Revista Brasileira de Oftalmologia PUBLICAÇÃO OFICIAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE OFTALMOLOGIA Publicação bimestral ISSN 0034-7280 Indexada na LILACS Opacidades multicoloridas nitidamente mais concentradas na região central da LIO Publicação bimestral vol. 65 - nº 1 - Janeiro/Fevereiro 2006 1 Publicação bimestral Rev Bras Oftalmol, v. 65, n.1, p. 1-66, Jan/Fev. 2006 Oftalmologia Revista Brasileira de PUBLICAÇÃO OFICIAL DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE OFTALMOLOGIA Indexada na LILACS Disponível eletronicamente no site: www.sboportal.org.br ISSN 0034-7280 Editor Chefe Raul N. G. Vianna - Niterói - RJ Co-editores Acacio Muralha Neto - Rio de Janeiro - RJ Arlindo José Freire Portes - Rio de Janeiro - RJ Marcelo Palis Ventura - Niterói - RJ Riuitiro Yamane - Niterói - RJ Corpo Editorial Internacional Baruch D. Kuppermann - Long Beach, CA, EUA Christopher Rapuano - Phyladelphia - EUA Howard Fine - Eugene - EUA Jean-Jacques De Laey - Ghent - Bélgica Lawrence P. 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Rehder - São Paulo - SP Laurentino Biccas Neto - Vitória - ES Leiria de Andrade Neto - Fortaleza - CE Liana Maria V. de O. Ventura - Recife - PE Manuel Augusto Pereira Vilela - Porto Alegre - RS Maurício Bastos Pereira - Rio de Janeiro - RJ Marcio Bittar Nehemy - Belo Horizonte - MG Marco Rey - Natal - RN Marcos Ávila - Goiania - GO Maria de Lourdes Veronese Rodrigues - Ribeirão Preto - SP Maria Rosa Bet de Moraes Silva - Botucatu - SP Mario Martins dos Santos Motta - Rio de Janeiro - RJ Mário Monteiro - São Paulo - SP Mariza Toledo de Abreu - São Paulo - SP Miguel Ângelo Padilha - Rio de Janeiro - RJ Milton Ruiz Alves - São Paulo - SP Nassim Calixto - Belo Horizonte - MG Newton Kara-José - São Paulo - SP Octávio Moura Brasil - Rio de Janeiro - RJ Paulo Augusto de Arruda Mello - São Paulo - SP Paulo Schor - São Paulo - SP Remo Susana Jr - São Paulo - SP Renato Ambrósio Jr. - Rio de Janeiro - RJ Renato Curi - Niterói - RJ Roberto Lorens Marback - Salvador - BA Rubens Camargo Siqueira - São João do Rio Preto - SP Sebastião Cronemberger - Belo Horizonte - MG Silvana Artioli Schellini - Botucatu - SP Suel Abujâmra - São Paulo - SP Tadeu Cvintal - São Paulo - SP Valênio Peres França - Belo Horizonte - MG Virgílio Centurion - São Paulo - SP Walton Nosé - São Paulo - SP Wesley Ribeiro Campos - Passos - MG Yoshifumi Yamane - Rio de Janeiro - RJ Redação: Rua São Salvador, 107 Laranjeiras CEP 22231-170 Rio de Janeiro - RJ Tel: (0xx21) 2557-7298 Fax: (0xx21) 2205-2240 Tiragem: 5.000 exemplares Edição: Bimestral Editoração Eletrônica: Marco Antonio Pinto DG 25341RJ Publicidade: Sociedade Brasileira de Oftalmologia Responsável: João Diniz Revisão: Eliana de Souza FENAJ-RP 15638/71/05 Normalização: Edna Terezinha Rother Assinatura Anual: R$240,00 ou US$210,00 2 Rua São Salvador, 107 - Laranjeiras - CEP 22231-170 - Rio de Janeiro - RJ Tels: (0xx21) 2557-7298 / 2205-7728 - Fax: (0xx21) 2205-2240 - e-mail: sbo@sboportal.org.br - www.sboportal.org.br Revista Brasileira de Oftalmologia, ISSN 0034-7280, é uma publicação bimestral da Sociedade Brasileira de Oftalmologia Diretoria da SBO 2005-2006 Presidente Yoshifumi Yamane Vice-presidente Luis Carlos Pereira Portes Vice-presidentes regionais Edna Almodin Marcos Ávila Roberto Lorens Marback Sebastião Cronemberger Secretário Geral Octávio Moura Brasil 1º Secretário Aderbal de Albuquerque Alves Jr. 2º Secretário Eduardo França Damasceno Tesoureiro Eduardo Takeshi Yamane Diretor de Cursos Armando Stefano Crema Diretor de Publicações Raul N. 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Experimental study in rabbits with transmission and scanning electron microscopy Maria Rosa Bet de Moraes Silva, Elisa Aparecida Gregório 28 Análise comparativa de custo entre diferentes implantes de drenagem para o tratamento do glaucoma Comparative cost evaluation between differents implants used in glaucoma treatment Rodrigo Angelucci, Walter Gomes Amorim, José Ricardo Rehder 36 Vitrectomia sob alta pressão com retinotomia puntiforme (cirurgia da PVR sem uso de perfluocarbono) High pressure vitrectomy “puncture” retinomy (PVR surgery without perfluorocarbon liquids use) Rubens Camargo Siqueira, Cláudio Dalloul, Daniel da Rocha Lucena, José Augusto Cardillo, Rodrigo Jorge 43 Planejamento estratégico para a implantação do centro cirúrgico oftalmológico de referência em Palmas – Tocantins Strategist planning for the implatation of the ophthalmological surgical center the reference in Palmas – Tocantins Samantha Lustoza Marques de Souza, Abelardo de Souza Couto Junior 4 Relato de caso 48 Opacificação de lentes intra-oculares de PMMA Opacification of PMMA intraocular lenses Lorena Zbyszynski Almeida, Ângelo Ferreira Passos 54 Melanoma de Coróide: relato de caso insuspeito Misdiagnosed choroidal melanoma case report Silvana Artioli Schelllini, Josenylda Calixto Barros , Vanessa Queiroz Loureiro, José Vicente Tagliarini, Eduardo Queiroga Artigo de revisão 58 Tratamento do Retinoblastoma Retinoblastoma Treatment Eduardo Ferrari Marback, Roberto Lorens Marback Instruções aos autores 65 Normas para publicação de artigos na RBO 5 R ecentemente, novas e valiosas informações fornecidas por importantes estudos prospectivos e multicêntricos trouxeram mudanças conceituais. Seus resultados têm alterado paradigmas e modificado a prática oftalmológica, colaborando na prevenção da cegueira pelo glaucoma. Tudo teve início com as descobertas sobre o processo secundário de morte autopropagável das células ganglionares da retina, conhecido como apoptose. Além disso, os recentes conhecimentos de genética e biologia molecular iniciam o difícil esclarecimento da patogênese dessa doença que é um grave problema de saúde pública. O glaucoma é a segunda maior causa de cegueira no mundo. Para o tratamento do glaucoma está revalorizada, consistentemente, a importância da redução da pressão intra-ocular (PIO) e da sua manutenção em níveis bem baixos e constantes. Aqui, cabe ressaltar que a aferição da PIO pela tonometria de aplanação de Goldmann está sujeita a influências da curvatura, espessura e citoarquitetura da córnea. Quanto a espessura, já está razoavelmente estabelecida a sua influência, apesar de ainda não existir uma fórmula para correção universalmente aceita; já o último fator ainda é difícil de ser considerado na prática clínica. Hoje, somos mais agressivos no tratamento do portador de glaucoma e muito mais rigorosos nos métodos empregados para avaliar o seu sucesso 1-3. Os exames seriados com fotos estereoscópicas da papila, as avaliações quantitativas do nervo óptico e da camada de fibras nervosas da retina e o estudo das subpopulações de células ganglionares da retina proporcionam melhor avaliação de hipertensos oculares e de portadores de glaucoma. Os novos softwares dos modernos equipa- mentos trazem algoritmos cada vez mais elaborados e eficientes para a detecção do glaucoma 4. Os testes eletrofisiológicos (por exemplo, o potencial evocado multifocal), que demonstram boa concordância com a perimetria, começam a ser estudados rotineiramente e parecem fornecer diagnósticos ainda mais precoces e objetivos. O diagnóstico precisa ser precoce, a terapêutica prescrita tem que ser eficiente, mas o paciente também precisa ter fidelidade ao tratamento 5. Para isso ele precisa ser educado 6. No atual sistema vigente de sáude pública no país não podemos ter o luxo de dar “aulas particulares” aos nossos doentes. A Associação Brasileira de Portadores de Glaucoma,Amigos e Familiares (ABRAG) presta um importante trabalho social na luta para a preservação da visão em portadores de glaucoma (www.abrag.com.br). O custo da efetividade das ações dessa instituição é constan- temente analisado e tem proporcionado resultados muito animadores. Na escolha da PIO que irá preservar a função visual do portador de glaucoma (PIO-Alvo), consideramos os seus fatores de risco prognóstico. Iniciamos com o tratamento clínico e, se necessário, indicamos a laserterapia ou a cirurgia. Constantemente novos fatores de risco prognóstico são discutidos na comunidade científica, como, por exemplo, a importância da pressão arterial, sistólica e diastólica, na variação diurna da PIO 7. A trabeculoplastia a laser, atualmente, é indicada nos casos de glaucoma primário de ângulo aberto não muito avançados, nos quais o tratamento clínico não é possível; nos casos de glaucoma na síndrome de esfoliação e nos casos de glaucoma pigmentar. É necessário lembrar que ela pode reduzir, em média, até 30% da PIO inicial, com perda da eficácia de 10% ao ano. A trabeculoplastia seletiva é muito promissora, porém requer equipamento de alto custo e com uso restrito. A cirurgia do glaucoma também está evoluindo? Procuramos constantemente, novos procedimentos cirúrgicos com menor número e gravidade de complica- ções a longo prazo, porém que sejam capazes de controlar adequadamente a PIO. O procedimento ideal deve preservar a função visual, mantendo a PIO constantemente em valores entre 8 a 10 mmHg, em casos de glaucoma em estadios avançados, sem medicação complementar, e não promovendo riscos de complicações a longo prazo. A trabeculectomia é ainda a cirurgia mais indicada para o tratamento do GPAA. O uso de drogas antimetabólitas, com ação antifibrótica (mitomicina C e 5-fluorouracil (5-FU) já está sedimentado8-10, devendo ser considerado na maior parte dos pacientes que serão submetidos à TREC, devendo-se pesar o risco estimado de fibrose e de complicações pós-operatórias11. O adequado pós-operatório, com intervenções como a lise de sutura, o agulhamento e injeções de 5-FU, faz com que muitos casos não necessitem de tratamento clínico complementar. Não podemos adotar no pós-operatório condutas padrões para todos os casos. As técnicas não podem ser “congela- das” e sim adequadas a cada paciente. EDITORIAL Glaucoma: Novos horizontes Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 5-6 6 Glaucoma: Novos horizontes Rev Bras Oftalmol. 