unesp UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” CAMPUS DE GUARATINGUETÁ GUSTAVO GARCIA ARANTES BRAGA ANÁLISE TEÓRICA DE CALDEIRAS DE INCINERAÇÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS MUNICIPAIS Guaratinguetá 2012 GUSTAVO GARCIA ARANTES BRAGA ANÁLISE TEÓRICA DE CALDEIRAS DE INCINERAÇÃO DE RESÍDUOS SÓLIDOS MUNICIPAIS Orientador: Prof. Dr. José Antonio Perrella Balestieri Guaratinguetá 2012 Trabalho de Graduação apresentada à Faculdade de Engenharia do Campus de Guaratinguetá, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para a obtenção do diploma de Graduação em Engenharia Mecânica. B813a Braga, Gustavo Garcia Arantes Análise teórica de caldeiras de incineração de resíduos / Gustavo Garcia Arantes Braga – Guaratinguetá : [s.n], 2012. 40 f : il. Bibliografia: f. 38-40 Trabalho de Graduação em Engenharia Mecânica – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Engenharia de Guaratinguetá, 2012. Orientador: Prof. Dr. José Antonio Perrella Balestieri 1. Caldeiras 2. Resíduos sólidos I. Título CDU 621.18 BRAGA, G. G. A. Análise Teórica de Caldeiras de Incineração de Resíduos Sólidos Municipais. 2012. 40 p. Trabalho de Graduação (Graduação em Engenharia Mecânica) – Faculdade de Engenharia do Campus de Guaratinguetá, Universidade Estadual Paulista, Guaratinguetá, 2012. RESUMO A discussão sobre possibilidade de implantação de caldeiras de incineração de RSU para a geração de energia elétrica no Brasil é o tema abordado por esse trabalho. São apresentadas algumas vantagens e desvantagens da utilização desse tipo de tecnologia, assim como uma metodologia de cálculo para uma estimativa de área para os principais equipamentos de um gerador de vapor de uma caldeira de incineração. PALAVRAS-CHAVE: Caldeira de Incineração. Resíduos Sólidos Municipais. BRAGA, G. G. A. Theoretical Analysis of Incineration Boilers of Municipal Solid Waste. 2012. 40 p. Graduate Work (Graduate in Mechanical Engineering) – Faculdade de Engenharia do Campus de Guaratinguetá, Universidade Estadual Paulista, Guaratinguetá, 2012. ABSTRACT The discussion about possibility of deployment of MSW incineration boilers to generate electricity in Brazil is the major topic of this paper. In this article are showed some advantages and disadvantages of this technology, as well as a methodology for the estimate of area for the main equipments of a steam generator for a boiler incineration. KEYWORDS: Incineration Boilers. Municipal Solid Waste. LISTA DE FIGURAS Figura 1: Trecho da matéria de Alcântara Machado de “O Pirralho” (1918)........................... 12 Figura 2: Outro trecho da matéria de Alcântara Machado de “O Pirralho” (1918). ................. 13 Figura 3: Representação de uma instalação de caldeiras [1]. ................................................... 14 Figura 4: Caldeira flamotubular [2]. ......................................................................................... 15 Figura 5: Representação de uma caldeira de incineração de RSU [3]...................................... 16 Figura 6: Calor específico dos gases de combustão em função da temperatura....................... 25 Figura 7: Pontos intermediários em uma caldeira de incineração. ........................................... 26 Figura 8: Transferência térmica em uma caldeira de incineração. ........................................... 27 Figura 9: Diâmetro do casco e comprimento útil dos tubos em função da área de troca térmica. .................................................................................................................................................. 29 LISTA DE TABELAS Tabela 1: Participação das diversas fontes de emissão de dioxinas e furanos. ..................................... 21 Tabela 2: Condições da água em cada ponto de uma caldeira de incineração. ..................................... 26 Tabela 3: Condições dos gases em cada ponto de uma caldeira de incineração. .................................. 27 Tabela 4: Áreas iniciais dos equipamentos. .......................................................................................... 28 Tabela 5: Áreas corrigidas dos equipamentos. ...................................................................................... 29 Tabela 6: Balanço de Energia do Economizador. ................................................................................. 30 Tabela 7: Valor de F1 para vários diâmetros dos tubos e layouts. ......................................................... 32 Tabela 8: Valores das áreas estimadas para cada equipamento. ........................................................... 36 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................ 10 2. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA .......................................................................................... 12 2.1. Caldeiras .................................................................................................................................13 2.2. Caldeiras de Incineração de RSU ...........................................................................................15 2.3. Boas Práticas para a Incineração ............................................................................................18 2.4. Incentivo a Incineração ..........................................................................................................19 2.5. Dioxinas e Furanos .................................................................................................................20 3. METODOLOGIA ............................................................................................................. 