UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRONÔMICAS CAMPUS DE BOTUCATU UTILIZAÇÃO DE LÂMINAS SERRILHADAS NO CORTE BASAL DA CANA-DE-AÇÚCAR ROBERTO DA CUNHA MELLO Tese apresentada à Faculdade de Ciências Agronômicas da Unesp – Campus de Botucatu para obtenção do título de Doutor em Agronomia (Energia na Agricultura) BOTUCATU-SP Maio – 2011 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JULIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRONÔMICAS CAMPUS DE BOTUCATU UTILIZAÇÃO DE LÂMINAS SERRILHADAS NO CORTE BASAL DA CANA-DE-AÇÚCAR ROBERTO DA CUNHA MELLO Orientador: Prof. Dr. Kléber Pereira Lanças Tese apresentada à Faculdade de Ciências Agronômicas da Unesp – Campus de Botucatu para obtenção do título de Doutor em Agronomia (Energia na Agricultura) BOTUCATU-SP Maio – 2011 I FICHA CATALOGRÁFICA ELABORADA PELA SEÇÃO TÉCNICA DE AQUISIÇÃO E TRATAMENTO DA INFORMAÇÃO – SERVIÇO TÉCNICO DE BIBLIOTECA E DOCUMENTAÇÃO - UNESP - FCA - LAGEADO - BOTUCATU (SP) Mello, Roberto da Cunha, 1958- M527u Utilização de lâminas serrilhadas no corte basal da cana- de-açúcar / Roberto da Cunha Mello. – Botucatu : [s.n.], 2011 x, 104 f. : il., gráfs. color., tabs., fots. color. Tese (Doutorado) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências Agronômicas, Botucatu, 2011 Orientador: Kléber Pereira Lanças Inclui bibliografia 1. Cana-de-açúcar - Colheita. 2. Corte basal. 3. Lâmina serrilhada. I. Lanças, Kleber Pereira. II. Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (Campus de Botucatu). Faculdade de Ciências Agronômicas. III. Título. I I Dedicatória Dedico este trabalho à minha esposa Maria de Fátima Soares de Mello e aos meus filhos Rani Figueiredo Soares de Mello e Yuri Soares de Mello. Aproveito a oportunidade para fazer um agradecimento especial aos meus pais Eneida Frey Mello e Januário da Cunha Mello Jr pelo exemplo de honestidade e dedicação. II Agradecimentos: Ao Prof. Dr. Kléber Pereira Lanças por acreditar em meu trabalho. Ao Prof. Dr. Harry David Harris pelo seu bom humor, incentivo e paciência. À colega Dra Ila Maria Corrêa pela atenção e colaboração na execução do trabalho. À Dra Gláucia Moraes Dias pela ajuda nas questões inerentes ao trabalho. Ao colega Moisés Storino pelas opiniões na elaboração do texto. À colega Maria Aparecida Ferreira Vargas pela formatação e diagramação do texto. Ao Colega Jair Rosas Silva por me apresentar à FCA/UNESP, Botucatu. À amiga e cunhada Ana Maria Vilela Soares pela ajuda nos trâmites burocráticos. Ao Prof. Dr Flávio Fava de Moraes pelo auxílio na preparação do recurso do Plano de Pesquisa. Ao Sugar Research and Development Corporation pelo auxílio financeiro. À FAPESP pelo auxílio financeiro. Ao Instituto Agronômico pelo incentivo à formação de seus funcionários III SUMÁRIO Página 1 RESUMO ................................................................................................................................1 2 SUMMARY ............................................................................................................................3 3 INTRODUÇÃO.......................................................................................................................5 4 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA................................................................................................7 4.1 Colheita mecanizada.........................................................................................................7 4.2 Processos de corte...........................................................................................................11 4.2.1 Corte metálico .....................................................................................................13 4.2.2 Corte por cisalhamento........................................................................................14 4.2.3 Corte por dobramento..........................................................................................14 4.2.4 Corte por rachadura .............................................................................................14 4.2.5 Corte por impacto ou corte por inércia................................................................15 4.2.6 Corte por deslizamento........................................................................................15 4.3 Forças e energia de corte ................................................................................................16 4.3.1 Efeito do ângulo de ataque ..................................................................................16 4.3.2 Efeito da velocidade da lâmina............................................................................17 4.4 Lâmina serrilhada ...........................................................................................................19 4.5 Comparação entre perfil liso e serrilhado........................................................................21 4.6 Estudo cinemático das lâminas........................................................................................21 4.6.1 Configuração do bordo cortante ..........................................................................23 4.6.2 Trajetória da borda cortante.................................................................................24 5 MATERIAL E MÉTODOS...................................................................................................27 5.1 Estudo cinemático da lâmina...........................................................................................27 5.1.1 Lâminas com bordos curvos ................................................................................28 5.1.2 Velocidade do ponto............................................................................................32 5.2 Material do experimento de laboratório .........................................................................34 5.2.1 Lâminas ...............................................................................................................34 5.2.2 Estrutura de teste .................................................................................................39 5.2.3 Sistema de aquisição de dados.............................................................................42 IV 5.2.4 Fotografias de alta velocidade .............................................................................43 5.3 Métodos do experimento de laboratório.........................................................................44 5.3.1 Delineamento experimental .................................................................................48 5.4 Material do experimento de campo ................................................................................48 5.5 Método do experimento de campo .................................................................................52 6 RESULTADOS E DISCUSSÃO ..........................................................................................54 6.1 Estudo cinemático ..........................................................................................................54 6.2 Experimento de laboratório ............................................................................................58 6.2.1 Danos ...................................................................................................................59 6.2.2 Perdas de massa ...................................................................................................61 6.2.3 Forças de corte.....................................................................................................64 6.2.4 Energia de corte ...................................................................................................69 6.2.5 Características do corte da cana de açúcar com o uso de lâminas serrilhadas. ...72 6.2.6 Corte na presença de deflexão. ............................................................................77 6.3 Experimentos de campo...................................................................................................81 6.4 Considerações finais ........................................................................................................89 7 CONCLUSÕES.....................................................................................................................91 8 REFERENCIAS .....................................................................................................................93 V LISTA DE TABELAS Página Tabela 1 - Conversão do ângulo θr para ângulo de ataque α. ...................................................36 Tabela 2 – Valores utilizados no cálculo do momento de inércia para os três tipos de lâminas utilizadas no experimento de laboratório. ..............................................................47 Tabela 3 - Valores da relação Vt / Vn, para diferentes �r ângulos e velocidades angulares, para uma lâmina inclinada para frente.................................................................................58 Tabela 4 - Valores da relação Vt / Vn, para diferentes �r ângulos e velocidades angulares, para uma lâmina inclinada para trás. ...................................................................................58 Tabela 5 - Danos em função da velocidade angular do disco. ..................................................59 Tabela 6 - Danos em função tipo de bordo cortante das lâminas. .............................................60 Tabela 7 - Danos em função do ângulo de ataque das lâminas com velocidade angular de 600 rpm................................................................................................................................60 Tabela 8 - Interação do ângulo de ataque com o bordo cortante para lâmina inclinada para frente. ...................................................................................................................................61 