Medicina Veterinária ISSN 1809-4678 ______________________________________________________________________________________________ (*) Autor para correspondência/Corresponding author: Rua Adhemar de Barros, nº 500 – Ondina, 40170-110, Salvador, Bahia, Brasil. E-mail: arianneoria@ufba.br Submetido em: 02 de julho de 2012 Aceito em: 04 de junho de 2013 Glaucoma secundário em cães e gatos [Secondary glaucoma in dogs and cats] “Revisão / Review” AP Oriá 1* , DC Gomes Junior 2 , MR Souza 3 , JM Costa Neto 1 , A Estrela-Lima 1 , FA Dórea Neto 4 1Professor do Departamento de Patologia e Clínicas da UFBA, Salvador, Bahia, Brasil. 2Mestrando FCAV/UNESP, Jaboticabal, São Paulo, Brasil. 3Mestranda Pós-graduação em Ciência Animal nos Trópicos, UFBA, Salvador, Bahia, Brasil. 4Professor da UNIME, Lauro de Freitas, Salvador, Bahia, Brasil. ______________________________________________________________________ Resumo O glaucoma é uma síndrome que acomete animais de diferentes espécies e em diferentes momentos de sua vida, tendo causas variáveis em função desta apresentação. Trata-se de uma emergência oftálmica que pode trazer danos irreversíveis a visão bem como a apresentação estética do paciente. Os sinais clínicos comumente apresentados por cães são: aumento da pressão intraocular, presença de vasos episclerais ingurgitados, hiperemia conjuntival, dor, uveíte anterior, luxação da lente e buftalmia, enquanto em gatos, os sinais são menos expressivos, notando-se midriase, leve injeção ciliar e buftalmia progressiva. Para o seu diagnostico são realizados três procedimentos básicos: tonometria, gonioscopia e oftalmoscopia. Quanto ao tratamento pode-se instaurar terapêutica medicamentosa associada ou não a intervenção cirúrgica, contudo, em algum momento, será necessária a realização da evisceração ou enucleação do bulbo do olho. Palavras-chave: canino, felino, pressão intraocular, oftalmologia. Abstract Glaucoma is a syndrome that affects animals of different species and in different moments of his life, having variables causes in function of this presentation. It is an ophthalmic emergency that may develop irreversible vision damage as well as the patient's aesthetic presentation. Increased intraocular pressure, presence of engorged episcleral vessels, conjunctival hyperemia, pain, anterior uveitis, lens luxation and buftalmia are commonly clinical signs presented by dogs while in cats, signs are less expressive, noting mydriasis, mild ciliary injection and progressive buftalmia. For diagnosis are carried out three basic procedures: tonometry, gonioscopy and ophthalmoscopy. The treatment can establish with medical therapy with or without surgical intervention, however, at some point it will be necessary to perform enucleation or evisceration of the eye bulb. Keywords: canine, feline, intraocular pressure, ophthalmology. ___________________________________________________________________________ Introdução O glaucoma é considerado uma das maiores causas de perda da visão em cães (WILLIS, 2004; GROZDANIC et al., 2007; PETERSEN-JONES, 2007; MILLER, 2012) e em gatos, tendo ocorrência de 0,8% e 0,3%, respectivamente (MILLER, 2012). Ocorre devido ao aumento da pressão intraocular (PIO) ocasionada pela redução ou obstrução da drenagem do humor aquoso. Oriá et al., Glaucoma secundário em cães e gatos..................................................................................... ....................14 Medicina Veterinária, Recife, v.7, n.3, p.13-22, 2013 Trata-se de via final comum a um grupo de condições que propiciam a perda