Eletra de Souza Biologia Reprodutiva da surucucu-pico-de-jaca (Lachesis muta): de Norte a Nordeste do Brasil São José do Rio Preto 2020 Câmpus de São José do Rio Preto Eletra de Souza Biologia Reprodutiva da surucucu-pico-de-jaca (Lachesis muta): de Norte a Nordeste do Brasil Dissertação apresentada como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestra em Biologia Animal, junto ao Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal, do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Câmpus de São José do Rio Preto. Financiadora: CAPES Orientadora: Profª. Drª. Selma Maria de Almeida Santos São José do Rio Preto 2020 S729b Souza, Eletra de Biologia reprodutiva da surucucu-pico-de-jaca (Lachesis muta): : de Norte a Nordeste do Brasil / Eletra de Souza. -- São José do Rio Preto, 2020 142 p. : il., tabs., fotos, mapas Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista (Unesp), Instituto de Biociências Letras e Ciências Exatas, São José do Rio Preto Orientadora: Selma Maria Almeida-Santos 1. Biologia. 2. Reprodução. 3. Aptidão biológica. 4. Espermatogênese em animais. 5. Lachesis muta. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca do Instituto de Biociências Letras e Ciências Exatas, São José do Rio Preto. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. Eletra de Souza Biologia reprodutiva da surucucu-pico-de-jaca (Lachesis muta): de Norte a Nordeste do Brasil. Dissertação apresentada como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestra em Biologia Animal, junto ao Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal, do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Câmpus de São José do Rio Preto. Financiadora: CAPES Comissão Examinadora Profª. Drª. Selma Maria Almeida-Santos (Orientadora) Instituto Butantan – São Paulo Orientadora Profª. Drª. Letícia Ruiz Sueiro UNG – Guarulhos Profª. Drª. Sonia Zanini Cechin UFSM – Santa Maria São Paulo 16 de abril de 2020 Dedico este trabalho ao que me move a continuar perseguindo meus sonhos. Dedico à biodiversidade brasileira, nossa fauna e flora, mas também a nossa brava gente, que resiste em meio à lama, ao fogo e ao óleo. AGRADECIMENTOS O presente trabalho foi realizado com o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de financiamento 001. Correndo o risco de ser pragmática, gostaria de iniciar os agradecimentos saudando o instrumento de fomento à pesquisa que possibilitou a realização deste trabalho. Sem financiamento, essa e tantas outras pesquisas científicas não seriam possíveis. Aos curadores das coleções visitadas, Dr. Hussan Zaher, Dr. Felipe Grazziotin e Giuseppe Puorto, Dra. Ana Lúcia Prudente, Dr. Paulo Passos e Dr. Luis Lousano, pelo empréstimo dos animais preservados sob seus cuidados. Aos técnicos e alunos dessas instituições, Valdir Germano, Aline Benetti, Francisco Brum, André Braga, Fabrício Sarmento, Juli, Pedro Bisneto, Dani Gennari, Dani França, Nati Friol e Lays Guerreiro, pela ajuda e recepção acolhedora. À Dra. Fátima Q. Alves e Dr. Antônio Argôlo pela parceria no projeto e empréstimo das surucucus da Mata Atlântica. À Dra. Marta Maria Antoniazzi e Dr. Carlos Jared por disponibilizarem o uso do laboratório para o preparo das imuno-histoquímicas e para as fotografias microscópicas. À técnica Luciana Sato por todo auxílio durante esses processos. Ao Felipe Sueiro e toda a equipe do Vet Pat por elaborarem boa parte das lâminas utilizadas nesse trabalho. À UNESP e ao Programa de Pós-Graduação em Biologia Animal do IBILCE (S. J. Rio Preto). Muito além de números e índices, busca lidar com pessoas e suas individualidades, se preocupa com os alunos e faz o possível para garantir equidade de oportunidades mesmo em tempos tão sombrios. À minha orientadora, Dra. Selma Maria Almeida-Santos, por ter aceitado me orientar, guiar meus passos com carinho e se mostrar sempre interessada nas minhas ideias. Sou grata por ser compreensível nos momentos em que precisei me ausentar e por me apoiar nas minhas escolhas profissionais. À Dra. Letícia Sueiro e à Dra. Sonia Cechin por aceitarem o convite de participarem da minha banca de defesa e por sempre priorizarem uma análise criteriosa e ética dos trabalhos científicos. À Dra. Lígia Pizzatto e à Dra. Marta Maria Antoniazzi por aceitarem o convite de participarem enquanto suplentes. À Dra. Erika Hingst-Zaher pela orientação ao longo da minha carreira no Butantan, pelas conversas, as de bar e as reuniões, pelas oportunidades de ampliar os horizontes, e pela relação de amizade que construímos ao longo desse caminho. Agradeço a todos os profissionais de limpeza, secretaria e manutenção do laboratório, Dona Vera, Dona Maria, Dona Marta, Regina, Darina, Sr. Déda e Sr. Robson, que proporcionam um ambiente sempre limpo e organizado para que o restante do trabalho seja possível. Aos técnicos do laboratório, Kalena, Adriano, Kelly, Poli, Cristiene e Cinthia, por se mostrarem sempre solícitos e dispostos a me ajudar com o que fosse preciso. Agradeço aos pesquisadores Dr. Otávio Marques e Myriam Caleffo, por todas as conversas, confraternizações e ideias de corredores que me foram essenciais. Aos amigos do LEEV! Às risadas, descontrações, cafezinhos e docinhos. Sou especialmente grata ao Fabiano, Erick, Serena, Miguel, Diego, Karininha, Rafaela, Henrique, Letícia, Rebeca, Lucas, Silara, Nati e Karina Banci, por toda a ajuda e apoio emocional ao longo da minha dissertação. Agradeço à Dra. Mariana Fogaça, uma pesquisadora incrível que eu admiro imensamente e tenho a honra de chamar de amiga. Seus conselhos, áudios de 15 minutos e e-mails são essenciais para a minha sanidade mental na pós-graduação. Sinto muita saudade dos nossos papos! Voa que é tudo seu! Agradeço às minhas amigas de outras vidas, Raquel, Iri, Julie, Luiza, Michele, Giu, Carol, Rafa e Vick. Em especial agradeço à Pri, que me ajudou a formatar essa dissertação. Vocês são os melhores presentes que a vida me deu. Agradeço ao meu companheiro de vida e de dissertação também, Bruno. Porque sem ele esse trabalho simplesmente não existiria. Topou ir pra (quase) todas as coleções comigo, e me ajudou dentro e fora do laboratório. Sou imensamente grata por ter ao meu lado alguém que quer ver o meu sucesso. À minha sogra, Cida, que me apoia incondicionalmente em tudo que eu faço, e à Mônica, que sempre me anima com seus causos e sente um legítimo orgulho de mim. Obrigada por tudo! E por último, mas não menos importante, quero agradecer a minha família. Às minhas tias, Bernadete, por não medir esforços para me ajudar e por deixar eu morar em sua casa enquanto vivi em São Paulo. Margarete, por acreditar em mim e estar disposta a ir comigo aonde for. Elizabeth que, mesmo distante, se preocupa sempre com o meu bem-estar. Lucélia, muito orgulhosa da sobrinha querida, sempre tão amorosa. Zeidi, pelos papos cabeça e pela compreensão dessa louca vida de academia. Minhas tias são como mães e tenho um amor imenso por elas. Aos meus tios (in memorian), Lídio, Rubinho e Hélio, pelo profundo amor com todos ao seu redor, pela demonstração de força e superação, pelo exemplo de ética e caráter. Saudades eternas. Aos meus irmãos Daniel e Luciane, e aos meus sobrinhos Gabriel e Lenina, pela cumplicidade e companheirismo. Aos meus muitos primos e primas, pelas agradáveis conversas, gargalhadas e comilanças. Ao meu pai Claudio Mendel e à minha mãe Andreia Barros, que me ensinam o valor máximo do caráter, da ética e do profissionalismo. Me apoiam em absolutamente todas as minhas escolhas e fazem de tudo para me garantir o melhor. Tenho um orgulho imenso dos meus pais e sem o amor e a compreensão deles essa dissertação não seria possível. Muito obrigada! “Sou biólogo e viajo muito pela savana do meu país. Nessas regiões encontro gente que não sabe ler livros, mas que sabe ler o seu mundo. Nesse universo de outros saberes, sou eu o analfabeto.” Mia Couto (2011, p. 14) RESUMO O conjunto de características manifestadas por uma espécie que levam ao sucesso reprodutivo pode ser chamado de estratégias reprodutivas. Isto inclui, por exemplo, o período reprodutivo, o modo reprodutivo, a sincronia reprodutiva entre machos e fêmeas, o tempo de fertilização e a frequência reprodutiva. O gênero Lachesis é composto de quatro espécies ovíparas restritas às florestas úmidas da América Central e América do Sul. Popularmente conhecidas como surucucu, são um grupo de importância médica, tal como Bothrops e Crotalus. Lachesis muta é a espécie com a maior distribuição, e ocorre na América no Sul, na Mata Atlântica e na Floresta Amazônica. Ao contrário de Bothrops e Crotalus, estudos sobre biologia reprodutiva para o gênero Lachesis são, em sua maioria, desenvolvidos em cativeiro e com foco no comportamento reprodutivo. Propomos, então, descrever em dois capítulos aspectos da biologia reprodutiva da espécie Lachesis muta investigados a partir da anatomia e morfologia de seus órgãos reprodutivos ao longo das estações do ano. No Capítulo 1, investigamos a biologia reprodutiva de L. muta da Floresta Amazônica e da Mata Atlântica brasileira a partir de dados de biometria e histologia de animais preservados em coleções biológicas e provenientes da natureza. No Capítulo 2, descrevemos o oviduto feminino em diferentes estágios do ciclo reprodutivo. Comparando tanto as duas populações quanto a espécie com outros crotalíneos neotropicais, nosso objetivo foi investigar possíveis padrões para o grupo Viperidae, assim como a hipótese da influência de fatores abióticos no ciclo reprodutivo de serpentes. Encontramos sazonalidade na espermatogênese dos machos para as duas populações, que ocorre ao longo da estação chuvosa (novembro a abril) na região Amazônica, e no outono e inverno (março a agosto) na região da Mata Atlântica. Também houve sazonalidade na vitelogênese das fêmeas, que coincidiu nas duas populações com a época da estação seca, na Amazônia, e outono/inverno na Mata Atlântica (maio a setembro). Adicionalmente, o resultado deste trabalho descreve pela primeira vez a estratégia reprodutiva de estocagem de espermatozoides nas fêmeas do gênero Lachesis. Palavras–chave: Biologia reprodutiva. Lachesis muta. Estratégia de estocagem de espermatozoides. Ciclos reprodutivos. Espermatogênese. ABSTRACT The set of characteristics manifested by a species leading to reproductive success can be called reproductive strategies. These include, for example, the reproductive period, the reproductive mode, the reproductive synchrony between males and females, the time of fertilization, and the reproductive frequency. The genus Lachesis comprises four oviparous species restricted to Central and South American rainforests and popularly known as bushmasters, and is a group of medical importance, as are Bothrops and Crotalus. Lachesis muta is the most widely distributed and occurs in South America, at the Atlantic Forest and the Amazon Rainforest.Unlike Bothrops and Crotalus, reproductive biology studies for the genus Lachesis weremostly developed in captivity, focusing mainly on reproductive behavior. We propose to describe in two chapters aspects of the reproductive biology of the Lachesis muta species investigated from the anatomy and morphology of its reproductive organs over the seasons of the year. In Chapter 1, we investigate the reproductive biology of L. muta by biometric and histology data from biological collections, focusing on individuals collected in the wild. In Chapter 2, we describe the female oviduct at different stages of the reproductive cycle. Comparing both populations and species with the other neotropical crotalines, we aim to investigate possibles patterns for the Viperidae group, as well as the hypothesis of the influence of abiotic factors on the snake reproductive cycle. For both populations, we find seasonality in male spermatogenesis, which occurs throughout the rainy season in the Amazon (November to April), and in autumn and winter in the Atlantic Forest (March to August); and in vitellogenesis of females, which occurs in the dry season in the Amazon and in autumn and winter in the Atlantic Forest (April to September). In addition, the result of this work describes for the first time the reproductive strategy of sperm storage in females of the genus Lachesis. Keywords: Reproductive biology. Lachesis muta. Sperm storage strategy. Reproductive cycles. Espermatogenesis. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Capítulo 1 – Biologia reprodutiva da surucucu-pico-de-jaca, Lachesis muta (Linnaeus, 1766): de Norte a Nordeste do Brasil. Figura 1.1 – Mapa da distribuição dos animais estudados neste trabalho. 27 Figura 1.2 – Climatogramas regionais para a Floresta Amazônica. 28 Figura 1.3 – Climatogramas regionais para o norte da Mata Atlântica. 29 Figura 1.4 – Maturidade sexual em fêmeas e machos. 30 Figura 1.5 – Folículos de L. muta. 31 Figura 1.6 – Medidas registradas para os machos em corte histológico. 32 Figura 1.7 – Atividade anual de indivíduos adultos de Lachesis muta da Amazônia. 36 Figura 1.8 – Atividade anual de indivíduos adultos de Lachesis muta da Mata Atlântica. 37 Figura 1.9 – Maturidade sexual em fêmeas de Lachesis muta- FA. 38 Figura 1.10 – Maturidade sexual em machos de Lachesis muta - FA. 38 Figura 1.11 – Maturidade sexual em fêmeas de Lachesis muta – MA. 39 Figura 1.12 – Maturidade sexual em machos de Lachesis muta – MA. 40 Figura 1.13 – Média e variação do comprimento rostro-cloacal (CRC) entre indivíduos adultos machos e fêmeas de L. muta. 41 Figura 1.14 – Correlação entre comprimento rostro-cloacal (CRC) e comprimento da cauda (CC) entre machos e fêmeas de L. muta. 42 Figura 1.15 – Correlação entre comprimento rostro-cloacal (CRC) e comprimento da cabeça (CCAB) entre machos e fêmeas de L. muta. 42 Figura 1.16 – Correlação entre o comprimento rostro-cloacal (CRC) e a largura da cabeça (LCAB) entre machos e fêmeas de L. muta. 43 Figura 1.17 – Média e variação do comprimento rostro-cloacal (CRC) entre indivíduos adultos machos e fêmeas de L. muta da Mata Atlântica. 44 Figura 1.18 – Correlação entre comprimento rostro-cloacal (CRC) e comprimento da cauda (CC) entre machos e fêmeas de L. mutada Mata Atlântica. 45 Figura 1.19 – Média e variação do comprimento da cabeça (CCAB) entre indivíduos adultos machos e fêmeas de L. mutada Mata Atlântica. 45 Figura 1.20 – Média e variação da largura da cabeça (LCAB) entre indivíduos 46 adultos machos e fêmeas de L. muta da Mata Atlântica. Figura 1.21 – Correlação entre comprimento rostro-cloacal (CRC) e comprimento do testículo de machos de L. muta. 47 Figura 1.22 – Média e variação do Log do Volume Testicular entre indivíduos adultos machos de L. muta ao longo das estações seca e chuvosa. 47 Figura 1.23 – Média e variação do Diâmetro do Ducto Deferente entre indivíduos adultos machos de L. muta ao longo das estações seca e chuvosa. 48 Figura 1.24 – Ciclo espermatogênico de L. muta. 49 Figura 1.25 – Média e variação do comprimento do Log do Diâmetro do Túbulo Seminífero para duas estações. 50 Figura 1.26 – Média e variação do comprimento da altura do Log do Epitélio do Túbulo Seminífero para duas estações. 50 Figura 1.27 – Média e variação do comprimento do Log do Diâmetro do Túbulo Seminífero para quatro estações. 51 Figura 1.28 – Média e variação do comprimento do Log do Epitélio do Túbulo Seminífero para quatro estações. 52 Figura 1.29 – Estocagem de espermatozoides no ducto deferente. 53 Figura 1.30 – Ciclo do Segmento Sexual Renal. 54 Figura 1.31 – Média e variação do comprimento do Log do Diâmetro do Segmento Sexual Renal (SSR) para duas estações. 55 Figura 1.32 – Média e variação do comprimento do Log da Altura do Epitélio do Segmento Sexual Renal (SSR) para duas estações. 55 Figura 1.33 – Média e variação do comprimento do Log do Diâmetro do Segmento Sexual Renal para quatro estações. 56 Figura 1.34 – Média e variação do comprimento do Log da Altura do Epitélio do Segmento Sexual Renal para quatro estações. 57 Figura 1.35 – Ciclo espermatogênico de L. muta. 58 Figura 1.36 – Média e variação do Log do Diâmetro do Túbulo Seminífero. 59 Figura 1.37 – Média e variação do Log da altura do Epitélio do Túbulo Seminífero. 59 Figura 1.38 – Ciclo do Segmento Sexual Renal. 60 Figura 1.39 – Média e variação do Log Diâmetro do Túbulo do SSR. 61 Figura 1.40 – Média e variação do Log da altura do Epitélio do Túbulo do SSR. 61 Figura 1.41– Ciclo reprodutivo dos machos de L. muta da população da Floresta 62 Amazônica e da Mata Atlântica. Figura 1.42 – Ciclo reprodutivo de fêmeas de Lachesis mutada Floresta Amazônica. 64 Figura 1.43 – Ciclo reprodutivo de fêmeas de Lachesis mutada Mata Atlântica. 65 Figura 1.44 – Correlação entre o log do comprimento rostro-cloacal (CRC) materno e o log do diâmetro do maior folículo ou ovo de fêmeas de L. muta. 67 Figura 1.45 – Plug copulatório na região vaginal de L. muta – FA. 68 Figura 1.46 – Estocagem de espermatozoides na junção útero-vaginal (UMT) de L. muta. 69 Figura 1.47 – Estocagem de espermatozoides no infundíbulo posterior de L. muta. 70 Figura 1.48 – Plug copulatório na região vaginal de L. muta – MA. 71 Figura 1.49 – Estocagem de espermatozoides em L. muta. 72 Figura 1.50 – Ciclo reprodutivo das fêmeas de L. muta da população da Floresta Amazônica e da Mata Atlântica. 73 Figura 1.51 – Resumo do ciclo reprodutivo de machos e fêmeas de L. muta da população da Floresta Amazônica. 74 Figura 1.52 – Resumo do ciclo reprodutivo de machos e fêmeas de L. muta da população da Mata Atlântica. 75 Quadro 1.1 – Classificação dos túbulos seminíferos nas fases espermatogênicas. 32 Capítulo 2 – Estocagem de espermatozoides e aspectos morfológicos do oviduto de Lachesis muta (Serpentes: Viperidae). Figura 2.1 – Aspecto geral do UMT de Lachesis muta. 108 Figura 2.2 – Tipos morfológicos do UMT encontrados em fêmeas diferentes de Lachesis muta. 108 Figura 2.3 – Microscopia Eletrônica de Varredura da região do útero aglandular onde é formado a UMT em Lachesis muta. 109 Figura 2.4 – Região do útero aglandular onde é formado o UMT em Lachesis muta – Corte transversal. 110 Figura 2.5 – Região do útero aglandular onde é formado o UMT em Lachesis muta – Corte longitudinal. 111 Figura 2.6 – Corte longitudinal da região do infundíbulo posterior. 113 Figura 2.7 – Estocagem de espermatozoides no infundíbulo posterior de Lachesis muta. 114 Figura 2.8 – Estocagem de espermatozoide no UMT de Lachesis muta. 115 Figura 2.9 – Infundíbulo posterior. 116 Figura 2.10 – Média e variação do comprimento do epitélio do infundíbulo posterior. 116 Figura 2.11 – Infundíbulo posterior de Lachesis muta em estágio de vitelogênese secundária indicando reação positiva para PAS e AB na região epitelial. 117 Figura 2.12 – Infundíbulo posterior de Lachesis muta em estágio de prenhez indicando reação positiva para PAS e AB na região epitelial. 118 Figura 2.13 – Infundíbulo posterior de Lachesis muta em diferentes estágios reprodutivos em reação negativa para BB na região epitelial 119 Figura 2.14 – UMT de Lachesis muta em diferentes estágios reprodutivos em reação positiva para AB na região epitelial. 120 Figura 2.15 – UMT de Lachesis muta em reação negativa para o PAS. 121 Figura 2.16 – UMT de Lachesis muta em diferentes estágios do ciclo reprodutivo em reação negativa para BB na região epitelial. 122 Figura 2.17 – Média e variação do comprimento do epitélio da vagina. 123 Figura 2.18 – Vagina de Lachesis muta em diferentes estágios do ciclo reprodutivo em reação positiva para AB na região epitelial. 124 Figura 2.19 – Vagina de Lachesis muta em diferentes estágios do ciclo reprodutivo em reação positiva para PAS na região epitelial. 125 Figura 2.20 – Vagina de Lachesis muta em diferentes estágios do ciclo reprodutivo em reação positiva para AB na região epitelial 126 Figura 2.21 – Média e variação do comprimento do epitélio do útero glandular. 127 Figura 2.22 – Média e variação do diâmetro das glândulas do útero glandular. 127 Figura 2.23 – Útero glandular de Lachesis muta em diferentes estágios do ciclo reprodutivo. 128 Figura 2.24 – Útero glandular de Lachesis muta em diferentes estágios do ciclo reprodutivo em reação positiva para o AB na região epitelial. 129 Figura 2.25 – Útero glandular de Lachesis muta em diferentes estágios do ciclo reprodutivo em reação positiva para o PAS na região glandular. 130 Figura 2.26 – Útero glandular de Lachesis muta em diferentes estágios do ciclo 131 reprodutivo em reação positiva para o AB na região glandular. LISTA DE TABELAS Capítulo 1 – Biologia reprodutiva da surucucu-pico-de-jaca (Lachesis muta): de Norte a Nordeste do Brasil. Tabela 1.1 – Número total de indivíduos analisados no trabalho separados por bioma. 25 Tabela 1.2 – Dados morfológicos dos indivíduos adultos machos e fêmeas da população Amazônica de L. muta. 41 Tabela 1.3 – Dados morfológicos dos indivíduos adultos machos e fêmeas da população da Mata Atlântica de L. muta. 44 Tabela 1.4 – Fêmeas analisadas de Lachesis muta. 66 Capítulo 2 – Estocagem de espermatozoides e aspectos morfológicos do oviduto de Lachesis muta (Serpentes: Viperidae). Tabela 2.1 – Espécimes examinados de Lachesis muta. 106 Tabela 2.2 – Espécimes de Lachesis muta os quais foram observados estocagem de espermatozoides. 112 Tabela 2.3 – Resumo das alterações secretórias que foram observadas no oviduto e nas estruturas encontradas (i.e., plug copulatório, UMT e espermatozoides) ao longo do ciclo reprodutivo das fêmeas de Lachesis muta. 132 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AB Alcian Blue ANCOVA Análise de Covariância BB Bromofenol Blue CC Comprimento da Cauda CCAB Comprimento da Cabeça CRC Comprimento Rostro-Cloacal Dd Ducto deferente direito FA Floresta Amazônica FMT-HVD Faculdade de Medicina Tropical Dr. Heitor Vieira Dourado H&E Hematoxilina e Eosina http HyperTextTranferProtocol. IBUSP Coleção Herpetológica Alphonse Richard Hoge IPd Infundíbulo Posterior direito L Lúmen LCAB Largura da Cabeça MA Mata Atlântica MPEG Museu Paraense Emílio Goeldi MZUSP Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo OVd Ovário direito PAS Ácido Periódico de Schiff Rd Rim direito SSD Índice de Dimorfismo Sexual SSR Segmento Sexual Renal UAd Útero Anterior direito UMT Uterine Muscular Twisting/Contração Muscular Uterina URL UniformResourceLocator V1 Vitelogênese primária V2 Vitelogênese secundária www World Wide Web LISTA DE SÍMBOLOS ºC Graus Celsius Mm Miligramas π Pi µm Micrometros < Menor SUMÁRIO CAPÍTULO 1: Biologia reprodutiva da surucucu-pico-de-jaca, Lachesis muta (Linnaeus, 1766): de Norte a Nordeste do Brasil. 