UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE ARQUITETURA, ARTES E COMUNICAÇÃO IGOR VIGINOTTI CANEVARE A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DE KAKÁ E ADRIANO PELOS JORNAIS FOLHA DE S. PAULO E O ESTADO DE S. PAULO BAURU – SÃO PAULO 2010 IGOR VIGINOTTI CANEVARE A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DE KAKÁ E ADRIANO PELOS JORNAIS FOLHA DE S. PAULO E O ESTADO DE S. PAULO Projeto Experimental de Conclusão do Curso de Graduação em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo, apresentado à Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. Orientador Prof. Dr. Cláudio Bertolli Filho BAURU – SÃO PAULO 2010 IGOR VIGINOTTI CANEVARE A CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE DE KAKÁ E ADRIANO PELOS JORNAIS FOLHA DE S. PAULO E O ESTADO DE S. PAULO Trabalho de Conclusão de Curso de graduação em Comunicação Social com habilitação em jornalismo, apresentado à Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”. BANCA EXAMINADORA: __________________________________ Prof. Dr. José Carlos Marques __________________________________ Prof. Dr. Ângelo Sottovia Aranha __________________________________ Prof. Dr. Cláudio Bertolli Filho Bauru, _________________________________ Dedicado aos meus pais e a minha avó, que sempre estiveram comigo. AGRADECIMENTOS Agradeço especialmente aos meus pais, Severino Canevare e Márcia Viginotti Canevare, que me deram todo o apoio necessário para que eu chegasse até aqui, bem como a minha avó Ilda Donadelli Viginoti e a toda a minha família. Agradeço também ao meu orientador Prof. Dr. Cláudio Bertolli Filho, por ter me aceitado como orientando e pela honra de sua colaboração, sem a qual esse trabalho não seria possível. E aos participantes da banca examinadora por terem aceitado fazer parte desta, Prof. Dr. Ângelo Sottovia Aranha e Prof. Dr. José Carlos Marques, que através de seu Curso Esporte e Comunicação colaborou na elaboração do referencial teórico. Agradeço também aos meus amigos, Gabriel José Innocentini Hayashi - que me ajudou na escolha do tema - Caio de Freitas Paes, Igor Henrique Sternieri e Fernando Henrique de Paulo, que colaboraram na minha formação pessoal e acadêmica. Resumo Este trabalho tem por objetivo investigar quais são os mecanismos que permitem a produção de identidade pela mídia e discutir como ela é um dos principais pólos produtores da identidade na sociedade. Para tanto, serão estudadas as matérias e artigos veiculados pelos jornais O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo sobre os futebolistas Kaká e Adriano, comparando como a identidade de ambos foi construída por esses meios e pelo contexto desempenhado pelo futebol na sociedade. A escolha dos dois jogadores se deve à ampla cobertura dada sobre Adriano quanto a sua possível ligação com o tráfico no Rio de Janeiro, enquanto a cobertura sobre Kaká foi mais apagada em relação à possível utilização da Igreja Renascer em Cristo para lavagem de dinheiro. Nesse procedimento, estaremos apoiados nas formulações teóricas de Laurence Bardin, em Análise de Conteúdo. Palavras-chave: Jornalismo; Futebol; Identidade; Kaká; Adriano. Sumário 1 Introdução 9 1.1 O tema e sua justificativa 9 2 Referencial teórico: síntese da literatura fundamental 11 2.1 Cultura e identidade 11 2.2 Futebol e sociedade brasileira 15 2.3 Crônica futebolística 23 2.4 Teorias da comunicação 23 2.5 Análise de Conteúdo 27 3 Mídia e espetacularização da vida 30 4 Mídia e futebol 34 5 Mídia e jogadores 38 5.1 Adjetivos empregados pelos jornais aos jogadores 41 5.1.1 O Estado de S. Paulo 42 5.1.2 Folha de S. Paulo 42 6 Estudo de caso 45 6.1 Categorização 48 6.1.1 Detalhamento 55 6.1.1.1 Kaká relacionado nas duas categorias positivas 56 6.1.1.2 Kaká categorizado nas duas características negativas 60 6.1.1.3 Adriano como bom jogador, mas problemático 61 6.1.1.4 Adriano humanizado 64 6.1.1.5 Preconceito religioso 65 6.1.1.6 Detalhamento geral 66 6.2 Análise e interpretação 72 6.2.1 Análise temática 75 6.2.1.1 Análise temática sobre Kaká 76 6.2.1.2 Análise temática sobre Adriano 82 6.3 Inferência 91 7 Conclusão 92 Referências 93 Anexos 97 9 1 Introdução 1.1 O tema e sua justificativa A mídia é uma das principais formadoras de opinião e construção da cultura e identidade nacional. Os meios de comunicação de massa ajudam na homogeneização dos costumes e das visões (mesmo que isso não ocorra totalmente) e a sedimentar opiniões e conceitos que passam a ser repetidos à exaustão pela sociedade. A partir disso, os meios de comunicação, em defesa dos próprios interesses e das suas próprias visões de mundo, julgam e condenam muitos “criminosos” antes da própria justiça. Não em poucas vezes, os que são condenados pela mídia são absolvidos pela justiça, e aquela, então, só publica uma nota para “reparar” o erro. Não raramente, nem isso acontece. O acusado dificilmente recuperará a idoneidade após um caso como esse. Outro fator de construção da cultura e identidade nacional é o futebol, o esporte preferido do brasileiro, a ponto de o país parar no período da Copa do Mundo para torcer pela Seleção Canarinho, e de a nação ser alcunhada de a “pátria de chuteiras” pelo dramaturgo Nelson Rodrigues. Tendo tudo isso em vista, este trabalho visa a estudar a construção da identidade dos jogadores Ricardo Izecson dos Santos Leite, o Kaká, e Adriano Leite Ribeiro, o “imperador” - como ficou conhecido em sua passagem pela Internazionale de Milão - tanto através do contexto desempenhado pelo futebol na sociedade como pelos jornais diários Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo. Ambos são jogadores fora de série, craques, e têm aproximadamente a mesma idade (nasceram em 1982), porém Kaká tem imagem de bom moço, religioso e disciplinado. Antagonicamente, Adriano ficou marcado como malandro e estereotipado como jogador indisciplinado, que falta aos treinos por causa da vida agitada. Seria um preconceito em virtude da origem diferente dos dois? Adriano cresceu no morro e tem pele morena, Kaká veio de família de classe média e é branco. Este é religioso, devoto da neopentecostal Renascer em Cristo, enquanto aquele não nega suas origens e ainda mantém amizades no morro, o qual não deixou de freqüentar depois do sucesso profissional. Contestado na Justiça quanto à sua relação com o tráfico, Adriano tem todos os seus “deslizes” amplamente noticiados, apesar de ainda não haver nada provado contra ele. 10 A despeito disso, Kaká teve uma cobertura apagada quando foi chamado pelo Ministério Público do Estado de São Paulo para responder sobre sua ligação com os bispos Sônia e Estevam Henandes, fundadores da igreja Renascer em Cristo (condenados pela Justiça norte-americana por conspiração para contrabando e contrabando de dinheiro; eles foram detidos em nove de janeiro de 2007 quando entravam nos EUA com US$ 56,4 mil escondidos em uma bolsa, na capa de uma Bíblia, em um porta-CDs e em uma mala). Kaká faz constantes doações para a neopentecostal, sendo uma das mais célebres, o troféu de melhor jogador do mundo de 2007, concedido a ele pela Fifa – o qual ficou exposto na sede da igreja em São Paulo. Este trabalho pretende, por meio da análise de conteúdo das matérias publicadas pelos jornais supracitados, esclarecer essas dúvidas e responder a esses questionamentos. Temos como objetivo geral inquirir sobre quais são os mecanismos que permitem que a mídia produza identidade e discutir como esta é um dos principais pólos produtores de identidade na sociedade brasileira. Para tal analisaremos as matérias e artigos publicados pelos jornais impressos Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo sobre os jogadores Kaká e Adriano do período de janeiro de 2008 a julho de 2010, de forma a investigar como esses meios de comunicação construíram a identidade dos futebolistas; tentaremos estabelecer até que ponto Adriano é mais estigmatizado pela mídia por ser originário do morro e ter pele morena, além de ser mais indisciplinado que Kaká, que cultiva a imagem de bom moço e demonstrar se Kaká teve seu estereotipo de bom moço preservado pelos jornais quando foi chamado a responder à Justiça. As hipóteses correspondentes a cada uma dessas questões, que irão nortear a pesquisa, serão investigadas a partir da Análise de conteúdo das matérias e artigos publicados para estabelecer como ocorreu a construção de identidade dos jogadores; além da comparação da cobertura entre os jornais diários Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo, os quais têm edições nacionais, linhas editorais parecidas e são concorrentes diretos por público. Para o conceito de cultura e identidade, estaremos embasados em Clifford Geertz e em Denys Cuche. 11 2 Referencial teórico: síntese da literatura fundamental Este trabalho tem como referência desde a crônica esportiva e literatura sobre o universo futebolístico e teóricos da comunicação, até filosofia e antropologia - para dar conta dos conceitos de cultura e identidade. Para esses dois últimos temas vamos nos embasar em Clifford Geertz e Denys Cuche. 2.1 Cultura e identidade Geertz (1978) define a cultura como uma teia de significados que grupos humanos estabelecem nas relações entre si e com a natureza. Assim, pensar a cultura implica interpretar esses significados e buscar os significados atribuídos às coisas para o outro. O modo de vida e de pensamento nos conduz à ordem simbólica e ao sentido e, conseqüentemente, cultura, sociedade, civilização e identidade se tornam conceitos-chave. Pensar a cultura implica: interpretar significados e buscar as denotações atribuídas às coisas e às relações, desenhando o que é próprio e o que é o Outro; compreender que a dinâmica que ocorre no diálogo entre alteridades é constitutiva da noção de cultura e é permanente. A cultura, esse documento de atuação, é portanto pública, como uma piscadela burlesca ou uma incursão fracassada aos carneiros. Embora uma ideação, não existe na cabeça de alguém; embora não-física, não é uma identidade oculta. (Geertz, 1978, p. 20). Tendo em Cuche o embasamento para identidade nos, rigistramos que, para ele, a cultura pode existir sem a consciência de identidade, (...) ao passo que as estratégias de identidade podem manipular e até modificar uma cultura que não terá então quase nada em comum com o que ela era anteriormente. A cultura depende em grande parte de processos inconscientes. A identidade remete a uma norma de vinculação, necessariamente consciente, baseada em oposições simbólicas. (Cuche, 1999, p. 176). 