progressiva de sensibilidade e função, seguidas de morte das células ganglionares da retina, perda de axônios do nervo óptico (GELLAT, 2003; WILLIS, 2004; MARTINS et al., 2009), escavação da cabeça do disco óptico, redução progressiva dos campos visuais e da visão (GELLAT, 2003; MARTINS et al., 2009). A drenagem do humor aquoso se dá por duas vias. A via convencional é responsável pela drenagem de 85 a 90% na espécie canina e de cerca de 97% em felinos. Nesta, o fluido passa entre os ligamentos pectinados, em permeio a fenda ciliar, que contém a malha trabecular (SLATTER, 2005; MARTÍN, 2007) e penetra o plexo venoso escleral, retornando ao sistema venoso (SLATTER, 2005). Na via não convencional, conhecida como uveoescleral, o humor aquoso passa para a circulação venosa pelos espaços supraciliar e supracoroidal (SLATTER, 2005; MARTÍN, 2007). O aumento do tamanho do bulbo do olho (buftalmia) decorre do incremento da PIO, que provoca a deformidade da córnea (SLATTER, 2005; MARTÍN, 2007) e da esclera (GAARDER, 2002a) devido ao estiramento e adelgaçamento das fibras colágenas que as compõem (MARTÍN, 2007). Tais alterações são irreversíveis mesmo com a diminuição da PIO (MARTIN, 1998). Rupturas na membrana de Descemet (estrias de Haab`s) se desenvolvem com o aumento da PIO (MILLER, 2001; MARTÍN, 2007) e são observadas como fissuras lineares e brancacentas no estroma corneal (MILLER, 2001; GAARDER, 2002a; SLATTER, 2005) que podem ramificar-se e estender-se por toda a córnea (GAARDER, 2002a; SLATTER, 2005). A localização anatômica da córnea a torna mais susceptível a agentes externos e menos umidificada pelo filme lacrimal, sujeitando-a a ceratites por exposição, ulceração e perfuração. A luxação de lente ocorre pelo rompimento dos ligamentos zonulares (SLATTER, 2005; MARTÍN, 2007) levando ao seu deslocamento anterior ou posterior (SLATTER, 2005). Classificação O glaucoma pode ser classificado de acordo com a causa em primário, quando na ausência de afecções intraoculares preexistentes ocorre elevação da PIO, devido a redução ou impedimento da drenagem do humor aquoso pela diminuição ou fechamento do ângulo iridocorneal, respectivamente (GELATT, 2003; GELATT et al., 2007; BERNARDES 2008; MILLER, 2012), sendo comumente bilateral e; secundário, quando ocorre elevação da PIO devido a afecções intraoculares preexistentes ou concomitantes as quais formam uma barreira física que obstrui a drenagem do humor aquoso (GELATT et al., 2007). Citam-se as alterações da lente, a uveíte anterior não controlada e as neoplasias intraoculares como as causas mais comuns (GELATT e MACKAY, 2004; MANDELL e HOLT, 2005; BERNARDES, 2008). O glaucoma congênito ocorre quando há uma anormalidade no desenvolvimento das vias de drenagem do humor aquoso, na zona do trabeculado (condição rara nos animais domésticos e observada logo após o nascimento) (SLATTER 1990). Na aparência do ângulo irido- corneal à gonioscopia, classifica-se o glaucoma em aberto, fechado ou estreito (MARTIN, 1998; GELATT, 2003; SLATTER, 2005) e na duração ou estágio da doença é considerado agudo quando os sinais são apresentados há menos de dois dias, e crônico com mais de cinco dias (MANDELL e HOLT, 2005). Sinais clínicos Deve-se suspeitar de glaucoma em pacientes com edema na córnea sem causa aparente, anormalidades da pupila ou da posição da lente, uveíte anterior crônica e déficit visual (MILLER, 2012), porém os sinais clínicos dependem do estágio da doença (MILLER, 2001; GELATT et al., Oriá et al., Glaucoma secundário em cães e