Resumo / abstract Ver-se no verso, intimamente: Nádia Battella Gotlib Neste artigo, abordamos a trajetória intelectual de Nádia Battella Gotlib – professora, pesquisadora e crítica de Literatura Brasileira, cujo trabalho se destaca pela abor- dagem da produção artística feminina e, também, das relações entre literatura e biografia. Palavras-chave: crítica literária; fotobiografia; literatura brasileira; mulher; Nadia Battella Gotlib. See yourself in verse, intimately: Nádia Battella Gotlib In this paper, we discuss the intellectual trajectory of Na- dia Battella Gotlib – teacher, researcher and critic of Bra- zilian Literature whose work stands out for its approach to women’s artistic production and also the relationship between literature and biography. Keywords: literary criticism; photobiography; Brazilian literature; woman; Nadia Battella Gotlib. Ver-se no verso, intimamente: Nádia Battella Gotlib Arnaldo Franco Junior Professor Doutor da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP), campus de São José do Rio Preto-SP afjr@ibilce.unesp.br Não era mais uma menina com um livro: era uma mulher com o seu amante. Clarice Lispector (Felicidade Clandestina) Leve, como leve pluma Muito leve, leve pousa. João Apolinário (Amor) Mulher em casa Debruçada à janela de um casarão colonial de paredes verdes, uma mulher, de blusa amarela, sorri para o que vê, estabelecendo um contato feliz com o objeto de seu olhar. Dá-se, também, nesse con- tato que é partilha, recebimento, entrega, discreta sedução. Nas cores, no elemento arquitetônico e, sobretudo, na figura humana, a imagem sintetiza inúmeros traços de brasilidade. Nos gestos: ale- gria, sereno assentamento no interior da casa, abertura para a vida do espaço público – rua, cidade, país, mundo –, lugar dos encontros possíveis: vidas, experiências, ideias, o outro. Uma mulher em sua casa: dentro e fora. Começo pela fotografia de Fernanda Acioly porque ela é da mesma natureza de algumas das fotos mais significativas selecionadas e organizadas para a fotobiografia de Clarice Lispector ou a biografia literária de Tarsila do Amaral. É uma imagem cuja síntese ultrapassa a metonímia, convertendo-se em fragmento narrativo que alude a uma totalidade que escapa, iluminando- se de alguns de seus traços mais característicos, dentre os quais o de oferecer-se à imediata reinterpretação: uma singularidade multifacetada. 252 ] Arnaldo Franco Junior De professores e alunos Meu primeiro contato com Nádia deu-se em 1982, meu segundo ano de Letras na FFLCH-USP. Como resistir ao apelo da professora que sorria, alegre, convidando-nos a realizar leituras e pesquisa de modo rigoroso sem que disciplina implicasse em perda do bom humor? Como resistir a um programa de disciplina, Literatura Brasilei- ra II, que equilibrava Mário e Oswald de Andrade, reco- nhecendo o valor da obra e das contribuições de ambos para a literatura, a cultura e a sociedade brasileiras? Isso, sem esquecimento de Anita Malfatti, Pagu e Tarsila do Amaral – as modernistas. Dessas aulas, posso dizer que ensinaram, efetivamente, “a ler ou ler para constatar situ- ações as mais diversas, que [estimulavam] experiências, com o objetivo de construir um situar-se num meio social determinado; situar-se que se [manifestava] por projetos de ação extraídos dos textos ‘melhores’ e que acaba[va] m por compor o repertório de ação pessoal de cada um” (GOTLIB, 1981, p. 74-75 – grifos no original; colche- tes nossos). Posso acrescentar que visavam, aliás, como sempre em suas outras disciplinas e cursos, “à boa for- mação – pelo trabalho de reflexão crítica e vivência cria- tiva – [estimulando] a reunião de textos e autores em função de um laço que os aproxim[ava] por suas tendências de colaboradores no aperfeiçoamento das relações humanas, pelas suas tendências ‘humani- zantes’” (GOTLIB, id., ibid. – grifos no original; colchetes nossos). Trabalho, este, de resistência porque integrado a um “projeto educativo que passa a correr os riscos e as ameaças de um contexto que lhe contrarie as pretensões – como contrariou da década de 60 em diante” (GOTLIB, id., ibid.). Trabalho, por fim, difícil, mas brilhantemente realizado porque marcado pela construção e manutenção de um ponto de equilíbrio entre a “informação, na pesquisa, com levantamento de dados, consulta a fontes, a teorias, a críticas, enfim, a todo o conjunto da cultura, [e a] invenção, [a] criação, motivando no aluno a coragem de se situar diante disso, mediante a marca de uma individualidade, para a conquista de uma identidade também intelectual neste processo, o caminho que constituiria uma formação” (GOTLIB, 1981, p. 77-78 – colchetes nossos). Foto: Fernanda Acioly | Olinda–PE – 15/11/2010 Ver-se no verso, intimamente: Nádia Battella Gotlib [ 253 Não conheci a aluna Nádia, senão já professora doutora, pesquisadora de literatura brasileira e es- tudiosa de literatura portuguesa – vínculo que jamais abandonou, embora tenha migrado, para a sua e, sobretudo, para a nossa felicidade, da área de Literatura Portuguesa para a de Literatura Brasileira na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, onde lecionou a partir de 1970. Imagino, entretanto, a aluna da terceira turma do curso de Letras Brasileiras da UnB, estudando, entre 1964 e 1967, em um campus literal e simbolicamente marcado pelas ideias de processo, transformação, mudança, construção de um espírito crítico voltado amorosamente para o sonho de um Brasil democrático e emancipado política, social e culturalmente. Projeto de Darcy Ribeiro, um de seus idealizadores; sonho desfigurado pela ditadura militar1, que só se recompôs, transformado, a partir de 1990, quando o Brasil deu, de fato, início à retomada da democracia. Imagino-a recebendo, em 1965, uma “recém-lançada terceira edição” (GOTLIB apud GOMES, 2007, p. 298) de Laços de Família de presente de um professor da faculdade, livro que a deixou “muito intrigada com aquele jeito de contar, que, a certa altura, já não entendia bem” (GOTLIB apud GOMES, id., ibid.), não entendimento que a levou “a querer saber o que ela estava querendo dizer” (GOTLIB apud GOMES, id., ibid.). Imagino-a, também, preocupada com amigos e colegas presos pelos agentes da repressão política, mobilizando dona Zezé e seu Aimone, mãe e pai, sobretudo o último, advogado, para ajudarem a tirá-los da cadeia e dos riscos de violência e morte nela implícitos à época. Imagino-a, por fim, partilhando com a irmã Tânia, aluna do curso de arquitetura, as descobertas de uma nascente Brasília, cidade amada na qual a segunda permaneceu enquanto Nádia retornava a São Paulo para os estudos em nível de pós-graduação na FFLCH-USP, dando início às suas vidas profissional e conjugal2. 