UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE ENGENHARIA DE ILHA SOLTEIRA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA MECÂNICA ÁREA DE CONHECIMENTO: CIÊNCIAS TÉRMICAS ANÁLISE TERMODINÂMICA E TERMOECONÔMICA DO APROVEITAMENTO DO GÁS NATURAL EM SISTEMAS DE COGERAÇÃO DE ENERGIA DE USINAS DE AÇÚCAR E ÁLCOOL David José Saran Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia Mecânica da Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira, para obtenção do título de Mestre em Engenharia Mecânica. Orientador: Prof. Dr. Ricardo Alan Verdú Ramos Ilha Solteira (SP), 29 de Janeiro de 2010. FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Seção Técnica de Aquisição e Tratamento da Informação Serviço Técnico de Biblioteca e Documentação da UNESP – Ilha Solteira. Saran, David José. S243a Análise termodinâmica e termoeconômica do aproveitamento do gás natural em sistemas de cogeração de energia de usinas de açúcar e álcool / David José Saran. -- Ilha Solteira : [s.n.], 2010. 121 f. : il. color. Dissertação (mestrado) – Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira. Área de conhecimento: Ciências Térmicas, 2010. Orientador: Ricardo Alan Verdú Ramos 1. Usinas de açúcar. 2. Cogeração de energia elétrica e calor. 3. Bagaço de cana. 4. Gás natural. DEDICATÓRIA Dedico esse trabalho aos meus pais, José Mario Saran e Maria de Fátima Milan Saran e aos meus irmãos Daniel Fernando Saran e Maria Natália Saran. Dedico também a minha noiva Marina Claudia Brustello, que se fez presente em toda a trajetória até a conclusão desse trabalho. AGRADECIMENTOS À Deus. Aos meus pais José Mario e Fátima pelo amor, apoio e companheirismo que demonstraram durante a realização desse trabalho. À Marina Claudia Brustello, pela capacidade de resistir à distância e manter o seu carinho e dedicação comigo. Aos amigos de pós-graduação Danilo Yura, Glauber Rocha, Antonio Tavares de França Junior, que compartilharam as alegrias e as dificuldades encontradas durante a realização desse trabalho e, em especial, ao amigo Rodnei Passolongo que contribuiu bastante para a conclusão do mesmo. Aos inesquecíveis amigos de república a quem me acostumei chamar por apelido, Alexandre (Travesseiro), Bruno (Tchê), Bruno Estevez (Ronco), Luis Eduardo (Dia), Lucas (Sabugo), Renan (Renan), Izaque (Pet), Sérgio (Cabresto), Elton (Mimão), Rodrigo (Parafuso) e Danilo (Coxinha), pelo companheirismo e proximidade. Aos amigos do PET (Programa de Educação Tutorial), em especial ao Maurício Jardim e ao Thiago Antonini, e ao Tutor Prof. Dr. Emanuel Rocha Woiski. Minha gratidão também para amigos queridos como Rodrigo Borges, Regina, Bel, Aline e Lilian. À CAPES (Coordenadoria de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), pelo suporte financeiro durante parte do desenvolvimento deste trabalho. Ao meu orientador Prof. Dr. Ricardo Alan Verdú Ramos e ao Prof. Dr. Cassio Roberto Macedo Maia pelo apoio durante o desenvolvimento deste trabalho. Aos funcionários do Departamento de Engenharia Mecânica pela ajuda e amizade. RESUMO Neste trabalho são realizados estudos termodinâmicos e termoeconômicos visando o aproveitamento do gás natural como combustível em usinas de açúcar e álcool. Para tanto são considerados quatro casos, sendo o primeiro uma planta de uma usina sucroalcooleira real que utiliza equipamentos modernos e eficientes, e que comercializa o excedente de eletricidade na safra. O segundo é um caso hipotético no qual é incorporada à planta real da usina uma turbina a gás e uma caldeira de recuperação, passando a planta a operar em ciclo combinado na entressafra utilizando como combustível o gás natural, com o intuito de possibilitar a comercialização de eletricidade ao longo de todo o ano. O terceiro caso considera a proposta de uma planta com grande capacidade de moagem (duas vezes mais do que a da usina real considerada no primeiro caso), que opere de forma convencional com geração de excedente de eletricidade para comercialização apenas na safra, com o diferencial de ser constituída por duas linhas independentes de produção, consumo de vapor e geração de eletricidade, flexibilizando a produção e manutenção. Finalmente, o quarto caso considera o aproveitamento do gás natural como combustível associado ao bagaço da cana, através da incorporação de uma turbina a gás e uma caldeira de recuperação na planta do terceiro caso, permitindo também a comercialização de eletricidade na entressafra. Diante dos resultados obtidos, foi constatado que só existe a viabilidade para o uso do gás natural no quarto caso, e mesmo assim em condições especiais nas quais se considera custos do bagaço e do gás natural abaixo dos praticados no mercado, bem como uma remuneração para a venda de eletricidade excedente acima do preço atual de mercado. Palavras-Chave: Usina Sucroalcooleira. Cogeração. Bagaço. Gás Natural. ABSTRACT In this work thermodynamic and thermoeconomic analyses for the use of natural gas as fuel in sugar-alcohol factories will be accomplished. In order to make these analyses, four cases are considered, being the first case constituted by a real sugar-alcohol factory that uses modern and efficient equipments, and sells surplus of electricity during the harvest. The second case is a hypothetical case that incorporates to the real plant of the previous case a gas turbine and a heat recovery steam generator, making possible the operation with natural gas in combined cycle at the time between harvests, with the intention of making possible the commercialization of electricity along the entire year. The third case considers the proposal of a plant with great milling capacity (twice more than of the real plant considered previously), operating in a conventional way with generation of electricity surplus for commercialization in the harvest, with the differential of being constituted by two independent lines of production and steam consumption and generation of electricity, becoming more flexible the production and maintenance. Finally, the fourth case considers the use of the natural gas as fuel associated to the sugar cane bagasse, through the incorporation of a gas turbine and a heat recovery steam generator in the plant of the previous case, also allowing the electricity commercialization at the time between harvests. In agreement with the obtained results, it was verified that there is viability for the natural gas use only in the fourth case, even though in special conditions in which the costs of the sugar cane bagasse and natural gas are considered below of the current price of the market, as well as the remuneration for the sale of electricity surplus is considered above of the current price of market. Keywords: Sugar Cane Factory. Cogeneration. Bagasse. Natural Gas. LISTA DE FIGURAS Figura 1.1: Processo seqüencial de geração de eletricidade e consumo de energia térmica útil.. ................................................................................................................... 17 Figura 1.2: Sistema de cogeração com turbinas a vapor de contrapressão. ......................... 19 Figura 1.3: Sistema de cogeração com turbina a vapor de extração-condensação. ............. 20 Figura 1.4: Sistema de cogeração com ciclo combinado de gás e vapor. ............................ 22 Figura 1.5: Estimativa da produção de cana e de bioeletricidade no Brasil. ....................... 25 Figura 1.6: Constituição das matrizes energética e elétrica brasileira. ................................ 26 Figura 1.7: Oferta e demanda de eletricidade no Brasil. ...................................................... 27 Figura 1.8: Acréscimo da geração de energia no Brasil até 2015. ....................................... 28 Figura 3.1: Sistema aberto em contato com a atmosfera e n reservatórios térmicos. .......... 48 Figura 4.1: Representação esquemática do Caso 1. ............................................................. 66 Figura 4.2: Representação esquemática do Caso 2. ............................................................. 69 Figura 4.3: Representação esquemática do Caso 3. ............................................................. 71 Figura 4.4: Representação esquemática do Caso 4. ............................................................. 74 Figura 5.1: Custo de geração de eletricidade em função do percentual de gás na caldeira. 85 Figura 5.2: Custo médio de eletricidade em função do custo do gás natural e do bagaço. . 88 Figura A.1: Gasodutos no Brasil......................................................................................... 102 Figura C.1: Representação esquemática da estrutura do IPSEpro. ..................................... 109 Figura C.2: Equipamentos da biblioteca APP. ................................................................... 110 Figura C.3: Interface da biblioteca Advanced Power Plant. .............................................. 111 Figura C.4: Modelos de turbinas existentes na biblioteca Gas Turbine. ............................ 112 Figura C.5: Interface da biblioteca Gas Turbine. ............................................................... 112 Figura C.6: Interface do Módulo PSE. ............................................................................... 114 Figura C.7: Interface do Módulo MDK. ............................................................................. 115 Figura C.8: Interface do MS-Excel com a barra de ferramentas do PSExcel. ................... 116 Figura C.9: Interface gráfica do PSEconomy. .................................................................... 117 LISTA DE TABELAS Tabela 1.1: Potencial de geração de bioeletricidade no Brasil até 2013. ............................. 24 Tabela 4.1: Dados de moagem, produção e consumo de bagaço para o Caso 1. ................. 67 Tabela 4.2: Parâmetros característicos de operação da planta do Caso 1. ........................... 68 Tabela 4.3: Parâmetros característicos de operação da planta do Caso 2. ........................... 70 Tabela 4.4: Dados de moagem, produção e consumo de bagaço para o Caso 3. ................. 72 Tabela 4.5: Parâmetros característicos de operação da planta do Caso 3. ........................... 73 Tabela 4.6: Parâmetros característicos de operação da planta do Caso 4. ........................... 75 Tabela 5.1: Custo estimado dos equipamentos. ................................................................... 77 Tabela 5.2: Custo anual dos equipamentos, com amortização. ............................................ 77 Tabela 5.3: Taxas de custos dos equipamentos em cada uma das configurações estudadas.......................................................................................................... . 78 Tabela 5.4: Eficiências, potências e/ou o calor gerado e/ou consumido, irreversibilidade e porcentagem de irreversibilidade nos principais equipamentos da planta do Caso 1. ............................................................................................................... 79 Tabela 5.5: Eficiências, potências e/ou o calor gerado e/ou consumido, irreversibilidade e porcentagem de irreversibilidade nos principais equipamentos da planta do Caso 2. ............................................................................................................... 79 Tabela 5.6: Eficiências, potências e/ou o calor gerado e/ou consumido, irreversibilidade e porcentagem de irreversibilidade nos principais equipamentos da planta do Caso 3. ........................................................................................................... 7980 Tabela 5.7: Eficiências, potências e/ou o calor gerado e/ou consumido, irreversibilidade e porcentagem de irreversibilidade nos principais equipamentos da planta do Caso 4. ............................................................................................................... 80 Tabela 5.8: Índices de desempenho das plantas de cada um dos casos estudados. .............. 