UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE MEDICINA KARISE NAVES DE REZENDE Caracterização morfofuncional de veias safenas magnas descelularizadas como arcabouço para engenharia de tecidos Dissertação apresentada à Faculdade de Medicina, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Botucatu, para obtenção do título de Mestra em Cirurgia e Medicina Translacional. Orientador: Prof. Dr. Matheus Bertanha Coorientador: Prof. Dr. Rodrigo Gibin Jaldin Botucatu 2021 Karise Naves de Rezende Caracterização morfofuncional de veias safenas magnas descelularizadas como arcabouço para engenharia de tecidos Dissertação apresentada à Faculdade de Medicina, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Botucatu, para obtenção do título de Mestra em Cirurgia e Medicina Translacional Orientador: Prof. Dr. Matheus Bertanha Coorientador: Prof. Dr. Rodrigo Gibin Jaldin Botucatu - SP 2021 Karise Naves de Rezende Caracterização morfofuncional de veias safenas magnas descelularizadas como arcabouço para engenharia de tecidos Dissertação, apresentada à Faculdade de Medicina, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Botucatu, para exame de qualificação para defesa da obtenção do título de Mestra em Cirurgia e Medicina Translacional. Orientador: Matheus Bertanha Comissão Examinadora __________________________________________ Prof. Dr. Matheus Bertanha Departamento de Cirurgia e Ortopedia – Vascular Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP __________________________________________ Prof. Dr. Diego Noé Rodríguez Sánchez Departamento. Clínica Veterinária / FMVZ/Botucatu – Unesp __________________________________________ Dra. Paula Angeleli Bueno de Camargo Departamento de Cirurgia e Ortopedia – Vascular Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP Botucatu, 01 de setembro de 2021 Dedicatória Dedico este trabalho, Aos meus pais, Maury e Cláudia, por serem fonte de amor incondicional, por se doarem por inteiros pela realização dos meus sonhos, por me preencherem de força e amparo por toda a vida e por serem exemplo de trabalho e persistência que sempre me inspiraram. Ás minhas avós, Luzia, exemplo de fortaleza e de fé que guia meus passos lá do céu. E Eneida, que doou a sua vida para completar a minha de amor e participou de cada passo da minha formação, transformando rabiscos em desenhos, contas em equação, resistindo e sendo companheira nas noites em claro do vestibular, das infinitas provas da faculdade e a maior comemoradora de cada conquista, foi ela quem me ensinou o valor e a importância do aprendizado. Ao Lúcio Júnior, meu irmão, pela parceria e amizade eternas, pelo carinho e pelo exemplo de doação e entrega a medicina. A toda minha família, em especial, Dinda, Tio Arthur, Cibele e Arthur Jr, por serem significado de união, e por fazerem da vida uma eterna comemoração. Agradecimentos A Deus, pois Deus não nos deu um espírito de timidez, mas de fortaleza, de amor e de sabedoria. (2 Timóteo 1,7) Agradecimento aos orientadores Ao Professor Matheus Bertanha, que exerceu um papel muito além de Orientador. Um dos maiores exemplos e admiração que tenho dentro da cirurgia vascular. Quem me ensinou sobre operar, sobre trabalho em grupo, quem foi amigo, compreensão, apoio e orientação dentro e fora da medicina. Quem esteve sempre de prontidão, para tirar uma dúvida, para acolher e ensinar. Com que aprendi imensamente sobre pesquisa, sobre resistência, sobre sonhos e que a dedicação é a maior arma para conquistá-los. Ao Professor Rodrigo Gibin, meu Co-Orientador, exemplo de um talento nato, que nunca se cansa de lapidar, exemplo de devoção a ciência. Obrigada por se mostrar sempre disposto a instruir e compartilhar o seu conhecimento e por sempre deixar as portas abertas para o aprendizado. Agradecimentos Á Lenize, por todo apoio, auxilio. Obrigada por se dedicar e empenhar tanto para que esse projeto fosse realizado. Tenho certeza que ganhei uma amiga e que vou me inspirar sempre na sua dedicação. Á Mariana, com quem dividi os passos dessa trajetória. Obrigada por mesmo à distância, sempre tornar o caminho mais leve. Ao Luiz Carlos Bardella, pela participação fundamental na realização dos testes biomecânicos. Obrigada pela sua prontidão, pelo auxilio e pelo bom humor sempre presente. Aos meus chefes da residência de cirurgia vascular, aos residentes e aos funcionários do laboratório vascular. Obrigada por toda convivência, aprendizado, pelo auxilio na coleta dos materiais e realização do trabalho. À Prof. Elenice, Prof. Rafael Pimenta, Dra. Helga e Dr. Diego Noé, pelas correções e considerações no projeto, que me guiaram durante sua concretização. Epígrafe “Não sei… Se a vida é curta Ou longa demais pra nós, Mas sei que nada do que vivemos Tem sentido, se não tocamos o coração das pessoas. Muitas vezes basta ser: Colo que acolhe, Braço que envolve, Palavra que conforta, Silêncio que respeita, Alegria que contagia, Lágrima que corre, Olhar que acaricia, Desejo que sacia, Amor que promove. E isso não é coisa de outro mundo, É o que dá sentido à vida. É o que faz com que ela Não seja nem curta, Nem longa demais, Mas que seja intensa, Verdadeira, pura… Enquanto durar. Cora Coralina” Rezende, K. N. Caracterização morfofuncional de veias safenas magnas descelularizadas como arcabouço para engenharia de tecidos. Botucatu, 2021. 49p. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Medicina de Botucatu, UNESP Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. RESUMO Introdução: O tratamento para a doença arterial obstrutiva periférica em situação de isquemia crítica geralmente requer um procedimento cirúrgico de revascularização, que pode ser realizado por técnicas endovasculares ou cirurgia convencional com bypass. Em cirurgias convencionais, o substituto vascular deve apresentar as mesmas características do vaso sanguíneo que se deseja substituir. No entanto, nem sempre isso é possível. A engenharia de tecidos em vasos sanguíneos surge como alternativa de fornecimento de vasos sanguíneos bioengenheirados, baseados em uma medicina personalizada. Objetivo: Realizar a descelularização de veias safenas magnas humanas (VSM), para produção de um scaffold tridimensional, para futuro uso em engenharia de tecidos em vasos sanguíneos. Comparar VSM em condição de suficiência e insuficiência, e congeladas ou não, para identificação dos melhores processos de descelularização, mantendo suas características biomecânicas. Metodologia: Foi realizada a caracterização morfofuncional de VSM descelularizadas por dois agentes descelularizantes, dodecil sulfato de sódio (SDS) e deoxicolato de sódio (DS), em duas concentrações (2% e 3%) mantidas por 1 e 2 horas em agitação contínua e analisadas pela identificação de células íntegras (contagem nuclear) em lâminas coradas em hematoxilina e eosina (HE). Foi analisado também a integridade da matriz extracelular (ME) através dos mesmos cortes histológicos. Os scaffolds foram avaliados comparativamente quanto as suas propriedades biomecânicas, estabelecendo-se os grupos: B1 - VSM insuficiente (in natura); B2 -VSM suficiente (in natura); B3 - VSM insuficiente (congelada); B4 - VSM suficiente (congelada); B5 - VSM insuficiente (SDS – 2% 2h); B6 - VSM suficiente (SDS – 2% 2h); B7 - VSM insuficiente (DS – 3% 2h); B8 - VSM suficiente (DS – 3% 2h), pela análise de limite de proporcionalidade (LP), coeficiente de rigidez (CR) e carga máxima (CM). Resultados: Foram utilizados VSM de 22 participantes para todas as análises. Os protocolos de descelularização de SDS 2% e DS 3% ambos com 2 horas de VSM suficientes e insuficientes se mostraram efetivos, sem diferença estatística entre eles, tanto para VSM suficientes como insuficientes (p>0,05). A ME se manteve integra em todos os protocolos de descelularização realizados. Para os testes biomecânicos, não se observou diferença estatística entre os grupos para LP (p>0,051). Quanto ao CR, observou-se que