Burger e Weibull a) Compósito A, b) Compósito B, c) Compósito C. ................................................................... 110 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Composição química (%) das fibras de vidro. ........................................................ 27 Tabela 2 - Principais especificações do microtomógrafo SkyScan 1272. ................................ 65 Tabela 3 - Resultado de massa, massa específica e volume dos compósitos. .......................... 74 Tabela 4 - Média dos resultados de picnometria de gás hélio. ................................................. 74 Tabela 5 – Resultados obtidos a partir da digestão ácida dos compósitos. .............................. 76 Tabela 6 - Média dos resultados de digestão ácida. ................................................................. 77 Tabela 7 - Resultados do módulo de perda das amostras com diferentes volumes de vazios. ................................................................................................................................................ 100 Tabela 8 - Resultados da tangente de perda das amostras com diferentes volumes de vazios. ................................................................................................................................................ 103 Tabela 9 - Valores dos parâmetros para o modelo de Findley. .............................................. 111 Tabela 10 - Valores dos parâmetros para o modelo de Burger. ............................................. 114 Tabela 11 - Valores dos parâmetros para o modelo de Weibull. ............................................ 118 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ASTM American Society for Tests and Materials DMT Departamento de Materiais e Tecnologia DSC Calorimetria exploratória diferencial DTG Derivada da curva de TGA FEG Faculdade de Engenharia de Guaratinguetá GFMA Grupo de Fadiga e Materiais Aeronáuticos MEV Microscopia eletrônica de varredura TGA Análise termogravimétrica UNESP Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” NCF Non crimp fabric RTM Moldagem por transferência de resina CDP Corpo de prova MCT Microtomografia computacional de raios X LISTA DE SÍMBOLOS Tg Temperatura de transição vítrea Vf Fração volumétrica de fibra μ Viscosidade V Volume da amostra At Área total do tecido δ Gramatura do tecido ρf Densidade da fibra Vm Volume do molde E’ Módulo elástico E” Módulo de perda Tan δ Tangente de perda SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .................................................................................................. 18 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .......................................................................... 21 2.1 MATERIAIS COMPÓSITOS .............................................................................. 21 2.2 MATRIZES TERMORRÍGIDAS EM COMPÓSITOS POLIMÉRICOS ........... 23 2.2.1 RESINA EPÓXI ................................................................................................. 24 2.3 REFORÇO ............................................................................................................ 25 2.3.1 Fibra de Vidro ..................................................................................................... 26 2.3.2 Tecido não-dobrável ........................................................................................... 27 2.4 MÉTODO DE MOLDAGEM .............................................................................. 29 2.4.1 Moldagem por transferência de resina (RTM) ................................................ 29 2.5 POROSIDADE ..................................................................................................... 30 2.6 PROPRIEDADES DINÂMICO-MECÂNICAS .................................................. 36 2.7 FLUÊNCIA .......................................................................................................... 42 2.7.1 Modelo de Findley .............................................................................................. 45 2.7.2 Modelo de Burger ............................................................................................... 45 2.7.3 Modelo de Weibull .............................................................................................. 48 2.8 MICROTOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA DE RAIOS X ...................... 49 2.9 REVISÃO DA LITERATURA E MOTIVAÇÃO DO TRABALHO .................. 51 3 OBJETIVOS ....................................................................................................... 53 4 MATERIAIS E MÉTODOS .............................................................................. 54 4.1 MATERIAIS ........................................................................................................ 54 4.1.1 Matriz e Reforço ................................................................................................. 54 4.2 MÉTODOS ........................................................................................................... 56 4.2.1 Caracterização da resina .................................................................................... 56 4.2.1.1 Análise Termogravimétrica da resina ................................................................... 57 4.2.1.2 Estudo da Cura da Resina ..................................................................................... 57 4.2.2 Viscosimetria ....................................................................................................... 57 4.2.3 Processamento das amostras ............................................................................. 58 4.2.3.1 Moldagem por transferência de resina (RTM) ..................................................... 58 4.2.4 Fração volumétrica de fibras ............................................................................. 59 4.2.5 Preparo das Amostras ........................................................................................ 60 4.2.6 Microscopia por Inspeção Acústica .................................................................. 60 4.2.7 Picnometria de gás hélio ..................................................................................... 61 4.2.8 Digestão ácida ..................................................................................................... 61 4.2.9 Análise Dinâmico-Mecânica .............................................................................. 62 4.2.10 Fluência ................................................................................................................ 62 4.2.11 Microtomografia de raios X ............................................................................... 64 5 RESULTADOS E DISCUSSÃO ....................................................................... 68 5.1 ANÁLISE TERMOGRAVIMÉTRICA ............................................................... 68 5.2 CALORIMETRIA EXPLORATÓRIA DIFERENCIAL ..................................... 69 5.3 VISCOSIDADE .................................................................................................... 71 5.4 MICROSCOPIA POR INSPEÇÃO ACÚSTICA ................................................ 72 5.5 PICNOMETRIA DE GÁS HÉLIO ....................................................................... 73 5.6 DIGESTÃO ÁCIDA ............................................................................................. 75 5.7 MICROTOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA DE RAIOS X ...................... 77 5.8 ANÁLISE DINÂMICO-MECÂNICA ................................................................. 94 5.8.1 Módulo de Armazenamento (E’) ....................................................................... 97 5.8.2 Módulo de Perda (E”) ........................................................................................ 99 5.8.3 Tangente de Perda (tan δ) ................................................................................ 101 5.9 FLUÊNCIA ........................................................................................................ 104 5.10 MODELAMENTO ............................................................................................. 109 5.10.1 Modelo de Findley ............................................................................................ 110 5.10.2 Modelo de Burger ............................................................................................. 113 5.10.3 Modelo de Weibull ............................................................................................ 117 6 CONCLUSÃO ................................................................................................... 121 6.1 TRABALHOS PUBLICADOS EM PERIÓDICOS ........................................... 122 REFERÊNCIAS .................................................................................................................... 