UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA CENTRO DE AQÜICULTURA CÂMPUS DE JABOTICABAL FONTES E DISPONIBILIDADE DE CÁLCIO E FÓSFORO PARA A TARTARUGA-DA-AMAZÔNIA - Podocnemis expansa CRIADA EM CATIVEIRO CAUÊ GUION DE ALMEIDA Zootecnista JABOTICABAL – SP Agosto – 2007 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA CENTRO DE AQÜICULTURA CÂMPUS DE JABOTICABAL FONTES E DISPONIBILIDADE DE CÁLCIO E FÓSFORO PARA A TARTARUGA-DA-AMAZÔNIA - Podocnemis expansa CRIADA EM CATIVEIRO CAUÊ GUION DE ALMEIDA Orientador: Prof. Dr. AUGUSTO SHINYA ABE Dissertação apresentada ao Programa de Pós- Graduação em Aqüicultura, como parte das exigências para obtenção do título de Mestre. JABOTICABAL – SP Agosto – 2007 Dedico Aos meus pais Maria Leine Guion de Almeida e Sérgio Augusto Gonçalves de Almeida, por todo amor, atenção, compreensão e estrutura para eu chegar até aqui, mas principalmente pelos ensinamentos e valores que me passaram ao longo desses anos e que me fizeram ser um pouquinho de cada um deles. A minha companheira Talita Cristina de Oliveira, mulher mais especial que conheci, por sua companhia nas noites de coleta e pela convivência ao longo desses anos. A minha filha Tarsila Guion de Oliveira e Almeida, luz da minha vida, por sua existência, energia, alegria, bagunça e amor. A minha irmã Inaê, a Marilene e a toda minha família, primos, tios e avós. “Os comunistas não se rebaixam a ocultar suas opiniões e os seus propósitos. Declaram abertamente que os seus objetivos só podem ser alcançados pela derrubada violenta de toda ordem social existente. Que as classes dominantes tremam à idéia de uma revolução comunista! Nela, os proletários nada tem a perder a não ser os seus grilhões. Tem um mundo a ganhar. Proletários de todos os países, uni-vos!” Karl Marx i AGRADECIMENTOS Ao Prof. Dr. Augusto Shinya Abe pela orientação, confiança, ensinamentos, cobranças e por ter viabilizado a realização de toda nossa pesquisa. Ao Prof. Dr. Luiz Edivaldo Pezzato, a Profa. Dra. Margarida Maria Barros e ao Prof. Dr. Antônio Celso Pezzato pelo apoio desde o momento de formulação das idéias deste trabalho até a utilização dos laboratórios da Zootecnia. Ao Prof. Dr. Nabor Veiga por ter me apresentado o manejo da vida silvestre ainda na graduação e pelo espaço cedido no Setor de Animais Silvestres para instalação dos animais e realização dos experimentos em Botucatu. A amiga Vera Lúcia Ferreira Luz, coordenadora de Conservação e Manejo de Répteis e Anfíbios do Centro de Conservação e Manejo de Répteis e Anfíbios – RAN/IBAMA, pelo incentivo a realização desse mestrado e por ter me aberto a porta ao trabalho e a essa vida com os quelônios e sua conservação, motivo dessa dissertação. Ao Isaías José dos Reis, a Yeda Soares de Lucena Bataus e a todos amigos do RAN/IBAMA pela atenção durante o trâmite de nosso projeto, além do trabalho de coleta na natureza e fornecimento dos filhotes de tartaruga-da-Amazônia utilizados nos experimentos. Ao Centro de Aqüicultura da Unesp, através de seus docentes e funcionários, que me permitiu a realização dessa Pós-graduação. ii A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES pela concessão da bolsa de mestrado. Ao Zootecnista João Manoel Cordeiro Alves, gerente de Aqüicultura da GUABI, pela atenção e presteza na disponibilização dos ingredientes utilizados na formulação das rações experimentais. Ao Igo, Vivian, Daniel e todo pessoal do Laboratório de Nutrição de Organismos Aquáticos de Botucatu pela ajuda em várias etapas desta pesquisa, do preparo de ração à realização das análises. Aos funcionários do Jacarezário de Rio Claro, Fernando e Marcelo, e do Setor de Animais Silvestres de Botucatu, Mauro, pela ajuda na recepção, transporte e manutenção dos filhotes em cativeiro. Aos funcionários do Laboratório de Bromatologia da Zootecnia, Renato e Conceição, pela ajuda na realização das análises. Aos amigos Leandro (Uerê) e Fabiola (Catota) pela ajuda na coleta de material e pela gostosa companhia no decorrer deste tempo. Ao amigo Dario (Salame), pela ajuda na discussão que iniciou este projeto e pela amizade nestes anos todos. iii Aos amigos Rodrigo e Thaís, padrinhos da minha filha Tarsila e companheiros de muitos anos e histórias. Obrigado pela ajuda no português. Aos amigos Márcio (Moscô), Ricardo (Loid), André (Gandola), Rogério, Shana, Maria Clara (Peroba), Fábio (Mocho), Flávio (Tang), Marcos (Xucro), Maurinho, Ricardo (Pilão), Alexandre (Collor), Ricardo (Lorpo), Kelly (Paçoca), Otávio (Pitchu), David (Liso) e todos amigos da Grão de Boi, Thiago (Balboa), Janaína (Iguana), Ana Gisela (Geléia), Cátia, Denise e Ozzy por todos estes anos de Botucatu. A cada brasileiro que se dedica a construir um país mais justo e ajuda a preservar nossa natureza, nossa cultura e nossos valores. iv SUMÁRIO Página LISTA DE TABELAS............................................................................................. vii LISTA DE FIGURAS.............................................................................................. ix GLOSSÁRIO DE NOMES CIENTÍFICOS.......................................................... x GLOSSÁRIO DE SIGLAS...................................................................................... xiii RESUMO.................................................................................................................. xv ABSTRACT.............................................................................................................. xvi CAPÍTULO I CONSIDERAÇÕES INICIAIS............................................................................... 1 Introdução.................................................................................................................. 2 Biologia da tartaruga-da-Amazônia........................................................................... 6 Nutrição de quelônios................................................................................................ 11 Cálcio e fósforo na alimentação animal..................................................................... 31 Referências bibliográficas.......................................................................................... 34 CAPÍTULO II Fontes e disponibilidade de cálcio e fósforo para a tartaruga-da-Amazônia – Podocnemis expansa criada em cativeiro............................................................... 43 Resumo....................................................................................................................... 44 Abstract...................................................................................................................... 45 Introdução................................................................................................................... 46 Material e Métodos..................................................................................................... 47 Resultados e Discussão.............................................................................................. 51 Conclusões.................................................................................................................. 54 v Literatura Citada......................................................................................................... 55 CAPÍTULO III Aproveitamento de diferentes alimentos de origem animal pela tartaruga-da- Amazônia – Podocnemis expansa criada em cativeiro.......................................... 66 Resumo...................................................................................................................... 67 Abstract..................................................................................................................... 68 Introdução.................................................................................................................. 69 Material e Métodos.................................................................................................... 70 Resultados e Discussão.............................................................................................. 73 Conclusões................................................................................................................. 77 Literatura Citada........................................................................................................ 78 CAPÍTULO IV CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. 88 vi LISTA DE TABELAS Página CAPÍTULO I Tabela 1 - Composição química e valores energéticos de alimentos utilizados na formulação de rações para animais............................................................................ 34 CAPÍTULO II Tabela 1 - Composição nutricional das dietas experimentais, na matéria natural..... 60 Tabela 2 – Índice relativo de comparação (IRC) da disponibilidade da matéria mineral, cálcio e fósforo entre os alimentos.............................................................. 61 Tabela 3 – Coeficientes de disponibilidade aparente da matéria mineral, cálcio e fósforo de alimentos utilizados em dietas para tartaruga-da-Amazônia.................... 62 Tabela 4 – Valores de matéria mineral, cálcio e fósforo total e disponível de alimentos utilizados em dietas para tartaruga-da-Amazônia..................................... 63 Tabela 5 – Comparação dos valores dos coeficientes de disponibilidade aparente (CDA) da matéria mineral (MM), cálcio (Ca) e fósforo (P) dos alimentos testados com os valores encontrados na literatura................................................................... 64 CAPÍTULO III Tabela 1 - Composição nutricional das dietas experimentais, na matéria natural..... 82 Tabela 2 – Índice relativo de comparação (IRC) da digestibilidade da matéria seca, proteína bruta, extrato etéreo e energia bruta entre os alimentos...................... 83 Tabela 3 – Coeficientes de digestibilidade aparente da matéria seca, proteína bruta, extrato etéreo e energia bruta de alimentos utilizados em dietas para tartaruga-da-Amazônia............................................................................................... 84 Tabela 4 – Valores de matéria seca, proteína, extrato etéreo e energia total e vii digestível de alimentos utilizados em dietas para tartaruga-da-Amazônia................ 85 Tabela 5 – Comparação dos valores dos coeficientes de digestibilidade aparente (CDA) da matéria seca (MS), proteína bruta (PB), extrato etéreo (EE) e energia bruta (EB) dos alimentos testados com os valores encontrados na literatura..................................................................................................................... 