1 Informa o site da UnB: “O antropólogo Darcy Ribeiro, idealizador, fundador e primeiro reitor da UnB, sonhava com uma instituição voltada para as transformações – diferente do modelo tradicional criado na década de 1930. No Brasil, foi a pri- meira a ser dividida em institutos centrais e faculdades. E, nessa perspectiva, foram criados os cursos-tronco, nos quais os alunos tinham a formação básica e, depois de dois anos, seguiam para os institutos e faculdades. Os três primeiros cursos- -tronco eram: Direito, Administração e Economia, Letras Brasileiras, e Arquitetura e Urbanismo. [...] Em 1964, a ditadura instalada com o golpe militar traria anos difíceis para a UnB. Na verdade, a instituição [...] já era tida por setores extra-uni- versitários como um foco do pensamento esquerdista, visão essa que só se acirrou com os militares. [...] Universitários e professores foram taxados de subversivos e comunistas. Comentava-se que havia uma tendência marxista na UnB, liderada pelos professores mais jovens e idealistas. O campus foi invadido e cercado por policiais militares e do Exército várias vezes durante o ano. No dia 18 de outubro de 1965, depois da demissão de 15 docentes acusados de subversão, 209 professores e instrutores assinaram demissão coletiva, em protesto contra a repressão sofrida na universidade. De uma só vez, a instituição perdeu 79% de seu corpo docente. Esse não foi o único ano em que as aulas foram interrompidas pelas invasões”. Disponível em: . Acesso em: 25 jul. 2012. 2 Em estudo de ambas dedicado a Brasília, lemos: “Nós duas nos mudamos para Brasília em 1961. Nossos pais, encantados com a nova cidade, já haviam se mudado no ano anterior, 1960, no calor da hora da inauguração, para trabalhar na área da 254 ] Arnaldo Franco Junior Do retrato imaginário da estudante à produção intelectual Elaborado da estudante o retrato imaginário composto de fatos reais, passo à produção intelectual de Nádia. Não proponho, aqui, um estudo sistemático nem exaustivo, mas um passeio por essa obra que resulta de paixão e rigor seja na escolha dos objetos de estudo, seja no tratamento conferido a eles, que, sem abdicar da leitura da imanência, jamais desconsiderou, nas obras, a relação problemática entre elas e o sujeito histórico que as construiu, nelas entremeando-se como signo, referência, figura, fantasma, voz. A produção intelectual de Nádia parece ter começado profissionalmente com a palestra “O Só, de Antonio Nobre”, ministrada na UnB em 1967. Mais tarde, transformou em livros sua dissertação de mestrado – A poesia de José Régio: o símbolo nos Poemas de Deus e do Diabo, defendida em 1971 e pu- blicada em 1981 –, e sua tese de doutorado: O estrangeiro definitivo – poesia e crítica em Adolfo Casais Monteiro, defendida em 1977 e publicada em 1985. Ambos os trabalhos foram orientados por Maria Aparecida de Campos Brando Santilli, professora de literatura portuguesa na FFLCH-USP e pioneira nos estudos e na criação de disciplinas de Literatura Africana de Expressão Portuguesa na universi- dade brasileira. Destaco, do primeiro livro, trecho que me parece significativo para a compreensão do trabalho de leitura da autora: Interessava, em José Régio, o sistema de símbolos que fazia aproximar realidades diversas, num mesmo uni- verso de significação, fosse pela mediação da imagem com implicações religiosas, psicanalíticas ou estéticas. Os textos de José Régio representavam igualmente, por configurações diversas, experiências místicas, eróti- cas e poéticas. Interessaria, em Adolfo Casais Monteiro, a verificação deste sistema de equivalências entre os aspectos da realidade representada na poesia, mas interessaria sobretudo a realidade da linguagem naquilo que se diferenciava das propostas mais tradicionais da “Presença”, filiando-se às linhas do Modernismo do “Orpheu” e às preocupações políticas que levaram o Autor a se indispor com o regime ditatorial português e a se exilar no Brasil. Em José Régio já se anunciava, então, um sentido de literatura enquanto busca de sentido do mundo, va- riado, nas suas formas de representação imagética. O seu programa poético ligado a conceitos idealistas de veia romântica, como os de intuição, criação, expressão, interioridade, personalidade, gênio, traços educação [...] e na área da atividade de fiscalização e da advocacia. Aqui fizemos universidade. Depois seguimos caminhos diferentes. A Tânia ficou aqui. Eu fui para São Paulo. Ela, trabalhando como arquiteta urbanista na NOVACAP, depois, [...] na Câmara Legislativa do Distrito Federal, cada vez mais engajada no trabalho de defesa e preservação de Brasília como Pa- trimônio Cultural da Humanidade. Eu, trabalhando na USP, como professora de literatura portuguesa e, depois, de literatura brasileira” (GOTLIB; SIQUEIRA, 2010, p. 1). Ver-se no verso, intimamente: Nádia Battella Gotlib [ 255 que delinearam com precisão a fisionomia do grupo presencista, acompanhava na sua poesia uma atitude gnóstica de ávida ansiedade de conhecimento da realidade, por vezes manifesta através de conceitos psi- cológicos, como mergulho no inconsciente, desvendamento do outro, busca da identidade. Mas a espe- cificidade da poesia de José Régio parecia se impor pela carga de religiosidade, de cunho marcadamente maniqueísta, de universo dividido, assim projetando-se nas criaturas, duplas, cuja criação, estética, pro- jeção da divina, que a havia gerado, passava a se inserir na linguagem de um traçado mítico, como busca de um sentido perdido. Reconheço que, se me tivesse detido num só destes elementos, como recurso de elucidação da linguagem poética de José Régio, talvez o trabalho ganhasse em unidade e coerência. Mas reconheço também que o que me impeliu a desenvolver tal tema foi justamente esta possibilidade do exame das equivalências de sentido simbólico que reconhecia vários níveis de realidade representados na ocorrência estilística das imagens uti- lizadas pelo Autor (GOTLIB, 1981, p. 10-11 – grifos nossos). Identifico, nestas palavras, certos traços que delineiam a Nádia leitora, alguns dos quais vão se desenvolver e se adensar, modulando-se em função do contato com a singularidade de seus