UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE MEDICINA VETERINÁRIA E ZOOTECNIA EXPOSIÇÃO PERINATAL AO PRAGUICIDA FIPRONIL EM RATOS WISTAR – ESTUDO DE EFEITOS TOXICOLÓGICOS SOBRE A GERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DA PROLE FRANCISCO PIZZOLATO MONTANHA Botucatu - SP 2015 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE MEDICINA VETERINÁRIA E ZOOTECNIA EXPOSIÇÃO PERINATAL AO PRAGUICIDA FIPRONIL EM RATOS WISTAR – ESTUDO DE EFEITOS TOXICOLÓGICOS SOBRE A GERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DA PROLE FRANCISCO PIZZOLATO MONTANHA Tese apresentada junto ao Programa de Pós-Graduação em Medicina Veterinária para obtenção do título de Doutor Orientadora: Profª. Drª. Noeme Sousa Rocha Co-Orientador: Prof. Dr. Antonio Francisco Godinho ii Nome do Autor: Francisco Pizzolato Montanha Título: EXPOSIÇÃO PERINATAL AO PRAGUICIDA FIPRONIL EM RATOS WISTAR – ESTUDO DE EFEITOS TOXICOLÓGICOS SOBRE A GERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DA PROLE COMISSÃO EXAMINADORA Profª. Drª. Noeme Sousa Rocha Presidente e Orientadora Departamento de Clínica Veterinária FMVZ – UNESP – Botucatu Prof. Dr. Julio Lopes Sequeira Membro Departamento de Clínica Veterinária FMVZ – UNESP – Botucatu Prof. Dr. Simone Biagio Chiacchio Membro Departamento de Clínica Veterinária FMVZ – UNESP – Botucatu Profª. Drª Claudia Turra Pimpão Membro Departamento de Farmacologia Veterinária Escola de Ciências Agrárias e Medicina Veterinária – Pontifícia Universidade Católica do Paraná - PUCPR – Curitiba-PR Profª. Drª. Rosa Maria Barilli Nogueira Membro Departamento de Clínica Médica de Pequenos Animais Universidade do Oeste Paulista - UNOESTE – Presidente Prudente-SP Data da Defesa: 30 de Junho de 2015. iii DEDICATÓRIA À minha esposa que sempre me apoiou e que, durante a realização deste estudo, foi paciente e compreensiva com a minha ausência. iv AGRADECIMENTO À Deus, por estar sempre presente em minha vida. Por me dar força para lutar. Sem Ele, não sou nada! “O Senhor é o meu pastor, nada me faltará!” À minha orientadora Noeme Sousa Rocha, pelos ensinamentos, pelas conversas e conselhos, pela confiança depositada em mim e pela atenção que teve para realização deste estudo. Ao meu co-orientador Antonio Francisco Godinho, por toda a dedicação com o projeto. Pela sua paciência para ensinar, pela força de vontade em ajudar, por vivenciar todos os momentos junto com a equipe. Pela amizade que permanecerá! Tenho grande admiração e respeito por você! À minha esposa Mariana Barbosa Nardelli Montanha! Só nós sabemos o quanto foi difícil e tudo o que passamos para que eu pudesse concluir o doutorado. Obrigado por ser tão especial! Você é um exemplo para mim! Aos meus pais, Aliceu Montanha Junior e Maria Margareth Pizzolato Montanha; irmãos, Lúcia Pizzolato Montanha, Aliceo Montanha Neto e Antonio Pizzolato Montanha; e sobrinhos, Maria Fernanda, Victor e Isabella. Não há palavras para agradecer e expressar o meu amor por vocês! São muito importantes para mim! Aos meus sogros, Silvio Nardelli e Fatima Barbosa Nardelli; cunhados, Lincoln Andrade, Leticia Ribeiro (Bia), Dayane Teixeira e Luiz Barbosa Nardelli; e a toda minha família e amigos que sempre me apoiaram. Pelas palavras de estímulo que me ajudaram a seguir em frente. Aos amigos, Alaor Almeida, Caique Faria, Faber Machado, Fábio Anselmo, Fábio Silva, Hélio, Isamery M. Sarmiento, João Chaguri, Juliano Ottoni, Maria Valéria M. Dalanezi, Raquel B. Ferioli, Roberto Fernandez, Rômulo F. Estangari Lot, Sarah Setznagl, Tália M. Tremori, Tatiany Silveira e Thiago Gianeti, que também se dedicaram para a concretização deste estudo. Vocês foram fundamentais para colocar em prática o que antes era só um projeto. Com vocês, cada momento se tornou mais fácil e prazeroso. Obrigado! Aos membros da lista da banca examinadora, Antonio Francisco Godinho, Bruno Cogliati, Claudia Turra Pimpão, Daisy Pontes Netto, Julio Lopes Sequeira, Lucia Helena O`Dwyer de Oliveira, Noeme Sousa Rocha, Roberto Calderon Gonçalves, Rosa Maria Barilli Nogueira e Simone Biagio Chiacchio, pelo tempo dedicado com a correção da tese, o que contribuiu muito para melhorar o meu trabalho. Meu respeito aos animais usados para realização deste estudo! v LISTA DE TABELAS Capítulo 1. TABELA 1. Classificação toxicológica dos agrotóxicos................................ 9 Capítulo 2. TABELA 1. Dosagem do fipronil e fipronil sulftona no cérebro..................... 58 Capítulo 3. TABELA 1-A. Alterações histopatológicas no cérebro da prole jovem......... 78 TABELA 1-B. Alterações histopatológicas no cérebro da prole adulta........ 78 Capítulo 4. TABELA 1. Dosagem do fipronil e fipronil sulfona no cérebro...................... 95 Capítulo 5. TABELA 1-A. Alterações histopatológicas no fígado de ratos jovens.......... 113 TABELA 1-B. Alterações histopatológicas no fígado de ratos adultos......... 113 vi LISTA DE FIGURAS Capítulo 1. FIGURA 1. Estrutura química do fipronil....................................................... 5 FIGURA 2. Pesagem dos filhotes................................................................. 25 FIGURA 3. Aparecimento de pelos............................................................... 25 FIGURA 4. Erupção dos dentes incisivos..................................................... 25 FIGURA 5. Descolamento de orelha............................................................. 26 FIGURA 6. Abertura dos olhos...................................................................... 26 FIGURA 7. Descida dos testículos................................................................ 26 FIGURA 8. Reflexo de preensão palmar....................................................... 27 FIGURA 9. Reflexo postural/endireitamento................................................. 27 FIGURA 10. Reflexo geotaxia negativa........................................................ 27 FIGURA 11. Reconhecimento de Novo Objeto............................................. 30 FIGURA 12. Labirinto Octogonal................................................................... 31 FIGURA 13. Arena de Campo Aberto........................................................... 32 FIGURA 14. Labirinto em Cruz Elevado....................................................... 33 FIGURA 15. Hole-Board................................................................................ 34 Capítulo 2. FIGURA 1. Número de entradas nos braços abertos – Jovens.................... 54 FIGURA 2. Tempo de permanência nos braços abertos – Jovens............... 54 FIGURA 3. Tempo de permanência nos braços abertos – Adultos.............. 55 FIGURA 4. Tempo de permanência nos braços fechados – Jovens............ 55 FIGURA 5. Tempo de permanência nos braços fechados – Adultos............ 56 FIGURA 6. Tempo de latência para primeiro ataque.................................... 56 FIGURA 7. Número total de ataques............................................................ 57 FIGURA 8. Dosagem do cortisol sérico – Jovens......................................... 57 Capítulo 3. FIGURA 1. Índice de reconhecimento de novo objeto – memória a longo prazo na prole jovem.................................................................. 75 vii FIGURA 2. Índice de reconhecimento de novo objeto – memória a curto prazo na prole adulta.................................................................. 75 FIGURA 3. Índice de reconhecimento de novo objeto – memória a longo prazo na prole adulta.................................................................. 76 FIGURA 4. Tempo para encontrar alimento.................................................. 76 FIGURA 5. Número de visitas à braços incorretos....................................... 77 FIGURA 6. Número de revisitações à braços incorretos.............................. 77 FIGURA 7. Dosagem da acetilcolinesterase na prole adulta........................ 78 FIGURA 8. Congestão vascular cerebral...................................................... 79 FIGURA 9. Edema cerebral.......................................................................... 79 FIGURA 10. Satelitose.................................................................................. 80 FIGURA 11. Vacuolização............................................................................ 80 Capítulo 4. FIGURA 1. Número de enfiadas de patas – Jovens..................................... 94 FIGURA 2. Número de enfiadas de patas – Adultos..................................... 94 Capítulo 5. FIGURA 1. Ganho de peso dos filhotes de ratas expostas ao fipronil.......... 109 FIGURA 2. Número de dias para a erupção dos dentes incisivos................ 109 FIGURA 3. Relação peso órgão/animal: fígado............................................ 110 FIGURA 4. Dosagem do cortisol sérico........................................................ 110 FIGURA 5. Congestão vascular no fígado.................................................... 111 FIGURA 6. Degeneração hidrópica no fígado............................................... 111 FIGURA 7. Infiltrado linfocítico no fígado...................................................... 112 FIGURA 8. Degeneração gordurosa no fígado............................................. 112 viii ABREVIAÇÕES % Porcentagem > Maior < Menor ® Registrado °C Grau célsius µg Micrograma µg/g Micrograma por grama ACA Arena de Campo Aberto ACh Acetilcolina AChE Acetilcolinesterase ALP Fosfatase alcalina ALT Alanina aminotransferase AST Aspartato aminotransferase CEUA Comissão de Ética no Uso de Animais Cl- Cloreto CL50 Concentração letal 50 DDT Dicloro-difenil-tricloroetano DL50 Dose letal 50 DPN Dias pós-nascimento EPA Agência de proteção ambiental EPM Erro Padrão Médio EUA Estados Unidos da América FMVZ Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia g Grama g L-1 Gramas por litro g mol-1 Gramas de um mol GABA Ácido gama amino butírico GGT Gama glutamiltransferase HB Hole-Board HPA Hipotálamo-Pituitária-Adrenal ia/ha Ingrediente ativo por hectare ix IP Intraperitoneal IRENOb Índice de reconhecimento de novo objeto LCE Labirinto em cruz elevado LDH Lactato desidrogenase LO Labirinto octogonal MCP Memória a curto prazo MCPJ Memória a curto prazo em jovens MCPA Memória a curo prazo em adultos MLP Memória a longo prazo MLPJ Memória a longo prazo em jovens MLPA Memória a longo prazo em adultos mg/Kg Miligramas por quilograma mg/Kg/d Miligramas por quilograma por dia mg/L Miligramas por litro mL Mililitro n Número NCP Núcleos Cerebelares Profundos pH Potencial hidrogeniônico ppm Parte por milhão 1ppm 1 mg/L RNOb Reconhecimento de novo objeto rpm Rotações por minuto SDH Sorbitol desidrogenase SINDIVEG Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal SNC Sistema nervoso central t Tonelada T½ Tempo de meia vida UNESP Universidade Estadual Paulista USA United States of América USEPA United States Environmental Protection Agency (Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos) x SUMÁRIO Página CAPÍTULO 1. EXPOSIÇÃO PERINATAL AO PRAGUICIDA FIPRONIL EM RATOS WISTAR – ESTUDO DE EFEITOS TOXICOLÓGICOS SOBRE A GERAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DA PROLE. Resumo........................................................................................................ xiii Abstract........................................................................................................ xiv 1. INTRODUÇÃO.................................................................................... 1 2. REVISÃO DE LITERATURA............................................................... 2 2.1 Praguicidas.............................................................................. 2 2.1.1 Fipronil.......................................................................... 4 2.1.1.1 Toxicocinética do fipronil.................................... 