gatos..................................................................................... ....................15 Medicina Veterinária, Recife, v.7, n.3, p.13-22, 2013 2007). Em geral, sinais incipientes não são percebidos pelos proprietários até que a PIO se encontre em níveis muito elevados, o que por sua vez dificulta o sucesso da terapia medicamentosa por não haver precocidade diagnóstica (MARTINS et al., 2009). A midríase e paralisia do músculo esfíncter da íris ocorrem quando a PIO se apresenta maior que 40 mm Hg (MILLER, 1995; GALLO e RANZANNI, 2002; GELATT, 2003; MILLER, 2012). Pressões acima de 60 mm Hg podem levar a cegueira em 24 a 48 horas. Elevações suaves levam a mesma complicação ao longo de semanas a meses. Tal consequência é proveniente de dano irreversível a retina e ao nervo óptico (KOCH e SYKES, 2002; BROOKS, 2008; MILLER, 2012). Comumente, o paciente expressa dor ao esfregar os olhos contra o solo ou patas. Em casos crônicos, quando a dor não é tratada, o animal passa a demonstrar timidez (se esconde atrás de móveis), apatia e, em alguns casos, torna-se agressivo. Salienta-se que muitos animais compensam o desconforto ocular e não demonstram sinais de dor (SLATTER, 1990). Pode-se observar buftalmia, injeção episcleral, hiperemia conjuntival, edema corneal difuso, midríase e reflexos pupilares diminuídos ou ausentes, fraturas de Descement, luxação ou subluxação da lente, catarata, alterações no reflexo tapetal, atenuação da vascularização da retina e Phthisis bulbi (MILLER, 1995; GALLO e RANZANNI, 2002; GELATT, 2003; MILLER, 2012) (Figuras 1 e 2). Figura 1. Macrofotografia de olho de cão portador de glaucoma. Notar vasos conjuntivais (mais finos e retilíneos) e episclerais (mais grossos e tortuosos) congestos, neovascularização, pigmentação ventral da córnea e edema profundo e difuso. Figura 2. Macrofotografia de olho de cão portador de glaucoma secundário a uveíte por hemoparasitose. Notar intensa hemorragia conjuntival e ulceração corneana central por lagoftalmia resultado da buftalmia. Oriá et al., Glaucoma secundário em cães e gatos..................................................................................... ....................16 Medicina Veterinária, Recife, v.7, n.3, p.13-22, 2013 Gatos apresentam sinais mais sutis, nota-se pequena injeção ciliar, podendo exibir midríase e progressiva buftalmia (MILLER, 1995; GALLO e RANZANNI, 2002; GELATT, 2003; MILLER, 2012) (Figuras 3 e 4). Diagnóstico O diagnóstico pode ser sugerido através das semiotécnicas clínica e oftálmica associadas ao histórico e a raça. Cabe ressaltar que sua confirmação se dá através da tonometria (mensuração da PIO) e da gonioscopia (quando em glaucoma primário observa-se diminuição ou obstrução do ângulo iridocorneal) (GELATT, 2003; MILLER, 2012). A PIO pode ser afetada pela idade, raça (SLATTER, 2005; COLITZ, 2007), alterações nas pressões osmóticas e sanguíneas, inflamação intraocular (SLATTER, 1990), método de contenção, tonometrista, bem como o tipo de tonômetro utilizado (SLATTER, 2005; COLITZ, 2007). Os cães braquicéfalos, os pacientes agitados, e os que são de difícil contenção podem apresentar variações pressóricas falsamente elevadas uma vez que compressões sobre o pescoço ou estruturas perioculares irão elevar a PIO (COLITZ, 2007). Em cães a PIO normal oscila entre 15 e 25 mm Hg (WILKIE, 1998; CARNEIRO-FILHO, 2004; MANDELL e HOLT, 2005; MARTÍN, 2007) e em gatos esta deve se encontrar abaixo de 32 mm Hg (MILLER, 2012). A tonometria pode ser realizada digitalmente ou mediante utilização de instrumento denominado de tonômetro (CARNEIRO-FILHO, 