Oscar Andrés Hincapié Marín Análise comparativa das relações entre áreas metropolitanas e bacias hidrográficas: os casos das bacias hidrográficas do rio Cali, na Colômbia, e Piraquara, na Região Metropolitana de Curitiba, Brasil Imagem da Região Metropolitana de Curitiba. Revista COMEC (2015) Presidente Prudente, SP 2017 Oscar Andrés Hincapié Marín Análise comparativa das relações entre áreas metropolitanas e bacias hidrográficas: os casos das bacias hidrográficas do rio Cali, na Colômbia, e Piraquara, na Região Metropolitana de Curitiba, Brasil Tese de Doutorado apresentado ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Unesp, Campus de Presidente Prudente, para a obtenção do título de Doutor em Geografia. Agência financiadora: CAPES Orientação: Prof. Dr. Arthur M. Whitacker Presidente Prudente, SP 2017 Ficha catalográfica elaborada pela Secção Técnica de Aquisição e Tratamento da informação – Diretoria Técnica de Biblioteca e Documentação – UNESP, Campus de Presidente Prudente Marín, Oscar Andrés Hincapié. M289a Análise comparativa das relações entre áreas metropolitanas e bacias hidrográficas. Os casos das bacias hidrográficas do rio Cali, na Colômbia, e Piraquara, na Região Metropolitana de Curitiba / Oscar Andrés Hincapié Marín. - Presidente Prudente : [s.n], 2017 272 f. : il. Orientador: Arthur Magon Whitacker Tese (doutorado) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Tecnologia Inclui bibliografia 1. Rio Piraquara. 2. Rio Cali. 3. Gestão hídrica. 4. Bacias hidrográficas. 5. Áreas Metropolitanas. 6. Planejamento territorial I. Whitacker, Arthur Magon. II. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências e Tecnologia. III. Título. Claudia Adriana Spindola CRB-8a/5790 A Maria Camila Arango Granados, a tus ojos, a nuestra história de amor A mi madre, Lucina Marín Torres, mi ejemplo de fortaleza y emprendimiento AGRADECIMENTOS À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES/CNPq) do Brasil, e o seu Programa de Estudante-Convênio de Pós-Graduação (PEC-PG), pelo apoio financeiro para a realização deste trabalho. À Coordenação do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista, Júlio de Mesquita Filho, FCT/UNESP, Campus de Presidente Prudente, e todos os que fazem parte dela, especialmente para Cinthia, Aline, André, Leonardo e Ivonette. Ao meu orientador e grande amigo Dr. Arthur M. Whitacker, por sua orientação e disposição assídua, desde o começo da pesquisa. Agradeço especialmente ao professor Dr. Antonio Cezar Leal, pelo constante apoio e motivação pessoal. Levarei comigo as palavras que melhor o representam: “Combinado meu amigo! “. Agradeço imensamente a Lia, esposa do Cezar. Muito obrigado por me acolher na sua casa e na sua família! Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Geografia da FCT/UNESP, pela disposição às consultas e os ensinamentos dentro e fora das salas de aula. Ao Instituto das Águas do Paraná - AGUASPARANÁ, especialmente a Marianna Sophie Roorda, pelas indicações na procura de informação. À Companhia de Saneamento do Paraná SANEPAR, em especial ao engenheiro José Roberto da Conceição, pelo apoio institucional no fornecimento de informações. A la Corporación Autónoma Regional del Valle del Cauca (CVC) por la disponibilización de informaciones cartográficas e hidrometeorológicas. Agradecimiento especial para el ingeniero Álvaro Calero. Aos companheiros do Grupo de Pesquisa Gestão Ambiental e Dinâmica Socioespacial (GADIS) pelos cafés com trocas de ideias: Ana Paula, Roberta, Fernanda, Fred, Dani, Bruna, Beatriz, Wilson, Taissa, Gloria. Aos colegas do Grupo de Pesquisa Produção do Espaço e Redefinições Regionais (GASPER). Àquelas pessoas maravilhosas que eu conheci e com as quais compartilhei momentos agradáveis durante minhas viagens pelo Brasil: Liriane Gonçalves, Larissa Pifer, Priscila Engel, Carla Hentz, Renata Cardoso, Paulo Roberto, Josué, Afonso, Chico. Aos meus grandes parceiros brasileiros Rodrigo Vitor, Eduardo Neves e Aurélio. A mi madre por el inconmensurable apoyo moral, económico y logístico. A Camila por todo el amor brindado, por el apoyo y por las palabras de aliento en los momentos de mayor dificultad. Por último y no menos imporante, agradezco especialmente el apoyo emocional y professional de mi padre, de mi hermana Diana, de Duberly, de mi sobrino Juán José y de mi primo y hermano Wilo. A todos ustedes, que con sus actos y palabras han hecho parte activa de este proceso, muchas gracias!! RESUMO O crescimento demográfico e de população urbana da América do Sul se reflete no aumento de conurbações, na consolidação de áreas metropolitanas e no incremento das demandas de infraestrutura urbana e de recursos. Neste sentido, os processos eficientes de planejamento e de gestão de bacias hidrográficas, contribuem substancialmente para a consolidação e desenvolvimento de contextos de bens e serviços. Há uma estreita relação entre o desenvolvimento de áreas metropolitanas e a gestão dos sistemas hierárquicos das bacias hidrográficas. O presente trabalho apresenta uma proposta metodológica para avaliar a relação entre a funcionalidade das bacias hidrográficas e a conformação de duas áreas metropolitanas, no Brasil e na Colômbia, mediante uma análise comparativa dos arcabouços normativos e institucionais aplicados. Para isso, seguindo o modelo Pressão-Estado-Resposta, foram selecionadas três variáveis de pressão nas bacias (mudanças nas coberturas das terras, usos urbanos em fundos de vale, variabilidade climática) e quatro variáveis de estado (abastecimento de água, perda de solos, produção de serviços ecossistêmicos, estrutura ecológica da paisagem fluvial). Seguidamente, se avaliou e comparou os mecanismos de resposta normativa e institucional metropolitanos. Entre os resultados, se destaca uma abundante normativa, em ambos casos, focada na proteção das bacias com objetivos de produção hídrica, mas insuficientes para controlar as ocupações irregulares, decorrentes da especulação imobiliária das metrópoles. No caso brasileiro há uma relação mais coesiva entre a funcionalidade das microbacias abastecedoras e a projeção do desenvolvimento metropolitano, inserido em um sistema de gestão hídrico maior, concluindo-se que, o sucesso dessa integração está relacionado, entre outros fatores, com o cumprimento das funções institucionais por componentes ambientais e não por jurisdições territoriais, como no caso da Colômbia. Palavra chave: Rio Piraquara. Rio Cali. Bacias Hidrográficas. Gestão Hídrica. Planejamento Territorial. Áreas Metropolitanas RESUMEN El crecimiento demográfico y de población urbana de América del Sur se refleja en el aumento de conurbaciones, en la consolidación de áreas metropolitanas y en el incremento de demandas de infraestructura y de recursos. En este sentido, los processos eficientes de planificación y gestión de cuencas hidrográficas contribuyen substancialmente a la consolidación y desarrollo de los contextos metropolitanos mediante la provición de bienes y servicios, es decir, hay una estrecha relación entre el desarrollo de áreas metropolitanas y la gestión de los sistemas jerarquicos de las cuencas hidrográficas. El presente trabajo presenta una propuesta metodológica para evaluar las relaciones entre la funcionalidade de las cuencas hidrográficas y la conformación de dos áreas metropolitanas, en Brasil y Colombia, mediante un análisis comparativo de las estructuras normativas e institucionales aplicadas para cada caso. Para eso, con base en el modelo Presión-Estado-Respuesta se seleccionaron tres variables de presión sobre las cuencas (cambios en las coberturas de la tierra, usos urbanos en los fondos de valle, variabilidad climática) y cuatro variables de estado (abastecimiento de agua, perdida de suelos, producción de servicios ecosistémicos, estrutura ecológica del paisaje fluvial), seguidamente se evaluacon y compararon los mecanismos de respuesta normativa e institucional metropolitana. Entre los resultados de la comparación se destaca la abundante normatividade, en los dos casos, respecto a la protección de las cuencas con objetivos de producción hídrica, pero insuficientes para controlar, por ejemplo, las ocupaciones irregulares resultantes de la especulación inmobiliária propia de las metrópoles. En el Brasil hay una relación más cohesiva entre la funcionalidade de las microbacias abastecedoras y las projecciones del desarrollo metropolitano, que a su vez hacen parte de un sistema de gestión hídrica mayor. Estos resultados permiten concluir que el éxito de la integración entre los dos contextos está relacionado, entre otros, con el cumplimiento de las funciones institucionales por componentes ambientales y no por jurisdicción territorial como se realiza en Colombia. Palabras clave: Rio Piraquara. Rio Cali. Cuencas Hidrográficas. Gestión Hídrica. Planificación Territorial. Áreas Metropolitanas ABSTRACT The demographic and urban population growth of South America is reflected in the increase of conurbations, in the consolidation of metropolitan areas and in the increase of demands of infrastructure and resources. In this sense, efficient watershed management processes contribute substantially to the consolidation and development of metropolitan contexts through the provision of goods and services, that is, there is a close relationship between the development of metropolitan areas and the management of the hierarchical systems of the watersheds. This research presents a methodological proposal to evaluate the relationship between watershed functionality and the conformation of two metropolitan areas, in Brazil and Colombia, through a comparative analysis of the normative and institutional structures applied for each case. For that, based on the Pressure-State-Response model, three pressure variables were selected about basins (changes in land cover, urban uses in valley bottoms, climatic variability) and four state variables (supply of water, soil loss, production of ecosystem services, ecological structure of the river landscape), then the metropolitan normative and institutional response mechanisms were evaluated and compared. Among the results of the comparison, there is an abundance of normativity, in both cases, regarding the protection of watersheds with water production objectives, but insufficient to control, for example, the irregular occupations resulting from real estate speculation typical of the metropolises. In Brazil there is a more cohesive relationship between the functionality of the supplying microbasins and the projections of metropolitan development, which in turn are part of a larger water management system. These results allow us to conclude that the success of the integration between the two contexts is related, among others, to the fulfillment of the institutional functions by environmental components and not by territorial jurisdiction as it is done in Colombia. Keywords: Piraquara River. Cali River. Watersheds. Water Management. Territorial Planning. Metropolitan Areas LISTA DE FIGURAS Figura 1. Região Nino 3.4 no Oceano Pacifico Central ............................................ 22 Figura 2. Características dos leitos dos rios ............................................................ 36 Figura 3. Esquema dos três pressupostos metodológicos ....................................... 48 Figura 4. Direção da associação entre variáveis ..................................................... 53 Figura 5. Esquema geral de processos ................................................................... 60 Figura 6. Fluxograma da proposta metodológica ..................................................... 75 Figura 7. Perfil geomorfológico do Estado do Paraná .............................................. 89 Figura 8. Infraestrutura de abastecimento SAIC .................................................... 119 Figura 9. Localização da UTP de Guarituba no contexto da RMC ......................... 144 Figura 10. Esquema do sistema de controle de inundações da RMC ................... 