23 3.1. Algumas Considerações .........................................................................................................23 3.2. Balanço de Massa e Energia ...................................................................................................25 3.3. Pré-dimensionamento .............................................................................................................28 3.4. Exemplo de Cálculo ...............................................................................................................30 4. DISCUSSÕES FINAIS ..................................................................................................... 36 5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................. 38 10 1 INTRODUÇÃO Todos os processos, sejam químicos ou físicos, têm como consequência a geração de resíduos que podem ou não ser reaproveitados em um novo processo. Durante um dia, em média, uma pessoa produz de 1,03 quilogramas de detritos no Brasil (ABRELPE, 2011), sendo que, em geral, quanto mais desenvolvida é a região maior será a quantidade de lixo gerado. No estado de São Paulo, esse valor sobe para 1,38 kg/dia/pessoa, atingindo um total de aproximadamente 55.200 toneladas por dia de lixo no ano de 2011 (ABRELPE, 2011). O tratamento desses resíduos fica como responsabilidade dos municípios e do estado, os quais definem qual será a melhor forma de administração. Segundo a ABRELPE, das 55,2 toneladas de lixo produzidas por dia no estado de São Paulo em 2011, 76,5% teve como destino aterros sanitários, 14,9% aterros controlados e 8,6% lixões. Para evitar a contaminação do meio ambiente, é necessário que o destino final dos resíduos seja feita de forma consciente, seguindo procedimentos estabelecidos pelos órgãos responsáveis. Independente se o fim dos detritos é um aterro sanitário, um aterro controlado ou, até mesmo, a incineração existem normas em vigor para cada caso que auxiliam na preservação do meio ambiente. Existem UTTRs (Unidades de Tratamento Térmico) em diversas localidades do mundo, como por exemplo: Viena, Áustria; Cergy-Pontoise, França; Mônaco; Marchwood Grã- Bretanha; Bréscia, Itália; Miami-Dade, EUA; Tóquio, Japão; Paris, França; entre outras regiões (BOLOGNESI, 2010). Dependendo do local de aplicação, a utilização da energia obtida a partir da queima do RSU é para um determinado fim: aquecimento de residências em um inverno rigoroso ou geração de energia elétrica. Como o Brasil é um país tropical, a principal finalidade de um projeto para a construção de uma UTTR nacional seria a geração de energia elétrica. Por outro lado, a incineração do RSU promove algumas vantagens físicas, como por exemplo: redução de 90% no volume do lixo; as cinzas são 75% mais levem que os resíduos não incinerados (MENEZES e GERLACH, 2000). Devido essas vantagens, o destino final das cinzas oriundas da incineração de RSU está assegurado, uma vez que a periculosidade das mesmas são inferiores ao do lixo propriamente dito, servindo os aterros existentes para o armazenamento desse novo resíduo (Morgado e Ferreira, 2006). Além disso, existe a possibilidade da implantação das cinzas em projetos da área de construção civil (BARROS e LOPES, N/A). 11 Desta forma, o estudo técnico de uma caldeira de incineração mostra-se de fundamental importância, pois a partir do mesmo é possível prever se a implantação das UTTRs é sensata ou utópica. Entretanto, para a real adição das caldeiras de incineração na política de tratamento do RSU é preciso que não haja agressões ambientais. A fundamental razão da negação perante a incineração ocorre quando se analisa o quesito ambiental, uma vez que a combustão do lixo tem como consequência a formação de gases poluentes que, caso não sejam devidamente tratados, trazem grandes danos ao meio ambiente. A formação de dioxinas e furanos é a principal preocupação nesse aspecto, pois tais componentes são extremamente tóxicos e prejudiciais à saúde (MCKAY, 2001). 1.1. Objetivo Esse trabalho tem como foco principal a abordagem técnica do assunto citado anteriormente, para tanto são feitas considerações a respeito de propriedades físicas e químicas do RSU para que possa ser feita uma primeira estimativa das dimensões de um gerador de vapor de uma caldeira de incineração. Além disso, é feito uma breve análise dos aspectos ambientais. 12 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA A seguir será informado o funcionamento básico de uma caldeira de incineração, especificando os principais equipamentos presentes, quais as regiões fundamentais de troca térmica, justificativa da utilização dessa tecnologia no Brasil, boas práticas recomendadas para o processo, entre outros pontos importantes. 2.1. Histórico A incineração não é uma proposta nova, existem registros que no ano de 1918, Alcântara Machado relatou uma matéria no jornal “O Pirralho” na qual a questão da incineração foi levantada, sendo ele próprio simpatizante dessa atividade (O PIRRALHO, 1918). As Figuras 1 e 2 representam trechos removidos dessa matéria. Figura 1: Trecho da matéria de Alcântara Machado de “O Pirralho” (1918). 13 Figura 2: Outro trecho da matéria de Alcântara Machado de “O Pirralho” (1918). 2.2. Caldeiras Caldeiras são equipamentos que permitem a geração de formas de energia térmica para um vasto campo de aplicações, podendo atingir desde níveis industriais até residenciais. A fonte de energia convencional é a queima de algum tipo de combustível, seja ele sólido, líquido, ou gasoso. Entretanto, existem também caldeiras que aproveitam o calor dissipado por outros equipamentos, utilizando-se geralmente dos gases de escape liberados com a finalidade de recuperar a energia que seria desperdiçada, por esse fato são denominadas caldeiras de recuperação (BALESTIERI, 2008). As caldeiras convencionais podem existir como um conjunto denominado instalação de caldeiras, sendo fundamente composta pelo gerador de vapor, pela fornalha e por alguns outros acessórios. Os principais componentes presentes em um gerador de vapor de uma caldeira são as tubulações, os superaquecedores, os evaporadores e os economizadores (BALESTIERI, 2008). A seguir é apresentada uma ilustração que representa uma instalação de caldeiras com os aparatos citados anteriormente. 