Tabela 9 - Perdas de massa em função da velocidade angular. ................................................62 Tabela 10 - Perdas de massa em função do tipo de bordo cortante...........................................62 Tabela 11 - Interação entre ângulo de ataque e bordo cortante para lâmina inclinada para trás. ......................................................................................................................................63 Tabela 12 - Forças específicas de corte em função da velocidade angular. ..............................67 Tabela 13 - Forças específicas de corte em função do bordo cortante. .....................................67 Tabela 14 - Força específica de corte em função do ângulo de ataque. ....................................68 Tabela 15 - Interação entre ângulo de ataque e bordo cortante a 600 rpm para lâmina inclinada para trás. ...............................................................................................................68 Tabela 16 - Energia específica de corte em função da velocidade angular. ..............................70 Tabela 17 - Valores da energia específica de corte em função do bordo cortante. ...................70 Tabela 18 - Valores da energia específica de corte em função do ângulo de ataque. ...............71 Tabela 19 - Interação entre ângulo de ataque e bordo cortante a 600 rpm para lâmina inclinada para frente. ...........................................................................................................71 Tabela 20 - Media dos danos e energias na presença de deflexão. ...........................................78 VI Tabela 21 - Valores obtidos no primeiro experimento de campo..............................................85 Tabela 22 - Valores do abalo de soqueira do primeiro experimento de campo. .......................85 Tabela 23 - Valores obtidos no segundo experimento de campo ..............................................87 Tabela 24 - Valores do abalo da soqueira..................................................................................87 Tabela 25 - Valores do dano ao toco. ........................................................................................88 VII LISTA FIGURAS Página Figura 1 – Protótipo da primeira colhedora comercial, 1956, (Fonte: Spargu e Baxter, 1975)......................................................................................................................................8 Figura 2 - Colhedora de cana-de-açúcar......................................................................................9 Figura 3 - Tipo corte por impacto (Fonte: Kroes, 1997) ...........................................................10 Figura 4 – Conceito de perdas (Ueno e Izumi, 1995)................................................................11 Figura 5 – Ângulo de ataque para lâmina reta e curva (Fonte: Person, 1987). .........................12 Figura 6 – Características da lâmina (Fonte: Person, 1987)......................................................12 Figura 7 – Ferramenta de corte avançando em um corpo de prova...........................................14 (Fonte: Astakhov e Shvets, 1998)..............................................................................................14 Figura 8 – Efeito da velocidade da faca sobre a energia de corte por unidade de área e a tensão de corte (Fonte: Prasad e Gupta, 1975). ...................................................................18 Figura 9 - Bordos serrilhados usados por Chancellor (1957)....................................................19 Figura 10 - Bordos serrilhados propostos por Person (1987)....................................................20 Figura 11 – Sistema de corte convencional com lâminas retangulares .....................................22 Figura 12 - Configuração do bordo cortante. (Fonte: Oduori et al, 1992). ...............................23 Figura 13 - Caminhamento dos sucessivos bordos cortantes (Fonte:Oduori et al, 1992). ........25 Figura 14 - Cortadores de base alternativos ..............................................................................28 Figura 15 - Geometria para lâminas curvas inclinadas para trás...............................................29 Figura 16 - Geometria para lâminas curvas inclinadas para frente ...........................................29 Figura 17 - Posição subsequente (X,Y) de um ponto (X0,Y0) do bordo cortante. ...................31 Figura 18 - Define as velocidades Vn e Vt ...............................................................................34 Figura 19 - Ângulo de ataque (α) para lâmina inclinada para trás. ...........................................35 Figura 20 - Lâminas inclinadas para frente e para trás usadas no experimento de laboratório............................................................................................................................36 Figura 21 - Tipo de serrilhado usado no experimento de laboratório. ......................................37 Figura 22 - Bordo cortante e ângulo de chanfro da lâmina convencional. ................................38 Figura 23 - Bordo cortante e ângulo de chanfro da lâmina inclinada........................................38 Figura 24 - Perfil da lateral do dente .........................................................................................39 Figura 25 – Esquema da estrutura de teste usada no experimento de laboratório.....................40 VIII Figura 26 – Esquema do perfil do carrinho com amostra de cana-de-açúcar............................41 Figura 27 – Esquema da vista superior dos sensores apoiando a amostra de cana-de-açúcar. .41 Figura 28 - Estrutura de teste com simulação de deflexão. .......................................................42 Figura 29 - Esquema do sistema de aquisição de dados............................................................43 Figura 30 - Classificação de danos ............................................................................................44 Figura 31 - Indicação do raio centróide para uma lâmina inclinada para trás...........................47 Figura 32 - Colhedora usada nos experimentos de campo. .......................................................49 Figura 33 - Estrutura usada na demarcação das áreas onde foram realizadas as avaliações. ....49 Figura 34 - Disco com lâminas inclinadas para frente (rotação no sentido horário).................50 Figura 35 - Desenho da lâmina utilizada no campo. .................................................................50 Figura 36 - Detalhe da metalização. ..........................................................................................51 Figura 37 - Lâmina serrilhada fixada no disco. .........................................................................51 Figura 38 - Lâmina convencional usada no experimento de campo. ........................................52 Figura 39 - Área onde foram realizados os experimentos. ........................................................53 Figura 40 - Visualização do caminhamento do bordo reto de lâminas vizinhas. ......................55 Figura 41 - Trajetória das lâminas com inclinação para trás. ....................................................55 Figura 42 - Vetores velocidades normal e tangencial para lâmina inclinada para frente (rotação horária e translação para a direita).........................................................................56 Figura 43 - Relação entre velocidade tangencial (Vt) e velocidade normal (Vn). ....................57 Figura 44 - Valores dos danos em função do ângulo de ataque para os diferentes tipos de serrilhado. ............................................................................................................................61 Figura 45 - Variação de perdas em função do ângulo de ataque...............................................63 Figura 46 - Forças de corte para uma lâmina convencional a 600 rpm.....................................64 Figura 47 - Forças de corte para uma lâmina convencional a 450 rpm.....................................65 Figura 48 - Forças de corte para lâmina inclinada para trás, borda lisa, trabalhando a 600 rpm com ângulo oblíquo de 63º...........................................................................................66 Figura 49 - Forças de corte para lâmina inclinada para frente, bordo liso, com ângulo de ataque de 63º trabalhando a 600 rpm...................................................................................66 Figura 50 - Variação da força específica de corte a 600 rpm. ...................................................69 Figura 51 - Variação da energia específica de corte a velocidade angular de 600 rpm. ...........72 Figura 52 - Rachaduras na cana de acordo com o tipo de corte e passo do serrilhado. ............73 IX Figura 53 - Típico corte por impacto com lâmina convencional...............................................74 Figura 54 - Corte por deslizamento com lâmina inclinada para frente e serrilhada de passo médio. ..................................................................................................................................75 Figura 55 - Corte por deslizamento com lâmina inclinada para frente e serrilhado médio.......75 Figura 56 - Corte por deslizamento com lâmina inclinada para frente e serrilhada pequeno. ..76 Figura 57 - Corte perfeito, sem nenhum dano, com lâmina inclinada para frente e serrilhado pequeno...............................................................................................................76 Figura 58 - Tensões em um corpo flexionado. .........................................................................77 Figura 59 - Caules com as tensões internas sendo cortada por diferentes lâminas. ..................78 Figura 60 - Cana sendo cortada por uma lâmina convencional na presença