2004; TALIERI et al., 2006). A tonometria digital é realizada utilizando dois dedos (não os polegares) para a palpação do bulbo do olho através da pálpebra superior cerrada (MARTIN, 1998; TALIERI et al., 2006; BROOKS, 2008). Trata-se de técnica rudimentar que diferencia apenas olhos “moles”, “médios” e “duros” (MARTIN, 1998). O tonômetro de identação de Schiotz é um instrumento de baixo custo ainda utilizado na rotina veterinária (TALIERI et al., 2006; MARTÍN, 2007; MARTINS et al., 2009). Sua utilização deve ser desestimulada devido a dificuldade Figura 3. Macrofotografia de gato portador de uveíte bilateral e glaucoma secundário em olho esquerdo. Figura 4. Macrofotografia do olho esquerdo do gato da figura 3. Notar discreto edema corneano difuso, neovascularização da córnea, ulceração corneana central e presença de precipitados ceráticos passíveis de visibilização no endotélio adjacente. Oriá et al., Glaucoma secundário em cães e gatos..................................................................................... ....................17 Medicina Veterinária, Recife, v.7, n.3, p.13-22, 2013 de manutenção da posição dos pacientes para a execução do exame. Os tonômetros de aplanação são facilmente empregados e podem ser utilizados com o paciente em diversas posições. O Tonopen 1 é o aparelho mais difundido para uso em animais domésticos e, realizada a leitura, o resultado, em mm Hg, é apresentado no visor ao mesmo tempo em que o seu desvio padrão (MARTINS et al., 2009), o qual não deve ser maior que cinco em qualquer espécie. Sua pequena base possibilita uso em olhos doloridos e em pacientes menos cooperativos, uma vez que para obter leitura bastar colocá-la em contato com uma pequena área da córnea (COLITZ, 2007). A posição da cabeça do paciente não interfere na obtenção da leitura (WILKIE, 1998; COLITZ, 2007). O Tonovet 2 foi recentemente introduzido no mercado para uso veterinário (COLITZ, 2007; BROOKS, 2008), sendo sua grande vantagem a possibilidade de utilização sem anestesia tópica, porém, a curva de aprendizado não é tão rápida comparativamente à do Tonopen (COLITZ, 2007). A oftalmoscopia direta e indireta é recomendada para o manejo clínico dos pacientes glaucomatosos (GELATT, 2003). É utilizada para observação de hiperreflexia da área tapetal associada à atenuação ou perda completa de vasos retinianos, atrofia do epitélio pigmentar no fundo não tapetal e atrofia óptica (MARTIN, 1998; MILLER, 2001; SLATTER, 2005; MARTINS et al., 2009). Porém, a opacidade dos meios transparentes poderá impedir a sua realização (TALIERI et al., 2006). Terapia medicamentosa Uma vez que o paciente esteja diagnosticado, deve-se buscar a causa e o grau de lesão ocular (WILKIE, 1998; COLITZ, 2007) e iniciar imediatamente terapia medicamentosa agressiva com o intuito de controlar a PIO (MANDELL e 1 TonoPen XL, Reichert Technologies, New York, USA 2 Tonovet, Jorgensen Labs, Colorado, USA HOLT, 2005). O objetivo terapêutico é manter a visão do paciente pelo maior tempo possível e eliminar a dor ocular (MILLER, 1995; MARTÍN, 2007; BROOKS, 2008). As preparações tópicas são indicadas para o manejo do glaucoma em cães e em gatos (WILLIS, 2004). Todavia, a resposta é individual e variável, não havendo um único protocolo terapêutico aplicável a todos os indivíduos (VAN DER WOERALT, 2001; WILLIS, 2004). O guardião deve sempre ser alertado que, por vezes, o glaucoma é controlado satisfatoriamente a curto prazo, todavia, a longo prazo, devido ao aumento da PIO será requerido a adoção de conduta cirúrgica (COOK, 1997). A terapêutica