RESSALVA Alertamos para ausência dos Anexos, não incluídos pela autora no arquivo único original. Estudo comparativo do genoma e do transcriptoma de Phyllosticta citricarpa (Guignardia citricarpa) agente da Mancha Preta dos Citros e Phyllosticta capitalensis Inaiara de Souza Pacheco Botucatu-SP 2014 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “Júlio de Mesquita Filho” INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS DE BOTUCATU Estudo comparativo do genoma e do transcriptoma de Phyllosticta citricarpa (Guignardia citricarpa) agente da Mancha Preta dos Citros e Phyllosticta capitalensis Inaiara de Souza Pacheco Marcos Antônio Machado Carolina Munari Rodrigues Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências, Campus de Botucatu, Unesp, para obtenção do título de Mestre no Programa de Pós-graduação em Ciências Biológicas Genética. Botucatu-SP 2014 FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA SEÇÃO TÉC. AQUIS. TRATAMENTO DA INFORM. DIVISÃO DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAÇÃO - CAMPUS DE BOTUCATU - UNESP BIBLIOTECÁRIA RESPONSÁVEL: ROSEMEIRE APARECIDA VICENTE - CRB 8/5651 Pacheco, Inaiara de Souza. Estudo comparativo do genoma e do transcriptoma de Phyllosticta citricarpa (telomorfo Guignardia citricarpa) agente da mancha preta dos citros e Phyllosticta capitalensis / Inaiara de Souza Pacheco. - Botucatu, 2014 Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Instituto de Biociências de Botucatu Orientador: Marcos Antonio Machado Coorientador: Carolina Munari Rodrigues Capes: 20202008 1. Expressão gênica. 2. Frutas citricas - Cultivo. 3. Guignardia citricarpa - Patogenicidade. 4. Cítricos. 5. Genomas. Palavras-chave: Expressão gênica; Genes associados a patogenicidade; RNA-seq. i Inaiara de Souza Pacheco Estudo comparativo do genoma e do transcriptoma de Phyllosticta citricarpa (telomorfo Guignardia citricarpa) agente da Mancha Preta dos Citros e Phyllosticta capitalensis Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Botucatu para a obtenção do título de Mestre no programa de Pós-graduação em Ciências Biológicas, Genética. Orientador: Dr. Marcos Antônio Machado Comissão examinadora Marcos Antônio Machado Centro de Citricultura Sylvio Moreira Chirlei Glienke Universidade Federal do Paraná Paulo Martins Ribolla Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Botucatu, 16 de maio de 2014 ii A minha mãe, Por acreditar incondicionalmente na minha capacidade e cujo amor e carinho foram indispensáveis para a realização desse trabalho Dedico. iii AGRADECIMENTOS Ao departamento de genética IBB/Unesp - Botucatu e ao Centro de Citricultura Sylvio Moreira pela oportunidade de realizar esse trabalho; Ao Dr. Marcos Antônio Machado, pela orientação e por acreditar na minha capacidade para a realização desse trabalho; A minha co-orientadoda Dra. Carolina Munari Rodrigues, pela paciência, carinho, auxílio e ensinamentos; Ao Dr. Marco Aurélio Takita pelo auxílio nas análises bioinformáticas; A Dra. Michele Clàrie Breton pela amizade, paciência e pelos conhecimentos que me ensinou e pela ajuda com as análises bioinformáticas; Ao Dr. Ronaldo Dálio pelas significativas contribuições para esse trabalho; Aos funcionários do Centro de citricultura, pesquisadores e Pós- doutorandos pelo companheirismo e conhecimentos compartilhados; As amigas da pós-graduação: Natália (Xei), Crisley, Ana Paula e em especial para Alessandra Tenório, que acompanhou o meu desenvolvimento profissional desde o meu primeiro ano de iniciação cientifica e com quem aprendi muito, os meus sinceros agradecimentos pelo carinho, companheirismo e apoio; Aos amigos do centro de Citricultura: Carol Sardinha, Gabi Arena, Willian, Diogo Maciel, Guilherme, Leonardo em especial para os membros da SALINHA DO AZAR: Silvia, Luciane (LUCIENE!!), Laura, Emilyn, Paulo, Eduardo e cia limitada, pelas experiências pessoais e profissionais compartilhadas, boas risadas e carinho; Aos amigos (família) do alojamento: Barbara, Rosinha, Laís, Diogo Manzano, Fausto, Tiago, Cíntia, Danila e Simone, por estarem presentes em todos os momentos, bons e ruins, que passei durante o mestrado me apoiando. Um milhão de dissertações não seriam suficientes expressar minha gratidão e o carinho que tenho por vocês. MUITO OBRIGADA!!! A minha família, pelo apoio, amor e compreensão em todos os momentos; Aos membros da banca por aceitarem o convite; À Coordenação de Aperfeiçoamento Pessoal de Nível Superior (CAPES) e a Fundação de Amparo a pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) pela concessão de bolsa de estudos iv “É muito melhor lançar-se em busca de conquistas grandiosas, mesmo expondo-se ao fracasso, do que alinhar-se com os pobres de espírito, que nem gozam muito nem sofrem muito, porque vivem numa penumbra cinzenta, onde não conhecem nem vitória, nem derrota.” (Theodore Roosevelt) v RESUMO PACHECO, I. S. Estudo comparativo do genoma e do transcriptoma de Phyllosticta citricarpa (telomorfo Guignardia citricarpa) agente da Mancha Preta dos Citros e Phyllosticta capitalensis. Dissertação (Mestrado). Instituto de Biociências. Universidade Estadual “Júlio de Mesquita Filho”. Botucatu. 2014. A Mancha Preta dos Citros (MPC), causada pelo fungo Phyllosticta citricarpa, é uma das mais importantes doenças da citricultura brasileira. No entanto, muito pouco se sabe sobre os mecanismos de patogenicidade deste patógeno na interação com seus hospedeiros. Além disso, P. citricarpa é morfologicamente muito semelhante a P. capitalensis, espécie endofítica também em citros, o que dificulta a diferenciação entre elas, gerando evidentes barreiras fitossanitárias à exportação de frutos in natura. Do mesmo modo, pouco ainda é conhecido sobre seus genomas, ainda não completamente sequenciados, assim como seus transcriptomas em diferentes condições. Assim, o objetivo geral desse trabalho foi avaliar e comparar os genomas e transcriptomas de P. citricarpa e P. capitalensis. O sequenciamento genômico com tecnologia Illumina gerou 179.880.616 reads para P. citricarpa que foram montados em 19.143 contigs, e 148.831.020 reads de P. capitalensis contidos em 11.080 contigs. Foram preditas 16.267 ORFs para a espécie patogênica e 14.813 para a espécie endofítica. Ambos os genomas são similares, com quantidades semelhantes de genes na maioria das categorias analisadas. Os transcriptomas por sua vez geraram em média 74 bilhões de reads por repetição biológica para ambas as espécies, com 3.074 transcritos diferencialmente expressos, sendo 2.637 mais expressos em P. citricarpa e 1.097 em P. capitalensis, com expressiva diferença qualitativa em ambas. P. citricarpa apresentou maior quantidade de genes expressos que P. capitalensis em quase todas as vias analisadas. A espécie endofítica apresentou maior número de genes expressos nas vias de sinalização e adesão. Além disso, os genes envolvidos na interação planta-patógeno foram também mais expressos na espécie endofítica. Os resultados obtidos dos genomas e transcriptomas de P. citricarpa e de P. capitalensis contribuem para maior compreensão da biologia dessas espécies. Palavas-chave: RNA-seq; expressão gênica, genes associados a patogenicidade. vi ABSTRACT PACHECO, I. S. Comparative study of genome and transcriptome of Phyllosticta citricarpa (Telomoph Guignardia citricarpa) the Citrus Black Spot agent and Phyllosticta capitalensis. Thesis (Master). Biosciences institute. São Paulo State University “Julio de Mesquita Filho”. Botucatu. 2014 Citrus black spot (CBP), caused by Phyllosticta citricarpa, is one of the most important citrus disease in the Brazilian citrus industry. However, the mechanisms of pathogenicity of this pathogen during the interactions with their hosts are poorly understood. P. citricarpa is frequently associated with P. capitalensis, which is morphologically similar to the endophytic specie. This feature difficults the differentiation of both species resulting in phytossanitary barriers for in natura fruit exportation. Moreover, their genomes were not fully sequenced yet and there is a lack of knowledge of their transcriptomes in different conditions. Thus, the overall objectives of this work were to evaluate and compare the genome and transcriptome of both species. The total genome sequence was 179,880,616 reads for P. citricarpa and 148,831,020 reads for P. capitalensis assembled in 19,143 and 11,080 contigs, respectively. There were predicted 16,267 ORFs for the pathogenic specie and 14,813 for the endophytic specie. P. citricarpa and P. capitalensis presented very similar amounts of genes. The transcriptomic sequence generated on average 74 billion of reads per biological repeat for each species. There were obtained 3,074 differential expressed transcripts, 2,637 were more expressed in P. citricarpa and 1,097 in P. capitalensis. Transcriptional differences between these species were observed. P. citricarpa showed more expressed genes than P. capitalensis in most analyzed categories. The endophytic specie presented more expressed genes on signaling pathway and adhesion than the pathogenic specie. Additionally, plant-pathogen interaction genes were expressed on P. capitalensis. Thus, the results of genomic and transcriptomic analyses of the P. citricarpa and P. capitalensis contribute to the biology comprehension of these species. Key-words: RNA-seq, gene expression, pathogenic genes. vii SUMÁRIO Resumo v Abstract vi 1. Introdução 1 2. Revisão de literatura 3 2.1 Citricultura e Mancha Preta dos Citros 3 2.2 Gêneros Phyllosticta e Guignardia 7 2.2.1 Phyllosticta citricarpa e Phyllosticta capitalensis 8 2.3 Interação planta-fungo 11 2.3.1 Interação planta-fungo endofítico 11 2.3.2 Interação planta-fungo patogênico 12 2.4 Genes de patogenicidade 15 2.5 Análise da expressão gênica 17 2.5.1Sequenciamento de nova geração 17 2.5.2 PCR quantitativo em tempo Real- RT-qPCR 20 3. Objetivos 22 3.1 Gerais 22 3.2 Específicos 22 4. Material e Métodos 23 4.1 Material Biológico 23 4.2 Sequenciamento do Genoma 23 4.3 Transcriptoma 24 4.4 Análise da expressão de genes candidatos por RT-qPCR 25 5. Resultados e Discussão 30 5.1 Sequenciamento genômico 30 5.1.1 Dados gerais 30 5.1.2 Enriquecimento de vias pelo KEGG 32 5.1.2.1 Metabolismo geral 32 5.1.2.2 Vias de sinalização 33 5.1.2.3 Genes envolvidos com patogenicidade ou simbiose 34 5.2 Análise transcriptômica 35 5.2.1 Dados Gerais 35 5.2.2 Categorização pelo programa Blast2go 36 5.2.2.1 Genes envolvidos degradação da parede celular 46 5.2.2.2 Fatores de transcrição 49 5.2.2.3 Metabólitos secundários 52 5.2.2.4 Proteases e proteínas secretadas 53 5.2.3 Enriquecimento de vias 55 5.3 Análise da expressão gênica por RT-qPCR 59 5.3.1 Genes endógenos 59 5.3.2 Validação do RNA-seq 60 5.3.2 Genes de patogenicidade de fungos 62 6. Considerações finais 65 7. Referência Bibliográfica 67 viii 8. Anexos (CD) 81 1 1. Introdução O Brasil é o segundo maior produtor de citros do mundo, sendo 85% de toda a produção destinada à produção de suco, majoritariamente para exportação para Europa e Estados Unidos. O Estado de São Paulo é responsável por 80% da produção do país e apresenta uma produção estimada em 268,6 milhões de caixas de 40,8 kg para 2014 (Neves, 2010; Citrus Br 2011; FAO, 2013; CONAB, 2013). Diversas doenças acometem a cultura dos citros, aumentando os custos e as perdas de produção. Dentre essas doenças destaca-se a Mancha Preta dos Citros (MPC), causada pelo fungo Phyllosticta citricarpa, considerada quarentenária A1 pelos países da Europa e quarentenária A2 pelo EUA. A MPC afeta quase todas as variedades de citros, depreciando a aparência dos frutos e, em estágios avançados, levando-os a maturação e queda precoce. Os sintomas são mais frequentes em frutos, no entanto, podem ocorrer em ramos verdes, espinhos e folhas (Aguiar- veloso et al., 2002; Almeida, 2010). O controle da doença é realizado por meio do manejo dos pomares e por aplicações de fungicidas sistêmicos e protetores. A existência de isolados de P. citricarpa resistentes a muitos desses princípios ativos já foram relatadas na literatura (Agostini & Peres, 2006; Hendricks, 2013; Possiede & Gabardo, 2009). O patógeno é frequentemente encontrado associado a uma espécie próxima e endofítica de diversas plantas lenhosas, Phyllosticta capitalensis, que é morfologicamente semelhante a P. citricarpa o que dificulta a diferenciação das duas espécies (Baayen et al., 2002; Glienke et al., 2011; Glienke-Blanco, 2002). Após a descrição da espécie endofítica, diversos isolados denominados P. citricarpa foram reclassificados para P. capitalensis e muitas pesquisas se desenvolveram com a finalidade de elaborar testes capazes de diferenciar rapidamente as duas espécies, impedindo assim que frutos contaminados com a espécie patogênica fossem introduzidos em outras regiões (Rodrigues, 2010). Os estudos sobre a genética das duas espécies de Phyllosticta são recentes. Sabe-se apenas que P. capitalensis possui um genoma de aproximadamente 21,5 MB distribuídos em pelo menos oito cromossomos, enquanto que o tamanho do genoma de P. citricarpa ainda é desconhecido (Glienke, 1999; Silva, 2008). Entretanto, o genoma completo de ambas as espécies ainda não foi sequenciado. 