153 Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.72, n.2, p.153-159, abr./jun., 2005 Vacinação anti-rábica em bovinos: comparação de cinco esquemas vacinais. VACINAÇÃO ANTI-RÁBICA EM BOVINOS: COMPARAÇÃO DE CINCO ESQUEMAS VACINAIS A. Albas1, P.E. Pardo2, H. Bremer Neto2, N.M.F. Gallina3, R.M. Mourão Fuches3, A. Sartori4 1Pólo Regional de Desenvolvimento Tecnológico dos Agronegócios da Alta Sorocabana, CP 298, CEP 19100-000, Presidente Prudente, SP, Brasil. E-mail: avealbas@yahoo.com.br 00RESUMO A profilaxia antirrábica em bovinos no Brasil é baseada no uso de preparações vacinais de vírus inativado. O Programa Brasileiro de Controle da Raiva Bovina indica o uso de uma dose destas vacinas (1 mL) seguida de um reforço. O objetivo deste trabalho foi avaliar e comparar os níveis de anticorpos induzidos por 5 esquemas alternativos de vacinação antirrábica em bovinos. Para isto, foram instituídos cinco grupos experimentais, denominados A, B, C, D e E, contendo 9 animais cada grupo. Os bovinos receberam, inicialmente, uma dose da vacina (dia 0). As doses de reforço foram aplicadas de acordo com o seguinte protocolo: grupo B (uma dose no dia 30); grupo C (uma dose no dia 180); os grupos D e E receberam duas doses de reforço, nos dias 30 e 60 e 30 e 180, respectivamente; o grupo A não recebeu dose de reforço. Amostras de sangue para obtenção de soro foram colhidas de todos os animais nos dias 0 (controle), 30, 60, 90, 180, 210 e 360 após o início da vacinação. Para aferir os níveis de anticorpos antirrábicos foi utilizado o Teste Rápido de Inibição de Focos Fluorescentes (RFFIT) e foram consideradas positivas as amostras com títulos ≥ 0,5 UI/mL (Unidades Internacionais/mL). O esquema de vacinação adotado no grupo E foi o mais eficiente, determinando níveis mais elevados de anticorpos e persistência dos mesmos por tempo mais prolongado e os resultados obtidos ilustram a necessidade de duas doses de reforço para melhor proteção de bovinos. Em função dos resultados observados, os autores sugerem que a vacinação contra a raiva nestes animais seja realizada com 3 doses, sendo os reforços administrados nos dias 30 e 180 após a primeira dose. PALAVRAS-CHAVE: Bovino, raiva, resposta imune, vacinação. ABSTRACT RABIES VACCINATION IN CATTLE: COMPARISON BETWEEN FIVE VACCINAL SCHEDULES. The Brazilian Program for Rabies Control indicates the use of 2 doses of a vaccine with inactivated virus. This study was conducted to determine the best schedule for cattle vaccination. To evaluate this, 45 bovines were organized in 5 groups (9 animals each), identified as A, B, C, D and E. Group A received only the dose at day 0; groups B and C received one booster at days 30 and 180, respectively; groups D and E received two boosters, delivered at days 30 and 60 and 30 and 180, respectively. Blood samples were withdrawn at days 0 (negative control), 30, 60, 90, 180, 210 and 360 after the beginning of vaccination. Specific antibody levels were determined in sera samples by the rapid fluorescent focus inhibition test (RFFIT). Samples showing titers ≥ 0.5 IU/mL were considered positive. Group E, whose protocol included two boosters, was the most efficient because it induced high and persistent specific antibody levels. The results reinforce the need of booster application in rabies vaccination to keep the prophylactic efficacy of inactivated vaccines. In view of these results the authors suggest the use of 3 doses of a vaccine with inactivated virus: one priming dose followed by two boosters delivered at days 30 and 180 after the initial dose. KEY WORDS: Cattle, rabies, immune response, vaccination. 2Universidade do Oeste Paulista, Presidente Prudente, SP, Brasil. 