de deflexão. ........79 Figura 61 - Cana sendo cortada por uma lâmina inclinada para trás na presença de deflexão. ..............................................................................................................................80 Figura 62 - Cana sendo cortada por uma lamina inclinada para frente na presença de deflexão. ..............................................................................................................................80 Figura 63 - Lâmina e disco utilizado no primeiro ensaio de campo cujo resultados não foram satisfatórios. ..............................................................................................................81 Figura 64 - Sistema de corte com lâmina serrilhada e inclinada para trás. ...............................82 Figura 65 - Lâmina lisa com inclinação para frente. .................................................................83 Figura 66 - Disco com quatro lâminas lisas com inclinação para frente. ..................................84 Figura 67 – Acúmulo de material entre os dentes do perfil serrilhado trabalhando em solo argiloso úmido. ....................................................................................................................85 Figura 68 - Perfil serrilhado após 8 horas de uso. .....................................................................87 Figura 69 - Toco com dano mínimo encontrado no campo.......................................................89 X LISTA DE SÍMBOLOS θr – Ângulo entre o centro do disco, a base e topo da lâmina. α - (Ângulo de ataque) – Ângulo entre a normal da lâmina e a direção do movimento. Rt = R0 – Raio do disco mais a lâmina. Rr = R1 - Raio do disco. R – Raio do ponto em estudo no bordo da lâmina. L – Comprimento da lâmina (R0 – R1). γ - Ângulo entre laminas. V – Velocidade de deslocamento da colhedora. ω - Velocidade angular do disco. Vn – Velocidade normal em um ponto no bordo da lâmina. Vt - Velocidade tangencial em um ponto no bordo da lâmina. XT – Posição X no topo da lâmina. YT - Posição Y no topo da lâmina. XR – Posição X na base da lâmina.. YR – Posição Y na base da lâmina.. 1 1 RESUMO As colhedoras atuais de cana-de-açúcar são autopropelidas, com todo acionamento, das peças ativas e locomotoras, hidráulico. O cortador de base é composto por dois discos contra rotativos, com cinco lâminas retangulares cada, que cortam os colmos em sua base por impacto. Um rolo defletor empurra os caules para frente antes do corte para auxiliar na alimentação da máquina. A deflexão e o corte de base por impacto são responsáveis por danos na soqueira e no produto colhido. Estes danos aceleram o processo de deterioração, aumentam o nível de perdas e prejudica a rebrota. O objetivo desta pesquisa foi desenvolver e avaliar um sistema de corte de base que não se baseie no corte por impacto e que possa ser adaptado em qualquer colhedora comercial sem a necessidade de alterações na máquina. Para alcançar o objetivo proposto, foi realizado um estudo cinemático de lâminas curvas e foram conduzidos experimentos de laboratório e campo. Os discos do cortador de base estão sujeitos a dois movimentos, rotação e translação (avanço da colhedora). O estudo cinemático descreve estes movimentos em forma de matrizes. Foram elaborados programas com o uso do software MATLAB para a realização de uma simulação virtual, usada para investigar as configurações alternativas do cortador de base e fornecer subsídios para um desenvolvimento teórico do processo de corte da cana-de-açúcar. No laboratório foi construída uma estrutura de teste que simulava os movimentos de rotação e translação do disco, para cortar uma amostra do caule da cana-de-açúcar. Foram realizados dois experimentos; no primeiro foi utilizado um delineamento estatístico em esquema fatorial onde foi avaliado o passo do serrilhado, o ângulo horizontal da lâmina com inclinação para frente e para trás e a velocidade de corte. Foram analisados os danos no caule, perdas de massa, forças e energia de corte. No segundo 2 experimento, foi utilizado um delineamento estatístico em esquema fatorial, e as amostras de cana-de-açúcar inteiras que foram submetidas a uma flexão para simular o efeito do rolo defletor e foram analisados os danos no caule, a perda de massa e a energia consumida no processo de corte. No campo também foram realizados dois experimentos, ambos inteiramente casualizados. No primeiro, o material colhido foi destinado à usina para moagem e no segundo o material colhido foi destinado ao plantio. Nos dois experimentos o sistema desenvolvido foi comparado com o sistema convencional e foram analisados o abalo de soqueira, o número, a altura e os danos nos tocos. Como resultado da simulação virtual foram determinadas as velocidades normal e tangencial (a velocidade normal produz impacto e a velocidade tangencial o deslizamento) do bordo cortante da lâmina. Este estudo mostrou que o ângulo horizontal da lâmina é o fator que mais influencia na relação entre as velocidades normal e tangencial. No laboratório, com a utilização de lâminas serrilhadas, o ângulo horizontal não apresentou diferença significativa, enquanto que o passo do serrilhado e a velocidade de corte apresentaram diferença significativa em todos os parâmetros estudados. Na presença de deflexão, as lâminas com inclinação horizontal para frente apresentaram os menores valores de danos e perdas. No campo, nos dois experimentos, o sistema com lâmina serrilhada e inclinada para frente apresentou os menores valores em abalo de soqueira e danos nos tocos. O sistema com serrilhado de passo pequeno com angulação horizontal para frente foi a combinação que apresentou os menores valores de danos, perdas e abalo de soqueira, o que indica que lâminas serrilhadas podem ser uma alternativa mais eficiente para o corte basal da cana-de-açúcar ______________________________ Palavras-chave: corte basal, colheita de cana-de-açúcar, lâmina serrilhada. 3 USE OF SERRATED BLADES FOR SUGARCANE BASECUTTER. Author: ROBERTO DA CUNHA MELLO Adviser: PROF. DR. KLÉBER PEREIRA LANÇAS 2 SUMMARY The current sugar cane harvesters are self propelled and all transmissions are hydraulic. The basecutting mechanism consists of two rotating discs, with five rectangular blades each, which cut the stalk at its base by impact. A knockdown roller pushes the stem forward before the cut to assist the machine feeding. The deflection and the basecutting by impact are responsible for damage to the stump and harvested product. This damage accelerates the deterioration process, increases the level of losses, damage and reduces the ratoon. The objective of this research was to develop and evaluate a basecutter system that is not based on the impact cut and can be adapted to any commercial harvester without any modification in the machine. To achieve the proposed objective, a cinematic study of curved blades was developed and was also conducted laboratory and field experiments. The basecutter discs are subject to two basic movements, rotation and translation (advancement of the harvester). The cinematic study describes these movements in form of matrices and some programs were written using the MATLAB software and this virtual simulation was used to investigate alternative basecutting configurations and provide knowledge to a theoretical development of the sugarcane cutting process. At the laboratory it was built a test rig that simulates the rotation and translation movements of the disc to cut a sample of sugarcane stalk. Two experiments were conducted: in the first, it was used a factorial statistics design which assessed the pitch of the serration, the horizontal blade angle (backward and forward) and cutting speed. It was analyzed the damage to stem, mass 4 losses, forces and cutting energy. In the second experiment the sample of whole sugarcane was submitted to a bending stress to simulate the effect of deflection roll and it was analyzed the damage to stem, mass loss and consumed energy in the cutting process. In the field it was also carried out two experiments. At first, the material was intended to mill for crushing and in the second; the material was used to planting. In both field experiments the developed system was compared with the conventional system and were analyzed the concussion of stumps, number, height and damage of the stumps. The virtual simulation results determined the normal and tangential velocities (the normal velocity produces impact and tangential velocity slip) on the cutting blade edge and showed that the horizontal angle of the blade is the most important factor that influences the ratio between the normal and tangential velocities. In the laboratory, with the use of serrated blades, the horizontal angle did not showed significant differences, while the pitch of serration and cutting speed were significantly different in all investigated parameters. In the presence of deflection, the blades with forward horizontal angle showed the lowest values of losses and damage. In field, in both experiments, the system with serrated blades forward angled had the lowest values of concussion and damage to stumps.The system with small serration and forward horizontal angle was the combination that produced the lowest values of concussion, damage and losses of the stumps, what indicate that serrated blades can be an efficient alternative for sugarcane basecutting. ______________________________ Keywords: Basecutter, sugar cane harvester, serrated knife. 