14 A figura acima representa uma caldeira de incineração de combustíveis sólidos, uma vez que ela dispõe de uma grelha de incineração. Além disso, esse sistema ilustra um tipo convencional de caldeiras denominado aquatubular. Como o próprio nome sugere, a água é bombeada pela tubulação enquanto os gases de combustão cruzam os feixes de tubo pela superfície externa, o que permite a troca de calor entre os fluidos de trabalho. Outro tipo de caldeira difundido é a flamotubular, que ao contrário da anterior, trabalha com os gases de combustão no interior dos tubos e a água em seu casco. A Figura 4 ilustra a configuração uma caldeira flamotubular. Figura 3: Representação de uma instalação de caldeiras [1]. 15 Figura 4: Caldeira flamotubular [2]. A seleção de uma caldeira aquatubular ou flamotubular depende da aplicação que se deseja suprir. Em geral, as caldeiras flamotubulares trabalham com pressões inferiores às aquatubulares, atingindo valores menores que 2,0 MPa para o vapor vivo, o que inviabiliza a utilização desse tipo de caldeira para sistemas de cogeração de energia. Já as aquatubulares alcançam condições de vapor vivo com pressões mais elevadas, aproximadamente 5,5 MPa, podendo até mesmo chegar a valores supercríticos para a água (28,0 MPa), sendo essa caldeira conhecida como supercrítica (BALESTIERI, 2008). 2.3. Caldeiras de Incineração de RSU Ambas as caldeiras, anteriormente citados, podem utilizar-se de combustíveis sólidos para a obtenção de vapor vivo, entretanto existem vantagens na seleção de uma ou de outra quando temos como objetivo a incineração do RSU. Em uma central de geração de energia a partir da queima de lixo, seja utilizando caldeira aquatubular ou flamotubular, as condições que os resíduos são incinerados nem sempre são controladas, muitas vezes os detritos apenas são recolhidos das residências pelo órgão responsável, armazenados e, posteriormente, queimados. Por esse motivo, os gases provenientes da combustão do RSU apresentam componentes extremamente corrosivos para os equipamentos, tais como: , , , , metais alcalinos e metais pesados, os quais são 16 capazes de formar cloretos com elevadas pressões de vapor, o que facilita a incrustação dos mesmos (RADEMAKERS, HESSELING e VAN DE WETERING, 2002). Nesse aspecto, as caldeiras flamotubulares se destacam, pois como os gases escoam pelos tubos não há corrosão do casco do equipamento, o que resulta em um menor custo de manutenção. Entretanto, esse tipo de caldeira, como já exposto anteriormente, não apresenta um ponto de operação que proporcione uma grande geração de energia elétrica, tornando a seleção de uma aquatubular economicamente atrativa em uma análise simplificada. A Figura 5 ilustra uma caldeira de incineração aquatubular com seus principais componentes. Figura 5: Representação de uma caldeira de incineração de RSU [3]. 17 Utilizando-se dessa imagem podemos compreender as etapas de troca térmica que uma caldeira de incineração de RSU está sujeita. Os itens marcados na Figura 5 encontram-se detalhados a seguir: 1. Zona de radiação: região na qual não se aproveita do calor dos gases de combustão, pois as elevadas temperaturas dos componentes presentes mantém uma atmosfera extremamente corrosiva. 2. Zona de convecção: local onde a agressividade dos gases atinge um nível mais aceitável para o início das trocas térmicas. 3. Superaquecedor: equipamento utilizado para superaquecer o vapor saturado proveniente do evaporador. 4. Evaporador: através de um conjunto de tambores, “tubulão e tubulinho” como são conhecidos, garante a evaporação completa da água do economizador pela movimentação do líquido e diferença de densidade da fase líquida para a gasosa, tendo como produto o vapor em estado saturado. 5. Economizador: apesar de não estar representada devidamente nessa figura, essa é a região na qual eles são instalados nas caldeiras. O economizador tem como objetivo realizar um pré-aquecimento da água do processo, proporcionando um melhor rendimento energético. Os gases após passarem pelo economizador devem ser direcionados para um sistema severo de tratamento, devido a grande concentração de toxinas nele presente, tais como as dioxinas e os furanos. Já o vapor superaquecido pode ser utilizado diretamente por uma turbina a vapor para a geração de energia elétrica ou prosseguir para uma caldeira de recuperação de um conjunto a gás, por exemplo, e apenas depois ser encaminhado para a turbina, formando um ciclo combinado de geração de energia elétrica. 18 2.4. Boas Práticas para a Incineração Independente se a caldeira de incineração seja usada para geração direta de energia elétrica ou se ela fizer parte de um ciclo combinado com uma turbina a gás, existem condições recomendadas quanto à temperatura de trabalho ao longo da troca térmica. De acordo com Korobitsyn, Jellema e Hirs (1999), as seguintes condições devem ser respeitadas: Durante a queima do RSU atingimos temperaturas de aproximadamente 1.000 ºC na zona de radiação, o que gera uma atmosfera extremamente corrosiva considerando os gases formados a partir da combustão do lixo. Então, para evitar um possível prejuízo estrutural do equipamento, é aconselhável posicioná-los de maneira que na entrada da zona de convecção a temperatura seja de 800 a 600 ºC; O vapor superaquecido gerado em uma caldeira de incineração de RSU pode atingir valores de até 4 MPa e 400 ºC, devido a eficiência energética das trocas térmica. Embora caso seja adotado a utilização de um ciclo combinado valores superiores, do ponto de vista energético, podem ser observados; Para que seja evitada a corrosão dos equipamentos e a deposição de componentes agressivos nas paredes das regiões de escoamento, é recomendado que temperaturas maiores de 200 ºC para os gases sejam garantidas após a passagem pelo economizador. Utilizando-se desses parâmetros e algumas outras considerações citadas ao longo deste trabalho podemos definir quais serão as condições para os gases de combustão durante a troca térmica na caldeira de incineração. 