148 LISTA DE MAPAS Mapa 1. Contexto da bacia hidrográfica do rio Piraquara ........................................... 4 Mapa 2. Contexto da bacia hidrográfica do rio CALI .................................................. 5 Mapa 3. Hipsometria da bacia hidrográfica do rio Piraquara, PR ............................. 80 Mapa 4. Declividade da bacia hidrográfica do rio Piraquara, PR .............................. 82 Mapa 5. Geologia da bacia hidrográfica do rio Piraquara, PR .................................. 87 Mapa 6. Tipos de solos da bacia hidrográfica do rio Piraquara, PR ......................... 92 Mapa 7. Usos das terras da BHRP no ano 1996 .................................................... 104 Mapa 8. Usos das terras da microbacia do rio Piraquara, Junho de 2016 ............. 105 Mapa 9. Usos das terras da BHRP período 1996 - 2016 ....................................... 107 Mapa 10. Perda de solos na BHRP ........................................................................ 123 Mapa 11. Unidade Territorial de Planejamento de Guarituba, ano 2016 ................ 146 Mapa 12. Zoneamento Ecológico e Econômico da BHRP...................................... 151 Mapa 13. Hipsometria da BHRC ............................................................................ 163 Mapa 14. Declividade da bacia hidrográfica do rio Cali .......................................... 166 Mapa 15. Geologia da bacia hidrográfica do rio Cali .............................................. 169 Mapa 16. Geomorfologia da bacia hidrográfica do rio Cali ..................................... 171 Mapa 17. Mapa da tipologia dos solos da bacia hidrográfica do rio CALI .............. 173 Mapa 18. Coberturas das terras da BHRC ano 1998. ............................................ 185 Mapa 19. Coberturas das terras da BHRC no ano 2014. ....................................... 186 Mapa 20. Mapa das mudanças dos usos das terras da BHRC período 1998 - 2014 ......................................................................................................................... 189 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1. América do Sul. Países selecionados. Crescimento populacional. 1950 a 2025 ................................................................................................................... 31 Gráfico 2. Curva hipsométrica e diagramas de frequência altimétrica da BHRP ..... 78 Gráfico 3. Climatologia registrada na estação Pinhais ............................................ 84 Gráfico 4. Precipitações médias em estações meteorológicas da BHRP ................ 85 Gráfico 5. Dinâmica populacional do Município de Piraquara entre 1970 e 2010.... 99 Gráfico 6. Distribuição demográfica urbana e rural de Piraquara no 2016 ............ 100 Gráfico 7. Precipitação média anual em cinco estações ....................................... 167 Gráfico 8. Índices de Qualidade das Águas (IQA). Cursos alto, médio e baixo do rio Cali. Período 1982 – 2006................................................................................ 197 LISTA DE QUADROS Quadro 1. Cenários de gestão das águas metropolitanas ....................................... 35 Quadro 2. Componentes da integração entre propriedades emergentes de bacias e desenvolvimento de áreas metropolitanas ......................................................... 45 Quadro 3. Variáveis teóricas, operacionais independentes e operacionais dependentes ...................................................................................................... 51 Quadro 4. Descrição da metodologia PER adaptada à pesquisa ............................ 53 Quadro 5 Modelo de operacionalização das variáveis dependentes e independentes ........................................................................................................................... 53 Quadro 6. Matriz da estrutura biofísica das bacias hidrográficas ............................. 59 Quadro 7. Operacionalização da variável independente: mudanças nos doberturas das terras ........................................................................................................... 62 Quadro 8. Operacionalização da variável independente: usos urbanos nos fundos de vale................................................................................................................ 63 Quadro 9. Operacionalização da variável independente: variabilidade climática..... 64 Quadro 10. Operacionalização da variável dependente: abastecimento de água ... 66 Quadro 11. Operacionalização da variável independente: dinâmica das encostas e perdas de solos .................................................................................................. 67 Quadro 12. Operacionalização da variável dependente: serviços ecossistêmicos .. 70 Quadro 13. Operacionalização da variável dependente: estrutura ecológica da paisagem fluvial ................................................................................................. 71 Quadro 14. Matriz de inputs e outpus ...................................................................... 73 Quadro 15. Matriz de síntese de mecanismos de respostas ................................... 74 Quadro 16. Quadros de comparação ....................................................................... 75 Quadro 17. Relações altimétricas das estações meteorológicas da BHRP ............. 85 Quadro 18. Matriz da estrutura biofísica da BHRP .................................................. 96 Quadro 19. Intervenções urbanas em fundos de vale BHRP, Ponto 1 .................. 110 Quadro 20. Intervenções urbanas em fundos de vale BHRP, Ponto 2 .................. 110 Quadro 21. Intervenções urbanas em fundos de vale BHRP, Ponto 3 .................. 111 Quadro 22. Intervenções urbanas em fundos de vale BHRP, Ponto 4 .................. 112 Quadro 23. Intervenções urbanas em fundos de vale BHRP, Ponto 4 .................. 112 Quadro 24. Registros ENOS na região NINO 3.4 e aumentos ou diminuições de precipitações na BHRP, período 1986-2016 .................................................... 117 Quadro 25. Matriz de Inputs e Outputs .................................................................. 130 Quadro 26. Marco normativo da gestão ambiental territorial da RMC ................... 135 Quadro 27. Matriz de respostas do tipo R1: usos urbanos em fundos de vale ...... 149 Quadro 28. Matriz de respostas do tipo R2: mudanças nas coberturas das terras 152 Quadro 29. Matriz de respostas do tipo R3: variabilidade climatica ....................... 157 Quadro 30. Matriz da estrutura biofísica da bacia hidrográfica do rio Cali ............. 176 Quadro 31. Intervenções urbanas em fundos de vale BHRC, ponto 1 .................. 191 Quadro 32. Intervenções urbanas em fundos de vale BHRC, pontos 2 e 3 ........... 192 Quadro 33. Intervenções urbanas em fundos de vale BHRC, Ponto 4 e 5 ............ 193 Quadro 34. Registros do fenômeno ENOS com aumentos e diminuições da precipitação na BHRC, período 1986 - 2016.................................................... 195 Quadro 35. Avaliação do índice hidrogeomorfológico (IHG) na BHRC .................. 199 Quadro 36. Avaliação do índice de qualidade ribeirinha (RQI) na BHRC .............. 200 Quadro 37. Matriz dos inputs - outputs da BHRC .................................................. 204 Quadro 38. Matriz de resposta do tipo R1: usos urbanos em fundos de vale ........ 212 Quadro 39. Matriz de resposta do tipo R2: mudanças nas coberturas das terras . 213 Quadro 40. Matriz de respostas do tipo R3: variabilidade climatica ....................... 215 Quadro 41. Estrutura dos planos estratégicos das áreas hidrográficas da Colômbia conforme o Decreto nº 1.640 de 2012.............................................................. 221 Quadro 42. Comparação do modelo de gestão hídrica de Brasil e da Colômbia ... 223 Quadro 43. Comparação do contexto departamental e estadual das áreas metropolitanas de análise ................................................................................ 228 Quadro 44. Comparação dos mecanismos de respostas diante os usos urbanos em fundos de vale .................................................................................................. 230 Quadro 45. Relação de comparação dos mecanismos de respostas perante a mudança nos usos das terras .......................................................................... 233 Quadro 46. Relação de comparação dos mecanismos de respostas perante a Variabilidade Climática ..................................................................................... 234 Quadro 47. Comparação geral das áreas de estudo ............................................. 236 LISTA DE FOTOGRAFIAS Fotografia 1. Morros à montante da BHRP, na Serra do Mar Paranaense no Municipio de Piraquara....................................................................................... 78 Fotografia 2. Panorama da BHRP desde o Morro do Canal.................................... 81 Fotografia 3. Várzeas da jusante da BHRP ............................................................. 83 Fotografia 4. Floresta Ombrófila Mista na BHRP .................................................... 93 Fotografia 5. Montante da bacia hidrográfica do rio Cali ....................................... 161 Fotografia 6. Montante da microbacia hidrográfica do rio Felidia .......................... 161 Fotografia 7. Jusante da microbacia hidrográfica do rio Aguacatal ....................... 162 Fotografia 8. Jusante da microbacia hidrográfica do rio Felidia ............................ 164 Fotografia 9. Curso baixo do rio Cali no perímetro urbano .................................... 164 LISTA DE TABELAS Tabela 1. Relação entre processos de pressão e impactos ..................................... 50 Tabela 2. Parâmetros morfométricos da BHRP ....................................................... 77 Tabela 3. Hidrografia da BHRP ................................................................................ 90 Tabela 4. Relação dos atores e atividades dentro da BHRP.................................. 102 Tabela 5. Coberturas das terras da BHRP nos anos 1996 e 2016 ......................... 106 Tabela 6. Taxas de câmbio dos usos das terras da BHRP período 1996 – 2016 .. 108 Tabela 7. Comparação dos Índices de Qualidade das Águas (IQA) registrados para dois estações do rio Piraquara no período 1994 – 2016: ................................. 120 Tabela 8. Avaliação do índice hidro geomorfológico (IHG) na BHRP .................... 125 Tabela 9. Avaliação do índice de qualidade ribeirinha (RQI) na BHRP .................. 126 Tabela 10. Parâmetros morfométricos gerais da BHRC ........................................ 160 Tabela 11. Altimetria das precipitações na BHRC .................................................. 167 Tabela 12. Relação da população de corregimientos da BHRC ............................ 178 Tabela 13. Crescimento populacional da Área Metropolitana de Cali .................... 179 Tabela 14. Relação dos atores e atividades dentro da BHRC ............................... 181 Tabela 15. Coberturas das terras da BHRC nos anos 1998 e 2014 ...................... 187 Tabela 16. Taxas de câmbio das coberturas das terras da BHRC período 1998 – 2016 ................................................................................................................. 