12 Entretanto, uma das dificuldades em abordar a questão da identidade é que esta é multidimensional, ou seja, “cada indivíduo integra, de maneira sintética, a pluralidade das referências identificatórias que estão ligadas à sua história.” (Cuche, 1999, p. 194). Por isso pode-se afirmar que ela funciona, “(...), como as bonecas russas, encaixadas umas nas outras (Simon, 1979, p. 31). Mas, apesar de ser multidimensional, a identidade não perde sua unidade” (Cuche, 1999, p. 195). Para Cuche, a identidade social de um indivíduo está ligada ao conjunto “de suas vinculações em um sistema social” (Cuche, 1999, p. 177), isto é, sua vinculação a uma classe sexual, faixa etária, classe social, a um país etc. Para o autor, a identidade permite que o indivíduo se localize em um sistema social e seja localizado socialmente. Com a ressalva de que a identidade social não diz respeito somente ao indivíduo, mas que todo grupo é dotado de uma identidade que corresponde à sua definição social, a qual permite situá-lo no conjunto social. A identidade social é ao mesmo tempo inclusão e exclusão: ela identifica o grupo (são membros do grupo os que são idênticos sob um certo ponto de vista) e o distingue dos outros grupos (cujos membros são diferentes dos primeiros sob o mesmo ponto de vista). Nesta perspectiva, a identidade cultural aparece como uma modalidade de categorização da distinção nós/eles, baseada na diferença cultural. (Cuche, 1999, p. 177). Segundo Cuche, a identidade é uma construção, a qual se elabora em uma relação de oposição de um grupo aos outros grupos com os quais está em contato. Haja vista que não há identidade somente em si, a identidade existe sempre em relação a uma outra e, por isso, identidade e alteridade são ligadas e estão em uma relação dialética. Por isso “A identificação acompanha a diferenciação.” (Cuche, 1999, p. 183). A identificação pode funcionar como afirmação ou imposição de identidade, a qual é sempre uma concessão, “uma negociação entre uma “auto-identidade”, que é definida por si mesmo e uma “hetero-identidade”, ou uma “exo-identidade”, definida pelos outros” (Simon, 1979, p. 24)” (Cuche, 1999, p. 184). Contudo, nem todos os grupos têm o mesmo “poder de identificação”, tendo em vista que o mesmo depende da posição que se 13 ocupa no sistema de relações que liga os grupos. Poucos destes têm o poder de nomear e de se nomear. De acordo com Bourdieu, em seu artigo intitulado “A identidade e a representação” (1980), somente os que dispõem de autoridade legítima, que é aquela conferida pelo poder, é que podem impor suas próprias definições de si mesmos e dos outros. “O conjunto das definições de identidade funciona como um sistema de classificação que fixa as respectivas posições de cada grupo” (Cuche, 1999, p. 186). Isso se dá porque a autoridade legitimada tem o poder simbólico de fazer reconhecer como fundamentadas as categorias de representação da realidade social, além das “regras” de divisão no mundo social. Dessa forma, e por isso, essa autoridade pode fazer e desfazer os grupos. Em oposição à categorização imposta pela autoridade, existe a tentativa das minorias de afirmar sua própria identidade. Todo esforço das minorias consiste em se reapropriar dos meios de definir sua identidade, segundo seus próprios critérios, e não apenas em se reapropriar de uma identidade, em muitos casos, concedida pelo grupo dominante. (Cuche, 1999, p. 190). Para tal, a minoria tentará transformar sua “hetero-identidade”, em geral uma identidade negativa, em uma nova identidade positiva, isto é, na identidade que ela mesma se atribui. Para se obter sucesso nesse empreendimento, faz-se necessária uma estratégia de identidade, tendo em vista que a identidade tem uma dimensão mutável. Dessa forma a identidade se torna meio para se atingir um objetivo. “Logo, a identidade não é absoluta, mas relativa” (Cuche, 1999, p. 196). Através desse conceito de estratégia, explorado por diversos autores sobre o tema, podemos vislumbrar que o indivíduo, como ator social, não é desprovido de uma certa margem de manobra. É possível que ele faça uma avaliação da situação e utilize seus conceitos de identidade de maneira estratégica. No entanto, recorrer ao conceito de estratégia não deve levar a pensar que os atores sociais são totalmente livres para definir sua identidade segundo interesses materiais e simbólicos do momento. As estratégias de identidade devem necessariamente levar em conta a 14 situação social, a relação de força entre os grupos, as manobras dos outros, etc. (Cuche, 1999, p. 196). Isso porque, por mais que a identidade se preste a certa instrumentalização, tendo em vista a sua plasticidade, como no exemplo de Devereux em que ela seria uma “ferramenta” ou até uma “caixa de ferramentas”, apesar disso, os grupos não podem fazer o que querem dela. “A identidade é sempre resultante da identificação imposta pelos outros e da que o grupo ou indivíduo afirma por si mesmo” (Cuche, 1999, p. 197). E para estabelecer a diferenciação nós/eles, autores que discorrem sobre o tema se utilizam do conceito de “fronteira”, tendo em vista que para Cuche, toda identificação é ao mesmo tempo diferenciação. Dessa forma o autor cita Barth (1969), para o qual no processo de identificação o principal é a vontade de marcar os limites entre “eles” e “nós”, para estabelecer o que os teóricos chamam de fronteira. Mais precisamente, a fronteira estabelecida resulta de um compromisso entre a que o grupo pretende marcar e a que os outros querem lhe designar. Trata-se, evidentemente de uma fronteira social, simbólica. (Cuche, 1999, p. 200). Essa fronteira é criada, portanto, pela vontade de se diferenciar, além da utilização de certos traços culturais que servirão como marcadores de sua identidade específica. Por essa razão é que grupos muito próximos culturalmente podem se considerar completamente estranhos uns em relação aos outros e até totalmente hostis, opondo-se sobre um elemento isolado do conjunto cultural. Cuche afirma que a análise de Barth permite escapar à confusão que é freqüente entre “cultura” e “identidade”. “Participar de certa cultura particular não implica automaticamente em ter certa identidade particular. A identidade etno-cultural usa a cultura, mas raramente toda a cultura” (Cuche, 1999, p. 201). Por isso o autor conclui que uma mesma cultura pode ser instrumentalizada de modo diferente e até mesmo oposto nas diversas estratégias de identificação. Por isso, para Barth, a organização social da diferença cultural vem através da etnicidade, produto do processo de identificação. E, para poder se explicar a etnicidade, o importante não é estudar o conteúdo cultural da 15 identidade, mas sim os mecanismos de interação que, utilizando a cultura de maneira estratégica e seletiva, mantêm ou questionam as “fronteiras” coletivas. Dessa forma, Se admitirmos que a identidade é uma construção social, a única questão pertinente é: ”Como, por que e por quem, em que momento e em que contexto é produzida, mantida ou questionada certa identidade particular?” (Cuche, 1999, p. 202). Expostos aqui, sucintamente, os conceitos de cultura e identidade sobre os quais vamos nos embasar, cabe agora arrolar nosso referencial teórico sobre a crônica futebolística, além das relações entre esporte e sociedade. 2.2 Futebol e sociedade brasileira O futebol passou muito tempo pouco estudado pela universidade, sendo que os primeiros trabalhos acadêmicos na área, “somente a partir da década de 1980 tenderam a construir pontes de relacionamento (...)" (Bertolli Filho, 2010, p. 116) entre esse tema e universidade. Portanto, a literatura acadêmica sobre futebol é recente, podendo-se ressaltar como um dos principais expoentes da área, Roberto DaMatta, utilizado como um dos pilares deste trabalho para se abordar a relação entre futebol e sociedade através do livro “Universo do Futebol”, no qual ele escreveu a introdução, e o principal artigo. Esse volume foi um dos pioneiros na área acadêmica, em que quatro antropólogos sociais apresentaram uma visão crítica e desmistificadora em torno do tema futebol abrangendo o período que vai dos anos de 1914 até 1982. Nessa obra, DaMatta ressalta a impossibilidade da discussão e entendimento sociológico do futebol, sem se falar de aspectos fundamentais do ser humano: (...) o fato de que, diferentemente dos animais, vivemos em mundos norteados e balizados por normas. Em outras palavras, existimos literalmente em campos de futebol. (DaMatta, 1982, p. 13). 16 As ideias expostas na obra ajudaram no processo que fez com que a academia transcendesse o preconceito em torno do debate sobre futebol, e começasse a estudar o fenômeno, que era visto anteriormente, principalmente por tendências marxistas, apenas como “ópio do povo”. As análises antropológicas expostas por esses acadêmicos por meio de ensaios em “Universo do Futebol” permitiram ter uma visão mais profunda e menos preconceituosa sobre o jogo, sua relação com os meios de comunicação e, principalmente, com a sociedade brasileira. Sem deixar de ressalvar que a relação entre a paixão nacional, a mídia e a sociedade é pautada por ideologias e visões de mundo, que se utilizam do esporte de maior audiência do país como forma de expressar questões ligadas à identidade nacional, mas, Não é por acaso que o futebol transcende o mero noticiário dos jornais e televisão, bem como os mais realistas e “politizados” comentários (o futebol, repete- se, é o ópio do povo) para permitir uma série interminável de discussões riquíssimas sobre a ideologia ou a concepção de mundo brasileira. (DaMatta, 1982, p. 14). Partindo desses pressupostos, a discussão sobre futebol é especular sobre um jogo, claro, emoldurado pelo capitalismo, pelos “cartolas”, entretanto, “é também argumentar sobre todos os dilemas, problemas e lances que a vida necessariamente nos faz experimentar independentemente de condição social” (DaMatta, 1982, p. 15). Podemos destacar também a relevância que o futebol alcança nas relações sociais no país. Seja para fazer amizades, seja para manter conversas com outrem, umas das vias mais fáceis na nação tupiniquim para isso é por meio desse esporte, que é discutido com energia normalmente empenhada para áreas consideradas “mais importantes”, como a da política e da religião. Para DaMatta, o futebol está incrustado na nossa sociedade de um modo igualmente especial, tornando-se, em menos de um século, um autêntico esporte de massas. E o livro se torna base para este trabalho na medida em que ele inquire sobre questões como: por que o futebol assume tal popularidade no Brasil? E por que ele acabou por ser uma imensa tela 17 onde se pode projetar não apenas um drama técnico, mas toda uma complexa e sutil rede de argumentos e deduções relativas à vida, ao destino e as relações sociais? Mesmo que não respondidas de forma absoluta, tendo em vista a vastidão e complexidade que abrangem essas questões levantadas nesse livro, e talvez justamente por isso, servem como norte para trabalhos como este que estamos a empreender. Para o antropólogo, O futebol, portanto, tem – como o carnaval, a umbanda, o jogo do bicho e a cachaça, tudo isso que o povo diz que é sério no Brasil: - seu poder e seu próprio plano. Se ele é produto de uma civilização que tem no dinheiro, no poder e na mais-valia o seu eixo primordial, ele não pode ser transitivamente reduzido somente a isso. Da mesma forma que o amor não se reduz só ao sexo: ou a política ao mero uso e abuso da força: ou a poesia ao uso das palavras. Há na atividade futebolística (como em tudo o mais que constitui a vida em sociedade) um “mistério”. E esse “mistério” começa a ser desvendado quando nos damos conta que as coisas decolam e ganham asas. (DaMatta, 1982, p. 16). O Roberto DaMatta segue a mesma linha de argumentação de seus trabalhos anteriores: “Carnavais, Malandros e Heróis” e “Universo do Carnaval”, para os quais há uma clara noção de que temas como o do futebol, da umbanda e do carnaval são tabus no âmbito das sociologias oficiais, que ainda os abordam como “ópios do povo” ou “casos de polícia”, “(...) seja ainda “como casos de idiotice popular aguda” (quer dizer, casos de alienação e mistificação e alienação social), tudo isso para ser corrigido com a administração da ideologia correta pelo grupo apropriado” (DaMatta, 1982, p. 16). Dessa forma, ele explica que: Se o futebol, como seus primos conspícuos (o carnaval, a umbanda e o jogo do bicho), permite uma forma de cidadela positiva, posto que transforma um indivíduo sem eira nem beira, em pessoa momentaneamente virtuosa, é porque ele é uma ponte. (DaMatta, 1982, p. 18). Ponte das classes menos favorecidas por um jogo em que as regras não mudam, em que meninos pobres, sem famílias importantes podem se 18 tornar ídolos pelos seus próprios méritos e talento, em que todos se igualam, independentemente de credo, de raça ou de classe social para torcer pelo mesmo time. Diferentemente do que ocorre na sociedade brasileira como um todo. Para Roberto DaMatta, são questões como essas que tornam o futebol, a umbanda e o carnaval tão populares e massificados no Brasil. Para o antropólogo, o futebol deve ser estudado como um drama, como um modo privilegiado através do qual a sociedade se deixa perceber ou “ler” por seus membros. Neste sentido, sigo de perto aquela conhecida e profunda