82 Tabela 5.9: Parâmetros importantes das plantas de cada um dos casos estudados. ............. 82 Tabela 5.10: Resultados termoeconômicos para cada um dos casos estudados. ................. 84 Tabela 5.11: Custo de geração de eletricidade em função do percentual de gás na caldeira. ............................................................................................................. 85 Tabela 5.12: Resultados globais para as configurações estudadas. ........................................ 87 Tabela A.1: Propriedades médias do gás natural boliviano. ............................................... 103 Tabela A.2: Composição média em volume do gás natural boliviano. ............................... 104 Tabela A.3: Custo do gás natural para o segmento de cogeração de energia. .................... 105 Tabela B.1: Características do bagaço de cana. .................................................................. 107 Tabela B.2: Exergia química dos principais componentes do gás natural no estado puro. 108 Tabela D.1: Balanço dos custos exergoeconômicos para o Caso 1. ................................... 118 Tabela D.2: Balanço dos custos exergoeconômicos para o Caso 2. ................................... 119 Tabela D.3: Balanço dos custos exergoeconômicos para o Caso 3. ................................... 120 Tabela D.4: Balanço dos custos exergoeconômicos para o Caso 4. ................................... 121 LISTA DE SÍMBOLOS Símbolos latinos b Exergia específica (kJ/kg) B� Fluxo de exergia (kW/kg) c Custo monetário por unidade de exergia (R$/kJ) C� Custo médio do fluxo por unidade de tempo em um componente (R$/s) fa Fator de amortização fomf: Percentual de custo anual fixo associada à operação e manutenção fomv Percentual de custo anual variável de operação e manutenção teorf Relação combustível-ar teórica realf Relação combustível-ar real FC Fator de carga g Aceleração gravitacional (m/s2) h Entalpia específica (kJ/kg) i Taxa anual de juros I� Taxa de irreversibilidades do processo (kW) m� Fluxo de massa (kg/s) n Período de tempo (anos) P Pressão (kPa) Q� Fluxo de calor (kW) bagvaporR Relação entre a quantidade de bagaço e o vapor produzido vapcanaR Relação entre a quantidade de vapor produzido e a quantidade de cana moída potelecanaR Relação da energia elétrica gerada em kWh por tonelada de cana moída vapcanaR Relação entre a quantidade de vapor produzido e a quantidade de cana moída vappoteleR Relação entre a potência elétrica e a quantidade de cana moída s Entropia específica (kJ/kgK) gerS� Fluxo de geração de entropia (kW/kgK) toper Tempo efetivo de operação do equipamento (h) T Temperatura (K) V Velocidade do fluxo de massa (m/s) W� Fluxo de trabalho (kW) z Cota (m) Z Custo de investimento de capital no equipamento (R$) aZ Custo anual do equipamento com amortização (R$/ano) �Z Custo médio total do equipamento por unidade de tempo (R$/s) Símbolos gregos �i Potencial químico do elemento � Porcentagem de irreversibilidade de um equipamento na planta � Eficiência ou rendimento baseado na primeira lei da termodinâmica � Eficiência ou rendimento baseado na segunda lei da termodinâmica Subscritos/Sobrescritos 0 Estado de referência bag Bagaço cald Caldeira cald_ref Caldeira de referência Cond Condensador Cont Contrapressão comb Combustível Desaer Desaerador Desup Dessuperaquecedor e Entrada ele Elétrico Ext Extração fis Física ger Geração GN Gás Natural mec Mecânico med Médio OM Operação e manutenção Proc Processo Q Referente a calor qui Química Rec Recuperação rev Reversível s Saída t Total term_ref Planta de potência de referência TG Turbina a Gás tur Turbina U Útil vap Vapor VC Volume de controle W Referente a trabalho Abreviaturas ANEEL Agência Nacional de Energia Elétrica ANP Agência Nacional do Petróleo BIG-GT Biomass Integrated Gasification Gas Turbine BIG-CC Biomass Integrated Gasification Gas Turbine Combined Cycle CCEE Câmara Central de Energia Elétrica CENBIO Centro Nacional de Referência em Biomassa CESP Companhia Energética de São Paulo CGCE Câmara de Gestão da Crise Energética CNP Conselho Nacional de Petróleo CNPE Conselho Nacional de Pesquisa Energética CONAB Companhia Nacional de Abastecimento CPFL Companhia Paulista de Força e Luz DNC Departamento Nacional de Combustíveis EEC Energia Economizada com a Cogeração EPE Empresa de Pesquisa Energética FUE Fator de Utilização de Energia GOELRO Plano Governamental de Eletrificação Russa IGP Índice de Geração de Potência IPE Índice de Poupança de Energia MAE Mercado Atacadista de Energia MDK Model Development Kit MME Ministério de Minas e Energia NOS Operador Nacional do Sistema Elétrico NUPLEN Núcleo de Planejamento Energético, Geração e Cogeração de Energia PCH Pequena Central Hidrelétrica PCI Poder Calorífico Inferior PIB Produto Interno Bruto PPT Programa Prioritário de Termeletricidade PROINFA Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica PSE Process Simulation Environment PURPA Public Utilities Regulatory Policy Act RPC Razão Potência/Calor SIN Sistema Interligado Nacional SNE Secretaria Nacional de Energia TEP Toneladas Equivalentes de Petróleo SUMÁRIO PREÂMBULO.........................................................................................................................15 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 15 1.1 ASPECTOS GERAIS DA COGERAÇÃO DE ENERGIA ............................................ 16 1.2 A COGERAÇÃO NO SETOR ELÉTRICO BRASILEIRO ........................................... 18 1.3 CARACTERIZAÇÃO DOS SISTEMAS DE COGERAÇÃO NO SETOR SUCROALCOOLEIRO .................................................................................................. 19 1.4 DESENVOLVIMENTO DA COGERAÇÃO NO SETOR SUCROALCOOLEIRO .... 22 1.5 POTENCIAL DE COGERAÇÃO NO SETOR SUCROALCOOLEIRO ...................... 24 1.6 MATRIZ ENERGÉTICA E ELÉTRICA, OFERTA E DEMANDA DE ELETRICIDADE NO BRASIL ...................................................................................... 25 1.7 MOTIVAÇÃO E RELEVÂNCIA DO TRABALHO ..................................................... 28 2 REVISÃO DA LITERATURA E OBJETIVO DO TRABALHO ............................ 30 2.1 RETROSPECTO DE ESTUDOS SOBRE COGERAÇÃO EM USINAS SUCROALCOOLEIRAS ................................................................................................ 30 2.2 OBJETIVO DO TRABALHO ........................................................................................ 41 3 FUNDAMENTOS TERMODINÂMICOS E TERMOECONÔMICOS .................. 43 3.1 FUNDAMENTOS TERMODINÂMICOS ..................................................................... 43 3.1.1 Introdução à Análise Energética ................................................................................... 43 3.1.2 Introdução à Análise Exergética ................................................................................... 44 3.1.3 Análise Termodinâmica de Plantas de Cogeração ....................................................... 47 3.2. ÍNDICES DE DESEMPENHO DOS SISTEMAS DE COGERAÇÃO ......................... 50 3.2.1 Fator de Utilização de Energia ...................................................................................... 50 3.2.2 Índice de Poupança de Energia ..................................................................................... 51 3.2.3 Índice de Geração de Potência ...................................................................................... 52 3.2.4 Razão Potência/Calor ..................................................................................................... 52 3.2.5 Eficiência Global da Planta ........................................................................................... 53 3.3 PARÂMETROS IMPORTANTES NO SETOR SUCROALCOOLEIRO ..................... 53 3.3.1 Relação Bagaço-Vapor .................................................................................................. 53 3.3.2 Relação Vapor - Cana Moída ........................................................................................ 54 3.3.3 Relação Potência Elétrica - Cana Moída ...................................................................... 55 3.3.4 Relação Vapor - Potência Elétrica ................................................................................ 55 3.3.5 Relação Bagaço - Potência ............................................................................................ 56 3.4 FUNDAMENTOS TERMOECONÔMICOS ................................................................. 57 3.4.1 Histórico da Termoeconomia ......................................................................................... 58 3.4.2 Vertentes da Termoeconomia ........................................................................................ 59 3.4.3 Análise do Custo Exergético .......................................................................................... 60 4 DESCRIÇÃO DOS CASOS ESTUDADOS ................................................................ 65 4.1 CASO 1 - CONFIGURAÇÃO ATUAL DE UMA USINA REAL ................................ 66 4.2 CASO 2 - CONFIGURAÇÃO DE CICLO COMBINADO PARA UMA USINA REAL .............................................................................................................................. 68 4.3 CASO 3 - CONFIGURAÇÃO MODIFICADA DE UMA USINA IDEALIZADA ..... 70 4.4 CASO 4 - CONFIGURAÇÃO DE CICLO COMBINADO PARA UMA USINA IDEALIZADA ................................................................................................................ 73 5 RESULTADOS E DISCUSSÕES ................................................................................ 76 5.1 CONSIDERAÇÕES E CÁLCULOS PRELIMINARES ................................................ 76 5.2 RESULTADOS TERMODINÂMICOS ......................................................................... 79 5.3 RESULTADOS TERMOECONÔMICOS ..................................................................... 83 5.4 RESULTADOS COMPLEMENTARES ........................................................................ 85 6 CONCLUSÕES ............................................................................................................. 89 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 91 APÊNDICE A - ASPECTOS DO GÁS NATURAL NO BRASIL ..................................... 99 A.1 ASPECTOS REGULATÓRIOS ..................................................................................... 99 A.2 ASPECTOS AMBIENTAIS ................................................................................... ..... 100 A.3 REDES DE DISTRIBUIÇÃO E PERSPECTIVAS DE AUMENTO DE CONSUMO ................................................................................................................... 101 A.4 CARACTERÍSTICAS TÉCNICAS .............................................................................. 103 A.5 TARIFAÇÃO DO GÁS NATURAL ............................................................................ 104 APÊNDICE B - CÁLCULO DAS EXERGIAS DOS COMBUSTÍVEIS ........................ 106 B.1 EXERGIA DO BAGAÇO DE CANA .......................................................................... 106 B.2 EXERGIA DO GÁS NATURAL.................................................................................. 107 APÊNDICE C - INFORMAÇÕES SOBRE O PROGRAMA IPSEPRO ........................ 109 C.1 BIBLIOTECAS DO IPSEPRO ..................................................................................... 109 C.1.1 Biblioteca APP ........................................................................................................... 1110 C.1.2 Biblioteca Gas Turbine ................................................................................................ 111 C.2 MÓDULOS DO IPSEPRO ........................................................................................... 113 C.2.1 Módulo PSE ................................................................................................................. 