2 Aspectos referentes à maquinaria genética requerida pelo fungo patogênico para identificar, penetrar e colonizar a planta hospedeira ainda não são conhecidos. Estudos comparativos (genômica e transcriptômica) entre as espécies patogênica e endofítica de Phyllosticta são fundamentais para o entendimento de mecanismos diferenciais que explicariam a patogenicidade ou não destas duas espécies. Com base nisso, esse trabalho objetivou ampliar os estudos de genômica e transcriptoma dos fungos P. citricarpa e P. capitalensis, buscando genes diferencialmente expressos nas duas espécies, ou espécie específicos, que poderiam estar associados à patogenicidade. Esse estudo poderá contribuir para o entendimento do processo da doença e, eventualmente, com o desenvolvimento de estratégias de controle da MPC. 3 2. Revisão de Literatura 2.1 Citricultura e Mancha Preta dos Citros A citricultura consiste em uma das mais importantes culturas comerciais brasileiras. O celeiro citrícola conta com 175.228 milhões de árvores produtivas e uma produção de 385 milhões de caixas de laranja, sendo que 85% da produção são destinadas a produção de suco concentrado congelado (FCOJ) e não concentrado (NRC), destinados à exportação (Neves et al., 2010; Citros Br, 2013). Apesar da grande importância, o setor sofre com vários problemas de ordem fitossanitária. Só na primeira década do século XXI, 40 milhões de árvores de citros foram erradicadas devido a pragas e doenças (Neves et al., 2010). Na última safra (2012/2013) foram erradicadas 13,1 milhões de plantas, o que representa 7,5% do parque citrícola nacional e uma redução de 19% na produção (Citros Br, 2013) A Mancha Preta dos Citros (MPC) afeta, com exceção da lima ácida “Tahiti” e da laranja Azeda e seus híbridos, todas as variedades de citros. Seis sintomas são atribuídos a doença que afeta principalmente a casca dos frutos comprometendo sua aparência. A doença é classificada como quarentenária A1 (ausente no país) pelos países da Europa e Ásia o que limita a exportação de frutos in natura para essas regiões (Silva, 2008; Rappussi et al., 2009). Recentemente a doença foi descoberta nos Estados Unidos sendo considerada doença quarentenária A2 neste país (Hu et al., 2013; Schubert, 2010). Descrita pela primeira vez em 1895 na Austrália (Almeida, 2009), a MPC encontra-se distribuída nas regiões subtropicais do planeta sujeitas a chuvas de verão (Pazoti et al., 2005). No Brasil, a doença foi observada pela primeira vez em 1940 em frutos em uma feira livre no município de Piracicaba. A doença não foi mais encontrada nos pomares brasileiros até década de 1980 quando causou perdas significativas em mexerica no Estado do Rio de Janeiro e, posteriormente, em diversas variedades de laranja doce. Em 1992 foi relatada a presença do fungo em pomares paulistas localizados na região de Conchal e Moji-Guaçu (Aguiar-veloso et al., 2002; Timossi, 2003). A radiação solar aliada a altas temperaturas favorecem o aparecimento dos sintomas da doença que são mais frequentes em frutos, no entanto, podem ocorrer em folhas, pecíolos, ramos verdes e espinhos (Schinor, 2002; Caixeta et al., 2008). P citricarpa é responsável pelo aparecimento de quatro sintomas distintos em frutos com MPC: a mancha dura ou mancha preta, mancha sardenta, falsa melanose e mancha 4 virulenta (Feichtenberger, 1996). Em 2005, Goes identificou mais dois sintomas que ocorrem no Brasil: a mancha rendilhada e a mancha trincada. A mancha dura ou mancha preta é o principal sintoma e aparece no início da maturação dos frutos (Figura 1A). O sintoma é caracterizado pela presença de lesões com bordas salientes com depressão no centro. O interior dessas lesões pode apresentar pontuações pretas que correspondem aos picnídios do fungo (esporos assexuais). Os demais sintomas apresentam as seguintes características: � A falsa melanose que consiste em pequenas lesões definidas não ásperas semelhantes as que ocorrem na doença melanose dos citros causada pelo fungo Diaporthe citri (Figura 1B); � A mancha rendilhada ocorre em frutos verdes e é caracterizada pela presença de lesões sem borda definida de coloração amarela com centro de cor marrom, em lesões mais velhas pode o correr a formação de pequenas trincas (Figura 1C); � A mancha sardenta, caracterizado por lesões definidas de coloração vermelha ou pardo-avermelhada que ocorrem em frutos maduros (Figura 1D); � Mancha virulenta que ocorre pela fusão de diferentes tipos de sintomas. São lesões irregulares que podem ou não apesentar o centro deprimido (Figura 1E); � A mancha trincada é um sintoma que ocorre em frutos verdes. É caracterizada por pequenas lesões de formato arredondado que ao envelhecerem formam um grande número de trincas em sua superfície (Figura 1F). 5 O ciclo da doença inicia-se com a queda no solo de folhas infectadas com o patógeno. Quando essas folhas entram em decomposição são formados os esporos sexuais do fungo (ascósporos). Esses esporos são levados por correntes de ar ou gotas de água para diversas regiões da mesma ou para outras plantas infectando ramos, folhas e frutos. Nesses tecidos os esporos germinam e o fungo se desenvolve produzindo esporos assexuais (picnídios ou conídios) que podem ser transportados apenas por gotas de água (Figura 2). Com base no ciclo da doença, pode-se inferir que o incremento da doença na planta é realizado pelos picnídios e os conídios são responsáveis pela transmissão da doença para outras plantas e outras áreas (Wickert et al, 2012). No entanto, quando a doença já está instalada não há consenso entre qual estrutura reprodutiva possui maior importância para sua dispersão (Timossi, 2003; Wickert et al., 2012). Uma característica importante da doença é o seu longo período de incubação. Se o fruto for infectado nos estágios iniciais de desenvolvimento, os sintomas aparecerão apenas no período de transição da cor verde para a amarela, durante a colheita ou ainda no período de transporte (Caixeta et al., 2008). O controle da doença é realizado através do trato cultural por meio do manejo do mato nas entrelinhas, remoção de folhas caídas, poda de limpeza dos ramos, emprego de irrigação, Figura 1. Sintomas de Mancha Preta dos Citros; Mancha preta (A), Falsa melanose (B), Mancha rendilhada (C), Mancha sardenta (D), Mancha virulenta (E), Mancha Trincada; Fonte: Citrus disease, 2013; Fundecitrus, 2013. 6 antecipação da colheita, utilização de quebra ventos e por uso de controle químico aplicado a partir da queda das pétalas (Fundecitrus, 2013). Os principais fungicidas utilizados para o controle da doença são os sistêmicos e protetores combinados ou não com óleo mineral ou vegetal. Os fungicidas sistêmicos consistem basicamente em benzimidazóis; e translaminares. A maioria dos fungicidas protetores é a base de cobre ou ditiocarbamatos. No entanto, P. citricarpa tem apresentado resistência a muitas dessas substâncias (Schutte & Mansfield, 2003; Agostini & Peres, 2006; Rodrigues et al., 2007; Possiede & Gabardo, 2009; Hendricks, 2013). Com a finalidade de obter novos mecanismos de controle da MPC, vários estudos foram desenvolvidos utilizando diversos compostos antimicrobianos e microrganismos antagonistas. Quitosana, ácido salicílico, extrato de albedo de citros e de compostos produzidos por Letimula edodes e Agaricus blazei, apresentaram ação antifúngica inibindo o crescimento de P. citricarpa in vitro e reduzindo a progressão ou o surgimento de novos sintomas em fruto (Rappussi & Benato, 2011; Rappussi & Pascholati, 2009; Cardoso Filho, Figura 2. Ciclo da MPC: OS conídios formados nas folhas em decomposição são levados por correntes de ar ou gotas de água para diferentes partes da planta ou para outras plantas. Na superfície dos órgãos da planta o fungo de desenvolve manifestando os sintomas e desenvolvendo estruturas de reprodução assexuada (picnídios) que podem ser transportados por gotas de água para outras partes da planta. Fonte: Fundecitrus, 2013. 7 2003; Toffano, 2010). A utilização de radiação UV e de microrganismos antagonistas como Bacillus subtilis, Trichoderma spp e Saccharomyces cerevisiae também apresentaram bom resultados contra o patógeno da MPC (Canale et al., 2011). 2.2 Gêneros Phyllosticta e Guignardia O gênero Phyllosticta foi descrito pela primeira vez em 1818 por Persoon quando ele apresentou esse termo genérico para Sphaeria lichenoides DC. Inicialmente, fungos com conídios unicelulares semelhantes aos do gênero Phoma que desenvolviam essas estruturas em folhas eram descritos como pertencentes ao gênero Phyllosticta (Wikee et al., 2011). O gênero é relatado como endofítico, patógeno ou saprófito de várias espécies vegetais. Podendo causar manchas ou queima foliar e mancha preta em frutos de espécies comercialmente importantes como banana, uva, citros, orquídeas e amora (Wulandari et al., 2009; Glienke et al., 2011; Wikee et al., 2011). Phyllosticta apresenta também grande importância agronômica e farmacêutica por produzir metabólitos secundários de atividade antimicrobiana, herbicida e anticancerígena. (Everett & Rees-George, 2006; Stergiopoulos et al., 2013; Vidente et al., 2008; Wikee et al., 2011). O termo genérico Guignardia é designado para a fase telomórfica (sexual) de Phyllosticta, no entanto, devido a utilização do sistema de classificação binomial por micologistas a várias décadas, as duas denominações, têm sido utilizadas separadamente e apenas uma pequena parte de fases telomórficas de Phyllosticta foram descritas como Guignardia. Devido essas denominações aleatórias os conceitos de espécie dentro desses gêneros são confusos (Wikee et al., 2011). Poucos são os estudos que decifram as relações filogenéticas entre Phyllosticta e Guignardia. Motohashi et al. (2009) utilizando sequências Internal transcribed spacer (ITS) e 18S rRNA relacionou filogeneticamente espécies japonesas de Phyllosticta e Guignardia, demonstrando que Phyllosticta é um clado monofilético. Utilizando uma análise combinada de sequências ITS, TEF1(Translation elongation factor), actina e GPDH (gliceraldehyde-3- phosphate dehidrogenase), Glienke et al. (2011) analisou diversos isolados de Phyllosticta e Guignardia que ocorrem em citros. Três novas espécies foram descritas nesse trabalho, além de desvendar as relações filogenéticas entre P. citricarpa, P. capitalensis, G. mangiferae e P. citriasiana. 