10 2.1.1.2 Toxicodinâmica do fipronil................................. 12 2.1.1.3 Efeitos toxicológicos do fipronil.......................... 14 2.2 Toxicologia do desenvolvimento.............................................. 16 2.3 Biomarcadores e bioindicadores.............................................. 23 2.3.1 Desenvolvimento físico e sensório-motor..................... 24 2.3.2 Avaliação neurocomportamental.................................. 28 2.3.3 Perfil bioquímico........................................................... 34 2.3.3.1 Acetilcolinesterase............................................. 35 2.3.3.2 Perfil hepático.................................................... 35 2.3.3.3 Cortisol............................................................... 36 2.3.4 Avaliação histopatológica............................................. 36 CAPÍTULO 2. EXPOSIÇÃO PERINATAL AO FIPRONIL PROVOCA SUSCEPTIBILIDADE AUMENTADA DE EFEITOS COMPORTAMENTAIS AGRESSIVOS E DE ANSIEDADE EM FILHOTES MACHOS DE RATOS. Resumo................................................................................................... 38 Abstract................................................................................................... 38 1. INTRODUÇÃO.................................................................................. 39 2. MATERIAIS E MÉTODOS................................................................ 41 2.1 Animais.................................................................................... 41 2.2 Procedimento experimental..................................................... 41 2.3 Avaliação do comportamento.................................................. 42 2.4 Análises bioquímica e cromatográfica..................................... 43 2.5 Análise estatística dos resultados........................................... 44 3. RESULTADOS.................................................................................. 44 4. DISCUSSÃO..................................................................................... 45 REFERÊNCIAS..................................................................................... 50 xi CAPÍTULO 3. COMPORTAMENTO DE MEMÓRIA DIMINUIDO EM FILHOTES DE RATOS EXPOSTOS AO PRAGUICIDA FIPRONIL NO PERÍODO PERINATAL. Resumo................................................................................................... 59 Abstract................................................................................................... 59 1. INTRODUÇÃO.................................................................................. 60 2. MATERIAIS E MÉTODOS................................................................ 62 2.1 Animais................................................................................... 62 2.2 Procedimento experimental.................................................... 62 2.3 Avaliação de comportamento.................................................. 63 2.4 Testes bioquímico e histopatológico....................................... 65 2.5 Análise estatística dos resultados........................................... 65 3. RESULTADOS.................................................................................. 66 4. DISCUSSÃO..................................................................................... 67 5. CONCLUSÃO.................................................................................... 71 REFERÊNCIAS.................................................................................... 72 CAPÍTULO 4. COORDENAÇÃO MOTORA AFETADA POR FIPRONIL EM FILHOTES DE RATAS EXPOSTAS AO PRAGUICIDA. Resumo................................................................................................... 81 Abstract................................................................................................... 81 1. INTRODUÇÃO E OBJETIVO............................................................ 82 2. MATERIAIS E MÉTODOS................................................................ 84 2.1 Animais................................................................................... 84 2.2 Procedimento experimental.................................................... 85 2.3 Avaliação de comportamento.................................................. 85 2.4 Dosagem do fipronil................................................................ 86 2.5 Análise estatística dos resultados........................................... 86 3. RESULTADOS.................................................................................. 87 4. DISCUSSÃO..................................................................................... 87 REFERÊNCIAS..................................................................................... 90 CAPÍTULO 5. PARÂMETROS DO DESENVOLVIMENTO DE FILHOTES DE RATAS EXPOSTAS AO PRAGUICIDA FIPRONIL NO PERÍODO PERINATAL. Resumo................................................................................................... 96 Abstract................................................................................................... 96 1. INTRODUÇÃO.................................................................................. 97 2. MATERIAL E MÉTODOS.................................................................. 98 2.1 Animais................................................................................... 99 2.2 Procedimento experimental.................................................... 99 2.3 Desenvolvimento físico e sensório-motor............................... 100 2.4 Comportamento...................................................................... 100 xii 2.5 Relação peso órgão/animal.................................................... 101 2.6 Análises bioquímicas.............................................................. 101 2.7 Avaliação histopatológica........................................................ 101 2.8 Análise estatística dos resultados........................................... 101 3. RESULTADOS.................................................................................. 101 Mães............................................................................................. 101 Filhotes.......................................................................................... 102 Desenvolvimento físico e sensório-motor................................. 102 Comportamento........................................................................ 102 Relação peso órgão/animal...................................................... 102 Avaliação bioquímica................................................................ 102 Avaliação histopatológica.......................................................... 103 4. DISCUSSÃO..................................................................................... 103 REFERÊNCIAS..................................................................................... 106 CAPÍTULO 6. 3. DISCUSSÃO GERAL.......................................................................... 114 4. CONCLUSÃO GERAL........................................................................ 116 5. BIBLIOGRAFIA................................................................................... 117 6. ANEXOS............................................................................................. 126 xiii MONTANHA, F.P. Exposição perinatal ao praguicida fipronil em ratos Wistar – estudo de efeitos toxicológicos sobre a geração e o desenvolvimento da prole. Botucatu, 2015. 151p. Tese (Doutorado) – Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Campus de Botucatu, Universidade Estadual Paulista. RESUMO O presente estudo teve o objetivo de avaliar os efeitos toxicológicos em ratos Wistar expostos ao fipronil no período perinatal. Os animais utilizados foram adquiridos do Biotério Central da UNESP, campus de Botucatu e os testes foram realizados em seus descendentes. Foi avaliado o desenvolvimento físico e sensório-motor e aplicados testes de comportamento, como a Arena de Campo aberto, para avaliar atividade geral; o Labirinto em Cruz Elevado, para avaliação do comportamento de ansiedade; o Hole-Board, para coordenação motora; os testes Reconhecimento de Novo Objeto e Labirinto Octogonal, para avaliar memória cognitiva e espacial, respectivamente; e o teste de agressividade, de acordo com o paradigma do animal residente/intruso. Por espectrofotometria, foram dosados os níveis de Acetilcolinesterase, de Cortisol, de Alanina Aminotransferase e de Aspartato Aminotransferase, e quantificado, através de análise cromatográfica, o fipronil e seus metabólitos nos cérebros dos ratos. Fragmentos dos órgãos cérebro e fígado foram coletados e avaliados por técnica de histopatologia. De acordo com os resultados obtidos, o fipronil alterou o desenvolvimento físico, aumentou a ansiedade e agressividade, prejudicou a memória e a coordenação motora, induziu aumento na atividade da enzima acetilcolinesterase, causou alterações histopatológicas no cérebro e fígado dos animais. O fipronil é considerado tóxico para o sistema nevoso central e fígado de ratos, jovens e adultos, expostos ao praguicida no período perinatal. Palavras-chave: Comportamento animal, Fenilpirazól, Histopatologia, Marcadores bioquímicos, Pesticidas. xiv MONTANHA, F.P. Perinatal exposure of Wistar rats to fipronil - toxicological effects on the generation and development of offsprings. Botucatu, 2015. 151p. Tese (Doutorado) – Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Campus de Botucatu, Universidade Estadual Paulista. ABSTRACT This study aimed to evaluate the toxicological effects in rats Wistar exposed to fipronil in the perinatal period. The animals used were acquired from the Biotério Central of UNESP, Botucatu and the tests were performed on their offspring. Were evaluated the physical and sensory-motor development and applied behavioral tests, such as the Open Field test, to assess general activity; the Plus Maze Elevated to assess the anxiety behavior; Hole-Board for motor coordination; tests Recognition New Object and Octagonal Labyrinth, to assess cognitive and spatial memory, respectively; and Aggressivity test, according to the resident/intruder animal paradigm. Were measured levels of Acetylcholinesterase, Cortisol, Alanine aminotransferase and Aspartate aminotransferase by spectrophotometry, and quantified fipronil and metabolites in the brains of rats, by chromatographic analysis. Fragments of organs as brain and liver were collected and evaluated by histopathology technique. According to the results, fipronil alter the physical development, increased anxiety and aggression, impaired memory and motor coordination, induced increase in the Acetylcholinesterase activity, caused histological changes in the brain and liver of these animals. Fipronil is considered toxic to the central nervous system and liver of rats, young and adults, exposed to pesticide in the perinatal period. Key words: Behavior animal, Biological markers, Phenylpyrazole chemical family, Pathology, Pesticides. 