5 3 INTRODUÇÃO A cana-de-açúcar (Saccharum officinarum L ) é uma monocotiledônea, membro da família Poaceae. Pode ser propagada por sementes, mas, comercialmente é plantada em pedaços do caule que contém as gemas. Sob condições favoráveis as gemas germinam e produzem os brotos primários, em seguida surgem os brotos secundários que vão se desenvolver e formar touceiras. . O final da fase vegetativa é o período onde a sacarose se acumulada no caule, em cultivos comerciais, estes são colhidos e posteriormente novos brotos irão surgir das partes remanescentes (soqueira). Este processo, conhecido como rebrota, se repete por cinco ou seis cortes até a produtividade diminuir a níveis não aceitáveis. Após este período, as soqueiras antigas são destruídas e um novo plantio é realizado. A rebrota e o volume de biomassa são fatores importantes, que influenciam no projeto de colhedoras de cana-de-açúcar, pois requerem do equipamento alta potência e robustez para poder processar todo o material e que não cause danos à soqueira. No Brasil, a mecanização da colheita vem crescendo de maneira acelerada, mas ainda não atingiu o nível de países como Austrália e Estados Unidos. A grande vantagem da colheita mecanizada é o fato de não necessitar queimar a palha antes da colheita. O corte basal das colhedoras atuais é composto por dois discos contra rotativos, com cinco lâminas retangulares em cada disco. Estas lâminas estão posicionadas radialmente nos discos e cortam a cana-de-açúcar em sua base por impacto. Um rolo defletor empurra os caules para frente antes do corte para auxiliar na alimentação da máquina. 6 A deflexão e o corte de base por impacto são responsáveis por danos no produto colhido e na soqueira. Estes danos aceleram o processo de deterioração do material colhido, aumenta o nível de perdas e prejudica a rebrota. O objetivo desta pesquisa foi desenvolver e avaliar um sistema de corte que não fosse baseado no corte por impacto e que pudesse ser adaptado em qualquer colhedora comercial sem a necessidade de alterações na máquina. 7 4 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 4.1 Colheita mecanizada Tentativas de colher a cana-de-açúcar mecanicamente foram registradas na Austrália em 1889, mas até 1930 nenhum progresso significativo foi alcançado (Spargo e Baxter, 1975). No período entre 1930 a 1970 foram desenvolvidos diferentes modelos de cortadores de colmos inteiros por fazendeiros inovadores. Essas máquinas trabalhavam bem com canas-de-açúcar eretas, mas não podia colher as deitadas, o que representava algo em torno de 50% em algumas regiões. Também era necessária uma equipe de trabalhadores manuais para recolher os colmos que não eram recolhidas pela máquina. As limitações funcionais dos cortadores mecânicos e a inabilidade de manusear caules retorcidas levou o chefe dos engenheiros das Massey e Ferguson (Austrália) Kem Gaunt a reconhecer que se os colmos fossem picados imediatamente após serem cortados em sua base e despontados, isto se tornaria um material uniforme que poderia ser manuseado. Trabalhando nesta base, a MF desenvolveu a primeira colhedora de cana-de-açúcar aceita comercialmente e mostrada na Figura 1. 8 Figura 1 – Protótipo da primeira colhedora comercial, 1956, (Fonte: Spargu e Baxter, 1975). As colhedoras atuais (Figura 2) são autopropelidas, com motores acima de 340 cv e com todo acionamento hidráulico. Estas máquinas possuem mecanismos para separar as linhas de plantio, levantar a cana deitada sobre o solo, cortar os ponteiros e a base, rolos alimentadores para levar a cana até os picadores e dois ventiladores (extratores) para remoção da palha, sendo um posicionado logo após o picador e o outro no final do elevador. Inicialmente, o cortador de base era composto por dois discos. Por causa de problemas na alimentação da máquina os dois discos foram substituídos por um único disco de maior diâmetro onde seu eixo ficava próximo da parede interna da entrada da máquina. É interessante notar que o sistema com dois discos foi reintroduzido 12 anos mais tarde (Spargu e Baxter, 1975). De acordo com Ueno e Izumi (1995) as perdas na colheita mecanizada estão em torno de 10 a 15 % quando a cana-de-açúcar é colhida sem queima previa. Kroes (1997) mostrou que o maior problema da colheita mecânica é o dano causado pelo cortador de base. Esses danos resultam na divisão em duas ou mais partes do primeiro ou até do segundo rebolo, estes pedaços de caule são facilmente lançados fora da máquina pelos extratores junto 9 com a palha. Os danos causados na soqueira pela ação dos cortadores de base, aumentam a exposição da planta ao ataque de doenças (Ricaud et al, 1989) e podem causar redução na produtividade. Figura 2 - Colhedora de cana-de-açúcar A Figura 3 mostra um típico corte por impacto onde a força é essencialmente normal à cana-de-açúcar causando trincas. Kroes (1997) fez extensivos estudos sobre os danos usando um dispositivo de corte e um sistema de classificação de danos. Ele também estudou algumas propriedades mecânicas dos caules e a influência da velocidade da lâmina sobre os danos e concluiu que velocidades na periferia da lâmina, abaixo de 11 m/s não conseguiram cortar amostras de cana-de-açúcar completamente. Ueno e Izumi (1995) estimaram os danos nos rebolos devido à colheita mecânica e também investigaram a influência dos danos na deterioração. Os danos totais têm uma forte correlação com as perdas de cana. Os autores classificaram os danos em quatro classes: 1 – Nenhum, 2 – Leve, 3 - Médio, 4 – Danificado. Esta classificação é razoável, entretanto depende de um julgamento pessoal do avaliador. 10 Figura 3 - Tipo corte por impacto (Fonte: Kroes, 1997) Braunack e Hurney (2000) mediram os danos causados na soqueira pelo tráfego de máquinas contando o número de colmos, falhas e a produtividade final. Eles usaram a tabela de classificação proposta por Kroes (1997). Ueno et al (1989) conduziram testes de laboratório para medir perdas. A cana-de-açúcar foi pesada, colocada manualmente em uma colhedora estacionária e depois pesada novamente, e por diferença foi determinada a massa das perdas. No campo, Ueno e Izumi (1995) realizaram cerca de 30 experimentos de perdas nas safras de 1990 e 1991 na ilha de Minami Daiato em Okinawa. As medidas incluíram perdas de caule inteiro e pedaços, perdas de toco e danos nos caules colhidos e na soqueira, além da velocidade e eficiência da colhedora. Neste trabalho, após a passagem da colhedora, todo o material deixado sobre parcelas de 9 m2 foi coletados. Este material foi separado em folhas, ponteiros, caule aderido ao toco, fragmentos de caule e rebolos. Estes autores determinaram um conceito básico de perdas: “as perdas de cana-de-açúcar são medidas relativamente a uma produtividade potencial”. A Figura 4 mostra uma curva de produtividade sob certas condições de água, luminosidade, fertilizantes, etc. As perdas são definidas como a diferença entre a produtividade esperada e a produtividade atual. 11 Figura 4 – Conceito de perdas (Ueno e Izumi, 1995) Neves (2003) classificou as perdas em: “perdas visíveis e perdas invisíveis”. As perdas visíveis são detectadas visualmente no campo após a colheita, constituindo-se de canas inteiras, rebolos, e tocos resultantes da altura do corte basal. As perdas invisíveis são definidas como estilhaços, serragem e perdas de caldo que ocorrem devido à ação dos mecanismos rotativos que cortam, picam e limpam a cana-de-açúcar no processamento interno na colhedora. Existem muitas fontes de perdas e estas são difíceis de serem avaliadas com precisão, entretanto uma análise das perdas é muito importante, para melhorar o desempenho da máquina. 4.2 Processos de corte Cortar materiais biológicos é geralmente mais complicado do que materiais homogêneos como os metais. Cada material se comporta de maneira diferente para cada tipo de corte. Quando o bordo da lâmina faz o primeiro contato com o material, inicia-se 12 o processo de corte. O movimento da faca impõe forças na região de contato e a reação do material cresce até a tensão interna atingir a condição de ruptura. O corte não pode ser considerado como um simples processo, mas uma seqüência elementar de forças e deformações, governadas por diferentes princípios e modos de ruptura. Segundo Person (1987), os fatores que influenciam o processo de corte são: tipo e condição do material a ser cortado, ângulo da faca em relação ao material (Figura 5), raio da borda cortante, espessura da borda cortante, ângulo do chanfro (Figura 6), velocidade da faca, etc. Figura 5 – Ângulo de ataque para lâmina reta e curva (Fonte: Person, 1987). Figura 6 – Características da lâmina (Fonte: Person, 1987). 13 Para substituir o corte por impacto, foi realizado um levantamento dos processos mecânicos de corte e suas características. 4.2.1 Corte metálico O processo conhecido como corte metálico, tem uma forma distinta denominada de tensão de dobramento na zona de deformação o que causa a formação de cavacos (Astakhov e Shvets, 1998). Quando o bordo cortante avança no material, resulta no crescimento da tensão interna até atingir a tensão máxima na frente da borda cortante (Figura 7 a). Quando esta tensão atingiu um limite máximo, pode ocorrer o seguinte: se o material é frágil uma trinca aparece na frente da borda cortante (Figura 7 b), a qual leva a uma fratura de uma camada que é removida. Se o material é dúctil a trinca não aparece por causa do efeito de uma alta plasticidade (Figura 7 c) e ocorre a formação de cavacos. Esta simples consideração mostra que as propriedades do material apresentam um importante papel no processo de corte. A força de penetração pode ser dividida em duas componentes: uma força compressiva atuando ao longo da direção axial e uma força de dobramento ao longo da direção transversal, portanto o cavaco está sujeito a uma ação mútua de força de compressão e momento fletor. 14 Figura 7 – Ferramenta de corte avançando em um corpo de prova. (Fonte: Astakhov e Shvets, 1998) 4.2.2 Corte por cisalhamento Neste tipo de corte existe o efeito da contrafaca, a qual produz uma força de reação contrária ao deslocamento da faca. Para um bom corte é importante que a contrafaca seja afiada e que esteja o mais próximo possível da faca para que a força de corte seja exclusivamente de cisalhamento (Person, 1987). 