LAÍS MEDEIROS DE ARAÚJO AVALIAÇÃO DA EFICIÊNCIA DA PAISAGEM PARA PARQUES LINEARES URBANOS NA AMAZÔNIA: UM ESTUDO DE CASO EM RIO BRANCO, ACRE Sorocaba 2024 LAÍS MEDEIROS DE ARAÚJO AVALIAÇÃO DA EFICIÊNCIA DA PAISAGEM PARA PARQUES LINEARES URBANOS NA AMAZÔNIA: UM ESTUDO DE CASO EM RIO BRANCO, ACRE Dissertação apresentada como requisito para a obtenção do título de Mestre em Ciências Ambientais pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” na Área de Concentração Diagnóstico, Tratamento e Recuperação Ambiental. Orientador: Prof. Dr. Gerson Araújo de Medeiros Coorientador: Prof. Dr. Rodrigo Otávio Peréa Serrano Sorocaba 2024 A663a Araújo, Laís Medeiros de Avaliação da eficiência da paisagem para parques lineares urbanos na Amazônia: um estudo de caso em Rio Branco, Acre / Laís Medeiros de Araújo. -- Sorocaba, 2024 96 f. : il., tabs., fotos, mapas Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista (UNESP), Instituto de Ciência e Tecnologia, Sorocaba Orientador: Gerson Araújo de Medeiros Coorientador: Rodrigo Otávio Peréa Serrano 1. Avaliação paisagística. 2. Área verde urbana. 3. Gestão ambiental. 4. Planejamento urbano. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca da Universidade Estadual Paulista (UNESP), Instituto de Ciência e Tecnologia, Sorocaba. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. IMPACTO POTENCIAL DESTA PESQUISA A pesquisa contribui para a gestão pública e planejamento urbano ao fornecer subsídios para avaliação, gestão e manutenção de parques lineares urbanos. Atende aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) nº 6, 11 e 15. Assim, se torna referência para órgãos públicos na elaboração de planos, programas e projetos de gestão de parques lineares. POTENTIAL IMPACT OF THIS RESEARCH The research contributes to public management and urban planning by providing support for the assessment, management and maintenance of urban linear parks. It complies with Sustainable Development Goals (SDGs) 6, 11 and 15. Thus, it becomes a reference for public agencies in the development of plans, programs and projects for the management of linear parks. UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA Câmpus de Sorocaba AVALIAÇÃO DA EFICIÊNCIA DA PAISAGEM PARA PARQUES LINEARES URBANOS NA AMAZÔNIA: UM ESTUDO DE CASO EM RIO BRANCO, ACRE TÍTULO DA DISSERTAÇÃO: CERTIFICADO DE APROVAÇÃO AUTORA: LAÍS MEDEIROS DE ARAÚJO ORIENTADOR: GERSON ARAÚJO DE MEDEIROS COORIENTADOR: RODRIGO OTÁVIO PERÉA SERRANO Aprovada como parte das exigências para obtenção do Título de Mestra em Ciências Ambientais, área: Diagnóstico, Tratamento e Recuperação Ambiental pela Comissão Examinadora: Prof. Dr. RODRIGO OTÁVIO PERÉA SERRANO (Participaçao Virtual) Programa de Pós Pós-graduação em Geografia – PPMGEO/UFAC / Universidade Federal do Acre (UFAC) Dr. BRUNO VICENTE MARQUES (Participaçao Virtual) Associação dos Produtores de Soja, Milho e Outros Grãos Agrícolas do Estado de Goiás – Aprosoja-GO Dr. CARLOS HUMBERTO BIAGOLINI (Participaçao Virtual) Secretaria de Educação do Estado de São Paulo Sorocaba, 15 de abril de 2024 Instituto de Ciência e Tecnologia - Câmpus de Sorocaba - Av. Três de Março, 511, 18087180 http://www.sorocaba.unesp.br/#!/pos-graduacao/pos-ca/pagina-inicial/CNPJ: 48031918003573. À minha filha Lívia, minha maior riqueza. Ao meu pai Antônio Leônidas e ao meu padrinho Gutemberg, os quais perdi durante esta jornada, mas que sempre estarão vivos em meu coração. AGRADECIMENTOS A Deus, por ser fonte de fé e de força, sobretudo nos momentos mais difíceis. À minha família, por todo o apoio e amor incondicional. À minha mãe, Leila, e ao meu pai, Antônio Leônidas (in memoriam), minhas maiores referências de amor, de humanidade e de caráter e que desde muito cedo me ensinaram o valor do conhecimento. Ao meu esposo Victor Hugo, pelo apoio incondicional, compreensão e paciência, sem os quais eu jamais teria conseguido seguir em frente. À minha filha Lívia, fonte de alegria, leveza, luz e inspiração renovados a cada dia. À minha irmã Letícia, minha melhor e mais antiga amiga, pelos conselhos, suporte e amor incondicional. Aos meus avós, Laís e Gustavo, que desde sempre cuidaram de mim e tiveram papel fundamental na minha formação profissional e como ser humano. Ao meu tio Gerson e ao meu tio e padrinho Gutemberg (in memoriam) pelos incentivos e por serem minhas maiores referências na carreira acadêmica. À minha cunhada Lorena, pelo carinho de sempre. À Socorro, por todo o amor com que cuidou de mim desde minha infância até hoje. Ao meu orientador, Professor Gerson Araújo de Medeiros, por confiar em minha pesquisa, por toda a paciência, pelos ensinamentos e pela dedicação na orientação deste trabalho. Ao meu coorientador, Professor Rodrigo Otávio Peréa Serrano, por todos os ensinamentos e orientações. À Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Unesp) campus Sorocaba, à coordenação, aos docentes e aos funcionários do Programa de Pós- graduação em Ciências Ambientais, por todo o apoio e presteza e pela oportunidade de aprendizado e de crescimento profissional e pessoal. À Universidade Federal do Acre (UFAC), às coordenações, aos docentes e aos funcionários dos programas de Pós-graduação em Geografia (PPGEO) e Ciência, Inovação e Tecnologia para a Amazônia (PPG-CITA), pela oportunidade de estudos que me possibilitaram agregar conhecimentos valiosos a esta pesquisa. Ao Governo do Estado do Acre, entre as gestões passadas e a presente, pela disponibilização de todas as informações necessárias à realização deste trabalho, por todo o crescimento pessoal e profissional que me foi proporcionado ao longo dos anos como servidora e pela oportunidade de aperfeiçoamento. Agradeço em especial àqueles que contribuíram para uma melhor compreensão do meu objeto de estudo: Eduardo Vieira, Gleilce Andrade, Ítalo Lopes, Leonardo Neder e Liliam de Paula. Aos meus amigos que sempre me incentivaram e me apoiaram nesta caminhada: Rejane, minha amiga e irmã de coração, sempre presente sobretudo nos momentos mais difíceis; Hudson, amigo querido e parceiro de pesquisa; Laura, amiga querida desde os tempos de Colégio Meta; Bruno, amigo de longa data; Suzanne, amiga querida da FAUS (UNISANTOS) para a vida; Carla, Nadja, Sue Ellen e Murillo, meus eternos amigos de Santos; Edfa, Emerson e Luciano, amigos que o CAU me presenteou; Eliane, Girlene, Gabrielle e Fabiana, minhas divas do coração; Matheus, amigo querido que ganhei da Arabesque; Ricardo Campelo, amigo sempre presente. Muito obrigada a todos vocês! Aos meus colegas de mestrado, tanto os da Unesp quanto os da UFAC, pelas trocas de experiências e por todo o apoio. Aos examinadores da banca de defesa, Bruno Vicente Marques e Carlos Humberto Biagolini, por todas as contribuições valiosas feitas a esta pesquisa. Agradeço a todos aqueles que, de alguma forma, contribuíram para a realização deste trabalho. “Rio que passa entre as matas Na sinfonia dos pássaros Que sempre vai muito além Que serve a todos Mas não pertence a ninguém” Correnteza – Sérgio Souto/Daphnis Souto “Só me deram duas estações Pra correr e poder procurar Vi a cheia e criei plantações E verei o meu rio secar Quando o inverno passar” Quando o inverno passar – Diogo Soares/João Eduardo/Jorge Anzol/Márcio Magrão RESUMO As cidades brasileiras vivenciam problemas que se arrastam desde seus surgimentos, como a ocupação de áreas de risco ao longo de corpos hídricos, muitas vezes elementos-chave para sua formação. Na Amazônia, cidades se consolidaram em torno de seus principais rios e possuem em seu tecido urbano uma extensa rede de cursos d’água, muitos deles ocupados por assentamentos precários. Nesse cenário, o poder público no Brasil tem implementado parques lineares ao longo de cursos d’água como uma medida para recuperação das áreas de risco e degradadas pelas ocupações irregulares, reintegrando esses espaços à cidade. No entanto, a presente pesquisa apontou lacunas referentes à qualificação de parques lineares no Brasil, em especial no ambiente amazônico. Tal lacuna limita a elaboração de diretrizes específicas para a gestão dessas áreas. Nesse sentido, o presente estudo teve como objetivo desenvolver e aplicar uma abordagem metodológica para avaliar parques lineares amazônicos, com base na análise da paisagem. Um estudo de caso foi desenvolvido no Parque da Maternidade em Rio Branco, estado do Acre, quando foram estabelecidos critérios para a criação de parâmetros que pudessem quantificar e qualificar a relevância do parque para a paisagem urbana da capital acreana, considerando aspectos sociais, culturais e ambientais. Na análise da paisagem a avaliação do parque considerou os meios antrópico, biótico e físico. A estrutura metodológica incluiu visitas de campo e seleção de elementos de destaque da paisagem, mapeamentos aéreos com drone em duas estações distintas do ano – seca e chuvosa, análise de imagens de satélite, pesquisa bibliográfica, levantamento e análise da legislação urbana e ambiental nas esferas municipal, estadual e federal e do projeto urbanístico do parque. A partir da coleta e análise dos dados obtidos, este trabalho estabeleceu parâmetros para avaliação do Parque da Maternidade, o qual foi dividido em recortes a cada 100 metros do curso d’água resultando em 46 polígonos avaliados. Um índice de eficiência da paisagem permitiu estimar a condição ambiental e estrutural do parque de forma espacializada. Os resultados apontaram uma evolução da condição da paisagem do período seco para o chuvoso, quando o índice de eficiência médio variou de 39% a 44% respectivamente. Com base nos resultados dos índices obtidos, foi realizada uma classificação dos polígonos do parque em classes (A, B, C e D). A Classe A apresentou a condição mais favorável do parque e, de forma decrescente, a Classe D a condição mais crítica. A partir dessa avaliação, foram propostas diretrizes para um plano de gestão do Parque da Maternidade, aplicáveis a outros parques lineares urbanos, considerando suas particularidades. Destacam-se diretrizes como ações de educação ambiental junto à comunidade, manutenção das espécies vegetais, monitoramento de fauna e manutenções periódicas em estruturas edificadas. Palavras-chave: análise da paisagem; infraestrutura verde; gestão ambiental; planejamento urbano. ABSTRACT Brazilian cities face longstanding issues dating back to their origins, such as the occupation of high-risk areas along watercourses, often pivotal elements in their formation. In the Amazon, cities have been consolidated around major rivers, with an extensive network of watercourses in their urban area, many of which are occupied by precarious settlements. In this context, the Brazilian public authorities have implemented linear parks along watercourses as a measure to recover areas at risk and degraded by irregular occupations, reintegrating these spaces into the city. However, the present research identified gaps regarding the qualification of linear parks in Brazil, especially in the Amazonian environment. This gap hinders the development of specific guidelines for the management of these areas. In this regard, the present study aimed to develop and apply a methodological approach to assess Amazonian linear parks based on landscape analysis. A case study was conducted in the Maternidade Park in Rio Branco, Acre state, where criteria were established to create parameters that could quantify and qualify the park's relevance to the urban landscape of the Acrean capital, considering social, cultural, and environmental aspects. In landscape analysis, the park's evaluation considered anthropic, biotic, and physical factors. The methodological structure included field visits and selection of landscape features, aerial mappings with drones in two distinct seasons – dry and rainy, satellite image analysis, bibliographic research, survey and analysis of urban and environmental legislation at municipal, state, and federal levels, and analysis of the park's project. Through data collection and analysis, this work established parameters for assessing the Maternidade Park, which was divided into sections every 100 meters along the watercourse, resulting in 46 evaluated polygons. A landscape efficiency index enabled the spatialized estimation of the park's environmental and structural condition. Results indicated an improvement in landscape condition from the dry to rainy season, with average efficiency indices ranging from 39% to 44%, respectively. Based on the obtained index results, park polygons were classified into classes (A, B, C, and D), with Class A representing the most favorable condition and Class D the most critical. Subsequently, guidelines were proposed for a management plan for the Maternidade Park, applicable to other urban linear parks, considering their unique characteristics. Key directives include environmental education initiatives with the community, maintenance of plant species, fauna monitoring, and periodic upkeep of built structures. Keywords: landscape assessment; green infrastrutcture; environmental management; urban planning. LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Espacialização de áreas verdes no município de Rio Branco, estado do Acre, Brasil. ............................................................................................................... 