113 C.2.2 Módulo MDK ............................................................................................................... 115 C.2.3 Módulo PSExcel ........................................................................................................... 116 C.2.4 Módulo PSEconomy .................................................................................................... 117 APÊNDICE D - BALANÇO DOS CUSTOS EXERGOECONÔMICOS ....................... 118 15 PREÂMBULO Este trabalho está inserido dentro das linhas de pesquisa do NUPLEN (Núcleo de Planejamento Energético, Geração e Cogeração de Energia) do Departamento de Engenharia Mecânica da Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira (UNESP) e seu conteúdo será descrito brevemente a seguir. No Capítulo 1 são abordados alguns aspectos referentes à cogeração de energia, desde a sua definição, tecnologias e, principalmente, sua aplicação no setor sucroalcooleiro e sua contribuição para as matrizes elétrica e energética brasileira; sendo, por fim, destacada a motivação para realização do trabalho. No Capítulo 2 é apresentada uma revisão da literatura relacionada à cogeração de energia no setor sucroalcooleiro e, depois, dentro deste contexto, definido o objetivo do trabalho. No Capítulo 3 são apresentados os conceitos termodinâmicos e termoeconômicos necessários para a avaliação das plantas de cogeração, dando ênfase às eficiências dos equipamentos e processos. Além disso, nesse capítulo são apresentados alguns índices de desempenho fundamentais baseados na primeira e na segunda lei da termodinâmica, bem como parâmetros importantes usualmente utilizados no setor sucroalcooleiro. No Capítulo 4 são descritas as plantas de cogeração de energia sobre as quais serão concentrados os estudos, destacando-se as características operacionais e os equipamentos envolvidos. No Capítulo 5, primeiramente são apresentadas algumas considerações assumidas e cálculos preliminares necessários para as simulações, sendo depois descritos os principais resultados das análises termodinâmicas e termoeconômicas. No Capítulo 6 são apresentadas as principais conclusões do trabalho, bem como sugestões para trabalhos futuros. Por fim, é apresentada uma lista de referências bibliográficas usadas para a execução deste trabalho, que consiste em livros clássicos, artigos de periódicos e de congressos, teses e dissertações, além de websites de empresas e instituições. Na seqüência, constam quatro Apêndices que dizem respeito, respectivamente, a aspectos do gás natural; ao cálculo das exergias dos combustíveis; ao principal programa utilizado nas simulações das plantas e ao balanço dos custos exergoeconômicos. 16 1 INTRODUÇÃO Inicialmente serão destacados neste trabalho alguns aspectos referentes à cogeração de energia, desde a sua definição, tecnologias e, principalmente, sua aplicação no setor sucroalcooleiro e sua contribuição para as matrizes elétrica e energética brasileira. 1.1 ASPECTOS GERAIS DA COGERAÇÃO DE ENERGIA O termo “cogeração” é de origem americana e é empregado para designar os processos de produção combinada de energia térmica e potência, mecânica ou elétrica, com o uso da energia liberada por uma mesma fonte primária de combustível, qualquer que seja o ciclo termodinâmico. Normalmente, são usados os ciclos Rankine, que são aqueles que empregam turbinas a vapor, ou os ciclos Brayton, que utilizam turbinas a gás. Pelo fato de serem obtidos dois produtos de valores distintos, energia térmica e potência, utilizando uma mesma fonte de energia, os sistemas de cogeração tornam-se atrativos por apresentarem eficiências de primeira lei maiores do que aquelas encontradas quando ambas as formas de energia são produzidas em processos independentes. Estas eficiências podem ser da ordem de 75 a 90 % (WALTER, 1994). As usinas do setor sucroalcooleiro podem ser consideradas empreendimentos de cogeração, pois, a partir da queima de bagaço, que é considerada uma fonte primária de energia, geram o vapor que será fornecido às turbinas de acionamentos mecânicos, como bombas, moendas, desfibradores, entre outros, e, também, para os geradores de energia elétrica. O vapor que sai das turbinas, chamado de “vapor de escape”, é usado como reservatório térmico no processamento do caldo de cana. O processo seqüencial de geração de eletricidade e consumo de energia térmica útil admite duas possibilidades de acordo com a ordem de produção das formas de energia. O ciclo topping é o mais freqüentemente encontrado na prática, especialmente no setor sucroalcooleiro. Neste ciclo, o vapor é utilizado para produzir primeiramente potência elétrica, sendo que a energia térmica resultante é recuperada e depois utilizada no processo produtivo. Nos chamados ciclos bottoming, a energia térmica residual associada aos processos 17 industriais que precisam de alta temperatura é empregada para a produção de energia elétrica, situação esta mais comum em indústrias químicas (SÁNCHEZ PRIETO, 2003). A Figura 1.1 ilustra os ciclos topping e bottoming. (a) Ciclo topping. (b) Ciclo bottoming. Figura 1.1: Processo seqüencial de geração de eletricidade e consumo de energia térmica útil. (Fonte: Fiomari, 2004). Um dos aspectos mais importantes inerentes à definição, mas com muita relação com a funcionalidade da tecnologia, é que estes sistemas são projetados para satisfazer fundamentalmente a demanda térmica do consumidor (paridade térmica), já que não é viável, na maioria dos casos, comprar este tipo de energia de outra empresa. A potência elétrica produzida pode atender parte ou a totalidade das necessidades da própria planta industrial, existindo também a possibilidade de produção de excedente de energia elétrica para a venda, constituindo-se em mais um produto da empresa. No caso de operação em paridade elétrica, a central deve atender às necessidades regidas pela curva de demanda eletromecânica, sendo a energia liberada para atender a demanda térmica uma decorrência desse processo. Ou seja, a vazão de vapor é uma variável dependente da necessidade eletromecânica. A operação em paridade térmica é usada pelas usinas sucroalcooleiras, pois tem sua geração de vapor ditada pelo consumo de vapor da unidade de processo, ou seja, aquele usado principalmente na fabricação do açúcar e do álcool. Normalmente, existem válvulas de controle nas plantas que atuam quando há falta de vapor de processo, desviando parte do vapor que sai da caldeira diretamente para o processo (sem passar pela turbina) até que seja atendida a necessidade. Nos casos das plantas que têm por objetivo produzir excedente de energia elétrica para venda, o vapor é fornecido a um turbo gerador de maior eficiência que rebaixará a pressão do 18 vapor a níveis desejados e produzirá energia elétrica. Após a passagem por esse turbo gerador o vapor poderá ser direcionado para outras turbinas de acionamento mecânico destinadas aos processos de fabricação de açúcar e álcool. 1.2 A COGERAÇÃO NO SETOR ELÉTRICO BRASILEIRO Na década de 70 a cogeração ganhou importância mundial após a crise do petróleo, mas apenas na década de 80 é que começou a ser priorizada no Brasil, visando à minimização dos impactos ambientais provocados por outras fontes. Nos últimos anos o setor elétrico brasileiro sofreu mudanças estruturais inovadoras de ordem institucional e em nível de regulamentação que alteraram sensivelmente o panorama, até então estável e controlado pelo governo, para um ambiente competitivo. Dentro deste contexto, em 1996 foi criada a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) com o objetivo de regular e fiscalizar a geração, transmissão, distribuição e comercialização da energia elétrica. Posteriormente, em 1998 foram criados o Operador Nacional do Sistema Elétrico (NOS), responsável pelo controle e operação das instalações de geração e transmissão de energia elétrica, e o Mercado Atacadista de Energia (MAE), responsável pelas transações de compra e venda de energia elétrica. No início de 2000 foi instituído o Programa Prioritário de Termeletricidade (PPT), visando à implantação de usinas termelétricas e centrais de cogeração a gás natural e, posteriormente, em 2002, foi criado o Programa de Incentivos às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (PROINFA), permitindo a contratação de energia produzida por fontes alternativas renováveis (eólica, biomassa e pequenas centrais hidrelétricas). Em 2004 foi criada a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), que tem por finalidade realizar estudos e pesquisas destinadas a subsidiar o planejamento do setor energético, e a Câmara Central de Energia Elétrica (CCEE), com a finalidade de viabilizar a comercialização de energia elétrica no Sistema Integrado Nacional. Por fim, no ano de 2005 entrou em vigor o Protocolo de Kyoto, permitindo a comercialização de créditos de carbono oriundos, dentre outras fontes, da cogeração. O estímulo à geração independente e descentralizada, além do aumento da geração de energia elétrica através da cogeração em indústrias, tem sido crescente no sentido de se evitar a ocorrência de uma nova crise. Dentro deste contexto, o setor sucroalcooleiro merece uma 19 posição de destaque, pois pode contribuir e muito para a produção de energia elétrica excedente para comercialização. Assim, a seguir serão apresentados alguns aspectos importantes deste setor. 1.3 CARACTERIZAÇÃO DOS SISTEMAS DE COGERAÇÃO NO SETOR SUCROALCOOLEIRO No setor sucroalcooleiro o principal sistema de cogeração é aquele que emprega turbinas a vapor como máquinas térmicas e que aparece vinculado a três configurações fundamentais: turbinas de contrapressão; combinação de turbinas de contrapressão com outras de condensação que empregam o fluxo excedente; e turbinas de extração-condensação. A condensação de uma parte do vapor de escape, ou de uma extração de vapor de uma turbina de extração-condensação, garante as necessidades de energia térmica do sistema. A Figura 1.2 apresenta um esquema de processo trabalhando em regime de cogeração que emprega turbinas de contrapressão. Figura 1.2: Sistema de cogeração com turbinas a vapor de contrapressão. (Fonte: Fiomari, 2004.) Às vezes uma mesma indústria precisa de vapor a distintos níveis de pressão, o que pode estar unido à necessidade de estabilizar o fornecimento da energia elétrica às concessionárias. Segundo Sánchez Prieto (2003), a solução adequada pode ser a combinação de turbinas a vapor de contrapressão com turbinas de condensação, estrutura que permite uma 20 maior flexibilidade às entregas de energia elétrica e energia térmica para processo, ainda que o custo de duas turbinas seja maior do que o custo de uma, aliado ao fato da complexidade do ponto de vista operativo. Quando o objetivo principal visa adequar a instalação para produção e venda de energia excedente, o uso de turbinas de extração-condensação é mais viável. Além de altos índices de desempenho, tais máquinas de condensação com extração regulada se justificam também pela sua capacidade de satisfazer a relação entre energia térmica e elétrica, que pode variar em uma ampla faixa. Este sistema, com maior capacidade de produção elétrica, possui normalmente turbinas de extração dupla, sendo a primeira, no nível de pressão em que o vapor é requerido pelas turbinas de acionamento mecânico, e a segunda, na pressão em que o vapor é consumido no processo produtivo. Comumente, o vapor de escape das turbinas de acionamento mecânico soma-se ao fluxo da segunda extração, visando satisfazer a demanda de vapor do processo. Dentro do setor sucroalcooleiro, a adoção de tal sistema implica em analisar a viabilidade de operação de tal sistema no período de entressafra, conjuntamente com o emprego de outros combustíveis para complementar a falta de bagaço nesse período. A Figura 1.3 ilustra um esquema de processo trabalhando em regime de cogeração que emprega uma turbina de extração-condensação. Figura 1.3: Sistema de cogeração com turbina a vapor de extração-condensação. (Fonte: Fiomari, 2004.) 