UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – UNESP “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS E VETERINÁRIAS CAMPUS DE JABOTICABAL ESTUDO ANATÔMICO, RADIOGRÁFICO E ENDOSCÓPICO DA LARINGE E TRAQUEIA DE CÃES BRAQUICEFÁLICOS E MESOCEFÁLICOS Thais Isaias dos Santos Médica veterinária Jaboticabal 2025 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA – UNESP “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS E VETERINÁRIAS CAMPUS DE JABOTICABAL ESTUDO ANATÔMICO, RADIOGRÁFICO E ENDOSCÓPICO DA LARINGE E TRAQUEIA DE CÃES BRAQUICEFÁLICOS E MESOCEFÁLICOS Thais Isaias dos Santos Orientador: Prof. Dr. Fabrício Singaretti de Oliveira Dissertação apresentada à Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias – Unesp, Câmpus de Jaboticabal, como parte das exigências para a obtenção do título de Mestre em Ciências Veterinárias, Área: Morfologia e Reprodução Animal Jaboticabal 2025 S237e Santos, Thais Isaias dos Estudo anatômico, radiográfico e endoscópico da laringe e traqueia de cães braquicefálicos e mesocefálicos / Thais Isaias dos Santos. -- Jaboticabal, 2025 72 p. : tabs., fotos Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Jaboticabal Orientador: Fabrício Singaretti de Oliveira 1. Anatomia. 2. Cadaver. 3. Conservação. I. Título. Sistema de geração automática de fichas catalográficas da Unesp. Dados fornecidos pelo autor(a). REGISTRO DE IMPACTO. Esta dissertação contribui para o avanço no diagnóstico e tratamento da síndrome braquicefálica em cães, oferecendo um método inovador de conservação de cadáveres para treinamento endoscópico e cirúrgico. Os resultados auxiliam na formação de profissionais veterinários e promovem melhorias na qualidade de vida de animais braquicefálicos, reduzindo complicações respiratórias e otimizando procedimentos clínicos. DADOS CURRICULARES DO AUTOR Thais Isaias dos Santos, nascida em São Paulo-SP, em 09 de junho de 1993. Graduou-se em Medicina Veterinária, na Universidade Federal do Tocantins, Araguaína, no ano de 2022, com trabalho de conclusão intitulado “Cistite relacionada à hiperplasia prostática benigna em cães: relato de caso”. Em março de 2023, iniciou o curso de Mestrado no Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias da FCAV – UNESP, Câmpus de Jaboticabal, SP, sob orientação do Prof. Dr. Fabrício Singaretti de Oliveira. O projeto foi financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), por meio da bolsa de mestrado concedida sob o processo nº 2023/03473-9. "Se você tropeçar cem vezes, levante-se cem vezes. O verdadeiro caminho da vitória é continuar avançando sem desistir, até o final." – Nitiren Daishonin DEDICATÓRIAS Dedico esta dissertação ao meu pai, que sempre acreditou em mim e foi meu maior incentivador. Sua dedicação, seu apoio incondicional e sua crença na importância dos estudos foram fundamentais para que eu chegasse até aqui. Este é o reflexo de tudo o que você me ensinou e da força que me transmitiu ao longo do caminho. Obrigado por ser minha inspiração. AGRADECIMENTOS A conclusão desta dissertação só foi possível graças ao apoio, incentivo e colaboração de muitas pessoas que estiveram ao meu lado durante essa jornada. Expresso aqui minha profunda gratidão a todos que fizeram parte deste caminho: À minha família, especialmente ao meu pai, Alberto, e à minha irmã, Laís, por todo o apoio e motivação incondicionais. Vocês foram minha base e meu conforto em todos os momentos. Ao meu marido, Gustavo, por sempre estar ao meu lado, apoiando todas as minhas decisões e acreditando em mim. Sua parceria foi essencial para que eu chegasse até aqui. À minha psicóloga, Alana, por me acompanhar nessa jornada e me ajudar a me tornar uma versão melhor de mim mesma. Sua orientação e cuidado fizeram toda a diferença no meu crescimento pessoal e profissional. Ao meu orientador, Fabrício Singaretti, pela confiança, orientação e pelo aprendizado compartilhado. Obrigada pela oportunidade de crescimento que este trabalho representou. Ao senhor Zé e à Marilda, pelo carinho com que sempre me acolheram desde a minha chegada. Vocês tornaram essa caminhada mais leve e especial. Aos colegas e amigos do laboratório de Anatomia Cirúrgica da Unesp, Daniel, Giulia, Giovanna, Arthur e Andrea, pela parceria, pelas conversas e pela alegria que trouxeram aos meus dias. Obrigada por dividirem essa jornada comigo. À equipe do setor de diagnóstico por imagem e do setor de cirurgia veterinária do Hospital Veterinário Governador Laudo Natel, especialmente à professora Danuta, professora Paola, Ariadne, Gabriel, Caio, Naira e Ismael, pela colaboração, amizade e dedicação. Vocês foram peças fundamentais para o desenvolvimento deste trabalho. À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), pelo apoio financeiro através da bolsa de estudos concedida (nº 2023/03473-9), sem a qual este trabalho não seria possível. I SUMÁRIO DADOS CURRICULARES DO AUTOR .............................................................................iv CERTIFICADO DA COMISSÃO ÉTICA NO USO DE ANIMAIS. ....................................... III RESUMO.......................................................................................................................... IV ABSTRACT ....................................................................................................................... V LISTA DE FIGURAS ......................................................................................................... VI LISTA DE TABELAS ......................................................................................................... IX LISTA DE ABREVIATURAS .............................................................................................. X CÁPITULO 1: CONSIDERAÇÕES GERAIS ...................................................................... 1 1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 1 1.1. Hipótese .................................................................................................................. 1 2. REVISÃO LITERATURA ................................................................................................ 2 2.1 Métodos de conservação de cadáveres em anatomia ............................................ 2 2.2 Variações do crânio ..................................................................................................... 4 2.3 Síndrome Braquicefálica ......................................................................................... 6 2.4 Considerações anatômicas da laringe e traqueia em cães ..................................... 6 2.5 Exames de imagem na síndrome braquicefálica ......................................................... 9 3. OBJETIVOS GERAIS. ................................................................................................. 11 4. REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 11 CAPÍTULO 2: LARINGOTRAQUEOSCOPIA DOS CÃES BRAQUICEFÁLICOS E MESOCEFÁLICOS. ..................................................................................................... 17 1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 17 2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS ........................................................................................ 18 3. MATERIAIS E MÉTODOS ........................................................................................... 18 3.1. Animais utilizados ................................................................................................. 18 3.2. Técnica anatômica empregada ............................................................................. 18 4. RESULTADOS ............................................................................................................ 22 II 4.1 Uso dos cadáveres quimicamente tratados para treinamento de laringotraqueoscopia ........................................................................................................ 22 4.2 Variações anatômicas ........................................................................................... 24 5. DISCUSSÃO ............................................................................................................... 26 6. CONCLUSÃO .............................................................................................................. 29 REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 29 CAPÍTULO 3: ARTERIOGRAFIA CERVICAL DESCRIÇÃO DA INERVAÇÃO TRAQUEAL COMPARATIVA ENTRE CÃES BRAQUICEFÁLICOS E MESOCEFÁLICOS ............. 32 1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 32 2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS ........................................................................................ 32 3. MATERIAIS E MÉTODOS ........................................................................................... 33 3.1 Animais utilizados ................................................................................................. 33 3.2 Técnica Anatômica empregada ............................................................................ 33 4. RESULTADOS ............................................................................................................ 35 4.1 Arteriografia cervical .................................................................................................. 35 4.2 Dissecação arterial .................................................................................................... 40 4.3 Dissecação da inervação ........................................................................................... 44 5. DISCUSSÃO ................................................................................................................ 50 6. CONCLUSÕES ............................................................................................................ 