8 Estudos sobre populações de Phyllosticta que ocorre em citros também foram efetuados na Austrália (Miles et al., 2013) e na China, com a identificação de mais uma espécie de Phyllosticta patogênica de citros: a P. citrichinaensis (Wang et al., 2011). Em 2011, o Código Internacional de Nomenclatura de algas, fungos e plantas (antigo Código Internacional de Nomenclatura Botânica) determinou que os nomes de fungos anamorfos e telomorfos apresentem o mesmo status priorizando o termo genérico mais antigo ou mais importante e amplamente utilizado (Hawksworth et al., 2011). A nova redação entrou em vigor em primeiro de Janeiro de 2013. Assim, o nome Phyllosticta prevaleceu sobre Guignardia por ser o primeiro descrito, apresentar um número maior de espécies descritas e por ser conhecido como causador de doenças importantes (Glienke et al., 2011; Wikee et al., 2011; 2013a). Schoch e colaboradores (2006) propuseram que o gênero Guignardia, até então classificado como pertencente a ordem Dothideales, fosse considerado membro da ordem Botryosphaeriales, família Botryosphaeriaceae. No entanto, estudos subsequentes demonstraram que o gênero apresentava características distintas dos demais membros da família Botryosphaeriaceae, sugerindo uma reclassificação (Wikee et al., 2013b). Nesse sentido, Wikee e colaboradores (2013) sugeriram que o gênero fosse classificado como membro da família Phyllostictaceae, um grupo irmão de Botryosphaeriaceae. 2.2.1 Phyllosticta citricarpa e Phyllosticta capitalensis Phyllosticta citricarpa é um ascomiceto pertencente à ordem Botryosphaeriales e família Phyllostictaceae. Foi descrita pela primeira vez em 1889 por McApline recebendo a denominação de Phoma citricarpa McApline. A fase telomórfica ou sexuada (G. citricarpa) foi descrita em 1948 por Kiely, e em 1973 Van der Aa reclassificou a fase anamórfica para P. citricarpa (Baayen et al., 2002; Wikee et al., 2011). As fases sexual e assexual são frequentemente encontradas associadas no campo, no entanto em condições de laboratório a fase sexuada é dificilmente encontrada (Timossi, 2003). A fase sexual produz pseudotécios e ascósporos apenas em folhas caídas ou em decomposição. Os ascos apresentam forma clava, são bitunicados e arredondados na extremidade superior . No interior deles encontram-se oito ascósporos unicelulares, hialinos, levemente acinzentados, cobertos com um quepe gelatinoso nas extremidades (Baayen et al., 2002; Glienke et al., 2011). Os ascósporos são resistentes ao ressecamento favorecendo a disseminação a curtas distâncias por meio de respingos de gotas d’agua das folhas caídas até a 9 superfície de órgãos das partes baixas das plantas e a longas distâncias por correntes de ar (Robbs & Bittencourt, 1995; Feichtenberger et al., 1996; Wickert et al., 2012). A fase assexual produz picnídios em lesões de frutos e pedúnculos, folhas caídas ou aderidas e em ramos mortos. Estes são pequenos, globosos, pretos e semi-eruptivos. No interior dos picnídios encontram-se os conídios (picnidiósporos) que são unicelulares, ovoides, elípticos ou subglobosos, cobertos por uma membrana gelatinosa. Possuem baixa resistência ao ressecamento, sendo a água o principal veiculo de dispersão e o fator limitante para a germinação dos mesmos (Robbs & Bittencourt, 1995; Feichtenberger et al., 1996; Baayen et al., 2002; Schinor, 2002; Reis et al., 2006; Glienke et al., 2011). Após a germinação dos esporos na superfície dos órgãos susceptíveis, forma-se o apressório através do tubo germinativo que penetra através da cutícula e forma uma massa de hifas entre a cutícula e a epiderme. Esse micélio pode permanecer quiescente por meses ou anos até o surgimento de condições favoráveis. Em folhas e ramos esse período pode ser interrompido quando ocorre a morte desses tecidos. Em frutos a quiescência pode ser interrompida quando os frutos iniciam sua maturação ou quando são expostos à intensa radiação (Schinor, 2002; Aguiar-veloso et al., 2002; Almeida, 2010). P. citricarpa cresce de forma lenta atingindo 7 cm de diâmetro em 20 dias a 28°C em diferentes meios de cultura. A colônia apresenta coloração negra de aspecto granuloso com margens lobosas e micélio submerso. Em meio aveia-ágar ocorre a formação de um halo amarelo ao redor da colônia, característico da espécie (Baayen et al., 2002; Baldassari et al., 2007). Em 1964 McOnie isolou duas cepas de P. citricarpa. Ele denominou de saprotrófica a cepa que quando inoculadas em frutos de laranjeira não desenvolviam sintomas e patogênica a cepa que quando inoculada produzia sintomas. A duas cepas apresentavam características morfológicas muito semelhantes, sendo este critério não muito confiável para distingui-las (Baayen et al., 2002; Bonants & Carroll, 2003; Everett & Rees-George, 2006; Glienke- Blanco, 2002). Baayen e colaboradores demonstraram por meio de estudos moleculares e cultivo in vitro que a cepa saprotrófica é na verdade outra espécie conhecida como Guignardia mangiferae (Phyllosticta capitalensis) geralmente endofítica de plantas lenhosas (Baayen et al., 2002; Bonants & Carroll, 2003). Após a descrição da espécie endofítica, diversos isolados denominados G. citricarpa foram reclassificados para G. mangiferae e diversas pesquisas foram desenvolvidas com a finalidade de elaborar testes capazes de diferenciar rapidamente as duas espécies impedindo assim que frutos contaminados com a espécie patogênica sejam introduzidos em regiões que 10 não possuem a doença (Bonants & Carroll, 2003; Everett & Rees-George, 2006; Meyer et al., 2006; Peres & Harakava, 2007; Van Gent-Pelzer et al., 2007; Rodrigues, 2010). P. capitalensis é um ascomiceto, pertencente à ordem Botryosphaeriales e família Phyllostictaceae. Endofítica em diversas espécies vegetais, foi descrita pela primeira vez em 1908 por Hennings ocorrendo em Stanhopea sp. (Orquidaceae) no Brasil (Wikee et al., 2013a). Em 2001, Okane e colaboradores descreveram P. capitalensis como endofítica em ericáceas sendo sua fase telomórfica Guignardia endophyllicola. No ano seguinte, Bayeen (2002) caracterizou por meio de técnicas moleculares P. capitalensis como endofítica de citros, considerando G. edophyllicola e G. mangiferae como sendo a mesma espécie. G. mangiferae foi descrita em 1968 por Roy causando manchas foliares em Mangifera indica (Anacardiaceae). A incerteza sobre qual o nome correto para utilizar na espécie endofítica de citros permaneceu até 2011, quando Glienke demonstrou que P. capitalensis e G. mangiferae são duas espécies distintas, sendo a primeira a endofítica de citros e a última a causadora de mancha foliar em manga (Glienke et al., 2011). Em meio de cultura a morfologia de P. capitalensis assemelha-se às de P. citricarpa. No entanto, a espécie endofítica apresenta um crescimento mais rápido e não forma halo amarelo ao redor da colônia quando cultivada em meio aveia-àgar (Baayen et al., 2002; Baldassari et al., 2007). O conhecimento sobre a genética dessas espécies e suas interações com o hospedeiro são escassos e recentes. Glienke (1999) empregou a técnica de eletroforese de campo pulsado para determinar o tamanho e o número de cromossomos de isolados patogênicos e não patogênicos de P. citricarpa. O resultado obtido foi um genoma de 21,5 MB distribuídos em oito cromossomos. Empregando a mesma técnica de Glienke, Silva (2008) conseguiu observar a presença de oito cromossomos em P. capitalensis e sete cromossomos em P. citricarpa, no entanto, o tamanho dos genomas das espécies não foi estipulado por esse estudo. Estudos pioneiros com transformação genética de P. citricarpa foram realizados utilizando o gene repórter GFP e mediadas pela bactéria Agrobacterium tumefaciens (Figueiredo et al., 2010; Rodrigues et al., 2013). Nas análises de microscopia eletrônica, observaram-se os estágios de colonização dos transformantes em frutos de laranja doce, onde após a penetração do fungo formou-se uma massa micelial ao redor das células epidérmicas seguida de uma colonização dos espaços intercelulares (Rodrigues et al., 2013). 11 Diferença na produção de enzimas hidrolíticas é um fator capaz de diferenciar as espécies endofítica e patogênica de Phyllosticta de citros. Tais enzimas são importantes nos estágios iniciais de infecção por promover a degradação da parede celular das células vegetais facilitando a colonização da planta hospedeira. Análises enzimáticas apontaram significativas diferenças na produção de amilases, pectinases, endoglucanase, esterase, xilanase e endopoligalacturonase entre as duas espécies, sendo a espécie patogênica a maior produtora dessas substâncias (Romão, et al., 2011; Rodrigues, 2010). A produção de pectinases por P. citricarpa sugere que tais substâncias são importantes para a sintomatologia da doença uma vez que as lesões são induzidas principalmente em regiões ricas em pectina. Em P. capitalensis essa substância provavelmente está envolvida na colonização endofítica ou de regiões senescentes do hospedeiro (Romão et al., 2011). Apesar de demonstrar a importância dessas enzimas, os trabalhos não demostraram se a expressão desses genes possui efeito significativo na patogenicidade. 2.3 Interação planta-fungo Uma grande parte das espécies de fungos vive associada às plantas. A maioria dessas interações não resulta em sintomas de doenças na planta hospedeira. Isso ocorre devido à maioria das espécies de fungos interagir de forma mutualística com a planta hospedeira. Acredita-se que apenas 10% de todas as espécies conhecidas de fungos sejam capazes de causar doenças em plantas (Kahman & Basse, 2001). Outro fator importante é que contra os organismos causadores de doenças, as plantas contam com um sistema de defesa, muitas vezes eficiente (Jones & Dangl, 2006). 2.3.1 Interação planta-fungo endofítico São considerados fungos endofíticos aqueles que colonizam os tecidos internos da planta durante uma parte ou em todo o seu ciclo de vida sem causar dano aparente ao hospedeiro (Hyde & Soytong, 2008; Toffano, 2010; Aly et al., 2011). Muitos fungos endofíticos podem se tornar patogênicos durante a senescência da planta. Acredita-se que todas as plantas são hospedeiras de pelo menos um fungo endofítico (Aly et al., 2011). Algumas espécies de fungos endofíticos são transmitidas verticalmente por meio das sementes dos seus hospedeiros. Porém, a maioria desses microrganismos é transmitida 12 horizontalmente por esporos que são levados pelo vento e infectam a planta através de aberturas naturais, como estômatos, hidatódios e raízes, por ferimentos ou de forma ativa por meio da formação de estruturas de infecção e pela produção de enzimas degradadoras de parede celular como os fungos fitopatogênicos (Saikkonen et al., 1998). A maioria das comunidades endofíticas aparenta ser hospedeiro-específica ou são adaptadas a condições de micro-habitat ou microclima específicas. Por outro lado, espécies dos gêneros Phoma, Phomopsis, Colletotrichum e Phyllosticta apresentam uma ampla gama de plantas independentes, levando essas espécies a desenvolver mecanismos para superar as defesas de diversos hospedeiros (Suryanarayanan et al., 2009). Como resultado da condição fisiológica de diferentes partes da planta ou da pressão de seleção formada a partir de diferentes endofíticos que colonizam a mesma planta, os fungos endofíticos podem ser tecido ou órgão específico, colonizando apenas partes específicas da planta (Hyde & Soytong, 2008). A relação planta-fungo endofítico é mantida por um equilíbrio fisiológico e genético que beneficia ambas as espécies. Os fungos endofíticos promovem nas plantas hospedeiras tolerância a estresse biótico e abiótico, aumentando a resistência à seca, bem como a tolerância à alta temperatura e alta salinidade e, em alguns casos, resistência a patógenos (Dyakov et al., 2007). Em contra partida a planta fornece para o fungo proteção contra dissecação, nutrição, compostos importantes para a conclusão do ciclo de vida, crescimento e defesa, além de disseminar a próxima geração do fungo através de suas sementes (Aly et al., 2011). 2.3.2 Interação planta-fungo patogênico Os fungos fitopatogênicos podem ser classificados em três grupos de acordo com a interação com o hospedeiro: � Fungos biotróficos: São fungos que parasitam tecidos vivos. Esses organismos ultrapassam as barreiras iniciais da planta (cutícula) por meio da formação de um apressório. No interior da planta, o fungo utiliza enzimas degradadoras de parede celular para penetrar no interior da célula. Essas enzimas degradam apenas regiões pontuais da parede celular vegetal, pois podem ser imobilizadas por interações iônicas e mantidas em pontos restritos. Ao alcançar a membrana plasmática da célula vegetal os fungos biotróficos formam uma hifa de alimentação denominada haustório (Horbach et al., 2011). 