outros objetos de estudo, ao longo de sua produção intelectual. Observe-se, no trecho da dissertação abaixo citado, uma evidência desses traços, que captam não apenas o sentido da obra estudada, mas também o movimento daquela que escolhe ler, nessa obra, algo que sugere a quase ultrapassagem do dualismo que a constitui. Trata-se de uma parte da análise do poema “Painel”: Os dois fantasmas de “Painel” apresentam-se integrados numa realidade extraordinária devido à inexplica- bilidade do seu surgimento, devido ao conhecimento imperfeito e dúbio quanto à sua configuração e devido ao próprio caráter do mundo irreal em que se circunscrevem, onde predomina uma atmosfera de terror e de nebulosidade. A existência desse mundo fantasmagórico torna-se mais patente se observada na sua relação com a possível realidade não onírica do Poeta. José Régio, tomado pelas sensações, praticamente se desvincula do mundo das aparências. O poeta deixa-se entrever, contudo, através do Autor em primeira pessoa, mas que não afirma, apenas levanta dúvidas e suposições acerca do seu estado de tensão, endossando a experiência do estranhamen- to. As referências ou reflexões sobre o seu próprio estado não chegam a defini-lo, não explicam esta tensão; constatam apenas uma relação de semelhança com as experiências de “sonho” e “pesadelo”, não eliminando o caráter de delírio do estado configurado no poema: [...] E mesmo esta relação comparativa é construída no sentido de preservar um caráter de dúvida e mera aproximação, que caracteriza as opiniões do Autor como hipóteses lançadas sem quaisquer tons conclusivos. [...] 256 ] Arnaldo Franco Junior A principal característica do delírio em José Régio é também o afastamento da realidade, mergulhando num mundo em que o “monstruoso” representa a coincidência e equivalência dos dois opostos em cada coisa (GOTLIB, 1981, p. 90-91 – grifos nossos). Observe-se, aí, a atenção para uma dupla configuração do sujeito da enunciação, inscrito no po- ema como Poeta e Autor. Este último é a instância responsável, no plano da sugestão, pela ultrapas- sagem dos limites maniqueístas que encerram a mundivisão do eu-lírico. Mas quem elabora essa sugestão? O poema apenas ou, também, a leitura que Nádia faz dele? Ambos, é claro, em interação. Note-se, aí, um gesto de leitura que se constitui em marca do olhar de Nádia para as obras que estu- da: um divisar, na obra, os signos que revelam a presença humana daquele que a construiu, persona de papel escrita a sangue – conjunção que, de algum modo, tem de estar presente na leitura que se queira abrangente e crítica. Da tese de doutorado sobre Casais Monteiro, diz Maria Aparecida Santilli: Estas páginas de Nádia [...] são reflexo de um convívio exaltado no mundo da leitura [...] O discurso analítico é frequentemente apaziguador, começa onde o transe de outro escritor acaba, onde as contorções de outra escrita se sustam. [...] o discurso analítico, no confronto com o do artista, é um discurso de perdas, neutralizado pelo resfria- mento que o sujeito do texto pragmático opera na convenção com seu objeto. Estas páginas de Nádia são, ao contrário, de vitória sobre os riscos dessa redução [...] Como num processo de mútuas transfusões, a tensão do texto de Nádia e a do escritor escolhido introje- tam-se e se fortificam. Tão transfundidas, as tensões a todo o instante abafam, em quem repassa as páginas a seguir, a própria consciência de plural que há nessa corrente de sedução. [...] Estas páginas fazem lembrar aquela hipótese ilusória de corte bizarro entre a leitura e a escrita que, a Roland Barthes, sugeriu um dia Gaston Bachelard: os escritores escreveram ou são apenas lidos? (SANTILLI apud GOTLIB, 1985, p. 13-14 – grifos nossos). Santilli identifica, na tese, um traço que se tornará característico da ensaística gotlibiana: o investi- mento na articulação e no entrecruzamento de vozes em que as palavras do eu e do outro se fortificam ao se introjetarem. E reitera o compromisso de Nádia com a construção de um equilíbrio entre a aná- lise imanente da obra e a perscrutação, na persona do Autor, do sujeito histórico que nela se imiscui. Observe-se um exemplo: Ver-se no verso, intimamente: Nádia Battella Gotlib [ 257 Na tradição da “poesia-crítica”, o poeta transita entre a perseverança num trabalho de manipulação da linguagem e a consciência do seu próprio destino, fadada que se acha ao “caos” e ao “desaparecimento”. O projeto da poética de Casais Monteiro engloba assim as duas direcções: como revivescência do simbolismo, parte para a arte do “sonho”, na defesa da ideologia da libertação, da comunhão com os homens, da palavra essencial, na exploração do inefável e do absoluto impossível; e como evidenciação do concreto, desnuda os suportes de sustentação das estruturas da realidade próxima, na sua ossatura, na dissecação dos elementos componenciais da sua engenhosidade possível e consumada. A contradição estabelece-se ainda no nível de cada direcção, que dialecticamente contém o seu contrário: o uso da palavra traduz a sua falência, e a desagregação revela a abertura para a plenitude da verdade, ainda que se traduza na verdade do esva- ziamento da palavra e do seu sentido [...]. Observador do “drama” da linguagem, o poeta manobra o discurso também jogando com as várias pos- sibilidades do risco: entre a aventura para a composição “regrada” da linguagem, seguindo as instâncias da conexão sintáctica que alinhavam as partes do discurso e fazem-no caminhar para um “sentido” – que afinal se afigura impossível, ou, na aventura para o “desregramento” sintáctico da linguagem, rompe com os elos da ligação, lança a palavra solta, átomo desintegrado, na linguagem que, no clímax da dilaceração, revela-se no sentido do nada [...] O exame da poética de Casais Monteiro permite, pois, nas suas várias formas de configuração, a admissão de uma identidade entre as linhas de direcionamento da “procura” de poema, em lances que se cruzam e que revelam, no ponto da intersecção, a identidade dos seus contrários planos de “origem” (GOTLIB, 1985, p. 337-338 – grifos nossos). Como não reconhecer nessas palavras dados estruturalmente semelhantes àqueles que Nádia iden- tificará, depois, na “vida que se conta” de Clarice Lispector, na vida que se pinta de Tarsila do Amaral? Como não reconhecer, aí, a singularidade do olhar que descerra, na obra acabada, o entrecruzamento tenso e, muitas vezes, paradoxal de suas linhas