1 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS Curso de Pós-Graduação em Alimentos e Nutrição Área de Ciências Nutricionais Paula Magalhães COMPORTAMENTO ALIMENTAR, ESTADO NUTRICIONAL E IMAGEM CORPORAL DE ESTUDANTES DE NUTRIÇÃO: ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E PERCURSO PEDAGÓGICO Araraquara - SP 2011 2 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS Curso de Pós-Graduação em Alimentos e Nutrição Área de Ciências Nutricionais COMPORTAMENTO ALIMENTAR, ESTADO NUTRICIONAL E IMAGEM CORPORAL DE ESTUDANTES DE NUTRIÇÃO: ASPECTOS PSICOSSOCIAIS E PERCURSO PEDAGÓGICO Aluna: PAULA MAGALHÃES Orientador: Prof. Dr. José Eduardo Dutra de Oliveira Co-orientadora: Profª. Drª. Denise Giacomo da Motta Trabalho apresentado ao Programa de Pós-graduação em Alimentos e Nutrição da Faculdade de Ciências Farmacêuticas para obtenção do grau de Doutor em Alimentos e Nutrição – Área de Ciências Nutricionais Araraquara – SP 2011 3 4 Banca examinadora _________________________________________ Co- orientadora Profa. Dra. Denise Giacomo da Motta Membros _________________________________________ Profa. Drª. Cláudia Rucco Penteado Detregiachi _________________________________________ Profa. Dra. Angélica de Moraes Manço Rubiatti _________________________________________ Profa. Dra. Maria Rita Marques de Oliveira _________________________________________ Prof. Dr. João Bosco Faria 5 Dedico este trabalho às pessoas que me ensinam a aprender e a amar: meus pais, José Reinaldo e Carmita, meu filho Pedro, meus irmãos Flávio e Adriana. E com carinho dedico às pessoas que estão ao meu lado enquanto aprendo: Ivan, Bernardo Daniela, Giulia e Bruna. 6 AGRADECIMENTOS Ao Prof. Dr. José Eduardo Dutra de Oliveira que, sendo um mestre, me ensinou constantemente a aprender a aprender. À Prof.ª Dr.ª Denise Giacomo da Motta que iluminou meu aprendizado sobre a importância dos aspectos psicossociais na educação e atuação profissional. Sua forma de orientar, neste processo de doutoramento, foi fundamental para chegarmos ao fim. Ao Prof. Dr. João Bosco Faria pelo apoio e pela sua grandeza como mestre. À Prof.ª Dr.ª Maria Rita Oliveira e Prof.ª Dr.ª Maria Cristina Faber Boog pelas precisosas sugestões e considerações na Qualificação. À Prof.ª Patrícia Carreira Nogueira pela contribuição na aplicação dos grupos focais. À Psicóloga Clarissa Giacomo da Motta, pelo trabalho impecável nas transcrições dos grupos focais. Às amigas Professoras e Nutricionistas Cíntia A. Matiucci Pereira (Nutricionista de coração), Valdete R. Guandalini, Maria Sylvia Carvalho de Barros, pelo apoio, amizade, companheirismo e confiança desde o início do doutorado. Às Professoras e Nutricionistas Angélica de Moraes Manço Rubiatti, Francine Millani, Jacqueline Queiroz, Paula Zulin. A Michelly Giovanna Vigatto e Carla Dato da clínica de Nutrição da UNICEP, pelo apoio e dedicação. A Gustavo Korte e Reginaldo Coelho pelo apoio e orientação nas análises estatísticas. Às Secretárias do Departamento de Pós-Graduação da UNESP, em especial a Cláudia Molina e Laura Rosim. 7 À Dr.ª Marle Alvarenga, Prof.ª Dra Sophia Szarfarc, Prof. Dr Sebastião Almeida e Prof.. Dr José Ernesto dos Santos pelo tempo que dedicaram conversando comigo sobre o trabalho. Ao Prof. Dr. Celso Goyos e seu grupo de estudos do Departamento de Psicologia da UFSCar. Às Alunas de Nutrição, que tornaram possível este trabalho. Às Instituições de Ensino envolvidas neste trabalho. A Ana Cristina Thomaz e Márcia, amigas do grupo do Prof. Dr. José Eduardo Dutra de Oliveira e a Dona Maria Helena, sua esposa e companheira de todos nós, com tanto carinho. À minha família querida por estar sempre ao meu lado me apoiando e amando. A João Luis de O. Carrano Albuquerque por ter acompanhado meu filho Pedro com amor e dedicação. Aos queridos Prof. Dr. Carlos Henrique Prado (Caíque) e Prof.ª Dr.ª Cibelle Celestino, amigos que me apoiaram com carinho. A Josmarina que se dedicou cuidando de nossa casa e família. Ao Prof. Dr. Marcelo Villela (in memoriam), que foi meu primeiro e verdadeiro mestre durante meus anos em Viçosa. 8 AGRADECIMENTO ESPECIAL Aos queridos amigos e amigas que estiveram comigo no percurso acadêmico e de vida, em especial a Fernanda Trópia, Maria do Carmo Couto Teixeira (Cacá), Ana Maria Giliolli, Adriana Braga, Luciana Orsini. À Força Maior, que está sempre ao nosso lado nos iluminando, a quem chamo de Deus. 9 Desde que nascemos, continuamente, palavras nos vão sendo ditas. Elas entram no nosso corpo, e ele vai se transformando. Virando uma outra coisa, diferente da que era. Educação é isto: o processo pelo qual os nossos corpos vão ficando iguais às palavras que nos ensinam. Eu não sou eu: eu sou as palavras que os outros plantaram em mim. Como o disse Fernando Pessoa: “Sou o intervalo entre o meu desejo e aquilo que os desejos dos outros fizeram de mim”. Meu corpo é resultado de um enorme feitiço. E os feiticeiros foram muitos: pais, mães, professores, padres, pastores, gurus, líderes políticos, livros. Meu corpo é um corpo enfeitiçado: porque o meu corpo aprendeu as palavras que lhe foram ditas, ele se esqueceu de outras que, agora permanecem mal...ditas... (O Sapo- Rubem Alves) 10 RESUMO O comportamento alimentar e a imagem corporal de estudantes de nutrição tem sido objeto de crescente interesse e pesquisa, dada a ocorrência de transtornos alimentares e prática de alimentação restritiva, nessa população. Independentemente de tais distúrbios, esses estudantes, como quaisquer outros indivíduos, possuem um repertório de cognições, atitudes e habilidades que pode ou não ser coerente com a competência necessária para a atuação profissional. As grades curriculares dos cursos de graduação em nutrição tem predomínio de disciplinas da área biológica, sendo a abordagem psicossocial do comportamento alimentar pouco desenvolvida. O presente estudo propôs-se a caracterizar o comportamento alimentar, o estado nutricional e a imagem corporal de estudantes de Nutrição quando de seu ingresso e ao final do último ano da graduação, discutindo-o à luz da abordagem psicossocial. A população foi formada por 167 estudantes do sexo feminino, ingressantes (n=64) e concluintes (n=103), de três instituições de ensino do interior do Estado de São Paulo, com média de idade de 21,6 anos (ingressantes) e de 24,5 anos (concluintes). A metodologia adotada foi a quantiqualitativa, mediante levantamento de dados antropométricos e recordatório alimentar de 24 horas, identificação do estilo alimentar (pelo Questionário Holandês do Comportamento Alimentar), das atitudes relativas à imagem corporal (Escala de Silhuetas) e realização de grupos focais, para questionamento das atitudes, percepções e sentimentos relativos à alimentação e imagem corporal, ao início e quando da conclusão do curso. Os resultados mostram 10,9% de excesso de peso entre as ingressantes e 26,1% entre as concluintes; e déficit de peso de 10,9%, entre as ingressantes. A ingestão energética média, estimada a partir da dieta referida (2155 kcal, ingressantes; 1800 kcal, concluintes), pode ser considerada suficiente e a distribuição percentual de macronutrientes, dentro da faixa de normalidade. Nos dois grupos, predominaram os indicativos de alimentação determinada por fatores externos e esse estilo mostrou correlação com o total energético da dieta. Foi observada tendência crescente à ingestão restritiva e à emocional, relacionadas principalmente ao aumento do IMC. A insatisfação com o peso e com a imagem corporal esteve presente, em ambos os grupos. A análise dos conteúdos das discussões focais mostra que as alunas desejam controlar o próprio corpo, pela alimentação, mas tem dificuldade para realizá-lo, apesar do conhecimento adquirido. Problematizam a tarefa de atuar junto ao outro, contribuindo para a mudança de seu comportamento alimentar e sentem-se impotentes frente a essa complexidade. Conclui-se que o comportamento alimentar, o estado nutricional e o grau de satisfação com a imagem corporal das estudantes de nutrição são pouco influenciados pelos conhecimentos adquiridos durante o curso. Considera-se, finalmente, que a formação acadêmica em nutrição deve apropriar-se das abordagens das ciências humanas e sociais, integrando-as aos conteúdos das áreas biológicas e da saúde, para que o objeto de estudo do nutricionista não fique reduzido à relação entre o corpo e a dieta, mas seja a relação entre a pessoa e a alimentação. Palavras chave: comportamento alimentar, estilo alimentar, imagem corporal, estudantes de nutrição, ensino da nutrição. 