52 REFERÊNCIAS ............................................................................................................... 52 III CERTIFICADO DA COMISSÃO ÉTICA NO USO DE ANIMAIS. IV ESTUDO ANATÔMICO, RADIOGRÁFICO E ENDOSCÓPICO DA LARINGE E TRAQUEIA DE CÃES BRAQUICEFÁLICOS E MESOCEFÁLICOS RESUMO A síndrome braquicefálica (SB) é caracterizada por anormalidades congênitas e hereditárias, que provocam um aumento da resistência à passagem do ar pelas vias respiratórias de cães e gatos de focinho curto. As deformações obstrutivas que compõe a SB são caracterizadas pela presença de cornetos nasais aberrantes, estenose bilateral de narina, prolongamento do palato mole, hipoplasia de traqueia, redução do espaço retrofaríngeo, macroglossia, redução do espaço orofaríngeo e nasofaríngeo. Dada a relevância clínica e o impacto na qualidade de vida desses animais, este estudo visa aprimorar o conhecimento anatômico e propor técnicas anatômicas voltadas ao treinamento cirúrgico. Para tanto, foram realizados estudos anatômicos, radiográficos e endoscópicos em 30 cadáveres de cães braquicefálicos e mesocefálicos, avaliando a laringe e traqueia, bem como a eficácia de um método de conservação com álcool etílico glicerinado e sais de cura para uso em treinamentos endoscópicos. Os cadáveres foram armazenados por até 120 dias e submetidos à análise quanto à coloração, maleabilidade e preservação anatômica. Os resultados indicaram diferenças topográficas significativas entre as espécies, especialmente na posição das artérias carótidas e na relação entre a traqueia e o esôfago. Além disso, o método de conservação mostrou-se eficaz para manter as características anatômicas e permitir o treinamento de laringotraqueoscopia por até 90 dias. Este estudo contribui para a formação de profissionais e para o avanço no diagnóstico e tratamento da síndrome braquicefálica. Palavras-chave: anatomia, cadáver, conservação V ANATOMICAL, RADIOGRAPHIC, AND ENDOSCOPIC STUDY OF THE LARYNX AND TRACHEA OF BRACHYCEPHALIC AND MESOCEPHALIC DOGS ABSTRACT Brachycephalic syndrome (SB) is characterized by congenital and hereditary abnormalities that increase resistance to airflow through the respiratory tracts of short- nosed dogs and cats. The obstructive deformities comprising SB include aberrant nasal turbinates, bilateral nasal stenosis, elongated soft palate, tracheal hypoplasia, reduced retropharyngeal space, macroglossia, and reduced oropharyngeal and nasopharyngeal spaces. Given the clinical relevance and impact on the quality of life of these animals, this study aims to enhance anatomical knowledge and propose anatomical techniques for surgical training. Anatomical, radiographic, and endoscopic studies were performed on 30 cadavers of brachycephalic and mesocephalic dogs, evaluating the larynx and trachea, as well as the efficacy of a preservation method using glycerinated ethyl alcohol and curing salts for endoscopic training. The cadavers were stored for up to 120 days and analyzed for coloration, pliability, and anatomical preservation. The results indicated significant topographic differences between the species, particularly in the position of the carotid arteries and the relationship between the trachea and esophagus. Additionally, the preservation method proved effective in maintaining anatomical characteristics and enabling laryngotracheoscopy training for up to 90 days. This study contributes to the training of professionals and advances in the diagnosis and treatment of brachycephalic syndrome. Keywords: anatomy, cadaver, preservation VI LISTA DE FIGURAS CAPITULO II Figura 1 Laringotraqueoscopia em cão mesocefálico fresco, sem preparo químico. A: Identificação da laringe visualizando-se o palato mole (1), processo cuneiforme da epiglote (2), processo corniculado da aritenoide (3), pregas vocais (4) e epiglote (*). B: Lúmen traqueal, demonstrando membrana dorsal (seta vermelha). C: Carina, demonstrando a entrada dos brônquios principais. ...................................................................................... 19 Figura 2 Cadáver de cão fresco, previamente ao preparo químico com acesso no 7º espaço intercostal esquerdo para canulação da aorta torácica. ........................................ 20 Figura 3 Avaliação macroscópica quanto a coloração da mucosa laríngea de um cadáver braquicefálico, previamente a preparação química (A) e após 90 dias de preparação química (B), demonstrando a proximidade da coloração entre o cadáver fresco e o quimicamente preparado. .................................................................................................. 21 Figura 4 Traqueoscopia de um cadáver mesocefálico fresco (A) e quimicamente tratado após 120 dias de conservação (B). Membrana dorsal (seta amarela), onde é possível visualizar prolapso da membrana dorsal para o lúmen traqueal após período de estudo (B). Região da carina (brônquios principais) (C) antes do processo de conservação, e após o processo de conservação sem o uso de traqueotubo, demonstrando colabamento dos brônquios(D). ..................................................................................................................... 22 Figura 5 Laringotraqueoscopia de um cão braquicefálico. Avaliação prévia ao processo de conservação (imagens à esquerda) evidenciando a entrada da laringe (A), traqueia (C) e carina (D). Imagens à direita demonstram as mesmas estruturas aos 90 dias de conservação (B, D e F). Notar a proximidade entre a coloração do cadáver fresco e o quimicamente preparado após o período de conservação. ...................................................................... 23 Figura 6 Laringoscopia de cão mesocefálico (A) e braquicefálico (B), vista ventral da cartilagem epiglótica, demonstrando variações anatômicas, onde a cartilagem epiglótica apresenta ápice arredondado. ........................................................................................... 24 Figura 7 Laringoscopia comparativa entre cães braquicefálicos (A e C) e mesocefálicos (B e D). Vista rostral da região laríngea, demonstrando a mucosa mais edemaciada do cão braquicefálico e menor proeminência do processo cuneiforme. Fonte: Serviço de Cirurgia Geral e Endoscopia Veterinária do Hospital Veterinário Governador Laudo Natel - UNESP/Jaboticabal (2023). ............................................................................................... 24 Figura 8 Vista rostral de exame laringoscópico de um cadáver braquicefálico, demonstrando palato mole alongado (A) e sacos laríngeos evertidos (B). ............................................... 25 Figura 9 Laringoscopia de cadáveres braquicefálicos(A,B,C,D) previamente ao processo de conservação, demonstrado a redução do lúmen da glote e a proximidade entre os processos corniculados. .................................................................................................... 25 Figura 10 Laringoscopia de cadáveres de cães mesocefálicos (A, B, C e D), demonstrando menor estreitamento do lúmen da glote. ........................................................................... 26 VII CAPITULO III Figura. 1. Imagem radiográfica de cadáver braquicefálico após preparação química e injeção de látex e bário. (A) projeção dorso ventral. (B) Projeção látero-lateral esquerda. São visíveis a artéria tireóidea cranial (seta azul), artérias carótidas comuns esquerda e direita (setas vermelhas), traqueia (seta amarela), região cranial do esôfago (círculo amarelo escuro). ............................................................................................................................. 34 Figura. 2 Dissecação do cão mesocefálico, demonstrando a remoção dos músculos esternocefálico, esterno-hióideo e esternotireóideo. ......................................................... 35 Figura. 3 Radiografia com contraste arterial em cão mesocefálico (A) e braquicefálico (B). Projeção dorso-ventral. Artéria carótida interna (1); Artéria carótida comum esquerda (2); Artéria carótida comum direita (2’); Artéria tireóidea cranial (3). Notar tortuosidade das artérias carótidas comuns em cães braquicefálicos, observando também que em alguns pontos dos seguimentos destas artérias há pouco contato direto com a traqueia. ........... 36 Figura. 4 Arteriografia cervical, projeção látero-lateral direita de um cadáver braquicefálico (A) e mesocefálico (B). Na imagem A, nota-se a origem da artéria vertebral esquerda em região de T1 adentrando o forame transverso da C6, já a imagem B demonstra a mesma região de origem adentrando o forame transverso da C7. ................................................ 37 Figura. 5 Arteriografia contrastada de um cadáver de cão braquicefálico (A) e mesocefálico (B), projeção látero-lateral direita. Artéria omocervical localizada próximo a vertebra C5 em braquicefálicos (seta amarela) e a C6 e mesocefálicos (seta vermelha). Fonte: Setor diagnóstico por Imagem, Hospital Veterinário Governador Laudo Natel - UNESP (2024) 39 Figura. 6 Dissecação traqueia para visualização da irrigação arterial em cães mesocefálicos. (A) Vista ventrolateral esquerda demostrando o percurso lateral (linha pontilhada vermelha) a traqueia da artéria carótida comum esquerda (Acc. E) paralelo ao esôfago. O esôfago cervical esquerdo encontra-se lateral e dorsal a traqueia (linha pontilhada amarela). (B) Vista ventrolateral esquerda. Artéria carótida comum esquerda (Acc. E) e artéria carótida comum direita (Acc. D); Tronco braquicefálico (Tr.Braq.). ....... 41 Figura. 7 Vista ventral da dissecação traqueia para visualização da irrigação arterial em cães braquicefálicos demonstrando a localização do esôfago em três cães braquicefálicos (1, 2 e 3). O esôfago cervical localiza-se parcialmente ventral a traqueia nestes cães na entrada torácica, apresentando também uma saculação esofágica nesta mesma região. Artéria carótida comum esquerda (Acc.E), sua porção caudal tem maior contato com esôfago cervical................................................................................................................. 