188 LISTA DE SIGLAS RMC Região Metropolitana de Curitiba BHRP Bacia Hidrográfica do Rio Piraquara BHRC Bacia Hidrográfica do Rio Cali CVC Corporación Autónoma Regional del Valle del Cauca PER Pressão, Estado e Resposta MEI Matéria, Energia e Informação ZEE Zoneamento Ecológico e Económico TGS Teoria Geral de Sistemas SRTM Shuttle Radar Topography Mission NOAA National Oceanic and Atmospheric Administration VC Variabilidade Climática POT Plan de Ordenamiento Territorial POTD Plan de Ordenamiento Territorial Departamental SIGPROM Sistema Integrado de Gestão e Proteção aos Mananciais UTP Unidade Territorial de Planejamento APA Área de Proteção Ambiental IQA Índice de Qualidade das Águas IHG Índice Hidrogeomorfológico RQI Índice de Qualidade Ribeirinha ENOS El Niño Oscilação Sul GIRH Gestão Integrada de Recursos Hídricos SIAC Sistema de Informaciones Ambientales de Colombia IDEAM Instituto de Hidrología, Meteorología y Estudios Ambientales SAIC Sistema de Abastecimento Integrado de Curitiba TIN Rede Irregular de Triângulos MDE Modelo Digital de Elevações EMBRAPA Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária ITCG Instituto de Terras, Cartografia e Geologia do Paraná SIMEPAR Sistema Meteorológico do Paraná SANEPAR Companhia de Saneamento do Paraná AGUASPARANÁ Instituto de Águas do Paraná RUSLE Revised Universal Soil Loss Equation SEMA Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos do Paraná IPEA Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas UPR Unidad de Planificación Rurual UPU Unidad de Planificación Urbana SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 1 1.2 Pergunta da pesquisa ................................................................................. 6 1.3 Hipótese ....................................................................................................... 6 1.4 Objetivo Geral .............................................................................................. 6 1.5 Objetivos Específicos ................................................................................. 6 1.6 Justificativas ................................................................................................ 7 1.7 Método .......................................................................................................... 8 1.8 Estrutura da tese ....................................................................................... 10 2. RELAÇÕES SISTÊMICAS ENTRE BACIAS HIDROGRÁFICAS E ÁREAS METROPOLITANAS ................................................................................................ 12 2.1 Teoria Geral de Sistemas (TGS) ............................................................... 12 2.2 Bacias Hidrográficas: Unidades Sistêmicas Complexas ....................... 15 2.3 As Propriedades Emergentes das Bacias Hidrográficas ....................... 17 2.4 Processos hidrogeomorfológicos e socioeconômicos em Bacias Hidrográficas ....................................................................................................... 19 2.5 A Bacia Hidrográfica na Gestão Integral dos Recursos Hídricos ......... 37 2.6 Elementos da integração entre Bacias Hidrográficas e Áreas Metropolitanas ..................................................................................................... 39 3.PROPOSTA METODOLÓGICA ............................................................................ 47 3.1 Definição de Variáveis ............................................................................... 49 3.2 Materiais, Ferramentas e Técnicas Selecionadas ................................... 54 3.3 Procedimentos Metodológicos................................................................. 55 4. RELAÇÃO BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO PIRAQUARA E A REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA .......................................................................... 76 4.1 CARACTERÍSTICAS GERAIS DA BHRP .................................................. 76 4.2 ANÁLISE DOS VARIÁVEIS DE PRESSÃO E ESTADO NA BHRP ........... 98 4.3 INDICADORES DAS VARIÁVEIS DE ESTADO - BHRP .......................... 117 4.4 INTEGRAÇÃO ENTRE A BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO PIRAQUARA E O PLANEJAMENTO E A GESTÃO AMBIENTAL DA REGIÃO METROPOLITANA DE CURITIBA ..................................................................... 131 5. RELAÇÃO DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO CALI COM A ÁREA METROPOLITANA DE CALI ................................................................................. 159 5.1 CARACTERÍSTICAS GERAIS DA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO CALI ................................................................................................................... 159 5.2 ANÁLISE DOS PROCESSOS DE PRESSÃO E ESTADO DA BHRC ..... 178 5.3 INDICADORES DAS VARIÁVEIS DE ESTADO - BHRC ......................... 196 5.4 INTEGRAÇÃO DO PLANEJAMENTO E GESTÃO DA BHRC NA ÁREA METROPOLITANA DE CALI .............................................................................. 205 6 ANÁLISE COMPARATIVA .............................................................................. 217 7. CONCLUSÕES E CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................... 239 8. REFERÊNCIAS ............................................................................................... 243 1 1. INTRODUÇÃO As bacias hidrográficas de contextos metropolitanos são unidades sistêmicas delimitadas por divisores de águas, com características hidrogeomorfológicas, que conformam uma rede de drenagem, que converge para um curso principal, ao mesmo tempo que, são espaços onde se expressam os complexos fluxos de informação, matéria e energia, entre os subsistemas sociais metropolitanos e os componentes e/ou subsistemas biofísicos da natureza (BID, 2012; GARCÍA, 2001; GWP, 2009). No planejamento e gestão de territórios metropolitanos, essas bacias hidrográficas podem funcionar como unidades fornecedoras de recursos hídricos e de serviços ecossistêmicos 1 , necessários para o suporte da vida e dos sistemas produtivos (CHRISTOPHERSON, 2012; GARCÍA, 2001; BID, 2012). Sabe-se, que por sua natureza hidrogeomorfológica, a dinâmica das bacias, evidencia relações de causa-efeito entre cursos altos e baixos (DOUROJEANNI, 2009; BIB, 2012). Neste sentido, o desmatamento e as mudanças provocadas pelas atividades de uso das terras2, nos cursos médios e/ou nas montantes, de forma indevida, comprometem sistematicamente a auto-regulação hidrológica e hidráulica da bacia e, portanto, os serviços que ela fornece (PÉREZ, 1996; ORDOÑEZ, 2011; DOUROJEANNI et al., 2002A; FAO, 2009). Desde a noção sistémica, essas bacias hidrográficas possuem propriedades emergentes, resultantes das complexas relações entre os seus componentes biofísicos, socioeconômicos e culturais, sendo constituída, portanto por vários subsistemas, todos com suas propriedades emergentes individuais, mas interatuando constantemente e conformando as grandes propriedades emergentes únicas do sistema como um todo (RODRÍGUEZ et al., 2001). 1 Serviços ecossistêmicos definidos como os benefícios que os seres humanos obtêm dos processos e componentes dos ecossistêmicas de uma determinada área, e que fazem explicita a relação entre sociedade e natureza (MEA, 2005; TURNER et al., 2008). A avaliação dos ecossistemas do milênio ou Milllenium Ecosystem Assessment (MEA) classifica esses serviços em quatro tipos: I) de suporte; II) de fornecimento; III) de regulação; IV) culturais. Utiliza-se o conceito de “serviços ecossistêmicos” no âmbito acadêmico. Entretanto, “serviços ambientais" é o termo utilizado para descrever as mesmas relações e benefícios, mas nos âmbitos e discussões político-administrativas (BALVANERA et al., 2010) 2 Atividades de pastoreio, mineração, culturas de sobrevivência de populações de baixa renda e crescimento urbano, entre outras. 2 A produção hídrica de uma bacia é, de fato, uma propriedade emergente, resultante das complexas relações entre os seus componentes biofísicos internos e os ingressos de matéria, energia e informação, provenientes do exterior do sistema. Esses serviços e bens das bacias, integram-se ao desenvolvimento urbano e/ou metropolitano mediante práticas culturais, planejamento e gestão territorial, e mecanismos econômicos e financeiros, mas para isso devem ser consideradas as dinâmicas hidrogeomorfologícas e relações de causa-efeito entre suas montantes e jusantes (PLATT, 2009). Assim, as propriedades emergentes do subsistema natural da bacia, quando bem planejadas e gerenciadas, contribuem substancialmente para a melhora da qualidade de vida dos habitantes (subsistema socioeconômico), caso contrário, as mesmas podem representar uma série de ameaças e perigos naturais (GARCIA, 2001). Os trabalhos de Dourojeanni (2009), e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID, 2012), indicam que a expansão da urbanização3 representa o maior impacto e distorção nas propriedades emergentes dos subsistemas biofísicos das bacias hidrográficas. A expansão territorial urbana, e o incremento populacional, alteram as relações entre os componentes da bacia, por exemplo: o aumento das áreas impermeabilizadas por conta do avanço urbano, influem direta e indiretamente na diminuição das taxas de infiltração, no aumento do volume e velocidade do escoamento superficial, no aumento dos despejos sem tratamento, e mesmo em períodos de chuvas normais, repercutem diretamente no aumento dos picos das vazões devido à concentração das águas em canais artificiais, na potenciação dos perigos por transbordamentos, deslizamentos e nas inundações (TUCCI, 2007; DOUROJEANNI; JOURAVLEV, 1999). Nesse sentido, o planejamento e a gestão das bacias hidrográficas em contextos metropolitanos da América do Sul, enfrentam diversos desafios devidos à transformação geral e consolidação dos modelos metropolitanos, resultado do crescimento populacional e das muitas relações econômicas, sociais e trabalhistas entre municípios e metrópoles regionais, e aos efeitos da variabilidade climática nos 3 Entende-se, para efeitos desta pesquisa, URBANIZAÇÃO como quatro processos que tanto podem ser analisados isoladamente, quanto combinados: 1) aumento da população urbana; 2) expansão territorial urbana, ou a extensão da superfície destinada e/ou ocupada por usos urbanos, inclusive os traçados de vias; 3) complexificação funcional dos espaços urbanos; 4) complexificação das relações entre espaços urbanos, conformando aglomerações urbanas como as áreas metropolitanas (Cf. WHITACKER, 2016). 3 padrões de variáveis ambientais, como a precipitação, entre outros (CEPAL, 2014; MARTÍNEZ; PATIÑO, 2015). Diante desse panorama visualiza-se uma necessidade de avaliar os caminhos do desenvolvimento dos contextos metropolitanos, ou seja, das relações Sociedade- Natureza nas bacias hidrográficas, com alcances suficientes para superar os desafios próprios da região da América do Sul. Assim, este trabalho visa identificar problemáticas territoriais da integração entre os serviços ecossistêmicos que produzem as bacias hidrográficas e o crescimento demográfico e económico característico de contextos metropolitanos em dois países da América do Sul. Para isso, a pesquisa propõe uma metodologia baseada na análise comparativa entre duas bacias hidrográficas e seus correspondentes contextos metropolitanos, fundamentada nas abordagens da Teoria Geral de Sistemas (TGS) de Bertalanffy (1968), no modelo Pressão-Estado-Resposta (PER) e na aplicação integrada de técnicas e métodos de análises ambientais. Na seleção das bacias e contextos metropolitanos de comparação e de análise, tomamos como ponto de referência e/ou baseamento empírico, a pesquisa realizada por Hincapié (2013). Nessa pesquisa foram analisados os modelos de cidade em Cali (Colômbia), na qual se encontra inserida a bacia hidrográfica do rio Cali, fornecedora de água a, aproximadamente, 20% da população da cidade de Cali. Para a seleção da segunda área de análise, foi considerada a referencia internacional de Curitiba, conforme a CEPAL (2012), que a relaciona como um modelo de desenvolvimento sustentável. A partir dessa referência de Curitiba, selecionou-se uma bacia hidrográfica abastecedora da sua área metropolitana. Esta seleção levou-nos à escolha da microbacia hidrográfica do Rio Piraquara, que também é fornecedora de, aproximadamente, 20% da água do sistema de abastecimento metropolitano de Curitiba. Nesse sentido, o desenvolvimento deste trabalho considera as duas bacias hidrográficas de análise como componentes espaciais e dinâmicos, que se constroem, modelam e evoluem a partir da interação entre os subsistemas biofísicos e socioeconômicos de um sistema maior de natureza metropolitana. Os Mapas 1 e 2 apresentam as duas áreas de análise e comparação. 