40 Figura 2 – Parque da Maternidade, em Rio Branco, estado do Acre, Brasil. ............ 41 Figura 3 – Localização do Parque da Maternidade em Rio Branco, AC, Brasil......... 42 Figura 4 – Fluxograma das etapas dos trabalhos ..................................................... 43 Figura 5 – Delimitação e divisão do Parque da Maternidade em polígonos. ............. 47 Figura 6 – Evolução do índice de eficiência geral da paisagem (IEPg) do período seco ao chuvoso ................................................................................................................ 54 Figura 7 – Comparação entre o aspecto da água nos períodos seco (A) e chuvoso (B) no polígono 37 em levantamento de campo ............................................................. 56 Figura 8 – Comparação entre o aspecto da água nos períodos seco e chuvoso nas imagens realizadas por drone ................................................................................... 57 Figura 9 – Erosão em sulco causada por ligação clandestina de esgoto no polígono 17 (A) e erosão laminar no polígono 18 (B) .............................................................. 58 Figura 10 – Índice de eficiência da paisagem da dimensão meio físico nos períodos seco e chuvoso, no Parque da Maternidade, em Rio Branco, estado do Acre, Brasil. .................................................................................................................................. 59 Figura 11 – Distribuição espacial de índices do meio físico nos períodos seco e chuvoso, no Parque da Maternidade, em Rio Branco, estado do Acre, Brasil .......... 59 Figura 12 – Cobertura do solo em observação visual do polígono 1 no período seco (A) e chuvoso (B) ...................................................................................................... 60 Figura 13 – Cobertura do solo em período seco e chuvoso, por meio de imagens de drone ......................................................................................................................... 61 Figura 14 – Cobertura da terra satisfatória no polígono 32 com nota atribuída 3 (A) e baixa no polígono 20 com nota atribuída 1 (B) .......................................................... 62 Figura 15 – Imagem aérea das copas no período seco (A); área de projeção das copas em período seco (B); imagem aérea das copas no período chuvoso (C); e área de projeção das copas no período chuvoso (D) ............................................................. 63 Figura 16 – Polígono 40 em observação visual (A) e em imagem gerada por drone (B) .................................................................................................................................. 64 Figura 17 – Índice de eficiência da paisagem da dimensão meio biótico nos períodos seco e chuvoso, no Parque da Maternidade, em Rio Branco, estado do Acre, Brasil .................................................................................................................................. 64 Figura 18 – Distribuição espacial de índices do meio biótico nos períodos seco e chuvoso, no Parque da Maternidade, em Rio Branco, estado do Acre, Brasil .......... 65 Figura 19 – Poço de visita sem vedação no polígono 20 (A) e evidência de lançamento de esgoto no igarapé no polígono 32 (B) .................................................................. 66 Figura 20 – Resíduos espalhados por toda a arquibancada no segmento 42 (A) e lixeira próxima ao local (B) ........................................................................................ 69 Figura 21 – Equipamentos de ginástica no polígono 2 (A) Quiosque no polígono 6 (B) e casa de artesanato no polígono 30 (C) .................................................................. 70 Figura 22 – Área de lazer com playground e sombreador (A), área deteriorada e parquinho ausente (B) e área onde o sombreador foi demolido (C) .......................... 70 Figura 23 – Pórtico localizado no polígono 32 (A) e no polígono 6 (B) ..................... 72 Figura 24 – Vista do pórtico (A) desgastes e armaduras aparentes (B) e pichação (C) no polígono 13 ........................................................................................................... 72 Figura 25 - Índice de eficiência da paisagem da dimensão meio antrópico nos períodos seco e chuvoso, no Parque da Maternidade, em Rio Branco, estado do Acre, Brasil .................................................................................................................................. 73 Figura 26 – Distribuição espacial de índices do meio antrópico nos períodos seco e chuvoso, no Parque da Maternidade, em Rio Branco, estado do Acre, Brasil .......... 73 Figura 27 – Distribuição comparativa dos valores de IEPg nos períodos seco e chuvoso ..................................................................................................................... 75 Figura 28 – Distribuição espacial de classes de valores de IEPg nos períodos seco e chuvoso no Parque da Maternidade, em Rio Branco, estado do Acre, Brasil ........... 75 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Distribuição de parques urbanos e lineares conforme o zoneamento urbano .................................................................................................................................. 40 Tabela 2 – Relação de indicadores do meio físico e critérios para avaliação ........... 49 Tabela 3 – Relação de indicadores do meio biótico e critérios para avaliação ......... 50 Tabela 4 – Relação de indicadores do meio antrópico e critérios para avaliação ..... 51 Tabela 5 – Análise estatística do IEPg do Parque da Maternidade em período seco .................................................................................................................................. 55 Tabela 6 – Análise estatística do IEPg do Parque da Maternidade em período chuvoso .................................................................................................................................. 55 Tabela 7 – Distribuição de classes de valores de IEPg ............................................. 74 Tabela 8 – Diretrizes para plano de gestão dos polígonos pertencentes à Classe A 79 Tabela 9 – Diretrizes para plano de gestão dos polígonos pertencentes à Classe B 80 Tabela 10 – Diretrizes para plano de gestão dos polígonos pertencentes à Classe C .................................................................................................................................. 81 Tabela 11 – Diretrizes para plano de gestão dos polígonos pertencentes à Classe D .................................................................................................................................. 83 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas APP Área de preservação permanente ELC European Landscape Convention IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IEP Índice de eficiência da paisagem IEPa Índice de eficiência da paisagem do meio antrópico IEPb Índice de eficiência da paisagem do meio biótico IEPf Índice de eficiência da paisagem do meio físico IEPg Índice de eficiência da paisagem geral LAP Landscape Assessment Protocol NBR Norma Técnica Brasileira PMRB Prefeitura Municipal de Rio Branco PROSAMIM Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus SEAD Secretaria de Estado de Administração SEHURB Secretaria de Estado de Habitação e Urbanismo SEOP Secretaria de Estado de Obras Públicas SITGeo Sistema de Inteligência Territorial Urbana ZC Zona Consolidada ZEC Zona em Consolidação ZIHC Zona de Interesse Histórico e Cultural ZOT Zona de Ordenamento Territorial ZQU Zona de Qualificação Urbana ZVA Zona de Vulnerabilidade Ambiental SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................... 17 2 OBJETIVOS .............................................................................................. 19 2.1 Objetivo Geral ............................................................................................. 19 2.2 Objetivos Específicos ................................................................................. 19 3 REVISÃO DA LITERATURA .................................................................... 20 3.1 Contexto histórico dos parques urbanos .................................................... 20 3.2 Base conceitual de parques urbanos e lineares ......................................... 24 3.3 Aspectos regionais: o ambiente Amazônico ............................................... 28 3.4 Parques urbanos e lineares: problemas e desafios .................................... 32 3.5 Aplicação da análise da paisagem em estudos ambientais ........................ 35 4 MATERIAIS E MÉTODOS ........................................................................ 39 4.1 Delimitação da área de estudo ................................................................... 39 4.2 Etapas de desenvolvimento do trabalho ..................................................... 42 4.3 Mapeamento aéreo com drone ................................................................... 44 4.4 Visitas ao local ............................................................................................ 45 4.5 Metodologia ................................................................................................ 45 4.6 Coleta de dados ......................................................................................... 46 4.6.1 Meio Físico ................................................................................................ 49 4.6.2 Meio Biótico ............................................................................................... 50 4.6.3 Meio Antrópico ........................................................................................... 50 5 RESULTADOS E DISCUSSÃO ................................................................ 54 5.1 Análise do meio físico ................................................................................. 55 5.2 Análise do meio biótico ............................................................................... 60 5.3 Análise do meio antrópico .......................................................................... 65 5.4 Classificação de áreas ................................................................................ 74 5.5 Diretrizes para um plano de gestão do Parque da Maternidade ................. 77 6 CONCLUSÕES ......................................................................................... 