há diferença estatística entre os grupos (p=0,003), sendo observado que o grupo padrão B2 foi superior aos grupos, B6 (p=0,007) e B8(p=0,046); e B4 é superior a B6 (p=0,016). Para CM, houve diferença estatística significativa entre os grupos (p<0,040), sendo queo grupo B8 foi superior aos grupos B1 (p=0,0276), B5 (p=0,0092), B6 (p=0,0024) e B7 (p=0,0111); e o B2 foi superior ao grupo B6 (p=0,0339). Conclusão: A descelularização de veias safenas humanas pode ser realizada de forma simples e eficiente, mantendo relativa integridade da ME, utilizando SDS a 2% e DS 3%, ambos com 2h de exposição. Veias safenas magnas suficientes e insuficientes, congeladas ou não, demonstram-se semelhantes durante a realização dos testes biomecânicos, porém, após o processo de descelularização VSM suficientes tiveram aumento de fragilidade após a descelularização. O mesmo não aconteceu para as VSM insuficientes que se mantiveram estáveis após a descelularização. Novos estudos devem ser realizados para se estabelecer o possível uso desses arcabouços na engenharia de tecidos de vasos sanguíneos. Palavras chave: Veias; Vasos Sanguíneos; Engenharia de tecidos; Descelularização. Rezende, K. N. Morphofunctional characterization of decellularized great saphenous veins as a framework for tissue engineering. Botucatu, 2021. 49p. Dissertation (Master's Degree) - Botucatu School of Medicine, UNESP Paulista State University “Julio de Mesquita Filho”. ABSTRACT Background: Treatment for peripheral arterial disease in critically ischemic situations usually requires a surgical revascularization procedure, which can be performed using endovascular techniques or conventional bypass surgery. In conventional surgeries, the vascular substitute must present the same characteristics as the blood vessel to be replaced. However, this is not always possible. Tissue engineering in blood vessels emerges as an alternative to supplying bioengineered blood vessels, based on personalized medicine. Objective: To perform the decellularization of human great saphenous veins (GSV) to produce a three-dimensional scaffold for future use in tissue engineering in blood vessels. Compare GSV in sufficiency and insufficiency conditions, and frozen or not, to identify the best decellularization processes, maintaining its biomechanical characteristics. Methodology: The morphofunctional characterization of GSV decellularized by two decellularizing agents, sodium dodecyl sulfate (SDS) and sodium deoxycholate (DS) was performed at two concentrations (2% and 3%) maintained for 1 and 2 hours under continuous agitation and analyzed by identifying intact cells (nuclear count) on slides stained with hematoxylin and eosin (HE). The integrity of the extracellular matrix (ME) was also analyzed through the same histological sections. The scaffolds were comparatively evaluated for their biomechanical properties, establishing the groups: B1 - Insufficient GSV (in natura); B2 - Sufficient GSV (in natura); B3 - Insufficient GSV (in frozen); B4 - Sufficient GSV (in frozen); B5 - Insufficient GSV (SDS – 2% 2h); B6 - Sufficient GSV (SDS – 2% 2h); B7 - Insufficient GSV (DS – 3% 2h); B8 - Sufficient GSV (DS – 3% 2h), by proportionality limit (PL), stiffness coefficient (SC) and maximum load (ML) analysis. Results: GSV from 22 participants were used for all analyses. The decellularization protocols of SDS 2% and DS 3% both with 2 hours of sufficient and insufficient GSV proved to be effective, with no statistical difference between them, both for sufficient and insufficient GSV (p>0.05). The extracellular membrane remained integrated into all decellularization protocols performed. For the biomechanical tests, there was no statistical difference between the groups for PL (p>0.051). As for the SC, it was observed that there is a statistical difference between the groups (p=0.003), being observed that the standard group B2 was superior to the groups, B6 (p=0.007) and B8 (p=0.046); and B4 is greater than B6 (p=0.016). For ML, there was a statistically significant difference between groups (p<0.040), with group B8 being superior to groups B1 (p=0.0276), B5 (p=0.0092), B6 (p=0.0024), and B7 (p=0.0111); and B2 was superior to group B6 (p=0.0339). Conclusion: The decellularization of human saphenous veins can be performed simply and efficiently, maintaining relative integrity of the ME, using 2% SDS and 3% DS, both with 2h of exposure. Sufficient and insufficient great saphenous veins, frozen or not, are similar during the performance of biomechanical tests, however, after the decellularization process, sufficient VSM had an increase in fragility after decellularization. The same did not happen for the insufficient VSM that remained stable after decellularization. Further studies should be carried out to establish the possible use of these frameworks in blood vessel tissue engineering. Keywords: Veins; Blood vessels; Tissue engineering; Decellularization. LISTA DE FIGURAS Figura 1. Micrografias em HE de VSM submetidas aos protocolos de descelularização com SDS em diferentes concentrações e tempos de exposição –aumento em 100X. A, B, C e D: VSM Suficiente. E, F, G e H: VSM Insuficientes. _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 28 Figura 2. Micrografias em HE de VSM submetidas aos protocolos de descelularização com DS em diferentes concentrações e tempos de exposição – aumento em 100X. A, B, C e D: VSM Suficiente. E, F, G e H: VSM Insuficientes. _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 29 Figura 3. Gráfico representativo dos resultados (em média) referentes à análise por contagem de células íntegras (núcleos celulares). _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _30 Figura 4. Micrografias de VSM in natura(controles, com normalidade da ME para cada situação) coradas em HE, segmentos obtidos de VSM de participantes do estudo antes dos processamentos – aumento em 100X. A,B e C: VSM suficientes; D,E e F: VSMinsuficientes. 400x. _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 31 Figura 5. Painel demonstrativo dos testes biomecânicos; A:Controle suficiente; B:Veias suficientes congeladas; C:Controle insuficiente e D: Veias insuficientes congeladas._ _ _ _ 32 Figura 6. Painel dos gráficos box-plot dos testes biomecânicos. A: Limite de Proporcionalidade (N); B: Coeficiente de resistência (N/mm); C: Carga Máxima (N). Valores apresentados pela média e desvio padrão_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 34 Figura 7. Painel gráfico dos testes biomecânicos das VSM, comparativamente. _ _ _ _ _ _ 37 LISTA DE TABELAS Tabela 1. Grupos para estabelecimento do melhor protocolo de descelularização da VSM_23 Tabela 2. Grupos dos testes biomecânicos das veias safena magnas não descelularizadas_ _25 Tabela 3. Grupos para análise do teste biomecânico _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _26 Tabela 4. Resultados das análises do teste biomecânico. _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 33 Tabela 5. Testes biomecânicos das VSM comparativamente_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 35 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS °C Graus Celsius µg Microgramas µm Micrometro 3D Tridimensionais CM Carga máxima cm Centímetro Cong Congelada CR Coeficiente de rigidez CTM Células-tronco mesenquimais DAOP Doença arterial obstrutiva periférica DS Desoxicolato de sódio ET Engenharia de tecidos F Força FMB Faculdade de Medicina de Botucatu h Horas HC Hospital das Clínicas HE Hematoxilina e Eosina Hz Hertz IN In Natura KN KiloNewton L Litro LP Limite de proporcionalidade ME Matriz extracelular mg Miligramas mL Mililitro mm Milímetros mmHg Milímetros de mercúrio N Newton PBS Solução tampão fosfato-salino PLA Ácido polilático PLG Ácido poliglicólico PTFE Politetrafluoretileno SDS Dodecil sulfato de sódio TCLE Termo de consentimento livre e esclarecido TNBP Tri-n-butilfosfato UI Unidade internacional UNIPEX Unidade de Pesquisa Experimental USD Ultrassonografia com Doppler VSM Veia safena magna VSMi Veia safena magna insuficiente VSMs Veia safena magna suficiente https://www.google.com/search?sxsrf=ALeKk03NGylMgnPbi-9jKke97f8KJRwxIA:1620399224940&q=Newton&stick=H4sIAAAAAAAAAOPgE-LQz9U3MKpMNlICs7Ky08u15DLKrfST83NyUpNLMvPz9FMyc1PzioGsYqvSvMySRaxsfqnlJfl5O1gZAakNXHFCAAAA&sa=X&ved=2ahUKEwjRh8nB6bfwAhWxpZUCHcCyDj0QmxMoATAiegQINhAD Sumário RESUMO ........................................................................................................................................... 