86 viii LISTA DE FIGURAS Página CAPÍTULO I Figura 1 – Fêmea adulta de tartaruga-da-Amazônia (cerca de 60 cm de comprimento de carapaça)......................................................................................... 8 Figura 2 – Filhote de tartaruga-da-Amazônia (3 meses de idade)............................ 8 Figura 3 – Fêmeas de tartaruga-da-Amazônia em assoalhamento (Rio Araguaia – GO)............................................................................................................................. 9 Figura 4 – Fêmea de tartaruga-da-Amazônia desovando (Rio Araguaia – GO)........ 9 CAPÍTULO II Figura 1 – Instalações experimentais para a tartaruga-da-Amazônia........................ 50 Figura 2 – Caixas para coleta de fezes de tartaruga-da-Amazônia com tela de proteção...................................................................................................................... 50 CAPÍTULO III Figura 1 – Caixas de alimentação (inferior) e coleta de fezes (superior) de tartaruga-da-Amazônia............................................................................................... 72 * Fotos: Cauê Guion de Almeida ix GLOSSÁRIO DE NOMES CIENTÍFICOS Quelônios Batrachemys raniceps (Família Chelidae) Chelus fimbriatus – Matá-matá (Família Chelidae) Chelonia mydas – Tartaruga verde (Família Cheloniidae) Geochelone carbonaria – Jabuti piranga (Família Testudinidae) Geochelone denticulata – Jabuti tinga (Família Testudinidae) Gopherus agassizi – Jabuti do deserto (Família Testudinidae) Pelodiscus sinensis – Tartaruga de casco mole (Família Trionychidae) Peltocephalus dumerilianus – Cabeçudo (Família Podocnemidae) Phrynops geoffroanus – Cágado de barbicha (Família Chelidae) Phrynops hilarii – Cágado de lagoa (Família Chelidae) Podocnemis expansa – Tartaruga-da-Amazônia (Família Podocnemidae) Podocnemis sextuberculata – Iaçá (Família Podocnemidae) Podocnemis unifilis – Tracajá (Família Podocnemidae) Pseudemys nelsoni (Família Emydidae) Terrapene carolina triunguis (Família Emydidae) Terrapene ornata (Família Emydidae) Trachemys dorbigni – Tigre d’água brasileiro (Família Emydidae) Trachemys scripta – Tigre d’água americano (Família Emydidae) Crocodilianos x Caiman yacare – Jacaré-do-Pantanal (Família Alligatoridae) Anuros Rana catesbeiana – Rã touro (Família Ranidae) Peixes Bidyanus bidyanus - Perca prateada (Família Terapontidae) Carassius auratus gibelio - Carpa gibel (Família Cyprinidae) Cyprinus carpio – Carpa comum (Família Cyprinidae) Dicentrarchus labrax - Robalo (Família Serranidae) Leporinus macrocephalus - Piavuçu (Família Anostomidae) Micropterus salmoides – “Black bass” (Família Centrarchidae) Oncorhynchus kisutch - Salmão coho (Família Salmonidae) Oncorhynchus mykiss - Truta arco-íris (Família Salmonidae) Oreochromis niloticus – Tilápia do Nilo (Família Cichlidae) Paralichthys olivaceus - Linguado oliva (Família Paralichthyidae) Piaractus mesopotamicus - Pacu (Família Characidae) Piaractus brachypomus - Pacu (Família Characidae) Pseudoplatystoma coruscans - Pintado (Família Pimelodidae) Pseudosciaena crocea – “Yellow croaker” (Família Sciaenidae) Rachycentron canadum – “Cobia” (Família Rachycentridae) Salmo salar - Salmão do Atlântico (Família Salmonidae) Sciaenops ocellatus – “Red drum” (Família Sciaenidae) xi Crustáceos Penaeus setiferus - Camarão branco (Família Penaeidae) Scylla serrata - Caranguejo de lama (Família Portunidae) Moluscos Haliotis midae - Abalone sul-africano (Família Haliotidae) xii GLOSSÁRIO DE SIGLAS AOAC - Association of Official Analytical Chemistry Ca - Cálcio CAL - Calcário CDA - Coeficiente de digestibilidade (disponibilidade) aparente CENAQUA - Centro Nacional de Quelônios da Amazônia CITES - Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagem em Perigo de Extinção Cr2O3 – Óxido de crômio III EB - Energia bruta EE - Extrato etéreo F - Flúor FB - Fosfato bicálcico FCO - Farinha de carne e ossos FM - Fosfato monocálcico FO - Farinha de ostras FOC - Farinha de ossos calcinada FP - Farinha de peixe FV - Farinha de vísceras de aves IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis xiii IBDF - Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal K - Potássio Mg - Magnésio MM - Matéria mineral MS - Matéria seca P - Fósforo PB - Proteína bruta PQA - Projeto Quelônios da Amazônia RAN - Centro de Conservação e Manejo de Répteis e Anfíbios UNESP - Universidade Estadual Paulista xiv RESUMO O estudo foi realizado para se determinar os coeficientes de disponibilidade aparente (CDA) da matéria mineral (MM), cálcio (Ca) e fósforo (P) da farinha de carne e ossos (FCO), farinha de vísceras de aves (FV), farinha de peixe (FP) e fosfato bicálcico (FB) e os coeficientes de digestibilidade aparente (CDA) da matéria seca (MS), proteína bruta (PB), extrato etéreo (EE) e energia bruta (EB) da farinha de carne e ossos, farinha de vísceras de aves e farinha de peixe apresentados pela tartaruga-da- Amazônia. Foram utilizados 226 filhotes provenientes do Projeto Quelônios da Amazônia no Estado do Mato Grosso, mantidos em caixas plásticas com renovação de água e temperatura média de 29,0oC. Os CDA foram determinados pela utilização de dietas contendo 0,1% do marcador óxido de crômio III (Cr2O3). Os CDA da MM, Ca e P foram, respectivamente, de 69,32; 69,46 e 73,28% para FCO; 87,53; 92,48 e 92,19% para FV; 92,53; 95,83 e 94,93% para FP e 41,18; 81,01 e 54,46% para FB. Os CDA da MS, PB, EE e EB foram, respectivamente, de 79,10; 87,61; 93,83 e 79,61% para FCO; 92,45; 94,89; 96,55 e 92,71% para FV e 93,53; 95,13; 94,05 e 93,18% para FP. xv ABSTRACT Apparent availability coefficient (AAC) of the ash, calcium (Ca) and phosphorus (P) of the meat and bone meal (MBM), poultry by-products meal (PBM), fish meal (FM) and dicalcium phosphate (DP) and apparent digestibility coefficient (ADC) of the dry matter (DM), crude protein (CP), ether extract (EE) and gross energy (GE) of the meat and bone meal, poultry by-products meal and fish meal were determined in the Arrau sideneck. The turtles used were 226 hatchlings from Projeto Quelônios da Amazônia, State of Mato Grosso. Experimental animals were raised in plastic containers, with continuous water flow and mean temperature kept at 29,0oC. AAC and ADC were accessed by diets labeled with 0.1% of chromium oxide III (Cr2O3). The AAC of ash, Ca and P were, respectively, 69.32, 69.46 and 73.28% for MBM, 87.53, 92.48 and 92.19% for PBM, 92.53, 95.83 and 94.93% for FM and 41.18, 81.01 and 54.46% for DP. The ADC of DM, CP, EE and GE were, respectively, 79.10, 87.61, 93.83 and 79.61% for MBM, 92.45, 94.89, 96.55 and 92.71% for PBM and 93.53, 95.13, 94.05 and 93.18% for FM. xvi CAPÍTULO I CONSIDERAÇÕES INICIAIS 1 Introdução A Amazônia sempre apresentou histórico como potencial fornecedor de alimento e outros produtos extrativistas. Com a fauna silvestre bastante apreciada na culinária local e representando as poucas chances de sustento na região, as espécies amazônicas sempre sofreram intensa pressão antrópica. Os quelônios amazônicos estão entre os animais que mais sofreram esta intervenção e a tartaruga-da-Amazônia (Podocnemis expansa) é o representante da ordem mais procurado pelos caçadores, ribeirinhos e indígenas. A principal utilização de animais jovens e adultos era para fornecimento de carne, por ser fonte de proteína de excelente qualidade para os humanos. Além de sua utilização como fonte de carne, a carapaça dos quelônios era usada como bacia, instrumento agrícola ou era queimada e sua cinza misturada com barro para fabricação de potes. Seus escudos extraídos serviam para confecção de bolsas, pentes, aros para óculos, grampos e fivelas. A pele do pescoço era utilizada como algibeira de tabaco ou esticada para fabricação de tamborins e a gordura misturada com resina e usada para impermeabilizar barcos, também sendo comercializada para utilização na farmacologia (Smith, 1979a). Os ovos das tartarugas eram usados como fonte de proteína e na forma de manteiga. Entre 1885 e 1894 entraram oficialmente em Belém cerca de 120 toneladas de manteiga de tartaruga. Essa manteiga era feita com os ovos das tartarugas, após serem amassados, misturados com água e deixados ao sol por várias horas para o óleo subir a superfície. Esse óleo, manteiga ou azeite de tartaruga era muito procurado para cozinhar e iluminar, representando importante comércio na região (Veríssimo, 1970). Cerca de 2 48 milhões de ovos eram destruídos a cada ano para suprir a demanda local e o comércio em algumas regiões da Amazônia (Smith, 1979b). No período colonial, os quelônios eram alvos principalmente daqueles que tinham alguma patente como militares, governantes e clérigos. Algumas capitanias tinham a exportação de produtos derivados dos quelônios como fonte de divisas, como a Capitania do Grão-Pará e a Capitania de São José do Rio Negro. Nestes locais, os habitantes naturais eram instruídos a abastecer esse comércio para as autoridades (Ferrarini, 1980). Segundo Smith (1979a), registros do século 18 relatam que a tartaruga-da- Amazônia desovava em grande número de praias em Itacoatiara, município do Amazonas. Isso atraiu a atenção dos portugueses e pelo menos uma praia real foi estabelecida (Pesqueiro Real das Tartarugas), para suprir soldados do Rio Negro. Outras praias também foram exploradas nas vizinhanças da cidade e as tartarugas, que eram excepcionalmente grandes e abundantes em Itacoatiara em 1774, já tinham suas populações diminuídas drasticamente no fim do século 19, bem como no resto das bacias do Amazonas e Orinoco. Em 1979, as tartarugas-da-Amazônia eram raramente encontradas nesta região, que passara a predar o tracajá (Podocnemis unifilis) e o iaçá (Podocnemis sextuberculata), mais preservados por não apresentarem comportamento de desova social. Os tracajás e iaçás eram pegos o ano inteiro, mas principalmente quando entravam nas várzeas inundadas para buscar frutos e flores para se alimentar, na época das enchentes. Os pescadores usavam espinhéis, cada um com quatro a seis anzóis, sob árvores com frutos maduros, especialmente o caiembé (família Moraceae) e o cramuri (família Sapotaceae), usados como isca nos anzóis. Ao longo do ano eram capturados com redes de pesca e com o tapuá, instrumento com haste de madeira de 3 cerca de 2 m com uma ponta de metal que se prendia na carapaça dos animais quando atirados. No verão, eram capturados por viração quando subiam para desovar. No final de 1975, restaurantes em Manaus ainda ofereciam carne de animais silvestres, sem incluí-los no cardápio. Wetterberg et al. (1976) realizaram estudo com entrevistas pessoais para identificar as espécies da fauna silvestre mais procuradas em restaurantes de Manaus. Dentre as 15 espécies preferidas estavam três espécies de quelônios, sendo que a tartaruga-da-Amazônia foi a mais citada, na frente da paca, veado, anta, porco do mato (catetos e queixadas), tatu, capivara, pato do mato, tracajá, cutia, jabuti, jibóia, codorna, marreca e macaco guariba, citados nesta ordem. O peso ideal para capturar as tartarugas era de 28,82 kg e para os tracajás de 9,40 kg. Havia grande interesse dos restaurantes, 78,78% deles, em trabalhar com fauna amazônica. A tartaruga foi considerada, seguido pela paca, veado, anta e porco do mato, como de preparo mais fácil e maior interesse em incluir no cardápio. Tartaruga, tracajá, cutia, veado e tatu apresentavam maior potencial de lucro. Assim, o consumo de tartarugas era socialmente apreciado pelas classes abastadas e o comércio ilegal economicamente importante como fonte de renda para os menos favorecidos, que as capturavam e apanhavam seus ovos para suprir essa demanda. Essa exploração predatória se intensificou com a construção da rodovia Transamazônica, que facilitou o acesso às regiões mais distantes e iniciou o processo de ocupação e uso inadequado dos recursos naturais, provocando pressão intensa sobre a fauna e a flora (Reva et al., 1989), tanto que na década de 70 a tartaruga-da-Amazônia chegou a ser indicada para compor a lista de animais ameaçados de extinção. Caso a predação continuasse na escala mencionada, a tartaruga entraria em processo de extinção (Alfinito, 1973). 