4 Mapa 1. Contexto da bacia hidrográfica do rio Piraquara Fonte de dados: Instituto de Águas do Paraná, 2016.Geoprocessamento e elaboração: Hincapié, 2016. 5 Mapa 2. Contexto da bacia hidrográfica do rio CALI Fonte de dados: CVC; Prefeitura de Cali, 2014.Geoprocessamento e elaboração: Hincapié, 2016. 6 1.2 Pergunta da pesquisa De forma complementar à formulação da pergunta de pesquisa entende-se que as bacias hidrográficas e as áreas metropolitanas de análise e comparação, respondem de modo diferente aos estímulos do interior e do exterior do sistema. Consequentemente, a pesquisa considera a formulação de uma pergunta do tipo metodológica e qualitativa: Quais circunstâncias e/ou processos se configuram como os principais obstáculos para uma integração coerente entre os serviços das bacias hidrográficas e o planejamento e a gestão territorial dos seus contextos metropolitanos? 1.3 Hipótese Com o intuito de responder à pergunta de pesquisa, levanta-se a hipótese a seguir: Os obstáculos estão associados com a intensificação e tipos de ocupação da bacia. Nesse sentido, a eficiência e efetividade da integração entre os serviços das bacias hidrográficas e o crescimento particular de uma área metropolitana depende da correspondência e sinergia que exista entre os mecanismos de respostas, normativas e institucionais, e suas diferentes escalas territoriais de implementação. 1.4 Objetivo Geral Comparar e analisar os mecanismos normativos e institucionais do planejamento e gestão das bacias hidrográficas pertencentes a áreas metropolitanas de Curitiba e Cali, e identificar as problemáticas da integração territorial desses dois contextos: área metropolitana e bacia hidrográfica. 1.5 Objetivos Específicos 1. Analisar os componentes das estruturas biofísicas das bacias hidrográficas, nas montantes e jusantes assim como suas interconexões. 7 2. Quantificar o avanço das ocupações das bacias hidrográficas e analisar, desde a escala metropolitana, os processos de pressão sobre as funções nos altos e baixos cursos dos rios. 3. Identificar e analisar os mecanismos normativos e institucionais para o manejo integral das bacias hidrográficas e sua integração ao planejamento e gestão dos contextos metropolitanos. 4. Comparar os arcabouços normativos e institucionais para a integração entre: o manejo integrado de bacias hidrográficas; e o planejamento e gestão de áreas metropolitanas e, com isso, evidenciar os desafios para o desenvolvimento metropolitano. 1.6 Justificativas A população urbana da América Latina e do Caribe, representa 80% do total dos seus habitantes, o que a torna a segunda região mais urbanizada do mundo. Segundo as projeções da CEPAL (2014), no ano 2064 haverão, aproximadamente, 652 milhões de pessoas morando nas áreas urbanas desta região, um aumento que implicará em enorme consumo de água, espaço e recursos. É preciso considerar as inter-relações entre economia, exploração de recursos naturais, degradação ambiental, crescimento populacional e expansão territorial urbana que, juntos, representam enormes desafios à gestão das cidades num contexto de ordem econômica mundial. Perante estas dinâmicas sociais e econômicas, faz-se necessário mudar a perspectiva da escala espacial municipal e regional, para entender a urbanização também como um processo com relações em escala mundial, inclusive, apontando para debates em torno da competitividade das áreas metropolitanas, no que tange a busca por investimentos, ações e programas internacionais. Esta competitividade dependerá, substancialmente, da articulação interinstitucional e normativa, entre desenvolvimento social, crescimento econômico e urbano, e aproveitamento estratégico e sustentável dos recursos naturais. Comparar as transformações espaciais a partir de análises de bacias hidrográficas de áreas metropolitanas, reveste-se de especial interesse para a administração pública, uma vez que interpretações e explicações sobre problemáticas comuns em contextos políticos, sociais, econômicos e ambientais diferentes, como é 8 o caso das duas áreas de estudo, ampliam a fronteira do conhecimento geográfico. O entendimento da intersecção entre temas atinentes à ordem mundial e à dinâmica espacial regional, outorgam à prática da geografia, um espaço na tomada de decisões governamentais importantes para o desenvolvimento da América Latina. Em relação à bacia hidrográfica do Rio Cali, a falta de estudos e projetos de investigação sobre a dinâmica das mudanças nas paisagens locais, permite que os processos de ordenação e ocupação sejam dirigidos por ações que podem contrariar o planejamento focado ao bem comum, como por exemplo, imposições de grandes grupos econômicos, especulação de terras e informalidade, dificultando e limitando critérios para investimentos públicos e privados. Áreas já ocupadas, tanto quanto novas áreas de uso e usufruto, exigem uma constante análise e aperfeiçoamento dos instrumentos de planejamento e gestão para orientar processos de consolidação urbanos e/ou investimentos compatíveis com o potencial ambiental territorial. Por fim, fazer uma análise comparativa utilizando os cenários institucionais e normativos, assim como a realidade da implementação de políticas ambientais urbanas, da Região Metropolitana de Curitiba (RMC), pode evidenciar elementos com baixo potencial dentro do funcionamento do sistema metropolitano, que precisem repensar a sustentabilidade ou introduzir modificações tendentes à melhorias. 1.7 Método A pesquisa aqui apresentada foi elaborada a partir de duas correntes de pensamento: o positivismo, do qual se resgatam os princípios universais da física mecânica e mediante os quais entende-se o funcionamento da dinâmica da natureza e do universo físico atuante e presente nas dinâmicas macrossistêmicas das bacias hidrográficas estudadas; e o materialismo histórico e dialético, cuja estrutura lógica ofereceu ferramentas conceituais para a análise complexa das inter-relações Sociedade-Natureza. Explicitamos, assim, que há um tempo natural e um tempo social e histórico, e dinâmicas espaciais, cujo principal determinante são as forças da Natureza e outros que se submetem às lógicas da sociedade. Implicitamente, pelo nosso entendimento das ações de planejamento e de gestão, compreendemos a submissão, direta ou indireta, efetiva ou intentada, da Natureza às lógicas da Sociedade. 9 Por sua vez, os princípios da Teoria Geral de Sistemas (TGS), proposta por Bertalanffy (1968) e relacionados nos trabalhos de Rodriguez e Silva (2013), foram utilizados na estruturação das análises desta pesquisa. A TGS, além de uma teoria, é concebida como uma forma de pensamento útil no entendimento das relações universais e da complexidade entre componentes das bacias. O pensamento sistémico se afasta da metafisica. Por tanto é materialistico, holístico, integrador, e tem como fundamento a análise das relações do movimento da matéria e do pensamento, da confrontação dos contrários e, assim, da evolução do conhecimento. Nesse sentido, entende-se o método como a forma de combinar ou organizar o conjunto de variáveis para responder aos questionamentos lógicos ou, como afirmado por Sposito (2004), o método é o caminho para chegar ao conhecimento, mas esse caminho possui ordem e medida. A seleção dos procedimentos lógicos e técnicas operacionais, que levam ao descobrimento das relações causais entre os fenômenos do objeto estudado, depende da relação do cientista com o mundo (SPOSITO, 2004). Nesta tese, adotamos o método comparativo, baseado no pensamento sistémico, o que permite-nos realizar inferências científicas de indução, dedução, de análise e de sínteses, a partir da analogia entre aspectos quantitativos e mudanças qualitativas do objeto de análise. Especificamente, as experiências sobre a análise comparativa na Geografia, podem-se compreender que ocorreram desde o começo desta ciência, com os trabalhos de Alexander von Humbold e Karl Ritter. Para Humbold e Ritter a compreensão dos novos fatos era ajudada pela referência dos conhecimentos já adquiridos. De fato, a maior parte do debate metodológico de Ritter, era baseado na Geografia Comparada. No entanto, essa consolidação de analogias como um princípio da ciência geográfica, ocorreu com a obra Principes de géographie humaine, publicada por Paul Vidal de La Blache em 1895 (BRANDÃO, 2012). Após a consolidação do espectro lablacheano na ciência, ao geógrafo norte- americano Richard Hartshorne, atribui-se o grande aporte consistente na formulação da análise epistemológica, de muito uso no campo metodológico atual. Desde a década de 1930, Hartshorne sugeriu a adoção de dois procedimentos de análise: a Geografia Idiográfica e a Geografia Nomotética. No primeiro caso, encarregada de identificar a singularidade de cada área, a partir da análise integrada dos diversos fenômenos que a constituem. O propósito do segundo, é a possibilidade da 10 comparação de distintas áreas. Com a comparação das integrações em distintas áreas, seria possível atingir um “padrão de variação” do fenômeno que se desejou analisar (BRANDÃO, 2012). A respeito da consistência dos trabalhos de La Blache e Hartshorne, os precursores da New Geography, da primeira metade do século XX criticaram o emprego do método comparativo, argumentando que o que se chamava de geografia comparativa era realmente uma geografia sistemática. Os cenários pós Segunda Guerra Mundial, deram um impulso forte às pesquisas direcionadas pelo método comparativo. Surgiu a necessidade, principalmente dos EE.UU., de fazer investimentos direcionados à comparação com as políticas econômicas e de desenvolvimento territorial dos países da Europa Ocidental. Estas pesquisas, foram a abertura à política comparada (GONZALES, 2008). Com a nova ordem mundial, o paradigma do neoliberalismo iniciado na década de 1970, torna-se uma realidade com reflexo em todos os campos da política e da economia, com efeito padronizador e de competição de todos os territórios e, neste contexto, a comparação ressurge como uma alternativa para aqueles que, conservando os princípios fundamentais, procuram a compreensão das formas de articulação das forças, nos diferentes espaços ingerênciados pelo Capitalismo (BRANDÃO, 2012). 1.8 Estrutura da tese Esta tese divide-se em 7 capítulos: a presente introdução que este subtópico encerra, na qual, como já percorrido pelo leitor, apresentamos a situação, seleção de casos de estudo, problema de pesquisa, hipótese, objetivos, justificativa e método. Os capítulos que seguem organizam-se em: um capítulo intitulado “Relações sistémicas entre bacias hidrográficas e áreas metropolitanas”, referente ao marco teórico; um capítulo consistente na proposta metodológica e na descrição dos procedimentos metodológicos; um capítulo de operacionalização da metodologia na bacia hidrográfica e área metropolitana no Brasil; um capítulo referente à operacionalização da metodologia na bacia hidrográfica e área metropolitana na Colômbia; um capítulo de análise comparativa e, por último, conclusões e referências bibliográficas. 