21 Por outro lado, turbinas a gás têm sido usadas nas áreas industrial e aeronáutica como elementos geradores de energia elétrica e/ou acionamento mecânico, assim como propulsores de aeronaves. A evolução tecnológica de seus componentes implicou numa grande contribuição ao incremento da sua eficiência, que junto da disponibilidade crescente de gás natural a preços competitivos tem favorecido a implantação de sistemas de cogeração com turbinas a gás. Os gases de escape carregam entre 60 e 80 % da energia primária que entra na turbina e constituem, de fato, a fonte de energia térmica fundamental nestes sistemas. Assim, as temperaturas relativamente altas (400 a 600 ºC); o elevado conteúdo de oxigênio nos gases de saída (13 a 18 %), decorrente do excesso de ar usado na combustão; e os baixos teores de gases poluentes com o emprego de gás natural como combustível; constituem o ponto de partida de algumas modificações feitas no ciclo padrão, visando acréscimos nos valores da eficiência térmica e/ou trabalho líquido (SÁNCHEZ PRIETO, 2003). Neste sentido, os esforços têm sido dirigidos ao aproveitamento do potencial energético dos gases de escape da turbina, sendo uma das primeiras modificações estudadas e avaliadas é o Ciclo de Turbina a Gás com Regenerador, no qual se aproveita a energia dos gases na saída da expansão para o aquecimento do ar antes da câmara de combustão. Esse é o mesmo princípio das caldeiras que têm pré-aquecedores de ar, nas quais o ar que é injetado na fornalha sofre anteriormente um pré-aquecimento trocando calor com os gases de combustão que vão ser liberados para a atmosfera. O termo “ciclo combinado” tem sido reservado para a instalação cuja essência de funcionamento consiste em aproveitar a energia dos gases de saída da turbina a gás para gerar vapor sob pressão na caldeira de recuperação de energia térmica e, posteriormente, obter mais potência elétrica numa turbina a vapor, constituindo-se, assim, numa combinação do ciclo a gás com o ciclo a vapor. A Figura 1.4 mostra um sistema de cogeração com ciclo combinado. Quando o caso tratado é sem queima adicional, a concepção da caldeira de recuperação é geralmente mais simples. Os parâmetros do vapor gerado são funções diretas da vazão e temperatura dos gases na saída da turbina a gás. Os ciclos que utilizam a combinação de gás e vapor podem sofrer algumas variantes. Uma delas é quando parte do vapor produzido na caldeira de recuperação é injetada na câmara de combustão da turbina a gás, facilitando as condições para criar uma mistura apropriada para obtenção de um efeito mais apreciável na redução das emissões de xNO . 22 Figura 1.4: Sistema de cogeração com ciclo combinado de gás e vapor. (Fonte: Fiomari, 2004.) No Apêndice A são apresentadas algumas informações importantes sobre o gás natural, incluindo aspectos regulatórios e ambientais, características técnicas (propriedades, composição, etc...), redes de distribuição, perspectivas de aumento de consumo e, por fim a tarifação do mesmo no Brasil, com destaque para a utilização em cogeração, que será objeto de estudo neste trabalho. 1.4 DESENVOLVIMENTO DA COGERAÇÃO NO SETOR SUCROALCOOLEIRO A cogeração teve grande aceitação e desenvolvimento no setor sucroalcooleiro fundamentalmente em razão da sua adequação, pois o combustível empregado é um rejeito do processo de fabricação e os produtos do sistema, potência mecânica ou elétrica e vapor, são utilizados no próprio processo. Enquanto as usinas do setor utilizavam turbinas somente para acionamentos mecânicos e geração de energia elétrica para consumo próprio, os parâmetros de trabalho do vapor gerado pelas caldeiras, denominado vapor direto, eram de 22 kgf/cm2 abs. de pressão e 290 ºC de temperatura. Isso porque não se tinha a preocupação com eficiências energéticas 23 altas e, além disso, as turbinas para essa classe de pressão, originalmente de um único estágio e de baixa eficiência, eram favoráveis ao balanço térmico das plantas. Ou seja, a demanda térmica de processo era atendida com a utilização das turbinas ineficientes no sistema. No entanto, com advento da cogeração e a possibilidade de exportação de energia elétrica, além da competitividade do mercado, as usinas passaram a se preocupar com a eficiência das suas máquinas térmicas, já que, nessa situação, além de atender a demanda térmica e eletromecânica, o excedente de energia pode ser vendido. Dentro desse contexto, passou-se a repensar no consumo de vapor de processo, na substituição de acionamentos mecânicos de baixa eficiência (turbinas a vapor de simples estágio) por motores elétricos, na readaptação das turbinas simples estágio para múltiplos estágios e na geração de energia elétrica através de máquinas térmicas mais eficientes, ou seja, de múltiplos estágios, podendo ou não ser de extração-condensação. Porém, para atender as necessidades técnicas de tais máquinas, os níveis de pressão e temperatura do vapor gerado pelas caldeiras nas plantas das usinas tiveram que ser alterados, passando, num primeiro momento, para 44 kgf/cm2 abs. e 420 ºC, respectivamente, e logo depois para 66 kgf/cm2 abs. e 480 ºC, respectivamente. Com os avanços tecnológicos, tem surgido no mercado máquinas térmicas a vapor com eficiências ainda mais altas, porém, para se conseguir tais rendimentos, é necessário que as plantas operem gerando vapor em níveis ainda mais altos de pressão e temperatura, por volta de 80 kgf/cm2 abs. e 530 ºC, respectivamente, sendo importante ressaltar que os níveis de temperatura do vapor direto são limitados pelas restrições dos materiais utilizados em equipamentos e tubulações. Isso porque para temperaturas acima de 480 ºC tem-se a necessidade de utilizar aços com alto teor de elementos de liga, que podem inviabilizar o negócio em função do alto preço. Nas usinas de açúcar e álcool, o vapor direto é usado em turbinas a vapor que geram potência mecânica. Essa potência pode ser usada diretamente no acionamento de equipamentos como moendas, bombas, desfibradores, picadores, entre outros, ou transformada em potência elétrica nos geradores elétricos, que por sua vez geram a energia para os acionamentos elétricos. Em ambos os casos, há a liberação do vapor de baixa pressão, normalmente em torno de 0,245 MPa (2,5 kgf/cm2), que é utilizado no processo, nas operações de aquecimento, evaporação, destilação e cozimento. A quantidade produzida de bagaço depende da quantidade de cana moída e da relação entre o teor de fibra da cana e do bagaço. A produção de bagaço varia diretamente com a fibra da cana e inversamente com a fibra do bagaço. Considerando números médios para o teor de 24 fibra da cana e do bagaço, pode-se considerar que uma tonelada de cana produz 285 kg de bagaço. O bagaço em geral tem Poder Calorífico Inferior (PCI) igual a 7.736 kJ/kg, umidade relativa de 50 % e pode ter até 86 % de aproveitamento energético em caldeiras modernas. 1.5 POTENCIAL DE COGERAÇÃO NO SETOR SUCROALCOOLEIRO Apesar da auto-suficiência em energia elétrica, a geração de excedentes de energia elétrica nas usinas sucroalcooleiras é ainda bastante limitada, pois apenas cerca de 15 % da energia auto-produzida é exportada. Isso porque a maior parte das usinas ainda possui instalações relativamente antigas que operam aquém do potencial técnico existente, considerando-se a quantidade de biomassa residual gerada e as novas tecnologias disponíveis. A Tabela 1.1 mostra uma estimativa da COGEN-SP do potencial de geração de bioeletricidade até a safra 2012-2013, em função do aumento da moagem, em milhões de toneladas (Mt) por safra (S), considerando a instalação de novas unidades e o retrofit das atuais (COGEN-SP, 2007). Tabela 1.1: Potencial de geração de bioeletricidade no Brasil até 2013. Safra (S) Número Usinas Cana (Mt/S) Bagaço (Mt/S) Instalado (MW) Exportação (MW) Retrofit (MW) Nova (MW) 2008-2009 282 492 123 11.787 4.166 316 1.183 2009-2010 313 556 139 13.331 5.585 316 1.103 2010-2011 343 605 151 14.508 6.742 316 841 2011-2012 349 641 160 15.376 7.678 316 620 2012-2013 351 668 167 16.009 8.447 316 452 Fonte: COGEN-SP, 2007. Pode ser observado que o potencial de energia a ser exportada até 2013 representa um crescimento de cerca de 2 vezes o valor exportado até a safra 2008-2009. A Figura 1.5 mostra estimativas da evolução da produção de cana e da capacidade instalada até a safra 2021-2022, na qual se espera atingir uma produção de 1 bilhão de 25 toneladas de cana e se ter uma oferta de 12.000 MW de bioeletricidade, gerando uma demanda potencial de cerca de 400 turbinas a vapor com capacidade de geração de 30 a 40 MW cada (COGEN-SP, 2007). Figura 1.5: Estimativa da produção de cana e de bioeletricidade no Brasil. (Fonte: COGEN-SP, 2007.) 1.6 MATRIZ ENERGÉTICA E ELÉTRICA, OFERTA E DEMANDA DE ELETRICIDADE NO BRASIL Vários fatores devem ser considerados na constituição da matriz energética, além dos dados estatísticos registrados ao longo do tempo, dentre eles: PIB setorial, intensidade e eficiência energética, crescimento populacional, urbanização e consumo energético. A Figura 1.6 mostra a distribuição das várias fontes de energia que constituem as matrizes energética e elétrica brasileira, segundo dados do Balanço Energético Nacional referente ao ano de 2007 efetuado pelo MME - Ministério de Minas e Energia (BRASIL, 2008). Na matriz energética (Figura 1.6a) têm destaque especial os derivados de petróleo utilizados principalmente como combustíveis veiculares. Em segundo lugar vem a biomassa utilizada como combustível para produção de calor e vapor para processo e geração de eletricidade e, também, como combustível veicular (álcool). Por outro lado, na matriz elétrica brasileira (Figura 1.6b), que inclui a importação de 26 Itaipu, verifica-se ainda a predominância de longa data da fonte hidráulica (usinas hidrelétricas), seguida pela biomassa e gás natural (usinas termelétricas). Outro ponto que pode ser destacado é a grande parcela de energia renovável que constitui essas matrizes. Vale destacar ainda a baixa participação da produção de eletricidade por meio da cogeração, correspondendo a algo em torno de apenas 6 % do total, segundo o MME, mostrando que existe um grande espaço para crescimento, principalmente no que se diz respeito ao setor sucroalcooleiro e depois em relação ao gás natural. * Inclui lenha, bagaço de cana, lixívia e outras recuperações. (a) Matriz Energética (239,4 milhões de TEP) ¹ Inclui importação.² Inclui lenha, bagaço de cana, lixívia e outras recuperações. (b) Matriz Elétrica (482,6 TWh) Figura 1.6: Constituição das matrizes energética e elétrica brasileira. (Fonte: MME, 2008.) A partir da definição de alguns cenários de desenvolvimento, é que são planejados os investimentos no setor energético para que não ocorram crises no futuro. Segundo projeções recentes do Plano Decenal de Expansão da Eletricidade do 27 Ministério de Minas e Energia (BRASIL, 2008), considerando um cenário de referência no qual são previstos crescimentos anuais de 4,2 % no PIB, de 2 milhões de habitantes e de 5,1 % no consumo de energia, devem ser acrescidos cerca de 41.800 MW na capacidade instalada e de 41.300 km em linhas de transmissão, resultando em investimentos da ordem de US$ 56 bilhões até 2015. A Figura 1.7 mostra a oferta de eletricidade existente e curvas da demanda considerando o cenário de referência e um cenário de maior crescimento do consumo de eletricidade, segundo dados da Associação Paulista de Cogeração de Energia (COGEN-SP), na qual pode ser observado que a demanda superaria a oferta em 2008 ou em 2010, respectivamente (COGEN-SP, 2007). No entanto, isso ainda não ocorreu devido a um menor crescimento anual do que o que havia sido projetado. Figura 1.7: Oferta e demanda de eletricidade no Brasil. (Fonte: COGEN-SP, 2007.) A Figura 1.8 mostra a previsão de acréscimo da geração de energia elétrica no Brasil até o ano de 2015, distribuídos entre as principais fontes, na qual pode ser verificada a pequena parcela prevista para o PROINFA, dentro do qual se enquadra a energia gerada pelo setor sucroalcooleiro, entre outras (biogás, resíduos, PCHs e eólica) e a grande parcela de energia hidráulica. Vale destacar que do investimento total previsto 73,8 % deve ser destinado a grandes centrais hidrelétricas, 21,1 % para usinas termelétricas e apenas 5,1 % para PCHs e outras (COGEN-SP, 2007). 