O conhecer e o pensar na condição de nervuras Raízes e Constelações do Saber Geográfico Acadêmico Brasileiro Guilherme dos Santos Claudino Presidente Prudente - SP 2019 O conhecer e o pensar na condição de nervuras Raízes e Constelações do Saber Geográfico Acadêmico Brasileiro GUILHERME DOS SANTOS CLAUDINO Presidente Prudente - SP 2019 Eliseu Savério Sposito ORIENTADOR Período Sanduíche na Universitat de Barcelona, Espanha, sob supervisão do Prof. Dr. Horácio Capel. Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP), câmpus de Presidente Prudente/SP, para a obtenção do título de Doutor em Geografia. Orientador: Prof. Dr. Eliseu Savério Sposito Auxílio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP): Doutorado Direto (17/18305-3) e Bolsa BEPE (16/11637-8) C615r Claudino, Guilherme dos Santos Raízes e Constelações do Saber Geográfico Acadêmico Brasileiro : O conhecer e o pensar na condição de nervuras / Guilherme dos Santos Claudino. -- Presidente Prudente, 2019 601 f. : il., tabs., fotos, mapas Tese (doutorado) - Universidade Estadual Paulista (Unesp), Faculdade de Ciências e Tecnologia, Presidente Prudente Orientador: Eliseu Savério Sposito 1. Geografia. 2. Pensamento Geográfico. 3. Geografia Brasileira. 4. História da Geografia. 5. Epistemologia da Geografia. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Biblioteca da Faculdade de Ciências e Tecnologia, Presidente Prudente. Dados fornecidos pelo autor(a). Essa ficha não pode ser modificada. por apostarem, muito antes de mim, que a dissertação de outrora poderia se tornar uma tese. por viver a adrenalina de um doutorado ao meu lado, sem recuar. À MARIA, minha avó, por resistir bravamente. Ao JEFFERSON, A ELISEU SPOSITO e HORÁCIO CAPEL, Ao RAFAEL, meu irmão, uma esperança. À IOLANDA, minha querida mãe, fada eterna. AGRADEÇO GERALDA, LURDES, LUIZA e LOSA, este espaço também é de vocês, seres de luz inestimáveis. FREDI, ELINES, TAMIRES e AGDA, À CAMILA, minha irmã, por me ouvir e sacudir meu existir. guerreiros, autênticos em seu modo de ser. A BERNANDO MANÇANO FERNANDES e ROSANA FIGUEIREDO SALVI: A mágica de vocês também faz parte desta tese, desde o momento de qualificação. Pelas contribuições e sugestões durante a defesa. A NÉCIO TURRA NETO e MARCOS AURÉLIO SAQUET: meus melhores e inestimáveis parceiros, AGRADECIMENTOS Uma tese não é realizada apenas com amor, amizade, companheirismo e solicitude. Ela também é movida pelas lutas cotidianas, muitas vezes solitárias, num trânsito entre sanidade e desespero. A cada mão que se estende, outras tantas parecem surgir na mesma proporção, buscando apontar nossas mais íntimas fragilidades. Uma tese, portanto, é erguida pelo amor das amizades mais genuínas e também pelo movimento de negação do nosso existir por outros que nos veem como inimigos e adversários concretos na batalha do conhecimento. A roda da vida pressupõe essa dialética infinita, cabendo a cada ser saber lidar com esse jogo que nunca cessa. Negação e aceitação, assim, vão costurando nossa curta trajetória na casa do saber. Existir pressupõe lutar. E foi a partir de muita luta que a tese ora apresentada foi elaborada, contando com as mais diversas almas para sua elaboração. Nesse sentido, destaco os nomes que alcançaram um estado de divindade no meu caminhar durante oito anos de Unesp, parceiros das batalhas cotidianas e teórico-políticas: Eliseu: Seu espítiro de superação foi fundamental nesses oito anos. Pela liberdade, gentileza e carinho depositado em todos os anos de orientação. Suas dicas e toques precisos permitiram a finalização desta tese. Bernardo: Por ensinar que conflito não é escolha, mas condição. Maria A. Frizarin Cipriano: Por ler minhas ideias e materializar em sua arte. Agradeço, também, pela editoração e elaboração do projeto gráfico pelo qual essa tese não seria a mesma. Whashington Gomes: Por lutar pela política de cotas com muita fibra. e Adriano Amaro, pelas trocas e afetos durante o doutorado. Rizzia Mendes Mares, Marcos Campos, Larissa Coutinho, Dos Bafônicos: Gratidão eterna. Sem vocês este doutorado teria sido bem diferente, talvez sem vida.!! Do Coletivo Mãos Negras: Da AGB e Caderno Prudentino: Gabriel, Rose, Leno, Geissiane, Rodolfo, Wanessa Savoldi, Felipe, Starlony, Luis Martins, Ana Paula Artero Vilela, Vinicius Bonafim, Bruna Sampaio, Mayara Vidal, Natame Assine, Franciele Valadão, Tais Teles, Verônica Flor, Jaque Vieira e Lika Fernandes, Ivonete Alves, Fabiana, Lisie, Carol, Kissy, Do Lar: obrigado pelo acolhimento. Sidney Cássio Todescato Leal, Esdras Veloso, Andressa Rezende, Flávia Timoteo, Ana B, Heroina, Mariana, pela acolhida e recepção. Fátima Costa, por toda gentileza nos diálogos noturnos e todo efeto depositado em nossas transcendências. Dos Veteranos: pelas dicas e recomendações ainda no período de graduação. Da Segunda Família: Da Turma 54: Pelo aprendizado e companheirismo. Da Moradia Estudantil: Angela Machado, por me mostrar que o mundo pode ser visto de outras formas através do seu equilíbrio espiritual. Antonio Sobreira, Antonio Bernardes e Paulo Jurado, continuo aprendendo. pelo aprendizado neste espaço. Da GEOATOS: pelo empenho de nossa equipe. Da Sala da Pós: Eusébio, Baltazar Casagrande, Mariana Niszhima, Lucas Pauli, Rita Gregório, José Maria Langa, Ester, Joice, Angela, Raphael Diniz, Aurélio Bandeira, Robson, Lidiana Pinho, Jean da Silva Cruz, Carlos Eduardo das Neves, Danielli Teixeira, e o Fredi com sua cadeira. E muitos outros que a memória não me ajudou a recordar,pela adrenalina do dia a dia. Marcelo Tenório, José Mariano Caccia Gouveia, Ricardo Pires de Paula, Fátima, Rizzia, Fredi, Lari, Colombo e Fachin, Guilherme Whitacker, Fred Gambardella, Nino, Sid, Lorena e Diógenes, obrigado pelos conselhos acadêmicos. Jocelyn Williams, pelos cafés e diálogos. pelas risadas. Esta pesquisa foi financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), processo nº (17/18305-3) (Bolsa Regular –Doutorado Direto) e processo nº16/11637-8 (Bolsa de Estágio de Pesquisa no exterior – BEPE). As opiniões, hipóteses e conclusões expressas nesta tese são de responsabilidade do autor e não necessariamente refletem a visão da FAPESP. Agradeço aos pareceristas da FAPESP, mesmo sem conhecê-los, pois sempre foram coerentes e gentis em suas avaliações e pareceres. Claudia, Cintia, Aline, André, Lincon, Ivonete e Tamae, Renata Menezes, Vitor Quissi, Lucas Campesino, Eduardo Nardez, Júlia Araújo, Emerson Batista, Carol Xavier, Bruno Vicente, Lucas Araújo, Edson Marcelo, Gabriele Guimarães, Gustavo Negrão, Leticia Lima, Rhaabe Sales, Willians Ventura. Matheus Buttler, João Grassi, Paulo Sérgio, Daniel Divieso, Acássia, Bruno Lopes, Ramon Rocha, Caio Gomes, Cintia Santos, Fabricio Paiva, Gustavo Luis, Geisyelli Raquel, Ana Carolina Matos e Lucas Boscarato (uns amores), Do GASPERR: De Barcelona: Flaviane dos Santos Ramos, Felipe César, César, Yolima, Mariana, Gabriel e Cláudio, obrigado pela recepção! a Unesp não funciona sem vocês. Dos Alunos: O presente trabalho também teve apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superrior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001. Marcelo Werner da Silva, um cara sério mas gente boa, Carminha, Thomaz, João Lima, Everaldo Melazzo, Eda Goes, João Oswaldo, Ricardo, Mariano, Terezinha, Rosangela Hespanhol, Isabel, Marcio Catelan, Rachel Silveira Wrege, Cinthia Ariosi, Paula Vermeersch, Marta Quadros, Arthur, Divino, Antonio Jaschke, Kaka, Claudemira, Girardi, Margo, Nécio Turra, Raul, Magaldi, Marília Coelho, Rose, Nivaldo e Cezar Leal. Guardo em mim um poquinho de cada um de vocês, tão singulares e mágicos. AGRADECIMENTO PELO FINANCIAMENTO Dos Funcionários: Dos Professores: Silvana Silgueiro (biblioteca), Michele, Adrian0, Capitães da areia não tem medo de nada! Revide em eletricidade, meus irmãos. RESUMO Palavras-chave: Saber Geográfico; Pensamento e Conhecimento Geográfico; Constelações; Raízes; Nervuras, Geografia Brasileira, História da Geografia, Epistemologia da Geografia. Processos diversos diferenciaram a trajetória do conhecimento/pensamento que hoje concebemos como geográfico. A história humana revela que, em diversos períodos, o humano – e seu meio subjetivo e material – alicerçou elementos para a efetivação de características que, unidas, dão substância a saberes; e o geográfico não foge à regra. De maneiras distintas e caminhos os mais diversos, geógrafos de diferentes instituições ocuparam-se do exercício de compreensão do saber geográfico. A materialização dessa ocupação cristalizou-se, entre outros resultados, em dissertações e teses. O propósito desta tese, assim, é compreender os estudos, na pós-graduação brasileira, que se voltaram ao pensamento e conhecimento geográfico como objetos de investigação, os quais entendo, contudo, como estudos de saberes. Julgo, portanto, que o saber é uma síntese do conhecer e do pensar. Nesse estado de coisas, identifico que o estudo do saber, na condição de objeto na Geografia brasileira, é investigado por meio de duas dimensões de análise: uma é histórica e outra é teórica-conceitual e propositiva. No interior dessas duas dimensões, concentra-se um conjunto de outros temas de pesquisa. As dissertações e teses foram detalhadamente distribuídas entre essas dimensões e outros subeixos, revelando autores, objetos de pesquisa, instituições onde foram realizadas e datas de quando foram concluídas. Com efeito, os autores e seus respectivos objetos de análise não estão fora do tempo e do espaço, uma vez que são produtos de um patrimônio histórico que os antecede, – pois há o que chamo de raízes – dos quais são inextricavelmente herdeiros. Tais raízes foram propulsoras para o nascimento de constelações de geógrafos que têm como identidade um tema de pesquisa em comum. Analiso, pois, uma parte da produção acadêmica brasileira em Geografia em nível nacional, cuja especificidade são os estudos históricos e epistemológicos do conhecimento e pensamento geográfico na condição de objeto através das noções de raízes e constelações e, ao mesmo tempo, constato que os estudos do conhecer e do pensar geográfico não podem ser investigados separadamente. Nesse sentido, cotejo o saber como uma síntese do conhecer e do pensar, alçado à condição de nervura. Busco, também, representar o devir em relação com o pretérito, o que denomino de presente contínuo do passado vindouro das raízes constelatórias do saber. É, em outros termos, um exercício que procura evocar coisas do passado que ainda não foram ditas, que através da pesquisa podem vir à superfície do hoje, conectando-se através dos sujeitos presentificados. O vindouro é a manifestação do porvir, ou seja, os novos sujeitos-geógrafos que surgirão e passarão a fazer parte do pensamento geográfico. Para representar esses “três tempos”, atribuo e procuro permanecer em estado de prelibação e expectação diante do objeto, conforme poderá ser observado na constelação síntese, que unifica todas em um único tom. A tese, em outros termos, é criação e revelação de um estado de expectativa através de um modo de pensar que se revela através de nervuras. Atribuo e proponho, então, um modo de pensar mais plástico, que considera as relações orientador & orientando imprescindíveis à história da Geografia brasileira e seu estado no período mais recente, conformando raízes constelatórias do saber. ABSTRACT Keywords: Geographic Knowledge; Knowing and Thinking; Constellations; Roots; Ribbing; Brazilian Geography; History of Geography, Epistemology of Geography. Roots And Constellations of the Brazilian Academic Geographic Knowledge Knowing and thinking under the condition of ribbing Diverse processes have differentiated the trajectory of the knowledge/thought that we conceive today as geographic. Human history reveals that, in different periods, the human – and their subjective and material milieu – has underpinned elements for the effectuation of characteristics that, united, give substance to knowledge; and geographic knowledge is no exception. In different manners and in the most