84 REFERÊNCIAS .................................................................................................... 85 APÊNDICE A – AVALIAÇÃO DOS POLÍGONOS 1 A 23 (SET.2023) ................ 91 APÊNDICE B – AVALIAÇÃO DOS POLÍGONOS 24 A 46 (SET. 2023) ............. 92 APÊNDICE C – AVALIAÇÃO DOS POLÍGONOS 1 A 23 (FEV. 2024) ............... 93 APÊNDICE D – AVALIAÇÃO DOS POLÍGONOS 24 A 46 (FEV. 2024) ............. 94 APÊNDICE E – MAPEAMENTO AÉREO REALIZADO EM SET. 2022 .............. 95 APÊNDICE F – MAPEAMENTO AÉREO REALIZADO EM FEV. 2023 .............. 96 17 1 INTRODUÇÃO A ocupação irregular em áreas de risco, especialmente às margens de cursos d’água, é um problema recorrente em cidades brasileiras e podem desencadear diversos problemas ambientais, sociais e de saúde pública. Na Amazônia, a consolidação urbana de grande parte das cidades se deu em torno dos rios, os quais desenvolveram relevante papel para as trocas comerciais durante o ciclo da borracha e se tornaram elementos importantes para os modos de vida de seus moradores e no desenvolvimento da cultura ribeirinha. Esse fenômeno trouxe à tona as problemáticas apontadas e levantou discussões a respeito da legislação ambiental em contraponto à dinâmica sociocultural. O surgimento de Rio Branco tem suas origens na produção e comercialização da borracha. A cidade nasce em torno do Rio Acre a partir da instalação de um seringal à margem direita em 1882, quando surgem os primeiros povoados com ruas de traçado irregular e casas de madeira, e expande para a margem esquerda no início do século XX, quando há os primeiros planos de ocupação com traçados viários regulares e as primeiras construções em alvenaria (ALVES, 2012). A partir de então, houve o crescimento e evolução da ocupação urbana. A ocupação urbana de Rio Branco, por se tratar de uma cidade ribeirinha amazônica, leva a importantes questões de vulnerabilidade ambiental, por sua consolidação em região de extensa área de bacia hidrográfica (FRANCA, 2013). Nesse caso constituída pelo rio Acre e uma grande trama de igarapés, nome regional de origem indígena dado aos pequenos rios na Amazônia. Dessa forma, os rios e igarapés tornaram-se elemento integrante da paisagem das cidades amazônicas e fazem parte dos modos de vida de seus moradores. Seus espaços e áreas marginais passaram a ser utilizados para diversas finalidades, sejam de habitação, de lazer ou de atividades ligadas a comércios e serviços. No entanto, a ocupação em áreas marginais de cursos d’água tornou-se um dos maiores desafios enfrentados pelo poder público, pois desencadeiam uma série de problemas urbanos. A concentração de pessoas vivendo em moradias insalubres contribui para a ausência de saneamento básico, que por sua vez leva à poluição dos cursos d’água, à falta de coleta e destinação de 18 resíduos sólidos e à proliferação de doenças (MARQUES, 2016). Além disso, tal ocupação compromete a mata ciliar, levando à erosão, ao assoreamento dos leitos e a inundações em períodos de chuvas (ALVES, 2012). Nesse cenário, o poder público tem empregado parques lineares como uma medida para recuperar as áreas degradadas e reintegrá-las à cidade, pela remoção de assentamentos precários e criação de espaços destinados ao lazer, à cultura e uma diversidade de atividades. Tais parques se consolidam como áreas de extenso comprimento e estreita largura, que margeiam os cursos d’água, apresentando a linearidade como principal característica. Em Rio Branco, a primeira iniciativa do poder público foi a construção do Parque da Maternidade, uma extensa área verde linear que percorre o igarapé de mesmo nome. A origem do seu nome se deve à presença do hospital público às margens do igarapé. Após sua implantação, foram criados outros parques lineares na cidade seguindo as mesmas características, de áreas verdes e espaços públicos destinados a lazer, cultura e recreação, que margeiam cursos d’água. Exemplos de parques posteriores ao da Maternidade que surgiram a partir de 2005, são o Parque do Tucumã, Parque do Igarapé Fundo, Parque do Palheiral e Parque Vale do Açaí. Em contrapartida, a ausência de diretrizes específicas para qualificar parques lineares urbanos no Brasil, em especial aqueles em ambiente amazônico, emerge desafios para aprimorar sua eficiência urbana e ambiental. Com base nessa problemática, é fundamental o desenvolvimento de abordagens metodológicas para embasar diretrizes de um plano de gestão para recuperar e elevar a eficiência desses parques, considerando aspectos estruturais e ambientais. Assim, justifica-se o estudo de caso no Parque da Maternidade, por ter sido o primeiro exemplar de parque linear urbano em Rio Branco e que serviu de modelo para os demais que foram implantados posteriormente na cidade. 19 2 OBJETIVOS 2.1 Objetivo Geral Desenvolver e aplicar uma abordagem metodológica para avaliar a eficiência da paisagem em parques lineares amazônicos, por meio de um estudo no Parque da Maternidade em Rio Branco, Acre. 2.2 Objetivos Específicos • Desenvolver uma ferramenta para o diagnóstico e avaliação para parques lineares urbanos amazônicos; • Elaborar indicadores baseado em elementos de destaque da paisagem e relacionados aos meios físico, biótico e antrópico em parques lineares urbanos; • Com base nesses indicadores, determinar um índice de eficiência da paisagem de parques lineares urbanos na Amazônia; • Propor diretrizes para um plano de gestão urbana para parques lineares urbanos em ambiente amazônico a partir da análise de paisagem. 20 3 REVISÃO DA LITERATURA 3.1 Contexto histórico dos parques urbanos A utilização de espaços verdes como elementos da cidade tem seus primeiros registros no século XVIII, quando se inicia a implementação de parques e infraestruturas verdes em centros urbanos, a partir dos movimentos ingleses, americanos e haussmannianos em Paris (FRIEDRICH, 2007). Na Inglaterra, o intenso processo de industrialização e urbanização que ocorria ao fim do século XVIII levou à necessidade de atenuar os efeitos da insalubridade e congestionamento de trânsito, ocasionados pelo desenvolvimento acelerado dos núcleos urbanos, bem como de proporcionar melhor qualidade de vida às cidades (GARABINI, 2004). Nesse sentido, o movimento dos parques ingleses buscava a integração com a natureza pela valorização dos cursos d’água e das formas orgânicas, além de haver uma preocupação com a destinação de espaços e equipamentos para lazer e recreação (FRIEDRICH, 2007). De acordo com a autora, esses espaços eram criados como forma de amenizar o adensamento da estrutura urbana, exercendo a função de “pulmão verde”, de oásis de ar puro e de áreas de contemplação. Paralelamente, houve na França o movimento haussmanniano que remete à execução do plano de Georges-Eugène Haussmann para Paris. Tal movimento consistia em expressivas reformas urbanas na capital francesa, sendo uma de suas principais características a abertura de avenidas e bulevares. Segundo Friedrich (2007), esse plano de ação incorporou a criação de um sistema de parques urbanos ligados por avenidas, sob o argumento da modernização e da salubridade, e resultando em três funções básicas: saneamento das infraestruturas para proporcionar saúde à população, transporte para viabilizar o deslocamento de pessoas e mercadorias e a implantação de equipamentos urbanos na cidade, tendo como premissa a modernização e a mitigação da insalubridade, com a criação de espaços mais amplos, iluminados e arejados. Ainda no fim do século XVIII, iniciou-se o movimento dos parques americanos, que teve como principal expoente o arquiteto paisagista Frederick 21 Law Olmsted (FRIEDRICH, 2007). Segundo Medeiros et al. (2020), Olmsted introduziu o conceito de parkways, modelo de parques que consistiam em caminhos que se conectam a espaços abertos e suas vizinhanças. Tal modelo levava em conta os espaços verdes inseridos ao meio urbano, possibilitando a interação entre homem e natureza (MEDEIROS, 2016). Além disso, considerava a utilização da paisagem como instrumento urbanístico de planejamento, de modo que a natureza no contexto urbano poderia contribuir para reconstruir ambientes degradados (FRIEDRICH, 2007). A autora afirma que havia a preocupação em integrar o parque à estrutura urbana, considerado lugar público, de justiça social e de participação democrática. Esses movimentos tinham em comum o objetivo de dar qualidade urbana às cidades que, pressionadas pelos processos acelerados de urbanização, percebiam a necessidade de criar espaços que proporcionassem melhorias e salubridade aos seus habitantes. Assim, os parques urbanos têm sua origem nesse contexto, pela demanda por espaços de lazer, de recreação e de integração com a natureza. O surgimento do modelo de parques lineares parece ter relação com essa utilização histórica dos espaços verdes quando ligados aos rios, como as propostas criadas nos movimentos que ocorreram na Europa e nos Estados Unidos. Biagolini (2018) comenta que esse modelo teria surgido na Europa no século XIX com o Plano da cidade de Berlim, de Lenné (entre 1840 e 1850). Esse plano se assemelhava ao modelo de parque linear, pois associava a criação um conjunto de parques ao sistema de canais do rio Spree, adotando soluções para permitir a navegabilidade e a prevenção contra enchentes, se configurando um elemento simultaneamente urbano e natural (SARAIVA, 1999). Já Medeiros et. al. (2020) apontam que Frederick Law Olmsted também exerceu forte influência para a surgimento do modelo de parque linear ao criar o conceito de parkways em 1865. Embora essa estratégia de criação de espaços públicos ao longo de cursos d’água tenha sido realizada anteriormente por Lenné, a concepção de parque linear como área de contemplação em que se conectam natureza e usuário é conferida a Olmsted (NAGANO; GONÇALVES, 2018). Frederick L. Olmsted em conjunto com o arquiteto Calvert Vaux desenvolveram entre 1866 e 1867 uma série de projetos com o conceito de parkways, como o Brooklyn’s Prospect Park, para a cidade de Nova York, além 22 de projetos de parques para as cidades de Buffalo e Chicago, no estado de Illinois (GIORDANO, 2004). De acordo com a autora, Olmsted e Vaux desenvolveram também um projeto de parkway para Boston em 1887, o Emerald Necklace, considerado até então maior realização de corredor verde com aproximadamente 7,2 quilômetros de extensão. A partir daí, esse conceito foi difundido e incorporado em diversas cidades nos Estados Unidos. Ao fim do século XIX e início do século XX, surgem outros projetos de parques nos Estados Unidos, como aqueles desenvolvidos por H. W. S. Cleveland para Minneapolis, por Charles Elliot para Boston e por Jeans Jensen para Chicago (GIORDANO, 2004). Já a partir de 1920, segundo a autora, Robert Moses foi a pessoa que mais construiu parkways nos Estados Unidos. Com o passar dos anos, as concepções de parques urbanos foram se adaptando às necessidades sociais, econômicas e culturais das populações (FRIEDRICH, 2007). A autora afirma que a partir da segunda metade do século XX as áreas verdes passaram a ser valorizadas pelas suas características cênicas em projetos paisagísticos e parques urbanos. Sakata (2018) afirma que a ideia de parques lineares, inicialmente proposta por Olmsted, foi introduzida no Brasil pelas arquitetas Rosa Kliass e Miranda Magnoli na década de 60, quando projetaram um sistema de parques integrados para a cidade de São Paulo, o Plano de Áreas Verdes de Recreação. O plano não foi executado, porém, o conceito difundiu-se e tornou-se consenso entre acadêmicos e técnicos ao longo dos anos. Nos anos 80, com o movimento ecológico e de renaturalização das cidades que emergiam na época, a questão ambiental se torna um fator relevante para a qualidade do ambiente urbano, considerando a recuperação de áreas degradadas como forma de melhorar a qualidade das cidades industriais (FRIEDRICH, 2007). Nesse período, passou-se a haver uma preocupação com a questão ambiental no que tange às relações