de construção alimentadas por uma carne que se faz verbo? O primeiro esboço de biografia literária realizado por Nádia deu-se em 1980, por ocasião da apresen- tação da vida de Camões ao público-alvo da famosa coleção Literatura Comentada. Emerge, dali, não um mito petrificado erigido em monumento, mas um homem com suas paixões e, mesmo, contradições: Camões não estaria, contudo, destinado à vidinha alegre e pacata de Coimbra. Antes dos vinte anos vai para Lisboa, trocando a placidez das águas do Mondego pela vida tumultuada da cidade que funcionava como o “cais do mundo”. Torna-se boêmio, envolve-se em brigas com fidalgos arruaceiros e prostitutas do Bairro Alto da Lisboa noturna: estava iniciado na vida aventureira de perigos e de amores. Se por vezes confessa 258 ] Arnaldo Franco Junior não ser este o seu ideal de vida, e sim o da companhia dos escritores clássicos, nunca deixou a boêmia nem a poesia: ambas marcaram sua vida até os últimos anos (GOTLIB, 1980, p. 3-4). No mesmo livro, voltado para uma iniciação ao estudo da literatura camoniana, Nádia escolhe in- serir as “Oitavas (IV)” – Petição feita ao regedor de uã nobre moça presa no Limoeiro da cidade de Lisboa, por se dizer que fizera adultério a seu marido, que era na Índia, assinalando em nota de roda- pé: “Camões faz a poesia como se fosse uma petição em defesa da mulher que cometera adultério, na ausência do marido, em viagem para as Índias. Observe os argumentos que utiliza, de ordem social” (GOTLIB, 1908, p. 45 – grifos nossos). E, na parte final, propõe, entre os exercícios, que o leitor reflita sobre “Descalça vai pera fonte”, sublinhando, na leitura oferecida como resposta, “a preocupação com o retrato feminino de Lianor, que [...] aparece com a idéia de movimento, na especificação de para, por e como ela vai” (GOTLIB, 1980, p. 105). Outro passo em direção a um inovador ensaísmo biográfico-literário é dado, em 1983, com Tar- sila do Amaral, a Musa Radiante, livro que, retomado e ampliado – via pesquisa que incluiu viagens e consultas a amigos, colecionadores e familiares da artista – com fotos, documentos e informações se chamará, em 1998, Tarsila do Amaral, a modernista. Destaco aqui, por sua exemplaridade, trecho mantido intacto de uma para outra edição: A Tarsila pintora consagrou-se numa carreira de progressivas invenções, reveladoras de uma artista calma mas curiosa, que exercita uma técnica de seu tempo, da vanguarda européia, no caminho de uma identidade bem brasileira: é a “pintora brasileira que pinta em brasileiro”, conforme anuncia uma revista dos anos 20. A Tarsila desenhista também se impõe como a artista da linha e por vezes mais soltamente, sem os tantos esquemas que usa na pintura. Com linhas – poucas e breves – e como um gesto natural consegue representar a calma de uma fazenda ou o movimento acelerado da cidade grande. [...] Mas, paralelamente, vai se desvendando uma Tarsila-mulher, que enfrenta corajosamente preconceitos con- servadores, enquanto constrói sua vida profissional e sentimental. É moça que exercita a emancipação, que descasa, viaja, mora longe, faz-se artista e de sucesso. É também a mulher caprichosa que se cuida, que “se gosta”, em arranjos bem femininos – nos quadros e na sua pessoa – e que cultiva sua beleza – e por que não? – em sucessivos auto-retratos. [...] Há a Tarsila que incomoda alguns ou empolga outras por ser... feliz. [...] Há a Tarsila dos últimos anos, forte no sofrimento, perseverante na vontade, muito sensível, sempre. [...] Mas há, sobretudo, uma Tarsila que pelo seu desempenho de pintora, se sobrepõe à high-society, ultrapassa os limites da classe que a gerou. Sua obra representa uma realidade brasileira até então desprezada e abafada pela Ver-se no verso, intimamente: Nádia Battella Gotlib [ 259 cultura acadêmica convencional. Tarsila pinta cactos, quando o costume era pintar rosas... Conquista, assim, uma dimensão mais ampla. A vivência marcadamente nacional projeta-a para além das margens quatrocentonas. O que Antonio Candido afirma, em Literatura e Sociedade, sobre a literatura modernista, aplica-se à pintura de Tarsila: os modernistas eram “renovadores, procurando exprimir valores mais profundos, aspirações e estilos recalcados na literatura popular pelo oficialismo burguês”. E Tarsila desrecalca. Desrecalca fazendo emergir da indiferença ou desvalorização a realidade ‘caipira’ do interior e da roça, em cores caipiras de rosa e azul. [...] Desrecalca deixando afluir dos seus subterrâneos mentais monstros-aves, plantas-bichos, estranhos num verde-amarelo-azul intensos de raízes míticas, de mistério e sonho. E desrecalca quando retrata a miséria dos viajantes nas estações, subnutridos e desamparados, ou os operá- rios das fábricas, numerosos, peças do mecanismo cruel da industrialização que despersonaliza. (GOTLIB, 1983, p. 9-12 [1998, p. 18-21]). Necessário sublinhar, aí, o olhar que explora, na leitura, os entranhamentos vida-obra sem, entre- tanto, furtar-se à análise das próprias obras? Dentre os documentos que constituem o livro de 1998, destaco, aqui, a fotografia de “Tarsila no salão de sua casa em São Paulo” e o fac-símile de uma carta da pintora ao crítico Décio de Almeida Prado corrigindo uma declaração do também modernista Flávio de Carvalho. A legenda da foto nos faz reconhecê-la como uma síntese privilegiada da vida-obra da pintora, pois nela estão presentes os principais elementos que constituíram a artista e a mulher. Observe-se: Tarsila no salão da sua casa em São Paulo. No centro da parede do fundo, o imenso quadro La Tour Eiffel, de To- bert Delaunay. Em frente às portas, Composição. Á direita, outros quadros de Tarsila, como O Mamoeir (em cima), Estudo (Academia nº 2) (à esquerda), O Touro (à direita), A Boneca e O Lago (embaixo). (GOTLIB, 1998, p. 164-165). 