3Instituto Butantan, Divisão de Desenvolvimento Tecnológico e Produção, Serviço de Virologia, Seção de Raiva, SP, Brasil. 4Universidade Estadual Paulista, Botucatu, SP, Brasil. IdeaPad Caixa de texto DOI: 10.1590/1808-1657v72p1552005 IdeaPad Retângulo IdeaPad Caixa de texto Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.72, n.2, p.155-161, abr./jun., 2005 154 Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.72, n.2, p.153-159, abr./jun., 2005 A. Albas et al. INTRODUÇÃO A raiva em bovinos tem sido um dos principais problemas dos países da América Latina, especial- mente, nas regiões onde está presente o morcego hematófago (TADEI et al., 1991). Segundo informe da Organização Panamericana de Saúde, no ano de 2001 foram notificados 2.470 casos de raiva em bovinos, sendo que destes, 2.322 (94%) ocorreram na América Latina; 102 (4,1%) na América do Norte e 46 (1,9%) no Caribe. Em outras espécies domésticas foram notificados 369 casos predominantemente em eqüinos (84,8%) (ORGANIZACION PANAMERICANA DE LA SALUD, 2001). Um estudo na região Sul do Brasil, sobre doenças do sistema nervoso central em bovinos, demonstrou por meio de diagnóstico neuropatológico que, de um total de 305 bovinos com sinais clínicos de distúrbi- os nervosos analisados, 49,3% apresentaram resul- tado positivo para raiva (SANCHES et al., 2000). Em outras regiões como a Sudeste e Centro-Oeste, tem havido um acréscimo nos casos de raiva nos últimos anos, com 1.498 casos no ano de 2000 (MARQUES & KOTAIT, 2001). A raiva dos herbívoros é responsável por prejuí- zos econômicos na América Latina estimados em 30 milhões de dólares/ano, com a morte aproximada de 40.000 bovinos/ano (INSTITUTO PASTEUR, 1998). Em todo o mundo, a raiva bovina provoca uma perda anual de 50 milhões de dólares/ano (KING & TURNER, 1993). Particularmente, no Hemisfério Sul, o controle da raiva nestes animais é realizado pela redução na população de morcegos hematófagos e pelo uso de vacinas (ACHA & SZYFRES, 1986). Segundo ATANASIU (1968), o aparecimento de anticorpos é um sinal evi- dente para se reconhecer uma reação imunológica após vacinação. A vacinação de bovinos, principal- mente, em áreas de alta concentração de morcegos hematófagos, não tem oferecido resultados plena- mente satisfatórios, inclusive com registro de casos de raiva em animais vacinados (MONTAÑO et al., 1987; RONDON et al., 1995). RIBEIRO NETO et al. (1973) reali- zaram estudo comparativo com vacinas antirrábicas para bovinos, e constataram que no Brasil, para al- guns tipos de vacinas, a imunidade não persiste mais que 45 dias. Outros autores também têm demonstrado a ineficiência de certos tipos de vacinas 30 dias após o uso (ALBAS et al., 1995; QUEIROZ DA SILVA et al., 2003). Experimentalmente, tem sido comprovado que doses de reforços conseguem níveis de anticorpos mais elevados (ITO et al., 1991; CORTES et al., 1993; RODRIGUES DA SILVA et al., 2000; OLIVEIRA et al., 2000; ALBAS, 2003). Este trabalho teve por objetivo avaliar e comparar os níveis de anticorpos induzidos por cinco esque- mas alternativos de vacinação contra a raiva em bovinos. MATERIAL E MÉTODOS Animais Neste trabalho foram utilizados 45 bovinos da raça ½ Pardo Suíço x ½ Holandês, fêmeas, com idade aproximada de um ano, mantidos na Estância Lolita, Município de Regente Feijó, SP. Estes animais foram observados por um médico veterinário e estiveram em condições adequadas de saúde durante a execução deste trabalho. Os bovinos foram cedidos pelo proprie- tário da fazenda. Os 45 bovinos foram distribuídos em 5 grupos com 99 animais cada, denominados de A, B, C, D e E, os quais foram submetidos a 5 esquemas diferentes de vacinação. O manuseio dos animais neste projeto foi conside- rado adequado aos princípios éticos, recomendados pelo Colégio Brasileiro de Experimentação Animal (COBEA) - UNESP – Campus de Botucatu, SP, Proto- colo nº 416. Vacina Foi utilizada uma vacina contra a raiva indicada para herbívoros denominada BGS - Cell, produzida pelo Laboratório Hertape Ltda, MG, Brasil, sendo formada de uma suspensão de vírus rábico, cepa PV, replicado em células BHK - 21, clone 13. O vírus foi inativado pela BEI (Bromoetileinemine) e a sus- pensão teve como adjuvante o hidróxido de alumí- nio. A partida utilizada foi a de n° 009/02, com valor antigênico 104.53 aferido pelo teste de HABEL (1996). Vacinação Os animais do grupo A receberam apenas uma dose de vacina no dia 0, contendo volume de 2 mL, aplicada com seringa previamente graduada. No grupo B, os animais também receberam o mesmo tratamento, porém 30 dias após a primeira vacina- ção, receberam uma dose de reforço (booster). Os animais do grupo C foram vacinados no dia 0 e a dose de reforço foi aplicada 180 dias após. Quanto ao grupo D, além da dose do dia zero, os bovinos receberam mais duas doses de reforço, sendo uma no dia 30 e outra no dia 60. Os animais do grupo E receberam uma dose no dia 0 como todos os outros, porém, as duas doses de reforço foram aplicadas nos 30 e 180 dias, após a primeira vaci- nação. Colheita das Amostras Inicialmente, foram colhidas amostras de todos os animais no dia zero com a finalidade de avaliar os IdeaPad Caixa de texto Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.72, n.2, p.155-161, abr./jun., 2005 IdeaPad Caixa de texto 156 155 Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.72, n.2, p.153-159, abr./jun., 2005 Vacinação anti-rábica em bovinos: comparação de cinco esquemas vacinais. títulos de anticorpos antirrábicos, para constatar se não houve estímulo antigênico anterior ao do experi- mento. Em seguida, foram colhidas amostras de san- gue dos bovinos dos grupos A, B, C, D e E nos dias 30, 60, 90, 180, 210 e 360. Após a coagulação, à tempera- tura ambiente, as amostras foram clarificadas por centrifugação, inativadas a 56° C por 30min, separa- das e distribuídas em volumes de aproximadamente 2 mL, sendo em seguida armazenadas a -20° C, até o momento de uso. Teste rápido de inibição de focos fluorescentes (RFFIT) Os títulos individuais de anticorpos neutra- lizantes foram determinados pela técnica de soroneutralização em células BHK21 clone 13. Esse teste foi baseado no Rapid Fluorescent Focus Inhibition Test - RFFIT (SMITH et al ., 1996) e no Fluorescence Inhibition Microtest - FIMT (ZALAN et al ., 1979). Foi utilizado soro eqüino de referên- cia nacional, lote BR 007, fornecido pelo Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS), contendo 204 UI/mL. As células foram marcadas com imunoglobulina antinucleo- capsídeo rábico, conjugada com isotiocianato de fluoresceína (Sanofi-Pasteur) e foram observados 10 campos em cada orifício da microplaca em microscópio de fluorescência invertido (Nikon TE-300) com aumento de 100 vezes. Foi conside- rado positivo o campo que apresentou um ou mais focos fluorescentes, e assim, se determinou a diluição eficaz do soro que protegeu 50% das células inoculadas contra a infecção pelo vírus rábico (DE 50) e os títulos de anticorpos neutrali- zantes foram expressos em UI/mL. Os cálculos foram efetuados pelo método de Spearman Karber (AUBERT, 1996). Para análise estatística dos resultados, os títulos individualizados dos animais foram transformados, usando-se log10 (X + 1), e foi utilizado o teste t indepen- dente, não paramétrico, para avaliação dos cruza- mentos sempre de 2 em 2 colunas (2 populações). As diferenças foram consideradas significativas quan- do p < 0,05. RESULTADOS As Tabelas 1, 2, 3, 4 e 5 mostram os resultados individualizados dos títulos de anticorpos de bovi- nos vacinados contra a raiva, respectivamente, nos grupos A, B, C, D e E. Os valores do RFFIT estão apresentados em Unidades Internacionais por mL (UI/mL) e pode-se observar também, as médias geo- métricas ± o desvio padrão, bem como as porcenta- gens dos títulos ≥ 0,5 UI/mL. Quanto as médias geométricas, as análises estatís- ticas demonstraram que, na Tabela 1, não houve diferenças significativas entre os títulos de anticorpos dos animais, porém, na Tabela 2, houve diferenças entre os títulos referentes ao dia 60 em relação aos outros dias (p < 0,05), o mesmo ocorrendo na Tabela 3 referente ao dia 210, em relação aos demais. Em relação à Tabela 4, estatisticamente, os títulos referen- tes aos dias 60 e 90 não diferiram entre si. No entanto, ambos foram diferentes dos demais. Finalmente, na Tabela 5, os títulos referentes aos dias 60 e 210 não diferiram entre si, porém, ambos diferiram dos demais (p < 0,05). Tabela 1 - Valores individuais dos títulos de anticorpos (UI/mL) em soros de bovinos vacinados contra a raiva com uma dose de vacina (Grupo A). Animal Dia Zero Dia 30 Dia 60 Dia 180 Dia 360 (Controle) 1 0 0,58 0,58 0,41 0,41 2 0 0,26 0,22 0,09 0,09 3 0 0,21 0,27 0,08 0,15 4 0 0,22 0,61 0,23 0,31 5 0 0,25 0,25 0,06 0,07 6 0 0,12 0,15 0,07 0,07 7 0 0,31 0,12 0,36 0,44 8 0 0,71 0,25 0,54 0,19 9 0 0,07 0,04 0,06 0,05 Média±DP 0 0,25±0,21 0,21±0,20 0,15±0,18 0,15±0,16 % ≥0,5 0 22,2 22,2 11,1 0 IdeaPad Caixa de texto Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.72, n.2, p.155-161, abr./jun., 2005 IdeaPad Caixa de texto 157 156 Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.72, n.2, p.153-159, abr./jun., 2005 A. Albas et al. Tabela 2 - Valores individuais dos títulos de anticorpos (UI/mL) em soros de bovinos vacinados contra a raiva com duas doses de vacina, sendo uma no dia 0 e o reforço no dia 30 (Grupo B). Animal Dia Zero Dia 30 Dia 60 Dia 180 Dia 360 (Controle) 10 0 0,58 1,17 0,29 0,09 11 0 0,58 4,69 0,51 0,15 12 0 0,09 4,37 0,72 0,19 13 0 0,38 4,69 0,29 0,09 14 0 0,27 2,51 0,55 0,33 15 0 0,33 5,47 0,95 0,19 16 0 0,71 3,82 1,66 0,36 17 0 0,71 3,86 0,27 0,08 18 0 0,38 3,86 0,83 0,22 Média ± DP 0 0,39±0,21 3,54±1,29 0,57±0,44 0,17±0,10 % ≥0,5 0 44,4 100 66,6 0 Tabela 3 - Valores individuais dos títulos de anticorpos (UI/mL) em soros de bovinos vacinados contra a raiva com duas doses de vacina, sendo uma no dia 0 e o reforço no dia 180 (Grupo C). Animal Dia Zero Dia 30 Dia 60 Dia 180 Dia 210 Dia 360 (Controle) 19 0 0,46 0,46 0,36 4,76 0,44 20 0 1,42 1,30 1,15 1,11 0,72 21 0 0,35 0,35 0,09 8,28 0,44 22 0 0,14 0,14 0,09 3,08 0,22 23 0 0,14 0,14 0,08 1,03 0,22 24 0 0,89 0,89 0,72 6,28 0,67 25 0 0,89 0,89 0,48 3,61 0,22 26 0 0,46 0,46 0,12 2,55 0,19 27 0 0,46 0,46 0,17 3,10 0,35 Média ± DP 0 0,45±0,41 0,44±0,38 0,23±0,37 2,56±1,19 0,39±0,20 % ≥0,5 0 33,3 33,3 22,2 100 22,2 Tabela 4 - Valores individuais dos títulos de anticorpos (UI/mL) em soros de bovinos vacinados com 3 doses de vacina, sendo uma no dia 0 e os reforços nos dias 30 e 60 (Grupo D). Animal Dia Zero Dia 30 Dia 60 Dia 90 Dia 180 Dia 360 (Controle) 28 0 0,28 6,10 1,46 0,55 0,22 29 0 0,26 6,10 5,47 1,11 0,44 30 0 0,29 1,00 9,52 1,57 0,44 31 0 0,22 3,81, 5,10 0,55 0,22 32 0 0,18 4,69 6,28 1,11 0,44 33 0 0,89 5,86 7,21 2,88 0,72 34 0 0,19 3,36 3,36 1,78 0,17 35 0 0,72 5,86 3,61 3,17 0,29 36 0 0,63 4,07 4,71 0,19 0,11 Média±DP 0 0,34±0,27 4,08±1,69 4,64±2,35 1,07±1,03 0,29±0,19 % ≥0,5 0 33,3 100 100 88,9 11,1 IdeaPad Caixa de texto Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.72, n.2, p.155-161, abr./jun., 2005 IdeaPad Caixa de texto 158 157 Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.72, n.2, p.153-159, abr./jun., 2005 Vacinação anti-rábica em bovinos: comparação de cinco esquemas vacinais. DISCUSSÃO E CONCLUSÕES No Brasil, não existem testes oficiais para avaliar se determinada vacina produziu soro-conversão em bovinos, em condições de campo. Os testes limitam-se em aprovar ou desaprovar as vacinas com base em ensaios de laboratório (HABEL, 1996). A Instituição responsável pela pelos testes das vacinas de uso animal em todo o país é o LARA (Laboratório de Referência Animal), credenciado pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, situado em Campinas, SP, que atualmente utiliza o método pre- conizado pelo National Institute of Health (NIH) (WILBUR & AUBERT, 1996). O objetivo deste trabalho foi comparar a eficácia de 5 esquemas alternativos de vacinação contra a raiva em bovinos: Um grupo foi vacinado com apenas uma dose (sem reforço), 2 grupos com uma dose de reforço nos dias 30 e 180) e 2 grupos com duas doses de reforço (dias 30 e 60 e dias 30 e 180). Neste trabalho foi utilizado o teste rápido de ini- bição de focos fluorescentes (RFFIT) que é recomenda- do pela Organização Mundial da Saúde (OMS), por meio da qual é determinado o título de anticorpos de indivíduos submetidos à vacinação. Um indivíduo para ser considerado imunizado precisa obter títulos de anticorpos = 0,5 Unidades Internacionais por mL (UI/mL), e se o título estiver abaixo, haverá necessida- de da aplicação de uma dose de vacina como reforço (WHO, 1992). Nenhum dos animais utilizados neste estudo apresentou títulos de anticorpos no soro, antes do início das vacinações, demonstrando que não houve estímulo antigênico anterior ao do experimento. Vá- rios autores têm pesquisado a resposta imune em bovinos e constataram que a resposta se apresentou heterogênea, havendo animais não respondedores, intercalados com animais que apresentaram valores Tabela 5 - Valores individuais dos títulos de anticorpos (UI/mL) em soros de bovinos vacinados com 3 doses de vacina, sendo uma no dia 0 e os reforços nos dias 30 e 180 (Grupo E). Animal Dia Zero Dia 30 Dia 60 Dia 180 Dia 210 Dia 360 (Controle) 37 0 0,26 2,80 0,59 5,86 0,44 38 0 0,38 4,69 1,09 11,72 2,15 39 0 0,58 3,60 1,55 7,73 1,35 40 0 0,16 4,15 1,09 10,93 0,77 41 0 0,34 6,28 0,36 11,72 0,36 42 0 0,21 12,55 1,78 7,73 0,51 43 0 0,44 17,80 1,02 14,43 1,44 44 0 0,52 15,46 0,67 2,22 0,22 45 0 0,41 3,86 0,77 9,52 0,59 Média±DP 0 0,34±0,14 6,33±5,75 0,89±0,46 8,16±3,66 0,69±0,64 % ≥0,5 0 22,2 100 88,9 100 66,6 baixos, médios e altos (TIZARD, 1977; CIUCHINI et al., 1981; ALBAS et al., 1998). Observando-se os resultados das médias geomé- tricas dos grupos A, B, C, D e E, respectivamente, correspondendo às tabelas 1, 2, 3, 4 e 5, pode-se constatar que, no dia 30, todas as amostras estiveram abaixo do mínimo recomendado pelo teste de RFFIT que é de 0,5 UI/mL. Os resultados analisados pelo percentual de amostras reagentes mostraram com- portamento similar. Estes resultados foram similares aos observados por QUEIROZ DA SILVA et al. (2003), que detectaram 10% de positividade em uma das quatro vacinas para uso bovino avaliadas, na região de Araçatuba, SP, um mês após a vacinação. Ainda, em relação ao grupo A, além do baixo nível de anticorpos no dia 30, esta média baixou mais ao longo do período, alcançando média geométrica de 0,15 UI/mL e 0% de valores reagentes no dia 360. Outros autores também obtiveram baixos títulos de anticorpos, 30 dias após o uso de uma dose de vacina (ROEHE et al., 1987; ALBAS et al., 1995). PASTORET et al., (1995) alerta que o uso de apenas uma dose de vacina não é suficiente para proteger os animais contra a raiva, havendo, portan- to, a necessidade de doses de reforço. No grupo B (Tabela 2), os animais receberam duas doses de vacina (dias zero e 30). O reforço aplicado no dia 30 potencializou a reposta imune humoral, ele- vando significativamente os níveis de anticorpos para 3,54 UI/mL, porém não impediu que houvesse de- créscimo acentuado com o passar do tempo, tanto que um ano após o experimento, a média caiu para 0,17 UI/mL e 0% de bovinos, com percentagem de anticorpos = 0,5 UI/mL. ALBAS et al. (1998) constata- ram 19% de proteção em bovinos que receberam dose de reforço no dia 30, após 360 dias do experimento e QUEIROZ DA SILVA et al. (2003) obtiveram resultados idênticos, ou seja, apenas 20%, após um ano. Os resultados observados no grupo C, reforço aplicado IdeaPad Caixa de texto Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.72, n.2, p.155-161, abr./jun., 2005 IdeaPad Caixa de texto 159 158 Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.72, n.2, p.153-159, abr./jun., 2005 A. Albas et al. aos 180 dias (Tabela 3), mostraram que, a exemplo do grupo B, 30 dias após a dose de reforço, os níveis de anticorpos aumentaram, porém não foram mantidos ao longo do experimento, tendo sido observado queda de 2,56 UI/mL (dia 210) para 0,30 UI/mL (dia 360), além do que, o percentual de amostras positivas (= 0,5 UI/mL) um ano após o início do experimento, ficou em 22,2%. ALBAS (2003), pesquisando o efeito de um reforço tardio, aplicado no dia 180, mostrou melhores resultados, com 93,3% de amostras positivas no dia 540. Vários fatores poderiam ter causado esta aparen- te discrepância. A possibilidade mais viável, pode ter sido o alto valor antigênico do lote de vacina utilizada que foi de 108.08, enquanto que neste experimento o título da vacina usada foi de apenas 104.53. Também, não se pode descartar a possível interferência do tipo de teste utilizado, uma vez que, no trabalho anterior foi utilizado o teste de soroneutralização em camun- dongos (SN), enquanto que, na presente investigação se fez uso do teste rápido de inibição de focos fluores- centes (RFFIT). HAASE et al. (1985) e GLÛCK et al. (1987), comparando os dois testes, verificaram que os resul- tados de SN chegaram a ser de 2 a 10 vezes superiores ao RFFIT, quando pesquisaram resposta imune em pessoas vacinadas contra a raiva. No grupo E (Tabela 5), os bovinos também recebe- ram duas doses de reforço (dia 30 e 180) e os níveis de anticorpos tiveram taxas mais elevadas que os demais grupos até o final do experimento. É importante ressal- tar, entretanto, que os níveis observados 360 dias, após a vacinação (média geométrica), foram ainda superio- res a 0,5 UI/mL, bem como, o percentual de amostras positivas (66,6%). UMEHARA et al. (2002) também obtive- ram resultados com níveis elevados de anticorpos (acima de 2,264 log10), com aplicação de duas doses de vacina como reforço em bovinos, porém, estes reforços foram administrados nos dias 90 e 360. Pode-se concluir que o esquema B, utilizado no grupo de bovinos, que recebeu dose de reforço precoce (30 dias após a primeira dose), não apresentou dife- renças estatísticas significativas em relação ao grupo A, que não recebeu dose de reforço. O mesmo pode-se concluir dos esquemas C e D, cujos animais receberam uma e duas doses de vacinas como reforços, respecti- vamente, e que, não atingiram os resultados espera- dos, uma vez que, o grupo C concluiu o experimento com 22,2% de amostras reagentes e o D com 11,1%. Com base nesses resultados, o esquema E, que empregou uma dose no dia 0, sendo o primeiro reforço no dia 30 e o segundo no dia 180, foi mais eficiente que os demais, corroborando com a indicação do progra- ma de controle da raiva dos herbívoros para o Estado de São Paulo, que recomenda revacinações semes- trais para áreas consideradas epidêmicas. Alerta para o devido cumprimento desta indicação, tendo em vista os resultados deste experimento. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACHA, P.N. & SZYFRES, B. Zoonosis y enfermedades transmissibles comunes al hombre y a los animales. 2.ed. Washington, Organizacion Panamericana de la Salud, 1986. p.502- 526. (Publicacion Cientifica n.503). ALBAS, A. Vacina anti-rábica em bovinos : efeito de doses de reforço. 68p. Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, Univ. Estadual Paulista, Botucatu: 2003. ALBAS, A.; ALBERTI, H.; ALBERTI, A.L.L.; PARDO, P.E.; GIOMETTI, J. Ausência de resposta imune em bovinos vacinados contra a raiva na região de Presidente Prudente, SP. Hora Veterinária, v.86, p.64-66, 1995. ALBAS, A.; PARDO, P.E.; GOMES, A.A.B.; ITO, F.H. Effect of a booster-dose of rabies vaccine on the duration of virus neutralizing antibody titers in bovines. Revista da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, n.31, v.4, p.367- 371, 1998. ATANASIU, P.; FUENZALIDA, E.; A CHA, P.; SZYFRES, B. Inmunidad antirrábica en bovinos vacunados. Boletín de la Oficina Sanitaria Panamericana, v.64, p.431-440, 1968. AUBERT, M.F.A. Methods for the calculation of titres. In: MESLIN, F.X.; KAPLAN , M.M.; KOPROWISKI, H. (Eds.). Laboratory techiniques in rabies. 4.ed. Geneva: WHO, 1996. Appendix, n.3, p.445-459. ORGANIZACIÓN PANAMERICANA DE LA SALUD . Vigilancia epidemiológica de la rabia en las Américas, 2001. Boletin: Vigilancia Epidemiológica de la Rabia en las Américas. CIUCHINI; IRSARA, A.; PESTALOZZA, S; TRANI, L.; ANTONUCCI, G. Risposta immunitaria in bovini vaccinati contro la rabia com virus attenuato ceppo ERA. Revista di Zôotecnia Veterinaria, n.9, p.176-184, 1981. CÔRTES, J.A.; RWEYEMAMU, M.M., ITO, F.H.;UMEHARA, O.; MEDEIROS NETO, R.R.; D E LUCCA NETO, D.; B ALTAZAR, M.C.; VASCONCELLOS, A.S.; VASCONCELLOS, M.P.E. Immune response in catle induced by inactivated rabies vaccine adjuvanted with aluminium hydroxide either alone or in combination with avridine. Revue Scientifique et Technique Office International des Epizooties, v.12, p.941- 955, 1993. GLÜCK, R.; WEGMANN, A.; KELLER, J.M.; HOSKINS, J.M.; GERMANIER, R. Human rabies immunoglobulin assayed by the rapid fluorescent focus inhibition test suppresses active rabies immunization. Journal Biological Standardization, n.15, p.177-182, 1987. HAASE , M.; SEINCHE , D.; SCHNEIDER , W. The mouse neutralization test in comparison with the rapid fluorescent focus inhibition test: differences in the results in rabies antibody determination. Journal Biological Standardization, n.13, p.123-128, 1985. HABEL, K. Habel test for potency. MESLIN, F.X.; KAPLAN, N.M.; KOPROWSKI, H. (Eds.). Laboratory techniques in rabies. 4.ed. Geneva: WHO, 1996., p.369-373. ITO, F.H.; CÔRTES, J.A.; RWEYEMAMU, M.M., UMEHARA, O.; MEDEIROS NETO, R.R.; D E LUCCA NETO, D.; B ALTAZAR, M.C.; VASCONCELLOS, A.S.; VASCONCELLOS, M.P.E. Course of humoral immune response shortly after revaccination with BHK-21 cell culture inactivated rabies vaccine adjuvanted with aluminium hydroxide . Brazilian Journal Veterinary Research and Animal Science, n.28, p.51-57, 1991. IdeaPad Caixa de texto Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.72, n.2, p.155-161, abr./jun., 2005 IdeaPad Caixa de texto 160 159 Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.72, n.2, p.153-159, abr./jun., 2005 Vacinação anti-rábica em bovinos: comparação de cinco esquemas vacinais. KING, A.A. & TURNER, G.S. Rabies: A review. Journal Comparative Pathology, n.108, p.1-39, 1993. INSTITUTO PASTEUR. São Paulo. Controle da raiva dos herbí- voros, São Paulo: Instituto Pasteur, 1998. (Manual Técnico do n.1). MARQUES, G.H.F. & KOTAIT, I. Situação epidemiológica da raiva dos herbívoros no Brasil. In: SEMINÁRIO IN- TERNACIONAL DE MORCEGOS COMO TRANS- MISSORES DA RAIVA, 2001, São Paulo. Resumos . São Paulo, 2001. p.27. MONTAÑO, J.A.; POLACK, G.W.; MORA, E.F. Raiva bovina em animais vacinados. II – Situação epidemiológica no Estado do Paraná, Brasil – 1984. Arquivo de Biologia e Tecnolologia, v.30, n.2, p.367-380, 1987. OLIVEIRA, A.N.; ANDRADE, M.C.R.; SILVA, M.V.; MOURA, W.C; CONTREIRAS, E.C. Immune response in cattle vaccinated agaist rabies. Memórias do Instituto Oswaldo Cruz, v.95, n.1, p.83-88, 2000. PASTORET, P.P.; THOMAS, I.; BROCHIER, B.; SCHWERS, A. Les prolèmes associés à la vaccination antirabique des animaux domestiques. Annales de Médicine Véterinarre, n.129, p.339-349, 1995. QUEIROZ DA SILVA, L.H.; CARDOSO, T.C.; PERRI, S.H.V.; P INHEIRO, D.M.; C ARVALHO, C. Pesquisa de anticorpos anti-rábicos em bovinos vacinados na região de Araçatuba, SP. Arquivos do Instituto Biológico, São Paulo, [on line] v.70, n.4, p.407-413, 2003. Disponível em: . Acesso em: 30 mar. 2005 RIBEIRO NETO, A.; NILSSON, M.R.; DE ANGELIS CORTES, J.; M IZUNO, M.; MIGUEL, O. Comparative study of cattle antirabies vaccine. Zentralblatt fur Veterinaermedizin , v.20, p.398- 404, 1973. RODRIGUES DA SILVA, A.C.; CAPORALE, G.M.M.; GONÇALVES, C.A.; TAGUETA, M.C.; COMIN, F.; ZANETTI, C.R.; KOTAIT, I. Antibody response in cattle after vaccination with inactivated and attenuated rabies vaccines. Revista do Instituto de Medicina Tropical de São Paulo, v.42, n.2, p.95- 98, 2000. ROEHE, P.M.; CUNHA, A.C.; KING, A. Níveis de anticorpos neutralizantes em bovinos vacinados contra raiva. Pesquisa Veterinária Brasileira, v.7, n.3, p.63-65, 1987. RONDON, E.S.; BASTOS, P.V.; SILVA, D.A.; PICCINI, R.S. Estudo comparativo da sintomatologia clínica de bovinos suspeitos de raiva. Revista Brasileira de Medicina Vete- rinária, v.17, p.253-259, 1995. SANCHES, A.W.D.; L ANGOHR, I.M.; S TIGGER, A.L.; B ARROS, C.S.L. Doenças do sistema nervoso central em bovinos no Sul do Brasil. Pesquisa Veterinária Brasileira, v.20, n.3, p.113-118, 2000. SMITH, J.S.; Y AGER, P.A.; BAER, G.M. A rapid fluorescent focus inhibition test (RFFIT) for determining rabies virus- neutralizing antibodies. In: MESLIN F.X.; K APLAN, M.M.; KOPROWISKI, H. (Eds.). Laboratory techiniques in rabies. Geneva WHO, 1998. p.181-192. TADEI, V.A.; GONÇALVES, C.A.; PEDRO, W.A.; TADEI, W.J.; KOTAIT, I.; ARIETA, C. Distribuição do morcego vampiro Desmodus rotundus (Chiroptera: Phyllostomidae) no Esta- do de São Paulo e a raiva dos animais domésticos. Campinas CATI, 1991. (Impresso Especial CATI n.107). TIZARD, I.R. An introduction to veterinary immunology. Philadelphia: W.B. Saunders, 1977. UMEHARA, O.; DE LUCCA NETO, D.; MORO, E.; BERNARDI, F.; ITO, F.H.; RODRIGUES, C.A. Rabies virus neutralizing antibody profile in cattle vaccinated with inactivated vaccine adjuvanted with either aluminium hydroxide alone or combinated with avridine. Arquivos do Instituto Bioló- gico, v.69, n.1, p.23-28, 2002. WILBUR, L.A.; AUBERT, M.F. The NIH test for potency. In: MESLIN F.X.; KAPLAN , M.M.; KOPROWISKI, H. (Eds.). Laboratory techiniques in rabies. 4.ed. Geneva WHO, 1996. p.360-368. WOLD HEALTH ORGANIZATION EXPERT MOMMITTEE ON RABIES. Eigth report. Geneva: World Health Organization, Tecnical Report Series 1992. (WHO Tecnical Report Series, n.824). ZALAN , E.; WILSON , C.; PUKITIS, D. A microtest for the quantitative of rabies virus neutralizing antibodies. Journal of Biological Standardization , n.3, p.213-220, 1979. Recebido em 1/6/05 Aceito em 30/6/05 IdeaPad Caixa de texto Arq. Inst. Biol., São Paulo, v.72, n.2, p.155-161, abr./jun., 2005 IdeaPad Caixa de texto 161