9 ABSTRACT ..................................................................................................................................... 10 LISTA DE FIGURAS ...................................................................................................................... 11 LISTA DE TABELAS ..................................................................................................................... 12 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ...................................................................................... 13 1. INTRODUÇÃO............................................................................................................................ 15 1.1 Doença arterial obstrutiva periférica ..................................................................................... 15 1.2 Engenharia de tecidos em vasos em vasos sanguíneos ......................................................... 16 1.3 Descelularização de tecidos .................................................................................................. 17 1.4 Aspectos clínicos .................................................................................................................. 18 2 JUSTIFICATIVA ......................................................................................................................... 19 3 OBJETIVOS ................................................................................................................................. 20 3.1 Objetivo geral ............................................................................................................................. 20 3.2 Objetivo Específicos................................................................................................................... 20 4 MÉTODOS................................................................................................................................... 21 4.1 Obtenção das veias safenas magnas............................................................................................ 21 4.2 Caracterização Histológica das VSM descelularizadas .............................................................. 22 4.3 Testes biomecânicos ................................................................................................................... 24 4.3.1 Protocolo de teste biomecânico ............................................................................................... 24 4.3.2 Primeiro teste biomecânico: VSM não descelularizadas ......................................................... 25 4.3.3 Segundo teste biomecânicos: VSM descelularizadas............................................................... 25 4.3.4 Avaliação compartaiva de todos os testes biomecâmicos ........................................................ 26 4.4 ANÁLISE ESTATÍSTICA ......................................................................................................... 26 5 RESULTADOS ............................................................................................................................ 27 5.1 Obtenção das VSM ..................................................................................................................... 27 5.2 Caracterização Histológica do Processo de Descelularização das VSM ..................................... 27 5.3 Avaliação da integridade da matriz extracelular ......................................................................... 31 5.4 Análise do primeiro teste biomecânico: VSM não descelularizadas ........................................... 32 5.5 Análise de todos os testes biomecânicos das VSM comparativamente ....................................... 34 6 DISCUSSÃO ................................................................................................................................ 38 7 CONCLUSÃO.............................................................................................................................. 41 8 REFERÊNCIAS ........................................................................................................................... 42 9 APÊNDICE .................................................................................................................................. 45 10 ANEXO 1. Aprovação ética ..................................................................................................... 46 15 1. INTRODUÇÃO 1.1 Doença arterial obstrutiva periférica As doenças cardiovasculares são as principais responsáveis pela mortalidade da população ocidental.1 A doença arterial obstrutiva periférica (DAOP) faz parte desse conjunto de doenças e está presente em 5.8% da população.1 A DAOP caracteriza-se pela obstrução aterosclerótica progressiva das artérias dos membros inferiores,2 levando a estreitamento da luz e redução do fluxo de sangue para os tecidos.3Em suas fases mais iniciais o paciente pode apresentar como sintoma a claudicação intermitente, que consiste em dor nos membros ao deambular. E nas fases mais avançadas, pode apresentar dor em repouso, gangrena e úlcera isquêmica, que consistem em quadros de isquemia crítica.3 No Brasil, um estudo transversal multicêntrico realizado em 72 centros participantes do Projeto Corações do Brasil avaliou a prevalência de DAOP em 1.170 pessoas de mais de 18 anos (média de 43,8 anos), pela medida do índice de pressão tornozelo­braço, considerando-a presente se esse índice fosse < 90 mmHg. A incidência encontrada da doença foi de 10,5%, e, destes pacientes, apenas 9% apresentavam o sintoma de claudicação intermitente.4 É bem estabelecido que, como forma de tratamento para a DAOP em situação de isquemia crítica, os pacientes podem ser submetidos a técnicas endovasculares e/ou cirurgia com bypass.5 Em cirurgias convencionais, em que se utilizam enxerto, o substituto vascular ideal seria um vaso sanguíneo com as mesmas características da artéria que se deseja substituir.6 Porém, se torna inviável a utilização de artérias autólogas para confecção de enxertos extensos em cirurgia vascular, pelo riso de isquemia de tecidos com a retirada desse tipo de vaso.3 Utiliza-se então, como possibilidade de um substituto vascular, a veia safena magna (VSM) 16 autóloga, prótese de Dacron ou poli-tetra-flúor-etileno (PTFE), sendo a primeira considerada como a de melhor resultado em termos de patência para a cirurgia vascular periférica.5 No entanto, há um conjunto de pacientes, que não são elegíveis a esses procedimentos, como exemplo: I. Não possuem veia autóloga adequada para um bypass; II. Uma prótese sintética, não pode ser usada por infecção local ou sistêmica; III. Desague arterial insuficiente; IV. Necessidade de shunts longos nas artérias infrapatelares, na ausência de uma veia autóloga adequada; ou V. Artéria de calibre muito pequeno para receber uma derivação distal com diâmetro incompatível.7 Séries relatam que pacientes em isquemia crítica podem chegar a uma taxa de amputação de 10% a 30% em 30 dias.5 Os casos, em que a única opção remanescente seria a amputação do membro afetado, podem se beneficiar da engenharia de tecidos (ET).5 1.2 Engenharia de tecidos em vasos em vasos sanguíneos A ET, com a intenção de produzir vasos sanguíneos, consiste da teoria de se produzir um substituto vascular, a partir de um arcabouço (scaffold) e células-tronco autólogas mesenquimais (CTM), estimuladas a diferenciarem-se nos tecidos que compõe naturalmente a parede do vaso.8 Dessa forma, a ET em vasos sanguíneos tem a finalidade de disponibilizar vasos personalizados, com características específicas de comprimento e espessura, necessários para revascularização individualizada, para uso em cirurgia arterial via bypass.9 Um dos maiores desafios durante o desenvolvimento da ET em vasos sanguíneos é produzir scaffolds tridimensionais (3D) biocompatíveis, que consistem em arcabouços tubulares, com um microambiente mimetizando a arquitetura natural do tecido in vivo10 e tenham características que favoreçam a adesão celular, a diferenciação celular, a permeabilidade de nutrientes através do tecido, a integração com o tecido receptor, resistência às forças mecânicas do fluxo sanguíneo, entre outros.11, 12 17 Os scaffolds podem ser biológicos, obtidos neste caso de vasos sanguíneos descelularizados, ou sintéticos, obtidos da manipulação de materiais absorvíveis como o ácido poliglicólico (PLG) e o ácido polilático (PLA).8 Dentre as vantagens dos scaffolds sintéticos, sabe-se que estes não induzem reações imunogênicas, por outro lado, não há comprovação científica da persistência do suporte mecânico ao longo do tempo.8 Já os scaffolds biológicos, têm como ponto positivo manter a estrutura conformacional e as substâncias da matriz extracelular (ME) própria do vaso sanguíneo natural, além da manutenção da bioatividade e arquitetura de tecido 3D natural, porém não existem estudos que comprovem a sua resistência mecânica, preservação da conformação estrutural, toxicidade celular induzida por resíduos dos agentes descelularizantes, entre outras características mal elucidadas.13, 14. Os scaffolds 3D desempenham funções importantes na ET, fornecendo suporte físico e estrutural para células e fornecendo pistas essenciais necessárias para a formação/regeneração de tecidos. Com os avanços na compreensão das interações célula-material e técnicas de fabricação de materiais, o design de scaffolds 3D evoluiu para gerar um ambiente funcional e interativo para instruir e coordenar atividades celulares e eventos biológicos em várias escalas de tempo e para promover o crescimento do tecido.15 1.3 Descelularização de tecidos A ET para produzir enxertos personalizados requer um enxerto de um doador seguido de descelularização e recelularização. A descelularização é uma tecnologia promissora para remover células de tecidos e órgãos.16 Pode ser realizada por métodos físicos, químicos e enzimáticos específicos ou por combinação dos mesmos.17 No uso ideal desses métodos, os tecidos descelularizados podem ter proteínas estruturais e funcionais semelhantes a uma ME de tecidos nativos. Esses órgãos possuem a capacidade intrínseca de aumentar a fixação, migração, proliferação e diferenciação das CTM. 16 18 1.4 Aspectos clínicos A ET vem sendo estudada por vários grupos, seguindo diferentes estratégias de descelularização e recelularização. A utilização de VSM nesse processo mostra-se como um campo promissor de estudos em decorrência da possibilidade de obtenção destas veias durante cirurgias de safenectomia, realizadas quando o paciente apresenta veia safena magna insuficiente (VSMi), ou seja, não exercem sua função de retorno venoso de forma adequada, com refluxo maior que meio segundo e dilatação, em geral maior que 0,6 cm de diâmetro. Essas veias geralmente são descartadas após sua retirada cirúrgica, surgindo assim a possibilidade de sua utilização em engenharia de tecidos.18 Diante do exposto, esse estudo tem por finalidade analisar morfologicamente e funcionalmente VSM de humanos, suficientes e insuficientes, descelularizadas através do uso agentes descelularizantes, com o propósito de se obter um scaffold útil e funcional para uso em ET. 19 2 JUSTIFICATIVA O transplante autólogo venoso é umas das principais formas de tratamento para a DAOP; no entanto, nem sempre é possível e a alternativa de tratamento é o uso de materiais sintéticos cuja patência é menor. A ET surge como uma proposta inovadora e promissora como alternativa de fornecimento de tecidos e órgãos personalizados, visando produzir enxertos biocompatíveis para substituir órgãos ou tecidos danificados ou não-funcionais. Esta linha de pesquisa busca produzir scaffolds a partir de VSM. Para isso, estratégias de avaliação estrutural foram realizadas para comprovação de que possam ser utilizados na engenharia de tecidos. A perspectiva será, no futuro, proporcionar a possibilidade de produção de vasos sanguíneos personalizados para casos selecionados onde hoje se encontra uma limitação de tratamento em associação com altas taxas de amputação de membros. 20 3 OBJETIVOS 3.1 Objetivo geral Realizar a caracterização morfofuncional de VSM de humanos descelularizadas, através do uso agentes descelularizantes. 3.2 Objetivo Específicos Avaliar histologicamente, estruturalmente e as propriedades biomecânicas de scaffolds resultantes da descelularização de VSM suficiente (VSMs) e VMSi em comparação com os grupos controle (VSMs e VSMi não descelularizadas). Analisar se o processo de congelamento das veias é capaz de alterar sua rigidez e resistência. 21 4 MÉTODOS O estudo foi desenvolvido na Unidade de Pesquisa Experimental (UNIPEX). Os materiais coletados no Centro Cirúrgico do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu (HC-FMB). A captação e assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE) dos pacientes foi realizada no Laboratório Vascular do HC-FMB. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa, com o número de parecer: 3.722.877 e CAAE: 20285818.3.0000.5411. Os dados e amostras foram coletados mediante assinatura do TCLE (Apêndice 1) pelo participante. 4.1 Obtenção das veias safenas magnas As VSMs foram obtidas de participantes submetidos a cirurgia de ponte/bypass em coronárias pela cirurgia cardíaca ou em membros inferiores para tratamento de DAOP pela equipe de cirurgia vascular. Os fragmentos coletados consistiam em veias residuais, ou seja, que foram coletadas e não utilizadas na confecção das pontes/by-pass e seriam destinadas ao descarte cirúrgico. Essas veias foram consideradas normais por exame de ultrassonografia com Doppler (USD), realizados rotineiramente antes da cirurgia, comprovado ausência de refluxo patológico e diâmetro inferior a 0,6 cm. As VSMi foram obtidas de participantes submetidos a cirurgias de safenectomia para o tratamento de insuficiência venosa crônica e que seriam desprezadas. Essas veias foram consideradas insuficientes por USD, realizado previamente a cirurgia, que constatou presença de refluxo em VSM maior que meio segundo, e diâmetro maior que 0,6 cm e menor que 1 cm de diâmetro. As VSM obtidas foram transportadas para a UNIPEX. Em ambiente estéril, em câmara de fluxo laminar (Clase IIA, Trox, São Paulo, SP, Brasil), as VSM foram lavadas três vezes com solução tampão fosfato-salino (PBS) (Phosphate buffered saline, Thermo Fisher 22 Scientifica™ Gibco, Grand Island, NY, EUA) e heparina não fracionada 1000UI/100ml (Hepamax® – Blau Farmacêutica, Cotia, SP, Brasil) para retirada do máximo de sangue residual e acondicionadas em tubo cônico de plástico de 50mL contendo solução fisiológica a 0,9% (SF, Eurofarma, São Paulo, SP, Brasil) acrescido de antibiótico (ciprofloxacino 10%, 32 µg/mL Bayer, São Paulo, SP, Brasil) e antifúngico (anfotericina B, 50µg/mL , Geolab, Anápolis, GO, Brasil) para evitar a proliferação de bactérias e fungos, e mantidos em geladeira, à 4 ºC para os processamentos a fresco e mantidas em frascos a seco e em freezer a -80 ºC para os experimentos de veias congeladas, até a realização dos mesmos. 