13 � Fungos necrotróficos: São fungos que matam a célula hospedeira para se alimentar. Após a formação do apressório, o fungo pode matar as células hospedeiras pela secreção de toxinas peptídicas de baixo peso molecular ou pela da indução da morte celular através de espécies reativas de oxigênio (ROS). � Fungos hemi-biotróficos: Possui um estilo de vida intermediário entre o biotrófico e o necrotrófico. Esses fungos apresentam a capacidade de colonizar tecidos vivos ou mortos. De um modo geral, as plantas possuem duas linhas de defesa contra patógenos. A primeira é denominada resistência passiva ou constitutiva formada por elementos estruturais como a cutícula, tricomas, parede celular rígida sobre células epidérmicas, e compostos anti- microbianos pré-formados. A segunda linha é denominada resistência ativa ou induzida, que ativam diversos genes dentro da célula, ativando reações de hipersensibilidade, mecanismos de fortalecimento da parede celular, síntese de compostos anti-microbianos adicionais, entre outros (Dikson, 2003). Nos estágios iniciais da infecção, padrões moleculares associados a patógenos (PAMPs- pathogen-associated molecular patterns) são reconhecidos por receptores de reconhecimento de padrões (PRRs- pattern recognition receptors) na membrana plasmática da célula hospedeira desencadeando processos de defesa (Bittel & Robatzek, 2007). PAMPs foram inicialmente descritos como moléculas conservadas dos microrganismos que possuem função essencial na aptidão ou sobrevivência do microrganismo, mas não são essenciais para a patogenicidade (Bittel & Robatzek, 2007). Como essas moléculas também podem ser encontradas em microrganismos não patogênicos, a nomenclatura padrões moleculares associados a micróbios também pode ser empregada (MAMPs- microbial-associated molecular patterns) (Thomma, Nürnberger, & Joosten, 2011). Os PRRs desencadeiam uma resposta imune inata, denominada imunidade desencadeada por PAMP (PTI - PAMP-triggered immunity), qual ativa mecanismos de defesa contra o patógeno. Essa é uma defesa basal da planta sendo um mecanismo patógeno-não especifico que induz a cascata de sinalização MAP quinase, a transcrição de genes de resposta a patógenos, produção de ROS e a deposição de calose para reforçar a parede celular e impedir o desenvolvimento do patógeno (Fu & Dong, 2013; Thomma et al., 2011). Uma vez reconhecido pelo hospedeiro através dos PRRs, os patógenos desenvolveram outra estratégia capaz de burlar a resposta imune do hospedeiro, facilitando sua entrada e desenvolvimento da doença. Essa estratégia é a secreção de proteínas efetoras que suprimem 14 PTI promovendo a susceptibilidade desencadeada por efetor (ETS- effector triggered immunity) (de Jonge, Bolton, & Thomma, 2011). Efetores são moléculas secretadas por um organismo que modificam a fisiologia de outro organismo. Caracterizados por serem pequenas proteínas ricas em cisteína que não possuem aparente homologia com outras proteínas. Os efetores são classificados em: apoplásticos e citoplasmáticos. Os efetores apoplásticos são secretados no espaço extracelular da planta e interagem diretamente com as defesas do hospedeiro, protegendo o patógeno contra a ação de enzimas hidrolíticas secretadas pela planta (de Jonge et al., 2011; Göhre & Robatzek, 2008; Hogenhout et al., 2009). Os efetores citoplasmáticos são translocados para o interior da célula. Bactérias possuem um sistema de secreção especializado para injetar seus efetores. Fungos e oomicetos secretam os efetores no interior da célula hospedeira através do haustório (Hogenhout et al., 2009). Por sua vez, as plantas desenvolveram proteínas de resistência (proteínas R) que reconhecem os efetores de forma direta ou indireta por meio de uma proteína acessória. Efetores e proteínas de resistência são mecanismos evolutivamente recentes e patógeno- especifico (Thomma et al., 2011). As proteínas R ativam a imunidade ativada por efetor (ETI). Esse tipo de imunidade é patógeno-especifica e desencadeia reações de hipersensibilidade (HR) e resistência sistêmica adquirida (SAR) (Fu & Dong, 2013). Após a superação dos efetores pelas proteínas R do hospedeiro, novos efetores são desenvolvidos pelo patógeno a fim de burlar as defesas imunológicas da planta e consequentemente, novas proteínas R serão geradas pelas plantas. Esse mecanismo de co- evolução entre plantas e patógenos foi nomeado como modelo de zigue-zague por Jones e Dangl (2006). 2.4 Genes de patogenicidade São considerados genes de patogenicidade todos aqueles que estão envolvidos no desenvolvimento da doença e que não são essenciais para o desenvolvimento do ciclo de vida do patógeno in vitro (Wouw & Howlett, 2011). Didaticamente esses genes podem ser divididos em seis grupos: genes envolvidos no reconhecimento do hospedeiro e na sinalização; genes envolvidos na produção de estruturas de infecção (apressório); na penetração; na supressão da defesa do hospedeiro; na produção de toxinas e na nutrição do patógeno (Idnurm & Howlett, 2001; Tudzynski & Sharon, 2003; Wouw & Howlett, 2011). 15 As vias de sinalização são importantes em todos os estágios de desenvolvimento do patógeno e também na patogenicidade. O processo de sinalização envolvido na interação planta-patógeno pode ser dividido em três etapas: percepção ou reconhecimento do sinal é realizada por receptores que reconhecem um determinado sinal, como por exemplo, sinais ambientais ou do hospedeiro. Esse sinal é transmitido (transdução do sinal) por vias que ativam respostas celulares (tradução do sinal) como a formação de estruturas de infecção e secreção de enzimas (Campos et al., 2010; Rodrigues, 2010). O maior grupo de receptores fúngicos são os receptores acoplados a proteínas-G (GPCRs). Estas estão envolvidas no reconhecimento de sinais externos e regulam diversos processos celulares associados às proteínas heteroméricas G (Xu et al.., 2006). Em Magnaporthe oryzae, o reconhecimento pode ser realizado pelo gene Cut2. Este ativa as vias de sinalização dependentes de AMP (adenosina monofosfato), proteína quinase A, proteína quinase C cíclica e diacilclicerol que promovem a formação do apressório (Wouw & Howlett, 2011). As principais vias de transdução envolvidas com a patogenicidade são as vias de sinalização cAMP (adenosina monofosfato cíclica) e MAPK (proteína quinase ativada por mitógenos) auxiliadas por proteínas heteroméricas G. Mutações ou deleções dos genes envolvidos nessas vias interferem na germinação dos esporos e na formação de estruturas de infecção (Idnurm & Howlett, 2001; Tudzynski & Sharon, 2003; Wouw & Howlett, 2011). Os genes envolvidos na formação de apressórios podem ser divididos em três grupos: Genes expressos antes, mas que são necessários para a formação dessa estrutura – como as vias de sinalização descritas anteriormente; genes que controlam e afetam a germinação do apressório e a penetração no hospedeiro; e genes que são expressos exclusivamente no apressório ou contribuem com características especificas dessa estrutura, como a biossíntese de melanina e glicerol (Tudzynski & Sharon, 2003). A penetração do fungo na célula hospedeira ocorre de forma ativa através da pressão exercida pelo apressório durante a infecção e secreção de enzimas degradadoras de parede celular. Os genes da biossíntese de melanina e glicerol são essenciais para penetração do apressório, pois conferem a essa estrutura a turgescência necessária para romper as barreiras da parede celular (Tudzynski & Sharon, 2003). As principais enzimas utilizadas para a degradação de parede celular vegetal são pectinases, cutinases, xilanases e celulases. A síntese dessas enzimas está frequentemente associada a mais de um gene correlacionado ou a famílias gênicas o que dificulta o conhecimento da ação dessas enzimas na patogenicidade (Idnurm & Howlett, 2001). 16 A penetração do fungo pode ser percebida pela planta hospedeira que desencadeia uma série de respostas fisiológicas contra a invasão. Oligossacarídeos de quitina (componente da parede celular dos fungos) liberados durante a infecção podem atuar como PAMPs ativando a imunidade inata das plantas que leva a produção de fitoalexinas (metabólitos secundários produzidos pela planta em resposta a um agente patogênico). Além dessas substâncias, metabólitos secundários que estão constitutivamente presentes na planta e apresentam atividade antimicrobiana atuam na defesa contra patógenos (fitoanticipinas). Contra essas substâncias os fungos sintetizam enzimas capazes de degrada-las como, saponinas (Tudzynski & Sharon, 2003). A produção de substâncias tóxicas que desabilitam funções celulares do hospedeiro ou matam células é um fenômeno muito comum em fungos. Tais substâncias podem ser hospedeiro-específicas, quando seu efeito é restrito a uma única espécie ou não-especificas, afetando uma ampla gama de plantas. Estas últimas foram os primeiros determinantes de patogenicidade confirmados pela genética molecular (Idnurm & Howlett, 2001; Tudzynski & Sharon, 2003). As toxinas fúngicas são, em sua maioria, metabólitos secundários, cuja síntese envolve enzimas NPRS (nonribosomal peptide synthetases) e PKs (polyketide synthases). Consequentemente, perturbações nesses genes levam a redução da patogenicidade (Xu et al., 2006). Transportadores também são muito importantes para a patogenicidade, pois deslocam substâncias endógenas ou exógenas, auxiliando a secreção de micotoxinas e a desintoxicação de compostos antimicrobianos produzidos pelo hospedeiro. Os transportadores ABC (ATP- binding cassete transporter) e MFS (major facilitator superfamily transporter) são os mais bem caracterizados e estão envolvidos na resistência a multidrogas (Horbach et al., 2011; Idnurm & Howlett, 2001; Tudzynski & Sharon, 2003). Uma das primeiras respostas da planta contra o patógeno é a produção de ROS (Tudzynski & Sharon, 2003). A forma como o patógeno lida com o estresse oxidativo pode interferir no seu potencial patogênico. Fungos biotróficos recorrem a síntese de enzimas desintoxicantes para superar o efeitos do ROS. Em contra partida, ROS favorece a patogenicidade de fungos necrotróficos que produzem e estimulam a produção dessas substâncias pelas plantas levando a morte celular e necrose das regiões do hospedeiro afetadas (Bolwell & Daudi, 2009; Tudzynski & Sharon, 2003). Mutações em diversos genes envolvidos na nutrição levam a redução da patogenicidade. Estudos demostraram que perturbações em genes das vias do glioxalato, 17 oxidação de ácidos graxos, transportadores de sacarose e síntese de sideróforos (peptídeos responsáveis pela aquisição de ferro) levam a redução de patogenicidade em diversos fungos fitopatogênicos (Dunn et al., 2009; Oide et al., 2006; Wahl et al., 2010; Wouw & Howlett, 2011) 2.5 Análise da expressão gênica 2.5.1 Sequenciamento de nova geração O sequenciamento de nova geração (Next generation sequence, NGS) consiste em técnicas de sequenciamento em larga escala e de alto rendimento. Essa metodologia permite o processamento de milhões de sequências em um curto período de tempo de tal forma que projetos de sequenciamento que levariam anos para serem concluídos utilizando os métodos mais antigos, podem ser realizados em semanas. As bibliotecas de fragmentos de DNA geradas por essas tecnologias não são oriundas de processos de clonagem em vetores tradicionais, o que impede que erros de clonagem interfiram no sequenciamento. A principal característica dessas novas plataformas é a geração de milhões fragmentos curtos de DNA, com tamanhos que variam de 20 a 400 pb, o que torna essa técnica capaz de gerar informações muitas vezes maior que o sequenciamento Sanger (Ansorge, 2009; Zhang et al., 2011). As tecnologias NGS podem ser divididas em duas classes: as baseadas em PCR e as de sequenciamento de “molécula única” (single- molecule sequence-SMS). O primeiro grupo é constituído pelas plataformas 454 FLX (Roche), Solexa (Illumina), SOLiD System, Ion Torrent (Life technologies) e o segundo pelas plataformas Helicos HeliScope, Pacific Biosciences system (Helicos). Neste trabalho utilizou-se a plataforma Solexa/Ilumina para a realização das análises genômicas e transcriptômicas. Assim como no sequenciamento de Sanger, a plataforma Solexa emprega a marcação dos nucleotídeos terminadores com fluoróforos. Nessa tecnologia o DNA é fragmentado suas extremidades são ligadas a adaptadores. Em seguida, esses fragmentos são fixados em um suporte sólido (flow cell) . Esse suporte possui oito linhas que podem ser utilizadas para o sequenciamento de oito ou mais bibliotecas em uma única corrida. A superfície dessas linhas é revestida com adaptadores complementares aos adaptadores ligados às extremidades dos fragmentos de DNA. Durante a fixação, os fragmentos de DNA são imobilizados por sua extremidade 5’ sobre a superfície e a extremidade 3’-OH é quimicamente inativada para garantir que apenas um nucleotídeo seja adicionado por vez. 18 Previamente ao ciclo de PCR, a extremidade livre (3’-OH) forma uma estrutura em “ponte” por hidridação ligando-se ao adaptador complementar da Flow cell (Figura 3). A fase de extensão da PCR ocorre nessa estrutura de ponte. 