reflexão de Clifford Geertz (1973) segundo a qual o rito (e o drama) seriam um determinado ângulo de onde uma dada população conta uma história de si mesma para si própria. O futebol praticado, vivido, discutido e teorizado no Brasil seria um modo específico, entre tantos outros, pelo qual a sociedade brasileira fala, apresenta-se, revela-se, deixando-se, portanto, descobrir. (DaMatta, 1982, p. 21). Na medida em que o esporte faz parte da sociedade, tanto quanto a sociedade faz parte do esporte, para se compreender uma atividade (ou um plano de atividades) se faz necessária uma referência à totalidade na qual ela está inscrita. “Esporte e sociedade são como as duas faces de uma mesma moeda e não como o telhado em relação aos alicerces de uma casa” (DaMatta, 1982, p. 23). De acordo com Geertz, suas relações não são de estratificação, mas relações expressivas, dramáticas, onde começo e fim se rebatem um no outro. A partir das reflexões engendradas por DaMatta, podemos inferir que a sociedade se revela, não só pelo trabalho, religião ou política, mas também pelo objeto de estudo deste trabalho: o futebol. “Cada uma dessas esferas é uma espécie de “filtro” ou de operador, através do qual a ordem social se faz e refaz, inverte-se e reafirma-se, num jogo básico para sua própria percepção enquanto uma totalidade significativa.” (DaMatta, 1982, p. 24). Dessa forma, o antropólogo nos coloca que a pergunta básica quando se adota essa perspectiva, transcende a perspectiva segundo a qual é 19 preciso discernir “funções” e “utilidades” do esporte numa determinada sociedade, mas sim, para a descoberta das implicações e conseqüências que este domínio do social que classificamos como “esportivo” permite vislumbrar. Ou melhor, o que se deseja é uma boa resposta para a(s) pergunta(s): quando estamos vivenciando ou refletindo sobre essas atividades denominadas “esportivas”, de que estamos afinal de contas falando? Que tipo de vivência a sociedade está abrindo e legitimando para nós e para ela própria como sistema? Que relações podemos desfrutar, renovar, estabelecer e esquecer nesse domínio? Que emoções podemos sentir e que sentimentos devemos afastar quando estamos no campo do futebol ou assistimos a um jogo de tênis? Com que regiões do caos e com que dimensões da ordem podemos efetivamente entrar em contato no mundo do “esporte”? Quais os ambientes, vestimentas, objetos, regras, relações sociais e valores que o “esporte” nos permite conceber e vivenciar? Que tipo, enfim, de roupagem é essa que a sociedade veste quando se manifesta totalizada por meio de sua dimensão esportiva? Essas são algumas das questões que devemos responder quando pensamos no futebol do Brasil no esporte em geral como uma atividade da sociedade e não como uma atividade em oposição ou competição com a sociedade. (DaMatta, 1982, p. 24). Para ele, para se pensar o futebol, temos de observar que a atratividade desse esporte, e causa de seu grande apelo popular, estaria na dramatização que ele pode proporcionar. Dramatização que advém do alto grau de imprevisibilidade desse jogo em que os atletas estão organizados em times – como na vida real estão em famílias – e pretendem vencer ao atuar em determinado estilo. Porém, há diversos fatores não passíveis de serem controlados, como, por exemplo: as ações da equipe adversária, a sua habilidade ou as coincidências, os erros e os acertos que decorrem do próprio jogo, do acaso etc. DaMatta ressalta o fato de, às vezes, uma equipe apelar para meios mágicos de vitória, como seria o caso do “futebol- arte” brasileiro. Por esses motivos, a vitória pode ser situada no plano do favorável, mas não no da certeza. 20 Ora, e precisamente essa interação complexa do time com o time adversário, do time com ele mesmo, das duas equipes com as regras que governam o espetáculo, e das equipes, regras e público com os controladores da partida (juízes e bandeirinhas), que cria o fascínio exercido pelo futebol enquanto um jogo e um drama. É sem dúvida essa complexidade que permite tomar o jogo de futebol como uma metáfora da própria vida. E, assim, expressar o conflito básico existente na sociedade brasileira entre os homens e forças impessoais que se colocam no seu caminho. (DaMatta, 1982, p. 31). Por questões como essa é que não deve causar espanto quando ele afirma em sua obra a junção entre futebol e carnaval como instrumentos básicos de manifestação da identidade nacional brasileira. Por ter como um componente fundamental da identidade no Brasil essas “causalidades” e imprevisibilidades que podem mudar o resultado desse “jogo” que é a vida neste país, e que tendem a conduzir a sociedade para a derrota. Como quando se fala, diante de situação em que não cabe mais a esperança, que “é o destino”. Por isso é que a relação entre o brasileiro e a seleção é tão forte. Por essa passar a ser um momento no qual a cancha futebolística parece permitir uma real experiência de “horizontalização do poder”, por meio da reificação esportiva. De forma que o povo vê e se expressa diretamente com o Brasil, sem precisar dos seus clássicos elementos intermediários, que, sistematicamente, totalizam o mundo social brasileiro para ele, e em seu nome. E isso se dá, em grande parte, porque, a massa popular jamais tem voz na “pátria de chuteiras”. “É pelo futebol, então, que se permite à massa uma certa intimidade com os símbolos nacionais” (DaMatta, 1982, p. 34). DaMatta, explica que, nesse tipo de sociedade, como a do Brasil, a popularidade do esporte bretão jaz na capacidade de possibilitar uma experiência com “estruturas permanentes”. O que advém das regras universais que essa modalidade tem, as quais ninguém pode modificar. O inverso do que acontece com a política, na qual após cada derrota, ou ao simples vislumbrar de derrota, os grupos dominantes buscam modificar as regras do jogo. 21 (...) o futebol (esse humilde e aparente instrumento de mistificação das massas), proporciona uma experiência exemplar de legitimidade e de acatamento às leis. Aqui as regras não mudam, e isso faz com que todos sejam iguais no campo da disputa. Derrota ou vitória é o prêmio a ser efetivamente colhido por quem joga melhor. (DaMatta, 1982, p. 39). Esse é um dos porquês do futebol ser utilizado como uma ferramenta que permite experimentar a igualdade, aberta e altamente democrática, por ser fundada no desempenho. Maior se torna a importância disso no contexto da sociedade brasileira, em que as pessoas são classificadas por meio de suas relações: pertencer a uma família, ter um título de doutor, receber um determinado espírito tendo com ele relações de compadrio, trabalhar para alguém poderoso etc. O que se inverte nesse esporte, em que as classificações são feitas pelo desempenho. Deste modo, ninguém pode ser promovido a astro de futebol pela família, pelo compadre ou por decreto presidencial, mas deve provar suas qualidades numa experiência empírica – experiência que é muito rara na sociedade brasileira, onde tudo tem o seu lugar e “quem é bom já nasce feito”. (DaMatta, 1982, p. 39). Johan Huizinga, filósofo holandês, também consultado por nós nessa pesquisa, segue a mesma linha de argumentação de Roberto DaMatta; mesmo se referindo de forma mais global ao esporte, mais especificamente ao jogo em si, que, para ele: Introduz na confusão da vida e na imperfeição do mundo uma perfeição temporária e limitada, exige uma ordem suprema e absoluta: a menor desobediência a esta “estraga o jogo”, privando-o de seu caráter próprio e de todo e qualquer valor. (Huizinga, 2000, p. 13). Por ter regras fixas, o jogo “cria” essa ordem, e por seu caráter de limite no espaço/tempo, essa perfeição é temporária e limitada. Estragar o jogo é desobedecer às suas regras, como a criança que não participa da ludicidade de uma brincadeira afirmando que aquilo que se combinou tacitamente não existe. Essa criança, geralmente, é deixada de lado pelas outras por “estragar” o jogo, ou o jogador que comete uma falta violenta demais e, por isso, é expulso. 22 No Brasil, essa ludicidade e esse seguimento de regras fixas fazem com que a música, o relacionamento com os santos e espíritos, a hospitalidade, a amizade, a comensalidade e, naturalmente, o carnaval e o futebol, permitam ao brasileiro comum entrar em contato com o permanente de seu mundo social. Retomando o filósofo holandês acima, cabe aqui ressaltar que ele nos adverte de que, nos estudos culturais sobre o esporte, não podemos cair no equívoco de colocar o jogo como uma finalidade: O grande estudioso da cultura emprega freqüentemente o termo jogo, sem contudo definir com exatidão qual o sentido que lhe atribui. Parece até por vezes aceitar subrepticiamente aquilo mesmo que tão energicamente repudia e que, de maneira alguma, corresponde à característica essencial do jogo: o conceito de finalidade. Porque na descrição proposta por Frobenius, o jogo serve explicitamente para representar um acontecimento cósmico, de certo modo tornando-o presente. (Huizinga, 2000, p. 20). Para Huizinga, o que é importante é o próprio jogo. Ele afirma que o ritual não difere de maneira essencial das formas superiores dos jogos infantis ou animais (brincadeiras de filhotes de cachorro, por exemplo), e dificilmente poderia afirmar-se que essas duas formas tenham a sua origem numa tentativa de expressão de qualquer emoção cósmica. “Os jogos infantis possuem a qualidade lúdica em sua própria essência, e na forma mais pura dessa qualidade” (Huizinga, 2000, p. 21). Feita essa ressalva e voltando ao universo mais específico do futebol; para o encerramento dessa parte da explanação teórica, todos os argumentos relacionados acima fazem com que DaMatta afirme que esse jogo, no Brasil, além de ser um esporte é também uma máquina de socialização de pessoas, um sistema altamente complexo de comunicação e valores essenciais e um domínio onde se tem a garantia da continuidade e da permanência cultural e ideológica como grupo inclusivo. Pois, se as formas de governo e a Constituição mudam constantemente, se as universidades, o padrão monetário e os partidos políticos fazem os brasileiros terem muitas dúvidas sobre uma sociedade enquanto nação moderna, aspirante a um lugar ao sol dentro de uma ordem mundial; futebol, carnaval e as relações 23 pessoais dizem que a sociedade brasileira é grande, criativa e generosa, tendo – como acontece com o futebol ali praticado – um glorioso futuro. (DaMatta, 1982, p. 40). Esse é o referencial no qual nos embasaremos para explicar a popularidade do futebol no país do carnaval. O futebol permite ao povo expressar uma série de problemas nacionais, alternando percepção e elaboração intelectual com emoções e sentimentos concretamente sentidos e vividos. O estudo das “dramatizações” do futebol nos auxiliam a ver como as fontes de identidade social no Brasil têm relações com as áreas da chamada “cultura popular”. 2.3 Crônica futebolística Também utilizamos, por exemplo, como fontes de informação, a biografia de Garrincha escrita por Ruy Castro “Estrela solitária: um brasileiro chamado Garrincha”, além das crônicas de José Roberto Torero, publicadas no jornal Folha de S. Paulo, reunidas em “Zé Cabala e outros filósofos do futebol”. Não se pode deixar de fora também um dos mais importantes cronistas da área, Nelson Rodrigues, com seu clássico “A Pátria em Chuteiras: novas crônicas de futebol”, e também “À sombra das chuteiras imortais: crônicas de futebol”. Nesses livros temos crônicas esportivas fundamentais para quem quer entender a cultura e a identidade futebolísticas. 