ecológicas, em que os parques de modo geral se tornam uma alternativa para atender a essas necessidades (SAKATA, 2018). No Brasil, ao final da década de 80, os parques lineares passam a atuar como instrumento de política pública. A partir da Constituição Federal de 1988, os municípios brasileiros passam a ter a atribuição de promover ações para planejamento urbano, ordenamento territorial adequado e controle do uso e 23 ocupação do solo, conforme prevê em seu art. 182 (COSTA; MACIEL, 2020). Tal artigo é regulamentado pelo Estatuto da Cidade (Lei 10.257/2001), que “confia ao Plano Diretor dos municípios a implementação da política de desenvolvimento e de expansão urbana, cuidando, dentre outras diretrizes, de corrigir as distorções do crescimento urbano e seus efeitos negativos sobre o meio ambiente” (COSTA; MACIEL, 2020). Os autores comentam que nesse viés o parque linear passa a surgir nos planos diretores municipais como instrumento de requalificação urbana nos cursos d’água. Essa nova finalidade conferida aos parques lineares pode ser observada não apenas no Brasil, mas também em outros países. Um exemplo é o parque linear do rio Torrens, na Austrália, projeto criado na década de 80 com um sistema de infraestruturas verdes com o objetivo de enfrentar os desafios da má qualidade da água e das inundações da bacia hidrográfica do rio Torrens (IBRAHIM et al. 2020). O parque se tornou uma referência para outros projetos semelhantes na Australia, por responder a diversas questões ambientais e sociais, promovendo mudanças de atitudes da sociedade em relação ao rio (MUGAVIN, 2004). No entanto, Ibrahim et al. (2020) destacam que, apesar de sua implementação ter trazido aspectos positivos, a complexidade do projeto impôs diversos desafios para sua gestão. A partir dos anos 2000 houve uma evolução da legislação ambiental brasileira, que passou a ser mais rígida e “dava instrumentos ao poder público para aprovar ou não obras de médio e grande porte, para aplicar sanções e captar recursos por meio de multas e compensações ambientais” (SAKATA, 2018). Segundo autora, os parques produzidos a partir dessa época se apresentavam como sustentáveis. Friedrich (2007) afirma que, a partir do século XXI, o conceito de parque linear se consolida como uma alternativa para viabilizar a preservação e recuperação de cursos d’água e suas áreas marginais, aliando essas ações à implementação de programas de lazer, recreação e circulação não motorizada, atendendo aos preceitos do desenvolvimento sustentável. Sakata (2018) pontua que, nos locais onde é feita a remoção de ocupações irregulares, a implantação de áreas verdes qualificadas é uma forma de evitar ocupações futuras, reforçando sua aplicabilidade como instrumento de política pública. 24 3.2 Base conceitual de parques urbanos e lineares Uma busca na literatura apontou diversas definições de parques urbanos e lineares desde a década de 1990, demonstrando a relevância do tema. Kliass (1993), arquiteta paisagista que exerceu forte influência para a introdução de parques urbanos no Brasil no século XX, em sua publicação os define como “espaços públicos com dimensões significativas e predominância de elementos naturais, principalmente cobertura vegetal, destinados à recreação.” (KLIASS, 1993, p. 19). Ahern (1995), um dos primeiros autores a elaborar o conceito de corredores verdes – greenways – os define como redes de terras que apresentam elementos lineares de forma planejada com fins ecológicos, de recreação, culturais, estéticos e outros que estejam alinhados ao conceito de uso sustentável da terra, assemelhando-se à configuração de parque linear. Para o autor, há cinco ideias-chave que justificam esse conceito, sendo elas: a configuração espacial linear; a conexão entre os elementos da paisagem; as características multifuncionais, por associar as necessidades ecológicas, de lazer, de estética e sociais; a estratégia baseada no desenvolvimento sustentável; e a estratégia baseada nas características particulares de sistemas lineares e integrados. O modelo de parque linear como tipologia de infraestrutura verde parece ter se consolidado de fato a partir dos anos 2000 (FRIEDRICH, 2007; SAKATA, 2018; IBRAHIM et al., 2020; MEDEIROS et al., 2020). Friedrich (2007) entende o parque linear urbano como instrumento de política pública, podendo atuar como elemento estruturador de programas ambientais e como instrumento de planejamento e gestão das áreas marginais de cursos d’água ao conciliar os aspectos urbanos e ambientais em consonância com a legislação ambiental e a realidade local. Assim, define o parque linear como um instrumento de gestão sustentável do uso e ocupação de áreas de fundo de vale, considerando os aspectos ambientais, sociais, econômicos e culturais. Ainda segundo a autora, o parque linear, ao contrário de um parque isolado, possui uma continuidade espacial, pois se relaciona com os espaços construídos e abertos, estabelecendo uma conexão com a paisagem urbana. 25 Medeiros (2016) afirma que os parques lineares são equipamentos que abrigam a biodiversidade local, que concilia as questões ambientais às necessidades humanas, fundamentado na utilização de um paisagismo baseado nos princípios da ecologia da paisagem. Para Sakata (2018), os parques lineares podem se apresentar tanto na forma de pequenos espaços livres que margeiam os cursos d’água, como na forma de projetos de porte expressivo que se articulam no tecido urbano. Além disso, a autora traz definições de diversas categorias de parques urbanos, dos quais destacam-se três tipos de parques lineares: parques lineares inseridos em malha urbana, os quais possuem comprimento muito maior em relação à largura, consolidados em vazios urbanos, geralmente com geometria linear, como por exemplo antigas linhas férreas ou viadutos demolidos; parques lineares ao longo de rios, que se consolidam às margens dos cursos d’água e tiram partido da paisagem natural; e parques lineares aéreos, projetados sobre estruturas antigas, como viadutos e linhas férreas desativadas, como por exemplo a Promenade Plantée, em Paris, e o High Line Park, em Nova York. Biagolini (2018) define os parques lineares como áreas estruturadas que acompanham os cursos d’água e que têm a finalidade de recuperação e preservação ambiental, além da criação de espaços para lazer e socialização. Comenta ainda que esses parques podem impedir as ocupações irregulares nas áreas protegidas. Esta é uma definição que condiz com a realidade atual, ao passo que os parques lineares têm sido utilizados como instrumentos de políticas públicas pelos municípios brasileiros à medida em que vem sendo incorporados aos planos diretores e outras normas municipais desde o início do século XXI, como demonstrado pela literatura. Ramos et al. (2019) apontam que os parques lineares são corredores que conectam diversos pontos da cidade, podendo valorizar o entorno e melhorar a qualidade de vida ao reunir atividades de lazer, cultura e esporte sendo, portanto, um espaço democrático que beneficia a cidade como um todo. Além disso, a presença do curso d’água valoriza a paisagem natural, fortalecendo a justificativa de sua implantação, como no estudo de caso apresentado pelas autoras. Ibrahim et al. (2020) entende o parque linear como uma tipologia de infraestrutura verde, conceituando-o como “sistema interligado de espaços verdes, compreendendo áreas naturais como cursos d’água, florestas ou 26 parques que são planejados e geridos para fornecer benefícios sociais, econômicos e ambientais” (IBRAHIM et al., 2020). Esse conceito é de grande importância para a compreensão do parque linear na atualidade, pois considera sua função social, por ser espaço voltado para utilização da população, aliado à preocupação em resolver questões ambientais. Em estudo recente sobre parques lineares em ambiente amazônico, Araújo et al. (2023) apontam os diversos aspectos regionais, como a questão da ocupação ribeirinha nas APPs e a utilização dos parques como medida para recuperação dessas áreas degradadas e criação de espaços verdes. Os autores trazem o conceito de parque linear, especificamente os amazônicos, como sendo “espaços verdes inseridos no tecido urbano, que possuem infraestrutura e equipamentos públicos destinados a lazer, cultura, recreação e diversas outras atividades humanas” (ARAÚJO et al., 2023). Comentam ainda sobre a morfologia de um parque linear que, ao acompanhar um curso d’água, é caracterizada pelo aspecto linear por apresentar vasto comprimento em relação à largura. Os autores afirmam que “tais parques possibilitam a conexão entre natureza e cidade, ao passo que há uma interrelação entre os meios físico, biótico e antrópico, tornando-se elemento integrante e indissociável da paisagem urbana.” (ARAÚJO et al., 2023) Por ser instrumento de política pública para o manejo de áreas ambientalmente degradadas e requalificação desses espaços, cabe elencar as funções desempenhadas por um parque linear urbano. Destaca-se, como comentado anteriormente, o seu caráter social, pelo uso público pelos habitantes e o desempenho de diversas atividades em seus espaços, revelando sua função social para a cidade. Friederich (2007) destaca as seguintes funções dos parques lineares urbanos: drenagem; proteção e manutenção do sistema natural; lazer, paisagismo, desenvolvimento econômico; política e corredor multifuncional. Além dessas funções, a autora acrescenta o caráter social do parque linear para a cidade. Raimundo & Sarti (2016) destacam ainda a função dos parques urbanos em prestar serviços ecossistêmicos, como a oferta de alimentos e de água, polinização, retenção de solo, entre outros, e serviços de regulação, este último com a provisão de cultura, lazer e turismo, reforçando sua função social. 27 A legislação brasileira, por sua vez, trata da função social da cidade e da propriedade urbana de maneira abrangente. Segundo a Constituição Federal de 1988 e o Estatuto da Cidade, “a propriedade urbana cumpre sua função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no plano diretor” (BRASIL, 1988 – Art. 182, parágrafo 2º), “assegurando o atendimento das necessidades dos cidadãos quanto à qualidade de vida, à justiça social e ao desenvolvimento das atividades econômicas” (BRASIL, 2001 – Art. 39). A partir da regulamentação do art. 182 da Constituição Brasileira pela Lei nº 10.257/2001 (Estatuto da Cidade), alguns municípios passaram a incorporar os parques lineares urbanos às suas legislações. Costa & Maciel (2020) comentam o exemplo da cidade de São Paulo, que já previa os parques lineares urbanos em seu plano diretor anterior (Lei paulistana nº 13.430/2002), e que o conceito evoluiu no plano diretor vigente em 2024 (Lei paulistana nº 16.050/2014), ampliando a relevância dos parques lineares e atribuindo-os diversas funções: proteção e recuperação das APPs e ecossistemas ligados aos cursos d’água; proteção, conservação e recuperação de corredores ecológicos; conexão entre áreas verdes e espaços públicos; controle de enchentes; evitar ocupações irregulares em fundos de vale; promoção de atividades de conservação ambiental, de lazer e de cultura; e ampliação da conscientização da população sobre o meio físico (SÃO PAULO, 2014). Ao trazer o tema para o estudo de caso deste trabalho – o Parque da Maternidade, em Rio Branco (AC) – fez-se uma consulta ao que dispõe a legislação municipal quanto às funções sociais da cidade e da propriedade urbana, bem como às funções de um parque linear. O Plano Diretor do Município de Rio Branco vigente em 2024 (Lei nº 2.222 de 26 de dezembro de 2016), é constituído, entre outros princípios norteadores, pelos princípios da função social da cidade e da propriedade (Art 5º, incisos II e III). A lei municipal elenca, ainda, as funções sociais do Município de Rio Branco, fazendo referência ao art. 182 da Constituição Federal e ao Estatuto da Cidade, ratificando que a propriedade urbana exercerá sua função social quando cumprir esses dispositivos legais. No entanto, a lei municipal não menciona funções específicas de parques lineares e nem estabelece diretrizes para eles. 28 No entanto, é possível perceber que as funções dos parques lineares se correlacionam com as funções sociais da cidade e da propriedade urbana, pois se empenham em concatenar as questões ambientais, educacionais, culturais, econômicas, de estrutura urbana, de habitação, de patrimônio e de serviços. Nesse contexto, entende-se que o parque linear é parte integrante da cidade e pode atuar como instrumento que contribui para o exercício de suas funções sociais e da propriedade urbana, desde que atenda ao disposto na legislação em âmbito federal, estadual e municipal. 