4 Visando evitar o risco de extinção desses quelônios, trabalhos de conservação passaram a ser realizados pelo Governo Federal a partir de 1964. Em 1967, foi promulgada a Lei de Proteção à Fauna, que proibia a utilização, perseguição, destruição, caça ou apanha de qualquer animal da fauna silvestre, bem como seus ninhos, abrigos e criadouros naturais, que passaram a ser propriedade do Estado. Em 1975, foi promulgada a Convenção sobre Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagem em Perigo de Extinção (CITES), que incluiu todos os representantes do gênero Podocnemis em seu Anexo II, espécies que embora não se encontrassem necessariamente em perigo de extinção, poderiam chegar a esta situação. Em 1979, foi criado o Projeto Quelônios da Amazônia (PQA), pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF). Com a criação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) em 1990, o PQA passou a ser coordenado por este por meio do Centro Nacional de Quelônios da Amazônia (CENAQUA) e hoje pelo Centro de Conservação e Manejo de Répteis e Anfíbios (RAN), criado em 2001. Estes órgãos atuaram controlando as populações dessas espécies por meio da proteção de matrizes em seus habitats e sítios de reprodução, impedindo a predação de seus ovos e fazendo o manejo e soltura de milhões de filhotes na natureza após os dias de maior risco de predação dos filhotes após o nascimento. Realizam educação ambiental e incentivam a criação em criadouros comerciais legalizados, desestimulando a caça predatória e o comércio ilegal pela oferta legal de tartarugas e seus subprodutos. Isso evitou que a tartaruga-da-Amazônia entrasse na Lista Oficial das Espécies da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção, publicada em 1989 e da qual constavam seis outros quelônios brasileiros. 5 A criação comercial de quelônios amazônicos foi normalizada pelas Portarias 142- N de 30 de dezembro de 1992 (criação em cativeiro de Podocnemis expansa e P. unifilis) e 070 de 23 de agosto de 1996 (comercialização de produtos e subprodutos de P. expansa e P. unifilis). No entanto, as tecnologias para o sucesso dessa criação não estão ainda bem definidas, apesar da rusticidade dos animais. Os maiores entraves são as técnicas de abate e o escoamento da produção, a sustentabilidade na produção de filhotes com a reprodução em cativeiro e o manejo alimentar, uma vez que a base da alimentação desses animais ainda é a ração balanceada para peixes. A carência de informação científica na área e a necessidade de se desenvolver a produção e conservação de quelônios, justifica o desenvolvimento do presente estudo. Biologia da tartaruga-da-Amazônia A tartaruga-da-Amazônia (Podocnemis expansa) pertence ao reino Animalia, filo Chordata, subfilo Vertebrata, superclasse Tetrapoda, classe Reptilia, subclasse Anapsida e ordem Chelonia. Dentro da ordem dos quelônios, pertence à subordem Pleurodira, que são as espécies que retraem a cabeça e o pescoço lateralmente e se colocam sob a margem da carapaça, além de possuírem a pelve unida ao plastrão. Por fim, pertence à família Podocnemidae. Distribuídas apenas no hemisfério sul, como todas espécies da família, ocorrem nos rios das Bacias Amazônica e do Orinoco, na Colômbia, Venezuela, Guiana, leste do Equador, nordeste do Peru, norte da Bolívia e norte e centro-oeste do Brasil (Iverson, 1992), habitando estes grandes rios e seus tributários de águas claras ou escuras, além de lagoas e lagos adjacentes a estes rios (Ernst & Barbour, 1989). No Brasil esta espécie 6 habita rios e lagos dos Estados do Acre, Pará, Amazonas, Tocantins, Rondônia, Roraima, Amapá, Mato Grosso e Goiás. É o maior quelônio fluvial da América do Sul, atingindo em média 80 cm de comprimento de carapaça, 60 cm de largura de carapaça e peso médio de 60 kg. Todavia, há indivíduos que chegam a 1 m de comprimento de carapaça. A cabeça é marrom acinzentada e apresenta manchas amarelas nos animais jovens. Essas manchas ocorrem nos escudos interparietais, um em cada lado da cabeça, e desaparecem nas fêmeas ou desbotam e escurecem nos machos com a idade. As mandíbulas são marrom claro e o queixo é amarelo, com a presença de duas barbelas. O pescoço é acinzentado dorsalmente e amarelo ventralmente, com pequenas escamas arredondadas ou tubérculos na sua superfície dorsal. As patas são cobertas com pele rugosa e possuem cinco garras firmes e resistentes nas patas dianteiras e quatro garras nas patas traseiras. Os membros são acinzentados, com duas ou três escamas mais largas ocorrendo na margem posterior das patas traseiras. A carapaça é baixa e tectiforme em filhotes e jovens e fortemente aplainada em adultos, com coloração marrom acinzentado para preto. O plastrão é cinza claro em filhotes, com alguns pigmentos escuros em recém nascidos. A carapaça é formada por 48 ossos e 37 placas córneas epidérmicas e o plastrão é composto por nove ossos e 13 placas córneas epidérmicas (Ernst & Barbour, 1989; Pritchard & Trebbau, 1984; Reva et al., 1989). Os machos tendem a manter as marcas de quando jovens na cabeça, possuem a cauda mais longa e mais grossa, com a abertura localizada mais distalmente, e apresentam a carapaça quase circular. São consideravelmente menores que as fêmeas (50 cm de carapaça para os machos e 80 cm para as fêmeas) e possuem a extremidade posterior da placa caudal mais larga, na forma de U, em relação às fêmeas, que apresentam as placas angulares, na forma de V (Pritchard & Trebbau, 1984). 7 Figura 1 – Fêmea adulta de tartaruga-da-Amazônia (cerca de 60 cm de comprimento de carapaça) Figura 2 – Filhote de tartaruga-da-Amazônia (três meses de idade) Como os outros quelônios aquáticos, secreta amônia (NH3), material solúvel e tóxico, exigindo a passagem de bastante água para evitar concentrações tóxicas durante sua excreção pela urina. As espécies semi-aquáticas secretam uréia (NH2CONH2), solúvel e relativamente atóxica, e as espécies terrestres secretam ácido úrico (C5H4O3N4), insolúvel, atóxico e que passa na forma de massa, exigindo pouca perda de água (Pritchard, 1979). A espécie é de hábitos aquáticos, dependendo da água para o crescimento, alimentação, locomoção e acasalamento. Apenas a desova é feita fora da água, em covas nas praias dos rios (Reva et al., 1989). O período de nidificação e desova varia de junho a dezembro, em função do regime de chuva das regiões de ocorrência, e se dá geralmente à noite em covas com até 80 cm de profundidade. A maturidade sexual se dá por volta dos 7 anos e a fêmea põe entre 60 e 140 ovos (média de 100 ovos) por postura, com período de incubação de cerca de 60 dias (Luz, 2005). Estes quelônios também saem da água para tomar sol, em galhos e troncos no meio do rio. As temperaturas 8 corporais de tartarugas que se aquecem ao sol são mais elevadas que a temperatura da água e do ar e podem auxiliar na digestão, crescimento e produção de ovos (Pough et al., 1999). Segundo Reva et al. (1989), no início do verão as tartarugas se reúnem em grupos e iniciam a migração em direção às praias de desova, processo chamado arribação, subindo várias vezes com a cabeça pra fora da água, o que é chamado de bubuia. Nas proximidades dos tabuleiros de desova, iniciam o processo de observação do ambiente, subindo por várias vezes à praia para observar as condições de temperatura e umidade do local. Este processo é denominado assoalhamento e dura até a desova, que geralmente é feita durante a noite. Figura 3 – Fêmeas de tartaruga-da-Amazônia em assoalhamento (Rio Araguaia – GO) Figura 4 – Fêmea de tartaruga-da-Amazônia desovando (Rio Araguaia – GO) Segundo Ernst & Barbour (1989), grandes reuniões de Podocnemis expansa ocorrem no início da estação seca, que é a estação reprodutiva. A cópula ocorre na água e as fêmeas passam nesse período pelo menos seis horas ao dia tomando sol, provavelmente para acelerar o desenvolvimento do ovo. Então sobem às praias em grupos para postura os ovos, sendo que as primeiras noites são usadas apenas para 9 explorar as praias, com a desova ocorrendo alguns dias depois. Várias fêmeas usam o mesmo sítio. Os ovos são esféricos (32-54 mm). Os quelônios, em geral, não apresentam cromossomos sexuais heteromórficos, com a determinação do sexo dependendo da temperatura de incubação, sendo que temperaturas mais altas produzem fêmeas e temperaturas mais baixas produzem machos (Alho & Danni, 1984). Estudando a determinação sexual em Podocnemis expansa em ninhos naturais da Reserva Biológica do Rio Trombetas, Pará, Alho & Danni (1984) deixaram três ninhos expostos ao sol e protegeram outros três contra a radiação solar. Os ninhos cobertos, temperatura média de 33,74oC (mínima de 31,0oC e máxima de 36,0oC), produziram mais machos (dois ninhos com 64,0% de machos e um com 75,0% de machos). Os ninhos expostos ao sol, temperatura média de 34,46oC (mínima de 30,0oC e máxima de 38,0oC), produziram mais fêmeas (dois ninhos com 97,0% de fêmeas e um com 96,0% de fêmeas). A diferença de 1,0oC entre os ninhos cobertos e descobertos foi constante ao longo do estudo e influenciou a razão sexual, que se