KARINA BORTOLIN LODI REPERCUSSÕES MINERAIS ÓSSEAS NO ALCOOLISMO CRÔNICO ASSOCIADO À DEFICIÊNCIA HORMONAL EM RATOS 2010 KARINA BORTOLIN LODI REPERCUSSÕES MINERAIS ÓSSEAS NO ALCOOLISMO CRÔNICO ASSOCIADO À DEFICIÊNCIA HORMONAL EM RATOS Tese apresentada à Faculdade de Odontologia de São José dos Campos, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, como parte dos requisitos de obtenção do título de DOUTOR, pelo Programa de Pós- Graduação em BIOPATOLOGIA BUCAL, Área Patologia. Orientadora: Profa Adja. Rosilene Fernandes da Rocha Co-orientadora: Profa Dra. Ana Maria do Espírito Santo São José dos Campos 2010 BANCA EXAMINADORA 1) Profa. Adja. Rosilene Fernandes da Rocha (Orientadora) Faculdade de Odontologia de São José dos Campos Universidade Estadual Paulista - UNESP 2) Prof. Adj. Lafayette Nogueira Junior Faculdade de Odontologia de São José dos Campos Universidade Estadual Paulista - UNESP 3) Dra. Renata Andrade Bitar 4) Profa Tit. Yasmin Rodarte Carvalho Faculdade de Odontologia de São José dos Campos Universidade Estadual Paulista - UNESP 5) Profa. Dra. Vilma Leyton Faculdade de Medicina de São Paulo Universidade de São Paulo – USP São José dos Campos, 12 de julho de 2010. DEDICATÓRIA À Deus, por toda nossa vida. Ao meu marido Matheus, Obrigada por acreditarem na possibilidade e me incentivarem a prosseguir, com apoio em todo tempo, tendo paciência e até mesmo ajudando no experimento. Te amo e te admiro muito! À minha família Altemar, Amarli e Samuel, Só tenho a agradecer pelo que sou. Sem vocês, com certeza este sonho não seria possível. Faço desta, a realização de vocês. Amo vocês! Aos meus avôs, Pela saudade desmedida, pelo carinho, pelo exemplo de vida e pelo maior amor do mundo. “ A vida sobretudo ocorre no intervalo entre os grandes momentos. Grande parte do que precisamos aprender se encontra nos pequenos eventos da vida!” Elizabeth Kübler-Ross AGRADECIMENTO ESPECIAL À minha orientadora, Rosilene Fernandes da Rocha, que ultrapassou a sua função de orientadora, com sua amizade, disponibilidade e experiência. Minha formação terá sempre esse toque especial de quem soube me acolher, buscando sempre ensinar a fazer pesquisa de valor. À minha co-orientadora Ana Maria do Espírito Santo, agradeço imensamente a dedicação. Sua competência me passava segurança, seu sorriso e entusiasmos, sempre presentes, me faziam mais tranqüila durante os experimentos. “Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina” Cora Coralina AGRADECIMENTO Esta tese está sendo concluída após um empenho diário de quatro anos. Esforço este apoiado no auxilio de vários amigos. É difícil citar o nome de todos os envolvidos. Existiram, entretanto, colaboradores imprescindíveis, a quem devo agradecer especialmente: À Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, representada pelo Diretor da Faculdade de Odontologia de São José dos Campos Prof. Adj. José Roberto Rodrigues e ao Programa de Pós-Graduação em Biopatologia Bucal, na pessoa da coordenadora Profa. Adj. Cristiane Yumi Koga Ito, pela oportunidade concedida. À Coordenadoria do Conselho Nacional de Pesquisa (CNPq) pelo apoio financeiro. À Universidade do Vale do Paraíba, representada pelo Reitor Prof. Dr. Baptista Gargione Filho por ceder seus laboratórios, equipamentos e professores. Também agradeço à Profa. Dra. Emilia Angela Loschiavo Arisawa , Prof. Dr. Luis Eduardo Silva Soares, Prof. Dr. Airton Abrahão Martin, Prof. Dr. Leandro Procópio Alves, e os alunos Carolina da Silva Carvalho, Geraldo Magno Alves de Abreu, Edson Aparecido Pereira dos Santo, sempre voluntariosos e atenciosos, pessoas que fazem de seu local de pesquisa um verdadeiro lar aos que ali passam. Aos queridos docentes Profa. Tit. Yasmin Rodarte Carvalho, Profa. Dra. Adriana Aigotti Haberbeck Brandão, Profa. Adja. Cristiane Yumi Koga Ito, Profa. Adja. Janete Dias Almeida e Prof. Dr. Leonardo Marchini pela colaboração, atenção, educação e gentileza, predicados encontrados nestas pessoas tão especiais. Aos docentes Prof. Tit. Horácio Faig Leite, Prof. Dr. Ivan Balducci, Profa. Dra. Juliana Campos Junqueira, Profa. Dra. Luana Marotta Reis de Vasconcellos, Profa.Adja. Ana Sueli Rodrigues Cavalcante, Prof. Tit. Luiz Cesar de Moraes, Prof. Adj. Luiz Eduardo Blumer Rosa, Profa. Adja. Mari Elí Leonelli de Moraes, Prof. Tit. Antonio Olavo Cardoso Jorge, Profa. Dra. Ana Lia Anbinder e Profa. Dra. Luciane Dias de Oliveira que mesmo no pouco convívio, demonstraram o prazer de pesquisar, conhecer e transmitir, de maneira atrativa aos estudantes, o maravilhoso mundo do conhecimento. Ao Prof. Adj. Lafayette Nogueira Junior pelo inestimável auxílio nos testes biomecânicos e à Profa. Dra. Valéria Abrantes Pinheiro Carvalho por me conduzir ao doutorado. Aos queridos alunos de iniciação científica e estagiários, a quem devo um agradecimento especial pela ajuda na execução dos experimentos: Érika Cristina Sbrisse Pereira, Isabel Chaves Silva Carvalho, Emmanuel da Silva Rovai, Gabriela da Silva Freitas, Geraldo Marques Miranda e Alberto Toseto Binde. Aos colegas Pós-Graduandos da UNESP, em especial Juliana Madureira de Souza Lima Alonso, Cristina Werkman, Camila Porto Deco, Giselle Segnini Senra, Adriana Mathias Pereira da Silva Marchini, Maria José Domingues Castro, com as quais tive o privilégio de conviver nestes últimos anos, cada qual com suas ocupações e dificuldades, buscando sempre alcançar um melhor preparo para, um dia, compartilhar o conhecimento. Aos funcionários e técnicos Ana Lourdes da Silva Machado, Maria Salete Faria, Lourival Jacobs, Antônio Domingos Sávio Barbosa Maia Vasconcelos e Marco Antonio Correa Alfredo. Às secretárias da pós- graduação, Rosemary da Fátima Salgado, Erena Michie Hasegawa, Maria Aparecida Consiglio de Souza e Lilian Faria das Graças. Aos meus colegas de profissão do laboratório Oswaldo Cruz, diretor- presidente Héctor Enrique Giana e farmacêutica Janaína Ribeiro da Silva, pela grande colaboração na realização das análises bioquímicas. Agradeço também à minha nova família: Jandira Margarida Gongora Lodi, Talita Gongora Lodi, Marilene Aparecida Lodi, Olga Maria Lodi e Lucia Helena Lodi. Obrigada pelo apoio e pela torcida! Meu profundo respeito aos animais deste experimento, que tiveram sua vida sacrificada em beneficio da ciência durante a realização deste trabalho científico. “Conte-me e eu esquecerei; Ensina-me e eu me lembrarei; Envolva-me e eu aprenderei.” Benjamim Franklin SUMÁRIO LISTA DE FIGURAS ................................................................................11 LISTA DE QUADROS E TABELAS .........................................................14 LISTAS DE ABREVIATURAS E SIGLAS .................................................15 RESUMO .................................................................................................18 1 INTRODUÇÃO......................................................................................19 2 REVISÃO DE LITERATURA .................................................................21 3 PROPOSIÇÃO......................................................................................47 3.1 Objetivos específicos .........................................................................47 4 MATERIAL E MÉTODO ........................................................................48 4.1 Animais ..............................................................................................48 4.2 Protocolo experimental ......................................................................48 4.3 Delineamento experimental ...............................................................49 4.4 Dieta ..................................................................................................50 4.4.1 Líquida ............................................................................................51 4.4.2 Sólida..............................................................................................52 4.5 Procedimentos cirúrgicos ...................................................................53 4.5.1 Anestesia e analgesia .....................................................................53 4.5.2 Ovariectomia e falsa ovariectomia (Sham) ......................................54 4.5.3 Orquiectomia e falsa orquiectomia (Sham) .....................................55 4.5.4. Coleta de sangue ...........................................................................56 4.5.5 Eutanásia ........................................................................................57 4.6 Variáveis estudadas...........................................................................58 4.6.1 Análises biométricas e nutricionais .................................................59 4.6.2 Análises das propriedades biomecânicas .......................................61 4.6.3 Quantificação mineral óssea ...........................................................65 4.6.4 Parâmetros bioquímicos .................................................................68 4.7 Análises Estatísticas ..........................................................................69 5 RESULTADOS .....................................................................................71 5.1 Análises biométricas e nutricionais ....................................................71 5.2 Análises das propriedades biomecânicas ..........................................76 5.3 Quantificação mineral óssea ..............................................................80 5.4 Parâmetros bioquímicos ....................................................................83 6 DISCUSSÃO ........................................................................................86 7 CONCLUSÃO ..................................................................................... 105 8 REFERÊNCIAS .................................................................................. 106 ANEXO A - CERTIFICADO DO COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA .... 131 ABSTRACT ........................................................................................... 132 LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Diagrama de obtenção do espectro de fluorescência de raios-x............................................................................... 45 Figura 2 - Delineamento experimental.............................................. 50 Figura 3 - Cirurgia de Ovariectomia: a) incisão da pele e da camada muscular; b) exposição do ovário e tecido mole circundante; c) ovário e tecido mole removido................. 55 Figura 4 - Cirurgia de Orquiectomia: a) desinfecção do escroto e incisão na pele e músculo; b) ligadura do pedículo vascular; c) remoção do testículo..................................... 56 Figura 5 - Coleta do sangue pela artéria abdominal......................... 57 Figura 6 - Distribuição dos fêmures por análise................................ 59 Figura 7 - Medição do fêmur com paquímetro digital........................ 61 Figura 8 - A: máquina universal de ensaio. B: teste de flexão- compressão em 3 pontos no fêmur.................................. 63 Figura 9 - A: laserpoint indicando ponto inicial da leitura. B: espectrômetro de microfluorescência de raios-x.............. 67 Figura 10 - Exemplo da obtenção da concentração em forma de gráfico dos minerais fósforo (A) e cálcio (B) nos fêmures de ratos............................................................................. 67 Figura 11 - Média e desvio-padrão dos valores de evolução ponderal (grama) obtidos de todos os grupos experimentais.................................................................... 72 Figura 12 - Média e desvio-padrão dos valores de comprimento femoral (mm) obtidos em todos os grupos experimentais.................................................................... 75 Figura 13 - Média e desvio-padrão dos valores de diâmetro femoral (mm) obtidos em todos os grupos experimentais............. 