3.3 Aspectos regionais: o ambiente Amazônico Na Amazônia é comum a utilização de denominações regionais para os cursos d’água pela população. Conforme Batista (2012), igarapé é uma palavra indígena que se refere a um pequeno curso d’água que possui características de um rio, sendo um nome regional para rios de pequena ordem. O processo de ocupação ribeirinho dos povos da região amazônica se caracteriza pela utilização dos cursos d’água, em que os núcleos urbanos são geralmente entrecortados por rios e igarapés (FRANCA, 2013). Segundo Pereira et al. (2007), o termo ribeirinhos é uma denominação regional para o camponês da Amazônia, referindo-se às populações que vivem às margens dos cursos d’água, muito conhecidos na região como paranás, igapós, furos e igarapés. Ainda segundo esses autores, essa população teve a contribuição de diferentes culturas, entre elas as indígenas, que lhe conferiram “vasto conhecimento na apropriação dos recursos naturais e na sua relação com o natural” (PEREIRA et al., 2007). Franca (2013) afirma que as cidades amazônicas que surgiram a partir dos rios passam por questões de vulnerabilidade por envolver o crescimento urbano desordenado aliado às ocupações de regiões de bacias hidrográficas. Segundo Medeiros et al. (2018), a extensa rede de igarapés típica da região, aliada aos modos de vida ribeirinho e a falta de suporte habitacional nas cidades contribuíram para a ocupação das APPs. Essas ocupações em áreas lindeiras a cursos d’água leva a importantes questões ambientais, pois nesses casos se observam a degradação de matas ripárias, poluição dos recursos hídricos, 29 erosão e sedimentação dos leitos, risco aumentado de inundações, entre outros problemas (ALVES, 2012). A legislação ambiental brasileira traz uma série de conceitos e regramentos a respeito das APPs, que segundo o Código Florestal Brasileiro (Lei 12.651/2012) são áreas protegidas que possuem a função ambiental de “preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas” (BRASIL, 2012). Freitas et al. (2013) destacam a importância das matas ciliares, também conhecidas como matas ripárias ou ribeirinhas, que são a vegetação que ocupam as margens dos cursos d’água e que possui características peculiares como a função de proteção contra inundações periódicas e a facilidade de adaptação a terrenos com alta declividade. Os autores afirmam que, apesar da proteção legal dessas áreas, sua ocupação é crescente e tem causado degradação ambiental. Medeiros et al. (2018) ressaltam a importância das APPs na Amazônia pelo seu papel ecológico ao promover o equilíbrio ecossistêmico local, além de fornecer bens e serviços ao homem. Entretanto, esses autores ponderam que a legislação não diferencia as APPs localizadas em áreas urbanas ou rurais, tornando difícil sua aplicação em meio urbano, pois as faixas de proteção impostas pela lei poderiam englobar bairros inteiros. Por outro lado, a manutenção da vegetação em ambiente urbano pode trazer diversos benefícios para a cidade e seus moradores. Um aspecto positivo da presença de áreas verdes é manutenção da avifauna, uma vez que essas áreas podem atuar como corredores ecológicos para seu deslocamento (RIBAS, 2021), afetando positivamente a flora com o transporte e dispersão de sementes, grãos de pólen e outros elementos, além de atuarem no controle de pragas e vetores (BIAGOLINI; LOURENÇO, 2018). Zhu et al. (2023) comentam que há uma relação entre a urbanização acelerada e o crescimento de problemas de saúde mental entre a população, razão pela qual defendem a utilização de espaços verdes como elemento essencial para saúde mental pública, interações sociais e atividades públicas. Esse estudo traz um aspecto relevante sobre o papel dos espaços verdes em áreas urbanizadas, pois os autores observaram 30 diversos benefícios proporcionados pelos cantos de pássaros e pelas concentrações de árvores e arbustos à saúde mental humana. Valladares (2009) comenta a relação entre homem e natureza no ambiente amazônico, apresentando um panorama de projetos de intervenção urbana na região. Segundo o autor, a partir da década de 1990 houve diversas políticas públicas de remodelagem urbana nas cidades amazônicas, notadamente na concepção de projetos de parques urbanos e orlas fluviais. Para o autor, ao contrário das concepções europeias de parque urbano, que surgiram de uma crítica à cidade industrial, a concepção de parques urbanos brasileiros se apoia nos anseios por modernização mesclados com as questões ambientais emergentes à época. Valladares (2009) esclarece, ainda, que a relação cidade- água, pelos próprios processos de ocupação da Amazônia, se torna um aspecto de considerável relevância para a região, consequentemente expresso nos parques urbanos e orlas fluviais. Assim, observa-se que as ocupações de APPs são uma característica comum às cidades amazônicas, levando a questões que colocam em risco a qualidade ambiental e urbana. Esses problemas levaram à busca por soluções, entre elas a criação de parques lineares ao longo de cursos hídricos que, segundo Costa & Maciel (2020), passaram a integrar as legislações municipais como instrumento de requalificação urbana a partir dos anos 2000. Apesar de os parques lineares terem se notabilizado no Brasil a partir do século XXI, sua implantação na Região Norte ainda é pouco difundida (MEDEIROS et al., 2020). Esses autores estudaram a implantação de parques lineares no Brasil e destacam algumas experiências realizadas em contexto amazônico, nas cidades de Manaus (Parque linear do igarapé Mindu), Belém (orla da baía de Guajará), e Rio Branco (Parque da Maternidade). Os autores afirmam que esses parques lineares foram implantados no início dos anos 2000 e têm em comum o objetivo de preservação ambiental e de oferecer espaços públicos para a população, porém, “sob um ponto de vista regional, poucas são as políticas públicas que abarcam os projetos de recuperação de rios urbanos de forma abrangente.” (MEDEIROS et al., 2020). No caso da capital amazonense, destaca-se a criação do Programa Social e Ambiental dos Igarapés de Manaus (PROSAMIM), plano de requalificação urbana criado pelo governo do Estado do Amazonas que iniciou as primeiras 31 intervenções urbanísticas a partir de 2006 (SAKATA, 2018). Morais & Venturato (2013) apontam que o PROSAMIM é parte de um processo de remodelagem urbana de Manaus na medida em que propõe uma reestruturação da cidade, com intervenções principalmente em igarapés, com a remoção de assentamentos precários e reassentando a população em outros locais, além da criação de parques ao longo dos cursos d’água. Na capital acreana, o Parque da Maternidade foi projetado pelas arquitetas Alejandra Devecchi e Eliane Guedes, acompanhando o curso d’água que leva o mesmo nome e é afluente do Rio Acre (MEDEIROS et al., 2020). Ao igarapé e ao parque que o margeia foi atribuído o nome “Maternidade” em razão da presença do hospital maternidade público existente no local. Segundo Valladares (2009), foi o primeiro parque linear implantado cidade e na Amazônia brasileira com o objetivo de resolver problemas relacionados às questões ambientais, sociais e espaciais. Bento (2021) destaca o Parque da Maternidade como parte das transformações urbanísticas ocorridas em Rio Branco a partir do final dos anos 1990, revelando sua importância para a malha viária, área arborizada e recuperada, além da valorização dos bairros do entorno. O projeto foi concebido com o intuito de recuperar o manancial com a remoção dos assentamentos precários existentes no local que contribuíam para a poluição hídrica, além de evitar enchentes (MEDEIROS et al., 2020). Para os autores, o parque se configura como um corredor verde que conta com espaços de lazer, valorizando o entorno e atraindo a população. Além disso, houve uma requalificação da paisagem no entorno com a construção de calçadas e ciclovias ao longo das avenidas (MEDEIROS, 2016). Após a inauguração do Parque da Maternidade em 2002, o poder público desenvolveu programas e projetos para construção de outros parques lineares urbanos como instrumento para recuperação de áreas de risco. Tais áreas eram ocupadas por assentamentos precários ao longo de outros igarapés urbanos (BENTO, 2021). Freire (2021) comenta que esses parques lineares tinham em comum a regularização urbanística nas APPs, reassentamento de famílias, obras de macrodrenagem e criação de espaços para lazer e esportes levando em conta a extensa rede de igarapés, característica importante das cidades amazônicas. 32 Assim, essas áreas foram destinadas para outros usos, com a criação de espaços livres de lazer, recreação, esportes e outras atividades, reproduzindo o modelo do Parque da Maternidade. Nesse viés, foram criados os parques Tucumã (inaugurado em 2005), Vale do Açaí (inaugurado em 2010), Palheiral (inaugurado em 2017), Igarapé Fundo (ainda em obras, com pequenos trechos concluídos), e igarapé Fidêncio (ainda em obras), de acordo com informações coletadas junto às Secretarias de Obras Públicas (SEOP), de Administração (SEAD) e de Habitação e Urbanismo (SEHURB) do Estado do Acre. De acordo com a SEAD, Parque da Maternidade possuiu, até 2018, um escritório administrado pelo governo do estado responsável pela manutenção da infraestrutura do parque, dos espaços edificados, do paisagismo e da limpeza do igarapé. Desde 2019, a manutenção do parque deixou de ser feita somente pelo estado e passou a ser compartilhada com a prefeitura, sem a existência de um alinhamento de ações entre os governos municipal e estadual. Os demais parques lineares implantados após o da Maternidade, por sua vez, não chegaram a possuir um escritório administrativo. 3.4 Parques urbanos e lineares: problemas e desafios Apesar de os parques lineares atuarem em muitos casos como instrumentos para recuperação de áreas degradadas, a literatura aponta que problemas e desafios ainda são verificados nesses espaços após sua implantação, os quais podem ser observados em exemplos na Amazônia, em outras regiões do Brasil e em outros países. Em Rio Branco, Araújo et al. (2023) comentam que a implantação do Parque da Maternidade conferiu diversos ganhos à cidade. No entanto, os autores pontuam que a falta de um plano de gestão para o Parque da Maternidade reflete os problemas observados no local, como erosão e assoreamento do curso d’água, falta de manutenção das estruturas físicas do parque e outros. Consequentemente, os demais parques lineares da cidade apresentam problemas semelhantes pela falta de gestão pública, ainda mais agravados naqueles que se localizam em áreas mais distantes do centro da cidade. 