19 2.5. Incentivo a Incineração Tratando-se dos aspectos econômicos, existem leis que incentivam a geração de energia elétrica a partir de insumos energéticos, como a biomassa composta de resíduos sólidos urbanos. A resolução normativa nº 271, de 3 de julho de 2007 da ANEEL (Associação Nacional de Energia Elétrica), apresenta quais as condições que devem ser seguidas para tanto. A seguir está transcrito alguns trechos da resolução para uma melhor compreensão da mesma. Art. 1º Estabelecer, na forma desta Resolução, os procedimentos vinculados à redução das tarifas de uso dos sistemas elétricos de transmissão e de distribuição, aplicáveis aos empreendimentos hidrelétricos com potência igual ou inferior a 1.000 (mil) kW, para aqueles caracterizados como pequena central hidrelétrica e àqueles com base em fontes solar, eólica, biomassa ou cogeração qualificada, conforme regulamentação da ANEEL, cuja potência injetada nos sistemas de transmissão ou distribuição seja menor ou igual a 30.000 (trinta mil) kW, incidindo na produção e no consumo da energia comercializada pelos aproveitamentos. Art. 3º Fica assegurado o direito a 100% (cem por cento) de redução, a ser aplicado às tarifas de uso dos sistemas elétricos de transmissão e de distribuição, incidindo na produção e no consumo da energia comercializada pelos empreendimentos a que se refere o art. 1º desta Resolução, desde que atenda a uma das seguintes condições: IV – aqueles que utilizem como insumo energético, no mínimo, 50% (cinquenta por cento) de biomassa composta de resíduos sólidos urbanos e/ou de biogás de aterro sanitário ou biodigestores de resíduos vegetais ou animais, assim como lodos de estações de tratamento de esgoto. Desta forma, a utilização de caldeiras de incineração aquatubular em ciclo combinado seria a escolha mais sensata, uma vez que essa configuração apresenta um possível ponto de operação do vapor vivo com uma carga energética superior a do ciclo simples de incineração. Além disso, a queima de outro combustível com um maior poder calorífico em um conjunto a gás garantiria um melhor equilíbrio econômico na geração de energia elétrica. 20 2.6. Dioxinas e Furanos Um dos principais pontos negativos da incineração do RSU são as toxinas liberadas pela queima do combustível, como já dito anteriormente, sendo que fundamentalmente duas delas destacam-se: as dioxinas e os furanos. De acordo com Pesquero (1999), as dibenzo-p-dioxinas policloradas (PCDD - polychlorinated-p-dibenzodioxins) e os dibenzo-furanos policlorados (PCDF - polychlorinated-p-dibenzofurans), comumente chamadas de dioxinas e furanos, são duas classes de compostos aromáticos tricíclicos, de função éter, com estrutura quase planar e que possuem propriedades físicas e químicas semelhantes. Quanto à origem dessas toxinas, Pesquero (1999) expõe que esses componentes não são formados naturalmente, e sim frutos da era industrial, em especial o século XX. A formação desse subproduto não intencional ocorre em vários processos envolvendo o cloro ou substâncias e/ou matérias que o contenham, como é o caso da incineração do lixo. De acordo com Milligan (1993) e Dickson (1987), as sequências de reações de formação dos PCDD e PCDF não são bem entendidas ou conhecidas, existindo três teorias básicas que têm sido propostas para a ocorrência desses compostos em incineradores de resíduos sólidos municipais. Dessas três teorias, a que se destaca é a de que esses compostos podem ser formados através de reações elementares entre carbono, hidrogênio, oxigênio e cloro. De acordo com a USEPA (1993), a incineração de RSU é a principal fonte de dioxinas com maior grau de toxidade. A USEPA (1993) realizou uma análise tendo como base a toxidade equivalente (TEQ) das dioxinas formadas por diversos processos, sendo que a dioxina mais tóxica é classificada com o índice 1 e conforme diminui-se a periculosidade da substância esse valor é reduzido. A Tabela 1 apresenta as principais fontes e a relativa parcela de toxidade equivalente gerada por cada uma delas. 21 Tabela 1: Participação das diversas fontes de emissão de dioxinas e furanos. Fonte Participação (%) Incineração de lixo municipal 60,18 Incineração de resíduos de serviços de saúde 10,88 Fornos de produção de cimento com queima de resíduos perigosos 7,85 Queima de carvão residencial 3,85 Fundição secundária de alumínio 3,16 Outras incinerações biológicas 2,64 Termelétrica a carvão 2,47 Outras fontes 2,36 Queima de madeira e de resíduos de madeira na indústria 1,86 Incêndios florestais e queima prescrita 1,57 Veículos automotores “on-road” 1,57 Fornos de produção de cimento sem queima de resíduos perigosos 0,99 Tratamento e preservação de madeira 0,63 Para evitar a formação de dioxinas e furanos em uma caldeira de incineração Puna e Baptista (2008) consideram importante o controle da temperatura e do tempo de arrefecimento dos gases provenientes da queima do RSU, o qual não deve ultrapassar um limite de 2 a 5 segundos, que para Milligan (1993) e Dickson (1987) essa é a razão da não formação de dioxinas e furanos nessa primeira etapa, devido a temperaturas elevadas o suficiente para eliminar os PCDD e PCDF (acima de 900 ºC). Esse processo acontece na câmara primária da combustão, a zona de radiação; apenas após essa ponto é possível iniciar a troca térmica nos equipamentos presentes em uma caldeira. De acordo com Puna e Baptista, para o tratamento dos gases de combustão são necessários processos físico-químicos para cada componente específico. O Quadro 1 expõe quais os tratamentos disponíveis de acordo com os poluentes. 