diverse paths, geographers from various institutions did engage in the exercise of understanding geographic knowledge. Such occupation came into materialization and crystallized, inter alia, in the form of master's theses and doctoral dissertations. The present doctoral dissertation, therefore, aims to understand the studies, in Brazilian graduate programs, that turned to geographic thought and knowledge as objects of investigation, which I however understand as studies of knowing. I therefore think that knowing is a synthesis of knowledge and thought. In this state of affairs, I identify that the study of knowing, as an object in Brazilian Geography, takes place under two dimensions of analysis: one is historical, and the other is theoretical-conceptual-propositional. A set of other research themes concentrates within these two dimensions. The dissertations and theses were distributed in detail into these dimensions and other sub-axes, revealing authors, research objects, institutions of origin, and dates of conclusion. In effect, the authors and their respective objects of analysis are not outside space and time, since they are products of a historical heritage that precedes them – once there are what I call roots – of which they are inextricably heirs. Such roots were the drivers for the rising of constellations of geographers whose identity underlies a research theme in common. I analyze, therefore, a part of the Brazilian academic work in Geography within the scope of historical and epistemological studies on geographic knowledge and thought as an object considered under the notions of roots and constellations and, at the same time, I discern that such studies should not be investigated on a separate basis. In this regard, I reckon that knowing is a synthesis of knowledge and thought, raised to the condition of ribbing. I also seek to represent the future in relation to the past, what I call the continuous present of the coming past of the constellatory roots of knowledge. In other words, it is an exercise that intends to evoke things from the past yet unsaid, which can now come to the surface through research, and which are connected through the subjects in the present. What is coming manifests in the future, that is, new subject-geographers will emerge and become part of geographic thought. To represent these three periods in time, I realize and attempt to remain in foretaste and expectation regarding the object, as can be seen in the constellatory synthesis, which unifies them all in a single tone. This doctoral dissertation, in other words, is the creation and revelation of a state of expectation through a way of thinking that unfolds by ribbing. Lastly, I feature and propose a more plastic way of thinking that does take into account the advisor-advisee relationship, essential to the history of Brazilian Geography and its state in the most recent period, thus forming constellatory roots of knowledge. RÉSUMÉ Mots-clés: Savoir géographique; Connaissance et pensée; Constellations; Racines; Nervures; Géographie brésilienne; Histoire de la géographie; Épistémologie de la géographie. Des Racines et Constellations du Savoir Géographique Académique Brésilien La connaissance et la pensée sous la condition de nervures Divers processus ont différencié la trajectoire de la connaissance/pensée que nous concevons aujourd'hui comme géographique. L'histoire humaine révèle que, à différentes époques, l'humain – et son milieu subjectif et matériel – a soutenu des éléments pour la réalisation de caractéristiques qui, unies, donnent corps aux savoirs; et la géographique ne fait pas exception. De plusieurs manières et dans les voies les plus diverses, les géographes de différentes institutions se sont engagés dans l'exercice de la compréhension du savoir géographique. Cette occupation s'est matérialisée et s'est cristallisée, entre autres, sous la forme de mémoires de master et de thèses de doctorat. La présente thèse vise donc à comprendre les études, dans les programmes d'études supérieures brésiliennes, qui se sont tournées vers la pensée et la connaissance géographiques comme objets d'investigation, ce que je comprends cependant comme des études de connaissances. Je considère donc que le savoir est une synthèse de la connaissance et de la pensée. Dans cet état de fait, j'identifie que l'étude du savoir, en tant qu'objet de la géographie brésilienne, se déroule sous deux dimensions d'analyse: l'une historique, l'autre théorique-conceptuelle-propositionnelle. Un ensemble d'autres thèmes de recherche se concentre dans ces deux dimensions. Les thèses ont été répartis en détail dans ces dimensions et d'autres sous-axes, révélant des auteurs, des objets de recherche, des institutions d'origine et des dates de conclusion. En effet, les auteurs et leurs objets d'analyse respectifs ne sont pas en dehors de l'espace et du temps, puisqu'ils sont les produits d'un héritage historique qui les précède – une fois qu'il y a ce que j'appelle des racines – dont ils sont inextricablement héritiers. Ces racines ont été les moteurs de la naissance des constellations de géographes dont l'identité partage un thème de recherche commun. J'analyse donc une partie de la production académique brésilienne en géographie dans le cadre d'études historiques et épistémologiques sur la connaissance et la pensée géographiques comme un objet considéré sous les notions de racines et constellations et, en même temps, je trouve que de telles études ne devraient pas être menées séparément. À cet égard, je considère que le savoir est une synthèse de la connaissance et de la pensée, élevée à l'état de nervure. Je cherche également à représenter l'avenir par rapport au passé, ce que j'appelle le présent continu du passé à venir des racines constellatoires du savoir. En d'autres termes, il s'agit d'un exercice qui vise à évoquer des choses du passé qui n'ont pas encore été dites, qui peuvent maintenant refaire surface grâce à la recherche, et qui sont connectées à travers les sujets du présent. Ce qui vient se manifeste à l'avenir, c'est-à-dire que de nouveaux sujets-géographes émergeront et feront partie de la pensée géographique. Pour représenter ces « trois temps », je me rends compte et j'essaie de rester dans un état d'avant-goût et d'attente devant l'objet, comme on peut le voir dans la constellation synthèse, qui les unifie tous d'un même ton. Cette thèse, en d'autres termes, est la création et la révélation d'un état d'attente sous une manière de penser qui se dévoile à travers de nervures. Ainsi, je présente et propose une façon de penser plus plastique qui prend en compte la relation entre les superviseurs et les étudiants supervisés, essentielle à l'histoire de la géographie brésilienne et de son état dans la période la plus récente, formant des racines constellatoires du savoir. Figura 7: Mapa de teses defendidas entre 1944 -1997 Figura 6: Mapa de dissertações defendidas entre 1965-1997 Figura 2: Tableaux accomplis, de C. Savigny (1587) Figura 10: Duas dimensões de investigação Figura 5: O pensamento para Arendt Figura 11: Distribuição das dissertações: o saber geográfico como objeto Figura 14:Constelação como procedimento e como método Figura 1: Arbor scientiae de R. Lúlio (1515: reed. 1635) Figura 12: Distribuição de teses: o saber geográfico como objeto Figura 15: Constelação Figura 4: Modo de pensar histórico-materialista Figura 9: Mapa de teses defendidas entre 1998-2014 Figura 3: Modo de pensar clássico Figura 8: Mapa de dissertações defendidas entre 1998-2014 Figura 13: Raízes rizomáticas Lista de Iustrações 130 159 207 91 90 237 151 121 147 120 209 171 235 167 218 Quadro 5: Esboço de organizações das abordagens de estudo da relação geografia- literatura em trabalho de geógrafos brasileiros pós 1990. Quadro 1: : Número de dissertações e teses: Totalidade e Saber Geográfico até 1997 Quadro 3: Representação dos estudos ligados ao Saber Geográfico Quadro 4: Sistemas de classificação do conhecimento na filosofia Quadro 6: 16 teses: Teoria e método da pesquisa em Geografia Quadro 2: Número de dissertações e teses: Totalidade e Saber Geográfico 1998-2014 Lista de Quadros 48 93 398 46 47 356 Quadro 1: : Número de dissertações e teses: Totalidade e Saber Geográfico Quadro 3: Representação dos estudos ligados ao Saber Geográfico Quadro 5: Abordagens de estudo da relação geografia-literatura no Brasil 1998-2014 Quadro 4: Sistemas de classificação do conhecimento na filosofia Quadro 2: Número de dissertações e teses: Totalidade e Saber Geográfico pós 1990 Quadro 6: 16 teses: Teoria e método da pesquisa em Geografia até 1997 Lista de Constelações 22 25 27 31 29 00 Raízes e Constelações do Saber Geográfico Acadêmico Brasileiro: uma síntese Constelação Lucia Helena de Oliveira Girardi Constelação José Ribeiro de Araújo Filho Constelação Heinz Dieter Heidemann Constelação Aziz Nacib Ab’Saber Constelação Armando Corrêa da Silva Constelação Pasquale Petrone Constelação Bertha Koiffmann Becker Constelação Lívia de Oliveira Constelação Maurício de Almeida Abreu Lista de Constelações 252 335 296 493 494 490 492 375 429 491 Gráfico 9: Tipologia de formação dos sujeitos pesquisados Gráfico 11: Número de personagens de outras formações pesquisados Gráfico 12: Porcentagem das dissertações e teses por temática Gráfico 2: Total de dissertações defendidas em Geografia no Brasil (1965-1997) Gráfico 3: Total de teses defendidas em Geografia no Brasil por instituição (1944-1997) Gráfico 4: Dissertações defendidas em Geografia do Brasil (1998-2014) Gráfico 5: Total de dissertações defendidas em Geografia no Brasil por Instituição (1998 -2014) Gráfico 6: Teses defendidas anualmente em geografia no Brasil (1998-2014) Gráfico 1: Total de dissertações defendidas em Geografia no Brasil por instituição (1965-1997) Gráfico 7: Total de teses defendidas nos Programas de Pós-Graduação no Brasil (1998-2014) Gráfico 8: Distribuição das dissertações e teses biográficas (geógrafos brasileiros e estrangeiros) Gráfico 10: Pesquisas em campos e domínios Gráfico13: Total de dissertações defendidas (1978-2014): o saber geográfico como objeto Gráfico 16: Número de teses por instituição (1953 – 2014): o saber geográfico como objeto Gráfico 15: Número de dissertações por instituição (1978-2014): o saber geográfico como objeto Gráfico 14:Total de teses defendidas (1953 -2014): o saber geográfico como objeto Lista de Gráficos 150 158 168 146 148 157 165 178 204 205 206 208 196 192 184 180 UEPG – Universidade Estadual de Ponta Grossa PUC-SP – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-RIO – Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro UFF – Universidade Federal Fluminense UFMT (T.L.) – Universidade Federal do Mato Grosso do Sul câmpus Três Lagoas UFG (C.C.) – Universidade Federal de Goiás, câmpus Catalão UFBA – Universidade Federal da Bahia SIG – Sistemas de Informação Geográficas UEM –Universidade Estadual de Maringá UEL – Universidade Estadual de Londrina UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais UFES – Universidade Federal do Espírito Santo UECE – Universidade Estadual do Ceará UFC – Universidade Federal do Ceará UFMT – Universidade Federal do Mato Grosso UFGD – Universidade Federal de Grande Dourados UFG – Universidade Federal de Goiás UFPA – Universidade Federal do Pará UFPB – Universidade Federal da Paraíba UERJ (R.J.) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro UFG (C.J.) – Universidade Federal de Goiás, câmpus Jataí UERJ (S.G.) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, câmpus São Gonçalo UFJF – Universidade Federal de Juiz de Fora UFAM – Universidade Federal do Amazonas ANPEGE – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia ENG – Encontro Nacional de Geógrafos FURG – Universidade Federal do Rio Grande AGB – Associação dos Geógrafos Brasileiros CAPES – Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Pualo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IHGB – Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro LDBEN – Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional MEC – Ministério da Educação PPGs – Programas de Pós-Graduação PUC-MG – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Lista de Abreviaturas e Siglas UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro UFSM – Universidade Federal de Santa Maria UNIOESTE (M.C.R.) – Universidade Estadual do Oeste do Paraná, câmpus de Marechal Cândido Rondon USP (G.F.) – Universidade de São Paulo: Geografia Física UFPEL – Universidade Federal de Pelotas UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina UNESP – Universidade Estadual Paulista UNICAMP – Universidade Estadual de Campinas UFRN – Universidade Federal do Rio Grande do Norte USP – Universidade de São Paulo USP (G.H.) – Universidade de São Paulo: Geografia Humana UFRR – Universidade Federal de Roraima UNB – Universidade de Brasília UNICENTRO – Universidade Estadual do Centro-Oeste UNESP (D.T.C.) – Universidade Estadual Paulista, câmpus de São Paulo (Desenvolvimento Territorial) UFPI – Universidade Federal do Piauí UFPR – Universidade Federal do Paraná UVA – Universidade Estadual Vale do Acaraú UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul UNIOESTE (F.B.) – Universidade Estadual do Oeste do Paraná, câmpus de Francisco Beltrão UFS – Universidade Federal de Sergipe UFT – Universidade Federal do Tocantins UFPE – Universidade Federal de Pernambuco UFU – Universidade Federal de Uberlândia UNESP (R.C.) – Universidade Estadual Paulista, câmpus de Rio Claro. UNESP (P.P.) – Universidade Estadual Paulista, câmpus de Presidente Prudente UNIR – Universidade Federal de Rondônia Metodologia e Possibilidades de um Programa de Pesquisa ICapítulo 35 Conhecimento e Pensamento IICapítulo 50 Introdução a três dimensões IIICapítulo 95 Índice Saber Geográ�ico: uma síntese IVCapítulo 123 Dissertações, Teses e a Produção do Saber Geográ�ico VCapítulo 141 Duas Dimensões de Análise do Saber Geográ�ico VICapítulo 170 Bancas Onde? Orientadores Quando? Raízes Nervura Constelação Origens e Inícios – Tempos e Espaços: a questão do nascimento de um saber espacial A Insuficiência do conceito Um Balanço VIICapítulo Raízes, Nervuras e Constelações do Saber VIIICapítulo 8.2 8.3 8.1 8.4 8.4.1 4.1 7.2 7.3 7.4 Raízes Constelatórias IXCapítulo VII VIII 22 25 27 29 195 22 25 27 29 31 214 245 Conhecimento geográfico Seu objeto, como objeto e definições Geografia do conhecimento Breve histórico Sobre alguns temas Pensamento Geográfico Um problema? Gêneros, formas, níveis, graus e divisões: classificações Um diálogo com dicionários e enciclopédias A condição de objeto Conhecimento Pensamento As interpretações Metodologia e Possibilidades de um Programa de Pesquisa ICapítulo 35 1.1 1.2 1.3 1.5 1.4 Seleção e Critérios Tempo Programas de pós-graduação e a busca de dissertações e teses Banco de dados Dissertações e Teses 36 39 44 43 41 I Conhecimento e Pensamento IICapítulo 50 2.3 2.4 2.1 2.2 2.3.1 2.2.1 2.5 59 51 77 73 65 87 84 II Introdução a três dimensões IIICapítulo 95 97 115 111 108 107 100 III 3.1 3.1.2 3.3 3.2 3.2.1 3.2.2 Sumário PRÓLOGO Introdução PROPÓSITOS 29 23 33 Dissertações e Teses (1944 – 1997) Teses A Pós-graduação em Geografia no Brasil Dissertações Dissertações Teses Dissertações e Teses (1998 - 2014) Saber Geográ�ico: uma síntese IVCapítulo Limites do conhecimento e do pensamento como objetos no âmbito da Geografia O Saber Algumas noções O diálogo com Kant O saber geográfico como relação e devir O poder O “lugar nenhum” do pensamento Verdade e significado, conhecimento e pensamento O espaço Localizando o pensamento A Diferenciação Arendtiana 123 124 124 128 129 132 131 134 138 127 131 136 4.2.2 4.2.4 4.1.1 4.1.2 4.1.3 4.1.4 4.1 4.1.5 4.2 4.2.1 4.2.3 Dissertações, Teses e a Produção do Saber Geográ�ico VCapítulo 5.1.2 5.2 5.1.1 5.2.1 5.1 5.2.2 5.1.3 IV 143 143 143 148 152 152 160 V 141 Os Estudos de Perfil Histórico Outros Geografia escolar (geral e específica) Biográfico e bibliográfico (historiadores, economistas e filósofos...) Correntes, escolas, matrizes, paradigmas e tradições Biográfico e bibliográfico (Geógrafos) Teorias Temas híbridos e difusos Campos e domínios disciplinares Espaço Região Território Ensino (conceitos e categorias) Ontologia Dissertações e teses Natureza Literatura Geografia Acadêmica (geral e específica) Cartografia Conceitos e Categorias Lugar Instituições Revistas, periódicos, anais e boletins Paisagem Os Estudos de Perfil Teórico-Conceitual e Propositivo Métodos Epistemologia Dissertações e teses Duas Dimensões de Análise do Saber Geográ�ico VICapítulo 6.1 6.1.2.4 6.2.1.4 6.1.2 6.2.1.6 6.1.2.2 6.2.1.1 6.1.2.3 6.2.1 6.2.1.2 6.2 6.2.1.3 6.1.2.7 6.1.2.8 6.1.2.9 6.2.1.5 6.1.2.5 6.2.1.7 6.2.1.8 6.4 6.2.1.8.2 6.1.2.6 6.6 6.5 6.2.1.8.1 6.1.2.10 6.1.2.1 6.3 VI 170 179 190 198 181 189 193 204 196 193 197 180 175 182 199 203 172 201 185 207 194 183 202 176 191 198 200 206 208 Orientadores Onde? Bancas Quando? Origens e Inícios – Tempos e Espaços: a questão do nascimento de um saber espacial Raízes Nervura Constelação A Insuficiência do conceito Um Balanço VIICapítulo Raízes, Nervuras e Constelações do Saber VIIICapítulo 8.1 8.2 8.4 8.3 8.4.1 4.1 7.3 7.2 7.4 Terra O presente contínuo do passado vindouro das raízes constelatórias do saber Lívia de Oliveira Aziz Nacib Ab'Saber Clima Pasquale Petrone Psique Forma Armando Corrêa da Silva Método Raízes Constelatórias IXCapítulo 9.1 9.1.1 9.1.2 9.2 9.2.1 9.3 9.3.1 9.4 9.5 9.4.1 VII VIII IX 206 204 197 203 195 216 232 219 230 227 297 336 291 253 264 365 426 329 246 376 214 245 433 470 489 430 Dissertações e Teses consultadas Conclusões Apêndices Referências 23 Esta tese tem como proposta investigar um segmento de pesquisa na Geografia brasileira conhecido tradicionalmente como pensamento geográfico. De um modo geral, pensamento geográfico significa a fusão de dois universos: o pensar e o espaço. De um modo mais específico, refere-se a uma relação do humano com o mundo, isto é, o ser, o estar e o existir da condição mundana e terrena do social com o espaço. Tal relação gera algo que, preliminarmente, denomina-se pensamento geográfico, pois confere-se um julgar sobre as coisas através da dialética ser- mundo, tendo-se, então, um discurso. Em outras palavras, a formulação de um juízo sobre o mundo pressupõe e materializa um pensar sobre ele. Esse pensar é um atributo de toda criatura viva, e o espaço, portanto, salta como uma via de determinação: o geográfico e/ou geograficidade. Aos geógrafos, o pensamento geográfico supõe o tino qualificador do objeto-método do seu realizar científico. Meu primeiro contato com esse tema foi ainda na graduação, na habitual e singular disciplina de História do Pensamento Geográfico, presente em todos os currículos de licenciatura em Geografia como um conteúdo supostamente obrigatório. Nesse primeiro momento, em meados de 2011, o professor Antonio Thomaz Júnior¹ ministrou a respectiva disciplina. Ali, com toda a empolgação que são as aulas do Thomaz, choviam dezenas de nomes de geógrafos, correntes, escolas, tendências, lutas, determinismo, possibilismo, enfim, toda a matéria, já há muito conhecida por todos, pipocava feito meteoros rasantes em suas aulas. Associar e memorizar tantos nomes, coisas e acontecimentos parecia-me impossível. Isso me conduziu a vasculhar todos os livros que tratavam de “pensamento geográfico” na biblioteca do câmpus. Livro a livro, sem uma leitura Esse pensar, que coexiste com o espaço, vem sendo, há mais de um século, objeto de investigação. A presente proposta, assim, mergulhou nesse segundo movimento do objeto, não o pensamento geográfico em si, mas o pensamento sobre esse pensamento, uma análise do discurso do discurso. Realiza-se uma investigação sobre a matéria já trabalhada, o produto do já dito. Há que se considerar, todavia, que o pensamento geográfico é utilizado, historicamente, como uma expressão flutuante, cravada, por vezes, como um atributo de todo geógrafo em seu ato de reflexionar sobre o mundo. Mas pensar, curiosamente, não é uma atividade exclusiva do geógrafo, tampouco o pensar sobre o espaço. E é justamente nesse outro movimento que o pensamento geográfico, enquanto objeto, ergue-se como um tema de investigação genuíno, conformando, de diferentes modos, programas de pesquisa de toda natureza há pelo menos oito décadas na Geografia brasileira. PRÓLOGO P R Ó L O G O ¹ Professor na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Faculdade de Ciências e Tecnologia de Presidente Prudente. 24 Nesse momento, constatei que procurar um orientador seria mais sadio. Foi então que conheci meu hoje amigo e orientador Eliseu Savério Sposito². Inicialmente, sugestionou que eu estudasse um autor, apenas um. Deu-me três meses para pensar, e, nessa busca, já eu cursava outra disciplina, Metodologia de Pesquisa, com Bernardo Mançano Fernandes³. Aproveitando a dinâmica da disciplina, levei até Bernardo o desafio posto pelo Eliseu. Bernardo, prontamente, sugestionou: “escolha um morto, pois os vivos darão problemas”. A partir daí, então, selecionei dois geógrafos que julguei mais interessantes: Armando Corrêa da Silva e Manuel Correia de Andrade. Escolhi o segundo e, rapidamente, levei até o Eliseu, que abraçou a proposta com muita empolgação, bem mais do que eu. Eliseu é assim, acredita mais na pesquisa do que os próprios orientandos – reside aí seu diferencial enquanto orientador. Finalizada a iniciação científica e Manuel, de certa forma, “esgotado”, o mestrado despontou-se como alternativa para continuação do meu existir acadêmico. Foi então que decidi propor um outro projeto de pesquisa, um pouco mais ambicioso, conforme exigem as etapas acadêmicas. Juntamente com Eliseu, optamos por catalogar todas as dissertações e teses produzidas no Brasil que equilibrada e planejada, fui mergulhando no labirinto de diversas histórias desse pensar, motivado, preliminarmente, pelas diferentes tensionalidades que Thomaz causava em todos os alunos. Com Manuel, conheci a Geografia brasileira durante meu percurso de iniciação científica. Realizei um levantamento de toda a sua obra, somando-se mais de cem livros publicados. Busquei ler os mais importantes durante quatro anos, gerando um resultado bastante curioso, pois descobri que Manuel fora fundamental não apenas para a Geografia nordestina, mas para a construção de uma Geografia eminentemente brasileira. Nesse meio tempo, fui selecionado para um intercâmbio na Universidad de Santiago de Compostela, Espanha, lugar que conheci e frequentei durante um semestre aulas de Filosofia da Ciência, possibilitando-me um primeiro contato com os clássicos do assunto: Karl Popper, Thomas Kuhn, Imre Lakatos, Paul Feyerabend e Larry Laudan. Esse contato mais aprofundado com essa literatura reforçou meu interesse ao estudo “pensamento geográfico”. Embora tenha surtido um encantamento e empolgação com esses sujeitos inicialmente, acabei, derradeiramente, afastando-me de suas formulações, pois às ciências humanas, de uma forma geral, não é dada a merecida atenção por esses. P R Ó L O G O ² Professor da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Faculdade de Ciências e Tecnologia de Presidente Prudente. ³ Professor na Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Faculdade de Ciências e Tecnologia de Presidente Prudente. 