2005; 66 (1): 5-6 E os procedimentos não-penetrantes, como a esclerotomia profunda? A Sociedade Brasileira de Glaucoma (SBG) em seu Consenso de 2005 fez a seguinte referência:“Esta técnica tem sido recentemente indicada em casos selecionados de glaucoma primário de ângulo aberto, contudo sua eficácia não foi comprovada em estudos de longo prazo” 12. O consenso da Association of International Glaucoma Societies (AIGS) sobre cirurgia do GPAA concluiu que essa é uma técnica alternativa à TREC para redução moderada da PIO e que sua falência pode comprometer o sucesso de uma TREC subseqüente.11 O consenso da SBG faz a seguinte indicação para os procedimentos ciclodestrutivos: “Quando não existe possibilidade da realização das cirurgias filtrantes (trabeculectomia, cirurgias não-penetrantes e implantes de drenagem)”.12 Os implantes de drenagem também têm evoluído muito. Hoje, os novos dispositivos de drenagem são efeti- vos para o tratamento de glaucomas refratários 13. Porém, as complicações continuam a existir e o cirurgião deve estar preparado para resolvê-las. As possíveis intercorrências das cirurgias incisionais não devem retardar a sua indicação. Em muitos casos, é a única possibilida- de de preservarmos a visão do enfermo. Em casos avançados dessa doença, que promove danos irreversíveis e piora a qualidade de vida do paciente, o prognóstico cirúrgico é mais reservado. Não devemos ser precipitados, nem tampouco retardar a indicação cirúrgica. Temos que desejar aprender sempre e mudar constantemente, pois há novos horizontes na constante luta contra a cegueira promovida pelo glaucoma. Prof. dr. Paulo Augusto de Arruda Mello Professor adjunto e da pós-graduação do departamento de Oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP) - Brasil 1. The Advanced Glaucoma Intervention Study (AGIS): 7. The relationship between control of intraocular pressure and visual field deterioration. The AGIS Investigators. Am J Ophthalmol. 2000;130(4):429-40. 2. Lichter PR, Musch DC, Gillespie BW, Guire KE, Janz NK, Wren PA, Mill RP; CIGTS Study Group. Interim clinical outcomes in the Collaborative Initial Glaucoma Treatment Study comparing initial treatment randomized to medications or surgery. Ophthalmology. 2001;108(11):1943-53. 3. The effectiveness of intraocular pressure reduction in the treatment of normal-tension glaucoma. Collaborative Normal-Tension Glaucoma Study Group. Am J Ophthalmol. 1998;126(4): 498-505. 4. Boden C, Pascual J, Medeiros FA, Weinreb RN, Sample PA. Relationship of SITA and full-threshold standard perimetry to frequency-doubling technology perimetry in glaucoma. Invest Ophthalmol Vis Sci. 2005;46(7):2433-9. 5. Schwartz GF. Compliance and persistency in glaucoma follow-up treatment. Curr Opin Ophthalmol. 2005;16(2):114-21. Review. 6. Mansukani SS. Improving adherence to drug-treatment regimens for glaucoma. Manag Care. 2002;11(11 Suppl):49-53. 7. Sehi M, Flanagan JG, Zeng L, Cook RJ, Trope CE. Relative change in diurnal mean ocular perfusion pressure: a risk factor for the diagnosis of primary open-angle glaucoma. Invest Ophthalmol Vis Sci. 2005;46(2):561-7. 8. Parrish RK 2nd , Schiffman JC, Feuer WJ, Heuer DK; Fluorouracil Filtering Surgery Study Group. Prognosis and risk factors for early postoperative wound leaks after trabeculectomy with and without 5-fluorouracil. Am J Ophthalmol. 2001;132(5):633-40. 9. Five-year follow-up of the Fluorouracil Filtering Surgery Study. The Fluorouracil Filtering Surgery Study Group. Am J Ophthalmol. 1996;121(4):349-66. 10. Wilkins M, Indar A, Wormald R. Intra-operative mitomycin C for glaucoma surgery. Cochrane Database Syst Rev. 2001; (1):CD002897. Review. 11. Carassa RG, Goldberg I. Non-penetrating glaucoma drainage surgery. In: Weinreb RN, Crowston JG. Glaucoma surgery - open angle glaucoma. The Hauge: Kugler Publications; 2005. p. 91. 12. Mello PAA, Mandia. Consenso Brasileiro de Glaucoma de Ângulo Aberto / Sociedade Brasileira de Glaucoma, 2a ed. São Paulo: PanMark; 2005. 13. Wilson MR, Mendis U, Paliwal A, Haynatzka V. Long-term follow-up of primary glaucoma surgery with Ahmed glaucoma valve implant versus trabeculectomy. Am J Ophthalmol. 2003;136(3):464-70. 7 Efeito midriático da tropicamida a 1%: vaporização x gota* Mydriatic effect of Tropicamide 1%: vaporization x drop Mônica Osório Tavares1, Arlindo José Freire Portes2 RESUMO Objetivo: Comparar a eficácia midriática da tropicamida a 1%, aplicada através de vaporizador em relação à instilação em gotas em olhos de crianças. Métodos: Crianças com idade entre 5 a 10 anos foram submetidas ao uso de 1 gota de tropicamida a 1% em um dos olhos e uma aplicação de vaporizador do mesmo midriático no olho contralateral; o diâmetro pupilar foi medido antes da aplicação e 10, 20, 30 minutos após. Resultados: Não houve diferença significativa da midríase produzida pelo vaporizador ou gota em cada paciente.Conclusão: O vaporizador apresenta efeito midriático clinicamente sig- nificativo na aplicação de tropicamida a 1%. Palavras chave: Efeito midriático, tropicamida a 1%, vaporização, gotas. Descritores: Pupila/efeito de drogas;Tropicamida/administração e dosagem; Adminis- tração tópica 1 Mestre em administração em OSftalmologia pela Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP) – Brasil; Doutoranda da Universidade de São Paulo - USP – São Paulo (SP) – Brasil; Membro o “staff” do Hospital Vita – Volta Redonda – (RJ) – Brasil; 2 Mestre e Doutor em Oftalmologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ – Rio de Janeiro (RJ) – Brasil; Professor Adjunto da Universidade Estácio de Sá - UNESA – Rio de Janeiro (RJ) – Brasil; Coordenador do curso de especialização em Oftalmologia do Hospital Geral de Bonsucesso – HGB – Rio de Janeiro (RJ) – Brasil. *Trabalho realizado no ambulatório de Oftalmologia do Hospital São João Batista - Volta Redonda ( RJ) - Brasil. Recebido para publicação em: 01.10.04 - Aceito para publicação em 10.11.05 ARTIGO ORIGINAL Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 7-12 8 INTRODUÇÃO A via de administração de drogas para o globo ocular mais usada em oftalmologia é a via tópica, que consiste na aplicação do princípio ativo do medicamento em um veículo que se mistura diretamente com o filme lacrimal, como por exemplo, uso de pomadas e principalmente, através de gotas de colírio. O uso de gotas, freqüentemente, apresenta efei- tos desagradáveis como a sensação de ardência, lacrimejamento, queimação e até alteração do compor- tamento emocional, principalmente em crianças que após o desconforto ocular da primeira aplicação de uma medicação por via tópica, freqüentemente choram copi- osamente, diminuindo o tempo de contato do princípio ativo com a córnea, reduzindo também a sua absorção. A aplicação de uma segunda dose da medicação por via tópica é muito mais difícil do que a primeira, tanto para o médico ou auxiliar, como para o profissional de saúde designado para tal, pois a criança evita abrir as pálpe- bras, mantendo-as fechadas e movimenta a cabeça, de modo a evitar que o frasco de colírio fique próximo aos olhos. Isso também ocorre com adultos, embora de uma maneira menos freqüente(1-2). O uso de uma nova forma de aplicação de solu- ção oftálmica, vaporizada, pode facilitar a administra- ção de drogas por via tópica, principalmente em pacien- tes com altas ametropias, idosos, pós-operatórios e trau- mas oculares. Assim, evita-se a proximidade externa do frasco com os olhos, dificultando a contaminação da sua abertura ao tocar nas pálpebras ou conjuntiva e, tam- bém, facilitando a aplicação em crianças, o que pode ser feito por esta via muito mais rapidamente ou até com olhos fechados (1-4). OBJETIVO O objetivo deste trabalho é comparar a eficácia midriática da tropicamida a 1% aplicada através de vaporizador em relação a gotas em olhos de crianças saudáveis. MÉTODOS Foi feito um estudo em uma série de 40 crianças (80 olhos), onde se administrou a tropicamida a 1% na forma de gota em um olho e no outro por vaporização. Os olhos escolhidos para a administração de colírio e vaporização foram sorteados antes da aplicação. Me- diu-se o diâmetro pupilar, antes da instilação, e após 10, 20 e 30 minutos, em ambos os olhos, com régua milimetrada, colocada em posição horizontal em fren- te à pupila, enquanto o paciente mantinha-se na posi- ção primária do olhar. Todas as crianças eram saudáveis e não estavam usando medicações que pudessem afetar o diâmetro pupilar. Estas crianças vinham encaminhadas de esco- las públicas para rotina oftalmológica, no ambulatório geral do Hospital São João Batista na cidade de Volta Redonda. Critérios de exclusão: 1) Anisocorias e/ou qualquer alteração de diâ- metro pupilar; 2) Presença de qualquer doença sistêmica que afetasse o sistema nervoso autônomo. Métodos de aplicação: todas as crianças perma- neciam sentadas durante o estudo e foram instruídas a olhar para frente, recebendo iluminação de um foco su- perior dirigido para ao seu colo. O colírio foi aplicado em um dos olhos previa- mente sorteado, sempre da mesma forma e pelo mesmo médico, do seguinte modo: o paciente era instruído a le- vantar a cabeça e em seguida instilava-se 1 gota de colírio no saco conjuntival da pálpebra inferior. O frasco de colírio apresentava um volume de 5,0 ml, liberando por aplicação 1 gota com um volume aproximado de 0,07ml, medidas aferidas previamente em papel filtro. A vaporização foi feita no olho onde não foi apli- cado o colírio, sempre pelo mesmo médico, do seguinte modo: o paciente foi instruído a permanecer na posição primária do olhar e em seguida posicionava-se o frasco diretamente à frente e a aproximadamente 5 cm de dis- tância do olho do paciente e vaporizava-se a droga so- mente uma vez. O olho contralateral era ocluído pela mão do médico aplicador. Todo este processo foi feito com destreza e rapidez. O frasco utilizado foi de plástico com 7 cm de altura por 2 cm de largura, apresentando um volume de 7 ml (figura 1). Cada vaporização liberou em média 0,1 ml de solução oftálmica, o que corresponde a aproximadamente 2 gotas de colírio em uma área de dispersão circular de 5,5 cm de diâmetro (medidas aferidas em papel filtro). Este frasco não está disponível para uso comercial e, portanto, foi esterilizado em óxido de etileno antes do estudo e a tropicamida a 1% foi introduzida neste recipiente de forma estéril através de manipulação em centro cirúrgico. Todos os olhos foram examinados previamente na lâmpada de fenda. No final dos 30 minutos, após a última medida do diâmetro pupilar, eles foram nova- mente avaliados por biomicroscopia para descartar qual- quer alteração corneana. As pálpebras também foram Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 7-12 Tavares MO, Portes AJF 9 examinadas ectoscopicamente, para descartar alguma sensibilidade na área