22 Quadro 1: Processos físico-químicos utilizados no tratamento dos gases de exaustão de uma incineradora de RSU. Componente Técnica Utilizada NOx Remoção seletiva não catalítica com a injeção de solução aquosa de amônia na câmara de combustão. HF, HCl, SO2 Injeção de leite de cal (Ca(OH)2). Dioxinas, Furanos, PCB’s, Metais pesados Injeção de carvão ativado. CO, COV’s Fornecimento de O2 na câmara de combustão em excesso. Outras partículas Filtros de manga. Fonte: Puna e Baptista, 2008. De acordo com o Quadro 1, fica evidente a existência de métodos de combate à formação de toxinas provenientes da combustão do RSU. Entretanto, caso os mesmos não sejam aderidos, a exposição a esses gases torna-se prejudicial à saúde, podendo causar inúmeros problemas, tais como cânceres, efeitos reprodutivos e no desenvolvimento, deficiência imunológica, disrupção endócrina incluindo diabetes mellitus, níveis de testosterona e do hormônio da tiroide alterados, danos neurológicos incluindo alterações cognitivas e comportamentais em recém-nascidos de mães expostas à dioxina, danos ao fígado, elevação de lipídios no sangue, o que se constitui em fator de risco para doenças cardiovasculares e danos à pele (APHA, 1995). 23 3 METODOLOGIA Como nesse trabalho se pretende estimar as dimensões dos principais equipamentos de um gerador de vapor associado a um incinerador, foram utilizados fundamentalmente três livros para essa tarefa: Fundamentos de Transferência de Calor e de Massa (5ª edição), Incropera F. P. e DeWitt D. P.; Fundamentos da Termodinâmica (6ª edição), Sonntag R. E., Borgnakke C. e Van Wylen G. J.; Heat Exchanger Design Handbook, Hewitt G. F.; sendo estas referências mais adequadamente citadas na seção de referências bibliográficas. 3.1. Algumas Considerações Inicialmente é necessário estimar valores de algumas propriedades dos gases de combustão do RSU para que seja possível realizar o balanço de massa nos equipamentos, obtendo-se as condições de operação. Desta forma, a primeira aproximação que deve ser obtida é a da composição química do lixo, pois através do balanceamento químico são calculadas outras propriedades, tais como o poder calorífico superior e inferior, e o calor específico. De acordo com Cohen (2004), uma aproximação válida para a composição química do lixo é a C6H10O4, sendo ela utilizada para os cálculos seguintes. Além disso, para a combustão do lixo é aconselhável um valor de excesso de ar, tal que reduza a formação de monóxido de carbono e outras toxinas. Para Rogaume (2002) um valor aceitável é o de um excesso na ordem de 150% de ar, tendo como consequência a seguinte equação balanceada: 24 A partir dessa equação, e com auxilio de outras expressões, é possível estimar os valores do PCI, PCS e calor específico. Matelli (2012) diz que para a queima de combustíveis sólidos ou líquidos uma boa aproximação do poder calorifico superior e inferior é: Entretanto, os detritos recolhidos nos municípios encontram-se úmidos, portanto existe uma umidade relativa a ser considerada. Para Statheropoulos (2005) essa umidade é da ordem de 50% em massa, ou seja, em cada quilograma de lixo úmido existem 500 g de água. Aproximando esse valor como 50% foi obtido um valor de PCS e PCI de 9.815 kJ/kg e 7.868 kJ/kg, respectivamente, sendo que de acordo com Bolognesi (2010) o PCI do lixo pode ser considerado 1.900 kcal/kg, aproximadamente 7.950 kJ/kg, o que é coerente com as considerações realizadas. Outro parâmetro a ser estimado é o calor específico, para tanto foi considerado que os gases de combustão têm o comportamento de gases perfeitos podendo ser utilizada a Eq. (3): , onde: θ = T (Kelvin)/1000 e , , e constantes (VAN WYLEN, SONNTAG E BORGNAKKE, 2003). A Eq. (3) fornece o valor do calor específico dos componentes isolados dos gases, sendo que para uma generalização deve ser feita uma espécie de média ponderada de cada calor específico em função da sua fração mássica. Para Balcazar, Dias e Balestieri, (2012) o calor específico dos gases de combustão do RSU é de 1,143 kJ/kg.K, o que aproxima-se dos valores encontrados com a utilização das equações anteriores. Na Figura 6 é representada a variação do calor especifico para os gases de combustão de RSU de acordo com a temperatura dos mesmos. (1) (2) (3) 25 Figura 6: Calor específico dos gases de combustão em função da temperatura. Desta forma, as propriedades requeridas para a realização de um balanço de massa estão quase definidas, restando apenas saber qual a quantidade de lixo que será queimada e até qual condição de vapor vivo deseja-se atingir. 3.2. Balanço de Massa e Energia Uma proposta foi submetida à revista Energy por Balcazar, Dias e Balestieri (2012) para a aplicação de um ciclo combinado, turbina a gás e incinerador de RSU, com objetivo de gerar energia elétrica em uma cidade de médio porte. Tal proposta considera a atual situação do lixo na cidade de São José dos Campos e fornece valores estimados das temperaturas da água ao longo de uma caldeira de incineração, além da quantidade de RSU incinerado por dia nessa cidade. Os valores apresentado na Tabela 2 correspondem a essas condições propostas de algumas propriedades da água, de acordo com a Figura 7. 