25 No primeiro ano de mestrado, 2015, iniciei o levantamento de dissertações e teses, programa a programa. Decidi iniciar da gênese, década de 1940, e pousar em 2015, momento que se fazia presente. Realizei, então, o primeiro censo total de toda a produção acadêmica brasileira que compreende dissertações e teses. Esse exercício foi efetuado três vezes durante oito meses – com o temor de deixar algo de fora, insistia na repetição do exercício. Cheguei a 11.521 materiais. Desses, apenas 381 representavam o conteúdo do “pensamento geográfico” como objeto, meros 3.3 % da totalidade. Feito o levantamento e selecionado o material, iniciei a saga até as bibliotecas onde os trabalhos estavam depositados. Por conta disso, realizei trabalhos de campo dezenas de vezes na Biblioteca Florestan Fernandes da FFLCH/USP, pois seu acervo contém a matéria prima das raízes da pós-graduação brasileira em Geografia. No final do primeiro andar, na última direita, localiza-se o quadrante que reúne as almas à espera de serem revividas. Igual procura repetimos em Rio Claro na Biblioteca Instituto de Biociências da UNESP, no Rio de Janeiro na Biblioteca Central do CCMN – UFRJ, em Pernambuco na Biblioteca do Centro de Filosofia e Ciências Humanas CFCH – UFPE e em Santa Catarina na Biblioteca Universitária BU – UFSC. Essas universidades foram as primeiras a iniciar o processo de formação de mestres e doutores em Geografia no Brasil antes do século XXI. Por conta disso, muitos trabalhos, praticamente todos, não se encontravam em versão online. O contato empírico com esses materiais foi fundamental. Por mais estranho que pareça, o papel velho tem cheiro, cor, localização, marcas de mãos, cafés derramados, e, o mais essencial, anotações das bancas avaliadoras: rabiscos, críticas, elogios, indicações, sugestões gramaticais etc., vidas que se cruzam entre o autor e o leitor inconsequente. Mas há, curiosamente, aqueles que não contêm marcas, somente a poeira do tempo aliada aos ácaros que revelam formidável resistência. Intocados, aparentemente, em sua condição estática na prateleira que os sepultam nas fileiras apertadas, esses trabalhos disputam pequenos centímetros para ali se eternizarem, à espera de um toque e do olho que se fixe nas letras infinitas do papel que se amarela, sendo, pouco a pouco, corroído pelo próprio tempo. Existe uma mágica muito sedutora no folhear desses materiais, pois, já nas primeiras páginas, os autores declaram seus agradecimentos aos familiares, trataram do “pensamento geográfico”. Eis que surge a questão: “o que é uma pesquisa sobre pensamento geográfico?” Supostamente, toda pesquisa realizada por geógrafos trata do pensamento geográfico. Mas nosso interesse era outro: o pensamento que pensou o pensamento geográfico no Brasil. P R Ó L O G O 26 amigos, entes que se foram, enfim, marcas da própria vida que se impõe. O principal obstáculo durante a elaboração desta tese foi o encantamento que os materiais surtiam sobre mim, pois cada tese ou dissertação, boa ou ruim, tem seu sentido de ser através do malabarismo do acaso e da necessidade para sua construção, pois são reféns das próprias adversidades do jogo da vida. Há uma riqueza abundante em cada trabalho, e o julgar sobre os mesmos será sempre limitado; contudo, é necessário e urgente que o façamos. A produção acadêmica brasileira de dissertações e teses vem alcançando cifras anuais de quase mil trabalhos. Ano a ano, vai somando um número considerável de reflexões que reclamam uma metodologia que lhe acompanhe e compreenda. Este é outro propósito da tese: o de desenvolver uma metodologia que reconheça o devir incessante dos números que só aumentam. Em uma linguagem mais objetiva, procuro elaborar um panorama geral do que se produziu na Geografia brasileira em um determinado seguimento investigativo – isso explica a quantidade exagerada dos apêndices e anexos no final deste trabalho. Julgo, então, que a reprodução integral dos nomes possa favorecer uma consulta mais objetiva e dinâmica pelo leitor, não necessitando refazer outros levantamentos semelhantes. A proposição metodológica da tese se assenta em quatro conceitos: i) saber, ii) raízes, iii) constelações e iv) nervuras. Do saber, chamo atenção à sua extensão conceitual, pois guarda tanto o pensar quanto o conhecer em seu núcleo, entendendo, portanto, que o saber é mais abrangente que o pensamento em relação à condição de objeto, pois o saber agrega também o conhecimento. Saber é uma Em sua condição finita, esses trabalhos – os tocados e os intocados – conectam-se pela Geografia, fixados na eternidade dos acervos, lugar que aguarda todos nós, geógrafos, espaço que reúne o magma do que chamamos de pensamento geográfico. Este foi o objeto de análise da presente tese, que se iniciou como dissertação e, posteriormente, indicada a tese de doutoramento em 2017. Nesse momento de transição, 2016, realizei um período de estudos na Universitat de Barcelona – UB, sob orientação do geógrafo Horácio Capel. Durante seis meses, vasculhei todo o acervo da UB interessante à Geografia, notadamente dissertações e teses. Nessa biblioteca, tive contato com livros de história da Geografia datados do século XIX, como a extensa obra do francês Vivien de Saint Martin Histoire de la géographie et des découvertes géographiques depuis les temps les plus reculés jusqu'à nos jours, publicada em 1873. Capel foi fundamental nesse aspecto mais histórico. Além da leitura atenta e gentil de cada capítulo, sugestionou a restruturação de todo o esqueleto dos capítulos previamente elaborados. P R Ó L O G O 27 síntese do conhecido e do pensado. Das raízes, entendo, preliminarmente, os orientadores mais expoentes no tema posto. Para fugir da ideia de árvore e suas hierarquias, adjetivo o conceito de raíz através dos rizomas, pois as raízes do saber são muitas. Raízes, por consequência, pressupõem que o saber foi produzido em algum lugar e, além disso, foi realizado por alguém. Evidentemente que a palavra raiz poderia ser substituída por processos, origens, início etc. Essas palavras, todavia, são destituídas da dimensão material, concreta, da realidade objetiva, e, sobretudo, do toque espacial interessante a nós, geógrafos. Pois, veja-se, é uma questão histórica que se impõe, e os recortes são fundamentais para o realizar da atividade científica. Utilizar o termo raízes, então, foi um mecanismo para não cairmos na armadilha da transcendência da história, pois “início”, “origem” e “processo”, são, grosso modo, tudo que nos antecede nas profundezas do tempo. O conceito de raízes, contudo, não possibilitava o entendimento conectivo e visual da dinâmica do presente em relação a multidão de geógrafos que vêm, dia a dia, se formando nos cursos de pós-graduação. Dado que um dos objetivos é proporcionar um panorama geral do que vem acontecendo na Geografia brasileira, recorri a mais um conceito: constelação. Descobri essa palavra em um livro de Karl Mannheim (1967) sobre sociologia do conhecimento, porém utilizei-me da proposta de Theodor Adorno (2009 [1966]) que fora apropriada de Walter Benjamin (1984 [1928]). Entendo, nesse sentido, a árvore dos geógrafos brasileiros através do conceito de constelação. Para tanto, conectei cada alma através do vínculo inevitável de orientação. Nesse momento, preliminarmente, não me interessa a relação existencial orientador-orientando, apenas o vínculo formal. A integração desses conceitos possibilitou denominar a presente tese de Raízes e Constelações do Saber Geográfico Acadêmico Brasileiro: o Conhecer e o Pensar na condição de Nervuras. Alerto, neste particular, que a proposição O vínculo existencial da constelação de orientações é interpretado através de outro conceito: o das nervuras. Como nervos que latejam e percorrem as partes do corpo, as nervuras sustentam uma determinada totalidade. Compreendo as nervuras enquanto a pulsão, tensão, ou seja, os conflitos e disputas das ideias entre os geógrafos que vão sendo herdadas geração a geração. A pulsão que tenciona a todos, todavia, nem sempre é herdada, uma vez que os mais jovens também criam outros fronts, desenhando, então, para continuarmos com metáforas, verdadeiros belts nos departamentos, eventos, publicações, etc. A noção de nervuras, em outros termos, poderia ser substituída por aquilo que Thomas Kuhn (2011 [1977]) chamou de “tensão essencial” da atividade científica. P R Ó L O G O 28 propriamente dita – raízes constelatórias – aparece a partir do capítulo 9. Nos capítulos de 1 a 7, desenvolvo a metodologia de investigação e no 8 o modo de pensar, esmiuçando cada conceito utilizado – raiz, constelação e nervura –, pois o método, conforme nos lembra Antonio Candido (1962, p. 18), “precisa ser histórico e estético”. Se a tese conseguir ser convidativa e interessante às críticas, ficarei satisfeito, pois é assim que o conhecimento caminha, empurrado pelas tensões, lei primeira da produção do saber científico.⁴ P R Ó L O G O ⁴ Utilizo a primeira pessoa no singular pois, inevitavelmente, tive que recorrer a aspectos particulares. Adianto, todavia, que o decorrer da tese será em primeira pessoa do plural. 29 O primeiro foi o de construir um produto didático e introdutório de um pedaço do universo acadêmico dos geógrafos brasileiros. Esse propósito amarra-se em um objetivo mais geral, isto é: dar ao leitor uma visão panorâmica do estado das coisas em dada temática de pesquisa. Esse panorama, por vezes denominado sobrevoo, é fundamental para que nós, geógrafos, saibamos o que se faz e se produz em diferentes lugares, regiões e, ainda, em temporalidades distintas no desenrolar da coisa acadêmica, conhecida também como fatos científicos. Nem sempre nosso lugar comporta o mundo e, então, com certa medida, precisamos sobrevoar outros lugares e ideias para que possamos compreendê-los em relação ao nosso próprio eu. Os propósitos do autor podem não ser os mesmos do leitor diante de um texto. As rotas de uma tese, portanto, resguardam uma certa imprevisibilidade em relação a seus caminhos previamente estabelecidos. Compreendemos, todavia, que alguns propósitos podem ser emitidos, baseando-se no conjunto de coisas que constituem esta tese. Basicamente, são três propósitos que guiaram nosso caminho. Entendemos, também, que a plasticidade [por sua amplitude conceitual] do termo pensamento geográfico necessita de investigações que o descortine à luz de todos. Nesse sentido, acreditamos que a elaboração de um produto didático promova o conhecimento e o interesse de jovens geógrafos quanto ao universo de que trata o tema desta tese. Vejam-se as seguintes questões: O que é pensamento geográfico? O que é pensar? Quem estudou o pensamento geográfico no Brasil? – indagações relativamente simples, mas fundamentais à compreensão do escopo da ciência geográfica. Procuramos, de diferentes modos e de forma sensível, responder essas dúvidas. Para tanto, realizou-se um mapeamento de toda produção acadêmica brasileira⁵. Nos anexos e apêndices ao final deste trabalho, é possível consultar cronologicamente os estudos que tiveram o pensamento geográfico como um objeto de estudo, assim como sua distribuição em diferentes A precisão, tal como sugere o compasso sobre o papel na elaboração de geometrias e círculos, é um alvo que uma tese de doutorado – durante sua realização – necessita perseguir. Dar ao leitor um círculo fechado e preciso, destituído de desvios e anamorfoses, supostamente é o fundamento primeiro de uma tese. Precisar, por seu turno, nem sempre está no plano do possível, notadamente quando a vida é a medida buscada enquanto objeto diante do papel e da caneta. Entendemos, assim, que, por mais retilíneos que sejam os objetivos de uma investigação, lançados ao vento, eles jamais seguirão uma única rota. PROPÓSITOS P R O P Ó S IT O S ⁵ Dissertações e teses em Geografia. 