260 ] Arnaldo Franco Junior Quanto à carta de Tarsila, além do resgate do documento, importa o procedimento sutil de mostrar que, da perspectiva das mulheres, bem como de outras “minorias”, a história da arte e da literatura de- manda cuidados para que os paradigmas herdados da tradição cultural não excluam ou subordinem os que dele escapam a uma questionável hierarquia de valores. Declara Tarsila a Décio: Fiquei surpresa ao ler [...] uma declaração de meu amigo Flávio de Carvalho: “Tarsila é consequência das idéias de Oswald e de sua orientação. Antes dele era pintora acadêmica”. Há engano nessa afirmação. Con- firmo o que disse ao ser entrevistada: Oswald não interferia na minha arte e elogiava sempre meus trabalhos sem “dar palpites. [...] Ao chegar a S. Paulo, depois da Semana de 22, minhas cores e técnica foram aplaudidas por meus amigos modernistas Menotti del Picchia, Oswald, Mário de Andrade e outros. Como você já deve ter imaginado, esta carta temo o objetivo de esclarecer o engano de Flávio de Carvalho (AMARAL apud GOTLIB, 1998, p. 186). Nádia, atenta aos dados de sua pesquisa, afirma sobre Tarsila: Na trilha artística da pintura e do desenho, vai abrindo alas para a literatura. Define direções do movi- mento Pau-Brasil. Inaugura a Antropofagia. Como o radar é potente, e o tempo ajuda, capta tendências que facilitam um diálogo entre as artes, que vão se complementando. Seu foco de irradiação atinge longe e alto. [...] E vai divulgando a arte moderna no Brasil (GOTLIB, 1983, p. 9 [1998, p. 18-19] – grifos nossos). Entre o primeiro e o segundo livros sobre Tarsila, Nádia realiza duas importantes contribuições ao estudo do conto e da crônica com, respectivamente, Teoria do Conto, de 1985, e “A Crônica: teoria e história do gênero”, coletânea de estudos que organiza em 1987. O primeiro integra a famosa coleção paradidática Princípios, voltada para a formação universitária básica; o segundo compõe o volume 46 do Boletim Bibliográfico Biblioteca Mário de Andrade, importante publicação dessa instituição. As duas obras são fundamentais para a formação dos alunos de Letras e de quem quiser aprofundar seus conhecimentos sobre o conto e a crônica. Em Teoria do Conto, Nádia transita com leveza por teorias e conceitos – A. Jolles, C. Bremmond, R. Castagnino, V. Chklosvki, B. Eikhembaum, H. Lima, M. Lancelotti, N. Friedman, E. M. Meletínski, V. Propp, B. Schnaiderman, J. Cortázar, E. Allan Poe, M. de Andrade, H. Quiroga, A. Tchekhov etc. –, instigando, por meio de exemplos, o leitor a estudar para aprender a lidar com as “múltiplas possibilidades de realização que o gênero oferece” (GOTLIB, Ver-se no verso, intimamente: Nádia Battella Gotlib [ 261 1985, p. 92). No volume do Boletim... dedicado à Crônica, reúne ensaios de teoria e história do gêne- ro (de Luiz Roncari, Marlise Meyer, Davi Arrigucci Jr.), leituras críticas de cronistas brasileiros (de Vilma Arêas, João Roberto Faria. Dulcília Buitoni, Raúl Antelo, Vera Chalmers, Rita de Cássia Bar- bosa), documentos importantes para o estudo do gênero na Literatura Brasileira (de João R. Faria, Rita de C. Barbosa, Yêdda D. Lima, Graciliano Ramos) e, por fim, apresenta uma extensa bibliografia comentada realizada sob sua coordenação. É um volume indispensável para o estudo do gênero, seja este pontual ou sistemático. As publicações seguintes incluem três importantes produções: a de um número do Suplemento Lite- rário Minas Gerais dedicado a Clarice Lispector3 por ocasião dos dez anos de sua morte, a de dois dos três volumes do Boletim do GT A Mulher na Literatura (co-organizado com Ana Lúcia de Almeida Gazzola)4, vinculado à ANPOLL – Associação Nacional de Pós-Graduação em Letras e Linguística e a de, com Wander Mello Miranda, quatro Boletins da ABRALIC – Associação Brasileira de Literatura Comparada. Destaco, na organização do Suplemento, a congregação de textos e imagens heterogêneos (ensaísticos, documentais, jornalísticos, bibliográficos; desenho, fotografia, fac-símile), que, de 1995 em diante, ganharão sólida musculatura nos livros dedicados ao estudo da obra-vida de Clarice Lispector. Este hibridismo é próprio do campo jornalístico, mas se revelará inovador, em razão do tratamento crítico que Nádia lhe dá, no campo da crítica e da historiografia literárias no Brasil contemporâneo. Por ocasião do lançamento de Clarice – uma vida que se conta, afirmou Eneida Maria de Souza: A biografia [...] de Nádia [...] retoma a temática do autor como centro de pesquisa acadêmica [...]. Repre- senta ainda um marco na área das publicações de biografias literárias no Brasil, por se distinguir das publicações no gênero, dotadas, na sua maioria, de dicção e natureza jornalísticas, pelo seu apego à recriação romantizada dos fatos ou à narrativa de curiosidades e de suspenses. [...] Sua originalidade é a de estabele- cer o enlace entre obra e vida do autor, sem que haja relações de dependência entre os “dados de ordem biográfica e dados de leitura crítica de seus textos” [...]. O grande mérito do livro reside justamente na maneira pela qual os traços biográficos ganham em dimensão 3 Disponível, na íntegra, em . Contém textos de: Antonio Candido, Adélia Prado, Sérgio Milliet, Miriam Chnaiderman, Valmiki V. Guimarães, José Tavares de Bastos, Rosario Cas- tellanos, Ray-Güde Mertin, Olga Borelli (entrevista), Lúcia Helena O. V. Carvalho, Vilma Arêas, Hector Bianciotti, Vânia Borges Santos, Carlos Drummond de Andrade. 4 Esses volumes reúnem a produção inicial do grupo de trabalho A mulher na literatura, um dos mais relevantes da AN- POLL em número de participantes e em diversidade de formações-atuações e prospecções teórico-críticas, historiográficas e literárias. Seria bom que fossem disponibilizados para download no site do GT (http://www.amulhernaliteratura.ufsc.br/ index1.htm). 262 ] Arnaldo Franco Junior metafórica e não se restringem a narrar a história de uma vida. A íntima simbiose entre arte e existência, entendida no seu estatuto de suplemento e representação, recebe da ensaísta um tratamento metafóri- co, em que são criadas pontes entre os fatos e a interpretação dos mesmos. Apresentado sob a forma de imagens, sejam elas icônicas ou literárias, o material recolhido pela biógrafa [...] traduz uma leitura de ordem intersemiótica e intercultural (SOUZA, 1995, p. 196-197 – grifos nossos). Resultado de mais de 10 anos de laboriosa pesquisa, a biografia literária inovadora de Nádia cata- lisou, desde as suas primeiras versões sob forma de tese de livre-docência e livro5, debates e certa po- lêmica. Uma das principais razões disso reside no fato de que tanto a tese como o livro (publicado na Argentina em 2007; revisto, corrigido e aumentado para a 2ª edição no Brasil em 2010) evitam trans- formar Clarice em totem, recusam-se a dar dela, ao leitor, uma efígie petrificada construída por meio de uma concepção ainda dominante de biografia que remonta a paradigmas do Naturalismo do século XIX e, principalmente, recusam-se a oferecer, dela, uma imago dócil às instrumentalizações ideológi- cas ou políticas. Tese e