1 1. INTRODUÇÃO Toxicologia é a ciência que estuda os efeitos nocivos decorrentes da interação das substâncias químicas e agentes físicos com o organismo. A Toxicologia Veterinária é uma área do conhecimento que vem despertando grande interesse no meio científico (SPINOSA e SCHWARZ, 2008). O estudo dos efeitos nocivos causados por agentes tóxicos em seus descendentes pode ser definido como toxicologia do desenvolvimento (GÓRNIAK et al., 2008). Praguicidas são amplamente utilizados para controlar insetos e pragas agrícolas que causam danos à saúde pública. Surtos de intoxicações com inseticidas têm sido relatados, ocorrendo entre animais e humanos, geralmente por exposição direta ou indireta através dos alimentos ou água contaminados por esses produtos químicos (GILL e DUMKA, 2013). Fipronil é um praguicida derivado quimicamente da família do fenilpirazol (MANDAL et al., 2014). As características do fipronil, como amplo espectro de ação sobre os insetos e praticamente atóxico para minhocas e diversas espécies de mariscos aquáticos, permitiu um aumento no uso deste inseticida, tanto no uso doméstico como na agricultura (AAJOUD et al., 2003). No entanto, o fipronil é altamente tóxico para peixes e pássaros e moderadamente tóxico para pequenos mamíferos. Dessa forma, desenvolveu- se grande preocupação com a toxicidade do fipronil nos animais (AMARAL, 2012), uma vez que, impactos não intencionais dos praguicidas sobre organismos não-alvos têm sido amplamente registrados (GIBBONS et al., 2014). A exposição de fêmeas a praguicidas durante a fase reprodutiva pode levar à alterações físicas no feto e posteriormente, à alterações comportamentais na prole. As consequências da exposição durante o desenvolvimento perinatal são alvo de preocupação porque os organismos jovens podem ser mais susceptíveis ao efeito desses produtos (CASTRO, 2006a). Diante disto, este estudo teve como objetivo estudar em ratos Wistar, efeitos toxicológicos da exposição in útero e lactacional ao fipronil, avaliando a geração e o desenvolvimento físico, sensório-motor e neurocomportamental da prole, e alterações morfológicas e bioquímicas. 2 2. REVISÃO DE LITERATURA 2.1 Praguicidas Praguicida, denominação utilizada para designar um grupo de agentes químicos tóxicos (POPPENGA e OEHME, 2010), também conhecidos por nomes como agrotóxicos e defensivos agrícolas, são substâncias ou misturas de substâncias que tem como objetivo prevenir, destruir ou combater qualquer tipo de praga presente em cultivo agrícola (AMARAL, 2012). São frequentemente utilizados no meio agropecuário para controlar uma variedade de insetos e pragas, e nos animais, por via tópica ou oral, no controle de parasitas (POPPENGA e OEHME, 2010). Praga (do latim plaga) refere-se a tudo aquilo que ataca, lesa ou transmite enfermidade às plantas, aos animais e ao homem, como ervas daninhas, fungos, insetos, carrapatos, aracnídeos ou qualquer outra forma de vida vegetal ou animal considerada danosa à saúde e ao bem-estar do homem, à lavoura, à pecuária e aos seus produtos e matérias-primas alimentares (SPINOSA e XAVIER, 2008). Já o termo praguicida (a terminação latina cida significa matar) refere-se à substância química, natural ou sintética, empregada para matar, repelir ou mitigar as pragas (SPINOSA e XAVIER, 2008). O termo xenobiótico (ksénos = estranho; bio = vida) é empregado para indicar qualquer substância estranha ao organismo, qualitativa ou quantitativamente, não indicando, necessariamente, que provoca efeito nocivo. Quando o xenobiótico, por alguma razão (por exemplo, concentração excessiva), provoca algum efeito nocivo, ele é considerado também um toxicante ou agente tóxico. Porém, nem todo xenobiótico é um toxicante (SPINOSA e SCHWARZ, 2008). Os praguicidas são amplamente utilizados na agricultura, com a finalidade de aumentar a produtividade agrícola e auxiliar no controle de vetores de várias doenças. Porém, seu uso excessivo e desordenado vem provocando diversos danos para o meio ambiente, como a contaminação das águas, solos e alimentos, e consequentemente trazendo intoxicações e doenças ao homem e animais (AMARAL, 2012). 3 O emprego de praguicidas trouxe grandes benefícios para a produção de alimentos e para a saúde humana e animal desde o início de sua utilização pela humanidade. Tanto que, ainda hoje, não é possível suspender a utilização desses agentes (SPINOSA e XAVIER, 2008). As primeiras substâncias utilizadas como praguicidas foram agentes tóxicos de origem natural, tais como nicotina, piretro, além de substâncias inorgânicas como o mercúrio e o enxofre. O uso de praguicidas mais modernos teve seu início por volta de 1940, quando Paul Müller descobriu o inseticida dicloro-difenil-tricloroetano (DDT). O DDT era muito eficaz, transformando-se rapidamente no praguicida mais utilizado no mundo. Entretanto, na década de 1960, descobriu-se que o DDT provocava danos à saúde de diversas espécies de aves, prejudicando sua reprodução e oferecendo grandes riscos à biodiversidade (AMARAL, 2012). Muitas são as substâncias químicas conhecidas em todo o mundo, cerca de onze milhões, das quais três mil são produzidas em larga escala. Anualmente, toneladas de substâncias sintéticas e naturais são lançadas no meio ambiente (UDO, 2012). No Brasil, de acordo com o Sindicato Nacional da Indústria de Produtos para Defesa Vegetal (SINDIVEG), no ano de 2013 houve um consumo de 235.133 toneladas (t) de inseticidas, 487.743t de herbicidas, 102.973t de fungicidas e 11.481t de acaricidas (SINDIVEG, 2014). Surtos de intoxicações com inseticidas têm sido relatados, ocorrendo entre animais e humanos, geralmente por exposição direta aos praguicidas ou indiretamente através dos alimentos ou água contaminados por esses produtos químicos (GILL e DUMKA, 2013). Por isso, os praguicidas despertam grande interesse dentro da toxicologia (SPINOSA e XAVIER, 2008). Os praguicidas podem exercer seus efeitos sobre organismos, quer diretamente ou indiretamente (UDO, 2012). Os efeitos diretos podem ocorrer através da ingestão de um produto formulado quando, por exemplo, uma ave se alimenta de uma semente tratada com inseticida ou através da absorção pela pele após um evento de pulverização ou ainda, pela ingestão de presas contaminadas (GIBBONS et al., 2014). Quando se menciona a ação indireta, se refere aos efeitos em organismos não alvos e ações não esperadas, como, por exemplo, o impacto no aumento 4 da mortalidade de besouros, mudanças nos padrões alimentares de garças e mudanças na aprendizagem e memória, e consequentemente no comportamento, em abelhas produtoras de mel. Ainda, o homem pode ser exposto indiretamente, ao consumir leite de vacas alimentadas com sementes tratadas (UDO, 2012). Nenhum praguicida é totalmente seguro, por isso, quando utilizado adequadamente, apresenta o potencial de exercer efeitos nocivos sobre a vida selvagem, solo e microflora, organismos aquáticos e sobre a saúde humana e animal, uma vez que parte dessa substância pode atingir e ser nociva para outros organismos não-alvo (SPINOSA e XAVIER, 2008). Praguicidas utilizados anteriormente, por exemplo, organoclorados, organofosforados e piretróides, foram substituídos mais recentemente por outros compostos, conhecidos como inseticidas de segunda geração, que trazem uma promessa de serem mais eficientes e seletivos no controle de pragas. Como exemplo, temos os derivados dos fenilpirazóis, cujo uso em organismos alvos provou ser eficiente, porém, pouco se sabe ainda sobre seus efeitos nos organismos não-alvos ou sobre o meio ambiente (FERREIRA, 2010; FERREIRA et al., 2012, 2012a). 2.1.1 Fipronil Fipronil, C12H4Cl2F6N4OS - Figura 1 (ANVISA, 2005), cujo nome químico é 5-amino-1-[2,6-dicloro-4-(trifluormetil) fenil]-4-[(trifluorometil) sulfinil]-1H-pirazol- 3-carbonitrila (MANDAL et al., 2014), e de sinonímia – MB 46030 (UDO, 2012), é uma substância sintética relativamente recente no mercado (FERREIRA, 2010; GILL e DUMKA, 2013). É um praguicida derivado quimicamente da família do fenilpirazol (WILDE et al., 2001) ou fiproles (TERÇARIOL, 2007; UDO, 2012) e foi o primeiro praguicida deste grupo químico (IKEDA et al., 2001; SILVA, 2008). Recentemente, foi designado pela Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos (United States Environmental Protection Agency – USEPA) como de 2ª geração (WILDE et al., 2001; SILVA, 2008; MARTINS, 2009; UDO et al., 2014). 5 FIGURA 1. Estrutura química do fipronil. Fonte: MANDAL et al., 2014. Possui amplo espectro de ação (GILL e DUMKA, 2013), é extremamente ativo (TANG et al., 2004; AMARAL, 2012) e altamente eficaz (ZHAO et al., 2005; GILL e DUMKA, 2013), mesmo aplicado em baixas doses (UDO, 2012). É classificado como inseticida, formicida e cupinicida (ANVISA, 2005). Foi descoberto e sintetizado a primeira vez pela transnacional Rhône-Poulenc Agro em 1987 (CID, 2012; MANDAL et al., 2014), conhecida, atualmente, como Bayer CropScience (GUNASEKARA et al., 2007), introduzido no mercado em 1993 (TINGLE et al., 2003; UDO et al., 2014) e registrado como um praguicida nos Estados Unidos da América em maio de 1996 (JACKSON et al., 2009; CID, 2012) pela USEPA (UDO, 2012). O fipronil, em sua forma pura, é um pó branco, com massa molar de 437 g mol-1 (TINGLE et al., 2003; AMARAL, 2012) com odor de bolor (TINGLE et al., 2003). Apresenta ponto de fusão de 195,5 a 203°C, sua solubilidade de 0,0024 g L-1 em água no pH 5,0 e 0,0022 g L-1 no pH 9,0, sendo altamente solúvel em solventes orgânicos (545,9 g L-1 em acetona) (AMARAL, 2012). Desde o seu desenvolvimento, este inseticida se tornou referência para utilização nos programas de controle de insetos em diferentes regiões do mundo, principalmente pela sua ampla eficácia, com resultados satisfatórios sobre uma gama de pragas em culturas, consideradas importantes economicamente (ZHAO e SALGADO, 2010), na higiene pública e sobre pragas na Medicina Veterinária (LI e AKK, 2008; FERREIRA, 2010). Devido sua eficiência no combate a ectoparasitas, a utilização do fipronil dentro da medicina veterinária aumenta em escala global, visto que ao ser 6 administrado topicamente, apresenta excelente ação terapêutica e sua atividade é persistente no combate a pulgas e carrapatos de cães e gatos domésticos (FERREIRA, 2010). Pode ser aplicado em doses muito baixas para conseguir o controle efetivo de pragas (TINGLE et al., 2003). O fipronil é conhecido em mais de 70 países e utilizado em mais de 100 diferentes tipos de culturas para o controle de pragas (ZHAO e SALGADO, 2010; AMARAL, 2012). Foi introduzido na Europa e nos Estados Unidos em meados de 1990 (LI e AKK, 2008) e autorizado para comercialização na França em 1994 (BICHON et al., 2008), porém, por causa de sua possível implicação na mortalidade de abelhas, desde 2004, a sua utilização como produto fitossanitário foi suspensa neste país (OLIVEIRA, 2010). Nos Estados Unidos, o fipronil não é registrado para uso na agricultura no estado da Califórnia (GUNASEKARA et al., 2007). Também teve seu uso proibido nos demais países da Europa pelo alto grau de toxicidade, comprovado pelos problemas sérios registrados em organismos expostos (OLIVEIRA, 2010). No entanto, em alguns países não europeus, continua a ser um dos ectoparasiticidas mais utilizados para animais de estimação na medicina veterinária (LACROIX et al., 2010; ZHAO e SALGADO, 2010). No Brasil, o uso do fipronil é proibido somente nas lavouras de soja (OLIVEIRA, 2010). Até o momento, existem poucas avaliações de toxicidade do fipronil em organismos não-alvos (LACROIX et al., 2010). A utilização incorreta do fipronil causa sérias preocupações, pois no Brasil existem áreas totais sendo pulverizadas, não havendo preocupação com possíveis contaminações e prejuízos aos ecossistemas. Há registros sobre redução do número de abelhas em várias partes do país. A sua utilização deve ser bem pesquisada com o objetivo de determinar os reais riscos apresentados ao ambiente (AMARAL, 2012). Comercialmente, no Brasil, o fipronil pode ser encontrado como Frontline®, Fiprolex®, Topline®, de uso veterinário, para administração em cães, felinos e bovinos, podendo ou não estar associado a outras moléculas, como por exemplo, o metopreno. O fipronil de uso agrícola é comercializado como Blitz®, Klap® e Regent® (MARTINS, 2009). 