clínica visa reduzir a produção do humor aquoso (agonistas e antagonistas adrenérgicos e inibidores da anidrase carbônica) ou aumentar sua drenagem (colinérgicos e análogos das prostaglandinas) (WILLIS, 2004). Contudo, outros fármacos devem ser associados para que se corrijam as alterações clínicas concomitantes, a exemplo das uveítes (GELLAT, 2003). Dentre as classes farmacêuticas indicadas no tratamento do glaucoma secundário citam-se os adrenérgicos antagonistas (beta bloqueadores), os inibidores da anidrase carbônica (dorzolamida e brinzolamida) e os antiinflamatórios esteróides e não esteróides. Salienta-se que a utilização de agentes colinérgicos (pilocarpina) e adrenérgicos agonistas (apraclonidina e brimonidina) é contraindicada em casos de glaucoma secundário associado à uveíte (WILKIE, 1998; GELATT, 2003; RIBEIRO et al., 2007; BROOKS, 2008) porquanto suscitam miose e quebra da barreira hematoaquosa (RIBEIRO et al.,, 2007) exacerbando a dor e os sintomas da uveíte (WILKIE, 1998; GELATT, 2003; BROOKS, 2008). Os análogos das Oriá et al., Glaucoma secundário em cães e gatos..................................................................................... ....................18 Medicina Veterinária, Recife, v.7, n.3, p.13-22, 2013 prostaglandinas também não são indicados, visto que o humor aquoso, nessas condições, já é rico em prostaglandinas. Igualmente, seu uso não se encontra indicado em pacientes afácicos, pseudofácicos ou com luxação anterior da lente, por serem potencialmente mióticos, podendo ocasionar bloqueio pupilar agudo e encarceramento do vítreo (WILLIS, 2004). As lentes luxadas anteriormente devem ser retiradas nos olhos com função visual, com o intuito de liberar o bloqueio pupilar e prevenir o dano corneal decorrente do contato da lente com o endotélio (MILLER, 2001; BROOKS, 2008). Se a luxação for posterior, em geral, a lente não é removida por causa do alto risco de complicações como descolamento de retina e hemorragia vítrea (MILLER, 2001) sendo indicado o uso de mióticos para reduzir a PIO e garantir que a lente não penetre na câmara anterior (SLATTER, 2005). Cabe ressaltar que os mióticos, a exemplo da pilocarpina, suscitam quadros inflamatórios muitas vezes importantes devendo ser descontinuados e até contraindicados na presença de uveíte (MARTIN, 1998; WILKIE, 1998; GELATT, 2003; BROOKS, 2008). Os agentes osmóticos, como o manitol e glicerol normalmente não são usados em pacientes com glaucoma secundário, uma vez que para serem efetivos exigem uma barreira uveoescleral intacta (WILKIE, 1998; GAARDER, 2002b; GELATT, 2003; WILLIS, 2004; RANZANI et al., 2009). Os adrenérgicos antagonistas são bastante utilizados por reduzirem a gênese do humor aquoso (WILKIE, 1998; WILLIS, 2004; BROOKS, 2008), mas, também podem ensejar miose (MARTINS et al., 2009). Sua ação sistêmica em receptores beta o contraindica em pacientes com insuficiência cardíaca e enfermidade pulmonar (WILLIS, 2004; MARTÍN, 2007). Destaca-se no tratamento antiglaucomatoso por apresentar baixo custo e fácil disponibilidade (BORGES et al., 2007). O betaxolol é seletivo para os receptores beta-1 e parece ser quase tão eficaz quanto o timolol na redução da PIO em cães (MILLER, 2001), porém poucos foram os trabalhos conduzidos para verificar a sua ação relativamente à redução da PIO (WILLIS, 2004). Acredita-se que o nipradilol (seletivo para os receptores alfa- 1) atue aumentando o fluxo uveoescleral. Sua potência corresponde à metade da demonstrada pelo maleato de timolol no bloqueio de receptores beta-adrenérgicos, no entanto