19 1 INTRODUÇÃO 20 2 MATERIAL E MÉTODOS 25 2.1 Os animais 25 2.2 Área de estudo 25 2.2.1 Floresta Amazônica (FA) 25 2.2.2 Mata Atlântica (MA) 26 2.3 Análise do dimorfismo e maturidade sexual 29 2.4 Caracterização do ciclo reprodutivo de machos e fêmeas de Lachesis muta 30 2.4.1 Histologia do trato reprodutivo masculino e feminino 31 2.5 Análises dos dados 33 3 RESULTADOS 35 3.1 Inferência do padrão de atividade a partir dos animais coletados 35 3.1.1 População Amazônica 35 3.1.2 População da Mata Atlântica 36 3.2 Maturidade sexual 37 3.2.1 População Amazônica 37 3.2.2 População da Mata Atlântica 39 3.3 Dimorfismo sexual 40 3.3.1 População Amazônica 40 3.3.2 População da Mata Atlântica 43 3.4 Ciclo reprodutivo dos machos 46 3.4.1 População da Floresta Amazônica 46 3.4.1.1 Variação do comprimento e volume testicular 46 3.4.1.2 Variação do diâmetro do ducto deferente 48 3.4.1.3 Ciclo espermatogênico 48 3.4.1.4 Estocagem no ducto deferente 52 3.4.1.5 Segmento Sexual Renal (SSR) 53 3.4.2 População da Mata Atlântica 57 3.4.2.1 Ciclo espermatogênico 57 3.4.2.2 Estocagem no Ducto Deferente 59 3.4.2.3 Ciclo do Segmento Sexual Renal (SSR) 60 3.4.3 Resumo do Ciclo reprodutivo dos machos de L. muta 62 3.5 Ciclo reprodutivo das fêmeas 63 3.5.1 Análise macroscópica do trato reprodutivo feminino 63 3.5.1.1 População da Floresta Amazônica (FA) 63 3.5.1.2 População da Mata Atlântica (MA) 64 3.5.2 Fecundidade 66 3.5.3 Plug copulatório e estocagem de espermatozoides 67 3.5.3.1 População da Floresta Amazônica 68 3.5.3.2 População da Mata Atlântica 70 3.6 Resumo do ciclo reprodutivo de fêmeas de L. muta 72 3.7 Resumo do ciclo reprodutivo de machos e fêmeas de L. muta da população da Floresta Amazônica e da Mata Atlântica 73 4 DISCUSSÃO 75 4.1 Maturidade sexual, dimorfismo sexual e fecundidade 75 4.2 Ciclos Reprodutivos 79 4.3 Frequência Reprodutiva 85 4.4 Variações Interpopulacionais 86 5 CONCLUSÃO 89 REFERÊNCIAS 91 CAPÍTULO 2: Estocagem de espermatozoides e aspectos morfológicos do oviduto de Lachesis muta (Serpentes: Viperidae) 100 1 INTRODUÇÃO 101 2 MATERIAL E MÉTODOS 103 2.1 Os animais 103 2.2 Coleta de dados 104 2.3 Microscopia de luz 104 2.4 Microscopia eletrônica de varredura 105 2.5 Análise de dados 105 3 RESULTADOS 105 3.1 Uterine Muscular Twisting (UMT) 105 3.1.1 Aspecto morfológico da UMT 107 3.1.2 Aspecto microscópico da UMT 109 3.2 Estocagem de espermatozoides no oviduto 111 3.3 Alterações secretórias no oviduto ao longo do ciclo reprodutivo 115 3.3.1 Infundíbulo posterior 115 3.3.2 UMT 119 3.3.3 Vagina e plug copulatório 122 3.3.4 Útero glandular 126 3.4 Resumo das alterações secretórias no oviduto ao longo do ciclo reprodutivo 131 4 DISCUSSÃO 132 5 CONCLUSÃO 136 REFERÊNCIAS 137 CAPÍTULO 1: Biologia reprodutiva da surucucu-pico-de-jaca, Lachesis muta (Linnaeus, 1766): de Norte a Nordeste do Brasil. Lachesis muta. Foto: Otávio A. V. Marques “Em 1788 Carl von Linné nomeou a surucucu de Crotalus mutus, literalmente “a silenciosa cascavel”. Quase 40 anos depois, François-Marie Daudin designou-a em um novo gênero, Lachesis, o nome de uma das três Moiras gregas. Na mitologia grega, Clothos gira o fio da vida; Lachesis, aleatoriamente, escolhe o comprimento do fio; e Atropos faz o corte final. Talvez a escolha do jovem herpetólogo francês refletisse uma aversão generalizada entre os primeiros naturalistas, bem como os perigos lendários associados a essa cobra.” Greene 1997 – Snakes: the Evolution of mistery in nature. 20 1 INTRODUÇÃO As serpentes são animais extremamente diferenciados, filogeneticamente complexos e amplamente distribuídos geograficamente, presentes em todos os continentes do mundo com exceção apenas das regiões polares e da Groenlândia (GREENE, 1997; UETZ; HOSEK, 2014). A ampla diversidade filogenética e biogeográfica confere às serpentes diferenças significativas no modo de vida de cada espécie, ocasionando em uma história de vida rica entre espécies e populações em termos de alimentação, reprodução e demais aspectos de história natural (SHINE; BONNET, 2009). Dentre todas as vertentes que moldam a história de vida das espécies, certamente a reprodução é uma das características mais intrigantes. Os organismos buscam otimizar sua aptidão biológica selecionando a melhor estratégia reprodutiva em determinado ambiente, o que possibilita o sucesso reprodutivo da espécie e sua continuidade ao longo da história evolutiva. O conjunto de características manifestadas por uma espécie que levam ao sucesso reprodutivo pode ser chamado de estratégias reprodutivas (VAZZOLER, 1996). Essas características incluem, por exemplo, o período reprodutivo, o modo reprodutivo, a sincronia reprodutiva entre machos e fêmeas, a época de fecundação e a frequência reprodutiva (SEIGEL; FORD, 1987; SHINE, 2003). Os custos e os benefícios que permeiam a reprodução impõem uma forte seleção no ajuste de tais estratégias às condições ambientais locais e, como consequência, espécies e até populações podem apresentar estratégias reprodutivas bem distintas entre si (SHINE, 2003). Em uma mesma população, por exemplo, diversos estudos demonstram significativo dimorfismo sexual entre machos e fêmeas, o que inclui o tamanho médio do corpo, tamanho relativo da cabeça e da cauda, coloração e aspectos ecológicos em geral (dieta, uso do habitat, nível de atividade e comportamento) (ALMEIDA-SANTOS et al., 2014; BONNET et al., 1998; KING, 1989; SHINE, 1993, 1994). O dimorfismo sexual pode tanto ser resultado de seleção sexual, em que machos maiores e mais robustos obteriam vantagens em rituais de combate com outros machos e na competição espermática, quanto decorrer de seleção natural, em que fêmeas maiores processam e estocam mais energia para a nutrição dos ovos ou embriões (BONNET et al., 1998; KING, 1989; SHINE, 1994). Diferenças corporais entre machos e fêmeas de serpentes são frequentemente relacionadas com diferenças em estratégias no sistema de acasalamento (SHINE, 1978). Nas espécies em que não ocorre ritual de combate entre machos, geralmente as fêmeas são maiores (SHINE, 1994). De fato, quando 21 olhamos para a família Viperidae, na grande maioria das espécies em que é confirmado o ritual de combate, machos são maiores do que as fêmeas, como é o caso de algumas espécies do gênero Agkistrodon (SHINE, 1994) e Crotalus (ALMEIDA-SANTOS; SALOMÃO, 1997; SHINE, 1994). Já para os viperídeos neotropicais, principalmente do gênero Bothrops, observa-se uma inversão nos valores do índice do dimorfismo sexual, e fêmeas frequentemente são maiores do que os machos ao mesmo tempo em que o ritual de combate deixa de ser observado para a maioria das espécies desse grupo, e a fecundidade das fêmeas aumenta (ALMEIDA-SANTOS et al., 2017; BARROS; ROJAS; ALMEIDA-SANTOS, 2014a, 2014b; HARTMANN; LEÃO et al., 2014; MARQUES; ALMEIDA-SANTOS, 2004; MARQUES; KASPEROVICZUS; ALMEIDA-SANTOS, 2013; MONTEIRO et al., 2006; SAZIMA, 1992; SOLÓRZANO; CERDAS, 1989; SILVA et al., 2019b; VALDUJO; NOGUEIRA; MARTINS, 2002). Outra característica importante e bastante variável entre as serpentes são os ciclos reprodutivos, ou seja, o padrão de atividade das gônadas dos indivíduos ao longo da estação reprodutiva. De acordo com Mathies (2011), os ciclos reprodutivos podem ser classificados tanto em nível individual quanto em nível populacional. Em nível individual, o tipo reprodutivo é classificado seguindo três padrões distintos: descontínuo cíclico, quando as gônadas ficam quiescentes por algum período; contínuo cíclico, quando as gônadas não ficam completamente quiescentes, mas sua atividade é reduzida por algum período; e acíclico, quando as gônadas exibem níveis constantes de atividade ao longo do ano. Em nível populacional, o ciclo reprodutivo pode ser classificado como sazonal, quando os indivíduos da população apresentam sincronia nos eventos reprodutivos; ou assazonal, quando não há sincronia. Diversos fatores associados (utilização do habitat, alimentação, temperatura, umidade e fotoperíodo) podem influenciar a extensão do ciclo reprodutivo (MATHIES, 2011) (SEIGEL; FORD, 1987). Muitas espécies de Colubridae da América do Norte, região temperada, apresentam o período de vitelogênese e cópula restritos ao período de primavera (ALDRIDGE; DUVALL, 2002; MATHIES, 2011(ALDRIDGE, 1979). Por outro lado, crotalíneos norte-americanos sincronizam o início da vitelogênese com as estações de verão e outono, no inverno o processo cessa por um período de hibernação e é finalizado na primavera, quando ocorre a ovulação e a fertilização, seguido do nascimento dos filhotes no verão até início do outono, demonstrando uma marcada sazonalidade reprodutiva que coincide com épocas mais quentes do ano (ALDRIDGE, 1979; ALDRIDGE; DUVALL, 2002; SEIGEL; HUGGINS; FORD, 1987). Nas regiões tropicais e subtropicais, é possível 22 encontrar espécies capazes de se reproduzir continuamente ao longo de todo o ano (MATHIES, 2011). Entretanto, a frequência dessas espécies é muito menor do que o esperado por alguns autores (FITCH, 1982), e parte considerável das espécies tropicais já estudadas apresenta ciclo sazonal, como é o caso dos crotalíneos (ALMEIDA-SANTOS; SALOMÃO, 2002; ALMEIDA-SANTOS et al., 2017; BARROS; ROJAS; ALMEIDA-SANTOS, 2014a; BARROS; SUEIRO; ALMEIDA-SANTOS, 2012; MARQUES, 1996; NOGUEIRA; SAWAYA; MARTINS, 2003; SHINE, 2003). Isto deve ocorrer devido a restrições filogenéticas, fator influente na reprodução de serpentes cuja importância ainda é pouco quantificada (BARROS; ROJAS; ALMEIDA-SANTOS, 2014a; BELLINI; ARZAMENDIA; GIRAUDO, 2017; PIZZATTO; ALMEIDA-SANTOS; MARQUES, 2006), e aos custos energéticos dos eventos reprodutivos (SEIGEL; HUGGINS; FORD, 1987). Existem 32 espécies da Família Viperidae descritas para o território brasileiro, sendo 2 do gênero Bothrocophias, 28 do gênero Bothrops, 1 do gênero Crotalus e 1 do gênero Lachesis (COSTA; BÉRNILS, 2018), e são conhecidas popularmente como jararacas (Bothrops e Bothrocophias), cascavéis (Crotalus) e surucucu (Lachesis). Vários aspectos biológicos são conhecidos para muitas delas, já que são animais peçonhentos e de importância médica (ALENCAR et al., 2016; GREENE, 1997). Em relação à biologia reprodutiva, os viperídeos brasileiros estudados são: Bothrops erythromelas (BARROS, 2011), B. insularis (KASPEROVICZUS, 2013), B. jararaca (ALMEIDA-SANTOS; SALOMÃO, 2002; KASPEROVICZUS, 2013) B. leucurus (BARROS; ROJAS; ALMEIDA-SANTOS, 2014b), B. matogrossensis (MONTEIRO et al., 2006), B. moojeni (ALMEIDA-SANTOS et al., 2017; NOGUEIRA; SAWAYA; MARTINS, 2003), B. pauloensis (VALDUJO; NOGUEIRA; MARTINS, 2002), B. alternatus (NUNES et al., 2010; AMARAL, 2015), B. atrox (SILVA et al., 2019a) e Crotalus durissus (ALMEIDA- SANTOS; SALOMÃO, 1997; BARROS; SUEIRO; ALMEIDA-SANTOS, 2012; SUEIRO, 2013). Nas espécies do gênero Bothrops, fêmeas e machos apresentam ciclos reprodutivos descontínuos e sazonais, e mostram algumas características reprodutivas conservadas em relação aos crotalíneos de regiões temperadas, como o nascimento dos filhotes no verão e início de outono, e outras características distintas, como período de cópula no outono/inverno (SEIGEL; FORD, 1987; SHINE, 1977b). Algumas estratégias reprodutivas adotadas por muitas espécies do gênero Bothrops são similares ao descrito para algumas espécies de Crotalus no que diz respeito à presença obrigatória de estocagem de espermatozóides, à presença do UMT (uterine muscular twisting) e à fertilização tardia, ou seja, dissociada do período de cópula (ALMEIDA-SANTOS; 23 SALOMÃO, 2002; BARROS; SUEIRO; ALMEIDA-SANTOS, 2012). A UMT é uma mudança morfológica que ocorre na região posterior do útero, em uma região também denominada junção útero-vaginal (MUNIZ-DA-SILVA et al., 2018). Essa modificação pode estar relacionada com a estocagem de espermatozoides, pois gera uma obstrução na região, dificultando a passagem de espermatozoides para o útero anterior por um determinado tempo (ALMEIDA-SANTOS; SALOMÃO, 2002). Apesar de ser comum observar essa estrutura em viperídeos do gênero Bothrops e Crotalus, ainda não há relatos na literatura para o gênero Lachesis. Estas características reprodutivas conservadas e atribuídas à maioria das espécies do gênero Bothrops e Crotalus vem sendo relacionadas com a inércia filogenética (ALMEIDA- SANTOS; SALOMÃO, 2002; BARROS; ROJAS; ALMEIDA-SANTOS, 2014b). O gênero Lachesis Daudin 1803 compreende quatro espécies restritas às florestas úmidas da América Central e América do Sul (VIAL; JIMENEZ-PORRAS, 1967) e são conhecidas