76 Figura 14 - Média e desvio-padrão dos valores de carga máxima (N) obtidos em todos os fêmures dos grupos experimentais. 77 Figura 15 - Média e desvio-padrão dos valores de rigidez (x103 N/m) obtidos em todos os fêmures dos grupos experimentais.................................................................... 78 Figura 16 - Média e desvio-padrão dos valores do módulo de elasticidade (mPa) obtidos em todos os fêmures dos grupos experimentais........................................................ 79 Figura 17 - Média e desvio-padrão dos valores da resistência máxima (mPa) obtidos em todos os fêmures dos grupos experimentais.................................................................... 80 Figura 18 - Média e desvio-padrão dos valores de cálcio (%) obtidos do fêmur em todos os grupos experimentais....... 81 Figura 19 - Média e desvio-padrão dos valores de fósforo (%) obtidos do fêmur de todos os grupos experimentais........ 82 Figura 20 - Média e desvio-padrão dos valores da proporção cálcio/fósforo (mol) obtidos do fêmur de todos os grupos experimentais.................................................................... 83 Figura 21 - Média e desvio-padrão dos valores de cálcio plasmático (mg/dL) obtidos do sangue de todos os grupos experimentais.................................................................... 84 Figura 22 - Média e desvio-padrão dos valores de fosfato plasmático (mg/dL) obtidos do sangue de todos os grupos experimentais....................................................... 85 LISTA DE QUADROS E TABELAS Quadro 1 - Composição da dieta padrão utilizada na alimentação dos animais.................................................................... 52 Tabela 1 - Grupos experimentais de ratas fêmeas......................... 49 Tabela 2 - Grupos experimentais de ratos machos........................ 49 Tabela 3 - Média diária por animal do quociente de eficiência alimentar (%), ingestão calórica (kcal) e hidratação (mL)............................................................................ 74 Tabela 4 - Média e desvio padrão dos valores de minerais (Ca e P) obtidos nas análises em todos os grupos experimentais.................................................................... 131 Tabela 5 - Média e desvio padrão dos valores biométricos e nutricionais obtidos nas análises em todos os grupos experimentais.................................................................... 132 Tabela 6 - Média e desvio padrão dos valores biomecânicos obtidos nas análises em todos os grupos experimentais................................................................... 132 LISTAS DE ABREVIATURAS E SIGLAS % = porcento [Ca10(PO)4]6(OH)2 = hidroxiapatita µEDXRF = microfluorescência de raios-x µg/mL = micrograma por mililitro µm = micrômetro ad libitum= à vontade (latim) ADH = álcool desidrogenase ALDH = aldeído-desidrogenase C2H5OH = etanol ou álcool etílico Ca = elemento químico cálcio Ca/P = proporção cálcio-fósforo CID-10 = classificação internacional de doenças e problemas relacionados à saúde Cl = elemento químico cloro CO3 -2 = íon carbonato COBEA = Colégio Brasileiro de Experimentação Animal CSMI = cross sectional moment of inertia CYP450 = citocromo P450 DEXA = absorciometria de dupla emissão de raios-x DMO = densidade mineral óssea DSM-IV = diagnostic and statistical manual of mental disorders EDXRF = fluorescência de raios-x EUA = Estados Unidos da América F = elemento químico flúor FDA = Food and Drug Administration g = grama g/kg = grama por quilograma g/L = grama por litro GABA-A = ácido gama aminobutírico-A HPO4 -2 = íon fosfato IGF-I = fator de crescimento semelhante à insulina IL = interleucina K = elemento químico potássio kcal = kilocaloria kcal/g = kilocaloria por grama keV = quiloeletrovolt kg = quilograma kg/m² = quilograma por metro quadrado Kgf = quilograma-força kV = kiloVolt MEOS = sistema microssomal de oxidação do álcool Mg = elemento químico magnésio mg = miligrama mg/dL = miligrama por decilitro mg/kg = miligrama por quilograma mg/kg/h = miligrama por quilograma por hora mL = mililitro mL/kg = mililitro por quilograma mm = milímetro mm/min = milímetro por minuto mPa = megaPascal mW = miliWatt N = Newton N/m = Newton por metro Na = elemento químico sódio NAD+ = nicotinamida-adenina dinucleotídeo NADH = nicotinamida-adenina dinucleotídeo hidrogenado NADP+ = nicotinamida-adenina dinucleótideo fosfato NADPH = nicotinamida-adenina dinucleótideo fosfato hidrogenado Nm = nanômetro NMDA = N-metil-D-aspartato ºC = grau Centígrado ºGL = grau Gay Lussac OMS = Organização Mundial de Saúde OQT = orquiectomia OVX = ovariectomia P = elemento químico fósforo PA = para análise (grau analítico) ppm = parte por milhão PTH = hormônio paratireoideano RANK = receptor do ativador do fator nuclear Kappa B Rh = ródio s = segundos Sham = falso (inglês) Si(Li) = silício-lítio SNC = sistema nervoso central UI = unidade internacional v/v = volume a volume WHO = World Health Organization Π = constante circular pi Lodi KB. Repercussões minerais ósseas no alcoolismo crônico associado à deficiência hormonal em ratos [tese]. São José dos Campos: Faculdade de Odontologia de São José dos Campos, UNESP – Univ Estadual Paulista; 2010. RESUMO O alcoolismo se relaciona com a redução da massa óssea, aumenta o risco de fraturas e, ocorrendo a fratura, pode piorar o reparo ósseo. Acima de tudo, fraturas e alcoolismo são associados a longos períodos de hospitalização e alta mortalidade. Mais de 50% dos atendimentos ambulatoriais de alcoólicos mostram evidencias de perda óssea. Além disso, já foi evidenciada em humanos e animais uma relação negativa entre consumo de etanol e densidade mineral óssea. A origem desses efeitos deletérios pode ocorrer além da ação direta no osso, sendo através dos distúrbios hormonais e deficiências nutricionais que acompanham os casos de consumo excessivo de etanol. O objetivo deste estudo foi investigar a resposta biomecânica sobre o fêmur de ratos, bem como os parâmetros bioquímicos e de composição mineral óssea decorrente da deficiência hormonal e consumo crônico de etanol. Ratos Wistar machos e fêmeas (n=108) foram divididos em machos orquiectomizados (ORQ), fêmeas ovariectomizadas (OVX) ou Sham- operados, e subdivididos de acordo com a dieta (grupos ad libitum, isocalórico e etanol 20%). Após um mês da cirurgia, os animais foram alimentados diariamente com a dieta controlada por 8 semanas. Foram avaliadas as condições nutricionais. Ca e P foram analisados por teste bioquímico no sangue e por espectrometria de fluorescência de raios-x no fêmur. As propriedades biomecânicas também foram analisadas pelo teste de flexão em 3 pontos. Os dados revelam que a deficiência hormonal promove ganho de massa corporal nas fêmeas e perda nos machos. Os resultados também revelam hiperfosfatemia plasmática nos grupos etanol-ORQ e etanol-OVX. Redução da proporção molar de Ca/P e de Ca ósseo em todos os grupos de dieta alcoólica. Do mesmo modo, a espectrometria revelou perda de P ósseo nos grupos Sham-ad libitum. As propriedades biomecânicas foram afetadas pela deficiência hormonal somente nos machos. A relação entre o consumo de etanol e a deficiência hormonal suporta a hipótese que estes fatores sinergicamente modificam a nutrição corporal, rompem a homeostasia de Ca e P e podem comprometer, de forma significativa, a estrutura da hidroxiapatita, tornando-se um fator de risco importante para a osteoporose. Palavras-chave: Alcoolismo. Osso. Deficiência hormonal. Rato. Espectroscopia de emissão de raios-x. 1 INTRODUÇÃO Muito se tem publicado e discutido a cerca da relação entre consumo de álcool etílico e seus efeitos na promoção da osteoporose. Ambos compartilham das características de serem patologias progressivas e de elevada morbidade. Assim como a osteoporose, o alcoolismo é também um problema de grande prevalência populacional e alto custo social. A mensagem que o consumo de bebidas alcoólicas pode trazer somente benefícios para saúde cardiovascular se converte em engano quando se descontextualiza do elevado número de patologias e transtornos que este consumo pode provocar. O risco de ocorrência de fraturas por traumatismos mínimos como as quedas ou mesmo em acidentes automobilísticos, muito comuns em pacientes alcoólicos, tornam-se ainda mais preocupante quando estes indivíduos são acometidos pela osteoporose; uma patologia ósseo-metabólica, que pode progredir sem detecção por décadas (Nordin, 2009). Estima-se que as fraturas osteoporóticas alcancem proporções endêmicas nos próximos anos, pois o crescente da expectativa de vida da população tem contribuído para a maior incidência desta doença crônico-degenerativa (World Health Organization, 2007). As anormalidades na homeostasia dos componentes que constituem os ossos, como é o caso do cálcio e do fósforo, podem ser desencadeadas por alterações tanto metabólicas, nutricionais e hormonais (Moe, 2008). 20 Sabe-se que há uma relação direta entre o metabolismo endócrino e ósseo, e há também evidências em relação à ação do etanol sobre os mesmos (Novoa et al., 1998; Chakkalakal, 2005). Em situações patológicas como a osteoporose, vários estudos têm se preocupado com o desenvolvimento de novas tecnologias nas áreas da bioengenharia e a ampliação dos conhecimentos voltados para novos métodos investigativos e diagnósticos. Para definir a qualidade e a composição óssea, é possível avaliar as estruturas ósseas através de parâmetros que quantifiquem os minerais presentes, bem como a microestrutura óssea e as cargas suportadas pelo osso (Licata, 2009). Considerando que o alcoolismo é um fator agravante para a osteoporose, e quando associadas, estas duas patologias elevam o risco para queda e fraturas graves, justifica-se assim, a contínua busca do conhecimento da fisiopatologia e de novos métodos diagnósticos destas doenças. Para tanto este trabalho propõe avaliar em ratos com deficiência hormonal, as alterações decorrentes do consumo crônico de etanol. 2 REVISÃO DE LITERATURA O alcoolismo é uma toxicomania decorrente da ingestão excessiva e contínua de álcool etílico. É uma patologia crônico- progressiva e multifatorial, envolvida em fatores biológicos (Marques, 2001; Ayesta, 2002), genéticos (Edenberg, 2007) psicológicos e sociais (Ramos; Woltowitz, 2004; Fernandes, 2007). A definição e os critérios que determinam a dependência ao álcool etílico tem-se modificado desde a sua primeira descrição pelo médico sueco Magnus Huss em 1849, no artigo “Alcoholismus Chronicus” (Gigliotti; Bessa, 2004). Atualmente, o diagnóstico mais aceito para este transtorno é baseado na classificação internacional de doenças (CID-10 - 1997) da Organização Mundial de Saúde (OMS), e no manual de diagnóstico e estatístico dos distúrbios mentais da American Psychiatric Association (DSM-IV - 1994). O consumo de bebidas alcoólicas acompanha a história da humanidade, concomitantemente, vem sendo observado por pesquisadores, o aumento progressivo na concentração alcoólica destas bebidas a partir da idade média. Além disso, estudos epidemiológicos têm detectado índices de consumo cada vez maiores tanto no Brasil, como em outras regiões do mundo, tornado-se patológico e endêmico principalmente após a Revolução Industrial (Marques, 2001; Moraes et al., 2006; Laranjeira et al., 2007). Ainda que a grande maioria da população tenha conhecimento sobre os efeitos nocivos da ingestão excessiva de etanol (Borges et al., 2009), estima-se que cerca de 90% da população adulta 22 mundial consome esporadicamente algum tipo de bebida alcoólica, sendo que destes, quase um terço ingere mais que moderadamente (Ramos; Woitowitz, 2004; WHO, 2007). O consumo de bebidas alcoólicas no Brasil é legalmente permitido para maiores de 18 anos de idade. Apesar da legislação, não há efetividade no cumprimento desta lei e por isso, muitos indivíduos desde a adolescência abusam do consumo de etanol, tornando-se um forte fator desencadeante de alcoolismo na idade adulta (Laranjeira et al., 2007). A prevalência do uso de álcool etílico representa uma parcela substancial dos pacientes atendidos ambulatorialmente em todo o mundo. Segundo dados publicados pela OMS, o consumo de etanol é responsável por 3,2% de todas as mortes prematuras no mundo, chegando a 1,8 milhões de óbitos por ano. De acordo com o mesmo relatório, estima-se que entre 10 a 18% dos casos de pacientes atendidos em emergências hospitalares estejam relacionados ao consumo excessivo desta substância (WHO, 2007). Rigo et al. (2005) relataram que nos Estados Unidos da América (EUA), 71,8% dos casos de trauma ocorrem em pacientes alcoolizados. No Brasil, os dados sobre acidentes são semelhantes, e a incidência de consumo é comparável a países mais desenvolvidos, uma vez que os relatos apontam que mais da metade da população brasileira ingere algum tipo de bebida alcoólica, e destes, somente 25% consomem moderadamente (Laranjeira et al., 2004; Segatto et al., 2008). Os limites que norteiam o consumo de bebidas alcoólicas e seus efeitos no organismo são definidos pela “dose”. Apesar desta denominação, não há um consenso mundial sobre a quantidade de grama de etanol que esta dose corresponde. No Brasil, segundo a Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (2008), uma dose corresponde a 12 grama de etanol e equivale aproximadamente a uma lata de cerveja, uma taça de vinho ou meio copo de uísque. 