7 Está disponível sob forma de “spot-on” (Frontline® Top Spot e Fiprolex® Drop Spot) e sob a forma de spray (Frontline® Spray). Também está disponível em associação com metopreno sob a forma de “spot-on” (Frontline® Plus Top Spot). Para aplicação em bovinos estão disponíveis duas formulações: uma na forma de “pour-on” (Topline®) com indicação contra carrapato (Rhipicephalus (Boophilus) microplus), mosca do chifre (Haematobia irritans) e berne (Dermatobia hominis) e outra na forma de spray (Topline® Spray) com indicação para o tratamento preventivo ou curativo de miíases (Cochliomya hominivorax) (CID, 2012). O fipronil é utilizado numa vasta gama de formulações e cada uma deve ser considerada separadamente na determinação e quantificação de riscos ambientais (TINGLE et al., 2003). As formulações do fipronil no Brasil são variadas, indo desde iscas atrativas para o controle de formigas (Blitz®) até sprays utilizados no controle de carrapatos e pulgas (Frontline® e Top Spot®), além do controle de pragas da raiz do milho e do gorgulho aquático do arroz (Klap®) e também no controle de insetos e pragas na cultura de cana de açúcar (Regent® 800 WG), podendo ser empregado desde doses baixas até altas (AMARAL, 2012). Fipronil tem sido recomendado para uso agrícola, fitossanitário e veterinário (CID et al., 2012), e designado como uma alternativa de praguicida para cupins e formigas, em vez de controle por fogo e organofosforados (DAS et al., 2006), bem como contra insetos resistentes aos organosfosforados e outros inseticidas, como piretróides, carbamatos (GUNASEKARA et al., 2007; MANDAL et al., 2014) e ciclodienos (AAJOUD et al., 2003), sendo efetivo, mesmo assim, em baixas doses (UDO, 2012; GILL e DUMKA, 2013). Está presente em produtos pecuários e agrícolas, principalmente em gramas e sementes. Domesticamente, o fipronil é utilizado para o controle de besouros (JACKSON et al., 2009), baratas, formigas (WILDE et al., 2001; UDO, 2012; CRAVEDI et al., 2013) e grilos; na medicina veterinária é utilizado contra carrapatos (Rhipicephalus sanguineus), pulgas (Ctenocephalides felis felis) (TINGLE et al., 2003; CID, 2012; CRAVEDI et al., 2013; GILL e DUMKA, 2013) e ácaros que infestam os animais domésticos, principalmente cães, gatos, equinos e bovinos (WILDE et al., 2001; TINGLE et al., 2003). 8 Ainda, é eficaz para o controle de cupins (CONNELLY, 2001) e, em ampla escala, contra gafanhotos (AAJOUD et al., 2003; CID, 2012), mosquitos, pulgas e carrapatos (CID, 2012), tanto para as larvas como para o estágio adulto (CONNELLY, 2001). Pode ser utilizado em diversos tipos de cultura de alimentos (TANG et al., 2004), para controle de insetos de solo (AMARAL, 2012) em plantações de batata, cana de açúcar e milho; em sementes de arroz, cevada e feijão; na água para irrigação de arroz; e em folhas nas culturas de algodão, arroz, cana de açúcar, milho (COUTINHO et al., 2005), legumes e frutas (MANDAL et al., 2014). É utilizado ainda, como conservador de madeiras (COUTINHO et al., 2005; AMARAL, 2012). Na saúde pública é utilizado para o combate de vetores de antropozoonoses, como a larva do mosquito da dengue, o Aedes aegypti (FERREIRA et al., 2012). A ampla utilização do fipronil tem exposto direta, ou indiretamente, à sua ação não só os organismos-alvo, mas também aqueles ditos não-alvos, como é o caso das algas, plantas aquáticas, peixes, anfíbios, répteis, aves e mamíferos, bem como o próprio ser humano (FERREIRA, 2010). Efeitos adversos também ocorrem em muitas situações agrícolas, onde a aplicação do fipronil no agro-ecossistema é muito comum (TINGLE et al., 2003). Seu interesse como inseticida é que é eficaz em doses baixas a muito baixas, em comparação com outras substâncias ativas (GAUTHIER et al., 2008). Como exemplo, fipronil aplicado em sementes de arroz, na dose de 12,5 g de ingrediente ativo por hectare (ia/ha) é mais eficaz que o malation a 300 g ia/ha (GUNASEKARA et al., 2007). Porém, por ser utilizado em aplicações domésticas e comercializado, preocupações recentes sobre seu potencial de causar efeitos adversos na saúde pública têm sido levantadas (DAS et al., 2006). A exposição, por um pequeno intervalo de tempo, pode causar sérios efeitos sobre o desenvolvimento de fetos, tanto de animais como de humanos e, após o nascimento são observadas sequelas, como dificuldade de aprender, diminuição dos reflexos, esterilidade, além do aumento da suscetibilidade para câncer e outras doenças (AMARAL, 2012). 9 O fipronil é classificado toxicologicamente como classe II (Tabela 1) (ANVISA, 2005; SILVA, 2008; MARTINS, 2009; UDO, 2012). TABELA 1. Classificação toxicológica dos agrotóxicos Classe Toxicológica Toxicidade I Extremamente tóxico II Altamente tóxico III Mediamente tóxico IV Pouco tóxico Fonte: BRAIBANTE e ZAPPE, 2012. É moderadamente tóxico para ratos e camundongos (HAINZL e CASIDA, 1996; UDO, 2012). A Dose Letal 50 (DL50) oral para ratos Wistar é 97 mg/Kg (CONNELLY, 2001; TINGLE et al., 2003; GUNASEKARA et al., 2007; JACKSON et al., 2009; MARTINS, 2009; FERREIRA et al., 2012a; CID, 2012; MANDAL et al., 2014), podendo variar entre 40 e 100 mg/Kg (TANG et al., 2004; UDO, 2012). Estudos realizados em ratos mostram a DL50, oral, de 92 e 103 mg/Kg de peso corporal, em machos e fêmeas, respectivamente (UDO, 2012). Para camundongos, a DL50 é de 91 (TINGLE et al., 2003) a 95 mg/Kg (MARTINS, 2009; CID, 2012). A DL50 do fipronil-dessulfinil (primeiro metabólito por fotodegradação) em ratos é 15 e 18 mg/Kg para fêmeas e machos, respectivamente (JACKSON et al., 2009). Por via dérmica, o fipronil é levemente tóxico para ratos, com uma DL50 superior a 2000 mg/Kg (CONNELLY, 2001; TINGLE et al., 2003; JACKSON et al., 2009; MARTINS, 2009; FERREIRA et al., 2012a; UDO, 2012) e 354 mg/Kg em coelhos (GUNASEKARA et al., 2007; MARTINS, 2009; CID, 2012; MANDAL et al., 2014). Por via inalatória, apresenta alta toxicidade para ratos, com Concentração Letal 50 (CL50) de 0,390 a 0,682 mg/L (CONNELLY, 2001; TINGLE et al., 2003; SILVA, 2008; CID, 2012). Por via intraperitoneal (IP), ratos podem ir a óbito em doses acima de 50 mg/Kg. Em camundongos, a DL50 do fipronil é de 41 mg/Kg de peso corporal 10 (SILVA, 2008; MARTINS, 2009) e, do composto fipronil sulfonado (metabólito), é de 50 mg/Kg (MARTINS, 2009). Fipronil é altamente tóxico para abelhas (DL50 de 0,004 µg/abelha), lagartos (DL50 para Acanthodactylus dumerili [Lacertidae] é de 30 µg/g peso corporal) e galináceos (DL50 de 11,3 mg/Kg para codornizes do Norte) (TINGLE et al., 2003). Embora seja considerado moderadamente tóxico para ratos e camundongos, estudos mostram que o fipronil pode ser classificado como tóxico de categoria II e III, dependendo da via de administração (UDO, 2012). Os sinais mais comuns de toxicidade nesta espécie são piloereção, postura arqueada, marcha anormal e diarreia (TINGLE et al., 2003; UDO, 2012). Para organismos aquáticos invertebrados, peixes e para algumas espécies de aves o fipronil é altamente tóxico, porém não tóxico para aves aquáticas (DAS et al., 2006) com DL50 superior a 2150 mg/Kg de pato-real (TINGLE et al., 2003). 2.1.1.1 Toxicocinética do fipronil Em ratos, após absorvido, o fipronil é rapidamente metabolizado (TINGLE et al., 2003; CID, 2012) e seus resíduos são amplamente distribuído para os tecidos e se deposita predominantemente em tecidos gordurosos (TINGLE et al., 2003; JACKSON et al., 2009; CID, 2012), onde permanecem em quantidades significativas, uma semana após a administração oral (TINGLE et al., 2003; CID, 2012). Em estudo feito em ratos, após administração por via oral, o pico plasmático foi alcançado 5,5 horas após o tratamento; a meia-vida de eliminação foi de 183 horas em machos e 245 horas em fêmeas. O fipronil se distribuiu por todos os tecidos, com maior predomínio no tecido adiposo (MARTINS, 2009). Um estudo com o tratamento por via tópica em cães e gatos detectou fipronil concentrado em glândulas sebáceas, camadas epiteliais que rodeiam os pelos 2 meses após o tratamento, sugerindo a difusão passiva do fipronil no pelo e pele (JACKSON et al., 2009). 11 Devido às suas propriedades lipofílicas, o fipronil pode alcançar o sistema nervoso durante o desenvolvimento do feto (UDO et al., 2014). Relativamente, pouco se sabe sobre a capacidade do fipronil ser metabolizado em vertebrados. Estudos in vivo de mamíferos indicam que a via metabólica principal para o fipronil envolve a formação oxidativa do metabólito sulfona (DAS et al., 2006; CID, 2012). Estudos recentes com microssomas hepáticos humanos e isoformas do citocromo p450 (CYP) recombinantes demonstraram que a formação da sulfona é quase exclusivamente o resultado da atividade do CYP3A4. Embora limitado, o metabolismo por CYP2C19 também foi relatado. O metabólito sulfona, assim como produtos da fotodegradação, o fipronil-dessulfinil, foram relatados como sendo mais tóxicos para insetos, mamíferos, peixes e aves do que o próprio composto original (DAS et al., 2006; CID, 2012). Tang et al. (2004), em seus estudos, concluíram que, o CYP3A4 é a principal enzima responsável pelo metabolismo do fipronil. Também constataram que a principal via metabólica ocorre por meio da oxidação do grupo tio éter para a formação do fipronil-sulfona e a enzima responsável pela oxidação é uma isoforma do citocromo p450. In vitro, fipronil aumenta atividades de CYP1A1 e 3A4 em hepatócitos humanos. Em contraste, nenhum efeito claro de fipronil foi evidenciado nas atividades de microssomas de ratos e coelhos tratados com fipronil (1,2 e 5 mg/kg/d por 4 e 14 dias) (LEGHAIT et al., 2009). Fipronil é metabolizado, principalmente, em sulfona (CABONI et al., 2003; SILVA, 2008; MARTINS, 2009; LACROIX et al., 2010), sulfeto, dessulfinil (CABONI et al., 2003; MARTINS, 2009) e amida por hidrólise (SILVA, 2008; MARTINS, 2009). Outro metabólito da transformação do fipronil resulta em ácido sulfônico, mas em menor grau (GAUTHIER et al., 2008). A via predominante do metabolismo do fipronil é a oxidação, em sulfona correspondente. Esta reação, principalmente catalisada pelo citocromo p450 isoforma CYP3A4, pode ser considerada como uma via de bioativação uma vez que o metabólito sulfona é ativo (CRAVEDI et al., 2013). A sulfona tem seis vezes mais afinidade do que o composto original para bloquear os receptores GABA no cérebro e vinte vezes maior potência em bloquear os canais de cloreto ativados pelo GABA em mamíferos (JACKSON et 12 al., 2009; CID, 2012; CRAVEDI et al., 2013) do que nos insetos (JACKSON et al., 2009), em comparação com o fipronil inalterado. Fipronil-sulfona também é suspeito de ser mais tóxico do que o fipronil em diferentes espécies. Além disso, o fipronil-sulfona persiste no sangue por muito mais tempo que o próprio fipronil (CRAVEDI et al., 2013). Fipronil-dessulfinil, o primeiro metabolito ambiental (fotodegradação) do fipronil, é 9 a 10 vezes mais ativo sobre os canais de cloro de mamíferos do que o composto original, reduzindo a seletividade entre os insetos e humanos quando expostos para este metabólito (JACKSON et al., 2009; FERREIRA, 2010; FERREIRA et al., 2012, 2012a). A concentração máxima do fipronil no sangue ocorre de 4 a 6 horas após sua ingestão (AMARAL, 2012), sendo metabolizado e excretado lentamente em ratos (CRAVEDI et al., 2013).. O tempo de meia vida (T½) longo do fipronil no sangue, de 150 a 245 horas em alguns casos, pode ser atribuído a liberação lenta de resíduos de gordura e pode sugerir potencial de bioacumulação de produtos metabólicos do fipronil (TINGLE et al., 2003; CID, 2012), pois, devido a intensa recirculação êntero-hepática, possui elevado tempo de meia-via, tornando-se assim, um fator de acréscimo de sua toxicidade (SILVA, 2008). Em uma pesquisa com ratos, o fipronil apresentou tempo de meia-vida em sangue total, após administração oral na dose de 4 mg/Kg, de 6,2 a 8,3 dias (JACKSON et al., 2009; CID, 2012). A excreção do fipronil e de seus metabólitos é realizada principalmente através das fezes e em menor quantidade através da urina (AMARAL, 2012). Em ratos, a excreção do fipronil ocorre 75 % pelas fezes e 25 % pela urina (TINGLE et al., 2003; JACKSON et al., 2009; UDO, 2012) tanto para machos, quanto para fêmeas (TINGLE et al., 2003). 