ajustou a proporção de 1 macho para 30 fêmeas encontrado em condições naturais. Valenzuela et al. (1997) também estudaram a determinação sexual em Podocnemis expansa no Rio Caquetá, na Amazônia Colombiana. Alguns ovos foram levados a incubadoras artificiais, com umidade controlada e diferentes temperaturas, e outros permaneceram em ninhos naturais ou seminaturais, preparados nas praias. Nas incubadoras, nasceram 100,0% de machos a 30,5oC e 69,7% de machos a 32,5oC. Quando a temperatura foi de 28,5oC e 26,0oC, os animais morreram, respectivamente, com 25 dias de desenvolvimento e com 10 dias de desenvolvimento. Nos ninhos naturais e seminaturais, nasceram de 73,3% a 100,0% de fêmeas. Os principais fatores que influenciaram a determinação sexual foram a temperatura e o tempo de temperatura alta nos dias 29 e 30. O valor acima de 32,5oC para produção de fêmeas para P. 10 expansa, talvez seja o mais alto reportado para quelônios. Malvasio (2001), no entanto, não encontrou correlação direta entre a temperatura de incubação dos ovos e determinação sexual, uma vez que ninhos com 31,3oC produziram 79,0% de fêmeas e ninhos com 34,9oC produziram fêmeas e machos quase na proporção de um para um. Nutrição de quelônios Segundo Bjorndal (1989), o conteúdo celular (carboidratos solúveis, proteínas, lipídios) é prontamente digerido pelas enzimas endógenas dos herbívoros no intestino delgado, enquanto a parede celular (celulose, hemicelulose, lignina) é digerida pela microflora simbiótica do intestino grosso. Herbívoros generalistas, como Geochelone carbonaria e G. denticulata, se ajustam às dietas com itens diversos, variando o consumo diário, taxa de passagem e digestibilidade, de forma a obterem maior eficiência no aproveitamento dos nutrientes. Dietas com altos teores de conteúdo celular ou baixa digestibilidade da parede celular, tem alto consumo diário e baixo tempo de passagem. Dietas com alta digestibilidade da parede celular apresentam baixo consumo e longo tempo de passagem. Para manter essa estratégia digestiva flexível, o animal requer morfologia do intestino que permita processar diferentes bolos alimentares. No caso dos jabutis, o intestino delgado e o intestino grosso possuem basicamente o mesmo comprimento, o que facilita a estratégia flexível. O tamanho do intestino delgado é suficiente para lidar com a dieta digerida pelas enzimas endógenas e o intestino grosso é capaz de reter a digestão por tempo suficiente para atividade microbiana. G. carbonaria apresenta, respectivamente, digestibilidade da matéria orgânica, energia e fibra bruta de 69,0%, 65,0% e 45,0% para manga, 36,0%, 32,0% e 7,0% para goiaba e 38,0%, 34,0% e 37,0% para folha de lantana. O tempo de passagem foi de 6,6 dias para manga, 2,6 11 dias para goiaba e 9,5 dias para folha de lantana. G. denticulata apresenta, respectivamente, digestibilidade da matéria orgânica, energia e fibra bruta de 71,0%, 67,0% e 42,0% para manga, 36,0%, 32,0% e 7,0% para goiaba e 41,0%, 37,0% e 41,0% para folha de lantana. O tempo de passagem foi de 4,8 dias para manga, 3,6 dias para goiaba e 8,7 dias para folha de lantana (Bjorndal, 1989). A presença de fermentação no intestino de quelônios de água doce também foi demonstrada com Pseudemys nelsoni. Bjorndal & Bolten (1990) testaram dieta com a planta aquática Hydrilla verticillata e encontraram valores de digestibilidade de 83,0% para matéria seca, 83,0% para matéria orgânica, 78,0% para energia, 88,0% para fibra bruta e 64,0% para proteína bruta. O tempo de trânsito foi de 68 horas e a alta digestibilidade da parede celular indicou fermentação. Estudando o trato digestório desta espécie, foi encontrado tamanho de 14,8 cm para o esôfago e tamanhos e pesos seco de 22,4 cm e 2,6 g para o estômago, 167,7 cm e 7,6 g para o intestino delgado e 40,6 cm e 3,8 g para o intestino grosso, em animais com 20,6 a 27,1 cm de comprimento de plastrão e 2,0 a 4,0 kg de peso vivo. Analisando as concentrações e produção de ácidos graxos voláteis, o esôfago e o estômago apresentaram valores baixos, com origem provavelmente na matéria vegetal e não na atividade microbiana. A atividade parece se iniciar na porção anterior do intestino delgado, com 11,0 µM/g de concentração e 244,0 µM/g.h de produção. Torna-se intensa nas porções média e posterior do intestino delgado, respectivamente, com 55,0 µM/g de concentração e 388,0 µM/g.h de produção e com 41,0 µM/g de concentração e 372,0 µM/g.h de produção. Há diminuição não significativa nessa atividade no ceco, cólon médio e cólon posterior, respectivamente, com 60,0 µM/g de concentração e 238,0 µM/g.h de produção, 61,0 µM/g de concentração e 241,0 µM/g.h de produção e 36,0 µM/g de concentração e 163,0 µM/g.h de produção. Essas diferenças ao longo do intestino 12 refletem mudanças no substrato e, provavelmente, diferentes populações microbianas. O pH neutro nas regiões de fermentação indica que os ácidos graxos voláteis foram aproveitados pelos quelônios. Os ácidos graxos voláteis mais encontrados foram acetato (76,8%), propionato (14,1%), butirato (7,4%) e valerato (1,7%) e o principal gás resultante do processo de fermentação é o dióxido de carbono. A alta proporção de propionato na porção anterior do intestino delgado indica competição entre as enzimas endógenas e a microflora simbiótica pela utilização dos melhores substratos. Também foram registrados a presença de densas populações de nematódeos no intestino delgado, menos ativas no intestino grosso, sem conclusões sobre seu benefício (Bjorndal & Bolten, 1990). Os quelônios possuem bicos córneos que, além de usados para apreensão dos alimentos, funcionam como defesa. A mandíbula tem potente musculatura e quebra facilmente os alimentos. A língua é curta e firmemente aderida ao assoalho da boca, com a glote localizada posteriormente. As glândulas salivares produzem muco, mas não produzem enzimas digestivas. O estômago, intestino delgado, fígado, pâncreas e vesícula biliar produzem enzimas. Nos animais jovens, o ceco é pouco desenvolvido, aumentando de volume à medida que cresce. Isso sugere aumento na dieta vegetal ao longo do desenvolvimento. A parte final do tubo digestório termina na cloaca, composta pelo ânus e pelos orifícios urinário e genital (Luz & Reis, 1999; Mader, 1996). Moreira & Loureiro (1992) estudaram a anatomia do trato digestivo de exemplares Podocnemis expansa com quatro anos de cativeiro e tamanho de 18,2 a 35,9 cm de comprimento de carapaça. O trato compreende o esôfago, estômago, intestino delgado, intestino grosso e reto. O intestino delgado é a porção do piloro até a válvula ileocólica e o intestino grosso é a porção da válvula ileocólica até a cloaca. Havia presença de papilas cornificadas no terço anterior do esôfago e os exemplares maiores apresentavam 13 uma expansão em forma de bolsa no final do intestino grosso. Essa bolsa apresentou histologia diferente do resto do intestino grosso e foi sugerido como adaptação para favorecer a atividade celulolítica com o crescimento dos quelônios. Quanto às papilas no esôfago, podem prevenir a regurgitação de alimentos devido à mudança de pressão durante a imersão, macerar determinados alimentos ou representar adaptação ao ambiente aquático, pois jabutis não apresentaram estas estruturas. O estômago e o intestino delgado representam importante papel na digestão, representando, respectivamente, 70,6% e 15,1% do conteúdo do trato. O intestino grosso representa 14,3% do conteúdo total. A presença de papilas no esôfago de Podocnemidae, incluindo Podocnemis expansa, P. unifilis e P. sextuberculata, já havia sido relatada por Vogt et al. (1998). Elas atuariam como filtro, retendo pedaços de partículas ingeridos quando os animais expelem água durante a neustofagia e não se apresentariam na família Chelidae. Segundo Belkin & Gans (1968), neustofagia é uma estratégia alimentar de alguns Podocnemidae os quais ingerem partículas suspensas na água com o pescoço num ângulo de 45º em relação à superfície e abrem a boca por um tempo, depois fechando com a ingestão das partículas. Os autores encontraram este comportamento estudando P. unifilis. Luz et al. (2003b) estudaram exemplares de Podocnemis expansa com média de 592,56 g de peso e 16,41 cm de comprimento de carapaça. O estômago se apresentou como maior volume do trato digestório, com 44,2%, seguidos pelo intestino delgado e intestino grosso com 28,68% e 20,93%, respectivamente. O estômago ainda apresentou capacidade de armazenamento em relação ao trato de 69,65% e, junto com o intestino delgado, desempenham importante função na digestão dos alimentos. O comprimento 14 do trato gastrointestinal, do intestino delgado e do intestino grosso foi de 72,75 cm, 46,68 cm e 13,99 cm, respectivamente. Segundo Malvasio (2001), o esôfago de Podocnemis é um tubo longo, cilíndrico, cor bege, limitando-se cranialmente com a cavidade oral e caudalmente com o estômago, estendendo-se ao longo do terço cranial da cavidade pleuroperitoneal, acoplado à face ventral da aorta dorsal e dorsal ao coração. O estômago apresenta cor bege, forma de C invertida, cilíndrico em P. sextuberculata. Em P. expansa e P. unifilis, observa-se uma constrição mediana, definindo as porções cranial e caudal. A porção cranial é proporcionalmente expandida e com paredes mais espessas e a porção caudal é cilíndrica e com paredes finas, seguida pelo intestino. O intestino é tubular, cor bege e ocupa os dois terços caudais da cavidade pleuroperitoneal. O intestino delgado apresenta várias alças intestinais, sendo a mais cranial, a duodenal. Nesta região desembocam os ductos biliares e pancreáticos. O intestino grosso e o reto se abrem ventralmente à cloaca. Produtores de enzimas, o fígado é conspicuamente desenvolvido e ocupa a maior porção do antímero direito da cavidade visceral, e o pâncreas apresenta formato alongado e cor esbranquiçada, ficando entre a face medial do estômago e a face cranial do duodeno. Exemplares recém eclodidos apresentaram o saco vitelínico aderido ao intestino delgado. P. expansa com menos de 1 ano (5,57 cm de comprimento de carapaça e 30,17 g de peso vivo) apresentaram intestino delgado com 9,14 cm e intestino grosso com 2,15 cm, com 1 a 5 anos (10,06 cm de comprimento de carapaça e 173,08 g de peso vivo) apresentaram intestino delgado com 20,02 cm e intestino grosso com 3,91 cm e com mais de 5 anos (25,96 cm de comprimento de carapaça e 2,03 kg de peso vivo) apresentaram intestino delgado com 51,70 cm e intestino grosso com 13,1 cm. P. unifilis com menos de 1 ano (4,25 cm de comprimento de carapaça e 16,16 g de peso vivo) apresentaram intestino delgado com 7,87 cm