28 Figura 1.8: Acréscimo da geração de energia no Brasil até 2015. (Fonte: COGEN-SP, 2007.) 1.7 MOTIVAÇÃO E RELEVÂNCIA DO TRABALHO A análise de dados do Ministério de Minas e Energia (MME) mostra que o consumo de energia elétrica no Brasil experimenta índices de crescimento superiores ao do seu Produto Interno Bruto (PIB), fruto do crescimento populacional concentrado nas zonas urbanas e da modernização da economia. Além disso, a matriz energética brasileira é fortemente dependente dos recursos hídricos e, após os baixos níveis dos reservatórios, decorrente da falta de chuva, ocorreu em 2001 uma grande crise no setor energético brasileiro. Devido a essa situação, o incentivo ao uso de outras fontes energéticas e a busca pelo aumento da eficiência de produção de energia tem sido crescente nos últimos anos. Como exemplo disso, pode ser destacado o PPT (Programa Prioritário de Termoeletricidade) e o PROINFA (Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica), implantados pelo governo. Nesse contexto, a conversão da biomassa em vetores energéticos (combustíveis líquidos, gasosos e eletricidade), o estímulo à geração independente e descentralizada com participação de capital privado no sistema através da construção de pequenas centrais termelétricas e o aumento da geração de energia elétrica através da cogeração em indústrias, principalmente no setor sucroalcooleiro, têm se demonstrado alternativas interessantes. Esse incremento da geração e da cogeração de energia no setor sucroalcooleiro, através de novos empreendimentos e/ou ampliação/repotencialização de plantas já existentes, 29 visando à comercialização de energia, é um aspecto de importante consideração para alavancar o desenvolvimento, uma vez que existe a possibilidade de integração com o mercado consumidor através das várias linhas de transmissão de energia elétrica já existentes. O uso do bagaço de cana e do gás natural como combustíveis nestas plantas pode apresentar atrativos econômicos e ambientais, sendo importante estabelecer as condições técnicas para as quais o uso independente e/ou combinado desses dois combustíveis pode ser praticado por usinas sucroalcooleiras, uma vez que algumas delas ficam próximas ao gasoduto Bolívia-Brasil e que também existem grandes áreas disponíveis nas imediações do mesmo para implantação de novos investimentos. 30 2 REVISÃO DA LITERATURA E OBJETIVO DO TRABALHO 2.1 RETROSPECTO DE ESTUDOS SOBRE COGERAÇÃO EM USINAS SUCROALCOOLEIRAS Nos últimos anos, têm surgido diversos trabalhos relacionados à análise energética, exergética e termoeconômica de sistemas aplicados às usinas de açúcar e álcool e verifica-se que a produção nesta área continua intensa até hoje, o que demonstra a preocupação dos pesquisadores com o tema. A seguir serão apresentadas resumidamente algumas publicações que serviram como referência para o desenvolvimento do presente trabalho. Walter (1994) tratou da cogeração e da produção independente de eletricidade, como formas de geração descentralizada de energia elétrica e, em especial, da viabilidade e das perspectivas dessas tecnologias junto ao setor sucroalcooleiro no Brasil, levando-se em conta a expansão da agroindústria canavieira. Foram analisadas várias alternativas de geração elétrica em larga escala e determinadas as principais características técnicas de cada sistema, tais como a capacidade de geração, a produção de energia elétrica, a disponibilidade de excedentes e a demanda de biomassa. Esses resultados permitiram identificar o potencial das tecnologias de maior viabilidade técnica e econômica, a partir da consideração de cenários alternativos de crescimento da produção de cana no estado de São Paulo e da identificação das usinas mais adequadas para esses empreendimentos. Barreda Del Campo e Llagostera (1996) avaliaram três configurações de sistemas de cogeração em usinas de açúcar, visando à produção de excedentes de energia elétrica passíveis de comercialização. Foi estudada a influência dos parâmetros do vapor, da eficiência das caldeiras e, para as configurações de melhor desempenho, da dependência da geração de eletricidade em função da demanda de vapor de processo. Foram efetuadas análises exergéticas das alternativas mais significativas e, finalmente, avaliações econômicas das configurações que se apresentaram mais promissoras. Coelho, Oliveira Jr. e Zylberstajn (1997) realizaram uma análise termoeconômica do processo de cogeração em uma usina de açúcar e álcool paulista. Os custos exergéticos do processo de geração de vapor e eletricidade foram calculados para várias configurações, a partir de estimativas de excedentes de eletricidade e dos investimentos correspondentes. 31 Foram aplicados os métodos de “igualdade”, “extração” e “trabalho como subproduto”, para a partição dos custos. Entre as configurações avaliadas, destaca-se uma que consistiu na simples troca de equipamentos, mantendo-se os mesmos níveis de pressão nas caldeiras e turbinas de contrapressão, com pequeno investimento em técnicas relativas ao uso racional de energia, visando apenas atingir a auto-suficiência energética. Outra configuração estudada consistiu no aumento dos níveis de pressão e a realização de investimentos adicionais no uso racional de energia, incluindo a eletrificação das moendas. Por fim, foi analisada uma configuração na qual foram realizados grandes investimentos, através da substituição da turbina de contrapressão por uma de extração-condensação, produzindo, neste caso, significativo excedente de eletricidade. Barreda Del Campo et al. (1998) estudaram o sistema de cogeração de uma usina sucroalcooleira que fornece excedentes de energia para a rede elétrica. Foram calculados, além das propriedades termodinâmicas dos diferentes fluxos do sistema, os balanços de massa, energia e exergia. Além disso, eles realizaram uma comparação das eficiências de primeira e segunda lei, mostrando a utilidade desta última na avaliação de um sistema real, e como elemento importante para decisão de melhorias das plantas térmicas ao evidenciar os equipamentos de maiores irreversibilidades e, conseqüentemente, a perda de oportunidades de geração de energia elétrica. Carpio et al. (1999) apresentaram critérios de avaliação termodinâmica para sistemas de cogeração em usinas de açúcar, analisando dois sistemas de cogeração, um com turbina de contrapressão operando a 2,1 MPa e 300 ºC e outro com turbina de extração-condensação operando a 8,0 MPa e 450 ºC. Foi analisada também a possibilidade de utilização de combustíveis auxiliares para o período da entressafra, usando palha de cana, eucalipto e gás natural. Além disso, foi determinado o custo de geração de eletricidade para cada caso. Os autores concluíram que o sistema com turbina de condensação e com duas extrações apresentou eficiência de 66 % contra 42 % do sistema de contrapressão, além de ter uma taxa de economia da energia do combustível de quase sete vezes. Como alternativas de geração fora da safra, o gás natural foi o combustível que apresentou o menor custo seguido pela palha de cana, se considerado custos de colheita e transporte inferiores a R$ 25,00 por tonelada. Coelho (1999) propôs e discutiu mecanismos para viabilizar um programa amplo de venda de excedentes de eletricidade a partir da biomassa das usinas de açúcar e álcool do Estado de São Paulo. Além disso, foi realizada uma avaliação termoeconômica da Companhia Energética Santa Elisa, localizada em Sertãozinho (SP), e foram propostas modificações na 32 legislação e na regulamentação em vigor e, também, estudos visando à inclusão dos custos ambientais e taxação de carbono no planejamento integrado do setor elétrico brasileiro. Vieira e Pellegrini (1999) apresentaram um estudo de caso onde foi analisada a repotenciação de usinas de açúcar e álcool de médio porte, localizadas na região sudeste do país. Para tanto, foi considerada uma unidade padrão característica do setor que processa 10 mil toneladas de cana por dia e foi utilizado um modelo matemático denominado Modelo de Despacho Hidrotérmico, comumente usado como balizador no processo decisório da expansão de empreendimentos para oferta de energia elétrica. Foi constatado que as usinas sucroalcooleiras, embora apresentem um regime sazonal de operação, são empreendimentos bastante interessantes do ponto de vista da expansão do sistema elétrico brasileiro. Arrieta (2000) analisou a possibilidade da utilização do gás natural como combustível complementar para a cogeração no setor sucroalcooleiro. Foi realizada uma análise econômica da integração de blocos geradores BIG-GT a usinas de diferentes capacidades de moagem e consumo de vapor em processo, a partir de diferentes relações de potência térmica entre os combustíveis (gás natural e bagaço) visando calcular o custo de eletricidade gerada. Além disso, foi feita uma análise termoeconômica, visando calcular o custo da eletricidade gerada por bloco gerador integrados a uma usina de capacidade média com um consumo de vapor reduzido se comparado com o atual. Corrêa Neto (2001) avaliou a viabilidade técnica e econômica de projetos de geração de energia elétrica utilizando como combustível o bagaço, a palha e as pontas da cana-de- açúcar, como opção complementar à expansão do sistema elétrico brasileiro. A tecnologia analisada foi de geração termelétrica com ciclo combinado, operando em cogeração, integrado a sistemas de gaseificação de biomassa para a produção de gás combustível, com e sem adição de gás natural. A análise econômica foi feita através da modelagem e construção de curvas de economicidade do projeto, baseadas nos preços da energia elétrica, do gás natural e nos custos da biomassa. Sánchez Prieto e Nebra (2001) fizeram uma análise de custo exergético do sistema de cogeração de uma usina açucareira que tem toda sua demanda de potência e energia térmica satisfeita pelo próprio sistema. Neste trabalho, os autores incluíram a determinação das irreversibilidades e das eficiências da segunda lei da termodinâmica, salientando a importância destas eficiências para as decisões sobre possíveis alterações do sistema, tanto para melhoria na planta térmica, como no sentido de atender os requisitos necessários estabelecidos pela ANEEL para a qualificação de centrais cogeradoras para a venda de energia. 