2.4 Teorias da comunicação Para nos fundamentar quanto às teorias de comunicação vamos ter base em Edgard Morin no seu volume “A cultura de Massas no Século XX”, no qual fica latente a preocupação de Morin em fazer uma sociologia do presente (Morin, 2000, pág. 7). O acadêmico francês validou a produção cultural com fins lucrativos e a relação da cultura de massa com as outras culturas (popular, culta, religiosa, nacional, etc.). Porém, ele pensa esse tema em uma perspectiva “multicultural”. O que fica claro é que o autor acredita no prejuízo das 24 outras culturas na relação com a cultura de massas, por causa da homogeneização dos costumes e das visões. E um dos expoentes dessa cultura de massas, o jornal diário, hoje não tão massificado, muito em virtude da internet, da televisão e novas formas de comunicação; pede-nos, também, um embasamento teórico para ser analisado aqui. Além de Morin, apoiar-nos-emos no trabalho de Mário Erbolato, no seu livro “Jornalismo Especializado – Emissão de textos no jornalismo impresso”, para nos referir aos jornais diários. Nesse volume ele trata de esmiuçar a prática do jornalismo especializado, interessando- nos, principalmente, o capítulo sobre o noticiário esportivo, objeto do estudo sobre o qual estamos debruçados. Normas técnicas, normas éticas e de conduta do jornalismo e a relação entre a mídia e os jogadores, são alguns dos tópicos tratados nesse capítulo. Para Erbolato: Além de conhecer as regras e os regulamentos de cada modalidade de esporte, o jornalista precisa inteirar-se de uma série de fatos que, por serem infringidos ou esquecidos, podem constituir a base para um bom noticiário. (Erbolato, 1981, p. 13). Contudo, o jornalista esportivo, assim como seus colegas de outras editorias, não pode deixar de observar o seguimento de normas éticas da profissão, o que, infelizmente, não ocorre com a freqüência desejada, no contexto atual. Erbolato sugere que: A independência do jornal e do repórter precisa ser mantida a todo custo, principalmente quando há excursões esportivas. Nenhum favor (hospedagem, pagamento de passagem e outros) deverá ser aceito. Há coberturas, como a das Olimpíadas, que exigem equipes de preferência integradas por repórteres que dominem não só a língua do país em que se realiza a competição, mas também outras línguas estrangeiras. (Erbolato, 1981, p. 15). Também utilizaremos o livro do acadêmico português Nelson Traquina: “Teorias do jornalismo: Porque as notícias são como são”. Sobre o qual, o próprio autor comenta que: 25 As respostas oferecidas neste manual teórico para a prática jornalística apontam para o jornalismo com a realidade, mas uma realidade muito seletiva, construída através de inúmeros processos de interação social entre os profissionais do campo jornalístico. (Traquina, 2005, p. 205). Nesse volume estão agrupadas e discutidas as principais teorias do jornalismo, surgidas ao longo do século XX. Nessa obra ele faz uma discussão sobre a história do jornalismo e de sua teorização. Traquina reafirma Pierre Bordieu, segundo o qual os jornalistas partilham estruturas invisíveis, “óculos”, através das quais vêem certas coisas e não vêem outras. O jornalismo acaba por ser uma parte seletiva da realidade. Nesta construção teórica do jornalismo, apontamos que os membros da comunidade profissional partilham não só de uma maneira de ver, mas também uma maneira de agir e uma maneira de falar, o “jonalês”. (Traquina, 2005, p. 30). Mas, independentemente desse enviesamento, ganha muita força na sociedade a defesa da teoria democrática do jornalismo, inicialmente identificada apenas com a imprensa, segundo a qual esta deve ser: Um veículo de informação para equipar os cidadãos com as ferramentas vitais ao exercício dos seus direitos e voz na expressão das suas preocupações – designado como a liberdade positiva do jornalismo (Christians, Ferre e Fackler, 1993). Segundo o historiador Boyce, a imprensa atuaria como um elo indispensável entre a opinião pública e as instituições governantes (Boyce, 1978: 21). (Traquina, 2005, p. 129). Com um viés mais crítico sobre a imprensa, surgiram nos anos de 1960, dúvidas emergentes na universidade sobre a necessidade de novas perguntas, em acordo com a ebulição política daquele tempo. Impelidos por esse espírito de época, desenvolvem-se teorias como as de ação política, a partir dos anos de 1970, elaboradas por autores marxistas como Antônio Gramsci, Chomsky e Herman. Nessas perspectivas teóricas são realizados estudos da parcialidade a partir do pressuposto de que as notícias devem refletir sobre a verdade sem distorção. 26 Nessa nova fase de investigação, a relação entre jornalismo e sociedade conquista uma dimensão central: (...) o estudo do jornalismo debruça-se sobre as implicações políticas e sociais da atividade jornalística, o papel social das notícias e a capacidade do Quarto Poder em corresponder às enormes expectativas em si depositadas pela própria teoria democrática. (Traquina, 2005, p. 161). Pensadores como Gramsci chegaram à conclusão, através desses estudos, que os meios de comunicação de massa reforçam os pontos de vista do establishmemt, tendo em vista que essas empresas dependem da publicidade e de que estão nas mãos de poucas famílias que dominam o mercado - na época isso acontecia nos Estados Unidos e permanece até hoje, da mesma forma que no Brasil. Assim, nas teorias de ação política, os media noticiosos são vistos de uma forma instrumentalizada, isto é, servem objetivamente certos interesses políticos: na versão de esquerda, os media noticiosos são vistos como instrumentos que ajudam a manter o sistema capitalista; na versão de direita, servem como instrumentos que põem em causa o capitalismo. Seja de esquerda ou de direita, essas teorias defendem a posição de que as notícias são distorções sistemáticas que servem os interesses políticos de certos agentes sociais bem específicos que utilizam as notícias na projeção da sua visão de mundo, da sociedade, etc. (Traquina, 2005, p. 163). Contudo, Traquina problematiza que a questão central dessas teorias é que mostram uma visão altamente determinista do funcionamento do campo jornalístico, em que os jornalistas ou colaboram na utilização instrumentalizada da mídia, ou são totalmente submissos aos desígnios dos interesses dos proprietários, sem contar com o descumprimento de alguma dessas regras por parte destes. Tendo em vista que: (...) os jornalistas têm um grau de autonomia e afirmam frequentemente a sua própria iniciativa na definição do que é notícia, nomeadamente nos trabalhos de reportagem e jornalismo de investigação, e, às vezes, incomodam a elite e põem em causa os interesses do poder instituído e do poder econômico. (Traquina, 2005, p. 168). 27 Por isso, para Traquina, esse modelo reduz por completo o papel da ideologia profissional dos membros da comunidade jornalística a uma mera questão de false conscionousness. Exposto aqui, resumidamente, o nosso embasamento em comunicação social, devemos descrever agora a teoria que utilizaremos para empreender o estudo de caso. 2.5 Análise de Conteúdo Será empreendida uma pesquisa qualitativa, um estudo de caso, qual seja, o estudo das matérias publicadas pelos jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo no período de janeiro de 2008 até julho de 2010. Estes periódicos foram escolhidos por serem os dois jornais de maior circulação do estado de São Paulo, sendo que a Folha é o de maior circulação no Brasil e o “Estadão” um dos mais tradicionais, fundado em 4 de janeiro de 1875. Grosso modo, isso exemplifica a importância dos dois como formadores de opinião e como objeto de estudo. Foi selecionado o período sobredito por ser 2008 o ano em que Kaká foi chamado a depor no Ministério Público de São Paulo sobre sua relação com a igreja Renascer – à época, os fundadores da neopentecostal haviam sido presos nos EUA por conspiração para contrabando e contrabando de dinheiro – e o futebolista era um dos principais doadores da igreja. Portanto, é o período a partir do qual a relação entre Kaká e igreja em questão passou a ser contestada, inclusive judicialmente, enquanto que a carreira de Adriano sempre ficou marcada pelas suas “escapadas” de treinos e pela vida agitada fora de campo, mas, no período analisado, Adriano desistiu do futebol europeu porque alegava não ter mais alegria em jogar bola e trocou o glamour de morar em uma cidade como Milão, por uma volta à favela Vila Cruzeiro, no Rio de Janeiro, onde havia crescido, o que causou espanto na mídia à época. Para o estudo das matérias dos jornais utilizaremos a Análise de Conteúdo, de Laurence Bardin (2009). Essa metodologia é utilizada para identificar o que está sendo dito a respeito de determinado tema. Bardin a 28 conceitua como um conjunto de técnicas de análise das comunicações cuja finalidade é (...) a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção (ou, eventualmente, de recepção), inferência esta que recorre a indicadores (quantitativos ou não). (Bardin, 2009, p. 40). Os métodos são puramente semânticos. A unidade de registro é, em geral, acompanhada de algumas limitações, incluem características definidoras específicas, devem estar adaptadas a esta ou aquela investigação e podem ser de diferentes tipos (palavra, tema, personagem, item). A unidade de contexto é a parte mais ampla do conteúdo a ser analisado, porém é indispensável para a necessária análise e interpretação dos textos a serem decodificados e, principalmente, para que se possa estabelecer a necessária diferenciação resultante dos conceitos de significado e sentido. Bardin aponta em seu livro, como pilares, a fase da descrição ou preparação do material, a inferência ou dedução e a interpretação. Dessa forma, os principais pontos da pré-análise são: a leitura flutuante (primeiras leituras de contato os textos), a escolha dos documentos (no caso matérias sobre os jogadores), a formulação das hipóteses e objetivos, a referenciação dos índices e elaboração dos indicadores de acordo com a freqüência de aparecimento e a preparação do material. Por isso, previamente separou-se o material a ser analisado como uma leitura preliminar. Para o tratamento dos dados foi escolhida a técnica da análise temática ou categorial que, de acordo com Bardin (2009), baseia-se em operações de desmembramento do texto em unidades, ou seja, descobrir os diferentes núcleos de sentido que constituem a comunicação, e posteriormente realizar o seu reagrupamento em classes ou categorias. Assim, na fase posterior, a exploração do material, tem-se o período mais duradouro: a etapa da codificação, na qual são feitos recortes em unidades de contexto e de registro; e a fase da categorização, na qual os requisitos para uma boa categoria são: a exclusão mútua, homogeneidade, pertinência, objetividade, fidelidade e produtividade. 29 Já a última fase, do tratamento e inferência à interpretação, permite que os conteúdos recolhidos se constituam em dados qualitativos e/ou análises reflexivas, em observações individuais e gerais das matérias. 