popularmente como surucucu ou surucucu-pico-de-jaca, devido à textura de suas escamas. Lachesis stenophrys Cope, 1876, é encontrada do sul da Nicarágua até a região central e oeste do Panamá (CAMPBELL; LAMAR, 2004) e a costa Atlântica da Costa Rica (CORRALES et al., 2014); L. melanocephala Solórzano e Cerdas, 1986, é restrita ao sudoeste da Costa Rica até a fronteira com o Panamá (CAMPBELL; LAMAR, 2004); L. acrochorda (García, 1896), é distribuída ao longo das duas faixas costeiras do Panamá e ainda na região norte da Colômbia até o noroeste do Equador (FUENTES; CORRALES, 2016). A espécie Lachesis muta (Linnaeus, 1766) é a de maior distribuição e ocorre na América do Sul. No Brasil são encontradas duas populações que ocupam biomas distintos, uma na região norte da Mata Atlântica, do Ceará ao Rio de Janeiro, e outra na Floresta Amazônica, no Amapá, Amazonas, Acre, Pará, Rondônia, Roraima, Mato Grosso e Goiás (CAMPBELL; LAMAR, 2004). Estudos de filogenia e taxonomia sugerem que L. muta é independente das demais espécies, formando um grupo monofilético (FERNANDES; FRANCO; FERNANDES, 2004; ZAMUDIO; GREENE, 1997). Lachesis são serpentes de hábito noturno e que se alimentam de pequenos mamíferos, principalmente roedores do gênero Oryzomys sp. e ratos-de-espinho do gênero Proechimys sp., o que faz com que alguns autores caracterizem essas serpentes como predadoras seletivas, ou especialistas (GREENE; SANTANA, 1983; GREENE, 1997; RIPA, 1999; CAMPBELL; LAMAR, 2004; TURNER; CARMICHAEL; SOUZA, 2008). Exceto, talvez, por Bothrocophias colombianus (CAMPBELL; LAMAR, 2004), Lachesis é o único viperídeo ovíparo neotropical, fato que a diferencia dos outros crotalíneos neotropicais (AMARAL, 1925). Estas serpentes depositam seus ovos em buracos de troncos caídos, ou deixados por 24 mamíferos, e utilizam esses locais como refúgio (CAMPBELL; LAMAR, 2004; DE SOUZA, 2007; GREENE, 1997; MOLE, 1924; RIPA, 1994). Estudos de biologia reprodutiva para as espécies de Lachesis foram desenvolvidos majoritariamente em cativeiro (CORRALES et al., 2014; RIPA, 1994; RIPA, 2002). Para as espécies da América Central, os autores relatam pela primeira vez o dimorfismo sexual (machos maiores do que fêmeas) e aspectos de comportamento reprodutivo, como o cuidado parental, o combate entre machos e o comportamento de corte. Sobre L. muta, estudos com foco em reprodução (BOYER; MITCHELL; MURPHY, 1989; CORRALES; GÓMEZ; FLORES, 2016; DE SOUZA, 2007; EISELE, 2009; MELGAREJO; CUNHA; AGUIAR, 1999) foram também delineados em cativeiro e descrevem cuidado parental, comportamento de corte e número médio de ovos por ninhada. Os autores citados acima relatam aspectos convergentes em relação ao ciclo reprodutivo da surucucu. De Souza (2007), ao estudar uma população do sul da Bahia em cativeiro, afirmou não existir estação reprodutiva definida para Lachesis muta, sugerindo que a população seria capaz de se reproduzir continuamente ao longo do ano desde que ocorram frentes frias ou aumento na frequência das chuvas. O mesmo fato também foi observado por Boyer et al. (1989) e por Corrales (2016), que sugerem a simulação de uma frente fria e o aumento da umidade do cativeiro para desencadear os eventos reprodutivos em L. muta. Por outro lado, Alves et al. (2014), ao analisar a atividade gonadal de machos e fêmeas em diferentes estações do ano de uma população de L. muta do sul da Bahia afirmaram existir sazonalidade em alguns eventos reprodutivos, como a espermatogênese dos machos. Controvérsias quanto à sazonalidade ou não dos eventos reprodutivos desconsideram aspectos ambientais ou influências do cativeiro. Estas lacunas estimulam novos estudos que considerem, não apenas dados comportamentais, mas também uma análise mais robusta e criteriosa do trato reprodutivo de machos e fêmeas de Lachesis muta. Além disso, a biologia reprodutiva da população da Floresta Amazônica permanece desconhecida. Nesse sentido, este trabalho tem o objetivo de descrever a biologia reprodutiva das duas populações de L. muta que ocorrem no Brasil através da análise histológica das gônadas de indivíduos coletados na natureza e preservados em coleções zoológicas. Com isso, buscamos responder as seguintes questões: 1) O ciclo reprodutivo da surucucu é conservado em relação aos demais crotalíneos neotropicais? Isto é, apresenta sazonalidade na atividade gonadal, estratégia de estocagem de espermatozoide e contração muscular uterina (UMT). 2) Influências climáticas são capazes de culminar em diferenças nas estratégias reprodutivas entre as duas populações de L. muta encontradas no Brasil? 25 Além do interesse inerente ao conhecimento da reprodução da espécie, Lachesis muta também sofre com a perda de habitat devido a destruição predatória de seu ecossistema exclusivo, e a população da Mata Atlântica já foi elencada vulnerável (ALVES; ARGÔLO; CARVALHO, 2014). Assim, o conhecimento sobre a biologia reprodutiva é importante para a definição de estratégias de conservação para a espécie (ALMEIDA-SANTOS et al., 2014). 2 MATERIAL E MÉTODOS 2.1 Os animais Foram utilizados espécimes de Lachesis muta, machos e fêmeas, fixados em coleções herpetológicas e museus zoológicos. Os animais examinados estão depositados nas coleções das seguintes instituições: Instituto Butantan, SP (IBUSP), Museu de Zoologia da USP, SP (MZUSP), Museu Paraense Emílio Goeldi, PA (MPEG), Fundação de Medicina Tropical Doutor Heitor Vieira Dourado, AM (FMT-HVD), e Museu de Zoologia da Universidade Estadual de Santa Cruz, BA (MZUESC) totalizando 270 indivíduos, 125 da Floresta Amazônica (FA) e 145 do norte da Mata Atlântica (MA) (Tabela 1.1). De todos os espécimes foram coletados dados de procedência e data de coleta/óbito para inferir o padrão de atividade dos indivíduos coletados. A Figura 1.1 mostra as localidades de todos os animais avaliados neste trabalho. Tabela 1.1 – Número total de indivíduos analisados no trabalho e separados por bioma. Machos Fêmeas Filhotes/Juvenis Floresta Amazônica 57 41 27 Mata Atlântica 56 54 35 2.2 Área de estudo 2.2.1 Floresta Amazônica (FA) As áreas localizadas dentro do bioma Amazônico compreendem os Estados do Amazonas, Acre, Rondônia, Roraima, Pará, Amapá, e partes do Maranhão, Mato Grosso e Tocantins. O clima predominante nessa região é o equatorial (MENDONÇA & DANNI- 26 OLIVEIRA, 2007), com temperaturas médias relativamente constantes ao longo do ano (24ºC e 26ºC). Nos meses de junho a agosto, a temperatura apresenta uma pequena queda devido à penetração de frentes frias. Em relação à pluviosidade, na região amazônica encontram-se os mais expressivos totais pluviométricos do país em uma distribuição heterogênea, tanto espacial quanto temporal (MENDONÇA; DANNI-OLIVEIRA, 2007). Tal característica permite identificar os subtipos climáticos da zona equatorial amazônica. Climatogramas para as principais regiões amostradas foram elaborados a partir de dados do WorldClim versão 2.0, entre os anos de 1970 e 2018 (Figura 1.2). 2.2.2 Mata Atlântica (MA) Nas áreas de Mata Atlântica onde a espécie em estudo ocorre, o clima é tropical úmido e quente, ou tropical litorâneo (MENDONÇA; DANNI-OLIVEIRA, 2007), influenciado pelas massas de ar úmidas provenientes do oceano Atlântico. Apresenta maior amplitude térmica e maior variação pluviométrica ao longo do ano quando comparado com o bioma Amazônico. A concentração de chuvas se dá principalmente no final do verão até o inverno, e a temperatura apresenta uma pequena queda nos meses de inverno (MENDONÇA; DANNI- OLIVEIRA, 2007). Climatogramas para essas regiões são apresentados na Figura 1.3. 27 Figura 1.1 – Mapa da distribuição dos animais estudados neste trabalho. FONTE: SOUZA, E. 2020 28 Figura 1.2 – Climatogramas de três cidades da região amazônica, representando o padrão para a área da Floresta Amazônica. Média anual da precipitação, temperatura mínima e temperatura máxima de três cidades. Fonte: SOUZA, E. 2020 29 Figura 1.3 – Climatogramas de três cidades do litoral nordestino, representando o padrão para a área do norte da Mata Atlântica. Média anual da precipitação, temperatura mínima e temperatura máxima de três cidades. Fonte: SOUZA, E. 2020 2.3 Análise do dimorfismo e maturidade sexual A maturidade sexual da fêmea foi inferida a partir da observação de folículos em vitelogênese secundária, ovos, oviduto distendido(ALMEIDA-SANTOS et al., 2014) (SHINE, 1977a) (Figura 1.4A), presença de contração muscular uterina (UMT – uterine muscular twisting), ou pela presença de espermatozoides no trato reprodutivo após análise histológica. Nos machos, a maturidade foi averiguada a partir da observação do menor indivíduo com ductos deferentes opacos e enovelados (SHINE, 1977a) e, após análise histológica, a partir da presença de espermatozoides nos ductos e/ou nos testículos (Figura 1.4B). Para a análise do dimorfismo sexual, foram coletados dados morfométricos de indivíduos machos e fêmeas adultos de Lachesis muta a fim de evitar variações ontogenéticas na forma do corpo (KING, 1989). As medidas coletadas foram: (1) Comprimento rostro- cloacal (CRC; com fita milimetrada precisão 0,5 mm); (2) Comprimento da cauda (CC; com fita milimetrada precisão 0,5 mm); (3) Comprimento da cabeça (CCAB; com paquímetro 30 digital precisão 0,1 mm); e (4) Largura da cabeça (LCAB, com paquímetro digital precisão 0,1 mm). Para comparar o índice de dimorfismo sexual (SSD) foi utilizada a fórmula proposta por Shine (1994): SSD = 1 – (CRC médio dos adultos do sexo de maior tamanho/CRC médio dos adultos do sexo de menor tamanho). O SSD é um valor arbitrário e, quando expresso como negativo, indicam machos maiores do que fêmeas, enquanto valores positivos indicam fêmeas maiores do que machos. Figura 1.4 – Maturidade sexual em fêmeas (A) e machos (B). A) Fêmea madura em vitelogênese primária e com oviduto distendido. B) Macho maduro com ductos deferentes opacos e enovelados. Legenda: UAd = útero aglandular direito; IPd = infundíbulo posterior direito; OVd = ovário direito; Rd = rim direito; Dd = ducto deferente direito. As setas apontam o ducto enovelado. Fonte: SOUZA, E. 2020 2.4 Caracterização do ciclo reprodutivo de machos e fêmeas de Lachesis muta Uma incisão longitudinal ventral acima da cloaca até dois terços do comprimento total do animal foi feita para estudo da anatomia macroscópica e microscópica do trato reprodutivo dos animais com a análise dos dados de acordo com Almeida-Santos et al. 2014. As medidas macroscópicas foram dadas em milímetros com auxílio de paquímetro digital precisão 0,1 mm. Para todas as fêmeas foram registrados os seguintes dados: (1) estágio folicular (vitelogênese primária ou vitelogênese secundária), (2) quantidade de folículos em 31 vitelogênese secundária (V2) ou ovos nos ovidutos, (3) o comprimento do maior folículo ovariano ou ovo, e (4) a presença/ausência da UMT. Para todos os machos foram registrados (1) o comprimento, a largura e a espessura dos testículos direito e esquerdo; (2) o aspecto dos ductos deferentes (opaco e enovelado ou liso e translúcido); e (3) o diâmetro dos ductos deferentes direito e esquerdo na região distal. Para o cálculo do volume testicular foi utilizada a fórmula: VT = 4/3 π abc, onde a = ½ comprimento do testículo, b = ½ largura e c = ½ espessura (SHINE, 1980). O volume testicular foi usado como indicador da atividade espermatogênica ( FOX, 1956; SHINE, 1977a; VOLSØE, 1944). É comum que folículos maiores de 10 mm sejam considerados folículos vitelogênicos (ALMEIDA-SANTOS et al., 2014). Entretanto, para a surucucu, os folículos de 10 mm eram não-vitelogênicos, uma vez que não foi possível identificar depósito de vitelo nesses folículos em análise histológica (Figura 