livro mimetizam, em seus efeitos, algo que é nuclear na experiência de leitura de Lispector: uma articulação de encantamento, enlevo e mal-estar entranhados à experimentação de descentramentos de ordem existencial e linguística. Cito, por significativo, trecho de abertura da tese que não entrou nas edições em livro: E uma indagação permanece: quem é Clarice? Como o leitor verá, a resposta só pode ser relativa. Trato de cada uma das Clarices, na medida em que vão aparecendo, cada uma, como estrela, uma estrela com mil raios que brilham e ferem, no seu universo de isolamento e de comunicação, de dor difícil e de fruição encantada. Não as reúno num final conclusivo. Deixo-as assim soltas nas conclusões parciais, enquanto pedaços de real e de imaginário, habitando constelarmente o espaço desse trabalho, e ligadas entre si por um traço que atra- vessa a literatura de Clarice e que procurei realçar nessa minha leitura: a linguagem como espaço de obsessi- va busca de verdades, entendida como modo de se identificar em relação a si e ao outro; como experiência de resistência no processo de difícil desmascaramento desmistificatório, a exigir doloroso exercício do enfren- tar esse ‘outro’, configurado ora no que é sujo, feio, proibido, ora no anti-gênero, no mau-gosto, na miséria humana. E no mal-estar do leitor. Predomina, assim, a experiência desconfortável do estado de angústia, que traz pela via do não racional – 5 Certo jornalista da grande imprensa marrom avaliou o trabalho como “perda de tempo”, mascarando, “num frágil lance de injúrias” (SOUZA, 1995, p. 199), a frustração de não ter conseguido escrever a sua própria biografia da escritora. Eneida M. de Souza (1995) nos revela parte dessa história. Resenhas objetaram que a proposta do trabalho arriscava-se na paráfrase (WALDMAN, 1995; FRIAS, s/d). Ver-se no verso, intimamente: Nádia Battella Gotlib [ 263 pelo não saber, por emoções, afetos, paixões, sentimentos, perplexidades, surpresas, intuições, êxtases – a consciência de nossa condição humana, calcada no conflito e na contradição. Bem e Mal expostos, Inferno e Paraíso coexistindo, ou então, consumindo-se, suicidamente, no vazio e no silêncio (GOTLIB, 1993, p. 16 – grifos no original). Nádia soube respeitar a liberdade como um dos mais altos valores da obra-vida de Lispector, que, segundo Olga Borelli “tinha horror a tudo que era -ista: comunista, feminista, integralista... Ela detes- tava! (BORELLI apud FRANCO Jr., 1987, p. 9). Oferece inúmeras facetas, cuidando para, em termos claricianos, não enrijecer o rosto em máscara6, evitando o erro de reduzir a obra-vida de Lispector a efeito de trauma ou produto de uma determinada condição étnico-cultural7. Em lúcida e generosa resenha, João Camillo Penna afirmou que o livro recoloca no título este desenrolar da inerência que liga o pólo da vida ao contar, distinguindo-os, mas jun- tando-os com processo único pelo reflexivo “se”. Se a vida “se” conta, o contar-se é conclusão necessária de uma articulação interna à própria vida que, por 6 Em “Persona”, crônica de 1968 publicada no Jornal do Brasil, Clarice escreve: “Vou falar da palavra pessoa, que persona lembra. Acho que aprendi o que vou contar com meu pai. Quando elogiavam demais alguém, ele resumia sóbrio e calmo: é, ele é uma pessoa. [...] Escolher a própria máscara é o primeiro gesto voluntário humano. E solitário. Mas quando enfim se afivela a máscara daquilo que se escolheu para representar-se e representar o mundo, o corpo ganha uma nova firmeza, a cabeça ergue-se altiva como a de quem superou um obstáculo. A pessoa é. Se bem que pode acontecer uma coisa que me humilha contar. É que depois de anos de verdadeiro sucesso com a máscara, de repente [...] a máscara de guerra de vida cresta-se toda no rosto como lama seca, e os pedaços irregulares caem com um ruído oco no chão (LISPECTOR, 1984, p. 99 – grifos no original). 7 Traços característicos da biografia realizada pelo norte-americano Benjamin Moser. Segundo Berta Waldman, “merece ressalva [...] o peso descomunal que a Clarice de Moser ganha, ao ser apresentada como movida pela orfandade. Segundo a interpretação do autor, ela perdeu a mãe ainda menina e falhou em salvá-la com seu nascimento, contrariando uma suposta crença judaica de que o nascimento de uma criança poderia salvar a vida da mãe, e isso teria marcado a sua trajetória. A no- vidade do estupro revelada pela biografia seria a responsável pela longa doença de Mania (a mãe) [...]. Segundo Moser, ha- veria uma culpa primordial que não só acompanharia a escritora por toda a vida, como também se constituiria no marcador fundamental de sua literatura. Por um lado, o autor não deixa claro de onde vem a informação do estupro da mãe; [...] Qual a fonte? [...] É difícil chegar ao judaísmo na escrita de Clarice Lispector porque ela não se declara judia. Entretanto, Moser sempre que alude ao judaísmo o faz equivaler à religião [...] talvez a forma de Clarice Lispector operar com seu judaísmo seja tentando se desenlaçar dele. Curiosamente, seus textos têm a marca dessa mesma operação (WALDMAN, 2010, p. 136-138). Benjamin Abdala Jr., além de apontar certo estranhamento quanto a coincidências entre as biografias de Moser (2009) e de Nádia (1995; 2009), afirma: “Do ponto de vista da crítica literária, no seu intuito de perseguir “os motivos judaicos nos escritos de Clarice Lispector”, no livro de Moser, a literatura de Clarice fica relegada a um pano de fundo” (ABDALA Jr., 2010, p. 292). 