11 ABSTRACT Eating behavior and body image of nutrition students has been the subject of increasing interest and research, given the occurrence of eating disorders and restrictive feeding in this population. Regardless of such disorders, these students, like any other individual, have a repertoire of cognitions, attitudes and skills that may or may not be consistent with the skills necessary for professional practice. The curriculum of undergraduate nutrition courses has a predominance of disciplines of biological and psychosocial approach of eating behavior is poorly developed. This study aimed to characterize the eating behavior, nutritional status and body image of nutrition students at the beginning and in the last year of undergraduate course, according to the psychosocial approach. Participants for this study were 167 female students (64 freshmen and 103 graduates) from three institutions of Sao Paulo State, aged between 21.6 (freshmen) and 24.5 (graduates). The methodology was quantiqualitative by anthropometric profile, the 24 h recall, eating style identification (Dutch Eating Behaviour Questionnaire), attitudes toward body image (Silhouette scale) and focal groups to investigate the attitudes, perceptions and feelings related to eating. The results showed 10.9% of overweight among entrants and 26.1% among graduates; and weight deficit among entrants, and weight deficit in 10.9% among entrants. Average energy intake, estimated from the diet (2155 kcal, entrants; 1800 kcal, graduates) could be considered enough and the percentage distribution of macronutrients within the normal range. Prevailed, in both groups, the indicative of an eating determined by external factors and this pattern was correlated with the total energy of the diet. It was observed increasing tendency to emotional and dietary restraint correlated mainly to BMI increase. Dissatisfaction with weight and body image was present in both groups. The analysis of the content from focal discussion showed that the students wish to control their own bodies by food, but has difficulty doing it, despite the knowledge acquired. They problematizes the task of working alongside the other, contributing to change their eating habits and feel powerless in the face of this complexity. It is concluded that the feeding behavior, nutritional status and degree of satisfaction with body image of nutrition students are little influenced by the knowledge acquired during the course. It is considered, finally, that education in nutrition should take ownership of the humanities and social sciences approaches, integrating them into the content of biological and health areas, so that the object of study of the nutritionist is not confined to the relationship between body and diet, but be the relationship between the person and the food. Keywords: eating behavior, eating style, body image, nutrition students, nutrition education. 12 CAPÍTULO II – Uma abordagem psicossocial do estado nutricional e do comportamento alimentar de estudantes de nutrição, ingressantes e concluintes. LISTA DE TABELAS Tabela 1. Idade e dados antropométricos (médias, desvios padrão e intervalos de confiança) das estudantes de nutrição, ingressantes e concluintes. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009............................................................. 70 Tabela 2. Valor energético total (VET) médio das dietas referidas, distribuição percentual de macronutrientes e número de refeições realizadas pelas estudantes de nutrição, ingressantes e concluintes. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009............................................................. 71 Tabela 3. Médias dos escores obtidos nos três estilos de ingestão alimentar por estudantes ingressantes e concluintes, segundo seu estado nutricional. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009............................................................. 72 LISTA DE FIGURAS Figura 1. Estado nutricional (IMC real) e ingestão restritiva (média dos escores obtidos) entre estudantes de nutrição. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009................................................. 73 Figura 2. Estado nutricional (IMC) e ingestão externa (média dos escores obtidos) entre estudantes de nutrição. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009................................................. 74 Figura 3. Estado nutricional (IMC) e ingestão emocional (média dos escores obtidos) entre estudantes de nutrição. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009................................................. 75 LISTA DE QUADROS Quadro 1. As expectativas iniciais das estudantes de Nutrição. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009.................... 76 Quadro 2. O comportamento alimentar das estudantes de Nutrição e a aquisição de conhecimentos. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009............................................................. 77 Quadro 3. O estilo alimentar das estudantes de nutrição: a interação entre a tendência restritiva e os fatores emocionais. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009..................... 78 Quadro 4. O estilo alimentar das estudantes de nutrição: a interação entre a tendência restritiva e as influências externas. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009..................... 79 13 CAPÍTULO III – Imagem corporal e estado nutricional: percepções e vivências de estudantes de nutrição LISTA DE TABELAS Tabela 1. Idade, dados antropométricos e imagem corporal (médias, desvios padrão e intervalos de confiança) das estudantes de nutrição, ingressantes e concluintes. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009........................................................ 98 Tabela 2. Comparação* entre as médias dos IMCs (real e desejado) e entre as médias dos escores atribuídos às imagens corporais (IC- real e desejada) de ingressantes e concluintes. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009...................................................................................... 99 Tabela 3. Valores médios dos pesos e IMCs reais e desejados, entre as alunas das três instituições do estudo. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009............................................. 100 Tabela 4. Histórico dieta para controle de peso, entre estudantes ingressantes e concluintes. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009.......................................................... 101 LISTA DE FIGURAS Figura 1. Índice de Massa Corporal e silhueta atual das estudantes ingressantes e concluintes (média, desvio-padrão e 1,96 desvio-padrão). Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009....................................................................................... 102 Figura 2. Distribuição percentual das estudantes, ingressantes e concluintes, de acordo com insatisfação corporal. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009................ 103 LISTA DE QUADROS Quadro 1. Expectativas das estudantes de nutrição em relação ao curso. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009.... 104 Quadro 2. A imagem corporal da estudante de nutrição e o Outro. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009............... 105 Quadro 3. A atitude da estudante de nutrição frente à pessoa com excesso de peso ou baixo peso. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009...................................................... 106 Quadro 4. Percepções e vivências das estudantes, ao longo do percurso pedagógico. Piracicaba, São Carlos e Taquaritinga, SP, 2009....................................................... 107 14 CAPÍTULO IV – O percurso pedagógico na graduação em nutrição e a problematização das questões relacionadas ao comportamento alimentar e à imagem corporal LISTA DE FIGURAS Figura 1. Distribuição das disciplinas por área, de acordo com as DCN. São Carlos, Taquaritinga e Piracicaba, SP, 2009..................... 134 15 SUMÁRIO RESUMO ABSTRACT LISTA DE TABELAS LISTA DE FIGURAS LISTA DE QUADROS APRESENTAÇÃO CAPÍTULO I 1 INTRODUÇÃO GERAL....................................................................................... 18 2 OBJETIVOS........................................................................................................ 21 2.1 Objetivo Geral................................................................................................... 21 2.2 Objetivos específicos........................................................................................ 21 3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA................................................................................ 22 4 CASUÍSTICA E MÉTODOS................................................................................ 35 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................... 42 CAPÍTULO II- Uma abordagem psicossocial do estado nutricional e do comportamento alimentar de estudantes de nutrição, ingressantes e concluintes ........................................................................................................... 51 Resumo ................................................................................................................. 52 Introdução .............................................................................................................. 54 Casuística e métodos............................................................................................. 57 Resultados ............................................................................................................. 59 Discussão .............................................................................................................. 61 Conclusão............................................................................................................... 65 Referências Bibliográficas...................................................................................... 66 CAPÍTULO III - Imagem corporal e estado nutricional: percepções e vivências de estudantes de nutrição ................................................................. 81 Resumo ................................................................................................................. 82 Introdução .............................................................................................................. 84 Casuística e métodos............................................................................................. 86 Resultados ............................................................................................................ 87 Discussão ............................................................................................................. 90 Conclusão.............................................................................................................. 