33 Sánchez Prieto, Carril e Nebra (2001) apresentaram uma análise de custo exergético do sistema de cogeração aplicado na Usina Cruz Alta, localizada na cidade de Olímpia (SP). Neste estudo é enfatizada uma metodologia para a determinação experimental da eficiência do sistema, permitindo a determinação do consumo de bagaço de cana da caldeira. Além disso, cada equipamento foi tratado separadamente de forma que os balanços de massa, energia e exergia foram feitos para cada componente do sistema térmico. Higa e Bannwart (2002) realizaram algumas simulações e análises térmicas de uma planta produtora de açúcar e álcool visando otimizar a produção de excedente de energia elétrica e encontrar a melhor forma de recuperação de calor e integração térmica do processo. Foram consideradas diferentes tecnologias de cogeração e de arranjos de evaporadores de múltiplos efeitos. Os resultados obtidos demonstraram que diferentes configurações requeriam também diferentes medidas e estabeleceram algumas prioridades, que podem ser realizadas em diversos níveis de investimentos econômicos. Além das diferenças na integração da usina no sistema de cogeração para a economia de bagaço, ou para o aumento da geração de energia elétrica excedente, foi possível concluir que as medidas para alcançar esses objetivos devem ser priorizadas de acordo com o consumo de vapor de processo e a integração de evaporadores de múltiplos efeitos. Lobo et al. (2002) analisaram os processos de extração de duas empresas sucroalcooleiras que usam turbinas de contrapressão para fornecer trabalho, sendo o vapor de contrapressão utilizado como energia térmica de processo. Uma das empresas emprega grandes turbo geradores de múltiplos estágios, que operam com entrada de vapor a 3,0 MPa e 330 ºC, para cogerar energia elétrica para motores elétricos que acionam as moendas, picadores e desfibradores. Já na outra empresa, o acionamento das máquinas é realizado diretamente por pequenas turbinas de simples estágio operando com vapor a 2,0 MPa e 290 ºC. Foi verificado que a empresa que utiliza energia elétrica cogerada, com turbinas maiores para acionar as máquinas, chega a economizar 65 % do bagaço gasto para moer uma tonelada de cana quando comprada com a empresa que utiliza várias turbinas menores e menos eficientes. Foi concluído que, com o uso mais racional do bagaço gerando vapor em temperaturas e pressões maiores, obtém-se uma grande economia de bagaço, que tanto pode ser comercializado in natura, ou ser usado para cogeração de excedentes de eletricidade. Jaguaribe et al. (2002) realizaram um estudo termodinâmico e avaliaram as condições técnicas das instalações a serem implantadas em um sistema de cogeração de energia na Destilaria Japungu Agroindustrial S.A., localizada em Santa Rita (PB). A ampliação proposta não tinha o objetivo apenas de tornar a destilaria auto-suficiente em termos de energia, mas 34 também de tornar possível exportar 33.616 MWh durante a safra e 3.600 MWh na entressafra. Foram considerados todos os custos envolvidos e os resultados mostraram que, naquela oportunidade, o negócio não seria atrativo, mas se houvesse uma elevação do preço de venda da eletricidade, o novo sistema de cogeração com venda de energia seria mais rentável. Brighenti (2003) apresentou e analisou os diversos requisitos necessários para que haja uma integração confiável e segura dos sistemas de geração a partir de biomassa (especificamente cogeração com bagaço de cana) ao sistema elétrico de potência. Foi considerado um estudo de uma usina de açúcar e álcool do Estado de São Paulo (Usina Santa Adélia) que recentemente ampliou sua geração própria, passando a comercializar sua eletricidade excedente com a CPFL. Foram levantadas e analisadas as barreiras técnicas, legislativas, econômicas e ambientais, que, em conjunto, determinam a integração do cogerador, sendo dada ênfase especial à parte técnica da interligação, buscando analisar o impacto que a inserção dos produtores independentes pode causar no sistema elétrico e o que precisaria ser feito para a interligação com a concessionária. Leite (2003) apresentou várias propostas de ciclos de potência e de plantas de cogeração para especificação de uma central termelétrica para operar em ciclo combinado, utilizando o gás natural e o bagaço de cana excedente de usinas sucroalcooleiras como energéticos. O trabalho consistiu na determinação da melhor opção na seleção da central termelétrica, considerando o critério de mínimo custo por kWh de energia produzida, através de uma análise termoeconômica, com a avaliação dos custos de produção de vapor e de eletricidade em base exergética. Sánchez Prieto (2003) realizou uma detalhada análise energética e exergética, visando determinar as eficiências de primeira e segunda lei da termodinâmica para os principais equipamentos de duas plantas de usinas sucroalcooleiras, bem como o consumo de combustível envolvido, além de alguns índices de desempenho típicos de sistemas de cogeração. O objetivo fundamental da avaliação foi determinar os custos dos principais fluxos do sistema, considerando os custos como se fosse uma instalação nova, com taxa de juros de 15 % ao ano e um período de amortização de 15 anos. Foi avaliada a variação do custo de bagaço e sua influência nos custos dos fluxos da planta e dada ênfase na potência elétrica e nos índices de desempenho. Jaguaribe et al. (2004) discutiram um caso real de investimento na ampliação do sistema de cogeração de energia em uma indústria sucroalcooleira paraibana (Japungu Agroindustrial S.A.), considerando o preço sazonal do bagaço, os custos de geração de energia e levando-se em conta um período de 10 anos. Com o novo parque de cogeração a 35 indústria se tornou auto-suficiente em energia, dispondo de 21.240 MWh para comercialização, com uma potência média de exportação de 4 MW. Todavia, após a análise econômica efetuada, verificou-se que a melhor opção seria manter a planta na forma original e vender o bagaço a R$ 26,00 por tonelada. Fiomari (2004) realizou análises energética e exergética de cinco plantas de vapor de uma usina sucroalcooleira. As plantas consideradas foram baseadas nas propostas de expansão do sistema de cogeração da Destilaria Pioneiros, no período de 2003 a 2007. Através da primeira e segunda leis da termodinâmica, foi possível avaliar a eficiência e a geração de calor e potência para cada componente, caldeiras, turbinas, condensadores e bombas que compunham as plantas avaliadas, bem como o aproveitamento global de energia de cada uma delas. Através de índices baseados na primeira lei da termodinâmica, foi possível comparar todas as plantas consideradas. Além disso, foram calculados também alguns indicadores que são bastante comuns em usinas de açúcar e álcool, como o consumo específico de vapor de turbinas a vapor ou consumo específico de vapor de processo. Algumas análises de sensibilidade foram feitas para avaliar o comportamento do aproveitamento global de energia de um ciclo com turbina de extração-condensação levando em consideração a variação de parâmetros como eficiência da caldeira, consumo de vapor de processo e taxa de condensação na turbina de extração-condensação. Observou-se que a eficiência da planta foi bastante sensível à variação da taxa de condensação e aumentou quando se aumentou a demanda do vapor de processo. Uchôa (2005) analisou a possibilidade de aproveitamento do gás natural como combustível complementar em usinas de açúcar e álcool paulistas, que ficam próximas do gasoduto, com a finalidade de não só aumentar a quantidade de energia e/ou bagaço para comercialização, como também permitir a operação durante todo o ano. Para tanto, foi feito um estudo termodinâmico minucioso, bem como uma criteriosa análise da viabilidade técnica e econômica, levando-se em conta as modificações que devem ser feitas com relação às plantas tradicionais dessas usinas, que incluem a implantação de queimadores de gás nas caldeiras e/ou a instalação de uma turbina a gás e uma caldeira de recuperação. O gás natural queimado diretamente nas caldeiras mostrou-se uma opção economicamente inviável, enquanto que seu uso em ciclo combinado pode ser uma alternativa interessante, desde que existam condições favoráveis ao retorno dos altos investimentos a serem realizados. Bohórquez, Horta Nogueira e Lora (2006), avaliaram a utilização integral do bagaço de cana de açúcar resultante do processo produtivo de uma usina de açúcar que pretende incrementar sua capacidade de geração de energia elétrica de 7 para 35 MW, mediante o 36 redesenho do ciclo e a incorporação de novos turbogeradores. Utilizando as ferramentas termoeconômicas foi estabelecida a matriz de incidência da planta de cogeração, a determinação dos custos exergoeconômicos e a realização das simulações da variação do preço de combustível e a eficiência da caldeira. Além disso, foi efetuado um breve estudo econômico da produção de energia elétrica e da venda dos excedentes de 27 MW médios e concluído que o custo da eletricidade gerada era de US$ 0,0511/kWh. Walter e Llagostera (2006a) realizaram uma análise da viabilidade da utilização de ciclos combinados com co-firing baseado na gaseificação dos resíduos da cana de açúcar (bagaço e palha) e aproveitamento do gás natural. A análise foi baseada nos custos de investimento de capital e de operação e manutenção de tais ciclos, levando em conta os custos atuais e de médio prazo das tecnologias BIG-CC em desenvolvimento. Foi concluído que uma profunda redução dos custos de investimentos nas tecnologias de gaseificação, bem como do custo do gás natural, são pontos chaves para fazer a tecnologia BIG-CC competitiva frente às outras opções existentes no mercado para a produção de eletricidade, mas isso só vai ser conseguido com a implantação e aprimoramento de algumas pequenas e médias unidades experimentais. Walter e Llagostera (2006b) realizaram uma pré-análise da viabilidade da integração de turbinas a gás com caldeiras que queimam pontas e palhas de cana, em uma configuração similar as que são utilizadas no caso de incineração de resíduos sólidos urbano, visando à produção de eletricidade. Ressalta-se que o aproveitamento destes resíduos para a geração ou cogeração de energia se torna importante não só para o aumento atual do potencial, como também para a substituição do próprio uso do bagaço da cana, a partir do momento que o mesmo passar a ser utilizado para a produção de etanol através do processo de hidrólise. Foram consideradas duas configurações para a análise sob o ponto de vista termodinâmico e econômico. Numa das configurações o vapor é produzido tanto na caldeira convencional de biomassa como também uma caldeira de recuperação, que utiliza os gases de exaustão da turbina a gás, e, também, superaquece o vapor oriundo da caldeira convencional antes de entrar na turbina a vapor. Na outra configuração o vapor é produzido somente na caldeira convencional de biomassa, sendo o mesmo apenas superaquecido pelos gases de exaustão da turbina a gás antes de entrar na turbina a vapor. Foi concluído que a primeira opção é mais viável, embora necessite de maiores investimentos, mas estudos mais detalhados devem ser feitos para otimização do sistema. Ensinas et al. (2006a) realizaram a otimização termoeconômica do consumo da energia térmica no processo de produção de açúcar, visando valores mínimos de 37 investimentos e de custo de operação. Alguns dados de usinas sucroalcooleiras brasileiras foram usados para definir os parâmetros do processo. A metodologia proposta foi usada para avaliar o custo do vapor consumido pelas usinas e otimizar o projeto do sistema de evaporação e da rede de trocadores de calor. Ensinas et al. (2006b) analisaram diferentes opções de sistemas de cogeração em usinas sucroalcooleiras com objetivo principal de verificar as possibilidades do aumento da geração de eletricidade. Foram consideradas quatro opções, sendo a primeira com a utilização da tradicional turbina de contrapressão; a segunda com a utilização de uma moderna turbina de extração-condensação; a terceira com a utilização de um gaseificador de bagaço, uma turbina a gás e uma caldeira de recuperação e, por fim, a quarta com uma configuração de ciclo combinado integrado com a gaseificação da biomassa. Vale destacar que a análise da potência das plantas foi realizada junto com a redução da demanda de vapor do processo de produção de açúcar, uma vez que esses dois sistemas estão interligados. Através dos resultados obtidos foi concluído que existe um potencial significativamente grande para o aumento da produção de eletricidade usando o bagaço da cana e a palha (na entressafra) como combustíveis principalmente com ciclos a vapor com turbinas de extração-condensação. Zanetti, Pellegrini e Oliveira Junior (2006) apresentaram um sistema de cogeração de energia para uma usina sucroalcooleira, com utilização de bagaço de cana-de-açúcar e gás natural, visando maximizar a produção de eletricidade. Para este sistema, foram propostas diversas estratégias de operação para uma mesma planta de utilidade, sendo uma delas a utilização de todo o bagaço na gaseificação e complementação de gás natural na turbina a gás de