30 categorias e variáveis temáticas. Na esteira desse intento, emerge nosso segundo propósito, movimentado pela seguinte questão: Como construir um juízo sobre uma multidão? Sabe-se, hoje, que há muitas escolas de formação de mestres e doutores em Geografia, o que torna a compreensão do “pensamento geográfico brasileiro e seus geógrafos” um empreendimento ousado e, por assim dizer, inexequível a uma única tese. Além dos muitos sujeitos envolvidos na construção do pensamento geográfico brasileiro, as ideias não são estáticas e, a cada tempo, vão surgindo novos geógrafos. O devir, consequentemente, passa a fazer parte do jogo, pois não só o tempo passado é do interesse da filosofia da ciência, mas também os caminhos ainda vindouros. Assim, é necessário que reformulemos a questão do respectivo modo: Como construir um juízo sobre uma multidão em constante mudança? É necessário desenvolver, pois, um modo de pensar que compreenda as determinações da totalidade em devir. Sabemos que os conflitos são inerentes à nossa existência. Toda criatura, em sua condição de vida, vê-se diante de tensões, ora consigo, ora com um outro. Produzir conhecimento é um movimento que tenciona a própria vida e, como tal, não é destituído de antonímias. A conflitualidade, portanto, não é apenas sinônimo de problema, mas também de vida. Sua ausência pode indicar um entrevero, uma normalidade que é estranha à própria condição de existência dos seres. A tensão do próprio existir é pensada, por vezes, em relação aos macros movimentos da história, sendo certas particularidades perdidas no movimento conduzido pela totalidade. Propomos, neste trabalho, reunir essas partículas aparentemente perdidas na história recente da Geografia brasileira e elevá-las à condição de nervuras, pois entendemos que a relação, ainda que pequena e íntima do processo de orientação – orientando & orientador –, pode revelar elementos pouco observados pelos estudiosos das relações acadêmicas no interior de nossa Geografia. Esse modo de pensar, por sua própria limitação, restringe-se à Nosso modo de pensar, conforme apontaremos em detalhes mais adiante, é estruturado através de quatro termos: saber, raízes, constelações e nervuras. Em sincronia, formam o que denominamos de raízes constelatórias do saber. As raízes representam os elementos pretéritos – o tempo – personificados em geógrafos e seus temas investigados. A constelação é o fio que conecta cada alma do passado às presentificadas. No interior das constelações, certos acontecimentos se destacam. Aqui, damos ênfase à tensão da existência humana em relação ao exercício científico, tensão esta que denominamos de nervura. P R O P Ó S IT O S ⁵ Dissertações e teses em Geografia. 31 Alertamos que a leitura não necessita ser linear, podendo, à vontade do leitor, escolher os pedaços que mais lhe agradam, até porque a presente tese não deixa de ser um trabalho de consulta e de carácter bibliográfico. Por isso, também, estruturamos o último capítulo em cinco categorias: I) forma; II) clima; III) terra; IV) psique e V) método. Cada uma dessas categorias trata de um tom temático na Geografia produzida no Brasil. Parecem, se observadas separadamente, de pouco diálogo entre si, uma vez que construímos narrativas particulares para cada qual. Por conta dessa aparente distopia de diálogo, o leitor precisa compreender que “Geografia brasileira” é uma totalidade dentro da qual os sujeitos-geógrafos são ligados através da/pela Geografia, conformando sua identidade científica, que será eterna à história da ciência. Tratamos de partes, mas reconhecemos o lugar de cada uma nessa totalidade que está em pleno devir, que é a Geografia brasileira. Procuramos representar, de forma imagética, cada constelação, de modo que o leitor possa identificar facilmente que deixamos muita coisa ainda a ser pesquisada e discutida. Em cada finalização das constelações, raramente estabelecemos um juízo definitivo, pois consideramos que o congelamento de tudo em nome de conclusões finais petrifica o real em razão de uma orientação científica que, em verdade, violenta a manifestação da realidade através do pensar e do conhecer. Buscamos, a cada finalização, deixar o fluxo das coisas em aberto, passível de outras inclusões e modificações. A organização e a estrutura desta tese foram pensadas, unicamente, com base na possibilidade de o leitor compreender panoramicamente o desenrolar de um objeto de pesquisa nas investigações dos geógrafos. Certos juízos de outras ordens podem, naturalmente, aparecer concatenados através dos desvios do autor em suas digressões, por vezes, exageradas. Nossa intenção, nesses momentos de exageros, foi a de apenas incluir e lembrar o leitor sobre as confluências infinitas que antecedem os fatos em seu acontecer. contemplação do objeto, galgando, em rápidos momentos, tentativas de julgamento que se esvanecem diante do fluxo constante da abundância dos acontecimentos. Representar o devir em relação com o pretérito é o terceiro propósito de nossa tese, o que chamamos de presente contínuo do passado vindouro das raízes constelatórias do saber. É, em outros termos, um exercício que procura evocar coisas do passado que ainda não foram ditas, as quais, através da pesquisa, podem vir à superfície do hoje, conectando-se através dos sujeitos presentificados. O vindouro é a manifestação do porvir, ou seja, os novos sujeitos-geógrafos que P R O P Ó S IT O S 32 A constelação síntese é o pressuposto principal da nossa hipótese, isto é: não se compreende unidades isoladas, mas em coexistência, não se entende, portanto, estrelas solitárias mas em constelações. Existir supõe coexistir. Nossa tese, em outros termos, é criação e revelação de um estado de expectativa através de um modo de pensar que se revela através de nervuras. surgirão e passarão a fazer parte do pensamento geográfico. Para representar esses “três tempos”, atribuímos e procuramos permanecer em estado de prelibação e expectação diante do objeto, conforme poderá ser observado na constelação síntese (consultar página 429), que unifica as anteriores em um único tom. P R O P Ó S IT O S 33 No primeiro capítulo, descrevemos a metodologia utilizada e os recortes efetuados. Nos capítulos 2, 3 e 4, apresentamos nosso entendimento em torno da relação do pensamento e do conhecimento, bem como o respectivo desdobramento destes no saber, esmiuçando e revelando os significados do geográfico nos três casos, rumando aproximações ao saber geográfico. Selecionamos o que comumente é conhecido como estudo do pensamento geográfico. Entendemos que investigações dessa natureza representam uma temática de pesquisa na Geografia acadêmica. Contudo, não é um tema que se apresenta de modo claro e, além disso, faz par com outro termo não menos complexo: o conhecimento geográfico. Este trabalho, assim, objetiva mapear a produção de dissertações e teses de 1944 até o final de 2014, cuja temática é o pensamento e o conhecimento geográfico como objetos de estudo. A expressividade desse tipo de investigação, bem como os limites e possibilidades dos termos pensamento e conhecimento como objetos, tornou-se um dos tópicos desenvolvidos nos capítulos deste trabalho. A presente tese divide-se em três momentos: I) um primeiro, mais filosófico e conceitual [capítulos 1, 2, 3 e 4]; II) um segundo, descritivo [capítulos 5, 6 e 7]; III) e o terceiro, propositivo e analítico [capítulos 8 e 9]. Essa divisão não deve ser vista com muita rigidez, afinal, a análise e a descrição percorrem, de certo modo, todo o trabalho, porém ganham maior destaque nos momentos os quais destacamos. Partindo de 1944, momento de defesa da primeira tese de doutorado em Geografia no Brasil, até 2019 (75 anos), a pós-graduação em Geografia e a respectiva produção de dissertações e teses completa sete décadas de existência. Mais de dez mil trabalhos, entre dissertações e teses, foram defendidos e concluídos, novos temas de pesquisas foram sendo integrados, outros eliminados, metamorfoses, avanços e recuos acometeram a pós-graduação em Geografia no Brasil, desenhando a atual imagem das pesquisas de que hoje somos parte – uma produção bastante expressiva que, em sua totalidade, é uma verdadeira incógnita a ser decifrada. Esta pesquisa tem como propósito compreender uma pequena fração desse todo. Esse exercício, todavia, pode ser realizado de diversos modos, variando com a temática e o tempo escolhidos à investigação dessa produção. O capítulo 5 tem descrita e analisada a produção total de dissertações e teses em todos os programas de pós-graduação no Brasil, da gênese até o final de 2014. No capítulo 6, nos dedicamos aos trabalhos referentes à história e aos debates teórico-conceituais e propositivos do saber geográfico. Introdução In tr o d u çã o 34 É um empreendimento que objetiva construir e contribuir com um o quadro panorâmico e sistematizado das dissertações e teses produzidas no Brasil na referida temática, revelando os autores, instituições nas quais foram realizadas, temas estudados, orientadores etc. O capítulo 7 revela o lugar da produção das dissertações e teses (objeto), quando foram realizadas, quem orientou e participou das bancas, traduzindo-se, assim, como um capítulo balanço dos anteriores. Esses sete capítulos, assim, têm três objetivos principais: I) entender o conhecer e o pensar como objeto no âmbito das ciências e da filosofia; II) comprovar que o saber é uma síntese do conhecer e do pensar enquanto objeto III) descrever a produção acadêmica brasileira (dissertações e teses) em sua totalidade e, respectivamente, identificar os trabalhos que tiveram o saber com objeto. Esses capítulos, portanto, almejam possibilitar uma visão geral dos estudos históricos e teórico-conceituais e propositivos do saber geográfico, expressos em dissertações e teses na pós-graduação em Geografia no Brasil. Expoem-se, assim, as teorias, conceitos, métodos e categorias estudadas e propostas, bem como os geógrafos, instituições, escolas, correntes e as respectivas relações com os instrumentos e ferramentas de investigação: antropologia do conhecimento, epistemologia, gnosiologia, história intelectual e da ciência, ontologia e a sociologia do conhecimento etc. Os capítulos 8 e 9 figuram-se como o último momento da nossa investigação. Entendemos que os autores e seus respectivos objetos de análise não estão fora do tempo e do espaço – uma vez que são produtos de um patrimônio histórico que os antecede, pois há o que chamamos de raízes –, dos quais são inextricavelmente herdeiros. Essas raízes, todavia, não respondem e tampouco permitem decifrar o atual estado da Geografia brasileira. Tais raízes foram propulsoras do nascimento de constelações de geógrafos que têm como identidade um tema de pesquisa em comum. Essas constelações são animadas por determinadas tensões inerentes à atividade científica. Denominamos essas tensões de nervuras. Nesse sentido, a parte final desta tese resume-se em três conceitos: raízes, constelações e nervuras; cuja sustentação que os segura é o saber geográfico. In tr o d u çã o Metodologia e Possibilidades de um Programa de Pesquisa I Capítulo 36 O pensamento geográfico é uma das palavras-chave desses estudos cuja uti l ização aparece em maior número. Evidentemente que pensar geograficamente, de longe, não pertence unicamente ao ofício do geógrafo e, assim, encontraríamos Geografia onde há o pensar e o situar-se em algum lugar, espaço, território sobre o qual se constroem discursos. Essa condição enriquece, ao passo que também coloca um desafio aos historiadores (geógrafos) das ideias e dos fatos geográficos frente a um leque amplo a se explorar. Nesse explorar, a pós- graduação brasileira materializou ideias e experiências em dissertações e teses, as mais diferentes perspectivas, definindo e contribuindo com os rumos da pesquisa em Geografia no Brasil. O material que analisamos compõe-se, em suma, das dissertações e teses defendidas em Geografia no Brasil, fonte donde fluíram nossas reflexões no presente trabalho. No início da proposição desta pesquisa, dois caminhos apresentaram-se como possíveis, embora distintos. Por um lado, a produção de dissertações e teses inaugurada com a primeira defesa de Maria da Conceição Vicente de Carvalho, em 1944, no Departamento de Geografia Humana da Universidade de São Paulo – USP, até as mais recentes, conformam aproximadamente doze mil trabalhos entre dissertações e teses defendidas no Brasil⁶, constituindo a imagem material e discursiva do pensamento/conhecimento geográfico brasileiro em termos de pós- graduação, ou seja, este total (doze mil defesas), e seu consequente estudo, configuraria um possível caminho para entender o estado do conhecimento geográfico brasileiro através da pós-graduação (dissertações e teses) em sua totalidade. Esse caminho, contudo, pela amplitude de trabalhos e pelo tempo que nos valeu, é impossível e por demais pretencioso para o momento. O propósito deste trabalho reside na tentativa de compreender o que vem sendo um conjunto de estudos os quais se intitulam como história do pensamento geográfico, epistemologia da Geografia ou, simplesmente, teoria e método dos estudos geográficos. Essas expressões, comumente recorrentes no vocabulário dos geógrafos, constituem-se em estudos essencialmente históricos da Geografia, almejando compreender autores, tradições, correntes, paradigmas, conceitos, categorias, versando um enredo que perpassa a contribuição científica, indo das obras de arte a letras de canções enquanto objeto de análise, numa procura do que tem de geográfico no real. Estes termos – história, epistemologia, teoria e método – ligam-se a outras frentes de investigação, cujos diálogos desenham uma temática de pesquisa como outras tantas então presentes na Geografia acadêmica. Seleção e critérios I S el eç ã o e c ri té ri o s 1.1 ⁶ Contabilizamos até o ano de 2014 essa referida quantidade, que será demonstrada com maiores detalhes no capítulo quatro. 