e intestino grosso com 1,86 cm, 15 com 1 a 5 anos (8,69 cm de comprimento de carapaça e 121,39 g de peso vivo) apresentaram intestino delgado com 15,49 cm e intestino grosso com 4,15 cm e com mais de 5 anos (14,44 cm de comprimento de carapaça e 429,05 g de peso vivo) apresentaram intestino delgado com 39,62 cm e intestino grosso com 9,7 cm. P. sextuberculata com menos de 1 ano (4,34 cm de comprimento de carapaça e 12,1 g de peso vivo) apresentaram intestino delgado com 5,1 cm e intestino grosso com 1,64 cm. A relação entre o comprimento do intestino e o comprimento da carapaça foi de 2,03 para animais com menos de 1 ano, 2,38 para animais de 1 a 5 anos e 2,5 para animais com mais de 5 anos para P. expansa, 2,29 para animais com menos de 1 ano, 2,27 para animais de 1 a 5 anos e 3,42 para animais com mais de 5 anos para P.s unifilis e 1,55 para animais com menos de 1 ano para P. sextuberculata. Estas relações sugerem que o aumento no tamanho do intestino pode estar relacionado ao maior consumo de vegetal com o aumento da idade (Malvasio, 2001). Segundo Pough et al. (2004), a maioria dos répteis são carnívoros, alguns onívoros e poucos estritamente herbívoros. Plantas são consumidas por alguns lagartos e quelônios, sendo que os animais onívoros selecionam as partes mais digestíveis das plantas, principalmente frutos e flores, que estão disponíveis sazonalmente, com estes animais utilizando-as oportunisticamente. A tartaruga-da-Amazônia é um animal onívoro oportunista, predominantemente herbívoro. O espectro de itens de que se alimenta é amplo e inclui frutos, flores, sementes, talos, raízes e folhas arbóreas e herbáceas, além de insetos, crustáceos, moluscos e peixes (Luz, 2005). Segundo Molina & Rocha (1996), são predominantemente herbívoras na natureza, aceitando carne e peixe em cativeiro. Para Ernst & Barbour (1989), são predominantemente herbívoras, comendo frutos, flores, raízes e plantas aquáticas, e aceitando carne e peixe em cativeiro. Pritchard & Trebbau 16 (1984) observaram que o conteúdo estomacal de Podocnemis expansa apresentava dieta herbívora e pequena quantidade de alimentos de origem animal. Segundo Mader (1996), onívoros mamíferos se alimentam mais de proteína e gordura durante o crescimento do que adultos em manutenção, sendo que jovens répteis podem apresentar esta mesma exigência. Quelônios aquáticos onívoros, por exemplo, se alimentam mais de peixe (proteína e gordura) do que plantas (carboidratos) quando jovens e crescem mais rápido com níveis mais altos de proteína. Essa necessidade de proteína animal nos jovens e a mudança de hábito com a idade foi observada para Chelonia mydas (Wood & Wood, 1981) e para Trachemys scripta (Clark & Gibbons, 1969; Hart, 1983). C. mydas é carnívora durante o primeiro ano de vida e muda gradualmente para dieta vegetal com aumento da idade, sendo predominantemente herbívora quando adulta, digerindo bem a celulose. T. scripta também são mais carnívoros quando jovens, mudando gradualmente a dieta e se tornando herbívoros ou carnívoros oportunistas quando adultos. Segundo Clark & Gibbons (1969), a mudança na dieta pode estar relacionada aos níveis de cálcio na dieta e na carapaça. Na carapaça, há diferença de baixo cálcio nos jovens e alto cálcio nos adultos. Nos alimentos animais, o teor de cálcio é substancialmente mais alto e, durante os primeiros dois anos, os animais aumentam o teor de cálcio na carapaça, aumentando a dureza da carapaça e apresentando maiores condições de sobrevivência. Malvasio (2001) estudou o comportamento e preferência alimentar da Podocnemis expansa, P. unifilis e P. sextuberculata em cativeiro. A dieta continha verduras, frutas, outros vegetais, peixe e carne bovina, além de presas vivas (minhocas, grilos e tenébrios) e foram observados animais com menos de 1 ano, de 1 a 5 anos e com mais de 5 anos. O comportamento foi semelhante entre as espécies e faixa etárias e as fases compreendem o forrageio, perseguição, apreensão, dilaceração e ingestão para presas 17 vivas e as fases de forrageio, aproximação, reconhecimento olfativo, apreensão, dilaceração e ingestão para alimentos sem mobilidade. A apreensão se dá pelo abocanhamento, sendo que algumas vezes há sucção da presa inteira. Foi observado neustofagia em P. unifilis. A localização dos alimentos e presas provavelmente se dá pela visão e olfato e a dilaceração ocorre com auxílio dos membros anteriores alternadamente. A ingestão se dá por sucção gradual por meio de movimentos com a boca e a cabeça. Foi observado cleptoparasitismo, onde mesmo com disponibilidade uma espécie tentava tirar o alimento que estava com a outra. Quando o alimento foi fornecido fora da água, a apreensão acontecia fora e todas as outras fases aconteciam dentro da água. As três espécies apresentaram comportamento de limpeza bucal, onde movimentam os membros anteriores sobre a cabeça e a boca para eliminar restos alimentares. No estudo sobre preferência alimentar, foram fornecidos carne, couve, tomate, cenoura, mamão e maçã. Ocorreu aumento significativo no consumo de vegetais com o aumento da idade e os animais tiveram preferência pelo alimento fornecido dentro da água. P. expansa menores que 1 ano consumiram 19,1% de vegetais e 80,9% de carne, de 1 a 5 anos consumiram 36,7% de vegetais e 66,3% de carne e com mais de cinco anos consumiram 51,6% de vegetais e 48,4% de carne. P. unifilis menores que 1 ano consumiram 27,4% de vegetais e 72,6% de carne, de 1 a 5 anos consumiram 30,8% de vegetais e 69,2% de carne e com mais de cinco anos consumiram 36,8% de vegetais e 63,2% de carne. P. sextuberculata menores que 1 ano consumiram 1% de vegetais e 99,0% de carne. P. expansa e P. unifilis apresentaram hábitos onívoros e P. sextuberculata apresentou hábito carnívoro em cativeiro (Malvasio, 2001). Phrynops geoffroanus e Phrynops hilarii, espécies predominantemente carnívoras da família Chelidae, apresentam as mesmas fases de comportamento e cleptoparasitismo em cativeiro (Molina, 1990; Molina et al., 1998). 18 Almeida et al. (1986) estudaram o conteúdo estomacal e realizaram levantamento junto aos habitantes locais sobre as espécies utilizadas pelos quelônios do gênero Podocnemis, no Baixo Rio Xingu, Estado do Pará. Foram identificadas 32 espécies vegetais, pertencentes às famílias Leguminosae (21,87%), Gramineae (12,5%), Nymphaeaceae, Palmae e Pontederiaceae (6,25%), Annonaceae, Cabombaceae, Polygonaceae, Sapotaceae, Chrysobalanaceae, Onagraceae, Euphorbiaceae, Simaroubaceae, Scrophulariaceae, Rubiaceae, Alismataceae, Eriocauleaceae, Cyperaceae, Marantaceae e Araceae (3,12%). Também foi identificado o consumo de Algae. Entre as espécies há plantas de várzea ou aquáticas, com hábitos arbóreos, arbustivos, herbáceos e sarmentosos. Cerca de 53,1% das espécies é consumida na forma de planta inteira e animais mais jovens preferem plantas aquáticas, de deglutição mais fácil. Frutos representam 34,4% e sementes representam 12,5% da dieta. Foram identificadas Cabomba pubescens, Polugonum acuminatum, Campsandra laurifolia, Couepia paraensis, Macrolobium pendulum, Hevea brasiliensis, Genipa spruceana, Paspalum repens, Thalia geniculata, Astrocaryum jauari, Montrichardia linifera, Eichhornia crassipes, Eichhornia azurea, Hymenachne amplexicaulis, entre outras. O hábito mais diversificado foi observado por P. expansa, com a utilização de 97,0% das plantas levantadas, seguido por P. unifilis e P. sextuberculata, que utilizam, respectivamente, 84,3% e 62,5% das plantas levantadas. Portal et al. (2002) estudaram as espécies vegetais utilizadas por Podocnemis unifilis na região do Pracuúba, Estado do Amapá, por meio de entrevistas com moradores das margens dos rios e lagos das áreas estudadas. Foram identificadas 35 espécies de plantas que provavelmente fazem parte da dieta dos tracajás. As espécies estão distribuídas em 21 famílias, sendo as mais representativas a Leguminosae (22,81%), Gramineae (8,57%), Pontederiaceae, Rubiaceae, Palmae, Burseraceae e 19 Meliaceae (5,71%). Araceae, Borraginaceae, Polygonaceae, Nymphaeaceae, Chrysobalanaceae, Annonaceae, Simaroubaceae, Sapindaceae, Myrtaceae, Melastomataceae, Ochnaceae, Myrsinaceae, Commelinaceae e Marantaceae contribuem com uma espécie (2,85%). Dentre as espécies identificadas, 12 apresentam teor de proteína maior que 10,0%, quatro teor de lipídio maior que 10,0%, nove teor elevado de fibra bruta, seis mais que 5,0% de matéria mineral, seis mais que 1,0% de cálcio e cinco mais que 0,2% de fósforo. Como fonte de proteína se destacam Commelina longicaulis, Polyganun acuminatum, Aeschymene sensitiva, Macrolobium aeaciaefolium e Oryza grandiglumes, respectivamente com teores de 20,78%, 20,19%, 18,93%, 17,06% e 15,0%. Como fonte de lipídio se destacam Cordia tetrandia, Psychotria ceysulina e Paulinia pinata, com teores de 26,0%, 12,7% e 11,1%. Como fonte de fibra se destacam Inga edulis, Protium opacum, Oryza alta, Eichhornia crassipes e Hymenachne amplexicaulis, com teores de 41,80%, 40,00%, 37,80%, 35,0% e 33,0%. Como fonte de cálcio se destacam Genipa sp., Eichhornia azurea, Eichhornia crassipes, Anona sp. e Aeschymene sensitiva, com teores de 1,9%, 1,64%, 1,6%, 1,44% e 1,07%. Como fonte de fósforo se destacam Astrocaryum jauari, Eichhornia azurea, Psychotria ceysulina, Oryza grandiglumes e Cordia tetrandia com teores de 2,18%, 0,35%, 0,23%, 0,21% e 0,21%. Pérez-Emán & Paolillo (1997) estudaram o conteúdo estomacal de Peltocephalus dumerilianus nos rios Yagua e Atacavi, na Venezuela. Também foram observados os restos intestinais e realizadas entrevistas com os indígenas da região. Cerca de 41,0% dos animais apresentavam o estômago vazio, não havendo relação com a flutuação nos níveis do rio (estação seca e chuvosa), sexo, tamanho, técnica de captura ou área de estudo. Frutos e sementes foram os componentes mais diversos da dieta, aparecendo com 19 espécies. A família encontrada com maior freqüência foi a Arecaceae (palmas), 20 também havendo frutos e sementes das famílias Annonaceae, Apocynaceae, Caesalpinaceae, Chrysobalanaceae, Combretaceae, Convolvulaceae, Euphorbiaceae, Lauraceae, Leguminosae, Ochnaceae, Rubiaceae e Sapotaceae. Plantas aquáticas também contribuem substancialmente com a dieta, sendo a família Araceae a mais freqüente. Aparecem ainda plantas das famílias Cyperaceae, Eriocauleaceae, Rapateaceae, Thurniaceae e Xyridaceae. As espécies mais freqüentes foram Montrichardia arborescens, Mauritia flexuosa, Parinari campestris e Thurnia polycephala. Não houve diferença na dieta entre os sexos e houve variação na dieta entre os rios. Os animais apresentaram grande quantidade de matéria