23 Para obter as unidades-equivalentes a uma dose em grama de uma determinada bebida alcoólica, é preciso multiplicar a quantidade da mesma por sua alcoolatura, chegando à quantidade absoluta de álcool etílico da bebida. Nos EUA, por outro lado, adotou-se como parâmetro de dose, a medida da bebida alcoólica em volume, que corresponde a 355 mL de cerveja, 148 mL de vinho ou 44,4 mL de bebidas destiladas em geral (Ferner; Chambers, 2001; Keer et al., 2005). De acordo com a nova regulamentação do Código de Trânsito Brasileiro, o limite máximo de consumo de etanol para um indivíduo ser considerado não alcoolizado é de 0,2 g/L, uma vez que a capacidade de desempenhar funções cruciais para a condução de veículos, encontra reduzida com alcoolemia acima de 0,5 g/L. (Associação Brasileira de Medicina de Tráfego, 2008; Brasil, 2008). O etanol, sinônimo de álcool etílico (C2H5OH), é o principal componente das bebidas alcoólicas destiladas ou fermentadas, é quimicamente uma molécula de baixo peso molecular, de altíssima solubilidade hídrica e lipídica (Gemma et al., 2006). Quando ingerido, sua absorção ocorre nas mucosas do trato gastrintestinal, especialmente no estômago (20%) e no duodeno (80%). Após a absorção é distribuído entre 30 a 90 minutos por todos os líquidos corpóreos intra e extracelulares (Paton, 2005; Gemma et al., 2006). O etanol é biotransformado em cerca de 90% por três distintos mecanismos, utilizando primordialmente o princípio de oxi- redução. Os 10% restantes são eliminados de forma inalterada pelos pulmões, rins, suor e saliva (Paton, 2005; Gifford et al., 2008). O primeiro sistema de biotransformação ocorre via desidrogenase alcoólica no citosol de células gástricas e nos hepatócitos. A enzima álcool desidrogenase (ADH) catalisa o passo inicial da biotransformação do álcool etílico transformando-o em acetaldeído, um metabólito ativo altamente tóxico ao sistema nervoso central (SNC), com 24 atividade mutagênica e carcinogênica (Zakhari, 2006; Seitz; Becker, 2007). Nesta primeira etapa de oxidação, um próton de hidrogênio do etanol é transferido para uma molécula de NAD+, que por sua vez é reduzida a NADH, gerando acetaldeído. Subsequentemente, o acetaldeído formado, é convertido em acetato por uma segunda enzima mitocondrial, a aldeído desidrogenase (ALDH), que também utiliza como catalizador da reação, a transferência de um próton de hidrogênio do NAD+ para o NADH. O acetato é, então, rapidamente convertido em água e dióxido de carbono (Mezey, 1980; Lieber, 2001; Paton, 2005; Gemma et al., 2006). O segundo mecanismo de biotransformação segue a via do sistema microssomal de oxidação do álcool (MEOS) no retículo endoplasmático dos hepatócitos, através do complexo enzimático citocromo P450 isoforma 2E1 (CYP450 2E1). Este mecanismo é acionado quando há um consumo exacerbado de bebida alcoólica, metabolizando cerca de 10% do etanol que se encontra no fígado. O citocromo P450 também converte o álcool etílico em acetaldeído, oxidando NADPH, em NADP+. A terceira e menor fração de biotransformação do etanol ocorre nos peroxissomos sob ação da enzima catalase (Paton, 2005; Gemma et al., 2006; Zakhari, 2006; Lu; Cederbaum, 2008). É nesta grande movimentação de elétrons da oxidação do etanol que ao reduzir o NADP+ para a forma NADPH e o NAD+ para o NADH, gera elétrons livres que são usados nas mitocôndrias como fonte de energia. (Mezey, 1980; Lieber, 2003; Lu; Cederbaum, 2008). O etanol é oxidado seguindo a cinética de ordem zero, pois a velocidade de biotransformação é constante e independente da sua concentração sanguínea. Em ratos, a saturação desta biotransformação é de aproximadamente 700 mg/kg/h. O tempo de meia-vida farmacológica após a ministração intravenosa de 250 mg/kg nestes animais é de 30 minutos (Gifford et al., 2008). 25 Em média, um indivíduo adulto oxida cerca de 10 mL de álcool etílico por hora, o que corresponde a 7,9 grama por hora. Exemplificado com um indivíduo sadio de 70 kg, sem ter ingerido alimentos, que consumir 33 grama de etanol, o equivalente a 2 latas de cerveja, terá uma alcoolemia de 0,7 g/L e será eliminada após 6 ou 7 horas (Silva; Fuchs, 2004) A biotransformação do álcool etílico é um dos determinantes do desenvolvimento da dependência alcoólica. Estima-se que entre 50% e 60% do alcoolismo seja determinado geneticamente por influência do polimorfismo nos sistemas de oxidação. Estudos recentes sugerem que existe uma relação entre as variáveis genéticas de receptores gabaérgicos, principalmente o ácido gama-aminobutírico A (GABA-A), e a incidência de alcoolismo. Tanto a enzima aldeído desidrogenase quanto a álcool desidrogenase também possuem isoformas que diferem entre si na velocidade e na eficiência de oxidação do acetaldeído e do álcool etílico (Edenberg, 2007; Sloan et al., 2008; Strat et al., 2008). De acordo com a velocidade de biotransformação e o tempo em que os metabólitos tóxicos ficam circulantes, é que são determinados os principais danos celulares. Quanto maior a deficiência nessas enzimas, maior o risco do álcool etílico e do acetaldeído ficarem circulantes e agirem de maneira tóxica nos órgãos. Contudo, indivíduos com este polimorfismo tendem a ingerir menos bebidas alcoólicas, já que o aumento do acetaldeído promove várias reações desagradáveis que inclui rubor facial, vasodilatação periférica, confusão mental, náusea, cefaléia pulsante e taquicardia (Edenberg, 2007). O polimorfismo genético para biotransformação do etanol pela ADH, ALDH e CP450 2E1 é observado de maneira acentuada em alguns grupos étnicos tanto para deficiência metabólica, reduzindo o risco de dependência como nos asiáticos (Strat et al., 2008), quanto na maior eficiência nos afro-americanos (Scott; Taylor, 2007) e índios brasileiros 26 (Fernandes, 2007), que assim sendo, têm maiores índices de dependência ao etanol (Gemma et al., 2006; Sloan et al., 2008). Quando comparações entre sexo são realizadas, verifica- se que as mulheres são mais sensíveis aos efeitos do etanol, ou por menor concentração da enzima álcool desidrogenase gástrica ou pela diferença na composição bioquímica do organismo. Bagnardi et al. (2001) observaram através de uma meta-análise de 229 estudos, que o consumo de quatro doses de bebida alcoólica por dia, o equivalente neste estudo a 50 grama de etanol, eleva significativamente o risco de câncer de mama e de infertilidade, induzido pela tendência genética feminina associada as alterações hormonais provocadas pelo consumo crônico de etanol (Sampson, 1997; Sjögren et al., 2006; Augustynska et al., 2007; Seitz; Becker, 2007; Moe, 2008). O mesmo dimorfismo sexual ocorre em ratos, com repercussões piores no gênero feminino, demonstrando maior lesão hepática (Cunningham; Van Horn, 2003), suscetibilidade à dependência (Escribano; Parra, 2007) redução da gliconeogênese (Sumida et al., 2007), maior incidência de cardiomiopatias (Fernández-Solà; Nicolás- Arfelis, 2002) e comprometimento da resposta imune (Kovacs; Messingham, 2002). Como agente farmacológico, o etanol é um depressor do SNC. Ao contrário de outras drogas que se ligam a receptores específicos, esta substância exerce seus efeitos penetrando na membrana celular, e de certa forma, fluidificando seu arranjo primário e influenciando a liberação dos principais neurotransmissores do SNC (Zaleski et al., 2004). O etanol também atua excitando sistemas inibitórios como os receptores específicos do GABA-A. Nos sistemas excitatórios glutamaérgicos, ele age como inibidor dos receptores N-metil-D-aspartato (NMDA) (Ayesta, 2002), além de alterar diretamente os canais de cálcio voltagem dependente (Brodie et al., 2007), e indiretamente os sistemas 27 serotoninérgicos e adrenérgicos (Zaleski et al., 2004). O álcool etílico também estimula indiretamente a atividade opióide endógena através da liberação de encefalinas e endorfinas (Olive et al., 2001). A resposta clínica do organismo ao álcool etílico é bastante variável. De maneira geral, quando consumido em baixa quantidade e frequência, estas bebidas não originam patologias físicas ou psíquicas em curto prazo. Amparando esta consideração, existem alguns estudos que relatam o efeito benéfico do etanol na forma de vinho tinto para o sistema cardiovascular, muitos deles, até sugerindo o consumo inferior a uma dose por dia, durante uma refeição (Berg et al., 2008). Micaleff et al. (2007) demonstraram que o consumo de 400 mL por dia de vinho tinto, durante duas semanas, aumentou significativamente a concentração sérica de antioxidantes em indivíduos voluntários. O resveratrol é um dos componentes antioxidantes mais promissores da pesquisa com o consumo de vinho e seu uso em processos oxidativos patológicos relacionados ao malfuncionamento mitocondrial (Shin et al. 2009; Yang et al., 2009). No entanto, estes achados devem ser seguidos com muita cautela. Sabe-se que a ingestão de etanol em longo prazo e altas doses repercute, sem exceções e de forma direta, nos sistemas orgânicos, promovendo alterações fisiológicas (Lopes; Francisconi, 1992; Bagnardi et al., 2001), comportamentais (Laranjeira et al., 2004), neurológicas (Cunha; Novaes, 2004) e nutricionais severas (Lieber, 2003). Apoiando estes indícios, grande parte da literatura tem sugerido uma forte associação entre etanol e deficiência nutricional primária e secundária. A desnutrição primária ao consumo de etanol ocorre tanto pelos hábitos alimentares irregulares como pela perda na qualidade da dieta, agravada pela alta concentração energética presente no etanol e nas bebidas alcoólicas não acompanhadas de vitaminas e sais minerais. Estas calorias são consideradas “vazias”, pois apesar de fornecer aporte calórico de 7,1 kcal por cada grama de etanol ingerido 28 (superior aos 4 kcal por grama do carboidrato), não apresentam a mesma contribuição em nutrientes (Lieber, 2003; Otero; Cortés, 2008; Tujague; Keer, 2009). A deficiência de micronutrientes acompanhada da desnutrição secundária sobrevém com frequência em pacientes alcoólicos, mesmo sem evidências de doença hepática, como resultado das complicações gastrintestinais como redução da absorção, insuficiência hepática, deficiência enzimática e quebra da barreira intestinal, aumentando o número de bactérias no intestino e enfraquecendo a defesa imunológica (Otero; Cortés, 2008). A restrição na ingestão