30 3 Mídia e espetacularização da vida Cada vez fica mais tênue a fronteira entre jornalismo informativo e entretenimento. Na denominada “sociedade da informação”, ironicamente, cada vez mais a informação é substituída por “notícias” sobre curiosidades, vida dos “famosos” e amenidades nas capas dos grandes jornais. Não que o jornalismo não deva falar sobre a vida das pessoas com notoriedade, mas há um limite ético para isso. Sobre esse tema, o acadêmico português Nelson Traquina afirma que: O jornalismo é “estórias” acerca da vida, das estrelas, das tragédias e dos espetáculos dos congressos partidários. O reforço do pólo econômico, as mudanças nas estruturas econômicas das empresas em grupos multimídia, a crescente competitividade, acentuaram a integração do campo jornalístico no campo mais vasto do campo mediático. Na definição e construção das notícias, a importância do que é importante não pode ser apagada pelo imperativo do que é interessante. Os imperativos da concorrência e a luta pelo brilho profissional na procura de furos e “exclusivas” não podem fazer esquecer o direito à vida privada e o poder do jornalismo de denegrir o bom nome. No calor da luta contra a tirania do fator tempo, as empresas jornalísticas e os jornalistas não podem fazer esquecer as regras elementares do trabalho, como, por exemplo, a verificação da informação, ou o respeito total pela fronteira entre o “fato” e “ficção”. (Traquina, 2005, p. 208). Contudo, nem sempre essas questões são observadas. Muito se noticia quando uma pessoa conhecida do público é levada a depor à justiça ou acusada e pouco se fala, quando se fala, da absolvição da mesma. Jogadores de futebol - tendo em vista a importância desse esporte no país e sua relação como integrante da composição da identidade nacional, têm suas vidas expostas e são vigiados e julgados full time. Muito disso se deve ao deslocamento do foco do jornalismo com a função de informar, para o jornalismo com a função de entreter. A crescente presença das notícias info-tainment e o crescente apagamento das fronteiras da informação e do entretenimento com a ascensão dos comunicadores, são tendências que apontam para a importância da 31 identidade profissional dos jornalistas. (Traquina, 2005, p. 208). Os jogadores abordados neste trabalho são emblemáticos nesse sentido, na medida em que um teve sua vida transformada em espetáculo, contudo de forma a prejudicá-lo; e outro, de forma a promovê-lo. O primeiro é Adriano, que teve suas faltas a treinos, saídas para a noite, problemas com alcoolismo e o suposto envolvimento com o tráfico, altamente divulgados; ao passo que Kaká também originou muita “notícia- entretenimento” tratando das suas bodas, da sua “boa” relação com a esposa, da exposição do “fato” de dizer ter se casado sem ter mantido relações sexuais e uma cobertura apagada do seu depoimento ao Ministério Público para esclarecer sua relação econômica com a igreja Renascer em Cristo. Sobre o tema de “Mídia e espetacularização da vida”, o colunista da Folha de S. Paulo, José Geraldo Couto, escreveu artigo publicado no jornal em 24 de abril de 2010, no caderno de “Esportes” no qual reflete sobre o tema. O articulista afirma que “No futebol midiático de hoje, quanto mais uma torcida ama um jogador, mais vigia seus passos” (Couto, 2010)1. Para ele, enquanto os atletas cumprem seu papel com boas apresentações em campo, encantando a platéia, “os supostos deslizes e desvios são perdoados, vistos até, às vezes, como um charme a mais, um traço pitoresco de personalidade” (Couto, 2010). Entretanto, quando o rendimento futebolístico cai, cresce a pressão geral por um comportamento regrado, uma vida de moderação. José Geraldo arremata ironicamente: “Fica a eterna dúvida: o rendimento cai por causa dos deslizes fora de campo ou os deslizes fora de campo aparecem mais quando o rendimento cai? O ovo ou a galinha?” (Couto, 2010). Para o articulista da Folha, o ponto nevrálgico da questão é que “A cobrança do torcedor é equivalente ao amor, à paixão que devotou ao ídolo” (Couto, 2010). Da mesma maneira que ama o ídolo quando este lhe dá títulos, gols, ele o quer vigiar, quer satisfações sobre sua vida. Seguindo esse ponto de vista, podemos concluir que o jornal noticia amplamente a 1 Tivemos de recorrer ao site do jornal Folha de São Paulo para coleta das matérias e artigos sobre os jogadores, contudo, apesar de constar o autor e a data das matérias e artigos, não há o número da página em que se encontravam na versão impressa. 32 vida desses astros da bola como forma de atender à demanda de informação, qual seja, informar não só o resultado, mas se o ídolo vai bem, como ele atuou dentro de campo, mas também como ele foi fora dele. Se ele foi mal, quais as razões extra-campo que o levaram a ir dessa maneira. Contudo, ao fazer isso, a mídia se volta ao entretenimento, deixando o “valor-notícia” de lado para noticiar amplamente a vida privada dos jogadores, o que não cabe a ela. Como citado no começo desse capítulo, isso extrapola os limites éticos do jornalismo. Ao fazer esse tipo de cobertura, as empresas de comunicação ajudam na construção da imagem desses jogadores perante o público, contudo, sem deixar de utilizar nesse processo todos os seus pontos de vista, ideologias e opiniões que permeiam a atividade em qualquer desses veículos de informação, com o agravante de que os meios de comunicação jornalísticos apregoam que seu discurso é desprovido de tudo isso, é imparcial, objetivo etc. Para Traquina, O jornalismo acaba por ser uma parte seletiva da realidade. Nesta construção teórica do jornalismo, apontamos que os membros da comunidade profissional partilham não só de uma maneira de ver, mas também uma maneira de agir e uma maneira de falar, o “jonalês”. (Traquina, 2005, p. 30). Por motivos como esse é que o objetivo deste trabalho é investigar quais são os mecanismos que permitem que a mídia produza identidade e discutir como esta é um dos principais pólos produtores de identidade na sociedade brasileira. E para tal efetuaremos a análise de conteúdo das matérias e artigos publicados pelos jornais impressos Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo sobre os jogadores Kaká e Adriano, no capítulo “Estudo de Caso”; de forma a investigar como esses meios e o contexto desempenhado pelo futebol na sociedade ajudaram na construção da identidade de ambos perante a sociedade. No último capítulo do trabalho empreenderemos a análise das edições dos jornais que trataram dos dois jogadores, sendo apenas as que abordaram as convocações de Kaká para falar sobre sua relação com a igreja Renascer do Reino de Deus, que trataram da sua ligação com essa 33 religião e as que demonstraram seu caráter de bom moço e rigoroso com seus afazeres. Além das que trataram de Adriano, sendo as que enfocaram suas saídas para festas, faltas a treinos e abordaram sua relação com traficantes e com o morro. O período estudado compreenderá de janeiro de 2008 até julho de 2010. 34 4 Mídia e futebol A relação entre o esporte e a imprensa das primeiras décadas do século XX era incipiente, pois o esporte não era considerado como algo relevante. De forma que o noticiário da época limitava-se a, no máximo, anunciar as disputas e a divulgar os resultados, tudo isso restrito a dez ou vinte linhas para cada competição. Segundo Brito Broca, “na segunda fase de modernização, de 1900 em diante, os jornais, sem desprezarem a colaboração literária, iam tomando um caráter cada vez menos doutrinário e sacrificando os artigos em favor do noticiário e da reportagem. As notícias de polícia, particularmente, que outrora, mesmo quando se tratava de um crime rocambolesco, não mereciam mais do que algumas linhas, agora passavam a cobrir largo espaço; surge o noticiário esportivo, até então inexistente, e tudo isso no sentido de servir o gosto sensacionalista do público que começava despertar”. (Erbolato, 1981, p. 14). Ao longo desse século a relação entre mídia e esporte foi se tornando cada vez mais forte, à medida que o futebol ia se tornando parte da identidade nacional, tendo como um de seus pontos culminantes nesse século a vitória da seleção de 1970, com a conquista do tricampeonato mundial de clubes, na qual o Brasil apresentou um futebol que passaria a integrar o imaginário nacional e até mesmo mundial dali em diante, quando se fala da seleção canarinho: o “futebol-arte”. A relação entre futebol e sociedade brasileira fica tão estreita que faz com que Roberto DaMatta afirme que: O futebol, portanto, tem – como o carnaval, a umbanda, o jogo do bicho e a cachaça, tudo isso que o povo diz que é sério no Brasil: - seu poder e seu próprio plano. Se ele é produto de uma civilização que tem no dinheiro, no poder e na mais-valia o seu eixo primordial, ele não pode ser transitivamente reduzido somente a isso. Da mesma forma que o amor não se reduz só ao sexo: ou a política ao mero uso e abuso da força: ou a poesia ao uso das palavras. Há na atividade futebolística (como em tudo o mais que constitui a vida em sociedade) um “mistério”. E esse “mistério” começa a ser desvendado quando nos damos conta que as coisas decolam e ganham asas. (DaMatta, 1982, p. 16). 35 Com a finalidade de explorar esse novo filão que surgia e se fortalecia sobremaneira, a mídia impressa, como meio de comunicação de massas que é, e com a intenção de conseguir atingir as massas, passou a dar cada vez mais espaço para a “Paixão Nacional”, e a relação entre futebol brasileiro e imprensa também “decolou e ganhou asas”: hoje temos cadernos inteiros dedicados ao esporte em todos os grandes jornais, nos quais o carro-chefe é o esporte bretão, que também conta com revistas e jornais especializados, como por exemplo, as revistas Placar, Football, Trivela e o jornal Lance. Já nos jornais diários, temos chamadas de capa para seus cadernos esportivos, que tratam, basicamente, de futebol, tendo um espaço reduzido para outras modalidades, somente se limitando, como outrora ao esporte como um todo, a falar sobre elas em poucas linhas ou simples boxes, confinados apenas aos resultados das disputas mais importantes, merecendo destaque um pouco maior apenas a Fórmula 1 em dias posteriores a corridas. Na imprensa sobre futebol contemporânea, tem-se a cobertura dos treinos, dos amistosos, dos campeonatos, dos bastidores e da política no futebol, da especulação sobre contratação de jogadores, da especulação sobre a vida destes etc. Para Erbolato, a seção de esportes, contudo, vai muito além disso: A Editoria de Esportes tem importância pela diversidade dos assuntos que aborda, nos setores profissional e amadorístico. Para cada especialidade recomenda-se um jornalista que entenda do assunto e que explique e comente as possibilidades dos concorrentes e as conseqüências de uma vitória, derrota ou empate em algumas competições. Aplicando-se as regras gerais sobre entrevista, reportagem, redação e diagramação, pode uma Seção Esportiva abordar aspectos variadíssimos, dependendo da orientação da Editoria e da Produção. (Erbolato, 1981, p. 15). Erbolato afirma em seu livro que foi depois da instituição da loteria esportiva no Brasil que vários jornais começaram a fazer os prognósticos e análises sobre as atuações dos clubes e a dar palpites sobre os resultados dos jogos futuros, como mais uma forma de atrair esse público leitor em 36 potencial dos apostadores, para a editoria que já tomava a forma em que se encontra hoje. Na imprensa atual, são justamente os que exercem esse papel, de analisar, criticar e fazer prognósticos, os mais prestigiados do noticiário futebolístico. Tendo em vista que os jornais impressos contemporâneos buscam na análise uma forma de conseguir novos leitores ou, até mesmo, não perder leitores para os meios digitais, que se limitam a apenas dar resultados, em razão de ser cansativo ficar lendo análises na tela do computador, com exceção da blogosfera, onde o jornalismo analítico e, principalmente, o opinativo se fazem cada vez mais presentes. Contudo, essa nova mídia também pode ser apontada como sinal de mais uma transformação pela qual o jornalismo está passando, e consequentemente, da sua relação com o futebol. Para o português Nelson Traquina, um conhecimento histórico do jornalismo nos ensina que: (...) do tambor dos satélites, esta atividade foi sempre profundamente transformada pelas inovações tecnológicas (Stephens, 1988). De novo, no início do novo milênio, as inovações tecnológicas, em particular a rede transglobal de computadores interligados pelo meio conhecido por internet, marcam as práticas jornalísticas, acelerando ainda mais a velocidade dos processos de produção de notícias, corroendo as barreiras do tempo e do espaço, globalizando as notícias e as audiências, criando novos canais de acesso aos membros da comunidade profissional (McNair, 1998). (Traquina, 2005, p. 210). O concreto é que essa transformação levou os meios impressos a privilegiar a análise e a opinião e, cada vez mais, o esporte também serve como mais uma forma velada da qual os jornais podem se utilizar para expressar suas opiniões e visões de mundo. Velada, porque muitas vezes os juízos de valor se encontram onde o leitor não espera isso: nas notícias, e não apenas nas colunas, desmentindo o que a imprensa apregoa sobre si mesma: imparcialidade e objetividade (como veremos no próximo capítulo Mídia e jogadores). Isso se dá seja na crítica da gestão dos clubes por parte dos cartolas, seja no julgamento sobre a conduta de um jogador, sobre a maneira com que ele age dentro e fora das quatro linhas. 