4.2.3 Corte por dobramento Se o espaço entre a faca e a contrafaca é grande, as forças de corte criam um momento fletor ao redor da extremidade da lâmina. A falha final do material pode ocorrer por flexão, depois da compressão (Person, 1987). 4.2.4 Corte por rachadura Se a lâmina é lisa, em forma de cunha e a fricção em seus lados é baixa, forças perpendiculares ao seu deslocamento aparecem no interior do material, fortes o 15 bastante para separá-lo. Este tipo de corte é sempre precedido por alguma outra forma de deformação (Person, 1987). O desenvolvimento deste tipo de corte depende muito da orientação das fibras e ocorrem especialmente quando a tensão é baixa na direção perpendicular ao deslocamento da lâmina. Pode-se observar também a ocorrência desse modo de corte em metais e solos. 4.2.5 Corte por impacto ou corte por inércia O corte por impacto ou corte inercial ocorre onde a reação necessária da força de corte é providenciada pela inércia da planta sustentada pelo solo (Chancellor, 1957). Este corte é utilizado em máquinas como roçadoras, alguns tipos de colhedoras de forragens e cereais e principalmente em colhedoras de cana-de-açúcar. A força de corte é essencialmente normal ao deslocamento da lâmina. 4.2.6 Corte por deslizamento Se houver um ângulo entre a perpendicular do bordo cortante e o deslocamento da lâmina (ângulo de ataque), além da força normal também ocorre uma força tangencial. Este tipo de corte é chamado de corte oblíquo para pequenos valores deste ângulo. Para ângulos entre 45º e 90º este corte é denominado de corte por deslizamento. Quando ocorre o deslizamento em uma lâmina afiada, as fibras aderem à lâmina e estas serão cortadas por fricção. Elas sofrerão apenas tensão de tração. Devido à elasticidade do material, este tipo de corte requer mais energia que o corte por impacto ou cisalhamento, mas pode ser executado com uma força normal menor, porque poucas fibras são envolvidas no processo de corte ao mesmo tempo (Chancellor, 1957). 16 4.3 Forças e energia de corte Segundo Persson (1987), a força de corte pode ser definida com uma força externa, a qual é aplicada pela lâmina ao material. Esta força de reação na extremidade cortante consiste de duas componentes, força normal e força lateral. A força normal é originada por uma alta tensão no local de contato da lâmina com o material e a força lateral atua nos lados da faca, abrindo o material. A força cortante é zero antes do contato da lâmina com o material e vai crescendo à medida que a lâmina vai se deslocando até atingir seu valor máximo quando ocorre a ruptura (tensão de ruptura), em seguida, diminui gradativamente até retornar ao seu valor inicial quando o processo de corte é completado. Ocorrem também forças oriundas da fricção e aceleração do material (Chancellor, 1957). Em muitos casos, o corte é realizado em materiais com largura diferente e a intensidade da força é linearmente proporcional a esta largura. A força mais representativa é expressa como “força de corte específica”, que é definida como a força por unidade de largura, medida perpendicularmente à direção do corte. Esta força específica de corte é expressa na unidade de força por comprimento (N.mm-1). A energia para realizar um simples corte foi definida como a derivada da força total de corte em função do deslocamento da lâmina. Esta energia inclui uma energia de compressão a qual é proveniente da extremidade cortante e uma energia real de corte (Chancellor, 1957). Uma medida denominada de energia de corte específica, expressa em (J.mm-2) fora definida por sua importância prática para relatar a energia de corte requerida para a quantidade de material a ser cortado. 4.3.1 Efeito do ângulo de ataque O ângulo de ataque é o ângulo que define o tipo de corte. Para pequenos ângulos a força de corte sobre a extremidade da faca é normal e o corte é denominado de corte por impacto. Para grandes ângulos, além da força normal há também uma força tangencial que causa o deslizamento. 17 Persson (1987) definiu a relação entre a força normal e tangencial sobre o deslizamento do material ao longo da extremidade da faca como sendo o coeficiente de fricção e a direção esperada do movimento do material é a direção da força resultante. As propriedades de fricção e elasticidade do material assim como o micro-relevo da borda cortante da faca determinam se ocorre o corte por deslizamento. Corte por deslizamento é esperado a ocorrer quando o ângulo de ataque é maior que o ângulo de fricção. Prasad e Gupta (1975) concluíram que a energia de corte por unidade de área decresce com o aumento do ângulo de ataque até um mínimo de 32º. O aumento da energia de corte para pequenos ângulos de ataque é explicado por um grande atrito das laterais da faca com o material. Com o aumento do ângulo de ataque ocorre maior deslizamento o qual diminui o impacto, portanto, a energia requerida aumenta. 4.3.2 Efeito da velocidade da lâmina O’ Dogherty e Gale (1986) encontraram que no processo de corte há uma velocidade crítica a qual é claramente demonstrada por medidas na energia de corte específica. Acima desta velocidade a energia requerida para o corte é praticamente constante. Reduzindo a velocidade de corte abaixo da velocidade crítica há um aumento do consumo de energia. O comportamento do material difere entre corte de consumo alto e baixo de energia. Para um corte eficiente ou de baixa energia, há uma pequena deflexão do material com uma curta duração de tempo. O trabalho de Dobler (1982) citado por O’ Dogherty e Gale (1986) mostrou que há uma redução na energia requerida com um aumento da velocidade de corte e é quase constante para velocidades acima de 20 m.s-1. Isto indica a existência de uma velocidade crítica. Chancellor (1957) cortando alfafa com 54% de umidade mostrou que a velocidade tem um pequeno efeito sobre a energia de corte. Um aumento na velocidade da faca normalmente aumenta as perdas de potência, causado por uma aceleração do material. Pode ocorrer um aumento de perdas de potência com a velocidade mesmo que a energia de corte se mantenha constante. 18 Prasad e Gupta (1975) estudaram o efeito da velocidade da faca sobre a energia e a tensão de corte em caules de milho. Eles concluíram que a energia por unidade de área foi mínima em velocidades em torno de 2,65 m.s-1 . A energia de corte decresce com o aumento da velocidade até atingir o valor mínimo (2,65 m.s-1) e em seguida aumenta significativamente. A Figura 8 mostra o efeito da velocidade sobre a energia de corte por unidade de área e a tensão de corte para uma faca com um ângulo de afiamento de 18º e ângulo de ataque de 32º. A razão do aumento da energia nas velocidades acima de 2,65 m.s-1 pode ser devido ao fato de que a energia cinética se perde ou é transmitida para a parte separada do caule depois do corte. Figura 8 – Efeito da velocidade da faca sobre a energia de corte por unidade de área e a tensão de corte (Fonte: Prasad e Gupta, 1975). 19 4.4 Lâmina serrilhada Uma investigação inicial sobre o uso de lâmina serrilhada mostrou que apesar de serem muito comuns e conhecida sua habilidade de manter-se afiada por mais tempo do que a lâmina lisa, muito pouco foi estabelecido sobre como ela trabalha. A única referência significante a que se têm acesso é Chancellor (1957), o qual estudou o uso de perfis serrilhados para cortar alfafa. O autor concluiu que a energia consumida para o corte, usando um perfil liso é maior do que quando se usa o serrilhado ou mesmo serras dentadas. A Figura 9 mostra as serras usadas por Chancellor (1957). Figura 9 - Bordos serrilhados usados por Chancellor (1957) 20 Nos bordos serrilhados, ocorre uma concentração de tensão na ponta do dente, a qual inicia o corte com maior facilidade. À medida que a lâmina prossegue, o corte ocorre nas laterais dos dentes. Em notas pessoais1, Chancellor discutiu a viabilidade de se usar perfis serrilhados de passo largo, uma vez que as lâminas do cortador de base trabalham muito próximos do solo e poderiam se desgastar rapidamente. Person (1987) em sua monografia sobre corte de materiais biológicos, usou o trabalho de Chancellor (1957) sobre os bordos serrilhados. Ele definiu sete tipos de configuração que podem ser visualizados na Figura 10. Figura 10 - Bordos serrilhados propostos por Person (1987) 1 Foram enviadas mensagens via e-mail onde o Dr. William J. Chancellor aprovou o uso de lâminas serrilhadas para o corte basal da cana-de-açúcar e sugeriu estudar diferentes passos de serrilhado. 21 4.5 Comparação entre perfil liso e serrilhado Em geral, o bordo liso é melhor do que o serrilhado quando é requerida precisão de cortes (Talmadge, 2004) e para aplicações como barbear, descascar uma maçã ou tirar a pele de animais. O bordo serrilhado trabalha melhor do que o liso no corte por deslizamento, especialmente através de superfícies duras ou resistentes (Glesser, 1970). Por exemplo, usa-se o bordo serrilhado para serrar cabos de aço. O serrilhado permite o corte de cabos através do princípio do serrilhado o que não seria possível com uma lâmina lisa. Naturalmente o aço na lâmina tem que ser consideravelmente mais duro do que o do cabo. Serrilhado não é serra. O dente de serra possui o bordo cortante transversal à ponta e ocorre a formação de cavaco. Com o serrilhado há uma borda cortante entre os dentes, portanto ocorre um corte constante o qual não remove material. Bordos serrilhados cortam mais eficiente pelas seguintes razões: maior comprimento da superfície cortante e uma concentração de forças na ponta do dente que promove uma melhor penetração no material. O corte por deslizamento requer uma força normal menor do que no corte por impacto. Com um perfil liso a força tangencial aumenta proporcionalmente com o aumento da força normal. Com o serrilhado, Chancellor (1957) concluiu que a força tangencial tem uma componente devido à fricção e outra devido ao material que fica alojado entre os dentes. Está ultima força não varia diretamente com a força normal. Considerando os processos de corte descritos, pode-se afirmar que as características do material e da lâmina são parâmetros que determinam o tipo de corte. 