123 18 1 INTRODUÇÃO Os compósitos estruturais são materiais que despertam grande interesse da indústria. O setor aeroespacial tem implementado esses materiais pelas suas características peculiares, como alta resistência mecânica e leveza, o que corrobora para a diminuição do peso das aeronaves e contribui para um menor consumo de combustível e/ou ganho de carga, devido a menor massa especifica desses materiais (BOTELHO; PARDINI, 2006;GUERMAZI et al., 2014) Os compósitos estruturais poliméricos devem ser obtidos com baixo teor de vazios, pois estes influenciam diretamente nas propriedades mecânicas finais. A formação dos vazios é influenciada por diversos fatores, como processo de fabricação, o tipo de reforço e arquitetura do mesmo (FRATTA et al., 2015; SALVATORI et al., 2018; ZENG et al., 2014). Dentre os processos mais utilizados e aceitos na fabricação dos compósitos estruturais poliméricos, o de moldagem por transferência de resina (RTM) tem se destacado, devido ao baixo percentual de vazios formados no produto acabado, assim como a possibilidade de fabricação de materiais com alta fração volumétrica de reforço (acima de 50%) (ALMEIDA JÚNIOR et al., 2012; HAMIDI; AKTAS; ALTAN, 2005a; MILITKÝ; JABBAR, 2015). No processo RTM, os vazios são formados durante a impregnação dos filamentos de fibras, quando o preenchimento do molde acontece. Os vazios uma vez formados são conduzidos no decorrer do preenchimento, o que leva à alteração da sua distribuição espacial e geometria (LUNDSTROM, 1996; PATEL; LEE, 1996a, 1996b). Em geral, quando a fração volumétrica de vazios é inferior a 1,5% os poros são esféricos e pequenos, acima desse valor, próximo dos 10%, esses tendem ser achatados, maiores e alongados (MEHDIKHANI et al., 2019b; STONE; CLARKE, 1975). Existem métodos diretos e indiretos para estudar o vazio em compósitos poliméricos: i) por correlação de alguma propriedade mecânica por exemplo, ou ii) por medição direta, por exemplo, pelo da microscopia eletrônica de varredura (MEV) ou microtomografia de raios X, sendo esta última uma das mais avançadas técnicas, devido à maior precisão e capacidade de representar a amostra e o vazio de forma tridimensional (MEHDIKHANI et al., 2019a; MONTICELI et al., 2019; NIKISHKOV; SEON; MAKEEV, 2014). Estudos mostram que os vazios influenciam as características finais dos compósitos poliméricos, como por exemplo, o estudo realizado por Stamopoulos et al. (2016), no qual o efeito da porosidade nas propriedades mecânicas de um compósito polimérico reforçado com fibra de carbono foi avaliado por meio da técnica de microtomografia computadorizada de 19 raios X. Os autores observaram que com o aumento do teor de vazios, o número de poros diminui, seu volume aumenta, ou seja, apresentaram poros com diâmetros maiores, e a geometria muda de esférica para o formato de agulha. Os resultados dos ensaios mecânicos mostraram que a maior fração volumétrica de vazios reduziu as propriedades mecânicas estudadas do material, pois os poros agem como concentradores de tensões. Umer et al. (2020) estudaram o comportamento experimental da compactação por fluência e permeabilidade de um sistema pré-impregnado de fibra de carbono/resina epóxi por meio da técnica de microtomografia computadorizada de raios X. Nesse estudo foi verificado o efeito do número de camadas na tensão por fluência e nas frações do volume da fibra em diferentes temperaturas. Nessa análise as características internas dos tecidos dos compósitos foram avaliadas. O estudo mostrou que o aumento no número de camadas reduziu a resistência à fluência nos materiais. O desenvolvimento de compósitos, com a finalidade de aplicações estruturais mais leves, é acompanhado dos estudos das propriedades mecânicas que os mesmos apresentam, de modo que sejam satisfatórias para sua finalidade. A propriedade mecânica de fluência começou a ser explorada nos estudos dos compósitos poliméricos, para fins de aplicações estruturais, por Sullivan em 1990, e desde então tem despertado interesse nos estudos para o desenvolvimento desses materiais (SULLIVAN, 1990; SULLIVAN; BLAIS; HOUSTON, 1993). Estudos realizados sobre o comportamento de fluência em compósito poliméricos demonstraram que a matriz utilizada, bem como o tipo de reforço, suas orientações e arquitetura influenciam diretamente nessa propriedade. Militký e Jabbar (2015) estudaram o comportamento de fluência a curto prazo de compósitos de matriz epóxi reforçados com tecido de juta tratados. Os tecidos da juta foram tratados com laser infravermelho pulsado com CO2, ozônio, enzima e plasma. Os compósitos foram fabricados pelo método de disposição manual e moldagem por compressão. Ensaios de fluência e análises dinâmico- mecânicas no modo de flexão de três pontos foram realizados. Os autores verificaram que os compósitos que receberam tratamento exibiram menor deformação por fluência, quando comparados com os que não receberam algum tipo de tratamento. O melhor resultado observado em relação à deformação por fluência foi apresentado pelo material que recebeu o tratamento a laser, e verificou-se que o comportamento elástico foi dominante sobre o comportamento viscoso. Os autores utilizaram o modelo de quatro parâmetros de Burger com o objetivo de ajustar os dados experimentais de fluência. Os resultados demonstraram uma boa relação entre os dados experimentais e as curvas teóricas construídas. 20 Almeida et al. (2018a), estudaram a fluência, recuperação, relaxação de tensão e o comportamento viscoelástico de compósitos de matriz epóxi reforçada com fibra de carbono, com diferentes orientações das fibras. Os autores verificaram que no compósito fabricado com fibras alinhadas longitudinalmente a transferência de tensão na fibra/matriz é mais eficiente e quase não apresentou deformação por fluência significativa. Com base na abordagem de distribuição de Weibull, as respostas de fluência e de recuperação, nas tensões de 2 e 5 MPa, foram estudadas. Os resultados encontrados foram mais significativos para a tensão mais alta. Os autores verificaram que os resultados obtidos com o modelo de Weibull foram mais satisfatórios, à medida que a tensão aumentava (melhor ajuste). Em outros estudos, Almeida et al. (2018b), estudaram o comportamento de fluência com fibras em diferentes ângulos, pelo uso dos modelos de Findley e Burger. Os resultados desse estudo demonstraram que a maior diferença no ajuste foi observada em temperaturas mais altas e, de acordo com o aumento do ângulo das camadas de fibra, o modelo de Burger se ajustou melhor que o modelo de Findley. Keller, Jellison e Ellison (2013), realizaram um estudo no qual foram feitos ensaios em fluência sob flexão em compósitos carbono/epóxi, após os mesmos serem expostos à água por mais de 18 meses. O ensaio foi realizado por DMA e a superposição tempo-temperatura (TTS) foi elaborada com base na energia de ativação. As maiores mudanças de conformidade nos resultados de TTS para a amostra exposta à água por 18 meses podem ser o resultado da degradação da matriz. Com os resultados, os autores puderam verificar que os materiais imersos em água por até 18 meses exibem maior deformação por fluência. Com base na literatura, não foram encontrados estudos anteriores sobre a influência de vazios e suas características (geometria, tamanho e posição) associados à fluência de compósitos vidro/epóxi. Portanto, neste estudo, o comportamento de fluência de compósitos de vidro/epóxi com diferentes teores de vazios será analisado por meio de diferentes modelos analíticos (ajuste de curva). Para isso, foi feita a caracterização e a avaliação do efeito do conteúdo de vazios no comportamento de fluência; modelagem de dados de fluência. 21 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1 MATERIAIS COMPÓSITOS Conforme a Norma ASTM D3878, para que um material seja reconhecido como um compósito, ele deve ser constituído por dois ou mais materiais inerentemente insolúveis (matriz e reforço), de modo que forme um novo material, com características associadas dos seus constituintes, como propriedades, formas ou constituição. Alguns desses materiais são produzidos com a finalidade de atingir certas propriedades específicas, como por exemplo, melhores desempenhos nas resistências à tração, flexão, ao impacto, à compressão, à corrosão, além de redução de custos, e melhor desempenho ao isolamento térmico ou acústico. Os materiais que constituem os compósitos são delimitados por uma região em escala microscópica denominada interface (REZENDE et al., 2011; BALASUBRAMANIAN, 2013). A interface separa as fases pelas quais os compósitos são constituídos, sendo elas, o reforço (fase dispersa) e a matriz (fase contínua (ou dispersante)). A fase dispersa tem como objetivo reforçar, aditivar ou preencher de maneira distribuída a fase contínua. As propriedades apresentadas pelos compósitos são diretamente influenciadas pelas propriedades apresentadas pelas fases que as constituem, das proporções em que são empregadas e da interface formada (interação/adesão). Algumas características da fase dispersa têm grande influência nas propriedades finais do compósito, como forma, distribuição na matriz e orientação ao longo do material (BALASUBRAMANIAN, 2013; ORNAGHI, 2014). A Figura 1 ilustra um esquema de classificação dos compósitos de acordo com o reforço empregado. 22 Figura 1 – Classificação dos materiais compósitos quanto ao reforço. Fonte: Adaptado de Balasubramanian (2013). Os compósitos podem ser classificados quanto à sua natureza (natural ou sintética), tipo de matriz ou fase dispersante (metálica, polimérica ou cerâmica) e tamanho da fase dispersa (nanocompósitos, microcompósitos ou macrocompósitos). Para os compósitos com matriz polimérica, o material pode ser classificado de acordo com o tipo de polímero empregado (termoplástico, termorrígido ou elastômero), uma vez que para aplicações estruturais, os termorrígidos destacam-se e são largamente utilizados. Um dos fatos que os tornam tão atraentes está relacionado ao seu processamento (BALASUBRAMANIAN 2013; PARDINI et al., 2006). Outro ponto importante é o processo de fabricação, que depende da constituição do compósito; quanto à fase dispersa e dispersante, e sua aplicação. Como exemplo, em compósitos estruturais utilizados na indústria aeronáutica, constituídos por uma matriz polimérica e reforçados com fibras contínuas, seu processamento resulta em um produto final fabricado com baixa massa específica e elevada resistência mecânica (REZENDE et al., 2011; CHUNG, 2010). O desenvolvimento e estudo desses novos materiais têm como objetivo substituir parcial ou totalmente os materiais utilizados convencionalmente, como metais, ligas metálicas, cerâmicas ou polímeros puros. A sua implementação pode atender às mais diversas áreas, não somente a indústria aeroespacial, mas também a indústria automobilística, fabricação de artigos esportivos, eletrônica, engenharia civil, entre outros, de maneira que se 23 alcance um valor desejável da relação resistência/peso (REZENDE et al., 2011; CHUNG, 2010). 