1.5 A e B). Sendo assim, folículos acima de 15 mm foram considerados vitelogênicos (Figura 1.5 C), quando o depósito de vitelo foi aparente no início da vitelogênese secundária, representado pela presença de gordura, que não fixa corretamente na lâmina e, portanto, não reage à hematoxilina-eosina. Figura 1.5 – Folículos de L. muta. Corte longitudinal. Hematoxilina e Eosina. Aumento 4x. A) Folículos em V1; 10,82 mm; B) Folículo em V1 com início de deposição de vitelo; 11,32 mm; C) Folículo em V2, 15,73 mm. Gr = granulosa; Oo = oócito; V = vitelo. Fonte: SOUZA, E. 2020 2.4.1 Histologia do trato reprodutivo masculino e feminino Foram coletadas amostras de tecido de machos e fêmeas para estudo em microscopia óptica. Nos machos foram coletados: um fragmento do testículo direito, um fragmento da região distal do ducto deferente e um fragmento do rim direito. As estruturas microscópicas medidas foram: diâmetro dos túbulos seminíferos e altura do epitélio seminífero nos cortes de testículo (Figura 1.6A) e diâmetro dos túbulos e altura do epitélio dos segmentos sexuais 32 renais (Figura 1.6B; SSK - Sexual Segment of the Kidney), na finalidade de quantificar a variação destas estruturas ao longo das estações e caracterizar as fases espermatogênicas em diferentes épocas do ano de acordo com o Quadro 1.1. Figura 1.6 – Medidas registradas para os machos em corte histológico. Hematoxilina e eosina, 40x. A) Túbulo seminífero em corte longitudinal do testículo, (1) = diâmetro do túbulo seminífero, (2) = altura do epitélio do túbulo seminífero. B) Segmento sexual renal (SSR) em corte longitudinal do rim, (1) = diâmetro do SSR, (2) = altura do epitélio do SSR. Fonte: SOUZA, E. 2020 Quadro1.1 – Classificação dos túbulos seminíferos nas fases espermatogênicas. Estágio Descrição do túbulo seminífero 1 Regressão completa: túbulos revestidos apenas por espermatogônias e células de Sertoli; ocorrência ocasional de poucos espermatozoides no lúmen. 2 Início da espermiogênese: Espermatogônias aumentando e dividindo- se; presença de espermatócitos primários. 3 Espermiogênese: Espermátides em metamorfose e presença de poucos espermatozoides. 4 Espermiação: espermatozoides maduros no lúmen. 5 Final da Espermiação: Espermatócitos e espermátides diminuindo. Espermatozoides ainda abundantes. 6 Início da regressão: Epitélio germinativo reduzido, espermatogônias, espermatócitos e espermátides. Pode haver espermatozoides no lúmen. Fonte: Adaptado de (GOLDBERG; PARKER, 1975; KASPEROVICZUS, 2013; SAINT-GIRONS, 1982; SILVA, 2015) 33 Nas fêmeas foram coletados: um fragmento do infundíbulo posterior e um da região da UMT e da vagina na finalidade de verificar estruturas de estocagem de espermatozoide e/ou plug copulatório. Os fragmentos de tecido coletados, previamente fixados em formol 10% e mantidos em solução etanol 70%, foram submetidos a desidratação em série crescente de etanol (80%, 90% e 100%) e diafanizados em xilol fracionado e xilol puro, seguido de inclusão em parafina. Os cortes de 5 μm de espessura foram feitos com micrótomo e em seguida submetidos à coloração básica com hematoxilina-eosina. 2.5 Análises dos dados Os dados foram analisados de acordo com Zar (1999), utilizando-se teste paramétrico ou o equivalente não paramétrico dependendo da normalidade e homogeneidade das amostras. As diferenças foram consideradas significativas quando p < 0,05. Devido à relativa homogeneidade na variação de temperatura ao longo do ano e à expressiva variação pluviométrica na região da Floresta Amazônica (FA) , foram definidas duas estações a fim de possibilitar comparação estatística na sazonalidade dos ciclos reprodutivos de machos e fêmeas: a estação seca, de maio até outubro, e a estação chuvosa, de novembro até abril. Já para a região da Mata Atlântica (MA), onde existe tanto variação de temperatura quanto pluviométrica ao longo do ano, foram definidas quatro estações: verão (janeiro, fevereiro e março), outono (abril, maio e junho), inverno (julho, agosto e setembro) e primavera (outubro, novembro e dezembro). Para inferência do padrão de atividade a partir da data de coleta dos animais, foi empregada a análise do Qui-quadrado de Pearson para verificar a probabilidade de casualidade na distribuição dos indivíduos em diferentes bimestres do ano. O dimorfismo sexual foi verificado a partir de teste-t na compararação do comprimento rostro-cloacal (CRC) médio de machos e fêmeas. Para o comprimento da cauda, da cabeça e largura da cabeça, foi utilizado análise de covariância (ANCOVA), usando o CRC como covariável. Para a população da FA, comparamos as medidas da variação do volume testicular e o diâmetro do ducto deferente por teste-t, uma vez que o tamanho dos órgãos não mostrou correlação com o CRC dos indivíduos. Já para o comprimento do testículo, avaliamos por análise de covariância, usando o CRC como covariável. Para a população da MA essas medidas não estão disponíveis pois a maioria dos animais estavam sem uma parte do testículo direito e/ou esquerdo devido a estudos anteriores. 34 O teste-t também foi utilizado para avaliar a variação nas medidas microscópicas do túbulo seminífero do testículo. A variação nas medidas do segmento sexual renal (SSR) foram comparadas pelo teste de Mann Whitney Wilcoxon, equivalente não paramétrico do teste-t. No caso dos machos da população amazônica, o número amostral permitiu testar a variação das medidas microscópicas levando em consideração dois períodos para cada estação: final da estação chuvosa (FEC: fevereiro, março, abril), início da estação seca (IES: maio, junho, julho), final da estação seca (FES: agosto, setembro, outubro), e início da estação chuvosa (IEC: novembro, dezembro, janeiro). Nesse caso os testes foram feitos com análise de variância (ANOVA) para o túbulo seminífero do testículo, e teste não paramétrico de Krustal Wallis para o SSR. Análises estatísticas e gráficos foram elaborados no software RStudio ou no Microsoft Excel. A fecundidade foi inferida pela contagem do número de folículos em vitelogênese secundáriaou ovos no útero de fêmeas reprodutivas. Primeiro, fizemos um teste de regressão entre o comprimento rostro-cloacal da mãe e a fecundidade, entre o comprimento total materno e a fecundidade, e entre o diâmetro do maior ovo ou folículo e o comprimento rostro- cloacal materno utilizando os dados de 10 fêmeas analisadas neste trabalho, sendo duas da FA e oito da MA. Em um segundo momento, os mesmos testes foram repetidos acrescentando-se dados de mais quatro fêmeas provenientes da literatura. Não comparamos a fecundidade entre as duas localidades devido ao baixo número amostral de fêmeas em V2 ou prenhes na região da Floresta Amazônica. O ciclo reprodutivo das fêmeas foi elaborado a partir da análise da distribuição dos folículos e/ou ovos ao longo do ano. O período de cópula foi estimado a partir da observação de espermatozoides e/ou plug copulatório em análises histológicas da vagina, e da época de maior concentração de fêmeas em vitelogênese secundária (ALMEIDA-SANTOS et al., 2014). De acordo com dados da literatura (ALVES; ARGÔLO; CARVALHO, 2014; BOYER; MITCHELL; MURPHY, 1989; CORRALES; GÓMEZ; FLORES, 2016; DE SOUZA, 2007), o comprimento total dos filhotes ao nascer varia de 40 a 61 cm aproximadamente. Portanto, exemplares da amostra que apresentavam comprimento entre esses valores foram considerados filhotes recém-nascidos. Juvenis com mais de 12 meses de vida apresentaram tamanho médio de 122 cm (BOYER; MITCHELL; MURPHY, 1989), portanto, exemplares de comprimento entre 61 cm e 122 cm foram considerados juvenis em primeiro ano de vida. Fotografias foram feitas no Microscópio Olympus BX 51, acoplado a câmera digital Olympus DP73. As medidas microscópicas foram feitas utilizando o software de imagem 35 cellSens, em aumento 20x. O preparo histológico foi feito no laboratório particular VETPAT Patologia e Biologia Molecular Veterinária, no Laboratógio de Biologia Celular do Instituto Butantan e no Laboratógio de Citogenética do Instituto Butantan. As fotografias foram feitas no Laboratório de Biologia Celular do Instituto Butantan. 3 RESULTADOS 3.1 Inferência do padrão de atividade a partir dos animais coletados 3.1.1 População Amazônica Foi avaliado um total de 95 indivíduos adultos, sendo 54 machos e 41 fêmeas. No caso dos machos, o número de animais coletados no bimestre de maio/junho foi significativamente superior ao restante do ano (Figura 1.6), ou seja, ao bimestre de julho/agosto (X² = 14,6; gL = 5; p = 0,0143), setembro/outubro (p = 0,0028), novembro/dezembro e janeiro/fevereiro (p = 0,0278). Em relação às fêmeas, o número de animais coletados no bimestre de março/abril e de maio/junho foi significativamente superior ao bimestre de novembro/dezembro (X² = 9,1951, gL = 5; p = 0,0348 e p = 0,0075, respectivamente; Figura 1.7). 36 Figura 1.7 – Número de indivíduos adultos de Lachesis muta da Amazônia coletados ao longo dos anos. O eixo x representa os bimestres: JF = janeiro/fevereiro; MA = março/abril; MJ = maio/junho; JÁ = julho/agosto; SO = setembro/outubro; ND = novembro/dezembro; o eixo y representa o número de indivíduos coletados por bimestre. Barras azuis = machos; barras vermelhas = fêmeas. Asterisco (*) = indica os bimestres com diferenças significativas tanto para machos quanto para fêmeas. Fonte: SOUZA, E. 2020 3.1.2 População da Mata Atlântica Foi avaliado um total de 94 indivíduos adultos, sendo 47 machos e 47 fêmeas. No caso dos machos, o número de animais coletados no bimestre de julho/agosto foi significativamente superior ao bimestre de maio/junho (X² = 17,723; gL = 5; p = 0,0218), e janeiro/fevereiro (p = 0,0017) (Figura 1.8). Em relação às fêmeas, o número de animais coletados no bimestre de março/abril foi significativamente superior ao bimestre de novembro/dezembro (X² = 9.0426, gL = 5; p = 0,012; Figura 1.8). 37 Figura 1.8 – Número de indivíduos adultos de Lachesis muta da Mata Atlântica coletados ao longo dos anos. O eixo x representa os bimestres: JF = janeiro/fevereiro; MA = março/abril; MJ = maio/junho; JA = julho/agosto; SO = setembro/outubro; ND = novembro/dezembro; o eixo y representa o número de indivíduos coletados por bimestre. Barras azuis = machos; barras vermelhas = fêmeas. Asterisco (*) = indica os bimestres com diferenças significativas entre machos (azul) e fêmeas (vermelho). Fonte: SOUZA, E. 2020 3.2 Maturidade sexual 3.2.1 População Amazônica A menor fêmea sexualmente madura tinha 1640 mm de CRC (Figura 1.9), apresentando folículos em vitelogênese primária e útero anterior distendido. Em relação aos machos, o menor indivíduo sexualmente maduro tinha 1280 mm de CRC, no início da espermatogênese. No caso dos machos, foi verificado certa variação entre os indivíduos da população (Figura 1.10), isto é, alguns machos maiores de 1280 mm foram considerados imaturos. 