11 O capítulo referente ao marco teórico (capítulo 2), teve como objetivos principais, os de contextualizar a pesquisa e definir os conceitos utilizados e critérios para a comparação. Os capítulos referentes às áreas de estudo (capítulos 3 e 4), se dividem, cada um, em três grandes componentes, que visam atender os três primeiros objetivos da tese. Esses grandes componentes são: características gerais das bacias, análise das variáveis de pressão e estado e, por fim, integração entre os serviços das bacias hidrográficas e o crescimento dos seus contextos metropolitanos. Ao final de cada um desses componentes dos capítulos 3 e 4, há uma síntese relacionada ao cumprimento do objetivo. Por último, o presente trabalho foi organizado de modo que, o capítulo da análise comparativa (capítulo 5), responde ao cumprimento do objetivo 4 da tese. 12 2. RELAÇÕES SISTÊMICAS ENTRE BACIAS HIDROGRÁFICAS E ÁREAS METROPOLITANAS Com o desenvolvimento deste capítulo, apresentamos o embasamento teórico e metodológico, que consideramos necessário e prévio à compreensão das relações sistêmicas entre subsistemas biofísicos e antrópicos em bacias hidrográficas, com influências sobre o desenvolvimento de áreas metropolitanas. Preocupamo-nos em adotar uma visão integradora, a partir da bacia hidrográfica, considerando-a como um sistema aberto totalizante, inserida em um contexto metropolitano, onde se expressam as relações entre Sociedade e Natureza, mediante trocas de energia, matéria e informação, e processos contínuos de produção de espaços urbanos. 2.1 Teoria Geral de Sistemas (TGS) Considerando o objeto de estudo, inter-relações entre componentes biofísicos e antrópicos em um espaço delimitado geograficamente por divisores de águas, faz-se necessário, como suporte ao método, uma concepção integradora destes processos e componentes. A Teoria Geral de Sistemas (TGS) fornece elementos conceituais, metodológicos, técnicos e científicos para o estudo de processos entre componentes individuais, quando analisados em conjunto ou quando assumidos como uma unidade com inter-relações complexas, que fazem parte de um conjunto maior (BERTALANFFY, 1968). Com gênese na Biologia da primeira metade do século XX e pertencente à lógica matemática, a TGS transcende os campos multidisciplinares, no entendimento do mundo a partir de princípios universais de sistemas abertos, independentemente de sua natureza, componentes ou relações (BERTALANFFY, 1968; LATORRE, 1996; CHRISTOPHERSON, 2012; CHRISTOFOLETTI, 1999). Desde a década de 1930, diversos cientistas, especialmente da Europa, elaboraram as bases experimentais e concepções da TGS (BERTALANFFY, 1968), no entanto, a construção do arcabouço desses princípios universais, coube a Ludwig Von Bertalanffy no trabalho “Systems Theory”, publicado pela primeira vez na década 13 de 19504. Bertalanffy propôs um redirecionamento do pensamento científico, em um contexto em que imperava a visão reducionista e mecanicista do mundo. Assim, contrariamente ao paradigma da especialização do conhecimento e fragmentação das ciências, a TGS ofereceu outro foco, uma integração de funções e de componentes. Definiu-se então, um sistema aberto como um conjunto de elementos, com seus atributos, que podem estabelecer diferentes tipos de relacionamentos em função de um objetivo. As relações entre os elementos de um sistema podem ser simples ou complexas, havendo dois tipos de complexidades: de detalhe e dinâmica (O’CONNOR; MCDERMOTT, 1998). A complexidade de detalhe, consiste no número de elementos e número de relacionamentos entre eles, entre maior número, maior complexidade. Na complexidade dinâmica, além das redes estabelecidas, os elementos adotam diferentes estados, podendo interagir uns com outros de diversas maneiras. O número de relações e o nível de complexidade do sistema, por cada novo elemento, aumenta de forma exponencial. Neste sentido, um sistema complexo terá elementos ou subsistemas que podem mudar de estado, e criar novas relações a cada momento, modificando dessa forma, o funcionamento inteiro do sistema. O conhecimento das relações entre os componentes dos sistemas, pode ser usado para prever os efeitos e produzir ou guiar o comportamento geral do sistema (O’CONNOR; MCDERMOTT, 1998; CAPRA, 1996). A maioria dos sistemas não são rígidos em suas estruturas ou funcionamentos. Devido às dinâmicas e mudanças endógenas e influencias exógenas, utiliza-se, por tanto, o termo “equilíbrio dinâmico”, para descrever o comportamento e adaptação dos sistemas às mudanças e ao aumento das capacidades de retroalimentação (CHRISTOPHERSON, 2012; CHURCHMAN, 1968). A retroalimentação dos sistemas funciona como “informações”, que são retornadas para o próprio sistema e podem orientar e até controlar as futuras operações dele. Se a retroalimentação não incentiva respostas no sistema, é uma retroalimentação negativa, ou seja, uma retroalimentação que causa autoregulação em um sistema natural, estabilizando o sistema. Se a informação de retroalimentação incentiva respostas no sistema, trata- 4 De 500 a 200 a.C. pensadores da antiga Grécia, entre eles Aristóteles, Anaxágoras e os Estóicos, já debatiam sobre o pensamento sistêmico e abarcador (Latorre, 1996). 14 se de uma retroalimentação positiva. Estes ciclos ou circuitos5 de retroalimentação, conformam a base de estudos da cibernética (CHRISTOPHERSON, 2012; BERTALANFFY, 1968; SILVESTRINI, 1998; JOHANSEN, 2000; O’CONNOR; MCDERMOTT, 1999; CHECKLAND, 1993; CAPRA, 1996; LOVELOCK, 1979; CHRISTOPHERSON, 2012). As entradas (inputs), podem ser consideradas como as relações externas de um sistema com outro. Os sistemas recebem entradas, as transformam convertendo-as em saídas (outputs). Consequentemente, considera-se que as saídas são o resultado final do processamento que o sistema exporta para o entorno. Nesta perspectiva, os sistemas interagem de forma permanente com seu entorno e o entorno condiciona seu funcionamento. A sobrevivência dos sistemas, baseia-se na capacidade que eles têm em se adaptar às demandas do entorno. Os objetivos ou propósitos do sistema determinam seu funcionamento. Isso só é possível a partir das relações que tenham ocorrido entre os elementos do sistema, para processar as entradas, produzir saídas e interagir, segundo as demandas do entorno (CHURCHMAN, 1968; JOHANSEN, 2000). Nesta abordagem, o complexo que representa um sistema não pode ser compreendido apropriadamente pela análise de componentes separados, e as características do conjunto não são explicáveis a partir da soma de partes isoladas. Essas propriedades do sistema, aparecem como “emergentes”, isto é, a análise integradora ou sistêmica, permite reconhecer um nível maior de propriedades únicas e surpreendentes do sistema, que não se consegue, analisando elementos funcionando de forma independente no mesmo conjunto (BERTALANFFY, 1968; CHRISTOLETTI, 1999). A hierarquia é uma das propriedades mais importantes no pensamento sistêmico. Neste sentido, cada componente de um sistema pode ser considerado como um sistema pertencente a uma escala menor, ou seja, um subsistema. Da mesma forma, vários sistemas podem interatuar numa estrutura de maior escala e conformar um macrosistema (GARCÍA, 2001). Em diferentes níveis sistêmicos, correspondem distintos níveis de complexidade, ou seja, em cada nível, os fenômenos observados possuem propriedades que não se percebem em níveis inferiores ou 5 Utilizamos a palavra “circuitos” como alternativa à tradução do termo “bucles”, empregado no inglês. 15 maiores. Assim, as propriedades sistêmicas de um nível específico são as propriedades emergentes desse nível (CAPRA, 1996; MATTOS; PEREZ FILHO, 2004). As aplicações conceituais das propriedades emergentes da bacia hidrográfica, sob a noção de sistema hidrogeomorfológico aberto, serão tratadas no item 2.3 dessa tese. O pensamento sistêmico é, então, um pensamento contextual, uma forma de perceber o mundo, onde processos são entendidos na relação dos componentes com o entorno. Logo, o pensamento sistêmico é um pensamento ambiental onde, todos e cada um dos elementos da Natureza e da Sociedade estão estreitamente relacionados em diferentes escalas, fazendo parte de um sistema maior ou macrosistema (CARSON, 1964; CAPRA, 1996; LOVELOOK, 1985). Aplicado aos objetivos desta pesquisa, a TGS fornece um modelo de análise hierárquico das relações complexas entre os componentes das bacias hidrográficas e áreas metropolitanas, considerando para tais fins, os aspectos biofísicos próprios da superfície da Terra (hierarquia maior que inclui o ciclo hidrológico, ciclo geológico, ciclos biológicos, clima, etc.), e os componentes socioeconômicos que transformam a paisagem natural, mediante diferentes hierarquias políticas e socioambientais, que se refletem na transformação e gestão dos territórios. 2.2 Bacias Hidrográficas: Unidades Sistêmicas Complexas 2.2.1 Relações entre os componentes do sistema da bacia hidrográfica O objeto de análise da pesquisa refere-se a microbacias ou sub bacias hidrográficas, inteiramente ou substancialmente inseridas em áreas metropolitanas. Para o caso brasileiro, escolheu-se uma microbacia com uma superfície de 102 km2 e, no caso colombiano, selecionou-se uma sub bacia de 215 km2 de área. Baseando-nos, nos trabalhos de Churchman (1968), as inter-relações entre os componentes e o entorno da bacia, podem ser representadas em termos dos seguintes componentes: processos (P); recursos (R); ambiente (A); gestão (G); controle ou retroalimentação (C); objetivos (O) e; saídas ou resultados (S) (GARCIA, 2001): S = S{P[R(A,G,C),G(O,A),C]} 16 A equação indica que os bens e serviços (outputs) das bacias hidrográficas (S), dependem da relação entre os seus processos (P). A quantidade e qualidade dos recursos ou estoques da bacia (R), dependem de três aspectos: 1) do nível de exploração humana (A); 2) da gestão territorial (G) e; 3) da resiliência ou respostas do sistema às mudanças, ou seja, da retroalimentação do sistema (C). A gestão territorial (G) é um resultado do planejamento operacional (O) e das respostas do ambiente natural (A) (GARCIA, 2001). Em outras palavras, a bacia hidrográfica é um sistema produtor de recursos, bens e serviços ambientais (outputs), que sintetiza energia, materiais e informação (inputs), mediante processos que interferem na gestão, nos objetivos de manejo, e que estão inseridos em um sistema hierárquico maior, com o qual ela se inter-relaciona constantemente. Este ambiente pode ser um mosaico, uma região, uma área metropolitana, um bioma ou um geossistema maior (CHRISTOPHERSON, 2012). 2.2.2 Fluxos de Matéria, Energia e Informação (MEI) O conceito de entropia (S) permite especificar as transformações e a dispersão da energia numa bacia, sub-bacia ou microbacia hidrográfica. Para um sistema aberto e não isolado, a variação de entropia (dS) é igual à entropia gerada no seu interior (diS), mais a entropia importada do exterior (deS), associada ao fluxo de massa e de energia (PRIGOGINE, 1962, citado por RODRIGUES, 1997). dS = deS + diS diS ≥ 0 Nesta lógica, o primeiro princípio fundamental da termodinâmica, afirma que a energia é constante, mas que muda de uma forma para outra.O segundo princípio da termodinâmica, ou entropia, designa que, em processos naturais a energia só pode variar numa única direção, de uma forma de energia mais utilizável para uma forma de energia mais degradada, assim o nível de entropia presente em diferentes partes de uma bacia hidrográfica, indica o grau de desorganização, ou de desordem do sistema, mesmo que revele o trabalho realizado e o nível da “qualidade” da energia com que ela dispõe (DOUREJEANNI, 1994; HENAO, 1988). A regulação da energia e a entropia de uma bacia hidrográfica é uma propriedade emergente de que trata esta tese, e que será tratada nos itens seguintes. 17 No entanto, podemos exemplificar essa qualidade, mediante os processos da morfoescultura (escoamento superficial, erosão hídrica, arraste de materiais, redes de drenagem, sedimentação, denudação). Estes processos ocorrem mediante interações dirigidas pelas mudanças de energia e aumentos da entropia. Os trabalhos realizados pela energia potencial e cinética, resultam numa estrutura física equilibrada que, em aparência é estática, mas que muda constantemente, ainda mais pelas intervenções do Homem (CHRISTOPHERSON, 2012; DOUREJEANNI 1994; HENAO 1988). O entendimento e aplicabilidade das duas equações anteriores conformam a base para a análise dos casos de estudo e comparação6. 2.3 As Propriedades Emergentes das Bacias Hidrográficas As bacias hidrográficas possuem características dos sistemas abertos, entre elas a sinergia, retroalimentação e propriedades emergentes em cada nível sistêmico, ou seja, independentemente da sua escala ou da hierarquia, na qual se encontrem (CHRISTOPHERSON, 2012; BERTALNAFFI, 1968; RODRÍGUEZ et al., 2001). A respeito Earls (2009) afirma: As bacias hidrográficas são sistemas complexos adaptativos, sistemas que têm comportamentos integrados ou emergentes que não se podem explicar a partir das propriedades dos seus componentes individuais. As bacias hidrográficas são hierárquicas e muito diversas entre elas, mas todas têm um padrão geométrico fractal comum (EALRS, 2009, p.16). Essa auto-organização geométrica, em formas de fractais das bacias hidrográficas, depende das relações entre os gastos de energia do sistema, o trabalho realizado na formação de paisagens fluviais e a entropia gerada (CRISTOFOLETTI, 1981). Assim, uma das propriedades emergentes mais importantes do sistema hidrogeomorfológico da bacia hidrográfica é a auto-regulação da energia. Os fatores hidrológicos e geomorfológicos se combinam para ajustar as formas dos canais e dos 6 Devido à magnitude e sua complexidade de medição, as trocas de matéria, energia (MEI) e informação entre os componentes das bacias hidrográficas não serão relacionadas em detalhe, no entanto, utilizam-se como conceitos para entender os objetos de análise. 18 vales até um estado ótimo, no qual o sistema consegue minimizar ao máximo a perda de energia dos fluxos. Esse ajuste de relações entre formas geométricas dos canais, tipos de vales e taxas de dissipação de energia, se transfere de forma regular para todos os trechos do sistema fluvial, gerando assim, uma estrutura e comportamento fractal (MOLNÁR et al., 1998; RODRÍGUEZ et al., 2001). Cada trecho do sistema, corresponde a um gasto mínimo de energia. Portanto, todo o sistema tem um balanço de energia por unidade de área (EARLS, 2009). Essa dissipação de energia do sistema físico, em cada trecho, gera relações intrínsecas com componentes biológicos, o que é chamado de funções ecológicas dos sistemas fluviais. Essas relações se apresentam como fractais, onde em cada trecho há uma relação ecossistêmica (VANNOTE et al., 1980; HANSSON et al., 1995; THORP et al., 2006). Em conjunto, componentes físicos e bióticos, em diferentes escalas fractais, conformam o metabolismo do sistema, mediante o qual, se sintetiza e integra a energia, produzindo biomassa e gerando benefícios aproveitáveis. Nesse sentido, o metabolismo ecossistêmico é outra propriedade emergente das bacias hidrográficas, integradas à dinâmica da sociedade, mediante serviços ecossistêmicos e, consequentemente, serviços ambientais (COSTANZA et al., 1997; RODRÍGUEZ et al., 2001; TURNER et al., 2008). As funções biofísicas e socioeconômicas das bacias hidrográficas, são definidas a partir das propriedades emergentes (NADAL, 1993; PARRA, 1996; 1988). No âmbito de planejamento e da gestão, essas propriedades e funções das bacias, ou de trechos das bacias, podem se ajustar às diferentes visões territoriais. Apresentamos, a seguir, algumas das funções da bacia hidrográfica nos propósitos de desenvolvimento de áreas metropolitanas (CHARRIA, 2001; NADAL, 1993; CVC, 1995; DOUROJUEANNI, 1994; OEA, 1978; VARELA, 1992; PARRA, 1996; 1988): • Uma área para coleta e fornecimento de recursos hídricos, úteis na produção agrícola e abastecimento urbano, assim como para a satisfação dos requerimentos naturais próprios do sistema fluvial; • Armazenamento de recursos hidráulicos, para produção de energia elétrica, para regulação de vazões e/ou para assegurar o abastecimento em períodos de estiagem; 19 • Uma fonte de recursos naturais tangíveis e de exploração sustentável (produção agrícola e pecuária, agricultura de subsistência, exploração madeireira, mineração controlada); • Uma fonte de recursos naturais intangíveis, isto é, uma fonte de serviços ecossistêmicos exploráveis, para o ecoturismo, sequestro de carbono, filtração do ar, regulação do clima, paisagem, lazer, práticas culturais e atividades ligadas à espiritualidade, entre outras; • Uma rede de drenagem natural, aproveitável nas atividades urbanas, desenhos urbanos ou de saneamento; • Uma zona de recarga de aquíferos e de eixos fluviais, com corredores ecológicos, consistentes em mata ciliar e rondas hídricas, que ligam as dinâmicas biofísicas longitudinais, com as laterais e horizontais, da montante à jusante. 2.4 Processos hidrogeomorfológicos e socioeconômicos em Bacias Hidrográficas 2.4.1 Morfometria Os parâmetros morfométricos de uma bacia permitem identificar, a priori, parte da resposta hidrológica dos tempos de concentração hidráulica e da dinâmica do escoamento superficial, durante um fenômeno de precipitação. Alguns dos parâmetros utilizados serão: I) fator da forma, determinado mediante a relação da área e o quadrado da longitude, que indica a tendência da bacia aos aumentos súbitos do volume dos escoamentos. Um fator de forma superior, indica uma tendência da bacia à concentração de escoamento, de forma rápida após a precipitação; II) índice do Gravelius que, mediante a relação com a área de um circulo, mede a concentração do volume do escoamento. Quanto maior é o índice de Gravelius, maior será a diferença da forma da bacia com um circulo e, consequentemente, menor será a concentração dos volumes de escoamento; III) a declividade que, desde a morfometria, define a velocidade e tipo de escoamento, assim como a movimentação das camadas de solo e matéria (REYES et al., 2010) Em síntese, os parâmetros morfométricos permitem vislumbrar parte dos processos de modelamento de 20 paisagens fluviais e das movimentações da matéria e energia, que influem na ocupação da bacia e, portanto, sobre o planejamento e a gestão. 2.4.2 Climatologia e Processos Atmosféricos Os aspectos meteorológicos e climatológicos são fatores determinantes no tipo de vegetação e na formação de solos nas bacias, ambos os casos relacionados pelas escalas de tempo. Os fatores estáticos (latitude, altitude, proximidade do oceano), são responsáveis pela quantidade de energia solar que chega, e pelos fatores dinâmicos (massas de ar e frentes), responsáveis pelo ritmo da sucessão habitual dos estados atmosféricos (DANNI-OLIVEIRA, 1999). O clima é um conceito abstrato, elaborado a partir de registros estatísticos de eventos meteorológicos, que resulta ser um fator determinante, e de longo prazo, na formação de solos e nas características dos biomas. O tempo meteorológico, adquire importância nas análises de bacias hidrográficas, portanto processos atmosféricos diários, que atuam localmente, estabelecendo relações entre o comportamento hidráulico das bacias hidrográficas e os fenômenos das precipitações pluviais máximas (JARAMILLO, 2002). Assim, o tempo meteorológico e o clima, são resultado das interações entre radiação solar (entrada da energia solar no sistema), atmosfera (movimentos regionais), forma e movimentos da Terra (zonalidade) e características da superfície terrestre (topoclima), (DANNI-OLIVEIRA, 1999). Nesta ordem, o tempo e o clima das áreas de estudo estão condicionados por processos atmosféricos, que interagem desde três tipos de escalas geográficas: a zonal, a regional e a local. As variações do tempo meteorológico e o clima das áreas sob estudo, são produto da mudança climática, da variabilidade climática e do ritmo climático. Estas variações são consequências da taxonomia de três escalas espaciais, proposta por vários autores, para a análise de fenômenos atmosféricos; o nível macroclimático, o nível mesoclimático, e o nível microclimático (RIBEIRO, 1993). Os processos atmosféricos do macroclima e zonalidade, incluem todas as camadas da atmosfera, ou seja, a escala macroclimática está relacionada com os aspectos de amplas áreas (grandes escalas), e de longa duração, isto é, a zonalidade. Nesta escala, define-se a circulação primária ou circulação geral da atmosfera, com destaque à Zona de Convergência dos Alísios, à Zona de Confluência Inter Tropical 21 (ZCIT), aos cinturões hemisférios de altas pressões nas latitudes médias, às zonas ciclônicas circumpolares, à Oscilação Sul associada ao El Niño e à circulação monçônica. (RIBEIRO, 1993). Dentro do nível macro climático, ainda se encontra o clima regional, que inclui o estudo das áreas menores, isto é, de uma extensão horizontal entre 150 e 2500 quilômetros de largura. Essa classificação taxonômica, da climatologia geográfica, continua diminuindo a escala desde o mesoclima, ou clima local, passando pelo topoclima, até o microclima, que é o nível menor de análise. Contudo, a escala de análise depende do alvo do pesquisador, neste caso, a pesquisa se focará na influência dos maiores níveis sobre o comportamento da bacia, ou seja, dos processos atmosféricos macroclimáticos, da zonalidade e do clima regional (RIBEIRO, 1993). 2.4.2.1 Variabilidade Climática e Mudança Climática Segundo a Organização Meteorológica Mundial (World Meteorological Organization – WMO), a variabilidade climática, define-se como as variações nas estatísticas dos parâmetros climáticos, em todas as escalas temporais e espaciais do clima, além dos eventos climáticos individuais (WMO, 2016). Entretanto, a mudança climática é definida como uma variação estatisticamente significativa no padrão médio do clima, ou da sua variabilidade. Diferentemente da variabilidade climática, a mudança climática persiste por um período bem prolongado de décadas ou mais (WMO, 2016). A variabilidade interanual, denominada El Niño Oscilação Sul, ou pela sigla ENOS, compõe-se de duas fases, a fase quente (Fenômeno El Niño) ou fase fria (La Niña). O ENOS é um dos fenômenos climáticos de maior influência nos padrões meteorológicos mundiais. Apresenta-se, simultaneamente, como um aumento da temperatura da superfície do mar no Oceano Pacifico Equatorial e uma diminuição da intensidade dos ventos alísios (fase quente do El Niño), e na fase fria, ou La Niña, caracteriza-se pelo esfriamento da temperatura do mar no Oceano Pacífico Tropical devido ao aumento da intensidade dos ventos alísios (TEIXEIRA; MARTIN-VIDE, 2013; VAREJÃO-SILVA, 2006). A ocorrência de um episódio ENOS na fase quente (Fenômeno El Niño) é confirmada só quando, durante cinco períodos de três meses consecutivos cada um, as Temperaturas da Superfície do Mar (TSM), na região “Nino 3.4” (no Pacifico 22 Central, entre os 5ºN - 5ºS e 120º-170º Oeste), apresentam registros de + 0,5 Cº, superando a média mensal histórica. Por sua vez, para que haja confirmação do ENOS na fase fria (Fenômeno da La Niña), as TSM devem ter variações iguais ou inferiores a – 0,5 ºC, registradas durante os cinco períodos consecutivos de três meses cada um (NOAA, 2016). Os fenômenos do El Niño e La Niña são registrados mediante o índice Oceânico El Niño (ONI). Os dados ONI, referentes às temperaturas na região “Nino 3,4” do Oceano Pacifico Equatorial, são fornecidos pelo NOAA (National Oceanic and Atmospheric Administration), através do site da National Weather Center (2017). A Figura 1 apresenta a região Nino 3.4. Figura 1. Região Nino 3.4 no Oceano Pacifico Central Fonte: NOAA (2017). 