2.2 MATRIZES TERMORRÍGIDAS EM COMPÓSITOS POLIMÉRICOS A função da matriz no compósito é envolver o reforço protegendo-o do meio externo e também distribuir a carga aplicada ao longo do material. O uso de matrizes poliméricas vem se destacando devido à sua baixa massa específica, quando comparadas às matrizes metálicas, por exemplo. As interações internas entre as fases dividem-se de duas maneiras: a física, que acontece por ancoramento mecânico (adesão mecânica entre a fase dispersa e a dispersante) e a química, que ocorre devido a ligações químicas. Para que haja uma distribuição de carga efetiva é importante que a matriz seja tenaz com dureza relativamente baixa e uma interação matriz/reforço adequada (CIOFFI, 2011; SONG et al., 2011). Na indústria aeroespacial, os compósitos de matriz termorrígida são os mais utilizados devido à suas propriedades, como boa resistência a solventes, alta temperatura de serviço significativa, resistência mecânica e baixa massa específica (REZENDE et al., 2011). As resinas termorrígidas que se destacam nesse setor são as resinas epóxi, fenólica, poliéster e poliimida (ORNAGHI, 2009; GALVÃO, 2012). No entanto, uma das desvantagens é que os termorrígidos não podem ser reprocessados, ou seja, não são recicláveis (SEVOSTIANOV; VERIJENKO; VON KLEMPERER, 2000). Os polímeros termorrígidos, diferentemente dos termoplásticos, apresentam uma etapa denominada cura que, segundo a terminologia química, acontece quando os grupos reativos, como os grupos epóxis, por exemplo, ou sítios ativos como insaturações, são consumidos. O processo de cura de um termorrígido é complexo e se caracteriza pelas mudanças que ocorrem nas propriedades químicas e físicas causadas pelo efeito de calor e/ou quando submetido por condições específicas de pressão e vácuo. Durante a cura, dois importantes fenômenos macroscópicos ocorrem: a gelificação e a vitrificação (LEE, 1967). Durante a gelificação, o sistema passa de um líquido viscoso a um gel elástico, ocorrendo a formação de uma rede de massa molar infinita; o que caracteriza um comportamento viscoelástico ao fluido (MANSON, 1976). A partir desse momento, a cura ocorre mais lentamente, com o aumento da densidade de ligações cruzadas no sistema, o que leva à uma maior dificuldade na mobilidade molecular. Com isso, as propriedades mecânicas, como a resistência à tração, e aquelas térmicas, como a temperatura de transição vítrea do material aumentam (PARDINI, 1990). O fenômeno de vitrificação ocorre após a gelificação e caracteriza-se pelo fim das 24 reações químicas, quando ocorre a reticulação total das cadeias, durante o processo de cura formando um sólido vítreo. As resinas não alcançam o estado de cura total, ou seja, 100% de conversão é altamente improvável, devido à restrição da mobilidade das moléculas no sistema, quando atingem a etapa de vitrificação, quando os grupos ou sítios reativos ainda presentes não são capazes de reagirem em razão dessa reticulação. Neste caso, pode-se dizer que eles encontram-se “aprisionados”, podendo reagir, posteriormente, caso entrem em contato com algum outro grupo reativo (PENN, 1982; REZENDE et al., 2011). Existem diversos métodos para o processamento de compósitos com matrizes poliméricas como a moldagem por compressão a quente, “laminação manual” e “laminação à pistola (spray-up)”, que são as técnicas mais conhecidas. Quando o material exige um processamento mais específico ou ainda uma etapa de pós-cura, como a fabricação de materiais com até 70% em volume de reforço, recomenda-se utilizar o processo de enrolamento filamentar ou autoclave, no entanto quando se requer uma geometria mais complexa, o emprego dessas técnicas torna-se limitado. Contudo, essas técnicas permitem um baixo teor de vazio, geralmente não alcançado por outros processos de compósitos (MAZUMDAR, 2002; LEVY NETO et al., 2006; ALMEIDA et al., 2018b). Um dos processos que se destaca, principalmente nos setores aeroespacial e automobilístico, é a técnica de moldagem por transferência de resina (RTM), que será tratada com mais detalhes posteriormente. Os materiais fabricados a partir dessa técnica possuem baixo teor de vazio e fração volumétrica de fibras superior a 50% (ALMEIDA JÚNIOR et al., 2012; MILITKÝ; JABBAR, 2015; STARK; JAUNICH; MCHUGH, 2015). 2.2.1 RESINA EPÓXI A resina epóxi, comumente utilizada como matriz de compósitos poliméricos estruturais, destaca-se frente à maioria dos outros tipos de resinas, como a poliéster, a fenólica e benzoxazina, por apresentar características como maior módulo de elasticidade e resistência à tração, boa resistência química, resistência à umidade, resistência térmica, estabilidade dimensional, boa aderência a grande parte das fibras sintéticas, entre outros (BEL; BOISSE; DUMONT, 2011; COSTA et al., 2011; PIRES, 2012; SHIINO et al., 2012). A reação de cura da resina epóxi acontece por meio da polimerização, utilizando agentes de cura. Essas substâncias têm como função reduzir a energia de ativação e aumentar a velocidade da reação criando um caminho alternativo pela combinação de reagentes que 25 modificam os mecanismos de reação (REZENDE et al., 2011; CHUNG, 2010). O tempo de cura é uma das principais desvantagens apresentadas por esse material, assim como as etapas de pré-processamento como a preparação do molde com o emprego de desmoldante e elementos para vedação, que se tornam necessárias para a fabricação adequada do produto acabado. A temperatura de trabalho é outro importante fator que deve ser considerado, se o aquecimento do material ultrapassar a temperatura de estabilidade térmica da resina poderá ocasionar a degradação do material. Para garantir que a estabilidade térmica seja mantida utiliza-se a temperatura de transição vítrea como referência de temperatura de trabalho (CIOFFI, 2011; DONG; DAVIES, 2015). A resina epóxi recebe esse nome devido ao grupo epóxi presente na sua estrutura química, sendo a mais comum a resina epóxi aromática, chamada também de DGEBA (Diglicidil Éter de Bisfenol A) representada na Figura 2, onde podem ser observados grupos epóxis nas extremidades da cadeia principal. Durante a cura do material são formadas ligações cruzadas, devido à presença desses grupos, o que resulta em um material final rígido (BALASUBRAMANIAN, 2013; PENN et al., 1982). Figura 2 - Estrutura química da resina epóxi DGEBA. Fonte: Adaptado de Penn et al. (1982). 2.3 REFORÇO A maior parte dos reforços utilizados em compósitos estruturais se dá no formato de fibras. Estas podem ser encontradas de maneira diversificada como na forma de fibras contínuas, fibras descontínuas e particulares. Seu formato influencia diretamente na distribuição de tensões no material acabado. Por exemplo, quanto maior o comprimento, mais eficiente será a distribuição da tensão ao longo do material. O reforço tem como principal função atribuir ao material final maior resistência mecânica. O diâmetro dos filamentos que compõem as fibras varia entre 5 e 20 µm e quanto mais finas são as fibras maior a tendência do material final ser mais resistente, pois diminui a ocorrência de defeitos o que levaria a falhas no material (GAY, 2003). A desvantagem da utilização desses materiais está por conta 26 do custo de produção elevado, uma vez que para fabricação de materiais com essas dimensões se requer técnicas e maquinários muito específicos (PARDINI, 2006; GAY, 2003). As fibras são divididas em fibras naturais (animal, vegetal e mineral - como por exemplo fibra de juta e macadâmia) e fibras sintéticas (como por exemplo, carbono, aramida e vidro). Como vantagem das vibras vegetais destacam-se boa resistência à tração e o módulo de elasticidade, porém seu uso pode ser restringido devido à sua baixa resistência térmica e por absorver umidade. Os principais setores que utilizam essas fibras em compósitos são os de construção civil e o automobilístico (ORNAGHI, 2014; ALMEIDA JÚNIOR et al., 2012; ORNAGHI, 2009; ROMANZINI et al., 2013), em interior de automóveis por apresentarem ótimo isolamento acústico. As fibras vegetais são basicamente formadas por celulose, hemicelulose e lignina, são empregadas como reforço em materiais poliméricos quando se busca uma baixa massa específica e baixo custo. Outras vantagens no emprego desses materiais deve-se à facilidade de ser encontrada no mercado, menor custo de processo em relação às sintéticas e por serem recursos oriundos de fontes renováveis, além da possibilidade de empregar mão-de-obra local (ORNAGHI, 2014; ORNAGHI et al., 2019). As fibras sintéticas, comparadas às fibras naturais, possuem vantagens como maior resistência mecânica (como por exemplo maior resistência quanto a tração), maior modulo de elasticidade, possui melhor resistência à umidade e a ataques químicos. Esse material pode ser aplicado nas mais diversas áreas, tais como, indústrias automobilísticas, aeroespaciais, construção civil, entre outras. Essas fibras possuem o custo relativamente mais elevado que o custo das fibras naturais, além de possuírem, em alguns casos, certos componentes que são prejudiciais ao meio ambiente ou à saúde dos seres vivos (ORNAGHI, 2009). 2.3.1 Fibra de Vidro As fibras de vidro possuem certas características, como baixo custo, alta resistência à tração, baixa degradabilidade comparada as fibras naturais por exemplo (o que resulta em um material com vida útil maior), são isolantes térmicos e acústicos, possuem boa resistência química, baixa massa específica e baixo coeficiente de expansão térmica, o que diminui as tensões residuais geradas durante o processo e que as tornam o reforço mais utilizado em compósitos poliméricos (REZENDE et al., 2011; GAY, 2003; BRANDY, 1984). A composição química das fibras de vidro pode variar de acordo com seu constituinte e aplicação, como mostrado através da Tabela 1. 27 Tabela 1 – Composição química (%) das fibras de vidro. Componentes SiO2 Al2O3 B2O3 MgO CaO Na2O Vidro E 55,2 14,8 7,3 3,3 18,7 - Vidro C 65 4 5 3 14 8,5 Vidro S 65 25 - 10 - - E= Resistência elétrica; C= Resistência química; S= Resistência mecânica. Fonte: Adaptado de Levy Neto et al. (2006). O principal constituinte da fibra de vidro é a sílica (SiO2). O material em sua forma pura (SiO2)n não apresenta um ponto de fusão definido e amolece próximo a 2000 ºC, quando começa a se degradar (KOTHARI, 1997). 