2.1.1.2 Toxicodinâmica do fipronil Os inseticidas utilizados nos últimos anos classificados como de segunda geração, são menos tóxicos e eles apresentam maior afinidade com receptores de insetos do que com os de mamíferos (SZEGEDI et al., 2005). Os 13 fenilpirazóis, como o fipronil, representam estes inseticidas de segunda geração (GAUTHIER et al., 2008). A transmissão nervosa em vertebrados e invertebrados ocorre através da liberação de neurotransmissores. O ácido gama amino butírico (GABA) é o neurotransmissor inibitório mais comum do sistema nervoso central (SNC) e é derivado da descarboxilação do glutamato por glutamato descarboxilase. O GABA foi identificado e isolado nos mamíferos primeiramente em 1950 e está presente tanto no reino vegetal como no animal e em bactérias. No entanto, tem sido aceito como um neurotransmissor a partir da década de 1960, depois de um grande número de pesquisas, em lagostas e lombrigas (GAUTHIER et al., 2008). O GABA regula a excitabilidade dos neurônios do SNC (IKEDA et al., 2004; SILVA, 2008; MARTINS, 2009) e por atuar em muitas vias diferentes do SNC e praticamente todos os neurônios serem sensíveis aos seus efeitos (UDO, 2012), tem sido associado a eventos fisiológicos e fisiopatológicos que envolvem a função e/ou a disfunção cerebral (SILVA, 2008; MARTINS, 2009; UDO, 2012). O sistema receptor-GABA é responsável pela inibição da atividade neuronal anormal e previne o estímulo excessivo dos nervos. Quando a função desse sistema regulador é bloqueada, ocorre hiperexcitação neural e consequentemente morte do inseto (COUTINHO et al., 2005). O fipronil é um potente desregulador do sistema nervoso central (SNC) (TINGLE et al., 2003; TERÇARIOL, 2007; UDO, 2012). Tem como principal efeito, atuar diretamente no SNC de mamíferos (OZOE et al., 2000) e insetos (OZOE et al., 2000; AMARAL, 2012) inibindo os receptores do GABA (COUTINHO et al., 2005), associados à canais de cloreto (SILVA, 2008). O ingrediente ativo do fipronil tem um modo de ação único e exclusivo, devido à especificidade e precisão do local atingido no SNC. A transmissão do impulso nervoso nas células do SNC acontece em função da diferença de concentração de íons dentro e fora dessas células. O estabelecimento do equilíbrio iônico nas células do SNC é garantido graças ao GABA, que controla o fluxo de íons cloreto através da membrana da célula nervosa (AMARAL, 2012). 14 O fipronil age antagonizando o GABA (OZOE et al., 2000; AAJOUD et al., 2003; CID et al., 2012; CRAVEDI et al., 2013; GILL e DUMKA, 2013; UDO et al., 2014), através da interferência com a passagem de íons de cloreto (TINGLE et al., 2003; CID et al., 2012; GILL e DUMKA, 2013; UDO et al., 2014), alterando o equilíbrio iônico nas células do SNC (AMARAL, 2012). Ligam-se aos canais de cloreto inibindo o fluxo dos íons Cl- para o interior da célula nervosa resultando na excitação excessiva do sistema nervoso, paralisia severa e morte do inseto (CID, 2012). Os metabólitos sulfeto, sulfona e dessulfinil também atuam no receptor GABA e são biologicamente ativos (CID, 2012). 2.1.1.3 Efeitos toxicológicos do fipronil Alguns estudos toxicológicos foram desenvolvidos com o fipronil. Ratos e camundongos expostos ao fipronil em dose única, por via oral ou inalação, apresentaram alterações de atividade ou marcha, aparência curvada, tremores e convulsões (JACKSON et al., 2009). Ratos alimentados durante 52 semanas com o fipronil apresentaram apetite reduzido, redução do ganho de peso, convulsões e morte, alterações nos hormônios da tireóide, aumento de massas no fígado e tireóide, e, efeitos renais (JACKSON et al., 2009). A menor dosagem a apresentar efeito tóxico foi de 0,059 mg/Kg/d para machos e 0,078 mg/Kg/d para fêmeas (CID, 2012). Outros estudos utilizando metabólitos do fipronil também foram realizados. Ratos foram alimentados com fipronil-dessulfinil nas doses 0, 0.5, 2.0, e 10 ppm por dois anos (0, 0.025, 0.098 e 0.050 mg/Kg/d para machos e 0, 0.032, 0.130, e 0.550 mg/Kg/d para fêmeas). A dose inicial de 10 ppm foi reduzida para 6 ppm nas fêmeas, após 26 semanas, devido ao aumento da mortalidade. Machos e fêmeas apresentaram aumento da incidência de agressividade e irritabilidade ao toque, na dose mais alta testada. Fêmeas também apresentaram aumento da salivação nas doses de 6 e 10, e convulsões, nas doses de 2, 6 e 10 ppm. Além disso, machos na dose de 10 ppm e fêmeas nas doses 2, 6 e 10 ppm, desenvolveram sinais clínicos de toxicidade, sem 15 evidência de carcinogenicidade. Nenhum efeito foi observado em doses abaixo de 0.5 ppm (0.025 mg/Kg/d) (JACKSON et al., 2009). Uma pesquisa foi realizada em ratos machos e fêmeas para a avaliação aguda da neurotoxicidade do fipronil, utilizando doses entre 0,5 e 50 mg/Kg. Foi possível observar, na maior dose testada, morte em até dois dias após o tratamento. Na necropsia, notou-se hemorragia cerebral difusa. Sete horas após o tratamento, os animais apresentaram sinais de depressão (diminuição do número de levantamentos, diminuição dos reflexos e diminuição da temperatura corporal) e de estimulação do sistema nervoso central (tremores, convulsões tônico-clônicas, mioclonias) (MARTINS, 2009). Em coelhos, a dose de 10 mg/Kg/dia, por um período acima de 21 dias causou diminuição do ganho de peso e consumo de alimento. Cães alimentados com fipronil na dose de 2,0 mg/Kg/dia apresentaram sinais clínicos de neurotoxicidade (JACKSON et al., 2009). Um estudo crônico da ação do fipronil por via oral em cães da raça Beagle, com dose de 10 mg/Kg/dia, foi reportado perda de apetite, postura curvada, inatividade, convulsão, tremores no corpo e balançar de cabeça. Nesta dose também houve a morte da metade do número de animais expostos (CID, 2012). Além de causar efeitos neurotóxicos e reprodutivos quando aplicado em altas doses em espécies de laboratório e problemas nervosos leves em casos de intoxicação aguda de humanos, a exposição ao fipronil pode causar alteração na função da tireóide em ratos, produzindo neoplasia na glândula tireóide secundário ao desequilíbrio hormonal (CRAVEDI et al., 2013). Isso ocorre, provavelmente, como resultado da sua capacidade de melhorar o metabolismo hepático dos hormônios tireoidianos e sua excreção (HURLEY et al., 1998; TINGLE et al., 2003; DAS et al., 2006; MARTINS, 2009). É possível que a indução de enzimas microssomais possa desempenhar um papel no desenvolvimento de tumores (HURLEY et al., 1998; DAS et al., 2006). A capacidade de produtos químicos induzirem enzimas metabólicas, incluindo o citocromo p450 (CYP), tem sido considerada uma das respostas bioquímica celulares mais sensíveis à agressão tóxica. Estudos recentes com hepatócitos humanos e ratos têm demonstrado que os praguicidas são capazes de induzir muitas enzimas metabólicas nestas células (DAS et al., 2006). 16 Além destes efeitos, o fipronil também provoca efeitos de toxicidade reprodutiva (U.S.EPA, 1996), hepatotoxicidade (SOUSA et al., 1997), alterações comportamentais (TERÇARIOL e GODINHO, 2011) e desregulação endócrina (U.S.EPA, 1998; UDO, 2012). O fipronil foi associado a efeitos reprodutivos em 95,4% dos ratos alimentados continuamente com 300 ppm de fipronil na dieta. Redução do tamanho da ninhada, diminuição do peso corporal, diminuição da percentagem de acasalamento dos animais, redução no índice de fertilidade, redução da sobrevivência pós-implantação e sobrevivência dos descendentes pós-parto e atraso no desenvolvimento físico foram observados (CID, 2012). Em vertebrados, em geral, além da sua atuação no sistema nervoso, o fipronil interfere também, na morfologia de outros órgãos, como é o caso do fígado e hipófise, porém, poucos estudos demonstraram estes tipos de efeitos do fipronil (FERREIRA, 2010). Tendo em vista a ação tóxica do fipronil sobre o GABA levando as alterações do funcionamento do sistema nervoso central promovendo neurotoxicidade e, que avaliação neurocomportamental tem sido utilizada como indicador biológico de função para estudar neurotoxicidade por agentes químicos, estudos que avaliem o comportamento de animais expostos ao fipronil são fundamentais (TERÇARIOL, 2007). 2.2 Toxicologia do desenvolvimento A toxicologia do desenvolvimento é um termo relativamente recente encontrado dentro da toxicologia reprodutiva (UDO, 2012). No entanto, ela tem suas raízes relacionadas à teratologia, termo utilizado antigamente para denominar alterações de ordem estrutural no concepto (GÓRNIAK et al., 2008), ligadas a perturbações do desenvolvimento embrionário ou fetal, estudando suas anomalias e malformações (UDO, 2012). De modo geral, a toxicologia reprodutiva dedica-se ao estudo de fatores que possam alterar o sistema reprodutor, o desenvolvimento do embrião e feto e o desenvolvimento pós-natal da prole (SANTOS, 2011). 17 Portanto, toxicologia do desenvolvimento é a área que estuda os efeitos nocivos causados por agentes tóxicos no concepto em desenvolvimento (UDO, 2012) decorrentes da exposição à substâncias químicas antes da concepção, durante o desenvolvimento pré-natal ou pós-natal, até a puberdade. Os efeitos gerados pela exposição pré e perinatal podem levar a distúrbios irreversíveis, pois as alterações são produzidas durante a formação ou diferenciação dos órgãos (GEHLEN, 2003). De acordo com a toxicologia, toda substância pode ser considerada um agente tóxico, dependendo das condições de exposição (GEHLEN, 2003; RIGHI et al., 2008), como a dose administrada ou absorvida, tempo e frequência de exposição (dose única ou múltipla) e via de aplicação (BRANCO, 2009), incluindo ainda, as propriedades físico-químicas e suscetibilidade individual (RIGHI et al., 2008). O nível de ação de um teratógeno está ancorado em três princípios: período crítico do desenvolvimento; dosagem da droga ou do composto químico; e constituição gênica do embrião (FERNANDES, 2009). Uma substância teratogênica é definida como aquela que aumenta a ocorrência de anormalidades funcionais ou estruturais da prole, em decorrência da administração de uma substância química às mães antes da concepção, durante a prenhez ou diretamente no organismo fetal em desenvolvimento (RIGHI et al., 2008). Sabe-se que o tipo de efeito teratogênico produzido pelos agentes químicos deve-se, em parte, à quantidade do agente ao qual o organismo é exposto, principalmente no período da gestação e, consequentemente, no estágio de evolução do feto quando se administra esse composto (RIGHI et al., 2008). A toxicidade de uma substância a um organismo vivo pode ser considerada como a capacidade de lhe causar algum desequilíbrio, dano grave ou morte (GEHLEN, 2003; BRANCO, 2009), ou seja, o efeito promovido por um agente tóxico em um determinado animal está basicamente relacionado com a concentração do tóxico no sítio de ação ou tecido (FLÓRIO e SOUSA, 2008). Os efeitos de um agente ambiental sobre o embrião ou o feto dependem da natureza física ou química do agente, além de vários outros fatores, como a dose, via e período de exposição e da gestação, a susceptibilidade genética 18 materna ou embriofetal e a presença e natureza de exposições simultâneas (ROMAN, 2011). As manifestações do desenvolvimento anormal podem ir desde um distúrbio funcional até a morte (FAVERO, 2006). Malformações não significam apenas anormalidades em tecidos, mas também anormalidades bioquímicas. Atualmente a teratologia também abrange as manifestações no retardo do crescimento, alterações funcionais e comportamentais e/ou morte da prole (UDO, 2012). Entre os efeitos tóxicos no desenvolvimento de animais após exposição às diferentes substâncias teratogênicas, estão: malformações geniturinárias, criptorquidismo, hipoplasia dos dígitos, baixo peso ao nascer, fenda palatina, anormalidades esqueléticas, malformações oculares, exoftalmia, microftalmia, anomalias faciais, anomalias do crânio, defeitos no tubo neural, dano no VIII par de nervos cranianos (surdez, desequilíbrio – antibióticos