26 Figura 7: Pontos intermediários em uma caldeira de incineração. Tabela 2: Condições da água em cada ponto de uma caldeira de incineração. Fluido [kg/s] P [MPa] T [ºC] x [ - ] h [kJ/kg] s [kJ/kg.K] 1 Líquido Comprimido 10,92 5,17 105,6 - 442,7 1,370 2 Água Saturada 10,92 4,91 262,8 0 1.148,9 2,910 3 Vapor Saturado 10,92 4,67 256,6 1 2.798,1 6,025 4 Vapor Superaquecido 10,92 4,43 443,0 - 3.309,2 6,863 Balcazar, Dias e Balestieri (2012) estimaram uma queima diária de 388 toneladas de lixo para alcançar essa situação, considerando para tanto dados fornecidos pelo IBGE (2010). A partir das informações acima citadas foi realizado um balanço de energia para averiguar quais as condições dos gases durante a troca térmica, tais informações encontram-se no Tabela 3. 27 Tabela 3: Condições dos gases em cada ponto de uma caldeira de incineração. [kg/s] [kJ/kg.K] T [ºC] ga 73,12 1,203 730,0 gb 73,12 1,186 646,7 gc 73,12 1,115 378,8 gd 73,12 1,084 264,6 Para esse cálculo foi considerado que apenas 75% do calor proveniente dos gases é trocado efetivamente com a água. Como já exposto anteriormente, a temperatura na entrada da zona de convecção deve estar entre 800 e 600 ºC, sendo nesse caso foi adotado 730 ºC, de acordo com a proposta de incineração de São José dos Campos (SJC, 2011). Com essas informações foi elaborado um gráfico representativo para a troca térmica (Figura 8). Figura 8: Transferência térmica em uma caldeira de incineração. Fica evidente nesse gráfico o valor da temperatura de pinch-point, tendo a mesma o valor de 116 ºC. Em aplicações gerais essa variação encontra-se na faixa de 10 a 30 ºC para que haja um bom aproveitamento energético (BALESTIERI, 2012), entretanto para o caso de 28 uma caldeira de incineração de RSU a importância do controle de temperatura dos gases de combustão torna tal consideração secundária, uma vez que a principal recomendação é que a temperatura dos gases na chaminé supere 200 ºC (KOROBITSYN, JELLEMA e HIRS, 1999). 3.3. Pré-dimensionamento A primeira etapa da estimativa das dimensões de um trocador de calor é definir quais as condições de entrada e saída dos fluidos de trabalho desse equipamento. A partir das Tabelas 2 e 3 ficam definidas essas condições para a caldeira de incineração considerada. Com o objetivo de pré-dimensionar o superaquecedor, o evaporador e o economizador esses equipamentos serão aproximados a trocadores de calor do tipo casco e tubo, passando a água pelos tubos e os gases pelo casco. Hewitt (2008) aconselha a utilização de um gráfico prático para estimar quais as principais dimensões desse tipo de trocador de calor em função da área de troca térmica, entretanto é preciso estimar o coeficiente global de transferência térmica para obter um valor inicial da área para cada equipamento. De acordo com Korobitsyn et al. (1999) esse parâmetro pode ser aproximadamente 65, 55 e 35 W/m².K, para o economizador, evaporador e superaquecedor, respectivamente. Desta forma, utilizando-se do Método da DMLT (Média Logarítmica da Diferença de Temperatura) é calculada a primeira estimativa de área para os equipamentos. Os valores das áreas encontradas por esse método encontram-se na Tabela 4. Tabela 4: Áreas iniciais dos equipamentos. Área Inicial (A0) [m²] Economizador 1.153,5 Evaporador 1.938,9 Superaquecedor 637,4 Essa ferramenta gráfica sugerida por Hewitt (2008) considera uma geometria padrão dos feixes de tubo e um valor de diâmetro para o mesmo, sendo essa configuração a mais utilizada para trocadores casco e tubo: triangular (30º) e ¾ de polegada. Existe a possibilidade da utilização de configurações diferentes; para tanto uma correção de acordo com as mudanças é necessária. Para os trocadores estudados foi considerada uma alteração no 29 diâmetro dos tubos e no passo, totalizando um fator de correção para o gráfico de 1,89, definindo as áreas corrigidas, apresentadas na Tabela 5. Tabela 5: Áreas corrigidas dos equipamentos. Área Corrigida (Ac) [m²] Economizador 2.180,1 Evaporador 3.664,5 Superaquecedor 1.204,7 Com o valor corrigido da área, utilizando-se do gráfico apresentado na Figura 9 é possível definir o comprimento útil dos tubos e o diâmetro interno do casco do trocador (HEWITT, 2008). Figura 9: Diâmetro do casco e comprimento útil dos tubos em função da área de troca térmica. 30 A partir da de área de troca térmica, do comprimento útil dos tubos e diâmetro dos mesmos é possível calcular qual o número de tubos será utilizado em cada trocador. Outro ponto importante é que com a geometria definida do equipamento, o valor do coeficiente global de transferência térmica pode ser calculado, e não estimado como realizado anteriormente. Para esse cálculo são necessárias as informações de algumas propriedades dos gases de combustão, tais como: a viscosidade, a massa específica e o número de Prandlt. Como o objetivo desse trabalho é estimar a área dos equipamentos, as propriedades dos gases serão aproximadas às do ar, pois existe uma semelhança entre as frações mássicas dos elementos presentes em cada fluido. Após obter um novo valor de U, deve ser iniciado um processo de iterações a fim de que o coeficiente global calculado aproxime-se do inicialmente utilizado para o cálculo da área do equipamento. Ou seja, deve ser calculada uma nova área com o valor do U encontrado e com essa área é feito uma verificação se aquele coeficiente global de transferência próximo do que foi utilizado para calculá-la. 3.4. Exemplo de Cálculo Para melhor compreensão de como foi realizado o cálculo das áreas dos equipamentos estudados será apresentado a seguir como exemplo o dimensionamento do economizador da caldeira de incineração de RSU. A Tabela 6 informa as condições dos fluidos para as entradas e saídas do economizador, conforme a Figura 7. Tabela 6: Balanço de Energia do Economizador. Fluido [kg/s] P [MPa] T [ºC] x [ - ] h [kJ/kg] s [kJ/kg.K] 1 Líquido Comprimido 10,92 5,17 105,6 - 442,7 1,370 2 Água Saturada 10,92 4,91 262,8 0 1.148,9 