41 Figura. 8 Artéria tireóidea caudal esquerda em sua origem em um cão mesocefálico. Vista ventral. Artéria carótida comum esquerda (Acc.E); Artéria carótida comum direita (Acc.D). Trajeto da artéria tireóidea caudal esquerda (setas amarelas). ........................................ 42 Figura. 9 Dissecação da artéria tireóidea cranial. Vista ventral da região lateral direita do cão braquicefálico (A). Vista lateral esquerda do cão mesocefálico(B). Ramo cricotireoideo (1); Ramo tireóideo seguindo até a região mediana da traqueia (2); Ramo esternocleidomastóideo (3); Artéria carótida comum esquerda (4). .................................. 43 Figura. 10 Dissecação da artéria tireóidea cranial. Vista ventral da região lateral direita do VIII cão braquicefálico (A). Vista lateral esquerda do cão mesocefálico(B). Ramo cricotireoideo (1); Ramo tireóideo seguindo até a região mediana da traqueia (2); Ramo esternocleidomastóideo (3); Artéria carótida comum esquerda (4). .................................. 43 Figura. 11 Vista ventral da região lateral esquerda da laringe e traqueia do cão mesocefálico (A). Imagem aproximada com zoom de 3x da laringe do cão braquicefálico (B). Demonstrando a cartilagem tireóidea (1) e o ramo laríngeo (2’) se inserindo na membrana tireo-hioidea (2). Osso basihioide (3); carótida externa (4); a. tireóidea cranial (5); ramo tireóideo seguindo caudalmente a traqueia (6). ................................................................ 44 Figura. 12 Gânglio vagal distal direito do cão braquicefálico (1), longo e fusiforme, demonstrando sua proximidade com a artéria carótida interna. Vista ventral lateral, imagem com obtida com uso de estereoscópio (zoom 3x). ............................................................ 45 Figura. 13 Vista ventral e lateral. Dissecação para visualização do gânglio vagal distal direito ................................................................................................................................. 45 Figura. 14 Vista lateral ventral da dissecação do cão mesocefálico, demonstrando a proximidade entre o gânglio cervical cranial (seta amarela) e o gânglio vagal distal (seta vermelha). ......................................................................................................................... 46 Figura. 15 Vista lateral ventral da dissecação do cão braquicefálico (A e B), demonstrando o musculo cricofaríngeo (1) e tireofaríngeo (2). Ramo do plexo faríngeo (3), nervo laríngeo cranial ................................................................................................................................ 47 Figura. 16 Dissecação cervical do cão braquicefálico. Vista ventral lateral esquerda, demonstrando a interação entre o gânglio cervical médio (1), tronco vago simpático (2) e a. carótida comum esquerda (3). Note a tortuosidade decorrente do desvio esofágico (4). . 48 Figura. 17 Dissecação cervical do cão mesocefálico, demonstrando o gânglio cervical médio esquerdo (seta) e sua proximidade à origem da artéria carótida comum esquerda. ......... 48 Figura. 18 Dissecação cervical do cão braquicefálico (A) e mesocefálico (B), demonstrando o gânglio cervical médio (círculo vermelho) e suas diferentes localizações entre os cães estudados, nota-se a distância da origem da a. carótida comum (1). ............................... 49 IX LISTA DE TABELAS CAPITULO III Tabela 1 - Resultados do teste exato de Fisher para associação entre tipo de crânio e tortuosidade da a.carótida comum. ................................................................................... 36 Tabela 2 - Resultados do teste exato de Fisher para associação entre tipo de crânio e percurso da artéria vertebral esquerda adentrando a 6ª ou 7ª vertebra cervical ............... 38 Tabela 3 -Distribuição da localização da artéria cutânea omocervical entre cães braquicefálicos e mesocefálicos. ....................................................................................... 39 X LISTA DE ABREVIATURAS a.C Antes de Cristo °C Graus Celsius CONCEA Conselho Nacional de Controle e Experimentação Animal EDTA Etilenodiaminotetracético IC Índice cefálico (IC ICF Índice crânio facial (ICF). Kg Quilogramas LAC UNESP Laboratório de Anatomia Cirúrgica da Universidade Estadual Paulista mL Mililitro SB Síndrome Braquicefálica 1 CAPÍTULO 1: CONSIDERAÇÕES GERAIS 1. INTRODUÇÃO A síndrome braquicefálica (SB) é um conjunto de anomalias anatômicas hereditárias e congênitas que resultam em maior resistência à passagem de ar nas vias respiratórias de cães de focinho curto, como pugs, bulldogs e shih-tzus (Torrez e Hunt, 2016). Essas alterações incluem estenose de narinas, prolongamento do palato mole, macroglossia, hipoplasia traqueal e outras deformidades que impactam diretamente a saúde e qualidade de vida desses animais (Morais e Neto, 2018). Além disso, essas características anatômicas podem predispor os cães a alterações secundárias, como eversão dos sacos laríngeos, colapso de traqueia e brônquios, e inflamações crônicas das vias aéreas superiores (Júnior et al., 2021). A crescente popularidade das raças braquicefálicas, aliada à complexidade das alterações associadas à SB, tem incentivado estudos que buscam elucidar suas particularidades anatômicas e desenvolver abordagens clínicas e cirúrgicas mais eficazes (Gianella et al., 2019; Mitze et al., 2022). A compreensão detalhada da anatomia da laringe e traqueia é essencial para o manejo clínico desses animais, uma vez que alterações nesses órgãos desempenham papel crucial no quadro respiratório da SB. Paralelamente, o avanço de métodos de conservação de cadáveres para ensino e treinamento tem se mostrado uma ferramenta valiosa para a formação de médicos veterinários, permitindo o aprimoramento de técnicas diagnósticas e cirúrgicas. Métodos como o uso de álcool etílico glicerinado e sais de cura têm demonstrado eficácia na preservação anatômica, mantendo coloração e maleabilidade semelhantes às de tecidos frescos, o que é fundamental para treinamentos endoscópicos (Janczyk et al., 2011; Zero et al., 2022). Este capítulo aborda as bases anatômicas da laringe e traqueia em cães braquicefálicos e mesocefálicos, com foco em suas particularidades estruturais e funcionais. Além disso, são apresentadas técnicas de conservação de cadáveres aplicadas ao ensino e treinamento, destacando sua importância para o desenvolvimento de novas abordagens na prática veterinária. 1.1. Hipótese Avaliar a viabilidade de um novo modelo anatômico para treinamento endoscópico respiratório, além de determinar se há diferenças na vascularização e 2 inervação da traqueia e laringe de cães braquicefálicos e mesaticefálicos. 2. REVISÃO LITERATURA 2.1 Métodos de conservação de cadáveres em anatomia A história dos estudos anatômicos inicia-se com a dissecação do corpo humano e têm seus registros mais antigos datados entre o século II-III a.C na China, demonstrados nos textos médicos Mawangdui, considerados hoje pelos historiadores como um atlas anatômico sistemático comparável aos encontrados na Grécia antiga descritas por Herófilo (335-280 a.C) e Erasístrato (304-250 a.C) (Von, 1992; Shaw et al., 2020). Embora a dissecação e estudo do corpo humano tenha sido documentada há um pouco mais que 2 mil anos atrás, a prática de conservação de peças anatômicas e cadáveres como um todo datam pelo menos 5 mil anos, com registros iniciais no Egito retratados como um ato religioso, onde o coração era o único órgão preservado nos corpos mumificados, devido a importância espiritual creditada a este órgão pela civilização egípcia (Silva et al., 2008). A técnica de mumificação consistia principalmente na desidratação do tecido com uso de natrão, viabilizando também ausência ou grande redução de bactérias anaeróbicas responsáveis pela deterioração e putrefação dos corpos, utilizava-se também neste processo ataduras de linho que envolviam os corpos, embebidas por uma substância orgânica, identificadas atualmente como um tipo de resina cujo a composição química é indeterminada (Jones et al., 2014; Felisbino e Souza, 2023). A preocupação com a conservação dos corpos humanos com viés espiritual continuou ao longo do tempo, mas foi a partir do século XVI que essa necessidade passa a ter objetivo didático e acadêmico (Caldas et al., 2021). Desde então, o uso de diversos produtos como conservantes e fixadores surgem durante a história, dentre eles, os mais utilizados até hoje são o álcool, glicerina e o formaldeído (Silva et al., 2008; Cury et al., 2013). O formaldeído a 10% é o produto químico mais utilizado em técnicas de conservação e fixação de peças anatômicas atualmente (Hayashi et al., 2015). A formalização para conservação dos cadáveres disponibilizados em aulas práticas de 3 anatomia é o método mais empregado nas universidades brasileiras de medicina (Silva et al., 2016). Isso ocorre devido a boa penetração tecidual, baixo custo e ampla disponibilidade deste produto, e, além disso, seu uso evita proliferação de bactéria e fungos, permitindo maior durabilidade da peça anatômica (Balta et al., 2015; Hayashi et al., 2015). O uso deste produto, no entanto, tem efeito deletério a saúde (Turan et al., 2017), pois além de ser um produto tóxico (Villacorta et al., 2019) de odor forte e irritante para as mucosas do trato respiratório e olhos (Marchi et al., 2023), apresenta potencial cancerígeno e teratogênico (Chhabra, 2020). Ademais, peças anatômicas formalizadas não possui algumas qualidades didáticas importantes para o ensino, tais como flexibilidade dos tecidos e coloração real ou aproximada dos órgãos (Hayashi et al., 2015). Compreendendo o efeito nocivo do uso do formaldeído, novas técnicas de fixação e conservação de peças anatômicas têm sido consideradas tanto na anatomia humana quanto na anatomia veterinária (Turan et al., 2017). Em substituição do formol, Turan et al. (2017) propuseram o uso de sabão líquido, etanol (96%), ácido cítrico e cloreto benzalcônio como solução fixadora- conservante, obtendo bons resultados em 12 meses de conservação de cadáveres caprinos, mantendo boa elasticidade em músculos para dissecação, além de evitar contaminação por microrganismos patogênicos. Um estudo realizado por Jaczyk et al. (2011), avaliou a eficácia do uso de solução composta por 23% nitrito de sódio, 30% de etanol, 20% de Pluriol® E 400 (mistura de polietileno glicóis) e 0,1% de óleo de orégano, como solução fixadora- conservante, em cadáveres de cães, durante 1 ano. A solução se mostrou eficaz na conservação de cadáveres com abdômen aberto, apresentando boas características para fins de dissecação. Outro método de substituição ao formaldeído é o uso da solução de Thiel, composta por ácido bórico, etileno glicol, nitrato de potássio, clorometilfenol, sulfato de sódio, formalina. Esta solução mantém os cadáveres macios e com a coloração aproximada do cadáver fresco, por esses resultados, seu uso é amplamente utilizado para treinamento cirúrgico. Contudo, este método não é recomendado para treinamento de endoscopia, devido a rigidez causada pela formalina em estruturas não distensíveis (Villacorta et al. 2019). 