264 ] Arnaldo Franco Junior necessidade inelutável, tem que se fazer escrita. Se na biografia falta a explicitação abrangente do nexo entre Clarice e seu contexto intelectual, se tudo parece se resumir a pequenos encontros fortuitos com amigos, é porque Nádia foi aqui fiel a este princípio da “inerência”, quem sabe a chave do processo da escrita-vida Clarice. Identificação excessiva com a biografada? Não creio. Escolha, sim, de um método imanente que recusa a produção de uma metáfora mais abrangente da obra, porque esconde a metáfora, espalhando-a sistematicamente, tornando a crítica quase imperceptível, para não forçar a mão e, quem sabe, interessar um leitor incauto. As supostas paráfrases de Nádia são, na verdade, pequenas leituras esboçadas nas dobradiças do recon- tar as estórias. Por aí, delineia-se em filigrana uma questão do “espelhamento”, do “desdobramento”, a partir do qual uma ironia clariciana viria a deslocar a questão da identidade, numa reversibilidade em outro do mesmo e do mesmo em outro. Fala pouco, quase quieta, mas deixa escapar certos comentários, caldo extraído de fatos e textos: há em Clarice um sistema da perda feminina, que se negocia em eventual ganho: a arte da sua escrita constitui-se nesse benefício. [...] é na imitação, na identificação com o perder-se da biografada, que Nádia Gotlib se esconde enquan- to crítica, convertendo o esconderijo em método. Ganho na perda, claricianamente (PENNA, 1995, p. 19 – grifos nossos). Clarice – uma vida que se conta equipara-se em importância a O drama da linguagem. Uma leitura de Clarice Lispector, de Benedito Nunes (1989), e Clarice Lispector: a travessia do oposto, de Olga de Sá (1993) – para citar, aqui, apenas dois dos estudos exaustivos da totalidade da obra da escritora. Ele resulta, em parte, de “Um fio de voz: histórias de Clarice”, publicado em 1988 e escrito para a edição crítica de A paixão segundo G. H. coordenada por Benedito Nunes para a Association Archives de la Littérature Latino-Américaine, des Caraibes et Africaine du XXème Siècle, onde lemos: Adentrar este território do imaginário, defrontando-se, diretamente, com a paixão, a fantasia e a invenção de si mesma, do outro e do mundo, zona extraordinária em que se experimenta uma verdade pelo deslo- camento do cotidiano, é o que a experiência de risco da linguagem de Clarice Lispector intenta. Esta ação básica, o desprender-se de uma realidade e o mergulhar numa outra, com a subseqüente e inevitável volta ao curso normal da trivialidade, já sob o estigma da mudança propiciada por esta vivência paradoxal, do melhor e do pior, e de modo intenso e temporário, reitera-se, ao longo de 37 anos de produção literária de Clarice Lispector [...] Sua literatura manifesta-se [...] como um exercício de liberdade, projeto de restauração de energias abafadas Ver-se no verso, intimamente: Nádia Battella Gotlib [ 265 por um complô mantido por diversos agentes repressores, prova de resistência contra o instituído, só pos- sível, naturalmente, por uma nova linguagem, que subverta também as ordens do seu próprio sistema de representação. Este é o grande desafio que sua obra enfrentou, corajosamente (GOTLIB, 1988, p. 161-162). O livro também se alimentou dos ensaios que compõem o fascículo Três vezes Clarice, publicado, em 1989, sob as coordenações de Heloísa Buarque de Hollanda e Silviano Santiago, pelo Centro in- terdisciplinar de Estudos Contemporâneos da Universidade Federal do Rio de Janeiro8. Nesses textos se destaca um traço de leitura habilmente dissimulado na biografia literária de Lispector: a ocupação, pela Nádia leitora, de um vértice crítico privilegiado que lhe permite divisar nos textos de Clarice um “dilema da decifração [que] instaura um espaço narrativo de linguagem intersticial entre uma lingua- gem possível – a que se faz – e uma linguagem impossível – a que nunca se atinge” (GOTLIB, 1989, p. 18). Este vértice crítico se constitui, na obra de Lispector, à maneira do quiasmo: um cruzamento de contrários simetricamente disposto no texto9. Na literatura clariciana, ele é o ponto privilegiado a par- tir do qual as personagens experimentam um descortínio perturbador, equiparável, em importância e efeito dramáticos, à anagnorisis trágica. Na leitura de Nádia, ele implica um modo de ler que barra o maniqueísmo e nos faz reconhecer que a verdade é sempre precária, porosa a inúmeros fatores que concorrem para a sua modulação, aberta a um imprevisível devir. Parafraseando-a, afirmo que é isso o que a sua leitura propõe: aprender e ensinar este “impasse mediante uma figura que é recorrente na sua obra. Trata-se da série dupla, de contrários invertidos, à moda do quiasmo, como o desenho de um X, o “X da ques- tão, que tem no vértice o seu “ponto crítico”. Uma imagem é a predominante; e é o simulacro da outra, o seu reflexo invertido. Uma sub-verte a outra. E tende a dominá-la, assumindo o plano da predominância. Jogo de imagens. Jogo de poder de imagens. Jogo de sedução (GOTLIB, 1989, p. 18-19 – grifos nossos). Jogos de imagens, poder e sedução adensam-se na 2ª edição de Clarice – uma vida que se conta, enriquecido de documentos, novas informações, bibliografia e muitas fotos. As imagens provêm do trabalho de pesquisa do qual resultou, em 2008, o livro Clarice Fotobiografia, abertura de um novo 8 Os ensaios são: “Clarice no país das narrativas”; “Uma aprendizagem dos sentidos” e “Quando o objeto, cultural, é a mulher” e, neles, destaca-se a leitura embasada nos conceitos de sexo e gênero e suas respectivas (e tensas) implicações sociais, históricas, culturais e políticas. Seria bom, dada a sua importância, que fossem disponibilizados para download no site do CIEC-UFRJ. 9 Para uma identificação exemplar do procedimento, leia-se, de Laços de família, “O crime do professor de matemática” (LISPECTOR, 1998). 266 ] Arnaldo Franco Junior caminho para o desenvolvimento de seu trabalho sobre a escritora e, também, marco de consolida- ção de um segmento ainda pouco explorado no sistema literário e no mercado editorial brasileiros. Já na 1ª edição da biografia literária de Clarice, os retratos constituíam um dos eixos de construção dos sentidos do livro, reafirmavam a impossibilidade de fazer ou escolher um retrato acabado de Clarice, uma imagem totalizante. Clarice fotobiografia nasceu de um projeto desenvolvido paralelamente à tese de livre-docência, à docência e à produção da biografia literária de Clarice. Nádia explica: Comecei a reunir imagens paralelamente à leitura dos seus textos, enquanto preparava cursos destinados a estudantes universitários. Eram imagens xerografadas, coletadas a partir de reproduções encontradas em jornais e revistas, e, depois, em arquivos de tais periódicos, que eu guardava, com a intenção de um dia orga- nizá-las em função da sua contextualização que, na época, me era quase desconhecida: quando teriam sido tiradas as fotos, em que local, em que circunstância? (GOTLIB, 2008, p. 11). Mas depois de explicar a gênese e justificar a estrutura de composição do livro, diz algo que reite- ra os seus valores de leitora e, a partir deles, a proposição de uma via crítica de trabalho intelectual: Percorridas as etapas e definidas a formatação e diagramação, é inevitável ocorrer também uma pergunta: por que fotobiografar Clarice? Não seria recomendável que ela ficasse ali, no seu lugar, que é o da sua litera- tura, lugar