2,910 gc Gases de Combustão 73,12 - 378,8 - - - gd Gases de Combustão 73,12 - 264,6 - - - 31 Como já dito anteriormente, foi considerado que 25% do calor proveniente dos gases de combustão não serão aproveitados no processo de geração de vapor, desta forma realizando-se um balanço de energia no economizador tem-se que: o balanço de energia no trocador de calor é dado pela Eq. (4). Substituindo-se os valores da Tabela 6 na Eq. (4) obtém-se que o calor fornecido para a água pelos gases é de 11,2 MW. A partir dessa informação, das condições de temperaturas dos gases calculadas utilizando-se do calor específico dos mesmos, e do coeficiente de transferência global encontrado na literatura ou estimado, no caso 65 W/m².K, é possível estimar um primeiro valor da área do equipamento utilizando-se do Método da DMLT, como representado na Eq. (5). Tendo como objetivo um pré-dimensionamento, a constante que depende de tipo de escoamento será considerada 1,0. Sendo que, de acordo com Hewitt (2008), a faixa de trabalho é dessa constante varia de 0,8 a 1,0. A diferença de temperatura logarítmica é calculada com a Eq. (6). Desta forma, fica definida a área inicial do equipamento. Entretanto, para a utilização da Figura 9 é necessário que haja uma correção conforme as considerações quanto arranjo dos tubos, número de passes nos tubos e tipo de construção do layout e feixe dos tubos. Para o caso em questão, a área inicial sem correções era de 1153 m², aproximadamente, mas quando consideramos correções esse valor pode aumentar significativamente, uma vez que: (4) (5) (6) (7) 32 Os valores dos fatores de correção anteriormente citados podem ser encontrados no livro Heat Exchanger Design Handbook (Hewitt, 2008), devendo ser realizada uma interpolação ou extrapolação para casos não tabelados. Para a geometria considerada foi extrapolado da Tabela 7 apresentado por Hewitt (2008), um valor de F1 igual a 1,89, e os parâmetros F2 e F3 foram considerados 1,00, uma vez que de acordo com Hewitt (2008) para diâmetros do casco maiores que 1,22 com apenas 2 passes nos tubos o valor de F2 é aproximadamente 1,00, assim como F3 assume esse mesmo valor para trocadores de calor com feixe de tubos fixos. Ou seja, como foi adotado que os trocadores de calor apresentam tubos de 1” de diâmetro com 1.1/2” de espaçamento, layout de 30º, com no máximo 2 passes nos tubos e construção de tubos fixos, o valor do produto dos parâmetros obtido foi de 1,89. Desta forma, uma área consideravelmente maior que a inicial é encontrada, o que evidencia a necessidade de realizar tal correção. A dimensão calculada para a área corrigida para o início das iterações é de 2180 m², aproximadamente. Tabela 7: Valor de F1 para vários diâmetros dos tubos e layouts. Diâmetro Externo dos Tubos [mm] Passo dos Tubos [mm] Layout F1 15,9 20,6 30º 0,90 15,9 20,6 45º, 90º 1,04 19,0 23,8 30º 1,00 19,0 23,8 45º, 90º 1,16 19,0 25,4 30º 1,14 19,0 25,4 45º, 90º 1,31 25,4 31,8 30º 1,34 25,4 31,8 45º, 90º 1,54 O processo de iterações se inicia quando se verifica, com auxílio da Figura 9, qual o comprimento útil dos tubos do trocador e qual o diâmetro interno do casco do equipamento. Com essas informações os cálculos agora devem ter como objetivo encontrar um novo valor de coeficiente global de transferência para a condição definida para o trocador, de tal forma que esse processo só acaba quando o valor encontrado for próximo, com certa tolerância, do que foi utilizado para definir aquela configuração para o equipamento. No caso do economizador, a configuração inicial encontrada foi que o diâmetro interno do casco teria 1,68 m e o comprimento útil dos tubos seria de 10 m. Com o comprimento útil, 33 o diâmetro externo dos tubos e a área corrigida é possível encontrar o número de tubos do trocador de calor. Além disso, as condições de layout dos feixes de tubo já foram definidas o que possibilita o início do cálculo do coeficiente global de transferência. Para o cálculo do U, é preciso inicialmente encontrar o valor do coeficiente de convecção para ambos os fluidos. Como o escoamento da água ocorre no interior dos tubos, a teoria de escoamento interno a tubos apresentada por Incropera (2002) é suficiente para calcular esse valor. Incropera (2002) apresenta também um método para calcular o coeficiente de convecção para feixes de tubos. O primeiro passa para o cálculo do coeficiente de convecção para a água é o cálculo do número de Reynoldys. Como a vazão é conhecida, as temperaturas de entrada e saída, e o diâmetro do tubo do trocador, tal número é facilmente calculado pela Eq. (8). As propriedades da água são apresentadas na Tabela A.6 (pág. 661) de Incropera (2002) e os diâmetros recomendados dos tubos de trocadores de calor encontram-se na Tabela 5 (seção 3.3.5 – pág. 4) de Hewitt (2008). Como já dito anteriormente o diâmetro considerado foi de 1”, desta forma fica a critério de quem projeta o equipamento a escolha da espessura dos tubos do trocador. Para esse trabalho foi selecionado o tubo de 1” BWG 16 e a partir dele foi encontrada uma vazão de aproximadamente 1,14x10-2 m³/s, para o número de tubos do equipamentos. Vale lembrar que o número de tubos do trocador é função da área que o mesmo necessita para garantir a troca térmica. A partir da vazão e a área da seção dos tubos é determinada à velocidade na qual o fluido escoa em seu interior, consequentemente determinando o número de Reynolds. Como as condições de entrada e de saída não são as mesmas foi considerado o caso crítico, ou seja, menor Reynolds, pois desta forma o equipamento será superdimensionado e não subdimensionado. No caso do economizador foi encontrado um número de Reynolds de aproximadamente 900, o que caracteriza um escoamento laminar. Após o cálculo do número de Reynolds é preciso calcular