4.6 Estudo cinemático das lâminas Este estudo foi realizado para investigar as configurações alternativas do cortador de base e fornecer subsídios para um desenvolvimento teórico do processo de corte da cana-de-açúcar. As colhedoras atuais de cana-de-açúcar usam dois discos contra- rotativos com cinco lâminas retangulares fixadas com a linha central, no sentido longitudinal, perpendiculares à tangente do disco, como mostra a Figura 11. O comprimento das lâminas 22 (faixa de corte) é de 100 mm, o diâmetro dos discos de 570 mm e o espaçamento entre discos de 65 mm. Os discos atuam com uma velocidade angular de 600 rpm e a velocidade de trabalho entre 4 e 8 km.h-1. A colhedora corta apenas uma linha de plantio posicionada no centro entre os dois discos. Figura 11 – Sistema de corte convencional com lâminas retangulares A cinemática do sistema convencional de corte de base foi estudada previamente por Oduori et al. (1992) que utilizaram o método de transformação linear homogênea desenvolvido por Crouch (1981) para determinar o deslocamento de um ponto em um corpo rígido através de matrizes e validado por um programa computacional interativo escrito em N88BASIC rodando em MS-DOS. Os autores concluíram que o projeto do cortador de base deve considerar não apenas a cinemática do cortador, mas também a mecânica do processo de corte. Kroes e Harris (1995) também desenvolveram um modelo matemático baseado no método de transformação linear homogênea, o qual descreve a cinemática de um cortador de base para calcular a máxima velocidade de trabalho permitida, que assegure que 23 toda á área foi coberta pelas sucessivas lâminas e que o disco não entre em contato com a planta até que o corte se complete. 4.6.1 Configuração do bordo cortante De acordo com Oduori et al. (1992) a Figura 12 ilustra a configuração de um bordo cortante o qual se inicia no momento (t0). Neste momento a origem 0, do sistema de coordenadas cartesiano estacionário, coincide com o centro de rotação do disco. Figura 12 - Configuração do bordo cortante. (Fonte: Oduori et al, 1992). Para esta análise, as seguintes suposições precisam ser feitas: os bordos cortantes são de orientação fixa relativa ao disco; as lâminas são uniformemente distribuídas ao redor da periferia do disco. Se houver n lâminas no total, o ângulo denominado γ na Figura 12 é igual a 2π n-1 radianos ou 360 n-1 graus. O disco gira no plano horizontal em torno de seu eixo central com velocidade rotacional ω (rad s-1) constante sendo positivo no sentido horário. O disco translada em linha reta dentro do plano de sua rotação com velocidade V (m s-1) constante positiva na 24 direção X, denominada de velocidade de avanço. Além disso, é conveniente expressar a velocidade de avanço em termos de velocidade rotacional como mostra a equação 1. 0VV ω= (1) V0 pode ser considerado o avanço proporcional do bordo cortante em m rad-1. 4.6.2 Trajetória da borda cortante A matriz usada no método da transformação linear homogênea para descrever as trajetórias da borda cortante e o deslocamento de um ponto em uma estrutura rígida que se move num plano de duas dimensões, pode ser representada pela equação matricial 2. � � � � � � � � � � � � � � � � � � � � = � � � � � � � � � � K Y X DDD DDD DDD K Y X 1 1 333231 232221 131211 2 2 . (2) onde: O vetor coluna [X1, Y1, K] representa a posição do ponto em questão antes do deslocamento. O vetor coluna [X2, Y2, K] representa posição do ponto depois do deslocamento. A matriz quadrada de ordem 3 [Dij] é conhecida como matriz deslocamento (D). No vetor coluna da equação 2, o terceiro componente K pode ser um número real. A equação (2) pode ser resumida como: P = D. P0 . Na Figura 13 começando com a primeira lâmina (lâmina 1) e a segunda lâmina (lâmina 2) na posição indicada, no tempo t0, então, em um tempo arbitrário subsequente (t), a posição da lâmina pode ser descrita da seguinte forma: 25 Figura 13 - Caminhamento dos sucessivos bordos cortantes (Fonte:Oduori et al, 1992). Para a ponta da borda cortante da primeira lamina: � � � � � � � � � � � � � � � � � � � � −= � � � � � � � � � � 0 01 01 0 1 1 )( )( 100 0cos cos )( )( V tY tX ttsin ttsint V tY tX T T T T ωω ωωω (3) Sendo Xt1 (t0) = 0, Yt1 (t0) = R0 e usando a equação (1) na equação (3), pode-se decompor da seguinte forma: tsinRVttX T ω01 )( += (4) tRtY T ωcos)( 01 = (5) Para a raiz do bordo cortante da primeira lamina, a matriz deslocamento deverá permanecer igual, desde que seja um corpo rígido. Entretanto, a posição inicial do ponto em questão precisa ser especificada corretamente da seguinte forma: 26 � � � � � � � � � � � � � � � � � � � � −= � � � � � � � � � � 0 01 01 0 1 1 )( )( 100 0cos cos )( )( V tY tX ttsin ttsint V tY tX R R R R ωω ωωω (6) Sendo Xr1 (t0) = R1 senoθ e Yr1 (t0) = R1cosenθ e usando a equação 4.1 na equação 4.6 pode-se decompor da seguinte forma: ( )rR tsinRVttX θω ++= 11 )( (7) ( )rR tRtY θω += cos)( 11 (8) Analogamente, para a ponta e a raiz da segunda lamina, a qual está rotacionalmente defasada da primeira lâmina pelo ângulo �, as seguintes equações podem ser decompostas: )()( 02 αω −+= tsinRVttX T (9) )cos()( 02 αω −= tRtYT (10) )()( 12 αθω −++= tsinRVttX R (11) )cos()( 12 αθω −+= tRtY R (12) Os subscritos R e T nas equações acima se referem ao topo e a raiz das laminas, respectivamente, e os subscritos 1 e 2 referem-se a primeira e segunda lâmina, respectivamente. As lâminas descrevem uma trajetória trocoidal. A representação gráfica é apresentada nos Resultados e Discussão (Figura 40). 27 5 MATERIAL E MÉTODOS Neste trabalho foram realizadas simulações virtuais, experimentos no laboratório e no campo, sendo este capítulo dividido em três etapas, com a primeira parte o estudo cinemático utilizado no projeto das lâminas, a segunda parte os matérias e métodos utilizados nos experimentos de laboratório e a terceira parte os matérias e métodos utilizados no campo. 5.1 Estudo cinemático da lâmina Baseado nas equações de 1 a 12 da Revisão Bibliográfica e com o auxílio do software MATLAB foi possível escrever um programa diskin7 (apresentado como Anexo 1) para lâminas retas com borda radial. O vetor posição inicial foi considerado como P0= {R, 0, 0, 1} e a posição da lamina subsequente foi calculada pela equação P = D.P0. Para as lâminas curvas, outros três programas foram escritos em MATLAB, baseando-se nas equações de 13 a 23. O programa diskin 8 (apresentado como Anexo 2) descreve a trajetória das lâminas curvas, o programa diskin 8d3 (apresentado como Anexo 3) define a quantidade desejada de sobreposição em função da velocidade da colhedora (V), velocidade angular do disco (�), comprimento e numero de lâminas. O programa diskin 7a2 (apresentado como Anexo 4) calcula a relação entre as velocidades normal e tangencial em um ponto no bordo cortante Foi possível determinar a influência de parâmetros como o ângulo de ataque, velocidade de avanço da colhedora, a velocidade angular do disco sobre a relação 28 Vt/Vn. As lâminas e discos usados no laboratório e nos experimentos de campo foram projetados considerando-se os parâmetros desta investigação. 5.1.1 Lâminas com bordos curvos Inicialmente, foram consideradas lâminas com curvaturas inclinadas para trás. Após a investigação virtual no ângulo de ataque foram idealizadas novas configurações que são mostradas na Figura 14. a) com lâminas inclinadas para trás b) com lâminas inclinadas para frente Figura 14 - Cortadores de base alternativos O bordo com perfil logaritmo foi escolhido por permitir que o parâmetro k possa ser determinado a partir do raio radii interno e externo da lâmina (R1 e R0) e da extensão angular da lamina (θR). O parâmetro k foi definido usando a equação 13. �� �� � = 0 1log1 R R k Rθ (13) 29 Se a lâmina tem um raio interno e externo e uma extensão angular θR, então a lâmina com bordas inclinadas para frente e para trás pode ser definida como é mostrado nas Figuras 15 e 16 por: Figura 15 - Geometria para lâminas curvas inclinadas para trás Figura 16 - Geometria para lâminas curvas inclinadas para frente Onde R é o raio do ponto estudado da espiral, θ é o ângulo de referencia, R0 é o valor de R quando θ = 0 e R1 é o valor de R quando θ e igual a θr . O pólo da espiral logarítmica pode ser convenientemente localizado no centro do disco, o qual facilita a análise o que não aconteceria se as lâminas fossem com curvatura circular2. 2 Se fossem usados bordos circulares, o centro do círculo do bordo não coincidiria com o centro do disco, o que dificultaria a análise. 