2.3.2 Tecido não-dobrável Os tecidos não-dobráveis (NCF - Non-Crimp Fabric), são reforços secos que possuem como características camadas de fibras orientadas em uma direção, costuradas por fios de poliéster para dar forma a um não-tecido (Figura 3), com orientações tipo unidirecional, biaxial e quadriaxial (CIOFFI, 2011; DUAN et al., 2002; AUENHAMMER et al., 2020). Seu emprego possibilita a produção de compósitos com finas camadas, com quantidade de filamentos relativamente grande e a variabilidade quanto à arquitetura (CIOFFI et al., 2010). A impregnação do reforço pela resina acontece com maior eficiência em relação às mantas de fibras aleatórias, por exemplo, devido à orientação unidirecional das fibras, o que corrobora com a melhor homogeneidade dos compósitos fabricados com esse tipo de tecido. Figura 3 - Estrutura de um tecido NCF (Non-Crimp Fabric). Fonte: Cioffi (2011). 28 Os tecidos NCF são ideais para a fabricação de compósitos, pois apresentam bom desempenho mecânico no plano de carregamento e ainda possibilita a fabricação de compósitos com complexas arquiteturas (MARKLUND; ASP; OLSSON, 2014; EDGREN; ASP, 2005). Outra vantagem apresentada por esses tecidos é o baixo custo de processamento, pois o processo ocorre em uma única etapa, o que leva a um tempo menor de processo e exige menos mão de obra (MIKHALUK et al., 2008). Os tecidos NCF também são conhecidos como tecidos multiaxiais acoplados, devido principalmente às suas grandes variações quanto à arquitetura. Esta pode ser classificada como unidirecional, biaxial, triaxial ou quadriaxial, essa classificação é dependente da quantidade de camadas e de como elas variam quanto à sua orientação. As fibras podem ser alinhadas na direção longitudinal (0°), oblíqua (30° < θ < 90°) e transversal (90°) (KONG, 2004). Esses tecidos são indicados, principalmente, em processos com molde fechado. Uma das justificativas se deve às fibras apresentarem linearidade e baixa ondulação, corroborando para uma boa impregnação e molhabilidade do tecido. A costura contribui para a não dobra dos feixes de fibra e para a difusão da resina no sentido vertical através das camadas do tecido, de modo que a taxa de infusão seja otimizada (CIOFFI, 2011). Os tecidos NCF são altamente aplicados em componentes aeroespaciais, como por exemplo, na fabricação do anteparo traseiro da parte pressurizada da aeronave Airbus A380, peça esta fabricada através do processo de infusão de resina (FONTES, 2017). Koziol (2016), realizou um estudo entre compósitos em formatos de placas planas e peças em formas curvilíneas e avaliou, a partir de diferentes tipos de tecidos utilizados como reforço, o comportamento mecânico dos materiais. Foram comparados um tecido 3D, um tecido costurado bidirecional e um tecido bidirecional plano (descrito pelo autor como “clássico”), todos esses tecidos utilizaram fibras de vidro-E. Os resultados obtidos nesse estudo mostraram que os compósitos em forma curvilínea apresentaram menor resistência mecânica (flexão e tração), quando comparados aos compósitos em formato plano. Também concluiu que os compósitos fabricados com tecidos costurados e com tecidos 3D são menos sensíveis à diminuição da resistência mecânica com a curvatura, o que possibilita concluir que esses tecidos exibem uma estrutura mais estável. 29 2.4 MÉTODO DE MOLDAGEM 2.4.1 Moldagem por transferência de resina (RTM) O processo de RTM foi criado devido à necessidade de maior produtividade e melhor desempenho na impregnação das fibras. Ganhou destaque na linha produtiva em diversos segmentos comerciais, principalmente na indústria aeronáutica, civil, automobilística, militar e setores de materiais esportivos. Os moldes utilizados para esse processo são hermeticamente fechados, o que evita a propagação de voláteis no ambiente de trabalho e, em geral, confeccionados de aço ou alumínio, de modo que seu uso seja possível durante longos ciclos. Essa técnica é ideal para matrizes termorrígidas e se destaca nos setores automobilístico e aeroespacial. Estudos realizados a partir desse processo tem concebido compósitos com maior resistência, como por exemplo ao carregamento cíclico, quando comparados aos produzidos por VARTM ou outras técnicas menos automatizadas (BROCKS et al., 2013; ROSS; CRISTESCU; SIERAKOWSKI, 1976; PARNAS et al., 1994; SHIINO; CIOFFI; VOORWALD, 2011). O emprego desse método se dá devido à complexidade geométrica de algumas peças, o processo ocorre em sistema fechado sob pressão e temperatura controlada durante todo processamento; vácuo e tempo minimizado. Esses fatores contribuem para um material com baixo volume de vazios e produção em larga escala (BROCKS et al., 2013; CÂNDIDO et al., 2014). Para essa técnica, o ideal é ter o conhecimento de variáveis que irão influenciar no processamento do material, tais como a geometria do molde, o tipo de fibra, as características da resina, a temperatura do molde, a temperatura da resina para injeção, pressão de injeção e uso de vácuo. A função do vácuo é retirar os voláteis e bolhas de ar aprisionadas no reforço (LEE; WEI, 2000). Uma das razões que tornam a resina epóxi ideal para processamento RTM é a baixa viscosidade quando aquecida em seu estágio inicial de cura, onde monômeros com a massa molar constante ainda não formaram nenhuma rede. A baixa viscosidade é ideal para esse processo, pois a impregnação do reforço acontece de maneira mais eficiente, permitindo que a resina envolva cada filamento do cabo de fibras, o que resulta em um material com boas propriedades mecânicas e baixa fração volumétrica de vazios (ZACHARUK et al., 2011; LOPES et al., 2010; VAN VELTHEM et al., 2015). O processamento do compósito envolve quatro etapas consecutivas, sendo elas: (i) armanezamento em temperatura ideal da formulação reativa; (ii) obtenção do formato por 30 meio do molde e formação de fluxo; (iii) processo de polimerização, também chamado de cura; (iv) desmoldagem, podendo haver uma etapa de pós cura. (i) Nessa etapa o tempo em que a formulação é armazenada em função da temperatura é importante para o processamento, pois é essencial que a taxa de polimerização seja baixa para que assim seja possivel utilizar a solução reativa até que se complete o ciclo de processamento do material; (ii) Na segunda etapa, a resina deve ser distribuida no molde antes de iniciar a polimerização, pois se não a viscosidade aumenta dificultando o processo; (iii) A tercira etapa, por envolver a cura por meio de aplicação de calor, é definida baseada em um ciclo térmico, de maneira que seja possível uma cura rápida e mínimo consumo de energia. (iv) A quarta etapa deve ocorrer de maneira a não gerar alterações na superfície e formato do produto final. As principais vantagens do RTM em relação a outros processos, como por exemplo autoclave, são: a possibilidade de processar compósitos em diferentes formatos; proteger o ambiente de trabalho, uma vez que o processo ocorre em molde fechado, os voláteis liberados são retirados por um sistema de bomba a vácuo; o tempo para injeção da resina é consideravelmente baixo; uso de tecidos secos e o processamento ocorrido em uma fase (SHIINO, 2015; MONTORO, 2013;NAIK; SIRISHA; INANI, 2014). 2.5 POROSIDADE Os compósitos são passíveis de apresentar inúmeros tipos de defeitos, que podem corroborar com um dano uma vez em operação. Os defeitos mais comuns são os vazios ou porosidade, delaminação, acúmulo de resina em regiões específicas, inclusões, desalinhamento de camadas ou orientações incorretas das fibras. A porosidade, ou vazios, é responsável pela maioria dos defeitos gerados durante o processo de fabricação dos materiais compósitos (ANCELOTTI, 2006). A palavra “porosidade” e “vazios”, na literatura, são utilizadas de maneira indiferente e possuem o mesmo significado, logo neste trabalho as palavras serão empregadas como sinônimo. A porosidade é um defeito que pode ocorrer devido a diversos fatores, como a descontinuidade na impregnação, impregnação inadequada na região de interface e/ou devido à presença de monômeros que não reagiram. A existência desse defeito torna-se um grande problema para certas aplicações, pois leva à redução do desempenho mecânico do material, 31 pois são concentradores de tensão; sabe-se que esse defeito corrobora com a diminuição da resistência à compressão, da resistência ao cisalhamento interlaminar e da resistência à flexão (VARNA et al., 1995; PARK et al., 2011; MONTORO, 2014; OLIVEIRA; BECKER; AMICO, 2014). Outro motivo que pode gerar tais defeitos é o uso de resinas com um elevado teor de voláteis, caso a cura da resina aconteça antes de os voláteis serem removidos do material, porosidades internas serão formadas, mostrando a necessidade da desgaseificação antes da injeção. A porosidade presente na superfície dos materiais é prejudicial ao desempenho mecânico, uma vez que em muitos casos a fratura começa devido aos defeitos superficiais. A Figura 4 exemplifica os possíveis poros no material polimérico, com conectividade e sem conectividade com a superfície (MONTORO, 2014; OLIVEIRA; BECKER; AMICO, 2014; NIU, 2000). Figura 4 - Representação dos tipos de poros presentes em materiais referentes à forma: (PT) poros de transporte, (PA) poros abertos, (PF) poros fechados e (PG) poros do tipo gaiola. Fonte: Adaptado de Gregg e Sing (1982). Os vazios no RTM são formados principalmente pelos mecanismos de impregnação dos meios fibrosos, geralmente pela arquitetura não homogênea das fibras, durante o preenchimento do molde, o que resulta em uma permeabilidade não uniforme da pré-forma de fibra, resultando na variação da velocidade de injeção da resina. Essa variação na velocidade é acentuada pelo efeito capilar, sobressaindo na microestrutura. Os vazios uma vez formados são conduzidos durante o preenchimento, o que leva à alteração da sua distribuição espacial e morfologia geométrica (PATEL; LEE, 1996c; SHIH; LEE, 2002a; BLACKMORE; LI; GAO, 2001; MEHDIKHANI et al., 2019b). 