de dispersão do vaporizador. No dia seguinte, se repetiu o exame, e o paciente foi questi- onado sobre qualquer queixa, como por exemplo: pruri- do ou edema palpebral. RESULTADOS A idade das crianças examinadas variou de 5 a 10 anos, com média de sete anos, sendo 25 crianças do sexo masculino e 15 do feminino, 22 de cor branca, 9 pardos, 6 negros e 3 amarelos. Na tabela 1, é mostrada a variação do diâmetro pupilar em função do tempo, para 10, 20 e 30 minutos através da administração de tropicamida a 1% na forma de gota. Na tabela 2, é apresentada a mesma variação através da vaporização. Para melhor visualização, a variação do valor médio do diâmetro pupilar antes e após 10, 20 e 30 mi- nutos da aplicação da tropicamida a 1% em gotas ou por vaporização está representado na figura 2. DISCUSSÃO A medicação oftálmica aplicada por vaporiza- ção representa uma alternativa para administração de soluções oftalmológicas que podem se tornar menos ir- ritantes ou desconfortáveis, quando comparadas com apli- cação de solução oftálmica em forma de gotas. No presente trabalho, onde se comparou a eficá- cia da aplicação de 1 gota de tropicamida a 1% através de colírio, contra vaporização em crianças emétropes, não se observou diferenças significativas na midríase resultante de ambos os processos de aplicação. Ismal, Rouse e Land concluíram que não havia diferença, estatisticamente significativa, quanto à cicloplegia causada pela aplicação de hidrocloreto de ciclopentolato a 1% ou instilação de 1 gota no olho aberto de 37 crianças hipermétropes(6). Benavides et al., em 1997, demonstraram que não havia diferença, esta- tisticamente significativa, na midríase causada por solu- ções oftálmicas de tropicamida a 1%, associada a fenilefrina a 2,5%, aplicadas através de gotas com pál- pebras abertas ou vaporização em pálpebras fechadas(4). Estes autores confirmaram a eficiência deste método, também relatado por outros pesquisadores (7-8). Em nosso trabalho, também observamos efeito midriático seme- lhante ao da tropicamida a 1% instilada na forma de gotas ou através de uma vaporização. Após extensa pes- quisa bibliográfica, não encontramos artigos sobre va- porização de drogas para olhos no Brasil. Através do uso de vaporização, pode-se evitar a contaminação da solução oftálmica devido à alta velo- cidade de saída do fluxo da medicação liberada para o olho, além de permitir aplicação a distância, evitando qualquer contato da superfície do frasco com o olho. Por fim, a rapidez do mecanismo de aplicação e a conveni- ência de não ter de conter a criança no momento da vaporização também foi uma grande vantagem obser- vada neste trabalho. Pacientes que usam colírio e apresentam baixa acuidade visual, principalmente para perto, podem en- costar a extremidade do frasco em suas pálpebras, favo- recendo sua contaminação ou errar no posicionamento correto do frasco, e assim diminuir a quantidade adequa- da do medicamento liberado para o saco conjuntival. O desperdício de medicação nestes pacientes pode vir a onerar o tratamento, ou seja, fazer o frasco terminar an- Figura 1 – Frasco ut ilizado para vaporizar a solução oftálmica Figura 2 – Variação do diâmetro pupilar em função d o tempo Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 7-12 Efeito midriático da tropicamida a 1%: vaporização x gota 10 tes do tempo previsto. A vaporização tem um volume liberado por apli- cação que equivale a aproximadamente 2 gotas. Portan- to, considerando pacientes com boa visão que não des- perdiçam gotas de colírio, se compararmos a quantidade de medicação liberada em uma instilação de gota com uma aplicação de vaporizador, a economia é maior com o uso da gota.Todavia, o frasco utilizado no trabalho foi adaptado para aplicação tópica de medicação oftálmi- ca. Provavelmente, a indústria farmacêutica poderia ela- borar vaporizadores com liberação equivalente em quantidade a uma gota de colírio e até com área de dis- Pacientes Tempo Diâmetro Tempo Diâmetro Tempo Diâmetro Tempo Diâmetro (min) (mm) (min) (mm) (min) (mm) (min) (mm) 1 0 3 10 6 20 6 30 6 2 0 3 10 5 20 6 30 6 3 0 2 10 5 20 5 30 6 4 0 3 10 6 20 7 30 7 5 0 3 10 6 20 7 30 7 6 0 3 10 5 20 7 30 7 7 0 3 10 6 20 7 30 7 8 0 2 10 4 20 7 30 7 9 0 3 10 4 20 7 30 7 10 0 3 10 6 20 7 30 6 11 0 3 10 5 20 6 30 6 12 0 3 10 5 20 6 30 6 13 0 3 10 6 20 7 30 7 14 0 3 10 6 20 7 30 7 15 0 3 10 5 20 6 30 7 16 0 3 10 6 20 7 30 7 17 0 3 10 4 20 6 30 7 18 0 3 10 4 20 6 30 7 19 0 3 10 4 20 6 30 7 20 0 2 10 4 20 6 30 8 21 0 3 10 5 20 6 30 7 22 0 3 10 5 20 6 30 8 23 0 3 10 6 20 7 30 6 24 0 2 10 5 20 6 30 7 25 0 2 10 6 20 6 30 6 26 0 2 10 6 20 6 30 6 27 0 3 10 4 20 6 30 7 28 0 3 10 4 20 6 30 6 29 0 3 10 5 20 7 30 8 30 0 4 10 4 20 6 30 9 31 0 3 10 4 20 6 30 7 32 0 3 10 5 20 6 30 6 33 0 3 10 5 20 7 30 7 34 0 2 10 4 20 7 30 7 35 0 3 10 5 20 7 30 7 36 0 3 10 4 20 6 30 6 37 0 2 10 5 20 6 30 7 38 0 4 10 5 20 7 30 8 39 0 3 10 5 20 7 30 8 40 0 3 10 5 20 6 30 7 Média 0 3 10 5 20 6 30 7 Tabela 1 Variação do diâmetro pupilar em função dos tempos medidos com administração de tropicamida a 1% em forma de gota Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 7-12 Tavares MO, Portes AJF 11 Pacientes Tempo Diâmetro Tempo Diâmetro Tempo Diâmetro Tempo Diâmetro (min) (mm) (min) (mm) (min) (mm) (min) (mm) 1 0 3 10 4 20 5 30 6 2 0 3 10 3 20 4 30 5 3 0 2 10 6 20 6 30 6 4 0 3 10 6 20 7 30 7 5 0 3 10 6 20 7 30 7 6 0 3 10 6 20 6 30 8 7 0 3 10 6 20 8 30 8 8 0 2 10 4 20 6 30 7 9 0 3 10 4 20 6 30 7 10 0 3 10 4 20 5 30 6 11 0 3 10 3 20 4 30 5 12 0 3 10 6 20 6 30 6 13 0 3 10 6 20 7 30 7 14 0 3 10 6 20 7 30 7 15 0 3 10 6 20 6 30 8 16 0 3 10 6 20 8 30 8 17 0 3 10 4 20 7 30 7 18 0 3 10 4 20 7 30 7 19 0 3 10 4 20 7 30 7 20 0 2 10 4 20 7 30 8 21 0 3 10 6 20 6 30 7 22 0 3 10 6 20 8 30 8 23 0 3 10 4 20 7 30 6 24 0 2 10 4 20 7 30 7 25 0 2 10 4 20 5 30 6 26 0 2 10 4 20 4 30 7 27 0 3 10 6 20 6 30 8 28 0 4 10 6 20 7 30 8 29 0 3 10 4 20 7 30 7 30 0 3 10 6 20 6 30 6 31 0 3 10 6 20 8 30 7 32 0 2 10 4 20 6 30 8 33 0 3 10 4 20 6 30 8 34 0 3 10 6 20 7 30 7 35 0 2 10 4 20 6 30 7 36 0 4 10 6 20 6 30 7 37 0 3 10 6 20 8 30 8 38 0 3 10 6 20 7 30 8 39 0 2 10 4 20 5 30 6 40 0 2 10 4 20 5 30 6 Média 0 3 10 5 20 6 30 7 Tabela 2 Variação do diâmetro pupilar em função dos tempos medidos com administração de tropicamida a 1% em forma de vaporização persão menor. O volume de tropicamida aplicada nos olhos dos pacientes foi semelhante, apesar do maior volume de dro- ga vaporizada em cada aplicação, porque a vaporização foi realizada a uma distância de aproximadamente 5 cm do globo ocular, o que provoca uma área de dispersão da solução oftálmica em cerca de 5,5 cm de diâmetro. Consi- derando que a fenda palpebral apresenta em média 3 cm de comprimento por 1,2 cm de altura, as gotículas vapori- zadas são direcionadas também na pele que circunda a fenda palpebral e, portanto, aproximadamente o volume equivalente a uma gota de tropicamida foi vaporizada Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 7-12 Efeito midriático da tropicamida a 1%: vaporização x gota 12 para cada olho neste trabalho. Vaporizadores apresentam custo reduzido e já são utilizados comercialmente para aplicação de soluções antissépticas na pele, exemplo: merthiolato. Para aplica- ção de soluções oftálmicas eles não são comercializados, porém podem ser adaptados como descritos neste traba- lho, desde que se realize sua esterilização prévia do fras- co onde a droga será colocada. O vaporizador, num futuro próximo, poderá vir a ser um método de escolha para aplicação de drogas aos olhos pela via tópica, pois são práticos e podem causar menos problemas que a aplicação de colírios. CONCLUSÃO 1) O efeito midriático causado a partir da aplica- ção por vaporizador ou gotas de tropicamida a 1% se apresentou semelhante em olhos abertos; 2) O vaporizador pode ser uma alternativa para evitar a contaminação e o desperdício do medicamento, além de facilitar a aplicação de soluções oftálmicas em crianças. SUMMARY Purpose: To compare the mydriatic efficacy of tropicamide 1% delivered to eye by vaporization to drop. Methods: One drop of tropicamide 1% was instilled in one eye of Children, aged 5 to 10, and one vaporization of the same medication was applied in the other eye. The pupil diameter was measured before application and 10, 20 and 30 minutes after. Results: There was no significant difference in final pupil diameter whether drop instillation or vaporization was used.Conclusion: The vaporization presents mydriatic effect clinically significant with tropicamide 1%. Keywords: Mydriatic effects, tropicamide 1%, vaporization, drop. Keywords: Pupil/drug effects; Tropicamide/ administration & dosage;Administration, topical REFERÊNCIAS 1. Bartlett JD, Wesson MD, Swiatocha J, Woolley T. Efficacy of a pediatric cycloplegic administered as a spray. J Am Optom Assoc. 1993; 64(9):617-21. 2. Wesson MD, Bartlett JD, Swiatocha J, Woolley T. Mydriatic efficacy of a cycloplegic spray in the pediatric population. J Am Optom Assoc. 1993; 64(9):637-40. 3. Wong CY, Fan DS, Yu CB, Lam DS. 