37 Por esse motivo podemos afirmar que essa relação entre a “paixão nacional” e a mídia é pautada por ideologias, visões de mundo, que se utilizam do esporte de maior audiência de país como forma de expressar questões ligadas à identidade nacional: Não é por acaso que o futebol transcende o mero noticiário dos jornais e televisão, bem como os mais realistas e “politizados” comentários (o futebol, repete- se, é o ópio do povo) para permitir uma série interminável de discussões riquíssimas sobre a ideologia ou a concepção de mundo brasileira. (DaMatta, 1982, p. 14). Sendo assim, a conduta da mídia em relação ao futebol ajuda e ao mesmo tempo é influenciada pela incorporação desse esporte como uma das características inerentes da cultura brasileira. 38 5 Mídia e jogadores A mídia esportiva mantém uma relação de brigas e afagos com os jogadores de futebol. Estes tomam muito cuidado ao se relacionarem com os jornalistas, para não terem suas declarações distorcidas ou amplificadas - para se vender mais jornais. Esse receio por parte dos futebolistas em falar com os meios de comunicação faz com que o repórter tenha algumas dificuldades para conseguir informações relevantes com os atletas, que respondem com o óbvio rotineiramente. Isso já provocou reações na imprensa: Em reportagem, O Estado de São Paulo, depois de levantamento feito pelas diversas sucursais, afirmou que o atleta do futebol é robô programado especialmente para não ser sincero e autêntico. Por isso, cria-se no jogador uma série de mecanismos de defesa, retirando-lhe, toda a espontaneidade, de tal forma que 99% daquilo que diz são evasivas plenas de clichês, chavões e lugares-comuns. E esse fenômeno atinge também o técnico e o dirigente. Difícil é a tarefa do jornalista, considerado sempre uma “sombra indesejável” (Erbolato, 1981, p. 17). Como se pode notar, através dessa referência de Mário Erbolato a uma reportagem publicada no jornal O Estado de S. Paulo, no dia 29 de fevereiro de 1976 (presente no livro), a relação entre a imprensa e jogadores é tumultuada há tempos. Por meio desse trabalho de análise empreendido por nós, buscamos entender um pouco dos motivos que fazem com que os jogadores atuem de forma tão evasiva com o jornal que fez essa matéria, e com seus concorrentes, até os dias de hoje, tendo em vista que esses meios de comunicação, da mesma forma que elevam e elogiam um “astro da bola”, também querem inquirir sobre sua vida pessoal e sobre suas relações. Será possível perceber essa situação por meio das análises empreendidas no capítulo “Estudo de Caso”. Um dos exemplos disso é que, apesar de insistir no discurso da imparcialidade e objetividade, a imprensa brasileira, analisada aqui com base das páginas dos jornais diários Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo, utiliza-se profusamente de adjetivos para se referir aos jogadores de 39 futebol. Isso contribui para a construção da imagem dos mesmos, seja pela própria adjetivação da mídia, seja pelo contexto desempenhado pelo futebol na sociedade brasileira. De acordo com Roberto DaMatta, o futebol é, além de um esporte, um instrumento de socialização de pessoas, um sistema altamente complexo de comunicação de valores e essências. Além de servir como forma de integração da sociedade brasileira pela sua garantia da continuidade, da permanência cultural e ideológica enquanto grupo inclusivo. Pois, se as formas de governo e a Constituição mudam constantemente, se as universidades, o padrão monetário e os partidos políticos fazem os brasileiros terem muitas dúvidas sobre sua sociedade enquanto nação moderna, aspirante a um lugar ao sol dentro de uma ordem mundial; futebol, carnaval e as relações pessoais dizem que a sociedade brasileira é grande, criativa e generosa tendo - como acontece com o futebol ali praticado – um glorioso futuro. (DaMatta, 1982, p. 40). Para o antropólogo, partindo-se desse pressuposto, a “paixão nacional” teria tanta popularidade no Brasil por permitir expressar uma série de problemas nacionais, “alternando percepção e elaboração intelectual com emoções e sentimentos concretamente sentidos e vividos” (DaMatta, 1982, p. 41). Portanto, graças a isso, na sociedade do Brasil, os jogadores passam a encarnar o brasileiro comum que pode vencer por seus próprios méritos, pelo próprio talento, refletindo os anseios dos que acompanham esse esporte, o que dificilmente ocorre na sociedade civil, na qual se faz necessário o pertencimento a uma família, a uma classe social, a um partido, e a lista segue. Imersa nesse universo que engloba futebol e sociedade brasileira, a mídia, vendendo a ilusão de que prefere um discurso desprovido de subjetividades, amplia a identificação e a classificação dos atletas, seja repetindo o que é falado destes fora de campo, seja imprimindo sobre eles essa classificação que a própria implicação do futebol nesta sociedade oferece, além de adjetivar, por conta própria, de acordo com sua visão de mundo (parcial). Portanto, justamente o oposto do que ela sugere através 40 de seu discurso. Talvez, por isso os jogadores tomem tanto cuidado ao falar com repórteres. Por toda essa conjuntura, fizemos um levantamento dos adjetivos dados pelos jornais supracitados para os jogadores Kaká e Adriano, e chegamos à lista enumerada ao final deste capítulo, em que podemos notar o tratamento impregnado de carga subjetiva dado a eles. Os repórteres se utilizam dos adjetivos, muitas vezes, como recurso para não repetir os nomes dos jogadores e, assim, tornar o texto menos cansativo. Contudo, adjetivos mais neutros, que podem ser usados nesse caso, como jogadores, atletas, são substituídos por adjetivos que denotam a opinião do jornalista ou do meio de comunicação sobre o esportista, como por exemplo, quando se dirigem à Kaká, como “adorado”, “badalado”, “maior ídolo da torcida”, mostrando o que o jornal pensa a respeito dele, ou, até mesmo o que ele quer que seu leitor pense. O mesmo pode ser dito a respeito de Adriano, quando se referem a ele como “bad boy”, “problemático dentro e fora de campo”, “maior esperança de gols”, “o craque”, “ameaçado” etc. Durante o levantamento pudemos constatar que o jornalista esportivo tem maior liberdade para adjetivar os jogadores do que os repórteres de outras editorias, porque todos os adjetivos com maior carga subjetiva, como exemplificados acima, estavam nas páginas de esporte. Quando os atletas apareciam em páginas de cotidiano, ou em notícias policiais, pudemos notar o cuidado por parte dos jornalistas na busca maior pela “imparcialidade” tendo em vista a utilização de adjetivos mais “neutros”. Cabe ressaltar que essas “qualificações” aos jogadores se repetem pelo noticiário e aqui não estão relacionadas quantas vezes elas aparecem, mas, todas as que apareceram nas matérias e reportagens analisadas. Adjetivos como “Imperador” para se referir a Adriano, e astro, para se referir a Kaká, são muito comuns e dificilmente não aparecem em textos esportivos sobre eles, sendo que o adjetivo “Imperador” se fez presente, inclusive, nas matérias policiais, algumas vezes, de forma bastante irônica, como, por exemplo, no dia em que Adriano foi prestar depoimento no Ministério Público. A repórter se referiu dessa forma a ele: 41 “No MP, Adriano foi tratado como “Imperador”. Autorizado a entrar no prédio por acesso privativo de funcionários, o jogador teve ajuda de seguranças do órgão para driblar a imprensa” (Moreira, 2010 p. E6). Esse trecho é emblemático, na medida em que é ilustrativo da “briga” entre mídia e atletas supracitada no começo do capítulo. Adriano estava às turras com a imprensa, por causa da ampla cobertura dada a sua vida pessoal e, por esse motivo, evitava dar entrevistas. A repórter, como reprimenda a sua atitude, deu o tratamento irônico acima a ele. Também pudemos notar, pela análise dessa “qualificação” efetuada pela mídia, que o jornal Folha de S. Paulo se utiliza de mais adjetivos do que o periódico O Estado de S. Paulo. Isso fica visível ao se olhar as listas abaixo em que as da Folha são bem maiores para os dois atletas, e maior para Adriano, principalmente com adjetivos pejorativos, raramente dirigidos a Kaká, pelos dois jornais. No próximo tópico, a lista completa de “qualificações” encontradas nas matérias de janeiro de 2008 a julho de 2010, dos jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo, levando-se em conta que não foram utilizadas todas as matérias publicadas sobre os jogadores nesses veículos no período, mas, principalmente, aquelas que: denotavam maior construção da imagem dos atletas pelos periódicos; maior carga subjetiva, bem como as mais paradigmáticas no sentido de abordá-los de maneira a refletir ou aprofundar a imagem mais fixada sobre ambos, qual seja; grosso modo, Adriano como o “jogador-problema” e Kaká como o “bom moço”. 5.1 Adjetivos empregados pelos jornais aos jogadores Cabe ressaltar aqui que há um discurso preponderante para se referir aos jogadores, como foi sobredito, que é uma visão mais favorável à Kaká do que a Adriano; como fica claro ao primeiro passar de olhos sobre as listas abaixo. Contudo, esse discurso sobre os futebolistas não deixa de abrigar contrariedades. Kaká tanto é chamado de “ausente”, quanto é chamado de “ídolo número 1”. O mesmo se dá com Adriano que ao mesmo tempo em que é qualificado como “contestado”, é também “solução”. Como poderemos observar a seguir: 42 5.1.1 O Estado de S. Paulo Kaká: melhor jogador em 2007, campeão europeu, campeão mundial, milionário, famoso, craque, celebridade internacional, ídolo número 1, adorado, fiel, assediado, astro, alvo da investigação, aposta, último trunfo, meia-atacante, rapaz de caráter excepcional, ídolo, rico, badalado, famoso, um dos nomes de mais impacto no time de Dunga, maior ídolo da torcida, meia, principal jogador do Brasil, o mais querido pela torcida, atleta, o brasileiro, comportamento impecável dentro e fora de campo, brasileiro mais bem pago, milionário da bola, nova paixão do clube merengue, lesionado, uma das principais esperanças do time, um dos mais assediados, craque brasileiro, brilha, faz a diferença, pronto para voltar a brilhar na equipe e na seleção brasileira, afastado, parceiro do fabricante, astro do time, um dos maiores nomes da competição. Adriano: atacante, centro das atenções, centroavante, imperador, bad boy, problemático dentro e fora de campo, maior esperança de gols, o craque, ameaçado, camisa 10, irritado, problema, de comportamento rebelde, perdoado, o diferencial, aliviado, polêmico, jogador questionado, criticado, fora de forma, atacante decisivo, principal artilheiro do time, celebrado pela torcida, contestado, solução, o melhor em campo, decisivo, rico, badalado, festeiro, talento inquestionável, deprimido, astro, problema, artilheiro, estrela, suspenso, famoso, um dos nomes de mais impacto no time de Dunga, goleador, o dono da festa, baladeiro, jogador, problema para qualquer time, magoado com a imprensa, parece em paz consigo e com a namorada, está melhor, dispersivo, importante e decisivo para a vitória, alvo de um inquérito policial, principal dúvida do treinador, intocável, indispensável, esperança de gols da equipe, abalado, abatido, principal destaque, ex-jogador do flamengo. 