30 A grande variação de possíveis lâminas com bordas curvas, assim como o disco as quais elas estão fixadas, seria conveniente considerar um formato básico de curva baseado em parâmetros simples como um círculo, mas a espiral logarítmica definida pela Equação 14, oferece uma grande faixa de curvas parametrizadas. θkeRR 0= (14) A lâmina inclinada para trás, tem o raio externo igual a R0, o raio interno igual a R1 e a constante K menor que 0. A lâmina inclinada para frente, tem o raio externo igual a R1, o raio interno igual a R0 e a constante K maior que 0. R R ek R 1 0= θ (15) O bordo cortante tem sido definido tanto para lâmina inclinada para frente como para trás dependendo se o raio cresce ou decresce na direção da rotação. Uma vez definido o formato do bordo curvo, o interesse é na trajetória dos movimentos de rotação e translação do disco e nas velocidades normal e tangencial de um ponto na curva. Para representar o deslocamento de um ponto sobre a translação e a rotação de um corpo rígido, definiram-se Y como a coordenada na direção linear do movimento e X como a normal desta direção. Nessa análise outra coordenada Z normal ao plano do disco foi adicionada. A forma geral da relação do movimento para três dimensões é: X Y Z S D D D D D D D D D D D D D D D D X Y Z S � � � � � � � � � � � � = � � � � � � � � � � � � � � � � � � � � � � � � 11 12 13 14 21 22 23 24 31 32 33 34 41 42 43 44 0 0 0 . (16) O vetor coluna P = {X,Y,Z,S} representa a posição do ponto no tempo t. A matriz quadrada de ordem quatro D = {Dij} é a matriz deslocamento, e o vetor coluna P0 = 31 {X0,Y0,Z0,S} representa a posição do ponto no tempo t = 0. A constante S pode ser qualquer número real. A Figura 17 mostra a posição subsequente de qualquer ponto que é o produto da matriz deslocamento com o ponto de posição inicial. Figura 17 - Posição subsequente (X,Y) de um ponto (X0,Y0) do bordo cortante. Para um disco rodando com velocidade angular � e velocidade de translação V, S é definido como 1, �= �t, e D se torna D = c o s s in s in c o s β β β β −� � � � � � � � � � � � 0 0 0 0 0 1 0 0 0 0 1 V t (17) Onde X0, Y0 e Z0 tem sido determinado no t = 0, então a posição subsequente do ponto é dado por P = D.P0 (18) 32 Se a lâmina tem uma curvatura para trás R0 > R1 e K < 0 e se a lâmina tem uma inclinação para frente R0 < R1 e K > 0. Para ambos as inclinações para trás e para frente o vetor posição inicial P0 é dado por: { }1,0,;cos 000 θθ θθ sineReRP kk= (19) 5.1.2 Velocidade do ponto O aprimoramento do desenvolvimento teórico dos cortadores de base foi obtido através da derivada da matriz deslocamento pelo método da transformação linear homogênea. Com a derivada do deslocamento, obtém-se a velocidade do ponto no bordo cortante. Harris e Mello (1999) usaram estas equações para determinar a relação entre as velocidades normal e tangencial (Vt/Vn) no ponto do bordo cortante para lâminas curvas O modelo também pode ser usado em outras configurações de cortadores de base, para diferentes velocidades angulares do disco e de avanço da colhedora. A velocidade de um ponto em um disco que está sujeito aos movimentos de rotação e translação com hastes fixas é dada por: )(.).( dt d(P) dt d P 00 P dt d DPD +== • (20) Onde: 0)( 0 =P dt d A diferencial de D é definida como: 33 dt d D = � � � � � � � � � � � � � � � � � � − −− •• •• 0000 0000 0sincos 00cossin .. .. Vββ ββ ββ ββ (21) Esta equação define a velocidade de um ponto como o produto da diferencial da matriz deslocamento com o ponto de posição inicial. Para atender ao propósito deste trabalho, o interesse é nas componentes da velocidade normal e tangencial no bordo da lâmina. O ângulo entre o raio e a tangente da lâmina naquele ponto, tem sido definido como ângulo de ataque (�), este é constante com a rotação do disco. As componentes das velocidades normal e tangencial no ponto sobre a lâmina com velocidade angular �R, e velocidade de deslocamento V, no tempo t da lâmina são calculados pelas equações 22 e 23 e mostradas na Figura 18. ( )[ ]θωααω +−+= tVRV n coscos (22) ( )[ ]θωααω +−+= tVRV t sinsin (23) Pelo cálculo do ângulo � para o formato da lâmina, estas velocidades e suas relações podem ser calculadas para qualquer ponto sobre a lâmina em qualquer instante ao longo da trajetória. 34 Figura 18 - Define as velocidades Vn e Vt . 5.2 Material do experimento de laboratório Para a realização dos experimentos de laboratório foram construídas, lâminas inclinadas para frente e para trás. Também foi projetada e construída uma estrutura de teste que simula os movimentos de rotação e translação do disco do cortador de base em condições controladas. Os experimentos foram realizados no laboratório do Sugar Research Institute (SRI) em Mackay, Australia. 5.2.1 Lâminas As lâminas foram projetadas baseadas na análise cinemática. A conversão do ângulo θr para ângulo ataque no caso de uma lâmina inclinada para trás é apresentado nas Equações 24 a 30 e mostrados na Figura 19. Estes ângulos foram escolhidos para produzir o corte por deslizamento. 35 Figura 19 - Ângulo de ataque (α) para lâmina inclinada para trás. Do diagrama acima, θπα −� � � −= − dx dy1tan 2 (24) θRsenx = (25) θcosRy = (26) θkeRR 0= . (27) Substituindo: � � � � � � = θ θ d dx d dy dx dy (28) Onde: θθ θθ ksen ksen dx dy + +−= cos cos (29) Então: θ θθ θθπα −� � � + +−−= − ksen ksen cos costan 2 1 (30) 36 A Tabela 1 mostra as conversões dos ângulos θr para ângulos de ataque, para um disco com raio de 300 mm. Tabela 1 - Conversão do ângulo θr para ângulo de ataque α. Lâmina inclinada para trás Lâmina inclinada para frente θr (rad) α (grau) θr (rad) α (grau) 0.6 63.4 0.3 43.7 0.7 67.3 0.4 51.7 0.8 70.6 0.5 58.3 0.9 73.3 0.6 63.4 1.0 75.5 0.7 67.3 As lâminas foram fabricadas em aço carbono (ABNT 1020) com 4 mm de espessura usando uma fresa de diâmetro de 20 mm com ângulo de 45° e ângulo de chanfro de 19°. A Figura 20 é uma fotografia das lâminas inclinadas para frente, com serrilhado grande, e uma lâmina inclinada para trás com serrilhado médio. Figura 20 - Lâminas inclinadas para frente e para trás usadas no experimento de laboratório. 37 A Figura 21 mostra detalhes do serrilhado onde é possível ver os sulcos de 90° criando ângulo de 30° na parte interna do dente. Figura 21 - Tipo de serrilhado usado no experimento de laboratório. Para caracterizar as lâminas usadas no laboratório, foram tiradas fotografias dos bordos cortantes (Figuras 22 a 24). Na obtenção dessas fotografias foi usado um projetor MITUTOYO modelo PJ 300 com amplificação de 20 x. Foi usada uma lâmina convencional de mercado com 4 mm de espessura. 38 Figura 22 - Bordo cortante e ângulo de chanfro da lâmina convencional. Figura 23 - Bordo cortante e ângulo de chanfro da lâmina inclinada. 39 Figura 24 - Perfil da lateral do dente 5.2.2 Estrutura de teste A estrutura de teste foi desenhada de modo que possa simular a ação do cortador de base sobre a cana-de-açúcar. Esta estrutura é um dispositivo de corte simples, composta de duas partes (a e b) cujo esquema pode ser vista na Figura 25. Na parte (b), em que foi simulado o movimento de rotação do disco, a lâmina é fixada em um braço rotativo horizontal que é acelerado por uma grande mola de torção. O braço é preso por um gatilho com um sistema de disparo na parte superior da mola. A mola é tencionada por uma rosca posicionada na parte inferior. Na parte (a), que simula o movimento de translação do disco, um carrinho conduz o pedaço de cana a ser cortado contra a lâmina. O movimento do carrinho dispara a mola de torção automaticamente, na posição desejada. O carrinho é movido por uma rosca sem fim, acionada por um motor elétrico de 1kW. Entre o motor e a rosca existe uma embreagem eletromagnética. As amostras de cana-de-açúcar a serem cortadas, foram fixadas em um suporte pivotado preso na base do carrinho de maneira que apóie as amostras na posição vertical. A Figura 26 mostra um corte do carrinho com a amostra de cana-de-açúcar fixada em 40 sua parte inferior pelo suporte pivotado e apoiada nos sensores de força, posicionados logo abaixo da lâmina. A Figura 27 mostra uma vista de cima da configuração dos sensores de força. Os sensores foram posicionados de maneira a medir as forças normal e tangencial. A força tangencial foi dividida em duas componentes sendo força tangencial a ré (sensor 1) quando a direção da força de corte é contraria ao deslocamento da colhedora e a força tangencial avante (sensor 3) quando a força tangencial de corte é no mesmo sentido do deslocamento da colhedora. Figura 25 – Esquema da estrutura de teste usada no experimento de laboratório. 1 – Motor elétrico 2 – Embreagem eletromagnética 3 – Rosca sem fim 4 – Pedaço de cana 5 – Carrinho 6 – Transdutores de força piezoelétrico 7 – Lâmina 8 – Sistema automático para liberar o braço com a lâmina 9 – Gerador incremental de pulsos 10 – Mola de torção 41 Figura 26 – Esquema do perfil do carrinho com amostra de cana- de-açúcar. Figura 27 – Esquema da vista superior dos sensores apoiando a amostra de cana-de-açúcar. Para simular o efeito do rolo defletor da colhedora, um braço com rosca foi anexado à estrutura como mostra a Figura 28. Para este tipo de ensaio (com ângulo de deflexão) foi usada cana inteira e esta permanecia estacionária, fixada no suporte pivotado e apoiada na célula de carga. O ângulo de deflexão foi de 30°. 42 Figura 28 - Estrutura de teste com simulação de deflexão. 5.2.3 Sistema de aquisição de dados O sistema de aquisição de dados consistiu de três sensores piezo- elétrico “PCB Piezotronics”, modelo 208A03 com sensibilidade de 10,18 mV/lb, um gerador incremental de pulsos (RSE) modelo RS256-483, e um microcomputador com processador AMD Duron (TM) 946 MHz, 248 Mb de memória RAM e HD de 10Gb. O gerador incremental de pulso foi fixado no eixo do braço rotativo para medir a velocidade da lâmina antes e após o corte. Dois sinais do gerador incremental de pulsos foram usados durante aquisição de dados. O sinal “Z” gera um pulso quadrado por volta do eixo do braço rotativo e outro sinal, “A”, gera 2000 pulsos quadrados por volta. O gerador incremental de pulso foi posicionado de modo que o pulso “Z” fosse gerado logo após a liberação do braço rotativo para iniciar o processo de aquisição de dados. A Figura 29 mostra o esquema de aquisição de dados usado no experimento de laboratório. 43 Figura 29 - Esquema do sistema de aquisição de dados. O sistema é disparado pelo pulso “Z” que aciona um timer interno do microcomputador. O microcomputador foi programado para registrar o tempo de cinco pulsos, que corresponde a 5/2000 da volta. Após um atraso de 150 pulsos ou 27°, novamente é registrado o tempo de mais 5 pulsos. Este atraso permite que a borda da lâmina complete o corte. Conhecendo a duração em micro segundos de ambos os grupos de 5 pulsos “A” (5/2000 giros) é possível determinar a velocidade da lâmina antes e depois do corte. 