de destaque conferido pelos seus já numerosos leitores, graças à qualidade estética inovadora de seus textos, marcados por denso e surpreendente poder desconstrutor? Talvez Roland Barthes ajude a entender esse impulso em direção à figura do autor, de quem ficam apenas as cinzas, a partir de cada obra publicada. Pois ao terminar sua obra, o autor dela se despede. E nos deixa dian- te apenas da sua literatura. A Clarice-Autora é, pois, uma outra, a que desaparece pela força da sua própria criação. No entanto, esse autor morto, de certa forma, parece reviver mediante o resgate documental. Fotos, documentos, depoimentos, encontros, viagens, relações sociais e profissionais, dados, enfim, que parecem adormecidos, adquirem certa vida, ou sobrevida, a partir do registro visual. E é Roland Barthes ainda que afirma [...] que o efeito que a imagem de tempos passados produz não se resume a restituir o que foi abolido pelo tempo, pela distância, mas permite atestar que aquilo que ali se vê, existiu. Isto é, coloca o espectador, o que vê, diante de algo que não é extraordinário, é apenas o que nenhuma pintura realista teria condição de lhe dar, coloca-o diante do que efetivamente aconteceu: o real em estado passado. E conclui: isso é, ao mesmo tempo, o passado e o real (GOTLIB, 2008, p.13-14 – grifos no original). Ver-se no verso, intimamente: Nádia Battella Gotlib [ 267 Ler a vida daquele que se doa e se dói por meio e para-além da imanência da obra de arte sem des- respeitar a singularidade que as constitui – eis, aí, um dos axiomas da leitura gotlibiana. Afinal, a res- posta de Macabéa à pergunta indignada da falsa amiga Glória, cansada de lhe dar aspirina, é, também, em inúmeros níveis e reverberações, declaração de Clarice: “Eu me dôo o tempo todo” (LISPECTOR, 1981, p. 76). Dito de outro modo: Nádia reavalia a chamada imanência da obra como um modo de o sujeito se produzir como tal na linguagem – tanto como obra ficcional quanto como obra mundana. Seu procedimento analítico baseia-se, pois, sobretudo, num modo de conceber a linguagem e suas dobras sobre si mesma, o que resulta num modo particular de conceber a ficção e a própria criação literária. O habitat linguageiro, a linguagem operando – produzindo obras-sujeito – em todos os mundos, eis, a meu ver, outro modo de formular um dos axiomas da leitura gotlibiana. Como na foto que abre o presente texto: um modo de estar em casa, para dentro e para fora da janela. Dor e doação se fazem presentes, também, nas páginas de Retratos antigos, livro de Elisa Lispector organizado por Nádia, que, com ele, lança uma necessária luz sobre a obra literária da irmã mais velha de Clarice: “Na literatura de Elisa [um] passado trágico, de fome, discriminação, violência e persegui- ções aos judeus, aparece em vários [...] textos. Na literatura de Clarice, embora haja dados referentes a seu passado, o pendor para o imaginário domina o texto (GOTLIB, 2012, s/p. – colchetes nossos). O livro se compõe de fotos e escritos que vão dos anos 40 aos 80 do século XX, e teve origem no interesse de uma sobrinha diante dos retratos de família guardados por Elisa, que resolveu, então, re- gistrar a história da família. Nádia destaca o “modo como [Elisa] narra essa história, com profundo respeito pela tradição da cultura judaica” (GOTLIB, 2012, s/p. – colchetes nossos), valendo-se, tam- bém, de recursos ficcionais: “Quem escreve esse texto de memória é uma boa escritora. Sem ser fic- ção, beira a ficção” (GOTLIB, 2011, s/p.). Nádia reitera, com mais esse livro, um modo de ler e ver que singulariza a sua contribuição à crítica e à historiografia literárias brasileiras, que serão futuramente enriquecidas por projetos ora em gestação: uma biografia de Elisa e uma fotobibliografia de Clarice10. O olhar de Nádia, como o de Clarice, instaura um percurso pelos interstícios da simultaneidade do histórico e do mítico, da experiência e da reminiscên- cia, [que] traz um movimento de afinidades também com seu contrário [...] O que fica [...] é o desenho 10 “Quero divulgar Elisa, porque ela merece ser reeditada. [...] estou escrevendo uma biografia sobre ela”, declara a Régis Martins (2012). E informa sobre a produção da Fotobibliografia de Clarice Lispector na apresentação de Clarice Fotobiografia (GOTLIB, 2008, p. 14). Também em preparação se encontra um livro dedicado à correspondência da Condessa de Barral com D. Pedro II. Uma contribuição anterior ao estudo do gênero epistolar, aliás, deu-se no livro Prezado senhor, prezada senhora: estudos sobre cartas (2000), que organizou com Walnice Nogueira Galvão. 268 ] Arnaldo Franco Junior de uma intersecção que, para além das diferenças, e através delas, desenha uma troca de olhares [...] num ponto desta construção estrutural de sentido literário. Que, como arte que é, se sujeita às instâncias de um objeto alcançável, mas precariamente, entre o que é e o que o autor inventou e nós inventamos dele (GOTLIB, 1989, p. 143). Desse olhar decorre uma lição de leitura afeita àquilo que Gilka Machado, também estudada por Nádia (1982), reivindicava para a sua poesia: Quero me vêr no verso, intimamente, em sensações de gôso ou de pezar, pois, occultar aqui’lo que se sente, é o proprio sentimento condemnar. [...] Quero a arte livre em sua contextura, que na arte, embora peccadora, a Idéa, deve julgada ser como Phrinéa: – na pureza triumphal da formosura. [...] Meu ser interno, tumultuoso, vario, – máo grado o parvo olhar profanador – no livro exponho como num mostruario: sempre a verdade é digna de louvor. Nas palavras de Diana Junkes M. Toneto, “ao ler [...] Nádia Gotlib, não se aprende apenas mais de Clarice, aprende-se mais de literatura, aprende-se mais do direito à literatura de que nos fala Antonio Candido como o direito ao sonho [...] e o direito à compreensão do mundo em que vive- mos” (TONETO, 2012, p. 410). Ponto de ancoragem à maneira de epílogo Encerro aqui, esperando ler, em breve, livros que neste momento estão em preparação: a correspon- dência da Condessa de Barral com o Imperador do Brasil, a biografia de Elisa Lispector, a Fotobiblio- grafia de Clarice Lispector. Não o faço, porém, sem um último testemunho: – O que escrevo enfeitiçado continua. Ver-se no verso, intimamente: Nádia Battella Gotlib [ 269 Referências bibliográficas ABDALA Jr., B. “Biografia de Clarice, por Benjamin Moser: coincidências e equívocos”. 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