37 Mediante este breve panorama que rapidamente apresentamos entre as pesquisas históricas ligadas, como se supõe, a dimensão do tempo passado das práticas dos geógrafos, tal como as ideias geográficas e de todo ato de pensar e conhecer geográfico oriundo de diferentes fontes, materializando-se, consequentemente, de diferentes formas e em lugares, os mais diversos, representando o campo de atuação, em nosso entender, histórico nessa temática de pesquisa. Caminhando ao lado desta, temos as pesquisas teórico-conceituais e propositivas⁷, cuja ligação com a filosofia e a sociologia representa, entre outros domínios do saber, um maior diálogo em quase toda sua extensão de análise e de apoio. Cabe ponderar e lembrar que houve pesquisas que se dedicaram à compreensão do “estado do conhecimento” ou “estado da arte”, as quais não são necessariamente históricas, de modo que também não podemos O outro caminho, que aqui trilhamos, procurou identificar trabalhos que estudaram a história do pensamento/conhecimento geográfico brasileiro. É a história que suleou esta pesquisa. Desse modo, foi necessário que delimitássemos o que, então, compreenderia um trabalho sobre história do pensamento/conhecimento geográfico, os capítulos 2 e 3 procuraram responder a esse desafio. Como afirmamos, a história guiou nosso primeiro levantamento sobre os estudos que constituem tal gênero de pesquisa como objeto. Ademais, a partir do primeiro levantamento, abraçamos a hipótese de que as pesquisas apenas históricas das práticas e das ideias geográficas não incluíam, como imaginávamos, a totalidade que esse gênero de pesquisa representa atualmente no universo investigativo realizado pelos geógrafos na referida temática. Desse modo, junto aos estudos históricos, consideramos também como ligado ao tema as abordagens de pesquisa epistemológicas, ontológicas e conceituais (que são, indiscutivelmente, para muitos geógrafos, estudos do pensamento/conhecimento geográfico). O tom dessas pesquisas, diferentemente das históricas, são, quase sempre, de caráter propositivo, orientado por problemas filosóficos e sociológicos da Geografia no período de então. Isso não descarta a relação com a história, tampouco dos estudos históricos com tais problemas, de fundamento teórico-conceitual. Além do que já dissemos, pode-se incluir sem temeridade a preocupação, por parte dos geógrafos, com os procedimentos e metodologias, o método, as técnicas no trabalho do geógrafo, relações com a arte e o senso comum, bem como, no caso da filosofia, da presença de reflexões gnosiológicas e da teoria do conhecimento. São, decerto, universos que representam, hoje, dois caminhos de pesquisa que se cruzam, cujas relações são tênues e de difícil separação, mas que também não podem se confundir. I S el eç ã o e c ri té ri o s ⁷ Nos capítulos três e quatro é pormenorizada a metodologia que utilizamos para capturar dissertações e teses neste gênero de estudo. 38 Nas pesquisas teórico-conceituais e propositivas, o universo é mais movediço quando pretendemos capturar dissertações e teses classificadas, neste caso, como “teóricas e conceituais”. Afirmar que uma dissertação é conceitual ou teórica demanda um conjunto de critérios muito bem definidos para que não cometamos equívocos no plano do método e do pensamento do autor que elaborou determinada dissertação ou tese. Não faz parte do caráter deste trabalho determinar se dado geógrafo foi “teórico” ou não em seu exercício intelectual e, de outro ponto de vista, afirmar que a pesquisa tenha sido apenas “empírica”. O nosso interesse é outro. O propósito é reunir os trabalhos que se dedicaram à compreensão – como objeto – de conceitos e categorias mais recorrentes na Geografia: neste caso, é importante o esclarecimento; referimo-nos a paisagem, lugar, região, território e espaço. Ainda assim não descartamos o exercício de reunir em um quadro separado trabalhos que se dedicaram a outros conceitos, como o de natureza, o conceito de camponês, entre outros; no entanto, cabe aqui repetir que nossa atenção mirou os conceitos mais recorrentes na Geografia, como referido acima. Além desses elementos, as pesquisas teóricos-conceituais e propositivas não se centram unicamente nos conceitos e categorias da Geografia; ocupam-se, ainda, dos modos de estudar tais conceitos e categorias, do papel e limites tal como a origem do conhecimento geográfico. Ademais, detêm-se às relações da Geografia com a arte e o senso comum, à Geografia no rol das outras ciências e do papel político deste gênero do saber na sociedade em geral, exercício que cabe à epistemologia, ontologia, e gnosiologia/teoria do conhecimento etc. Procuramos, pois, reunir dissertações e teses nessas temáticas como constituintes do que estamos chamando de teórico-conceitual e propositivo. Vale, agora, esclarecermos o último elemento no plano teórico- metodológico de nossa proposta de trabalho. De maneira geral, os geógrafos dedicados a essas problemáticas referem-se, enquanto objeto, à história de um pensamento ou de um conhecimento, podendo tal pensamento ou conhecimento ser, por exemplo, de toda a disciplina ou de apenas um sujeito, por isso o fato de alguns utilizarem a denominação ‘‘história do pensamento geográfico’’. Surgem, classificá-las como teórico-conceituais e propositivas, mas que, aqui, podem ser vistas como uma zona de contato entre essas duas frentes de pesquisa. Reunimos, também, em outro quadro, os trabalhos cujo objetivo foi a aplicação dos conceitos e categorias no ensino de Geografia, nos quais, ainda assim, tais conceitos ou categorias fossem o objeto do estudo. I S el eç ã o e c ri té ri o s 39assim, algumas questões: há diferenças entre uma história do pensamento e outra do conhecimento geográfico? Essas duas terminologias são sinônimas? Caso pensamento e conhecimento geográfico não sejam sinônimos, em que consistiriam suas diferenças? Sugerimos, assim, um outro termo como possibilidade resolutiva desse emblema entre o pensar e o conhecer, que foi aplicado neste trabalho. Optamos, aqui, pelo termo saber. Como síntese do pensar e do conhecer nasce um saber, em nosso caso, o saber geográfico. O saber, apresentando-o de modo breve, considerando o pensamento e o conhecimento, para nós é o objeto – o elo – que resume essas duas faculdades anteriores, cabendo a cada geógrafo, em seus estudos, dizer se determinado saber é ou não geográfico, se o referido teve peso no desenvolvimento ou recuo da Geografia e da sociedade em geral na história e no período de então. O saber geográfico que é transmitido e modificado no marchar da história é, atualmente, objeto de questionamentos e, portanto, de pesquisas. É o termo que utilizamos no decorrer de todo o trabalho. No capítulo 2 e 3, detalhamos cada um desses três termos e sua respectiva utilização pelos geógrafos. A pós-graduação brasileira, fonte das dissertações e teses aqui utilizadas, tem uma história relativamente curta (SCHWARTZMAN, 1976). Considerando a partir da primeira defesa em 1944 até 2014, que é o ano que fecha nosso recorte temporal, totalizam-se setenta anos. Os motivos da escolha desse recorte temporal é o que será esclarecido no próximo item. Diferentemente de outras temáticas de pesquisa cujo estabelecimento em departamentos e grupos de pesquisa detém uma história, de certo modo, melhor estabelecida, como por exemplo a Geografia urbana ou a Geografia agrária, os estudos históricos e teórico-conceituais e propositivos do saber geográfico geralmente representam uma expressividade menor, cujo resultado em alguns casos é de inexistência em algumas universidades. Isso pode variar, indiscutivelmente, com os propósitos de cada departamento e/ou pós-graduação – muitas vezes alguns cursos de Geografia, seja de graduação ou pós-graduação, são criados visando suprir a limitação de conhecimentos ou resolução de problemas de determinada região da qual farão parte. Basta observarmos as linhas e os objetos I S el eç ã o e c ri té ri o s Tempo1.2 40de pesquisa em dissertações e teses em diferentes programas de pós-graduação. Notaremos uma enorme diferença nos objetos pesquisados das dissertações defendidas na Universidade Federal do Amazonas – UFAM e, de outro ponto de vista, na Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, por exemplo. O fato da inexistência de um grupo ou uma linha de pesquisa histórica e teórico-conceitual e propositiva nos cumpre observar que pesquisas individuais sempre existiram, mais do que isso: muitos avanços em determinados domínios de estudo da Geografia (seja na climatologia, Geografia urbana etc.) fluíram de dentro dessas áreas, não requerendo, necessariamente, de um pesquisador “profissional” em pensamento geográfico. A pequena expressividade de trabalhos históricos e teórico-conceituais pode ser constatada por levantamentos anteriores ao que realizamos neste trabalho. Esses estudos sempre apresentaram um diminuto volume (MONTEIRO, 1980; SILVA, 1984; MAUREL, 1984; BAHIANA, 1992; ABREU, 1994; CARVALHO, 2009) quando comparado a outros domínios da Geografia, seja em dissertações e teses, revistas ou livros. Esse fato se confirmou com o primeiro levantamento realizado, no qual constatamos, em um universo de nove mil trabalhos (partindo da década de noventa), pouco mais de uma centena de dissertações e teses dessa natureza. Isso posto, decidimos, então, iniciar o levantamento a partir da primeira defesa, isto é, 1944. Contudo, não houve aumento significativo de trabalhos, visto que as defesas até meados da década de oitenta ainda se concentravam no Departamento de Geografia da USP – tanto é que a primeira defesa (dissertação) teórico-conceitual e propositiva do saber geográfico foi defendida em 1978, na Universidade do Rio de Janeiro, por Olindina Vianna Mesquita⁸. O aumento de trabalhos apresentou-se maior quando decidimos incluir pesquisas teórico-conceituais e propositivas. Quanto a defesas de tese, julgamos como sendo a primeira a livre-docência de Milton Santos, Os Estudos Regionais e o Futuro da Geografia, defendida em 1960⁹, tese esta que teve como objeto o conceito de região. Posteriormente à defesa de Milton Santos, somente em 1974, quatorze anos depois, houve outra – neste caso, a do geógrafo e historiador Bernardo Issler com a tese A Geografia e os Estudos Sociais¹⁰. I ⁹ Em fins da década de 1950, Milton inscreve-se no concurso para livre-docência da Faculdade de Filosofia da Universidade da Bahia, mas surpreendentemente o concurso não se realiza, por razões que o professor Délio Pinheiro classifica como vinculadas a uma “oligárquica e segregacionista sociedade baiana de belas gravatas e verdades encobertas”. Milton Santos recorre à justiça, tendo como advogado o então Deputado Federal e futuro Senador Nelson Carneiro, vencendo em todas as instâncias e tendo se submetido com brilhantismo ao concurso em 1960, com a tese Os Estudos Regionais e o Futuro da Geografia (SILVA, 2002). ¹⁰ Esta tese relaciona a Geografia, o Ensino e, à época, o que se chamava de Estudos Sociais, num exercício de contextualização histórica de cada uma dessas