5.1.2 Folha de S. Paulo Kaká: ausente, atleta do Milan, melhor jogador do mundo em 2007, meia- atacante, melhor do mundo, meia, maior astro do Milan, craque, jogador, o melhor jogador de futebol do mundo, atleta, estrela, novíssima estrela, 43 (colocados entre aspas de declarações de outros jornais europeus: o brasileiro perfeito, bom exemplo para as crianças, virtuoso da bola, mais europeu dos brasileiros, pessoa familiar, tem a humildade como bandeira, estrela do futebol)2, brasileiro, ex-são-paulino, mais vistoso fiel da Renascer, um dos líderes da seleção de Dunga, remanescente da copa alemã, camisa 10 da seleção de Dunga, jogador do Real Madrid, jogador brasileiro mais caro da história do futebol, astro do Milan, mina de ouro para rivais, porta de entrada para fiéis na Renascer, tranqüilo, praticamente a única estrela do time de Dunga, o único capaz de causa comoção quanto joga no Zimbábue ou treina em Soweto, evangélico, animado, maior astro do time italiano atualmente, brasileiro mais elogiado por Maradona, um dos mais experientes da seleção, maior estrela da seleção que vai à Copa do Mundo, alvo de críticas, famoso, grande atração da Copa dos Campeões, ex-melhor do mundo, decisivo, principal dúvida de Dunga para a Copa de 2010. Adriano: goleador e ídolo do Flamengo, decisivo, atacante da seleção brasileira, fora de forma, longe da sua melhor forma física, principal contratação da equipe para a temporada, imperador, esperança dos dirigentes para aumentar as receitas do clube, jogador, atacante, flamenguista, atacante do Flamengo, jogador, carioca, atleta, alvo de investigações em delegacias cariocas, rubro-negro, imprevisível, o novo camisa 10 são-paulino, principal contratação do São Paulo para a temporada, preocupado, herói da noite, destaque, centroavante, cobiçado, quem mais funciona na equipe do São Paulo, problemático em alguns momentos, aposta que dá mais certo no clube (São Paulo), artilheiro do campeonato, bad boy, longe da boa forma física, nova estrela do São Paulo, Principal reforço do São Paulo para 2008, ex-atacante da Inter de Milão, o grande reforço para a Libertadores, alvo preferencial dos paparazzi na Europa, imagem arrogante, mais aliviado, carrasco de argentinos, a grande novidade na convocação de Dunga, camisa 10 são-paulino, gigantesco, Majestático, noivo, camisa 10, discreto, pesado, lento, sem ritmo de jogo, 2 Na matéria da qual estes adjetivos foram extraídos, o repórter apenas repetia declarações de outros jornais europeus sobre o meia, nenhum desses adjetivos entre parênteses foi dado diretamente por ele, outros sim, que também estão relacionados acima. Contudo, o texto todo era uma colagem de declarações de forma a mostrar como o atleta era (bem) visto na Europa. 44 maior contratação do clube para 2008 (São Paulo), artilheiro, atleta da seleção, a principal atração do clássico contra o Vasco, o melhor centroavante de 2010, líder da artilharia nos clássicos, herói do jogo, personagem central em um clássico no Paulista, o melhor são-paulino em campo, artilheiro do Nacional, o mais festejado pela torcida, perigoso no ataque, indispensável, brasileiro, titular, atacante brasileiro, problemático, pupilo, diferente, arrependido, injustiçado, sincero e firme, ex-jogador do Flamengo, em baixa e sob pressão, esperança, astro, cobrado, convocado e grato, bastante agradecido, centro das atenções, figura internacional. 45 6 Estudo de caso Nosso objeto de estudo serão as matérias publicadas pelos jornais Folha de S. Paulo e O Estado de S. Paulo no período de janeiro de 2008 até julho de 2010. Esses periódicos foram escolhidos por serem os dois jornais de maior circulação do estado de São Paulo, sendo que a Folha é o de maior circulação no Brasil e o “Estadão” um dos mais tradicionais, fundado em 4 de janeiro de 1875. Grosso modo, isso exemplifica a importância dos dois como formadores de opinião e como objeto de estudo. Foi escolhido o período sobredito por ser 2008 o ano em que Kaká foi chamado a depor no Ministério Público de São Paulo sobre sua relação com a igreja Renascer – à época, os fundadores da neopentecostal haviam sido presos nos EUA por conspiração para contrabando e contrabando de dinheiro – e o futebolista era um dos principais doadores da religião. Portanto, é o período a partir do qual a relação entre Kaká e igreja em questão passou a ser contestada, inclusive judicialmente, enquanto que a carreira de Adriano sempre ficou marcada pelas suas “escapadas” de treinos e pela vida agitada fora de campo, mas, no período analisado, Adriano desistiu do futebol europeu porque alegava não ter mais alegria por jogar futebol e trocou o glamour de morar em uma cidade como Milão, por uma volta à favela no Rio de Janeiro onde havia crescido, o que causou espanto na mídia. Para a realização desse estudo utilizaremos a teoria Análise de Conteúdo, de Laurence Bardin, que, segundo ela própria: (...) fornece informações suplementares ao leitor crítico de uma mensagem, seja este lingüista, psicólogo, sociólogo, crítico de literário, historiador, exegeta religioso ou leitor profano que deseja distanciar-se da sua leitura “aderente” para saber mais sobre esse texto. (Bardin, 2009, p. 163). Para Bardin, a análise, Teoricamente, pode remeter para ou apoiar-se nos elementos constitutivos do mecanismo clássico da comunicação: por um lado, a mensagem (significação e código) e o seu suporte ou canal; por outro, o emissor 46 e o receptor, enquanto pólos de inferência propriamente ditos. (Bardin, 2009, p. 163). Nosso estudo valer-se-á da regra da representatividade, segundo a qual a análise se utilizará de uma amostra, que serão as matérias mais representativas sobre os jogadores Kaká e Adriano no sentido de abordá-los de maneira a aprofundar a imagem mais fixada sobre ambos: Kaká como “bom moço” e Adriano como “problemático”. A amostragem diz-se rigorosa se a amostra for uma parte representativa do universo inicial. Neste caso, os resultados obtidos para a amostra serão generalizados ao todo. (Bardin, 2009, p. 123). Para organização dos estudos reteremos as palavras-chave e as palavras-tema. Bardin afirma que a noção de tema, largamente utilizada em análise temática, é característica da análise de conteúdo e é definida como: Uma afirmação acerca de um assunto. Quer dizer, uma frase, ou uma frase composta, habitualmente um resumo ou uma frase condensada, por influência da qual pode ser afectado um vasto conjunto de formulações singulares. (Bardin, 2009, p. 131). O tema, enquanto unidade de registro, corresponde a uma regra de recorte (do sentido e não da forma) que não é fornecida uma vez por todas, visto que o recorte depende do nível de análise e não de manifestações formais reguladas. No nosso caso, o recorte será o supracitado, tendo em vista que, para Bardin: O tema é geralmente utilizado como unidade de registro para estudar motivações de opiniões, de atitudes, de valores, de crenças, de tendências, etc. As respostas a questões abertas, as entrevistas (não directivas ou mais estruturadas) individuais ou de grupo, de inquérito ou de psicoterapia, os protocolos de teses, as reuniões de grupo, os psicodramas, as comunicações de massa, etc. (Bardin, 2009, p. 131). Como unidade de registro utilizaremos o que Bardin chama de O Personagem. Segundo essa proposição, nossos personagens são Kaká e 47 Adriano, que serão estudados de acordo com a “grelha” que escolhemos, isto é, como foi feito no capítulo anterior, com as qualificações atribuídas a eles, e analisar, nas matérias estudadas a seguir, o contexto em que esses adjetivos foram empregados. Para Bardin, nessa efetuação, temos de responder às questões: “Quem e em que ocasião? Com que papel? Em que situação etc. A unidade personagem pode ser combinada com outros tipos de unidade” (Bardin, 2009, p. 132). Para a interpretação do estudo utilizaremos o que Bardin denomina unidade de contexto, a qual serve de unidade de interpretação, para codificar a unidade de registro e corresponde ao seguimento da mensagem. Para ela, as dimensões dessa mensagem, “são óptimas para que se possa compreender a significação exacta da unidade de registro. Esta pode, por exemplo, ser a frase para a palavra e o parágrafo para o tema” (Bardin, 2009, p. 133). Também utilizaremos, como parte de uma análise quantitativa englobada pela pesquisa geral, uma regra de enumeração apontada por Bardin, que será a da presença/ausência. A freqüência é usada para mostrar quando o que e quando aparece. “No entanto, a ausência de elementos (relativamente a uma certa provisão) pode, nalguns casos, veicular um sentido” (Bardin, 2009, p. 134). Neste caso pretendemos demonstrar a presença de muitas matérias favoráveis a Kaká, em oposição a muitas desfavoráveis a Adriano, bem como a menor freqüência do oposto disso, como forma de construção de um discurso sobre ambos no noticiário. Haja vista que, segundo a autora: (...) a aparição de um item de sentido ou de expressão será tanto mais significativa – em relação ao que procura atingir na descrição ou na interpretação da realidade visada –quanto mais esta freqüência se repetir. A regularidade quantitativa da aparição é, portanto, aquilo que se considera como significativo. Isto supõe que todos os itens tenham o mesmo valor, o que nem sempre acontece. (Bardin, 2009, p. 135). Também utilizaremos o conceito de direção, apresentado pela autora, segundo o qual a ponderação da freqüência traduz um caráter quantitativo (intensidade) ou qualitativo: a direção. 48 A direção pode ser favorável, desfavorável, ou neutra (eventualmente ambivalente), num caso de um estudo de favoritismo/desfavoritismo. Os pólos direcionais podem, no entanto, ser de natureza diversa: bonito/feio (crítico estético), pequeno/grande (tamanho), etc. (Bardin, 2009, p. 137). Tendo como base esse conceito, levantaremos nas matérias a forma como foi direcionada a visão aos jogadores, como vimos no capítulo anterior, com os adjetivos, e isso não se deu de forma imparcial; a seguir faremos as inferências e análises de como isso ocorreu nas notícias, que serão empreendidas segundo o que explica Bardin: Por exemplo, na análise da imprensa, a superfície dos artigos, o tamanho dos títulos ou a freqüência dos acontecimentos descritos talvez sejam três modos de codificação e de enumeração aptos para elucidarem a mesma realidade. (Bardin, 2009, p. 163). 6.1 Categorização Nessa primeira parte da análise, faremos a relação de todas as matérias selecionadas, conforme o supracitado, com base nos critérios enumerados abaixo, a saber: Kaká visto positivamente por questões morais e por questões do jogo e visto negativamente pelos mesmos critérios, o mesmo se dando com Adriano. Cabe ressaltar aqui que se trata de apenas um quadro numérico quantitativo, que pode ser comprovado pela leitura superficial das matérias relacionadas nos anexos, bem como pela explicação no detalhamento que faremos logo abaixo da tabela. A análise qualitativa, que dará mais subsídios para essa quantificação feita abaixo, com suas devidas conclusões, constará dos próximos tópicos. Cabe ressaltar que a maior quantidade de matérias sobre Adriano se dá em virtude de este ter jogado, em alguns períodos abrangidos pelo estudo, em clubes brasileiros: primeiro em 2008, pelo São Paulo Futebol Clube e depois em 2009, após fracassada volta para a Internazionale de Milão (segundo semestre de 2008) ele defendeu o Clube de Regatas Flamengo. Enquanto que Kaká, durante todo o período abarcado jogou no exterior. Até o primeiro semestre de 2009 no clube italiano Milan (no qual ele atuou por oito anos), e a partir de junho desse ano no Real Madrid, da 49 Espanha, clube onde permanece. Pudemos notar que Adriano foi mais noticiado por estar no Brasil (tendo como critério de noticiabilidade a proximidade, segundo Traquina (2005)), porque, quando voltou a atuar na Itália, mesmo sendo muito noticiado por lá, devido aos problemas que passou a enfrentar, ele merecia apenas notas curtas nos jornais daqui. Os dois só recebiam textos mais longos quando chamavam a atenção de forma não usual nos países do exterior. Cabe ressaltar que algumas matérias, pela polifonia intrínseca ao discurso midiático, poderiam ser encaixadas, contraditoriamente, ao mesmo tempo em até três categorias. Contudo, selecionamos o discurso que prevalece, o que é a tônica, como mais um critério de divisão. Mesmo assim, há muitas notícias sobre os atletas que se encaixam em duas categorias ao mesmo tempo. As que apresentam alguns pontos obscuros, e que sua delimitação não fica tão clara logo à primeira leitura, estão mais bem explicadas no detalhamento, logo abaixo da tabela que segue, como poderemos observar: Kaká visto positivamente: a) por questões morais: O Estado de São Paulo – “Na contramão das celebridades” – 04-01-2008; O Estado de São Paulo – “Kaká fica no Milan. “Dinheiro não é tudo””, diz Berlusconi – 20-01-2009; O Estado de São Paulo – ““Escutei meu coração”, diz Kaká” – 20-01-2009; O Estado de São Paulo – “Kaká se diz perseguido e critica jornalista” – 20-06-2009; O Estado de São Paulo – “Kaká vê prestígio em alta já na apresentação” – 01-07-2009; O Estado de São Paulo – “Kaká, parceiro do fabricante, elogia a bola” – 05- 06-2010; O Estado de São Paulo – “Kaká volta após 45 dias em meio a polêmica” – 24-04-2010; Folha de São Paulo – “Brasil é fábrica de Ronaldos, diz Kaká” - 17-02-2008; Folha de São Paulo – “Ele cresceu longe das favelas” - 01-07-2009; Folha de São Paulo – “Eleição na Europa adia o anúncio da saída de Kaká” - 04-06-2009; Folha de São Paulo – “Escaldado, time troca carnaval por oração” - 29-06-2009; Folha de São Paulo – “Jogador culpa crise econômica pela transação” - 09-06-2009; Folha de São Paulo – “Jogador se diz perseguido por causa da religião” - 23-06-2010; Folha de São Paulo – “Kaká apregoa virgindade e liderança” - 15-10-2008; Folha de São Paulo – “Kaká encara polêmicas tranqüilo” - 05-06-2010; 50 Folha de São Paulo – “Kaká hesita em tomar rumo de Robinho” - 15-01- 2009; Folha de São Paulo – “Kaká nega Berlusconi em polêmica” - 11-07- 2008; Folha de São Paulo – “Kaká se diz prescindível e defende os 23” - 13- 05-2010; Folha de São Paulo – “Kaká vê exagero no otimismo do City em tirá-lo do Milan” - 16-01-2009; Folha de São Paulo – “No Real, Kaká abre a vida no Twitter e lamenta o Milan” - 21-10-2009; Folha de São Paulo – “Por torcida, Kaká recusa oferta recorde” - 20-01-2009; Folha de São Paulo – “Real aplaude Kaká e delira com Ronaldo” - 26-08-2009. b) pelo jogo: O Estado de São Paulo – “Kaká volta a ser aposta de Dunga” – 25-09-2008; O Estado de São Paulo – “Kaká no Real mais uma vez. É o que dizem na Espanha” – 07-04-2009; O Estado de São Paulo – “Real leva Kaká por R$178 mi” – 03-06-2009; O Estado de São Paulo – “Kaká se diz perseguido e critica jornalista” – 20-06-2009; O Estado de São Paulo – “Kaká vê prestígio em alta já na apresentação” – 01-07-2009; O Estado de São Paulo – “Kaká, o brasileiro mais bem pago” – 17-09-2009; O Estado de São Paulo – “Kaká vai receber cuidados especiais na seleção para não estourar” – 03-04-2010; O Estado de São Paulo – “Kaká entra no fim, faz gol e mantém Real vivo” – 25-04-2010; Folha de São Paulo – ““Brasil é fábrica de Ronaldos”, diz Kaká” - 17-02-2008; Folha de São Paulo – “Com Kaká, Brasil mantém seu desempenho em alta” - 08-09-2009; Folha de São Paulo – “Ele cresceu longe das favelas” - 01-07-2009; Folha de São Paulo – “Escaldado, time troca carnaval por oração” - 29-06-2009; Folha de São Paulo – “Espanhol Kaká dribla desconfiança e salva o Real” - 25-04-2010; Folha de São Paulo – “Kaká abre nova caçada ao título de melhor do mundo” - 17-02-2008; Folha de São Paulo – “Kaká acerta salário com Real Madrid” - 03-06-2009; Folha de São Paulo – “Kaká apregoa virgindade e liderança” - 15-10-2008; Folha de São Paulo – “Kaká bate Messi na aposta para o craque do Mundial” - 25-04-2010; Folha de São Paulo – “Kaká brilha mais que primeira galáxia” - 01-07-2009; Folha de São Paulo – “Kaká deixa seleção mais goleadora” - 01-04-2009; Folha de São Paulo – “Kaká é mina de ouro para rivais” - 01-06-2010; Folha de São Paulo – “Kaká encara polêmicas tranqüilo” - 05-06-2010; Folha de São Paulo – “Kaká hesita em tomar rumo de Robinho” - 15-01-2009; Folha de São Paulo – “Kaká se compara a Maradona” - 04-09-2009; Folha de São Paulo – “Kaká se diz prescindível e defende os 23” - 13-05-2010; Folha de São Paulo – “Kaká vê 51 exagero no otimismo do City em tirá-lo do Milan” - 16-01-2009; Folha de São Paulo – “No Real, Kaká abre a vida no Twitter e lamenta o Milan” - 21- 10-2009; Folha de São Paulo – “Por torcida, Kaká recusa oferta recorde” - 20-01-2009; Folha de São Paulo – “Raridade, Kaká leva o vermelho” - 21- 06-2010; Folha de São Paulo – “Real aplaude Kaká e delira com Ronaldo” - 26-08-2009. Kaká visto negativamente: a) por questões morais: O Estado de São Paulo – “Justiça quer ouvir Kaká sobre Renascer” – 13-01-2008; O Estado de São Paulo – “De uma só vez, Kaká doou € 200 mil para Renascer” – 17-02-2009; O Estado de São Paulo – “Hernandes e Kaká lançam pedra fundamental da igreja” – 08-09- 2009; O Estado de São Paulo – “Espanhóis criticam Kaká, lesionado, por correr em comercial” – 28-03-2010; Folha de São Paulo – “Ausente, Kaká é alvo da ira de Dunga” - 31-05-2008; Folha de São Paulo – “Em culto no Bixiga para 19 pessoas, pastor repreende fiéis e silencia sobre vítimas” - 20-01-2009; Folha de São Paulo – “Kaká e troféu da Fifa se tornam porta de entrada para fiéis na Renascer” - 02-02-2008; Folha de São Paulo – “Kaká participa de evento de reconstrução da Renascer” - 08-09-2009; Folha de São Paulo – “Kaká terá de explicar sua relação com a Igreja Renascer” - 13-01-2008; Folha de São Paulo – “Marcha da Renascer reúne 1,2 milhão de pessoas em São Paulo” - 23-05-2008. b) pelo jogo: O Estado de São Paulo – “Ricos, badalados e... em má fase” 28-03-2009; O Estado de São Paulo – “Espanhóis criticam Kaká, lesionado, por correr em comercial” – 28-03-2010; Folha de São Paulo – “Ausente, Kaká é alvo da ira de Dunga” - 31-05-2008; Folha de São Paulo – “Kaká admite a má fase e minimiza a crise no Real” - 13-03-2010; Folha de São Paulo – “Kaká some na Europa e vira alvo de críticas” - 18-02-2010. Adriano visto positivamente: a) por questões morais: O Estado de São Paulo – “Adriano repete Ronaldo e diz ter costas largas” – 17-04-2010; Folha de São Paulo – “A morte passou por perto” - 06-12-2009; Folha de São Paulo – “Adriano pacifica o Fla em 1º treino no clube” - 19-05-2009. b) pelo jogo: O Estado de São Paulo – “Adriano puxa a fila no São Paulo” – 08-01-2008; O Estado de São Paulo – “Muricy promete recuperar Adriano” 52 – 09-01-2008; O Estado de São Paulo – “São Paulo será Adriano e mais 10” – 10-01-2008; O Estado de São Paulo – “Uma noite de gala do imperador” – 18-01-2008; O Estado de São Paulo – “Adriano começa hoje nova vida” – 17-01-2008; O Estado de São Paulo – “Adriano desencanta, marca dois e o São Paulo vence de virada” – 06-03-2008; O Estado de São Paulo – “A redenção do polêmico Adriano” – 04-04-2008; O Estado de São Paulo – “Estrelas com papéis invertidos” – 20-04-2008; O Estado de São Paulo – “Adriano, suspenso, está na lista pra pegar Itália” – 27-01-2009; O Estado de São Paulo – “Fla considera certo o acordo com Adriano. Falta assinar” – 01-05-2009; O Estado de São Paulo – “Adriano recebido com pompa no Fla” – 08-05-2009; O Estado de São Paulo – “Adriano: o dono da festa no Maracanã” – 01-06-2009; O Estado de São Paulo – “Dunga traz Adriano de volta à seleção” – 21-08-2009; O Estado de São Paulo – “Adriano cala críticos e ganha torcida” – 20-12-2009; O Estado de São Paulo – “Patrícia escala Adriano e Kléberson na estréia” – 09-03-2010; O Estado de São Paulo – “Adriano é a principal dúvida do treinador” – 11-05-2010; O Estado de São Paulo – “Flamengo confia em Adriano para vencer no Maracanã” – 12-05-2010; O Estado de São Paulo – “Adriano dá vitória ao Fla na volta” – 15-03-2010; Folha de São Paulo – “A morte passou por perto” – 06-12- 2009; Folha de São Paulo – “Adriano fica na favela e adia decisão sobre futuro” – 10-12-2009; Folha de São Paulo – “Adriano impera em sua estréia” – 18-01-2008; Folha de São Paulo – “Adriano marca em sua estréia pelo Flamengo” – 01-06-2009; Folha de São Paulo – “Adriano salva safra de reforços” – 07-03-2008; Folha de São Paulo – “Adriano se despede do Fla para pagar dívida com Itália” – 28-05-2010; Folha de São Paulo – “Adriano se queima e perde decisão” – 28-11-2009; Folha de São Paulo – “Aos 49min, Adriano faz gol decisivo e exibe físico” – 03-04-2008; Folha de São Paulo – “Carrasco de argentinos, Adriano é convocado” – 21-08-2009; Folha de São Paulo – “Com dois gols, Adriano dá sua melhor desculpa” – 06-03- 2008; Folha de São Paulo – “Como de hábito, Adriano faz gol, e São Paulo vence” – 15-05-2008; Folha de São Paulo – “Em família, São Paulo festeja Adriano” – 19-01-2008; Folha de São Paulo – “Em má fase, Adriano sobra entre os atacantes” – 05-05-2010; Folha de São Paulo – “Entrevista Maradona fez gol de mão, diz herói do jogo” – 14-04-2008; Folha de São 53 Paulo – “Flamengo vence com Adriano até na defesa” – 16-11-2009; Folha de São Paulo – “Muricy e 2º pai aprovam a atuação” – 18-01-2008. Adriano visto negativamente: a) por questões morais: O Estado de São Paulo – “Carlos Alberto, aposta ousada do São Paulo” – 16-01-2008; O Estado de São Paulo – “Adriano complicado ano de 2007 com acidente de carro no Rio” – 01-01-2008; O Estado de São Paulo – “Muricy promete recuperar Adriano” – 09-01-2008; O Estado de São Paulo – “Imperador ameaçado” – 01-03-2008; O Estado de São Paulo – “São Paulo perdoa Adriano” – 02-03-2008; O Estado de São Paulo – “Adriano cai na balada e recebe punição da Inter” – 29-10-2008; O Estado de São Paulo – “Mourinho pede mais esforço para Adriano” – 22-11- 2008; O Estado de São Paulo – “Adriano, suspenso, está na lista para pegar Itália” – 27-01-2009; O Estado de São Paulo – “A redenção do polêmico Adriano” – 04-04-2008; O Estado de São Paulo – “Procura-se Adriano desesperadamente” – 06-04-2009; O Estado de São Paulo – “Internazionale planeja processar Adriano” – 09-04-2009; O Estado de São Paulo – “Adriano cansa da vida de astro” – 10-04-2009; O Estado de São Paulo – “Inter se cala, mas na não conta mais com Adriano” – 11-04-2009; O Estado de São Paulo – “Adriano acha que a Inter joga pesado ao propor rescisão” – 17-04-2009; O Estado de São Paulo – “Inter, enfim, acaba com a novela Adriano” – 25-04-2009; O Estado de São Paulo – “Adriano não aparece para depor sobre tráfico” – 01-06-2010; O Estado de São Paulo – “Adriano: o dono da festa no Maracanã” – 01-06-2010; O Estado de São Paulo – “Adriano já apronta das suas no Flamengo” – 03-06-2010; O Estado de São Paulo – “MP pede quebra de sigilo bancário e telefônico de Adriano” – 03-06-2010; O Estado de São Paulo – “Dunga traz Adriano de volta à seleção” – 21-08-2009; O Estado de São Paulo – “Adriano cala críticos e ganha torcida” – 20-12-2009; O Estado de São Paulo – “Adriano admite: está fora por seus erros” – 12-03-2010; O Estado de São Paulo – “Adriano é a principal dúvida do treinador” – 11-06-2010; O Estado de São Paulo – “Adriano vai à Itália em busca de paz” – 02-06-2010; O Estado de São Paulo – “Adriano vai ter de ir à polícia para se explicar” – 17-03-2010; O Estado de São Paulo – “Adriano nega ter dado moto à traficante” – 28-03- 2010; O Estado de São Paulo – “Adriano desabafa e diz que não usa drogas” – 13-03-2010; O Estado de São Paulo – “Adriano surpreende e 54 aparece na Gávea” – 16-03-2010; Folha de São Paulo – “Adriano Atacante nega ter dado dinheiro a traficante do CV” – 04-06-2010; Folha de São Paulo – “Adriano chora, treina e conversa com psicólogo” – 12-05-2010; Folha de São Paulo – “Adriano diz que bebe, mas nega que seja alcoólatra” – 13-03-2010; Folha de São Paulo – “Adriano diz que fica no Brasil” – 10- 04-2009; Folha de São Paulo – “Adriano é outro do Fla na mira da polícia” – 17-03-2010; Folha de São Paulo – “Adriano fica na favela e adia decisão sobre futuro” – 10-12-2009; Folha de São Paulo – “Adriano marca em sua estréia pelo Flamengo” – 01-06-2009; Folha de São Paulo – “Adriano rescinde e é cobiçado no Flamengo” – 25-04-2009; F