93 Referências Bibliográficas...................................................................................... 93 16 CAPÍTULO IV - O percurso pedagógico na graduação em nutrição e a problematização das questões relacionadas ao comportamento alimentar e à imagem corporal............................................................................................. 108 Resumo ................................................................................................................. 109 Introdução .............................................................................................................. 111 Casuística e métodos............................................................................................. 116 Resultados e discussão.......................................................................................... 117 Considerações Finais............................................................................................. 129 Referências Bibliográficas...................................................................................... 131 CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 135 APÊNDICES........................................................................................................... 138 Apêndice 1- Dados de Corporeidade.................................................................... 139 Apêndice 2- Recordatório 24hs............................................................................. 140 Apêndice 3- Grupo Focal ( questões).................................................................... 141 Apêndice 4- Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ................................. 142 ANEXOS 145 ANEXO 1- Questionário Holandês do Comportamento Alimentar 146 ANEXO 2- Escala de Silhuetas 148 ANEXO 3- Sequências Curriculares dos Cursos de Nutrição 149 ANEXO 4- Comitê de Ética 162 17 APRESENTAÇÃO A idéia desse trabalho surgiu durante meu percurso acadêmico, como professora e coordenadora de cursos de Nutrição. Desde minha atuação em Ouro Preto (UFOP), depois em Alfenas (UNIFENAS) e atualmente em São Carlos (UNICEP), sempre procurei entender de que forma podemos ensinar os alunos a quererem buscar algo mais. Buscar o que “está por trás” do conteúdo aprendido / não aprendido na sala de aula e nos livros. E durante todo este tempo, percebi o quanto é difícil esse “algo mais”. Pois não depende somente da vontade dos alunos e dos professores dos cursos de Nutrição, exige uma dedicação profunda, de ambas as partes, no processo do aprendizado, incluindo abordagem que ajude o futuro nutricionista a olhar o outro como alguém que traz questões sociais, culturais e emocionais. Mas para isso, precisamos considerar que os estudantes de nutrição, como quaisquer outros indivíduos, possuem um repertório de cognições, atitudes e habilidades que pode ou não ser coerente com a competência necessária para a atuação profissional. Os alunos precisam ser vistos e olhados nos cursos, considerando-se esses aspectos. Como pessoas que trazem consigo uma história de vida. Durante esse tempo, em que busquei entender um pouco mais esse processo, percebi que, para ensinar usando uma abordagem psicossocial, seria necessário buscar outras habilidades e competências. E assim, pensando em me aprofundar nesse tema, busquei o doutorado. 18 CAPÍTULO I 19 1 INTRODUÇÃO GERAL As ciências da nutrição têm como um de seus objetos de estudo a relação entre o homem e o alimento. A atuação profissional do nutricionista, por sua vez, visa à alimentação do ser humano, individual ou coletivamente, o que exige amplo entendimento da nutrição humana. A partir dessas considerações, tem sido proposto que a formação acadêmica em nutrição possa levar o estudante à compreensão do ser humano enquanto ser biopsicossocial, do alimento e da relação ser humano/alimento, o que envolve aspectos biológicos, psicológicos, sociais, antropológicos, filosóficos, ambientais. Entretanto, embora a nutrição sempre tenha sido pensada como ciência multifacetária, diversos estudos destacam o evidente predomínio das ciências biológicas e exatas nas atividades e conteúdos acadêmicos (BOOG et al,1988; CANESQUI; GARCIA, 2005; MOTTA; OLIVEIRA; BOOG, 2003; YPIRANGA, 1990). Historicamente, o objeto de trabalho do nutricionista é determinado pela sua inserção e desempenho na sociedade. Atualmente, a educação alimentar e nutricional voltada para a segurança alimentar, promoção da saúde, qualidade de vida, prevenção e controle das doenças crônicas e desvios do comportamento alimentar tem sido objeto de significativa demanda social (BOOG, 2004). A Lei Federal 8.234/91 (BRASIL, 1991), que regulamentou a profissão do nutricionista, considera a Educação Nutricional como “atividade privativa deste profissional em todos os campos de atividade, alimentação coletiva, nutrição clínica, saúde coletiva, ensino, indústria de alimentos e esporte”. O Conselho Federal de Nutricionistas (CFN), no Glossário da Resolução 380/2005, assim a conceitua: "Educação Alimentar e Nutricional – procedimento realizado pelo nutricionista junto a indivíduos ou grupos populacionais, considerando as interações e significados que compõem o fenômeno do comportamento alimentar, para aconselhar mudanças necessárias a uma readequação dos hábitos alimentares." (CFN, 2005). 20 Outros autores definem essa atividade como: “a parte da nutrição aplicada que orienta seus recursos para o aprendizado, adequação e incorporação de hábitos nutricionalmente adequados, de acordo com as crenças, valores, atitudes, representações, práticas e relações sociais que se estabelecem em torno do ato de se alimentar. A incorporação e a prática de uma boa e desejável alimentação são o resultado que devemos esperar da educação alimentar e nutricional, e não apenas a melhoria de conhecimento sobre alimentação e nutrição.” (GABRIEL et al., 2008, p.566). A Educação Nutricional visa difundir os conhecimentos práticos da ciência da Nutrição para buscar a autonomia das pessoas na escolha por alimentos mais saudáveis e adequados às suas condições física, psicológica, socioeconômica e cultural. As condições de acesso aos alimentos são determinantes e primordiais à segurança alimentar e nutricional. Garantido o acesso, é indispensável o emprego dos recursos para uma seleção adequada de alimentos, bem como a organização da alimentação no cotidiano, para que sejam contemplados tanto os aspectos nutricionais quanto aqueles relacionados aos fatores emocionais, à comensalidade e ao prazer, não menos relevantes à qualidade de vida (BOOG, 2004). O comportamento alimentar é influenciado por aspectos nutricionais, demográficos, econômicos, sociais, culturais, ambientais e psicológicos. Para que o nutricionista possa contribuir no processo de mudança desse comportamento, suas competências profissionais devem incluir conhecimentos, atitudes e habilidades interdisciplinares e multissetoriais. Conhecimentos, atitudes e habilidades relativas à alimentação que o estudante de nutrição já traz, em sua bagagem cultural e pessoal, e que poderão ser transformados, aprofundados e ampliados, ao longo do curso de graduação. Para especialistas da área, “no processo educativo, o grande desafio é fazer com que as pessoas que aprenderam os diferentes aspectos da alimentação e nutrição os traduzam em ação, em seu próprio comportamento habitual. É preciso traduzir conhecimentos em ação, em uma boa alimentação diária.” (GABRIEL et al., 2008, p.566). 21 Educação é processo que visa capacitar o indivíduo para agir conscientemente diante de situações novas de vida, com o aproveitamento da experiência anterior (TURANO; ALMEIDA, 1999). Esse conceito pode ser aplicado tanto à educação alimentar e nutricional quanto ao ensino da nutrição, na formação profissional. Como o estudante de nutrição adquire conhecimentos amplos sobre o tema de sua formação profissional ao longo do curso, é natural supor que seu comportamento alimentar os incorpore, o que deveria resultar em uma alimentação saudável e nutricionalmente adequada. Todavia, alguns estudos negam essa suposição (ALVES; BOOG, 2007; CRITES Jr; AIKMAN, 2005; FIATES; SALLES, 2001; MOREIRA; SAMPAIO; ALMEIDA, 2003; STIPP; OLIVEIRA, 2003; TOLEDO; DALLEPIANE; BUSNELLO, 2009; VIEIRA, 2008). Como explicar o aparente paradoxo? Estariam os cursos de nutrição contribuindo para a problematização, ressignificação e reconstrução do comportamento alimentar de seus alunos? No Brasil, a maioria dos estudos que avaliou o comportamento alimentar de estudantes de nutrição investigou a presença de sinais e sintomas de transtornos alimentares, nesse grupo (ANTONACCIO, 2001; ALVARENGA, 2001; BOSI et al., 2006; GONÇALVES et al., 2008; STIPP; OLIVEIRA, 2003). Não foram identificados, em nosso meio, estudos sobre aspectos psicossociais do comportamento alimentar, estado nutricional e imagem corporal de ingressantes e concluintes de cursos de nutrição, associados ao questionamento do processo da formação acadêmica. Partindo da premissa que o repertório de competências do estudante de nutrição frente a seu objeto de estudo - a relação entre a pessoa e o alimento – tem início em sua própria vivência, justifica-se a realização da presente pesquisa, que teve por objetivo caracterizar o comportamento alimentar, o estado nutricional e a imagem corporal de estudantes de Nutrição (ingressantes e concluintes), discutindo-os à luz de uma abordagem psicossocial. 