32 Embora a impregnação da pré-forma em macroescala seja descrita geralmente pela lei de Darcy, baseado na teoria do escoamento de meios porosos, (IKEGAWA; HAMADA; MAEKAWA, 1996; CHOI; DHARAN, 2002), dois fluxos distintos se desenvolvem em escalas diferentes: 1) um fluxo viscoso entre os feixes de fibra; e 2) um fluxo capilar dentro de cada feixe de fibras, impulsionado por forças capilares. Quando esses dois fluxos estão avançando em velocidades frontais distintas, os vazios são formados pelo chamado aprisionamento mecânico (SHIH; LEE, 2002a; ABRAHAM; MCILHAGGER, 1998). De modo geral, quando a fração volumétrica de porosidade é inferior a 1,5% os poros são esféricos e pequenos, quando ultrapassam esse valor, aproximando-se dos 10%, tem a tendência de serem achatados, maiores e alongados (MEHDIKHANI et al., 2019b; STONE; CLARKE, 1975). O reforço também influencia as características apresentadas pelos poros, de acordo com sua orientação e distribuição na matriz. Para compósitos com reforços unidirecionais os poros são menores e esféricos, comparados aos compósitos quase- isotrópicos por exemplo, que apresentam poros mais alongados e achatados (HSU, 1987; COSTA; REZENDE; ALMEIDA, 2000). Os compósitos reforçados com tecido apresentam poros em diferentes formas, como esféricos (HSU, 1988), formas em cone truncado (RUBIN; JERINA, 1994) e até mesmo em formato triangular (COSTA; REZENDE; ALMEIDA, 2000). Compósitos fabricados a partir desse reforço apresentam concentração de poros mais acentuada nas regiões com acúmulo de resina. De uma maneira geral, compósitos com grandes quantidades de vazios apresentam uma homogeneidade maior na sua distribuição, enquanto os materiais com baixa formação de vazios tendem a concentrar-se em certas regiões, principalmente nas que apresentam maior quantidade de resinas (BOWLES; FRIMPONG, 1992). Os compósitos reforçados com fibras, devido à sua natureza multiescalar, podem apresentar três diferentes escalas de vazios, sendo eles: macroporos, mesoporos e microporos. Através da Figura 5 pode-se observar as características dos poros quanto à escala. Os mesoporos são formados entre os feixes de fibras, os macroporos são formados em uma zona maior da pré-forma e podem ser observados a olho nu, e os microporos são formados entre as fibras que formam os feixes de fibras e são em geral menores que os mesoporos na seção transversal, em contrapartida são geralmente maiores na vista plana (MEHDIKHANI et al., 2019b). 33 Figura 5 - (a) Esquema da formação de vazios durante o fluxo longitudinal e transversal na moldagem de compósito líquido de um reforço fibroso de dupla escala, exibindo a competição entre o fluxo viscoso e o fluxo capilar – as setas inclinadas demonstram a impregnação transversal dos feixes; (b) micrografia demonstrando microporos dentro dos feixes de fibras; (c) micrografia demostrando mesoporos entre os feixes de fibras. Fonte: Adaptado de Mehdikhani et al. (2019b). Ainda pode-se encontrar outras nomenclaturas atribuídas aos poros quanto à sua escala. Muitas literaturas nomeiam os macroporos em “pontos secos”, os mesoporos podem ser chamados de poros interfilamentares ou de canais, e os microporos podem ser conhecidos como poros intrafilamentares. Os macroporos são regiões que não foram impregnadas pelo fluxo macroscópico da resina, enquanto a resina já atingiu a abertura de saída do processo. Esses poros podem ser observados a olho nu, e geralmente são introduzidos por padrões de fluxos distorcidos, em virtude da irregular permeabilidade do reforço, locais de injeção inadequados, ou devido à presença de irregularidades do molde, como nervuras ou desgaste (MEHDIKHANI et al., 2019b). 34 O processo que envolve a moldagem de compósitos com matriz líquida é considerado adequado e eficiente para a produção de peças sem pontos secos visíveis. Porém, no interior dos feixes de fibras a impregnação pode ocorrer de maneira incompleta, que pode formar os microporos e os mesoporos. Correlacionam-se com duas escalas distintas de lacunas a serem preenchidas pela resina: as grandes lacunas (mesoporos), ocorrem entre os feixes de fibras; e os pequenos canais (microporos), ocorrem no interior dos feixes, entre as fibras individuais, Figura 5a (MEHDIKHANI et al., 2019b). Entre os feixes de fibras, a força hidrodinâmica direciona o fluxo viscoso da resina. Já entre as fibras individuais que formam os feixes, devido ao pequeno diâmetro, a tensão superficial torna-se mais importante, logo o fluxo de absorção devido à pressão capilar torna- se um fator atuante para conduzir o fluxo da resina. A formação de mesoporos e microporos é controlada entre as diferenças de força do fluxo viscoso e do fluxo capilar. Se o fluxo capilar entre as fibras dominar o fluxo da resina, as regiões entre os feixes de fibras do reforço permanecem sem preenchimento, formando vazios entre eles, como pode ser observado nas Figuras 5a e 5c. Porém, quando o fluxo hidrodinâmico acontece mais rapidamente, as fibras individuais formadoras dos feixes de fibras permanecem sem preenchimento, e os microporos são formados no interior dos feixes, conforme representado nas Figuras 5a e 5b (MEHDIKHANI et al., 2019b). O fluxo da resina pode acontecer em duas direções em relação à orientação da fibra. Por meio de modelagens analíticas foi possível mostrar que quando o fluxo é perpendicular à direção da fibra (fluxo transversal - Figura 5a), os vazios são distribuídos por todo compósito, enquanto que, se o fluxo de resina acontecer paralelamente à direção das fibras (longitudinal/axial – Figura 5a), os vazios são localizados na região frontal do fluxo (MEHDIKHANI et al., 2019b). Diversas metodologias podem ser empregadas para o estudo e visualização na formação de vazios, como por exemplo: gravação de vídeos alta resolução por microscopia assistida, combinação de técnicas de análise visual de imagens, sistema de sensor de voltagem, termogravimetria por infravermelho e tomografia de raios X computadorizada (Micro-TC). Independente do fluxo ser longitudinal ou transversal, a impregnação dos feixes pode acontecer em duas direções: paralelas (indicadas pelas setas retas na Figura 5a) e transversal (indicadas pelas setas inclinadas na Figura 5a). Binetruy et al. utiliza um modelo analítico para verificar que no fluxo longitudinal a impregnação dos feixes acontece transversalmente (MEHDIKHANI et al., 2019b; BINETRUY et al., 1998). 35 O tamanho do vazio pode influenciar na sua mobilidade durante o processamento do material. Em geral, os mesoporos podem ser removidos facilmente caso eles se movam com a resina, enquanto os microporos são mais difíceis de remover. Estudos realizados por Rohatgi, Patel e James Lee (1996), atribuíram este fato às lacunas muito maiores entre os feixes de fibras do que aquelas dentro dos feixes, o que resulta em arrasto de fibras insuficiente, devido à pressão hidrodinâmica, para tornar os microporos móveis, por isso a escolha de um processo que minimize a formação desse vazio é de crucial importância. Os estudos de Frishfelds, Lundström e Jakovics (2008) mostraram que em reforços do tipo NCF impregnados, a movimentação dos vazios acontece com a movimentação da resina através dos canais existentes entre os feixes, caso esses canais sejam muito estreitos os poros ficarão aprisionados. Schell et al., 2007 estuda os vazios em um compósito de vidro/epóxi processado via RTM por meio da microtomografia computadorizada de raios X. Os resultados permitiram observar a presença de pequenos espaços de geometria esférica localizada em regiões ricas em resina e grandes espaços irregulares os feixes sobrepostos. Um estudo comparativo entre a técnica de microtomografia computadorizada de raios X e algumas outras técnicas de caracterização de vazios foi realizada por Little, Yuan e Jones (2012), onde foi possível observar que esta técnica mais precisa e confiável, que ainda possibilita a análise da forma, tamanho, distribuição e conteúdo dos espaços vazios nos materiais. Os vazios detectados pela técnica de microtomografia computadorizada de raios X em compósitos de carbono/epóxi são apresentados na Figura 6. 36 Figura 6 - Vazios em um compósito com de carbono/epóxi caracterizado por microtomografia de raios X, exibidos em (a) topo, (b) 3D, (c) frente e (d) vista lateral. Fonte: Little, Yuan e Jones (2012). 2.6 PROPRIEDADES DINÂMICO-MECÂNICAS Os polímeros são materiais viscoelásticos, ou seja, em condições de deformação apresentam de maneira simultânea componentes elástico e viscoso. Quando uma tensão senoidal é aplicada em um material polimérico ou em um compósito polimérico a resposta à deformação também será senoidal, porém atrasada comparada à solicitação inicialmente aplicada (Figura 7). O atraso ocorre devido ao tempo que as moléculas levam para se rearranjarem e está relacionado à relaxação das cadeias poliméricas ou grupos pendentes (BOTELHO et al., 2005). Nos sólidos lineares a tensão aplicada (σ) é proporcional à deformação (ε) obedecendo a lei de Hooke, Eq. (1) na qual a razão de proporcionalidade corresponde ao módulo de elasticidade (E). Os líquidos viscosos baseiam-se conforme a lei de Newton, Eq. (2), na qual a tensão de cisalhamento (τ) e a taxa de deformação ou gradiente de velocidade (dUx/dy) apresentadas pelo material estão relacionadas pela viscosidade constante (μ) (PASCAULT, 2002). " = $ ∗ & (1) 37 ' = ( ∗ )!"!!