35 ciclos de PCR são realizados formando cerda de 1000 cópias de cada fragmento de DNA. Esses fragmentos permanecem próximos uns dos outros formando clusters. Nos ciclos subsequentes de amplificação são fornecidos os nucleotídeos marcados. A alta densidade dos clusters permite que a câmera do aparelho de sequenciamento identifique a fluorescência nucleotídeo que foi incorporado. Ao final de cada ciclo ocorre uma etapa de lavagem para a remoção do excesso de reagentes a ativação da extremidade 3’-OH dos fragmentos (Figura 3). Cinquenta milhões de clusters podem ser sequenciados por linha da flow cell resultando em um rendimento elevado (Ansorge, 2009; Mardis, 2008; Martinez & Nelson, 2010; Shokralla et al., 2012). Uma das principais aplicações dessas plataformas é o sequenciamento de transcriptomas a partir de bibliotecas de cDNA, conhecido como RNA deep sequencing ou RNA-seq. Durante muito tempo utilizou-se a metodologia de microarranjo de DNA para a determinação dos níveis de transcrição em larga escala. No entanto essa metodologia necessita do conhecimento prévio do genoma (Ansorge, 2009; Martinez & Nelson, 2010). A vantagem do RNA-seq é a possiblidade de identificar transcritos sem a necessidade do conhecimento prévio do genoma do organismo. Além da descoberta de novos transcritos, essa tecnologia pode ser empregada para medir a abundância de transcritos, identificar regiões não traduzidas, variantes de splicing, identificar polimorfismos de base simples (SNPs), RNAs interferentes, entre outros (Nowrousian, 2010; Nowrousian et al., 2010). As tecnologias NGS constituem uma ferramenta em potencial no estudo de microrganismos. O pequeno tamanho do genoma desses organismos permite uma elevada cobertura de sequenciamento. Com a finalidade de melhorar a anotação e a compreensão acerca da genética dos microrganismos, o RNA-seq foi complementarmente empregado nos projetos de sequenciamento genômico de Saccharomyces cerevisiae, Schizosaccharomyces pombe e Aspergillus oryzae. E o sequenciamento de novo de diversos fungos filamentosos também já foi realizado utilizando essa nova metodologia (Diguistini et al., 2009; Martinez & Nelson, 2010; Nowrousian, 2010; Wang et al., 2010). 19 Figura 3: Técnica de sequenciamento plataforma Solexa (Illumina); O DNA é fragmentado e a ele são ligados adaptadores nas extremidades (A). A extreminade 5’ é fixada na flow cell (B) e a extremidade 3’ liga-se ao adaptador complementar no suporte por meio de hibridação formando uma ponte (C) onde ocorre a fase de extensão da PCR formando a fita complementar. O final do ciclo as fitas de DNA são separadas linearizadas (D). O ciclo se repete 35 vezes formando cerca de mil cópias de cada fragmento. Esses fragmentos permanecem próximos uns dos outros formando clusters (E). Nas fases subsequentes de amplificação, são fornecidos nucleotídeos marcados (G). A densidade dos clusters permite a identificação da fluorescência de cada nucleotídeo quando incorporado (H, I, J). A leitura das bases é feita por análise sequencial das capturas das fluorescências em cada ciclo de sequenciamento (K, L). Fonte: Illumina, 2007 Em fungos fitopatogênicos, a tecnologia RNA-seq foi empregado para desvendar as relações desses microrganismos com seus hospedeiros revelando informações importantes sobre os estágios iniciais de infecção, colonização e patogenicidade (Kawahara et al., 2012; O’Connell et al., 2012). 2.5.2 PCR quantitativo em tempo real (RT-qPCR) A técnica de PCR convencional é amplamente utilizada para a quantificação genética através da amplificação das sequências alvo por um número discreto de ciclos. Os produtos da amplificação são geralmente observados por eletroforese em gel de agarose, no entanto, a 20 técnica apresenta algumas limitações principalmente no que se refere à quantificação da expressão gênica. Examinando o processo de amplificação, podemos observar que a PCR é limitada pela atividade enzimática e do substrato ao longo das fases. Ao final da reação, quando essas substâncias se desgastam ou vão se tornando escassas, a reação chega a um platô no qual, teoricamente, todas as amostras possuirão a mesma quantidade de DNA total. Isso obscurece qualquer diferença na abundância do cDNA inicial. Outra desvantagem é que a quantificação dos produtos de PCR ao final da reação exalta qualquer pequena diferença entre a eficiência da reação das amostras (VanGuilder & Freeman, 2008). A PCR em tempo real minimiza esses erros experimentais por meio da quantificação dos produtos da PCR em cada ciclo de amplificação levando a uma medição quantitativa dos produtos acumulados ao longo do processo. A maioria das tecnologias é baseada em fluorescência. As mais empregadas são: fluoróforos intercalantes (SYBR Green), sondas que apresentam fluorescência por hidrólise ou hibridização (TaqMan) e hairpins fluorescentes (Molecular beacons) (Schena, Nigro, Ippolito, & Gallitelli, 2004; VanGuilder et al., 2008). SYBR Green é um fluoróforo que intercala na dupla fita de DNA. Durante a amplificação, essa molécula se liga ao produto da PCR emitindo fluorescência verde quando excitada pela luz. Apesar da facilidade de uso, o SYBR Green liga-se ao DNA de forma indiscriminada, dímeros de primers e erros de amplificação podem superestimar a quantificação do gene alvo. A verificação desse tipo de erro ocorre por meio da análise da curva de dissociação. Esta consiste na quantificação da intensidade do SYBR Green que é visualizada graficamente em de forma de picos. Como cada amplicon possui uma temperatura de melting devido a sua composição de nucleotídeos, portanto, a especificidade do produto amplificado se dá através da formação de um único pico. A análise da expressão de transcritos pode ser realizada em níveis absolutos ou relativos. Na quantificação absoluta o número de cópias de um transcrito é calculado por meio da curva padrão do DNA do gene de interesse. Para isso diluições seriadas com quantidades conhecidas de DNA é realizada e submetida a amplificação. A curva padrão é então utilizada para extrapolar a concentração de partida do sinal de amplificação desconhecido (VanGuilder et al., 2008). O método 2-ΔΔCT de quantificação relativa é o mais utilizado em análises de expressão gênica. Essa metodologia considera que a eficiência de amplificação é 100%, ou seja, a cada ciclo o número de cópias de DNA é duplicado é que existe um gene (ou genes) que é expresso 21 de forma constante nas amostras (gene endógeno). (Livak & Schmittgen, 2001; VanGuilder et al., 2008). Para o cálculo da expressão relativa dos genes alvo, o valor de ciclos de quantificação ou Cicle Threshold (Ct) de cada amostra precisa ser estimado. O Ct consiste no ponto que detecta o ciclo em que a reação atingiu o limiar da fase exponencial. Para cada amostra é calculada a diferença entre o CT do gene de interesse e do gene endógeno (∆CT). Em seguida, ocorre a subtração do ∆CT da condição controle (constituída de todos os elementos do grupo submetido ao tratamento, no entanto, sem a variável que pretende avaliar) contra o ∆CT do tratamento (∆∆CT). Esse valor negativo é utilizado como exponente de 2 na equação que representa a diferença corrigida do Ct (Livak & Schmittgen, 2001). 2-ΔΔCT= 2 –(Ct,tc –Ct,cg)Tratamento- (Ct,tc –Ct,cg) controle Os genes endógenos devem ser cautelosamente escolhidos para a realização da RT- qPCR, pois eles irão normalizar diferenças entre a quantidade do produto inicial, bem como a eficiência da reação. Para isso esses genes necessitam apresentar algumas características como: apresentar expressão similar em todas as amostras de estudo, apresentar expressão resistente às condições experimentais, e passar pelas fases da reação com a mesma cinética dos genes alvo. (VanGuilder et al., 2008). A eficiência de genes endógenos candidatos podem ser empiricamente determinadas por meio de algoritmos matemáticos que utilizam os dados obtidos do RT-qPCR desses genes para a realização dos cálculos. Os programas amplamente utilizados para esse fim são o geNorm (Vandesompele et al., 2002), BestKeeper (Pfaffl et al., 2004) e Normfinder (Andersen et al.,2004). 3. Objetivos 3.1 Gerais - Avaliar e comparar o genoma e o transcriptoma de Phyllosticta citricarpa e P. capitalensis. 3.2 Específicos - Identificar genes diferencialmente expressos em P. citricarpa e P. capitalensis. - Anotar e caracterizar ORFs de P. citricarpa envolvidas na patogenicidade em citros. - Validar a expressão de genes associados à patogenicidade. 22 4. Material e Métodos 4.1 Material Biológico Para o desenvolvimento desse estudo foram utilizados os isolados LGMF06 de P. citricarpa e LGMF01 de P. capitalensis, cedidas pelo Laboratório de Genética de Microrganismos (LabGeM) da Universidade Federal do Paraná (UFPR). LGMF06 foi isolado de lesões de MPC de frutos de laranja doce (Citrus sinensis L. Osb), enquanto que LGMF01 foi isolado de frutos assintomáticos de lima ácida “Tahiti”. A confirmação das espécies desses isolados foi realizada por análises moleculares e testes de patogenicidade (Glienke et al., 2011; Stringari, 2009). Os fungos foram cultivados em placas contendo meio de cultura Citros Fabris- Nishimura (CFN) (Figueiredo et al., 2010) e mantidos em BOD a uma temperatura de 25 +/- 3º C. A cada trinta dias foi realizada a repicagem dos fungos por meio da retirada de um fragmento de micélio de uma placa e a transferência deste para outra placa contendo o mesmo meio de cultura. Com o objetivo de obter DNA e RNA sem contaminantes provenientes do meio de cultura, os isolados de ambos os fungos também foram crescidos em meio CFN líquido e mantidos sob agitação (65 rpm) por sete dias a 25 +/- 3º C no escuro. Após esse período o micélio foi removido do meio, lavado com água destilada, macerado com nitrogênio líquido e armazenado a-80°C para posterior utilização nos processos de extração de DNA e RNA. 4.2 Sequenciamento do Genoma O DNA total de P. citricarpa e P. capitalensis foi extraído de acordo com o protocolo de CTAB cedido pela professora Magnólia de Araújo Campos, da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG). A qualidade do DNA foi verificada por meio de gel de agarose 0,8% corado com brometo etídio (0,5 ng/ml) sob luz ultravioleta. A concentração desses DNAs foi determinada no espectrofotômetro Nanodop 8000 (Uniscience). Dez microgramas de DNA de cada espécie foram enviados à empresa Macrogen (Coréia do Sul) para a realização do sequenciamento utilizando a plataforma Genome AnalyzerIIx® (Illumina). Todos os procedimentos de sequenciamento foram realizados de acordo com os protocolos da Illumina. Foram gerados fragmentos paired-end com tamanho aproximado de 101 pares de base (pb). 