aminoglicosídeos – ototoxicidade), retinopatia, icterícia neonatal, malformação mandibular, hemorragias cerebrais, hidrocefalia, microcefalia, anormalidades do sistema nervoso central, abortos ou reabsorções, anormalidades cardíacas, hemorragias, braquignatia, retardo de crescimento e embrioletalidade (GEHLEN, 2003). As anomalias do sistema nervoso central, dos órgãos reprodutivos e do sistema imune ocorrem com frequência decorrente da exposição à teratógenos. Neste sentido, o defeito observado seria, por exemplo, de distúrbios comportamentais ou mentais, deficiência motora, queda na fertilidade e imunodeficiência ou aparecimento de doenças autoimunes (GORNIAK et al., 2008). A presença das anomalias ósseas é bem provável, pois o período de organogênese do esqueleto é longo (GEHLEN, 2003). A resposta ao teratógeno é amplamente dependente do genótipo do embrião. A talidomida, por exemplo, é teratogênica para humanos, coelhos e macacos e não ao rato. Outro exemplo é metotrexato, sendo este teratogênico para ratos e não para macacos e humanos (GEHLEN, 2003). Nem todas as espécies animais são igualmente suscetíveis ou sensíveis ao efeito tóxico de determinada substância química. Neste sentido, deve-se considerar que uma substância que atua causando malformação em uma 19 espécie pode ter pouco ou nenhum efeito deletério em outra (GÓRNIAK et al., 2008). Considera-se, ainda, que a substância química pode produzir efeitos similares em diferentes espécies animais, embora essas alterações variem na frequência. Além disso, uma substância que produz determinada alteração em uma espécie animal pode acarretar alterações completamente diferentes em outras (GÓRNIAK et al., 2008). A exposição materna a agroquímicos durante a fase reprodutiva pode levar a alterações no desenvolvimento animal. Embora o organismo materno possa transformar o químico ou pelo menos reduzir sua concentração, a grande maioria das substâncias pode atravessar a barreira placentária (CASTRO, 2006). Antigamente, acreditava-se que o útero era intransponível a agentes externos e que a placenta constituía-se em verdadeira barreira entre o organismo materno e o organismo fetal. O conceito de que o feto estaria pouco exposto a substâncias utilizadas pela gestante foi abalado apenas no início da década de 60, pela “tragédia da talidomida”, sedativo usado para diminuir as náuseas em mulheres grávidas. Quantidades pequenas, como as referentes a uma simples dose, foram suficientes para causar defeitos significativos ao nascimento. Os fetos apresentaram intestinos malformados, defeitos na audição, agenesia de orelhas, anomalias renais e oculares (FAVERO, 2006). No entanto, o fenótipo que mais chamou a atenção foi a focomelia, síndrome caracterizada pela aproximação ou encurtamento dos membros junto ao tronco do feto. Como seu uso havia se mostrado seguro em várias espécies animais, foram necessários vários anos e altas taxas de malformações (20 a 30%) para a confirmação dos seus efeitos adversos em humanos (FAVERO, 2006). Atualmente, sabe-se que compostos tóxicos, presentes no sangue materno, facilmente atravessam a barreira placentária e atingem a corrente sanguínea do feto (FAVERO, 2006; ROMAN, 2011). Embora o organismo materno seja capaz de alterar uma substância química ou pelo menos, reduzir sua concentração, sabe-se que as funções protetoras da placenta são limitadas. Neste sentido, determinados xenobióticos, 20 além de afetarem diretamente o desenvolvimento pré-natal, podem causar sequelas que só serão detectadas na vida adulta do animal (ROMAN, 2011). A placenta, constituída por membrana lipídica, permite a transferência de substâncias de maneira bidirecional entre o compartimento fetal e o materno. Embora existam diferenças significantes nos tipos de placenta, considerando-se as várias espécies animais, essas diferenças parecem não exercer papel preponderante na passagem das diferentes substâncias químicas através da placenta (GORNIAK et al., 2008). Dessa forma, a maior importância nesse aspecto reside na possibilidade dessas substâncias serem transportadas e chegarem até o feto, devendo ser considerado as propriedades físico-químicas dos toxicantes, como lipossolubilidade, peso molecular, ligação proteica, enzimas placentárias que realizam biotransformação do xenobiótico, entre outras (GORNIAK et al., 2008). Por mais que a placenta forneça proteção ao feto, produtos químicos industriais como praguicidas, podem atravessá-la e concentrar-se no sistema nervoso fetal, por vezes, em concentrações ainda mais elevadas do que no organismo materno. Alguns destes produtos químicos são lipofílicos e, por conseguinte, tendem a ser mantidos em órgãos com elevada concentração de lipídios, tais como o encéfalo (JULVEZ e GRANDJEAN, 2009). Quando uma gestante ingere ou recebe qualquer medicamento, dois organismos serão afetados, sendo que um deles, o organismo embriofetal, ainda não tem a mesma capacidade de metabolizar as substâncias que a mãe, pois não possui os sistemas corporais plenamente desenvolvidos, estando, portanto, sujeito a efeitos negativos não esperados (FAVERO, 2006). Embora os embriões de mamíferos estejam bem protegidos no útero, agentes ambientais teratogênicos podem causar perturbações no seu desenvolvimento após a exposição da mãe a eles (FERNANDES, 2009). A avaliação dos possíveis efeitos decorrentes da exposição aos agroquímicos é importante de ser realizada em diferentes períodos de desenvolvimento, devido a possível influência na morfologia e conexão sináptica nos alvos neuronais (CASTRO, 2006a). Atualmente, nos estudos de toxicologia do desenvolvimento é importante também considerar a teratologia comportamental, segundo a qual, a exposição a diversos fatores ambientais durante o desenvolvimento ou maturação cerebral 21 do indivíduo, pode ocasionar alterações comportamentais tardias, manifestadas no decorrer da vida pós-natal. Por isso, avalia-se também o desenvolvimento físico, sensorial e comportamental do indivíduo (UDO, 2012). A suscetibilidade a alterações morfológicas aumenta à medida que as camadas germinativas começam a se diferenciar, ocorrendo com maior probabilidade no início da organogênese, fim do primeiro terço da gestação (GEHLEN, 2003). As alterações funcionais afetam processos homeostáticos ou metabólicos, como exemplo, o desenvolvimento e ativação de uma enzima específica, e ocorre após o final da organogênese. As alterações funcionais podem acontecer sem alterações morfológicas detectáveis (GEHLEN, 2003). Como todos os efeitos tóxicos, os efeitos teratogênicos geralmente são dose-dependentes (GEHLEN, 2003), logo, aumentando a dose, deve-se verificar um aumento da toxicidade. Dessa forma, o feto pode não demonstrar nenhum efeito ou apresentar um efeito mais grave, como o óbito (efeito letal) (GORNIAK et al., 2008). O toxicante deve produzir seus efeitos embriotóxicos em níveis de doses que não provoquem toxicidade para a mãe, pois se houver toxicidade materna, a dismorfogênese poderá decorrer do efeito primário tóxico materno, o que não é considerado teratogenicidade (GORNIAK et al., 2008). Os agentes químicos podem afetar o ciclo reprodutivo em qualquer fase podendo causar alterações parentais e também efeitos teratogênicos na prole (UDO, 2012). O período de desenvolvimento do embrião e do feto consiste em diversas mudanças, sendo estas, marcadas por fases (GEHLEN, 2003). É fundamental o conhecimento das etapas do desenvolvimento embrionário, pois alguns estágios do desenvolvimento são mais vulneráveis que outros. É importante salientar que normalmente os agentes atuam não apenas em uma estrutura específica, mas em um grande número de estruturas que estão se definindo durante determinado momento (FAVERO, 2006). A exposição a agentes tóxicos durante poucas horas após a fertilização pode produzir malformação fetal. Há casos em que a exposição ao toxicante durante a fase de pré-implantação leva às malformações. São exemplos, a administração de metilnitrosurea a camundongos, entre os dias dois e quatro de 22 gestação, e a administração de ciproterona, no segundo dia de prenhez (GORNIAK et al., 2008). A gestação do rato dura aproximadamente 21 a 23 dias, sendo dividido em três períodos: pré-implantação, abrange do 1° ao 5° dias de gestação, caracterizado pela formação do blastocisto e início da implantação; organogênico, do 6° ao 15° dias de gestação, havendo o término da implantação e período de formação dos tecidos e órgãos; fetal, do 16° ao 21º dias de gestação, no qual o feto já com os órgãos formados, inicia seu crescimento intrauterino, com maturação funcional dos órgãos (GRANCE, 2007). O período crítico do desenvolvimento para o aparecimento de malformações é o período da organogênese, quando tecidos e órgãos estão se diferenciando rapidamente, ficando susceptíveis à interferência de agentes externos capazes de alterar seu desenvolvimento (GRANCE, 2007). Para cada estrutura formada, existem picos de susceptibilidade ao aparecimento das malformações (UDO, 2012). No rato, por exemplo, o ácido acetilsalicílico só é capaz de produzir fenda palatina se o feto for exposto entre o 10º e 16º dias de gestação, período em que se forma o palato. Quanto maior for o período de formação de um determinado sistema maior será o risco de seu desenvolvimento ser afetado por um determinado agente (GEHLEN, 2003). Na organogênese ocorre a formação da placa neural, diferenciação das camadas de células e a formação de órgãos (UDO, 2012). Os medicamentos, quando utilizados no período de organogênese, podem levar à teratogênese, se a lesão for compatível com a vida do animal; ou à embrioletalidade, caso não seja (GEHLEN, 2003). Neste período podem ocorrer as anormalidades maiores (olhos, cérebro, coração e arcos aórticos, esqueleto axial, palato, sistema urogenital). Elas exigem tratamento cirúrgico ou deixam sequelas funcionais importantes (GEHLEN, 2003). No período fetal podem ocorrer defeitos estruturais ou defeitos funcionais provocados pela lesão (GORNIAK et al., 2008). Neste período podem ocorrer anormalidades morfológicas menores e funcionais, pois os órgãos já estão formados. Este é o período de maturação e diferenciação do cérebro, que vai do final da organogênese até o período neonatal (GEHLEN, 2003). 23 Nos ratos, no período neonatal, que ocorre após o nascimento e se estende do 1º ao 21º dia (lactação) ocorrem a maturação de receptores, diferenciação sexual do encéfalo, formação de sistemas enzimáticos (GEHLEN, 2003) e ganho de peso corporal, os quais podem sofrer prejuízos com a exposição a substâncias químicas. O período mais importante do desenvolvimento cerebral do rato ocorre nas duas primeiras semanas pós- natais (CASTRO, 2006). Apesar da diversidade de estudos existentes, os efeitos dos agroquímicos na saúde nem sempre são bem conhecidos. Muitos desses agentes afetam o sistema reprodutor, efeitos esses confirmados em testes experimentais incluindo gestação, parto, lactação, desmame, crescimento e desenvolvimento da prole. Sabe-se, por exemplo, que a exposição da fêmea a agroquímicos durante a prenhez e a lactação pode causar alterações refletidas em aspectos físicos e comportamentais, de acordo com o período do desenvolvimento animal (TERÇARIOL, 2007). As manifestações de toxicidade, quando organismo são expostos a agentes químicos durante o seu desenvolvimento, ou seja, no período perinatal, podem ser observadas em qualquer momento da vida do animal (UDO, 2012). 2.3 Biomarcadores e bioindicadores O biomarcador compreende toda substância ou seu produto de biotransformação ou qualquer alteração bioquímica precoce cuja determinação possa ser realizada nos fluidos biológicos, tecidos ou ar exalado (CASTRO, 2006). Já os estudos de alterações fisiológicas, comportamentais ou de sobrevivência em um organismo, ou em uma população, constituem-se como bioindicadores (JONSSON e CASTRO, 2005). Esta determinação deve estabelecer a relação entre a exposição a agentes químicos e o efeito tóxico refletida em alterações pré-clínicas e agravos à saúde ou ainda permitir entender os mecanismos relacionados à ação tóxica e o grau de resposta nos indivíduos (CASTRO, 2006). 