forma a atender a demanda de vapor da usina (sem queima de bagaço na caldeira de recuperação), e outra forma de operação com o envio de uma determinada quantidade de bagaço ao gaseificador para acionar uma turbina a gás, sendo o excedente queimado na caldeira de recuperação de forma a maximizar a quantidade de vapor produzida. Por fim, foi concluído que a maximização da produção de energia elétrica implica no comprometimento do rendimento exergético do sistema, devido ao aumento das irreversibilidades na caldeira. Lobo et al. (2007) realizaram uma análise econômica das modificações propostas no processo de moagem de uma usina sucroalcooleira de médio porte antiga (Agroval), levando- se em conta o consumo de energia envolvido no processamento da cana bem como a eficiência de extração de açúcar. Essas modificações incluíram o uso de acionamento elétrico direto e maior embebição em água durante o esmagamento para aumentar a extração do caldo. Embora mais energia seja gasta nestas condições, e tanto a umidade do bagaço como a diluição do caldo sejam maiores, utilizando turbinas modernas para acionamento dos 38 geradores, verificou-se que o consumo do vapor aumenta muito pouco e ocorre uma redução no consumo de bagaço. Foram determinados os custos do bagaço ou da eletricidade consumida para o acionamento extra, bem como o aumento da renda com a maior produção de açúcar. Rodrigues, Walter e Faaij (2007) avaliaram o desempenho dos sistemas de gaseificação da biomassa atmosféricos em ciclo combinado operando sob diferentes estratégias de utilização do gás de baixo poder calorífico em turbinas a gás. São propostas algumas modificações como extração de ar do compressor e retrofit da turbina a gás, através da alteração da geometria do compressor. Os resultados mostraram ganhos consideráveis que podem ser obtidos na produção de energia quando o expansor de turbina a gás é modificado. Ensinas et al. (2007) analisaram a redução da demanda de vapor no processo industrial de uma usina com acionamentos eletrificados e com sistema de evaporação de cinco efeitos. Foram apresentadas quatro configurações de plantas, considerando desde plantas convencionais com turbina de contrapressão até a gaseificação do bagaço em ciclo combinado. Foi verificado que, para os ciclos de vapor tradicionais, uma quantidade significativa de bagaço excedente pode ser obtida com o processo de redução da demanda de vapor. Além disso, a gaseificação da biomassa se mostrou uma importante alternativa para longo prazo, permitindo um incremento de mais de 70 % na geração de eletricidade. Lima et al. (2008) realizaram análises termodinâmicas e termoeconômicas do projeto inicial e de uma proposta de expansão de uma usina sucroalcooleira com processo de extração de caldo por difusão. O primeiro caso estudado considerou a produção apenas de álcool e é constituído por uma caldeira que produz vapor a 43 bar e 400 °C e um turbogerador de simples estágio para geração de eletricidade para consumo próprio. O segundo caso estudado consistiu na expansão da planta inicial para produção de álcool, açúcar e excedente de eletricidade para comercialização. Os resultados obtidos mostraram que os dois casos possuem um rendimento global equivalente, porém o segundo caso mostrou-se mais interessante por apresentar melhor eficiência de caldeiras e turbina, melhores índices de desempenho termodinâmico e também por aproveitar melhor o bagaço e gerar uma maior quantidade de energia. Em termos termoeconômicos, o segundo caso também se mostrou mais viável por possuir um menor custo de produção de vapor associado a um menor custo de produção de eletricidade. Pizzo et al. (2008) analisaram e compararam as eficiências da planta de vapor de uma usina sucroalcooleira paulista (Companhia Energética Santa Elisa), considerando-se para tanto a planta atual e uma proposta de mudança que inclui a troca de equipamentos, como, por 39 exemplo, a substituição de 4 caldeiras de 21 kgf/cm² por uma única caldeira de 95 kgf/cm², além da eletrificação das moendas. Foi possível avaliar a eficiência e a geração de calor e potência para cada componente, caldeiras e turbinas das plantas consideradas para a usina. Os resultados indicaram que a eficiência do sistema de vapor da usina melhorou para o caso que considera a alteração da planta atual, além de aumentar a geração de potência, combinada com um aumento do consumo de vapor por processo. Além disso, notou-se uma maior produção de vapor por bagaço queimado e, também, um aumento da potência elétrica produzida por combustível consumido. Bocci, Di Carlo e Marcelo (2009) estudaram a eficiência energética utilizando dados reais de uma usina sucroalcooleira antiga e exploraram possíveis melhorias como utilizar o ciclo de Rankine com temperatura e pressão mais elevadas e configurações inovadoras com gaseificador e turbina a gás. Os autores mostraram que as configurações inovadoras para a usina podem aumentar o potencial de cogeração do bagaço da cana, aumentando significativamente a energia elétrica produzida com combustíveis renováveis. Bohorquez et al. (2009) avaliaram a tecnologia existente para produção de energia numa planta vapor, considerando 6 casos com implementações diferentes. O Caso I utiliza ciclo combinado com duas turbinas a gás, caldeira de recuperação e uma turbina a vapor adicional. O Caso II utiliza apenas uma turbina a gás e uma caldeira de recuperação, mantendo a turbina a vapor antiga. O Caso III utiliza o mesmo arranjo do Caso II, mas inclui injeção de água na câmara de combustão da turbina a gás. O Caso IV utiliza o mesmo arranjo do Caso II, mas inclui injeção de vapor na câmara de combustão da turbina a gás. O Caso V utiliza um ciclo combinado, incluindo o uso de gás natural tanto na caldeira convencional como na turbina a gás. O antigo ciclo a vapor é mantido e a turbina a gás com a caldeira de recuperação é adicionada. O Caso VI utiliza o mesmo esquema do Caso V, mas usa óleo como combustível na caldeira convencional e diesel na turbina a gás. Todos os casos que passaram por implementações mostraram uma maior eficiência quando comparados com o caso base (Caso I), sendo que o Caso II foi o que apresentou maior eficiência e o Caso IV foi o que apresentou menos emissão de gás carbônico. Kamate e Gangavati (2009) apresentaram uma análise exergética de uma planta de cogeração típica de uma usina que processa 2.500 toneladas de cana por dia, utilizando turbinas de contrapressão e de extração-condensação. A configuração com turbinas de extração-condensação se mostrou mais eficiente do ponto de vista da exergia. As análises mostraram que a caldeira é o componente que mais contribuiu para a ineficiência da planta, devido à sua natureza intrínseca. Verificou-se que uma caldeira moderna com a tecnologia 40 atual poderia utilizar apenas 37 % da exergia química do combustível na geração de vapor, de forma que 63 % da exergia total é perdida na combustão irreversível. Palacio et al. (2009) realizaram uma análise termoeconômica para dois casos diferentes de uma destilaria e da planta de cogeração. O primeiro caso consiste em uma destilaria normal com uma turbina de simples estágio nas moendas, destilação atmosférica e um sistema de cogeração com turbina de contrapressão com vapor a 2 MPa. O segundo caso utiliza turbinas de extração-condensação com vapor variando a pressão na faixa de 4 a 10 MPa. O resultado da análise termoeconômica mostrou que, para modernização da destilaria e um melhor desempenho geral da planta, deve-se aumentar a pressão do vapor de 2 para 10 MPa; substituir os atuais acionamentos mecânicos por acionamentos elétricos, substituir a destilação atmosférica pela destilação pressurizada; e substituir o sistema atual de evaporação pela tecnologia falling film. Palacios-Bereche et al. (2009) avaliaram a desempenho de três diferentes sistemas de cogeração em usinas sucroalcooleiras. O Caso A utiliza uma caldeira de baixa pressão (21 bar) e turbina a vapor de contrapressão. O Caso B utiliza dois tipos de caldeira, a primeira trabalha com produção de vapor a baixa pressão (22 bar) para acionar as turbinas das moendas, picadores, trituradores e bombas e a segunda caldeira produz vapor a uma pressão mais elevada (42 bar), o qual é usado para gerar energia. Todas as turbinas usadas nesse caso são de contrapressão. O Caso C utiliza uma caldeira de alta pressão (67 bar) e turbinas de extração-condensação. Deste modo, a energia elétrica produzida no Caso C foi 2,76 vezes maior que no caso B, que, por sua vez, foi 3,02 vezes maior que no Caso A. A eficiência de geração de potência foi maior no Caso A e menor no Caso C, ao contrário do que ocorreu com a eficiência de geração de eletricidade. Por outro lado, o Caso C apresentou a melhor eficiência pela segunda lei da termodinâmica. Passolongo et al. (2009) apresentaram uma análise termodinâmica da integração de um sistema de gaseificação de biomassa em uma usina sucroalcooleira. Foi considerada a gaseificação da palha, bagaço e vinhaça separadamente e, também, o efeito de suas associações utilizando equipamentos adicionais como gaseificador, turbina a gás e caldeira de recuperação. A análise se baseou no balanço de massa, primeira e segunda leis da termodinâmica, considerando um volume de controle para cada equipamento. Os resultados mostraram um ganho de potência em todos os casos que incluíram gaseificação, especialmente na gaseificação do bagaço, obtendo maior eficiência e geração de potência. Foi verificado que, embora a gaseificação da vinhaça produza um gás com maior poder calorífico, a produção de energia adicional é menor se comparada com a gaseificação da palha e bagaço. 41 Pellegrini e Oliveira Junior (2009) abordaram o problema da otimização da exergia em sistemas de cogeração de usinas sucroalcooleiras. Um modelo geral dos processos de produção de açúcar e etanol foi desenvolvido baseado em dados fornecidos por uma planta real e, depois, a análise exergética foi executada. Foi mostrado que um melhor desempenho termodinâmico do sistema de cogeração está relacionado com uma diminuição na destruição de exergia em todos os processos de conversão de energia. Além disso, foi verificado que um melhor desempenho é traduzido numa diminuição do custo exergético de produção do açúcar e do etanol. Sistemas convencionais de cogeração podem gerar um excedente de até 80 kWh por tonelada de cana, dependendo do consumo de vapor no processo. Enquanto que sistemas de cogeração avançados podem produzir até 200 kWh por tonelada de cana, o que representa um potencial de geração de 111 TWh/ano, ou 25 % do consumo brasileiro de eletricidade. Pellegrini, Oliveira Junior e Burbano (2009) apresentaram um estudo comparativo termoeconômico de plantas de usinas, considerando ciclos de vapor supercríticos e ciclos combinados com integração da gaseificação da biomassa. Os ciclos de vapor supercrítico se mostraram capazes de gerar um excesso de eletricidade 142 kWh por tonelada de cana, reduzindo a destruição de exergia no interior da fábrica de quase 12 %. Para a gaseificação da biomassa em ciclo combinado, foram consideradas três configurações, utilizando gaseificador atmosférico e pressurizado. A configuração com gaseificador pressurizado se mostrou mais eficiente, gerando uma eletricidade excedente de cerca de 202 kWh por tonelada de cana e com uma redução na destruição de exergia de quase 20 %. Além disso, esta configuração apresentou os menores custos exergéticos de eletricidade, vapor de processo, álcool e açúcar. 