23 Os resultados foram enviados em formato FASTA com qualidade Phred >20 (Ewing et al., 1998). A montagem de novo do genoma foi realizada utilizando o software CLC Genomics Workbench (http://www.clcbio.com). Para a predição das ORFs (Open read frames) foi utilizado o programa Augustus (Stanke et al.,2004). A anotação e categorização das ORFs foram realizadas automaticamente no programa Blast2GO e pela ferramenta KEGG (Kyoto Encyclopedia of Genes and Genomes) (Conesa et al., 2005; Kanehisa & Goto, 2008; Kanehisa et al., 2011). Para a estimativa da cobertura do sequenciamento foi realizado o seguinte cálculo: Nreads X . Treads Tgenoma Sendo: Nreads = número de leituras disponíveis; treads = tamanho médio, em pares de bases, das leituras, nesse caso foi usado 96 pb; Tgenoma = tamanho, em pares de bases, do genoma referencia. Adotou-se como tamanho do genoma 21,5 Mb para as duas espécies estudadas. Esse valor foi determinado por Glienke (1999) para isolados de P. citricarpa por meio de eletroforese de campo pulsado. 4.3 Transcriptoma Para as análises de transcriptomas foram utilizadas três repetições biológicas de cada espécie dos fungos P. citricarpa e P. capitalensis. A extração do RNA total foi conduzida de acordo com as instruções do fabricante do kit de extração RNeasy® (Quiagen) e tratado com DNaseRNase Set-Free® (Quiagen). A qualidade e integridade dos RNAs foram verificadas por eletroforese em gel de agarose 0,8%, e pelo aparelho Bioanalyzer 2100 (Agilent Technologies). A quantificação desses RNAs foi realizada no espectrofotômetro Nanodop 8000 (Uniscience). Dez microgramas de RNA total foram enviadas para a empresa Macrogen para a realização do RNA-seq pela mesma plataforma utilizada no sequenciamento genômico. Os resultados também foram enviados em arquivos FASTA com valores de Phred > 20 como descrito no sequenciamento genômico (Ewing et al., 1998). A montagem dos transcritos foi realizada através da ferramenta TopHat utilizando como referência as ORFs de P. citricarpa (Trapnell et al., 2009). A estimativa da abundância relativa dos transcritos foi feita utilizando a ferramenta Cufflinks, que mede a abundância da 24 transcrição em fragmentos por kilobase de exon por milhão de fragmentos mapeados (FPKM), e a expressão diferencial foi verificada através do software Cuffdiff (Trapnell et al., 2010). A anotação e categorização dos transcritos foram realizadas automaticamente pelo programa Blas2GO e pela ferramenta KEGG (Conesa et al., 2005, Kanehisa & Goto, 2008; Kanehisa et al., 2011). Para a identificação de transcritos que codificam possíveis proteínas secretoras (efetores), os peptídios sinal foram preditos utilizando a ferramenta SignalP 3.0 (Bendtsen, et al., 2004; Petersen et al.,2011). Complementarmente a essas análises foi realizado busca por genes envolvidos com patogenicidade em P. citricarpa e P. capitalensis através do alinhamento local dos transcritos expressos nessas espécies contra as sequencias do banco de dados de interação patógeno- hospedeiro (Winnenburg et al., 2008). 4.4 Análise de expressão gênica por RT-qPCR Dois genes superexpressos em cada espécie (P. citricarpa e P. capitalensis) foram selecionados para validação do sequenciamento transcriptômico através de RT-qPCR. As sequencias desses genes foram alinhadas entre as duas espécies por meio de blastN (Johnson et al., 2008). Os primers foram desenhados nas regiões conservadas compartilhadas entre as espécies estudadas utilizando a ferramenta Primer blast (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/tools/primer-blast/). As penalidades dos primers foram verificadas utilizando a ferramenta Primer 3 (http://www.bioinformatics.nl/cgi- bin/primer3plus/primer3plus.cgi/). A especificidade dos primers foi confirmada por sequenciamento no equipamento ABI 3730 – Applied Biosystems de acordo com as instruções do fabricante (Life Techhnologies) utilizando como molde produto de PCR. As sequências obtidas foram alinhadas contra banco de dados de sequências do NCBI (National Center for biotecnology information) utilizando a ferramenta BlastX (Johnson et al., 2008). Além do sequenciamento, a especificidade também foi verificada através da curva de dissociação obtida após o RT-qPCR. Esse procedimento é realizado para a verificação de amplificações inespecíficas decorrentes de possíveis contaminações. Para as avaliações por RT-qPCR, foram usadas as mesmas amostras de P. citricarpa e P. capitalensis utilizadas para o sequenciamento dos transcriptomas. Para a síntese do cDNA (DNA complementar ) foi utilizado 500 ng/µl do RNA total das amostras. A síntese foi 25 conduzida utilizando o Kit RevertAid H minus First Strand cDNA Synthesis® (Thermo Scientific) de acordo com as instruções do fabricante. Ao final da reação, todos os cDNA foram diluídos 1:25 para posterior uso nas análises de expressão gênica. Para a realização do RT-qPCR foram utilizadas três repetições biológicas de cada condição, e três repetições técnicas. As reações foram realizadas usando 2 μl dos cDNAs diluídos e o kit FAST SYBR Green Master Mix® conforme instruções do fabricante (Life technologies). Os dados de fluorescências gerados na RT-qPCR foram exportados para o software Miner para a determinação da eficiência dos primers e o cálculo do Cq. O valor de Cq é obtido através de um algoritmo de regressão linear que se baseia na cinética das reações individuais sem a necessidade de curva padrão (http://www.miner.ewindup.info/). Os níveis de expressão dos genes candidatos foram calculados utilizando o método 2- ∆∆Ct (Livak & Schmittgen, 2001). Esse método calcula o nível de expressão relativa de um gene a partir dos Cqs dos genes alvo, normalizados com os valores de Cq de genes endógenos, em relação ao calibrador. O calibrador utilizado foram os valores obtidos de P. capitalenisis para os genes expressos na espécie patogênica e P. citricarpa para os genes expressos na espécie endofítica. O calibrador é o valor de obtido para uma amostra especifica. A variação dos níveis de expressão das amostras de interesse são obtidos em relação ao normalizador (Livak & Schmittgen, 2001; VanGuilder et al., 2008). As médias das três repetições biológicas de cada amostra com os diferentes genes analisados foram comparadas aplicando o teste t (P ≤0.05). Para a seleção dos normalizadores, genes comprovadamente com função constitutiva foram selecionados. As sequencias desses candidatos foram obtidas no GenBank e utilizadas para encontrar regiões conservadas dessas sequencias entre as duas espécies. Foram desenhados primers paras os genes 18s rRNA, 28s rRNA, Translation elongation factor e Glyceraldehyde- 3-phosphate dehydrogenase (Tabela 1). Tabela1: Genes candidatos para controle endógeno Gene Sequencias dos Primers 18S rRNA 18S1 F-TCTCTTCTGGTTCTGGCATCG R-TTGAAATGACGCTCGAACAG 18S2 F-GACGTGCGGTCCTATTTTGT R-AACATCCTTGGCAAATGCTT 26 Translation elongation factor Tef1 F-GCCTCACATTTTCTTTGAGC R-GCCAAAGCAGCTTAGCGTAG 28S rRNA 28S F-AGGTGTCGGGAATGTAGCAC R-TTACAACCATTACGCCAGCA Glyceraldehyde- 3- phosphate dehydrogenase GPD F-AAGGCCTCTGCTCACTTGAA R-CAAGAAGCGTTGGAGAGGAC As análises para a seleção dos genes normalizadores foram feitas através do algoritmo geNorm (Vandesompele et al., 2002). Esse programa determina o fator de estabilidade do gene (M), qual é definido através da avaliação da média de variação aos pares (‘pairwise variation’) de um gene comparando os demais genes candidatos. O baixo valor de M (m- value) demonstra uma alta estabilidade do gene normalizador. O número de genes normalizadores pode variar para distintos conjuntos de amostras. Este valor também pode ser calculado pelo software por meio do cálculo dos pairwise variation entre cada combinação sequencial de fatores de normalização (NF). Vandesompele e colaboradores propuseram 0,15 como m-value máximo aceitável, acima do qual, a inclusão de um gene endógeno não resulta em melhora da normalização (Artico et al., 2010; Vandesompele et al., 2002). Complementarmente, foi analisada a expressão de genes candidatos envolvidos na patogenicidade de diversos fungos em P. citricarpa e P. capitalensis. Genes com função patogênica em diversos fungos foram selecionados por meio de revisão bibliográfica e suas sequencias foram obtidas no GenBank. Essas sequências foram alinhadas com as ORFs de P. citricarpa utilizando a ferramenta Clustal W (http://www.ebi.ac.uk/Tools/msa/clustalw2/). Os primers para os genes selecionados foram desenhados nas regiões conservadas compartilhadas entre as espécies estudadas utilizando a ferramenta Primer blast (http://www.ncbi.nlm.nih.gov/tools/primer-blast/). As penalidades dos primers foram verificadas utilizando a ferramenta Primer 3 (http://www.bioinformatics.nl/cgi-bin/primer3plus/primer3plus.cgi/). Foram desenhados 16 pares primers para os genes que apresentaram maior similaridade com as sequencias de referência (Tabela 2). 27 Tabela 2: Genes envolvidos com patogenicidade escolhidos por similaridade com outros fungos fitopatogênicos Genes Sequências de primers Função Degradação de parede celular Cut A F-AGCCGCTAAAGTCTCTGCTG R-GTGGGGAGGCAGGATAACG Cutinase envolvida na degradação de parede celular Cut 2 F-ATGACGAACCAGGCCAACTC R-CACCTTTGACGCCTTGCTG Cutinase envolvida no reconhecimento de superfície, diferenciação germinativa, desenvolvimento de apressório, penetração no hospedeiro e virulência Genes envolvidos em sinalização BatrB F-GCTCAAGTACGTCGACACTGTA R-GGATAGAAGGCTTGGAGACGAG ABC transporter, Efluxo MagB F-GTCGCTCAACCAACATGAGA R-GCACATGATGTAAACATACCATTGA Subunidade Alfa de proteina G CHK1 F-AAAGCGATTGACGTCTGGAG R-AGGATGAGGGTGAGTTGGTG MAP kinase envolvida na conidiação, fomação de apressório e patogenicidade Genes envolvidos em estruturas de infecção e penetração THR1 F-GAGTTTGACCGCGTCTTCAG R-CGAGTAGACGGTGTGCTTGG Tetrahidroxinafitaleno redutase envolvida na penetração do apressório PKs1 F-TCCTCAAGCGTTACGAGGAC R-GTGATGGAGACAGCCTCAGC Poliketide sinthase, biossíntese de melanina SDH1 F-AGAAGGTTTCGGACGACGAG R-TTTGTACCAGTGCGTGTTGG scytalone desidratase e sítese de melanina Produção de metabólitos secundários e toxinas NPS6 F-ACTCCGAGCTGCTCTCATTTG R-AACGTCTGAGACCGTGAGACC Nonribossomal peptide sintase envolvida em fatores de virulência NPS2 F-ACTCCGAGCTGCTCTCATTTG R-AACGTCTGAGACCGTGAGACC Envolvido na biossíntese do sideroforo hidroxamato AaPEX6 F-ATCTCGACGGCCTACTTCTTC R-GCACTGACGCTGGGTACG Síntese de peroxissomos, síntese de metabolitos secundários e 28 patogenicidade DEC1 F-ACTTCAACACGACAGGCTTCA R-CCATGCGCTCAGTGATCTTG Decarboxilase AOX1 F-ACCCATTCTTCCCGTACGAC R-CGTGATGTTGCTCGACAGGT Álcool oxidase HTS1 F-AACCAAAACTCGGTCCAGGAA R-GGCGCTAATGCTATCAAGACC Peptideo sintetase catalizador da produção da toxina HC ToxF F-GCGTCTATGTCATGCCCACT R-AGCACTGGGGCATAGTTTCC Aminotransferase de aminoácidos de cadeia ramificada ToxC F-GACAGCGAGTGGGAAAAGACT R-AGCCTTGTCGAGAGCGAAG Sub unidade beta de sintetase de ácido graxo envolvida na síntese de Toxina HC A especificidade dos primers e a validação dos genes foram realizadas como descrito a cima para os genes utilizados para validação do sequenciamento transcriptômico. 29 5. Resultados e Discussão 5.1 Sequenciamento genômico 5.1.1 Dados gerais Após a extração, foi possível visualizar a boa qualidade dos DNAs de ambas as espécies de fungos em gel de agarose 0,8% (Figura 4). Dez microgramas de DNA de cada fungo foram enviadas para a empresa Macrogen para a realização do sequenciamento genômico. Como resultado do sequenciamento, foram obtidas 18.167.942.216 bases e 179.880.616 de reads para P. citricarpa, enquanto que para P. capitalensis foram gerados 15.031.933.020 de bases e 148.831.020 de reads. O conteúdo CG foi de 48,72% e 51, 43% para a espécie patogênica e endofítica, respectivamente. A qualidade das sequências com Phred >20 (Q20) foi superior a 90% para ambas as espécies (Tabela 3). Os reads das duas espécies foram usados para a montagem de novo do genoma. Foi gerado um genoma com aproximadamente 32.6 Mb distribuídos em 19.143 contigs para P. citricarpa e 33.2 Mb em 11.080 contigs para P. capitalensis. O N50 foi de 3.049 para P. citricarpa e 4.925 para P. capitalensis, esse valor (N50) significa que 50% das bases Figura 4: Qualidade das amostras de DNAs em gel de agorose 0,8%. Lambda (λ) 100 ng/μl; Cit1, Cit2, Cit3, correspondem às três repetições biológicas amostras de P. citricarpa; Cap1, Cap2, Cap3 correspondem às três repetições biológicas das amostras de P. capitalensis. 