animal, indicando serem onívoras. A proporção de matéria animal, inclusive, foi superior com relação a Podocnemis expansa, P. unifilis, P. sextuberculata e P. vogli. Os alimentos muitas vezes foram encontrados inteiros, indicando que esta espécie também funcionaria como dispersora de sementes. O conteúdo estomacal de cinco espécies de quelônios foi estudado no rio Guaporé, Costa Marques, Estado de Rondônia. P. unifilis consumiram 89,46% de vegetais e apenas 1,15% de matéria animal, com a dieta composta de 39,0% de frutos e sementes, 28,6% de unidades vegetais não identificados, 9,4% de talos e brotos, 1,4% de folhas, 0,8% de raízes e 1,1% de matéria animal. As famílias de plantas Convolvulaceae, Leguminosae, Euphorbiaceae e Poaceae foram encontradas, respectivamente, em 73,01%, 53,97%, 48,01% e 36,07% dos conteúdos. Também foram encontrados itens das famílias Sapotaceae, Ebenaceae, Ulmaceae, Moraceae, Phytolaceae, Annonaceae, Lauraceae, Menispermaceae, Quiinaceae, Bonnetiaceae, Meliaceae, Malpighiaceae, Polygalaceae, Aquifoliaceae, Celastraceae, Violaceae, Myrtaceae, Lecythidaceae, Melastomataceae, Myrsinaceae, Rubiaceae, Lentibulariaceae, Pontederiaceae e Cyperaceae, além de Monocotyledonea e Chlorophyta. A matéria animal continha 21 insetos, crustáceos, moluscos e, principalmente, peixes, que foi mais importante em animais jovens. Não houve diferença entre os conteúdos nas estações de vazante e cheia e os machos se alimentaram mais de talos, enquanto as fêmeas preferiram frutos e sementes. P. expansa consumiram 97,6% de vegetais e apenas 0,004% de peixes. A dieta incluía 25,1% de frutos e sementes e 72,5% de folhas e talos de plantas não identificadas. As frutas pertenciam às famílias Leguminosae, Euphorbiaceae e Convolvulaceae e as sementes às famílias Annonaceae, Leguminosae, Sapotaceae e Rubiaceae. No entanto, poucos exemplares foram observados. Phrynops geoffroanus consumiram 47,96% de matéria animal e 51,65% de vegetais, sendo 35,6% de sementes de frutos, 1,9% de algas, 0,1% de folhas, 14,1% de matéria vegetal não identificada, 29,8% de peixes, 10,5% de insetos, 4,6% de camarões, 2,4% de caranguejos e 0,6% de anfíbios. Batrachemys raniceps consumiram 69,4% de gastrópodes, 13,9% de crustáceos e 16,7% de vegetais, sendo 14,71% da família Myrtaceae. Chelus fimbriatus se alimentaram 100,0% de peixe (Teran, 1992; Teran et al., 1995). Moskovits & Bjorndal (1990) estudaram a preferência alimentar em Geochelone carbonaria e G. denticulata, na Ilha de Maracá, Estado de Roraima. A dieta não difere entre as espécies, que se alimentam de gramas, folhas, videiras, raízes, frutas, cogumelos, restos de vertebrados, insetos, caracóis, terra, areia e seixo. Os alimentos mais consumidos foram os frutos (46,7%), seguidos pelas flores (26,45%), talos, folhas e raízes (12,9%), terra, areia e seixos (6,55%), folhas mortas (4,3%), cogumelos (2,1%) e animais (1,0%). Dentre as frutas e flores, foram identificadas espécies das famílias Anacardiaceae, Annonaceae, Araceae, Bromeliaceae, Burseraceae, Chrysobalanaceae, Lecythidaceae, Melastomataceae, Moraceae, Passifloraceae, Palmae, Rubiaceae, Sapotaceae, Theophrastaceae, Bignoniaceae e Cochlospermaceae. Os alimentos aceitos, constantes na floresta, são ricos em fibra bruta e pobres em proteína, fósforo e minerais, 22 com cálcio abundante e alta relação Ca:P. No entanto, os jabutis não pegam o primeiro alimento que encontram. Eles forrageiam, reconhecem os alimentos com o olfato e são capazes de selecioná-los. E os alimentos preferidos por estas espécies apresentam bons níveis de proteína, fósforo e minerais e baixos níveis de fibra bruta, cálcio e relação Ca:P. Primariamente oportunistas, se alimentando de acordo com a dieta oferecida na estação ou região, ingerem itens variados buscando adequado balanço de nutrientes. Ainda podem funcionar como efetivos dispersores de sementes, uma vez que apresentam tendência a engolir alimentos inteiros. Oftedal & Allen (1995) estudaram a influência do potássio na perda de nitrogênio em Gopherus agassizi. Os alimentos vegetais no deserto apresentam elevados teores de potássio, mas vários répteis herbívoros de regiões áridas apresentam glândulas especializadas para excreção do excesso de potássio. No caso dos jabutis do deserto, a excreção desse excesso de potássio se dá pela urina, o que provoca perda de nitrogênio e água. Testando diferentes níveis de potássio na dieta em cativeiro, com água a vontade, houve preferência pelas dietas com menores teores do mineral (80,0% ou mais do total ingerido) e os animais parecem descriminar os alimentos e evitar dietas com alto teor de potássio. Quando as dietas foram oferecidas separadas, sem possibilidade de escolha dos animais, o consumo foi inverso ao aumento no teor de potássio. Com relação às perdas de nitrogênio nas excretas, foi encontrado 37,0% de perda de nitrogênio para a dieta com 0,5% de potássio, 56,0% para dieta com 1,6% de potássio, 66,0% para dieta com 2,7% de potássio e 93,0% para dieta com 3,8% de potássio. Rodrigues (2003) estudou a composição nutricional da dieta de Podocnemis expansa na Reserva Biológica do Rio Trombetas, Estado do Pará. Os animais, de hábitos onívoros com preferência por vegetais, consumiram 68,0% de plantas e 4,0% de matéria animal. Entre os vegetais se destacaram as folhas, seguido de sementes, talos e 23 palmitos. Entre a matéria animal existiam principalmente ossos e moluscos. A dieta apresentou 16,84% de proteína bruta, 6,5% de extrato etéreo, 16,85% de fibra bruta, 36,05% de matéria mineral e 6087 kcal/kg de energia bruta. Segundo Mader (1996), répteis herbívoros consomem de 15,0% a 35,0% de proteína, menos que 10,0% de extrato etéreo, mais que 50,0% de carboidratos e de 10,0% a 40,0% de fibra. Segundo Gaspar & Filho (2001), a carne de tartaruga-da-Amazônia apresenta teor de proteína de 17,39%, valor semelhante à maioria dos animais domésticos. No entanto, apresenta baixo teor calórico, 85,99 kcal/100g, e reduzido teor de gordura, 1,83%. Apresenta ainda 78,8% de umidade e 0,91% de matéria mineral. O rendimento de carcaça foi de 30,0%. Luz et al. (2003a), com animais com 592,56 g de peso e 16,41 cm de comprimento de carapaça encontrou rendimento de carcaça de 29,87%, com 19,71% de carapaça, 4,99% de gordura, 16,76% de vísceras e 2,9% de fígado. A carne apresentou 22,3% de matéria seca, 17,38% de proteína bruta e 1,09% de extrato etéreo. Rodrigues (2003) encontrou rendimento de carcaça de 23,69% em animais com média 36,83cm. No entanto, eram animais de vida livre e utilizavam dieta natural, dependente de disponibilidade. Vianna (1999) estudou filhotes de Podocnemis unifilis com 28,7 g e 4,66 cm de comprimento de carapaça e filhotes de Trachemys dorbigni com 48,7 g e 5,77 cm de comprimento de carapaça e testou níveis de proteína bruta de 21,0%, 26,0% e 31,0% para o desempenho e digestibilidade da dieta pelas espécies. As rações eram isocalóricas, peletizadas e continham farelo de soja, farelo de arroz, farelo de trigo, milho, farinha de peixe, farinha de carne, fosfato bicálcico e suplemento vitamínico. Para P. unifilis, durante os primeiros 90 dias, com a temperatura da água em torno de 25,0oC devido o inverno, o crescimento foi menor e a ração com 26,0% se apresentou melhor para o comprimento, largura e altura da carapaça. No entanto, não houve efeito 24 dos níveis de proteína no peso. Entre 120 e 210 dias houve efeito linear dos níveis para comprimento, largura e a altura da carapaça e peso, indicando que a ração com 31,0% se mostrou mais adequada nos períodos com temperaturas mais elevadas. Aos 240 dias houve efeito dos níveis apenas para comprimento e largura da carapaça, o que pode indicar diminuição na necessidade protéica com aumento da idade ou peso corporal. Os resultados foram parecidos para T. dorbigni, mas a ração mais adequada para o inverno foi a de 21,0%. Nos períodos mais quentes pode ser usada a ração com 31,0% de proteína e depois de 210 dias este nível pode ser diminuído. Os coeficientes de digestibilidade aparente da proteína e energia apresentados por P. unifilis foram, respectivamente, 92,83% e 92,49% para ração com 21,0% de proteína bruta, 90,79% e 88,52% para ração com 26,0% de proteína bruta e 89,91% e 88,37% para ração com 31,0% de proteína bruta. Para T. dorbigni os coeficientes de digestibilidade aparente da proteína e energia foram, respectivamente, 93,03% e 90,65% para ração com 21,0% de proteína bruta, 88,13% e 80,67% para ração com 26,0% de proteína bruta e 89,18% e 82,03% para ração com 31,0% de proteína bruta. Não houve diferença para os coeficientes que, no entanto, tiveram a digestibilidade diminuída com o aumento nos níveis de proteína. Durante o estudo foi observado crescimento alométrico dos animais e, além da temperatura da água, a sazonalidade pode ter influenciado os resultados. Anfíbios e répteis aproveitam energia e nutrientes com a mesma eficiência de aves e mamíferos, diferindo dos endotérmicos na velocidade de processamento do alimento (mamíferos processam 10 vezes mais rápidos que os répteis), provavelmente devido à área de absorção de seus intestinos. No entanto, répteis necessitam menos energia que os mamíferos. Carnívoros usam primariamente gordura e proteína como fonte de energia, herbívoros usam mais carboidratos solúveis e fibras e onívoros usam mistura de proteína, gordura e carboidratos. A utilização de energia varia nas espécies conforme a 25 estação, temperatura e alimentos disponíveis. Quelônios aquáticos utilizam a glicólise anaeróbica durante períodos de temperaturas frias e ciclo de ácido cítrico e beta- oxidação durante períodos mais quentes (Mader, 1996; Pough et al., 2004). Segundo Stone & Moll (2006), a habilidade de aproveitar energia da dieta é influenciada pela temperatura, tempo de trânsito, taxa de consumo, qualidade e processo físico do alimento. Assim, estudaram o desempenho e o aproveitamento de dietas com amoras (Rubus allegheniensis), morangos comerciais (Fragaria sp) e “mayapples” (Podophyllum peltatum), frutos presentes na dieta natural das espécies, pelos quelônios Terrapene ornata (principalmente carnívora) e Terrapene carolina triunguis (ingere grandes proporções de plantas). O ganho de massa não diferiu entre os tratamentos, mas o tempo de trânsito foi afetado pelas dietas. O morango apresentou o maior tempo de trânsito, seguido pelo “mayapple” e pela amora, que não diferiram significativamente entre si. Em T. carolina triunguis, o tempo de trânsito variou com as dietas, mas não houve diferença significativa para T. ornata. O hábito carnívoro da última espécie pode ter influenciado nos resultados, uma vez que a dieta experimental foi à base de frutas. O tempo de trânsito variou de 5 a 10 dias para amora e “mayapple” e foi de mais de 10 dias para o morango, sendo que houve diferença significativa no tempo de trânsito do morango para T. carolina triunguis em relação a T. ornata. Quanto aos coeficientes de digestibilidade da energia, o morango se apresentou superior a amora, mas não diferiu do “mayapple”, que foi significativamente superior a amora. Os coeficientes variaram de 88,0% a 97,0%, valores considerados altos para espécie. T. carolina triunguis apresentou maior digestibilidade da energia do morango e T. ornata da energia do “mayapple”. Os autores apresentaram a hipótese de interferência dos teores de fibra nos resultados. No entanto, esta não foi determinada no estudo. 