protéica também reduz os níveis hepáticos de ADH, o que leva à redução na biotransformação do etanol e, por consequência, sua maior permanência na circulação. A deficiência de zinco e magnésio no alcoolismo altera as funções hipotalâmicas, com estímulo serotoninérgico e elevação de citocinas, como o fator de necrose tumoral e interleucinas 1 e 6 (IL-1 e IL-6) (Maio et al., 2000; Simsek et al., 2005; Otero; Cortés, 2008). A redução na absorção de vitaminas e minerais reflete diretamente na manutenção da saúde geral de um indivíduo. A baixa biodisponibilidade destes nutrientes é capaz de alterar, em cadeia, todo o estado nutricional de um indivíduo. O cálcio, mineral essencial ao organismo é obtido somente através da dieta. Este micronutriente é o quinto elemento mineral mais encontrado no organismo, aproximadamente 1.000 a 1.500 grama, mantendo seu equilíbrio na faixa de 8,5 a 10,5 mg/dL de sangue, o que representa menos de 0,1% do cálcio extracelular (Ilich; Kerstetter, 2000; Heaney, 2006; Talmage; Talmage, 2006; Moe, 2008). Em condições normais, somente 1% do cálcio encontra- se no fluído extracelular e nos tecidos moles, atuando na formação de fosfolipídios das membranas celulares, na manutenção do potencial de ação, na divisão celular e em várias outras atividades enzimáticas, sendo 29 que o restante (99%) é distribuído no esqueleto e dentes, na forma de hidroxiapatita (Ilich; Kerstetter, 2000; Nelson; Cox, 2004). O cálcio é absorvido, de forma equilibrada, via transporte passivo e ativo no intestino, necessitando do seu bom funcionamento para que haja uma absorção satisfatória. A distribuição do cálcio no sangue está fisiologicamente contrabalanceada entre a forma iônica livre (45%), ligado a albumina (40%) e os 15% restantes, ligado a íons diversos como bicarbonato, citrato, fosfato e lactato (Heaney, 2006; Moe, 2008; Stránský; Ryšavá, 2009). Os hormônios da paratireóide (PTH) e o hormônio calciferol, formado a partir da vitamina D, regulam a absorção ativa de cálcio. O prejuízo na função renal como a idade, o alcoolismo e a falta de estrógenos na pós-menopausa alteram a produção de calciferol renal e, por consequência, a absorção de cálcio. O cálcio plasmático também pode ser modificado de acordo com a concentração de albumina, anomalias protéicas e distúrbios do equilíbrio ácido-básico (Heaney, 2006; Iwaniec et al., 2008; Moe, 2008). Assim como em patologias ósseas, também é observada uma redução plasmática de cálcio no alcoolismo crônico. Estudos em ratas demonstraram uma redução dose-dependente e duradoura dos níveis de cálcio no sangue associados ao consumo de etanol, sugerindo que a resposta hormonal de regulação deste mineral é afetada pelo etanol e que, possivelmente, reflita na formação óssea (Kayath et al., 1999; Keiver et al., 2005). Money et al. (1989) e mais tarde, Pepersack et al. (1992), observaram que o consumo crônico de etanol induziu a inibição aguda do efluxo de cálcio do osso para o plasma, o aumento da depuração renal da hidroxiprolina e a redução da osteocalcina, sugerindo que estas alterações são indícios das anormalidades provocadas no tecido ósseo. O fósforo é outro mineral de relevância na manutenção da qualidade óssea. Do mesmo modo, atua no metabolismo mitocondrial, na 30 membrana fosfolipídica, na sinalização celular, e na agregação plaquetária. A absorção do fósforo ocorre especialmente no jejuno (60%) via processo passivo ou por processo ativo estimulado pelo calciferol. No lúmen intestinal a absorção é modulada pela própria concentração deste mineral, que é independente de saturação, uma vez que quanto maior a concentração intestinal de fósforo, maior será sua absorção (Nelson; Cox, 2004; Shaikh et al., 2008) Em homeostasia, os níveis de fosfato inorgânico livre (HPO4 -2), que é a forma circulante estável de fósforo, mantém concentrações plasmáticas entre 2,5 a 4,5 mg/dL. Aproximadamente 85%, dos 700 g de fósforo presentes no organismo constituem a hidroxiapatita dos ossos e dentes, e somente 0,15% está na forma livre no plasma, ou como componente dos eritrócitos (Koshihara et al., 2005; Moe, 2008). O mecanismo de retroalimentação do PTH controla a liberação hormonal e a reabsorção de fosfato e cálcio, para evitar perdas ósseas, alterações renais, calcificação cardiovascular ou dos tecidos moles. Em resposta à hipocalcemia, a paratireóide secreta PTH que age no túbulo distal renal restringindo a eliminação de cálcio e inibindo, nos túbulos proximais, a reabsorção de fosfato (Quarles, 2008). Uma quantidade equivalente a 60% do fosfato absorvido é eliminada pelo rim dependendo primordialmente da atividade física, de outros constituintes da dieta, da ação hormonal e do consumo de etanol. A baixa ingestão de alimentos, a síndrome de má absorção, bem como o desequilíbrio da depuração renal de cálcio e fósforo observado no alcoolismo, prejudicam o equilíbrio sistêmico deste mineral (Kanis et al., 2005; Moe, 2008). Estudos têm demonstrado, da mesma maneira, a associação entre a ingestão de etanol e a redução da deposição óssea de cálcio mediada pelo hipoparatireoidismo transitório, desencadeada pela atividade parácrina do PTH nos ossos (Callaci et al., 2006), que por sua 31 vez é regulado pelo fator de crescimento semelhante à insulina (IGF-I) e que também está reduzido no alcoolismo crônico (Iwaniec et al., 2008). Dentre vários sintomas do hipoparatireoidismo, como fraqueza, espasmos e cãibras musculares, a hipotensão ortostática transitória, apesar de incomum, torna-se um achado clínico relevante em pacientes alcoólicos e idosos, onde a incidência de quedas relacionadas a este sintoma chega a 34% dos casos (Callaci et al., 2006; Low, 2008). Além disso, o etanol também provoca outras alterações neurológicas relacionadas ao risco de quedas, como o enfraquecimento vestibular e somatossensorial, que regulam o equilíbrio postural e de marcha do individuo. Estudos em psicotoxicologia indicam que alcoolemia acima de 0,8 g/kg é responsável pela redução cognitiva e psicomotora de forma expressiva, além de reduzir drasticamente o reflexo e a capacidade de processar informações (Ahmad et al., 2002; Cunha; Novaes, 2004). Associando as alterações do funcionamento cognitivo e de reflexos geradas pelo consumo abusivo de álcool etílico à suscetibilidade a fraturas em pacientes com deficiência hormonal, pode- se pensar em uma comorbidade que acarreta um grande impacto sócio- econômico e de enorme comprometimento para saúde pública. Acrescentando a este, outro fator negativo como a idade avançada e a osteoporose, as fraturas tendem a ter um tempo maior de reparo e as manifestações clínicas o pior prognóstico (Christodoulou; 2003; Close et al., 2003; Baum; Peters, 2008). Dos tipos de lesão óssea provocadas por quedas ou acidentes, a fratura de quadril é o mais severo, com elevadas taxas de morbidade e mortalidade entre pacientes idosos (Pinto Neto et al., 2002; Rigo et al.; 2005). O estudo PROFET “Prevention of falls in the elderly trial” conduzido na Inglaterra por Close et al. (2003), revelou que o consumo de álcool etílico está entre os seis maiores responsáveis por quedas em idosos. 32 No Mundo, são mais de 200 milhões de indivíduos idosos com osteoporose. No Brasil ela atinge 10 milhões de pessoas, ou seja, um em cada 17 habitantes (Pastore, 2000). Em uma projeção realizada pela OMS para 2025 inclui o Brasil entre os dez países do mundo com maior contingente de idosos, e considerando-os como o maior grupo de risco para doenças crônicas não-transmissíveis, como é o caso da osteoporose (Rodrigues et al., 2008). Estimou-se, em outro estudo epidemiológico sobre osteoporose, que a população da América Latina no ano 2000 fosse de 524 milhões de habitantes, dentre esses, quase 6% acima dos 65 anos de idade, e que até o final deste ano de 2010, o total da população Latina irá aumentar 16%, muito abaixo da taxa de idosos que crescerá 28%. De acordo com as análises e seguindo este crescimento populacional, os autores afirmam que de 1990 a 2050 o número de fraturas ósseas de indivíduos com idade de 50 a 64 anos crescerá 400% (Riera-Espinoza, 2009). Poucas patologias foram tão estudadas e continuam tão enigmáticas quanto a osteoporose. Por definição adotada em 2000 pelo National Institutes of Health “osteoporose é uma desordem esquelética caracterizada pelo comprometimento da força óssea predispondo a um aumento do risco de fratura” (Osteoporosis Prevention, Diagnosis, and Therapy, 2000). As mais recentes diretrizes sobre osteoporose elaboradas pelo American College of Physicians, são fundamentadas em evidências de revisões sistemáticas desde 1990 até Julho de 2007. Com base nesta metanálise, os fatores de risco para fratura relacionada à baixa densidade óssea foram a idade acima de 70 anos, índice de massa corporal menor que 25 kg/m², perda de peso maior que 10%, estilo de vida sedentário, fraturas prévias por osteoporose, uso prolongado fármacos como corticóides e dieta pobre em cálcio. Neste estudo, os autores ainda concluíram que a privação de androgênios, além de aumentar o risco de 33 lesão, está associada à instalação da osteoporose em homens (Baum; Peters, 2008; Qaseem et al., 2008). A osteoporose tem sido classificada em dois tipos principais, a forma primária e a secundária. A primária, mais frequente, é subdividida em tipo I e tipo II. Na osteoporose primária tipo I ou pós- menopausa, ocorre alta reabsorção óssea em estágio precoce, com ação acentuada dos osteoclastos que afeta de forma irreversível o osso trabecular de mulheres acima dos 50 anos com hipoestrogenismo. Já a tipo II, osteoporose senil, acomete homens e mulheres acima dos 70 anos. Neste caso, a perda óssea ocorre de forma mais gradual, sugerindo uma atividade reduzida dos osteoblastos, aumento do PTH, deficiência crônica de minerais como cálcio, entre outros fatores. Como consequência da diminuição da função osteoblástica e aumento da reabsorção osteoclástica, o diâmetro periosteal aumenta, resultando em afinamento da cortical (Ramalho; Lazaretti-Castro, 1999; Gali, 2001; Lerner, 2006). Dentre os fatores de risco para o desenvolvimento da osteoporose secundária, decorrente principalmente de processos inflamatórios e alterações endócrinas, destacam-se o hipogonadismo, desordens na tireóide, menopausa precoce, idade avançada, terapia com corticosteróides por mais de três meses, tabagismo e o alcoolismo (Gali, 2001; Sampson, 2002; Lane, 2006; Liu et al., 2008; Metcalfe, 2008; Moayyeri et al., 2009; Pinheiro et al., 2009). Acredita-se que o consumo crônico de etanol conduz à perda óssea sistemática por redução na ingestão de nutrientes, pela ação antiproliferativa nos osteoblastos e indução da atividade dos osteoclastos (Turner; Sibonga, 2001; Callaci et al., 2004). Suportando esta hipótese, foi demonstrado em camundongos submetidos à dieta hidroalcoólica a 26% durante 4 meses, que apesar destes animais não apresentarem alteração hepática e hormonal, tiveram uma redução significativa na densidade mineral óssea (DMO) e na quantidade e espessura de trabéculas ósseas, 34 além da osteoclastogênese aumentada (Dai et al., 2000; Chakkalakal et al., 2005). O osso, apesar de ser um material rígido, está em constante remodelação e, justamente por isso, torna-se sensível às mudanças nas suas atividades celulares. É também considerado um tecido viscoelástico, anisotrópico e de estrutura não homogênea. Representando 18% dos constituintes totais do corpo adulto comparado a 43% de músculos, 25% de pele e gordura, 11% de vísceras e 3% de tecido nervoso. Está associado primariamente à proteção de órgãos, sustentação e alavanca para execução dos movimentos (Witson, 2001; Junqueira; Carneiro, 2009). Macroscopicamente e do ponto de vista estrutural, são distinguidos dois tipos de tecido ósseo, o cortical e o trabecular. Ambos formados pelos mesmos tipos de células e componentes intercelulares, diferenciando