4 Outras soluções conservantes também têm sido sugeridas em substituição aos tanques de armazenamento de peças anatômicas submersas em formaldeído, como o uso de propileno fenoxetol a 1%, demonstrando eficácia após 10 anos de conservação, mantendo as peças anatômicas macias, flexíveis e com coloração adequada para fins de dissecação e demonstração (Chhabra, 2020). Um estudo recente demonstrou o uso do EDTA como um potencial conservante, onde foram submersos rins de caprinos (sem fixação prévia) em uma solução de EDTA a 30%, obtendo resultados satisfatórios durante um curto prazo, sugerindo que este produto pode ser utilizado em misturas conservantes (Wisesa, 2022). O estudo realizado por Oliveira (2014) avaliou a eficácia da conservação de peças anatômicas que foram inicialmente fixadas com formaldeído a 10% e depois conservadas em solução aquosa de cloreto de sódio a 30% por um período de 5 anos. Os resultados demonstraram que esta técnica foi eficaz, pois não foi observado contaminação das peças ao longo do estudo, sugerindo ser uma prática segura a ser utilizada em laboratórios de anatomia. A solução de Larssen modificada (formalina a 10%, glicerina liquida, hidrato de cloral, cloreto de sódio e água) tem sido empregada para treinamento cirúrgico por médicos veterinários, observando-se boa eficácia para este fim (Oliveira et al., 2018). Hayashi et al. (2016) sugerem o uso de soluções salinas saturadas para fins de treinamento cirúrgico em cadáveres, pois trata-se de um método de baixo custo, simples e com baixo risco de infecção. O uso de álcool etílico glicerinado para fixação e sais de cura como conservante mostrou-se eficaz para preservação de cadáveres para fins didáticos. É um método de baixo custo que mantém as características morfológicas dos cadáveres próximos aos cadáveres de animais frescos, sendo benéfico para treinamentos de técnicas cirúrgicas, punção de líquido cerebrospinal e mielografias (Zero et al., 2022). 2.2 Variações do crânio O sincrânio, que engloba o conjunto formado pelo crânio e a mandíbula, divide- se em duas regiões principais: a facial e a neural (Gregory, 1933). A região facial circunda os olhos, a passagem digestiva e respiratória, enquanto a região neural protege o encéfalo. O sincrânio é considerado a parte mais complexa do esqueleto, devido à sua estrutura e à diversidade de funções que desempenha. Além disso, nos 5 cães, é a região que apresenta as maiores variações de tamanho e forma em comparação a qualquer outro mamífero (Evans e Lahunta, 2013). Diferente dos cães mesocefálicos, que possuem o crânio com comprimento proporcional à sua largura, cães braquicefálicos apresentam uma conformação desarmoniosa, observando-se uma região facial curta, crânio largo e globoso com sua superfície dorsal convexa (Dyce 2019). A ocorrência de prognatismo em raças braquicefálicas é considerada comum (HARVEY e EMILY 1993). No entanto, o prognatismo nestes cães pode ser relativo, embora haja uma projeção mandibular aparente, o que de fato ocorre é o encurtamento da maxila e não o alongamento da mandíbula. Por essa razão, não é adequado classificar essas raças como prognatas normais (Hennet 1995, Gioso 2007). Os tipos de crânios são classificados a partir da mensuração de dois índices e comparação com os seus respectivos valores de referência: Índice cefálico (IC) e Índice crânio facial (ICF). O IC é obtido através da relação entre a largura do crânio e seu comprimento (Machado, 2006). O comprimento do crânio é mensurado do ponto da superfície central na protuberância occipital externa até a extremidade rostral da sutura interincisiva, entre as raízes dos dentes incisivos centrais superiores. Já a largura do crânio é dada através da mensuração da distância entre os ápices zigomáticos (Schimming e Pinto e Silva 2013). Obtendo-se a seguinte fórmula: (Getty, 1986) O IC em cães braquicefálicos pode chegar a 90, e nos cães mesocefálicos podem variar entre 70 e 75 (Santos et.al, 2016). O ICF é obtido através da relação entre o comprimento do crânio e o comprimento da face, tendo como referência a sutura frontonasal. Para este índice, a média nos cães mesocefálicos é de 2, podendo ser igual ou ultrapassar 3 nos cães braquicefálicos (Machado, 2006). As alterações observadas nos crânios de cães braquicefálicos resultam na compressão das passagens aéreas nasais e faríngeas, ou seja, os tecidos moles presentes no crânio, tais como mucosa nasal das conchas, mucosa da nasofaringe, IC= 100 x Largura do crânio/ comprimento do crânio 6 palato mole e até mesmo a língua, não se desenvolvem proporcionalmente com a redução esquelética da face, resultando em um lúmen respiratório estreito, ocasionando a síndrome braquicefálica (Ekenstedt et. al, 2020). 2.3 Síndrome Braquicefálica A síndrome braquicefálica (SB) caracteriza-se por um conjunto de anomalias anatômicas de causa hereditárias e congênitas que resultam em uma maior resistência à passagem de ar nas vias áreas de cães e gatos de focinho curto (Torrez e Hunt,2016). As características anatômicas obstrutivas congênitas da SB, tais como, narinas estenosadas, cornetos nasais aberrantes, prognatismo, prolongamento de palato mole, redução do espaço orofaríngeo, macroglossia, redução do espaço nasofaríngeo e hipoplasia de traqueia, acarretam um aumento do esforço inspiratório e consequentemente aumento da pressão negativa das vias respiratórias superiores, resultando em alterações classificadas como secundárias (Morais e Neto, 2018; Mendes Júnior et al., 2021). Os aspectos secundários à SB se desenvolvem de maneira progressiva, podendo ser observado espessamento do palato mole, edema e inflamação da nasofaringe e orofaringe, hiperplasia de tonsilas, eversão dos sacos laríngeos, colapso de traqueia e/ou colapso de brônquio principal (Mendes Júnior et al., 2021). Além disso, cães braquicefálicos que apresentam sinais respiratórios podem apresentar distúrbios gastrintestinais, alcançando 93% de prevalência dos casos (Poncet et al., 2005). Dada as inúmeras disfunções relacionadas ao conjunto de anomalias anatômica do crânio de cães braquicefálicos e sua crescente popularidade entre os tutores, diversos estudos anatômicos e sistêmicos têm sido realizados a fim de elucidar as características específicas e tratamentos clínico-cirúrgico dos animais acometidos pela SB (Gianella et al., 2019; Mitze et al., 2022; Luciane et al., 2022; Carvalho et al.,2022). 2.4 Considerações anatômicas da laringe e traqueia em cães A laringe é um órgão cilíndrico e simétrico, composto por cartilagens, músculos e ligamentos, localizado entre a faringe e a traqueia. Sua função principal é proteger a entrada da traqueia contra a aspiração de corpos estranhos e é importante para a 7 vocalização. As paredes da laringe são formadas pelas cartilagens laríngeas, músculos conectores e ligamentos, que a ligam ao aparelho hióideo rostralmente e à traqueia caudalmente (König e Liebich, 2016). A vascularização da laringe ocorre através do ramo laríngeo da artéria tireóidea cranial, que se prolonga até a extremidade cranial da artéria carótida comum. Os músculos laríngeos são irrigados por ramificações do ramo laríngeo da artéria tireóidea cranial, essas ramificações, por sua vez, se prolongam, seguindo a margem dorsal caudalmente para uma anastomose com a artéria tireóidea caudal, irrigando os músculos vocal, vestibular e a mucosa laríngea (Dyce et al., 2019; König e Liebich, 2016). Medidas da glote (índice glótico) tem sido realizada em raças braquicefálicas (pug, bulldog francês e bulldog inglês) visando-se o melhor conhecimento anatômico da região e correlacionando-se com problemas respiratório nesses animais. Este índice foi menor em pugs que em bulldogs ingleses, o que pode predispor à problemas respiratórios devida progressão do colapso de laringe (Caccamo et al., 2014). O nervo laríngeo cranial deixa o vago no gânglio distal e passa ventralmente à laringe, onde se divide em um ramo externo e um ramo interno. O ramo externo inerva o músculo cricotireoideo e termina suprindo a mucosa faríngea. O ramo interno não fornece músculos. Ela supre a mucosa laríngea e transporta axônios aferentes viscerais especiais para papilas gustativas localizadas na epiglote, que são importantes no fechamento reflexo da glote quando estimuladas por água e outras soluções. O nervo laríngeo cranial é importante por ser o ramo aferente do reflexo da tosse quando substâncias irritam a mucosa laríngea ou traqueal cervical. O