26 Avery et al. (1993) estudaram o efeito da proteína bruta e da temperatura no crescimento, consumo e eficiência digestiva de Trachemys scripta. As rações foram preparadas com farelo de soja, farinha de carne e milho, sendo que a farinha de carne foi eliminada nas rações com menores teores de proteína. O crescimento (peso, comprimento e largura de carapaça e plastrão) foi maior nas rações com 25,0% e 40,0% de proteína, que não diferiram entre si, quando comparados com a ração com 10,0%, que ainda apresentou perda de peso no período final do estudo. Por ser carnívoro, T. scripta talvez necessite de dietas com mais proteína animal, o que explicaria o baixo ganho da dieta com 10,0% de proteína, sem farinha de carne. No estudo sobre a influência da temperatura, apenas 61,0% dos animais se alimentaram e produziram fezes quando a temperatura foi 15,0oC. Quando a temperatura foi de 22,0oC, 89,0% dos animais se alimentaram e quando as temperaturas foram de 28,0oC e 34,0oC, 100,0% se alimentaram. O tempo de passagem foi de mais de seis dias a 15,0oC e menos de dois dias a 34,0oC. Houve diferença significativa no consumo entre as temperaturas, com aumento no consumo à medida que aumentou a temperatura. O teor de proteína também afetou o consumo, mas não afetou a digestão, que foi afetada pela temperatura. A temperatura afetou a eficiência digestiva dos animais, mas a dieta sozinha não apresentou efeito significativo na digestibilidade e não houve interação entre a temperatura e a dieta. Os coeficientes de digestibilidade da energia de 99,5% para 15,0oC, 98,3% para 22,0oC, 94,8% para 28,0oC e 95,8% para 34,0oC são elevados quando comparados com outras espécies. Best & Souza (1984) testaram quatro níveis de proteína bruta para Podocnemis expansa com até um ano de idade. Os melhores resultados foram obtidos com a dieta com 70,0% de proteína, com peso de 221,4 g, 0,0% de mortalidade, ganho de peso de 0,71 g/dia e eficiência de utilização de 47,8 g/100g ração. Os piores resultados foram 27 obtidos pela dieta com 80,0% de proteína, com 165,4 g de peso, 3,3% de mortalidade, 0,5 g/dia de ganho de peso e menor eficiência de utilização. O segundo melhor desempenho se deu com a dieta com 60,0% de proteína, seguido pela dieta com 40,0% de proteína. Estes valores, no entanto, estão elevados para a realidade desta espécie. Oliveira et al. (2002) testaram três níveis de proteína e dois níveis de energia e avaliaram o desempenho de Podocnemis expansa, P. unifilis e P. sextuberculata. O maior ganho de peso se deu com a dieta com 20,0% de proteína (0,52 g/dia), seguida pela dieta com 40,0% de proteína (0,49 g/dia) e com 30,0% de proteína (0,49 g/dia). Para energia, o maior ganho se deu com a dieta contendo 3500 kcal/kg, que apresentou ganho de peso de 0,54 g/dia. A dieta contendo 4500 kcal/kg apresentou ganho de 0,47 g/dia. Entre as espécies, P. expansa apresentou tendência a obter maior ganho de peso, com 1,51 g/dia. Em seguida vieram P. unifilis e P. sextuberculata com, respectivamente, 1,19 g/dia e 0,59 g/dia. Sá et al. (2004) testaram cinco rações com diferentes níveis de proteína de origem vegetal e uma ração comercial para peixe com proteína de origem animal para Podocnemis expansa. As rações preparadas continham farelo de soja, farelo de trigo, milho, farelo de algodão, farelo de arroz, farinha de ostras, fosfato bicálcico, suplemento vitamínico e sal comum, com níveis de 18,0%, 21,0%, 24,0%, 27,0% e 30,0% de proteína vegetal, com níveis de energia e fibra semelhantes. A ração comercial apresentava 30,0% de proteína animal. O peso corporal foi superior na ração com 30,0% de proteína animal, seguida pelas rações vegetais com 27,0%, 30,0%, 24,0%, 21,0% e 18,0%. O comprimento da carapaça foi superior na ração com 30,0% de proteína animal, seguida pelas rações vegetais com 30,0%, 27,0%, 24,0%, 21,0% e 18,0%. A largura da carapaça foi superior na ração com 30,0% de proteína animal, seguida pelas rações vegetais com 24,0%, 30,0%, 27,0%, 21,0% e 18,0%. O 28 comprimento do plastrão foi superior na ração com 30,0% de proteína animal, seguida pelas rações vegetais com 30,0%, 27,0%, 18,0%, 24,0% e 21,0%. A largura do plastrão foi superior na ração com 30,0% de proteína animal, seguida pelas rações vegetais com 27,0%, 30,0%, 18,0%, 24,0% e 21,0%. Lima (1998) testou rações com diferentes níveis de proteína animal e vegetal para Podocnemis expansa e encontrou melhores resultados com a dieta com equilíbrio entre os níveis de proteína animal e vegetal. As fontes de proteína animal e vegetal foram, respectivamente, a farinha de peixe e o farelo de soja, sendo que as rações foram peletizadas e ainda continham fubá de milho, farinha de trigo, farinha de carne e ossos e suplemento vitamínico. A ração com 50,0% de proteína animal e 50,0% de proteína vegetal proporcionou maior peso final, ganho de peso, comprimento, largura e altura da carapaça e comprimento do plastrão. Em seguida vieram as rações com 75,0% de proteína animal, 100,0% de proteína animal e 75,0% de proteína vegetal. Os piores resultados foram proporcionados pela dieta com 100,0% de proteína vegetal. A menor mortalidade se deu com a dieta com 50,0% de proteína animal e 50,0% de proteína vegetal, seguida pelas dietas com 100,0% de proteína vegetal, 75,0% de proteína animal e 75,0% de proteína vegetal. A dieta com 100,0% de proteína animal resultou em 55,0% de mortalidade. Um dos poucos quelônios com informação sobre a exigência de cálcio e fósforo em cativeiro é a tartaruga de casco mole Pelodiscus sinensis, espécie aqüícola de alto valor nos países da Ásia. Huang et al. (2003) avaliaram o desempenho desta espécie com dietas a base de farinha de peixe com diferentes níveis de cálcio e fósforo. Foram testados os níveis de 4,7%, 5,1%, 5,5%, 5,7% e 6,6% de cálcio e 2,7% e 3,0% de fósforo. O maior ganho de peso e a melhor conversão alimentar foram obtidos com a dieta com 5,7% de cálcio e 3,0% de fósforo. O tratamento controle, com 4,7% de cálcio 29 e 2,7% de fósforo apresentou os maiores teores de matéria mineral e cálcio na carne, no entanto apresentou o menor ganho de peso e pior conversão alimentar, o que indica que essa dieta é suficiente para manter o nível de cálcio, mas não para o máximo crescimento. Os altos níveis de cálcio e fósforo na dieta, maiores que os encontrados nos alimentos naturais são justificados pelo fato de 65,0% da carapaça ser mineral e o cálcio ser dominante. Também são atribuídos ao fato dos quelônios, ao contrário dos peixes, não dependerem do cálcio presente na água. Essa hipótese foi suportada pela melhora nos resultados de desempenho com o aumento dos níveis de cálcio, mesmo a água apresentando concentrações de cálcio de 18,3 mg/L. Os autores, por fim, ressaltaram a necessidade da realização de estudos sobre a disponibilidade destes minerais nos alimentos utilizados nas dietas em cativeiro. Pelodiscus sinensis ainda teve testado por Saad et al. (2003) a sobrevivência e crescimento de seus filhotes com dietas contendo resto de peixe e rações peletizadas a base farinha de peixe, farinha de vísceras de aves e uma mistura de farinha de peixe e farinha de vísceras. Não houve diferença na sobrevivência, que foi de 97,2% para restos de peixe, 91,7% para farinha de peixe, 97,2% para farinha de vísceras de aves e 100,0% para dieta mistura. O ganho de peso, ganho de comprimento de carapaça e conversão alimentar foi pior para farinha de vísceras de aves, sendo que nos outros tratamentos não diferiram entre si. O ganho de peso, de comprimento de carapaça e a conversão alimentar foram, respectivamente, 10,8 g, 1,85 cm e 2,5 para farinha de peixe, 4,9 g, 1,09 cm e 4,8 para farinha de vísceras de aves e 12,3 g, 1,95 cm e 2,3 para mistura das duas farinhas. A dieta com restos de peixe determinou ganho de peso de 9,6 g e ganho de comprimento de carapaça de 1,68 cm. Os valores baixos da farinha de vísceras foram atribuídos à deficiência de alguns aminoácidos essenciais. No entanto, quando misturada com a farinha de peixe, foram obtidos os melhores resultados, o que pode ser 30 devido ao nível de 50,0% de proteína que a dieta apresentou, considerado o essencial para a espécie. Com isso, a farinha de vísceras de aves pode substituir parte da farinha de peixe. Para o desenvolvimento de dietas adequadas para os quelônios, um dos caminhos é estudar o valor nutritivo dos alimentos utilizados como fontes de nutrientes e energia na ração desses animais, determinando-se a digestibilidade das fontes a serem estudadas. Segundo o NRC (1993), a digestibilidade é definida como a fração do nutriente ou da energia do alimento ingerido que não é excretada nas fezes. Ela pode ser determinada por meio de métodos diretos, que são as gaiolas metabólicas, ou indiretos. O método mais adequado para determinação de digestibilidade na aqüicultura é o método indireto com uso de indicadores, que são substâncias presentes ou adicionadas ao alimento que não são digeridas pelos animais. Com a quantidade desse indicador presente nas fezes e no alimento, é possível a determinação do coeficiente de digestibilidade aparente do alimento utilizando-se equação matemática. Cálcio e fósforo na alimentação animal O cálcio (Ca) é um elemento metálico branco prateado encontrado em rochas como a greda, pedra calcária e mármore. Metal alcalino, apresenta 40,08 de peso atômico e seu número atômico é 20. É o quinto elemento mais abundante, ocorrendo em 3,64% da crosta terrestre, nas formas de carbonato de cálcio, fluoreto de cálcio e sulfato de cálcio. No organismo animal, é o mineral mais abundante e aparece em 1,0 a 2,0% do corpo do animal, sendo que 99,0% do cálcio está presente nos ossos e dentes (McDowell, 1992). Sua principal função é plástica e está ligada a formação do tecido ósseo e ossificação. Também apresenta funções dinâmicas como manutenção da 31 permeabilidade normal das células, auxiliando no controle da pressão osmótica, coagulação sanguínea, regulação da contratibilidade dos músculos, retardando a fadiga muscular, transmissão de impulsos nervosos, participando da regulação da excitabilidade neuromuscular, regulação cardíaca, atuação na produção animal (carne, leite, ovos) e ativação e estabilização de sistemas enzimáticos (Andriguetto et al., 1990). O fósforo (P) é um elemento obtido da apatita, presente em rochas ígneas (magmáticas) e sedimentares. Apresenta 30,97% de peso atômico e número atômico 15. Ocorre em 0,12% da crosta terrestre, na forma de vários compostos fosforados orgânicos ou minerais. É o segundo mineral mais abundante no organismo animal e representa cerca de 1,0% do corpo do animal, sendo que 80,0 a 85,0% do fósforo constituem os ossos e dentes (McDowell, 1992). Atua na constituição do esqueleto, gera energia para funções do organismo e constituição do tecido muscular, atua na absorção, deposição e utilização das gorduras, no metabolismo dos carboidratos, proteínas e outros minerais, é constituinte dos ácidos nucléicos DNA e RNA (hereditariedade e crescimento), de fosfoproteínas e fosfolipídios do sistema nervoso, participa do equilíbrio ácido-básico (sistema tampão), atua na produção animal (carne, leite, ovos), na reprodução dos animais e é essencial ao metabolismo e desenvolvimento da flora do rúmen (Andriguetto et al., 1990). A absorção de cálcio e fósforo parece que ocorre no duodeno, com absorção ativa e passiva (difusão). O mecanismo de absorção ativo está relacionado a adequadas quantidades de vitamina D no organismo animal. Níveis adequados dos dois minerais no organismo também interferem na absorção, sendo que o desequilíbrio de um deles acarreta problemas com o outro (McDoweel, 1992). A absorção de cálcio é influenciada por fatores intrínsecos dos animais e pela dieta. A fonte utilizada, o tamanho da partícula, o equilíbrio em vitamina D e a relação Ca:P da dieta influenciam a absorção 32 do cálcio. A presença de ácido fítico na dieta também reduz a disponibilidade do cálcio, uma vez que este é absorvido na forma iônica e o ácido fítico se liga a essa forma, originando compostos insolúveis (fitatos). Esse fósforo na forma de ácido fítico ainda se liga a proteínas e outros cátions como magnésio (Mg) e potássio (K), também os tornando indisponíveis. Esses compostos podem ser degradados pela fitase, produzindo ácido fosfórico e sais ortofosfatos. No entanto, a maioria dos monogástricos não produz essa enzima. A absorção do fósforo, além dos fatores já citados, é influenciada pelo estado nutricional, estado fisiológico e espécie animal (Ammerman et al., 1995). A excreção de cálcio se dá principalmente pelas fezes e a de fósforo pelas fezes nos herbívoros e pela urina nos carnívoros (McDoweel, 1992). O cálcio e o fósforo encontram-se presente na maioria dos alimentos, mas estão disponíveis principalmente nos ingredientes de origem animal e minerais, uma vez que a maioria dos cereais e grãos apresentam baixos teores de cálcio e fósforo na forma de ácido fítico. As principais fontes de origem animal são a farinha de carne e ossos, farinha de vísceras de aves, farinha de peixe, farinha de ossos calcinada e farinha de ostras. Dentre as fontes minerais estão o calcário, fosfato bicálcico, fosfato monocálcico e fosfato monoamônio. A farinha de carne e ossos é o produto do processamento de restos de abate, catação de açougues e desossa, que são picados, moídos e levados aos digestores. A farinha de vísceras de aves é o produto resultante do processamento de vísceras de aves, podendo incluir cabeça e pés, mas não penas e resíduos de incubatórios. A farinha de peixe, no Brasil, é proveniente de resíduos não comestíveis (cabeça, cauda, coluna e vísceras) ou peixes integrais rejeitados para o consumo humano. No Peru e no Chile, que exportam farinha de peixe para o Brasil, ela é preparada a partir de peixes integrais utilizados para este propósito. A farinha de ossos calcinada é resultante do 33 processamento de ossos de carcaças de frigoríficos e açougues isentas da maior parte dos tecidos. A farinha de ostras é oriunda da moagem de resíduos de ostras e é constituída principalmente de carbonato de cálcio. O calcário, fosfato bicálcico, fosfato monocálcico e fosfato monoamônio são fontes inorgânicas provenientes de jazidas (Butolo, 2002). Na Tabela 1 está apresentada a composição química dos principais alimentos utilizados como fonte de minerais em rações para animais (Rostagno et al., 2000). Tabela 1 - Composição química e valores energéticos de alguns alimentos utilizados na formulação de rações para animais Alimento MS (%) PB (%) EE (%) EB (kcal/kg) MM (%) Ca (%) P (%) F (%) FCO 92,5 40,69 11,82 3561 36,22 14,31 6,2 FV 91,0 58,0 11,5 4453 15,68 4,4 2,6 FP 92,18 54,53 7,52 4374 22,0 6,06 3,79 FOC 32,6 16,3 FO 36,7 CAL 38,4 FB 24,8 18,5 0,12 FM 18,6 20,5 0,63 FMA 24,0 0,23 FCO = farinha de carne e ossos, FV = farinha de vísceras de aves, FP = farinha de peixe, FOC = farinha de ossos calcinada, FO = farinha de ostras, CAL = calcário, FB = fosfato bicálcico, FM = fosfato monocálcico, FMA = fosfato monoamônio, MS = matéria seca, PB = proteína bruta, EE = extrato etéreo, EB = energia bruta, MM = matéria mineral, Ca = cálcio, P = fósforo, F = flúor Referências bibliográficas 34 ALFINITO, J. Preservação da tartaruga-da-Amazônia. Brasília: Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal, 1973. 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Foram utilizados 226 filhotes provenientes do Projeto Quelônios da Amazônia no Estado do Mato Grosso, mantidos em caixas plásticas com renovação de água e temperatura média de 29,0oC. Os CDA foram determinados pela utilização de dietas contendo 0,1% do marcador óxido de crômio III (Cr2O3). Os CDA da MM, Ca e P foram, respectivamente, de 69,32; 69,46 e 73,28% para FCO; 87,53; 92,48 e 92,19% para FV; 92,53; 95,83 e 94,93% para FP e 41,18; 81,01 e 54,46% para FB. Palavras–chave: cálcio, disponibilidade, fósforo, nutrição, Podocnemis expansa, quelônios 44 Calcium and phosphorus source and availability in the diet of the Arrau sideneck - Podocnemis expansa raised in captivity Abstract: Apparent availability coefficient (AAC) of the ash, calcium (Ca) and phosphorus (P) were studied in the Arrau sideneck. The sources of mineral material were meat and bone meal (MBM), poultry by-product meal (PBM), fish meal (FM) and dicalcium phosphate (DP). The turtles used were 226 hatchlings from Projeto Quelônios da Amazônia, State of Mato Grosso. Experimental animals were raised in plastic containers, with continuous water flow and mean temperature kept at 29.0oC. AAC was accessed by diets labeled with 0.1% of chromium oxide III (Cr2O3). The AAC of ash, Ca and P were, respectively, 69.32, 69.46 and 73.28% for MBM, 87.53, 92.48 and 92.19% for PBM, 92.53, 95.83 and 94.93% for FM and 41.18, 81.01 and 54.46% for DP. Keywords: availability, calcium, nutrition, phosphorus, Podocnemis expansa, sideneck turtles 45 Introdução Os quelônios surgiram há cerca de 200 milhões de anos atrás, antes dos mamíferos, pássaros, lagartos e serpentes. Grupo com característica singular, apresentam o corpo encaixado em um casco ósseo recoberto por uma camada de placas córneas. A parte ventral e plana é denominada plastrão e a parte dorsal e convexa é denominada carapaça. Como os demais répteis, são ectotérmicos, com sua temperatura corporal variando de acordo com a temperatura do meio (Pough et al., 2004). A tartaruga-da-Amazônia (Podocnemis expansa) é o maior quelônio fluvial da América do Sul, atingindo em média 80 cm de comprimento e 60 cm de largura de carapaça, com peso médio de 60 kg. Todavia, há indivíduos que chegam a 1,0 m de comprimento de carapaça. Apresenta a carapaça achatada e mais larga na região posterior, com coloração variando entre marrom, cinza e verde oliva. Os animais jovens possuem manchas amarelas na cabeça. Essas manchas vão desaparecendo com o crescimento e passam a ser um desenho característico das fêmeas adultas, enquanto nos machos elas são mantidas, porém mais escurecidas ou desbotadas (Luz & Reis, 1999). É onívoro oportunista, predominantemente herbívoro. O espectro de itens de que se alimentam é amplo e inclui frutos, flores, sementes, talos, raízes e folhas arbóreas e herbáceas, além de insetos, crustáceos, moluscos e peixes (Luz, 2005). Segundo Molina & Rocha (1996), são predominantemente herbívoras na natureza, aceitando carne e peixe em cativeiro. Pritchard & Trebbau (1984) observaram que o conteúdo estomacal de P. expansa apresentava dieta herbívora e pequena quantidade de alimentos de origem animal. Em 1992, foi permitida a criação em cativeiro desta espécie, com finalidade comercial, objetivando desestimular o tráfico e o mercado ilegal de carne e subprodutos 46 da tartaruga-da-Amazônia. Entretanto, sua criação carece de muitas informações, principalmente no que diz respeito à nutrição em cativeiro, uma vez que a base da dieta é ração balanceada para peixes onívoros. Nesse contexto, o cálcio e o fósforo se apresentam como nutrientes importantes na vida dos quelônios, uma vez que a carapaça é composta em 65,0% por minerais, sendo o cálcio o mais abundante (Huang et al., 2003). Este estudo teve o objetivo de investigar a digestibilidade de alimentos na tartaruga-da-Amazônia e avaliar o aproveitamento de diferentes fontes de minerais, por meio da determinação dos coeficientes de disponibilidade aparente da matéria mineral (MM), do cálcio (Ca) e do fósforo (P). Material e Métodos O presente trabalho foi realizado na Universidade Estadual Paulista (UNESP), com a utilização de 226 filhotes de tartaruga-da-Amazônia provenientes do município de Ribeirão Cascalheira, região do Rio das Mortes/MT, área de atuação do Projeto Quelônios da Amazônia manejada pelo IBAMA/RAN. Em um primeiro momento, após transporte aéreo, os filhotes ficaram no Jacarezário, do Instituto de Biociências, UNESP, Campus de Rio Claro. Foram alojados na creche, numa estufa climatizada, nas dimensões 8,5 x 10,0 m, construída em alvenaria e com cobertura plástica, em tanques de 1,5 x 1,25 x 0,6 m, com água corrente e mantida entre 28,0 a 32,0ºC. Nesse período, se adaptaram à alimentação oferecida em cativeiro, ração comercial extrusada para peixes onívoros. Após o período de adaptação à alimentação, os animais foram transferidos para o Setor de Animais Silvestres, da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia, 47 UNESP, Campus de Botucatu, onde foi conduzida a fase experimental. Os filhotes foram aleatoriamente div