33 Diversos problemas são encontrados em outros parques lineares no Brasil. Na cidade de São Paulo, Nagano & Gonçalves (2018) analisaram três parques lineares: Canivete, Guaratiba e Itaim, os quais apresentavam como características comuns as ocupações irregulares em áreas ambientalmente protegidas, como rios e morros. Os autores levantaram diversos problemas enfrentados pelo poder público pós-implantação desses parques, como falta de manutenção, carência de políticas de gestão e avaliação, falta de apropriação do espaço pela população, criminalidade e lançamento de esgoto não tratado nos córregos. Pontuam ainda que não há uma política de gestão da prefeitura, notadamente pela redução das equipes para manejo dos parques, assimetria de investimentos entre espaços centrais e periféricos e falta de alinhamento de ações entre prefeitura e governo do estado. Além destes problemas, Biagolini (2018) também verificou a falta acessibilidade em calçadas, ausência de sinalização, ciclovias e bebedouros, presença de resíduos sólidos e redução das espécies de avifauna em grande parte dos parques lineares paulistanos avaliados pelo autor. Sakata (2018) comenta que há uma relação entre apropriação e manutenção dos parques urbanos no Brasil, uma vez que seus estudos apontaram uma tendência de melhor manutenção em parques com uso frequente e em áreas centrais, ao passo que bairros formados por população de baixa renda apresentaram espaços em condições ruins. A autora destaca desafios de gestão desses espaços, entre eles a elaboração de um programa de atividades para cada parque, melhoria da percepção de segurança, proteção contra invasões, manutenção dos espaços, entre outros. Destaca, ainda, exemplos de cidades com parques em bom estado de conservação, como Belo Horizonte, que desenvolveu uma gestão integrada de parques, e Curitiba, que na década de 1990 contava com um corpo técnico para planejar os espaços de lazer, levando à manutenção mais eficiente desses espaços. Em estudo realizado com usuários do parque linear Rio do Peixe, no município de Videira, em Santa Catarina, Camara & Lemos (2022) apontaram boas condições da maior parte das estruturas do parque, como calçadas, decks, pergolados, ciclovias e quadras esportivas, além de boa diversidade vegetal e manutenção periódica dos jardins. Entretanto, os autores comentaram que o mobiliário urbano apresentava deterioração pela manutenção deficiente. Outro 34 aspecto destacado é a percepção de segurança levantada pelos autores, que se mostrou mais elevada pela presença de edificações públicas de polícia e de corpo de bombeiros, além de considerarem a circulação de pessoas como fator para elevar essa percepção. Além dos problemas relacionados ao meio antrópico, os meios físico e biótico são afetados com a canalização dos cursos d’água na implantação de parques lineares, como afirma Medeiros (2016). Nesses projetos rios e córregos geralmente são retificados e consequentemente há perda de matas ciliares, o que contribui para o maior escoamento das águas e elevação dos riscos de erosões e inundações. É possível encontrar desafios de gestão em parques lineares fora do Brasil, a exemplo do parque linear do Rio Torrens, na Austrália (Ibrahim et al., 2020). Esses autores apontaram como desafios: a) atendimento às funções das infraestruturas verdes, com formação de solo e ciclagem de nutrientes, provisão de alimentos e de água potável, controle de enchentes e melhoria da qualidade da água e recreação e ecoturismo; b) colaboração das diversas partes interessadas, como a comunidade, o poder público, o setor privado e as organizações não governamentais; e c) governança, pela falta de visão e prioridades compartilhadas, má coordenação entre as partes interessadas e mau gerenciamento de manutenção. Cabe salientar que esse parque linear foi implantado com o objetivo de resolver os problemas ambientais relacionados à má qualidade da água e inundações do rio. No Brasil percebe-se, portanto, que é comum a dificuldade de gestão desses espaços e que ocorre por uma série de fatores, como falta de apropriação pela comunidade, manutenções precárias, deficiência de equipes, falta de visão integrada entre instituições públicas, descontinuidade entre gestões de governo (NAGANO, 2018; SAKATA, 2018, ARAÚJO et al., 2023). A falta de integração entre as partes interessadas, como comentado por Ibrahim et al. (2020), também contribui para uma gestão ineficiente. 35 3.5 Aplicação da análise da paisagem em estudos ambientais A Convenção Europeia da Paisagem (ELC) define a paisagem como uma “área, como percebida pelas pessoas, cuja característica é o resultado da ação e da interação entre fatores naturais e/ou humanos” (COE, 2000). Segundo Jones (2007), a ELC reconhece a paisagem como importante elemento da qualidade de vida das pessoas em todas as áreas. Medeiros et al. (2020) comentam que há uma tendência à utilização do conceito de ecologia da paisagem em projetos de parques lineares. Metzger (2001) aborda este conceito como nova área de conhecimento em ecologia, caracterizada por duas perspectivas principais: a geográfica, que considera a influência do homem sobre o meio, a paisagem e o território; e a ecológica, que trata da importância das relações e conservações ecológicas e biológicas. Dessa forma, o autor propõe uma definição da paisagem como um “mosaico heterogêneo formado por unidades interativas, sendo esta heterogeneidade existente para pelo menos um fator, segundo um observador e numa determinada escala de observação” (METZGER, 2001). Nesse cenário, a paisagem é compreendida pelo olhar do homem em abordagem geográfica, e pelo olhar das espécies em abordagem biológica. Nesse viés, compreende-se a relação entre ecologia da paisagem e parques lineares na medida em que há o relacionamento do homem com as diversas espécies sobre o meio, quando se considera os parques lineares como espaços de uso público e de espaços verdes, fauna, flora e recursos naturais. Pela importância que a paisagem tem como elemento fundamental para o bem-estar do homem, foi adotada a análise da paisagem como metodologia para avaliação da eficiência do Parque da Maternidade. De acordo com Rodriguez (2022), a análise paisagística é o conjunto de métodos e procedimentos técnico-analíticos que explicam a estrutura da paisagem e estuda as suas propriedades. Vlami et al. (2019) apresentam o protocolo para avaliação da paisagem (LAP), o qual afere o seu estado de conservação por meio da identificação de métricas para avaliar os níveis de degradação. O método permitiu estabelecer 36 índices de qualidade da paisagem utilizando os princípios da ecologia e história da paisagem, e foi aplicado na ilha grega de Samothraki em julho de 2016. Em estudo posterior, Vlami et al. (2022) aplicaram o LAP em toda a Costa Rica, considerando 50 locais diferentes do país e utilizando os mesmos critérios para avaliação descritos por Vlami et al. (2019). O estudo apontou que a utilização desse protocolo nos trópicos da América Latina tem perspectivas positivas e inicialmente poderia ser aplicado como método de pesquisa nessa região. Burgui-Burgui et al. (2022) utilizam a técnica da análise da paisagem para investigar o impacto da expansão hoteleira em área costeira de Cuba na perspectiva da percepção de cerca de 700 estudantes universitários e um grupo de especialistas, de Espanha e Brasil. O método de avaliação se baseou em análise de fotografias e demonstrou a percepção negativa dos avaliadores, independente de aspectos como faixa etária, idade, formação universitária e gênero. Marques et al. (2021) descrevem uma metodologia semelhante para análise das paisagens, aplicada à avaliação da eficiência ambiental de ambientes de proteção de uma bacia hidrográfica na região sudeste do Brasil. Nesse estudo, os autores defendem a importância da combinação das técnicas de geoprocessamento e sensoriamento remoto com os trabalhos de campo. Tais abordagens metodológicas se complementam, tanto pelas percepções das paisagens observadas nas visitas in loco, como pelo geoprocessamento que permite uma visão mais abrangente da área estudada. Dessa forma, os autores identificaram elementos de destaque na paisagem de acordo com os meios físico, biótico e antrópico, estabelecendo um índice de eficiência da paisagem (IEP) relacionado à intensidade percebida dos impactos ambientais. Nesse trabalho foram selecionados diversos pontos da bacia hidrográfica em questão, nos quais foram avaliados o IEP para cada meio, permitindo-se estabelecer uma classificação especializada da eficiência da paisagem. Em uma perspectiva que considera o meio ambiente urbano, Biagolini (2018) propõe um modelo de avaliação quantitativo e qualitativo para dez parques lineares na cidade de São Paulo, no qual analisa diversos aspectos relacionados aos serviços públicos e às estruturas antrópicas de cada parque estudado, além de considerar a avifauna e a flora. Esse modelo considerou uma 37 escala de avaliação de 0 a 100 pontos, distribuídos entre os descritores propostos pelo autor, os quais foram avaliados individualmente e atribuídos pontos e pesos a cada um. Ao final, chegou-se à nota geral para o parque avaliado, permitindo sua classificação em ruim (0 a 25 pontos), regular (25,1 a 50 pontos), bom (50,1 a 75 pontos) e excelente (75,1 a 100 pontos). Apesar de ser um trabalho realizado na região sudeste do país, foi adotado como referência para o presente estudo, por se tratar de avaliação específica de parques lineares urbanos. Medeiros (2016), por sua vez, propõe um método para criação de parques lineares mediante uma análise de degradação da orla do Lago Paranoá considerando a paisagem. Nessa pesquisa o autor selecionou atributos da paisagem relacionados aos meios físico (solo), biótico (vegetação) e antrópico (acessibilidade). O autor avaliou os atributos de acordo com seu estado de conservação ou degradação, no caso de solo e vegetação, e pela presença ou ausência de barreiras físicas, no caso da acessibilidade, considerando uma escala de pontuação que permitiu a classificação desses atributos conforme a condição, de maneira espacializada. Os trabalhos de Vlami et al. (2009, 2022) e Marques et al. (2021) consideram a avaliação baseada na determinação de índice, o qual permite estimar a qualidade ambiental da área de estudo mediante a análise de um conjunto de métricas ou indicadores que compõem a análise, levando em consideração a realidade do local de estudo, em que são levantados os cenários de maior e menor vulnerabilidade ambiental, permitindo uma categorização de áreas mais e menos críticas e a traçar diretrizes e estratégias mais assertivas para recuperação e melhoria da qualidade ambiental e social. A utilização de índices e indicadores pode ser útil em avaliações ambientais, especialmente quando a análise leva em consideração aspectos visuais, olfativos e auditivos. Siche et al. (2007) abordam os conceitos de indicadores e índices, embora muitas vezes possam ser erroneamente considerados como sinônimos. Os autores definem o índice como um valor numérico que interpreta uma realidade por meio de cálculos, métodos e bases científicas, enquanto o indicador é uma métrica selecionada, isolada ou em conjunto com outras, que revelam as condições da realidade observada. Vilanova et al. (2015) comentam a relação entre índice e indicador, em que o 38 índice constitui uma informação pronta para comunicação, ao passo que os indicadores fornecem os dados brutos e complexos. A avaliação baseada em indicadores e índices podem, portanto, contribuir para validar informações perceptivas de forma quantitativa, como afirma Marques (2016). Além disso, Medeiros et al. (2021) defendem que a combinação de um amplo espectro de indicadores para avaliações da paisagem é cada vez mais necessária, pois permitem uma análise abrangente em vários campos e áreas temáticas. Nessa perspectiva, este trabalho propõe a avaliação do Parque da Maternidade por meio da análise da paisagem, adaptada ao contexto de parques lineares urbanos em ambiente amazônico. A seleção de indicadores, que são elementos relevantes presentes no parque em questão, compôs a avaliação e permitiu estimar um IEP, como base para a proposta de diretrizes de gestão. Esse estudo leva em consideração a função social do parque, pois abrange não apenas as questões ambientais, mas também as sociais e culturais, como lazer e acessibilidade da população. 