ramo interno envia um ramo comunicante para o nervo laríngeo caudal. Essa comunicação não degenera quando o tronco vagossimpático é cortado cirurgicamente (Kitchell et al., 1977), sugerindo que não é um nervo motor, mas uma projeção sensitiva do nervo laríngeo cranial para o nervo laríngeo caudal. A traqueia é um órgão tubular que se estende desde a cartilagem cricóidea da laringe até sua bifurcação terminal acima do coração, formando um sistema contínuo de condução de ar entre a laringe e os bronquíolos nos pulmões (Souto, 2016), é composta por cartilagens hialinas cujo formato varia entre as espécies, nos cães está disposta em forma de "C" conectadas por ligamentos (Dyce et al., 2019). O número de anéis cartilaginosos também se distingue entre espécies, em cães esse número 8 pode variar entre 32 a 46 anéis traqueais, observando-se geralmente em sua porção cervical 18 a 30 anéis traqueais (23,4 ± 2,9) e entre 10 a 20 (14,7 ± 2,3) anéis em sua porção torácica (Guimarães et al., 2012; König e Liebich, 2016). Braquicefálicos de peso médio de 8,36kg apresentaram diâmetro de traqueia cervical de 1,05 ± 0,10 cm, enquanto nos não-braquicefálicos de peso médio de 9,78kg este foi de 1,28 ± 0,19 cm (Dias et al., 2016). O diâmetro e espessura dos anéis traqueais são menores no nível de entrada torácica porque a direção da traqueia muda neste ponto onde a entrada torácica é relativamente pequena e circundado por osso. As razões entre o diâmetro vertical e transversal externo foram quase iguais, entre 1,14 e 1,25 em todas as regiões, o que indicou que a traqueia tem formato quase circular no cão. No nível da entrada torácica, as áreas transversais do lúmen são 7 e 6% menores que os da cervical média e intratorácica, respectivamente. A cartilagem mais fina foi vista no nível de entrada torácica onde há risco de colapso traqueal (DABANOGLU et al., 2001). De acordo com Ghoshal (1986) e Bezuidenhoute (2013), o suprimento sanguíneo da traqueia cervical é feito por meio das delgadas artérias tireóideas direita e esquerda, que ascendem lateralmente à traqueia até os lobos da glândula tireoide, onde pode-se anastomosar com os ramos da artéria tireóidea cranial. Os autores ainda citam que há inconstâncias quanto à sua origem, podendo elas surgirem do tronco braquicefálico, do início de qualquer artéria carótida comum, da artéria subclávia esquerda ou do ramo ascendente da artéria cervical superficial. A artéria tireoidiana caudal é um pequeno vaso que geralmente se origina do tronco braquicefálico entre as origens das artérias carótidas comuns. Não é constante em sua origem; pode originar-se do tronco braquicefálico, da artéria subclávia esquerda, das artérias carótidas comuns ou do ramo ascendente da artéria cervical superficial. Ocasionalmente vem do tronco costocervical do lado direito. A origem mais comum é na forma de um tronco curto a partir do tronco braquicefálico, dando origem às artérias tireoidianas caudais direita e esquerda, que seguem cranialmente em direção aos respectivos lobos da glândula tireoide. Encontram-se na traqueia e em contato com as respectivas bordas do esôfago. Ramos das artérias tireóideas caudais são direcionados para o esôfago, traqueia, gânglios cervicais médios e nervos na região da entrada torácica. Eles se anastomosam com as artérias tireóideas cranianas maiores. A artéria tireoidiana cranial é um vaso curto que se origina da artéria carótida 9 comum oposta à parte caudal da laringe. É o maior e o único ramo constantemente presente da artéria carótida comum. Além dos ramos que suprem o lobo tireoidiano, a artéria tireoidiana cranial possui os ramos faríngeo, laríngeo caudal, cricotireoideo e esternocleidomastóideo (Bezuidenhoute, 2013). O nervo vago esquerdo dá origem ao nervo laríngeo recorrente esquerdo, que se curva ao redor do ligamento arterioso e da aorta, segue cranialmente ao longo da traqueia, e emite ramos para a traqueia e esôfago referidos por Watson (1974) como nervos laríngeos pararrecorrentes, e termina como o nervo laríngeo caudal esquerdo, que inerva todos os músculos do lado esquerdo da laringe, exceto o cricotireóideo esquerdo. O nervo vago direito dá origem ao nervo laríngeo recorrente direito, que gira em torno da artéria subclávia direita e segue cranialmente ao longo da traqueia para terminar como nervo laríngeo caudal direito para suprir todos os músculos do lado direito da laringe, exceto o músculo cricotireoideo direito. O nervo laríngeo recorrente direito também emite ramos que suprem a traqueia e o esôfago. Braund et al. (1988) relataram estudos morfológicos e morfométricos dos nervos vago e laríngeo recorrente em cães normais. O manejo cirúrgico para animais portadores de SB deve ocorrer precocemente para reduzir o desenvolvimento das alterações secundárias causadas por essa síndrome (MEOLA, 2013). A proporção de cães melhorou significativamente por cirurgia é superior a 90% (Dunié-Mérigot et al., 2010; Monnet, 2014). 2.5 Exames de imagem na síndrome braquicefálica O exame radiográfico é uma ferramenta importante no diagnóstico da síndrome braquicefálica. Este exame complementar é frequentemente utilizado na avaliação e diagnóstico de hipoplasia ou colapso traqueal, alterações comumente encontradas em cães braquicefálicos (Regier et al., 2020). Há dois métodos de avalição de proporção que podem ser empregados no diagnóstico radiográfico da traqueia hipoplásica: a proporção do diâmetro do lúmen traqueal na entrada torácica com o diâmetro entre a primeira vertebra torácica e o manúbrio (TD:TI) e a relação do diâmetro da luz traqueal no ponto médio entre a entrada torácica e a carina com a largura da terceira costela (TT:3R). Quando a relação entre TD:TI resulta em valores menores que 0,127. 10 Em buldogues ingleses e pugs, 0,16 em braquicefálicos não descendentes de buldogue e 0,204 em cães não braquicefálicos a traqueia é considerada hipoplásica, já para a proporção entre TT:3R a resultante deve ser menor que 2,0 para tal diagnóstico em todas as raças (Coyne e Fingland, 1992; Regier et al., 2020; Mostafa e Berry, 2022). Embora contribua para o desconforto respiratório em cães acometidos pela SB, na ausência de afecção pulmonar concomitante, a hipoplasia de traqueia pode ser apenas um achado radiográfico, além disso, há possibilidade de não estar associada a sinais clínicos da síndrome (Kaye et al.,2015; Mitze et al., 2022). Regier et al. (2020) sugeriram que a correção cirúrgica de anormalidades relacionadas à síndrome braquicefálica (narinas estenosadas, palato mole alongado e eversão de sacos laríngeos) não estão associadas à piora ou melhora do prognostico da hipoplasia traqueal. A endoscopia das vias aéreas permite uma avaliação clínica detalhada do lúmen traqueal e brônquios (Lorenzi et al.,2009), sendo tida como uma modalidade diagnóstica e terapêutica de grande importância clínica-cirúrgica na síndrome braquicefálica (Carvalho et al., 2022), além disso, também é considerada uma técnica de referência máxima na detecção de traqueomalácia no homem e nos cães (Bottero et al., 2013; Souto, 2016; Hysinger, 2018). Tangner e Hobson (1982) propuseram um sistema de classificação do colapso de traqueia através da traqueoscopia, determinando-se a gravidade do colapso em grau I quando o lúmen traqueal tem redução de aproximadamente 25%, grau II quando há redução de 50% do diâmetro, grau III quando há redução de 75% do diâmetro e grau IV quando o lúmen traqueal é totalmente obliterado. Deste modo, a endoscopia das vias aéreas pode ser benéfica em animais diagnosticados ou não com colapso traqueal, devido sua maior sensibilidade em detectar a gravidade do colapso, além de fornecer dados complementares como a extensão e características dinâmicas desta afecção que não são possíveis de identificar apenas no exame radiográfico (Creevy, 2009). Entretanto, segundo Morshed et al. (2011), a endoscopia das vias aéreas apresenta limitações em casos obstrutivos onde uma grande extensão traqueal é acometida, já que estes quadros impossibilitam a avaliação dos segmentos distais a obstrução. 11 3. OBJETIVOS GERAIS. O objetivo deste trabalho é realizar um estudo anatômico, radiográfico e endoscópico da laringe e traqueia de cães braquicefálicos e mesocefálicos, a fim de auxiliar no diagnóstico e tratamento destes animais na rotina clínica–cirúrgica veterinária. REFERÊNCIAS Balta, J. Y. et al. 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Em particular, a síndrome braquicefálica (SB), caracterizada por alterações anatômicas obstrutivas das vias aéreas craniais, como narinas estonadas, macroglossia e alongamento do palato mole, demanda uma abordagem diagnóstica precisa e uma formação adequada para os médicos veterinários (MORAIS e NETO, 2018; PONCET et al., 2005). Nesse contexto, a preservação de cadáveres para treinamento em técnicas diagnósticas e cirúrgicas é essencial, facilitando o aprimoramento das habilidades de estudantes e profissionais da saúde (COSTA E LINS, 2012; MASSARI et al., 2018). A técnica de preservação de cadáveres tem se mostrado um método eficaz para o ensino de anatomia, sendo fundamental para garantir que os alunos possam realizar dissecações com qualidade e segurança. Jaczyk et al. (2011), demonstraram que soluções fixadoras compostas por nitrito de sódio, etanol ou Pluriol® E 400 são eficazes para a conservação de cadáveres, mantendo suas características anatômicas para fins de dissecação por longos períodos. Além disso, a necessidade de técnicas eficazes para a conservação dos cadáveres, especialmente no que diz respeito à coloração e maleabilidade dos tecidos, é um desafio contínuo para os desenvolvimentos de novas técnica anatômicas (JACZYK et al., 2011). O presente estudo tem como objetivo principal, além de propor uma técnica anatômica de conservação de cadáveres para o treinamento em laringotraqueoscopia, avaliar a durabilidade das peças anatômicas entre 90 e 120 dias, utilizando soluções conservantes (sais de cura e álcool glicerinado) combinadas com o armazenamento a vácuo, em cadáveres de cães braquicefálicos e mesocefálicos. Além disso, busca- se observar as possíveis alterações anatômicas comparativas da laringe destes cães, 18 fornecendo subsídios para o desenvolvimento de novos estudos com cães braquicefálicos, contribuindo para a formação e aprimoramento dos profissionais da área veterinária. 