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Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 7-12 Tavares MO, Portes AJF 13 Avaliação dos resultados do transplante de membrana amniótica na reconstrução do simbléfaro Evaluation of the outcome of amniotic membrane transplantation for symblepharon reconstruction Luciana Frizon1, Waleska Belmino Chaves Donato2, Ana Estela S’antanna3 , Sérgio Vanetti Burnier4, Myrna Serapião dos Santos5, José Álvaro Pereira Gomes6 1 Residente do departamento de oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP) – Brasil; 2 Colaborador do setor de doenças externas oculares e córnea da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP) – Brasil; 3 Mestre em oftalmologia / chefe do setor de plástica ocular da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP) – Brasil; 4 Doutor em oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP) – Brasil; 5 Doutor em oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP) – Brasil; 6 Doutor em oftalmologia da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP) – Brasil; setor de doenças externas oculares e córnea / setor de plástica ocular - departamento de oftalmologia – Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP) – Brasil. RESUMO Objetivo: O objetivo desse estudo é relatar os resultados cirúrgicos obtidos com o uso da amniótica (MA) na correção do simbléfaro. Métodos: Análise retrospectiva de 15 olhos de 14 pacientes submetidos à cirurgia de correção de simbléfaro, com o uso da MA.A MA foi obtida de partos cesários, preservada em glicerol e meio de preservação de córnea 1:1 e mantida à -80oC. A técnica cirúrgica envolveu a liberação das adesões palpebrais e abertura do fórnice conjuntival, seguida pela remoção do tecido fibrovascular episcleral, ceratectomia quando necessário e transplante da MA. A MA foi fixada a episclera e tarso, com a face epitelial voltada para cima e coberta com os bordos conjuntivais. Resultados: Foram 9 homens (60%) e 5 mulheres (40%), com mé- dia de idade de 48 anos (variando de 16-74 anos). O tempo médio de seguimento foi de 9 meses (variando de 3-18 meses). Em 6 casos (40%), o simbléfaro foi secundário a doenças cicatriciais, em 4 casos (24,6%) a trauma mecânico e nos outros 5 casos (33,3%) a pterígio recidivado. O sucesso cirúrgico foi obtido em 5 olhos (33,3%) e recidiva em 10 olhos (66,6%). Conclusão: Houve alto índice de recorrência (66,6%) em casos de membrana amniótica para correção de simbléfaro em pterígio recidivado. Terapias adicionais, como o uso de mitomicina C intra-operatória ou associação com outros tipos de transplantes, podem ser necessários para melhorar os resultados. Estudos randomizados, prospectivos e controlados são necessários para determinar o melhor manejo para o tratamento de simbléfaro. Descritores : Amnio/transplante; Queimaduras oculares; Pálpebras/patologia; Aderên- cias/cirurgia ARTIGO ORIGINAL Recebido para publicação em: 18.04.05 - Aceito para publicação em 17.11.05 Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 13-17 14 INTRODUÇÃO O simbléfaro pode ser definido como adesão en- tre a conjuntiva bulbar e palpebral, decor- rente de processo cicatricial secundário a queimadura ocular, penfigóide cicatricial ocular (PCO), síndrome de Stevens Johnson (SSJ), tracoma, ceratoconjuntivite sicca e traumas mecânicos. Pode cau- sar anormalidades palpebrais, restrição da motilidade ocular e disfunção do filme lacrimal, podendo inclusive comprometer a acuidade visual.1-4 O tratamento do simbléfaro consiste na sua ressecção e utilização de enxertos provenientes de membranas mucosas autógenas, tais como: conjuntiva, mucosa oral ou labial,3-5 vaginal3 e nasal,2 para recons- trução do fundo de saco e correção das alterações palpebrais e conjuntivais. Entretanto, o uso de mucosa do próprio paciente tem como desvantagens a baixa disponibilidade desses tecidos e o trauma cirúrgico na área doadora. A prevenção, diferentemente do tratamento, pode ser feita de forma simples, pela utilização de materiais sintéticos (lentes esclerais, gortex e luvas) e biológicos (peritônio de coelho e membrana amniótica), com o ob- jetivo de prevenir a adesão entre superfícies cruentas, impedindo a formação do simbléfaro.2 A membrana amniótica (MA), parte interna da placenta, consiste de uma membrana basal espessa, com colágeno tipo IV, laminina e um estroma avascular. A MA possui propriedades importantes, como estímulo a migração e adesão das células epiteliais, redução da re- ação inflamatória, propriedades angiogênicas e cicatriciais.6-8 Em 1940, De Rötth relatou o uso da MA a fresco para a reparação de simbléfaro, com resulta- dos pouco satisfatórios8. Em 1947, Sorsby et al. demons- traram bons resultados com o uso da MA em queima- duras agudas, sugerindo um efeito antiinflamatório da mesma9; Kim & Tseng, em 1995, reintroduziram o uso da MA em um modelo experimental de queimadura ocular.10 Desde então, a MA preservada tem sido uti- lizada no tratamento de várias doenças da superfície ocular, como na reconstrução de doenças cicatriciais (síndrome de Stevens Johnson, penfigóide ocular cicatricial e queimaduras oculares), defeitos epiteliais crônicos, ceratopatia bolhosa, pterígio recorrente e correção de simbléfaro.6-7,11-13 O objetivo desse estudo é descrever os resultados cirúrgicos obtidos com o uso da membrana aminiótica (MA) na correção do simbléfaro. MÉTODOS Estudo retrospectivo, intervencionista, não randomizado, tipo série de casos. Foram selecionados 14 pacientes (15 olhos) do setor de plástica ocular e doenças externas oculares da UNIFESP, que foram submetidos à correção de simbléfaro com MA, no período de janeiro de 1999 a setembro de 2002. A MA foi preparada e preservada segundo o método proposto por Gomes et al.13 A placenta humana foi obtida de partos cesários, após obtenção de consenti- mento das gestantes, as quais tinham sorologia negativa para sífilis, HIV e hepatite B e C. Sob condições estéreis, o amnio foi separado do córion e lavado com solução salina tamponada, contendo penicilina 1000U/ml, estreptomicina 20mcg/ml e anfotericina B 2,5 mcg/ml. Sob fluxo laminar, o amnio foi esticado sobre um papel de nitrocelulose, com a face epitélio/membrana basal para cima. O papel com a membrana amniótica aderida foi então cortado em pedaços de 3x3cm e 4x4cm e esto- cado à -80o C, em um meio de preservação constituído de glicerol e meio de preservação de córnea 1:1. Todos os pacientes foram submetidos a exame oftálmico completo, incluindo avaliação da motilidade ocular antes e depois da intervenção cirúrgica. A técnica cirúrgica envolveu anestesia peribulbar com bupivacaína 0,5%, liberação das adesões palpebrais e abertura do fórnice conjuntival, seguida de remoção do tecido fibrovascular episcleral e ceratectomia nos casos de pterígio recidivado. A membrana aminiótica foi colocada com a face epitelial voltada para cima so- bre a área cruenta da episclera e tarso, e suturada com pontos separados de vicryl 8-0. Em seguida, foi realiza- da sutura contínua com nylon 9-0, mantendo a borda conjuntival sobre a MA (Figura 1). Nos casos de pterígio recidivado e SSJ, foram utilizadas lentes esclerais. Nos Figura 1 - Técnica cirúrgica do transplante de membrana amniót ica para correção do simbléfaro : (A) pré-operatório; (B) pós-operatório Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 13-17 Frizon L, Donato WBC, S’antanna AE, Burnier SV, Santos MS, Gomes JAP 15 outros casos, a MA foi fixada por um ou dois pontos de seda 4.0 no fórnice inferior, que transfixaram a pele e foram anodados sobre tégulas de silicone. Durante o primeiro mês de pós-operatório, foram usados colírios de dexametasona a 0,1% e o floxacina a 0,3%, 4 vezes ao dia, que foram retirados progressiva- mente. Foram também prescritas lágrimas artificiais de 3/3h. Na avaliação dos resultados, os pacientes foram divididos em 2 categorias: - Êxito: correção do simbléfaro e motilidade ocu- lar normal. - Recidiva: manutenção do mesmo aspecto pré- operatório. RESULTADOS Foram avaliados 14 pacientes (15 olhos), sendo 9 do sexo masculino (60%) e 5 do sexo feminino (40%), com idade média de 48 anos (variando de 16-74 anos) e tempo de seguimento pós-operatório médio de 9 meses (variando de 3-18 meses). Seis casos (40%) apresenta- vam doenças cicatriciais (1 tracoma, 1 PCO, 3 SSJ, 1 queimadura química); 4 casos (26,6%) apresentavam história prévia de trauma (2 pós-exérese de tumor palpebral, 2 por agente desconhecido); 5 casos (33,3%) apresentavam pterígio recidivado com simbléfaro (3 casos na 3a recidiva e 2 na 5a recidiva) (Tabela 1). Durante o tempo de seguimento pós-operatório, de acordo com a classificação, observamos sucesso em 5 olhos (33,3%), sendo 3 pacientes com SSJ, 1 com quei- madura ocular e 1 pós-trauma. Ocorreu recidiva do simbléfaro em 10 olhos (66,6%), sendo 1 caso de tracoma, 3 pós-trauma, 1 com PCO e nos 5 pterígios recidivados (Figura 2). As 2 lesões pós-exérese de tumor recidivaram na pálpebra inferior. Houve apenas uma complicação (6,6%), que consistiu na formação de granuloma no pa- ciente vítima de trauma de etiologia desconhecida. DISCUSSÃO O melhor material utilizado na restauração da su- perfície conjuntival é a conjuntiva autóloga, que é capaz de fornecer uma membrana basal intacta e células caliciformes. Entretanto, esta é viável em acometimentos unilaterais e pouco extensos1,3. Enxerto de mucosa oral é uma boa opção terapêutica3-5, mas não são funcionalmen- te ideais (não possuem células caliciformes), são de difícil obtenção e não conferem, muitas vezes, boa aparência estética. Neste trabalho, optamos pela membrana amniótica por suas propriedades antiinflamatórias, por fa- cilitar a migração, adesão e prevenir a apoptose epitelial, Fig ura 2 - Fotografia d o pré e p ós-op eratório de exérese de s imbléfaro com transplante de memb ran a amniótica em olho co m p teríg io recorrente Tabela 1 Características dos pacientes Diagnóstico n(%) Resultado Doenças cicatriciais 6 (40%) Tracoma 1 recidiva PCO 1 recidiva SSJ 3 melhora Queimadura 1 melhora Trauma 4 (26,6%) Tumor palpebral 2 recidiva Desconhecido 2 melhora (1caso) Pterígio recidivado 5 (33,3%) 3ª recidiva 3 recidiva 5ª recidiva 2 recidiva Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 13-17 Avaliação dos resultados do transplante de membrana amniótica na reconstrução do simbléfaro 16 por ter um bom efeito estético e pela fácil obtenção. Jain & Rastogi encontraram índice de 70% de su- cesso no tratamento de simbléfaro secundário a diversas causas tratados com membrana amniótica14. Outro estudo com simbléfaro secundário a queimadura química trata- do com membrana amniótica obteve 80% de sucesso ci- rúrgico15. Solomon et al.16 demonstraram sucesso em 70,6% dos pacientes na correção de simbléfaro de causas varia- das com membrana amniótica, sendo os casos de insucesso as desordens auto-imune e pterígio recorrente. No nosso estudo, que incluiu diversas causas de simbléfaro, obser- vamos que o uso de MA obteve um índice de sucesso de apenas 33%. É possível que as diferenças observadas se- jam explicadas pelas diferentes causas de simbléfaro. Em um estudo, de uma série de casos de pterígio recidivado, foi encontrado 37,8% e 4,1% de recidiva uti- lizando transplante de MA e transplante de conjuntiva, respectivamente17. Shimazakiet al. obtiveram melhores resultados na reconstrução da superfície ocular em ca- sos de pterígio recidivado com simbléfaro, utilizando transplante de MA associado ao transplante de limbo18. Neste estudo, observamos 100% de recidiva nos casos de simbléfaro associado a pterígio recidivado, o que tal- vez seja explicado pela realização de múltiplas inter- venções cirúrgicas na região do limbo, levando à quebra da barreira límbica, com crescimento de tecido fibroso no local. Pode ser