39 4 MATERIAIS E MÉTODOS 4.1 Delimitação da área de estudo O trabalho foi realizado no município de Rio Branco, capital do Estado do Acre, em região conhecida como Amazônia Ocidental. O município de Rio Branco foi fundado em 28 de dezembro de 1882 e possui área territorial de 8.835 km2. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população é estimada em 364.756 pessoas, com densidade demográfica de 41,28 habitantes por km2 (IBGE, 2022). O clima da região é do tipo equatorial quente e úmido (ACRE, 2010), marcado por duas estações bem definidas: a seca, que perdura nos meses de maio a outubro, e a chuvosa, de novembro a abril, popularmente conhecidas na região como verão e inverno amazônico, respectivamente (ALVES, 2012). Um estudo sobre as características climáticas de Rio Branco realizado por Sousa (2020) entre os anos de 1990 e 2019 apontou a temperatura média anual no período de 25,6°C, sendo que nos meses de julho e agosto ocorreram as médias das temperaturas mínimas de 18,1°C e 18,8°C respectivamente, e que a média das temperaturas máximas ocorreu em setembro, com 33,6°C. De acordo com o autor, a precipitação média anual no período foi de 2.022 mm. Rio Branco conta com 56,7% de domicílios dotados de esgotamento sanitário adequado, 13,8% de domicílios urbanos em vias públicas com arborização e apenas 20,4% de domicílios urbanos servidos com infraestrutura urbana adequada (rede de esgoto e drenagem, calçada, pavimentação e meio fio) (IBGE, 2019). A Figura 1 mostra o mapa de zoneamento urbano de acordo com o plano diretor (RIO BRANCO, 2016) e a espacialização dos parques urbanos e lineares em Rio Branco. Nela se observa, ainda, os cursos d’água que permeiam a cidade, com densidade de drenagem no perímetro urbano de aproximadamente 0,85 km/km² calculada a partir de base extraída do Zoneamento Ecológico Econômico (ACRE, 2010). A cidade é dividida pelo rio Acre em duas porções denominadas primeiro e segundo distrito. Além disso, o rio Acre constitui um importante meio de transporte fluvial para municípios do Acre e do Amazonas. 40 Figura 1 – Espacialização de áreas verdes no município de Rio Branco, estado do Acre, Brasil. Fonte: Autoria própria, adaptado de Rio Branco (2016) A Tabela 1 mostra a distribuição de áreas verdes em Rio Branco e o percentual de área que ocupa em relação à zona em que está inserido: Tabela 1 – Distribuição de parques urbanos e lineares conforme o zoneamento urbano Zona Parque Área (ha) % da Zona Zona de Qualificação urbana (ZQU) Igarapé Fidêncio 4,04 0,12 Vale do Açaí 5,61 0,17 Subtotal parques ZQU 9,65 0,29 Zona Consolidada (ZC) Horto Florestal 17,86 0,53 Igarapé Fundo 14,29 0,43 Ipê 4,26 0,13 Maternidade 16,17 0,48 Parque Zoobotânico 100,00 2,98 São Francisco 1,24 0,04 Tucumã 34,10 1,02 Subtotal parques ZC 187,92 5,60 Zona em Consolidação (ZEC) Ipê 0,89 0,02 Maternidade 10,78 0,26 Palheiral 4,46 0,11 Subtotal parques ZEC 16,13 0,38 Zona de Vulnerabilidade Ambiental (ZVA) Capitão Ciríaco 5,07 0,12 Palheiral 3,41 0,08 Subtotal parques ZVA 8,48 0,21 Zona de Ordenamento Territorial (ZOT) Chico Mendes 57,35 1,06 Zona de Interesse Histórico (ZIHC) (nenhum) 0 0 Fonte: Autoria própria 41 Observa-se uma concentração expressiva de parques urbanos e lineares na Zona Consolidada (ZC), tanto em quantidade de parques quanto em área territorial. A ZC concentra cinco parques integralmente e dois parcialmente, o da Maternidade e o do Ipê, totalizando 187,92 hectares que representam 5,60% da área total dessa zona. De acordo com Araújo et al. (2023) a consolidação do Parque da Maternidade (Figura 2), objeto de estudo deste trabalho, proporcionou um acréscimo de 15% na área verde do município na época em que foi implantado, passando de 180 para 207 ha, tomando como base a área do perímetro urbano estabelecida pelo plano diretor vigente em 2024 (Lei municipal nº 2.222/2016). Atualmente, em 2024, o município conta com 279,53 ha de áreas verdes. Figura 2 – Parque da Maternidade, em Rio Branco, estado do Acre, Brasil. Fonte: Veras (2022) O Parque da Maternidade se configura como espaço que conecta o curso d’água às atividades de lazer, recreação, econômicas (Figura 3). Além disso, torna-se uma alternativa para mobilidade urbana com a construção de vias que margeiam o curso d’água em determinados trechos. 42 Figura 3 – Localização do Parque da Maternidade em Rio Branco, AC, Brasil. Fonte: Araújo et al. (2023) Segundo informações obtidas junto à SEOP, as obras se iniciaram em 1999 e foram concluídas e entregues pelo governo em 2002. Apesar de as informações coletadas junto ao órgão apontarem que possui extensão aproximada de 6 km, uma verificação do comprimento de todo o parque através do software QGIS apontou a extensão total de 4,54 km. Uma verificação da área total resultou em cerca de 27 ha, baseado na delimitação do projeto urbanístico fornecido pelo órgão. 4.2 Etapas de desenvolvimento do trabalho Após a delimitação da área de estudo, o Parque da Maternidade, os trabalhos foram estruturados em três etapas: pesquisa, análise e proposta (Figura 4). 43 Figura 4 – Fluxograma das etapas dos trabalhos Fonte: Autoria própria A primeira etapa, de pesquisa, foi destinada à busca na literatura pelo histórico e conceitos de parques urbanos e lineares, seu surgimento e evolução ao longo do tempo. Além disso, pretendeu-se compreender o contexto e as características de um parque linear urbano em ambiente amazônico, tomando- se como estudo de caso o Parque da Maternidade. Ainda nesta etapa, coletaram-se dados em órgãos da administração pública estadual e municipal referentes ao Parque da Maternidade, bem como consultas às legislações municipal e estadual. Isto possibilitou a criação de indicadores a serem avaliados no parque. A segunda etapa correspondeu ao levantamento de informações em campo com visitas ao local e mapeamentos aéreos com drone. Nesta fase procedeu-se à análise das informações coletadas e ajustes dos indicadores 44 elencados na etapa anterior. O parque foi dividido em polígonos que foram avaliados individualmente, sendo observados os elementos presentes e atribuídas notas a cada um deles. Isto permitiu estabelecer os índices de eficiência da paisagem por área avaliada, divididos de acordo com o meio e do parque como um todo. Essa avaliação revelou o diagnóstico do parque, possibilitando a criação de classes de valores de acordo com a variação dos índices e norteando diretrizes para elevar essas pontuações. Por fim, a terceira etapa referiu-se à elaboração da proposta, com a criação de diretrizes para elevar os índices de eficiência da paisagem obtidos no Parque da Maternidade. Essas diretrizes apoiarão um plano de gestão do parque, que poderá ser aplicado em outros parques lineares urbanos amazônicos. 4.3 Mapeamento aéreo com drone Os mapeamentos aéreos realizados nesta pesquisa compreenderam toda a extensão do Parque da Maternidade, utilizando veículo aéreo não tripulado (drone) marca DJI Phantom 4 Pro, equipado com sensor CMOS RGB (vermelho, verde, azul) com resolução de 20 megapixels, lente de autofoco de 24 milímetros e obturador manual com autonomia de até 30 minutos, realizado em altitude de 120 metros acima do parque com velocidade de cruzeiro de 10 m/s. Foram feitos dois mapeamentos em períodos distintos: o primeiro em setembro de 2022, mês em que houve precipitação de 61 mm (UNIVERSIDADE FEDERAL DO ACRE, 2022), temperatura média de 26,7°C que oscilou entre mínima de 18,7°C e máxima de 37,1°C e umidade relativa do ar média de 70% (INMET, 2022). O segundo mapeamento foi realizado em fevereiro de 2023, quando a precipitação atingiu 282 mm, temperatura média de 24,4°C oscilando entre mínima de 18,1°C e máxima de 33,2°C e umidade relativa do ar média de 90%, (INMET, 2023). Isto possibilitou observar o comportamento do parque nesses dois períodos – seco e úmido – a fim de avaliar a influência do clima na qualidade ambiental do espaço. Os mapeamentos geraram uma série de imagens que foram unificadas, gerando um mosaico de toda a extensão do parque, permitindo uma análise mais 45 precisa e atualizada e possibilitando observar as condições dos meios físico, biótico e antrópico. 4.4 Visitas ao local Foram feitas visitas a campo em toda a extensão do parque com o objetivo de identificar os elementos de destaque que compõem a paisagem, incluindo ambientes e estruturas antrópicas, avifauna e vegetação, bem como as condições em que esses elementos se encontram, sendo feitos registros com anotações e fotografias para posterior análise dos problemas e potencialidades do parque. Assim como o mapeamento com drone, foram feitos levantamentos de campo nos períodos seco (setembro de 2023) e chuvoso (fevereiro de 2024), com o intuito de observar se haveria influência do clima sobre os indicadores. As visitas a campo ocorreram em todas as etapas de desenvolvimento do trabalho, desde as pesquisas iniciais, a fim de compreender a dinâmica do parque e de realizar o reconhecimento de campo de pesquisa, até as fases finais de coleta e análise dos dados, quando se analisou os indicadores. 4.5 Metodologia Neste trabalho é proposto um plano de avaliação para um parque linear amazônico baseado nas metodologias de análise da paisagem descritas por Marques et al. (2021) e Vlami et al. (2019, 2022). Entretanto, esses autores aplicam o método para estudo de bacias hidrográficas e ambientes de proteção, o que demonstra a necessidade de adaptação para o presente estudo, que se concentra em uma área urbanizada e, portanto, correspondendo a um ambiente engenheirado. Nesse viés, fez-se a adequação do método proposto por Marques et al. (2021) para avaliação de parque linear urbano, combinando com o modelo apresentado por Biagolini (2018) como elemento norteador do presente estudo para a região amazônica, propondo descritores compatíveis com as estruturas, serviços e espaços esperados para um parque linear amazônico. 46 Essa adaptação foi feita da seguinte forma: a metodologia utilizada para avaliação do Parque da Maternidade foi a descrita por Marques et al. (2021), elencando os indicadores e suas notas de acordo com os dados coletados e, posteriormente, apresentando o cálculo do índice de eficiência da paisagem considerando os meios físico, biótico e antrópico, além do índice geral. Entretanto, a escolha dos indicadores foi adaptada de acordo com a metodologia proposta por Biagolini (2018), que considera diversos elementos que compõem um parque linear, considerando a realidade amazônica. Dessa forma, foram estabelecidos indicadores para análise divididos entre os meios físico (solo, ar, água, ruído, olfato), biótico (vegetação e avifauna) e antrópico (espaços destinados a uso público e dos usuários do parque). Por seu caráter predominantemente antrópico, com perda significativa de seus aspectos naturais pela descaracterização da APP, e por ter sido convertido em espaço usufruído pela população, os indicadores estabelecidos para análise são, em sua maioria, elementos relacionados ao meio antrópico. Todavia, apesar de se tratar de uma antropização de APP, ressalta-se a importância da manutenção dos meios físico e biótico, que contribuem para elevar a qualidade ambiental do parque. Nesse contexto, foram considerados elementos relacionados aos meios físico e biótico, quais sejam a água, terra, ar, clima, fauna e flora, por serem partes intrínsecas e indissociáveis da existência do homem, bem como pela manutenção de suas relações com a natureza. A avaliação dos indicadores foi baseada em aspectos visuais, olfativos e auditivos levantados em campo, relativos à observação das condições físicas dos elementos destacados na paisagem, odores que poderiam sugerir poluição hídrica ou do ar, e à presença de aves observadas visualmente ou pelos sons percebidos em campo. 