quanto à disposição espacial e a delimitação do espaço medular. A medula óssea preenche o espaço medular contido na diáfise de ossos longos, assim como os espaços inter-trabeculares. É constituída por estroma, tecido mielóide, adipócitos, vasos sanguíneos e tecido linfático. (Loveridge, 1999; Alexander, 2001). O osso trabecular é uma estrutura altamente porosa, mais presente nos corpos vertebrais e nas extremidades de ossos longos. Neste tipo de arranjo ósseo, os espaços medulares são mais amplos e dispostos irregularmente. Além disso, é formado por trabéculas entrecruzadas de diversas formas e espessuras e dispostas de acordo com as solicitações biomecânicas, que delimitam o espaço preenchido por medula óssea. Quando há perda trabecular, ocorre igualmente a perda da qualidade óssea, comprometendo a resistência óssea e aumentando o risco de fraturas. Já o osso cortical é uma massa óssea contínua e mais densa que quando comparado ao trabecular. A cortical óssea, mais localizada na diáfise e metáfise de ossos longos. Pode ser 35 considerado como uma estrutura mais compacta e de canais mais estreitos (Loveridge, 1999; Carbonare et al., 2005; Turner, 2007). Microscopicamente, o tecido ósseo é composto por células, água e a matriz extracelular dispostas tridimensionalmente. Dentre os componentes celulares estão os osteócitos, que participam da manutenção da matriz; os osteoblastos, os osteoclastos, além de adipócitos, nos indivíduos adultos (Loveridge, 1999; Junqueira; Carneiro, 2009). No processo de remodelação normal dos ossos, os osteoblastos e os osteoclastos trabalham de forma conjunta, com o objetivo de substituir o tecido ósseo senil, reorganizar o arranjo celular e manter a homeostasia mineral e adaptar a microarquitetura óssea à solicitação biomecânica. Os osteoclastos secretam ácidos, colagenases, pirofosfatases e outras enzimas que descalcificam e hidrolisam a matriz orgânica. Os osteoblastos através da sua atividade anabólica sintetizam colágeno e proteínas que são depositadas na superfície para formar a matriz óssea. (Hazenberg et al., 2007; Henriksen et al., 2007). A matriz extracelular do osso é formada por duas fases, uma orgânica composta por colágeno, glicosaminoglicanos e uma inorgânica de cristais de fosfato de cálcio. A porção inorgânica constitui 67% do volume ósseo, e é composta por cristais de cálcio e fosfato na forma de hidroxiapatita [Ca10(PO)4]6(OH)2 e fosfato de cálcio não cristalino. Nesta matriz, há também outros íons como citratos, bicarbonato, fluoreto, magnésio, potássio e sódio em menor quantidade (Witson, 2001; Wahl; Czernuszka, 2006; Clarke, 2008). Os cristais de hidroxiapatita situam-se ao lado de cada fibra colágena presentes nos osteóides, firmemente fixados, formando um padrão ordenado ao longo do osso. Os cristais são envolvidos por um meio homogêneo designado substância fundamental amorfa, composta de líquido extracelular e proteoglicanos, sulfato de condroitina e ácido hialurôrico (Feng, 2009; Junqueira; Carneiro, 2009). 36 Em nível molecular, a porção orgânica é constituída em 90% do seu volume por colágeno tipo I e 10% por proteínas não colágenas. O colágeno tipo I além de ser a proteína extracelular mais abundante, é essencial para a força esquelética. Cada fibra colágena se estende em torno das linhas de força tensionais, proporcionando ao osso certa elasticidade (Rupel et al., 2008). O colágeno, que compreende a porção orgânica na matriz extracelular possui 35% de glicina, 11% de alanina e 21% de prolina e hidroxiprolina. Nos animais existe cerca de 20 tipos distintos de colágeno, cada um com sua característica e funções específicas. O conjunto de eventos extra e intracelulares, como por exemplo, a resposta ao estímulo hormonal, determina o controle da biossíntese do colágeno ósseo. De outra forma, o aumento da síntese de colágeno pode ser determinado pela resposta dos fibroblastos e das fibras colágenas à ação do acetaldeído gerado na biossíntese do etanol (Lieber et al., 1965; Lieber 2004; Kolácná et al., 2007; Lodi et al., 2009). Assim como os micronutrientes e o tecido ósseo são influenciados pelo consumo de álcool etílico, este também pode interferir diretamente na função reprodutiva feminina ou masculina via sistema hormonal e, indiretamente, pelas alterações na aromatização hepática precursora de estrógenos (Turner et al., 1999; Augustynska et al., 2007; Epstein et al., 2007; Manolagas et al., 2009). Como função metabólica, os ossos também desempenham um papel importante no controle bioquímico de alguns íons como cálcio e fosfato. Na fisiologia normal, há um intercâmbio contínuo entre o cálcio plasmático e aquele armazenado no esqueleto, sendo primordial para a condução nervosa, contração muscular, coagulação sanguínea e basicamente toda a atividade celular de ossos e dentes. A homeostasia óssea é refletida no sangue e na urina com alteração dos níveis de enzimas, minerais e outras substâncias 37 envolvidas na remodelação óssea (Pinto Neto et al., 2002; Heaney, 2006; Moe, 2008). Acredita-se que além do hormônio paratireoidiano, calcitonina e hormônio de crescimento, os esteróides sexuais exerçam sua função metabólica nos ossos atuando no processo de remodelação. Do mesmo modo, a etapa final da síntese de estrógeno é catalisada pelo CYP450 no fígado, e tanto animais machos quanto fêmeas, com deleção do gene que participa desta biossíntese, têm a produção de estrógeno impedida (Faloni; Cerri, 2007; Ignacio et al., 2009). O hipoestrogenismo exerce um efeito direto sobre a atividade osteoclástica, aumentando as interleucinas IL-1 e IL-6 e as citocinas pró-inflamatórias, que estimulam a liberação do RANK ligante (receptor do ativador do fator nuclear Kappa B), proteína pertencente à família do fator de necrose tumoral, que é um dos principais agentes promotores da osteoclastogênese. Esta outra via de atuação dos estrógenos no processo de remodelação óssea, constitui um dos fatores de inibição da apoptose de osteoclastos e da diferenciação e ativação destas células. Já a osteoprotegerina é outra proteína solúvel que age como um receptor competitivo ao RANK ligante. Desta forma, na deficiência estrogênica há aumento da expressão de RANK ligante e redução da osteoprotegerina (Ramalho et al., 2000; Lerner, 2006; Faloni; Cerri, 2007). Com a menopausa e a andropausa, as concentrações de estrógenos declinam drasticamente, possibilitando a hiperatividade osteoclástica, como consequência, há o desequilíbrio na remodelação óssea com tendência à desmineralização. Por outro lado, através da terapia de reposição estrogênica, é possível impedir a degradação da matriz óssea (Turner; Sibonga, 2001; Faloni; Cerri, 2007). Os ovários são a principal fonte fisiológica de estrógeno circulante, sendo secretado na forma de estradiol. O hormônio estrogênico influencia a diferenciação de células progenitoras 38 hematopoiéticas em osteoclastos, participa da regulação e remodelação óssea, além de atuar no metabolismo do cálcio no osso cortical e trabecular (Gennari et al., 2002; Harada; Rodan, 2003). De acordo com dados da literatura, fica claro que a concentração de hormônios esteróides sexuais reduz com o passar da idade em ambos os gêneros, privando o indivíduo do efeito protetor contra a reabsorção óssea. Estima-se que 50% da perda óssea relacionada à carência de estrógeno, ocorra nos dez anos seguintes à instalação da menopausa (Ilich; Kerstetter, 2000; Ramalho et al., 2000; Gennari et al., 2003). Do mesmo modo já foi demonstrado que a suscetibilidade às fraturas osteoporóticas em mulheres idosas aumenta com a idade, e ao atingir a menopausa, há uma aceleração ainda mais significativa, com elevação da perda óssea e alteração da microarquitetura e conectividade trabecular (Jiang et al., 2007; Seeman, 2008). O estrógeno também regula a expressão dos genes que codificam o colágeno tipo I nos osteoblastos, a fosfatase alcalina óssea, e a osteocalcina. Ele inibe a síntese de agentes reabsortivos como as interleucinas, o fator de necrose tumoral alfa, a prostaglandina E2 e o fator estimulador de colônia de macrófagos, alterando, do mesmo modo, a osteoclastogênese (Bland, 2000; Okazaki et al., 2002). Dentre as interleucinas inibidas pelo estrógeno, destacam-se a IL-1 e IL-6 produzidas nos osteoblastos, que aumentam a reabsorção óssea quando há deficiência hormonal (Sunyer et al., 1999, Ribeiro et al., 2003; Lorenzo et al., 2008). Simsek et al. (2003) demonstraram através de inibição hormonal por ovariectomia e orquiectomia em ratos, o aumento transitório na osteoclastogênese em apenas uma semana após a cirurgia. A importância da ação hormonal nos diferentes gêneros e de acordo com o estímulo do desenvolvimento cortical ou trabecular, também foi observada em animais experimentais. Receptores andrógenos 39 ativados isoladamente estimulam o desenvolvimento trabecular e a remodelação cortical normal em camundongos machos. Todavia, a expansão do periósteo nestes animais, é observada somente quando há ativação simultânea dos receptores de andrógeno e estrógeno (Vanderschueren et al., 2004; Epstein, 2007). No gênero masculino, além do efeito estrogênico, os ossos são igualmente afetados pelos hormônios andrógenos como a testosterona e seus derivados 5 alfa-reduzido e a dihidrotestosterona, produzidos nas gônadas, que secretam mais de 95% do total de testosterona nos homens (Veloso et al., 2008). Estes hormônios, além de manterem o tônus muscular masculino, regulam o metabolismo ósseo via receptor específico para andrógenos e via receptor de estrógenos após a aromatização nos hepatócitos. Deste modo, a osteoporose em homens acima dos 55 anos está relacionada com o equilíbrio do sistema hipotálamo-pituitáira-gonadal, que por sua vez, atua na regulação do estrógeno e da testosterona (Gennari et al., 2003; Lee et al., 2006; Madeo et al., 2007; Ohlsson; Vandenput; 2009). Estima-se que 30% dos homens acima dos 60 anos tenham redução na concentração de testosterona. Habitualmente, os níveis declinam com a idade em uma taxa média de 1,5% ao ano, chegando a níveis 20% menores aos 50 anos e decrescendo até 50% aos 80 anos. As implicações desta redução hormonal refletem também nas doenças pré-existentes do indivíduo, elevando o índice de mortalidade em 6 meses quando são comparados homens com as mesmas patologias e idade (Shores et al., 2006; Laughlin et al., 2008). Laughlin et al. (2008) conduziram uma grande pesquisa populacional, onde foram avaliados 1060 homens, segundo a idade, patologias prévias, parâmetros antropométricos e 19 variáveis bioquímicas. Neste estudo os pesquisadores constataram que ao atingir níveis de testosterona abaixo do normal, a mortalidade nos pacientes 40 para os 20 anos seguintes à redução hormonal aumentava em 40%, independente da causa do óbito. Baixas concentrações de testosterona provocam redução da massa muscular, aumento de gordura corporal, obesidade centrípeta, resistência insulínica, irritabilidade e redução da libido. A privação deste hormônio precocemente, também reduz o crescimento periosteal e crescimento radial, resultando em tronco e membros menores nos machos e com tendência a maior fragilidade quando submetidos a cargas mecânicas. Contudo, não é possível relacionar a andropausa com a perda óssea acelerada, como é observada nas mulheres pós-menopausa. Neste caso, a redução da DMO é mais lenta, cerca de 20 a 25% de osso cortical e trabecular (Ribeiro et al. 2003; Shores et al., 2006; Epstein, 2007). Vanderschueren et al. (2000) conduziu um estudo com ratos Wistar orquiectomizados durante 15 semanas, e observou que a reposição hormonal de baixas doses de testosterona preveniu a redução da densidade mineral e da massa óssea. Os autores ainda verificaram que o efeito da testosterona ocorre mais na redução da reabsorção óssea do que no estímulo de neoformação óssea. A testosterona, por sua vez, pode ser convertida pela aromatase