38 Figura 1.9 – Número de fêmeas de Lachesis muta amostradas de acordo com a maturidade sexual - FA. O eixo x representa o comprimento rostro-cloacal em milímetros de todos os indivíduos amostrados; o eixo y representa o número de indivíduos. Barras escuras representam fêmeas imaturas e barras claras representam fêmeas maduras. Fonte: SOUZA, E. 2020 Figura 1.10 – Número de machos de Lachesis muta amostrados de acordo com a maturidade sexual - FA. O eixo x representa o comprimento rostro-cloacal em milímetros de todos os indivíduos amostrados; o eixo y representa o número de indivíduos. Barras escuras representam machos imaturos e barras claras representam machos maduros. Fonte: SOUZA, E. 2020 0 5 10 15 20 25 30 < 1500 1501-1599 1600-1699 1700-1799 > 1800 N ú m e ro d e i n d iv íd u o s CRC (mm) Fêmeas Imaturas Maturas 0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 < 1500 1500-1599 1600-1699 1700-1799 > 1800 N ú m e ro d e I n d iv íd u o s CRC (mm) Machos Imaturos Maturos 39 3.2.2 População da Mata Atlântica Observamos uma fêmea sexualmente madura com 1420 mm de CRC (Figura 1.11), apresentando vitelogênese primária e UMT bem desenvolvido, possivelmente em seu primeiro episódio reprodutivo. Em relação aos machos, o menor indivíduo sexualmente maduro tinha 1300 mm de CRC (Figura 1.12), apresentando ductos enovelados e opacos. Figura 1.11 – Número de fêmeas de Lachesis muta amostradas de acordo com a maturidade sexual - MA. O eixo x representa o comprimento rostro-cloacal em milímetros de todos os indivíduos amostrados; o eixo y representa o número de indivíduos. Barras escuras representam fêmeas imaturas e barras claras representam fêmeas maduras. Fonte: SOUZA, E. 2020 0 5 10 15 20 25 30 35 < 1500 1501-1599 1600-1699 1700-1799 > 1800 N ú m e ro d e I n d iv íd u o s CRC (mm) Fêmeas Imaturas Maturas 40 Figura 1.12 – Número de machos de Lachesis muta amostrados de acordo com a maturidade sexual - MA. O eixo x representa o comprimento rostro-cloacal em milímetros de todos os indivíduos amostrados; o eixo y representa o número de indivíduos. Barras escuras representam machos imaturas e barras claras representam machos maduras. Fonte: SOUZA, E. 2020 3.3 Dimorfismo sexual 3.3.1 População Amazônica Foi encontrado dimorfismo sexual no Comprimento Rostro-Cloacal (CRC) (Tabela 1.2; Figura 1.13) e no Comprimento da Cauda (CC) (Tabela 1.2; Figura 1.14) entre os indivíduos adultos machos e fêmeas de Lachesis muta. Os machos apresentaram tanto maior tamanho corporal do que as fêmeas (t = -2,6545, gL = 91, p = 0,009; Tabela 1.2; Figura 1.12), quanto maior tamanho da cauda (ANCOVA, F2,88 = 42,19, p <0,00001; Tabela 1.2; Figura 1.13). O índice de dimorfismo sexual (SSD) foi de – 0,062. Em relação ao Comprimento da Cabeça (CCAB) (ANCOVA, F = 0,04 e p = 0,83; Tabela 1.2) e à Largura da Cabeça (LCAB) (ANCOVA, F = 1,88 e p = 0,17; Tabela 1.2), as fêmeas apresentaram valores médios maiores do que os machos, porém a diferença não foi significativa (Figura 1.15 e 1.16). 0 5 10 15 20 25 30 35 < 1500 1501-1599 1600-1699 1700-1799 > 1800N ú m e ro d e I n d iv íd u o s CRC (mm) Machos Imaturos Maturos 41 Tabela 1.2 – Dados morfológicos dos indivíduos adultos machos e fêmeas da população Amazônica de L. muta. DP = desvio padrão. Variável Machos Fêmeas Média ± DP Mínimo-Máximo n Média ± DP Mínimo-Máximo n CRC (mm) 1975,8 ± 237,53 1500-2520 53 1859,5 ± 206,46 1640-2680 40 CC (mm) 185,22 ± 19,22 140-215 54 168,58 ± 14,26 130-195 41 CCAB (mm) 67,7 ± 5,18 55,37-76,9 51 67,78 ± 4,36 56,42-75,41 38 LCAB (mm) 42,94 ± 5,1 33,19-55,67 51 44,28 ± 5,88 31,97-55 37 Fonte: SOUZA, E. 2020 Figura 1.13 – Média e variação do comprimento rostro-cloacal (CRC) entre indivíduos adultos machos e fêmeas de L. muta. Linhas horizontais no interior das caixas representam a média, limite das caixas o desvio padrão e linhas verticais os limites máximo e mínimo observados. O asterisco (*) indica diferença significativa. Fonte: SOUZA, E. 2020 42 Figura 1.14 – Correlação entre comprimento rostro-cloacal (CRC) e comprimento da cauda (CC) entre machos e fêmeas de L. muta. Pontos vermelhos são os valores observados para as fêmeas e pontos azuis os valores observados para os machos. Fonte: SOUZA, E. Figura 1.15 – Correlação entre comprimento rostro-cloacal (CRC) e comprimento da cabeça (CCAB) entre machos e fêmeas de L. muta. Pontos vermelhos são os valores observados para as fêmeas e pontos azuis os valores observados para os machos. Fonte: SOUZA, E. 43 Figura 1.16 – Correlação entre o comprimento rostro-cloacal (CRC) e a largura da cabeça (LCAB) entre machos e fêmeas de L. muta. Pontos vermelhos representam valores observados para fêmeas e pontos azuis valores observados para machos. Fonte: SOUZA, E. 2020 3.3.2 População da Mata Atlântica Foi encontrado dimorfismo sexual no Comprimento Rostro-Cloacal (CRC) (Tabela 1.3; Figura 1.17) e no Comprimento da Cauda (CC) (Tabela 1.3; Figura 1.18) entre os indivíduos adultos machos e fêmeas de Lachesis muta. Os machos apresentaram tanto maior tamanho corporal do que as fêmeas (t = -2.8953, gL = 88, p = 0,004777; Tabela 1.3; Figura 1.16), quanto maior tamanho da cauda (ANCOVA, F2,86 = 12,53, p < 0,0001; Tabela 1.3; Figura 1.17). O índice de dimorfismo sexual (SSD) foi de – 0,09. Em relação ao Comprimento da Cabeça (CCAB) (Pearson; p = 0,06576; t = -0,5304, gL = 43, p = 0,5986; Tabela 1.3) e à Largura da Cabeça (LCAB) (Pearson; p = 0,631; t = - 1.8678, gL = 28, p = 0,07229; Tabela 1.3), e os machos apresentaram valores médios maiores do que as fêmeas, porém não houve diferença significativa (Figura 1.19 e 1.20). 44 Tabela 1.3 – Dados morfológicos dos indivíduos adultos machos e fêmeas da população da Mata Atlântica de L. muta. DP = desvio padrão. Variável Machos Fêmeas Média ± DP Mínimo-Máximo n Média ± DP Mínimo-Máximo n CRC (mm) 1894,8 ± 319,40 1510-3200 43 1737,98 ± 181,19 1444-2200 47 CC (mm) 157,84 ± 19,64 60-184 43 143,40 ± 12,9 101-166 47 CCAB (mm) 70,45 ± 11,13 30-85 24 69,05 ± 5,28 60-78 21 LCAB (mm) 40,94 ± 5,41 32,36-52 13 37,76 ± 3,93 30-44,82 17 Fonte: ALVES et al., 2014 Figura 1.17 – Média e variação do comprimento rostro-cloacal (CRC) entre indivíduos adultos machos e fêmeas de L. muta da Mata Atlântica. Linhas horizontais no interior das caixas representam a média, limite das caixas o desvio padrão e linhas verticais os limites máximo e mínimo observados. O asterisco (*) indica diferença significativa. Fonte: SOUZA, E. 2020 45 Figura 1.18 – Correlação entre comprimento rostro-cloacal (CRC) e comprimento da cauda (CC) entre machos e fêmeas de L. muta da Mata Atlântica. Pontos vermelhos são os valores observados para as fêmeas e pontos azuis os valores observados para os machos. Fonte: SOUZA, E. 2020 Figura 1.19 – Média e variação do comprimento da cabeça (CCAB) entre indivíduos adultos machos e fêmeas de L. muta da Mata Atlântica. Linhas horizontais no interior das caixas representam a média, limite das caixas o desvio padrão e linhas verticais os limites máximo e mínimo observados. Fonte: SOUZA, E. 2020 46 Figura 1.20 – Média e variação da largura da cabeça (LCAB) entre indivíduos adultos machos e fêmeas de L. muta da Mata Atlântica. Linhas horizontais no interior das caixas representam a média, limite das caixas o desvio padrão e linhas verticais os limites máximo e mínimo observados. Fonte: SOUZA, E. 2020 3.4 Ciclo reprodutivo dos machos 3.4.1 População da Floresta Amazônica 3.4.1.1 Variação do comprimento e volume testicular Um total de 23 machos foram utilizados para obtenção de medidas do testículo, sendo 10 da estação seca e 13 da chuvosa. Para o volume testicular, o valor médio para a estação seca foi 7,76 mm³ e 7,35 mm³ para a estação chuvosa. Já no caso do comprimento testicular, o valor médio para a estação chuvosa foi maior. Entretanto, não foi encontrada nenhuma variação significativa tanto no comprimento (ANCOVA; F = 5,552, p = 0,68; Figura 1.21) quanto no volume testicular (t = -1,1555, gL = 20, p = 0,26; Figura 1.22) entre as estações seca e chuvosa. 47 Figura 1.21 – Correlação entre comprimento rostro-cloacal (CRC) e comprimento do testículo de machos de L. muta. Pontos pretos são os valores observados para a estação chuvosa e pontos cinzas os valores observados para a estação seca. Fonte: SOUZA, E. 2020 Figura 1.22 – Média e variação do Log do Volume Testicular entre indivíduos adultos machos de L. muta ao longo das estações seca e chuvosa. Linhas horizontais no interior das caixas representam a média, limite das caixas o desvio padrão e linhas verticais os limites máximo e mínimo observados. Fonte: SOUZA, E. 2020 48 3.4.1.2 Variação do diâmetro do ducto deferente Um total de 18 machos foram utilizados para obtenção das medidas do ducto deferente., O valor médio para a estação seca foi de 3,03 mm e 2,65 mm para aa estação chuvosa Entretanto, não foi encontrada nenhuma variação significativa no diâmetro do ducto deferente ao longo das estações seca (n = 9) e chuvosa (n = 9) (t = -1,3562, gL = 16, p = 0,19; Figura 1.23) Figura 1.23 – Média e variação do Diâmetro do Ducto Deferente entre indivíduos adultos machos de L. muta ao longo das estações seca e chuvosa. Linhas horizontais no interior das caixas representam a média, limite das caixas o desvio padrão. Fonte: SOUZA, E. 2020 3.4.1.3 Ciclo espermatogênico Foram examinados um total de 22 machos maduros, sendo 10 da estação chuvosa (novembro a abril) e 12 da estação seca (maio a outubro). A regressão testicular (estágio 1; Figura 1.24 A) foi encontrada em quatro indivíduos coletados apenas durante a estação seca, nos meses de setembro (n = 2) e outubro (n = 2). O início da espermiogênese (estágio 2) foi observada em dois indivíduos, um no início da estação chuvosa, no mês de novembro, e um no início da estação seca, no mês de maio. A espermiogênese (estágio 3; Figura 1.24 B) foi observada em 9 animais, tanto na estação seca (maio, n = 3; julho, n = 1) quanto na estação chuvosa (novembro, n = 1; dezembro, n = 1; abril, n = 3). A espermiação, fase do pico de produção de espermatozóides (estágio 4; Figura 1.24 C) foi encontrada em quatro machos, 49 sendo um coletado no início da estação seca (maio) e o restante na estação chuvosa (novembro, março e abril). O final da espermiação (estágio 5; Figura 1.24 D) foi observada em dois animais coletados na estação seca (julho e agosto). Figura 1.24 – Ciclo espermatogênico de L. muta. A) Regressão testicular – estágio 1 (outubro; 20x); B) Espermiogênese – estágio 3 (abril; 20x); C) Espermiação – estágio 4 (março; 20x); D) Final da espermiação – estágio 5 (julho; 20x). O asterisco (*) indica a presença de espermatozoides. Fonte: SOUZA, E. 2020. Para a primeira análise que considerou a estação seca e chuvosa, as medidas do diâmetro do túbulo seminífero tiveram variação significativa entre as estações (t = 2.6728, gL = 17, p = 0,01606; Figura 1.25). A média observada para a estação chuvosa foi de 330,192 µm, enquanto a média observada para a estação seca foi de 219,240 µm. A mesma diferença foi observada para a variação das medidas da altura do epitélio dos túbulos seminíferos (t = 3.7681, gL = 17, p = 0,001533; Figura 1.26). A média observada para a estação chuvosa foi de 85,764 µm, enquanto a média observada para a estação seca foi de 43,744 µm. 50 Figura 1.25 – Média e variação do comprimento do Log do Diâmetro do Túbulo Seminífero para duas estações. Linhas horizontais no interior das caixas representam a média, limite das caixas o desvio padrão e linhas verticais os limites máximo e mínimo observados. O asterisco (*) indica diferença significativa. Fonte: SOUZA, E. 2020 Figura 1.26 – Média e variação do comprimento da altura do Log do Epitélio do Túbulo Seminífero para duas estações. Linhas horizontais no interior das caixas representam a média, limite das caixas o desvio padrão e linhas verticais os limites máximo e mínimo observados. O asterisco (*) indica diferença significativa. Fonte: SOUZA, E. 2020 51 Para o segundo método de análise, que considerou as duas estações divididas em quatro períodos (início e fim da estação chuvosa e início e fim da estação seca), as variáveis continuaram apresentando diferenças significativas. Para o diâmetro do túbulo seminífero (ANOVA, F = 7,859, p = 0,0022; Figura 1.27), o teste a posteriori de Tukey revelou que a diferença está entre a amostra do final da estação chuvosa (FEC: fevereiro, março e abril) e do final da estação seca (FES: agosto, setembro e outubro) (Tukey FEC-FES, p = 0,00109). Para a altura do epitélio (ANOVA, F = 13,49, p = 0,000156; Figura 1.28), o teste a posteriori de Tukey apresentou três períodos de diferença significativa entre as medidas microscópicas: início da estação chuvosa (IEC: novembro, dezembro e janeiro) e início da estação seca (IES: maio, junho e julho) (Tukey IEC-IES, p = 0,0173), início da estação chuvosa (IEC) e final da estação seca (FES) (Tukey IEC-FES, p = 0,00331), e final da estação chuvosa (FEC) e final da estação seca (FES) (Tukey FEC-FES, p = 0,0000954). Figura 1.27 – Média e variação do comprimento do Log do Diâmetro do Túbulo Seminífero (eixo y) para quatro estações (eixo x). Linhas horizontais no interior das caixas representam a média, limite das caixas o desvio padrão e linhas verticais os limites máximo e mínimo observados. O asterisco (*) indica diferença significativa. FEC = final da estação chuvosa; IES = início da estação seca; FES = final da estação seca; IEC = início da estação chuvosa. Fonte: SOUZA, E. 2020 52 Figura 1.28 – Média e variação do comprimento do Log do Epitélio do Túbulo Seminífero (eixo y) para quatro estações (eixo x). Limites representam intervalos de 95% de confiança. FEC = final da estação chuvosa; IES = início da estação seca; FES = final da estação seca; IEC = início da estação chuvosa. Fonte: SOUZA, E. 2020 3.4.1.4 Estocagem no ducto deferente Em relação à estocagem de espermatozoides no ducto deferente, foram examinados 19 indivíduos machos adultos. O ducto esvaziado foi observado em um indivíduo (Figura 1.29 A), coletado no mês de setembro e que também apresentava túbulo seminífero quiescente. Entre o final da estação chuvosa e início da estação seca, nos meses de abril, maio e julho, foi observada uma quantidade reduzida de espermatozoides estocados no ducto deferente de alguns indivíduos (n = 4; Figura 1.29 B). O restante dos animais analisados apresentou ducto deferente completamente cheio independente do mês ou da estação em que foram coletados (n = 14; novembro, dezembro, março, abril, maio, julho e agosto; Figura 1.29 C e D). 53 Figura 1.29 – Estocagem de espermatozoides no ducto deferente. A) Ducto deferente esvaziado (setembro; 10x); B) Ducto deferente com poucos espermatozoides (maio; 4x); C) Ducto deferente cheio (agosto; 4x); D) Ducto deferente cheio em maior aumento (agosto; 20x). O asterisco (*) indica a presença de espermatozoides. Fonte: SOUZA, E. 2020. 3.4.1.5 Segmento Sexual Renal (SSR) Para avaliação da hipertrofia do segmento sexual renal (SSR) foram examinados 21 machos adultos, sendo 10 indivíduos coletados na estação chuvosa e 11 indivíduos coletados na estação seca. Em análise visual preliminar comparativa do diâmetro do segmento sexual renal, a maioria dos machos apresentavam os túbulos do SSR altamente ou moderadamente hipertrofiado ao longo do ano, sugerindo um padrão asazonal para essa estrutura. Além disso, também verificamos assincronia entre os indivíduos da população. Apenas 4 machos aparentavam hipotrofia do SSR, coletados tanto na estação seca quanto na chuvosa (outubro, n = 2; novembro, n = 1; abril, n = 1; Figura 1.30 A). Oito indivíduos aparentavam SSR moderadamente hipertrofiado, coletados em ambas as estações (novembro, n = 1; dezembro, n = 1; abril, n = 2; maio, n = 1; julho, n = 1; agosto, n = 1; setembro, n = 1; Figura 1.30 B), e 8 54 indivíduos observados apresentaram o SSR altamente hipertrofiado, também coletados em ambas as estações (novembro, n = 2; março, n = 1; maio, n = 3; julho, n = 1; setembro, n = 1; Figura 1.30 C e D). Para as medidas microscópicas, o teste de Mann Whitney Wilcoxon foi utilizado. O diâmetro dos túbulos do SSR apresentou diferença significativa entre as estações seca e chuvosa. O valor médio para a estação chuvosa foi de 151 µm, significativamente maior (W = 78, p = 0,00028; Figura 1.31) do que o valor médio de 99,46 µm para a estação seca. O mesmo foi observado para a altura do epitélio do SSR, em que o valor médio para a estação chuvosa foi de 57,78 µm, significativamente maior (W = 66, p = 0,001234; Figura 1.32) do que o valor médio de 41,50 µm para a estação seca. Figura 1.30 – Ciclo do Segmento Sexual Renal. Corte longitudinal. Hematoxilina-eosina. A) SSR hipotrofiado no final da estação chuvosa (abril; 10x); B) SSR moderadamente hipertrofiado na estação seca (setembro; 10x); C) e D) SSR hipertrofiado no início da estação chuvosa (novembro; 10x). As setas indicam os túbulos do SSR. Fonte: SOUZA, E. 2020 55 Figura 1.31 – Média e variação do comprimento do Log do Diâmetro do Segmento Sexual Renal (SSR) para duas estações. Linhas horizontais no interior das caixas representam a média, limite das caixas o desvio padrão e linhas verticais os limites máximo e mínimo observados. O asterisco (*) indica diferença significativa. Fonte: SOUZA, E. 2020 Figura 1.32 – Média e variação do comprimento do Log da Altura do Epitélio do Segmento Sexual Renal (SSR) para duas estações. Linhas horizontais no interior das caixas representam a média, limite das caixas o desvio padrão e linhas verticais os limites máximo e mínimo observados. O asterisco (*) indica diferença significativa. Fonte: SOUZA, E. 2020 56 Já no segundo método de análise, as variáveis não apresentaram diferenças significativas. Para o diâmetro do SSR, o teste de Krustal Wallis não apontou nenhuma diferença significativa entre as estações avaliadas (Krustal Wallis, X² = 0,51754, gL = 3, p = 0,915; Figura 1.33). Para a altura do epitélio do SSR, também não foi encontrada diferença significativa (ANOVA, F = 0,136, p = 0,937; Figura 1.34). Figura 1.33 – Média e variação do comprimento do Log do Diâmetro do Segmento Sexual Renal (eixo y) para quatro estações (eixo x). Limites representam intervalos de 95% de confiança. FEC = final da estação chuvosa; IES = início da estação seca; FES = final da estação seca; IEC = início da estação chuvosa. Fonte: SOUZA, E. 2020 57 Figura 1.34 – Média e variação do comprimento do Log da Altura do Epitélio do Segmento Sexual Renal (eixo y) para quatro estações (eixo x). Limites representam intervalos de 95% de confiança. FEC = final da estação chuvosa; IES = início da estação seca; FES = final da estação seca; IEC = início da estação chuvosa. Fonte: SOUZA, E. 2020 3.4.2 População da Mata Atlântica 3.4.2.1 Ciclo espermatogênico Foram examinados um total de 13 machos maduros, sendo 8 das estações outono e inverno (20 de março até 21 de setembro) e 5 das estações primavera e verão (22 de setembro até 19 de março). A regressão testicular (estágio 1; Figura 1.35 A) foi encontrada em três indivíduos coletados nos meses de novembro, dezembro e fevereiro (primavera/verão). O início da espermiogênese (estágio 2) foi observada em quatro indivíduos nos meses de março, abril, maio e julho (outono/inverno). A espermiogênese (estágio 3; Figura 1.35 B e C) foi observada em quatro animais, nos meses de junho, julho e agosto (outono/inverno). A espermiação, fase do pico de produção de espermatozóides (estágio 4; Figura 1.35 D) foi encontrada em um macho coletado em janeiro (verão). Um macho coletado em agosto (inverno) estava no início da regressão testicular (estágio 5). 58 Figura 1.35 – Ciclo espermatogênico de L. muta. A) Regressão testicular – estágio 1 (dezembro; 20x); B) Espermiogênese – estágio 3 (julho; 20x); C) Espermiogênese – estágio 3 (agosto; 20x); D) Espermiação – estágio 4 (janeiro; 10x). O asterisco (*) indica a presença de espermatozoides. Fonte: SOUZA, E. 2020. Para a primeira análise, as medidas do diâmetro do túbulo seminífero não tiveram variação significativa entre as estações Outono/Inverno (O/I) e Primavera/Verão (P/V) (t = 1.6701, gL = 10, p = 0,1259; Figura 1.36 A). A média observada para a estação O/I foi de 215,166 µm, maior do que a média de 160,446 µm observada para a estação P/V. Também não encontramos diferença significativa para a variação das medidas da altura do epitélio dos túbulos seminíferos (t = 1.6731, gL = 10, p = 0,1253; Figura 1.37 A). A média observada para a estação O/I foi de 63,236 µm, maior do que a média de 37,495 µmobservada para a estação P/V. Considerando as estações separadamente, também não foi verificada nenhuma diferença significativa tanto para as medidas do diâmetro do túbulo seminífero (ANOVA; F = 1,664, p = 0,243; Figura 1.36 B) quanto para as medidas da altura do epitélio do túbulo seminífero (ANOVA; F = 1.325, p = 0.313; Figura 1.37 B). 59 Figura 1.36 – Média e variação do Log do Diâmetro do Túbulo Seminífero. A) Duas estações. O/I = outono/inverno; P/V = primavera/verão. B) Três estações. Verde = outono; Vermelho = Inverno; Azul = Verão. Linhas horizontais no interior das caixas representam a média, limite das caixas o desvio padrão e linhas verticais os limites máximo e mínimo observados. Fonte: SOUZA, E. 2020. Figura 1.37 – Média e variação do Log da altura do Epitélio do Túbulo Seminífero. A) Duas estações. O/I = outono/inverno; P/V = primavera/verão. B) Três estações. Verde = outono; Vermelho = Inverno; Azul = Verão. Linhas horizontais no interior das caixas representam a média, limite das caixas o desvio padrão e linhas verticais os limites máximo e mínimo observados. Fonte: SOUZA, E. 2020. 3.4.2.2 Estocagem no Ducto Deferente Foram examinados um total de 9 machos maduros, sendo 7 das estações outono e inverno (20 de março até 21 de setembro) e 2 das estações primavera e verão (22 de setembro até 19 de março). Dois machos, um coletado em abril e outro em maio (outono) apresentava poucos espermatozoides no ducto. O restante dos animais (n = 7) apresentou ductos cheios de espermatozoides em todos os meses avaliados (janeiro, fevereiro, maio, junho, julho e agosto). 60 3.4.2.3 Ciclo do Segmento Sexual Renal (SSR) Foram examinados um total de 12 machos maduros, sendo 8 das estações outono e inverno (20 de março até 21 de setembro) e 4 das estações primavera e verão (22 de setembro até 19 de março). A hipotrofia do SSR (Figura 1.38 A) foi encontrada em dois indivíduos coletados nos meses de fevereiro e março (verão). O SSR moderadamente hipertrofiado (Figura 1.38 B) foi observada em três indivíduos nos meses de novembro, abril e maio (primavera/outono). A hipertrofia do SSR (Figura 1.38 C e D) foi observada em 7 machos coletados nos meses de maio, junho (outono), julho, agosto (inverno) e janeiro (verão). Figura 1.38 – Ciclo do Segmento Sexual Renal. Corte longitudinal. Hematoxilina-eosina. A) SSR hipotrofiado no verão (fevereiro; 10x); B) SSR moderadamente hipertrofiado no outono (abril; 10x); C) e D) SSR hipertrofiado no inverno (julho e agosto; 10x). As setas indicam os túbulos do SSR. Fonte: SOUZA, E. 2020 Para a primeira análise, as medidas do diâmetro do túbulo do SSR não tiveram variação significativa entre as estações Outono/Inverno (O/I) e Primavera/Verão (P/V) (t = 1.5587, gL = 10, p = 0,1501; Figura 1.39 A). A média observada para a estação O/I foi de 61 126,77 µm, maior do que a média de 99,56 µm observada para a estação P/V. Também não encontramos diferença significativa para a variação das medidas da altura do epitélio dos túbulos do SSR (t = 1.0628, gL = 10, p = 0,3129; Figura 1.40 A). A média observada para a estação O/I foi de 50,71 µm, maior do que a média de 39,97 µm observada para a estação P/V. Considerando as estações separadamente, também não foi verificada nenhuma diferença significativa tanto para as medidas do diâmetro do túbulo do SSR (ANOVA; F = 3,048, p = 0,0975; Figura 1.39 B) quanto para as medidas da altura do epitélio do túbulo do SSR (ANOVA; F = 2,349, p = 0,151; Figura 1.40 B). Figura 1.39 – Média e variação do Log Diâmetro do Túbulo do SSR. A) Duas estações. O/I = outono/inverno; P/V = primavera/verão. B) Três estações. Verde = outono; Vermelho = Inverno; Azul = Verão. Linhas horizontais no interior das caixas representam a média, limite das caixas o desvio padrão e linhas verticais os limites máximo e mínimo observados. Fonte: SOUZA, E. 2020. Figura 1.40 – Média e variação do Log da altura do Epitélio do Túbulo do SSR. A) Duas estações. O/I = outono/inverno; P/V = primavera/verão. B) Três estações. Verde = outono; Vermelho = Inverno; Azul = Verão. Linhas horizontais no interior das caixas representam a média, limite das caixas o desvio padrão e linhas verticais os limites máximo e mínimo observados. Fonte: SOUZA, E. 2020. 