22 2 OBJETIVOS Objetivo geral Caracterizar o comportamento alimentar, o estado nutricional e a imagem corporal de estudantes de Nutrição (ingressantes e concluintes), discutindo-os à luz de uma abordagem psicossocial e frente ao percurso pedagógico das concluintes. Objetivos específicos Verificar o consumo alimentar (valor energético, distribuição percentual de macronutrientes; prática de dietas restritivas). Identificar os estilos de ingestão alimentar (restritiva, emocional e externa). Avaliar o índice de massa corporal e a percepção da autoimagem corporal. Identificar e analisar percepções, pensamentos e sentimentos relativos à alimentação e imagem corporal das estudantes concluintes. Verificar, entre as concluintes, a ocorrência de problematização sobre o comportamento alimentar e a imagem corporal, a partir de suas vivências e percurso pedagógico. 23 3 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 3.1 O comportamento alimentar sob a ótica da complexidade Entre os hábitos e comportamentos promotores da saúde, o alimentar é reconhecidamente elemento que se destaca, formando com o padrão de atividade física o chamado “estilo de vida”, promotor da saúde ou fator de risco para doenças crônicas. A nutrição está intrinsecamente associada à saúde e à doença e algumas das mais prevalentes doenças do nosso tempo são em grande parte atribuíveis a hábitos alimentares não saudáveis, adquiridos na infância e na adolescência. Assim, o conhecimento dos fatores que causam impacto no comportamento alimentar de indivíduos é essencial para que os profissionais que atuam na área de saúde possam desenvolver estratégias de educação nutricional realmente eficazes. Neste trabalho, adotaremos o mesmo conceito de Alves e Boog (2007), citando Diez-Garcia (1994), para quem o comportamento alimentar é o conjunto de procedimentos relacionados às práticas alimentares de grupos humanos (o que, quanto, como, quando, onde e com quem se come; a seleção de alimentos e os aspectos referentes ao preparo da comida) associados a atributos socioculturais, ou seja, aos aspectos subjetivos individuais e coletivos relacionados ao comer e à comida (alimentos e preparações apropriadas para situações diversas, escolhas alimentares, combinação de alimentos, comida desejada e apreciada, valores atribuídos a alimentos e preparações e aquilo que pensamos que comemos ou que gostaríamos de ter comido) (ALVES; BOOG, 2007). A partir de reflexão de Freitas, Minayo e Fontes (2011), compreende-se que hábito alimentar é a percepção que se tem sobre a comida e a escolha de alimentos no contexto social em que se vive, e corresponde ao conjunto de valores relativos à alimentação, adquirido por meio da experiência do sujeito em seu mundo social, desde a infância. Pode-se afirmar, a partir dessa conceituação, que o hábito alimentar corresponde aos aspectos qualitativos, socioculturais e simbólicos do comportamento alimentar. 24 Atitude é uma predisposição do indivíduo, formada a partir de suas experiências e informações obtidas, as quais o influenciam a agir favorável ou desfavoravelmente em relação a um determinado objeto. A psicologia considera que a atitude seja formada por três componentes básicos e inter- relacionados, sendo o primeiro o componente cognitivo – relativo ao aprendizado e à experiência do indivíduo com relação ao objeto em estudo, o segundo o componente afetivo – o qual reflete o grau de aceitação/preferência do indivíduo em relação ao objeto em questão; e, por último, o componente motivacional – associado à tendência do indivíduo à ação (GADE, 1980). O consumo alimentar é influenciado por hábitos e padrões alimentares e está relacionado ao perfil nutricional do indivíduo, caracterizando-os por meio dos diferentes aspectos socioculturais (SICHIERI; CASTRO; MOURA, 2003; SILVA; PAIS-RIBEIRO; CARDOSO, 2008; KOSTER, 2009). Diversos estudos realizados sobre o tema (BOOG, 1999; HAINES; NEUMARK-SZTAINER, 2006; RAMALHO; SAUNDERS, 2000; ROSSI; MOREIRA; RAUEN, 2008; TORAL, 2006), mostram que existe uma generalizada falta de conhecimento e entendimento sobre alimentação e nutrição na população, apesar da ampla disseminação de informações, contribuindo tanto para a manifestação das carências nutricionais quanto para a ocorrência da obesidade e das doenças crônicas. Escolher uma alimentação saudável não depende apenas do acesso à informação nutricional adequada. A seleção de alimentos tem a ver com as preferências relacionadas com o prazer associado ao sabor dos alimentos, as atitudes aprendidas desde muito cedo na família e a outros fatores psicológicos e sociais. É necessário, portanto, compreender o processo de ingestão do ponto de vista psicológico e sociocultural e conhecer as atitudes que influenciam esse processo de decisão (VIANA, 2002; SILVA; PAIS- RIBEIRO; CARDOSO, 2008). Um estudo realizado por Hoefkens et al. (2011), mostrou que a inclusão de informações nutricionais nas refeições oferecidas pelas cantinas nas universidades, não melhorou as escolhas das refeições e a ingestão de nutrientes entre os estudantes, concluindo que independente da intervenção 25 com as informações nutricionais, a escolha foi determinada pelas características da refeição oferecida. Isso reforça o que foi dito anteriormente que a escolha de uma alimentação saudável não depende apenas do acesso à informação nutricional. As pesquisas sobre alimentação de populações, geralmente analisam o consumo calórico, verificando a ingestão de macro e micronutrientes e a relação com as deficiências nutricionais e doenças crônicas não transmissíveis. A Organização Mundial da Saúde entretanto, em 1998 propôs que nas recomendações de alimentação saudável para a população, se dê ênfase aos alimentos, e não só aos nutrientes (SICHIERI; CASTRO; MOURA, 2003). O ato de comer é bastante complexo e não significa apenas a ingestão de nutrientes, mas envolve também uma amplitude de emoções e sentimentos, além de valores culturais específicos (VIANA, 2002). Entretanto, como analisa Silva (2002), a questão de como abordar o conceito de alimentação saudável, no âmbito da saúde, tem estado mais restrita à busca de estratégias técnicas a serem repassadas pelos profissionais à população. O setor da saúde, ao não assumir a alimentação como o resultado das múltiplas relações entre o biológico e o sociocultural, mas restringi-la ao aspecto da necessidade biológica, nutricional, fundamenta a reprodução de um saber que se sobressai para coibir valores simbólicos inscritos na alimentação cotidiana dos usuários. “Nessa noção conceitual, os nutrientes são colocados na dimensão do simbólico que faz contraste com o plano real, em que estão inseridas outras classificações dos alimentos. É nesse momento que, no campo do trabalho da saúde, traça-se um projeto de orientação alimentar ideal, pois, ao se incluírem os nutrientes no discurso do profissional como um signo para instruir a alimentação para a saúde do organismo, fecha-se a possibilidade de interação entre outros saberes humanos.” (SILVA, 2002, p. 1375). Do ponto de vista psicossocial, as explicações para a ingestão alimentar em desacordo com as necessidades, na atualidade, podem ser encontradas em teorias como a da externalidade, a psicossomática e a teoria da restrição. A teoria da externalidade considera que o processo de ingestão é determinado por fatores extrínsecos aos alimentos como o aroma, o gosto e o estímulo visual, aos quais a pessoa é condicionada na infância, influenciada pelos pais, 26 dentro de seu universo sociocultural. A teoria psicossomática valoriza a contribuição dos fatores emocionais e a confusão que pode existir entre estados como fome e ansiedade. A teoria da restrição defende que os indivíduos restritivos, pressionados por fatores sociais, tendem a se perceber como tendo peso excessivo, mesmo estando dentro da faixa de normalidade, o que os leva a buscar os conhecimentos sobre nutrição e as dietas de emagrecimento. Mas, por fatores fisiológicos e psicossomáticos, a tendência após um período de restrição é o descontrole, a desinibição alimentar. Nesse caso, a dieta restrita pode ser considerada a causa da ingestão excessiva subseqüente, por vezes compulsiva (VIANA, 2008; VIANA, 2009). A partir dessas teorias, definiram-se os estilos alimentares. Uma das abordagens, aplicada ao comer excessivo, propõe a diferenciação entre a “ingestão emocional” - aquela em que as emoções são o principal determinante do excesso alimentar -, a “ingestão por estímulo externo” - aquela em que as características do alimento ou do ambiente se sobrepõem à percepção da fome/saciedade - e a “ingestão restritiva” - aquela em que o controle alimentar restrito desinibe o comportamento alimentar, predispõe ao descontrole e à compulsão (VIANA; SINDE, 2003). Ingestão emocional: As emoções podem determinar as escolhas e preferências alimentares e os alimentos associam-se ao contexto emocional em que habitualmente são consumidos. As emoções também podem perturbar os controles cognitivos. A adesão a um controle alimentar pode ser por elas dificultada, uma vez que a função racional pode ser inibida, quando a emocional predomina e desinibe o comportamento alimentar. A psicologia comportamental observa e procura modificar essas relações; a psicanálise busca interpretar as associações, a partir da história da pessoa, para que o emocional possa ser elaborado e ressignificado (VIANA; SANTOS; GUIMARÃES, 2008; MOTTA; MOTTA; CAMPOS, 2011). Ingestão externa: estímulos ambientais associados aos alimentos, como o aroma, a aparência e o sabor também influenciam as escolhas alimentares. Se a pessoa não é capaz de identificar de modo adequado as suas necessidades, é mais facilmente afetada pelos estímulos externos do que pelos sinais de fome ou saciedade. Frente a um alimento de grande palatabilidade, a 27 aparência ou aroma deste pode estimular o apetite e a pessoa desinibe-se, liberta-se do controle e come mesmo sem ter fome (VIANA et al., 2009). Ingestão restritiva: a restrição alimentar implica um controle cognitivo, consciente, do apetite, em desacordo com as necessidades da pessoa, para levar, geralmente, à diminuição do peso corporal, pelo balanço energético negativo. Mas, por fatores fisiológicos e psicossomáticos, a tendência após um período de restrição é o descontrole, a desinibição alimentar. Nesse caso, a dieta restrita pode ser considerada a causa da ingestão excessiva subsequente (VIANA et al., 2009). As pessoas restritivas comem, geralmente, mais quando sob o efeito de fatores desinibidores (por exemplo, em situações de stress, ansiedade ou depressão), enquanto as não restritivas tendem a comer menos quando estressadas, deprimidas ou ansiosas (VIANA et al., 2009). Contrariamente ao que poderia ser esperado, os estudos demonstram que a restrição é mais frequente em obesos do que em pessoas de peso normal. A maior sensibilidade do obeso aos estímulos do ambiente (comer por estímulo externo), assim como a maior frequência de episódios de ingestão emocional, podem ser explicadas por um desejo potencializado por carências afetivas não identificadas e, portanto, não satisfeitas (ALMEIDA; LOUREIRO; SANTOS, 2001; BERNARDI; CICHELERO; VITOLO, 2005). 