o número de Nusselt. Para tanto, foi realizado primeiro o cálculo do comprimento hidrodinâmico e termodinâmico de entrada pelas Equações 9 e 10. (8) 34 (11) (12) Para esse caso de escoamento os comprimentos hidrodinâmico e termodinâmico são respectivamente 1,0 e 1,5 metros, o que pode ser aproximado a um comprimento de entrada combinado; desta forma, a expressão utilizada para o cálculo do número de Nusselt foi a Eq. (11). Como NuD = h.D/kf o valor do coeficiente de convecção da água “h” é encontrado, faltando apenas calcular esse coeficiente para os gases de combustão. Entretanto, o escoamento dos gases é externo aos tubos, o que caracteriza um escoamento através de feixes de tubos. Usando-se da teoria presente em Incropera (2002) para esse tipo de situação, é possível obter o coeficiente de convecção dos gases de combustão. A primeira etapa desse cálculo é verificar o local em que a velocidade de escoamento dos gases é máxima, pois as áreas de escoamento podem diferir quando o fluido escoa por entre dois tubos de uma mesma fileira e dois tubos de fileiras distintas. Após essa etapa, deve-se calcular o número de Reynolds utilizando-se da mesma expressão que o escoamento interno. Já para o cálculo do número de Nusselt foi utilizada à Eq. (12). Assim como para escoamento interno, para o escoamento entre feixes de tubos a expressão para determinar o coeficiente de convecção é a mesma. Desta forma, todos os parâmetros necessários para o cálculo do coeficiente global de transferência térmica são conhecidos e utilizando-se da Eq. (13) é possível determiná-lo. Vale salientar que como o objetivo é apenas um pré-dimensionamento não será considerado nenhum tipo de resistência a troca térmica devido à incrustação de partículas nas paredes dos tubos. (9) (10) 35 (13) Com os resultados dos coeficientes e adotando-se um material para a tubulação ficam definidos os parâmetros necessários para o cálculo do coeficiente global de transferência do economizador. A partir desse novo valor é encontrada uma nova área que caso seja próxima da área corrigida os valores considerados estão corretos, caso contrário essa nova área deve ser tratada como corrigida e o processo se reinicia, sendo que para esse trabalho, o critério de convergência utilizado foi |U’n+1 – U’n|/U’n+1 5.10-2. 36 4 DISCUSSÕES FINAIS Através desse método foi possível estimar uma área para os equipamentos do gerador de vapor de uma caldeira de incineração de RSU. Os resultados encontrados para cada área encontram-se no Tabela 8. Tabela 8: Valores das áreas estimadas para cada equipamento. U0 [W/m².K] Ac [m²] U’n [W/m².K] A’n [m²] U’n+1 [W/m².K] A’n+1 [m²] Economizador 65,0 2.180,1 223,2 634,9 225,1 629,4 Evaporador 55,0 3.664,5 129,4 1.557,6 132,3 1.523,0 Superaquecedor 35,0 1.204,7 110,9 380,2 113,2 372,4 O coeficiente global de transferência térmica considerado por Korobitsyn et al. (1999) é consideravelmente menor quando comparado com os calculados, porém a ordem de grandeza dos resultados foi considerada satisfatória, uma vez que não foi exposto por Korobitsyn et al. (1999) quais as condições geométricas para essa aproximação. Um ponto que poderia ser trabalhado para melhoria dos resultados seria quanto às propriedades dos gases de combustão, o que traria uma maior segurança para os cálculos. Como a área de cada equipamento é função de seu coeficiente global de transferência térmica, os resultados apresentam um valor relativamente inferior ao utilizando o coeficiente inicial. Entretanto, para confirmar os cálculos das áreas seria interessante utilizar de outra metodologia, o Método da Efetividade NUT, sendo possível realizar uma comparação dos dois métodos. Aparentemente, a implantação de uma caldeira de incineração fazendo parte de um ciclo combinado com uma turbina a gás é um proposta interessante, uma vez que incentivos financeiros são fornecidos pela legislação em vigor, auxiliando na viabilidade econômica do projeto. Devido à redução significativa na massa e no volume do lixo o controle do encaminhamento do mesmo para locais específico de armazenamento e tratamento ocorreria de maneira mais simples. O maior obstáculo para a implantação de uma caldeira de incineração seriam os gases tóxicos emitidos pela queima do lixo, entretanto existem propostas de tratamento para os mesmos. Desta forma, o principal problema seria a negligência na realização desses tratamentos, sendo que a fiscalização de uma central de geração de energia a partir de RSU 37 dever ser realizada de maneira severa, uma vez que a exposição aos gases emitidos pela queima do lixo pode causar problemas à saúde pública. Portanto, a implantação ou não de uma caldeira de incineração de RSU é uma questão complicada, pois a viabilidade econômica não é o único parâmetro de avaliação a ser ponderado. 38 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BALCAZAR, Juan Galvarino Cerda; DIAS, Rubens Alves; BALESTIERI, José Antonio Perrella. Analysis of gas turbine and waste incinerator integration for medium-sized cities. Energy. 2012. BALESTIERI, José Antonio Perrella. Máquinas Térmicas: Material de apoio à disciplina. Guaratinguetá, 2008. BOLOGNESI, Antonio. A Geração de Energia a partir do lixo: Perspectivas no Estado de São Paulo. São Paulo, 2010. PUNA, Jaime Filipe Borges; BAPTISTA, Bráulio Dos Santos. 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Objetivo 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1. Histórico 2.2. Caldeiras 2.3. Caldeiras de Incineração de RSU 2.4. Boas Práticas para a Incineração 2.5. Incentivo a Incineração 2.6. Dioxinas e Furanos 3 METODOLOGIA 3.1. Algumas Considerações 3.2. Balanço de Massa e Energia 3.3. Pré-dimensionamento 3.4. Exemplo de Cálculo 4 DISCUSSÕES FINAIS 5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS