0 PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO Linha de Pesquisa: Educação: Política, Gestão e o Sujeito Contemporâneo. CORPO EM MOVIMENTO: MARCAS DO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO NA CIDADE DE SUZANO/SP Ivan Rubens Dário Jr. Rio Claro/SP junho / 2016 Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação - Instituto de Biociências do Câmpus de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Educação. Orientador: Romualdo Dias 1 PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO Linha de Pesquisa: Educação: Política, Gestão e o Sujeito Contemporâneo. CORPO EM MOVIMENTO: MARCAS DO ORÇAMENTO PARTICIPATIVO NA CIDADE DE SUZANO/SP Ivan Rubens Dário Jr. Rio Claro junho / 2016 Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação - Instituto de Biociências do Câmpus de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Educação. Orientador: Romualdo Dias Dario Junior, Ivan Rubens Corpo em movimento : marcas do orçamento participativo na cidade de Suzano/SP / Ivan Rubens Dario Junior. - Rio Claro, 2016 285 f. : il., figs., gráfs., tabs., fots., mapas Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Instituto de Biociências de Rio Claro Orientador: Romualdo Dias 1. Educação. 2. Processo educacional. 3. Reinvenção da cidade. 4. Experiência. 5. Cartografia. 6. Processo de subjetivação. 7. Estado. I. Título. 370 D218c Ficha Catalográfica elaborada pela STATI - Biblioteca da UNESP Campus de Rio Claro/SP 2 Nome: Ivan Rubens Dário Jr Título: CORPO em movimento: marcas do orçamento participativo na cidade de Suzano/SP Aprovado em 09/junho/2016. BANCA EXAMINADORA ___________________________________________________________________ Prof. Dr. Romualdo Dias – Orientador Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP ___________________________________________________________________ Profa. Dra. Bernadete Ap. Caprioglio de Castro Oliveira Titular ___________________________________________________________________ Profa. Dra. Rosimeri de Oliveira Dias Titular ___________________________________________________________________ Prof. Dr. Pedro de Carvalho Pontual Suplente ___________________________________________________________________ Prof. Dr. Aldo Ambrósio Suplente Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação - Instituto de Biociências do Câmpus de Rio Claro, Universidade Estadual Paulista, como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre em Educação. 3 “Aos esfarrapados do mundo e aos que neles se descobrem e, assim descobrindo-se, com eles sofrem, mas, sobretudo, com eles lutam.” Paulo Freire Ao meu avô José Rodrigues Jordão Filho com saudade. Em homenagem a três educadores: José de Souza Candido (nosso mestre), Júlio Mariano e Juarez de Araújo Braga. 4 AGRADECIMENTOS Agradeço a minha família. Agradeço ao professor doutor Romualdo Dias. Agradeço às professoras doutoras Rosimeri de Oliveira Dias e Bernadete Aparecida Caprioglio de Castro Oliveira, e ao professor doutor Aldo Ambrózio. Agradeço aos amigos na pessoa dos geógrafos Marcelo Candido e Ivo Reseck, ao pedagogo Silvio Munari Machado e ao administrador Leonel de Arruda Machado Luz. Agradeço a família-outra 156. Agradeço aos colegas do OP em Suzano, conselheiros, apoiadores, simpatizantes, trabalhadores, companheiros, na pessoa da geógrafa Fabiane Pizzirani, da jornalista Cecília Figueiredo e da educadora Paula Cursino. 5 Ventana sobre el cuerpo (Eduardo Galeano) a Iglesia dice: El cuerpo es una culpa. La ciencia dice. El cuerpo es una máquina. La publicidad dice: El cuerpo es un negocio. El cuerpo dice: Yo soy una fiesta. Aboio (Caetano Veloso) Urbe imensa Pense o que é e será e foi Pensa no boi Enigmática máscara boi Tem piedade Megacidade Conta teus meninos Canta com teus sinos A felicidade intensa Que se perde e encontra em ti Luz dilui-se E adensa-se Pensa-te O nome da cidade (Caetano Veloso) Ôôôôôôô ê boi! ê bus! Onde será que isso começa A correnteza sem paragem O viajar de uma viagem A outra viagem que não cessa Cheguei ao nome da cidade Não à cidade mesma, espessa Rio que não é rio: imagens Essa cidade me atravessa Ôôôôôôô ê boi! ê bus! Será que tudo me interessa? Cada coisa é demais e tantas Quais eram minhas esperanças? O que é ameaça e o que é promessa? Ruas voando sobre ruas Letras demais, tudo mentindo O Redentor, que horror! Que lindo! Meninos maus, mulheres nuas Ôôôôôôô ê boi! ê bus! A gente chega sem chegar Não há meada, é só o fio Será que pra meu próprio rio Este rio é mais mar que o mar? Ôôôôôôô ê boi! ê bus! Sertão, sertão! ê mar! 6 RESUMO O presente texto registra uma experiência com o corpo implicado: a implementação do Orçamento Participativo em Suzano/SP, a cidade das flores, no período compreendido entre 2005–2008 e seus desdobramentos. Desde o primeiro momento na coordenação deste projeto, uma pergunta nos desafiava: para além das obras físicas, o que fica para a cidade com uma política desta natureza? Ou, a que conduz o Orçamento Participativo? Uma experiência coletiva, inédita, promotora de movimentos, de trânsitos sobre o chão da cidade física e trânsitos em territórios existenciais, tudo isso inevitavelmente provoca marcas. Apresentamos algumas dessas marcas no corpo da cidade, no CORPO e na cidade. No primeiro capítulo estão organizados os aspectos mais empíricos, corpos em movimento na cidade. No segundo capítulo trabalhamos três fios retirados do novelo, três eixos pulsantes de todo o trabalho, Estado, cidade e sujeito (outros), linhas em tecitura. Nos colocamos a tecer no terceiro e último capítulo: a vida veste sua roupa nova. Estado agora é de poesia, cidades são visíveis, sujeitos provam outras vestimentas e uma articulação entre elas. Educação compreendida como a mútua implicação: processo educacional e produção de subjetividade. Por fim, uma escrita fora do texto, uma fala com a vivência do campo cotidiano liberada de conhecimentos definitivos sobre o objeto. Registramos uma experiência de cidade atravessada pela produção de subjetividade. Você terá contato com um texto polifônico a partir de uma política narrativa articulada a outras políticas: política orçamentária, política de pesquisa, política de subjetividade, política de cidade. Falamos de uma política com sentido ampliado, para além das práticas relativas ao Estado. Falamos de uma política que coloca em relação os sujeitos, que dispara movimentos, que provoca encontros. Uma política compreendida como a multiplicação dos possíveis, que se faz em arranjos locais, micro-relações, conversas, cirandas e outras, nessa dimensão micro política das relações. Uma tessitura relacional instituinte na relação com o instituído. Cartografando uma multiplicidade de linhas e vozes. Linhas em tecitura, vozes em tessitura. Palavras chave: processo educacional - processo de subjetivação - cidade - política - cartografia. 7 Abstract This text registers a body implied experience: the implementation of the Participatory Budgeting in Suzano/SP and its developments in the city of flowers, within the 2005- 2008 period. Since the early start of this project coordination some questions challenged us: what remains to the city with such politics over and above the physical works? What leads the Participatory Budgeting? An unprecedented collective experience that promotes movements, as well as traffics above the ground of the physical city, all of these causing marks. We present some of these marks in the body of the city, into the body and into the city. In the first chapter the most empiric aspects are organized, body in movement in the city. In the second chapter, we work with the three threads taken out of the ball of thread, three pulsing shafts of the whole work, State, city and subject (others) - lines in a weaving. We place ourselves at the weave at the third and last chapter: the life wears its new gown. State now is poetry, the cities are invisible, subjects try other clothes. An articulation amongst all of this: the education comprehended on this mutual implication, its educational process and its subjective production. At last, an out of the text writing, a knowledge liberated speech experience that gives up a definitive positions towards the object. We register an experience of the city overpassed by the subjectivity production. You will be in touch with a polyphonic text, out of a narrative policy articulated with other politics: budgeting politics, research politics, subjectivity politics, city politics. We mean politics in a wide sense, beyond the State related politics. We speak about a politic which relates the subjects, which triggers movements and promotes encounters. A politic comprehended as a multiplication of possible worlds that builds itself in local arrangements, micro-relations, talks, dance rounds, in a micro-political policy of the relations. A relational instituting weave at the relation with the instituted. mapping a multipilicity of lines and voices. Weaving lines, voices in weave. 8 SUMÁRIO Introdução .................................................................................................. 9 Capítulo 1 Corpos em movimento: a experiência do OP na cidade .................................. 15 1.1 Síntese da história da cidade e do governo. ............................... 16 1.2 Síntese da história do OP, concepção e organização. ................ 27 1.3 O processo do ponto de vista da participação das pessoas. ...... 36 Capítulo 2 Eixos pulsantes, linhas em tecitura. ................................................................. 77 2.1 Estado outro ................................................................................ 78 2.2 Cidade outra ................................................................................ 96 2.3 Sujeito outro .............................................................................. 112 Capítulo 3 Arte de tecer: a vida veste sua roupa nova. ................................................... 121 3.1 Estado, de poesia...................................................................... 122 3.2 Cidade visíveis .......................................................................... 133 3.3 Sujeito no provador ................................................................... 140 3.4 Dobradiça: as linhas .................................................................. 156 CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 161 Referencial bibliográfico. ................................................................................ 168 Fora do texto – uma escrita no movimento do corpo ..................................... 173 Apêndice A. Artigos publicados em 2006 .......................................... 177 Apêndice B. Artigos publicados em 2007 .......................................... 200 Apêndice C. Artigos publicados em 2008 .......................................... 237 Apêndice D. Artigos publicados a partir de 2009 ............................... 273 9 Introdução à medida em que fui mergulhando na memória para buscar os fatos e reconstituir sua cronologia, me vi adentrando numa outra espécie de memória, uma memória do invisível feita não de fatos mas de algo que acabei chamando de "marcas". (ROLNIK, 1993 p.241) Às vésperas do natal de 2004, um deputado estadual ainda no exercício do mandato e prefeito eleito me convidou para um café da manhã. A cerimônia de posse aconteceria no início da primeira manhã de 2005. Mesa posta, palavra acesa. Iniciamos com as ‘prioridades’: futebol. Falamos sobre a cerimônia de posse, pensamos um pouco sobre as relações entre as instituições públicas na cidade, até que ouço o convite o compor para equipe de governo. Tudo apontava para um intenso trabalho na cidade visto o desafio de implementar um programa de governo construído coletivamente em debates públicos. Sobre a mesa, omelete, pão, café e leite, suco e três possibilidades de atuação. Duas delas já experimentadas: a primeira delas muito bem conhecida; a segunda, razoavelmente conhecida; portanto sem muitas novidades. A última, absolutamente inédita para a cidade e para mim: coordenar o orçamento participativo. Titubeei! Como escapar dessa situação? Precisava de mais um tempo para elaborar a surpresa que tomou conta de mim. Contudo, nenhum assunto outro teria força suficiente para mudar o foco e me garantir um tempinho a mais para pensar sobre isso, nem mesmo as possibilidades reais de uma temporada gloriosa para nosso mais querido São Paulo Futebol Clube. Fui enfático: - preciso pensar! Ao que ele respondeu: - Claro. Vou pedir um café expresso. É deste tempo que dispomos. O amigo bem me conhecia. Sabia que minha decisão estava tomada desde a formulação do convite. Ineditismo, estudo, criação, invenção, novas possibilidades de experimentação individual e coletiva, enfim, todo um horizonte avistado através desta janela aberta. Aceitei e me lancei neste alto-mar de mundo. 10 Ventana sobre la utopia Ella está en el horizonte —dice Fernando Birri—. Me acerco dos pasos, ella se aleja dos pasos. Camino diez pasos y el horizonte se corre diez pasos más allá. Por mucho que yo camine, nunca la alcanzaré. ¿Para qué sirve la utopía? Para eso sirve: para caminar. Eduardo Galeano Em 1992, o Rio de Janeiro/Brasil sediou a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente e o Desenvolvimento, conhecida como Eco-92. Naquela oportunidade, Félix Guattari apresentou a restauração da cidade subjetiva no colóquio “Homem, cidade, natureza: a cultura hoje”. Guattari iniciou sua intervenção afirmando que o ser humano contemporâneo é fundamentalmente desterritorializado. Com isso quero dizer que seus territórios etológicos originais – corpo, clã, aldeia, culto, corporação... não estão mais dispostos em um ponto preciso da terra, mas se incrustam, no essencial, em universos incorporais. (Guattari, 1992, p.149) Um paradoxo que este autor chamou de falso nomadismo: tudo parece circular numa espécie de agitação, um movimento que é, na verdade, falso. Ele usou o exemplo da indústria do turismo. Os turistas viajam imóveis nas cabines de avião, nos quartos de hotel, nos restaurantes que servem os mesmos cardápios ao redor do planeta, para observar as imagens já vistas em cartazes, em anúncios publicitários, em cartões postais, na tela sem profundidade do aparelho de televisão. Compreendemos com Guattari que o excesso de movimento está, na verdade, escamoteando uma paralisia. Tudo circula, mas do ponto de vista da produção da subjetividade, nada acontece. “A subjetividade encontra-se ameaçada de paralisia”. (Guattari, 1992, p.150). Acompanhando seu raciocínio, alguns pontos nos provocaram sobremaneira. Primeiro, a afirmação de estarem definitivamente perdidas as terras natais. Segundo, a previsão de um horizonte contemporâneo ao mesmo tempo ameaçador e maravilhoso considerando a possibilidade da recomposição de uma singularidade individual e coletiva. Para Guattari, (1992, p.150) “a vida de cada um é única. O nascimento, a morte, o desejo, o amor, a relação com o tempo, com os elementos, com as formas vivas e com as formas inanimadas são, para um olhar depurado, novos, inesperados, miraculosos”. 11 A ideia de Jerusalém celeste nos dá uma pista para a necessidade de escaparmos das idealizações, visto que a restauração da cidade subjetiva, esse confronto entre o sujeito e a materialidade da vida neste aqui e agora tem sua potência. “Essa subjetividade em estado nascente (...) cabe a nós reengendrá-lo constantemente. Não se trata aqui de uma “Jerusalém Celeste”, como a do Apocalipse, mas da restauração de uma cidade subjetiva que engaja tanto os níveis mais singulares da pessoa quanto os níveis mais coletivos” (Guattari, 2012, p.150). Consideradas as idealizações como janelas para utopia na perspectiva de Eduardo Galeano, como um horizonte de sonhos e possibilidades, como disparadora de movimentos, esta perspectiva nos agrada sobremaneira. Por outro lado e ao mesmo tempo, nos parece necessário escapar das idealizações consideradas como totalidades, como verdades absolutas, como respostas que fecham as janelas e interditam movimentos. O fato de chegar ao governo da cidade, pela primeira vez desde sua emancipação político-administrativa, um projeto político e programático oriundo das classes populares, desencadeando toda uma movimentação como experiência coletiva, como experiência de outras formas de estar na cidade, desde então nos provocou muitos pensamentos. “Ressingularizar as finalidades da atividade humana, fazê-la reconquistar o nomadismo existencial tão intenso quanto o dos índios da América pré-colombiana! Destacar-se então de um falso nomadismo que na realidade nos deixa no mesmo lugar, no vazio de uma modernidade exangue, para aceder às verdadeiras errâncias do desejo, às quais as desterritorializações técnico-científicas, urbanas, maquínicas de todas as formas, nos incitam.” (GUATARRI, 1992, p170) Compreendemos a expressão “ressingularizar as finalidades da atividade humana” como o trabalho de produção e de re-elaboração dos sentidos. Sujeito e sentido se produzindo simultaneamente na medida em que as marcas desta ação se materializam na paisagem urbana em forma de obras ou serviços públicos com um resultado concreto na execução do orçamento por parte da prefeitura. Desta maneira, a população dos bairros da cidade orientava a distribuição de parte da mais valia na cidade. 12 Observando de início o título desta pesquisa, nossa curiosidade está no confronto estabelecido entre sujeito e cidade. A cidade compreendida como a expressão do real, onde vivemos, de onde extraímos nossa sobrevivência, onde nossos encontros acontecem. A cidade compreendida também como uma construção coletiva. Neste espaço entre um trabalho vivo no governo local assumido na responsabilidade de apresentar respostas concretas para a cidade e, ao mesmo tempo, compreendido como campo empírico a partir do qual o pensamento transita. Nossa experiência aconteceu numa cidade específica da região metropolitana de São Paulo, esta urbe imensa. Suzano, como todas as cidades, é expressão material de uma construção coletiva. A partir dos encontros de orientação neste estudo, pensamos que, ao Estado local cabe tratar das questões da cidade, inserida, contudo no capitalismo neoliberal que opera na destruição do pensamento e na captura dos sujeitos. Questões nacionais e globais batem à porta da Prefeitura o tempo todo. Como responder a isso? As demandas sociais cada vez maiores, mais sérias e mais urgentes e a capacidade de responder a essas demandas cada vez mais limitadas jurídica e orçamentariamente. A vida parece estar se resumindo à esfera sobrevivência em sua batalha violenta. Afinal, quanto mais vulnerável, quanto mais capturado, tanto mais dominado pode estar o sujeito. Os estudos da subjetividade nos interessam no sentido de compreender melhor o confronto entre sujeito e cidade. Pensamos que ao produzir atitudes nesse processo de construção da cidade como espaço da materialização de uma vida mais interessante, ou seja, ao assumir um papel na produção da cidade o sujeito está ao mesmo tempo produzindo a si mesmo. Colocamos nosso foco na experiência concreta da implementação do orçamento participativo no período de 2005 a 2008 que promoveu ampla discussão pública sobre o custo de viver na cidade a partir do trabalho com a questão do orçamento público. Como veremos nas páginas deste estudo, o orçamento participativo trabalha com as condições reais da sustentação da vida ao olhar para a cidade numa perspectiva econômica. Embora esse trabalho tenha como base a economia, não esteve restrito a essa dimensão. Na experiência também aconteceram convivência, estabelecimento de regras, construção de pactos, e, portanto, consensos aconteceram: o político em movimento. E neste movimento, provocações e estímulos sobre horizontes de que a cidade pode ser diferente. Em 13 outras palavras, produção de outros sentidos para novas leituras de mundo, sonhos, utopias, saberes, ciência, esperança, tudo isso se articulando. Vamos tentar relacionar esse nosso campo problemático compreendido como curiosidade disparadora deste estudo, aos desafios presentes na reinvenção do Estado, na reinvenção da cidade e na reinvenção do sujeito em sua disposição de assumir o compromisso com o viver na cidade. Pois bem, a cidade é o real, onde se dá a materialidade da vida. O Estado aqui compreendido como garantidor, ou seja, como legalidade, o jurídico, a institucionalidade, os pactos, as lei, acertos, as regras de convivência enfim. O sujeito, por sua vez, está mais relacionado com aquilo que ele pode desfrutar disso tudo pois, na medida em que o sujeito participa, na medida em que o sujeito interfere, na medida em que o sujeito se envolve, que decide, ele pode perceber que sua vida pode ser melhor e, nesta implicação com a cidade e o Estado, quando tudo se modifica, o próprio sujeito se modifica. Um campo mais amplo, um universo de possibilidades vai se descortinando diante do sujeito, novos sentidos se produzem, outras perspectivas vão aparecendo. Interessante perceber que estar à espreita, que colocar em dúvida, que elaborar perguntas mostrou-se constante durante toda a experiência. Num artigo publicado em dezembro de 2008 sob o título A conversa que não houve..., reproduzido nas páginas 259 e 260 deste texto, uma pergunta aparece repetidas vezes: então, o que fica? O que fica para a cidade e seus habitantes para além das obras físicas como materialidade da execução orçamentária por parte da Prefeitura Municipal? Agora, vinculados a este programa de pós-graduação em educação, procuramos resposta para a seguinte questão:  A que conduz o Orçamento Participativo? No primeiro capítulo, mais empírico, descreveremos a experiência do orçamento participativo em Suzano em três abordagens. Primeiro abordaremos o histórico da cidade e do governo no sentido de construir uma contextualização de espaço e tempo. Em seguida entraremos no orçamento participativo propriamente dito com ênfase maior no seu caráter organizativo, narrando sua concepção e como 14 foi organizado em Suzano. Por fim narraremos este processo a partir do ponto de vista da participação das pessoas que aceitaram o convite e viveram a experiência. No segundo capítulo, de caráter mais teórico, traremos os autores que fundamentam esta nossa pesquisa, compondo o terreno conceitual por onde circularão nossos pensamentos e, neste diálogo produziremos os três eixos pulsantes, as linhas na tessitura das tantas vozes e na tecelagem desta narrativa a partir da experiência empírica: 1) Estado outro, apoiado em Eduardo Viveiros de Castro, Gilles Deleuze, Michel Foucault e Boaventura de Souza Santos; 2) Cidade outra, apoiada em Yi-Fu Tuan, David Harvey, Félix Guattari, Luc Boltanski e Ève Chiapello; 3) Sujeito outro, apoiado nos textos de Jean-Paul Sartre, Michel Kail e Raoul Kirchmayr. No terceiro capítulo, traremos nossa experiência vivida em Suzano com o Orçamento Participativo. Desenvolveremos nosso raciocínio da experiência descrita e narrada no primeiro capítulo e, com as lentes presentes no segundo capítulo, apresentaremos os saberes produzidos na experiência, o conhecimento construído a respeito do Estado, da cidade e do sujeito. Um último item servirá como uma espécie de dobradiça articuladora dos eixos pulsantes. Nas considerações finais, retomaremos a pergunta formulada nesta introdução no sentido de buscar algumas respostas que, mesmo que provisoriamente, arrefeçam e retroalimentem nossa curiosidade investigativa. Estão fora do texto os artigos produzidos quinzenalmente durante o período investigado como forma de registro dos acontecimentos no momento mesmo de sua realização, uma espécie de caderno de campo tornado público na coluna de um jornal local. Desta maneira, esperamos na esteira de Boaventura de Souza Santos quando de sua Crítica da Razão Indolente: contra o desperdício da experiência, registrar e analisar essa experiência singular vivida intensamente na cidade de Suzano/SP. Por fim, um alerta ao leitor: a tessitura das tantas vozes, os tantos encontros, dão a esse texto um caráter polifônico. As múltiplas vozes presentes nesse texto estão marcadas com aspas quando a autoria popular é conhecida e registrada. Fazemos isso em respeito e reverência aos autores populares que fizeram e viveram conosco essa experiência única e singular. As expressões em itálico marcam outras tantas autorias cuja identificação e registro não é possível. Vozes tantas outras que ainda ressoam, ecoam e preenchem os inúmeros cadernos de campo. 15 Capítulo 1 Corpos em movimento: a experiência do OP na cidade Eu não escrevo pra ninguém e nem pra fazer música E nem pra preencher o branco dessa página Eu me entendo escrevendo E vejo tudo sem vaidade Só tem eu e esse branco Ele me mostra o que eu não sei E me faz ver o que não tem palavras Por mais que eu tente são só palavras Mariana Aydar Neste primeiro capítulo abordaremos a experiência empírica no processo de implementação do Orçamento Participativo no município de Suzano entre os anos 2006 e 2008. Organizaremos os dados coletados nesta experiência realizada na cidade no esforço de facilitar a compreensão do processo constituído no movimento mesmo dos encontros e acontecimentos. Para tanto, este capítulo possui três partes. Apresentaremos, na primeira parte, uma síntese da história da cidade e uma síntese da história do governo eleito novembro de 2004. Descreveremos algumas concepções políticas explicitadas no confronto com as contradições na materialidade do urbano nas condições reais da cidade investigada. Na segunda parte, apresentaremos uma síntese da história do Orçamento Participativo, o modo como foi concebido e como foi implementado. Nesta parte, colocaremos o foco no processo organizacional do ponto de vista da estrutura do trabalho realizado. Por fim, na terceira parte apresentaremos os elementos educacionais utilizando grande parte do material didático produzido na experiência e outras formas de registro que coletamos nesta pesquisa. Nesta última parte descreveremos o processo organizacional a partir do ponto de vista da participação das pessoas que se envolveram e, desta maneira, fizeram essa história. Queremos alertar o leitor a uma dificuldade enfrentada no movimento desta escrita. Em alguns momentos do texto, o esforço descritivo talvez esteja sobreposto 16 por uma narrativa mais intensiva, resultado de uma história vivida com o corpo implicado. Como sugere a epígrafe deste capítulo, escrever como registro mas também como produção de sentido, como polissemia, como busca. É um pouco como olhar para uma página em branco que nos mostra com toda sua clareza as coisas que não sabemos. Pois não sabemos de nada. Mas ao mesmo tempo, toda uma experiência vivida pode ganhar palavras, ou pelo menos parte dessa vida pode se revelar em palavras. Outras não podem. Palavras ainda estão por serem inventadas. O mesmo acontece com o sujeito que escreve ou pode escrever: há tanto por inventar. É como ver o que não tem palavras, é como mergulhar nas profundezas do ser e de tantos seres que estiveram conosco nesta experiência. Porque viver tudo isso que contaremos a partir de agora é tão singular quanto escrever sobre isso. Como se toda escolha sobre o que descrever ou narrar significasse necessariamente deixar de fora uma infinidade de cores, rostos, cheiros, afetos e etc. 1.1 Síntese da história da cidade e do governo. Desperta Cidade das Flores / que almeja um porvir triunfal; Bandeira de todas as cores / no peito um só ideal. Sentindo na alma o valor / do bem que o progresso nos traz Somos seus filhos felizes / lutamos em busca da paz. Avante! Avante Suzano! Para um futuro de glória. Avante! Avante Suzano! Para o florir da vitória. De vários lugares da Terra / vieram imigrantes formar Potência ditosa que encerra / a grande paz de um altar. Trouxeram nas mãos uma flor, / trouxeram indústrias também, Hoje a Cidade progresso / se orgulha dos filhos que tem. (Hino a Suzano. José de Gouvêa.) Consta no sítio da Câmara Municipal de Suzano que o início da colonização da Capitania aconteceu logo após a fundação da Vila de São Vicente, em 1532. No planalto se estabeleceu o Colégio dos Jesuítas, na Vila de São Paulo, em 1554. Daí partindo para o interior da Capitania à procura de pedras ou metais preciosos, 17 aprisionando índios para o trabalho escravo, alargando os domínios da Coroa Portuguesa. De São Paulo saíram incursões descendo ou subindo o rio Anhembi, depois denominado Rio Tietê. De acordo com registros do início do século XVII a sesmaria, cuja área que corresponde em grande parte ao território do atual município de Suzano, foi concedida a um senhor Rodrigues. A presença de ouro nas proximidades do rio Taiaçupeba despertou interesse e trouxe exploradores de regiões distantes. Nos primeiros anos do século XVIII foi erguida a capela de Nossa Senhora da Piedade na localidade denominada Antonio Francisco Baruel, marca do início da formação histórica da Suzano atual. Em meados do século XIX eram treze as casas dedicadas ao comércio, algo considerável para a época. Nesta localidade foi criada uma escola de primeiras letras para meninos no dia 28 de março de 1870. Em 2007, Lei municipal fixou 28 de março como dia da educação. A instalação da linha férrea na ligação do rio Guaió e rio Taiaçupeba, bem próximo à margem esquerda do Rio Tietê, criou novo vetor de crescimento urbano. Em 1875 uma pequena parada para a troca de lenha da locomotiva, a Parada Piedade (em respeito à Padroeira do Baruel), foi erguida no local. Antonio Marques Figueira, então contramestre da ferrovia, propôs o estabelecimento do núcleo urbano junto à parada de trem e, para tanto, contou com apoio de proprietários de terra naquela região1. O arruamento da Vila Concórdia foi aprovado em dezembro de 1890 com apoio dos maçons da capital da República recém-proclamada. Neste processo, a vila do Baruel perde expressão. No início do século XX chegaram os primeiros imigrantes japoneses. As tradições da cultura japonesa compõem a paisagem urbana até os dias de hoje. Joaquim Augusto Suzano Brandão, engenheiro da ferrovia em Mogi das Cruzes, atendendo à solicitação do ainda povo Guaió ergue, em 1907, uma estação em alvenaria. No ano seguinte o local foi oficialmente denominado Suzano, tornando-se distrito em 1919 e conquistando autonomia de Mogi das Cruzes em 24 de dezembro de 1948 por meio de Lei Estadual. O primeiro mandato de vereadores e prefeito teve início no dia 2 de abril de 1949, data que marca o aniversário da cidade de Suzano. A Comarca de Suzano foi instalada em maio de 1962. 1 Guilherme Boucalt e Francisco Pinheiro Fróez, proprietários da fazenda Boa Vista e fazenda Revista. João Romariz, proprietário das terras conhecidas atualmente como Vila Amorim, além de autor do projeto de arruamento. 18 De acordo com o IBGE, em 1919 foi criado o distrito de Susano2, subordinado ao município de Mogi das Cruzes. Em 1948, elevado à categoria de município, Suzano foi desmembrada do município de Mogi das Cruzes e constituído do distrito sede. Em 1981 foram criados os distritos de Boa Vista Paulista e Palmeiras de São Paulo, anexados ao município de Suzano. Logo depois, em 1983, foram constituídos os três distritos: Suzano, Boa Vista Paulista e Palmeiras de São Paulo. Em 1984 a grafia foi alterada para Susano. Em 1988 o município estava constituído em distrito de Susano, distrito Boa Vista Paulista e distrito de Palmeiras de São Paulo. Em 1992 grafou-se definitivamente Suzano. Três anos depois chegamos à configuração atual: distrito de Suzano, distrito Boa Vista Paulista, distrito Palmeiras de São Paulo. Cerca de 1.700 metros separam a estação da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e a ponte sobre o rio Tietê na rua vereador João Batista Fitipaldi. Toda porção Norte a partir desses dois referenciais é popularmente conhecido como Rio Abaixo. Trens e rio fluindo lado a lado. Trens fluem nos dois sentidos, ida e volta. Rios fluem em um único sentido inexoravelmente. Rios vão das nascentes até a foz. Queremos muito rapidamente marcar dois apontamentos importantes para nosso estudo acerca do rio Tietê: trata-se de um rio que nasce na encosta continental da Serra do Mar, mais precisamente na cidade de Salesópolis distante cerca de 70 km de Suzano, vertendo para o interior. A segunda marcação refere-se ao nome, Tietê, de origem Tupi, resultado da junção de TI (água) e ETÉ (verdadeiro). Estamos falando de um rio de águas verdadeiras fluindo para o interior. Suzano é um município da região metropolitana de São Paulo. É possível acessar Suzano utilizando transporte sobre trilhos (CPTM) para passageiros. O acesso rodoviário se faz principalmente pelas rodovias Ayrton Senna, Dutra, Carvalho Pinto, rodovia Índio Tibiriçá (ligação com rodovia Anchieta/Imigrantes), rodoanel e outros acessos. Suzano faz divisa com o ABC Paulista, está a cerca de 30 km do Aeroporto Internacional de Guarulhos e cerca de 100 km do Porto de Santos. O transporte ferroviário de carga transita pela linha MRS, com destaque para o Porto Seco da companhia Regional de Armazéns Gerais e Entrepostos Aduaneiros. 2 A grafia de Suzano com ‘z’ e Susano com ‘s’ é proposital. Assim estão os registros que localizamos. Percebemos que houve variação, talvez por equívoco em algum momento, até que a grafia foi fixada definitivamente Suzano com ‘z’. 19 Ainda de acordo com o IBGE3, o Município de Suzano possui 206,236 km2 de área territorial, está localizado na Região do Alto Tietê, entre a Zona Leste da Grande São Paulo e o Vale do Paraíba. O censo 2010 registrou 133.786 mulheres e 128.694 homens, totalizando 262.480 habitantes sendo 96,47% residente urbana. A distribuição da população no território está na ordem de 1.272,9 habitantes por km2. O IBGE informa haver forte influência da migração da Região Nordeste do Brasil na composição da sua população suzanense atual. É perfeitamente possível sentir as culturas japonesa, negra e nordestina em Suzano: os restaurantes dedicados à culinária japonesa e as casas do Norte, os sotaques, os jornais escritos em idioma japonês dispostos nas bancas ou durante a leitura em locais públicos (chegamos a perceber tais publicações protegendo paredes durante a pintura, forrando chão, disponíveis nas grandes hortas urbanas), as histórias que ouvíamos nas andanças pela cidade, o contato direto com o povo e a observação dos costumes, os templos religiosos e terreiros, as escolas de samba e tantas outras marcas impressas na cultura e na paisagem urbana. Se a realidade confirma essa presença, os dados oficiais (pelo menos os que tivemos acesso nesta pesquisa) não lhes dão igual relevo. Por conta dos festejos em homenagem ao centenário da migração japonesa no Brasil, a imprensa local divulgou em julho de 2015 a presença de aproximadamente dezesseis mil descendentes de japoneses em Suzano. Percebemos uma concentração dos japoneses na região do centro expandido e Sul da cidade, o que de alguma forma coincide com a atividade agrícola. Há empresas japonesas líderes em seus segmentos instaladas na cidade e os nomes próprios estão por toda parte. São clubes que mantêm as tradições japonesas como a tradicional Festa da Cerejeira que em 2015 realizou sua trigésima edição. A Academia Terazaki, conhecida como a primeira escola de judô na América, tem sua sede em Suzano. São três os templos religiosos com arquitetura oriental na cidade: Igreja Shingonshu Kongoji, Templo Budista Nambei Shigonshu Daigozan Jumyoji e Templo Honpa Hongwanji de Suzano. Certamente existem outros. A intensidade das festas juninas e a grande Festa Nordestina em Suzano organizada pela Paróquia Santa Rita (na região Norte da cidade) e Prefeitura Municipal, com comidas típicas (tapioca, buchada de bode, baião de dois, bobó de 3 Disponível em 20 camarão, sarapatel e caldo de mocotó), apresentações de música típica regional, demonstram o cultivo de tradições do Nordeste brasileiro na cidade. É muito comum observarmos nas feiras livres e nos cardápios dos restaurantes, dos mais sofisticados aos mais comuns, o encontro das gastronomias: yakissoba, tempurá, temaki, pastel, tapioca, caldos, espetinhos, massas dentre outros. Feijoada é prato comum nas quartas e sábados nos restaurantes da cidade. O movimento negro atuante na cidade e região ganhou ainda mais expressão quando este setor, somando com outras forças políticas vinculadas às classes populares, acessou a Prefeitura pela porta da frente. Com o apoio da prefeitura, suas iniciativas ganharam relevo. As atividades em reverência à consciência negra, as Rodas de Todos os Santos, as caminhadas e cortejos pelas ruas da cidade com manifestações culturais e religiosas lhes deram mais visibilidade na cidade. O Pavilhão da Cultura Afro-brasileira Zumbi dos Palmares situado no interior do parque municipal Max Feffer apesar de recente, talvez seja uma das poucas marcas físicas, em termos de equipamentos públicos, na paisagem urbana que destacam a importância da comunidade negra na diversa composição étnica que Suzano abriga. As palavras de origem indígenas marcam também alguns lugares da cidade, denominando equipamentos públicos, e fazendo referência à presença histórica do povo e da cultura indígena nesta região. Nos campos de Mirambawa, o antigo clube Mirambava, depois de incorporado ao patrimônio público municipal, foi transformado no Complexo Educacional Mirambava4, a Represa Taiaçupeba e rio Taiaçupeba, a rodovia índio Tibiriça, o rio Tietê, o rio Una e etc. Um memorial foi construído no jardim Ikeda em homenagem aos índios enterrados naquela região, cujos indícios sugerem sepultamentos realizados entre 1906 e 19345. As Conferências de Promoção da Igualdade Racial foram frequentes no período de 2005 a 2012, contando com a participação dos movimentos sociais e populares, e a presença dos representantes de grupos organizados em torno da preservação da memória indígena regional. Neste particular da composição da população suzanense é importante registrar a abundância de informações disponíveis sobre a presença da colônia japonesa; raras as informações organizadas e disponíveis sobre a presença 4 Equipamento vinculado à Secretaria Municipal de Educação em 2008 como parte das ações voltadas à formação dos profissionais da rede municipal e atividades afins. 5 Dados da Prefeitura de Suzano quando da construção do Memorial sobre o terreno em 2006. 21 nordestina; raríssimas sobre a presença negra e indígena bem como sua participação na construção histórica da cidade. Disputas político-eleitorais No esforço de contextualizar a gênese do Orçamento Participativo no jogo das forças políticas que disputavam os espaços institucionais em Suzano, vamos utilizar os dados do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) para demonstrar sua organização e seu desempenho eleitoral nas últimas décadas. Na tabela 1 percebemos o histórico dos mandatos no Poder Executivo. Chamamos a atenção para a força eleitoral da articulação partidária entre a Aliança Renovadora Nacional (ARENA), o Partido Democrático Social (PDS) e o Partido da Frente Liberal (PFL) com seis mandatos, seguido pelo Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) com quatro mandatos, Partido Social Democrático (PSD) com dois mandatos e Partido dos Trabalhadores (PT) também com dois mandatos. Com a aprovação da Emenda Constitucional nº 16 em junho de 1997 permitindo a reeleição dos mandatos para um único período subsequente, no caso de Suzano, tanto o PFL quanto o PT gozaram deste direito conquistando, respectivamente, suas reeleições nos pleito de 2000 e 2008. Ainda na tabela 1, acrescentamos o nome do vice- prefeito para demonstrar a presença de representantes da colônia japonesa na movimentação política com vistas ao poder executivo. Nas últimas décadas a força política articulada em torno da candidatura de Estevam Galvão de Oliveira6, ARENA/PDS/PFL/DEM, mostra-se mais consolidada. A outra força política se organiza em torno do Partido dos Trabalhadores que, disputando todas as eleições municipais com candidatura própria, a partir de 2000 fixa expressão eleitoral em Marcelo de Souza Candido7. Bacharel em direito, Estevam foi vereador entre 1973-1977 e foi prefeito pela Arena entre 1977-1982, pelo PDS entre 1989-1992, pelo PFL entre 1996-2000-2004. Foi deputado federal entre 1983-1987 quando rompeu com o PDS. Foi deputado estadual pelo PL entre 1994-1996. Nas eleições de 2006 foi eleito, mais uma vez, 6 Natural de Garça/SP em 1942. 7 Natural de Marília em 1969. 22 deputado estadual pelo PFL. Foi líder do Democratas (DEM) na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (ALESP), reeleito em 2010 e 2014. Sua primeira e única derrota eleitoral aconteceu em 2008. De outro lado, no Partido dos Trabalhadores, José de Souza Candido8 iniciou sua vida política no sindicato dos trabalhadores rurais da cidade de Oriente e região. Migrou para Suzano onde trabalhou como operário (torneiro mecânico) e constituiu-se liderança no Jardim Revista, periferia de Suzano, por sua participação na fundação da comunidade católica e na construção do centro comunitário da sociedade amigos de bairro. Disputou sua primeira eleição para vereador em 1982. Foi vereador à câmara municipal de Suzano entre 1988-1992, 1992-1996, 1997-2000. Seu filho, Marcelo de Souza Candido, acompanhou de perto a vida pública do pai, filiou-se ao Partido dos Trabalhadores em 1990. Técnico em contabilidade e Geógrafo9, disputou o executivo municipal no pleito de 2000 ficando em segundo lugar com 38,88% dos votos válidos. Em 2002, com 44.035 votos em Suzano, Marcelo somou votação suficiente para chegar a ALESP como deputado estadual. Venceu as eleições municipais em 2004, reelegendo-se em 2008. Durante o exercício dos mandatos de Marcelo Candido à frente da prefeitura de Suzano, José Candido chegou à Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo em 2006 e 2010. Seu Candido, como era popularmente conhecido, faleceu em fevereiro de 2012. Ele e Marcelo são negros. O povo se refere a Estevam como alemão. Observando o gráfico 1, queremos destacar que Marcelo Candido e Estevam Galvão se enfrentaram diretamente na disputa à prefeitura de Suzano em duas oportunidades: 2000 e 2008. Na primeira disputa, Estevam foi reeleito prefeito com uma vitória apertada, cerca de 2,5%. Os dois candidatos somaram cerca de 80% dos votos válidos naquele pleito. Na segunda oportunidade em que se enfrentaram diretamente, Marcelo foi reeleito com uma vitória mais folgada, algo em torno de 8% sobre o então deputado estadual Estevam Galvão10. Os dois candidatos somaram aproximadamente 95% dos votos válidos no pleito de 2008. 8 Natural de Sabino/SP em 1942. 9 Bacharel em Geografia pela Universidade Estadual Paulista, campus de Rio Claro/SP, no período 1993-1996. 10 Durante parte deste mandato, Estevam se licenciou do legislativo estadual para assumir a subprefeitura de Guaianases durante a gestão José Serra. 23 Tabela 1. Histórico dos Prefeitos do município de Suzano/SP. nº Nome Partido Período de mandato Obs. 1 Abdo Rachid PSD 2/abril/1949 1/abril/1953 2 Alberto Nunes Martins Vice: Francisco M. Figueira UDN 2/abril/1953 1/abril/1957 3 João Alves Machado PSD 2/abril/1957 1/abril/1961 4 Firmino José da Costa PDC 2/abril/1961 1/abril/1965 5 Paulo Portela PSP 2/abril/1965 1/abril/1969 6 Pedro Sinkaku Miyahira ARENA 2/abril/1969 30/jan/1973 7 Firmino José da Costa ARENA 31/jan/1973 31/jan/1977 8 Estevam Galvão de Oliveira Vice: Kazuhiro Mori ARENA / PDS 1/fev/1977 Renunciou em 14/maio/1982 9 Aristides José Rodrigues PDS 15/maio/1982 31/jan/ 1983 Assumiu após a renúncia do titular 10 Firmino José da Costa PMDB 1/fev/1983 Cassado em 4/maio/1987 11 Pedro Ishida PMDB 5/maio/1987 4/jul/1988 Assumiu após a cassação do titular 12 Firmino José da Costa PMDB 5/jul/1988 31/dez/1988 Assumiu c/ liminar 13 Estevam Galvão de Oliveira Vice: Paulo Fumio Tokuzumi PFL 1/jan/1989 31/dez/1992 14 Paulo Fumio Tokuzumi PMDB 1/jan/1993 31/dez/1996 15 Estevam Galvão de Oliveira Vice: Kazuhiro Mori PFL 1/jan/1997 31/dez/2000 1/jan/2001 31/dez/2004 Reeleição 16 Marcelo de Sousa Cândido PT 1/jan/2005 31/dez/2008 1/jan/2009 31/dez/2012 Reeleição 17 Paulo Fumio Tokuzumi PSDB 1/jan/2013 Atual Fonte: TRIBUNAL REGIONAL ELEITORAL. https://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_Social_Democr%C3%A1tico_(1945-2003) https://pt.wikipedia.org/wiki/Uni%C3%A3o_Democr%C3%A1tica_Nacional https://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_Social_Democr%C3%A1tico_(1945-2003) https://pt.wikipedia.org/wiki/Firmino_Jos%C3%A9_da_Costa https://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_Democrata_Crist%C3%A3o_(1945-1965) https://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_Social_Progressista https://pt.wikipedia.org/wiki/Alian%C3%A7a_Renovadora_Nacional https://pt.wikipedia.org/wiki/Firmino_Jos%C3%A9_da_Costa https://pt.wikipedia.org/wiki/Alian%C3%A7a_Renovadora_Nacional https://pt.wikipedia.org/wiki/Estevam_Galv%C3%A3o_de_Oliveira https://pt.wikipedia.org/wiki/Alian%C3%A7a_Renovadora_Nacional https://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_Democr%C3%A1tico_Social https://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_Democr%C3%A1tico_Social https://pt.wikipedia.org/wiki/Firmino_Jos%C3%A9_da_Costa https://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_do_Movimento_Democr%C3%A1tico_Brasileiro https://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_do_Movimento_Democr%C3%A1tico_Brasileiro https://pt.wikipedia.org/wiki/Firmino_Jos%C3%A9_da_Costa https://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_do_Movimento_Democr%C3%A1tico_Brasileiro https://pt.wikipedia.org/wiki/Estevam_Galv%C3%A3o_de_Oliveira https://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_da_Frente_Liberal https://pt.wikipedia.org/wiki/Paulo_Fumio_Tokuzumi https://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_do_Movimento_Democr%C3%A1tico_Brasileiro https://pt.wikipedia.org/wiki/Estevam_Galv%C3%A3o_de_Oliveira https://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_da_Frente_Liberal https://pt.wikipedia.org/wiki/Marcelo_de_Sousa_C%C3%A2ndido https://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_dos_Trabalhadores https://pt.wikipedia.org/wiki/Paulo_Fumio_Tokuzumi https://pt.wikipedia.org/wiki/Partido_da_Social_Democracia_Brasileira 24 Nossos fluxos se cruzaram durante a graduação em Geografia. Desde 1993 acompanhamos essa história em Suzano seja no convívio universitário, seja frequentando a casa de seu Candido no Jardim Revista. Nossa presença se intensificou em 2000, ganhando ainda mais intensidade a partir de 2002 quando mergulhamos no fluxo deste movimento político. Fixamos residência na cidade de Suzano em 2003. Atravessamentos, fluxos laterais, correntezas: nosso convívio pessoal, militância, contato com os movimentos sociais e populares, participação ativa na luta política e linha de frente nas disputas e campanhas eleitorais, participação no governo da cidade, criação do Orçamento Participativo e envolvimento em outras políticas de participação popular, tudo isso vai se compondo no ineditismo da experiência, dos encontros e acontecimentos. *** Para além dos votos e das diferenças programáticas, um jeito de governar a cidade também estava em disputa. Vamos apresentar dois importantes registros que marcaram essa disputa. 1) No programa de governo apresentado durante o processo eleitoral em 2000, o tema amplo da participação popular junto ao governo local apareceu como alternativa àquilo que a Frente Suzano sem Exclusão11 chamou de uma forma clientelista e viciada de fazer política institucional. 2) Na disputa eleitoral de 2004 a coligação Reconstruindo Suzano12 publicou e distribuiu um caderno com as Diretrizes do Programa de Governo cuja metodologia ali registrada lançava as bases para o Orçamento Participativo. Percebemos neste último documento de diretrizes importantes elementos para compreensão da gênese da experiência que estamos descrevendo. De início o texto relata um trabalho coletivo. Mais de mil pessoas presentes nos treze encontros realizados entre 12 de junho e 15 de julho no espaço denominado ideias no lugar13. Tais encontros tinham por objetivo discutir as políticas públicas na cidade: Educação, Saúde, Transporte, Cultura, Esporte e Lazer, Política Social e outros 11 Frente composta pelos seguintes partidos: Partido dos Trabalhadores (PT), Partido Socialista Brasileiro (PSB) e Partido Socialista dos Trabalhadores Unificados (PSTU). 12 Frente composta pelos seguintes partidos: Partido dos Trabalhadores (PT), Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Partido da Mobilização Nacional (PMN) e Partido Popular Socialista (PPS). 13 Tratava-se de um imóvel cedido por um apoiador da campanha eleitoral, situado na esquina da rua Monsenhor Nuno com a rua Jácomo Braghiroli, no centro da cidade. 25 temas de interesse popular. As reuniões começavam com as provocações a partir da mesa coordenadora dos trabalhos e as contribuições de pessoas convidadas a expor experiências vividas em outras cidades. Em seguida o debate acontecia no diálogo aberto entre os presentes, cerca de oitenta a cem pessoas em média. Ao mesmo tempo, uma equipe cuidava dos registros das falas, das imagens e mesmo dos desenhos e frases das crianças que chegavam acompanhando os adultos. Um programa de governo foi elaborado a partir das análises das discussões, dos registros das reuniões e das propostas construídas no calor desse movimento. Além dos textos, o caderno de cinquenta páginas traz ilustrações, trechos de canções e poesias. Informa que parte dos desenhos produzidos pelas crianças durante os encontros também foram incorporados ao caderno. Responsabilizamo-nos com a coordenação deste processo, o que nos permitiu vivê-lo intensamente. Estar nos encontros significou estabelecer relações com as pessoas, saber dos seus pensamentos sobre a cidade, sobre a Prefeitura, os interesses e sonhos, enfim, as forças que as traziam para aquele espaço de luta política. Quantas pessoas chegavam demonstrando certa desconfiança e, com o desenrolar das conversas iam se abrindo ao debate, aceitando o contraditório, percebendo que a cidade é complexa. Percebemos também a surpresa dos presentes quando da leitura do registro do encontro ao final da reunião, uma espécie de carta de intenções que, submetida à plenária recebia ajustes, supressões, inclusões, até ganhar a aprovação do grupo. Essa mistura de expectativa e desconfiança produzia, ao final de cada encontro, uma espécie de energia na plenária. Uma convicção se construía no trabalho coletivo. Percebemos também que novas possibilidades de ação política iam devagar se construindo na experiência. Um laboratório de invenções foi, com o tempo, se desdobrando em outras experimentações e outros espaços, inclusive nas estratégias de campanha de um modo geral, e no corpo a corpo pelas ruas da cidade. Ainda no caderno com as diretrizes do Programa de Governo, a primeira diretriz apresentada aborda a questão da gestão pública com o título gestão democrática e participação popular. Dentre as propostas apresentadas nessa diretriz, destacamos as seguintes: - incluir o cidadão no processo de decisão sobre os rumos da cidade; - acompanhar de perto o exercício do mandato do prefeito; 26 - participação da população nos processos decisórios, na definição das prioridades orçamentárias e na elaboração das políticas públicas; - romper com a cultura do paternalismo, do clientelismo e do messianismo; Para tanto, entre outras coisas, propõe: - orçamento participativo, fortalecimento dos conselhos municipais, congresso da cidade e outra relação com o poder legislativo. A segunda diretriz apresentada é Administração pública transparente e de qualidade. O texto sugere um aprofundamento da primeira diretriz colocando o foco das mudanças na instituição prefeitura: prestações de contas, descentralização de serviços públicos, integração de secretarias municipais, canais de comunicação como a ouvidoria municipal14 por exemplo. Cabe destacar ainda que propostas visando à redução da distância entre governo e comunidades aparecem praticamente em todas as diretrizes. O orçamento participativo em particular aparece ainda nas diretrizes que tratam da educação, da saúde e da política social. *** A assessoria da presidência da câmara municipal e o governo de transição organizaram a primeira sessão legislativa com o objetivo de, como é de costume, dar posse solene ao prefeito e aos vereadores eleitos e, em seguida, eleger sua mesa diretora. Atendendo ao seu regimento interno, a 1ª sessão legislativa tem estes objetivos. Optamos por utilizar o jardim interno da câmara em detrimento do plenário e do limitado espaço da galeria. As intensas negociações para eleição da mesa da câmara, a articulação política, a tensão em torno da disputa pela presidência da casa legislativa, tudo isso carregava de expectativas o ambiente. Apesar disso, sentíamos no ar uma euforia, uma alegria, como se anunciando um novo tempo de esperanças. Com o jardim lotado, as pessoas, por iniciativa própria, subiram a escadaria do paço municipal e ocuparam os dois andares superiores para, debruçadas no guarda corpo, acompanhar a solenidade de posse. Em seu discurso, o prefeito anunciou um governo apoiado em cinco eixos:  Participação popular;  Desenvolvimento sustentável; 14 A Ouvidoria Geral do Município foi criada em lei municipal em 2005, passando a funcionar logo em seguida. 27  Combate à corrupção;  Inclusão social;  Cidade legal. Logo nas primeiras semanas o executivo encaminhou para a câmara municipal um projeto de lei com pequena reorganização administrativa. Neste contexto, criamos uma assessoria especial para implementação do orçamento participativo (OP) vinculada ao gabinete do prefeito. Uma pergunta já nos acompanhava: como institucionalizar uma fronteira, um espaço entre o movimento que institui e o poder instituído? Dito de outra maneira, como administrar15 a tensão permanente entre estado e movimento? Não nos referimos aqui em administrar meramente no sentido de gerir, de controlar essa tensão. Pelo contrário, pensávamos em cuidar dessa tensão no sentido de aproveitá-la em sua potência disparadora de movimentos. Os desafios estavam, desde então, diante dos nossos olhos. 1.2 Síntese da história do OP, concepção e organização. Três decretos municipais (2006, 2007 e 2008) deram legalidade ao Regimento Interno do Orçamento Participativo. Toda regulamentação jurídica foi construída com apoio da Secretaria de Negócios Jurídicos da Prefeitura. Um procurador que demonstrava muita habilidade no trabalho com movimentos populares nos apoiou nesta produção legislativa e, desta forma, fomos experimentando um exercício de fronteira entre as certezas dos regulamentos típicos do Estado e as idas e vindas do movimento na materialidade das disputas, acirramentos e afrouxamentos, reuniões, plenárias e outras formas de trabalho coletivo. Na leitura do parecer jurídico16 que fundamentou a edição do primeiro 15 A partir do diálogo com a banca examinadora, ressaltamos a escolha do verbo ‘administrar’. Habitávamos, à época desta pergunta, território existenciais, linhas de quem acompanhava processos e ao mesmo tempo, espaços institucionais onde esta terminologia é muito presente e capturada pelos sentidos produzidos nas políticas de Estado e as outras políticas. Reforçamos administração no sentido de sustentação, de cuidado, no sentido pedagógico (agogós), daquele que conduz pela mão como apoio ao movimento do outro, mais coerente com o sentido experimentado em uma política como ampliação do universo de possíveis. 16 De Marcos Pedroso Mateus 28 decreto municipal, percebemos a opção por este instrumento como possibilidade de auto-regulamentação e, desta forma, garantindo algum equilíbrio entre o tempo da burocracia e o tempo da tomada de decisão na materialidade da experiência do OP. Desta maneira, todo o trabalho de avaliação e planejamento foi atribuído ao Conselho do Orçamento Participativo. O primeiro decreto municipal foi elaborado por um grupo de governo que, em parte, constituiu posteriormente a Secretaria Executiva do OP. Este grupo contava também com representantes dos partidos coligados no processo eleitoral. Foram criados, já nesta primeira edição de regimento interno em forma de decreto municipal, os instrumentos que abordaremos a seguir. Depois de eleito, o Conselho do OP 2006 aprimorou este decreto e construiu o Regimento Interno do Orçamento Participativo de Suzano que vigorou a partir de 2007. Um compromisso ia se construindo nesse processo denominado avaliação do OP e planejamento do ciclo seguinte. Um olhar para o trabalho realizado no presente e outro olhar para o que está por vir. É possível perceber uma preocupação com a linguagem. Os decretos, por exemplo, exigem uma linguagem particular, típica do jurídico e da administração pública. O Regimento Interno foi traduzido em material de trabalho para o conselho, uma espécie de material didático. Todo conselheiro titular, suplente e demais apoiadores, recebiam um caderno logo no início dos trabalhos do conselho eleito, caderno este apresentado como “as regras do jogo”. Nele, o Orçamento Participativo está definido como um processo de participação direta da população na elaboração do planejamento e execução orçamentária no município de Suzano. Quanto ao funcionamento, o OP possuía as seguintes instâncias: I – fase externa: a) Reuniões preparatórias; b) Plenárias regionais deliberativas; II – fase interna: a) Secretaria executiva; b) Assembleia Geral dos Representantes e Fórum dos representantes; c) Conselho do Orçamento Participativo, o CORPO; d) Comitê de Acompanhamento da Execução do Plano de Investimentos. 29 Seguiremos nossa escrita com a descrição com algum detalhamento das fases listadas acima. Reuniões Preparatórias Espaços informais, abertos e irrestritos, com a finalidade de comunicar o OP, informar sobre o orçamento público, convidar para as Plenárias Regionais Deliberativas e, desta maneira, ajudar a população a organizar sua presença, participação e sua atuação nestas Plenárias. A convocação das Reuniões Preparatórias era de livre iniciativa bastando, para tanto, entrar em contato com o CORPO ou, no início do processo em 2006, com alguém da equipe de coordenação na prefeitura municipal. No Regimento Interno do OP, tais reuniões preparatórias tinham por objetivos: - estimular a participação popular nas Plenárias Regionais Deliberativas; - explicar o funcionamento do Orçamento Participativo; - apresentar e discutir o planejamento orçamentário municipal. Plenárias Regionais Deliberativas As Plenárias Regionais Deliberativas estão definidas como espaço de participação direta para discussão e deliberação das questões do OP com os objetivos de: - dar publicidade ao processo do OP; - informar e discutir ações do poder público municipal; - prestar contas das demandas do OP, relativas aos ciclos anteriores; - discutir, apresentar e votar as demandas; - eleger 1 conselheiro titular, 1 conselheiro suplente e representantes para as demais fases do OP. Ao chegar à escola que sediava a Plenária, a população era recebida por uma equipe da prefeitura responsável por realizar o credenciamento de cada participante. Esta participação era aberta a todos/as, contudo o direito de votar estava restrito aos moradores dos bairros e loteamentos que compunham a referida região. O morador presente na Plenária e devidamente credenciado poderia se candidatar ao Conselho do OP tendo, para tanto, apenas que registrar seu interesse. 30 Durante as Plenárias aconteciam Grupos de Trabalho (GT’s), lugar onde as discussões se aprofundavam. Com duração mínima de uma hora, nos GT’s a população listava as questões livremente e, por meio de votação, ordenava-as numa lista de prioridades. O critério de composição dos Grupos de Trabalho era aleatório e a identificação estava no crachá distribuído aos presentes nas mesas de credenciamento. Os GT’s reuniam normalmente trinta pessoas numa sala de aula e três pessoas vinculadas à coordenação do OP assumiam a tarefa de organizar e fluir o grupo. Os trabalhos começavam com as apresentações e os combinados no grupo. Ao final, o grupo ainda escolhia seus representantes para sequencia do OP na proporção de um para dez. Esses representantes apoiavam o trabalho do Conselheiro da sua região no Conselho do OP, participavam da Assembleia Geral dos Representantes e do Fórum dos Representantes. Encerrados os GT’s, constituía-se novamente a plenária no pátio da escola. As demandas mais votadas nos GT’s eram submetidas à votação final. Assim, toda Plenária Regional Deliberativa elegia três demandas como as prioritárias da região e um conselheiro. Secretaria Executiva do OP Pequeno grupo de pessoas vinculadas ao poder público municipal que atuavam no suporte ao OP. As atribuições dessa instância estavam no Regimento Interno: - propor o calendário e a regionalização do OP ao CORPO; - dar o suporte e os subsídios necessários ao funcionamento do OP; - tornar público o Orçamento Participativo e seus resultados; - participar do CORPO por meio dos indicados pelo Poder Executivo; - facilitar o acesso e a permanência da população nas diversas fases do OP. Neste último item, algumas iniciativas merecem destaque. Sempre que um grupo organizado numa reunião preparatória indicava a dificuldade de acesso à escola sede da Plenária Regional Deliberativa, na medida do possível a prefeitura oferecia transporte. Combinávamos que a organização do grupo, estabelecimento de ponto de encontro, os horários, o trajeto e etc, tudo isso ficaria sob a responsabilidade do grupo interessado em, utilizando o transporte, participar da Plenária. Nosso esforço em apoiar os interesses populares partilhando tarefas e 31 responsabilidades, para além de atender algumas necessidades, funcionava como uma espécie de exercício coletivo. Esse detalhe do transporte pode parecer menor, mas considerando as dimensões territoriais das duas regiões no distrito das Palmeiras de São Paulo, a região Orquídea e a região Bromélia, tem-se mais precisão de sua real necessidade. A figura 1 traz o mapa utilizado em todo o período de funcionamento do Orçamento Participativo em Suzano. Nele podemos visualizar todas as regiões e suas dimensões territoriais. Podemos perceber também uma linha sinuosa entre a região Sálvia e as regiões Lírio e Rosa. Trata-se do rio Tietê. Foram muitas noites pilotando reuniões, plenárias e peruas Kombi. Quanto à permanência, o café e principalmente o espaço para as crianças foram estratégias que se mostraram fundamentais. Principalmente considerando a necessidade das mulheres. Nós percebemos isso logo nos primeiros encontros ainda em 2005. De início organizamos a ‘creche do OP’, aprimorada na avaliação de 2007 que deu origem à ‘ciranda do OP’. Falaremos da ciranda, uma rica experiência de participação de crianças e adolescentes na discussão da cidade com respeito ao tempo da infância, ainda neste capítulo. 32 Figura 1. Mapa ilustrativo da organização territorial do OP. fonte: Prefeitura Municipal de Suzano/SP 33 Fórum de Representantes O Fórum de Representantes era compreendido como espaço de participação dos representantes eleitos nos Grupos de Trabalho organizados em cada Plenária Deliberativa. De acordo com os documentos, o fórum era composto numericamente por 10% dos presentes nas Plenárias. Por exemplo: numa Plenária com trezentas pessoas, dez salas de aula seriam ocupadas com Grupos de Trabalho, totalizando trinta representantes sendo três por sala. O Fórum dos Representantes tinha por objetivos: - apoiar o trabalho do conselheiro da região; - ajudar na difusão das informações do trabalho do Conselho do OP, colaborar na mobilização popular, reunir-se quando necessário. A Assembleia Geral de representantes, por sua vez, era uma reunião específica do Fórum dos Representantes com objetivos específicos: - promover o encontro de integração dos grupos que participaram das Plenárias Regionais; - eleger doze conselheiros (e doze suplentes) para o CORPO; - dar publicidade ao conjunto das prioridades eleitas nas doze Plenárias. Considerando que até aquele momento cada participante conhecia apenas as prioridades eleitas na plenária da sua região. Portanto, trabalhávamos sempre nessa especificidade de parte e todo, sujeito e coletivo, bairro/conjunto de bairros/região e cidade. Neste momento em particular, a cidade compreendida como o conjunto das trinta e seis prioridades eleitas no respectivo ciclo do OP e vinte e quatro conselheiros titulares e igual número de suplentes eleitos, originando um CORPO para o trabalho coletivo durante a fase interna do OP. Produzíamos vídeos com as imagens reais de todas as plenárias regionais, as informações de cada uma delas como, por exemplo, público presente, número de representantes eleitos nos GT's, conselheiro eleito e suplente, além das decisões tomadas nas respectivas votações finais. O Conselho do Orçamento Participativo - CORPO O Conselho do Orçamento Participativo - CORPO, estava compreendido como espaço de participação de conselheiros para discussão e deliberação de 34 questões pertinentes ao OP. De acordo com o Regimento Interno, tinha os seguintes objetivos: - encaminhar ao prefeito municipal o plano de investimentos17 para apreciação e inclusão no projeto de lei do orçamento anual; - acompanhar a execução do plano de investimentos; - manter informados representantes e região sobre as questões do OP. Dentre as tarefas que cabiam ao CORPO, destacamos: - convocar a Caravana do Orçamento Participativo; - pensar o OP produzindo coletivamente valores, o que denominávamos avaliação do processo; apontar/criar/inventar/descobrir/experimentar novas possibilidades visando ao aprimoramento. Neste ponto está o caráter de auto- regulamentação do OP, ou seja, avaliação e planejamento compreendidos como processualidade. Depois de realizadas todas as Plenárias Regionais e reunidos todos os representantes em Assembleia Geral, estava composto um CORPO: doze conselheiros eleitos diretamente nas Plenárias18; doze conselheiros eleitos na Assembleia Geral dentre os representantes de Grupos de Trabalho e oito indicações do Poder Executivo. Portanto, um CORPO de maioria popular: 2/3 sociedade civil e 1/3 governo. O mandato do CORPO vigia até a posse do CORPO eleito no ciclo seguinte. Uma reeleição para o período subsequente esteve permitida. Já a coordenação dos trabalhos era composta por quatro conselheiros escolhidos na primeira reunião ordinária. Caravana do OP À medida que o CORPO avançava em seus estudos sobre as prioridades eleitas nas plenárias, os temas da administração municipal, conhecia o planejamento orçamentário e os planos setoriais do governo, a Caravana do OP era 17 Plano de investimentos do OP é o documento que materializa as decisões do CORPO. A partir dos estudos de viabilidade, representa da compatibilização entre as prioridades eleitas nas Plenárias e os limites previstos na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) em vigor naquele momento. 18 No ciclo 2007 o CORPO alterou sua composição. Com a realização da Plenária Deliberativa de Juventude em 2008, o número de conselheiros eleitos passou a 13 eleitos em Plenárias e 13 eleitos na Assembleia Geral de Representantes. 35 a oportunidade de intensificar o trânsito pela cidade. Um dia dedicado a visitar todas as regiões, circular por essas realidades, perceber suas características, confrontar suas diferenças, sentir o cheiro das flores e etc. No regimento interno, a caravana tinha os objetivos de: - conhecer as realidades locais e auxiliar o CORPO na escolha das prioridades eleitas nas Plenárias Regionais Deliberativas visando ao Plano de Investimento; - contribuir para o intercâmbio das realidades regionais e a realidade do Município; - constituir o CORPO promovendo integração de conselheiros. *** Queremos destacar ainda quatro pontos percebidos nas três edições do Regimento Interno do OP. O CORPO 2007 criou o Comitê de Acompanhamento da Execução do Plano de Investimento. Este item é observado no regimento interno vigente em 2008. Sempre que empossado um CORPO, o anterior passa à condição de COMITÊ que tem por objetivo: - acompanhar a execução do Plano de Investimento e fiscalizar a execução das ações nele definidas. O segundo ponto é o fato de que esteve vedado aos ocupantes de cargos eletivos e aos ocupantes de cargo de livre provimento na Prefeitura ou na Câmara Municipal o direito de votar e ser votado na fase externa do Orçamento Participativo. O terceiro ponto é a inclusão de uma prioridade para a cidade. No ciclo 2008 as plenárias regionais deliberativas mantiveram a eleição de três prioridades para a região, como nos ciclos anteriores, e deliberaram ainda mais uma prioridade que servisse à cidade como um todo. Percebemos, com a experiência, que essa prioridade impactaria mais as decisões na ordem da política do que na ordem do orçamento municipal. Por fim, o quarto ponto destacado se refere à realização da plenária temática de juventude. Decisão da Conferência Municipal de Juventude que, submetida ao conselho do OP, passou a integrar o calendário no ciclo 2008. Esta 13ª Plenária trouxe sangue novo ao CORPO 36 1.3 O processo do ponto de vista da participação das pessoas. Vamos apresentar alguns elementos educacionais e parte do material didático num esforço de descrever o processo do ponto de vista da participação das pessoas. Para tanto, utilizaremos os artigos publicados na imprensa local (e regional) compreendidos como publicização do processo vivido, e também como registro de campo no calor dos acontecimentos. Os artigos compõem o apêndice do Fora-texto desta dissertação. Antes, contudo, vamos destacar dois episódios importantes no processo que levou à experiência do Orçamento Participativo em Suzano. O 1º seminário de participação popular e o PPA Participativo. 1º Seminário de Participação Popular Uma das primeiras atividades realizadas logo no início do governo municipal foi o Seminário Semeando Participação Popular, Reinventando a Democracia. Uma pequena publicação, uma espécie de livreto, registra o conteúdo das falas dos convidados e o debate com a equipe de governo. Os objetivos do seminário foram assim descritos: - pensar a participação popular como eixo de governo; - qualificar o debate sobre Participação Popular na equipe de governo; - construir o conceito de Participação Popular; - levantar subsídios para pensar as ações neste eixo; - cumprir o estabelecido no plano de governo. Procurávamos aglutinar um coletivo mais nuclear, que, por adesão, assumisse a responsabilidade com a implementação do Orçamento Participativo e que, nesta ação coletiva acontecessem estudos, formulações, pesquisas enfim, fosse nascendo um trabalho singular. Essa singularidade desejada poderia, pensávamos à época, escapar das fórmulas prontas, manuais de implementação ou contratação de especialistas. Exemplares do livreto foram distribuídos e, conforme observamos na figura 2, o material carregava um convite para transformar a cidade 37 das flores num grande jardim19 e brincava com a abreviação de participação popular, convidando para bater um papo sobre o desafio de colocá-la como eixo de governo. No interior do caderno, além da transcrição das falas, algumas canções populares também apareceram como convite. Ainda sobre a questão do jardim, faremos um rápido parêntese. Durante o percurso desta pesquisa encontramos em Yi-Fu Tuan elementos que nos provocaram pensamentos nesta relação cidade e jardim. Se no momento da experiência no campo empírico o pensamento provocado por Rubem Alves nos dava um terreno firme para nosso trânsito e nossa ação, no momento de leituras e escrita desta dissertação, o livro Topofilia, em particular o capítulo Do cosmo à paisagem alarga os limites desse terreno e, com ele, nosso pensamento ganha outros sentidos. Novas perguntas nos ocorrem: convidávamos para fazer da cidade um jardim paisagístico? Seria o jardim isométrico? O que podemos perceber deste convite presente no 1º Seminário como uma espécie de intuição, e suas ressignificações neste tempo presente? Por que este detalhe, pois pode parecer mesmo um detalhe menor no contexto de um seminário, nos chamou tanto a atenção, atraiu o nosso olhar neste momento em que nos debruçamos sobre a experiência no esforço de construção de uma análise sobre ela? Retornaremos este ponto no capítulo 3º. 19 No sentido de constituir um chão comum para o trânsito do pensamento coletivo, adotamos a prática de colocar alguns textos em circulação. Esta ideia de transformar a cidade das flores num jardim se apoiava no texto Sobre Política e Jardinagem de Rubem Alves, presente no livro Conversas sobre Política, utilizado à época. Este texto foi distribuído aos presentes durante o 1º Seminário. Disponível em . Acesso em: 08/fev/2016. http://www.rubemalves.com.br/site/10mais_08.php 38 Figura 2. Imagem da página 3 da publicação que registra o 1º Seminário Fonte: Publicação da Prefeitura de Suzano/SP. Material distribuído internamente. Logo na abertura dos trabalhos, disse o prefeito municipal que O orçamento participativo criou um marco de relações institucionais entre o poder público e a população (...). Mas OP não é receita 39 pronta que se reproduz infinitamente nos municípios. Há várias experiências e diferenças de formato, de método e de concepção. Temos também o compromisso em nosso programa de governo com outras formas de participação como as conferências e outros mecanismos de participação direta (...). Então o nosso desafio está em criar métodos, condições e modelos (...). Quero destacar aqui a importância desse seminário como uma forma de criarmos o nosso método, definirmos juntos que participação popular nós queremos, que modelo nós defendemos (...). Está presente o desejo de criar uma experiência singular partindo das características presentes na realidade da cidade e do governo. (CANDIDO, 2005, p.05) Ainda sobre o seminário, queremos destacar dois aspectos que nos parecem marcantes no OP. Primeiro, uma ideia sintetizada na expressão um jeito artista de participar. Ao contrário de aplicar integralmente os receituários disponíveis nos manuais, essa ideia aparecia como um convite para viver uma experiência inédita, a possibilidade de ação dos sujeitos com o corpo implicado e produzindo os sentidos no ato de fazer. Talvez compreendêssemos, já naquele momento e à nossa maneira, a existência de um espaço entre os monumentos típicos do Estado e os movimentos típicos das comunidades. E que habitar esse espaço fronteiriço significava um conhecimento e uma habilidade construída no movimento de criação. O segundo aspecto é mais pontual e aparece na expressão rico no processo e bem-sucedido nos resultados. Sobre os resultados, chama a atenção do poder público local (ali reunido) para a necessidade de priorizar de fato a execução das indicações construídas no processo do OP. Quanto à riqueza no processo entendíamos naquela época, a importância de sustentar movimentos em coerência com a riqueza no processo. Com o tempo fomos compreendendo que um processo é tanto mais rico na medida em que sustenta movimentos de criação, de experimentação, de produção de valores e produção de sujeitos. Enfim, este segundo aspecto demonstra a necessidade de uma boa articulação entre processualidade e materialidade na produção coletiva e individual do valor. Dito de outra maneira, um processo rico pode cair em descrédito se os resultados não se materializam concreta e objetivamente na execução das obras e/ou serviços por parte da Prefeitura. Fica evidenciada a importância em buscar um bom equilíbrio entre processo e resultado. O Plano Plurianual Participativo – PPA Participativo 40 Depois do Seminário, a prefeitura promoveu um amplo debate para subsidiar seus técnicos e apoiar os agentes de governo envolvidos com o planejamento orçamentário. Cabe ao executivo a iniciativa do projeto de lei do Plano Plurianual (PPA) sempre no primeiro ano de cada mandato. O PPA é um dos instrumentos do planejamento orçamentário que apresenta as ações do governo nos quatro anos subsequentes. São macro programas que deverão estar articulados com as Leis do Orçamento Anual (LOA) por meio das Leis das Diretrizes Orçamentárias (LDO). A prefeitura organizou três grandes plenárias na cidade, uma em cada distrito. Internamente, nos organizamos em uma Secretaria Executiva, equipe intersetorial que articulava várias secretarias municipais. Essa discussão pública funcionava como mais um laboratório na experimentação do que viria a ser o orçamento participativo. Produzimos material de divulgação que foi distribuído na forma de convite, e material didático distribuído durante as plenárias como apoio aos participantes. A figura 3 apresenta capa e contracapa de um folheto de divulgação. A parte interna do folheto trazia informações específicas das reuniões como local, horário, orientações gerais para a participação, contato para agendamento de reuniões preparatórias, acesso a demais informações e etc. Foram registradas sessenta e uma reuniões preparatórias e as três plenárias distritais. No total, 5.619 pessoas se reuniram neste processo que ficou conhecido como PPA participativo. Durante as plenárias, a população presente se distribuía em salas de aula que agrupavam as seguintes áreas fim: - Educação, Cultura, Comunicação Social; - Saúde, Esporte e Lazer; - Infra Estrutura, Obras e Saneamento; - Política Urbana (erradicação das áreas de risco, habitação e transporte); - Desenvolvimento Econômico (geração de emprego); - Promoção da Cidadania, Inclusão Social e Fundo Social; - Segurança e Manutenção da Cidade. A dinâmica desses encontros era muito parecida com a construção do Programa de Governo no ano anterior, já descrita neste texto. Os agentes do governo faziam uma apresentação inicial da realidade orçamentária da Prefeitura, da estrutura de pessoal, de equipamentos, frota e etc. Em seguida, apresentavam as linhas gerais do planejamento plurianual e o diálogo com a comunidade acontecia. Durante a discussão acontecia o registro das falas e propostas. Cada grupo de 41 trabalho apresentava um resumo do seu trabalho com os demais grupos na plenária. A secretaria executiva fez um trabalho de síntese a partir dos registros de cada grupo temático e municiou a área técnica responsável pela elaboração do projeto de lei do PPA. O primeiro material didático específico do Orçamento Participativo distribuído no primeiro semestre de 2006 registrava o processo do PPA Participativo com quadros temáticos sintetizando as reivindicações populares e as ações específicas presentes na lei20 do PPA. As figuras 4 e 5 trazem os quadros preparados com as informações pertinentes à área das Políticas Urbanas e área da Educação. Figura 3. Material de divulgação do PPA Participativo. Fonte: Prefeitura de Suzano/SP. Material de ampla circulação. 20 Na data da publicação do caderno, tratava-se de lei. 42 Figura 4. Registro do trabalho no tema Política Urbana no PPA Participativo. Fonte: Prefeitura de Suzano/SP. Material de ampla circulação. 43 Figura 5. Registro do trabalho no tema Educação no PPA Participativo. Fonte: Prefeitura de Suzano/SP. Material de ampla circulação. O Orçamento Participativo. Tendo em vista as novidades que aconteciam na cidade, uma empresa de comunicação com sede em Suzano e circulação regional denominado jornal Diário 44 de Suzano entrou em entendimentos com a Secretaria de Comunicação Social da Prefeitura e, a partir de então, ocupamos uma coluna semanal. A ideia era trabalhar o tema da participação popular como eixo de governo com o foco inicial em duas ações específicas. Sobre o Plano Diretor Participativo, Miguel Reis Afonso, então Secretário Municipal de Política Urbana, produzia e assinava textos quinzenalmente. Sobre o Orçamento Participativo os artigos quinzenais eram produzidos e assinados pelo Assessor para Implementação do OP, Ivan Rubens Dário Jr. Assumimos essa responsabilidade como uma oportunidade de produzir os registros no percurso dos acontecimentos e, ao mesmo tempo, como possibilidade de tornar público e fazer circular nossa experiência coletiva vivida na cidade. Na edição do dia 27 de maio de 2006 (sábado), nosso primeiro artigo21 sobre o Orçamento Participativo com o título Desperta, cidade das flores! Agora o Orçamento é Participativo começava assim: Compete ao Executivo propor o projeto de Lei do Orçamento Anual, conhecido como LOA, e encaminhá-lo até o último de setembro de cada ano ao Poder Legislativo. Cabe à Câmara de Vereadores analisá-lo, debatê-lo e propor emendas para aprimorar o projeto e votá-lo, tramitação que tem prazo até o dia 31 de dezembro. Aprovada a Lei do Orçamento Anual, ela vigora do primeiro ao último dia do ano seguinte. Existem também duas peças muito importantes do planejamento que são o Plano Plurianual (PPA) e a Lei das Diretrizes Orçamentárias (LDO), tudo disciplinado por um rigoroso arcabouço legal das esferas federal, estadual e municipal. Pois, é: Orçamento! A palavra pode parecer um pouco complicada, mas todo mundo sabe do que se trata. Simplificando, é a previsão dos ganhos (estima receita) e definição dos gastos (fixa despesas), quanto a prefeitura espera arrecadar no ano seguinte e como será gasto esse dinheiro que é, em grande medida, fruto dos impostos, taxas, tributos, contribuições, entre outros, pagos por todos nós (...). (DÁRIO, 2006) O trecho acima demonstra uma característica presente em todos os materiais didáticos produzidos na experiência do OP em Suzano: um esforço de tradução. Estávamos conscientes que tornar pública uma discussão historicamente restrita a técnicos da prefeitura e agentes dos governos de então, configurava algo inédito na cidade. Um sem número de códigos, técnicas, normas e regulamentos disciplinam o planejamento e a execução orçamentária. Era, portanto, fundamental que a linguagem técnica e a linguagem jurídica fossem traduzidas de forma a possibilitar o debate público. Um esforço de desburocratizar a discussão sobre o orçamento da 21 Sobre os artigos publicados quinzenalmente no jornal Diário de Suzano ver Fora-texto. 45 prefeitura na tentativa de devolver a ele sua simplicidade: morar na cidade tem um custo. Quem arca com o custo de viver na cidade? Com o Orçamento Participativo deslocávamos para o espaço público o debate do orçamento público. Alguém me avisou pra pisar nesse chão devagarinho22: nossas vivências anteriores indicavam a prudência em pisar devagar e cuidadosamente, nos davam pistas e nos ajudavam perceber o chão e seu relevo para cada passo novo. Aliás, tudo era muito novo inclusive para nós. Desde sempre a generosidade popular nos tranquilizava. O povo se mostrava muito generoso. Percebíamos nas falas, nos encontros, nos vínculos estabelecidos que o desespero inicial rapidamente se transformava em esperança com uma cidade melhor na medida em que o trabalho coletivo acontecia. Isso contaminava os encontros e nos ajudava a encontrar um clima favorável, a produzir um ambiente afetivo no sentido de favorecer o trabalho. O afeto fortalecia em nossa equipe a convicção de que as pessoas mostravam sentimentos pelo seu lugar. Nossa certeza na caminhada se construía nas incertezas do caminho. Acreditávamos nas pessoas e acreditávamos, portanto, no processo. Nosso convite para pensar a cidade era universal. Construir a Lei do Orçamento Anual exige saber das receitas e apontar prioridades para as despesas de forma a construir um projeto coletivo de cidade: operários em construção. *** As regiões do OP receberam nomes de flor. A escolha das flores partiu de uma rápida pesquisa realizada com antigos moradores da cidade que nos informaram, grosso modo, a localização dos sítios e espécies produzidas em tempos idos. Também levamos em consideração a população, as distâncias, características dos lugares, da cultura, peculiaridades da circulação no território. A sensibilidade de nossa equipe também pesou muito nesse processo de organização da regionalização/territorialização do OP. Na tabela 2 podemos observar as doze regiões e as respectivas flores, a escola que sediava cada plenária e o conjunto de bairros e loteamentos. Flores para Suzano, a cidade das flores: 22 Referência ao samba Alguém me avisou de Ivone Lara. 46 HORTÊNSIAS CRISÂNTEMOS BEGÔNIAS ORQUÍDEAS BROMÉLIAS MARGARIDAS CRAVOS LIRIOS ROSAS SÁLVIAS GIRASSÓIS JASMINS 47 Tabela 2. Organização da cidade em regiões para o Orçamento Participativo. Região Local da Plenária Bairros que correspondem à região 1 CRISÂNTEMO Emef Profª Terezi- nha P.L. Muzzel Jardim Graziela, Jardim Santa Inês, Jardim São Bernardino, Jardim São José, Veraneio Juruá. 2 BEGÔNIA Emef Augustinha R. Maida Molteni Jardim Bela Vista, Jardim Belém, Jardim Lazzareschi, Jardim Leymar, Jardim Maitê, Jardim Maneira, Jardim Miriam, Jardim Natal, Jardim Nazaré, Jardim Portugália, Vila Monte Sion, Vila Santana. 3 HORTÊNSIA Emef Abraão Salomão Domingues Chácara Ceres, Chácara Primavera, Jardim do Bosque, Jardim Leblon, Jardim Pompéia, Jardim Residencial Nova América, Pq Alvorada, Pq Umuarama, Pq Vienense, Tabamarajoara, Veraneio Suzano, Vila Helena e Vila Suzano. 4 BROMÉLIA Emef Odário Ferreira da Silva Chácara Boa Vista, Chácara Duchen, Chácara Ouro Verde, Chácara N. Sra. Aparecida II e III, Chácara São Judas Tadeu, Chácara Virgínia, Condomínio Alta Vista, Condomínio Clube dos Oficiais, Estância Angelina, Estância dos Pinherais, Estância Piratininga, Estância Tijuco Preto, Jardim Alto do Boa Vista, Jardim Amazonas, Jardim Ana Rosa, Jardim Brasil, Jardim Brasil II, Jardim Belém, Jardim Dora, Jardim dos Eucaliptos, Jardim Esperança, Jardim Etan, Jardim Guatambú, Jardim Itamaracá, Jardim do Lago, Jardim Maria Emília, Jardim Mimosa, Jardim Nova Ipelândia, Jardim Novo Horizonte, Jardim Palmeiras, Jardim Regina, Jardim Santa Rita de Cássia, Jardim Santa Maria, Jardim São Luiz, Jardim São Marcos, Jardim São Paulo, Pq Astúrias, Pq do Heroísmo, Pq Ouro Fino, Recanto São José, Recreio Bela Vista, Recreio Internacional, Recreio Ouro Fino, Recreio das Palmas, Recreio Rio Bonito, Recreio Santa Rita, Vale da Serra, Vila Ipelândia, Vila Real Palmeiras, Vila Real Santista, Vila Rica, Vila São Pedro, Vila Voegels. 5 CRAVO Emef Profª Célia Pereira de Lima Jardim Aeródromo Internacional, Jardim Cacique, Jardim Lincoln, Jardim Luella, Jardim Residencial Suzano, Jardim Santa Lucia, Vila Amorim, Vila Colorado, Vila Mazza, Vila Nova Amorim, Vila Urupês. 6 LÍRIO Emeif Orlando Digênova Cidade Boa Vista (zona Ribeirão, zona Itapetí, zona Jaguarí, zona Planalto), Cidade Miguel Badra Alto (gleba 1), Cidade Miguel Badra Baixo (glebas 2 a 7), Jardim Carmem, Jardim Fernandes, Jardim Francisco Cardoso, Sesc. 7 SÁLVIA Emef Luiz Romanato Jardim Maria Helenice, Pq Maria Helena, Vila Maluf. 8 ORQUÍDEA Emeif Profª Neyde Pião Vidal Chácara Bonanza, Chácara Casemiro, Chácara Fukui, Chácaras das Hortências, Chácara Monte Carlo, Chácara Nossa Senhora Aparecida I, Chácara São Carlos, Condomínio das Palmas, Estância Americana, Estância São Luiz, Jardim Ikeda, Jardim das Lavras, Jardim das Lavras II, Jardim das Lavras Mirim, Jardim Lígia, Jardim Planalto, Jardim Petrópolis, Jardim Restinga, Jardim Silvestre, Jardim Três Américas, Núcleo Baruel, Pq Buenos Aires, Pq das Cerejeiras, Pq das Lavras, Pq Mirim, Pq Palmeiras, Pq Residencial Samambaia, Recanto Feliz, Recanto Maria de Jesus, Região do Caulin, Rincão das Lendas, Sítio Santa Gema, Sítio dos Moraes, Vila Fátima, Vila Júlia, Vila Nova das Lavras, Vila Varpa. 9 MARGARIDA EMEF Antônio Marques Figueira (2006). EE Zeikichi Fukuoka (2007-2008) Centro, Chácara Faggion, Chácara Nova Suzano, Chácara Reunidas Guaió, Cidade Edson, Estância Paulista, Fazenda Aya, Jardim Altos de Suzano, Jardim Ana Rosa, Jardim Anzai, Jardim Campestre, Jardim Carlos Cooper, Jardim das Flores, Jardim Guaió, Jardim Janina, Jardim Japão, Jardim Josué, Jardim Marcato, Jardim Modelo, Jardim Paulista, Jardim Realce, Jardim Riviera, Jardim Santa Helena, Jardim Santo Antonio, Jardim Santos, Jardim São Bento, Jardim São Luiz, Jardim Sol Nascente, Jardim Suzano, Jardim Vitória, Meu Cantinho, Pq Ana Rosa, Pq do Colégio, Sítio São José, Vila Adelina, Vila Ana Rosa, Vila Bela Vista, Vila IV Centenário, Vila Costa, Vila Ipiranga, Vila Figueira, Vila Mifune, Vila Morrone, Vila Suely. 10 JASMIM Emeif Profª Mércia A. A. de Brito Chácara Casa Branca, Jardim Casa Branca, Jardim Caxangá, Jardim da Saúde, Pq Residencial Casa Branca, Ramal São José, Sete Cruzes, Sítio dos Moreiras, Vila Barros. 11 GIRASSOL Emef CAIC de Suzano Cidade Cruzeiro do Sul, Conjunto Residencial Iraí, Jardim dos Ipês, Jardim Imperador, Jardim Márcia I, Jardim Monte Cristo, Jardim Nena, Jardim Quaresmeira, Jardim Suzanópolis, Pq Suzano, Vila Maria de Maggi. 12 ROSA Emef José Celestino Sanches Chácara Méa, Chácara Meu Sossego, Chácara Recreio Sertãozinho, Jardim Alterópolis, Jardim Carla, Jardim Dona Benta, Jardim Europa, Jardim Gardênia Azul (gleba I), Jardim Margareth, Jardim Revista, Jardim Varan, Vila Beatriz, Vila Célia, Vila Laura. Fonte: Prefeitura de Suzano. 48 As Reuniões Preparatórias Alguns trabalhos específicos na mobilização para as Plenárias foram realizados na forma de reuniões preparatórias. As salas de Educação de Jovens e Adultos na rede municipal de ensino ganharam centralidade neste momento. Em uma dessas oportunidades, registramos o seguinte depoimento: “Se a minha rua tem asfalto e esgoto, as outras têm que ter também”. (Maria dos Reis Fagundes, moradora da Vila Feliz e aluna da EJA, 2006). Outra ação estava ligada ao programa saúde da família – PSF. Conversávamos com as equipes e estas nos ajudavam na divulgação e mobilização durante as visitas domiciliares. Numa dessas oportunidades ouvimos: “O OP vai mostrar à população a situação orçamentária do município e privilegiar o que a população deseja” (Célia Cristina, 2006). Célia Bortoletto, como era conhecida, uma entusiasta da participação popular, foi nomeada secretária municipal de saúde e permaneceu no cargo por seis anos. Durante esse período, todas as unidades de saúde passaram a contar com conselhos gestores de unidade de saúde e o conselho municipal de saúde atuava com muita animação. Nas disputas internas do partido dos trabalhadores, ela perdeu (no segundo turno de votação) a indicação para sucessão de Marcelo Candido com vistas ao processo eleitoral 2012. Outro foco de nossa ação na fase externa estava nos conselhos gestores locais. Visitávamos todos os conselhos de escola e os conselhos gestores de unidade de saúde. “O OP é parecido com o orçamento de nossa casa. Mas, como é dinheiro público tem que ter mais cuidado” (Waldineide Cavalcanti Silva, moradora do Jardim Cacique e conselheira de escola). “Com o OP vai ficando mais transparente a administração, porque há um livre arbítrio para a população decidir”. (Wladimir de La Torre, conselheiro do antigo Núcleo de Educação Especial - NEESP). Tantas outras reuniões aconteciam a convite de associações de moradores, igrejas, partidos, vereadores, apoiadores, conselheiros e etc. As Plenárias Regionais Deliberativas 49 As Plenárias eram grandes encontros onde a população acessava informações, discutia seus problemas e propunha soluções23, elegia representantes para acompanhar a sequencia dos trabalhos. As plenárias compunham a fase externa do OP com ações abertas, públicas, de convite universal em ampla divulgação24, onde a participação se dava diretamente. O direito a voz e voto não era apenas uma norma. Na intensidade das falas e da participação percebíamos o fazer coletivo nesses encontros organizados de forma a tratar de temas mais gerais num espaço pleno, geralmente no pátio coberto da escola e, principalmente, nas salas de aula organizadas para Grupos de Trabalho, um debate mais concentrado. As propostas (ainda denominadas como demandas da população) vinham dos Grupos de Trabalho, as candidaturas ao conselho e, listadas num telão visível para toda plenária, submetidos à votação. A escolha dos representantes do GT acontecia com animação. Candidato eleito, três prioridades eleitas, juntam-se ao CORPO. *** Por um jeito artista de participar Milhares de mãos atuaram nessa obra. Vamos transcrever alguns depoimentos recolhidos durante as plenárias regionais. A 1ª Plenária do OP aconteceu às 14 horas do dia 06 de maio de 2006 (sábado) na EMEF Profa. Terezinha P. Lima Muzzel e foi assim descrita por um participante: Apesar de fria pelo tempo e pelo vento que soprava, era uma linda tarde de sol quando os moradores da região crisântemo começavam a se aproximar. Era lindo o olhar daquelas pessoas que, apesar de marcadas por tantos problemas vividos naquela região, vislumbram uma esperança de pela primeira vez decidir como será gasto o dinheiro público e, principalmente, saber que não se encontrava ali apenas para ouvir as decisões do governo, mas como ator da decisão, com poder deliberativo e com a liberdade de apresentar e defender suas propostas. (Antônio Agostinho da Silva, 2006). 23 Evidentemente as falas não estavam necessariamente organizadas conforme descrito aqui. Um primeiro momento caracterizado por angústias, amarguras, descontentamentos. Uma espécie de grito de dor e sofrimento. Com a acolhida do grito, as falas, as escutas e os pensamentos iam articulando o fluxo do grupo. As linhas se entrelaçavam e o grupo tecia. 24 A política de comunicação social no OP previa: colocação de faixas nos pontos de grande circulação, cartazes, convites, publicação no jornal quinzenal próprio da Prefeitura – Suzano Agora, circulação de carro de som na cidade (neste último item aconteceram muitas experimentações), eventos oficiais com a presença do Prefeito e cobertura da imprensa local e regional. 50 Logo na entrada da escola ficavam as mesas de credenciamento. Funcionários da prefeitura e apoiadores do OP recebiam a população com as boas vindas e orientavam às mesas de credenciamento. No credenciamento preenchíamos as fichas de identificação dos participantes, oportunidade para conferir se o endereço declarado estava coerente com os bairros componentes da respectiva região. Ainda distribuíamos os crachás com as credenciais para participação e votação, e o material didático em pastas com elástico identificadas com a logomarca do OP. Em seguida, cada participante se dirigia para o pátio da escola onde estavam organizadas as cadeiras de frente para um tablado onde os trabalhos seriam coordenados. O espaço era ambientado, ilustrado com cartazes referentes aos assuntos em discussão, com informações relevantes sobre a organização dos tempos na plenária e sobre o orçamento municipal. O palco estava sempre decorado com a flor ‘típica’ da região. Neste momento inicial ficavam bem marcadas as composições preestabelecidas para participação nas Plenárias, os grupos organizados se mostravam. Seu José nos contou a articulação da sociedade amigos de bairro: “Estamos unidos por meio de entidades dos três bairros, discutindo melhorias comuns para todos nós e acho que assim conseguiremos uma vitória” (José Pereira da Silva, carpinteiro aposentado, morador da Vila Maluf.) Fotos 1 e 2 Material didático distribuído e utilizado nas Plenárias Regionais Moradores da região observando o material de apoio antes do início da Plenária. Fonte: arquivo pessoal 51 As plenárias iniciavam com a Rádio25 OP. Seis jovens atores iniciavam os trabalhos apresentando ‘tradução’ de canções conhecidas, a radionovela Algemas da Paixão’ e os Recadinhos do Coração. Improvisando, os atores interagiam com a plenária. A professora Érika, quando perguntada por um dos atores no papel de repórter da rádio sobre o procedimento de escolha durante uma plenária em 2006, respondeu: “por votação. Serão elencadas algumas hi