# * (2) Figura 7 - Tensão (σ) aplicada em um material, deformação (ε) resultante e ângulo de defasagem (δ) entre a tensão e a deformação. Fonte: Lorandi, Cioffi e Ornaghi (2016). Para melhor compreensão das propriedades viscoelásticas dos materiais poliméricos termorrígidos, dependentes do tempo e da temperatura, é essencial o conhecimento a respeito de certas propriedades físicas, tais como densidade de ligações cruzadas, mobilidade das cadeias, volume livre e temperatura de transição vítrea. A estrutura química molecular e macromolecular está relacionada diretamente a essas propriedades. A heterogeneidade apresentada pelos compósitos termorrígidos exige o conhecimento de outras características, além das propriedades físicas, tais como a morfologia e a interface (PASCAULT, 2002). A análise dinâmico-mecânica de materiais poliméricos permite obter informações como módulo de armazenamento, módulo de perda e o fator de perda, além das transições de relaxação primária, secundária e terciária. O módulo de armazenamento define o comportamento elástico do material, medido em cada ciclo baseado na força (tensão) exigida para ocasionar o deslocamento/deformação (amplitude). O módulo de perda define o comportamento viscoso do material, obtido através da diferença de fases existente entre a tensão e a deformação. O fator de perda mede a energia dissipada no material, calculada a partir da razão entre o módulo de perda pelo módulo de armazenamento (ALMEIDA et al., 38 2018b; WILLIAMS; SUMMERSCALES; GROVE, 1996; FLIEGENER; HOHE; GUMBSCH, 2016). As propriedades apresentadas pelos polímeros termorrígidos variam de acordo com o comportamento característico do material, em função do tempo e da temperatura, e podem ser divididas da seguinte maneira (PASCAULT, 2002): Região Vítrea: Nesta região o material polimérico possui comportamento vítreo/frágil. As propriedades são basicamente imperceptíveis às modificações de estrutura em escala macroscópica, sendo praticamente dependentes da energia de coesão que ocorre em nível molecular. Região de transição vítrea: Região compreendida entre as regiões I e III da Figura 8, nela as propriedades são influenciadas aos níveis macromolecular e molecular, ocorrendo simultaneamente. Como por exemplo, o efeito das ligações cruzadas na Tg (nível macromolecular), é decorrente da função apresentada pela rigidez das cadeias, dependente de aspectos moleculares. Região elastomérica: Nessa região o polímero apresenta um comportamento de um sólido viscoso. As propriedades são basicamente imperceptíveis às modificações de estrutura em escala molecular, sendo praticamente dependentes da estrutura macromolecular, como por exemplo, da densidade de ligações cruzadas. Um exemplo característico de variação do módulo de armazenamento, do módulo de perda e do fator de perda (em função da temperatura) está representado através da Figura 8 a seguir, onde pode-se observar as três regiões descritas anteriormente. 39 Figura 8 - Representação das regiões comumente encontradas em um polímero junto ao módulo de armazenamento, módulo de perda e fator de perda. Fonte: Lorandi, Cioffi e Ornaghi (2016). Nos compósitos poliméricos, graças ao seu comportamento viscoelástico, são encontrados dois valores de módulos, sendo o módulo de armazenamento (E') e o módulo de perda (E’’). A Figura 9a e Figura 9b apresentam um esquema que mostra que o módulo de armazenamento é proveniente do componente de tensão resposta em fase junto à deformação; o módulo de perda é proveniente do componente da tensão resposta a 90º fora de fase com a deformação. Geralmente, os resultados dinâmico-mecânicos são representados, matematicamente, em termos de módulo complexo (E*) por essas componentes (E’ e E’’) como pode ser verificado pela Eq. 3, definida pela razão trigonométrica, representada pelo esquema da Figura 10 (NIELSEN, 1994; LUCAS et al., 2001). !∗ = !" + %!′′ (3) O módulo de armazenamento (E’) representa a parte real do número complexo e a parte imaginária é representada pelo módulo de perda (E”). A razão entre esses valores, representa uma grandeza intitulada tangente de perda ou (tan δ), demostrada através da Eq. 4 (MAZUR, 2010). '() δ = #" #" (4) 40 Figura 9 - Representação das funções senoidal da deformação aplicada (γ) e da tensão resposta (σ) para materiais: (a) elásticos lineares, (b) viscosos lineares e (c) viscoelásticos. Fonte: Lucas et al. (2001). Figura 10 - Relação trigonométrica entre o módulo complexo (E*), módulo de armazenamento (E’) e módulo de perda (E’’) com o ângulo (δ). Fonte: Lorandi, Cioffi e Ornaghi (2016). A tangente de perda, também é conhecida como amortecimento ou fricção interna, representa a razão entre a energia dissipada por ciclo e a energia potencial máxima armazenada durante o ciclo. Com isso, os materiais com maior rigidez apresentam valores de tan δ menores, comparados aos materiais mais flexíveis. A Figura 9c apresenta um esquema das funções senoidal de deformação empregada e da tensão resposta para os materiais elásticos lineares, viscosos lineares e viscoelásticos (LUCAS et al., 2001). O módulo de armazenamento corresponde à resposta elástica do material, logo trata-se de uma medida reversível (FANCEY, 2005). Baseado na tensão aplicada e na deformação 41 resultante e pela relação trigonométrica da Equação 3, o módulo de armazenamento (E’) pode ser calculado baseado na Eq. 5 a seguir. !" = %! &! +,- . = !∗+,- . (5) E* representa o módulo complexo, σ0 corresponde a amplitude da tensão empregada, ε0 corresponde a amplitude da deformação resultante e δ refere-se ao ângulo de defasagem entre essas amplitudes (MILITKÝ; JABBAR, 2015; GOERTZEN; KESSLER, 2006; WU; LIN; MURAKAMI, 2017). É importante ressaltar a diferença existente entre o módulo de armazenamento obtido no DMA (análise dinâmico mecânica) e pelo módulo de Young de determinado material. O módulo determinado através do DMA é dinâmico, sendo a tensão ou deformação mecânica empregada no material é oscilatória, tendo como resultado a deformação sofrida ou tensão resultante em função da temperatura ou da frequência. O módulo de Young do material é obtido a partir do ensaio estático e destrutivo, calculado através do início da inclinação da curva tensão-deformação, na qual a tensão e a deformação são aplicadas sobre o material à taxa constante (YANG et al., 2006). O módulo de perda (E’’) ao contrário do módulo de armazenamento (E’) é uma medida irreversível, e deve-se à resposta viscosa (LORANDI et al., 2018). Pode ser calculado através da Eq. 6. !′" = %! &! -/) . = !∗-/) . (6) E* representa o módulo complexo, σ0 corresponde à amplitude da tensão empregada, ε0 corresponde a amplitude da deformação resultante e δ refere-se ao ângulo de defasagem entre essas amplitudes (MILITKÝ; JABBAR, 2015; GOERTZEN; KESSLER, 2006; WU; LIN; MURAKAMI, 2017). O tan δ é um indicativo da diferença encontrada no comportamento do material com o comportamento elástico ideal. Os materiais com tan δ elevado dissipam a maior parte da energia utilizada para deformá-lo na forma de calor. Materiais que apresentam comportamento Newtoniano são casos de grande dissipação da energia na forma de calor com amortecimento infinito (tan δ = ∞), como por exemplo a água. Já os materiais perfeitamente elásticos não apresentam amortecimento (tan δ = 0), como é por exemplo as molas ideais. Os 42 polímeros são materiais que apresentam um comportamento intermediário entre estes extremos, logo são classificados como viscoelásticos (LUCAS et al., 2001). A região de transição vítrea é caracterizada pela inclinação abrupta da curva referente ao módulo de armazenamento. Também pode ser representada pelos picos das curvas que indicam o módulo de perda e tan δ. Como se trata de uma região, e não de um ponto específico, a temperatura de transição vítrea pode apresentar diferentes valores, de acordo com a curva considerada para esta avaliação (LORANDI; CIOFFI; ORNAGHI, 2016). 2.7 FLUÊNCIA Todos os materiais fluem em função do tempo. Esse efeito pode ser acelerado com o aumento da temperatura ou da tensão aplicada. Logo, a fluência é uma deformação plástica que ocorre quando o material é submetido a certas condições de tensão e temperatura, ambas constantes. Essa deformação é fortemente influenciada pela força e pela temperatura aplicada ao material. A temperatura envolvida na grande maioria dos casos é elevada, entretanto, abaixo da temperatura de fusão para polímeros termoplásticos ou abaixo da temperatura de transição vítrea caso se trate de polímeros termorrígidos, pois são dependentes da aplicação (FINDLEY, 1976). A estabilidade dimensional do material é medida no ensaio de fluência e a resistência que ele apresenta a este ensaio é o que determina seu tempo de vida útil. Esta análise é de grande relevância para os materiais com caráter estrutural, pois a partir das informações fornecidas verifica-se sua aplicação por longos períodos. Os períodos são determinados de acordo com os resultados obtidos por ensaios acelerados que definem o comportamento do material em um curto espaço de tempo. A partir de técnicas que extrapolam esses resultados tem-se o comportamento do material em períodos de tempo inacessíveis laboratorialmente (décadas) (FINDLEY, 1976; YANG et al., 2006; NIELSEN, 1994). O ensaio de fluência ainda fornece importantes informações a respeito da viscosidade e das propriedades viscoelásticas dos materiais poliméricos e dos compósitos com matriz polimérica. Os compósitos tendem a apresentar a fluência reduzida, devido ao reforço na matriz, isto se justifica, pois há um aumento da rigidez estabelecida pelo reforço que reflete diretamente na matriz. A redução da fluência implica em uma estabilidade mais eficiente do material quando este é sujeito a certas condições de tensões/temperatura. Os resultados obtidos são fortemente influenciados de acordo com as características do compósito, como por exemplo, o tipo de reforço utilizado, o seu volume, a interface reforço/matriz, a 43 porosidade, entre outros fatores (RAGHAVAN; MESHII, 1998; NIELSEN, 1994; GEORGIOPOULOS; KONTOU; CHRISTOPOULOS, 2015; MILITKÝ; JABBAR, 2015; GOERTZEN; KESSLER, 2006; PULNGERN et al., 2016). Para polímeros termorrígidos, devido à presença de ligações cruzadas, quando se aplica uma tensão mesmo que constante no material, a resposta a esta solicitação não é constante ao longo da espessura do material, pois a mobilidade das cadeias apresenta diferentes restrições (NIELSEN, 1994). A fluência pode ser definida de acordo com três estágios (Figura 11), em função da variação das dimensões (deformação) do material ensaiado com o decorrer do tempo (FINDLEY, 1976): I) Primeiro estágio: conhecido como fluência primária, nesta região ocorre a deformação elástica do material, sucessivamente ocorre a deformação plástica com velocidade de fluência maior. A velocidade de deformação neste estágio é decrescente; II) Segundo estágio: conhecido como fluência secundária, nesta fase ocorre a etapa mais longa de todo processo e caracteriza-se por apresentar taxa de fluência constante. III) Terceiro estágio: conhecido como fluência terciária, nesta fase a deformação do material acontece de maneira muito rápida e termina com sua ruptura, ou seja, a fluência ocorre a uma taxa crescente. 