2.2 OBJETIVO DO TRABALHO O objetivo principal deste trabalho é a realização de análises termodinâmica e termoeconômica do aproveitamento do gás natural em sistemas de cogeração de energia de usinas de açúcar e álcool. Serão considerados quatro casos, sendo o primeiro um estudo sobre uma planta de uma usina sucroalcooleira real que utiliza equipamentos modernos e eficientes, incluindo uma caldeira que produz vapor a altos níveis de pressão e temperatura, o qual é utilizado para geração de eletricidade em uma turbina de extração-condensação de múltiplos estágios e em outra turbina de contrapressão. Além disso, todos os acionamentos das moendas são 42 eletrificados. Na seqüência será definido um caso hipotético no qual é incorporada à planta real da usina uma turbina a gás e uma caldeira de recuperação, passando a planta a operar em ciclo combinado com gás natural na entressafra com a turbina a vapor de contrapressão e, também, com uma turbina a vapor de condensação que será incorporada, com o intuito de possibilitar a comercialização de energia ao longo do ano todo. A partir daí serão definidas novas configurações de plantas para usinas sucroalcooleiras baseadas nas modernas tecnologias e equipamentos da planta real. A primeira nova configuração proposta será constituída por uma planta básica com grande capacidade de moagem (duas vezes mais do que a da usina real), que opere de forma convencional com geração de excedente de energia elétrica para comercialização apenas na safra, sendo a mesma constituída por duas linhas independentes de produção e consumo de vapor e geração de eletricidade, flexibilizando a produção e manutenção. Tendo como base essa última configuração, será idealizada uma nova configuração que permite, na entressafra, o aproveitamento do gás natural como combustível associado ao bagaço da cana, através da incorporação de uma turbina de condensação, uma turbina a gás e uma caldeira de recuperação. A proposta é fazer com que seja possível gerar um excedente de eletricidade ao longo do ano todo de modo que se possa fazer um contrato de fornecimento de uma quantidade fixa (energia firme), sendo o eventual valor ainda excedente passível de comercialização por meio de leilões de energia. 43 3 FUNDAMENTOS TERMODINÂMICOS E TERMOECONÔMICOS 3.1 FUNDAMENTOS TERMODINÂMICOS 3.1.1 Introdução à Análise Energética A análise de sistemas e processos pela Primeira Lei da Termodinâmica está baseada nas conservações de energia e de massa. No caso de regime permanente, a conservação de massa inclui somente a análise do fluxo de massa que está entrando e saindo do volume de controle e desconsidera a variação de massa no interior do volume de controle. Além disso, considerando-se que as variações de energia cinética e potencial são desprezíveis no balanço de energia, as equações resultantes são as seguintes: 0mm es �� �� �� (3.1) 0hmhmWQ sseev.c.v.c. �� � �� ���� (3.2) sendo: em� : vazão de massa entrando no volume de controle (kg/s); sm� : fluxo de massa saindo do volume de controle (kg/s); eh : entalpia específica na entrada do volume de controle (kJ/kg); sh : entalpia específica na saída do volume de controle (kJ/kg); v.c.Q� : taxa transferida de calor no volume de controle (kW); v.c.W� : taxa de potência no volume de controle (kW). As somatórias que aparecem nas equações representam a possibilidade de diversas portas de entrada e saída de massa e de vários fluxos de calor na superfície de controle. 44 As irreversibilidades num processo são quantificadas pela Segunda Lei da Termodinâmica, por meio da propriedade denominada entropia. Para processos em um volume de controle, em regime permanente, o balanço de entropia é definido como: 0�� � � � � ��� ssee i i v.c. ger, smsm T QS �� � � (3.3) sendo: es : entropia específica na entrada do volume de controle (kJ/kg K); ss : entropia específica na entrada do volume de controle (kJ/kg K); ii TQ� : taxa de entropia gerada pelos fluxos de calor no V.C. (kW/K); iT : temperatura superficial do volume de controle (K); v.c. ger,S� : taxa de geração de entropia no volume de controle (kW). A Equação (3.3) mostra que a taxa na qual a entropia é transferida para fora do volume de controle deve ser igual à soma da taxa na qual a entropia entra no volume de controle, da taxa de entropia gerada pelos fluxos de calor e da taxa de geração de entropia devida às irreversibilidades. 3.1.2 Introdução à Análise Exergética A análise exergética consiste no emprego simultâneo da Primeira e Segunda Leis da Termodinâmica na avaliação de desempenho de processos de conversão de energia, uma vez que a análise energética (Primeira Lei da Termodinâmica) não contabiliza a qualidade da energia que está se perdendo e nem onde ocorrem as irreversibilidades dos processos. Assim, uma aplicação conjunta das análises energética e exergética permite uma efetiva avaliação termodinâmica dos processos, quantificando o valor termodinâmico de um fluxo, em termos do trabalho mecânico que poderia ser extraído dele, assim como também as irreversibilidades que ocorrem durante o desenvolvimento destes processos. A análise exergética, segundo Tsatsaronis (1993), permite: 45 � Uma melhor medida para a avaliação da magnitude da energia perdida em relação à energia total suprida sob a forma de insumo energético; � Uma medida da qualidade (ou do desperdício) da energia do ponto de vista termodinâmico; � Uma variável para definir a eficiência racional para o sistema energético. Segundo Kotas (1985), a exergia é o padrão de qualidade de energia, igual ao máximo trabalho útil que pode ser obtido de uma dada forma de energia, utilizando os parâmetros do ambiente (P0, T0) como referência. A exergia sempre possui uma parcela que é destruída, constituindo a chamada irreversibilidade. A exergia é sempre medida comparando-se um estado inicial a um estado de equilíbrio. Podem ser definidos dois estados de equilíbrio: � Equilíbrio restrito: estado em que o sistema é levado a um equilíbrio térmico e mecânico com o meio ambiente, onde a temperatura e pressão do sistema são iguais às do ambiente considerado; � Equilíbrio irrestrito: neste caso, além do equilíbrio térmico e mecânico, ainda existe o equilíbrio químico. Neste estado de equilíbrio o sistema possui energia, mas a sua exergia é zero. Um fator importante quando se deseja calcular o valor da exergia de um sistema é o ambiente de referência. Kotas (1985) afirma que o ambiente real é muito complexo para ser usado em cálculos termodinâmicos, sendo necessária a introdução de um meio ambiente idealizado. Neste caso, não existem gradientes de pressão, temperatura, potencial químico, energia cinética e potencial, impossibilitando a execução de trabalho por interação entre as várias partes. O ambiente pode ser modelado por duas abordagens: � As substâncias que formam o meio ambiente de referência são escolhidas de forma a coincidir com as substâncias do sistema analisado; � Todos os sistemas são analisados com um único estado de referência, pode este estado escolhido coincidir ou não com o ambiente real. Como a exergia é função de propriedades de dois estados, uma vez fixado o ambiente de referência, pode-se utilizá-lo para calcular a exergia de qualquer outro estado. A variação de exergia entre dois estados será independente do processo seguido para alcançar um a partir do outro. Permitindo, assim, definir uma trajetória composta por vários processos para separar a variação total de exergia no somatório de vários termos. Szargut, Morris e Steward (1988), Kotas (1985) e outros, propõem a seguinte relação para o cálculo da exergia: 46 t fis quib b b� (3.4) onde: fisb : exergia específica física (kJ/kmol); quib : exergia específica química (kJ/kmol). A exergia física de um fluxo é calculada com base num estado de referência restrito ( 0P , 0T ) onde há equilíbrio térmico e mecânico com o meio, através da seguinte equação: � � � � 2 0 0 0 0( ) 2 � � � � �fis Vb h h T s s g z z (3.5) Desprezando os termos decorrentes da energia cinética e potencial, tem-se que a função exergia para um fluxo de matéria em regime permanente assume a seguinte forma: � � � �fisb h h T s s0 0 0� � � � (3.6) Segundo Kotas (1985), a exergia química é definida como sendo a máxima quantidade de trabalho obtida da transformação de uma substância em equilíbrio físico com o ambiente até o estado de referência irrestrito, através de processos que envolvam apenas transferência de calor e troca de substâncias somente com o meio. Para haver equilíbrio completo com o meio, o sistema deve estar também em equilíbrio químico com ele. O trabalho, que pode ser obtido através de um processo reversível que leva o sistema do estado de referência restrito até o estado de referência onde há equilíbrio completo (“estado morto”), é a exergia química, definida por: � �0,� ��qui i i ib � � x (3.7) onde: 0,i� : potencial químico de referência do elemento (T0, P0); i� : potencial químico do elemento na mistura (T0, P0); ix : fração do componente na mistura. 47 Logo, a exergia total (bt) pode ser representada por: � � � � � �t i i ib h h T s s � � x� � � � ��0 0 0 0, (3.8) Szargut, Morris e Steward (1988) estabeleceram uma substância padrão para cada um dos elementos da tabela periódica, desta forma foi definido um ambiente padrão com o qual é possível calcular a exergia de qualquer composto químico. Além disso, eles calcularam a exergia de muitos compostos químicos e as apresentaram em forma de tabelas e equações. As equações para o cálculo das exergias dos combustíveis a serem usados neste trabalho (bagaço da cana-de-açúcar e gás natural) são apresentadas no Apêndice B. 3.1.3 Análise Termodinâmica de Plantas de Cogeração A combinação entre a Primeira e Segunda Lei da Termodinâmica permite que se estabeleça o balanço de exergia. Considere o sistema da Figura 3.1, o qual, em certo instante, pode estar em contato térmico com um número de reservatórios de temperatura de temperaturas iT ( , , , . . ., )i 1 2 3 n� . A atmosfera, representada pelo reservatório térmico a 0P e 0T , tem um papel especial na instalação. A taxa de transferência de trabalho (W� ) representa a combinação de todos os modos possíveis de transferência de trabalho ( , , ,mecânico elétrico magnéticoP dV dt W W W� � � ). 48 Figura 3.1: Sistema aberto em contato com a atmosfera e n reservatórios térmicos. Com referência ao sistema aberto definido na Figura 3.1, e desprezando as mudanças de energia cinética e potencial, pode-se escrever a Primeira e a Segunda Lei da seguinte forma: 0 n i i e s dE Q W m h m h dt � � � �� � �� � � � (3.9) 0 0 n i ger i e si QdSS m s m s dt T� � � � �� � � � � � � (3.10) Eliminando Q�0 das equações (3.9) e (3.10), encontra-se que a taxa de transferência de trabalho (W� ) depende explicitamente do grau de irreversibilidade termodinâmica do sistema ( gerS� ), como segue: � � � � � � n 0 0 i 0 0 0 ger i 1 e si TdW E T S 1 Q m h T s m h T s T S dt T� � � � � � � � � � � � � � � �� �� � � (3.11) Assim, Equação (3.11) pode ser expressa como: rev 0 gerW W T S� � �� � (3.12) 49 Pois, � � � � � � n 0 rev 0 i 0 0 i 1 e si TdW E T S 1 Q m h T s m h T s dt T� � � � � � � � � � � � � � ��� � � (3.13) Fazendo-se a diferença entre a taxa trabalho reversível e a taxa de trabalho real, que é a taxa de trabalho perdida ou taxa de exergia destruída ou taxa de irreversibilidade ( �I ): � � � � ��� � � � perdido rev 0 gerW I W W T S 0 (3.14) Em casos onde o reservatório de pressão atmosférica 0P troca trabalho com o sistema (Figura 3.1), a parte de W� que é transferida para a atmosfera é 0P dV dt , enquanto que o restante constitui a taxa de trabalho útil (taxa de exergia), conforme segue: dt dVPWW revútil 0�� �� (3.15) Portanto, o balanço de fluxo de exergia é o seguinte: � � � � � � n 0 útil 0 0 i 0 0 0 ger i 1 e si TdW E PV T S 1 Q m h T s m h T s T S dt T� � � �� � � � � � � � � � � �� �� � � (3.16) A Equação (3.16) considera todas as exergias possíveis, sendo o primeiro termo após a igualdade correspondente as exergias de não fluxo, o segundo as trocas de calor, o terceiro e quarto ao fluxo líquido de exergia para cada corrente e o último corresponde às irreversibilidades. Um importante parâmetro a ser observado na análise exergética não é só a irreversibilidade em cada equipamento, que mostra o quanto o equipamento é eficiente em aproveitar a exergia que nele é introduzida, mas, também, a porcentagem da irreversibilidade de c