áreas. ⁸ O Estado Isolado de von Thünen: uma discussão, sob orientação Maria do Carmo Corrêa Galvão. T em p o 41 Se o material de análise desta pesquisa são dissertações e teses, é importante que compreendamos os fatores que lhes deram vida. Os programas de pós-graduação, em específico os de Geografia, são, sem nenhuma dúvida, determinantes quanto a esse aspecto. Embora, anteriormente à implantação propriamente dita desses programas, muitas outras instituições as antecederam, além do que, também, condicionantes tanto políticos quanto econômicos motivaram a criação das mesmas. É sabido o singular papel do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro – IHGB, criado em 1838, da Associação dos Geógrafos Brasileiros – AGB, criada em 1934 em sincronia com o curso de graduação em Geografia na USP, os quais atuaram profundamente na construção da Geografia brasileira. Aliou-se, certamente, no caso da promoção da pós-graduação no Brasil, à criação do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq, em 1949, e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES, em 1951. Lembramos, rapidamente, essas instituições e órgãos para que compreendamos, pois, aquela que, no caso da Geografia, talvez seja a mais importante em termos de pós-graduação: referimo-nos à Associação Nacional de Cabe destacar, junto a essas entidades, o papel do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, criado em 1936. Todas essas instituições foram objeto de uma variedade de estudos concretizados em dissertações e teses (PENHA, 1992; ZUSMAN, 1996; PEREIRA, 1997, 2003; ALMEIDA, 2000; ANTUNES, 2008). Como ponto de chegada, selecionamos o ano de 2014, momento de elaboração do projeto desta tese. Com esse ponto de chegada, foi possível acompanharmos as metamorfoses, recuos e avanços dos estudos inerentes ao saber geográfico como objeto. Esse período do tempo nos permitiu – dada a pouca expressividade, até o final dos anos noventa, de estudos dessa natureza – fazer um paralelo entre o que se pesquisava (e quem pesquisava) e o que se pesquisa (e quem pesquisa atualmente). Contudo, se o tempo considerado nesta pesquisa não se mostrou um problema, é importante discutirmos um pouco sobre a concreta ampliação dos programas de pós-graduação e as dezenas de limitações de seus acervos e banco de dados, onde se encontram as dissertações e teses. I T em p o Programas de pós-graduação e a busca de dissertações e teses1.3 42 Julgo, porém, que não há porque haver definições de pós-graduação. Na medida em que a pós-graduação se define como um centro de excelência de cada universidade, ela vai se fazendo e reformulando, na medida em que as suas lentes vão elaborando e redefinindo o seu pensamento (SANTOS, 1984, p. 296). E s s a q u a n t i d a d e d e p r o g r a m a s , n o B r a s i l , a p r e s e n t a - s e desproporcionalmente em cada região, dado que desenha singularidades e diferenças em cada programa. Devemos, ao colocarmos em um mesmo quadro 59 programas de pós-graduação, considerar o tempo de existência, a distribuição de recursos etc. E mais: Em 1984, acontecera o Primeiro¹¹ Encontro Nacional de Pós-graduação em Geografia¹² – o título oficial de instituição ainda não havia se efetivado, mas as sementes, certamente, foram lançadas, cujo florescer, então, se deu em 1993, na cidade de Florianópolis. Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia – ANPEGE. Suas antecessoras tiveram, cada uma a seu modo, exímia representação como propulsoras ao nascimento da ANPEGE; porém, em 1984, em São Paulo, de 16 a 18 de dezembro, guardadas todas as particularidades do momento, a história dessa instituição efetiva-se, definitivamente, na memória do percurso histórico da Geografia brasileira. Coube, contudo, além dos processos já citados, a um grupo de geógrafos arquitetar um encontro nacional de pós-graduação em Geografia. Todos esses fatos determinaram, e ainda determinam, em cada programa de pós-graduação, as linhas de pesquisa, os objetos pesquisados, a quantidade de defesas tanto no mestrado quanto no doutorado – fatores importantes para explicarmos os modos que colhemos, tabulamos e classificamosas dissertações e as teses. Santos (1984) chama atenção ao fato de que o modelo de cada pós- graduação é ela própria. Ela se aperfeiçoa em função do modelo que ela mesma vai elaborando, e não em função de um modelo externo a ela. De 1984 até a criação do Encontro em 1993, ocorreram mais três encontros. Atualmente, 2018, passados 25 anos, a Instituição é portadora e provedora de dados e publicações referentes à pós-graduação em Geografia no Brasil. Este breve histórico é fundamental para que possamos entender os 59 programas de pós-graduação existentes hoje na Geografia brasileira e, consequentemente, a produção de dissertações e teses e, assim, nossos procedimentos metodológicos de busca. I P ro g ra m a s d e p ó s- g ra d u a çã o e a b u sc a d e d is se rt a çõ es e t es es ¹¹ Cerca de 140 pessoas se inscreveram no I Encontro Nacional de Pós-Graduação em Geografia e apenas 20, aproximadamente, não compareceram em nenhuma das atividades programadas, o que atinge uma cifra de frequência, ao evento, ao redor de 80% (Anais ANPEGE, p. 9, 1984). ¹² I Encontro Nacional de Pós-Graduação em Geografia, São Paulo, Anais, 1984. USP. 43 4. A necessidade de ir programa a programa coletando os dados nos respectivos websites. (As informações são quase sempre incompletas). 5. A necessidade de ir às bibliotecas de cada programa. (Muitos catálogos não diferenciam tese de dissertação, assim como as áreas do conhecimento nas quais foram defendidas). 3. A Plataforma Sucupira (https://sucupira.capes.gov.br) comporta somente dissertações e teses entre 2013 e 2014. (Em 2013, em alguns programas, os dados são limitados). A segunda alternativa são os relatórios da CAPES, os quais, atualmente, estão desativados¹³. Nesses relatórios, foi possível detectar, a cada ano, as defesas ocorridas em cada programa de pós-graduação em Geografia no Brasil cadastrados na CAPES. Contudo, esses relatórios apenas continham informações a partir de 6. A matriz do banco de dados da CAPES que compreende apenas os anos de 1987 a 2012. (Também contendo uma série de problemas, como duplicatas, ausências etc.). Na primeira alternativa (Banco de Teses da Capes), como já mencionado, há informações entre 1987 e 2014 – este recorte, todavia, além de incompleto nas informações, apresenta uma quantidade expressiva de duplicatas. 1. O Banco de Teses da CAPES (http://bancodeteses.capes.gov.br/) comporta somente dados entre 1987 e 2014. Hoje, no Brasil, há seis meios/formas de chegarmos e realizarmos levantamentos de dissertações e teses, especificamente no caso da Geografia. Na realidade, esses meios são bancos de informações que, em sua totalidade, apresentaram-se incompletos. Tivemos que cruzar as informações para completarmos os anos incompletos em outros bancos de dados. Do mesmo modo, com tal procedimento (de cruzamento de dados), detectamos as repetições, exclusões e referências com lacunas. Assim, é necessário apresentar os problemas e possibilidades das ferramentas utilizadas para chegarmos às dissertações e teses. 2. Os relatórios, como uma outra forma de busca, contêm dados apenas a partir de 1998, não sendo possível uma pesquisa interativa e rápida. (Não estão atualizados). I B a n co d e d a d o s Banco de dados1.4 ¹³ Anteriores a 2013, a Plataforma Sucupira disponibiliza relatórios a partir desse ano. 44 I B a n co d e d a d o s Utilizamos, na medida do possível, todos esses meios. Cruzamos as informações e, assim, somente assim, chegamos, portanto, às dissertações e teses de nosso interesse, bem como à realização do recenseamento de toda a produção brasileira de dissertações e teses em Geografia. A quarta forma é mais trabalhosa, contudo possibilita um contato mais próximo com os programas de pós-graduação. Trata-se do procedimento de ir programa a programa, em cada pós-graduação, visitando os respectivos websites. Nesse exercício, notamos muitos programas que não detinham um website disponibilizando as listas de defesas. Outros, inclusive, apresentavam dados que não compatibilizavam com os emitidos pelos relatórios da CAPES. 1998 até 2012. Conseguimos, felizmente, acessar esses relatórios antes de sua retirada pela CAPES. A terceira alternativa vem a ser uma inovação das duas anteriores; no entanto, somente é possível consultar dados a partir de 2013. O banco de dados em questão é a Plataforma Sucupira¹⁴, gerida pela CAPES. O quinto modo de levantamento de dissertações e teses liga-se com o anterior, porém não é menos trabalhoso e defeituoso. Referimo-nos às bibliotecas onde se encontram os programas. A dificuldade que encontramos consistiu na mistura de dissertações e teses nos acervos dessas bibliotecas. Não havia, muitas vezes, a separação por áreas do conhecimento – existia, nesses casos, apenas o título nos catálogos, o que, para nós, só foi utilizado como última opção. O último e sexto modo só foi possível devido a um contato que tivemos com a CAPES. Por meio desse contato, a CAPES nos disponibilizou a matriz de seu banco de dados. Essa matriz nos foi enviada em formato de Excel, possibilitando uma maior interatividade com as informações. A matriz compreende os anos de 1987 até 2012. Anterior a qualquer contato com os bancos de dados dos programas, decidimos, primeiramente, analisar trabalhos de autores que realizaram semelhante busca na temática que aqui nos propomos e em outros domínios, a saber: Darlene Aparecida de Oliveira Ferreira (Geografia Agrária – 1998); Flaviana Gasparotti Nunes (Geografia Econômica – 2000/2004); Antonio Carlos Pinheiro (Ensino de Geografia – 2003); Deise Fabiana Ely (Climatologia – 2006); ¹⁴ Esta plataforma agrega informações dos programas de pós-graduação do Brasil, indo desde linhas de pesquisas, discentes e docentes até as produções bibliográficas. Dissertações e teses1.5 45 I D is se rt a çõ es e t es es Sobre a produção em história do pensamento geográfico, houve levantamento realizado por Rui Ribeiro de Campos (2004) e Antônio Alfredo Teles de Carvalho (2007), que apresentam apenas um caráter introdutório ao tema, entretanto, no caso de Carvalho (2007), seu estudo pode ser considerado o mais próximo à natureza de nossa proposta. Carvalho (2007) dedicou um capítulo de sua tese de doutorado¹⁵ à compreensão da produção de dissertações e teses ligadas à história do pensamento geográfico, no entanto, o principal objeto de estudo de sua tese foi o médico e geógrafo Josué de Castro e a inclusão da fome nos estudos geográficos. Kalina Salaib Springer (Geografia e Natureza – 2008); Valéria de Meira Albach (Geografia do Turismo – 2010) e Janaína Francisca de Souza Campos Vinha (Geografia Agrária – 2012). Analisamos a metodologia de cada um desses trabalhos (dissertações e teses), em todas suas temáticas – inclusive, os estudos históricos e teóricos-conceituais e propositivos do saber geográfico eram, em número, o de menor quantidade quando ocorria de haver trabalhos. Não encontramos resposta a esta pergunta. Tivemos, dado tal debilidade, que realizar um recenseamento na base de dados de todos os programas em Geografia no Brasil e em outros órgãos ligados à pós-graduação. Em primeiro lugar, vale lembrar que iniciamos a busca a partir de 1944, procurando trabalhos históricos e teórico-conceituais e propositivos do saber geográfico. Realizamos esse levantamento até o final de 2014, à época com 58 programas de pós-graduação no Brasil. Organizamos todo o material por meio do Houve reflexões de outros geógrafos, publicadas em revistas, boletins etc., a exemplo: MONTEIRO, 1980; SILVA, 1984; MAUREL, 1984 e BAHIANA, 1992. Com toda essa bibliografia, notamos que ora tal pesquisador relacionava seus estudos referentes ao pensamento geográfico apenas às questões teórico- conceituais e propositivas, ora voltava-se para a história do pensamento. Outro problema é a transmissão da informação. Alguns estudos apenas demonstravam dados estatísticos, não fazendo referência aos nomes dos autores, instituições promovedoras, etc. – simplesmente referiam-se, por exemplo, a “10% de estudos teóricos-conceituais”. Voltando às dissertações e teses, ocorreu de notarmos outro problema – este também de ordem estatística. Independentemente de qualquer que seja a quantidade de dissertações e teses direcionadas à compreensão do saber geográfico, qual seria, pois, sua expressão no todo, isto é, qual é de fato a quantidade de dissertações e teses em Geografia produzidas no Brasil ao longo de toda a história da pós-graduação? ¹⁵ O Pão nosso de cada dia nos dai hoje...Josué de Castro e a Inclusão da Fome nos Estudos Geográficos no Brasil. Tese, USP, 2007. 