que o transplante de MA associado ao transplante de conjuntiva e limbo estaria indicado nos casos de fibrose intensa, uma vez que o transplante de limbo poderia reconstituir a barreira límbica, impedin- do o crescimento fibrovascular e o transplante de MA, por sua atividade inibitória sobre a cicatrização, dimi- nuiria o desenvolvimento da fibrose subconjuntival.18 Ou ainda, que o uso de um antimitótico, como a mitomicina C, possa ser utilizado concomitantemente à cirurgia para potencializar as propriedades da MA e diminuir a recorrência da proliferação fibro-vascular.18-19 Tsubota et al.11 apresentaram bons resultados na reconstrução da superfície ocular de 86% dos pacientes com PCO e SSJ que foram submetidos a transplante de MA e transplante de limbo. No presente estudo, não foi utilizado transplante de limbo, pois os objetivos cirúrgi- cos foram liberar os simbléfaros e reconstruir os fórnices superior e inferior. Os objetivos foram alcançados em 3 olhos de pacientes com SSJ. No PCO, os resultados cirúr- gicos podem não ser satisfatórios se a inflamação não for controlada adequadamente no pré-operatório.11 O único paciente com PCO em nosso estudo teve seu qua- dro cicatricial ocular agravado no pós-operatório. Em resumo, no presente estudo, observamos reci- diva do simbléfaro em 10 dos 16 casos (66,6%) em que foi utilizado transplante de MA. Avaliando, separada- mente as etiologias, evidenciamos que 100% dos casos de simbléfaros associados a pterígio recidivado apre- sentaram recorrência. Terapias adicionais, como o uso de mitomicina C intra-operatória, e/ou associação com outros tipos de enxertos, podem ser necessários para me- lhorar o resultado. Estudos prospectivos, randomizados e controlados são necessários para determinar o melhor manejo para a correção do simbléfaro. SUMMARY Objective: The purpose of this study is to report the surgical results of the amniotic membrane (AM) transplantation for symblepharon correction. Methods: Retrospective analysis of 15 eyes of 14 patients that underwent to symblepharon correction with AM. Amniotic membrane was obtained at the time of cesarean section and preserved at -80ºC in glycerol and cornea culture medium 1:1. The surgical technique evolved release of the lid adhesions and conjunctival fornix, followed by fibrovascular episcleral tissue excision, keratectomy as necessary and AM transplantation. The AM was fixed to episclera and tarsus with its epithelial side up and it was covered with the conjunctival edges. Results: Nine patients (60%) were male and 6 (40%) were female. The mean age was 48 years old (range 16-74 yo) and the mean follow- up time was 9 months (range 3-18 mo.) Six cases (40%) presented cicatricial diseases, 4 cases (26,6%) cases had previous history of trauma and 5 cases (33,3%) had recurrent pterygium with symblepharon. Five eyes (33.3%) had sucessfull results and 10 eyes (66.6%) had symblepharon recurrence. Conclusion: In this study, there was a high recurrence rate (66.6%) of symblepharon after AM transplantation, especially in recurrent pterygium. Additional therapies, as the use of intra-operative mitomycin C or association with other types of grafts, may be necessary to improve the outcome. Prospective, randomized, controlled studies are required to determine what is the best approach to treat symblepharon. Keywords: Eye burns; Palpebras/pathology; Amnion/transplantation;Adhesions/surgery REFERÊNCIAS 1. Castroviejo R. Plastic and reconstructive surgery of the conjunctiva. Plast Reconstr Surg. 1959 ;24(1):1-12. 2. Kuckelkorn R, Schrage N, Redbrake C, Kottek A, Reim M. 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Transplantation of amniotic membrane and limbal autograft for patients with recurrent pterygium associated with symblepharon. Br J Ophthalmol. 1998; 82(3):235-40. 19. Alves MR, Potério MB, Cardillo JA. Nova técnica cirúrgica para ressecção de pterígio em associação com o uso intra-operatório de mitomicina C. Rev Bras Oftalmol. 1997;56(6): 441-3. ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Luciana Frizon Rua Borges Lagoa 933, apto 73 - Vila Clementino CEP 04038-032 - São Paulo - SP E-mail: lucianafrizon@oftalmo.epm.br Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 13-17 Avaliação dos resultados do transplante de membrana amniótica na reconstrução do simbléfaro 18 Efeito da mitomicina C no epitélio ciliar Estudo experimental em coelhos com microscopia eletrônica de varredura e de transmissão Effect of mitomycin C on the ciliary epithelium Experimental study in rabbits with transmission and scanning electron microscopy Maria Rosa Bet de Moraes Silva1, Elisa Aparecida Gregório2 1 Professora livre-docente do departamento de oftalmologia, otorrinolaringologia e cirurgia de cabeça e pescoço. Faculdade de Medicina, Universidade Estadual de São Paulo “Júlio Mesquita Filho” – UNESP – Botucatu (SP) – Brasil; 2 Professora titular do departamento de morfologia, Instituto de Biociências, Universidade Estadual de São Paulo “Julio Mesquita Filho” – UNESP – Botucatu (SP) – Brasil. * Trabalho premiado com o XXXIII prêmio Varilux - Categoria Master. Recebido para publicação em: 20.10.05 - Aceito para publicação em 21.10.05 RESUMO Objetivo: Verificar e correlacionar no coelho, as possíveis alterações causadas ao epitélio ciliar interno por meio da microscopia eletrônica de transmissão (MET) e da microscopia eletrônica de varredura (MEV), após aplicação de mitomicina C sob retalho escleral nas concentrações de 0,5 mg/ml e 0,2 mg/ml. Métodos: Foram estudados os olhos de 32 coelhos albinos divididos em 4 grupos experimentais. O olho direito (OD) destinou-se aos grupos experimentais e o olho esquerdo (OE), ao controle. O grupo I (G1) foi formado por 8 olhos que receberam mitomicina C na dose de 0,5 mg/ml sob retalho escleral e foram examinados após 15 dias. O grupo II (G2) diferiu do G1 apenas no tempo de exame, após 30 dias. O grupo III (G3) foi formado por 8 olhos que receberam mitomicina C na dose de 0,2 mg/ml sob retalho escleral e foram examinados após 15 dias. O grupo IV (G4) diferiu do G3 apenas no tempo de exame, após 30 dias. O epitélio ciliar interno de cada olho foi examinado à microscopia eletrônica de transmissão (MET) e também à microscopia eletrônica de varredura (MEV). Resultados: À MET do epitélio ciliar interno foram observadas as seguintes alterações nos grupos G2, G3 e G4: Lâmina basal fina, descontínua e irregular, células achatadas e com volume dimi- nuído, núcleo mais irregular e mais eletrondenso, alargamento entre interdigitações, mitocôndrias edemaciadas e figuras de mielina. Estas alterações não ocorreram em todos os animais dos grupos. O G1 não apresentou alterações. À MEV foram observa- das rugosidades nos grupos G1, G2, G3 e G4. Nos grupos G1 e G4 foram também observadas soluções de continuidade. Conclusão: A mitomicina C causou alterações no epitélio ciliar interno tanto na concentração de 0,2 mg/ml como na de 0,5 mg/ml, 15 e 30 dias após utilização, à MET e à MEV. Não houve correlação das alterações com a dose, com o tempo e também entre as alterações à MET e MEV. Descritores: Corpo ciliar (epitélio ciliar)/efeito de drogas; Mitomicina C; Microscopia eletrônica; Microscopia eletrônica de varredura; Coelhos Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 18-27 ARTIGO ORIGINAL 19 INTRODUÇÃO A mitomicina C tem sido usada na cirurgia do glaucoma desde 19831 para reduzir a “fi- brose” pós-operatória e aumentar o sucesso cirúrgico porque o insucesso da cirurgia antiglaucomatosa se deve principalmente à prolifera- ção fibroblástica. A inibição da proliferação de fibroblastos pela mitomicina C já foi bem documentada in vitro2-5, assim como in vivo em animais de experimentação6,7. Estes estudos mostraram marcada redução da proliferação de fibroblastos, tornando o processo de cicatrização muito prolongado. Pelos motivos acima apontados, a mitomicina C tem sido largamente empregada em várias cirurgias oftalmológicas, particularmente nas cirurgias antiglaucomatosas. Esta tem sido utilizada não só em cirurgias de mau prognóstico, mas também em cirurgias primárias8-15. Nas cirurgias antiglaucomatosas tem sido utiliza- da na esclera ou sob o retalho escleral, em diversas con- centrações, com diferentes tempos de exposição e com volumes diferentes de irrigação. Apesar da aplicação extra-ocular, a mitomicina C pode atingir vários tecidos do interior do globo ocu- lar16-17. Desta forma, a mitomicina C pode ser potencial- mente tóxica não só para os fibroblastos, mas também para estes tecidos. Efeitos tóxicos da mitomicina C já foram demons- trados histopatologicamente em animais18 e no homem19. Estes efeitos ocorreram após um período que variou de 1 dia a 4 semanas após a aplicação. Um dos efeitos clínicos indesejáveis da mitomicina C no pós-operatório de cirurgia antiglaucomatosa tem sido a hipotonia prolongada20, que pode levar a perda visual importante. O mecanismo da hipotonia permanece até hoje não totalmente esclarecido. Um dos fatores apontados como causador desta complicação, poderia ser a toxicidade da mitomicina C ao corpo ciliar, mais especi- ficamente ao epitélio ciliar. No entanto, os raros estudos a este respeito mostram-se controversos18,21. OBJETIVO Verificar e correlacionar ao coelho, as possíveis alterações causadas ao epitélio ciliar interno por meio da microscopia eletrônica de transmissão (MET) e da microscopia eletrônica de varredura (MEV), após apli- cação de mitomicina C sob retalho escleral nas concen- trações de 0,5 mg/ml e 0,2 mg/ml. MÉTODOS Foi realizado um estudo experimental, randomizado, controlado e intervencionista. Foram es- tudados 32 coelhos albinos da raça Norfolk de ambos os sexos, saudáveis, pesando entre 1500 e 2950g, com olhos normais ao exame, realizado com microscópio cirúrgico da marca D. F. Vasconcelos® - Brasil, fornecidos pelo Biotério Central do Campus de Botucatu - UNESP. Os procedimentos, aos quais os animais foram submetidos, foram aprovados pela Comissão de Ética em Pesquisa Animal da Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP (Protocolo n° 124 CEEA). Os coelhos foram distribuídos pelos diversos gru- pos, obedecendo ao critério de sorteio, antes do início do experimento. Cada grupo experimental foi formado por 8 coelhos que receberam mitomicina C (MMC) sob re- talho escleral em concentração que variou conforme o grupo. - GRUPO I (G1): 0,5 mg/ml durante 5 minutos no olho direito (OD) e exame após 15 dias; - GRUPO II (G2): 0,5 mg/ml durante 5 minutos no OD e exame após 30 dias; - GRUPO III (G3): 0,2 mg/ml durante 5 minutos no OD e exame após 15 dias; - GRUPO IV (G4): 0,2 mg/ml durante 5 minutos no OD e exame após 30 dias; - GRUPO CONTROLE (GC): formado por olhos esquerdos dos animais dos 4 grupos. Em cada um dos grupos experimentais, os olhos de 4 animais foram preparados para microscopia eletrô- nica de transmissão (MET) e os dos outros 4 para microscopia eletrônica de varredura (MEV) para estu- do do epitélio ciliar interno do corpo ciliar. Após o sorteio e identificação, cada coelho foi anestesiado com injeção de pentobarbital sódico a 4% na dose de 1 ml/kg na veia marginal da orelha com se- ringa de 5 ml e agulha 25/7 (G22). Dose complementar de 0,5 ml da solução de pentobarbital sódico foi admi- nistrada quando houve reação do animal durante a ci- rurgia. A cirurgia consistiu na realização de abertura con- juntivo-tenoniana de base fórnice (a 7 mm do limbo) na região compreendida entre os músculos retos superior e lateral, seguida da realização de retalho escleral de 4 por 4 mm, de aproximadamente meia espessura escleral, confeccionado com bisturi lâmina 11. Este procedimen- Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 18-27 Efeito da mitomicina C no epitélio ciliar Estudo experimental em coelhos com microscopia eletrônica de varredura... 