em estrógeno, e desta forma estimular a formação óssea tanto em machos quanto em fêmeas. A enzima aromatase é dependente do citocromo P450 do fígado, e por esta razão, uma alteração hepática como ocorre no alcoolismo, pode refletir na inibição da síntese estrogênica e elevação da suscetibilidade à fraturas (Harada; Rodan, 2003; Ohlsson; Vandenput; 2009). Mecanicamente, o tecido ósseo comporta-se como outros materiais não-biológicos, pois pode sofrer micro-traumas e fraturas. Quando estes micro-traumas excedem a capacidade reparativa do osso ocorre a falha (Nalla et al., 2004). A alta concentração de colágeno da fase orgânica em ossos jovens e normais permite ao osso resistir a tensões de flexão. Já a fase inorgânica, compostas por cristais de 41 hidroxiapatita, dá ao osso excelente resistência às tensões de compressão (Eihorn, 1992; Alexander, 2001). A redução da espessura, as irregularidades do osso trabecular ou cortical e as microfraturas, reduzem a capacidade do osso em absorver energia após um impacto, resultando em fratura mesmo sob condições normais de carga. A resistência óssea reflete a integração das duas características principais do osso que são a densidade óssea e qualidade óssea (Downey; Siegel, 2006; Hernandez, 2008). Dentre as funções mecânicas, os osteócitos atuam como células sensoriomecânicas, transformando os estímulos mecânicos recebidos sobre o esqueleto, em sinais bioquímicos de ativação da remodelação óssea e deposição mineral (Ocarino et al., 2006; Lane; Yao, 2009). O envelhecimento é um dos fatores de redução na quantidade e atividade dos osteócitos. Os osteoclastos, também atraídos por células em apoptose aumentam, ainda mais, a reabsorção óssea em idosos. Da mesma forma, a porção colágena sofre grandes perdas no decorrer da idade, acentuando-se após a menopausa (Bronckers et al., 2000; Bay- Jensen et al., 2009). Em seus estudos Hogan e colaboradores (2001), verificaram em roedores que o consumo de etanol também promove redução dramática das propriedades biomecânicas do fêmur quando comparados a ratos não submetidos ao consumo crônico de álcool etílico. Desde que Julius Wolff formulou a “Lei da Remodelação Óssea” em 1892, estudar o comportamento do tecido ósseo frente à patologias como desnutrição, alcoolismo e menopausa tem sido um grande desafio da comunidade científica (Burger; Klein-Nulend, 1999; Cole et al., 2009). Por meio de ensaios destrutivos específicos tem sido possível determinar algumas propriedades biomecânicas de um material biológico como o osso, tanto na forma de corpo de prova quanto na sua 42 estrutura íntegra, sendo estas, denominadas propriedades biomecânicas intrínsecas e extrínsecas (Turner; Burr, 1993; Ammann; Rizzoli, 2003). As propriedades extrínsecas referem-se ao osso como um todo, refletindo em seus valores os efeitos combinados do tamanho, forma e características teciduais. O uso do osso intacto é de grande importância no entendimento da fisiopatologia, pois os resultados obtidos refletem melhor a capacidade plástica e de resistir ao esforço de movimento do sistema músculo-esquelético. Já as propriedades intrínsecas referem-se ao comportamento do material somente a nível tecidual (Burger; Klein-Nulend, 1999; Silva, 2007). Parâmetros obtidos através de ensaios clássicos de propriedades biomecânicas, como carga máxima (carga máxima aplicada no momento da fratura óssea), deformação (distância movida pela carga até o momento da fratura), rigidez (curva relacionando carga e deformidade) e capacidade de absorção de energia (área sobre a curva), são importantes para especificar as propriedades elásticas e rígidas do osso (Hernandez; Keaveny, 2006; Comelekoglu et al., 2007; Silva, 2007; Ruppel et al., 2008). Os ensaios biomecânicos que determinam estes parâmetros são classificados de acordo com a forma e a direção das cargas aplicadas. As cargas aplicadas, por unidade de área de osso, podem ser classificadas de acordo com forma de aplicação das tensões sendo a tração, a compressão, o cisalhamento, a flexão e a torção as técnicas mais comuns (Eihorn, 1992; Turner; Burr, 1993; Hernandez; Keaveny, 2006; Ruppel et al., 2008). Os avanços das técnicas analíticas sem dúvida favoreceram o desenvolvimento das análises ósseas. Contudo, para a qualidade dos resultados em estudos científicos, é imperioso o uso de métodos distintos e parâmetros diferenciados de análise. Quanto mais correlações são encontradas, mais suporte é dado às evidencias descritas. Da mesma forma, maior será a contribuição da pesquisa na 43 determinação das possibilidades diagnósticas e futuras abordagens terapêuticas (Ammann; Rizzoli, 2003; Comelekoglu et al., 2007; Cole et al., 2009). Atualmente é preconizado pela OMS e seguido por protocolos clínicos do mundo todo a utilização da absorciometria de dupla emissão de raios-x (dual energy x-ray absorptiometry - DEXA) como técnica padrão-ouro para medida da massa óssea e no diagnóstico de osteoporose. Esta técnica determina quantitativamente o valor da DMO do indivíduo através de análise na coluna vertebral dorso-lombar, no terço proximal do fêmur, no terço distal do rádio e no terço proximal do úmero, locais correspondentes ao maior índice de fraturas por fragilidade óssea e por consequência, os mais importantes para serem investigados (Junqueira et al., 2001; Pinto Neto et al., 2002; Qaseem et al., 2008). Apesar disso, estudos populacionais demonstram que a quantificação da massa óssea não permite explicar todos os fenômenos associados à osteoporose (Wilkin; Devendra, 2001). Entre eles, o fato de 50% dos casos de fraturas ósseas ocorrerem em casos não qualificados na classificação de osteoporose da OMS (Schuit et al., 2004). Do mesmo modo, estudo experimental de Sarkar et al. (2002) e metanálise realizada por Delmas et al. (2004) demonstraram que a terapêutica com fármacos anti-reabsortivos como o raloxifeno promove, em média, a redução de 50 a 60% e pelas análises com DEXA, ocorre o aumento de apenas 7 a 8% na medida de DMO. Estes resultados levam a acreditar que os métodos tradicionalmente empregados para determinar a qualidade do osso fornecem somente uma visão semi-quantitativa destes processos, não sendo possível qualificar as alterações ultra-estruturais e moleculares das amostras ou mesmo prever novas fraturas. Assim sendo, o desenvolvimento de novos métodos de avaliação óssea podem permitir a identificação e a quantificação destas alterações de forma mais global (Nagareddy et al., 2005; Hernandez; Keaveny, 2006; Briggs et al., 2007). 44 Associado ao DEXA acredita-se que alguns marcadores bioquímicos auxiliam tanto no diagnóstico diferencial quanto na determinação do grau de comprometimento ósseo. Níveis plasmáticos de cálcio e fosfato inorgânico são alguns destes indicativos, uma vez que estes minerais compõem a estrutura da hidroxiapatita e suas alterações refletem na qualidade da microarquitetura óssea (Pinto Neto et al., 2002; Saraiva; Lazzareti-Castro, 2002; Keiver, 2004; Vieira, 2007; Vasikaran, 2008). Para mensuração destes minerais também é possível utilizar métodos de alta sensibilidade analítica como espectroscopia por fluorescência de raios-x, tomografia computadorizada quantitativa, microscopia eletrônica de varredura, entre outros (Baranowska et al., 2004; Nagareddy; Lakshmara, 2005). Dentre estas técnicas analíticas de elevada exatidão, a microfluorescência de raios-x (µEDXRF; micro energy dispersive x-ray fluorescence) é uma variante microanalítica da fluorescência de raios-x por dispersão em energia (EDXRF; energy dispersive x-ray fluorescence), que utiliza um micro-feixe para incidir os raios-x na amostra, possibilitando o mapeamento e a análise elementar de uma área específica menor da amostra. A microfluorescência de raios-x permite a determinação simultânea ou sequencial da concentração elementar da ordem de parte por milhão (ppm), sem a necessidade de pré-tratamento químico ou destruição da amostra (Nagata et al., 2001; Baranowska et al., 2004; Oliveira et al., 2008). Esta técnica baseia-se na excitação da amostra por um feixe primário proveniente de um tubo de raios-x, excitando os elétrons e gerando uma perturbação nos orbitais eletrônicos dos átomos. Esta perturbação atômica provoca uma fotoejeção de elétrons, formando as lacunas e gerando uma instabilidade. Na sequência, os elétrons das camadas posteriores realizam um salto quântico e ocupam estas lacunas geradas. Essa transição eletrônica promove a perda de energia e tende a 45 estabilizar os orbitais e atingir o estado fundamental. O resultado desta movimentação de elétrons é a emissão, na forma de fóton de raios-x, de energia característica e bem definida para cada elemento constituinte da amostra. Este efeito é esquematizado no diagrama da figura 1 (Zamburlini et al., 2007; Carvalho et al., 2009). Para medir a energia emitida pela amostra, o espectrômetro identifica o número de fótons (intensidade) da radiação fluorescente (secundária) em função da sua energia. A intensidade da radiação secundária é diretamente proporcional à concentração de cada elemento químico da amostra (Todd; Chettle, 1994; Matsumoto, 2001; Nagata et al., 2001; Soares et al., 2009). Figura 1 - Diagrama de obtenção do espectro de fluorescência de raios-x. Através da verificação em diferentes escalas, é possível obter uma visão geral e molecular de grande relevância no entendimento das estruturas ósseas, partindo da avaliação macroscópica para o nível molecular e correlacionando com outras análises, como é o caso dos testes biomecânicos (Lane; Yao, 2009). Diante da complexidade de interação entre as patologias, e do elevado risco de um indivíduo alcoolizado sofrer uma queda, torna o K L M N O P Q elétron é ejetado elétron ocupa vacância formada 1 2 3 4 IONIZAÇÃO ELÉTRONS EMISSÃO DE FLUORESCÊNCIA DETECÇÃO DA ENERGIA OBTENÇÃO DE DADOS ESPECTRO DE FLUORESCÊNCIA CONCENTRAÇÃO DO ELEMENTO EXCITAÇÃO PELOS RAIOS-X 46 problema da osteoporose associada ao alcoolismo um objeto de extrema relevância, uma vez que as fraturas interferem na qualidade e na expectativa de vida. Sendo assim, este trabalho se propõe a estudar as alterações biomecânicas ósseas, bem como o cálcio e fósforo no sangue e no fêmur de ratos com deficiência hormonal submetidos ao consumo crônico de etanol. 3 PROPOSIÇÃO A proposta desta pesquisa foi avaliar a resposta biomecânica decorrente da deficiência hormonal e do consumo elevado e crônico de etanol sobre o fêmur de ratos, bem como os parâmetros bioquímicos no sangue e técnicas microanalíticas da mineralização óssea. 3.1 Objetivos específicos a) Avaliar a condição nutricional dos ratos frente às variáveis estudadas, b) Analisar o comportamento biomecânico estrutural dos fêmures de ratos, quando submetidos ao ensaio de flexão-compressão em 3 pontos, c) Quantificar e analisar, por meio de testes bioquímicos o cálcio e o fosfato inorgânico, d) Quantificar e analisar, por meio de espectrometria de microfluorescência de raios-x o cálcio e o fósforo dos fêmures, e) Correlacionar os achados de acordo com o gênero, tipo de dieta e tipo de cirurgia. 4 MATERIAL E MÉTODO 4.1 Animais Este estudo seguiu os preceitos éticos de experimentação animal, conforme o Colégio Brasileiro de Experimentação Animal (COBEA). O protocolo experimental desenvolvido neste trabalho foi submetido e aprovado pela Comissão De Ética em Experimentação Animal sob protocolo número 037/2007-PA/CEP. Para a realização deste trabalho foram utilizados 108 ratos adultos, sendo 54 machos (Rattus norvegicus, variação albinus, Wistar) e 54 fêmeas (Rattus norvegicus, variação albinus, Wistar), com aproximadamente cento e vinte dias de idade (4 meses) e massa corpórea média de 267 grama para fêmeas e 446 grama para machos, provenientes do Biotério da Faculdade de Odontologia de São José dos Campos - UNESP. Os animais foram mantidos em trios em gaiolas a temperatura ambiente e higienizadas diariamente. 