2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS • Descrever as variações anatômicas da laringe e traqueia dos cães braquicefálicos; • Propor um método de conservação de cadáveres cães para treinamento de laringotraqueoscopia por até 120 dias, mantendo as características anatômicas mais próximas ao animal vivo. 3. MATERIAIS E MÉTODOS 3.1. Animais utilizados Foram utilizados 30 cadáveres de cães, distribuídos igualmente entre braquicefálicos e mesocefálicos, obtidos no Centro de Zoonose de Ribeirão Preto (processo 02.2014.000027-1), este estudo seguiu as normas e princípios éticos de experimentação animal aprovados pelo Conselho Nacional de Controle e Experimentação Animal (CONCEA) e foi aprovado pela Comissão de Ética no Uso de Animais da Universidade Estadual Paulista (protocolo 003578/23). Os cadáveres foram selecionados obedecendo o escore corporal de 4 ou 5, numa escala de 1 a 9 (LAFLAMME 1997). Foram observadas no grupo de cães braquicefálicos as raças Shit-tzu (n=12) e bulldog francês (n=3). O grupo de cães mesocefálicos foi composto por raças não definidas (SRD). Para este estudo, a craniometria foi realizada no grupo de cães braquicefálicos para garantir a seleção adequada, considerando um índice crânio-facial (ICF) ≥ 3 e um índice cefálico (IC) ≥ (GETTY,1896). O grupo de cães braquicefálicos era composto por 9 fêmeas e 6 machos, enquanto o grupo de cães mesocefálicos incluía 8 machos e 7 fêmeas. 3.2. Técnica anatômica empregada Após o óbito os cadáveres foram congelados e transportados para o Laboratório de Anatomia Cirúrgica da Universidade do Estadual Paulista (LAC- UNESP). Já na instituição, os corpos foram descongelados em água corrente durante 12 horas. 19 Após o descongelamento, os animais foram pesados e identificados. Na sequência os corpos foram submetidos ao procedimento de intubação orotraqueal com tubo de cuff de 4.5mm ou 5.5mm (variando de acordo com o tamanho do animal) e a traqueia e pulmão foram insuflados com auxílio de um ambu, a fim de minimizar a quantidade de líquido presente na traqueia e facilitar a visualização das estruturas durante o exame de traqueoscopia. Após a extubação, os animais foram submetidos à laringotraqueobroncoscopia no departamento de Serviço de Cirurgia Geral e Endoscopia Veterinária do Hospital Veterinário Governador Laudo Natel (UNESP/Jaboticabal). O exame foi realizado com um endoscópio rígido de 4 mm e 30º (Karl Storz-endoscope®) acoplado à microcâmera Telecam SL NTSC®, óptica Hopkins II®, e fonte de luz fria halógena 250 Twin® e Xenon 100®. Avaliaram-se as cartilagens da laringe e traqueia quanto às alterações anatômicas, como a eversão dos sacos laríngeos e estenose traqueal, comparando a frequência dessas alterações entre cães braquicefálicos e mesocefálicos. As imagens coletadas antes do processo de conservação foram utilizadas como controle, permitindo avaliar a eficácia da técnica de preservação com base na coloração e maleabilidade dos tecidos ao uso do endoscópio rígido (FIGURA 1). Figura 1 Laringotraqueoscopia em cão mesocefálico fresco, sem preparo químico. A: Identificação da laringe visualizando-se o palato mole (1), processo cuneiforme da epiglote (2), processo corniculado da aritenoide (3), pregas vocais (4) e epiglote (*). B: Lúmen traqueal, demonstrando membrana dorsal (seta vermelha). C: Carina, demonstrando a entrada dos brônquios principais. Fonte: Serviço de Cirurgia Geral e Endoscopia Veterinária do Hospital Veterinário Governador Laudo Natel - UNESP/Jaboticabal (2023) 20 Para preservar a topografia das estruturas adjacentes à traqueia cervical, foi adotado o protocolo de canulação pela aorta torácica, acessado por meio de uma incisão no 7º espaço intercostal esquerdo (Figura 2). A solução conservadora e fixadora consiste em álcool etílico glicerinado a 5% (50 mL/kg) e sais de cura, compostos por 20% de cloreto de sódio, 1% de nitrito de sódio e 1% de nitrato de sódio, em proporção equivalente ao álcool glicerinado. Após a canulação da aorta torácica, os sais de cura foram injetados em direção cranial, seguidos pela administração de álcool etílico glicerinado a 5%. Após a preparação química dos 30 cadáveres, 18 deles (9 braquicefálicos e 9 mesocefálicos) foram embalados a vácuo utilizando uma seladora a vácuo (VS600 Cetro®) e armazenados sob refrigeração média de 4°C por 120 dias. Os 12 cadáveres restantes (6 braquicefálicos e 6 mesocefálicos) foram submetidos à intubação orotraqueal antes do armazenamento, mantendo o traqueotubo na traqueia. Esses corpos foram armazenados no mesmo método dos anteriores, em posição de esfinge, por um período de 90 dias sob as mesmas condições de refrigeração. Após o período pré-determinado de armazenamento dos cadáveres, foi realizada uma segunda laringotraqueoscopia com o objetivo de avaliar: (I) a eficácia da técnica de conservação em relação ao aspecto macroscópico da mucosa traqueal, especialmente quanto à coloração; (II) maleabilidade do tecido para uso de endoscópio rígido; (III) possíveis particularidades na conservação de cães braquicefálicos para treinamento de laringotraqueoscopia; (IV) o prazo ideal de Figura 2 Cadáver de cão fresco, previamente ao preparo químico com acesso no 7º espaço intercostal esquerdo para canulação da aorta torácica. Fonte: Arquivo pessoal (2023) 21 armazenamento dos corpos; (V) a influência do posicionamento do cadáver durante o armazenamento; e (VI) o impacto da presença do traqueotubo durante o processo. Os itens I (a eficácia da técnica de conservação em relação ao aspecto macroscópico da mucosa traqueal, especialmente quanto à coloração) e II (maleabilidade do tecido para uso de endoscópio rígido), foram avaliados por dois médicos veterinários, mestres em cirurgia veterinária, com vasta experiência em laringotraqueoscopia. Os cadáveres quimicamente preparados foram analisados e comparados com as imagens obtidas antes da preparação química, sendo classificados de acordo com os seguintes critérios: coloração, considerada semelhante a cadáveres frescos ou alterados (tonalidade avermelhada); e maleabilidade, avaliada quanto à flexibilidade do tecido durante o uso de endoscópio rígido, sendo classificada como próximo ao tecido de animais vivos ou ausência de maleabilidade (FIGURA 3). As avaliações adicionais, incluindo possíveis particularidades na conservação de cães braquicefálicos para treinamento em laringotraqueoscopia, o prazo ideal de armazenamento dos corpos, a influência do posicionamento do cadáver durante o armazenamento e o impacto da presença do traqueotubo no processo, foram realizadas por meio da análise das imagens obtidas durante a laringotraqueoscopia e o manejo dos cadáveres durante o exame. Os dados coletados foram registrados e documentados, permitindo sua quantificação em porcentagens e apresentação em gráficos. A B Figura 3 Avaliação macroscópica quanto a coloração da mucosa laríngea de um cadáver braquicefálico, previamente a preparação química (A) e após 90 dias de preparação química (B), demonstrando a proximidade da coloração entre o cadáver fresco e o quimicamente preparado. Fonte: Serviço de Cirurgia Geral e Endoscopia Veterinária do Hospital Veterinário Governador Laudo Natel -UNESP/Jaboticabal (2023). 22 4. RESULTADOS Na presente pesquisa, os fatores como sexo, peso e raça não influenciaram a conformação anatômica dos espécimes analisados. Portanto, essas variáveis não foram consideradas na descrição dos resultados. 4.1 Uso dos cadáveres quimicamente tratados para treinamento de laringotraqueoscopia Entre os 18 cadáveres conservados por 120 dias, 72,2% (n=13) apresentaram coloração avermelhada semelhante à mucosa congesta, dos quais 69,23% (n=9) não permitiram uma avaliação completa da traqueia devido à rigidez dos tecidos. Em contrapartida, 27,8% (n=5) dos cadáveres apresentaram boa maleabilidade e coloração semelhante ao cadáver fresco. No total, 14 (77,77%) dos 18 cadáveres avaliados após 120 dias de conservação exibiram alterações morfológicas nas estruturas evidentes, incluindo prolapso da membrana dorsal para o lúmen traqueal e estenose dos brônquios principais, como demonstrado na figura 4. D C B A Figura 4 Traqueoscopia de um cadáver mesocefálico fresco (A) e quimicamente tratado após 120 dias de conservação (B). Membrana dorsal (seta amarela), onde é possível visualizar prolapso da membrana dorsal para o lúmen traqueal após período de estudo (B). Região da carina (brônquios principais) (C) antes do processo de conservação, e após o processo de conservação sem o uso de traqueotubo, demonstrando colabamento dos brônquios(D). Fonte: Serviço de Cirurgia Geral e Endoscopia Veterinária do Hospital Veterinário Governador Laudo Natel - UNESP/Jaboticabal (2023). 