20 to foi realizado em ambos os olhos dos coelhos. A aplicação da MMC foi feita com retalho de al- godão de 4 por 4 mm, embebido com 0,1 ml de solução de MMC, nas concentrações padronizadas (ou soro fisi- ológico), conforme o grupo experimental (OD ou OE), o qual foi colocado sob o retalho escleral por 5 minutos logo após secagem do local com cotonete. Após a remo- ção do algodão foi feita irrigação com 20 ml de solução de cloreto de sódio a 0,9 mg/ml. O retalho escleral foi suturado nas extremidades com 2 pontos de mononylon 10-0 e a conjuntiva foi suturada com 1 ponto de vicryl - 7 zeros na extremidade medial. Foi instilada uma gota de colírio de cloranfenicol no final do experimento e continuada sua aplicação de 6/6 h por uma semana. Após o procedimento cirúrgico os animais foram mantidos em gaiolas individuais próprias e foram ofere- cidas alimentação e água “ad libitum” até o momento do sacrifício. Para o sacrifício, o animal foi anestesiado e foi instilado glutaraldeído de forma contínua sobre a córnea, durante 5 minutos. Foi feita a enucleação e seccionado o globo ocular no nível do equador, inician- do-se com bisturi lâmina 11 e complementando-se a secção em 360º com tesoura de conjuntiva. Para preparação do material para a MET, o corpo ciliar foi separado da íris com auxílio de pinça sem den- te. Foram preparados fragmentos da região apical dos processos ciliares (+ 1 mm de lado), coletados da região adjacente ao local da cirurgia. Os fragmentos foram co- locados em frascos de vidro, devidamente identificados, contendo solução de glutaraldeído a 2,5% no tampão fosfato 0,1M-pH7,3 e permaneceram em geladeira por pelo menos 3 horas e preparados para MET, conforme técnica do Laboratório de Microscopia Eletrônica do Instituto de Biociências – UNESP – Botucatu. Para exame à MEV, após enucleação, os olhos fo- ram seccionados no equador, o cristalino foi retirado e cada segmento foi dividido ao meio. Foi processada a metade que continha a região onde havia sido realizado o retalho escleral. O processamento seguiu a padronização do labo- ratório de microscopia eletrônica acima citado. Todos os espécimes foram documentados por meio de elétron-micrografias, utilizando-se o filme Ektacrome Kodak e papel fotográfico Kodacrome RC Print F3 Kodak. RESULTADOS Microscopia eletrônica de transmissão · Grupo Controle (Figura 1) Os olhos do grupo controle apresentaram o epitélio ciliar interno (epitélio ciliar não pigmentado) Figura 1 - Elétron-micrografia (MET) de epitélio ci liar de coelho (controle) - A: Epitélio interno (EI) formado por células cubóides, com núcleo (N) basal, e cromatina frouxa; Interdigitações (It) nas faces laterais da célula. Células do epitélio externo (EE) relacionando-se de forma não simétrica com as d o epitél io b asal , X 4.0 00; B: Epitélio intern o, mostrand o invagin ações (I), e membrana basal (seta) fin a, co ntínua e regular, desmossomo (D). Membrana plasmática vol tada para a câmara posterior (CP), X 31.500; C: Epi télio interno mostrando invaginaçõ es (I), mitocôndrias (M), ret ículo endoplasmático rugoso (rer) e retículo endoplasmático l iso (rel), X 27.500; D: Junções entre os dois epitélios formadas por inúmeros desmossomos (D). Complexo de Golgi (G). Mitocôndria (M). Núcleo (N). X 16.500 Figura 2: Elétron-micrografia (MET) de epitél io ciliar de coelho (G2) - A: Célu las d o epi télio interno (EI) achatadas, com vo lume reduzido, espaçadas entre si e com vacúolos (V) no citoplasma. Núcleo (N) de contorno i rregular, X 5.0 00; B: Detalhe do ci toplasma b asal, mos tran do membrana basal (MB) desc ontínu a e irr egu lar , e mitocôndrias (M) edemaciadas nas células alteradas. Câmara posterior (CP), X 21.000; C: memb rana b asal descontínua (seta) e i rregular, adjacente à célu la de vo lume dimin uído . Observ am-se também alargamentos entre as interdigitações (*), X 16.500 Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 18-27 Silva MRBM, Gregório EA 21 Figura 3 - Elétron-micrografia (MET) de epitélio cil iar de coelho ( G3 ) - A: Aspecto d e um processo ci l iar. Na parte superio r da micrografia os ep itélios ci liares interno (EI) e externo (EE) são n ormais, do lado oposto às células do epitél io in terno (EI) mostram- se achatadas , diminuídas de volume, com citoplasma denso . Capilar com hemácias (H), X 2.150; a: Detalhe do epitélio interno mos trando membrana basal i rregular, co m descontinu idades (setas ), X 27.0 00; B: Epitélio interno com mitocônd rias (M) edemaciadas e com figuras d e mielina (seta) em célula den sa, X 14.500; C: Detalhe da região b asal celular do ep i tél io interno , q ue mo stra mito côndria (M) edemaciada em célula densa. Invaginações (I), X 14.500 Figura 4: Elétron-micrografia (MET) de epitélio ciliar de co elho (G4) - A: Ep itélio interno mostrando célula den sa, com formato triangular e redução de volume, núcleo (N) d e contorno irregular e cromatina condensada. A membrana basal (MB) mostra-se descontínua e irregular, X 10.2 50; a: Figura de miel in a em célu la d o epi tél io interno . Núcleo (N), X 1 2.0 00 ; B: Detalhe do ci to plasma basal mostrando membrana basal descontínua (setas ) e irregular, X 29.000 da parte apical dos processos ciliares, formado por ca- mada única de células regulares e cubóides com núcleo arredondado. A membrana celular voltada para a câmara an- terior formava numerosas invaginações, principalmen- te próximo à face lateral da célula e estava recoberta por membrana basal fina, contínua e de espessura re- gular que não acompanhava as invaginações. Na face lateral da célula, a membrana celular apresentava nu- merosas interdigitações imbricadas com as das célu- las vizinhas e desmossomos concentrados no 1/3 apical. Na parte apical (em contato com o epitélio externo) havia grande número de junções dos tipos desmossomos e nexos e não foram observadas interdigitações. No citoplasma celular foram observados: grande número de mitocôndrias alongadas ou arredondadas mais concentradas na parte basal da célula e ao redor do núcleo; retículo endoplasmático rugoso com cisternas em arranjo paralelo; retículo endoplasmático liso; aparelho de Golgi pouco desenvolvido, com cisternas achatadas; ribossomos livres; vesículas claras; alguns corpos densos; microfilamentos e microtúbulos. O núcleo mostrou-se volumoso, arredondado, de contorno regular com pequenas chanfraduras e a cromatina bastante descondensada, com condensação periférica, havendo nucléolo evidente. A relação das células dos dois epitélios se fez de tal forma que uma célula do epitélio interno se relacio- nou com duas células do epitélio externo; sendo a parte lateral das células dos dois epitélios não coincidentes. · Grupo I (G1) As células do epitélio ciliar interno não apresen- taram alterações em relação ao controle; · Grupo II (G2) (Figura 2) A membrana basal do epitélio ciliar interno apre- sentou-se fina, descontínua e irregular em dois dos qua- tro olhos. Em um destes dois olhos, as células estavam achatadas, com volume diminuído, o núcleo mais eletrondenso e com contorno irregular e as mitocôndrias edemaciadas. Havia, ainda, alargamentos entre as interdigitações. · Grupo III (G3) (Figura 3) A lâmina basal do epitélio ciliar interno apresen- tou-se fina e descontínua em um animal. As células do epitélio ciliar interno apresenta- ram-se achatadas ou triangulares e com volume diminu- ído (atróficas) em dois olhos. Em um deles observou-se alargamento entre as interdigitações. Nas células “atróficas”, as mitocôndrias estavam edemaciadas, o núcleo era menor, de contorno irregular e com maior quantidade de cromatina condensada. Fo- ram observadas também nestas células, figuras de nuclina. · Grupo IV (G4) (Figura 4) A lâmina basal apresentou-se fina, descontínua e irregular em um dos quatro olhos. Foram observadas células “atróficas” em um dos olhos Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 18-27 Efeito da mitomicina C no epitélio ciliar Estudo experimental em coelhos com microscopia eletrônica de varredura... 