30 montadas estão em contigs de tamanho N ou maiores (Miller, Koren, & Sutton, 2010)(Tabela 4). Tabela 3: Características gerais do sequenciamento genômico de P. citricarpa e P. capitalensis. Espécie Total de Bases N° de reads Conteúdo CG (%) Q20 (%) P. citricarpa 18.167.942.216 179.880.616 48,72 93,52 P. capitalensis 15.031.933.020 148.831.020 51,43 91,63 Com o tamanho estimado do genoma por Glienke (1999) tornou-se possível verificar a profundidade de cobertura de sequenciamento realizado. As tecnologias de NGS baseadas em PCR, como a utilizada nesse trabalho, geram milhares de cópias dos fragmentos contidos nas bibliotecas gênicas durante o sequenciamento. A profundidade da cobertura de sequenciamento consiste na quantidade de vezes que os fragmentos em questão, no caso todo o genoma, foram sequenciados. Estimamos uma cobertura de 779.2x para P. citricarpa e 643.3x para P. capitalensis (Tabela 4). No período em que o estudo de Glienke foi realizado, P. citricarpa e P capitalensis eram consideradas cepas patogênicas e não patogênicas da mesma espécie, ambas denominadas Guignardia citricarpa (nomenclatura dada à fase sexual de P. citricarpa até 2012). Anos depois, a cepa não patogênica foi reclassificada como uma nova espécie, P. capitalensis (Baayen et al., 2002). Embasada nos trabalhos anteriores, Silva (2008) reproduziu a técnica de eletroforese de campo pulsado para estimar o número de cromossomos de P. citricarpa, P. capitalensis e Phyllosticta spinarum. Nesse estudo considerou-se 21,5Mb como sendo o tamanho do genoma de P. capitalensis. Apesar de estimar o número de cromossomos, o tamanho do genoma das espécies não foi estimado nesse trabalho. Após a montagem dos contigs, as sequências das espécies foram submetidas à predição das ORFs através do programa Augustus. Foram preditas 16.267 ORFs para a espécie patogênica e 14.813 para a espécie endofítica (tabela 4). Atualmente, os genomas dessas espécies encontram-se em processo de categorização dos genes por meio do programa Blas2go. 31 Tabela4: Montagem de novo para as espécies P. citricarpa e P. capitalensis. 5.1.2 Enriquecimento de vias pelo KEGG KEGG é um banco de dados que integra informações genômicas e funcionais. Esse banco de dados apresenta informações de genomas completos e parciais que consistem na anotação e diversas funções de cada gene. A ferramenta de anotação de genes e genomas disponível nesse banco de dados é amplamente utilizada, pois proporciona além da categorização, a representação gráfica dos processos celulares como metabolismo, ciclo celular, transdução de sinal, entre outros, em que os genes estão envolvidos (Kanehisa & Goto, 2011; Kanehisa et al., 2012; Mao et al., 2005). Análise preliminar dos genomas de P. citricarpa e P. capitalensis foi realizada utilizando a ferramenta KEGG. No entanto, aproximadamente somente 20% das ORFs das duas espécies foram categorizadas pelo programa. (Tabela anexo 01). Os resultados obtidos permitiram identificar algumas diferenças interessantes estre as espécies. 5.1.2.1. Metabolismo geral Foram observadas quantidades maiores de genes envolvidos com metabolismo de carbono e biossíntese de aminoácidos em P. citricarpa quando comparada à P. capitalensis (Figura 1, 2, 3 e 4 anexo; Tabela 02 anexo). Soanes e colaboradores (2008) postularam que enzimas envolvidas em vias essenciais a todos os fungos, como enzimas envolvidas na beta- oxidação, síntese e ácidos graxos, metabolismo de aminoácidos e utilização de açúcares estocados, são importantes para a patogenicidade. Os autores acreditam que quando essas vias são consideradas em conjunto elas podem representar o estado nutricional fúngico requerido para os estágios iniciais de infeção e nutrição no tecido hospedeiro. Reduções em famílias gênicas envolvidas em metabolismo primário e secundário foram observadas em Piriformospora indica, indicando que essa espécie necessita obter esses compostos a partir do hospedeiro para seu completo desenvolvimento (Zuccaro et al., 2011). Análises P. citricarpa P. capitalensis Tamanho estimado do genoma (Mb) 32.6 33.2 N° contigs 19.143 11.080 N50 -contigs 3.049 4.925 N° de ORFs 16.267 14.813 Cobertura do sequenciamento 779.2 X 643.3X 32 bioinformáticas demonstraram que o fungo biotrófico Blumeria graminis apresenta menores quantidades de genes envolvidos na biossíntese de aminoácidos (Giles et al., 2003). Os autores atribuíram essa redução ao estilo de vida do fungo que provavelmente utiliza a maquinaria hospedeira para obtenção de aminoácidos. Como relação a genes envolvidos com metabolismo secundário, as duas espécies apresentam quantidade de genes semelhantes, assim como quantidades parecidas de genes envolvidos com o metabolismo e degradação de xenobióticos (Tabela 03, anexo). P. capitalensis apresentou mais genes envolvidos na degradação e síntese de limoneno e genaniol (tabela 4 anexo). Terpenos, como limoneno e geraniol são os principais metabólitos secundários das plantas. Varma e colaboradores (2013) demonstraram que o fungo endofítico Piriformospora indica aumenta a quantidade de metabolitos envolvidos na síntese de ubiquinona e degradação de limoneno e pinene em resposta à rizobactéria Burkholderia cepacia sugerindo que esses metabólitos estão envolvidos em processos de biorremediação e interação planta-microrganismo. Em contra partida, a espécie patogênica apresentou maior quantidade de genes envolvidos com a síntese de aflatoxinas, tetraciclina e flavonol (tabela anexo 03). 5.1.2.2. Vias de sinalização De forma geral, as duas espécies apresentam quantidade similares de genes envolvidos em diversas vias de sinalização (tabela 05 anexo). Foi observado um número maior de genes envolvidos com a via de sinalização de cálcio na espécie endofítica (Figura 5 anexo), bem como duas proteínas quinases dependentes de cAMP (PKA), contra apenas uma a espécie patogênica (tabela 05 anexo). As vias de sinalização de cálcio são conservadas em fungos e a quantidade de cópias de genes pode variar entre espécies (Eaton et al., 2011). Essas vias são descritas como importantes na comunicação entre o microrganismo simbionte e a planta hospedeira atuando nos processos iniciais de infecção e nodulação (Dodd et al., 2010; vadassery & Oelmüller, 2009). As PKAs, são as proteínas centrais da via de sinalização dependente de cAMP sendo essencial em processo de crescimento e desenvolvimento (Eaton et al., 2011). A via de sinalização cAMP é requerida para o processo infeccioso de diversos fungos fitopatogênicos. A interferência em genes que codificam PKA promoveram a redução de virulência em diversos fungos como M. grisea, Fussarium verticillioides e U. maydis (Kahmann et al.1999; Choi & Xu2010; Klimpel et al.2002). 33 5.1.2.3. Genes envolvidos com patogenicidade ou simbiose Foi observado um número menor de genes que codificam para transportadores ABC na espécie endofítica em relação a espécie patogênica. (Figuras 6 e 7 anexo). Transportadores ABC estrão envolvidos no deslocamento de diversas substâncias, entre elas, toxinas produzidas pelo patógeno e pelo hospedeiro, contribuindo para a virulência e auxiliando o fungo a se desintoxicar de produtos produzidos pela defesa da planta (Howlett, 2006). Essa família gênica foi descrita por Aguileta e colaboradores (2008) como uma das famílias em expansão no reino fúngico, provavelmente essa expansão deve ser mais evidente em genomas de fungos fitopatogênicos uma vez que essas espécies estão mais expostas a respostas de defesa hospedeira. Corroborando os dados observados, análise genômica da espécie endofítica P. indica também apontou diminuição na quantidade de genes dessa família gênica (Zuccaro et al., 2011). Quantidades semelhantes de enzinas hidrolíticas envolvidas na degradação de parede celular vegetal foram identificadas nas duas espécies (Tabela 5; tabela 06, anexo), assim como pectato liase e pectina esterase, enzimas envolvidas na degradação da pectina, foram observadas nas duas espécies, (Tabela 5; tabela 06, anexo) demonstrando que as duas espécies apresentam capacidades similares de degradação da parede celular do hospedeiro. No entanto, P. citricarpa apresenta três vezes mais quitinases do que P. capitalensis. Tais enzimas são responsáveis pela degradação de quitina e geralmente estão envolvidas em processos de auto- lise no qual o fungo realiza a digestão de hifas velhas (Hartl et al, 2012). Uma hipótese para a identificação desses genes é a tentativa dessa espécie de reduzir quitinoligossacarídeos que são reconhecidos pelo hospedeiro de desencadeiam resposta de defesa (Amselem et al., 2011). Tabela 5. Quantidades de genes anotados que codificam enzimas hidrolíticas categorizadas em P. citricarpa e P. capitalensis. Genes candidatos P. citricarpa P. capitalensis alpha-amylase 3 3 endo-1,4-beta-xylanase 1 1 glucan 1,4-alpha-glucosidase 1 2 endoglucanase 4 1 endo-1,3(4)-beta-glucanase 1 2 alpha-glucosidase 4 2 beta-glucosidase 7 7 alpha-galactosidase 1 1 beta-galactosidase 1 1 alpha-mannosidase 2 2 34 beta-mannosidase 3 2 Quitinase 9 3 A identificação de genes que codificam fosfatases que respondem a diferentes tipos de pH podem elucidar algumas mudanças substanciais no estilo de vida de P. citricarpa e P. capitalensis. Foi identificado que a espécie endofítica apresenta mais fosfatases ácidas do que alcalinas (Tabela 07, anexo). Isso é um indício de que diversas enzimas dessa espécie, quais são utilizadas na obtenção de nutrientes, requerem um ambiente ácido para se tornarem ativas. Em contra partida, P. citricarpa apresenta quase a mesma quantidade de fosfatases alcalinas e ácidas o que sugere que essa espécie adequa a secreção de suas enzimas de acordo com o pH do ambiente (Manteau et al.; 2003; Alkan et al., 2012). 5.2 Análise do transcriptoma 5.2.1 Dados Gerais Após a extração, foi possível visualizar a boa qualidade dos RNAs de ambas as espécies de fungos através do “RNA Nano Labchips” no aparelho Bioanalyzer 2100 (Agilent Technologies) (Figura 5). Dez microgramas de DNA de cada fungo foram enviadas para a empresa Macrogen para a realização do sequenciamento genômico. Figura 5. Concentração e a integridade dos RNAs avaliadas em “RNA Nano Labchips” no aparelho Bioanalyzer 2100 (Agilent Technologies) demonstrada através de gráficos, onde cada um é referente a uma amostra que também é representada em gel. Amostras P. capitalensis 1 a 3, correspondem ao RNA das replicas biológicas de P. capitalensis e as amostras P. citricarpa. 1 a 3 correspondem ao RNA das replicas biológicas de P. citricarpa. 35 A análise de RNA-seq gerou em média 74 milhões de reads por repetição biológica para ambas as espécies (Tabela 6). Após a análise no programa Cufflinks foram obtidos 3,074 transcritos diferencialmente expressos, com valores de fold < 2, sendo 2,637 mais expressos em P. citricarpa e 1.097 em P. capitalensis (tabela 08, anexo). Tabela 6. Número de reads de transcriptoma gerados por RNA-seq de P. citricarpa e P. capitalensis. 