62 3.4.3 Resumo do Ciclo reprodutivo dos machos de L. muta O esquema a seguir (Figura 1.41) resume os resultados apresentados anteriormente que são referentes ao ciclo reprodutivo dos machos de Lachesis muta para a população da Floresta Amazônica e da Mata Atlântica. Figura 1.41 – Ciclo reprodutivo dos machos de L. muta da população da Floresta Amazônica (FA – cinza) e da Mata Atlântica (MA – preto). Os números dentro das caixas indicam o número amostral observado para cada fase do ciclo reprodutivo. As caixas estão sobrepostas ao respectivo mês de ocorrência. Fonte: SOUZA, E. 2020 63 3.5 Ciclo reprodutivo das fêmeas 3.5.1 Análise macroscópica do trato reprodutivo feminino Um total de 73 fêmeas maduras foram avaliadas para a definição do ciclo reprodutivo, sendo 40 da FA e 33 da MA. 3.5.1.1 População da Floresta Amazônica (FA) Folículos em vitelogênese primária (V1) foram observados ao longo de todos os meses do ano. Apenas 4 fêmeas em vitelogênese secundária (V2) foram encontradas. Uma delas em vitelogênese avançada (CRC = 1830 mm, maior folículo = 38,59 mm) foi coletada em maio, início da estação seca, com sete folículos em V2 no ovário direito e cinco no ovário esquerdo. As outras três fêmeas estavam em início do processo de vitelogênese secundária (CRC = 1830 mm e maior folículo = 16,99 mm; CRC = 2030 mm e maior folículo = 16,32 mm; CRC = 1790 mm e maior folículo = 15,32 mm) foram coletadas nos meses de maio, julho e setembro respectivamente, na estação seca. Apenas uma fêmea prenhe foi coletada no mês de agosto e continha 6 ovos no oviduto direito e 3 ovos no oviduto esquerdo (CRC = 1830 mm e maior ovo = 60,51 mm). O maior ovo foi dissecado e nenhum embrião foi encontrado, o que pode indicar início do desenvolvimento embrionário ou ovo atrésico. Dentre os animais avaliados neste trabalho na FA, dois deles tinham comprimento dentro desse limite (57,5 cm e 59,8 cm) e foram considerados filhotes recém-nascidos. Estes foram coletados em janeiro e fevereiro, respectivamente. Outros quatro filhotes da amostra ultrapassaram 61 cm (65 cm, 68,1 cm, 68,4 cm e 76 cm) e foram considerados juvenis em primeiro ano de vida. Estes foram coletados nos meses de junho, março e outubro respectivamente. A figura 1.42 resume os resultados acima citados. 64 Figura 1.42 – Ciclo reprodutivo de fêmeas de Lachesis muta da Floresta Amazônica. Círculo fechado = vitelogênese primária; Círculo aberto = vitelogênese secundária; Círculo vermelho = fêmea prenhe; Estrelas = recém-nascidos; Serpentes = juvenis < 12 meses. Fonte: SOUZA, E. 2020 3.5.1.2 População da Mata Atlântica (MA) Folículos em V1 foram observados ao longo de todo o ano. Oito fêmeas em V2 foram encontradas nos meses de abril (CRC = 1444 mm e maior folículo = 15,73 mm), maio (CRC = 1750 mm e maior folículo = 21,84 mm), junho (CRC = 1806 mm e maior folículo = 18,82 mm; CRC = 1686 mm e maior folículo = 20,42 mm), julho (CRC = 1570 mm e maior folículo = 27,63 mm), agosto (CRC = 2070 mm e maior folículo = 46,7 mm; CRC = 2200 mm e maior folículo = 48,74 mm) e setembro (CRC = 1565 mm e maior folículo = 49,91 mm), meses que representam as estações do outono e inverno na região da MA e que coincidem com a estação seca para a região da FA. Duas fêmeas prenhes foram coletadas, uma foi atropelada no mês de março e, devido ao estado de conservação, foi possível identificar apenas 4 ovos (CRC = 1790 mm e maior ovo = 52,29 mm). A segunda fêmea prenhe foi coletada no mês de 0 10 20 30 40 50 60 70 J F M A M J J A S O N D D iâ m e tr o d o s f o lí c u lo s ( m m ) Meses 65 setembro e continha um total de 10 ovos (CRC = 1910 mm e maior ovo = 50,21 mm). Os ovos não foram dissecados. Três animais tinham comprimento dentro do limite estipulado para recém-nascido (54,1 cm, 58,5 cm e 54,5 cm), e foram coletados em janeiro, março e abril, respectivamente. Outros 10 animais da amostra apresentaram tamanho total entre 61 cm e 122 cm e foram considerados juvenis em primeiro ano de vida. Estes foram coletados em fevereiro (111,3 cm), março (100,7 cm), abril (66,5 cm), maio (67,8 cm), junho (61,9 cm e 72,1 cm), agosto (75,2 cm e 86,6 cm), setembro (63,5 cm) e outubro (115,5 cm). A Figura 1.43 resume os resultados aqui apresentados. Figura 1.43 – Ciclo reprodutivo de fêmeas de Lachesis muta da Mata Atlântica. Círculo fechado = vitelogênese primária; Círculo aberto = vitelogênese secundária; Círculo vermelho = fêmea prenhe; Estrelas = recém- nascidos; Serpentes = juvenis < 12 meses. Fonte: SOUZA, E. 2020 0 10 20 30 40 50 60 70 J F M A M J J A S O N D D iâ m e tr o d o s f o lí c u lo s ( m m ) Meses 66 3.5.2 Fecundidade Os animais examinados estão listados na Tabela 1.4. O tamanho da ninhada não foi positivamente correlacionado com o tamanho do corpo materno (t = -1,681, gL = 8, p = 0,1313). Também não foi observado correlação entre o diâmetro do maior ovo ou folículo e o comprimento rostro-cloacal materno (t = 1,8938; gL = 8; p = 0,09487) ou o comprimento total (t = 2,0167; gL = 8; p = 0,07846). Quando incluímos os dados da literatura, o resultado continuou não significativo entre o número de folículos/ovos com o tamanho do corpo materno (t = -2,1551 gL = 12, p = 0,05217) nem com o comprimento total (t = -1,9527; gL = 8; p = 0,08663), porém foi observado correlação positiva entre o diâmetro do maior ovo ou folículo e o comprimento rostro-cloacal materno (t = 2,7708; gL = 11; p = 0,0182; Figura 1.44), mas não com o comprimento total (t = 2,0937; gL = 8; p = 0,06961). Também não foi observada correlação negativa significativa entre o número de filhotes e o diâmetro do maior folículo ou ovo (t = - 1,2656; gL = 11; p = 0,2318). Tabela 1.4: Fêmeas analisadas de Lachesis muta. (Id e Coleção=número de tombo/ coleção; FA = Floresta Amazônica, MA = Mata Atlântica; CRC = comprimento rostro-cloacal; CT = comprimento total; F = fecundidade total; >FO = maior folículo ou ovo; ER = estágio reprodutivo; P = prenhe; V2 = vitelogênese secundária; (*) =tamanho do ovo na ovipostura. Id e Coleção Localidade CRC mm CT mm F >FO mm ER Autor(es) 45997/IBU Manaus/AM 1830 2000 9 60,51 P Este estudo 16514/MPEG Marabá/PA 1830 2010 12 38,59 V2 Este estudo 2085/MZUESC Ilheus/BA 2070 2236 9 46,7 V2 Este estudo 3014/MZUESC Ilhéus/BA 1444 1579 18 15,73 V2 Este estudo 3123/MZUESC Ilhéus/BA 2200 2355 14 48,74 V2 Este estudo 5359/MZUESC Ilhéus/BA 1806 1948 10 18,82 V2 Este estudo 5442/MZUESC Ilhéus/BA 1750 1884 12 21,84 V2 Este estudo 7430/MZUESC Ilhéus/BA 1570 1701 13 27,63 V2 Este estudo 7803/MZUESC Ilhéus/BA 1909 2060 10 50,21 P Este estudo 9313/MZUESC Ilhéus/BA 1565 1715 13 49,91 V2 Este estudo - FA - - 15 73,1* P Eisele, 2009 - FA 1990 - 9 - P Corrales et al. 2016 67 3057/IBU MA 1940 - 11 80* P Amaral, 1925 - FA 2000 - 10 75,9* P Boyer et al. 1989 - MA 2000 - 14 70,5* P Melgarejo et al. 1999 Fonte: SOUZA, E. 2020. Figura 1.44 – Correlação entre o log do comprimento rostro-cloacal (CRC) materno e o log do diâmetro do maior folículo ou ovo de fêmeas de L. muta. Fonte: SOUZA, E. 2020 3.5.3 Plug copulatório e estocagem de espermatozoides O presente trabalho relata pela primeira vez a presença de plug copulatório, estocagem de espermatozoides e formação do UMT (Uterine Muscular Twisting) no oviduto de uma espécie do gênero Lachesis. O plug copulatório é um conjunto de substâncias, principalmente proteínas, produzidas no rim e depositadas pelo macho na cloaca da fêmea após a cópula. Essa estrutura atua tanto como uma barreira temporária, dificultando futuras cópulas, quanto evitando o vazamento de esperma pela cloaca da fêmea e garantindo, assim, que seus espermatozoides sejam fertilizados (BIRKHEAD; MØLLER, 1993; FRIESEN et al., 2013). 68 3.5.3.1 População da Floresta Amazônica Foram encontradas quatro fêmeas com quantidades diferentes de plug na região da vagina. Uma fêmea estava em início de V2, coletada no mês de julho (Figura 1.45 A). Outra fêmea em início de V2 foi coletada no mês de setembro (Figura 1.45 B). As duas fêmeas restantes foram coletadas nos meses de maio e julho (Figuras 1.45 C e D, respectivamente), sendo que uma delas estava em V1 (Figura 1.45 D) e, para a outra, não foi possível determinar o estágio folicular. Não foram encontrados espermatozoides no plug ou em nenhuma outra região do oviduto dessas fêmeas. Figura 1.45 – Plug copulatório na região vaginal de L. muta - FA. Corte longitudinal. Hematoxilina-Eosina. A) Fêmea em início de V2 (Julho; 4x); B) Fêmea em início de V2 (Setembro; 10x); C) (Maio; 40x); D) Fêmea em V1 (Julho; 20x). Asteriscos (*) indicam o plug copulatório. Fonte: SOUZA, E. 2020 A presença ou ausência de UMT foi avaliada em 19 fêmeas, das quais a estrutura foi observada em sete: uma prenhe, duas em vitelogênese secundária, três em vitelogênese primária e em uma não foi possível determinar o estágio reprodutivo. Foram encontrados 69 espermatozoides estocados na junção útero-vaginal da fêmea prenhe (Figura 1.46A e B) e de uma fêmea em vitelogênese secundária avançada (Figura1.46C e D). Já no infundíbulo posterior, foi encontrado espermatozoide em uma fêmea em V1 (Figura 1.47 A e B) e em uma fêmea em V2 (Figura 1.47 C e D) coletadas em março e julho, respectivamente. Os espermatozoides encontrados no infundíbulo posterior não estavam estocados em receptáculos. Maiores detalhes sobre a UMT e a estratégia de estocagem de espermatozoides de L. muta estão no Capítulo 2 deste trabalho. Figura 1.46 – Estocagem de espermatozoides na junção útero-vaginal (UMT) de L. muta. Corte longitudinal. Hematoxilina-Eosina. A) Vestígios de espermatozoides em fêmea prenhe (Agosto; 10x); B) Maior aumento de A (100x); C) Espermatozoides em fêmea em V2 (Maio; 4x); D) Maior aumento de C (40x). Asteriscos (*) indicam espermatozoides. Fonte: SOUZA, E. 2020 70 Figura 1.47 – Estocagem de espermatozoides no infundíbulo posterior de L. muta. Corte longitudinal. Hematoxilina-Eosina. A) Fêmea em V1 (Março; 40x); B) Maior aumento de A (100x); C) Fêmea em V2 (Maio; 10x); D) Maior aumento de C (40x). Asteriscos (*) indicam espermatozoides. Fonte: SOUZA, E. 2020 3.5.3.2 População da Mata Atlântica Foram encontradas duas fêmeas em V1 com quantidades diferentes de plug na região da vagina, uma coletada no mês de março (Figura 1.48 A) e a outra coletada no mês de dezembro (Figura 1.48 B). Não foram encontrados espermatozoides no plug ou em nenhuma outra região do oviduto dessas fêmeas. 71 Figura 1.48 – Plug copulatório na região vaginal de L. muta - MA. Corte longitudinal. Hematoxilina-Eosina. A) Fêmea em V1 (Março; 4x); B) Fêmea em V1 (Dezembro; 4x); As setas indicam o plug copulatório. Fonte: SOUZA, E. 2020 A presença ou ausência de UMT foi avaliado em 33 fêmeas da MA, das quais 8 apresentaram a estrutura. Quatro destas estavam em V1 e quatro em V2. Foi observada uma quantidade reduzida de espermatozoides em uma fêmea em V2 avançada coletada no mês de setembro (CRC: 1565 mm; maior folículo: 49,91 mm; Figura 1.49 A e B). No infundíbulo posterior, apesar de vários receptáculos seminais ciliados terem sido identificados (Figura 1.49 C), não foi observado espermatozoides dentro dessas estruturas em nenhum