22 Microscopia eletrônica de varredura · Grupo controle (Figura 5) Os processos ciliares apresentaram-se triangulares com a base do triângulo voltada para a câmara anterior e o ápice para a ora serrata. Na parte anterior, os processos ciliares formavam pregas com circunvoluções na parte mais apical, separadas por vales (para plicata) e mais posterior- mente observou-se superfície lisa (pars plana). Os processos ciliares estavam simétricos em toda a circunferência do corpo ciliar e processos mais longos e largos (principais) se intercalavam com outros curtos e estreitos (intermediários). No 1/3 apical dos processos principais havia “ra- mificações” do processo que se entrelaçavam formando as circunvoluções. Os processos ciliares prolongavam-se, anterior- Fig ura 6: Elétro n-microgra fia (MEV) de processos cil ia res de coelho (G1) - A: Parte apical de processo cil iar mostrando rugosidade da superfície, X 575; B e C: Parte apical de processo ci liar, mostrando soluçõ es de con tinu idade na superfície e d esprendimentos lamelares (seta). B = X 575 e C = X 785 mente em direção da íris, formando processos irianos que eram mais baixos e com superfície mais lisa. A transição entre processo ciliar e processo iriano se fazia de forma abrupta. A superfície das circunvoluções apresentou-se lisa e sem soluções de continuidade. Havia aderidos à super- fície algumas hemácias, fragmentos celulares e fibrina. · Grupo I (G1) (Figura 6) A superfície apical dos processos ciliares mos- trou rugosidades, dando a impressão de encolhimento destes processos. Foi observada solução de continuidade da mem- brana basal com desprendimentos lamelares em um dos quatro olhos. · Grupo II (G2) Foram observadas rugosidades dando impressão de encolhimento na parte apical dos processos ciliares principais. Não havia soluções de continuidade. · Grupo III (G3) (Figura 7) Foram observadas rugosidades na parte apical dos processos ciliares sem soluções de continuidade. · Grupo IV (G4) (Figura 7) Também foi observado enrugamento na superfí- cie dos processos ciliares que foi maior do que o obser- vado nos demais grupos. Foram também observadas áreas focais de solução de continuidade e protrusões cuneiformes na superfície. Figu ra 5: Elétro n-microgra fia (MEV) de pro cesso s ci l iares de coelho (c ontro le) - A : Observa-se processo i riano (PI) em continuação com processo ci liar principal (PC), X 60; B: Parte apical de processo ci liar mostran do aspecto liso da superfície. Hemácia (H), X 505; C: Detalhe de processo ciliar em sua parte apical, sem solução de continuidade, X 2 .025 Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 18-27 Silva MRBM, Gregório EA 23 DISCUSSÃO A causa da hipotonia, observada após cirurgias antiglaucomatosas com uso de mitomicina C, não está até hoje bem determinada. Uma das causas presumidas é o aumento da facilidade de saída do humor aquoso, já que foi observada hipocelularidade subconjuntival e escleral em pacientes que apresentaram hipotonia per- sistente e que foram submetidos à revisão da bolha filtrante19, 22. No entanto, a possibilidade da mitomicina C che- gar ao corpo ciliar em quantidade suficiente23, e causar alteração na produção do humor aquoso, poderia ser uma outra causa importante de hipotonia.Alguns estudos le- vam à confirmação desta hipótese. Em macacos, apli- cando-se mitomicina C por via escleral nos 4 quadrantes, foi observada redução de 20% na produção do humor aquoso, sendo o efeito máximo observado 2 semanas Figu ra 7: Elétron-micro grafia (MEV) de pro cesso s ci liares de coelho - A: Parte ap ical de pro cesso ci l iar (G3 ) mostrando enrugamento na sup erfície, X 500; B : Parte apical de processo cil iar (G4) mo strando enrugamento e protrusões cuneiformes (seta), X 575 após a aplicação24. No homem, após injeção subconjuntival de mitomicina C nas concentrações de 0,2, 0,02 e 0,002 observou-se no HA que a concentração foi de 0,06 mg/ml, 0,004 mg/ml e traços, respectivamen- te após 1 hora da aplicação25. No mesmo estudo, estes autores observaram que no coelho a mitomicina C desa- pareceu rapidamente. Em olhos humanos submetidos à trabeculectomia com aplicação de esponja com mitomicina C na concen- tração de 0,5 mg/ml, durante 3 a 5 minutos pelas vias escleral ou intra-escleral (sob o retalho), foi observada mitomicina C no humor aquoso na concentração de 5 a 36 mg/ml após 5 e 10 minutos, respectivamente da reti- rada da esponja26. Em coelhos submetidos à aplicação de 0,5 mg/ml de mitomicina C por 3 a 5 minutos, a concentração da mitomicina C no humor aquoso variou de 0 a 121 mg/ml e foi 7 vezes maior quando a aplicação foi intra-escleral do que esclera27. A mitomicina C também foi observada no humor aquoso de coelhos, após a aplicação com esponja de ce- lulose na conjuntiva no primeiro dia pós-operatório de esclerectomia de lábio posterior. Nesta forma de aplica- ção o pico ocorreu após 1 hora16. Também em coelhos, após 60 minutos da aplica- ção na esclera de esponja com mitomicina C por 5 minu- tos em diferentes concentrações, foi observado que as concentrações no HA estavam abaixo de 10 mg/ml, 11,1mg/ml e 11,8 mg/ml, respectivamente, quando a aplicação foi nas concentrações de 0,2, 0,5 e 1,0 mg/ml28. Os trabalhos acima citados demonstraram, por- tanto, que tanto no homem como em animais de experi- mentação a mitomicina C, após aplicação tópica por di- ferentes vias e em diferentes concentrações, pode atin- gir o HA e ser potencialmente tóxica para o epitélio ciliar. Em 1994, um estudo do epitélio ciliar de coelhos chinchila, fêmeas, bastardas, pigmentadas, após a aplica- ção de mitomicina C (com esponja) nas concentrações de 0,05 mg/ml; 0,2 mg/ml e 1,0 mg/ml durante 5 minutos por via escleral, descreveu alterações morfológicas à microscopia eletrônica de transmissão18. Estes autores observaram material elétrondenso próximo ao RER vacúolos perinucleares, edema mitocondrial com lise da matriz mitocondrial e lise de organelas citoplasmáticas. As alterações foram observadas após 1 dia, 7 dias e 28 dias da aplicação da mitomicina C. Em seu trabalho, os autores referem correlação entre a intensidade das alte- rações e a concentração da droga utilizada e o tempo de observação. No entanto, não deixam claro em quantos animais as alterações ocorreram. Parece ter sido em 1 Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 18-27 Efeito da mitomicina C no epitélio ciliar Estudo experimental em coelhos com microscopia eletrônica de varredura... 24 animal de cada grupo. No presente trabalho foram observadas altera- ções do epitélio ciliar interno à MET nos grupos 2, 3 e 4 que incluíram: lâmina basal mais fina, descontínua e ir- regular, alterações quanto à forma das células (mais acha- tadas ou triangulares), volume celular aparentemente diminuído, núcleo com contorno irregular e cromatina mais condensada. No grupo G3 observou-se também alar- gamento entre as interdigitações e mitocôndrias edemaciadas. Estas alterações não foram observadas em todos os animais. As observações nos diferentes grupos não permitiram portanto, correlacionar as alterações nem com a dose da mitomicina C administrada nem com o tempo de observação. No grupo G1 não foram observadas alterações à MET, apesar da dose ser a máxima utilizada em clínica (0,5 mg/ml). Não sabemos explicar este fato, talvez, pe- las alterações serem focais, por não ocorrerem em todos os animais, mesmo nos outros grupos, pelo tempo curto de observação, ou pela recuperação das alterações. Estudando o efeito da mitomicina C também em coelhos não pigmentados (New Zealand) à MET, outros autores observaram alterações 14 e 28 dias após a apli- cação subconjuntival de 0,2 mg/ml e 0,4 mg/ml, as quais foram mais intensas após 28 dias29. Estes autores não co- mentam correlação com concentração e não se referem as alterações que ocorreram em todos os animais. As alterações encontradas foram semelhantes as nossas, exceto pelo fato de não terem encontrado nenhuma na lâmina basal. Outro estudo em coelhos da mesma raça (New Zealand), submetidos à aplicação de mitomicina C nas doses de 0,005; 0,02; 0,08; 0,1; 0,12 e 0,16 mg/ml pela mesma via (subconjuntival), além de outras alterações, encontrou afinamento da membrana basal, dose depen- dente, após 14 dias que só ocorreu nas concentrações a partir de 0,1 mg/ml30.Também neste trabalho, os autores não comentam em quantos animais as alterações ocor- reram. Outros estudos em coelhos pigmentados à MET mostraram alterações semelhantes no epitélio ciliar não pigmentado após aplicação de mitomicina C, que também ocorreram apenas próximas ao local de aplicação31-35. O único estudo que avaliou ao mesmo tempo co- elhos pigmentados e não pigmentados mostrou, no en- tanto, que as alterações à MET só ocorreram nos coelhos pigmentados32. As alterações descritas à MET, nos poucos estu- dos realizados em coelhos de raça e sexo variados e com tempo de observação de até 28 dias, são controversas quanto aos achados. Alguns autores30 observaram mitocôndrias normais, porém outros observaram edema mitocondrial18,29,31,34,36. Outros autores33,35 descreveram fi- guras de mielina na mitocôndria que não foram obser- vadas por outros autores. Foram também observadas di- latação e desorganização de RER31,36. A comparação dos trabalhos entre si, assim como com nossos resultados, se torna bastante difícil em fun- ção das variações metodológicas dos trabalhos. A via da maioria dos trabalhos foi a superfície escleral, mas a forma de administração, a concentração da droga, a rea- lização ou não de trabeculectomia, o tempo de exposi- ção, a irrigação ou não, a quantidade do líquido de irriga- ção e o tempo de observação foram bastante variados. A concentração de mitomicina C utilizada em tra- balhos semelhantes variou de 0,005 a 1 mg/ml, sendo as mais utilizadas 0,2 mg/ml e 0,5 mg/ml. No entanto, o volume utilizado não é comentado pela maioria dos au- tores. A maior parte dos trabalhos administrou a mitomicina C sobre a esclera, mas a forma de adminis- tração variou: injeção subconjuntival29-30, esponjas cirúr- gicas18,31,34,36, conchas de colágeno, lente de contacto e liofilizado33,35.A marca (fabricação) da esponja foi varia- da e o tamanho da esponja variou de 4x4x1 - 5x5x1 ou não foi referida pelos autores. No presente trabalho, a mitomicina C foi utiliza- da no leito escleral, o que deveria levar a maior quanti- dade de mitomicina C no HA e, portanto, a uma altera- ção mais intensa no epitélio ciliar interno. Contudo, nos- sas alterações à MET não só não foram mais intensas do que as da literatura, como também não foram observa- das no grupo G1. Isto pode ser devido à irrigação reali- zada com 20 ml de soro fisiológico. Foi demonstrado que a quantidade de mitomicina C que chega ao HA se re- duz em 69%, quando se utiliza irrigação de 10 ml de soro fisiológico e em 95% com irrigação de 50 ml17.Tam- bém em coelhos albinos submetidos à trabeculectomia com utilização de mitomicina C a 0,5 mg/ml, seguida de irrigação com 20 ml de solução de cloreto de sódio a 0,9%, não foram encontradas alterações do epitélio ciliar à MET 10, 30 dias e 3 meses após21. O tempo de exposição à mitomicina C da maioria dos trabalhos foi de 5 minutos18,33,36. Quanto à irrigação, a maioria dos trabalhos não a cita.Alguns autores realizaram-na com 10 ml de BSS31,33. Alterações do epitélio ciliar interno, associadas à mitomicina C, também foram descritas no homem em paciente que faleceu 7 dias após ter sido submetida à trabeculectomia com mitomicina C (não foram descri- tas a concentração, o volume e o tempo de exposição)19. A paciente tinha 78 anos e era portadora de glaucoma Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 18-27 Silva MRBM, Gregório EA 25 primário de ângulo aberto e, 8 meses antes da trabeculectomia com mitomicina C, havia sido submeti- da à trabeculectomia seguida de 9 injeções subconjuntivais de 5 mg de 5 fluorouracil sem obter con- trole da Po. No 6º Po da nova trabeculectomia com mitomicina C, a Po foi de 12 mmHg. O epitélio não pigmentado (interno) da região próxima à cirurgia com mitomicina C mostrou variação de espessura e superfí- cie irregular ao exame anatomopatológico. Espaços intercelulares alargados foram mais observados nos ápi- ces celulares e também foram observadas “células ras- gadas”, sendo que em algumas áreas as células pareci- am “esfiapar”. À MET, o epitélio ciliar não pigmentado desta região, mostrou numerosas invaginações na parte basal, figuras de mielina, aumento de grânulos de melanolipofucina, citoplasma com vacualização, ruptu- ra de mitocôndria e condensação da cromatina. O exame à MEV mostrou, no presente trabalho, solução de continuidade do epitélio ciliar interno, em 1 animal do grupo G1 e 1 do grupo G4. Assim, também com esta técnica, não pudemos correlacionar as altera- ções encontradas, com a concentração da mitomicina C e o tempo de observação. Não encontramos na literatura, trabalho que ava- liasse o epitélio ciliar interno à MEV após utilização de mitomicina C, o que impossibilitou a comparação de nossos resultados com a literatura, mas entendemos que a MEV é um método importante para avaliação deste tecido, pois este trabalho mostrou alteração no grupo G1 onde a MET não havia mostrado. A MEV mostrou alterações nos grupos G1 e G4 onde a mitomicina C foi utilizada a 0,5 mg/ml e observa- ção de 14 dias e 0,2 mg/ml com observação de 28 dias, respectivamente. A MET mostrou alterações em G2, G3 e G4. Não houve, portanto, correlação das alterações ob- servadas à MET e à MEV. Este dado, associado ao fato de que as alterações tanto à MET como à MEV não ocorreram em todos os animais dos grupos e também ao caráter focal das lesões, sugere que haja outros fatores envolvidos na hipotonia observada em trabeculectomias com uso de mitomicina C, além da redução de produção de humor aquoso. Considerando-se o exposto acima, verifica-se que a mitomicina C pode causar dano ao epitélio ciliar inter- no que é o produtor do H.A., tanto à MET como à MEV. Deve ser ressaltado todavia, que as alterações morfológicas não significam necessariamente dano fun- cional, isto é, redução de produção do H.A. A mitomicina C é um alquilante que interfere na síntese e replicação do DNA. Desta forma, sua ação ocor- re em células em proliferação. Como não se conhece a proliferação normal do epitélio ciliar não se sabe qual é o mecanismo que leva às alterações neste tecido. Não observamos neste trabalho modificação da pressão intra-ocular com uso da mitomicina C (resulta- dos não publicados), portanto apesar de termos encon- trado alterações no epitélio ciliar interno não parece ter ocorrido dano funcional. Isto confirma a hipótese de que dano morfológico não é sinônimo de dano funcional. O único trabalho que estudou, concomitantemente, o epitélio ciliar interno à MET e a pressão intra-ocular34 também só observou alterações morfológicas. Portanto, apesar de ter sido observada queda de pressão intra- ocular, com utilização de mitomicina C tanto no homem como em animais de experimentação37-40, quando se es- tudaram as alterações morfológicas e a pressão intra- ocular, não houve correlação entre esses dois parâmetros. O que então poderia causar a hipotonia, nos casos onde não se observam vazamentos e excesso de filtra- ção? Em primeiro lugar, devemos lembrar que as alte- rações descritas ocorreram em animais jovens e sadios e no local próximo à aplicação da mitomicina C. Não sabemos a extensão das lesões no epitélio ciliar dos pa- cientes glaucomatosos, muitas vezes tratados, previamen- te com vários medicamentos durante anos, e submetidos à cirurgia com uso deste medicamento. O único relato existente em paciente19 descreve alterações à MET, pró- ximas ao local da trabeculectomia, mas não longe do local cirúrgico. Além disso, a paciente não apresentou hipotonia, sua Po um dia antes do falecimento foi de 12 mmHg. As observações destes autores também corrobo- ram, portanto com a idéia de que alterações morfológicas não são sinônimo de alterações funcionais. Em segundo lugar, lembraríamos que alterações moleculares, lesões nervosas e/ou vasculares do corpo ciliar ou ainda alteração no trabeculado causadas pela mitomicina C poderiam ser a causa da hipotonia. Assim, as alterações morfológicas observadas no epitélio ciliar interno após aplicação da mitomicina C, tanto sobre a esclera como no leito escleral não poderi- am, isoladamente, ser responsáveis pela hipotonia, mas sim ser um fator que associado a outros contribuiria para a redução significativa da produção do H.A. no paciente glaucomatoso. SUMMARY Purpose: To evaluate and correlate in the rabbit the possible changes caused by mitomycin C under the scleral flap in the ciliary epithelium with transmission electron microscopy (TEM) and scanning electron microscopy (SEM). Methods: The eyes of 32 albino rabbits were Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 18-27 Efeito da mitomicina C no epitélio ciliar Estudo experimental em coelhos com microscopia eletrônica de varredura... 26 studied and divided in 4 experimental groups. The right eye (RE) was intended for the experimental groups and the left eye (LE) for the controls. Group I (G1) was formed by 8 eyes that received 0,5 mg/ml of mitomycin C under the scleral flap and were examined after 15 days. Group II (G2) differed from G1 only in the time of the exam, after 30 days. Group III (G3) was formed by 8 eyes that received 0,2 mg/ml of mitomycin C under the scleral flap and were examined after 15 days. Group IV (G4) differed from group 3 just in the time of the exam, after 30 days. In each eye the internal ciliary epithelium were examined with TEM. Results: The following changes in the internal ciliary epithelium were observed in groups G2, G3, and G4 with TEM: discontinuous and irregular basement membrane, more irregular and electron-dense nucleous, enlargement among interdigitation, edematous mitochondria and myelin figures. These alterations were not found in all the animals of the groups. Group G 1 did not present alterations. Roughness in groups G 1, G2, G3 and G4 were observed with SEM. In groups G 1 and G2 continuity solutions were also observed. Conclusion: Mitomycin C in 0,2 mg/ml and 0,5 mg/ml concentrations caused changes in the internal ciliary epithelium 15 and 30 days after, with TEM and SEM. There was no correlation between dosage, time and with TEM and SEM. Keywords: Ciliary body (ciliary epithelium)/drug effects; Mitomycin; Microscopy, electron; Microscopy, electron, scanning ; Rabbits REFERÊNCIAS 1. Chen CW. 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ENDEREÇO PARA CORRESPONDÊNCIA Maria Rosa Bet de Moraes Silva Departamento de OFT/ORL/CCP – Faculdade de Me- dicina de Botucatu, Universidade Estadual de São Pau- lo “Júlio Mesquita Filho” – UNESP Distrito de Rubião Júnior s/nº CEP 18618-970 – Botucatu - SP E-mail: rosabet@fmb.unesp.br Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 18-27 Efeito da mitomicina C no epitélio ciliar Estudo experimental em coelhos com microscopia eletrônica de varredura... 28 Análise comparativa de custo entre diferentes implantes de drenagem para o tratamento do glaucoma Comparative cost evaluation between differents implants used in glaucoma treatment Rodrigo Angelucci1, Walter Gomes Amorim2, José Ricardo Rehder3 1 Médico colaborador do setor de retina e vítreo da Faculdade de Medicina do ABC – FMABC – Santo André (SP) – Brasil 2 Chefe do setor de glaucoma – Faculdade de Medicina do ABC – FMABC - Santo André (SP) – Brasil; 3 Professor titular da disciplina de oftalmologia da Faculdade de Medicina do ABC - FMABC – Santo André (SP) – Brasil; Professor adjunto da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP) – Brasil. Trabalho realizado no Instituto de Olhos da Faculdade de Medicina do ABC – FMABC para conclusão de Curso de MBA / Mestrado profissionalizante da Universidade Federal de São Paulo – UNIFESP – São Paulo (SP) – Brasil. RESUMO Objetivo: Analisar comparativamente os custos entre diferentes implantes de drena- gem para o tratamento do glaucoma. Métodos: Foi realizado um estudo prospectivo e especulativo, no qual, através de pesquisa de mercado foram estabelecidos valores de custos médios para os implantes de drenagem de humor aquoso de Schocket® modifica- do, Molteno® e Ahmed® que são utilizados no tratamento cirúrgico dos glaucomas refra- tários. Resultados: O custo do implante de Schocket® modificado foi de R$ 173,00; do implante de Molteno®, R$ 371,15 e do implante de Ahmed®, R$ 1.950,15. Conclusão: 1. O implante de Schocket® modificado foi o que apresentou o menor custo quando com- parado aos implantes de Molteno® e Ahmed®; 2. O custo variável apresentou diferenças significativas entre os três implantes. Descritores: Implantes de glaucoma/métodos; Implantes de glaucoma/economia; Fato- res econômicos; Estudo comparativo; Custos de cuidados com a saúde Recebido para publicação em: 31.08.05 - Aceito para publicação em 29.11.05 ARTIGO ORIGINAL Rev Bras Oftalmol. 2006; 65 (1): 28-35 29 INTRODUÇÃO A Organização Mundial de Saúde (OMS) su- gere que 80% dos casos de cegueira encon- trados nos países em desenvolvimento podem ser prevenidos ou curados. Na faixa etária adulta, as cau- sas mais freqüentes de cegueira incluem: catarata, dege- neração macular relacionada à idade, glaucoma e retinopatia diabética.(1) Nos EUA, o glaucoma representa a segunda mai- or causa de cegueira na população geral (11,1%) e a principal causa de cegueira na população negra(2). Tal constatação apresenta concordância com estudos brasi- leiros que apontam o glaucoma como uma das princi- pais causas de cegueira no país e no mundo(3).Apesar de extensivas pesquisas, atualmente realizadas nas áreas de diagnóstico e tratamento, o acompanhamento do pa- ciente portador de glaucoma ainda é um grande proble-