4.2 Caracterização Histológica das VSM descelularizadas As VSM foram seccionadas em fragmentos de cinco milímetros (5mm) de comprimento para a realização dos procedimentos de descelularização e posterior análise histológica. Um estudo prévio experimental em coelhos19, realizado por esse mesmo grupo, direcionou a escolha dos agentes descelularizantes, adaptando-se ás condições da ME das VSM, ou seja, foram escolhidos os protocolos com maiores concentrações de descelularizante devido a maior espessura da ME das VSM. Desta forma, utilizou-se os agentes descelularizantes dodecil sulfato de sódio (SDS) e deoxicolato de sódio (DS), diluídos em solução de PBS, variando-se as concentrações entre 2% e 3%, além de dois tempos de exposição diferentes, uma e duas horas de exposição. Foram utilizados 24 fragmentos de VSMs e 24 fragmentos de VSMi e realizados os mesmos protocolos de descelularização em veias suficientes e insuficientes com o objetivo de observar se a presença de insuficiência venosa interferiria no processo de descelularização. Os fragmentos desta etapa foram obtidos de três doares de VMSs e três doadores de VSMi. Sendo assim, cada grupo de descelularização continha três amostras, de doadores diferentes, formando os seguintes grupos de descelularização (Tabela 1). 23 Tabela 1. Grupos para estabelecimento do melhor protocolo de descelularização da VSM Grupo Tipo de Veia Safena Magna (VSM) Detergente Concentração do detergente % Tempo de ação (hs) Número de repetições Tamanho fragmento (cm) G1 VSMs SDS 2% 1 3 0.5 G2 VSMs SDS 3% 1 3 0.5 G3 VSMs SDS 2% 2 3 0.5 G4 VSMs SDS 3% 2 3 0.5 G5 VSMi SDS 2% 1 3 0.5 G6 VSMi SDS 3% 1 3 0.5 G7 VSMi SDS 2% 2 3 0.5 G8 VSMi SDS 3% 2 3 0.5 G9 VSMs DS 2% 1 3 0.5 G10 VSMs DS 3% 1 3 0.5 G11 VSMs DS 2% 2 3 0.5 G12 VSMs DS 3% 2 3 0.5 G13 VSMi DS 2% 1 3 0.5 G14 VSMi DS 3% 1 3 0.5 G15 VSMi DS 2% 2 3 0.5 G16 VSMi DS 3% 2 3 0.5 SDS= dodecil sulfato de sódio; DS=desoxicolato de sódio. Para cada um dos doadores foram testados 3 fragmentos de 0,5 cm em todas as experimentações. VSMs= Veia Safena Magna suficiente; VSMi= Veia Safena Magna insuficiente; As veias previamente acondicionadas entre dois a 8ºC foram, então, preparadas para a descelularização, da mesma maneira, em câmara de fluxo laminar (Clase IIA, Trox, São Paulo, SP, Brasil), em ambiente estéril. A descelularização foi realizada por incubação em um shaker (News Brunswick Scientific™, Nijmegen, Holanda) a 2,67 Hz, em temperatura de 37 °C. Após completar o processo de descelularização, cada segmento de veia foi lavado por três vezes com soro fisiologico 0,9% (SF, Eurofarma, São Paulo, SP, Brasil) por 10 minutos. A avalição dos resultados do processo de descelularização foi feita por meio de análise histológica dos scaffolds em hematoxilina e eosina (HE). Resumidamente, os scaffolds foram fixados em formalina a 10% durante 48h. Após lavar cada fragmento por cinco vezes com PBS, os materiais foram desidratados em soluções crescentes em concentração de etanol e finalmente embebidos em parafina para confecção de blocos. Foram obtidos secções de cinco µm em um micrótomo e colocados em lâminas de microscopia montadas em Permout® para avaliação em microscópio óptico. 24 A contagem de células não removidas pelo processo de descelularização foi feita pela análise de 10 campos microscópicos aleatórios por lâmina, aplicando-se ampliação de 400X e foram analisadas três lâminas para cada protocolo de concentração e tempo (n=3), por dois avaliadores independentes. Os resultados foram avaliados quanto ao número de células íntegras (núcleos celulares), sendo considerados efetivos na descelularização quando apresentassem quantidades insignificantes de células íntegras. Para os mesmos 10 campos aleatórios, a ME foi avaliada quanto à sua integridade, realizada da mesma forma por dois avaliadores independentes, classificando-a como: ótimo - na ausência de áreas de ruptura da ME; insatisfatório - quando uma ou mais áreas de ruptura da ME foi considerado como resultado insatisfatório. 4.3 Testes biomecânicos 4.3.1 Protocolo de teste biomecânico Para o teste biomecânico, cada fragmento foi tracionado longitudinalmente até o ponto de ruptura. O protocolo de análise foi realizado em um aparelho EMIC®, modelo DL 10.000 (Equipamentos e Sistemas de Testes ™, Ltda., Curitiba, PR, Brasil), que oferece uma precisão de cerca de 0,018 + F / 3700 quilo Newton (KN) e opera em conjunto com um microcomputador usando o software Mtest® 1.00. O programa fornece ao final do ensaio valores das propriedades mecânicas escolhidas pelo usuário, além do diagrama de carga versus deformação. Esses diagramas possibilitaram a obtenção dos seguintes parâmetros: Limite de proporcionalidade - (LP) dado em Newtons (N), valor máximo de carga em que o material guarda a capacidade de retornar ao seu comprimento original quando interrompido o carregamento; graficamente, corresponde ao valor máximo de tensão de uma função linear na curva carga-deformação, ainda obedecendo à Lei de Hooke, calculado pelo método de Johnson; Coeficiente de rigidez (N/mm), divisão da força (N) pela deformação (mm) correspondentes ao limite elástico; por se tratar de uma relação numérica linear e constante, representa a capacidade de deformação do material 25 conforme a carga aplicada; Carga máxima – força de rotura (N), maior carga suportada pelo material até a ruptura, ou seja, o limite máximo de resistência, ou seja, após a ruptura inicial, é o limite para a dilaceração/secção completa do material.20 4.3.2 Primeiro teste biomecânico: VSM não descelularizadas Para a pré-análise biomecânica, as amostras de VSMi obtidas foram fragmentadas em segmentos de dois cm de comprimento para que se conseguisse um pool de 20 fragmentos, sendo 10 testados in natura mantidos em geladeira a 4ºC (com antibiótico e antifúngico – descrito previamente) e 10 submetidos ao processo de congelamento -80ºC por 4 semanas e descongelamento imediatamente antes do teste. Igualmente, as amostras de VSMs obtidas foram fragmentadas em segmentos de 2 cm de comprimento para que se conseguisse um pool de 20 fragmentos, sendo 10 testados in natura mantidos em geladeira a 4ºC (com antibiótico e antifúngico – descrito previamente) e 10 submetidos ao processo de congelamento -80ºC por 4 semanas e descongelamento imediatamente antes do teste. Assim, obtiveram-se os quatros grupos apresentados na Tabela 2. Este experimento teve como objetivo avaliar as características biomecânicas das VSM suficientes e insuficientes e a comparação da influência do processo de congelamento sobre a sua integridade e resistência. Tabela 2.Grupos dos testes biomecânicos das veias safena magnas não descelularizadas Grupo Diâmetro Comprimento n B1 Controle VSM insuficiente (in natura) > 0,6 cm 2 cm 10 B2 Controle VSM suficiente (in natura) 0,3 - 0,6 cm 2 cm 10 B3 Controle VSM insuficiente (congelada) > 0,6 cm 2 cm 10 B4 Controle VSM suficiente (congelada) 0,3 - 0,6 cm 2 cm 10 VSM = veia safena magna; n = número de fragmentos de VSM por grupo 4.3.3 Segundo teste biomecânicos: VSM descelularizadas Após as análises de caracterização histológica das VSM descelularizadas elencou-se os melhores protocolos de descelularização da VSM, para cada agente descelularizante (DS e 26 SDS). Cada fragmento descelularizado foi submetido ao teste biomêmico, como descrito anteriormente. O tempo de espera entre a descelularização e a análise biomecânica não ultrapassou o prazo de 24 horas em conservação em geladeira a 4°C. 4.3.4 Avaliação compartaiva de todos os testes biomecâmicos Para análise dos resultados, foi realizada uma avaliação comparativa entre todos os grupos do teste biomecânico e, por fim, a compilação com todos os dados a fresco e congelados, para que se pudesse comparar eventual influência de todos os processamentos conforme melhor apresentado na Tabela 3 (todos os grupos submetidos ao teste biomecânico): Tabela 3. Grupos para análise do teste biomecânico Grupo Diâmetro Comprimento n B1 Controle VSM insuficiente (in natura) > 0,6 cm 2 cm 10 B2 Controle VSM suficiente (in natura) 0,3 - 0,6 cm 2 cm 10 B3 Controle VSM insuficiente ( congelada) > 0,6 cm 2 cm 10 B4 Controle VSM