4.2 Protocolo experimental Os animais foram divididos em 12 grupos (cada grupo contendo 9 ratos), de acordo com o gênero, tipo de cirurgia e dieta ministrada, conforme esquema descrito nas tabelas 1 e 2. 49 Tabela 1 - Grupos experimentais de ratas fêmeas Grupos n=9 Cirurgia Dieta G1 Ovariectomia Etanol G2 Ovariectomia Isocalórico G3 Ovariectomia Ad libitum G4 Sham Etanol G5 Sham Isocalórico G6 Sham Ad libitum Tabela 2 - Grupos experimentais de ratos machos Grupos n=9 Cirurgia Dieta G7 Orquiectomia Etanol G8 Orquiectomia Isocalórico G9 Orquiectomia Ad libitum G10 Sham Etanol G11 Sham Isocalórico G12 Sham Ad libitum 4.3 Delineamento experimental O delineamento experimental está esquematizado conforme a figura 2, mostrando o tempo inicial e final do tratamento em semanas. 50 Figura 2 – Delineamento experimental 4.4 Dieta O modelo de alcoolismo utilizado foi o modelo semi- voluntário de Lieber-DeCarli, onde a solução hidroalcoólica era o único líquido oferecido para os grupos G1, G4, G7 e G10, e água fornecida para os grupos ad libitum G3, G6, G9 e G12. Além disso, foi fornecida solução de sacarose e água a vontade para os grupos isocalóricos G2, G5, G8 e G11 (Cunningham et al., 2000; Chakkalakal et al., 2002; Souza et al., 2009). A alcoolemia de 20% e o tempo de dieta alcoólica de 8 semanas, foram baseados em observações de estudos com resultados positivos para indução da perda óssea (Hogan et al., 2001; Rocha, 2005; Deco, 2009). A quantidade de dieta líquida e sólida consumida foi controlada diariamente em todos os grupos experimentais, sendo obtidas as calorias totais da dieta e sua proporção em relação às dietas sólida e líquida (Rocha, 2005; Alonso, 2009; Souza et al., 2009). • Ovariectomia • Orquiectomia • Sham 17 semanas • Etanol • Isocalórico • Ad libitum 22 semanas EUTANÁSIA30 semanas Controle da Dieta 5 semanas 8 semanas 51 4.4.1 Líquida Os animais do grupo Etanol receberam como dieta líquida uma solução hidroalcoólica contendo 5% de álcool etílico (Gay Lussac 5º = 5% v/v) com aumento gradativo semanal de 5% para ambientação, até atingir a concentração final de 20%, mantida por oito semanas até o final do experimento (Cunningham et al., 2000; Alonso, 2009; Deco, 2009). Os animais dos grupos Etanol ingeriam água apenas na forma de solução hidroalcoólica que era fornecida ad libitum durante as 24 horas para evitar o consumo agudo e a desidratação (Deco, 2009; Dolganiuc; Szabo, 2009). O grupo Isocalórico teve a finalidade de distinguir se o efeito prejudicial era decorrente da ação do etanol ou da desnutrição provocada pelo seu consumo crônico (Lieber, 2003; Alonso, 2009). A fim de estabelecer o consumo pareado de calorias dos grupos Etanol e Isocalórico, o fornecimento da dieta nos grupos Etanol teve início um dia antes dos demais para que, no dia seguinte, as calorias ingeridas na forma de etanol fossem oferecidas aos grupos Isocalórico na forma de solução de sacarose (Deco, 2009; Souza et al., 2009). O consumo diário de etanol foi convertido de grama para kcal e a quantidade correspondente foi transformada em solução de sacarose a 26,6% (Vetec Química Fina, Rio de Janeiro - Brasil) e fornecida aos animais Isocalóricos. Para estes cálculos foi estabelecido que 1 grama de etanol é equivalente a 7,1kcal/g, e que 1 mL de álcool etílico absoluto PA (ACS-99,5o Ecibra®, Santo Amaro - Brasil) contém 0,798 grama de etanol. Os grupos ad libitum receberam dieta líquida livre constituída de água potável, sendo as quantidades ingeridas registradas por dia e por animal. 52 4.4.2 Sólida Todos os grupos receberam dieta sólida controlada, constituída pela ração Labina (Purina, São Paulo - Brasil), com 23% de proteínas, conforme disposto no quadro 1. Para os grupos Etanol foi fornecida diariamente uma quantidade livre, porém conhecida de ração. Para estabelecer o consumo pareado de calorias provenientes da ração ingerida pelos grupos Etanol, o fornecimento da dieta nestes grupos também teve início um dia antes dos demais para que, no dia seguinte, a mesma quantidade de ração fosse oferecida aos grupos Isocalórico (Deco, 2009; Souza et al., 2009). Os grupos ad libitum também receberam dieta sólida livres, sendo registrada a ingestão diária por animal. Quadro 1 - Composição da dieta padrão utilizada na alimentação dos animais. Vitamina A 20000 UI Umidade (máx.) 13% Vitamina D3 6000 UI Proteína (mín.) 23% Vitamina E 30 UI Lipídeo (méd.)* 4,2% Vitamina K 6 mg Carbohidrato (méd.)* 56,8% Zinco 35 mg Caloria (kcal/100g)* 358,5% Cobre 26 mg Extrato Etéreo (mín.) 2,5% Antioxidante 100 mg Matéria Fibrosa (máx.) 9,0% Vitamina B12 10 µg Matéria Mineral (máx.) 8,0% Vitamina B2 8 mg Cálcio (máx.) 1,3% Pantotenato de Cálcio 24 mg Fósforo (min.) 0,85% Niacina 95 mg Tiamina 4 mg Colina 2000 mg Piridoxina 6 mg Biotina 0,1 mg Ácido Fólico 0.5 mg Manganês 50 mg Iodo 2 mg Ferro 65 mg Composição básica segundo Purina do Brasil: milho, farelo de trigo, farelo de soja, farinha de carne, farelo de arroz cru, carbonato de cálcio, fosfato bicálcico, sal, Pré-mix. * Adaptado do rótulo do produto e de: Maia, LMSS. L-arginina facilita a depressão alastrante cortical, de forma dependente da dose, em ratos nutridos e precocemente desnutridos. 2008. Tese (Doutorado em Nutrição) - Universidade Federal de Pernambuco. 53 4.5 Procedimentos cirúrgicos Todos os procedimentos cirúrgicos foram realizados com material cirúrgico esterilizado, em sala cuidadosamente limpa, no Biotério da Faculdade de Odontologia de São José dos Campos - UNESP. 4.5.1 Anestesia e analgesia Antes de todos os procedimentos cirúrgicos como ovariectomia, orquiectomia e falsa-cirurgia (Sham), os animais foram imobilizados e anestesiados por via intramuscular na dose de 0,1mL/100g de uma solução contendo 13 mg/kg de cloridrato de xilazina Anasedan® (Vetbrands, Paulínia – Brasil) (fármaco sedativo, relaxante muscular e analgésico), associado à 33 mg/kg de cloridrato de quetamina Dopalen® (Vetbrands, Paulínia - Brasil) (fármaco anestésico geral). Após o procedimento cirúrgico, todos os animais receberam uma dose única via intramuscular de solução antimicrobiana de uso veterinário na dose de 1,35 mL/kg, contendo benzilpenicilina benzatina, benzilpenicilina procaína, benzilpenicilina potássica, diidroestreptomicina base sulfato e estreptomicina base sulfato em ampola de 6.000.000 UI Pentabiótico Veterinário® (Fort Dogde, Porto Alegre - Brasil). Todos os animais também receberam antiinflamatório não esteroidal no músculo contralateral na dose de 1 mg/kg de diclofenaco sódico 75 mg Voltaren® (Novartis, Rio de Janeiro - Brasil). 54 4.5.2 Ovariectomia e falsa ovariectomia (Sham) A ovariectomia foi utilizada como forma de indução de perda óssea nas ratas fêmeas. Esta técnica é um método experimentalmente consagrado e bem documentado por Jee e Yao (2001), Turner (2001), Netto et al. (2006) e Deco (2009), sendo igualmente recomendado pelo Food and Drug Administration (FDA), órgão do governo americano que regulamenta alimentos e medicamentos (Bonjour et al., 1999). Aos cinco meses de idade, as ratas pertencentes ao grupo ovariectomizado foram anestesiadas, tricotomizadas na região abdominal lateral e submetidas à anti-sepsia com álcool iodado a 2%. Para a ovariectomia, os animais sofreram incisão longitudinal com extensão aproximada de 1 centímetro na pele e musculatura da região lateral do corpo, na linha média, próxima ao nível dos rins e abaixo da última costela. O ovário foi identificado e exposto, sendo em seguida realizada a hemostasia local por meio da ligadura da parte superior da trompa com fio de seda número 4 Ethicon® (Johnson & Johnson, São José dos Campos - Brasil). Em seguida, os ovários e tecidos moles adjacentes foram removidos. As trompas foram então reposicionadas na cavidade abdominal, as camadas musculares e a pele foram suturadas, em seguida foi realizada nova anti-sepsia com álcool iodado a 2% (Synth ® , Diadema - Brasil). Este procedimento foi realizado bilateralmente (Figura 3). Para que não houvesse interferência da resposta orgânica ao trauma, todos os animais do grupo falso-ovariectomizados (Sham) foram submetidos aos mesmos protocolos que os animais ovariectomizados, porém os ovários não foram removidos (Netto et al., 2006). 55 Figura 3 - Cirurgia de Ovariectomia: a) incisão da pele e da camada muscular; b) exposição do ovário e tecido mole circundante; c) ovário e tecido mole removido. 4.5.3 Orquiectomia e falsa orquiectomia (Sham) Para indução de perda óssea nos ratos machos foi utilizada a orquiectomia, um método experimentalmente com resultados positivos para redução estrogênica em machos (Calero et al., 2000; Vanderschueren et al., 2000; Herbst; Bhasin, 2004; Piano et al., 2005; Veloso et al., 2008). Os ratos pertencentes ao grupo orquiectomizado, após anestesia, foram dispostos em decúbito dorsal e o escroto recebeu anti- sepsia com álcool iodado a 2%. Em seguida, a pele foi incisada longitudinalmente na linha mediana anterior da bolsa escrotal e realizada a exteriorização dos testículos. Os ductos deferentes e o pedículo vascular foram isolados, ligados com fio de seda número 4 para hemostasia, permitindo a remoção dos testículos e epidídimos (Veloso et al., 2008). ca b 56 Após a remoção bilateral dos testículos, foi realizada a sutura muscular e na pele da bolsa escrotal e realizada nova anti-sepsia com álcool iodado a 2% (Figura 4). Os animais falso-orquiectomizados (Sham) foram submetidos ao mesmo procedimento farmacológicos e ato operatório para que não houvesse interferência da resposta orgânica ao trauma cirúrgico. Entretanto, houve apenas o manuseio cirúrgico do testículo, sem remoção do órgão. Figura 4 - Cirurgia de Orquiectomia: a) desinfecção do escroto e incisão na pele e músculo; b) ligadura do pedículo vascular; c) remoção do testículo 4.5.4. Coleta de sangue Após as oito semanas de dieta, os animais foram novamente anestesiados e levados à sala cirúrgica para coleta de sangue e eutanásia. Para realizar as dosagens bioquímicas foram coletados aproximadamente 5 mL de sangue da artéria abdominal de cada animal. A coleta foi realizada com auxílio de seringa de 5 mL com agulha 30x7 (Solomed® B.D., Juiz de Fora - Brasil) na artéria abdominal, ca b 57 que foi localizada após abertura sagital do abdome e afastamento das estruturas sobrepostas à artéria (Figura 5). As amostras foram depositadas de forma lenta em tubos de coleta previamente heparinizados. Em seguidas, as amostras foram encaminhadas para análise bioquímica de cálcio e fosfato no Laboratório de Análises Clínicas Oswaldo Cruz® de São José dos Campos/São Paulo. Figura 5- Coleta do sangue pela artéria abdominal. 4.5.5 Eutanásia Imediatamente após a coleta de sangue todos os animais, foram decapitados em guilhotina, para em seguira realizar a remoção dos fêmures. Neste procedimento foi verificada a ausência de tecido ovariano e testicular, além da atrofia das vesículas seminais e próstata ventral para confirmação da orquiectomia, e ausência dos ovários e atrofia uterina para confirmação da ovariectomia. Os fêmures esquerdos depois de removidos e dissecados foram armazenados individualmente em solução fisiológica de cloreto de 58 sódio 0,9% (Laboratório Tayuyna®, Nova Odessa - Brasil) a temperatura constante de - 20 ºC. Os fêmures direitos, depois de removidos, dissecados e secos com auxílio de gaze estéril foram armazenados individualmente em tubos criogênicos (Nalgene Labware®, Rochester - EUA) devidamente identificados e numerados, para serem transportados até o Laboratório de Espectroscopia Vibracional Biomédica (LEVB), do Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento (IP&D) da Universidade do Vale do Paraíba - UNIVAP em São José dos Campos/São Paulo, onde foi realizada a análise por microfluorescência de raios-x. 4.6 Variáveis estudadas Os parâmetros avaliados podem ser divididos em análises biométricas e nutricionais (evolução ponderal, quociente de eficiência alimentar e morfometria femoral), análise das propriedades biomecânicas (teste de flexão-compressão em 3 pontos e análise intrínseca da cortical), quantificação mineral óssea (microfluorescência de raios-x) e análise bioquímica (cálcio e fosfato inorgânico plasmático), sendo os fêmures separados de acordo com análises destrutivas (fêmur esquerdo) e não destrutivas (fêmur direito) conforme Figura 6. 