4.6 Coleta de dados O ponto de partida para coleta de dados foi a definição de todos os limites do parque. Para esta delimitação, foi considerado como referência principal o projeto urbanístico do parque em meio digital obtido junto à SEOP, em formato 47 DWG (arquivo de software AutoCAD, sendo utilizada a versão educacional gratuita, ano 2024). Foi utilizado o software QGIS para desenhar o polígono do parque conforme o projeto urbanístico original com o auxílio das imagens obtidas pelos dois mapeamentos aéreos feitos com drone em setembro de 2022 e fevereiro de 2023. No processo de delimitação observou-se que alguns limites estabelecidos pelo projeto urbanístico, elaborado em 1999, não foram realizados e/ou foram modificados ao longo dos anos. Nos locais que apresentaram inconsistências, foram feitas verificações com a ferramenta SITGeo - Sistema de Inteligência Territorial Urbana, disponibilizada pela Prefeitura Municipal de Rio Branco (PMRB), além do recurso Google Street View, no qual é possível verificar imagens 360° de 2022 e de 2012. Dessa forma foi possível fazer todas as adequações da delimitação do Parque da Maternidade, permitindo-se realizar cálculos de sua área e extensão, bem como sua localização exata no tecido urbano. Além disso, a área de estudo foi dividida em polígonos (Figura 5) para permitir a avaliação do índice de eficiência da paisagem. A divisão do parque em polígonos foi feita a cada 100 (cem) metros de extensão do igarapé, resultando em 46 polígonos. Figura 5 – Delimitação e divisão do Parque da Maternidade em polígonos. Fonte: Autoria própria Em cada polígono foram avaliados os indicadores estabelecidos para os meios físico, biótico e antrópico. Na metodologia descrita por Marques et al. 48 (2021), foram atribuídas as notas 1, 2, 3, 4 ou 5 para cada indicador avaliado, sendo a nota mais baixa relacionada às situações mais negativas e a nota mais alta, àquelas mais positivas. Entretanto, no presente trabalho, foram consideradas apenas as notas 1, 3 e 5 como forma de simplificar a classificação e evitar equívocos. Assim, a nota 1 refletiu os indicadores relacionados à percepção de impactos ambientais negativos, degradação e vulnerabilidade ambiental, estruturas antrópicas desativadas, ausentes ou em mau estado de conservação; a nota 3 correspondeu aos indicadores em condições satisfatórias; e a nota 5 foi atribuída às melhores condições e qualidade dos indicadores. Essa avaliação permitiu o cálculo do índice de eficiência da paisagem para cada polígono avaliado, utilizando a Equação 1, proposta por Marques et al. (2021). Equação 1 – Cálculo do Índice de Eficiência da Paisagem por dimensão avaliada 1 1 100 n i i n i i x IEP y = = = × ∑ ∑ onde IEP corresponde ao índice de eficiência da paisagem; n, a quantidade de indicadores; xi, a nota obtida na avaliação (adimensional); e yi, a nota máxima na escala de avaliação (adimensional). A Equação 1 foi utilizada para cálculo do IEP para cada dimensão (física, biótica e antrópica), na qual o índice obtido é expresso em percentual, podendo variar de 0 a 100%. Para cálculo do IEP geral é utilizada a Equação 2, que consiste na média dos IEP das três dimensões avaliadas: Equação 2 – Cálculo do Índice de Eficiência da Paisagem Geral 3 f b a g IEP IEP IEP IEP + + = onde IEPg corresponde ao IEP geral; IEPf, ao IEP do meio físico; IEPb, ao IEP do meio biótico; e IEPa, ao IEP do meio antrópico. 49 Os dados levantados em campo foram comparados com as imagens obtidas pelos voos de drone em setembro de 2022 e fevereiro de 2023 no que tange à presença de resíduos e de processos erosivos, densidade vegetal, cobertura da terra e estruturas antrópicas. 4.6.1 Meio Físico O meio físico contempla as características relacionadas ao solo, água e clima e suas interações, como fatores determinantes da qualidade ambiental da paisagem (Marques et al., 2021). Nesse caso, foi estabelecida a relação dos indicadores e a descrição dos critérios para selecionar a nota baseada em diferencial semântico conforme a Tabela 2: Tabela 2 – Relação de indicadores do meio físico e critérios para avaliação Processos erosivos Evidência de sulcos, ravinas e desgastes severos às margens do curso d’água Erosão laminar, desgastes leves a moderados Sem evidência de processos erosivos 1 3 5 Condição de escoamento da água Deposição ou acúmulo severo de sedimentos e de resíduos no leito do curso d’água, dificultando o escoamento Deposição ou acúmulo leve a moderado de sedimentos e de resíduos no leito do curso d’água Sem evidência de deposição ou acúmulo de sedimentos e de resíduos 1 3 5 Resíduos sólidos Presença de resíduos sólidos no polígono avaliado em mais de cinco pontos Presença esparsa de resíduos, em menos de cinco pontos Ausência de resíduo sólido 1 3 5 Poluição hídrica Evidência de poluição por atividades antrópicas, como presença de esgoto; aparência turva da água Presença de resíduos provenientes da vegetação (folhas e frutos) Sem evidência de qualquer tipo de resíduo na água 1 3 5 Poluição do ar Presença de odores desagradáveis característicos de esgoto Presença de odores ligeiramente desagradáveis Ausência de odores desagradáveis 1 3 5 Fonte: Autoria própria, adaptado de Vlami et al. (2019) 50 4.6.2 Meio Biótico Na análise do meio biótico consideram-se os elementos que envolvem a flora e a fauna do Parque da Maternidade. Quanto à flora, foram avaliadas as condições que dizem respeito à arborização, cobertura, densidade e diversidade da vegetação presente. Em relação à fauna, foi avaliada a presença de animais desejáveis, como as aves, e a presença de animais indesejáveis, como cães e gatos abandonados, animais peçonhentos (insetos, escorpiões, serpentes) e vetores (ratos, morcegos e outros transmissores de doenças). A Tabela 3 apresenta os indicadores do meio biótico e critérios de avaliação no parque: Tabela 3 – Relação de indicadores do meio biótico e critérios para avaliação Diversidade vegetal Baixa variação de espécies vegetais Média variação de espécies vegetais Grande variação de espécies vegetais 1 3 5 Densidade vegetal Baixa quantidade e composição das espécies vegetais, área de cobertura de copas das árvores até 20% da área do polígono avaliado Média quantidade e composição das espécies vegetais, área de cobertura de copas das árvores entre 20 e 40% da área do polígono Alta quantidade e composição das espécies vegetais, área de cobertura de copas das árvores acima de 40% da área do polígono avaliado 1 3 5 Cobertura da terra Áreas extensas de solo exposto, taludes com malha aparente, manutenção precária dos jardins Presença de poucas áreas de solo exposto, média manutenção das áreas de gramado Área do solo totalmente coberta por vegetação e com manutenção das áreas de gramado 1 3 5 Fauna Ausência de fauna desejável e presença de fauna indesejável Presença de fauna desejável e indesejável Presença de fauna desejável 1 3 5 Fonte: Autoria própria, adaptado de Vlami et al. (2019) 4.6.3 Meio Antrópico O meio antrópico é constituído pelas relações entre o homem e o meio, bem como os seus impactos ambientais, sejam eles positivos ou negativos (Marques et al., 2021). Nesse aspecto foram avaliadas a presença e a qualidade de espaços e estruturas não naturais, implantadas para promover usos recreativos e mobilidade da população no parque. A Tabela 4 mostra os indicadores elencados para o meio antrópico e seus critérios para avaliação: 51 Tabela 4 – Relação de indicadores do meio antrópico e critérios para avaliação Saneamento básico Ausência de rede de saneamento; rede de saneamento existente deteriorada, poços de visita sem vedação ou com entupimento por resíduos sólidos, evidência de lançamento de esgoto não tratado no igarapé Rede de saneamento em condições satisfatórias, com necessidade de poucos reparos; ausência de evidência de esgoto não tratado no igarapé Rede de saneamento em boa condição de conservação; ausência de evidência de esgoto não tratado no igarapé 1 3 5 Iluminação pública Pouca ou nenhuma iluminação no período noturno, evidência de furtos de fios de luminárias Iluminação satisfatória no período noturno, com poucos pontos sem iluminação Boa iluminação no período noturno 1 3 5 Segurança pública Percepção de baixa segurança em função da iluminação pública deficiente, ausência de policiamento, ausência de pessoas, presença de moradores de rua, presença de pichações alusivas a facções criminosas Percepção de média segurança em função da iluminação pública em condições satisfatórias e presença de pessoas no parque Percepção de alta segurança em função da boa iluminação pública, presença de rondas policiais e/ou delegacias 1 3 5 Calçadas Calçadas e passeios deteriorados, quebrados e/ou com buracos; presença de obstáculos; ausência de rampas e pisos táteis ou presença desses itens em estado precário Calçadas e passeios satisfatórios; presença de rampas e/ou pisos táteis em estado precário a satisfatório Calçadas e passeios em bom estado de conservação e com rampas e pisos táteis; atendimento à norma técnica de acessibilidade (ABNT NBR 9050:2020) 1 3 5 Ciclovias Ciclovias e ciclofaixas deterioradas, com desgastes no asfalto, trincas longitudinais e/ou buracos; ausência de sinalização Ciclovias e ciclofaixas em estado satisfatório, com poucos desgastes e/ou trincas longitudinais, sinalização satisfatória Ciclovias e ciclofaixas em bom estado de conservação, sem trincas, com boa sinalização 1 3 5 Sinalização viária Sinalização horizontal e vertical ausentes ou deterioradas em vias, ciclovias e ciclofaixas Sinalização horizontal e vertical satisfatória em vias, ciclovias e ciclofaixas Sinalização horizontal e vertical em bom estado de conservação em vias, ciclovias e ciclofaixas 1 3 5 Banheiros públicos Ausência de banheiros públicos Acesso a banheiros públicos através de outras edificações Presença de edificação destinada a banheiros públicos 1 3 5 Lixeiras 52 Ausência de lixeiras ou quantidade de lixeiras insuficiente Presença satisfatória de lixeiras; lixeiras em estado satisfatório Boa quantidade de lixeiras; lixeiras em bom estado de conservação 1 3 5 Pontos de água Ausência de bebedouros; fontes e espelhos d’água deteriorados e sem manutenção Bebedouros estado de conservação satisfatório; fontes e espelhos d’água satisfatórios Bebedouros em bom estado de conservação; fontes e espelhos d’água em bom estado de conservação 1 3 5 Quiosques e restaurantes Quiosques, lanchonetes ou restaurantes demolidos ou desativados Quiosques, lanchonetes ou restaurantes em funcionamento, em estado satisfatório Quiosques, lanchonetes ou restaurantes em funcionamento, em bom estado de conservação 1 3 5 Estruturas físicas destinadas a educação e cultura Anfiteatros, casas de artesanato, área para cultos e bibliotecas em mau estado de conservação ou desativados Anfiteatros, casas de artesanato, área para cultos e bibliotecas em estado satisfatório Anfiteatros, casas de artesanato, área para cultos e bibliotecas em bom estado de conservação 1 3 5 Estruturas físicas destinadas a esportes e recreação Quadras de esportes, playgrounds, academias ao ar livre e pistas de skate deteriorados Quadras de esportes, playgrounds, academias ao ar livre e pistas de skate em estado satisfatório Quadras de esportes, playgrounds, academias ao ar livre e pistas de skate em bom estado de conservação 1 3 5 Estruturas físicas destinadas a sombreamento Sombreadores e pergolados deteriorados ou demolidos Sombreadores e pergolados em estado satisfatório Sombreadores e pergolados em bom estado de conservação 1 3 5 Mobiliário urbano Bancos, tótens, placas informativas, bicicletários e guarda-corpos deteriorados, com peças faltantes e/ou pichados Bancos, tótens, placas informativas, bicicletários e guarda-corpos em estado satisfatório Bancos, tótens e placas informativas, bicicletários e guarda-corpos em bom estado de conservação 1 3 5 Pontes sobre o igarapé Pontes em estado de deterioração, com ausência de peças ou peças soltas; presença de pichação Pontes em estado de satisfatório Pontes em bom estado de conservação 1 3 5 Pórticos Pórtico com sinais de deterioração, como desgastes na pintura e reboco, armaduras aparentes; presença de pichação Pórtico em estado satisfatório com pintura