suficiente (congelada) 0,3 - 0,6 cm 2 cm 10 B5 VSM insuficiente descelularizada – SDS “melhor protocolo” > 0,6 cm 2 cm 10 B6 VSM suficiente descelularizada – SDS “melhor protocolo” 0,3 - 0,6 cm 2 cm 10 B7 VSM insuficiente descelularizada – DS “melhor protocolo” > 0,6 cm 2 cm 10 B8 VSM suficiente descelularizada – DS “melhor protocolo” 0,3 - 0,6 cm 2 cm 10 VSM = veia safena magna; n = número de fragmentos de VSM por grupo 4.4 ANÁLISE ESTATÍSTICA As análises estatísticas dos resultados de caracterização histológica e validação da descelularização foram feitas a partir da determinação de normalidade pelo teste de Shapiro- Wilk, seguido pelos testes de Análise de Variância (ANOVA) para os resultados paramétricos ou Kruskal-Wallis e pelo teste de Mann-Whitney para os resultados não paramétricos. Os testes biomecânicos foram analisados estatisticamente a partir da determinação de normalidade pelo teste de Kolmogorov-Smirnov, seguido de confirmação pela análise de variâncias semelhantes pelo teste de Levaine, o que permitiu trabalhar todos os testes por ANOVA, exceto para o coeficiente de resistência que foi analisado por Kruskal-Wallis. Em 27 todos os testes foi fixado o nível de significância de 5%.Foi utilizado o software SPSS Versão 17, ©1993-2007. 5 RESULTADOS 5.1 Obtenção das VSM Um total de 22 participantes foram incluídos neste estudo. Quatro doadores tiveram seus materiais descartados em decorrência de segmentos muito pequenos, não aplicáveis aos testes. Nove participantes, doaram segmentos de VSMs e nove participantes doaram VSMi. 5.2 Caracterização Histológica do Processo de Descelularização das VSM A partir de 6 doadores, sendo 3 doadores de VSMs totalizando 24 fragmentos, e 3 doadores de VSMi totalizando 24 fragmentos, foram realizados os processos de descelularização celular. Estes foram divididos em 16 grupos para análise, conforme descrito previamente na Tabela 1. Dessa forma, as observações foram realizadas por agente descelularizante com suas concentrações entre VSM suficientes e insuficientes, para se observar a consistência do método escolhido nas condições de suficiência ou insuficiência da veia por agente descelularizante. Exemplos de micrografias das VSM descelularizadas com SDS e DS são vistos, respectivamente, nas Figura 1 e 2. 28 Figura 1. Micrografias em HE de VSM submetidas aos protocolos de descelularização com SDS em diferentes concentrações e tempos de exposição –aumento em 100X. A, B, C e D: VSM Suficiente. E, F, G e H: VSM Insuficientes. Autor: Rezende, K.N.2021. 29 Figura 2. Micrografias em HE de VSM submetidas aos protocolos de descelularização com DS em diferentes concentrações e tempos de exposição – aumento em 100X. A, B, C e D: VSM Suficiente. E, F, G e H: VSM Insuficientes. Autor: Rezende, K.N.2021 30 Na Figura 3, observamos o gráfico representativo dos resultados referentes à análise por contagem de células íntegras (núcleos celulares). Obeteve-se total ausência de células íntegras apenas no grupo G3 (VSM suficiente SDS 2% 2h), considerado, então, o grupo padrão ouro, entretanto, observou-se que não houve diferença estatistica da contagem de células viáveis desse grupo com os grupos G4 (VSM suficiente SDS 3% 2h), G7 (VSM insuficiente SDS 2% 2h), G8 (VSM insuficiente SDS 3% 2h), G12 (VSM suficiente SDS 3% 2h), G15 (VSM insuficiente SDS 2% 2h), G16 (VSM insuficiente SDS 3% 2h), que apresentam quantidades insignificantes de células viáveis. Os demais grupos apresentaram viabilidade celular significativas. Dessa forma, para esta análise, considerando-se que o agente descelularizante deveria apresentar eficiência na descelularização tanto para VSMs e VSMi, escolhemos como melhores protocolos: Para SDS, o SDS 2%, 2h (menor quantidade de agente descelularizante para manter a mesma efetividade tanto para VSMs quanto para VSMi) e para DS, o DS 3%, 2h (único que teve alta efetividade nas duas condições da VSM). Figura 3. Gráfico representativo dos resultados (em média) referentes à análise por contagem de células íntegras (núcleos celulares). Autor: Rezende, K.N.2021 Contagem de células íntegras para cada grupo de descelularização 31 5.3 Avaliação da integridade da matriz extracelular Foi realizada a avaliação da integridade da ME nas mesmas lâminas coradas em HE utilizadas para contagem celular, avaliando-se simultaneamente os mesmos 10 campos em 400 aumentos. Como dito previamente, o resultado ótimo foi considerando quando havia ausência de áreas de ruptura da ME e resultado insatisfatório quando havia apresença de uma ou mais áreas de ruptura da ME. Para melhorar a acurácia da avaliação, VSM in natura a fresco foram processadas para obtenção de lâminas em HE que serviram de base para as análises da integridade das VSM descelularizadas (Figura 4). Figura 4.Micrografias de VSM in natura(controles, com normalidade da MEC para cada situação) coradas em HE, segmentos obtidos de VSM de participantes do estudo antes dos processamentos – aumento em 100X. A,B e C: VSM suficientes; D,E e F: VSMinsuficientes. 400x. Autor: Rezende, K.N.2021 Na análise por campos, observamos que a descelularização não causou áreas de ruptura da ME, sendo o score igual a ótimo para todos os grupos e sem diferença estatística entre eles (p = 1,0). É possível observar essa integridade também nos exemplos das Figuras 1 e 2, previamente apresentadas. 32 5.4 Análise do primeiro teste biomecânico: VSM não descelularizadas Nesta etapa, estabeleceu-se novos grupos de interesse, chamados de B1 (VSM insuficiente in natura), B2 (VSM suficiente in natura), B3 (VSM insuficiente congelada) e B4(VSM suficiente congelada). Foram submetidas ao processo de avaliação biomecânica quanto ao limite de proporcionalidade (LP), coeficiente de rigidez (CR) e carga máxima (CM). A Figura 5 apresenta um exemplo dos gráficos obtidos e os dados gerados durante os testes biomecânicos. Figura 5:Painel demonstrativo dos testes biomecânicos; A:Controle suficiente; B:Veias suficientes congeladas; C:Controle insuficiente e D: Veias insuficientes congeladas. Autor:REZENDE, K.N. 2021 A Tabela 4 apresenta os resultados numéricos dos testes biomecânicos realizados na pré-análise, incluindo (LP, CR e CM). 33 Tabela 4. Resultados das análises do teste biomecânico Limite de Proporcionalidade VSMi Cong. VSMs Cong. VSMi IN VSMs IN 40 32.9 21.2 33.6 40 37.1 22.54 20.16 40 38.69 40.6 34.3 36.8 33.58 18 41.6 38.69 16.8 47.7 59.52 14.52 39.9 27.56 50.4 39.2 43 22.26 47.2 15.18 43.4 37.8 30.1 44.1 58.52 42.4 54 23.92 81.76 34.98 30.6 40 40.28 Coeficiente de Resistência VSMi Cong. VSMs Cong. VSMi IN VSMs IN 8131 7018.72 4176.74 4698.72 4841.06 7004.06 5637.06 6259.7 4841.06 5538.72 7391.08 5189.1 5535.08 6518.74 4669.44 8846.02 5568.74 3119.38 7320.44 5632.68 2124.06 6065.08 5548.06 7275.7 5946.06 6749.05 6791.76 5057.68 3196.72 4444.06 5460.06 8711.1 8754.38 7296 4101.46 5253.04 6598.72 11450.12 3793.14 6767.7 5787.42 6123.06 Carga Máxima VSMi Cong. VSMs Cong. VSMi IN VSMs IN 45.55 43.29 25.3 34.24 43.28 42.75 28.62 21.23 43.28 44.13 41.67 36.09 43.42 41.56 18.06 47.41 42.85 18.36 54.26 62.75 14.67 40.25 31.92 51.41 40.28 52.85 28.5 47.97 16.41 42.93 38.18 41.35 44.49 71.99 44.28 55.24 27.02 88.32 35.94 38.54 42 46.67 VSMs: veia safena magna suficiente; VSMi: veia safena magna insuficiente; Cong.: congeladas; IN: in natura A Figura 6 apresenta os gráficos dos três testes realizados. Resumidamente, quanto ao LP, não se observou diferença estatística significativa entre os grupos avaliados (p= 0,537), o que sugere que, a insuficiência das veias e o processo de congelamento não influenciaram em sua elasticidade. Quanto ao CR, também não se observou diferença estatisticamente significativa entre os grupos (p= 0,250), o que também permite inferir que as variáveis 34 analisadas não interferiram com a rigidez da estrutura. Finalmente, quanto a CM, o mesmo padrão foi observado, não apresentando diferença estatística significativa entre os grupos (p= 0,552), o que permite concluir que não houve diferença entre as variáveis quanto a maior carga suportada por qualquer uma das VSM antes de se romper, isto é, mantiveram a resistência frente à tração que foi aplicada pelo teste biomecânico. Figura 6. Painel dos gráficos box-plot dos testes biomecânicos. A: Limite de Proporcionalidade (N); B: Coeficiente de resistência (N/mm); C: Carga Máxima (N). Valores apresentados pela média e desvio padrão. Autor: REZENDE, K.N 2021. Estatisticamente, foram testadas as variâncias homogêneas dos diferentes testes pelo teste de Levene que pode confirmar que não houve diferenças para nenhum dos testes biomecânicos aplicados (p>0,05). 