5.2.2 Categorização pelo programa Blast2go Após a categorização dos genes diferencialmente expressos pelo programa Blast2go, foi verificado que a maioria das sequências mapeadas apresentou similaridade com as espécies Macrophomina phaseolina e Neofusicoccum parvum (Figuras 6 e 7). Macrophomina phaseolina é um ascomiceto pertencente à família Botryosphaeriaceae que ampresenta ampla distribuição geografica. M. phaseolina é um fungo necrotrófio que apresenta uma ampla gama de hospedeiros, causando a prodridão do carvão em mais de 500 plantas hospdereiras, incluindo diversas culturas comercialmente importantes como milho, soja sorgo, feijão, alfafa, entre outros (Islam et al., 2012). Pertencente à mesma família de M. phaseolina, N. parvum também apresenta ampla distribuição geográfica, e é patógeno de diversas plantas lenhosas. N. parvium um patógeno latente que possui estágios de vida semelhante a fungos endofíticos (Sakalidis, 2011). Espécie Repetições Biológicas N° de reads sequenciados P. capitalensis 1 77.265.680 2 74.021.134 3 68.074.552 P. citricarpa 1 76.999.094 2 76.596.154 3 71.154.164 36 Figura 6. Distribuição dos alinhamentos realizados entre as sequencias de P. citricarpa diversas espécies realizada automaticamente pelo programa Blas2go. 37 Figura 7. Distribuição dos alinhamentos realizados entre as sequencias de P. capitalensis diversas espécies realizada automaticamente pelo programa Blas2go. 38 O programa Blast2Go utiliza bancos de dados públicos para a categorização dos genes. Em seguida, os genes são classificados de acordo com sua função em três categorias: Processos biológicos, função molecular e componente celular. Vale apena ressaltar que as categorias podem se sobrepor, ou seja, um gene pode ser encontrado em uma ou mais categorias. Na categoria de processos biológicos foi observado que P. citricarpa concentra a maioria dos seus genes expressos em processos metabólicos e celulares (Figura 8). P. capitalensis também apresenta as categorias processos celulares e metabólicos com a maior quantidade de genes (Figura 8). No entanto, ao comparar P. citricarpa à P. capitalensis algumas diferenças que podem ser relevantes para o estilo de vida desses fungos são observadas como o aparecimento de dois grupos gênicos que não são encontrados na espécie patogênica: sistema imune e adesão biológica (Figura 8). Na categoria sistema imune o gene categorizado codifica uma proteína de fusão ubiquitina-ribossomal (ribosomal-ubiquitin fusion protein) (GO:0097190) segundo a anotação do Gene ontology envolvida em processos de apoptose (Tabela 09, anexo). A adesão é um processo importante para a infecção fúngica. Muitos fungos apresentam uma mucilagem que recobre os seus esporos facilitando a fixação deste no tecido hospedeiro e auxiliando assim no contato inicial (Tudzynski, & Sharon, 2003). As duas espécies aqui estudadas apresentam mucilagem recobrindo os esporos (Glienke, et al 2011), o que demonstra que a adesão do esporo ao hospedeiro é um fator limitante a infecção desses fungos. Após a germinação dos esporos, o fungo estimula a secreção de mucilagens que auxiliem a adesão do tubo germinativo e do apressório no hospedeiro. Durante essa fase diversas proteínas auxiliam o desenvolvimento dessas estruturas e medeiam a sinalização inicial entre planta e fungo (Tudzynski, & Sharon, 2003). Os genes identificados em P. capitalensis na categoria adesão biológica codificam reguladores transcricionais medusa (GO:0044406, GO:0048315). Segundo a categorização do Gene ontology (geneontology.org) esses genes estão envolvidos em processo de infecção, adesão do esporo ao hospedeiro e são importantes para a implantação da interação simbiôntica. 39 Figura 8. Categorização dos genes expressos em P. citricarpa (A) e P. capitalensis (B). Os genes foram categorizados automaticamente de acordo com GO (Gene Ontology) e distribuídos conforme o processo biológico em que o gene está envolvido. Além do aparecimento das categorias sistema imune e adesão biológica, pode-se observar que a espécie endofítica apresenta uma quantidade muito maior de genes envolvidos com vias de sinalização (42 genes) em relação à espécie patogênica (29 genes) (Figura 8). A forma como a planta e o microrganismo se reconhecem e respondem a estímulos é essencial para determinação do tipo de interação: simbiôntica ou patogênica. De forma geral, os eventos de sinalização que atuam na interação entre plantas e microrganismos simbiontes e patogênicos são similares, ativando as mesmas vias de sinalização. No entanto, os mecanismos de reconhecimento pelo hospedeiro que resultam na interação benéfica entre planta e fungo ainda não são bem esclarecidos (Vadassery & Oelmüller, 2009). As vias de transdução de sinal envolvidas na interação patógeno-planta mais caracterizadas são as vias das proteínas-G, MAPK e cAMP. No entanto, essas vias também estão envolvidas em outros processos fisiológicos importantes no desenvolvimento e sobrevivência fúngica de forma geral. 40 As proteínas-G estão envolvidas na regulação da transdução de sinais ambientais para células eucarióticas. A via de sinalização regulada por essas proteínas é formada por receptores, responsáveis pela percepção do sinal, que se ligam a essas proteínas formando as subunidades Gα, Gβ e GϪ. O sinal recebido pelos receptores é transmitido através das proteínas-G para a fosfolipases, proteínas quinase A dependente de cAMP (PKA) e MAPK, que ativam das vias de sinalização MAPK e cAMP (Yu et al., 2008). P. capitalensis apresentou maior quantidade de genes que codificam proteínas –G do que P. citricarpa (Tabela 09, anexo). Três dos quatro genes que codificam para proteínas-G mapeados na espécie endofítica foram caracterizados como Gα. Essa subunidade é o primeiro componente da cadeia de sinalização e está envolvida no desenvolvimento vegetativo, sexual e em processos de interação planta-patógeno e virulência de fungos fitopatogênicos (Aly et al, 2011; Gronover, et al, 2001). Três proteínas quinase A dependente de cAMP (PKA) foram identificadas em P. capitalensis (GO:0005952, GO:0016301, GO:0005952) e uma em P. citricarpa (Tabela 09, anexo). Proteínas PKAs são responsáveis pela transdução de sinal na via cAMP e interagem com as proteínas-G (Tudzynski & Sharon, 2003). A via cAMPK frequentemente interage com a via das proteínas MAP quinases. Um grupo de proteínas quinase serina/treonina altamente conservadas em eucariotos, que assim como a via cAMP, estão envolvidas na transdução de uma grande variedade de sinais extracelulares, regulação de processos de crescimento e diferenciação (Kim et al., 2000; Perotto & Baluska, 2012). Na espécie endofítica foram expressos três genes envolvidos com as vias de sinalização MAPK (GO:0000165, GO:0000909, GO:0004674), ao passo que a espécie patogênica não apresentou nenhum gene envolvido com essa via (Tabela 09, anexo). Estudos demonstraram que essas vias de sinalização são importantes para a determinação do estilo de vida endofítico, nos quais a deleção ou inativação de genes dessas vias levaram a expressão de características patogênicas em fungos endofíticos (Eaton et al., 2010; Hamel et al., 2012). Atividade catalítica e ligação foram os grupos mais representativos nas duas espécies na categoria funções moleculares. P. capitalensis apresentou um gene envolvido com reserva nutricional, categoria não encontrada na espécie patogênica, além de um maior número de genes envolvidos com atividade molecular estrutural em relação à P. citricarpa (Figura 9). 41 Figura 9 Categorização dos genes expressos em P. citricarpa (A) e P. capitalensis (B). Os genes foram categorizados automaticamente de acordo com GO (Gene Ontology) e distribuídos conforme a função molecular em que o gene está envolvido. O terceiro maior grupo em P. citricarpa foi o dos genes envolvidos no transporte (Figura 9). Os fungos possuem uma vasta quantidade de transportadores que medeiam a secreção e importação de uma variedade de compostos. Transportadores MFS (major facilitator superfamily transporter) estão envolvidos no transporte de solutos, carboidratos, proteínas e, juntamente com os Transportadores ABC (ATP-binding cassete transporter), são responsáveis pelo deslocamento de agentes tóxicos exógenos e endógenos ao fungo (Cornell et al., 2007; Del Sorbo et al., 2000). Foi observada a expressão de grande número de genes que codificam transportadores ABC e MFS, principalmente na espécie patogênica (Figura 10; tabela 10, anexo). Dentre 42 Figura 10. Principais categorias gênicas de transportadores expressos em P. citricarpa e P. capitalensis. Os diâmetros das circunferências correspondem ao número de genes encontrados em cada categoria. esses genes, foram identificados nove genes que codificam transportadores multidrogas na espécie patogênica e dois na espécie endofítica (Tabela 10, anexo). Diversos estudos evidenciaram a importância dos transportadores multi-drogas para a patogenicidade de fungos (Coleman et al, 2011; Del Sorbo et al., 2000). Tais trabalhos demonstraram que várias toxinas ativam a expressão dos genes que codificam esse tipo de transportadores (Del Sorbo et al., 2000). A interrupção desses genes alterou a capacidade do fungo Cercospora nicotiana de penetrar na planta hospedeira, sintetizar e secretar compostos tóxicos (Choquer et al., 2007; Urban et al., 1999). Transportadores ABC foram relatados como responsáveis pela resistência a diversos anti-fungicos em Candida albicans, 43 Cryptococcus neoformans e Candida glabrata (Sanglard et al, 1997; 1999; Posteraro et al, 2003;). Além desses transportadores, foram identificados genes que codificam proteínas de resistência a multidrogas nas duas espécies (GO:0055085 em P. citricarpa e GO:0042626 em P. capitalensis). A aquisição de resistência a diversos compostos anti-fungicos por P. citricarpa foi relatado em múltiplos trabalhos (Agostini & Peres, 2006; Hendricks, 2013; Possiede & Gabardo, 2009; Schutte & Mansfield, 2003), provavelmente as proteínas multidrogas aqui identificadas apresentam alguma relação com a indução de resistência nessa espécie. Um baixo número de genes que codificam transportadores ABC foram expressos na espécie endofítica (Figura 10; Tabela10, anexo). É possível que essa espécie apresente uma expressão mais tardia desses genes, como foi verificado em Piriformospora indica, cuja expressão desses genes que codificam transportadores ABC foi mais evidente aos 14 dias após a inoculação do fungo em Arabidopsis thaliana (Lahrmann et al., 2013). Um grande número de genes que codificam transportadores de íons metálicos e solutos foi expresso em P. citricarpa (Figura 10). Íons metálicos são essenciais para o funcionamento celular atuando como cofatores de diversos processos metabólicos. As concentrações de iônicas citoplasmáticas precisam ser finamente reguladas para que o funcionamento da célula não seja comprometido (Saier- Jr, 2000). Nesse sentido, a manutenção de homeostase celular depende do funcionamento eficiente de transportadores e de canais iônicos. Os transportadores encontrados em maior quantidade em P. citricarpa foram os responsáveis pelo deslocamento de sódio, potássio, ferro e cálcio (Figura 11). Transportadores de sódio e potássio frequentemente estão relacionados com a manutenção do pH intracelular e do gradiente iônico da membrana plasmática (Rodríguez- Navarro & Benito, 2010; Benito et al., 2011). Em fungos e leveduras o cálcio modula uma série de cascatas de sinalização importantes para a simbiose e patogênese. Mutantes deletérios de genes envolvidos no transporte de cálcio apresentaram má formação em conídios e apressórios, no entanto, a ação da ausência desses genes na patogenicidade diverge entre espécies. A mutação em genes que codificam canais de cálcio em Botrytis cinerea não promoveu ausência de patogenicidade (Harren & Tudzynski, 2013). Em contra partida, efeitos na virulência foram evidenciados em mutantes deletérios de Claviceps purpurea para gene que codifica canais iônicos (Bormann & Tudzynski, 2009). Os íons metálicos podem ser divididos em dois grupos: íons redox ativos como Fe2+, Cu2+, Co2+ e não ativos como Ca+ e Zn2+. Os íons ativos geralmente compõem enzimas com função em atividade redox e são importantes na conversão de componentes que contenham 44 oxigênio ativo. Dentre esses íons ativos, o ferro destaca-se, pois é um cofator indispensável de uma variedade de processos celulares como transporte de íons, biossíntese de esteróis, metabolismo de aminoácidos. Além disso, o excesso de íons de ferro livre pode catalisar a formação de e