44 Figura 11 - Curva típica para a deformação por fluência e taxa de fluência em função do tempo, com as três etapas do processo de fluência de um material. Fonte: Adaptado de Nielsen (1994). O estudo da fluência em compósitos que apresentam baixa deformação pode ser realizado através da análise dinâmico-mecânico (DMA). A análise dinâmico-mecânica para estudos com alta deformação não é possível, devido às limitações do equipamento. A análise utilizando baixas deformações, mesmo que normalmente não são deformações de uso, são importantes uma vez que as respostas associadas a esta deformação se devem às propriedades microestruturais do material. Por meio desta técnica, é realizado um ensaio de deformação em função do tempo em uma temperatura e tensão específicas. Para os compósitos, a resistência à fluência está relacionada diretamente com a deformação viscoelástica e com o comportamento interfacial entre fibra/matriz. A temperatura, tensão e tempo são parâmetros essenciais para descrever o comportamento viscoelástico, principalmente quando a interação entre fibra/matriz precisa ser avaliada, logo modelos matemáticos foram propostos com a finalidade de prever o comportamento de fluência dos materiais a médio e a longo prazo, sendo os modelo de Findley, de Burger e de Weibull os mais conhecidos (FINDLEY, 1976; YANG et al., 2006; GEORGIOPOULOS; KONTOU; CHRISTOPOULOS, 2015; MILITKÝ; JABBAR, 2015; LORANDI; CIOFFI; ORNAGHI, 2016; GUEDES, 2004; DENG; HOU; YE, 2007). 45 2.7.1 Modelo de Findley As curvas de fluência de grande parte dos polímeros são muito semelhantes com as curvas de fluência apresentadas pelos materiais metálicos. Logo, muitos autores basearam-se em modelos matemáticos de fluência para metais para elaborar modelos empíricos e descrever o comportamento de fluência dos polímeros. O modelo de Findley é um dos mais conhecidos, e descreve o comportamento de fluência de muitos materiais poliméricos com uma boa precisão em uma ampla escala de tempo, baseado na Eq. 7 (FINDLEY, 1976)(YANG et al., 2006): 0(') = 0' + 3'( (7) (n) é uma constante da tensão e geralmente menor que 1; (0') é a deformação elástica (mm.mm-1); (A) é a amplitude da deformação elástica transiente (mm.mm-1.s-1); (0') e (A) são funções da tensão e variáveis ambientais que incluem o tempo e a umidade; (0(')) é a deformação por fluência (mm.mm-1) no tempo (') (s). As duas constantes (A e n) são dependentes do material e da temperatura, uma vez que a mobilidade molecular das cadeias poliméricas acontece mais facilmente em altas temperaturas, apresentando, portanto, tendência de maiores deformações instantâneas quando se compara o mesmo material a temperaturas mais baixas. O estudo do comportamento de fluência de um compósito carbono/epóxi com diferentes sequências de empilhamento, moldados por enrolamento filamentar (filament winding) foi realizado por Almeida et al. (2018b) e os resultados mostraram que o modelo de Findley foi adequado para prever o comportamento de fluência dos materiais a longo prazo. 2.7.2 Modelo de Burger O modelo de Burger é um dos mais importantes dentre os modelos que predizem o comportamento viscoelástico dos materiais em fluência, uma vez que é o modelo que melhor representa a correlação estrutura versus propriedade dos polímeros. Baseia-se na combinação entre outros dois modelos, o de Maxwell e Kelvin, conectados em série. Esse modelo também é conhecido como o modelo dos quatro parâmetros (ou modelo de quatro elementos), sua forma esquemática esta representada na Figura 12 (FINDLEY, 1976). 46 A equação para o modelo de Burger pode ser baseada a partir da resposta em deformação sob tensão constante em cada um dos elementos em série. A deformação total (!!) no tempo (t) é a soma das deformações dos elementos, sendo a mola e o pistão em série constituído no modelo de Maxwell considerados como dois elementos, representados na Figura 12 por (εM1) (εM2) e, mola e um pistão que encontram-se em paralelo correspondente ao modelo de Kelvin, representado por (εK) na Figura 12 (YANG et al., 2006). Figura 12 - Diagrama com esquema do modelo de Burger. Fonte: Yang et al. (2006). Para uma tensão específica, a deformação em função do tempo pode ser calculada de acordo com a Eq. 8 a seguir. &+ = &,1 + &,2 + & (8) B, M e K correspondem aos modelos de Burger, elementos de Maxwell e de Kelvin, respectivamente. !"1 são as deformações da mola, !$2 corresponde ao pistão de Maxwell e && unidade de Kelvin. Com base nas peculiaridades das relações dos elementos e as condições 47 iniciais em t = 0 o comportamento quanto a fluência dos materiais, de acordo com modelo de Burger, pode ser definido a partir da Eq. 9: 0(') = %! #" + %! ## 41 − / )* +, 7 + %!-" (9) Sendo ε(t) é a deformação por fluência (mm.mm-1) no tempo (t) em segundos; !. (MPa) e 0$(MPa.s) são o módulo e viscosidade da mola e pistão de Maxwell, respectivamente; !/ (MPa) e )/ (MPa.s) são o módulo e viscosidade das unidades de Kelvin, respectivamente; "0 (MPa) é a tensão inicialmente aplicada; ' = 0(/0$( é o tempo de retardação para produzir 63,2 % ou (1 − %)*) na deformação total do elemento de Kelvin - corresponde ao tempo de relaxação do modelo (FINDLEY, 1976; YANG et al., 2006). Os aspectos de fluência proposta pelo modelo de Burger podem ser caracterizados da seguinte maneira: o primeiro termo é constante e descreve a deformação elástica instantânea; o segundo termo é referente a elasticidade retardada da unidade de Kelvin, dominante nos estágios iniciais de fluência, porém chega a um valor de saturação perto de "0/$&, está relacionado com a rigidez apresentada pelas cadeias poliméricas amorfas (relaxação); o terceiro termo refere-se ao fluxo viscoso que aumenta quase linearmente após um período de tempo consideravelmente longo de carregamento (YANG et al., 2006; GEORGIOPOULOS; KONTOU; CHRISTOPOULOS, 2015; MILITKÝ; JABBAR, 2015). Por meio da diferenciação da Eq. 9 a taxa de deformação por fluência é dada de acordo com a Eq. 10: 0̇ = %! -" + %! -$ / )* +, (10) (0 ̇) corresponde a taxa de deformação com o tempo (mm.mm-1). Em escalas de tempo suficientemente longas, a taxa deformação por fluência torna-se constante (Eq. 11): 0̇ (∞) = %! -" (11) O modelo de Burger pode ser empregado de forma satisfatória para representar o comportamento prático dos materiais viscoelásticos. Os parâmetros dos materiais !., 0$ , !/ e )/ podem ser simulados por meio de dados experimentais junto a softwares de análise e 48 ajustes de dados, a partir do ensaio de fluência realizado por DMA, por exemplo. A variação dos parâmetros simulados mostra o efeito das tensões aplicadas (YANG et al., 2006). O estudo do comportamento de fluência a curto prazo de um compósito Juta/Epóxi com diferentes tratamentos de fibras, moldados manualmente, foi realizado por Militký e Jabbar (2015), e os resultados mostraram que as fibras tratadas apresentaram menor deformação por fluência comparadas às fibras não tratadas para todas as temperaturas utilizadas. O tratamento que utilizou laser apresentou os melhores resultados em relação à deformação, sendo observado menor deformação por fluência, este exibiu um comportamento elástico predominante, principalmente em temperaturas mais elevadas. O uso do modelo de Burger mostrou ser adequado para os dados experimentais de fluência dos materiais. 2.7.3 Modelo de Weibull A deformação viscoelástica é considerada uma variação suave, isto é, um material em processo de fluência, recuperação ou relaxação de tensão acontece de maneira contínua com o tempo. As mudanças viscoelásticas acontecem através de saltos incrementais. Em escala molecular, o fenômeno pode ser considerado como segmentos de moléculas saltando entre as posições de relativa estabilidade. Fancey foi o primeiro a levantar essa abordagem, quando verificou que a fluência de materiais poliméricos, assim como a recuperação, poderia ser caracterizada com precisão por meio de equações baseadas na função de distribuição Weibull (FANCEY, 2001). O modelo de Weibull na engenharia é utilizado para descrever a confiabilidade, repetitividade e homogeneidade dos dados de maneira que represente os elementos discretos de falha. Com base nessa premissa, Fancey elaborou um modelo matemático (Eq. 11) no qual a ação dos elementos de trava, dependentes do tempo, descrevesse a resposta viscoelástica, logo o objetivo era predizer as propriedades de fluência dos materiais viscoelásticos (FANCEY, 2005). 00(') = 01 + 00 :1 − /;< =− 4 * (% 7 2% >? (11) Sendo: !+(')corresponde a deformação de fluência no tempo t; !$é a deformação instantânea; @0é o parâmetro de formato da curva. (+ é o tempo de vida característico para fluência (FANCEY, 2001). 49 O estudo de comportamento de fluência de compósitos poli (éter imida) (PEI) semi-preg e epóxi pré-impregnado foi realizado por Reis et al. (2020). Utilizaram um analisador dinâmico mecânico para verificar as relações de estrutura vs. propriedade dos materiais estudados em diferentes regiões (vítreas, de transição vítrea e elastomérica). Utilizaram o modelo analítico proposto por Weibull e verificaram que se ajustou de forma excelente a curva experimental. 