5.5 Análise de todos os testes biomecânicos das VSM comparativamente Através dos melhores protocolos, levando-se em conta a capacidade de remoção celular, manutenção da estrutura da ME e manutenção de características biomecânicas frente ao processo de congelamento ou não congelamento (não houve diferença entre os procesos), elencou-se os protocolos de descelularização: SDS 2%, 2h e DS 3%, 2h. A Tabela 5 apresenta os resultados dos testes biomecânicos dos 8 grupos estudados. Limite de proporcionalidade Coeficiente de resistência Carga máxima 35 Tabela 5: Testes biomecânicos das VSM, comparativamente Limite de Proporcionalidade Cong. Insuf. Cong. Suf. IN Insuf. IN Suf. SDS Insuf. SDS Suf. DS Insuf. DS Suf. 40 32.9 21.2 33.6 39.6 36.98 32.2 66.99 40 37.1 22.54 20.16 15.08 19 21.5 39.2 40 38.69 40.6 34.3 25.9 38 30.01 35.1 36.8 33.58 18 41.6 28.7 34 35.2 47.6 38.69 16.8 47.7 59.52 64.4 23 18.4 51.7 14.52 39.9 27.56 50.4 27.6 46.24 61.6 47.3 39.2 43 22.26 47.2 26.4 20.6 64.5 59.8 15.18 43.4 37.8 30.1 33.6 25.9 23 48.72 44.1 58.52 42.4 54 33.6 27.14 76.5 39.76 23.92 81.76 34.98 30.6 50.6 31 13.8 55.89 Coeficiente de Resistência Cong. Insuf. Cong. Suf. IN Insuf. IN Suf. SDS Insuf. SDS Suf. DS Insuf. DS Suf. 8131 7018.72 4176.74 4698.72 6098 4662 3027 4618 4841.06 7004.06 5637.06 6259.7 8617 3646 3756 2762 4841.06 5538.72 7391.08 5189.1 3602 3491 3403 2961 5535.08 6518.74 4669.44 8846.02 5192 2961 5060 3602 5568.74 3119.38 7320.44 5632.68 6054 6276 3800 4618 2124.06 6065.08 5548.06 7275.7 2850 4530 9324 4043 5946.06 6749.05 6791.76 5057.68 3845 3093 7623 3845 3196.72 4444.06 5460.06 8711.1 3248 2563 2828 5016 8754.38 7296 4101.46 5253.04 4817 2364 6143 5612 6598.72 11450.12 3793.14 6767.7 4949 2894 3226 4309 Carga Máxima Cong. Insuf. Cong. Suf. IN Insuf. IN Suf. SDS Insuf. SDS Suf. DS Insuf. DS Suf. 45.55 43.29 25.3 34.24 41.65 41.74 34.26 69.01 43.28 42.75 28.62 21.23 25.08 19.87 22.44 41.9 43.28 44.13 41.67 36.09 29.64 44.18 31.04 37.8 43.42 41.56 18.06 47.41 30.01 36.7 36.74 52.93 42.85 18.36 54.26 62.75 65.52 24.7 19.32 54.27 14.67 40.25 31.92 51.41 29.05 49.49 66.16 52.17 40.28 52.85 28.5 47.97 29.26 25.71 71.54 62.99 16.41 42.93 38.18 41.35 34.27 26.81 23.96 51.78 44.49 71.99 44.28 55.24 36.2 29.26 79.44 41.3 27.02 88.32 35.94 38.54 51.13 35.13 14.16 57.44 Cong. Insuf.: Congeladas Insuficientes; Cong. Suf.: Congeladas Suficientes; IN Insuf.: In Natura Insuficientes; IN Suf.: In Natura Suficientes; SDS Insuf.: SDS 2%-2h Insuficientes; SDS Suf.: SDS 2%-2h Suficientes; DS Insuf.: DS 3%-2h Insuficientes; DS Suf.: DS 3%-2h Suficientes. A Figura 7 apresenta os gráficos box-plot dos testes biomecânicos realizados. Para o LP não se observou diferença estatística significativa entre os grupos avaliados (p>0,051), o que sugere que, a insuficiência das veias, o processo de congelamento e a descelularização com ambos detergentes não influenciaram em sua elasticidade, ou seja, todos preservaram a capacidade de retornar ao seu comprimento original quando interrompido o carregamento (Lei de Hooke). 36 Quanto ao CR, observou-se que há diferença estatística entre os grupos (p=0,003), sendo observado que o grupo padrão B2 VSMs a fresco foi superior aos grupos, B6 VSMs descelularizada com SDS a 2% 2h (p=0,007) e B8 VSMs descelularizada com DS a 3% 2h (p=0,046); e B4 VSMs congelada foi superior a B6 VSMs SDS a 2% 2h (p=0,016). O CR representa a capacidade de deformação do material conforme a carga aplicada, desta forma, para os grupos de VSMs, observou-se que houve prejuízo relacionado aos processos de descelularização. Quanto as demais comparações, não houve diferença estatística significativa. Finalmente, quanto a CM, houve diferença estatística significativa entre os grupos (p<0,040), sendo que o grupo B8 VSMs descelularizadas com DS a 3% 2h foi superior aos grupos B1VSMi a fresco (p=0,0276), B5 VSMi descelularizado com SDS a 2% 2h (p=0,0092), B6 VSMs descelularizado com SDS a 2% 2h (p=0,0024) e B7 VSMi descelularizado com DS a 3% 2h (p=0,0111); E o B2 VSMs a fresco foi superior ao grupo B6 VSMs descelularizado com SDS a 2% 2h (p=0,0339). A CM é a maior carga suportada pelo material até a ruptura. Portanto, o grupo B8 VSM suficiente descelularizado com DS a 3% 2h apresentou a maior diferença entre os grupos. 37 Figura 7. Painel gráfico dos testes biomecânicos das VSM, comparativamente. B1: Controle VSM insuficiente (in natura); B2: Controle VSM suficiente (in natura); B3: Controle VSM insuficiente (in natura congelada); B4: Controle VSM suficiente (in natura congelada); B5: Controle VSM insuficiente (SDS – 2% 2h); B6: Controle VSM suficiente (SDS – 2% 2h); B7: Controle VSM insuficiente (DS – 3% 2h); B8: Controle VSM suficiente (DS – 3% 2h). Em A: Limite de Proporcionalidade (N), com ANOVA - p>0.05; B: Coeficiente de resistência (N/mm) com ANOVA - p<0.05; C: Carga Máxima (N) com Kruskal – Wallis - p<0.05. Valores apresentados pela mínimo e máximo e desvio padrão. Valores apresentados pelo desvio padrão, mínimo e máximo, 1º a 3º quartil. Autor: REZENDE, K.N 2021. Limite de proporcionalidade Coeficiente de resistência Carga Máxima 38 6 DISCUSSÃO O uso de suportes biológicos derivados de tecido e órgãos descelularizados vêm sendo demonstrados em estudos pré-clínicos com animais e, em alguns casos, tem apresentado aplicação clínica definida.9 A utilização desses scaffolds apresentam algumas vantagens biológicas,21porém, é necessário que se faça um preparo rigoroso que garanta uma adequada eliminação dos componentes celulares para se evitar uma possível reação imunológica no momento de aplicação no receptor do novo tecido e se mantenha preservada a arquitetura natural do tecido.19,22,23Como solução para a oferta de substituto vasculares em casos onde não há uma veia ou artéria autóloga adequada para uso, impossibilidade de uso de próteses sintéticas e não há solução endovascular possível, a engenharia de tecidos em vasos sanguíneos está em busca do melhor scaffold com origem biológica ou sintética para suprir as necessidades cirúrgicas.24 O uso de veias alogênicas criopreservadas, veias alogênicas transplantadas ou veias processadas podem induzir respostas imunológicas, falha do enxerto e baixa durabilidade, o que justifica o esforço da engenharia de tecidos em busca da remoção completa de biomoléculas estranhas imunogênicas, mas isso ainda permanece como um desafio a ser superado.23 No presente estudo, identificamos que o processo de descelularização de VSM suficiente e insuficiente, congeladas ou não, com SDS 2% e o DS 3%, ambos em 2 horas, removeram suficientemente as células da parede dos vasos, permitindo a manutenção da integridade da ME, sendo considerados protocolos ótimos de descelularização. A integridade da ME é essencial, pois seus componentes como colágeno, elastina, fibronectina, vitronectina e laminina, são responsáveis pela adesão, proliferação e diferenciação celular e, portando, pela manutenção da estrutura do vaso, além da manutenção estrutural necessária para o processo de implante celular e resistência às tensões mecânicas quando in vivo.25 Neste estudo, uma 39 avaliação preliminar da ME, apenas em HE, mostrou sinais que esta encontra-se preservada. Mas, avaliações histológicas deverão ser realizadas para a complementação