3.2 Comportamento alimentar e estado nutricional de estudantes universitários Estudos mostram que o comportamento alimentar inadequado e irregular atinge principalmente indivíduos do sexo feminino e a prevalência de doenças relacionadas a esse quadro é maior em grupos específicos, como estudantes universitários, atletas e profissionais com certa cobrança e exigência de um baixo peso corporal, como nutricionistas. Trabalhos realizados com estudantes universitários mostram que este grupo está sujeito a carências, excessos ou distúrbios nutricionais (FIATES; SALLES, 2001; HENDRICKS; HERBOLD, 1998; SANTOS; MENEGUCI; MENDONÇA, 2008; HOUSTON; BASSLER; 28 ANDERSON, 2008) e isso pode estar relacionado com o pouco conhecimento sobre nutrição e alimentação (OZDOĞAN; OZCELIK, 2011). Outros estudos mostram que os estudantes de nutrição formam um grupo de risco para transtornos alimentares, e que isso parece estar atribuído ao fato desse grupo estar envolvido em assuntos sobre alimentação, levando a maior autocobrança sendo que, muitas vezes, esses estudantes optam pela carreira de nutricionista por suas próprias questões com alimentação (ANTONACCIO, 2001; KIRSTEN; FRATTON; PORTA, 2009; LAUS; MOREIRA; COSTA, 2009). Segundo Vieira et al. (2002), os hábitos alimentares de estudantes universitários podem ser influenciados pelo próprio momento em que se encontram, caracterizado por novas relações sociais e novo ambiente, que causariam ansiedade e outras alterações emocionais, que poderiam refletir em um comportamento alimentar inadequado. Nesse sentido é importante ressaltar que as Universidades devem oferecer um ambiente em que os estudantes possam desenvolver bons hábitos de vida e práticas alimentares saudáveis (LOWRY et al., 2000; MARCONDELLI; COSTA; SCHMITZ, 2008). É fundamental considerar que os futuros nutricionistas estarão, em sua vida profissional, orientando pessoas em relação à alimentação, e dessa forma, ficarão mais expostos a uma cobrança em relação ao seu peso corporal e à sua forma física. É imprescindível que o nutricionista tenha uma boa relação pessoal com a alimentação e o corpo para conseguir uma eficaz orientação a terceiros (ANTONACCIO, 2001; MANOCHIO, 2010). Fiates e Salles (2001) buscaram identificar, em mulheres universitárias, aquelas que apresentavam fatores de risco para o desenvolvimento de distúrbios alimentares. Aplicaram o questionário Eating Attitudes Test (EAT) em 221 mulheres (114 estudantes de nutrição e 107 estudantes de outras áreas não relacionadas à saúde). Os resultados indicaram que 22,17% das estudantes apresentaram fatores de risco para o desenvolvimento de distúrbio alimentar, sendo que no grupo de alunas de nutrição o percentual foi maior (25,43%) do que no grupo de estudantes de outros cursos (18,69%). Embora a diferença não tenha sido significativa, os autores salientaram que as futuras nutricionistas podem estar inseridas em um ambiente mais favorável ao 29 desenvolvimento de distúrbios alimentares, uma vez que estão em contato constante com o alimento; sabem que “boa aparência” pode ser uma importante medida de valor pessoal rumo a uma profissão de sucesso. Além disso, possuem conhecimentos quantitativos e qualitativos a respeito dos alimentos que praticamente as obrigam a manterem-se de acordo com os rígidos padrões estéticos vigentes (FIATES; SALLES, 2001). Estudos com o mesmo público em nosso meio vêm apontando diversos problemas em relação à alimentação, como: ausência de refeições, especialmente do desjejum, baixo consumo de frutas e leite e não apropriação da autonomia em prover e cuidar da própria alimentação (ALVES; BOOG, 2007; AMORIM, 2001; ALBANO, 2000; VIEIRA, 2002). Matias e Fiore (2010), por outro lado, verificaram relatos de estudantes de curso de nutrição, que atribuiram mudanças de comportamento e de hábito alimentar à informação recebida durante o curso e observaram evolução positiva no consumo de quase todos os grupos de alimentos mais saudáveis, apesar de persistirem inadequações. Esse trabalho mostrou que o conhecimento adquirido no transcorrer do curso parece ter contribuído para mudanças alimentares. 3.3 A imagem corporal A imagem corporal (IC) é um componente da identidade pessoal. Pode ser definida como a representação mental (imagem introjetada) que uma pessoa tem sobre sua aparência física e corporeidade, expressa por meio de pensamentos, sentimentos e comportamentos referentes ao corpo. Sua formação está relacionada à percepção corporal e ao nível de satisfação ou insatisfação com o próprio corpo (BOSI et al., 2006; SAIKALI et al., 2004; SLADE, 1988; STIPP; OLIVEIRA, 2003; ALVES et al., 2009; ALVARENGA; SCAGLIUSI; PHILIPPI, 2011). 30 Para a Psicologia Social, a IC é parte do autoconceito, construção mental que o indivíduo elabora sobre si mesmo ao longo da vida, composta por cognições, afetos, sentimentos, comportamentos e atitudes que ele possui a respeito de si, dos outros e do meio em que vive. Esta estrutura é formada a partir das percepções, conjecturas e fantasias que o indivíduo tem quanto à influência que a sua imagem exerce sobre os outros, do julgamento que estes realizam sobre o indivíduo, somados a uma espécie de auto-sentimento (orgulho ou vergonha) resultante dessa interação social (KANNO et al., 2008). A IC é influenciada por fatores de origem física, psicológica, ambiental e cultural, tais como sexo, idade, etnia, crenças e valores, todos relacionados à subjetividade de cada ser humano. Na sociedade contemporânea, a mídia exerce forte influência no comportamento das pessoas, impondo padrões estéticos que se refletem na relação do indivíduo com sua imagem corporal (ALVARENGA et al., 2010; ANDRADE; BOSI, 2003). A “cultura do magro” se associa à “divinização do corpo belo”. O indivíduo molda as suas ações em função daquilo que é considerado normal e aceitável no seu meio social, procurando preencher os requisitos exigidos pela cultura à qual pertence (ALVES et al., 2009; CASTRO et al., 2010). A distorção da percepção corporal, ou seja, a representação do tamanho ou forma do corpo de maneira diferente da que pode ser avaliada por métodos objetivos, não constitui característica particular de pessoas que desenvolvem algum tipo de transtorno alimentar e se faz presente entre adolescentes e adultos de diferentes estratos da população, na atualidade. As influências socioculturais, as pressões da mídia e “a busca incessante por um padrão de corpo ideal associado às realizações e felicidade estão entre as causas das alterações da percepção da imagem corporal, gerando insatisfação, em especial para indivíduos do gênero feminino.” (CONTI; FRUTUOSO; GAMBARDELLA, 2005, p.493). Alguns estudos tem demonstrado que essa insatisfação contribui para a adoção de comportamento alimentar restritivo e é mais prevalente entre estudantes e profissionais de áreas como nutrição e educação física e praticantes de esportes (BOSI et al., 2006; COQUEIRO et al., 2008; DAMASCENO et al., 2005; GONÇALVES et al., 2008; QUADROS et al., 2010). 31 A insatisfação com a imagem corporal pode, inclusive, ser um dos motivos que influenciam a opção pelo curso de nutrição (ANTONACCIO, 2001; MANOCHIO, 2010; SANTOS; MENEGUCI; MENDONÇA, 2008). É fundamental considerar que os futuros nutricionistas estarão, em sua vida profissional, orientando pessoas em relação à alimentação para obter resultados que se expressam na corporeidade e dessa forma, sentir-se-ão sujeitos a expectativas sociais e expostos a críticas sobre seu peso e sua forma física. É imprescindível que tenham uma boa relação pessoal com a alimentação e o corpo para conseguir uma eficaz orientação a terceiros (ANTONACCIO, 2001; ARROYO et al., 2010). 3.4 A formação profissional em Nutrição Na área da saúde, reconhece-se, desde o final do século passado, a necessidade de formar “um novo tipo de profissional, capacitado tecnicamente, não mais com uma qualificação fragmentada, centrado nos conhecimentos biológicos, inadequado às necessidades sociais e afastado das condições de vida do paciente, impossibilitando a compreensão do indivíduo” (SCHRAIBER, 1998, p. 114). A formação dos profissionais de saúde tem sido repensada, principalmente, devido às mudanças ocorridas no mundo contemporâneo, nos aspectos políticos, econômicos, culturais, sociais e tecnológicos. Tais mudanças têm implicado em redirecionamentos nas políticas de educação e de saúde, as quais resgatam elementos fundamentais para repensar a educação dos profissionais de saúde. O debate sobre a formação inadequada dos profissionais de saúde e sobre a necessidade de modificações nas orientações curriculares tem dado ênfase à inclusão do princípio da integralidade como um eixo da formação em saúde. Considera também a complexidade, as implicações políticas e os desafios acadêmicos que envolvem a transformação do sistema educacional dominante. Os fatores sociais, políticos, econômicos, ecológicos, ambientais, geográficos e culturais, dentre outros, tem sido pouco abordados, quando se 32 estudam aspectos do alimento, da alimentação e de suas interações com o ser humano (SOARES; AGUIAR, 2010; FERREIRA; MAGALHÃES, 2007). Contrariando o que se supõe necessário para uma abordagem holística de tema altamente complexo, trabalhos como o de Boog (1997) mostram que os cursos de Nutrição possuem uma estrutura curricular “biologicista”, ou baseada nas ciências biológicas. A maioria dos estudos realizados para caracterizar o hábito alimentar de indivíduos ou grupos populacionais limita-se ao levantamento dos padrões de ingestão (consumo alimentar). A avaliação nutricional tradicionalmente inclui a investigação dos aspectos dietéticos (ingestão), antropométricos, clínicos e laboratorias, sendo os dados socioeconômicos e culturais meros complementos do procedimento. O comportamento é o objeto de análise da Psicologia. A pouca efetividade da educação nutricional no processo de formação e mudança do comportamento alimentar aponta para a necessidade de inserção dos referenciais da Psicologia nessa área (VIANA, 2002). A ênfase do enfoque biologicista aparece desde o início da formação, como já questionado no IV Congresso Brasileiro de Nutricionistas, em 1967. Na década de oitenta, o predomínio do biologicismo também foi problematizado conforme pode ser observado em documento da Associação Brasileira de Nutrição: "A formação do profissional na área de nutrição vem sendo feita a partir de uma visão do mundo fragmentadora e biologicista que ao abordar a saúde e a doença como processos naturais e individuais, não forma um profissional realmente comprometido com uma prática voltada para a transformação dos processos sociais e biológicos que determinam a fome e a desnutrição". (ASSOCIAÇÃO..., 1991, p.359). Vários estudos e eventos têm caracterizado o processo de formação do nutricionista, discutindo, basicamente, o currículo e o perfil profissional desejado. Trabalhos abordando esse tema identificaram, como principais problemas curriculares, a distância entre os conhecimentos biológicos e sociais, entre a teoria e a prática, como também entre o ciclo básico e o profissionalizante (COSTA,1996; COSTA,1999; FRANCO; BOOG, 2007; SANTOS et al., 2005; FREITAS; MINAYO; FONTES, 2011; SOARES; AGUIAR, 2010; VASCONCELOS, 2010). 33 O nutricionista é um profissional com fundamentação teórica no campo da nutrição, capaz de traduzir esta ciência para a linguagem de seu público, orientando o comportamento alimentar dos indivíduos (CFN, 2001). Em qualquer área que ele atue, cumprirá um papel de educador, considerando que suas ações deverão se realizar como agente de mudança num processo que ocorre, no mínimo entre duas pessoas: educando e educador. “Ser um educador significa criar possibilidades para mudar conhecimentos, atitudes e ações em todas as situações que se fizerem necessárias” (TURANO; ALMEIDA, 1999. p.61). Os princípios, objetivos e metas das Diretrizes Curriculares para os Cursos de Nutrição (DCN), homologadas pelo Conselho Nacional de Educação em 03/10/01 (BRASIL, 2001), são comuns aos demais cursos da saúde e têm dentre seus focos centrais a flexibilização do ensino, a ênfase na formação geral, a promoção da autonomia e a articulação da teoria com a prática. Além disso, as diretrizes preconizam que todos os profissionais de saúde devam estar dotados de competências essenciais para possibilitar a sua participação e atuação multiprofissional, beneficiando tanto os indivíduos como a comunidade. Para Franco e Boog (2007), as DCN estabelecem que os conteúdos curriculares dos cursos de nutrição devem contemplar as ciências sociais e humanas, que são áreas de conhecimentos que abordam a educação. Além disso, esse documento preconiza que o ensino deve ser crítico, reflexivo, criativo e deve conter atividades teóricas e práticas desde o início, assegurando a definição de estratégias pedagógicas que articulem ensino/pesquisa/extensão-assistência. Segundo as autoras, a relação teórico- prática é importante desde o primeiro ano da graduação, para que o aluno consiga estabelecê-la em todas as suas ações ao longo do curso. Não cabe somente à disciplina educação nutricional e aos seus docentes o papel do despertar da educação enquanto essencialidade da prática profissional (FRANCO; BOOG, 2007). Para Mitre et al., a formação dos profissionais de saúde tem sido pautada no uso de metodologias tradicionais, conservadoras, sob forte influência do mecanicismo, fragmentado e reducionista. Na busca da eficiência técnica, “separou-se o corpo da mente, a razão do sentimento, a ciência da 34 ética, compartimentalizando-se, conseqüentemente, o conhecimento em campos altamente especializados” (MITRE et al., 2008, p.2134). O ato de aprender deve ser um processo reconstrutivo, que permita o estabelecimento de diferentes tipos de relações entre fatos e objetos, desencadeando ressignificações/reconstruções e contribuindo para a sua utilização em diferentes situações. Para a construção da aprendizagem significativa duas condições são necessárias: a existência de um conteúdo potencialmente significativo e a adoção de uma atitude favorável para a aprendizagem, ou seja, a postura própria do discente que permite estabelecer associações entre os elementos novos e aqueles já presentes na sua estrutura cognitiva. Ao contrário, na aprendizagem mecânica, não se consegue estabelecer relações entre o novo e o anteriormente aprendido (FRANCO; BOOG, 2007). A educação crítica e transformadora pressupõe um discente capaz de autogovernar seu processo de formação e de corporeificar as palavras pelo exemplo, conforme proposto por Paulo Freire (2006). Para tanto, acreditamos que o estudante, em sua formação, deve ser considerado um sujeito detentor de conhecimentos, atitudes e habilidades relativas à alimentação, passíveis de problematização, ressignificação e reconstrução. Espera-se que o egresso dos cursos de nutrição tenha competências para exercer a educação alimentar e nutricional em qualquer área de atuação, construindo conhecimentos significativos com o cliente/paciente/educando, considerando-o como sujeito ativo do processo, aberto e flexível às suas necessidades. Competências são definidas como conjuntos de conhecimentos, atitudes e habilidades interdependentes e necessárias à consecução de determinado propósito. Englobam as cognições, atitudes e habilidades já existentes, ampliadas no processo de ensino-aprendizagem (LAZZAROTTO, 2003). Na área da alimentação, todos os indivíduos, independentemente da formação acadêmica, possuem um repertório de cognições, atitudes e habilidades, que pode ou não ser coerente com a competência necessária para a atuação profissional. 35 O conhecimento em nutrição, como parte da formação profissional, está diretamente associado à atenção dietética, que é a ação específica que individualiza e caracteriza a prática profissional do nutricionista (YPIRANGA, 1990). A dietética, em seu sentido amplo, corresponde ao exercício da razão como faculdade crítica que fornece a cada um os meios para tornar-se mestre de seu corpo e aderir às regras que permitem conservá-lo em bom estado (OLIVEIRA, 2006). No sentido restrito, esses meios são os relativos à alimentação. Assim, na formação do nutricionista, espera-se que a razão seja exercitada para fornecer os meios com os quais as pessoas possam controlar o comportamento alimentar e obter a imagem corporal desejada, compatível com o adequado estado nutricional. Entretanto, a racionalidade técnica que desconsidere as dimensões humanas, psicológica e sociocultural do comportamento alimentar, ao longo da formação do nutricionista, deve ser questionada. 36 4. CASUÍSTICA E MÉTODOS 4.1 Local e delineamento do estudo O estudo, do tipo transversal, quantitativo e qualitativo, foi realizado em três universidades particulares do interior do estado de São Paulo. 4.2 População do estudo A população de estudo constituiu-se de um total de 167 estudantes do sexo feminino, ingressantes (n=64) e concluintes (n=103) de cursos de Nutrição, com média de idade de 21,6 anos entre as ingressantes e de 24,5 entre as concluintes. 4.3 Critérios de inclusão Foram incluídas no estudo estudantes do sexo feminino, ingressantes no curso de Nutrição no ano em que o estudo foi realizado, e alunas concluintes que estivessem cursando o último período (terminando os estágios curriculares). 4.4 Critérios de exclusão Foram excluídas alunas que, embora ingressantes no curso no ano em que o estudo foi realizado (por transferência ou rematrícula), tivessem cursado, anteriormente, disciplinas específicas de períodos posteriores ao primeiro ano. 4.5 Variáveis do estudo 4.5.1 Variáveis para avaliação do estado nutricional Para a avaliação do estado nutricional, foram levantados dados pessoais (idade e ocupação) e realizadas avaliação antropométrica e do consumo alimentar. 37 As medidas antropométricas usadas foram peso e estatura. As estudantes foram pesadas descalças, em balança eletrônica digital e medidas em antropômetro acoplado à balança, no momento em que preencheram o questionário de informações pessoais. Foi verificado o Índice de Massa Corporal (IMC= peso(kg)/ altura(m)2) considerando-se os dados de peso real e peso desejado. O IMC foi classificado de acordo com o proposto pela Organização Mundial de Saúde (WHO,1997), em baixo peso (IMC< 18,5 kg/m2), eutrofia (18,5≤ IMC<24,9 kg/m2), sobrepeso (25≤IMC≤29,9kg/m2) e obesidade (IMC>29,9kg/m2). 4.5.2 Variáveis relativas ao comportamento alimentar Para caracterizar o consumo alimentar, foi levantado o número de refeições diárias e calculadas, a partir da dieta referida no recordatório de 24 horas, a ingestão calórica e a distribuição percentual dos macronutrientes. O comportamento alimentar foi investigado mediante a identificação do estilo psicossocial (restrição alimentar, ingestão emocional, ingestão externa); histórico de realização de dietas modificadas; percepções, pensamentos e sentimentos relativos à alimentação. 4.5.3 Variáveis relativas à imagem corporal As atitudes relativas à imagem corporal foram levantadas a partir da identificação da imagem corporal atual, imagem corporal desejada, peso real e peso desejado. 4.6 Instrumentos e métodos 4.6.1 Dados pessoais e corporeidade A identificação das participantes foi realizada mediante aplicação de questionário (Apêndice 1) que inclui dados pessoais, histórico do peso corporal e da realização de dietas para controle de peso e registro dos dados antropométricos. 38 4.6.2 Consumo e comportamento alimentar Para verificar o consumo alimentar das estudantes de Nutrição, foi utilizado o Recordatório de 24hs (Apêndice 2). Aspectos psicossociais do comportamento alimentar foram investigados mediante a aplicação do Questionário Holandês de Comportamento Alimentar (QHCA, Anexo 1), preenchido por todas as estudantes. O QHCA (VAN STRIEN, FRITJERS, BERGERS & DEFARES, 1986) foi validado para o português por Viana & Sinde (2003) e traduzido para a população brasileira por Almeida, Loureiro e Santos (2001). O questionário é composto por 33 itens, avaliados numa escala cotada entre 1 e 5 (nunca/ raramente/ às vezes/ frequentemente/ muito frequentemente), compondo 3 subescalas: restrição alimentar (10 itens); ingestão emocional (13 itens); e ingestão externa (10 itens). A subescala de restrição alimentar refere-se ao esforço que o indivíduo exerce regularmente para controlar o seu apetite e ingestão de alimentos, e define um estilo alimentar associado ao conhecimento de hábitos nutricionais adequados. A ingestão emocional representa a perda de controle da ingestão por exposição a fatores de stress emocional, implicando desinibição alimentar e traduz um estilo alimentar responsivo ao estado emocional do indivíduo. Já a ingestão externa diz respeito à desinibição ou perda de controle que ocorre devido a fatores externos intrínsecos aos alimentos ou à situação social em que são ingeridos. Esse instrumento permite questionar não o ato de ingestão alimentar, mas as atitudes e fatores psicossociais implícitos na seleção e decisão na alimentação. Um resultado elevado em uma das subescalas implica em uma tendência a reagir aos alimentos (atitude) que se traduz no estilo alimentar. 4.6.2 Imagem Corporal Para avaliar a percepção da imagem corporal adotou-se a Escala de Silhuetas (STUNKARD et al, 1983), adaptada por Scagliusi et al (2006) que 39 consiste de nove figuras. De acordo com Madrigal et al (1999) as silhuetas são divididas em quatro categorias: silhueta 1- delgada (magra); silhuetas 2 a 5 - normal; silhuetas 6 e 7- sobrepeso; e silhuetas 8 e 9- obesa. As figuras esquemáticas foram apresentadas a cada estudante e lhes foi solicitado selecionar as silhuetas correspondentes às suas imagens atual e desejada (conforme modelo constante do Anexo 21). A satisfação corporal foi analisada por meio do cálculo da diferença entre o valor atribuído à imagem que a estudante gostaria de ter (ideal) e o valor que a representasse no momento (atual). Esse escore poderia variar de – 8 a + 8, e quanto maior a diferença, maior o grau de insatisfação da estudante com a autoimagem corporal (SCAGLIUSI et al., 2006). 4.6.3 Grupo Focal Após a realização das fases anteriores, foram formados grupos focais, com amostra das participantes do estudo, para a discussão e aprofundamento dos resultados. A escolha desta amostra foi condicionada ao preenchimento de critérios de inclusão específicos: disponibilidade, concordância e interesse em participar dessa etapa da pesquisa. Sob o ponto de vista qualitativo, os princípios de definição amostral se baseiam na busca de “aprofundamento e de compreensão de um grupo social, de uma organização, de uma instituição ou de uma representação” (MINAYO, 2004, p.102). Os critérios quantitativos, portanto, não se aplicam à definição amostral para essa técnica. A técnica de grupo focal permite a obtenção de dados de natureza qualitativa a partir de sessões grupais em que as pessoas que compartilham traços comuns, como por exemplo, faixa etária, ocupação, papel que representam na comunidade, discutem vários aspectos de um tema especifico. Esta técnica pode ser empregada quando se pretende trabalhar com mudança de comportamento humano e educação em saúde, pois possibilita a inserção de indivíduos na discussão e resolução de problemas (MINAYO, 2004; MINAYO, 2005). 1 O formulário utilizado inclui outras questões, que não serão objeto de análise neste trabalho. 40 As reuniões dos grupos ocorreram mediante utilização de roteiro de questões (Apêndice 3). Esse roteiro foi previamente submetido à avaliação de três pareceristas (pesquisadores com experiência na aplicação da metodologia qualitativa e realização de grupos focais). Essa técnica exige que haja um moderador e um observador, além dos participantes. O moderador tem como função coordenar a discussão e incentivar a participação de todos, formulando questões, evitando o predomínio de um sobre os demais e conduzindo a discussão de modo que esta se mantenha dentro dos tópicos de interesse. No presente estudo, o questionamento incluiu os motivos da opção pelo curso, para expressar a possível relação com suas histórias alimentares; aspectos do comportamento alimentar e imagem corporal das estudantes ao longo do curso e sua relação com a aquisição de conhecimentos. As reuniões ocorreram em salas de aula das Instituições, amplas, arejadas e em local calmo e silencioso. O ambiente foi preparado com as carteiras em círculo e as alunas foram acolhidas pela moderadora, que lhes oferecia água, suco, bolachas e barras de cereais, antes do início das reuniões. A moderadora explicava como seria a dinâmica e iniciava a atividade. As reuniões duraram, em média, uma hora. As discussões foram gravadas, anotadas pelo observador e, posteriormente, transcritas. Antes da aplicação dos instrumentos, foi realizado seu pré-teste com alunas de um dos cursos de Nutrição, não participantes da pesquisa, para testar e adequar o formato e a linguagem. 4.7 Análise dos dados Para os dados demográficos, de satisfação corporal e de antropometria, foram realizadas análises estatísticas descritivas e calculados a média, os desvios-padrão e o intervalo de confiança. Os dados foram duplamente digitados e confirmada a consistência do banco. O recordatório alimentar de 24 horas foi analisado com o objetivo de verificar a adequação do consumo energético e da distribuição de macronutrientes das estudantes ingressantes e concluintes. As refeições foram 41 calculadas pelo Programa DIET PRO (Software de Avaliação Nutricional e Prescrição Dietética. Disponivel em: http://www.dietpro.com.br/. Acessado em: 20/01/2010). Para análise do Questionário Holandês de Comportamento Alimentar consideraram-se os escores parciais de cada subescala. O tratamento estatístico dos dados quantitativos foi realizado com apoio do programa Excel for Windows. Para verificar o grau de significância das diferenças entre ingressantes e concluintes realizaram-se os testes t-student e análise de variância (ANOVA). Teste de Pearson foi utilizado para identificar correlações entre as variáveis levantadas. As análises foram realizadas utilizando-se os programas Statistica, versão 7 e SPSS para Windows, versão 15.0.1 em Espanhol (SPSS Inc.,1986-2006). O nível de significância considerado foi p<0,05. Para a análise de dados do grupo focal, a literatura sugere o método de análise de conteúdo, em que as falas dos indivíduos estão situadas em seu contexto para serem melhor compreendidas. Os passos, sugeridos na literatura (GOMES, 1994, p.78-79) e utilizados no presente trabalho foram: Ordenação de dados: mapeamento de todos os dados obtidos no trabalho de campo (transcrições de gravações, releitura do material, organização dos relatos, dados da observação participante); Classificação dos dados: determinação do conjunto das informações presentes na comunicação, com elaboração de categorias específicas, através da leitura exaustiva e repetida dos dados. Nesta fase é importante considerar que os dados não existem por si só, mas devem ser construídos com base nos questionamentos que fazemos sobre eles, fundamentados na teoria; Análise: estabelecimento de articulações entre os dados e os referenciais teóricos da pesquisa, respondendo às questões da pesquisa com base em seus objetivos. Para complementar a discussão relativa ao percurso pedagógico das estudantes concluintes, foram solicitadas às coordenações dos cursos as sequências curriculares vigentes (Anexo 3). 42 4.8 Aspectos Éticos A população foi esclarecida previamente quanto aos objetivos e métodos do estudo e foram incluídos apenas indivíduos que aceitaram participar da pesquisa e assinaram o TCLE (Termo de Consentimento Livre e Esclarecido) (Apêndice 4). Foram garantidos sigilo e anonimato a todas as participantes. As Instituições de ensino onde o estudo se realizou foram devidamente esclarecidas a respeito da pesquisa e participaram mediante consentimento dos responsáveis pelo curso em estudo. O protocolo do estudo foi aprovado pelo comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Central Paulista de São Carlos, SP, conforme processo no 002/2009 (Anexo 4). 43 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALBANO-CARDOSO, M. R. 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A população foi formada por 167 alunas (64 ingressantes e 103 concluintes) de três instituições do interior do Estado de São Paulo, com média de idade de 21,6 anos (ingressantes) e 24,5 anos (concluintes). A metodologia foi a quantiqualitativa, mediante levantamento de dados antropométricos, recordatório alimentar de 24 horas, identificação do estilo alimentar (pelo Questionário Holandês do Comportamento Alimentar) e realização de grupos focais, para questionamento das atitudes, percepções e sentimentos relativos à alimentação. Os resultados mostraram 10,9% de excesso de peso entre as ingressantes e 26,1% entre as concluintes; e déficit de peso de 10,9%, entre as ingressantes. A ingestão energética média (2155 kcal, ingressantes; 1800 kcal, concluintes) pode ser considerada suficiente e a distribuição percentual de macronutrientes, dentro da faixa de normalidade. Nos dois grupos, predominaram os indicativos de alimentação determinada por fatores externos e esse estilo mostrou correlação com o total energético da dieta. Entre as concluintes, observou-se tendência à restrição alimentar e influência do componente emocional, associadas ao aumento de peso. Conclui-se que os conhecimentos adquiridos ao longo do percurso pedagógico não foram suficientes para a aquisição do controle desejado, uma vez que fatores emocionais e socioculturais dificultaram sua incorporação à prática alimentar habitual das alunas. Descritores: comportamento alimentar, estudantes de nutrição, grupos focais, estilo alimentar. 54 Abstract Future dietitians, as any other individuals, are subject to psychosocial factors that influence their eating habits, regardless of their level of expertise. This study aimed at characterizing the feeding behavior and nutritional status of students of Nutrition Science, discussing them in light of the psychosocial approach. The studied population consisted of 167 students (64 freshmen and 103 undergraduate) from three institutions in State of São Paulo, with a mean age of 21.6 years (freshmen) and 24.5 years (undergraduate). The methodology was quantitative and qualitative by anthropometric data collection, 24-hour food recall, and identification of eating behavior (using the Dutch Eating Behavior Questionnaire) and conducting focus groups to investigate attitudes, perceptions and feelings regarding food. The results showed that 10.9% of overweight among the freshmen, 26.1% among undergraduates, and low weight of 10.9% among the freshmen. The average energy intake (2155 kcal among freshmen and 1800 kcal among undergraduates) can be considered sufficient and the percentage distribution of macronutrients within the normal range. In both groups there was a prevalence of influence of external factors on dietary behavior which is correlated with the total energy of the diet. Among the graduates, it was showed a tendency to food restriction and influence of the emotional component associated with weight gain. It is concluded that the knowledge acquired along the way was not enough to acquire the desired control, as emotional and socio-cultural factors have hindered its incorporation into usual eating habits of the students. Key words: Eating behavior, nutrition students, focus groups. 55 Introdução Para que o nutricionista possa contribuir no processo de mudança do comportamento alimentar, no exercício da atenção dietética, suas competências profissionais devem incluir conhecimentos, atitudes e habilidades interdisciplinares e multissetoriais, dada a complexidade do processo. Diferentemente de outros conhecimentos e habilidades técnicas, os relativos à alimentação o estudante de nutrição já traz, em sua bagagem cultural e pessoal, mas ao longo do curso de graduação esses deverão ser aprofundados e ampliados. Para especialistas da área, “no processo educativo, o grande desafio é fazer com que as pessoas que aprenderam os diferentes aspectos da alimentação e nutrição os traduzam em ação, em seu próprio comportamento habitual. É preciso traduzir conhecimentos em ação, em uma boa alimentação diária” (GABRIEL et al., 2008, p.566). Como o estudante de nutrição adquire conhecimentos amplos sobre o tema, é natural supor que seu comportamento alimentar os incorpore, o que deveria resultar em uma alimentação saudável e nutricionalmente adequada. Todavia, alguns estudos negam essa suposição (ALVES; BOOG, 2007; CRITES Jr; AIKMAN, 2005; FIATES; SALLES, 2001; MOREIRA; SAMPAIO; ALMEIDA, 2003; STIPP; OLIVEIRA, 2003; TOLEDO; DALLEPIANE; BUSNELLO, 2009; VIEIRA; SABADIN; OLIVEIRA, 2008). Como explicar o aparente paradoxo? As explicações para a ingestão em desacordo com as necessidades, do ponto de vista psicossocial podem ser encontradas em teorias como a da externalidade, a psicossomática e a teoria da restrição. A teoria da externalidade considera que o processo de ingestão é determinado por fatores extrínsecos aos alimentos como o 56 aroma, o gosto e o estímulo visual, aos quais a pessoa é condicionada na infância, influenciada pelos pais, dentro de seu universo sociocultural. A teoria psicossomática valoriza a contribuição dos fatores emocionais e a confusão que pode existir entre estados como fome e ansiedade. A teoria da restrição defende que os indivíduos restritivos, pressionados por fatores sociais, tendem a se perceber como tendo peso excessivo, mesmo estando dentro da faixa de normalidade, o que os leva a buscar os conhecimentos sobre nutrição e as dietas de emagrecimento. Mas, por fatores fisiológicos e psicossomáticos, a tendência após um período de restrição é o descontrole, a desinibição alimentar. Nesse caso, a dieta restrita pode ser considerada a causa da ingestão excessiva subseqüente, por vezes compulsiva (VIANA; SANTOS; GUIMARÃES, 2008; VIANA et al., 2009). A partir dessas teorias, definiram-se os estilos alimentares. Uma das abordagens, aplicada ao comer excessivo, propõe a diferenciação entre a “ingestão emocional” - aquela em que as emoções são o principal determinante do excesso alimentar -, a “ingestão por estímulo externo” - aquela em que as características do alimento ou do ambiente se sobrepõem à percepção da fome/saciedade - e a “ingestão restritiva” - aquela em que o controle alimentar restrito desinibe o comportamento alimentar, predispõe ao descontrole e à compulsão (VIANA; SINDE, 2003). Ingestão emocional: As emoções podem determinar as escolhas e preferências alimentares e os alimentos associam-se ao contexto emocional em que habitualmente são consumidos. As emoções também podem perturbar os controles cognitivos. A adesão a um controle alimentar pode ser por elas dificultada, uma vez que a função racional pode ser inibida, quando a emocional predomina e desinibe o comportamento alimentar. A psicologia comportamental observa e procura modificar essas relações; a psicanálise busca interpretar as associações, a partir da história da pessoa, para que o 57 emocional possa ser elaborado e ressignificado (VIANA; SANTOS; GUIMARÃES, 2008; MOTTA; MOTTA; CAMPOS, 2011). Ingestão externa: estímulos ambientais associados aos alimentos, como o aroma, a aparência e o sabor também influenciam as escolhas alimentares. Se a pessoa não é capaz de identificar de modo adequado as suas necessidades, é mais facilmente afetada pelos estímulos externos do que pelos sinais de fome ou saciedade. Frente a um alimento de grande palatabilidade, a aparência ou aroma deste pode estimular o apetite e a pessoa desinibe-se, liberta-se do controle e come mesmo sem ter fome (VIANA et al., 2009). Ingestão restritiva: a restrição alimentar implica um controle cognitivo, consciente, do apetite, em desacordo com as necessidades da pessoa, para levar, geralmente, à diminuição do peso corporal, pelo balanço energético negativo. Mas, por fatores fisiológicos e psicossomáticos, a tendência após um período de restrição é o descontrole, a desinibição alimentar. Nesse caso, a dieta restrita pode ser considerada a causa da ingestão excessiva subsequente (VIANA et al., 2009). As pessoas restritivas comem, geralmente, mais quando sob o efeito de fatores desinibidores (por exemplo, em situações de stress, ansiedade ou depressão), enquanto as não restritivas tendem a comer menos quando estressadas, deprimidas ou ansiosas (VIANA et al., 2009). Contrariamente ao que poderia ser esperado, os estudos demonstram que a restrição é mais frequente em obesos do que em pessoas de peso normal. A maior sensibilidade do obeso aos estímulos do ambiente (comer por estímulo externo), assim como a maior frequência de episódios de ingestão emocional, podem ser explicadas por um desejo potencializado por carências afetivas não identificadas e, portanto, não 58 satisfeitas (ALMEIDA; LOUREIRO; SANTOS, 2001; BERNARDI; CICHELERO; VITOLO, 2005). Tem sido mostrado que o comportamento alimentar inadequado e irregular atinge principalmente indivíduos do sexo feminino e que a prevalência de transtornos alimentares é maior em grupos específicos, como estudantes universitários, atletas e profissionais que lidam com a corporeidade, dentre eles nutricionistas e estudantes de nutrição. Pesquisas sugerem ainda, que, algumas vezes, a opção profissional é motivada pelos desvios do comportamento alimentar (ANTONACCIO, 2001). Na perspectiva de ampliar essa discussão, o presente estudo teve por objetivo estudar o estado nutricional e o comportamento alimentar de estudantes de nutrição, à luz da abordagem psicossocial, quando de seu ingresso e ao final do último ano da graduação. Casuística e método A população do estudo foi formada por 167 estudantes do sexo feminino, ingressantes (n=64) e concluintes (n=103), de três instituições de ensino de municípios distintos do interior do Estado de São Paulo, com média de idade de 21,6 anos (ingressantes) e de 24,5 anos (concluintes). O estudo foi do tipo transversal,