2.8 MICROTOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA DE RAIOS X A microtomografia de raios X trata-se de uma técnica não destrutiva de ensaio, na qual o material analisado pode ser utilizado mais vezes. Esse ensaio, atualmente, vem sendo empregado em diversas áreas, mas principalmente na área médica (DA SILVA, 2018). A técnica consiste em criar uma imagem em três dimensões da amostra analisada a partir da aquisição de imagens. Parte do mesmo princípio de uma tomografia computadorizada (TC), e foi inicialmente elaborada para verificar e estudar materiais que possuem estruturas muito pequenas, em sua grande maioria, de ordem de micrômetros (CARVALHO, 2018). A técnica de microtomografia de raios X tem como princípio representar a distribuição espacial de um parâmetro físico, é capaz de representar fielmente a estrutura interna do material analisado, uma vez que sua resolução é de ordem de micrômetros. Tem como base fundamental a técnica de raios X, sendo que a principal diferença se encontra na ordem de grandeza focada pelos tubos dos equipamentos de raios X. Uma similaridade entre as técnicas é que ambas possuem imagens com diferentes tons de cinza, sendo proporcionais à densidade das amostras analisadas. O uso da microtomografia possibilita analisar o coeficiente de atenuação ponto a ponto, diferentemente de uma radiografia planar, na qual se pode perceber profundidades distintas em um plano único. As principais vantagens do uso dessa técnica são: a possibilidade de reproduzir imagens digitais com alto contraste, excelente resolução espacial, e reaproveitamento do corpo de prova após o ensaio (FONTES, 2015). Estudos realizados por Machado et al. (2015), utilizando da técnica de microtomografia computadorizada aplicada na área biomédica, tinham como objetivo a elaboração de um modelo experimental a respeito de fraturas ósseas. Para esse estudo foram utilizados ratos como amostras; os mesmos foram varridos por um microtomógrafo, modelo SkyScan 1173. As condições de operação utilizada para análise foram 70 kV e 114 μA, o tamanho do pixel foi de 9,91 μm. Através dos resultados, os autores chegaram à conclusão de 50 que as análises visuais das estruturas ósseas geradas por essa técnica foram bem relevantes, principalmente a área fraturada. Mehdikhani et al. (2019a) utilizaram a tomografia computadorizada por raios X para gerar dados de características dos vazios em laminados de carbono/epóxi com diferentes sequências de empilhamento (Figura 13). Os vazios foram induzidos pela modificação do ciclo de cura do material. As imagens tridimensionais obtidas pelo estudo foram utilizadas para estudar os vazios, foram quantificadas com uso do software VoxTex. As características do vazio, como a forma, tamanho, orientação e distribuição espacial, foram analisadas. Os autores verificaram que os vazios possuem formato alongado, alinhados com as fibras vizinhas, grande parte dos vazios tinham seções transversais ligeiramente achatadas. Foi observado que os espaços vazios se localizaram nas camadas internas do laminado. Verificou- se que a sequência de empilhamento afeta o tamanho e a forma dos vazios, com o conteúdo de vazios maior para laminados mais espessos. Figura 13 - Exemplos de imagens obtidas por microtomografia das amostras. Fonte: Mehdikhani et al. (2019a). 51 2.9 REVISÃO DA LITERATURA E MOTIVAÇÃO DO TRABALHO A revisão da literatura é um tópico de grande relevância para o presente estudo, uma vez que as aplicações e estudos dos compósitos vêm ganhando destaque nos últimos anos, principalmente aqueles com características estruturais empregados nas indústrias aeroespaciais. Esta revisão baseou-se em trabalhos que estudaram algumas das mesmas propriedades discutidas no presente estudo, com foco principal nos ensaios de fluência. Como base na discussão, foi avaliado o comportamento apresentado pelos compósitos; por exemplo, como eles se comportam com as mudanças de alguma variável, tais como temperatura, tempo ou tensão e como essas variações influenciam na propriedade de fluência. É importante ressaltar que as propriedades apresentadas pelos compósitos são dependentes dos seus constituintes e de como eles interagem entre si; do processo de fabricação; da orientação do reforço na matriz; entre outros. Almeida et al. (2018b), investigaram as características interfaciais utilizando ensaio de fluência (método indireto) de laminados de resina epóxi reforçados com fibra de carbono em diferentes orientações de fibra. O processo de fabricação utilizado para confeccionar os laminados unidirecionais de 12 camadas foi por enrolamento filamentar seco, sendo curados sob compressão a quente. Foram estudadas as seguintes sequências de enrolamento: [0]12, [30]12, [45]12, [60]12 e [90]12, onde [x] refere-se ao ângulo e 12 são os números de camadas utilizadas. A análise dinâmico-mecânica foi utilizada para avaliar o comportamento de fluência dos compósitos, os autores verificaram que houve influência da orientação da fibra. A transferência de tensão da fibra/matriz é mais eficiente para laminados a 0⁰, o que proporcionou menor deformação de fluência. Os autores utilizaram os ajustes de Findley e Burger para analisar os dados de fluência. Foi verificado que a deformação por fluência aumentou da orientação longitudinal para a transversal da fibra com o aumento de temperatura. Os autores concluíram que os modelos de Burger e Findley foram adequados para prever o comportamento de fluência dos materiais, onde mostraram um bom ajuste dos dados experimentais. Foi observado ainda que com o aumento angular das camadas de fibras, o modelo de Burger parece não se ajustar tão bem aos dados experimentais como o modelo de Findley. Bouafif et al. (2013), estudaram o efeito do tipo, tamanho, conteúdo e processo de fabricação de partículas no comportamento de fluência de compósitos de partículas de madeira e polietileno de alta densidade (PEAD). Realizaram ensaios de fluência a curto prazo 52 em diferentes temperaturas. O modelo de Burger e de Findley foram utilizados para ajustar os dados experimentais de fluência. Os autores verificaram que a fluência dos compósitos aumenta com a temperatura, e isto deve-se à mobilidade do volume amorfo. Foi observado que o aumento do teor de partículas de madeira geralmente diminui o nível de fluência. Quanto ao processo de fabricação os autores concluíram que os materiais processados por injeção e compressão apresentaram melhor comportamento de fluência do que os materiais processados por extrusão devido a diferenças nas microestruturas dos compósitos. Já o tamanho das partículas não demonstrou ter forte influência nas propriedades de fluência. Os autores verificaram que o modelo de Findley levou a um melhor ajuste do comportamento de fluência dos materiais. Almeida et al. (2018a) estudaram a fluência, recuperação, relaxação de tensão e o comportamento viscoelástico de compósitos de matriz epóxi reforçados com fibra de carbono com diferentes orientações das fibras: [0]4, [30]4 e [60]4. O estudo abrange um procedimento analítico e ensaios experimentais. Os autores verificaram que no compósito fabricado com fibras alinhadas longitudinalmente [0]4 a transferência de tensão na fibra/matriz é mais eficiente e quase não apresentou fluência significativa, também se observou que seu módulo de armazenamento foi o que apresentou o maior valor, comparados aos demais compósitos com diferentes ângulos em relação as fibras. Com base na abordagem de distribuição Weibull os autores estudaram as respostas de fluência e recuperação, foram utilizadas duas tensões, 2 e 5 MPa. Os resultados encontrados foram mais significativos para a tensão mais alta. Os autores verificaram que os resultados obtidos com o modelo de Weibull seguiram uma tendência lógica, principalmente para os compósitos sob tensão de 5 MPa, pois 2 MPa foi uma tensão considerada muito baixa para compósitos rígidos como o utilizado no estudo. Saba et al. (2017), estudaram o efeito da implementação de nanofibras de celulose via DMA de compósitos epóxi em função da temperatura. Para o estudo, os autores utilizaram o método de colocação manual para fabricação dos nanocompósitos de epóxi reforçados com nanocelulose. Os compósitos foram fabricados com diferentes teores de nanocelulose: 0,5%, 0,75% e 1% em resina epóxi. Os autores observaram, a partir dos resultados obtidos, que a implementação da nanofibras de celulose melhorou a estabilidade térmica e melhorou as propriedades dinâmicas (E' e E'’) de todos os nanocompósitos comparados ao epóxi puro. Observou-se os compósitos com 0,75% de carga conferiu maior resistência térmica e melhores propriedades dinâmicas. De modo geral, foi concluído que os nanocompósitos de epóxi com carga de 0,75% de nanofibras de celulose mostram maior estabilidade térmica, temperatura de decomposição, conteúdo residual e propriedades viscoelásticas. 53 3 OBJETIVOS O objetivo geral do trabalho é avaliar a influência da porosidade nas propriedades viscoelásticas e no comportamento à fluência sob baixa carga de um compósito de matriz polimérica de resina epóxi reforçada com tecido não dobrável de fibra de vidro, produzido através do processo de moldagem por transferência de resina. Modelamentos analíticos foram utilizados para relacionar a influência da temperatura e da carga com diferentes teores de vazios no material. Ainda, microtomografia de raios X foi feita para verificação da distribuição, morfologia e do teor dos vazios. Para dar suporte ao objetivo geral, as seguintes etapas foram realizadas: ü Caracterização da matriz (resina epóxi) por meio da calorimetria exploratória diferencial (DSC), viscosimetria e termogravimetria (TGA). ü Caracterização do compósito por meio das seguintes técnicas: inspeção por ultrassom, análise dinâmico-mecânica (DMA), picnometria de gás hélio, digestão ácida e microtomografia de raios X; ü Determinação do comportamento de fluência dos compósitos sob diferentes tensões e temperaturas; ü Utilização de modelos analíticos, como os modelos de Findley, Burger e Weibull aplicados às curvas de fluência e correlação de seus parâmetros com as propriedades viscoelásticas do compósito; ü Relação das possíveis diferenças nos resultados obtidos em cada etapa com a diferença de porosidade (incluindo distribuição, tamanhos de poros, quantidade de poros abertos e fechados, etc.) para cada compósito. 54 4 MATERIAIS E MÉTODOS 4.1 MATERIAIS 4.1.1 Matriz e Reforço Neste trabalho foi utilizado um tecido non-crimp fabric (NCF) de fibra de vidro C- 0900 biaxial costurado (Barracuda Advanced Composites®). Os tecidos para a fabricação dos compósitos foram cortados nas orientações 0°/90° para a montagem do compósito. A gramatura do tecido é igual a 307 g.m-1; a massa específica da fibra de vidro igual a 2,58 g.cm-1; apresentam fibras com diâmetro de 13 μm; a espessura do tecido é de 0,21 mm. A costura do tecido evita o arraste das fibras pela passagem da resina. Os tecidos foram montados em uma arquitetura biaxial [(0 e 90)s]2, em 14 camadas. A Figura 14 mostra o tipo de tecido de fibra de vidro que foi utilizado neste trabalho