24 Os organismos, quando expostos a situações de ameaça e perigo, respondem com uma série de respostas adaptativas, físicas e mentais que se opõe aos estímulos estressores na tentativa de manter a homeostasia (BENETTI, 2005). 2.3.1 Desenvolvimento físico e sensório-motor Segundo dados prévios da literatura, a exposição de fêmeas aos praguicidas durante a prenhez e a lactação pode causar alterações refletidas em aspectos físicos e comportamentais, de acordo com o período do desenvolvimento animal (KIMMEL, 1998; CHELONIS et al., 2004; COSTA et al., 2004). O período neonatal representa a fase final do período perinatal, tem seu início ao nascimento da prole e é finalizado com o término da lactação. Nesse período ocorre o ganho de peso corporal (Figura 2), peso este que pode sofrer redução com a exposição às substâncias químicas (CASTRO, 2006a). A observação da presença ou ausência dos parâmetros de desenvolvimento físico e sensório-motor são importantes em estudos toxicológicos. São observados, por filhote, os dias respectivos em que ocorrerem, por exemplo, aparecimento de pelo (Figura 3), erupção dos dentes incisivos (Figura 4), descolamento de orelha (Figura 5), abertura dos olhos (Figura 6) e descida dos testículos (Figura 7) (CASTRO 2006). Efeitos pós- natais mediados por agentes químicos encontrados no leite materno podem provocar desenvolvimento físico alterado nos filhotes (SALVATORI et al., 2004). A preensão palmar (Figura 8) é um reflexo medular que tende a desaparecer no decorrer da vida pós-natal dos filhotes. Por sua vez, os ajustes posturais são regulados por três sistemas: o vestibular, exteroceptivo e proprioceptivo. O reflexo postural (Figura 9) e a geotaxia negativa (Figura 10) de ratos jovens refletem o desenvolvimento motor e atividades controladas pelo sistema vestibular. A integridade do sistema vestibular também pode ser avaliada por meio da atividade motora geral do animal (UDO, 2012). 25 FIGURA 2. Pesagem dos filhotes. Fonte: Arquivo pessoal. FIGURA 3. Aparecimento de pêlos. Fonte: Arquivo pessoal. FIGURA 4. Erupção dos dentes incisivos. Fonte: Arquivo pessoal. 26 FIGURA 5. Descolamento de orelha. Fonte: Arquivo pessoal. FIGURA 6. Abertura dos olhos. Fonte: Arquivo pessoal. FIGURA 7. Descida dos testículos. Fonte: Arquivo pessoal. 27 FIGURA 8. Reflexo de preensão palmar. Fonte: Arquivo pessoal. FIGURA 9. Reflexo postural/endireitamento. Fonte: Arquivo pessoal. FIGURA 10. Reflexo geotaxia negativa. Fonte: Arquivo pessoal. 28 2.3.2 Avaliação neurocomportamental Investigações neurofisiológicas podem ser importantes, nos casos em que os animais ou os seres humanos são expostos quer a baixas doses de produtos químicos para um longo período de tempo, ou para uma única dose elevada, durante um acidente (SZEGEDI et al., 2005). A avaliação neurocomportamental é realizada através de métodos para avaliar as funções cognitivas como a aprendizagem e a memória. Há várias evidências experimentais mostrando que, na progressão de doenças neurotóxicas, os eventos bioquímicos precedem as alterações estruturais e danos permanentes ao sistema nervoso central (CASTRO, 2006). O estudo do desenvolvimento comportamental dos filhotes permite a avaliação da maturidade dos sistemas que controlam os diversos reflexos (UDO, 2012). Comportamento tem sido utilizado como um bioindicador de função para estudar efeitos tóxicos de agentes químicos. Alterações do comportamento em animais expostos a um determinado agente químico podem servir como indicativo de que a substância provoca neurotoxicidade. A importância de estudos neurocomportamentais reside no fato de que comportamento é considerado como um produto final funcional de vários processos sensoriais, motores e integrativos, que ocorrem no sistema nervoso (TERÇARIOL, 2007). Embora vários estudos procurem compreender os mecanismos da toxicidade neuronal dos praguicidas em mamíferos, há poucos relacionados aos efeitos neurocomportamentais e estes podem ser úteis para avaliar os efeitos das exposições às substâncias químicas (MARTINS, 2009). Um dos comportamentos estudados relacionados à neurotoxicidade por agentes químicos é o de aprendizagem-memória. Aprendizagem é o processo através do qual o organismo adquire conhecimento sobre o mundo. Já memória é o processo pelo qual o conhecimento é codificado, retido e, posteriormente, recuperado (AZEVEDO, 2010). A capacidade de formar, manter e utilizar as memórias é uma propriedade fundamental do cérebro (BAVARESCO, 2008). Evidências na literatura apontam para o envolvimento do glutamato, GABA, bem como de proteínas cinases nos processos iniciais de formação da memória, seguidos de mecanismos hormonais e neuro-humorais. Lesões em 29 estruturas centrais, como, o estriado, podem alterar as fases de aquisição, consolidação e evocação da memória (BAVARESCO, 2008). O sistema GABAérgico está envolvido em processos cognitivos como aprendizado e memória. Assim, drogas que atuam no sistema GABAérgico promovem prejuízo na formação da memória, quando administradas diretamente no ventrículo lateral, prosencéfalo basal, hipocampo e amígdala (AZEVEDO, 2010). Prejuízos cognitivos como deficiência no aprendizado e memória espacial são frequentemente atribuídos a danos em estruturas diencefálicas e corticais, como tálamo, hipocampo e córtex pré-frontal. Além disso, a severidade da deficiência de aprendizado e memória espacial são dependentes do grau de lesão diencefálica e cortical. O córtex pré-frontal possui papel fundamental na memória, pois em modelos animais, lesões nesta estrutura ocasionam piora na recuperação e ordenamento temporal de memórias. O hipocampo, estrutura do lobo temporal medial, é uma área que desempenha função importante no processo de memória dos mamíferos e torna-se especialmente relevante quando é necessário combinar e relacionar informações de múltiplas fontes para tarefas de memória espacial. Em humanos, macacos e roedores, danos na região hipocampal provocam prejuízos no desempenho em uma variedade de tarefas de aprendizado e memória (AZEVEDO, 2010). Para estudar os mecanismos envolvidos com a memória, diversas tarefas experimentais têm sido propostas (BAVARESCO, 2008), tais como teste de reconhecimento de objetos e teste do labirinto octogonal. O teste de reconhecimento de objetos (Figura 11) é um teste de memória com base na propensão natural dos roedores para explorar novidade, que confere aos animais a capacidade de discriminar entre o que é familiar e o que é novo. A consolidação da memória ocorre principalmente no hipocampo, embora outras estruturas do cérebro e uma variedade de neurotransmissores desempenham um papel no processamento da memória (SILVEIRA et al., 2013). Este teste é muito usado para avaliar a capacidade de memorizar e reconhecer objetos novos e já conhecidos (NEVES, 2010). É especialmente adequado para testar os efeitos de intervenções farmacológicas sobre a aprendizagem e memória (SILVEIRA et al., 2013). 30 FIGURA 11. Reconhecimento de Novo Objeto. Fonte: Arquivo pessoal. A formação do hipocampo medeia vários aspectos da função cognitiva, incluindo a aprendizagem espacial, a formação e a recuperação de memórias. Estudos têm mostrado que, quando as lesões que englobam o hipocampo forem superior a 75%, o reconhecimento é significativamente prejudicado, confirmando assim que o hipocampo desempenha um papel crucial no reconhecimento de objetos (STANLEY et al., 2012). Glutamato, GABA e acetilcolina (ACh) desempenham um papel importante na formação da memória no hipocampo, como é evidenciado pelo comprometimento da aprendizagem após a administração de antagonistas para os seus respectivos receptores (STANLEY et al., 2012). No teste do labirinto octogonal (Figura 12) onde a utilização pelo animal, de pistas visuais colocadas estrategicamente na sala, permite-lhe aprender e memorizar espacialmente como reconhecer um trajeto para um braço onde está colocado determinado tipo de reforço, como um alimento, por exemplo (OLTON, 1987). Os animais são treinados a reconhecer o aparelho e, numa segunda etapa, induzidos a encontrar o reforço. Os ratos apresentam relativo aprendizado em diferenciar os braços já visitados daqueles não visitados (memória de trabalho) enquanto aprendem a localizar o braço onde sempre está a comida (memória de referência) (STOLBERG, 2005). 31 FIGURA 12. Labirinto Octogonal. Fonte: Arquivo pessoal. Outro dos aspectos da neurotoxicidade que podem ser estudados através dos testes comportamentais é o da ansiedade/emocionalidade. Algumas tarefas experimentais têm sido utilizadas para estudar este componente comportamental. A arena de campo aberto (Figura 13) é o mais antigo dos testes de ansiedade que são baseados na exploração espontânea de um novo ambiente (BEHR et al., 2009). O campo aberto foi criado em 1934 e é utilizado para avaliar a atividade locomotora, exploração e emocionalidade de roedores (MARTINS, 2009). Nele, o animal com ansiedade elevada demora para utilizar o centro do aparelho, ja que deambular junto às paredes lhe traz maior sentido de proteção (MARTINS, 2009). Um dos fatores relevantes na observação do comportamento do animal é a sua tendência a movimentar-se, conhecida como atividade geral. A quantificação dessa locomoção pode refletir o comportamento, uma vez que o animal permanecerá imóvel (freezing) quando apresentar alto grau de ansiedade. Nesse sentido, a exploração do roedor é inversamente proporcional ao medo ou emocionalidade (UDO, 2012). Além da locomoção, o comportamento de levantar (animal apoiado nas patas traseiras, eleva o tronco para farejar o ambiente verticalmente) é a manifestação de um processo exploratório de aproximação das regiões modificadas do ambiente (SILVA, 2008; MARTINS, 2009; UDO, 2012). 32 FIGURA 13. Arena de Campo Aberto. Fonte: Arquivo pessoal. O comportamento de auto-limpeza (grooming) observado no campo aberto, tem sido tomado como a expressão de um decréscimo na emocionalidade e mostra independência das situações de medo (MARTINS, 2009; UDO, 2012). O teste de campo aberto é considerado como um indicador do estado emocional do animal e é comumente utilizado para triagem farmacológica de drogas que atuam sobre o sistema nervoso central (TERÇARIOL, 2007). O teste de labirinto em cruz elevado (LCE) (Figura 14) foi criado por Montgomery em 1955 e é um dos principais modelos usados no estudo da ansiedade. Esse teste é baseado no comportamento exploratório de locais novos e na observação de respostas comportamentais em situações que poderiam ou não provocar perigo; ele consiste em analisar o grau de aversão do animal aos braços abertos, em conflito com o comportamento exploratório (UDO, 2012), já que ambientes abertos, sem proteção lateral, são naturalmente aversivos para o roedor (MARTINS, 2009). A exposição aos braços abertos do LCE produz significativamente mais ansiedade quando comparada à exposição aos braços fechados. Drogas ansiolíticas elevam o tempo gasto pelos roedores nos braços abertos quando comparados com o tempo gasto nos braços fechados e, em contraste, drogas ansiogênicas diminuem o tempo gasto nos braços abertos (SILVA, 2008; MARTINS, 2009). 