23 Figura 5 Laringotraqueoscopia de um cão braquicefálico. Avaliação prévia ao processo de conservação (imagens à esquerda) evidenciando a entrada da laringe (A), traqueia (C) e carina (D). Imagens à direita demonstram as mesmas estruturas aos 90 dias de conservação (B, D e F). Notar a proximidade entre a coloração do cadáver fresco e o quimicamente preparado após o período de conservação. Fonte: Serviço de Cirurgia Geral e Endoscopia Veterinária do Hospital Veterinário Governador Laudo Natel -UNESP/Jaboticabal (2023). No grupo de animais conservados por 120 dias (n=18), quatro (22,22%) cadáveres foram armazenados entubados com traqueotubo e em posição de esfinge durante todo o período avaliado. Notou-se que estes animais mantiveram toda a morfologia do lúmen traqueal semelhante à observada antes da preparação química. Desses, três obtiveram resultados satisfatório em relação à coloração e à maleabilidade dos tecidos durante o uso do endoscópio rígido. Dos 12 cadáveres avaliados por laringotraqueoscopia após 90 dias de conservação, 100% (n=12) obtiveram resultados satisfatórios em todos os critérios analisados, incluindo coloração próxima ao do cadáver fresco, maleabilidade compatível com o uso do endoscópio rígido e morfologia preservada e fidedigna aos padrões observados em cadáveres frescos (preservação anatômica da membrana dorsal, brônquios e tecido moles da laringe), como demonstrado na figura 5. A C D E F B 24 . Ápice Ápice A B A B Figura 6 Laringoscopia de cão mesocefálico (A) e braquicefálico (B), vista ventral da cartilagem epiglótica, demonstrando variações anatômicas, onde a cartilagem epiglótica apresenta ápice arredondado. Fonte: Serviço de Cirurgia Geral e Endoscopia Veterinária do Hospital Veterinário Governador Laudo Natel - UNESP/Jaboticabal (2023). 4.2 Variações anatômicas Entre os 15 cães braquicefálicos analisados neste estudo, 14 (93,33%) apresentaram o ápice da cartilagem epiglótica com formato arredondado. Em contraste, todos os cães mesocefálicos (100%; n=15) apresentaram o ápice dessa cartilagem com conformação pontiaguda, conforme demonstrado na Figura 6. Todos os cães mesocefálicos (n=15) apresentaram maior proeminência dos processos cuneiformes em comparação aos cães braquicefálicos avaliados neste estudo (n=15). Observou-se, nessa região, a presença de mucosa mais edemaciada em todos os cadáveres braquicefálicos (100%), conforme ilustrado na Figura 7. Processo cuneiforme Processo cuneiforme Epiglote Epiglote C D Figura 7 Laringoscopia comparativa entre cães braquicefálicos (A e C) e mesocefálicos (B e D). Vista rostral da região laríngea, demonstrando a mucosa mais edemaciada do cão braquicefálico e menor proeminência do processo cuneiforme. Fonte: Serviço de Cirurgia Geral e Endoscopia Veterinária do Hospital Veterinário Governador Laudo Natel -UNESP/Jaboticabal (2023). 25 Foram identificadas alterações anatômicas previamente descritas na literatura nos cães braquicefálicos (figura 8), incluindo alongamento do palato mole em 100% dos casos (n=15) e eversão dos sacos laríngeos em 13,33% (n=2). Por outro lado, entre os cães mesocefálicos, foi observado apenas um caso de eversão de sacos laríngeos (6,67%; n=1). Em comparação aos cães mesocefálicos analisados neste estudo, os cães braquicefálicos apresentaram o lúmen da glote significativamente mais estreito, com os processos corniculados posicionados mais próximos entre si, conforme demonstrado nas figuras 9 e 10. Palato mole Sacos laríngeos A B A B C D Figura 8 Vista rostral de exame laringoscópico de um cadáver braquicefálico, demonstrando palato mole alongado (A) e sacos laríngeos evertidos (B). Fonte: Serviço de Cirurgia Geral e Endoscopia Veterinária do Hospital Veterinário Governador Laudo Natel -UNESP/Jaboticabal (2023). Figura 9 Laringoscopia de cadáveres braquicefálicos(A,B,C,D) previamente ao processo de conservação, demonstrado a redução do lúmen da glote e a proximidade entre os processos corniculados. Fonte: Serviço de Cirurgia Geral e Endoscopia Veterinária do Hospital Veterinário Governador Laudo Natel -UNESP/Jaboticabal (2023). 26 Figura 10 Laringoscopia de cadáveres de cães mesocefálicos (A, B, C e D), demonstrando menor estreitamento do lúmen da glote. Fonte: Serviço de Cirurgia Geral e Endoscopia Veterinária do Hospital Veterinário Governador Laudo Natel -UNESP/Jaboticabal (2023). 5. DISCUSSÃO O avanço e a crescente acessibilidade da tecnologia de diagnóstico por imagem têm se consolidado como uma ferramenta essencial no ensino de anatomia animal, especialmente com sua aplicação cada vez mais frequente na prática veterinária (MASSARI et al., 2018). O uso de animais em treinamentos e pesquisa de técnicas cirúrgica tem sido amplamente debatido no meio científico, o que tem impulsionado a investigação de novos métodos de conservação de cadáveres (SOUZA et al., 2020). O presente estudo viabiliza um método de conservação alternativo, que possibilita aprimorar técnicas de laringotraqueoscopia, reduzindo o número de animais utilizados e consequentemente a redução de custos experimentais, uma vez que o mesmo cadáver pode ser utilizado para diversas práticas. Estudos anteriores demonstram a eficácia do sal de cura com nitrito como agente de embalsamamento, destacando sua capacidade de conservar membros, como músculos e vasos sanguíneos, embora apresente limitações na preservação de cadáveres inteiros (FRIKER et al., 2007; JANCZYK et al., 2011). A adição de etanol e polietilenoglicóis como agentes fixadores foi necessária para manter a flexibilidade de músculos e órgãos, embora os autores tenham observado dificuldades em relação à manutenção da coloração dos tecidos conservados (JANCZYK et al., 2011). A solução proposta, composta por sal de cura com nitrito, etanol ou polietilenoglicóis, se mostrou D C B A 27 uma alternativa mais segura e ecológica ao formaldeído, além de apresentar boa eficácia microbiológica (FRIKER et al., 2007; JANCZYK et al., 2011). No presente estudo, foi utilizada a adição de glicerina ao álcool etílico. Em conformidade com os achados de Janczyk et al. (2011), os cadáveres mantiveram suas características anatômicas durante 90 dias após a conservação, com coloração e maleabilidade mais próximas às observadas em cadáveres frescos. A embalagem a vácuo, eficaz na preservação de alimentos devido à inativação de bactérias aeróbicas (FARBER et al., 2003), também mostrou benefícios no armazenamento de cadáveres, ao prolongar a qualidade e evitar deterioração (QUEIROZ et al.,2020). No estudo em questão, o armazenamento a vácuo, aliado ao uso de uma solução conservante em menor volume (5%), contribuiu para a manutenção da coloração e maleabilidade dos tecidos. A remoção do ar durante o armazenamento potencializou os efeitos da técnica, favorecendo a preservação anatômica dos espécimes. Para o sucesso da técnica de conservação, é essencial o armazenamento dos corpos com o traqueotubo acoplado à traqueia, a fim de evitar deformidades nas estruturas anatômicas da traqueia. No entanto, essa medida é necessária apenas quando os corpos são armazenados de forma empilhada. Caso o armazenamento permita que cada cadáver fique posicionado de forma isolada (posicionado em esfinge), sem a influência do peso de outros sobre ele, esse procedimento pode ser dispensado, como realizado nessa pesquisa. A síndrome obstrutiva das vias aéreas é uma condição amplamente prevalente em cães braquicefálicos, caracterizada por manifestações respiratórias como dispneia, cianose, ronco, intolerância ao exercício e distúrbios do sono (MEOLA, 2013). Essas alterações estão relacionadas a deformidades anatômicas congênitas, como as descritas neste trabalho, incluindo estenose das narinas, palato mole alongado e macroglossia, que resultam em aumento da resistência das vias aéreas e dificultam o fluxo respiratório (ROEDLER et al.,2013). As alterações anatômicas das vias aéreas em cães braquicefálicos representam um fator determinante na evolução e gravidade da Síndrome Obstrutiva das Vias Aéreas Superiores. A eversão dos sacos laríngeos é uma dessas alterações comumente identificadas, sendo observada em 40% a 60% dos cães dessas raças (GIANELLA et al., 2019). Os resultados obtidos no presente estudo complementam 28 esses achados ao identificar que cães braquicefálicos apresentam, adicionalmente, um lúmen glótico reduzido em comparação a cães mesocefálicos. Alteração observada devido à proximidade entre si dos processos cuneiformes, sendo estes menos proeminentes em comparação aos cães mesocefálicos deste estudo, além disso, notou-se também diminuição de espaço na rima glótica. Estudos recentes destacam a alta incidência de colapso laríngeo nesses animais, com 85% apresentando colapso grau I e 33% grau III, alterações que agravam o quadro respiratório e influenciam diretamente o prognóstico e o tratamento (KIM et al., 2018; CANTATORE et al., 2012). White (2011) descreve os estágios progressivos do colapso laríngeo em cães: no estágio I, ocorre a eversão dos sacos laríngeos; no estágio II, há perda da rigidez e deslocamento medial dos processos cuneiformes das cartilagens aritenoides; e, no estágio III, verifica-se o colapso dos processos corniculados das cartilagens aritenoides, resultando na perda do arco dorsal da rima glótica. Os resultados do presente estudo indicam uma possível correlação entre essas alterações anatômicas progressivas e os achados observados. Verificou-se que 13,33% dos cães braquicefálicos avaliados (n = 3) apresentaram eversão dos sacos laríngeos, correspondente ao grau I do colapso laríngeo. Além disso, foi constatado que 93,33% dos animais (n = 14) apresentaram redução do lúmen glótico, mesmo sem a presença de eversão dos sacos laríngeos. Esse achado pode estar relacionado a um leve deslocamento medial dos processos cuneiformes da cartilagem glótica, característico de um estágio inicial do grau II de colapso laríngeo. Esses resultados sugerem que o estreitamento do lúmen glótico pode ocorrer de forma precoce, independentemente da eversão dos sacos laríngeos, destacando a importância da avaliação anatômica detalhada desses animais. O presente estudo também observou que cães braquicefálicos possuem o as junções ariepiglóticas menos eminentes, ápice da cartilagem glótica mais arredondado. As mucosas presentes nestas cartilagens são mais edemaciadas comparada aos cães mesocefálicos utilizados nesta pesquisa. 