não possui os efeitos colaterais sobre a pressão sanguínea e a frequência cardíaca (MAEHARA et al., 2004; MARTINS et al., 2009). Os inibidores da anidrase carbônica funcionam reduzindo a PIO através do bloqueio da enzima anidrase carbônica, responsável pela produção ativa de humor aquoso (WILKIE, 1998; GAARDER, 2002b; GELATT, 2003; BROOKS, 2008). A dorzolamida a 2% mostra-se eficaz em reduzir a produção do humor aquoso e a PIO quando utilizada a cada 8 horas (WILLIS, 2004; MARTINS et al., 2009). Durante sua utilização poderá ser observado quadro de blefarite em cães, contudo a sua resolução se dá com a descontinuidade do tratamento. Comercialmente pode ser encontrada associada ao maleato de timolol a 0,5%, para utilização duas vezes ao dia. A brinzolamida possui pH mais alto que a dorzolamida, próximo da neutralidade, provocando menos desconforto ao animal (WILLIS, 2004) e efeito de diminuição pressórica similar, contudo não atua de forma eficaz na espécie felina. Os antiinflamatórios esteroides (AIEs) e não-esteroides (AINEs) são recomendados como adjuvantes no controle da inflamação em glaucomas secundários a uveítes (MARTINS et al., 2009), com frequência de uma a seis vezes ao dia de acordo com a gravidade da inflamação. Em uveítes severas, normalmente quando o segmento posterior encontra-se comprometido e cuja causa de base não é de Oriá et al., Glaucoma secundário em cães e gatos..................................................................................... ....................19 Medicina Veterinária, Recife, v.7, n.3, p.13-22, 2013 cunho infeccioso, a corticoterapia sistêmica terá indicação (SLATTER, 2005). Os glicocorticóides atuam reduzindo a exsudação e a infiltração inflamatória, inibindo a degranulação de mastócitos, a atividade fibroblástica e a formação de colágeno, reduzindo, ainda, a neovascularização pós-inflamatória, além de inibirem as respostas imunes celular e humoral e tenderem a restaurar a permeabilidade normal dos capilares inflamatórios (ANDRADE e JERICÓ, 2002; FINAMOR et al., 2002; SLATTER, 2005; RANZANI et al., 2009). A dose do glicocorticóide deve ser reduzida gradualmente mediante a melhora clínica (RANZANI et al., 2009). A corticoterapia tópica, usualmente, constitui-se de predinisolona a 1% (FINAMOR et al., 2002; GELATT, 2003; SLATTER, 2005; LIMA, 2009) ou de dexametasona a 0,1% (MILLER, 2001; FINAMOR et al., 2002; GELATT, 2003; SLATTER, 2005; LIMA, 2009; MARTINS et al., 2009). Corticóides subconjuntivais são recomendados como adjuvantes da terapia tópica ou sistêmica, em presença de inflamação ocular severa ou, alternativamente, em animais onde a terapia tópica por razões diversas, não é possível (FINAMOR et al., 2002). São exemplos de substâncias, o acetato de metilpredinisolona (ANDRADE e JERICÓ, 2002; SLATTER, 2005), a betametasona, a dexametasona e a triancinolona (ANDRADE e JERICÓ, 2002; SLATTER, 2005; LIMA, 2009). Para um controle mais efetivo da inflamação, muitas vezes, faz-se necessário a associação de fármacos esteróides e não-esteróides por via tópica (ANDRADE e JERICÓ, 2002). Cabe ressaltar que a corticoterapia tópica com uso crônico na espécie felina pode resultar em incremento da pressão intraocular (ZHAN et al., 1992; BHATTACHERJEE et al., 1999). Terapia cirúrgica O glaucoma comumente torna-se refratário à terapia medicamentosa ao longo do tratamento. Muitas vezes, a intervenção cirúrgica torna-se obrigatória para o alívio da dor e desconforto ocular. Os procedimentos cirúrgicos recomendados para o manejo de olhos glaucomatosos e cegos incluem a ablação