59 Figura 6 – Distribuição dos fêmures por análise. 4.6.1 Análises biométricas e nutricionais 4.6.1.1 Evolução ponderal A massa corpórea dos animais foi aferida no dia da cirurgia (17ª semana), no início da dieta (22ª semana) e no final do experimento (30ª semana). A partir desses dados foi calculada a evolução ponderal por animal. Este cálculo foi obtido subtraindo-se do peso final (g) de cada animal o peso inicial (g) e dividindo este valor pelo peso inicial (g) multiplicado por 100, para obter o valor em percentual (Rocha, 2005). D I R E I T O Macroscópica Cálcio plasmático Fosfato plasmático FÊMUR Extrísenco BIOQUÍMICA Intrínseco Módulo de elasticidade Resistência máxima Evolução ponderal Quociente de eficiência alimentar NUTRICIONAL E S Q U E R D O µEDX Morfometria Carga máxima Rigidez Quantificação mineral óssea 60 4.6.1.2 Quociente de Eficiência Alimentar (QEA) Diariamente foram registrados os valores médios das dietas sólidas e líquidas consumida por cada animal. A partir desses dados foi calculada a média de consumo para todos os grupos experimentais, considerando ração ingerida (g e kcal), solução líquida (mL e kcal), dieta total (kcal) e percentual correspondente às dietas líquida e sólida. Com a finalidade de analisar a capacidade do animal converter em peso corporal a energia alimentar consumida, foi realizado o cálculo do quociente de eficiência alimentar dividindo-se o ganho médio de massa corporal (g) de cada animal, pelo consumo total da dieta (kcal), multiplicado por 100 (Botelho et al., 2005; Henriques et al., 2008). Neste estudo, os cálculos nutricionais foram baseados nos valores de energia metabolizável da ração oferecida aos animais controle. No grupo controle a ração foi responsável por 100% do conteúdo calórico, enquanto nos grupos Etanol ela foi responsável por apenas (64,20%) em média, sendo o restante das calorias provenientes da solução hidroalcoólica. Para os animais do grupo isocalórico, os mesmos 64,20% das calorias da dieta foram fornecidos através da ração, e o restante pela solução de sacarose. 4.6.1.3 Morfometria do fêmur No fêmur direito com auxílio de paquímetro digital com precisão de 0,05 milímetros (modelo 727 Starret®, Athol - EUA), foi realizada a mensuração do comprimento e diâmetro. 61 Para o comprimento do fêmur foi tomando como referência a região distal dos côndilos femorais (região articular com a tíbia) e saliência óssea mais proximal do trocanter maior. O diâmetro femoral foi mensurado através da espessura médio-lateral da região mediana da diáfise (Figura 7). Figura 7 - Medição do fêmur com paquímetro digital. 4.6.2 Análises das propriedades biomecânicas Para avaliar a biomecânica femoral os fêmures esquerdos foram submetidos a testes de propriedades biomecânicas pelo ensaio de resistência à flexão-compressão em 3 pontos e em seguida pela análise da cortical óssea. Através do ensaio de flexão-compressão em 3 pontos foram analisadas as propriedades extrínsecas que se referem ao osso intacto, refletindo em seus valores os efeitos combinados da morfometria, mineralização e características teciduais. Para avaliar a propriedade intrínseca através de medições de um corpo de prova gerado após o teste 62 anterior, que reflete o comportamento da cortical óssea no ponto de ruptura da carga máxima (Ramadoss et al., 2006). 4.6.2.1 Propriedades biomecânicas extrínsecas As propriedades biomecânicas extrínsecas dos fêmures foram determinadas por meio do teste de resistência à flexão- compressão em três pontos. O ensaio foi conduzido em uma Máquina Universal de Ensaio Emic® (modelo DL 2000 Equipamentos e Sistemas de Ensaio Ltda, São José dos Pinhais - Brasil) (Figura 8A). Para permanecer em equilíbrio térmico com o meio ambiente e evitar microfraturas, os fêmures foram descongelados gradualmente, sob refrigeração, 24 horas antes dos ensaios, e mantidos em solução fisiológica de cloreto de sódio 0,9% até o momento anterior ao teste. Todo o procedimento foi realizado em temperatura ambiente e as amostras levemente hidratadas. Cada espécime foi centralizada ao longo de seu comprimento sobre um suporte contendo dois apoios de 3 mm, distantes 15 mm um do outro, com sua face anterior voltada para baixo e apoiados na região metafisiária, conforme demonstrado na figura 8B. Uma pré-carga foi aplicada para acomodação do sistema máquina-acessório-fêmur. Para tanto, foi utilizada a célula de carga de 100 kgf de capacidade máxima ajustada para escala de 50 kgf ou 490 N. A carga constante de até 50 kgf foi aplicada perpendicularmente ao eixo longitudinal do osso, no sentido póstero- anterior, no meio da distância entre os dois apoios, numa velocidade constante de 5 mm/min até a falha do espécime (Senra, 2009). 63 Figura 8 – A: máquina universal de ensaio. B: teste de flexão-compressão em 3 pontos no fêmur. Com um computador acoplado à máquina universal de ensaio associado ao programa de computador de automação de ensaios Tesc® (versão 1.1 Standard EMIC, São José dos Pinhais - Brasil) foi possível controlar os parâmetros dos ensaios e calcular, automaticamente, os valores correspondentes à carga máxima (N) e à rigidez (x103 N/m) para cada animal. A obtenção dos pontos de análise, que em seguida é convertido nos valores de carga e rigidez, foi realizada em intervalos não padronizados de tempo definidos pelo programa, que emite um arquivo para cada ensaio com os valores de tempo em segundos (s), deslocamento em milímetros (mm) e carga em Newton (N). Em seguida, os dados foram transcritos para o programa Office Excel® (versão 14.0 Microsoft Corporation, Redmond - EUA), onde os valores foram compilados e as propriedades biomecânicas extrínsecas dos fêmures foram calculadas (Senra, 2009). A B 64 4.6.2.2 Propriedades biomecânicas intrínsecas Após o ensaio de flexão-compressão, cada segmento distal ósseo foi separado para análise intrínseca do osso cortical. Com auxílio de um micromotor com peça reta KaVo® (KaVo do Brasil, Joinvile - Brasil) sob alta rotação e irrigação com solução fisiológica de cloreto de sódio a 0,9%, foram realizadas secções transversais de aproximadamente 1 milímetro de espessura na região adjacente ao local da ruptura dos fêmures após o teste de flexão-compressão em 3 pontos (Ramadoss et al., 2006). As amostras foram então coradas por 3 minutos com azul de metileno a 1% (Synth®, Diadema - Brasil) para otimizar a visualização, e dispostas sobre uma lâmina de vidro e analisadas em um estereomicroscópio Stemi® (modelo 2000-C Carl Zeiss, Bernried - Alemanha) com aumento de 20 vezes. A imagem de cada espécime foi obtida por câmera digital Sony® (modelo Cybershot DSC-W5, Tokyo - Japão), acoplada ao estereomicroscópio auxiliado por régua milimetrada. Em seguida, as imagens foram processadas pelo programa UTHSCSA Image Tool® (versão 3.0 University of Texas Health Science Center, San Antonio - EUA) para determinar o “cross sectional moment of inertia” (CSMI) pela fórmula de Jarvinen et al. (1998) (1). Onde: “T” é a espessura externa e “t” a espessura interna, no sentido antero-posterior. “W” é a largura externa e “w” é a largura interna, no sentido médio-lateral: CSMI= pi / 64 x [(T3W)- (t 3 w)] (1) A partir deste resultado, utilizando a metodologia descrita por Compagnucci et al. (2007) foram determinadas as propriedades 65 intrínsecas da cortical óssea. O módulo de elasticidade (MPa) (2), onde “K” é a rigidez, “L” é o comprimento do osso, e “CSMI” é o momento de inércia. E também a resistência máxima (MPa) (3), onde “d” é o diâmetro externo da cortical. Calculados pelas fórmulas: Módulo de Elasticidade = (K x L x 3)/(48 x CSMI) (2) Resistência Máxima = (carga máxima x L x d)/(8 x CSMI) (3) Os dados foram então transcritos para o programa Office Excel®, onde os valores foram compilados e realizados os cálculos das propriedades biomecânicas intrínsecas do fêmur. 4.6.3 Quantificação mineral óssea Os fêmures direito dos ratos foram avaliados através de espectrometria para determinar a concentração em peso proporcional dos elementos cálcio e fósforo e também a relação molar entre eles (Ca/P). As análises foram efetuadas em um equipamento de microfluorescência de raios-x (modelo 1300 Shimadzu®, Kyoto - Japão) (Figura 9A), equipado com tubo de raios-x de ródio (Rh). A contagem da radiação foi feita por um detector semicondutor de silício-lítio (Si(Li)) refrigerado por nitrogênio líquido, conectado a um computador para realização do processamento de dados. A varredura foi realizada longitudinalmente em toda a extensão plana do osso, excluindo as epífises que, para facilitar o posicionamento da amostra, foram seccionados em uma cortadora de disco diamantado Isomet® (modelo 1000 Buehler International, Lake Bluff 66 – EUA) com 0,3 mm de espessura sob alta rotação e irrigação com solução fisiologia a 0,9%. No momento do teste, os fêmures foram fixados com auxílio de plasticina (Acrilex®, São Bernardo do Campo - Brasil) em uma placa de vidro. A placa de vidro contendo os ossos foi posicionada convenientemente no porta-amostra do equipamento para uma boa visualização da superfície a ser analisada. A calibração do equipamento foi realizada utilizando-se como referência a hidroxiapatita estequiométrica sintética com grau de pureza mínima de 99.999% Ca10(PO4)6(OH)2 (Sigma-Aldrich®, St. Louis - EUA). Após calibração da energia por padrões internos do equipamento, as medidas foram coletadas utilizando-se os parâmetros fundamentais de emissão de raios-x característicos dos principais elementos químicos presentes na hidroxiapatita do fêmur, que são o cálcio (Ca) e o fósforo (P). O elemento oxigênio (O) foi utilizado como balanço químico de massa total e o elemento hidrogênio (H) não foi considerado, uma vez que sua massa é equivalente a 0,1% do peso total da hidroxiapatita (Carvalho et al., 2009; Senra, 2009). A tensão e a corrente do tubo foram de 15 kv (auto), com ajuste automático da corrente e feixe com diâmetro de 50 micrômetros (µm). A varredura foi realizada em linha horizontal a cada 50 µm tomando como partida a porção medial do fêmur, totalizando 200 pontos por amostra, com tempo de leitura de 10 segundos por ponto (tempo real), somando um total de 260 minutos para cada leitura da amostra (Figura 9B). 67 Figura 9 – A: espectrômetro de microfluorescência de raios-x. B: laserpoint indicando o ponto inicial da leitura. Após o término da leitura em varredura, foi gerado um gráfico com o posicionamento e as médias da concentração de Ca e P no fêmur. A proporção entre os elementos químicos da amostra foi calculada pela razão do peso relativo determinado nas leituras do equipamento, que converte a intensidade relativa da energia de transição do raios-x característico do elementos para os respectivos teores em porcentagem de peso (Figura 10). Figura 10 - Exemplo da obtenção da concentração em forma de gráfico dos minerais fósforo (A) e cálcio (B) nos fêmures de ratos. Após a coleta dos dados, os espectros obtidos foram tratados por um processo de filtragem (smoothing) com cinco pontos no A B A A A A B 68 programa de computador PCMEDX® (versão 1.04 Shimadzu, Kyoto - Japão) e em seguida foram tabulados em uma planilha do programa Office Excel® para realização dos cálculos estatísticos. 4.6.4 Parâmetros bioquímicos As concentrações plasmáticas de cálcio e fosfato inorgânico foram quantificadas por técnicas analíticas em espectrofotômetro automatizado Cobas Integra® (modelo 400 Plus Roche Diagnostic, Basel - Suíça) e com rea