46 I D is se rt a çõ es e t es es TIPO ANOS TOTALIDADE %SABER GEOGRÁFICO 1965-1997 1944-1997 1054 276 50 17 4,7 6,1 DISSERTAÇÕES TESES Para que o levantamento comportasse maiores detalhes, além dos critérios já esboçados de modo breve na primeira parte deste capítulo, tivemos que ler algumas dissertações e teses, embora, muitas vezes, apenas o resumo, sumário e bibliografia já revelasse a natureza do trabalho. No Quadro 1, representamos a expressividade da produção brasileira de dissertações e teses na totalidade até 1997, e aquelas referentes ao saber geográfico. Após essa primeira tabulação, separamos as dissertações das teses em dois quadros para, detalhadamente, compreendermos as diferenças e/ou semelhanças inerentes a cada gênero de formação acadêmica. Esse levantamento, repetimos, realizou-se apenas nos programas de pós-graduação em Geografia. Cada uma dessas variáveis nos possibilitou construir quadros, mapas, gráficos e tabelas de cada qual. Foi possível, por exemplo, ver o tipo de pesquisa mais predominante em determinada instituição, os geógrafos que mais orientaram, etc. Como já dito, iniciamos em 1944 até o final de 2014. Respeitamos a série histórica, contudo dividimos as análises em dois blocos temporais: dissertações e teses produzidas e defendidas até 1997, e outro bloco de análise de 1998 até 2014. Essa separação ocorreu de modo sistemático no todo da produção de dissertações e teses e nas inerentes ao saber geográfico – assim o fizemos pois torna-se detectável o salto da produção de dissertações e teses no Brasil. A produção em seu todo, com o recorte temporal em questão, repetiu-se na confecção dos mapas, gráficos e tabelas, analisados detalhadamente no capítulo 4. Quadro 1: Número de dissertações e teses: totalidade e Saber Geográfico até 1997. programa EXCEL 2013, cujas variáveis foram: nome do autor, título do trabalho, tipo do trabalho (se é uma dissertação ou tese), instituição de defesa, ano de defesa, orientador (neste caso, quando houve coorientação, consideramos apenas o primeiro orientador), banca examinadora, palavras-chave, estado da federação a que pertence a instituição). De todas essas variáveis, a banca examinadora foi a que mais demandou estratégias de busca. Fonte: Programas de pós-graduação em Geografia (bibliotecas, websites e pesquisas diretas do autor) e Banco de Teses da CAPES (1986-1997). Organização e elaboração (contagem): Guilherme dos Santos Claudino. 47 TIPO ANOS TOTALIDADE %SABER GEOGRÁFICO 1998-2014 1998-2014 7889 2302 185 129 2,3 5,6 DISSERTAÇÕES TESES I D is se rt a çõ es e t es es TIPO ANOS TOTALIDADE %SABER GEOGRÁFICO 1965-1997 1944-1997 1054 276 50 17 4,7 6,1 DISSERTAÇÕES TESES Quadro 2: Número de dissertações e teses: totalidade e Saber Geográfico até 1998-2014. Em linhas gerais, como representado no quadro, o número de dissertações defendidas é bem superior à quantidade de teses, repercutindo no número de defesas que se dedicaram ao saber geográfico. A expressão percentual de dissertações sobre o saber geográfico nesse período comparada à totalidade é de 4,7%, não tão diferente da porcentagem de teses que representam – apenas 6,1%. Outro dado importante é o fato das defesas de dissertações terem se iniciado em 1965; já as teses se iniciaram 21 anos antes, com todas as particularidades do momento. O segundo bloco analítico tem uma diminuta mudança no corte, que vai de 1998 até 2014. Do ponto de vista da produção de dissertações defendidas no Brasil, o aumento foi vertiginoso comparado ao período anterior – reflexo, indiscutivelmente, do aumento de universidades e programas de pós-graduação. Entre 1998 e 2014, ocorreram mais 185 defesas com relação aos estudos do saber geográfico, representando 2,3 % frente a quase 8 mil defesas em sua totalidade. As teses, por outro lado, tiveram 129 defesas em comparação com os 2.302 do total de teses defendidas, configurando, desse modo, 5,6 % de teses ligadas à compreensão do saber geográfico, como demostrado no Quadro 2. A soma dos dados dos Quadros 1 e 2, isto é, de toda produção de dissertações e teses no Brasil, partindo de 1944, totaliza 11.521 trabalhos. Desse total, 381 tiveram como objeto o saber geográfico. Em resumo, o material analítico desta tese representa 3,3% de toda a produção de dissertações e teses da Geografia brasileira. O Quadro 3 exibe essa informação. Fonte: Programas de pós-graduação em Geografia (bibliotecas, websites e pesquisas diretas do autor) e Banco de Teses da CAPES (1986-1997). Organização e elaboração (contagem): Guilherme dos Santos Claudino. 48 I D is se rt a çõ es e t es es TOTALIDADE %SABER GEOGRÁFICO 11.521 381 3,3 DISSERTAÇÕES E TESES TOTAL ¹⁶ Na primeira parte da metodologia, esclarecemos a que abordagem histórica estamos nos referindo e, no capítulo 4, esmiuçamos a proposta. ¹⁷ Alguns intelectuais o chamam de “estado da arte” ou “estado do conhecimento”. Organização e elaboração (contagem): Guilherme dos Santos Claudino. Fonte: Programas de pós-graduação em Geografia (bibliotecas, websites e pesquisas diretas do autor) e Banco de Teses da CAPES (1986-1997). Esses 381 trabalhos, além de estarem separados em dissertações e teses, foram divididos, do ponto de vista teórico, em dois grandes blocos de análise, rapidamente apresentado na primeira parte deste capítulo. O primeiro bloco, denominamos de Históricos. Nesse grupo, as dissertações e teses são distribuídas nos seguintes eixos: Biográfico e Bibliográfico (geógrafos); Biográfico e Bibliográfico (historiadores, economistas, filósofos...); Instituições; Revistas, Anais, Boletins e Periódicos; Geografia Acadêmica (geral e específica); Campos e Domínios Disciplinares; Correntes, Escolas, Matrizes, Paradigmas e Tradições; Geografia Escolar (geral e específica); Cartografia; e Literatura (artes em geral). O primeiro bloco se subdivide em nove temáticas. Cada temática comporta um conjunto de trabalhos históricos¹⁶ e/ou do estado do saber¹⁷. Quadro 3: Total de dissertações e teses no Brasil e a representação dos estudos ligados ao Saber Geográfico. O segundo bloco de análise, titulamos de Teórico-Conceitual e Propositivo. Esse bloco conta com nove temáticas: Teorias; Conceitos e Categorias; Outros; Métodos; Epistemologia; Ontologia; Temas Híbridos e Difusos; e Ensino (Categorias e Conceitos). Como já mencionado, as 381 dissertações e teses se distribuíram em cada um desses blocos e eixos, respectivamente. Muitos trabalhos, além disso, estão presentes em mais de um eixo. A epistemologia, em si, por exemplo, não é um objeto como uma categoria de análise para os geógrafos; ela se apresenta, quase sempre, como um instrumento investigativo de pensamentos, categorias, conceitos etc. Uma tese com as características desse exemplo pode estar em mais de um eixo. Os estudos do saber geográfico afirmam a importância de se utilizar um programa de pesquisa rigoroso. Os detalhes de cada etapa, desde as noções desse tipo de estudo até a quantificação de dissertações e teses, são esmiuçados em cada capítulo. Os termos conhecimento e pensamento são, para nós, fundamentais para compreendermos a base referente às noções essenciais aos domínios de estudo comumente conhecidos como história do pensamento geográfico, epistemologia 49 I D is se rt a çõ es e t es es da Geografia ou, simplesmente, teoria e método do pensamento geográfico e conhecimento geográfico – temas que trataremos a seguir. Conhecimento e Pensamento II Capítulo 51 Conhecimento e pensamento, na literatura em geral¹⁸, referem-se a um estado e a uma multiplicidade de coisas. A Geografia, enquanto uma ciência, detém e é um tipo peculiar de conhecimento e pensamento, o que supõe um modo singular de conhecer e de pensar. Em sua singularidade científica, organiza e elabora discursos direcionados ao estado de coisas, que é, decerto, uma realidade objetiva e/ou subjetiva. Esses discursos são expressões de conhecimentos e de pensamentos. São, assim, um material (objeto) passível de pesquisas. Um discurso geográfico é fruto de uma produção, reprodução, omissão, incrementação, etc. de conhecimentos e pensamentos peculiares à atividade científica no sistematizar, organizar e combinar elementos cujo resultado, então, é um conhecimento e/ou um pensamento. A leitura e construção de um discurso sobre o estado de coisas (espaciais) surge, também, de outros gêneros – religioso, senso comum, artístico etc. – objetos, portanto, de investigações. Mas o que seria um conhecimento e um pensamento? Como podem esses dois termos serem objetos? Como a psicologia e a filosofia, que tradicionalmente têm esses termos como objeto, os entendem? E as outras ciências, juntamente com a Geografia, como compreendem o conhecimento e o pensamento? Os dicionários e as enciclopédias foram nosso ponto de partida para buscarmos respostas a essas perguntas; embora, ainda, contradições estivessem presentes nesses materiais. Lembramos que não são todos os dicionários e enciclopédias que possuem o conhecimento e o pensamento em seu rol de verbetes. O exercício realizado procurou captar o significado desses termos como verbos substantivados: “o conhecer e o pensar”. Essa multiplicidade de significados e sentidos nos remeteu às enciclopédias e, juntamente, aos dicionários, onde buscamos reunir os elementos mais regulares e comuns. Iniciemos, então, pelo conhecimento. O conhecimento do ponto de vista filosófico. De acordo com Régis Jolivet, em seu Vocabulário de Filosofia, de 1954, o conhecimento é uma operação vital imanente que tem, por efeito, fazer um objeto presente ao sentido e a inteligência é, em suma, um saber que resulta dessa operação. Mark Moiseevich Rosental e Pavel Fyodorovich Yudin, por outro lado, trazem uma compreensão do conhecimento, através do Pequeno Dicionário Filosófico, de 1959, novos elementos em comparação às proposituras de Jolivet. Rosental e Yudin (1959) afirmam que a filosofia marxista foi a primeira, na história do pensamento humano, a dar uma explicação científica da natureza do conhecimento e do processo cognitivo. A gnosiologia marxista, toma por base a Um diálogo com dicionários e enciclopédias II U m d iá lo g o c o m d ic io n á ri o s e en ci cl o p éd ia s 2.1 52 realidade objetiva do mundo exterior que existe independentemente da consciência dos homens, e considera seu conhecimento como o reflexo desse mundo objetivo. O marxismo parte deste princípio: o mundo exterior é perfeitamente cognoscível. Relação de índole muito especial entre um sujeito e um objeto, que consiste em uma espécie de penetração mútua de ambos. No uso prático da língua, a palavra designa duas coisas diferentes, conforme o ponto de vista. Parte de um ou de outro dos dois termos dessa relação: do sujeito ou do objeto. Partindo do sujeito, a relação cognoscitiva se apresenta como um ato subjetivo; isto é o primeiro sentido da palavra. No processo cognoscitivo, o sujeito capta, pelo menos, uma parte da realidade, que se lhe apresentou de maneira objetiva e incorpora-se ao tesouro de objetos já anteriormente apreendidos e tornados subjetivos; esse material apreendido, tanto que corresponde a um ato só, como particularmente a soma do material assim captado em todos os atos cognoscitivos de um sujeito, ou às vezes também de um grupo, constitui o segundo sentido da palavra conhecimento. Tanto o ato que conhece, como o objeto conhecido, pode ser classificado em razão d