29 Desta forma, conclui-se que o método de conservação proposto neste estudo demonstrou ser eficaz na preservação de cadáveres para o treinamento em laringotraqueoscopia, mantendo a integridade anatômica e funcional das estruturas. Além disso, as alterações anatômicas identificadas nos cães braquicefálicos reforçam a relevância dessa técnica para o diagnóstico e manejo das doenças respiratórias. Esse avanço representa uma alternativa ética, segura e economicamente viável para o aprimoramento das práticas veterinárias. 6. CONCLUSÃO Os resultados obtidos neste estudo fornecem subsídios importantes para a compreensão da viabilidade do uso de cadáveres quimicamente tratados no treinamento de laringotraqueoscopia, bem como para a análise de variações anatômicas entre cães braquicefálicos e mesocefálicos. A preservação adequada da coloração, maleabilidade e morfologia das vias aéreas em parte dos cadáveres conservados por até 90 dias evidencia o potencial dessa metodologia como ferramenta de ensino. Além disso, as diferenças estruturais identificadas entre as raças estudadas ressaltam a relevância do conhecimento anatômico específico para a prática clínica e cirúrgica. REFERÊNCIAS BOTTERO, E.; BELLINO, C.; DE LORENZI, D.; RUGGIERO, P.; TARDUCCI, A.; D’ANGELO, A.; GIANELLA, P. Clinical evaluation and endoscopic classification of bronchomalacia in dogs. Journal of Veterinary Internal Medicine, v. 27, n. 4, p. 840– 846, 2013. Disponível em: https://doi.org/10.1111/jvim.12096. CANTATORE, M.; GOBBETTI, M.; ROMUSSI, S.; BRAMBILLA, G.; STEFANELLO, D.; GIUDICE, C.; GRIECO, V. Medium term endoscopic assessment of the surgical outcome following laryngeal saccule resection in brachycephalic dogs. Veterinary Record, v. 170, n. 20, p. 518, 2012. Disponível em: https://doi.org/10.1136/vr.100289. Acesso em: 01 Dez 2024 COSTA, G. B. F.; LINS, C. C. S. A. O cadáver no ensino da anatomia humana: uma visão metodológica e bioética. Revista Brasileira de Educação Médica, v. 36, n. 3, p. 369–373, 2012. Disponível em: https://doi.org/10.xxxx. Acesso em: 02 jan. 2025 30 FARBER, J.N.; HARRIS, L.J.; PARISH, M.E.; BEUCHAT, L.R.; SUSLOW, T. V.; GORNEY, J.R.; GARRETT, E.H.; BUSTA, F.F. (2003) Microbiological Safety of Controlled and Modified Atmosphere Packaging of Fresh and Fresh-Cut Produce Comprehensive Reviews. Food Science and Food Safety. v. 2, p.142-160. FRIKER, J., ZEILER, E., MCDANIEL, B.J. From formalin to salt. Development and introduction on a salt-based preserving solution for macroscopic anatomic specimens Tierärztl. Prax. 35, 243–248, 2007. GETTY, R. Anatomia dos animais domesticos 5.ed Rio de Janeiro: Guanabara, 1986: 1377-1391 GIANELLA, P.; CACCAMO, R.; BELLINO, C.; BOTTERO, E.; FIETTA, F.; RONCONE, S.; OSTANELLO, F.; PIETRA, M.; BURACCO, P. Evaluation of metabolic profile and C-reactive protein concentrations in brachycephalic dogs with upper airway obstructive syndrome. Journal of Veterinary Internal Medicine, v. 33, n. 5, p. 2183-2192, 2019. HYSINGER, E. B. Laryngomalacia, tracheomalacia and bronchomalacia. Current problems in pediatric and adolescent health care, v. 48, n. 4, p. 113–118, 2018. 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Dissertação (Mestrado em Cirurgia Veterinária) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Jaboticabal, 2020. Orientador: Fabrício Singaretti de Oliveira. ROEDLER, F. S.; POHL, S.; OECHTERING, G. U. How does severe brachycephaly affect dog’s lives? Results of a structured preoperative owner questionnaire. Veterinary journal, v.198, n.3, p.606-10, 2013. SOUZA, J. V. M. D.; DAMBROS, M. D.; PAULINO, N. T. R.; GONÇALVES, G. R.; GRECCO, L. H. Cadáveres quimicamente preservados com solução de Larssen modificada – um método alternativo de conservação. InterAmerican Journal of Medicine and Health, v. 3, e202003055, 2020. https://doi.org/10.31005/iajmh.v3i0.106. Acesso em: 02 jan. 2025. WHITE, R. N. Surgical management of laryngeal collapse associated with brachycephalic airway obstruction syndrome in dogs. Journal of Small Animal Practice, v. 53, p. 44–50, 2012. Disponível em: https://doi.org/10.1111/j.1748- 5827.2011.01156.x. Acesso em: 16 jan. 2025. 32 CAPÍTULO 3: ARTERIOGRAFIA CERVICAL DESCRIÇÃO DA INERVAÇÃO TRAQUEAL COMPARATIVA ENTRE CÃES BRAQUICEFÁLICOS E MESOCEFÁLICOS 1. INTRODUÇÃO A compreensão das particularidades anatômicas das artérias cervicais em cães braquicefálicos e mesocefálicos é de extrema importância para a prática veterinária, especialmente no contexto das abordagens cirúrgicas e diagnósticas. No âmbito cirúrgico, a região cervical de cães é frequentemente utilizada em procedimentos reconstrutivos que empregam retalhos de padrão axial. Para o sucesso dessas técnicas, é indispensável o conhecimento detalhado da estrutura vascular da área transplantada (MACPHAIL, 2015; MENEGUCI et al., 2016), garantindo a preservação do suprimento sanguíneo e a viabilidade dos tecidos envolvidos. Cães braquicefálicos apresentam características anatômicas específicas resultantes de anos de seleção artificial, que incluem encurtamento do focinho, alargamento médio-lateral do crânio e obstrução do fluxo respiratório cranial. Essas alterações genéticas e anatômicas, enquanto contribuem para a aparência desejada por muitos tutores, têm implicações significativas na saúde respiratória, gastrointestinal e ocular desses animais (EKENSTEDTET al.,2020). Diversos estudos têm demonstrado que cães braquicefálicos cursam com anomalias anatômicas específicas, além de possíveis alterações fisiológicas (KÄMPF et al., 2023; CANOLA 2021). Dado o atual cenário, a realização de estudos anatômicos detalhados é essencial para subsidiar o planejamento terapêutico, cirúrgico e a identificação de padrões vasculares e neurológicos que possam minimizar riscos de complicações durante procedimentos. Desta forma, este trabalho tem como objetivo descrever as possíveis particularidades anatômicas das artérias cervicais e da inervação da traqueia e laringe de cães braquicefálicos e mesocefálicos, utilizando técnicas de arteriografia e dissecação. 2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS • Descrever as particularidades anatômicas das artérias cervicais cutâneas em cães braquicefálicos através da arteriografia. • Descrever as possíveis particularidades anatômicas da irrigação e inervação traqueal a partir da dissecação dos cadáveres. 33 3. MATERIAIS E MÉTODOS 3.1 Animais utilizados Foram utilizados 30 cadáveres de cães, distribuídos igualmente entre braquicefálicos e mesocefálicos, obtidos no Centro de Zoonose de Ribeirão Preto (processo 02.2014.000027-1), este estudo seguiu as normas e princípios éticos de experimentação animal aprovados pelo Conselho Nacional de Controle e Experimentação Animal (CONCEA) e foi aprovado pela Comissão de Ética no Uso de Animais da Universidade do Estadual Paulista (protocolo 003578/23). Os cadáveres foram selecionados com escore corporal de 4 ou 5 em uma escala de 1 a 9 (LAFLAMME, 1997), para garantir uniformidade dos dados. Testes prévios indicaram que cães obesos (escore 6 a 9) apresentavam as mesmas conformações anatômicas, porém com maior dificuldade para dissecação e visualização dos nervos, devido ao excesso de tecido adiposo. Foram observadas no grupo de cães braquicefálicos as raças shih-tzu (n=12) e bulldog francês (n=3). O grupo de cães mesocefálicos foi composto por raças não definidas (SRD). Para este estudo, a craniometria foi realizada no grupo de cães braquicefálicos para garantir a seleção adequada, considerando um índice crânio-facial (ICF) ≥ 3 e um índice cefálico (IC) ≥ 80 (GETTY,1896). O grupo de cães braquicefálicos era composto por 9 fêmeas e 6 machos, enquanto o grupo de cães mesocefálicos incluía 8 machos e 7 fêmeas. 3.2 Técnica Anatômica empregada Após o óbito os cadáveres foram congelados e transportados para o Laboratório de Anatomia Cirúrgica da Universidade do Estado de São Paulo “Júlio de Mesquita Filho” campus Jaboticabal (LAC-UNESP). Os corpos foram descongelados em água corrente por um período de 12 horas, seguidos da realização de tricotomia total. Para preservar a topografia vascular da região cervical, utilizou-se uma solução conservante e fixadora, a qual foi administrada por meio de canulação da aorta torácica, acessada mediante incisão no 7º espaço intercostal esquerdo. A conservação dos espécimes foi realizada com solução composta por sais de cura, contendo 20% de cloreto de sódio, 1% de nitrito de sódio e 1% de nitrato de sódio, na proporção de 50 mL/kg (5%), complementada com álcool glicerinado a 5%. 34 Ambas as soluções foram injetadas em volumes equivalentes (50 mL/kg), direcionando-se o fluxo no sentido cranial. Em seguida, foi realizado o processo de marcação arterial, sendo injetado 15 mL/kg de solução de sulfato de bário diluído em água (1:1), na proporção de 1:4 com solução de látex colorido com tinta Xadrez® vermelha (3 gotas a cada 100mL de solução bário:látex). Após marcação arterial, os corpos foram identificados e embalados a vácuo utilizando seladora a vácuo (VS600 Cetro®) e armazenados sob refrigeração média de 4°C durante 48 horas para endurecimento do látex. Em seguida, os cadáveres seguiriam para avaliação radiográfica do crânio e traqueia, realizadas no Hospital Veterinário da Instituição com o equipamento Tridoros 812 -E 800 mA, Siemens, Berlin e digitalizadas utilizando-se o aparelho CR 30-X, Agfa, Belgium, e avaliadas no monitor diagnóstico MDRC-1119, Barco, United States, sendo consideradas duas projeções: latero-lateral esquerda e dorso ventral (FIGURA 1). Figura. 1. Imagem radiográfica de cadáver braquicefálico após preparação química e injeção de látex e bário. (A) projeção dorso ventral. (B) Projeção látero-lateral esquerda. São visíveis a artéria tireóidea cranial (seta azul), artérias carótidas comuns esquerda e direita (setas vermelhas), traqueia (seta amarela), região cranial do esôfago (círculo amarelo escuro). Fonte: Setor diagnóstico por Imagem, Hospital Veterinário Governador Laudo Natel -UNESP (2023). Os corpos seguiram para dissecação, iniciando p