farmacológica do corpo ciliar, a ciclofotocoagulação, a cicloterapia, a enucleação (com ou sem a utilização de implantes) ou a evisceração com colocação de implante intraocular. A ablação química do corpo ciliar (destruição farmacológica por necrose tóxica do corpo ciliar mediante a injeção intravítrea de sulfato de gentamicina e dexametasona) (COOK, 1997; GELLAT, 2003; BRANDÃO et al., 2007; BROOKS, 2008; MARTINS et al., 2009) pode ser empregada, exceto na presença de neoplasia ou inflamações oculares (PENTLARGE, 1992; BROOKS, 2008). Permite a manutenção do bulbo do olho reduzindo seu tamanho até próximo ao normal, retira a dor ocular e apresenta bom resultado estético, contudo, com evidente opacidade corneana (CHIURCIU et al., 2007). Hemorragia ocular, opacificação corneal, formação de catarata, redução inadequada da PIO, phthisis bulbi (MILLER, 1995; COOK, 1997; GELATT e BROOKS, 1999; ABRAMS, 2000) e a possível persistência do quadro de dor ocular, são complicações frequentes e motivos pelos quais a técnica deve ser evitada (COOK, 1997). A ciclocrioterapia (aplicação de nitrogênio líquido ou óxido nitroso no corpo ciliar, com o objetivo de produzir áreas focais de atrofia e fibrose do corpo ciliar e de seu epitélio) (COOK, 1997; GELATT e BROOKS, 1999; WILKIE, 1998; MARTÍN, 2007) ou a ciclofotocoagulação (aplicação de laser transescleralmente com o intuito de destruir o corpo ciliar) (WILKIE, 1998; GELATT, 2003; MARTÍN, 2007; BROOKS, 2008) apresentam eficácia relativa ao controle da PIO e são pouco previsíveis. Possíveis complicações incluem intensa quemose, conjuntivite, descolamento e degeneração retinianas (MARTÍN, 1998), catarata e uveíte faco-induzida com o reaparecimento da dor ocular, do glaucoma ou levar ao phthisis bulbi (MILLER, 2001). Oriá et al., Glaucoma secundário em cães e gatos..................................................................................... ....................20 Medicina Veterinária, Recife, v.7, n.3, p.13-22, 2013 O’Reilly et al. (2003) avaliando cães que desenvolveram glaucoma após extração lenticular intracapsular, submetidos a ciclofotocoagulação, notaram que a técnica é valida por um a três meses após a cirurgia, sendo na maioria dos casos necessário a utilização de medicações antiglaucomatosas, repetição da cirurgia ou utilização de outra técnica como a ablação química do corpo ciliar para o controle da PIO. A enucleação ou evisceração com ou sem a utilização de implante é comumente utilizada para o alívio da dor ocular (MIGLIORI, 2002). Dar-se preferência a enucleação por ser um procedimento que envolve menos complicações pós-operatórias imediatas e tardias. A evisceração é contra indicada na presença de olhos buftálmicos, com ceratite de exposição, ulcerações e outras afecções corneais assim como os casos de neoplasias intraoculares, endoftalmites ou panoftalmites (HAMOR et al., 1994; MCLARGHLIN et al., 1995). Considerações Os sinais clínicos apresentados pelo paciente glaucomatoso torna muito claro o diagnóstico sugestivo da alteração. Desse modo, deve-se encaminhar o animal para um médico veterinário oftalmologista, para que seja realizada toda a semiotécnica oftálmica em busca do diagnóstico definitivo e de outras alterações concomitantes menos evidentes ao clínico geral. O guardião deve estar ciente da evolução da doença, e que em algum momento o paciente irá ser submetido a procedimento cirúrgico para o alivio da dor ocular, sendo ainda informado das alterações estéticas causadas pelo procedimento curativo. 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