GABRIEL FELIPE HISPAGNOL BICHO SÍNTESE, CARACTERIZAÇÃO E ESTUDO DO POTENCIAL ANTIMICROBIANO DE PEPTÍDEOS ANÁLOGOS AO PEPTÍDEO (p- BthTX-I)2 Dissertação apresentada ao Instituto de Química da UNESP de Araraquara como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Biotecnologia. Orientador: Prof. Dr. Norival Alves Santos Filho Araraquara 2024 IMPACTO POTENCIAL DESTA PESQUISA Com o aumento das linhagens de microrganismos resistentes a antibióticos, os tratamentos estão se tornando menos eficazes. Diante desse cenário crescente e persistente de resistência antimicrobiana, surge a necessidade de descobrir novas substâncias capazes de substituir os antibióticos existentes. O objetivo final é obter moléculas com atividade contra bactérias e fungos, com foco especial nas linhagens de bactérias listadas pela Organização Mundial de Saúde (OMS) devido à alta preocupação global que apresentam. Espera-se também que as moléculas deste estudo tenham baixa toxicidade contra células saudáveis de mamíferos, mostrando- se assim uma alternativa promissora de tratamento futuro, específica contra microrganismos, afim de contribuir com o desenvolvimento de terapias mais eficazes e seguras para tratar infecções e melhorar a qualidade de vida da população. THE POTENTIAL IMPACT OF THIS RESEARCH With the increase in strains of antibiotic-resistant microorganisms, treatments are becoming less effective. Given this growing and persistent scenario of antimicrobial resistance, there is a need to discover new substances capable of replacing existing antibiotics. The aim of this work is to obtain molecules with activity against bacteria and fungi, with a special focus on the strains of bacteria listed by the World Health Organization (WHO) due to the high global concern they present. It is also expected that the molecules in this study will have low toxicity against healthy mammalian cells, thus showing a promising alternative for future treatment, specifically against microorganisms, in order to contribute to the development of more effective and safe therapies to treat infections and improve the quality of life of the population. DADOS CURRICULARES IDENTIFICAÇÃO Nome: GABRIEL FELIPE HISPAGNOL BICHO Nome em citações bibliográficas: BICHO, G.F.H ENDEREÇO PROFISSIONAL: Instituto de Química - UNESP – Araraquara. R. Francisco Degni, 55. Bairro Quitandinha – Araraquara 14800900, SP – Brasil. Telefone: 16 33019822 FORMAÇÃO ACADÊMICA/ TITULAÇÃO: 2018 – 2022 BACHAREL EM FARMÁCIA PELA INSTITUIÇÃO DE ENSINO UNIVERSIDADE PAULISTA (UNIP) DE ARAÇATUBA. FORMAÇÃO COMPLEMENTAR: 2016 – 2016 Curso de Inglês basico (Carga horária: 80 h). CNA, Birigui -SP, Brasil. 2016 – 2017 Curso de Inglês intermediário (Carga horária: 80 h). CNA, Birigui -SP, Brasil. 2022 – 2022 Curso de Comunicação e Escrita Científica. (Carga horária: 4h). American Chemical Society, Estados Unidos. 2022 – 2022 Webinar Fall Back to Basics - Part 1: Chemistry, realizado pela Waters. 2022 – 2022 Webinar Fall Back to Basics - Part 2: LC Systems, realizado pela Waters. 2022 – 2022 Webinar Fall Back to Basics - Part 3: MS Systems, realizado pela Waters. 2023 – 2023 Workshop “Boas práticas em pipetagem”. 2023 – 2023 Estágio de docência realizado na disciplina Bioquímica Geral e Experimental I. Instituto de Química de Araraquara. 2023 – 2023 Evento Brunch Internacionalização da Pós-graduação da UNESP. 2023 – 2023 Ferramentas Aplicadas na Produção in vitro de Embriões. (Carga horária: 4h). Universidade Federal de São Carlos, UFSCAR, Brasil. 2023 – 2023 Isolamento de Microrganismos. (Carga horária: 4 h). Universidade Federal de São Carlos, UFSCAR, Brasil. 2023 – 2023 Plant basic metabolics. (Carga horária: 3 h). Universidade Federal de São Carlos, UFSCAR, Brasil. 2023 – 2023 PRODUTOS BIOTECNOLÓGICOS PARA O TRATAMENTO DO CÂNCER. (Carga horária: 8 h). Universidade de Araraquara, UNIARA, Brasil. 2023 – 2023 Triagem de microrganismos. (Carga horária: 4 h). Universidade Federal de São Carlos, UFSCAR, Brasil. 2023 – 2023 Workshop “Artificial Intelligence and Metabolomics”. 2023 – 2023 Workshop “ChatGPT and python-Applied to bioinformatics and chemoinformatics”. 2023 – 2023 Workshop “Metabolômica e Machine Learning”. 2024 – 2024 Curso de LC e LC/MS. (Carga horária: 8 h). Agilent. Universidade Federal de São Carlos, UFSCAR, Brasil. 2024 – 2024 Curso de letramento científico. (Carga horária: 24 h). Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, UNESP, Brasil. 2024 – 2024 Curso de orátoria (Carga horária: 90 h). Cosmonauta Araraquara. 2024 – 2024 Curso de outono “Escrita científica”. (Carga horária: 6 h). Universidade de São paulo – USP de São Carlos, Brasil. 2024 – 2024 Iniciação teatral (Carga horária: 90 h). Sesi. Araraquara. 2024 – 2024 Jogos teatrais (Carga horáia: 15 h). Sesi Araraquara. 2024 – 2024 Oficina de escrita cientifica. (Carga horária: 2 h). Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, UNESP, Brasil. ATUAÇÃO PROFISSIONAL: 2022 – 2023 Participação da comissão colegiada da biblioteca (titular). 2022 – 2024 Aluno de pós graduação (Mestrado) em Instituto de Química de Araraquara, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, UNESP, Brasil. 2022 – 2024 Bolsista, Enquadramento Funcional: mestrando, Carga horária: 40, Regime: Dedicação exclusiva. 2022 – 2024 Participação no grupo de pesquisa LaseBio (Laborátorio de síntese e estudo de biomoléculas). PRODUÇÃO BIBLIOGRÁFICA: 1. SYNTHESIS, CHARACTERIZATION AND STUDY OF THE ANTIMICROBIAL POTENTIAL OF PPTIDES ANALOGUES TO THE PEPTIDE (p-BthTX-I)2. 47ª Reunião anual da Sociedade Brasileira de Biofisica. 2023. (Congresso). 2. SÍNTESE, CARACTERIZAÇÃO E ESTUDO DO POTENCIAL ANTIMICROBIANO DE PEPTÍDEOS ANÁLOGOS AO PEPTÍDEO (p-BthTX-I)2. XII Four Biotec + 4º Biotec Days. 2023. (Congresso). PARTICIPAÇÃO EM EVENTOS CIENTÍFICOS: 1. III Simpósio de Toxicologia Básica e Aplicada [SIM-TOX]. 2023. (Simpósio). 2. 47ª Reunião anual da Sociedade Brasileira de Biofisica (SBBF). Realizado em Universidade de Campinas (UNICAMP), na cidade de Campinas - SP. 2023. (Congresso). 3. VII Simpósio de Biociências e Biotecnologia em Instituto de Biociências, Letras e ciências exatas UNESP- São José do Rio Preto - SP. 2023. (Simpósio). 4. XII Four Biotec + 4º Biotec Days. Realizado Universidade de São Carlos (UFSCAR) na cidade de São Carlos - SP. 2023. (Congresso). 5. Avaliador de projetos em 13ª BRAGANTEC - Feira de ciência e tecnologia - Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo - Câmpus de Bragança Paulista. 2023. Instituto Federal de São Paulo. 6. Avaliador de trabalhos em 53º Semana da Química em Instituto de Química de Araraquara-UNESP. 2023. Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Dedico este labor ao Senhor, à minha família e amigos, por todo o estímulo e apoio concedidos ao longo desta jornada, e pela aventura que está por vir. AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus pelas oportunidades que me forneceu até hoje. A minha mãe, Cássia, meu pai Emerson, minhas tias Ruth e Nilma, avós Maria e Odila, avôs, Edson e Euclides. Ao meu orientador, Norival, pelos ensinamentos científicos e de vida que me moldaram como profissional e tornaram possíveis a realização deste trabalho. Ao professor Eduardo e Paulo por toda a atenção e sugestões para melhorias deste projeto. À Débora e à biblioteca do Instituto de Química de Araraquara, pela ajuda na adequação às normas da ABNT. Aos meus amigos e amigas, Mércedes, Anderson, Emanuel, Expedito, Felipe, Gustavo, Henler, Henrique, Jennifer, José, Juan, Lucas, Natan, Pedro, Thayná e Yves, Julienne, Alexandre, Rita, Douglas, Thiago, Mariana, Meire, Nana, Kayane Nilton, Lais, Washi, Lucélia, Nicolas, Wizyng, Camila, Fernanda, Zeca, Talles e Danilo que me deram ápoio durante essa jornada. À CAPES pelo fomento às pesquisas científicas brasileiras. Ao instituto de química de araraquara - Universidade Estadual Paulista -UNESP “Júlio de Mesquita Filho” por cada oportunidade fornecida. A Universidade de São Carlos - UFSCAR por cada curso e evento fornecido Aos servidores do Instituto de química que sempre me atenderam com respeito e carinho. A Wanda e Gehard por cada café e conversa que me forneceram. Todos fizeram parte dessa trajetória e contribuíram para que tal sonho fosse possível. Sou muito grato a todos vocês! Este trabalho foi realizado com apoio Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de financiamento - 001. “...Pois onde estiver o seu tesouro, aí também estará o seu coração”. Mateus 6:21 RESUMO A resistência microbiana é um problema crônico de saúde pública. Estima-se que, caso não sejam tomadas providências, cerca de 10 milhões de mortes anuais ocorrerão em todo o mundo até 2050, tornando-se a principal causa de morte. O objetivo deste trabalho foi sintetizar e purificar peptídeos análogos ao peptídeo (p- BthTX-I)2K, sendo eles (p-MtII)2K, (p-EM-2)2K, (p-ACL)2K, (p-AppK)2K, assim como realizar a caracterização estrutural, avaliar o potencial antimicrobiano, desvendar os possíveis mecanismos de ação em membranas biológicas, degradação frente a protéases presentes no sangue e toxicidade frente a hemácias humanas. A síntese dos peptídeos foi realizada através da técnica de síntese de peptídeos em fase sólida (SPFS) e a caracterização estrutural dos peptídeos foi feita por meio da técnica de dicroísmo circular. A atividade antimicrobiana foi avaliada contra linhagens de bactérias Gram-positivas e Gram-negativas, assim como duas linhagens de C. albicans, sendo uma suscetível a fluconazol e outra resistente. As moléculas foram testadas contra hemácias humanas para avaliação de toxicidade in vitro, e também foram testadas em soro sanguíneo para avaliação do perfil de degradação frente a protéases. Para elucidar os possíveis mecanismos de ação, foi efetuada a técnica de permeabilização em vesículas lipídicas. Os resultados do ensaio de atividade antimicrobiana demonstraram que os peptídeos foram ativos contra as linhagens bacterianas, em especial (p-AppK)2K e (p-ACL)2K, que foram ativos contra todas as linhagens testadas, tanto contra bactérias Gram-positivas, Gram-negativas e as duas linhagens de C. albicans, superando na maioria dos casos a molécula modelo (p-BthTX-I)2K, demonstrando também baixa atividade hemolítica. O ensaio de permeabilização de vesículas sugere possíveis mecanismos de formação de poros transientes para (p-MtII)2K, (p-ACL)2K, (p-AppK)2K e perfil característico de peptídeos formadores de poros para (p-EM-2)2K. Contudo, estudos adicionais devem ser realizados para a elucidação desses mecanismos. Todos os peptídeos demonstraram ser estáveis por pelo menos uma hora frente a protéases do soro humano, sendo que (p-ACL)2K e (p-AppK)2K alcançaram cerca de 90% de degradação no período de 24 h. As modificações propostas inicialmente para o peptídeo (p-BthTX-I)2K demonstraram ser aplicáveis para outros peptídeos derivados de PLA2-Like de peçonhas de serpente. As moléculas deste estudo demonstraram atividade contra bactérias Gram-positivas, Gram-negativas e linhagens de C. albicans, além de baixa toxicidade, abrindo oportunidades para novos estudos. Palavras-chave: Peptídeos antimicrobianos catiônicos; peptídeos síntese; bactérias Gram-positivas; bactérias Gram-negativas; mecanismo de ação. ABSTRACT Microbial resistance is a chronic public health problem. It is estimated that, if no measures are taken, about 10 million deaths per year will occur worldwide by 2050, making it the leading cause of death. The aim of this study was to synthesize and purify peptides analogous to the peptide (p-BthTX-I)2K, namely (p-MtII)2K, (p-EM- 2)2K, (p-ACL)2K, and (p-AppK)2K, as well as to perform structural characterization, evaluate their antimicrobial potential, investigate possible