33 FIGURA 14. Labirinto em Cruz Elevado. Fonte: Arquivo pessoal. O LCE é um excelente modelo para avaliar as drogas com ação GABAérgica e via glutamato (MARTINS, 2009). O GABA tem sido associado com amplo espectro de funções fisiológicas e em estados de doenças incluindo ansiedade e depressão (SILVA, 2008; MARTINS, 2009). O labirinto foi validado farmacologicamente por Pellow em 1985 (MARTINS, 2009). Os comportamentos ofensivos e defensivos de ratos têm elos comuns com a agressão humana, sendo utilizados tanto em estudos de neurofisiologia e neurofarmacologia da agressão, como em modelos de transtornos psiquiátricos (PÓVOA, 2007). Os comportamentos agressivos de ratos podem ser induzidos por estimulação do hipotálamo lateral ou lesões do bulbo olfatório, núcleo amigdaloide, região septal e hipotálamo. Os efeitos das lesões sobre comportamentos agressivos variam conforme a localização da lesão (PÓVOA, 2007). O comportamento agressivo pronunciado de ratos de laboratório é acompanhado por um elevado nível de atividade neuronal dentro do núcleo paraventricular (BEIDERBECK et al., 2012). De acordo com estes autores, os maiores níveis de agressão em ratos de laboratório machos são acompanhados por uma atividade neuronal excessiva. Além disso, de acordo com Serra (2010), com o aumento no nível de cortisol ocorre também um aumento da agressividade. O modelo do paradigma do rato residente-intruso foi utilizado 34 para avaliação da agressividade de acordo com o descrito em Terçariol et al. (2011). Esse método permite a observação da interação social e comportamento ofensivo do animal residente bem como elementos defensivos do intruso refletindo a agressão intraespecífica (KOOLHAAS e BOHUS, 1991). O aparelho Hole-Board (Figura 15) oferece um método simples de medir as respostas de um rato a um ambiente novo e tem sido amplamente utilizado para avaliar os efeitos de drogas (FILE e WARDILL, 1975). Trata-se de um aparelho que tem sido utilizado para avaliar comportamentos de coordenação motora e comportamento exploratório frente à exposição de agentes químicos neurotóxicos (KUC et al., 2006; GODINHO et al. 2014). FIGURA 15. Hole-Board. Fonte: Arquivo pessoal. 2.3.3 Perfil bioquímico Com frequência, a avaliação bioquímica sérica é utilizada para avaliar a saúde de pacientes mamíferos não domésticos (THRALL, 2006). Na experimentação animal, esta avaliação pode ajudar a entender e às vezes caracterizar a relação de processos danosos que compõem o quadro geral de intoxicação. 35 2.3.3.1 Acetilcolinesterase (AChE) A AChE é a enzima envolvida na hidrólise de acetilcolina, localizada preferencialmente em neurônios e axônios. A atividade da AChE tem sido relacionada com ações colinérgicas e não colinérgicas tais como, por exemplo, o crescimento axonal e a sinaptogênese, bem como em processos neurodegenerativos (BAVARESCO, 2008). Além disso, modificações nas funções colinérgicas parecem estar associadas a prejuízos na memória/aprendizado (BAVARESCO, 2008; GONÇALVES, 2012). As concentrações de acetilcolina (ACh), como os inibidores da acetilcolinesterase (AChE), são ferramentas terapêuticas conhecidas para melhorar deficiências cognitivas associadas com doenças neurodegenerativas (SILVEIRA et al., 2013). 2.3.3.2 Perfil hepático As enzimas presentes em amostras séricas ou de plasma comumente utilizadas no diagnóstico de doença hepática em roedores incluem Fosfatase Alcalina (ALP), γ-glutamiltransferase (GGT), Aspartato Aminotransferase (AST), Alanina Aminotransferase (ALT) Lactato Desidrogenase (LDH) e Sorbitol Desidrogenase (SDH). A concentração sérica ou plasmática dessas enzimas aumenta quando há maior produção, maior liberação ou menor clearance da enzima (THRALL, 2006). AST é uma enzima citosólica e mitocondrial com alta atividade no fígado, no coração, no músculo esquelético e nos rins. O aumento da atividade plasmática ou sérica de AST geralmente está associado à lesão de fígado, músculo cardíaco ou músculo esquelético (THRALL, 2006). A ALT é utilizada como marcadora da função hepática. O aumento da atividade sérica desta enzima é considerado indicador de danos nas células do fígado de mamíferos (SILVA, 2010). Na maioria dos roedores, a atividade sérica ou plasmática de ALT aumenta com lesão hepatocelular; a enzima parece ser específica de fígado de ratos e camundongos. Em ratos, existe correlação entre o aumento da atividade 36 sérica de ALT e o grau de necrose hepática. Como curiosidade, verifica-se o aumento de três vezes na atividade plasmática de ALT de camundongos contidos manualmente pelo corpo, em comparação com aqueles seguros pela cauda (THRALL, 2006). 2.3.3.3 Cortisol A resposta primária de estresse é a ativação dos centros cerebrais, o que resulta em liberação de catecolaminas e corticosteroides, este último representado pelo cortisol. A elevação do cortisol no sangue pode ser considerada um indicador de estresse (SERRA, 2010). A presença de estresse agudo leva a alteração na concentração plasmática do cortisol. Em resposta a este estímulo ocorre aumento na secreção deste hormônio, e os seus níveis plasmáticos podem atingir valores até seis vezes superiores em relação ao valor basal, sendo que esta elevação é proporcional à gravidade do desequilíbrio da homeostase (MELLO, 2007). De acordo com Dietrich et al. (2013), em crianças níveis maiores de cortisol estão relacionados com a ansiedade e níveis mais baixos de cortisol associados com a agressão. 2.3.4 Avaliação histopatológica A análise histológica é uma importante ferramenta nos estudos toxicológicos, uma vez que alterações na estrutura e organização das células, tecidos e órgãos permitem a identificação da lesão tissular e orgânica, essencial na definição dos padrões morfológicos e clínicos da doença (GRANCE, 2007). A utilização de técnicas de histopatologia na verificação de alterações causadas pela ação de produtos tóxicos tem se mostrado muito eficaz e uma importante ferramenta na avaliação dos danos causados por esses produtos nos sistemas dos organismos estudados. Conforme o aumento da concentração do produto químico utilizado, maiores são os danos causados no organismo; como exemplo, em estudos realizados previamente, as alterações 37 ultraestruturais dos hepatócitos expostos ao fipronil foram proporcionais ao aumento da concentração do produto (FERREIRA, 2010). Existe associação entre histopatologia hepática e alterações séricas de ALT. A interação entre o estudo histológico e a avaliação bioquímica é particularmente uma vantagem para o toxicologista, colaborando efetivamente na identificação da intoxicação (GRANCE, 2007). CAPÍTULO 2. Trabalho a ser submetido à revista Pesticide Biochemistry and Phisiology Exposição perinatal ao fipronil provoca susceptibilidade aumentada de efeitos comportamentais agressivos e de ansiedade em filhotes machos de ratos (Perinatal fipronil exposure provoke an increased susceptibility of aggressivity and anxiety behavioral effects in male offspring rats) Francisco Pizzolato Montanhaa*, Caique Aparecido Fariab, Faber Daniel Machadob, Fábio Anselmoc, Antonio Francisco Godinhod, Noeme Sousa Rochae a Doutorando na Universidade Estadual Paulista, Botucatu-SP, Brasil. chicopm28@yahoo.com.br.*autor para correspondência b Iniciação científica na Universidade Estadual Paulista, Botucatu-SP, Brasil. caiquefaria32@hotmail.com; faber.machado@hotmail.com c Mestrando na Universidade Estadual Paulista, Botucatu-SP, Brasil. anselmof_unesp@yahoo.com.br. d Docente na Universidade Estadual Paulista, Botucatu-SP, Brasil. godinho@ibb.unesp.br e Docente na Universidade Estadual Paulista, Botucatu-SP, Brasil. rochanoeme@fmvz.unesp.br RESUMO Exposição perinatal a praguicidas tem sido associada com alterações no desenvolvimento neurocomportamental da prole. Este estudo teve como objetivo avaliar os comportamentos de ansiedade e agressividade em filhotes de ratas Wistar expostas ao fipronil no período perinatal. Para isto, ratas gestantes foram distribuídas em cinco grupos (n=15) assim constituídos: controle (Ct) e expostas - gestação (G), lactação (L), gestação mais lactação (G+L) 7-14 e gestação mais lactação (G+L) 1-21. Ansiedade foi avaliada utilizando-se o Labirinto em Cruz Elevado (LCE) e agressividade, utilizando-se o paradigma do animal residente/intruso. Foram quantificados o nível do cortisol no sangue e o fipronil e metabólitos (sulfona e dessulfinil) no cérebro dos filhotes dos diferentes grupos. Os resultados obtidos mostram que houve aumento nos comportamentos de ansiedade e agressividade principalmente no grupo lactação; a dosagem de cortisol aumentou na prole jovem, mas não na adulta; fipronil e fipronil sulfona foram detectados no cérebro da prole jovem e não no da adulta. Conclui-se que a exposição perinatal ao fipronil aumentou os comportamentos de agressividade e ansiedade, confirmando sua toxicidade sobre o neurodesenvolvimento da prole, principalmente na fase jovem da vida dos animais. Palavras-chave: Cortisol, Fenilpirazól, Labirinto em Cruz Elevado, Metabólitos, Sulfona, Dessulfinil. ABSTRACT Perinatal exposure to pesticides has been associated with changes in neurobehavioral development of the offspring. This work aimed to evaluate anxiety and aggressive behavior in Wistar rat offspring, exposed to fipronil in the perinatal period. For this, pregnant rats were distributed into five groups (N = 15) constituted as follows: control (Ct) and exposed - gestation (G), lactation (L), gestation and lactation (G + L) 7-14, gestation and lactation (G + L) 1-21. Anxiety was assessed using the Elevated Plus Maze (LCE) and aggression, using the paradigm of rat resident/intruder. The level of cortisol in the blood and fipronil and their metabolites (sulfone and dessulfinil) were quantified in the brain of the offspring of different groups. The results show that there was an increase in anxiety and aggression behaviors, especially in the lactation group; the cortisol increased in young offspring, but not in adults; fipronil and fipronil sulfone were detected in the brains of young pups and not in adults. It is concluded that perinatal exposure to fipronil increased anxiety and aggression behavioral, confirming the toxicity on offspring neurodevelopment, especially in the young stage of life of the animals. Keywords: Cortisol, Phenylpyrazole, Elevated Plus Maze, Metabolites, Sulfone, Dessulfinil. 39 1. Introdução Recentemente, relatos científicos têm evidenciado que é elevado o potencial de toxicidade dos praguicidas para animais e humanos e a associação do uso indiscriminado destas substâncias com alterações do neurodesenvolvimento em crianças, tem chamado a atenção para os vários problemas decorrentes da sua utilização e as exposições que ocorrem no período perinatal [1-3]. A exposição a praguicidas por um pequeno intervalo de tempo pode causar sérios efeitos sobre o desenvolvimento de fetos, tanto de animais como de humanos e, após o nascimento tem sido observados sequelas como dificuldade de aprender, diminuição dos reflexos, esterilidade, além do aumento da suscetibilidade para câncer e outras doenças [4,5]. Fipronil (5-amino-1-[2,6-dichloro-4-(trifluoromethyl)phenyl]- 4-[(trifluoro- methyl) sulfinyl] -1H-pyrazole -3-carbonitrile) é um praguicida, derivado quimicamente da família do fenilpirazol ou fiproles que tem como alvo o receptor do ácido gama amino butírico (GABA) [6]. Possui amplo espectro de ação [7], é extremamente ativo [8] e altamente eficaz [7,9]. É usado na agricultura contra uma grande variedade de pragas que infestam alimentos [6,10,11], controle das pragas veterinárias [12], tendo sido designado pela agência de proteção ambiental (EPA) como alternativa ao uso de organofosforados para o controle de cupins e formigas. No entanto, várias questões foram levantadas sobre os efeitos adversos do fipronil na saúde pública, por ser largamente comercializado e utilizado no ambiente doméstico [12,13]. Apesar de sua propagada seletividade contra insetos [14-16], o fipronil também se liga a receptores GABAérgicos de mamíferos [15,17-19]. O principal metabólito sulfona, bem como seu produto de fotodegradação dessulfinil, são considerados mais tóxicos a insetos, mamíferos, peixes e pássaros, do que o composto original [20]. Apesar da neurotoxicidade dos fenilpirazóis ser bem caracterizada e seu mecani