2.4.3 Dinâmica das encostas, perdas de solos e equilíbrio dinâmico As dinâmicas das encostas, compostas por uma linha divisória de águas no topo e por um canal fluvial ou uma planície aluvial no fundo, favorecem a formação e perda de solos. As partes baixas favorecem os processos de acumulação de materiais e água, enquanto que nas partes médias e altas predominam os processos de 23 denudação e perda de materiais. Os processos relacionados à declividade, podem ser classificados em denudativos e deposicionais (JARAMILLO, 2002; SCHAETZL; ANDERSON, 2005). Regularmente, em declividades íngremes, a gravidade e os processos erosivos geram perdas de materiais, estimulando os afloramentos rochosos e, quando a rocha fica exposta às constantes mudanças das condições meteorológicas, ocorre uma alteração física e química, e posterior fragmentação/desagregação dos materiais primários para, assim, formarem a estrutura dos solos. Deste modo, origina-se a partir da rocha e em um tempo geológico, o material térreo disponível para pedogênese de diversos tipos (JARAMILLO, 2002; SCHAETZL; ANDERSON, 2005). Os fatores formadores de solos, descrevem-se mediante o modelo representado por cinco variáveis (SCHAETZL; ANDERSON, 2005; JARAMILLO, 2002; UNESCO, 2010): S = f (C, R, O, D, T) Onde: S = desenvolvimento do solo; C = Clima; R = Rocha; O = Organismos; D = Declividade; T = Tempo Segundo esta equação, o desenvolvimento dos solos é função do clima e dos organismos, que atuam sobre o substrato rochoso, em um processo controlado pela declividade e determinado pelo tempo. O entendimento da formação de solos, abrange uma enorme quantidade de variáveis relacionadas a cada um dos componentes da equação anterior. Por exemplo, processos geológicos e tipo de rocha (orogênese, derrames basálticos, rochas ígneas, metamórficas, sedimentares, minerais etc.), associações entre os organismos e microrganismos e as matérias do solo (artrópodes, nematódeos, anelídeos, fungos, algas etc.). Os componentes físicos, em processos de perda de solos, relacionam-se com as dinâmicas específicas das encostas: comprimento, inclinação, exposição à radiação solar, cobertura e tipo de rocha. Junto à gravidade, determinam as perdas de solo, por exemplo. A relação entre a declividade e o comprimento de rampa, é diretamente proporcional à velocidade e a força do escoamento e arrastre de materiais. Nestas variáveis físicas, interagem também a intensidade e duração das 24 chuvas, a estrutura molecular do solo e as formas do relevo (WINCHMEIER; SMITH, 1978; RENARD, 1996; BRUCE; WILKINSON; BRANDON, 2007). Além das dinâmicas naturais, a intervenção antrópica nas encostas e nos relevos, conforma outro fator determinante na perda de solos. Os usos das terras, os conflitos ambientais por usos inadequados de solos e a presença ou ausência de práticas conservacionistas, são definitivas no aumento ou diminuição das taxas de perda de solos (WINCHMEIER; SMITH, 1978; RENARD, 1996). Em contexto, a erosão, degradação e ulterior perda de solos, ocorre pela relação direta de componentes físicos e sociais, antecedida pela colonização de terras, desmatamento, mudança de cobertura vegetal, avanço da fronteira agrícola, mecanização agrícola, mineração, fragmentação do sistema e impermeabilização de grandes áreas (MALAGÓN-CASTRO, 1998; ALCAÑIZ, 2008; PIMENTEL, et al., 1995). A importância dos solos, deve-se ao fato de eles sustentarem a vida dos ecossistemas e grande parte do desenvolvimento econômico e cultural das sociedades. Os solos são a base para a soberania alimentar e a sustentação da produtividade. A perda de solos é, por muito, um processo complexo que afeta vários aspectos fundamentais para o funcionamento dos ecossistemas naturais ligados ao desenvolvimento socioeconômico de assentamentos urbanos, além dos problemas por assoreamentos, que mudam a hidráulica dos leitos e canais fluviais naturais (velocidade, forma, área), e influem na diminuição da qualidade das águas (UNESCO, 2010; ALCAÑIZ, 2008). 2.4.4 Geomorfologia e modelagem das paisagens fluviais No contexto da geomorfologia fluvial, os processos de modelagem da paisagem estão estreitamente ligados ao gasto energético e ao trabalho que a água faz sobre a litosfera (CHRISTOFOLETTI,1981). A equação de energia de Bernoulli (1738), consequência da lei de conservação da energia, estabelece que a diferença de energia entre duas seções é igual à perda de energia no caminho percorrido entre elas pelo fluido, assim, a energia potencial é convertida, no fluxo, em energia cinética, que por sua vez, é grandemente dissipada em calor e fricção (LEOPOLD; LANGBEIN, 1962). 25 Quase 95% da energia de um rio é convertida em calor, devido à fricção com as paredes do perímetro úmido, durante os trabalhos de erodir e modelar a paisagem, e os 5% restantes são empregados no trabalho fluvial de transportar o material erodido (CHRISTOFOLETTI, 1981; LEOPOLD; LANGBEIN, 1962). Mediante esse gasto energético, os sistemas fluviais originam formas de relevo e contribuem para formação de solos, combinando processos denudacionais e de sedimentação (CHRISTOFOLETTI, 1981). Entre estas formas de relevo, considera-se importante destacar, no entendimento das dinâmicas das bacias hidrográficas, a sedimentação e formas do relevo nas planícies de inundação, os terraços fluviais e os vales fluviais. 2.4.4.1 Formação e tipos de vales No intuito de identificar as características geomorfológicas dos pontos analisados em cada um dos casos de estudo (Brasil e Colômbia), consideramos relacionar seis tipos de vales extraídos e adaptados dos trabalhos de Rosgen (1996) e González, et al., (2006). Esses tipos de vale descrevem as características dos cursos, segundo como eles aparecem na paisagem, podendo ser de alta montanha, nos cursos médios ou nas jusantes. Vale Tipo I: localizado nos cursos altos das montanhas, pode-se classificar em três tipos diferentes, Tipo IA, Tipo IB e Tipo IC. Vale Tipo IA: vale estreito com formas em “V”, de origem fluvial, cujas vertentes tem inclinações iguais ou superiores a 45º. Pertencente aos cursos altos de montanha e leitos de pequeno tamanho, mas com declividade longitudinal elevada. A sinuosidade do vale pode ser alta, como consequência das formas do relevo, mas com alguns trechos retos. A função destes trechos, é de erodir e transportar materiais por saltacão ou arraste de fundo, aproveitando a energia cinética do fluxo. Os materiais de arraste do leito, vêm das ladeiras mais próximas. As bordas são estáveis, geralmente com controle rochoso natural e cobertura vegetal, e o leito tem pouca redistribuição fluvial formando cachoeiras e/ou degraus. Vale Tipo IB: vales em “U”, relativamente amplos, de origem glaciar, mas, assim como o Tipo IA, corresponde as formas de alta montanha, com inclinações de suas vertentes igual ou superior a 45º. A declividade longitudinal desses trechos é intermediária ou baixa. A sinuosidade destes vales pode ser elevada por conta dos 26 processos fluviais que atuam sobre materiais soltos de origem glaciar. Os materiais característicos dos leitos, são geralmente de diâmetros pequenos e vêm de sedimentos aluviais recentes, produto de glaciações. As bordas são geralmente instáveis, sem vegetação ou com distribuição irregular de árvores ou arbustos. Vale Tipo IC: correspondente aos trechos de alta montanha, vales em forma de “U”, estreitos e confinados, com formação de canhões e/ou incisões rochosas com alta declividade e altura. A declividade longitudinal dos trechos é elevada ou intermediária e a sinuosidade pode ser elevada, em função do relevo acidentado, mas que pode ser reta e curta em alguns trechos. O material de arraste do leito é uma mistura entre coluviões e aluviões, que vêm das vertentes mais próximas e de águas de montante. Vale Tipo II: vales relativamente abertos, cuja inclinação das ladeiras vertentes é inferior a 45º. Encontram-se em trechos altos e médios, que descem por terrenos de serras e montanhas baixas, ou nos trechos médios de rios montanhosos, onde ainda falta a configuração das planícies de inundação do curso principal. A largura deste tipo de vale é maior do que o Tipo IC, e a sinuosidade pode estar ligada ao relevo ou aos processos fluviais. Geralmente, os materiais de arraste do rio, referem- se à mistura entre aluviões e coluviões, em função da estabilidade das bordas. Há redistribuição fluvial e formação de trechos rápidos, assim como remansos. Vale Tipo III: vales muito abertos e de largura considerável, com planícies de inundação bem definidas e com formação de terraços fluviais. Este tipo de vale, se localiza nos trechos médios e baixos de rios de maior tamanho, onde a influência pela afetação dos processos gravitacionais das ladeiras vertentes sobre os leitos é baixa. A profundidade dos leitos é menor em relação à largura, portanto o fluxo tende a se distribuir de forma uniforme por todo o leito, provocando a redistribuição de sedimentos e a criação de meandros, ligados aos processos fluviais de erosão e sedimentação. Os materiais transportados pelo rio nesses tipos de vale são dos dois tipos de origem (coluviões e aluviões), mas de diâmetro muito menor, ao ponto de o transporte ocorre por flutuação ou dissolução. Vale Tipo IV: vales pertencentes aos relevos planos onde os leitos são pouco encaixados, com planícies de inundação não confinadas. O rio pode serpentear sobre antigos depósitos sedimentares de origem fluvial, sobre os quais geralmente forma 27 várzeas ou lagoas, por conta da baixa declividade e frequente transbordamento do leito e elevação dos níveis freáticos. 2.4.5 Crescimento urbano e ocupação nas bacias hidrográficas A maior parte da bibliografia sobre gestão de bacias hidrográficas urbanas, controle de enchentes e ciclos hidrológicos, relaciona a urbanização e o crescimento populacional como os processos mais relevantes para se considerar neste tipo de análise (TUCCI, 2007; GPW, 2009, CHOW, 1988). Como afirmado por Dourojeanni e Jouravlev (1999), não há nenhum aspecto da vida dos seres humanos ou do seu entorno, que esteja livre de afetações por conta do crescimento demográfico e da concentração urbana. A América do Sul é, conforme destacado no começo desta tese, a região com maior porcentagem de população urbana, superada só pela América do Norte. Além disso, espera-se que esta porcentagem poderá alcançar 85% para o ano de 2030 (CEPAL, 2016). No contexto da nossa pesquisa, as afetações ao funcionamento dos sistemas bacias hidrográficas, de contextos metropolitanos, relacionam-se com o aumento das erosões, perigos e ameaças de deslizamentos, arraste de materiais, aumento de inundações urbanas, e os processos relacionados com movimentos gravitacionais. Entre os agentes geradores dessas afetações, sabe-se que se relacionam os manejos inadequados das terras às montantes, seja por urbanização ou conflitos socioambientais, por mineração ilegal, entre outros. No entanto, também com a ocupação urbana, às vezes em condição de ilegalidade, em áreas ambientalmente frágeis nas jusantes, fundos de vale ou mesmo em áreas de mananciais. O crescimento urbano desordenado e característico da América do Sul, tem apresentado fortes impactos negativos sobre ecossistemas e áreas ambientalmente frágeis das bacias hidrográficas em contextos metropolitanos (MARTINS, 2006; TUCCI, 2005). Devido a sua rápida manifestação, esse avanço da urbanização, e consequente ocupação de diferentes espaços, não aptos em termos ambientais, não foi devidamente acompanhado pelas instituições gestoras. A geração de novos espaços, não teve o fornecimento de serviços de saúde, educação, abastecimento de água e de saneamento básico, assim como de vias de acesso e meios de transporte massivos, fatos da própria produção desigual da cidade latinoamericana (DOUROJEANNI; JOURAVLEV, 1999; RIBEIRO, 2009; 2000). 