mechanisms of action on biological membranes, assess degradation by proteases present in blood, and determine toxicity against human erythrocytes. The peptides were synthesized using the solid-phase peptide synthesis (SPPS) technique, and their structural characterization was performed using circular dichroism. Antimicrobial activity was evaluated against Gram-positive and Gram-negative bacteria, as well as against fluconazole-susceptible and resistant strains of C. albicans. The molecules were tested against human erythrocytes for in vitro toxicity evaluation and in blood serum to assess degradation by proteases. To elucidate possible mechanisms of action, lipid vesicle permeabilization assays were conducted. The antimicrobial activity assays showed that the peptides were active against bacterial strains, especially (p- AppK)2K and (p-ACL)2K, which were active against all tested strains, including Gram- positive, Gram-negative bacteria, and both C. albicans strains. These peptides often outperformed the model molecule (p-BthTX-I)2K and also demonstrated low hemolytic activity. The vesicle permeabilization assays suggested transient pore formation mechanisms for (p-MtII)2K, (p-ACL)2K, (p-AppK)2K, and a characteristic pore forming peptide profile for (p-EM-2)2K. However, additional studies are needed to clarify these mechanisms. All peptides showed stability for at least an hour against human serum proteases, with (p-ACL)₂K and (p-AppK)₂K degrading approximately 90% in 24 h. The modifications initially proposed for the peptide (p-BthTX-I)2K were found to be applicable to other PLA2-like peptides derived from snake venom. The molecules in this study demonstrated activity against Gram-positive and Gram- negative bacteria and C. albicans strains, with low toxicity, opening up opportunities for further studies. Keywords: Cationic antimicrobial peptides; peptide synthesis; Gram-negative bactéria; Gram-positive bactéria; mechanism of action. LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Propaganda sobre o uso da penicilina no período da Segunda guerra mundial. ..................................................................................................................... 26 Figura 2 - Mecanismos de resistência bacteriana. ................................................... 31 Figura 3 - Interação de PAM catiônicos em membrana procariótica. ....................... 34 Figura 4 - Mecanismos de ação de peptídeos antimicrobianos (Barrell-stave (a), poro toroidal (b), modelo carpet (c) e detergent-like (d). ........................................... 37 Figura 5 - Impacto na atividade antimicrobiana de análogos ao p-BthTX-I. ............. 41 Figura 6 - Ligação peptídica. .................................................................................... 43 Figura 7 - Etapas de acoplamento e desproteção na SPFS. .................................... 45 Figura 8 - Etapas do dicroísmo circular. ................................................................... 48 Figura 9 - Perfil cromatográfico do peptídeo (p-MtII)2K bruto (a) e puro (b). ............ 60 Figura 10 - Perfil cromatográfico do peptídeo (p-EM-2)2K bruto (a) e puro (b). ........ 60 Figura 11 - Perfil cromatográfico do peptídeo (p-ACL)2K bruto (a) e puro (b). ......... 60 Figura 12 - Perfil cromatográfico do peptídeo (p-AppK)2K bruto (a) e puro (b). ........ 61 Figura 13 - Espectro de massas do peptídeo puro (p-MtII)2K. .................................. 63 Figura 14 - Espectro de massas do peptídeo puro (p-EM-2)2K. ............................... 63 Figura 15 - Espectro de massas do peptídeo bruto (p-ACL)2K. ................................ 64 Figura 16 - Espectro de massas do peptídeo bruto (p-AppK)2K. .............................. 64 Figura 17 - Espectros de CD das principais estruturas secundárias de peptídeos e proteínas. Alfa-hélice (a), folha-beta (b) e random-coil (c). ....................................... 72 Figura 18 - Espectro de dicroísmo circular dos peptídeos (p-MtII)2K, (p-EM-2)2K, (p- ACL)2K e (AppK)2K .................................................................................................... 73 Figura 19 - Perfil de degradação em soro para o peptídeo (p-MtII)2K ...................... 76 Figura 20 - Perfil de degradação em soro para o peptídeo (p-EM-2)2K. .................. 76 Figura 21 - Perfil de degradação em soro para o peptídeo (p-ACL)2K. .................... 77 Figura 22 - Perfil de degradação em soro para o peptídeo (p-AppK)2K. .................. 77 Figura 23 – Porcentagem (%) de degradação em função de tempo para os peptídeos (p-MtII)2K, (p-EM-2)2K, (ACL)2K e (AppK)2K ............................................. 79 Figura 24 – Atividade hemolítica para os peptídeos (p-MtII)2K, (p-EM-2)2K, (p- ACL)2K, (p-AppK)2K .................................................................................................. 80 Figura 25 - Permeabilização de vesículas 15 mM de POPC. ................................... 83 Figura 26 - Permeabilização de vesículas 12 mM de POPC (80%) + 3 mM de POPG (20%) ......................................................................................................................... 84 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Programas usados para purificação dos peptídeos por CLAE.. .............. 46 Tabela 2 - Ponto isoelétrico (pI) e carga líquida dos peptídeos (p-MtII)2K, (p-EM- 2)2K, (p-ACL2K; (p-AppK)2K. ........................................................................................ 59 Tabela 3 - Tempo de retenção (T.R) e pureza dos peptídeos (p-MtII)2K, (p-EM-2)2K, (p-ACL)2K e (p-AppK)2K. ........................................................................................... 62 Tabela 4 - Concentração inibitória miníma (CIM) e concentração bactericida miníma (CBM) para os peptídeos (p-MtII)2K, (p-EM-2)2K, (p-ACL)2K e (p-AppK)2K. ............. 67 Tabela 5 - Concentração inibitória miníma (CIM) e concentração fungicida miníma (CFM) para os peptídeos (p-MtII)2K, (p-EM-2)2K, (p-ACL)2K e (p-AppK)2K contra Candida albicans ATCC 90028. ................................................................................ 70 Tabela 6 - Concentração inibitória miníma (CIM) e concentração fungicida miníma (CFM) para os peptídeos (p-MtII)2K, (p-EM-2)2K, (p-ACL)2K e (p-AppK)2K contra Candida albicans ATCC 96901. ................................................................................ 71 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Alinhamento múltiplo. ............................................................................ 56 Quadro 2 - Sequência dos peptídeos ....................................................................... 58 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ACN Acetonitrila Ala Alanina Alanina Alanina APD Antimicrobial Peptide Database Arg Arginina Asp Aspartato Boc t-butiloxicarbonila C Cisteína CBM Concentração bactericida mínima CD Circular dichroism (dicroísmo dircular) CF Carboxifluoresceína CFM Concentração fungicida mínima CIM Concentração inibitória mínima CLAE Cromatografia Líquida de Alta Eficiência CLSI Clinical and Laboratory Standards Institute Cys Cisteína DCM Diclorometano DIC N,N-diisopropilcarbodiimida DMF N,N-dimetilformamida E Ácido glutâmico EUA Estados Unidos da América ERO Espécies reativas de oxigênio F Fenilalanina Fmoc 9-fluorenilmetiloxicarbonila GUV Giant unilamellar vesicles (vesículas unilamelares gigantes) H Histidina HC50 Hemolytic concentration (concentração que produz lise de 50%) HOBt N-hidroxibenzotriazol K Lisina L Leucina LPC Lysophosphatidylcholine (lisofosfatidilcolina) LPS Lipopolissacarídeo LUV Large unilamellar vesicles (vesículas unilamelares grandes) Lys Lisina MH Müeller-Hinton MIC Minimal inibition concentration (concentração inibitória mínima) MS Mass spectrometry (espectrometria de massas) OMS Organização Mundial da Saúde P Prolina PAM Peptídeo antimicrobiano PBS Phosphate-buffered saline (tampão fosfato salino) PG Phosphatidylglycerol pI Ponto isoelétrico POPC 1-palmitoil-2-oleoil-sn-glicero-3-fosfocolina POPG 1-palmitoil-2-oleoil-sn-glicero-3-fosfo-(10-rac-glicerol) PS Phosphatidylserine (fosfatidilserina) R Arginina RAM Resistência antimicrobiana RPM Rotações por minuto SARM Staphylococcus aureus resistente à meticilina SPFS Síntese de peptídeos em fase sólida T.R Tempo de retenção TFA Ácido trifluoroacético TFE 2,2,2-trifluoroetanol Y Tirosina TIS Triisopropilsilano W Triptofano EU União Europeia VRE Vancomicine resistence Enterococos (Enterococos resistentes à vancomicina) SÍMBOLOS Θ Elipticidade molar Sumário 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 23 1.1 História dos antimicrobianos ....................................................................... 23 1.2 Resistência aos antimicrobianos ................................................................. 27 1.3 Peptídeos antimicrobianos .......................................................................... 32 1.4 Mecanismos de ação de PAM .................................................................... 33 1.5 Miotoxinas PLA2-LIKE ................................................................................. 37 1.6 Peptídeo (p-BthTX-I)2 .................................................................................. 40 2 OBJETIVOS ....................................................................................................... 42 3 MATERIAIS E METÓDOS ................................................................................. 43 3.1 Síntese de peptídeos em fase sólida (SPFS) ............................................. 43 3.2 Purificação e caracterização dos peptídeos por cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC/CLAE) ............................................................................................ 47 3.3 Espectrometria de massas .......................................................................... 47 3.4 Alinhamento múltiplo ................................................................................... 47 3.5 Dicroísmo circular ....................................................................................... 48 3.6 Atividade antimicrobiana ............................................................................. 49 3.6.1 Atividade antibacteriana .......................................................................... 49 3.6.2 Atividade antifúngica ............................................................................... 50 3.7 Degradação em soro ................................................................................... 51 3.8 Vazamento de carboxifluoresceína ............................................................. 52 3.8.1 Preparação do filme lipídico .................................................................... 52 3.8.2 Preparação de LUVs ............................................................................... 52 3.8.3 Liberação de CF ...................................................................................... 53 3.9 Atividade Hemolítica ................................................................................... 53 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ......................................................................... 55 4.1 Alinhamento múltiplo ................................................................................... 55 4.2 Síntese de peptídeos .................................................................................. 57 4.3 Atividade antimicrobiana ............................................................................. 66 4.3.1 Atividade antibacteriana .......................................................................... 66 4.3.2 Atividade antifúngica ............................................................................... 69 4.4 Dicroismo circular........................................................................................ 72 4.5 Degradação em soro ................................................................................... 75 4.6 Atividade hemolítica .................................................................................... 79 4.7 Liberação de carboxifluoresceina................................................................ 82 5 CONCLUSÃO .................................................................................................... 87 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 88 23 1 INTRODUÇÃO 1.1 História dos antimicrobianos O uso de substâncias com propriedades antimicrobianas remonta a milênios como por exemplo, a aplicação de micróbios que produzem antibióticos como medida preventiva contra doenças ou a utilização de remédios como cataplasmas à base de pão mofado, empregados para tratar ferimentos expostos na Sérvia, China, Grécia e Egito há mais de 2000 anos. Documentos antigos, como o papiro de Eber, datado de 1550 a.c., mencionam em sua lista de tratamentos tanto o pão com bolor quanto o solo medicinal (Hutching; Truman; Wilkinson, 2019). No século XX, teve início a era de ouro no tratamento contra infecções microbianas, testemunhando-se o surgimento do primeiro agente antibacteriano desenvolvido pelo ser humano, conhecido como arsfenamina (Salvarsan) (Uddin et al., 2021). Sintetizado por Alfred Bertheim nos laboratórios de Paul Ehrlich e aprovado como medicamento em 1910, foi o primeiro fármaco da classe das sulfonamidas. Sua história começou quando Paul Ehrlich, influenciado pela coloração seletiva de células por corantes de anilina, teve a ideia da quimioterapia específica. Em 1909, Ehrlich e seu assistente Sahachirō Hata descobriram que o composto 606, derivado do ácido arsanílico, era eficaz contra estirpes bacterianas e o protozoário Trypanosoma, levando ao tratamento da sífilis (Nicolaou; Rigol, 2018). Poucos meses após a aprovação, o medicamento passou a ser amplamente utilizado contra sífilis e tripanossomíase, sendo considerado como a “bala mágica” no tratamento da sífilis. Mais tarde foi chamado de Salvarsan e foi o medicamento antimicrobiano mais usado antes da década de 1940. Essa descoberta impulsionou a pesquisa de novas moléculas, resultando em novas versões do Salvarsan com melhor aplicação e menos efeitos colaterais (Gaynes, 2017; Nicolaou; Rigol, 2018; Zaffiri; Gardner; Toledo-Pereyra, 2012). O Salvarsan deu lugar ao pró-fármaco sulfonamida Prontosil, identificado por Gerhard Domagk, um bacteriologista da Bayer. Ele utilizou a substância para evitar que sua filha perdesse o braço por amputação. Domagk e sua equipe deram continuidade ao trabalho de Paul Ehrlich, pois as sulfonamidas se baseavam em 24 corantes que tingiam seletivamente as células bacterianas (Hutching; Truman; Wilkinson, 2019). Os antimicrobianos exerceram influência não apenas no combate a doenças infecciosas, mas também na estrutura da sociedade, alterando os níveis de morbidade e mortalidade. A adoção de agentes antimicrobianos, desenvolvidos a partir de uma variedade de compostos de arsênico em laboratório, na prática da quimioterapia, foi essencial para reduzir as taxas de infecção cirúrgica de 40% para 2% (Zaffiri; Gardner; Toledo-Pereyra, 2012). Em 1928, Alexander Fleming, um bacteriologista do hospital St. Mary's em Londres, ao retornar de suas férias, deparou-se com uma cena peculiar em uma de suas placas de Petri contendo estafilococos. Percebendo que um fungo contaminante, identificado posteriormente como Penicillium notatum, estava impedindo o crescimento das bactérias próximas, Fleming iniciou uma jornada que culminaria na descoberta da penicilina. Esta descoberta foi um marco na medicina moderna, embora inicialmente tenha considerado seu uso como um antisséptico local, Fleming não conseguiu purificar ou caracterizar sua atividade (Kardos; Demain, 2013; Lobanovska; Pilla, 2017). Os trabalhos de Fleming foram fundamentais para os cientistas de Oxford, especialmente Howard Florey e Ernst Chain, que, a partir de 1939, se dedicaram ao desenvolvimento de novos antimicrobianos. Norman Heatley, um jovem químico do laboratório de Florey, desempenhou um papel crucial na purificação da penicilina, tornando-a viável para testes adicionais. O trabalho em equipe e a persistência desses cientistas foram essenciais para o sucesso da penicilina. Graças aos esforços conjuntos, em meados da década de 1940, a Escola de Patologia Sir William Dunn, em Oxford, tinha quantidade suficiente de penicilina para testes em animais. Um experimento marcante conduzido por Heatley e colegas demonstrou o potencial salvador da penicilina, onde todos os ratos tratados com o antimicrobiano sobreviveram após serem infectados com uma dose fatal de estreptococos do Grupo A, enquanto os ratos de controle sucumbiram. Esta evidência notável foi um divisor de águas, mostrando o poder da penicilina como um medicamento vital para a salvação de vidas (Barrett, 2023; Spagnolo; Trujillo; Dennehy, 2021). 25 Os antibióticos desempenharam um papel fundamental durante a Segunda Guerra Mundial. Dada a necessidade de controlar infecções decorrentes de ferimentos e queimaduras, os militares realizaram experimentos com antibióticos, começando com a sulfonamida Prontosil. Em 1942, o uso de sulfonamidas em forma oral e na forma de cristais diretamente aplicados nas feridas dos soldados americanos tornou-se comum. No entanto, essa prática teve vida curta, pois em 1943, um estudo clínico mostrou uma perda de eficácia no tratamento de infecções, e em 1945, o uso de sulfas em pó para feridas já não era mais recomendado (Brocke; Barr, 2020). A penicilina prometia resultados melhores para o tratamento de infecções (Brocke; Barr, 2020). Em 1942, os soldados americanos receberam penicilina pela primeira vez durante um ataque em Oran, na África (Maniring et al., 2009). Como a capacidade de produção do Reino Unido estava voltada para a fabricação de munições, a produção em massa da penicilina foi realizada em Peoria pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos, e depois foi ampliada por empresas farmacêuticas americanas como Merck, Squibb, Pfizer e Abbott (Brown, 2004). Este avanço foi crucial para a medicina de guerra. A produção conjunta dos britânicos e americanos de penicilina aumentou de 21 bilhões de unidades em 1943 para 6,8 trilhões de unidades em 1945. O primeiro uso militar em larga escala da penicilina ocorreu durante a invasão da Normandia no Dia D em 1944 (Maniring et al., 2009) e embora houvesse quantidades suficientes para soldados na guerra nesse período, a penicilina ainda permanecia rara para os civis (figura 1) (Brocke; Barr, 2020). 26 Figura 1 - Propaganda sobre o uso da penicilina no período da Segunda guerra mundial. Fonte: Extraído de Brocke; Barr (2020). Em 1945, o reconhecimento internacional chegou a Alexander Fleming, Howard Florey e Ernst Chain, na forma do Prêmio Nobel, concedido pela "descoberta da penicilina e seu efeito curativo em várias doenças infecciosas". Chain e outro colaborador, Edward Abraham, prosseguiram com a pesquisa sobre a estrutura da penicilina até 1943, quando Abraham propôs pela primeira vez a estrutura dos beta-lactâmicos. Esta teoria foi posteriormente confirmada por Dorothy Hodgkin e Barbara Low através da cristalografia de raios X. (Kardos; Demain, 2013). A descoberta da penicilina reverberou ao longo da história, marcando um ponto de viragem fundamental. Durante a Segunda Guerra Mundial, a penicilina emergiu como um salva-vidas, resgatando milhares de soldados e civis feridos (Sengupta; Chattopadhyay; Grossart, 2013). Além disso, lançou as bases para a era dos antibióticos, catalisando o desenvolvimento de uma gama diversificada de agentes antimicrobianos mais potentes e eficazes (Nathan, 2015). 27 1.2 Resistência aos antimicrobianos A introdução dos antibióticos no uso clínico marcou um ponto crucial na história da medicina do século 20. Embora tenha representado um avanço significativo, os primeiros sinais de resistência antimicrobiana surgiram em 1937, especialmente em relação às sulfonamidas, o que comprometeu sua eficácia terapêutica e esses mesmos mecanismos continuam ativos cerca de 70 anos depois. Em 1940, Abraham e Chain notaram que uma cepa de Escherichia coli demonstrou a capacidade de neutralizar a ação da penicilina produzindo a enzima penicilinase. Esse fenômeno desencadeou preocupações significativas na comunidade médica e científica (Davies; Davies, 2010). Com o amplo uso da penicilina, cepas resistentes capazes de inativar a molécula tornaram-se predominantes. Para combater essa resistência, estudos com compostos sintéticos foram conduzidos para modificar quimicamente a penicilina, a fim de evitar a clivagem pelas penicilinases (β-lactamases), dando origem a diversas classes novas como cefalosporinas, cefamicinas, monobactamos e carbapenêmicos, assim como inibidores da beta-lactamase como por exemplo o ácido clavulânico (Bush; Bradford, 2016; Davies; Davies, 2010; Uddin et al., 2021). A resistência antimicrobiana (RAM) é definida como a capacidade de um microrganismo sobreviver em concentrações de antimicrobianos que matam ou inibem o crescimento de outros microrganismos da mesma espécie (Alós, 2015). É um problema crônico de saúde publica e ela ocorre quando microrganismos adquirem resistência contra os medicamentos antimicrobianos utilizados para tratamento. Estima-se que caso não seja tomada nenhuma providência, cerca de 10 milhões de mortes em todo o mundo irão ocorrer até 2050, tornando-se a principal causa de morte no mundo (Tang; Miliar; Moore, 2023). Em fevereiro de 2017, a OMS (Organização mundial da saúde) publicou a sua lista de agentes patogênicos de grande interesse clínico a qual necessitam de novas alterntivas farmacológicas de âmbito emergêncial. Dentro desta ampla lista, estão os patógenos (Enterococcus faecium, Staphylococcus aureus, Klebsiella pneumoniae, Acinetobacter baumannii, Pseudomonas aeruginosa e Enterobacter spp.), formando o acrônimo "ESKAPE". Esses microrganismos são frequentemente responsáveis por 28 infecções hospitalares graves e potencialmente letais em pacientes gravemente enfermos e com o sistema imunológico comprometido (Oliveira et al., 2020). A bactéria S. aureus, Gram-positiva, faz parte da microbiota normal da pele, especialmente no nariz. Contudo, é uma das principais causas de infecções hospitalares graves, como endocardite infecciosa, osteomielite e bacteremia, com altas taxas de mortalidade antes da era dos antibióticos. A introdução da penicilina melhorou significativamente o prognóstico, mas levou ao surgimento de cepas resistentes, como as produtoras de β-lactamases (Huemer et al., 2020). A resistência à meticilina é mediada pelo gene mecA, disseminado através da transferência horizontal de genes do elemento genético móvel SCCmec. A colonização por SARM aumenta o risco de infecção, sendo comum a transmissão via itens hospitalares como jalecos, celulares e tablets. Na prática clínica, a vancomicina e a teicoplanina são frequentemente utilizadas como tratamento de primeira linha, embora tenham surgido cepas com resistência reduzida. Alternativas incluem daptomicina, linezolida, tigeciclina, sulfametoxazol-trimetoprim ou β- lactâmicos de 5ª geração (Rossi, 2011). Enterococos faecium, um microrganismo persistente nos ambientes hospitalares. Representa uma ameaça considerável devido à sua capacidade de desencadear infecções graves, tais como infecções peritoneais, de feridas, de tecidos moles e pele, do trato urinário, do sistema nervoso central, bacteremia e endocardite (Huemer et al., 2020; Jannati et al., 2023). Além disso, como patógenos oportunistas, representam um risco significativo, especialmente para pacientes com comprometimento imunológico (Lee et al., 2019) Esta variedade de infecções associadas a esses microrganismos dificulta o trabalho dos profissionais de saúde. Nos últimos anos, observou-se um aumento na ocorrência de infecções enterocócicas resistentes a antibióticos, com destaque para os Enterococos resistentes à vancomicina (VRE). Em 2017, na União Europeia, a taxa atingiu 14,9%, enquanto nos Estados Unidos da América chegou a 30%. O tratamento dessas infecções por VRE é desafiador devido à resistência bacteriana (Huemer et al., 2020). K. pneumoniae, um patógeno Gram-negativo em forma de bastonete, é um dos patógenos mais comuns responsáveis por infecções, incluindo pneumonia, infecções do trato urinário e bacteremias (Stojowska-Swedrzyńska et al., 2022). K. 29 pneumoniae, especialmente as cepas resistentes a carbapenêmicos, representam uma preocupação global devido à sua prevalência variada. A resistência desenvolvida por essas cepas, através de mecanismos como a produção de β- lactamases, facilita sua disseminação em ambientes hospitalares, aumentando o risco de surtos (Reyes; Aguilar; Caicedo, 2019; Stojowska-Swedrzyńska et al., 2022). Acinetobacter baumannii é uma bactéria patogênica Gram-negativa que emergiu globalmente como um patógeno altamente problemático presente em infecções em ambientes hospitalares, associado a diversas infecções graves, como pneumonia associada à ventilação mecânica e infecções da corrente sanguínea (Moubareck; Halat, 2020). Sua capacidade de adquirir resistência a múltiplos antibióticos potencializa a gravidade dessas infecções, tornando-o um dos organismos multirresistentes mais preocupantes na prática clínica. A mortalidade relacionada a infecções por A. baumannii pode variar significativamente, de 5% em enfermarias de hospitais gerais a 54% em UTIs (Moubareck; Halat, 2020). A abordagem terapêutica dessas infecções é um desafio, especialmente devido à resistência a carbapenêmicos, β-lactâmicos e polimixinas (Tu et al., 2023). A bactéria Gram-negativa P. aeruginosa, trata-se de uma bactéria oportunista responsável por várias infecções graves, como pneumonia associada à ventilação mecânica, infecções em unidades de terapia intensiva e infecções sanguíneas por cateteres centrais (Lorusso et al. 2022). Ela afeta especialmente pacientes imunocomprometidos, devido à sua capacidade de evadir as defesas imunológicas, colonizando e formando biofilme. Além disso, produz diversos fatores de virulência que causam danos nos tecidos, sendo associada a altas taxas de mortalidade em casos de fibrose cística, infecções neonatais, câncer e queimaduras graves (Tuon et al., 2022). A bactéria P. aeruginosa foi incluída no grupo prioritário 1 da OMS para desenvolvimento de novas opções de tratamento, exibe naturalmente baixa suscetibilidade a muitos antimicrobianos e uma tendência significativa ao desenvolvimento de resistência (Lorusso et al. 2022). Enterobacter spp. são bacilos Gram-negativos anaeróbios facultativos, parte da família Enterobacteriaceae, com uma variedade de espécies, incluindo E. aerogenes, E. cloacae e E. hormaechei (Davin-Regli; Lavigne; Pagès, 2019). Associadas a diferentes ambientes, desde solo e água até microbiota intestinal, algumas subespécies se destacam por causar infecções nosocomiais. Essas 30 infecções são desafiadoras devido à resistência intrínseca a vários antibióticos, incluindo ampicilina e cefalosporinas de primeira geração, e à produção de β- lactamases de amplo espectro. A resistência a β-lactâmicos é uma preocupação global, com a emergência de enzimas como as β-lactamases de espectro estendido (ESBLs) e as β-lactamases do tipo AmpC (Meini et al., 2019). O Brasil não está imune ao cenário global de resistência antimicrobiana. Nos últimos anos, a ANVISA identificou aumento preocupante nas taxas de resistência aos carbapenêmicos entre bacilos Gram-negativos, incluindo Acinetobacter spp., Klebsiella pneumoniae e Pseudomonas aeruginosa. Linhagens bacterianas resistentes, como Klebsiella pneumoniae produtora de KPC-2 (CC258, ST258 e ST11), Pseudomonas aeruginosa produtora de SPM-1 (ST277) e Acinetobacter baumannii produtora de carbapenemase classe D (ST79), tornaram-se endêmicas no Brasil, resultando em altos níveis de resistência em ambientes hospitalares. A emergência de resistência à polimixina, especialmente entre os isolados de Klebsiella pneumoniae e Acinetobacter baumannii, tem limitado ainda mais as opções terapêuticas disponíveis. (Martins; Toleman; Gales, 2020). A resistência antimicrobiana é um processo natural, no entanto o uso excessivo de antimicrobianos acelera esse processo (Bassetti et al., 2022). Existem dois tipos de resistência: intrínseca (natural) e adquirida. A resistência intrínseca ocorre quando certas espécies bacterianas são naturalmente resistentes a certos antibióticos, independentemente da exposição prévia a eles. Isso pode ser devido à presença de genes específicos. A resistência adquirida pode ocorrer por meio de mutações no DNA bacteriano durante a replicação ou pela transferência horizontal de genes, que pode ocorrer por transformação, transdução ou conjugação. Esses processos permitem que as bactérias absorvam material genético de outras bactérias, aumentando assim sua resistência a antibióticos (Mancuso et al., 2021; Uddin et al., 2021). Os mecanismos de resistência bacteriana a antimicrobianos são variados e sofisticados, representando um desafio significativo no tratamento de infecções (Oliveira et al., 2020; Tang; Miliar; Moore, 2023). Uma estratégia comum é a diminuição do acúmulo de fármacos pela redução da permeabilidade da membrana externa (Figura 2A) ou pelo aumento do efluxo ativo dos fármacos através da superfície celular, impedindo a entrada ou 31 favorecendo a expulsão dos antimicrobianos (Figura 2D) (Morrison; Zembower, 2020). Além disso, algumas bactérias produzem enzimas capazes de inativar ou modificar os medicamentos, tornando-os ineficazes antes mesmo de exercerem seu efeito bactericida (Figura 2B) (Pang et al., 2019). Outro mecanismo é a alteração dos locais alvo ou de ligação, como a modificação de proteínas de ligação à penicilina ou ribossômicas, reduzindo a afinidade dos antimicrobianos por essas estruturas (Figura 2C). Além disso, as bactérias podem desenvolver vias metabólicas alternativas que contornam os efeitos dos antimicrobianos, como a absorção de ácido fólico do ambiente para resistir aos efeitos do trimetoprima-sulfametoxazol. Essa diversidade de mecanismos ressalta a importância de estratégias abrangentes no combate à resistência bacteriana, visando preservar a eficácia dos antimicrobianos e garantir o sucesso no tratamento de infecções (Morrison; Zembower, 2020). Figura 2 - Mecanismos de resistência bacteriana. Fonte: Elaborado pelo autor (2024). Embora a resistência antimicrobiana seja algo natural, diversas causas podem ser atribuídas ao avanço acelerado desse processo, dentre elas, é possível 32 citar a falta de higiene/saneamento básico e liberação de antibióticos não metabolizados ou resíduos deles no meio ambiente, mas a principal causa é o uso irracional e ou incorreto. Além do uso desenfreado, diversos estudos revelaram que as indicações de tratamento, escolha do agente e a duração da antibioticoterapia são inadequadas em 30% a 50% dos casos (Aslam et al., 2018). 1.3 Peptídeos antimicrobianos Mediante a versatilidade dos microrganismos de desenvolverem mecanismos para resistir aos antibióticos atuais se faz necessário cada vez mais a descoberta de novas moléculas (Magana et al., 2020). Em todo o mundo pesquisadores trabalham em busca de novas alternativas para substituir os antimicrobianos convencionais e os peptídeos antimicrobianos (PAM) são uma alternativa vantajosa, principalmente devido ao seu amplo espectro de ação e baixa indução de resistência e fácil reprodutibilidade (Santos Filho et al., 2015). Além disso, podem apresentar na maioria das vezes, mecanismos de ação variados, como por exemplo, nas membranas biológicas dos microrganismos e parede celular, dificultando a formação de resistência (Li et al., 2022). Os PAM são pequenas moléculas, geralmente variando entre 2 e 50 resíduos de aminoácidos, são geralmente catiônicos e anfipáticos, com cerca de 50% de resíduos apolares. Estão amplamente difundidos na natureza, podendo ser obtidos de bactérias, fungos, protozoários, plantas e animais. São efetores importantes no sistema imunológico inato e a primeira linha de defesa para proteção contra infecções por patógenos (Boparai; Sharma, 2020). O primeiro peptídeo antimicrobiano, gramicidina foi descoberto por René Jules Dubos e Rollin Hotchkiss em 1939, extraído de Bacillus brevis e demonstrou atividade contra bacterias gram positivas. Atualmente, uma variedade de atividades já foi descrita na literatura, como atividade antibacteriana, antifúngica, antiprotozóaria, antiviral e antitumoral. No momento constam mais de 3.000 PAM de fontes naturais no Antimicrobial Peptide Database (APD) e somando com os peptídeos sinteticos, mais de 5.000 já foram descobertos ou sintetizados até o momento (Hafeez et al., 2021). 33 1.4 Mecanismos de ação de PAM A carga líquida positiva dos peptídeos antimicrobianos facilita a interação inicial com a membrana bacteriana, que geralmente possuem carga líquida negativa devido à presença de componentes como lipopolissacarídeos (LPS) em Gram- negativas e ácidos lipoteicoicos em Gram-positivas. Essa atração eletrostática permite que os peptídeos se aproximem e interajam efetivamente com a membrana como mostra a figura 3, um passo crucial para sua subsequente atividade antimicrobiana, seja por desestabilização da membrana, formação de poros, ou outros mecanismos de ação (Luo; Song, 2021). Estudos indicam que a curvatura da membrana também é relevante para a interação entre PAM e membranas. Alguns PAM são sensíveis a características dos lipídios além da carga. Por exemplo, as magaininas são mais eficazes em lipossomas de PG, comuns em membranas bacterianas, do que em lipossomas de PS, predominantes em membranas animais. PS e PG embora possuam carga liquída negativa, têm formas moleculares distintas, afetando suas propriedades de curvatura da membrana. O peptídeo polybia-MP1 causa mais vazamento em vesículas de PS devido à sinergia com outros componentes da membrana (Kumar; Kizhakkedathu; Straus, 2018). 34 Figura 3 - Interação de PAM catiônicos em membrana procariótica. Fonte: Modificado de Parchebafi et al., (2022). Embora o mecanismo de ação dos PAM tenha sido extensivamente estudado desde o seu descobrimento, ainda não está totalmente esclarecido, vários modelos foram propostos, sendo a maioria centrada na desestabilização da membrana fosfolipídica dos microrganismos. Diferentes modelos, como “barrell-stave”, poro toroidal ou “detergent-like”, tentam descrever a interação desses peptídeos com as membranas lipídicas (Lorenzón et al., 2018; 2019). Além disso os PAM também podem entrar no citoplasma através da penetração direta e endocitose da membrana plasmática. As atividades intracelulares dos peptídeos antimicrobianos são variadas, como ligação a ácidos nucléicos, inibindo a síntese de ácidos nucléicos e proteínas e afetando o ciclo celular. A compreensão desses mecanismos de ação podem favorecer a criação de novas moléculas antimicrobianas (Graf; Wilson, 2019). O modelo “barrell-stave”, (figura 4A) descreve como os peptídeos antimicrobianos se inserem perpendicularmente na membrana, formando uma estrutura similar a um barril. Os peptídeos agem como "aduelas" do barril, com suas 35 regiões hidrofóbicas interagindo com os lipídios da membrana e as regiões hidrofílicas voltadas para o interior do poro, formando um canal. Esse arranjo facilita o fluxo descontrolado de íons e pequenas moléculas, perturbando o potencial de membrana e levando à morte celular (Li et al., 2022; Lorenzón et al., 2019; Ramazi et al., 2022; Wimley et al., 2010). No modelo de poro toroidal (figura 4B), os peptídeos antimicrobianos interagem com as membranas celulares de maneira que induzem as moléculas de fosfolipídios da membrana a se curvarem em direção ao interior do poro. Diferente do modelo barrell-stave, no toroidal, os peptídeos e os lipídios compartilham a formação da parede do poro, mantendo os lipídios orientados de maneira que suas cabeças polares fiquem voltadas para o interior aquoso do poro e suas caudas hidrofóbicas em contato com as regiões hidrofóbicas dos peptídeos (Pandidan; Mechler, 2021; Sengupta et al., 2008; Wimley, 2010; Yeaman; Yount 2003). Outra abordagem, é o modelo "carpet-like" ou "detergent-like" (figura 4C), que sugere a permeabilização da membrana pela ação detergente dos peptídeos. Esse mecanismo envolve a agregação dos peptídeos na superfície da membrana, como um carpete e quando atinge um limiar de concentração, leva desestabilização das ligações de fosfolipídeos, e nisso a membrana é dissolvida de maneira semelhante à uma dispersão, sendo que a ruptura da membrana não envolve um processo de formação de canal (Huang et al., 2009; Li et al. 2022; Travkova; Moehwald; Brezesinski, 2017). A natureza desse mecanismo envolve a interação dos peptídeos com os grupos cabeça de lipídeos e não necessariamente interagem com o núcleo hidrofóbico da membrana (Huang et al. 2009). Um modelo alternativo à formação de poros é o modelo de poros transientes (figura 4D), que descreve a formação momentânea de poros na membrana celular pelos peptídeos, sem uma estrutura específica duradoura (Tossi; Gennaro, 2011). Esses poros permitem a rápida passagem de moléculas, resultando em perturbações temporárias no equilíbrio iônico e molecular da célula, capazes de desestabilizar as células-alvo, potencialmente levando à sua inibição ou morte, sem a necessidade de estabelecer estruturas permanentes ou estáveis na membrana (Huang, Chen; Lee, 2004; Matsuzaki, 1998; Scocchi; Tossi; Gennaro, 2011). Alguns PAM agregam-se à superfície da membrana e interagem com os lipídios, resultando na perda da potencial transmembrana e na formação de um canal temporário 36 (Scocchi; Tossi; Gennaro, 2011). Os PAM são então transportados para o interior das células, onde exercem sua função alvo. No modelo de Shai-Matsuzaki-Huang, os PAM anfifílicos inicialmente se ligam à superfície da membrana e, em seguida, se inserem na bicamada lipídica. A orientação do peptídeo muda de transversal para vertical, formando poros toroidais instantâneos (Nicolas, 2009). Este modelo sugere que um único peptídeo pode atravessar a bicamada lipídica horizontalmente sob estresse mecânico ou força elétrica (Jean-François et al., 2008). Nem todos os PAM têm como alvo a ruptura da membrana celular para matar a célula, alguns têm como alvos intracelulares (figura 4E). Os peptídeos antimicrobianos com ação intracelular interferem em processos vitais dentro das células bacterianas. Eles podem inibir a síntese de componentes essenciais como DNA e RNA, levando à sua morte ou incapacitação. A buforina II, derivado de histonas encontrado em sapos, é o exemplo de PAM que passa pela membrana da E. coli sem causar danos a ela e finalmente, se liga ao DNA e RNA bacteriano (Parchebafi et al., 2022). 37 Figura 4 - Mecanismos de ação de peptídeos antimicrobianos (A: Barrell-stave, B: poro toroidal, C: carpet like, D: poro transiente e E: intracelular). Fonte: Traduzido de Lorenzón, 2019. 1.5 Miotoxinas PLA2-LIKE Os venenos animais desempenham um importante papel de defesa e predação e são amplamente difundidas na natureza. Atualmente mais de 100.000 espécies de animais peçonhentos já foram identificadas no mundo e estima-se que cada uma delas seja capaz de produzir mais de 100 tipos de componentes diferentes em seus venenos. Os venenos são formados por misturas complexas de substâncias, dentre elas estão diversas moléculas bioativas como peptídeos, proteínas e enzimas que apresentam uma diversidade de propriedades de interesse científico, os quais podem ser estudados para obtenção de novos fármacos (El-Aziz et al., 2019). 38 As serpentes do gênero Bothrops (Família Viperidae) são responsáveis pela maioria dos acidentes ofídicos relatados na América Latina. A capacidade de causar danos teciduais proeminentes como inchaços, hemorragias e mionecroses são os principais problemas relacionados à mordida dessas serpentes, podendo resultar em sérias complicações para a vítima como amputação do membro acometido (Borges et al., 2021; Santos et al., 2011). No Brasil as serpentes da espécie Bothrops alternatus e Bothrops moojeni desempenham um papel de destaque nos casos de acidentes ofídicos (Mamede et al., 2016). As toxinas são importantes componentes encontrados nas peçonhas de serpentes, sendo as fosfolipases A2 (PLA2) uma das classes mais abundantes (Gutiérrez et al., 2008; Santos Filho et al., 2008). As PLA2s são classificadas em diversos grupos, dentre eles as que estão presentes na peçonha de serpentes pertencem a dois grupos que apesar de possuírem relação evolutiva, apresentam estruturas diferentes, sendo eles o grupo IA, da família Elapidae e o grupo IIA da família Viperidae; além disso, o segundo grupo pode ser dividido em diversos subgrupos diferenciados pelo resíduo de aminoácido encontrado na posição 49, sendo os mais comuns aqueles contendo aspartato (Asp49 PLA2) e os homólogos Lys49 PLA2 ou (PLA2-Like) que apresentam lisina na posição 49, sendo que o primeiro subgrupo apresenta atividade catalítica e o outro não (Lomonte; Ângulo; Moreno, 2010; Proléon et al., 2022; Simões-Silva, 2021). As PLA2 Asp49 catalisam a hidrólise da ligação éster sn-2 de fosfolipídios de membrana para gerar ácidos graxos e lisofosfolipídios em um mecanismo cálciodependente (Marinho et al., 2021). Embora as Lys49 PLA2 sejam enzimaticamente inativas, eles possuem uma série de atividades independentes de seu sítio catalítico, bem como atividades miotóxicas, antifúngicas e antibacterianas (Tonello et al., 2012). Várias PLA2-Like foram descritas, incluindo a miotoxina II (Mt-II) de Bothrops asper, bothropstoxina I (BthTX-I) de Bothrops jararacussu, AppK de Agkistrodon piscivorus piscivorus e a miotoxina de Agkistrodon contortrix laticinctus (ACL) (Gutiérrez; Ownby; Odell, 1984; Homsi-Brandburgo et al., 1988; Johnson; Ownby, 1993; Maraganore; Heinrikson, 1986). Diversos estudos foram feitos com peptídeos baseados na região C-terminal dessas proteínas, demonstrando serem capazes de replicar o potencial terapêutico 39 da molécula original. Pesquisas realizadas por Lomonte et al., 1994, com um peptídeo curto de 13 resíduos localizados entre os resíduos 115-129 da miotoxina II de Bothrops asper, a qual foi nomeado de p-MtII (KKYRYYLKPLCKK), demonstrou atividade antimicrobiana, sendo posteriormente proposto modificações na sequência desse peptídeo para otimizar essa molécula, dando origem a uma molécula nomeada de p-EM-2 (KKWRWWLALCKK) (Santamaria et al. 2005), a qual apresenta substituições dos resíduos de tirosina por triptofano e de prolina por alanina, a qual demonstrou ter maior atividade comparado a molécula original. Outra molécula de destaque é o peptídeo p-ACL (KKYKAYFKLKCKK) (Ambrósio et al., 2005), proveniente da Lys49 PLA2-Like da peçonha da serpente Agkistrodon contortrix laticinctus. Em estudo anterior, p-ACL e seu análogo p-AclR7 (sequência RRYRAYFRFRCRR), demonstraram potencial leishmanicida eficiente contra L. amazonensis e L. infantum chagasi. Embora seu mecanismo seja incerto, acredita-se dentre outras possibilidades que ocorra através de perturbações através de interações com a membrana (Mendes et al., 2019). A molécula p-AppK (KKYKAYFKFKCKK) proveniente da região C-terminal da miotoxina Lys49 PLA2-Like (AppK) de Agkistrodon piscivorus piscivorus também foi descrita na literatura como tendo atividade antimicrobiana, demonstrando efeito promissor em bactérias Gram-positivas e Gram-negativas. Além disso, foram relatadas outras atividades na literatura, como, por exemplo, antitumoral (Almeida et al., 2022). Um estudo utilizando p-ACL e p-Appk em células tumorais murinas e bactérias Gram-positivas e Gram-negativas, demonstrou que esses peptídeos apresentam atividade dupla. Neste estudo, percebeu-se também que p-ACL apresentou maior efetividade em comparação a p-Appk, sugerindo que a presença de fenilalanina na posição 9 do peptídeo pode conferir maiores vantagens aos mecanismos antitumoral e antibacteriano em relação a p-Appk (Almeida et al., 2022). Outro exemplo de molécula, é o peptídeo p-BthTX-I (sequência KKYRYHLKPFCKK) derivado da região C-terminal da bothropstoxina I, assim como o seu dímero ligado por dissulfeto (p-BthTX-I)2, o quais apresentaram atividade antimicrobiana contra cepas de bactérias Gram-positivas e Gram-negativas, incluindo bactérias multirresistentes (Santos Filho et al., 2015; 2017). 40 1.6 Peptídeo (p-BthTX-I)2 O estudo liderado por Santos Filho et al., 2015 com o peptídeo p-BthTX-I, derivado da região C-terminal da Botropstoxina I, revelou que a forma dímerica da molécula era fundamental para a atividade antimicrobiana, sendo inicialmente formada por ponte dissulfeto pelos resíduos de cisteína na posição 11. Tal estudo se deu através da síntese de peptídeos parentais e um peptídeo alternativo, a qual a substituição do resíduo de cisteína por serina acarretava perda da atividade da molécula. Posteriormente foi realizado estudos de degradação em soro e analise por espectrometria de massas a qual constataram que o subproduto formado rapidamente era um homodímero (p-BthTX-I)2. Esses estudos avaliaram a estabilidade das moléculas frente a proteases sanguíneas, demonstrando que os resíduos de lisina na posição 12 e 13 eram rapidamente degradados, não contribuindo para a atividade da molécula. Foi avaliado também a importância dos resíduos 1 e 2 visando a possibilidade de diminuição do peptídeo, para diminuir a suscetibilidade a proteases, revelando que os peptídeos sem os resíduos 1 e 2 apresentaram perda de atividade antimicrobiana, demonstrando que a região N- terminal é importante para a atribuição de carga a molécula (Santos Filho et al. 2017). Tendo em vista a importância da dimerização, em um estudo subsequente, foram propostos modelos alternativos os quais averiguaram o impacto da posição do ligante como ponto de ramificação. Assim foi sintetizado um homodímero formado na região N-Terminal usando um resíduo de ácido glutâmico [E(p-BthTX-I)2], o qual comprovou que os resíduos de lisina da extremidade N-terminal livre são fundamentais para a atividade antimicrobiana, devido a contribuição de carga para a molécula, já o homodímero formado através de uma lisina ao invés de cisteína e deleção dos resíduos 12 e 13, demonstrou ser igual ou mais ativo contra certas linhagens de bactérias em relação a molécula original, sendo essa a forma dimérica des-Cys11, Lys12, Lys13-(p-BthTX-I)2K, considerada mais promissora (Santos Filho et al. 2017; 2021; Bittencourt et al., 2023). 41 Um resumo desses análogos assim como a influência na atividade antimicrobiana é encontrado na figura 5. Figura 5 - Impacto na atividade antimicrobiana de análogos ao p-BthTX-I. Fonte: Traduzido de Santos Filho et al., 2021. Com base nos relatos sobre atividade antimicrobiana de alguns peptídeos catiônicos, o presente estudo visa avaliar se peptídeos sintéticos derivados da região C-terminal de miotoxinas PLA2-Like de peçonha de serpentes, podem apresentar proeminente atividade antimicrobiana, a partir das modificações propostas por Santos Filho et al., 2021, assim como comparar a atividade desses análogos entre si e entre a molécula modelo. A molécula modelo para a síntese dos análogos é [des-Cys11, Lys12, Lys13-(p-BthTXI)2K. 42 2 OBJETIVOS O presente trabalho tem como objetivos principais: Sintetizar análogos dos peptídeos MtII (Lomonte et al. 1994), p-EM-2 (Santamaria et al. 2005), p-ACL (Mendes et al. 2019) e p-AppK (Nunez; Ângulo; Lomonte, 2001), baseados na estrutura do peptídeo (p-BhTX-I)2. Para tanto, serão executadas as seguintes etapas: A) Sintetizar os peptídeos: - [des-Cys11, Lys12, Lys13 -(MtII)2K] – sequência (KKYRYYLKPL)2K; - [des-Ala11, Lys12, Lys13 -(p-EM-2)2K] – sequência (KKWRWWLKAL)2K; - [des-Cys11, Lys12, Lys13 -(AppK)2K] – sequência (KKYKAYFKLK)2K; - [des-Cys11, Lys12, Lys13 -(ACL)2K] – sequência (KKYKAYFKFK)2K; B) Purificar os peptídeos por sistema HPLC (CLAE); C) Caracterizar por espectrometria de massas; D) Caracterizar o conteúdo de estrutura secundária por espectroscopia de dicroísmo circular (CD); E) Avaliar o potencial antimicrobiano em bactérias Gram-positivas, bactérias Gram- negativas e Fungos; F) Determinar a concentração inibitória mínima (CIM) e concentração bactericida mínima (CBM); G) Determinar a atividade hemolítica; H) Estudar o mecanismo de ação em solução contendo miméticos de membranas; I) Avaliar a estabilidade desses peptídeos no soro humano. 43 3 MATERIAIS E METÓDOS 3.1 Síntese de peptídeos em fase sólida (SPFS) A ligação peptídica é uma reação de condensação entre o grupo N-terminal de um aminoácido com o grupo C-terminal de outro aminoácido (Figura 6) (Nelson; Cox, 2019. Figura 6 - Ligação peptídica. Fonte: Elaborado pelo autor (2024). A síntese em fase sólida surgiu na década de 1960, com Robert Bruce Merrifield (Merrifield et al, 1964). A técnica de síntese de peptídeos em fase sólida (SPFS) consiste no crescimento da cadeia peptídica, aminoácido por aminoácido, partindo de sua porção carboxi-terminal, a qual está firmemente unida a um suporte polimérico (resina). A construção do peptídeo se dá mediante o avanço da cadeia peptídica da extremidade carboxi-terminal para a extremidade N-terminal. A eliminação de subprodutos de reação e reagentes em excesso em cada fase é conduzida por meio de filtração e lavagem (Merrifield, 1963; (Tickler; Wade, 2007). Foram desenvolvidas duas abordagens principais para a SPFS: a química da tert-butiloxicarbonila (Boc) e a da 9-fluorenilmetiloxicarboxila (Fmoc). A estratégia Boc requer a utilização de TFA para a remoção da proteção do grupo Boc e fluoreto de hidrogênio para a clivagem. Essa estratégia utiliza ácidos fortes a cada processo de desproteção, aumentando a periculosidade, necessitando de equipamentos mais sofisticados, já na segunda abordagem, emprega-se o grupo base lábil Fmoc, que 44 utiliza soluções de piperidina ou 4-metil-piperidina para remover o grupo protetor do α-amino (Fmoc), e TFA na fase final para a clivagem do peptídeo da resina e a desproteção das cadeias laterais. Tanto no método Boc quanto Fmoc, os grupos carboxila livres dos aminoácidos a serem acoplados são ativados com agentes acilantes, como por exemplo o diisopropilcarbodiimida (DIC), com ou sem a presença de hidroxibenzotriazol (HOBt), para acelerar a reação (El-Faham; Albericio, 2011). Atualmente, a maioria dos peptídeos sintéticos são preparados através da síntese de peptídeos em fase sólida Fmoc (SPFS), devido à sua facilidade de execução, segurança e à eliminação da necessidade de fluoreto de hidrogênio (HF), além da possibilidade de automação (Sheppard, 2003). O Fmoc SPFS foi prontamente automatizado devido à ausência do TFA corrosivo nos ciclos sintéticos e à liberação de um grupo fluoreno com forte absorção UV durante a desproteção, o que proporcionou um indicador confiável do êxito da síntese (Seco; Sheppard, 1986). Estratégias de dimerização tem sido apontada por vários autores para a modificação dos peptídeos visando aumentar a estabilidade e atividade de biomoléculas, como por exemplo os PAM (Willing et al., 2007). Uma das técnicas atualmente adotadas se baseia na utilização de uma lisina Fmoc-Lys(Fmoc)-OH como ponto de ramificação, por apresentar 2 grupos amino, sendo um localizado na cadeia principal (α-amino) e outro na cadeia lateral do aminoácido de lisina (ε- amino). Após a desproteção dos grupos protetores Fmoc por base, os grupamentos amino ficam livres para o acoplamento do próximo resíduo de aminoácido, sendo que um se ligará no (α-amino) e o outro no (ε-amino), formando, portanto, um homodímero (Lorenzón, et al., 2019). Tal técnica apresenta vantagens sobre a dimerização por ligações dissulfetos, dentre essas vantagens, estão a facilidade de obtenção, pois para dimerização por ligações dissulfeto, o peptídeo precisa ser oxidado ao ar, sendo que esse processo reduz de forma significativa o rendimento da síntese de peptídeo (Santos Filho, et al., 2021). Os peptídeos foram obtidos por síntese de peptídeos em fase sólida (SPFS) (Merrifield, 1963), utilizado o protocolo de química Fluorenilmetiloxicarboxil (Fmoc). Para a síntese de todos os peptídeos, foi utilizada a resina Rink amida com grau de substituição de 0,678 mmol.g-1 com escala 0,2 mmol e com 2x de excesso 45 para a ancoragem do primeiro aminoácido e 4x de excesso para o acoplamento do segundo aminoácido em diante, devido à proporção de sítios reativos dos grupos amino (α e ε) do primeiro resíduo de lisina. O método de acoplamento utilizado para todos os acoplamentos foi N-hidroxibenzotriazol (HOBt) + N,N- diisopropilcarbodiimida (DIC) dissolvidos em dimetilformamida (DMF), com agitação por pelo menos 2 horas. A desproteção do grupo protetor Fmoc foi realizada utilizando solução de 20% de 4-metil-piperidina em DMF por 1 minuto e 20 minutos. Para verificação do sucesso de acoplamento e desproteção foi utilizado o teste de ninidrina, a qual apresenta mudança de coloração na presença de grupamentos α-amino livres, mudando a cor da solução de amarelo para azul (maioria dos aminoácidos) (Figura 7) ou castanho como é o caso da prolina (Kaiser et al., 1970). Figura 7 - Etapas de acoplamento e desproteção na SPFS. Fonte: Elaborado pelo autor (2024). 46 Após a síntese, todas as peptidil-resinas foram submetidas a um processo de clivagem em meio ácido para remoção da resina ligada ao grupo C-terminal do peptídeo e dos grupos protetores de cadeia lateral. A solução foi composta por 95% de ácido TFA, 2,5% de TIS e 2,5% de água destilada, a qual foi deixado sobre agitação durante 2 horas, após a clivagem em meio ácido, os peptídeos foram precipitados em éter etílico anidro gelado, passando por etapas de sonicação, vórtex e centrifugação, onde o sobrenadante foi recolhido e descartado. Posteriormente o precipitado resultante foi submetido a uma solução de extração contendo 70% de solução A (0,045% de TFA em 1 L de água destilada) e 30% de solução B (0,036% de TFA em 1 L de acetonitrila), passando novamente pelas etapas de sonicação, vórtex e centrifugação, sendo dessa vez recolhido o sobrenadante compondo o peptídeo bruto a qual foi liofilizado e armazenado para o próximo processo. A tabela 1 resume os programas utilizados na purificação de cada peptídeo. Tabela 1 – Programas usados para purificação dos peptídeos por CLAE. Peptídeos Sequência Purificação dos peptídeos (p-MtII)2K (KKYRYYLKPL)2K 5-60% de solução B em 120 minutos (p-EM-2)2K (KKWRWWLKAL)2K 20-60% solução B em 120 minutos (p-ACL)2K (KKYKAYFKFK)2K 10-60% solução B em 120 minutos (p-AppK)2K (KKYKAYFKLK)2K 15-45% solução B em 120 minutos Fonte: Elaborado pelo autor (2024). 47 3.2 Purificação e caracterização dos peptídeos por cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC/CLAE) Os peptídeos sintetizados foram purificados por cromatografia líquida de alta eficiência (CLAE) em cromatógrafo Shimadzu em modo semipreparativo em coluna de fase reversa C18 (Phenomenex 2,1 x 25 cm). O grau de pureza das frações foi determinado em um cromatógrafo Shimadzu, em uma coluna analítica (0,46 x 25 cm) de fase reversa C18 (Kromassil) em um gradiente de 5-95% de solução B em 30 min, com fluxo de 1 mL.min-1. As soluções utilizadas para a purificação e verificação do teor de pureza dos peptídeos foram 0,045% de TFA em ultrapura (solução A) e 0,036% de TFA em acetonitrila (solução B). Após a purificação de cada peptídeo, os tubos coletados foram analisados novamente por CLAE com coluna analítica (0,46 x 25 cm) de fase reversa C18 para análise de pureza dos tubos coletados, a qual foram reunidas apenas amostras que apresentaram pureza superior a 95%. 3.3 Espectrometria de massas Os espectros de massas foram obtidos em um espectrômetro de massas LCQ FLEET ThermoScientific, com injeção direta, em modo de detecção positiva, localizado no Instituto de Química de Araraquara - UNESP, no Departamento de Bioquímica e Química Orgânica. 3.4 Alinhamento múltiplo O Alinhamento múltiplo foi realizado através do software Clustal Omega, utilizando as sequências encontradas no artigo de Lomonte; Ângulo; Moreno (2010). Sendo elas: p-MtII (KKYRYYLKPLCKK), p-BthTX-I (KKYRYHLKPFCKK), p-EM-2p (KKWRWWLKALCKK), p-ACL (KKYKAYFKFKCKK) e p-AppK (KKYKAYFKLKCKK) 48 3.5 Dicroísmo circular A técnica de dicroísmo circular (CD) avalia a absorção diferencial dos componentes polarizados circularmente à esquerda e à direita da radiação polarizada do plano. Isso ocorre quando um cromóforo é quiral (opticamente ativo) devido à sua estrutura, ligação covalente a um centro quiral ou ambiente assimétrico. O CD é importante na investigação de estruturas peptídicas porque permite determinar a estrutura secundária de proteínas, fornecendo informações sobre a conformação de peptídeos e proteínas (Kelly; Price, 2000). Para avaliar o conteúdo de estrutura secundária dos peptídeos foi utilizado a técnica de espectroscopia de dicroísmo circular (CD) em espectropolarímetro Jasco J-715. Os espectros de CD foram obtidos em solução tampão fosfato-salino (PBS) pH: 7,4 , solução de trifluoroetanol (TFE) 60% e em solução de lisofosfatidilcolina (LPC) 5 mM. A figura 8 ilustra as etapas da obtenção de dados referentes a técnica de CD. Figura 8 - Etapas do dicroísmo circular. Fonte: Elaborado pelo autor. 49 3.6 Atividade antimicrobiana 3.6.1 Atividade antibacteriana Os peptídeos foram encaminhados para o Laboratório de Epidemiologia e Microbiologia Molecular (LEMiMo) do IFSC-USP localizado na cidade de São Carlos- SP para avaliação da atividade contra cepas bacterianas. A moléculas foram testadas contra 9 linhagens bacterianas, sendo elas, S. epidermidis ATCC 35984, S. aureus ATCC 25923, S. aureus ATCC 8095, E. faecalis ATCC 29212, E. faecium ATCC 700221, K. pneumoniae ATCC 700603, E. coli ATCC 25922, A. bauamannii ATCC 19606 e P. aeruginosa ATCC 27853. Para realização dos ensaios, cada amostra de peptídeo foi diluída em DMSO e preparada uma solução estoque 100x concentrada e posteriormente diluída na proporção de 1:100 em caldo Muller Hinton Cátion Ajustado (MHCA) (BD) segundo o CLSI (2013). A partir disso, cada composto foi testado em 512 μg.mL-1 a 1 % DMSO, ou na maior concentração em que foi possível dissolver o composto sem que houvesse precipitação. Dos poços do composto a 512 μg.mL-1 partiram as diluições seriadas (1:2) até a concentração de 0,06 μg.mL-1. Após o término do tempo de incubação, foi realizado a leitura visual, a qual foi observado a concentração inibitória mínima (CIM). Para o controle positivo de crescimento foi utilizado caldo MHCA 1% de DMSO, sendo adicionado bactéria sem o peptídeo, para observar o crescimento normal da bactéria e no controle negativo foi adicionado apenas o caldo MHCA a 1 % de DMSO, sem bactéria, para mostrar que não houve contaminação do meio. Todos os testes foram realizados em duplicata. Após a leitura visual da CIM, foi inoculado 100 µL do conteúdo dos poços equivalentes ao CIM, 2x CIM e 1/2 CIM, em uma placa de MHCA-Ágar por técnica de microgota, sem estriar, a placa foi incubada em estufa por 24 horas a uma temperatura de 37ºC, sendo posteriormente feito uma leitura visual para determinação da atividade bactericida ou bacteriostática. As amostras que obtiveram CBM/CIM menor ou igual a 4 foram considerados bactericidas bacteriostáticas (Pankey; Sabath, 2004). 50 3.6.2 Atividade antifúngica Para o ensaio de atividade antifúngica utilizou-se duas linhagens de Candida albicans, sendo elas, Candida albicans ATCC 90028 suscetivel à fluconazol e Candida albicans ATCC 96901, com resistência à fluconazol. Ambas linhagens seguiram com a mesma metodologia sendo armazenadas a -80°C; YNB/50% de glicerol, descongeladas e plaqueadas em meio de cultura Sabouraud Dextrose Agar (SDA; Acumedia Manufacturers Inc., Lansing, MI, EUA) contendo 0,05 mg/mL de cloranfenicol. Após incubação a 37°C durante 48 h, cinco colônias foram transferidas para meio YNB contendo 100 mM de glicose (YNBg) e incubadas a 37°C durante a noite (16 h). Em seguida, a suspensão fúngica foi diluída 1:20 em meio YNBg fresco e incubada a 37°C até atingir a fase mid-log de crescimento, confirmado por densidade óptica a 540 nm (OD540; Bioespectro SP 220 Equipar Ltda, Curitiba, PR, Brasil). A concentração inibitória mínima (CIM) e a concentração fungicida mínima (CFM) de cada peptídeo foram avaliadas pelo método de microdiluição, com base nas recomendações do Clinical and Laboratory Standards Institute (CLSI, M27-A3) e do European Committee for Antimicrobial Susceptibility Testing. (EUCAST), com algumas modificações. Resumidamente, cada peptídeo foi diluído em série (concentrações finais de 512; 256; 128; 64; 32; 16; 8; 4; 2; 1; 0.5; 0,25; 0,125; 0,0625 μg/ml) e depois transferidos para placas de microtitulação com fundo em U de 96 poços (TPP Techno Plastic Products, Trasadingen, Suíça). Em seguida, a suspensão fúngica foi diluída em YNBg em 10 3 UFC/mL e 100 μL foram adicionados a cada poço a uma concentração final de 0,5–2,5 × 10 3 UFC/mL. Suspensões fúngicas foram utilizadas como controles sem antifúngico, peptídeos em YNBg sem suspensão fúngica foram utilizados como controles para condições estéreis e apenas YNBg foi utilizado como branco. Fluconazol foi utilizado como controle positivo. As placas foram incubadas a 37°C por 24 h, e a DO540 foi determinada antes e depois da incubação em espectrofotômetro (leitor de microplacas FLUOstar Omega; BMG Labtech GmbH, Offenburg, Alemanha). Foi escolhida uma temperatura de 37◦C, em vez de 35 ◦C conforme recomendado pelo CLSI, para 51 consistência com a temperatura corporal humana. A CIM foi identificada visualmente e por absorbância como sendo a menor concentração do peptídeo que não causou turvação a olho nu e aumento no valor da DO após a incubação. Após a leitura da CIM, inoculou-se 10 μL do conteúdo do poço equivalente a CIM, uma diluição abaixo e duas acima, em placa de SDA por técnica de microgota. As placas foram incubadas a 37°C por 48 h para verificar o crescimento das colônias (CFM). Foram realizadas duas ocasiões em duplicata e o resultado foi expresso pela média e desvio padrão. 3.7 Degradação em soro Os ensaios de estabilidade peptídica foram realizados em plasma diluído conforme descrito por Santos Filho et al. (2017) com pequenas modificações. Primeiro, 2 mL de plasma humano a 25% foram centrifugados a 3.000 x g por 10 min; o sobrenadante foi coletado e incubado por 15 min a 37 ◦C. Para realização do ensaio, foi utilizado 100 µL de cada peptídeo + 100 µL de soro sendo adicionado ao final de cada tempo 100 µL de solução de etanol 96% para precipitação sendo centrifugado a 3000 rpm por 2 min e em seguida, foram coletados 150 µL de amostras em horários diferentes durante os ensaios, que foram realizados em duplicata. As análises foram realizadas por e HPLC em coluna de fase reversa em modo analítico em método de 5-95% de acetonitrila em água por 30 minutos. Os tempos avaliados foram de 0 h, 1 h, 4 h, 12 h e 24 h. Para o controle do plasma foi utilizado 100 µL de soro + 100 µL de PBS + 100 µL de solução de etanol P.A%, e para o controle das amostras foi utilizado 100 µL dos peptídeos + 100 µL de PBS + 100 µL de solução de etanol P.A%. 52 3.8 Vazamento de carboxifluoresceína 3.8.1 Preparação do filme lipídico Para a formação de filme lipídico foram utilizadas duas composições lipídicas diferentes, sendo a primeira composta apenas pelo lipídio 1-palmitoil-2-oleoil-sn- glicero-3-fosfocolina (POPC) 15 mM e a segunda composta por POPC 12 mM + de 1-palmitoil-2-oleoil-sn-glicero-3-fosfo-(10-rac-glicerol) (POPG) 3 mM, na proporção de 80% POPC: 20% POPG. Para fazer a suspensão dos lipídios foi utilizado uma solução de clorofórmio em metanol respectivamente na proporção 1:4, sendo evaporado por N2 e mantido por 12 horas sobre vácuo para eliminação de solventes. 3.8.2 Preparação de LUVs A preparação de vesículas unilameres grandes (LUVs) seguiu os procedimentos descritos por Bittencourt et al., (2023). Após a obtenção do filme lipídico, este foi diluído em uma solução de 80 mM de carboxifluoresceína em tampão Tris-HCl, iniciando-se um ciclo de etapas que envolveram vortexação, aquecimento a 60ºC e sonicação durante o período de 1 h, sendo 10 minutos para cada etapa. Após realizado o ciclo de etapas, obteve-se vesículas multilamelares. Realizou-se a extrusão das vesículas multilamelares através de um extrusor da marca Avanti, com filtro de membranas de 0,1 µm de diâmetro a qual foram efetuados 40 ciclos de extrusão, obtendo-se, portanto, vesículas unilamelares grandes. Após a obtenção das LUVs, foi realizado um processo de separação por cromatografia de exclusão com resina Sephadex G-10-120 para separar a carboxifluoresceína excedente no meio. 53 3.8.3 Liberação de CF A permeabilização das vesículas lipídicas contendo carboxifluoresceína foi realizada utilizando espectrofluorimetro modelo Jasco FP-8250. As composições lipidicas utilizadas foram 1-palmitoil-2-oleoil-sn-glicero-3-fosfocolina (POPC) e POPC 80% + 20% de 1-palmitoil-2-oleoil-sn-glicero-3-fosfo-(10-rac-glicerol) (POPG). A quantificação de intensidade de fluorescência foi realizada após a adição da amostra no período de 3 minutos e 15 segundos e foi utilizado solução de Triton X- 100 1%, sendo adicionado no período de 8 minutos e 55 segundos para o rompimento de 100% das vesículas. Para construção dos gráficos de liberação de carboxifluoresceína foi utilizado a seguinte equação abaixo: % liberação = (F medido – F inicial) / (F final – F inicial) × 100, Onde F final é o valor médio de fluorescência obtido após a adição de Triton, F inicial é a média dos valores iniciais da corrida antes da adição do peptídeo, e F medido são os valores de fluorescência obtidos em cada ponto do experimento. 3.9 Atividade Hemolítica A atividade hemolítica de cada peptídeo foi realizada de acordo com os procedimentos experimentais descritos por Santos Filho et al. (2015) com modificações. Os eritrócitos utilizados foram lavados 3 vezes com tampão fosfato salino (PBS) com pH 7,4 a 500 g por 5 minutos. Os eritrócitos obtidos foram diluídos na proporção de 1/25 em PBS. Foi utilizado uma concentração inicial de 512 µg.mL-1 de peptídeos, sendo realizado em seguida, diluições em serie até obter a concentração final de 1 µg.mL-1. Para realização da determinação de 100% de hemólise, foi utilizado Triton X-100 a 1% (v/v). Após 1 hora de incubação em temperatura de 37°C, as amostras foram centrifugadas a 500 g durante 5 minutos. Alíquotas de 80 µL de sobrenadante foram 54 transferidas para a microplaca e a leitura foi realizada na faixa de emissão de comprimento de onda de 540 nm. A % de hemólise foi realizada utilizando a seguinte equação: % de hemólise = (A amostra – A PBS) x 100 (A Triton – A PBS) A utilização de sangue humano seguiu com aprovação do conselho de ética, parecer n° 4.253.480, sob o projeto “Síntese, caracterização e estudos de diferentes peptídeos bioativos”. 55 4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.1 Alinhamento múltiplo As PLA2-Like provenientes de peçonha de serpente, tem sido descritas na literatura a várias décadas, desprovidas de atividade catalítica, inicialmente foram investigadas pelo seu potencial miotóxico a qual atribui-se ao chamado sitio farmacológico, localizado na região C-terminal dessa classe de proteínas. Desde então muitas PLA2-Like foram identificadas e caracterizadas em relação a atividade miotóxica, dentre elas, a miotoxina II (Mt-II) originaria de Bothrops asper (Gutiérrez et al., 1984), Bothropstoxina I (BthTX-I) encontrada em Bothrops jararacussu (Homsi-Brandeburgo et al., 1988), a miotoxina ACL encontrada na peçotnha de Agkistrodon contortrix lactinctus (Johnson; Ownby, 1993) e AppK da peçonha de Agkistrodon piscivorus piscivorus (Maraganore; Heinekson, 1986). Além da atividade miotóxica, outras atividades biológicas já foram relatadas nessa classe de miotoxinas, como por exemplo, atividade antibacteriana, antifúngica, antiprotozoária e antitumoral (Almeida et al., 2018; Almeida et al., 2022; Lomonte; Ângulo; Moreno, 2010; Mendes et al., 2019; Santamaria et al., 2005). Diversos estudos foram feitos com peptídeos baseados na região C-terminal dessas proteínas, demonstrando serem capazes de replicar o potencial terapêutico da molécula original. Pesquisas realizadas por Lomonte et al 1994, com um peptídeo curto de 13 resíduos localizados entre os resíduos 115-129 da miotoxina II de Bothrops asper, a qual foi nomeado de p-MtII, demonstrou atividade antimicrobiana, sendo posteriormente proposto modificações na sequência desse peptídeo para otimizar essa molécula, dando origem a uma molécula nomeada de p-EM-2 (Santamaria et al. 2005), a qual apresenta substituições dos resíduos de tirosina por triptofano e de prolina por alanina, a qual demonstrou ter maior atividade comparado a molécula original. Diversos estudos foram realizados com o peptídeo p-ACL, comprovando desde atividade antimicrobiana, como também atividade antitumoral (Almeida et al., 2022), assim como atividade antileishmania (Mendes et al., 2019). Atividades antimicrobianas também são relatadas para o peptídeo p-AppK (Mendes et al., 56 2022). A sequência C-terminal das PLA2-Like, de origem de peçonhas de serpente possuem alta semelhança estrutural, apresentando resíduos altamente conservados, como resíduos catiônicos e hidrofóbicos. Para analisar essa semelhança, foi realizado um alinhamento múltiplo, conforme mostrado pelo quadro 1. Quadro 1 - Alinhamento Múltiplo. |p-ACL| KKYKAYFKFKCKK 13 |p-AppK| KKYKAYFKLKCKK 13 |p-EM-2| KKWRWWLKALCKK 13 |p-BthTX-I| KKYRYHLKPFCKK 13 |p-MtII| KKYRYYLKPLCKK 13 **::..:*..*** Um asterisco (*) indica posições com um único resíduo totalmente conservado. Dois pontos (:) indicam conservação entre grupos de propriedades fortemente semelhantes, aproximadamente equivalente a pontuação > 0,5 na matriz Gonnet PAM 250. Um ponto (.) indica conservação entre grupos de propriedades fracamente semelhantes, aproximadamente equivalente a pontuação =< 0,5 e > 0 na matriz Gonnet PAM 250. Como observado no quadro 1, as sequências apresentam grupos altamente conservados, tais como os resíduos de lisinas na extremidade N-terminal e C- terminal. Os estudos realizados por Santos Filho et al. 2017 e 2021 com (p-BthTX-I) demonstraram que as lisinas da posição 12 e 13 eram alvo de ação por protéases, que degradavam a extremidade C-terminal, gerando como produto uma molécula com atividade antimicrobiana semelhante à molécula original. Também foi avaliado a importância dos resíduos de lisina na posição 1 e 2 e o peptídeo sintetizado sem esses resíduos sofreu uma perda significativa na atividade antimicrobiana, indicando que a carga positiva dessa região é de grande importância, assim como é possível observar a importância de resíduos positivos nas posições 4 e 8 e resíduos aromáticos na posição 3, características mantidas por todas as sequências representadas no quadro 1. Outro resíduo altamente conservado nas sequências foi a cisteína na posição 11. No estudo realizado por Santos Filho et al., 2015, foi observado que a dimerização do peptídeo (p-BthTX-I) através do resíduo de cisteína na posição 11, 57 formando o peptídeo (p-BthTX-I)2 era importante para a atividade da molécula, tal característica pode explicar a conservação desse resíduo na região C-terminal de PLA2-Like de peçonha de serpentes ao longo do processo evolutivo. Visando a importância da dimerização para a atividade antimicrobiana da molécula que inicialmente envolvia a oxidação dos resíduos de cisteína, formando pontes dissulfeto para a molécula (p-BthTX-I), outros estudos propuseram a dimerização através de formas alternativas, Santos Filho et al., 2021 dimerizou a região N-terminal através de um resíduo ácido glutâmico, levando posteriormente a oxidação da cisteína na posição 13 de (p-BthTX-I), formando o peptídeo cíclico E(p- BthTX-I)2, o qual obteve perda da atividade antimicrobiana, demonstrando a importância da região N-terminal livre para contribuição de carga para a molécula. Outro estudo realizado por Santos Filho et al., 2021, propôs uma estratégia alternativa ao processo de dimerização a qual consiste em substituir a cisteína por uma lisina como ponto de ramificação para a formação de um homodímero, deletando os resíduos 12 e 13, uma vez visto que pela ação de protéases, são rapidamente degradados. Tais modificações demonstraram em certos casos, melhor desempenho contra algumas linhagens de microrganismos em relação a molécula original, sendo também mais fácil de ser obtida por necessitar de menos etapas para a síntese do peptídeo. As semelhanças estruturais dessas sequências, assim como as características que elas compartilham levantam a hipótese da possibilidade das modificações anteriormente propostas por Santos Filho et al., 2021 para o peptídeo p-BthTX-I terem influência na otimização dos demais peptídeos alvos desse estudo. 4.2 Síntese de peptídeos O processo de síntese de peptídeos em fase sólida (SPFS) foi realizado com sucesso, seguindo como modelo o peptídeo (p-BthTX-I)2K descrito por Santos Filho et al. 2021. Para a dimerização foi utilizando como ligante o aminoácido Fmoc- Lys-(Fmoc)-OH, a qual a desproteção gerou duas regiões amino livres (α-amino e ε- amino) e a resina Rink amida com intuito de obter uma região C-terminal amidada para não interferir na carga da molécula. 58 Para facilitar a discussão, os peptídeos foram nomeados como (p-MtII)2K, (p-EM-2)2K, (p-ACL)2K e (p-AppK)2K. A sequência proposta para as moléculas, assim como os nomes e análogos correspondentes estão representados no quadro 2. Quadro 2 - Sequência dos peptídeos. Codígo Peptídeo derivado Sequência (p-BthTX-I)2K p-BthTX-I KKYRYHLKPF \ K / KKYRYHLKPF (p-MtII)2K p-MtII KKYRYYLKPL \ K / KKYRYYLKPL (p-EM)2K p-EM-2 KKWRWWLKAL \ K / KKWRWWLKAL (p-ACL)2K p-ACL KKYKAYFKFK \ K / KKYKAYFKFK (p-AppK)2K p-AppK KKYKAYFKLK \ K / KKYKAYFKLK Fonte: Elaborado pelo autor (2024). 59 O pI (ponto isoelétrico) foi calculado para cada peptídeo assim como a carga líquida (tabela 2). Tabela 2 - Ponto isoelétrico (pI) e carga líquida dos peptídeos (p-MtII)2K, (p-EM-2)2K, (p- ACL)2K; (p-AppK)2K. Nome pI teórico Carga líquida (p-MtII)2K 10,2 10+ (p-EM-2)2K 12,05 10+ (p-ACL)2K 10,3 12+ (p-AppK)2K 10,3 12+ Fonte: Elaborado pelo autor (2024). Os peptídeos antimicrobianos deste estudo exibem variações significativas em seus pontos isoelétricos teóricos (pI) e cargas líquidas a pH 7,4. O peptídeo (p- MtII)2K possui um pI teórico de 10,2, resultando em uma carga líquida positiva de +10, o mesmo ocorrendo com o peptídeo (p-EM-2)2K, que possui um pI teórico de 12,05. Já os peptídeos (p-ACL)2K e (p-AppK)2K compartilham um pI teórico de 10,3, apresentando uma carga líquida ainda mais positiva de +12 para ambos. A carga líquida positiva é um dos pilares para o mecanismo de ação dos PAM, sendo crucial para ancoragem dos peptídeos a membranas bacterianas que são carregadas negativamente, permitindo uma vantagem em termos de seletividade (Luo; Song, 2021). Os perfis cromatográficos obtidos dos peptídeos brutos e puros podem ser observados nas figuras 9 a 12. 60 A) B) 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 A b s o rb â n c ia ( 2 2 0 n m ) Tempo (min) (p-MtII) 2 K- Bruto 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 A b s o rb â n c ia ( 2 2 0 n m ) Tempo (min) (p-MtII) 2 K-Puro Figura 9 - Perfil cromatográfico do peptídeo (p-MtII)2K bruto (A) e puro (B). Fonte: Elaborado pelo autor (2024). A) B) 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 A b s o rb â n c ia ( 2 2 0 n m ) Tempo (min) (p-EM-2) 2 K - Bruto 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 A b s o rb â n c ia ( 2 2 0 n m ) Tempo (min) (p-EM-2) 2 K- Puro Figura 10 - Perfil cromatográfico do peptídeo (p-EM-2)2K bruto (A) e puro (B). Fonte: Elaborado pelo autor (2024). A) B) 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 A b s o rb â n c ia ( 2 2 0 n m ) Tempo (min) (p-ACL) 2 K - Bruto 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 A b so rb â n ci a ( 2 2 0 n m ) Tempo (min) (p-ACL) 2 K - Puro Figura 11 - Perfil cromatográfico do peptídeo (p-ACL)2K bruto (A) e puro (B). Fonte: Elaborado pelo autor (2024). 10,3 min. 10,3 min. 13,2 min. 13,2 min. 7,8 min. 7,8 min. 61 A) B) 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 A b s o rb a n c e (2 2 0 n m ) Time (min) (p-Appk) 2 K 0 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 1,4 1,6 A b s o rb â n c ia ( 2 2 0 n m ) Tempo (min) (p-AppK) 2 - Puro Figura 12 - Perfil cromatográfico do peptídeo (p-AppK)2K bruto (A) e puro (B). Fonte: Elaborado pelo autor (2024). A Figura 9A mostra o perfil cromatográfico do peptídeo (p-MtII)2K com tempo de retenção de aproximadamente 10,3 minutos e pureza de 74,89% para o pico majoritário em uma corrida de 5-95% de solução B em 30 minutos. Os demais picos observados no cromatograma podem ser considerados contaminantes derivados de reações de acoplamento ou desproteções malsucedidas durante o processo de síntese de peptídeos em fase sólida. O método utilizado para purificação foi escolhido com base no tempo de retenção observado no cromatograma mostrado na Figura 9A, no qual o pico majoritário possui tempo de retenção de 10,3 minutos em um gradiente linear de 5-95% de solução B em 30 minutos, ou seja, ocorrendo uma variação de 3% de solução B por minuto, indicando que a eluição da amostra de interesse pode ocorrer em cerca de 31,10% de solução B, portanto foi escolhido o método com um gradiente de 5-60% de solução B em 120 minutos. O perfil cromatográfico do peptídeo bruto (p-EM-2)2K em gradiente de 5-95% de solução B em 30 minutos (figura 10A), o tempo de retenção do pico majoritário analisado foi de cerca de 13,2 minutos com pureza de 58,30%, seguindo o mesmo procedimento usado para o peptídeo anterior, a escolha do método necessário para realização da etapa de purificação foi de 20-60 % de solução B em 120 minutos. Na Figura 11A, é mostrado o perfil cromatográfico da amostra bruta (p- ACL)2K, com tempo de retenção de aproximadamente 7,8 minutos e pureza de 42,56% para o pico majoritário. O método utilizado para realização da etapa de purificação foi de 10-60% de solução B em 120 minutos. Seguindo os mesmos passos, a Figura 12A mostra o perfil cromatográfico do peptídeo bruto (p-AppK)2K, 9,4 min. 9,4 min. 62 com tempo de retenção de aproximadamente 9,4 minutos e pureza de 85,21% para o pico majoritário. O método utilizado para realização da etapa de purificação foi de 15-40% de solução B em 120 minutos. Nota-se que (p-EM-2)2K demonstrou maior apolaridade, com tempo de retenção de aproximadamente 13,0 minutos, isso se deve ao fato de apresentar mais resíduos apolares em sua sequência, constituindo cerca de 50% dos resíduos, diferenciando-se dos demais que apresentam cerca de 30% de resíduos apolares. Os tempos de retenção e pureza dos peptídeos puros são resumidos na tabela 3. Tabela 3 - Tempo de retenção (T.R) e pureza dos peptídeos (p-MtII)2K, (p-EM-2)2K, (p- ACL)2K e (p-AppK)2K. Peptídeo T.R (min) Pureza (%) (p-MtII)2K 10,3 95,77 (p-EM-2)2K 13,3 98,35 (p-ACL)2K 7,8 97,44 (p-AppK)2K 9,4 98,35 Fonte: Elaborado pelo autor (2024). Os espectros de massa correspondentes às frações puras, são mostrados nas figuras 13 a 16. 63 Figura 13 - Espectro de massas do peptídeo puro (p-MtII)2K. Fonte: Elaborado pelo autor (2024). Figura 14 - Espectro de massas do peptídeo puro (p-EM-2)2K. Fonte: Elaborado pelo autor (2024). 64 Figura 15 - Espectro de massas do peptídeo bruto (p-ACL)2K. Fonte: Elaborado pelo autor (2024). Figura 16 - Espectro de massas do peptídeo bruto (p-AppK)2K. Fonte: Elaborado pelo autor (2024). A obtenção das amostras puras de interesse (figuras 9B, 10B, 11B e 12B) foram confirmadas pelos espectros de massas conforme as figuras 13 a 16. 8+ 352,43 65 A confirmação da molécula de interesse foi realizada aplicando a relação de razão massa/carga para cada íon observado. De acordo com o espectro de massas do peptídeo (p-MtII)2K puro (figura 13), a massa molecular teórica da molécula, e com base nos cálculos da razão massa/carga (m/z), considerando que a massa teórica do peptídeo é de 2852,51 g.mol-1 , os resultados mostrados na Figura 13 são correspondentes aos íons 3+ (951,83), 4+ (714,12), 5+ (571,50), 6+ (476,42) e +7 (408,50), esses dados confirmaram que a síntese e purificação do peptídeo de interesse foi realizada com sucesso. O mesmo procedimento para confirmação das demais moléculas foram os mesmos. De acordo com o espectro de massas de (p-EM)2K (Figura 14), e com a razão massa/carga (m/z) do peptídeo, considerando a massa molecular teórica do peptídeo sendo 2938,65 g.mol-1, a amostra analisada corresponde aos íons 4+ (735,72), 5+ (588,73), 6+ (490,76), 7+ (420,77) e 8+ (368,33). Para (p-ACL)2K, a razão massa/carga (m/z) do peptídeo, sendo a massa igual a 2810,47 g.mol-1, então os resultados mostrados na Figura 15 correspondem aos íons 4+ (703,42), 5+ (562,92), 6+ (469,28), 7+ (402,37) e 8+ (352,43). Com base na razão massa/carga (m/z) do peptídeo (p-AppK)2K e a massa molecular do peptídeo sendo de 2742,44 g.mol-1, os resultados mostrados na Figura 16 correspondem aos íons 2+ (1372,22), 3+ (915,147), 4+ (686,61) e 6+ (458,07), confirmando a obtenção bemsucedida do último peptídeo de interesse. A presença de seis triptofanos na sequência de (p-EM)2K pode contribuir para o perfil com ruídos observado na análise de espectrometria de massas devido à sua fotossensibilidade. A preparação e manipulação das amostras podem expor os triptofanos à luz, induzindo a formação de espécies reativas de oxigênio (EROs), como ânions superóxido e oxigênio singlete (Igarashi; Onaue; Tsuda, 2007). Essas EROs causam fotodegradação, formando múltiplos produtos de degradação resultando em picos menores como observado na figura 14. 66 4.3 Atividade antimicrobiana 4.3.1 Atividade antibacteriana O dímero (p-BthTX-I)2K foi testado por Santos Filho et al., 2021 contra todas as linhagens deste estudo, com exceção apenas de S. aureus ATCC 8095. O peptídeo demonstrou atividade mais fraca contra P. aeruginosa ATCC 27853, tendo atividade em concentrações maiores que 512 mg.L-1. Os melhores desempenhos de CIM e CBM pa