desta afirmação. Segundo Dimitrievska & Niklason,26 em um estudo publicado em 2017, os principais critérios para projetar um enxerto de longa duração incluem propriedades mecânicas de alta complacência/tração, baixa trombogenicidade e remodelação regenerativa que acabam por levar a uma integração bem-sucedida, justificando os testes propostos na pesquisa. Em estudos experimentais prévios demonstraram que as veias cavas de coelhos podem ser descelularizadas, mantendo boa estruturação da matriz, sendo apta para servir de scaffold para receber as CTM, inclusive com diferenciação em endotélio.19,21 Determinou-se, também, que o processo de descelularização da veia não acarreta toxicidade residual significativa em teste de cultura com CTM ou perda das características essenciais da ME.19 O presente estudo teve por objetivo avaliar, também, a resistência mecânica das VSM após o congelamento e ao processo de descelularização, sendo os resultados parcialmente semelhantes aos encontrados no estudo experimental com veias cavas inferiores de coelho.19 As características mecânica das estruturas vasculares depende dos componentes da túnica média – colágeno, elastina, proteoglicanos e camada muscular – e todos podem afetar a resistência à tração22, de modo que a capacidade elástica destes tecidos é relacionada diretamente com seu comportamento biomecânico.19 Testes de resistência à tração refletem a rigidez e a elasticidade do conduto vascular, ou seja, analisam a capacidade do colágeno e da elastina em permitir que essa sofra distensão, parte fundamental de sua função22. Carga máxima, limite de proporcionalidade e coeficiente de rigidez foram os parâmetros escolhidos para estimar estas propriedades biomecânicas. Foram observadas diferenças nas resistências quando se processa a descelularização da VSM insuficiente em comparação a VSM suficiente, possivelmente justificado pelo remodelamento de características estruturais da insuficiente durante a agressão inflamatória crônica decorrente de processos degenerativos que culminam 40 em dilatação e tortuosidade, decorrentes da incompetência valvar.18 Possivelmente, alterações de componentes da ME ou processo fibrótico relacionados a VSM insuficiente possam aumentar a resistência desse tecido quando descelularizados, como observado pelo CR. Quanto a CM, este parâmetro deve ser o menos relevante na avaliação de um produto biológico para arcabouço vascular, uma vez que, a partir do ponto de ruptura inicial, existe comprometimento irreversível da estabilidade estrutural do material. Olausson et al 2014,27estudo com veias safenas magnas que foram submetidas a protocolos de descelularização, utilizando Triton X-100 a 1%, tri-n-butilfosfato (TNBP) a 1% e 4 mg / L de Dnase, observou-se que as veias foram descelularizadas com sucesso, porém o teste de resistência à tração das veias mostrou uma diminuição no trabalho necessário para deformar as amostras completamente quando comparados com amostras normais, o que difere de nossos resultados, que utilizou-se um protocolo mais simplificado de descelularização, principalmente no que tange o tempo de exposição. Considerando que a veia safena magna é o substituto vascular autólogo mais utilizado atualmente, associado à sua grande disponibilidade proveniente de cirurgias de safenectomia por insuficiência venosa e a possibilidade de obtenção por doação cadavérica, surge a necessidade de avaliar o comportamento de veias safenas magnas insuficientes e descelularizadas, com a perspectiva, de no futuro, proporcionar a formação de um banco de veias. No ser humano, grandes variações de diâmetro das artérias ocorrem no decorrer de seu percurso do coração até os pontos mais distais dos membros superiores e inferiores, portanto um banco de safenas com variações de diâmetros será muito importante para atender todas as necessidades de substituição de artérias acometidas por doença aterosclerótica. 41 7 CONCLUSÃO A descelularização de veias safenas humanas pode ser realizada de forma simples e eficiente, mantendo relativa integridade da ME, utilizando SDS a 2% e DS 3%, ambos com 2h de exposição. VSM suficientes e insuficientes, congeladas ou não, demonstram-se semelhantes durante a realização dos testes biomecânicos, porém, após o processo de descelularização de VSMs tiveram aumento de fragilidade com protocolos elencados. O mesmo não aconteceu para as VSMi que se mantiveram estáveis após a descelularização. Novos estudos devem ser realizados para se estabelecer o possível uso desses arcabouços na ET de vasos sanguíneos. 42 8 REFERÊNCIAS 1. Roger VL, Go AS, Lloyd Jones DM, Adams RJ, Berry JD, Brown TM, et al. Heart disease and stroke statistics—2011 update a report from the american heart association. Circulation. 2011;123(4):e18-209. 2. Sociedade Brasileira de Diabetes. Doença arterial obstrutiva periférica no paciente diabético: avaliação e conduta. Diretrizes SBD. São Paulo: SBD; 2014-2015. p. 296- 303. 3. Pimenta REF, Maffei FHM, Mariúba JVO, Lastória S. Aterosclerose Obliterante Periférica | Epidemiologia, Fisiopatologia, Quadro Clínico e Diagnóstico. 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Estou estudando veias safenas obtidas de descarte cirúrgico. Para que eu possa ter um resultado nesse momento preciso obter fragmento de veia safena magna, extirpada em decorrência da cirurgia em que o senhor (a) será submetido e que seria descartada em lixo cirúrgico. O risco da coleta do fragmento de veia, são os riscos inerentes ao procedimento cirúrgico que será realizado, sem riscos adicionais. Informo que o material biológico colhido do Senhor (a), não será usado em sua totalidade e parte dele será armazenada na Faculdade de Medicina. Para reutilização desse material será escrito um novo projeto de pesquisa, com um novo termo de consentimento para que o Senhor (a) assine nova autorização para utilização desse material. Solicito também seu consentimento para consultar seu prontuário médico para coletar outras informações lá contidas referentes a consultas feitas anteriormente pelo (a) Senhor (a). Seu benefício em participar será o de contribuir com a evolução do tratamento das doenças arteriais obstrutivas periféricas que poderá favorecer futuros pacientes, após os pesquisadores terem o conhecimento dos resultados da pesquisa. Fique ciente de que sua participação neste estudo é voluntária e que mesmo após Caracterização morfofuncional da veia cava decelularizada como suporte de engenharia de tecidoster dado seu consentimento para participar da pesquisa, você poderá retira-lo a qualquer momento, sem qualquer prejuízo na continuidade do seu tratamento. Este Termo de Consentimento Livre e Esclarecido será elaborado em 2 vias de igual teor, o qual 01 vias será entregue ao Senhor (a) devidamente rubricada, e a outra via será arquivada e mantida pelos pesquisadores por um período de 5 anos após o término da pesquisa. Qualquer dúvida adicional você poderá entrar em contrato com o Comitê de Ética em Pesquisa através dos telefones (14) 3880-1608 ou 3880-1609 que funciona de 2ª a 6ª feira das 8.00 às 11.30 e das 14.00 às 17horas, na Chácara Butignolli s/nº em Rubião Júnior – Botucatu - São Paulo. Os dados de localização dos pesquisadores estão abaixo descritos. Após terem sido sanadas todas minhas dúvidas a respeito deste estudo, CONCORDO EM PARTICIPAR de forma voluntária, estando ciente que todos os meus dados estarão resguardados através do sigilo que os pesquisadores se comprometeram. Estou ciente que os resultados desse estudo poderão ser publicados em revistas científicas, sem, no entanto, que minha identidade seja revelada. Botucatu, _____/___/______ _______________________ _________________________ Pesquisador Participante da Pesquisa Nome: Karise Naves de Rezende Endereço: Rua 122, Qd 43ª, Lt 17, Setor Sul 46 Telefone: (62) 99694-8586 Email: karisenaves@gmail.com 10 ANEXO 1. Aprovação ética mailto:karisenaves@gmail.com 47 48 49