28 As ocupações em zonas ambientalmente não aptas para expansão urbana, como afirmado por Martins (2006), podem ser analisadas a partir da relação de oposição, que existe entre a moradia pobre e a preservação da paisagem natural. A primeira questão a analisar, é o tipo de ocupação realizada nessas áreas. A maior parte delas são ocupações irregulares, em condição de ilegalidade e com má qualidade de vida. A segunda questão a se analisar, é o cenário natural onde se acentuam, e posteriores impactos nos ecossistemas, importantes para a vida, devido à falta de infraestrutura de saneamento, drenagem e vias de acesso (MARTINS, 2006). No espaço urbano os diferentes grupos sociais ou econômicos, nos limites de sua capacidade de articulação e força política ou econômica, disputam territórios e buscam aceder a melhores localizações e condições urbano-ambientais e afastar-se das inadequadas. Na disputa pelo espaço urbano, os mais frágeis na escala social são empurrados a confrontar-se com a natureza e a avançar sobre ela (MARTINS, 2006, p. 10). Parte da problemática tratada por Martins (2006), deve-se à especialização do mercado imobiliário, que rejeita a faixa da população de baixa renda. No entanto, o tema da falta de moradia regular para a população de baixa renda é um assunto também ignorado pelas instituições. Nesse sentido Martins (2006) afirma: [...] a marcante presença de assentamentos populares, precários e irregulares, nos lugares ambientalmente mais frágeis, “protegidos por lei”, interditados à edificação, desvalorizados, excluídos da produção imobiliária formal. Nesse contexto, a questão ambiental urbana é antes de tudo um problema de carência de uma política consistente de acesso à habitação de interesse social (MARTINS, 2006, p. 13). A concentração da população urbana e o tamanho das cidades, são parte de um processo maior, relacionado às práticas do capital na produção do espaço (LEFEBVRE, 1976). A expansão urbana e, portanto, o avanço e ocupação de bacias hidrográficas na América do Sul, têm sido processos que ultrapassam a rigorosidade dos planos territoriais, dando como resultado, um ordenamento do território por defeito, influenciado pelas forças do capital. Na prática, esse ordenamento por defeito, se deve à especulação urbana e ao deslocamento de populações de baixa renda para 29 periferias socioeconômicas 7 , concentração de renda com infraestrutura urbana consolidada em zonas exclusivas e criação de centralidades sob o mesmo padrão. Entender as ocupações urbanas em áreas ambientalmente não àptas, requer uma visão integral, uma vez que, enquanto processo, não é possível entende-las de forma isolada. No âmago da problemática confluem questões econômicas, sociais, culturais, além da desarticulação institucional. Entretanto, surgem os questionamentos sobre as possíveis soluções à dicotomia do desenvolvimento económico e a produção de espaços segregados. A esse respeito Martins (2012) afirma: Considerando que o território tem dimensão finita e que a população urbana crescente deve acomodar-se em algum lugar, para que o espaço urbanizado não avance sobre áreas protegidas, e sobre o espaço natural de um modo geral, é necessário, de alguma forma, intensificar seu uso, superar desperdícios e democratizá-lo (MARTINS, 2006, p. 16). Neste contexto, os efeitos das terras que mudam para uso urbano nas bacias hidrográficas são muitos, mas podem ser classificados pelo cenário onde ocorrem: I) à montante – desmatamento, perda de solo, diminuição das taxas de sequestros de carbono, perda de fauna local, mudança no regime hidrológico; II) à jusante - impermeabilização de solos, aumento das temperaturas pelo aumento da reflectância dos materiais, concentração e aumento das vazões em pontos específicos, aumento de poluentes nos escoamentos superficiais, canalização dos córregos, perda de vegetação ribeirinha, eliminação das dinâmicas de interações laterais, longitudinais e 7 Segundo Whitacker (2017), o termo periferia deve ser adjetivado. Para este autor o “termo periferia geométrica” refere-se a um “dualismo espacial (centro-periferia)” e “leva a uma associação, já sedimentada em muitas análises urbanas, de identificação de uma área com um dado conteúdo social e econômico”. Apoiando-se em Milton Santos, Whitacker (2017), complementa: “Santos (2003), ao discutir o conceito de primazia urbana e sua identificação com as noções de centro e periferia (e lembrando que nessa obra o autor refere-se à análise regional e da rede urbana, portanto, fazemos aqui uma generalização a partir de seu escrito), adverte que: ‘A noção de periferia estava até aqui carregada da noção de distância, que constitui, de longe, o fundamento da maior parte das teorias espaciais e locacionais. A essa noção de periferia, dita ‘geográfica’, é preciso opor uma outra, a de periferia socioeconômica, se levarmos simultaneamente em consideração os lugares tornados marginais ao processo de desenvolvimento e, sobretudo, os homens rejeitados pelo crescimento. Estes homens formam a periferia social dentro do polo econômico e, se o modelo de crescimento continuar a ser o que é, estão arriscados, por longo tempo ainda, a encontrar aí sua única residência possível (SANTOS, 2003, p. 82)’. Com o objetivo de distinguir uma visão geográfica que não seja corográfica, substituímos o termo “periferia dita ‘geográfica’” pelo termo “periferia geométrica”, para marcar suas implicações e limitações” (WHITACKER, 2017, p. 159). 30 verticais (pulso dos rios, planícies de inundação, enchentes, corredores hiporréicos) (TUCCI, 2007; ALAN, 2014). 2.4.5.1 O panorama do crescimento populacional na América do Sul A pressão demográfica e o avanço da urbanização sobre as bacias hidrográficas em áreas metropolitanas na região da América do Sul, adquire uma relevância maior no âmbito deste trabalho. A CEPAL (2014), tem registrado um aumento populacional exponencial nesta região nos últimos 65 anos. Este comportamento, veio acompanhado de um aumento da porcentagem de população urbana, chegando à faixa geral de 80%, uma cifra que supera a média percentual da África e da Ásia. A estimativa é que a população urbana da América do Sul continue crescendo constantemente até o ano 2064, quando haveriam mais de 652 milhões de pessoas morando nem áreas urbanas (CEPAL, 2014). O bloco de países da América do Sul8, passou de 240 milhões de habitantes em 1980 para 412,5 milhões no ano 2015, um crescimento de 71,8% em 35 anos (CEPAL, 2013). Este incremento demográfico, acompanhado da expansão de áreas construídas, tem ocorrido de forma insustentável com deterioração da qualidade dos ecossistemas, especialmente nas zonas de influência de grandes aglomerações urbanas, resultantes da polarização urbana e concentração em grandes cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Buenos Aires, Santiago de Chile, Lima e Bogotá D.C. (TUCCI, 2007; UNESCO, 1999). Esse incremento populacional combina-se à rarefação de infraestruturas, equipamentos e serviços urbanos, desigualdades em indicadores sociais, econômicos e ambientais, conformação de estruturas urbanas, cada vez mais complexas e, por outro lado, decorre da própria concentração do capital nestas grandes aglomerações urbanas (DE MATTOS, 2004). No prognóstico, espera-se ainda, que o crescimento populacional projetado estará acompanhado das correspondentes demandas por água e serviços ambientais, e terão ligados, inumeráveis impactos nos complexos naturais das bacias hidrográficas e do ambiente em geral (DNP, 2014). 8 Não foram incluídos a Guiana, Guiana Francesa e Suriname. 31 O Gráfico 1, apresenta o comportamento do crescimento populacional na América do Sul. Deste grupo, destaca-se o Brasil e a Colômbia, que são, desde finais do século XX, os de maior população e os que possuem os maiores índices de crescimento demográfico. A população brasileira aumentou 66,7% em 35 anos. Por sua vez, a Colômbia, com uma população substancialmente menor, cresceu em porcentagem similar no mesmo período. Gráfico 1. América do Sul. Países selecionados. Crescimento populacional. 1950 a 2025 Fonte de dados: (CEPAL, 2013). Organização: Hincapié, 2015. No Brasil, dados comparativos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e da Comisión Económica para América Latina y el Caribe (CEPAL) projetam que, o crescimento populacional será de 20,6% em 15 anos, passando de 173.448.346 de habitantes em 2010, para 218.330.014 de habitantes no ano 2025 (IBGE, 2013; CEPAL, 2013). A ocupação do território nacional brasileiro consolidou-se, em termos gerais, a partir do litoral atlântico, com predomínio da densidade populacional na Região Sudeste.O aumento da produção industrial esteve ligado ao processo de urbanização e crescimento das cidades brasileiras, o que foi mais intensificado entre 1960 e 1980. Este progresso econômico da Região Sudeste do Brasil, atraiu grandes investimentos e grande parte de movimentos migratórios internos do país, além de migrações de outros países da América do Sul (BRASIL, 2009). A urbanização de áreas como São 0 50 100 150 200 250 1950 1955 1960 1965 1970 1975 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 2015 2020 2025 M ilh õe s d e pe ss oa s Anos Argen/na Bolivia Brasil Chile Colômbia Equador Paraguai Peru Uruguai Venezuela 32 Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte, Curitiba e outras, caracterizou-se pela criação de complexas redes urbanas, compostas por áreas metropolitanas e cidades médias fornecedoras de serviços e habitação aos grandes polos de desenvolvimento industrial (ENCE, 2003; ARAUJO, 2009). Na Colômbia, o Departamento Administrativo Nacional de Estadística – DANE, é o órgão encarregado de registrar o crescimento populacional e urbano, além de gerar diversas séries de dados econômicos e sociais. O DANE projeta que, para o ano 2020, a população no país será de 51 milhões de pessoas (DANE, 2005; DANE, 2015), dos quais 60% residirá na Região Andina, 21,2% na Região Atlântica, 17,3% na Região Pacífica e o restante distribuirão na Amazônia e na Orinoquia, que juntas possuem 42% do total do território (CEPAL, 2003; DANE, 2005). Em relação à distribuição demográfica em zonas urbanas do território colombiano, o documento CONPES 3819 (DNP, 2014), identificou 34.728.900 pessoas em 2014 vivendo em áreas urbanas, sendo que destas 64,6% (22.440.037 de habitantes), distribuíam-se em 113 cidades funcionais9 ou aglomerações maiores que 100.000 habitantes. Ao ritmo do crescimento demográfico do Brasil e da Colômbia, cabem, nesta pesquisa, os questionamentos relacionados às implicações do crescimento demográfico e urbano, traduzido no aumento dos consumos de recursos e demandas de espaços da população urbana da América do Sul (80% do total da população concentrada em áreas urbanas e áreas metropolitanas) e o futuro panorama das bacias hidrográficas, por conta dessa pressão nos estoques do capital natural. 2.4.6 A natureza das áreas metropolitanas brasileiras A criação da Política Nacional de Desenvolvimento Urbano (PNDU) da década de 1970, decorreu de um momento desenvolvimentista brasileiro, quando, entre os anos 1973 e 1974, se criou uma política, que tinha o objetivo de consolidar as metrópoles, integrando, de uma forma geográfica e socioeconômica, os serviços e infraestrutura de municípios vizinhos, em função do desenvolvimento do modelo 9 O CONPES define as cidades funcionais como aquelas cidades receptoras de força laboral que se desloca diariamente desde cidades/municípios dormitórios. 33 industrial, isto é, um processo onde o Governo Federal identifica o papel fundamental que têm as grandes cidades na produção do espaço. O elemento unificador e epistemológico dessa política, é o conceito de rede, ou seja, a ligação entre os diferentes espaços urbanos (ENCE, 2003; ARAUJO, 2009). Entre as bases para a PNDU, encontram-se a Lei Complementar N. 14 de 1973 e a Lei Complementar N.20 de 1974. Na primeira, estabeleceu-se, segundo seu Artigo 1, a constituição formal das Regiões Metropolitanas10 de São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Salvador, Curitiba, Belém e Fortaleza. A natureza das áreas metropolitanas, está ligada à mobilidade espacial, circulação de pessoas, integração das economias. Boa parte da mão de obra dos serviços da indústria nas metrópoles, dependiam, e dependem até agora, das atividades de cidades do entorno, independentemente de serem cidades pequenas ou médias. Essa integração, cria a necessidade da consolidação de sistemas de transportes metropolitanos, de planos de ações para a construção de capital fixo e infraestrutura. Ou seja, o objetivo das regiões é a integração, circulação e planejamento (FIRKOWSKI, 2013). No âmbito dos estudos de metrópoles, assume grande relevância o conceito de movimento pendular, que é a condição básica de viagens de ida e retorno, desde cidades satélites ou dormitórios até as metrópoles, já consolidadas no setor de serviços, que atraem as populações vizinhas. Nesse sentido, cabe aqui a discussão sobre o papel das ci