5.2.4 Fotografias de alta velocidade Fotografias de alta velocidade foram usadas para observar e entender os processos de corte. Para se obter estas fotos foi usada uma câmera Pentax, modelo K 1000 com lente de 50 mm f/5.6 e filme ISO 400. Também foi usado um flash especial da marca Metz-Mecablitz modelo 45 CL3 com uma duração de 1/10.000 segundos. As fotografias foram tiradas à noite, com o laboratório escuro. A câmera permanecia aberta e o pulso Z foi ajustado para disparar o flash na posição desejada. 44 5.3 Métodos do experimento de laboratório A estrutura de teste foi utilizada para avaliar o desempenho das lâminas em função da velocidade angular, tipo de bordo cortante e ângulo de ataque da lâmina. O desempenho das lâminas foi caracterizado por quatro variáveis (danos no colmo cortado, perdas de massa, força e energia de corte). As análises foram conduzidas separadamente para as lâminas inclinadas para frente e para trás e a lâmina convencional foi usada para efeito de comparação (testemunha). Neste experimento, sem deflexão, foram usados pedaços da parte inferior do caule da cana-de-açúcar, da variedade Q 124, primeiro corte com aproximadamente 350 mm de comprimento. Os diâmetros foram medidos para cada amostra e variaram entre 22 e 31 mm. As amostras foram pesadas antes e depois do corte e as perdas foram determinadas pela diferença destas massas. Os danos em cada corte foram determinados de acordo com a classificação proposta por Kroes (1997) e adaptada para este trabalho. A tabela modificada é apresentada na Figura 30. Figura 30 - Classificação de danos 45 Para transformar o sinal da força do transdutor (mV) em força de corte (Fc), em Newtons, foram usadas as equações 31 a 33. O cartão de aquisição de dados contava 32768 para cada entrada de 5 volts e a sensibilidade do sensor de força era de 10,18 mV/lb. Para obter a força de corte (Fc) em N: lb N lb mV mVleitura Ft 445.4 18.10 5000 32768 ××= (31) qp qFt Fc + ×= (32) Onde: Ft = força do transdutor p e q são as distâncias entre a lâmina e o transdutor de força e a distância entre o transdutor de força e o apoio pivotado. Estas distâncias podem ser vistas na Figura 26. Para obter a resultante da força: 045.0)2)(()31)(()( 22 ×+= mVSensoroumVSensorNFc (33) A resultante da força foi dividida pelo diâmetro do caule para obter a força específica de corte (N/mm), que foi usada na análise estatística. A equação 34 determina a energia total para o momento polar de inércia e as velocidades antes e depois do corte. 2 )( 22 fi t J E ωω − = (34) Onde: 46 J = Momento polar de inércia ωi = Velocidade rotacional antes do corte ωf = Velocidade rotacional depois do corte Para calcular o momento de inércia de formas irregulares, foi usado o método do pêndulo e a massa polar da inércia. A equação 35 determina o momento polar de inércia. 2 gmrJ = (35) Onde: m = Massa do sistema rotativo rg = Raio de giro As massas, período de oscilação e o raio centróide do sistema rotativo são diferentes para cada tipo de lâmina, e são mostrados na Tabela 2. O raio de giro (rg) foi calculado pela equação 36 2 2 16C gr r c g τ = 36 Onde: τ = período de oscilação Rc = raio centróide do sistema C = fator de correção para amplitude de oscilação O período de oscilação foi calculado medindo-se o tempo de dez oscilações do sistema rotativo para cada diferente configuração. A amplitude de oscilação foi de 120°. 47 O raio centróide é a distância entre o centro de rotação e o centro de gravidade de todo o sistema rotativo. Esta medida é exemplificada na Figura 31 para uma lâmina inclinada para trás. O fator de correção C foi obtido na tabela 19.1, (Beer and Johnston, 1977) p752, sendo 2,157 para uma amplitude de oscilação de 120º. Os valores do momento de inércia (J) são mostrados na Tabela 2. Tabela 2 – Valores utilizados no cálculo do momento de inércia para os três tipos de lâminas utilizadas no experimento de laboratório. Lâmina convencional Lâmina inclinada para trás Lâmina inclinada para frente Massas do sistema rotativo (kg) 4,851 5,340 5,672 Período de oscilação (s) 1,175 1,169 1,241 Raio centróide (mm) 126 152 168 Momento de inércia (kg/mm2) 0,110 0,146 0,193 Figura 31 - Indicação do raio centróide para uma lâmina inclinada para trás. Raio centróide 48 A energia total foi dividida pela área para se obter a energia específica de corte (J/cm2). 5.3.1 Delineamento experimental Foram realizados dois experimentos, ambos em esquema fatorial. O primeiro foi com duas lâminas (inclinada para trás e para frente), cinco ângulos oblíquos, quatro tipos de bordos cortantes (liso, serrilhados pequeno, médio e grande), duas velocidades As velocidades angulares utilizadas foram: 450 rpm (18 m/s no topo da lâmina) e 600 rpm (22 m/s no topo da lâmina). Estas velocidades foram selecionadas em função de 600 rpm ser a velocidade utilizada atualmente nas colhedoras e como se pretendia otimizar a utilização da potência do motor, outra velocidade angular menor (450 rpm) foi utilizada. Uma lâmina convencional foi utilizada como fator de comparação e foram realizadas quatro repetições para cada combinação. A quantidade total de cortes nesse experimento foi (2 lâminas X 5 ângulos X 4 perfis X 2 velocidades + 2 lâminas convencionais) X 4 repetições = 328 parcelas experimentais. O Teste de Tukey a 5 % de probabilidade foi usado para comparar as médias A deflexão é um importante fator que afeta o corte, pois cria tensões internas dentro do material a ser cortado. Para estudar o efeito da deflexão sobre o processo de corte, outro experimento foi realizado e alguns fatores selecionados com base nos resultados do primeiro experimento. Estes fatores foram: dois tipos de lâminas (inclinada para trás e para frente), 1 ângulo de ataque (70’6’’ para lâmina inclinada para trás e 58’3’’ para lâmina inclinada para frente), 2 tipos de serrilhados (3 mm e 7 mm), uma velocidade angular (600 rpm), uma lâmina convencional e quatro repetições. A quantidade total de cortes foi de: (2 X 1 X 2 X 1 + 1) X 4 repetições = 20 parcelas experimentais. 5.4 Material do experimento de campo Para realização dos experimentos de campo foi usada uma colhedora da marca CASE modelo 7700 tracionada por esteiras que pode ser vista na Figura 32. 49 Uma estrutura de bambu e barbante (Figura 33) medindo 2m de comprimento por 1,5 m (espaçamento entre linhas) de largura foi usada para demarcar as áreas onde foram realizadas as avaliações. Figura 32 - Colhedora usada nos experimentos de campo. Figura 33 - Estrutura usada na demarcação das áreas onde foram realizadas as avaliações. Foi fabricado um conjunto de discos e vários jogos de lâminas. As lâminas foram fabricadas com aço SAE 9260 e submetidas à têmpera e revenimento, além de tratamento de termoquímico de endurecimento na parte inferior do bordo cortante, a base de carbureto de tungstênio (metalização). A Figura 34 mostra o disco com as lâminas. 50 Figura 34 - Disco com lâminas inclinadas para frente (rotação no sentido horário). O desenho da lâmina utilizada no campo pode ser visualizado na Figura 35. Figura 35 - Desenho da lâmina utilizada no campo. 51 A Figura 36 mostra detalhe do endurecimento superficial (metalização) realizada apenas na parte inferior (onde ocorre o contato com o solo) do bordo cortante. Figura 36 - Detalhe da metalização. As Figuras 37 e 38 mostram a lâmina serrilhada e a lâmina convencional respectivamente, montadas na colhedora. Figura 37 - Lâmina serrilhada fixada no disco. 52 Figura 38 - Lâmina convencional usada no experimento de campo. 5.5 Método do experimento de campo Foram realizados dois experimentos de campo, sendo o primeiro durante a safra (agosto, setembro e outubro de 2007) e o material colhido foi destinado à usina. O segundo experimento foi realizado durante a estação chuvosa (janeiro e fevereiro de 2008) e o material colhido foi destinada ao plantio. Quando a cana-de-açúcar colhida se destina à usina, o corte é realizado rente ao solo e quando a cana-de-açúcar é destinada ao plantio, o corte se realiza a aproximadamente 10 cm de altura para evitar a contaminação com terra. Os dois experimentos foram realizados em área cedida pela Usina São Martinho, denominada Capão da Cruz, no município de Pradópolis, SP, em Latossolo Vermelho Amarelo, arenoso. A área é plana, bastante homogênea e pode ser vista na Figura 39. No primeiro experimento foram determinados a durabilidade das lâminas, a altura de corte, o abalo de soqueira, a quantidade de tocos por metro e o teor de impurezas minerais. No segundo experimento, além dos parâmetros acima, exceto impurezas minerais, também foram determinados os danos nos tocos. 53 Figura 39 - Área onde foram realizados os experimentos. Para determinação da durabilidade, foi anotado o número do horímetro da colhedora antes e após a troca de cada conjunto de lâminas, e por diferença obteve-se o número de horas trabalhadas. A altura de corte foi determinada com o auxílio de uma trena e a quantidade de tocos foi determinada pela contagem dentro da parcela. O abalo da soqueira foi determinado aplicando-se, com uma das mãos, uma leve força alternada nas laterais dos tocos e dependendo do deslocamento, atribuía-se uma nota. Esta determinação foi realizada sempre pela mesma pessoa e as notas atribuídas foram 0, 3, 5, 7, e 10, sendo 0 para tocos intactos e 10 para arrancados. Os danos foram determinados segundo a Figura 30. As determinações (altura de corte, abalo da soqueira e danos no toco) foram realizadas logo após a passagem da colhedora, para evitar que o tráfego de máquinas pudesse alterar os resultados. Todos os tocos dentro da área demarcada pela estrutura de bambu foram medidos, contados e avaliados. A estrutura de bambu foi posicionada aleatoriamente nas áreas de colheita e foram realizadas 25 repetições para cada tratamento. Os tratamentos foram denominados de sistema convencional e com lâminas serrilhadas. O teste de Tukey a 5 % de probabilidade foi usado para comparação das médias. 54 6 RESULTADOS E DISCUSSÃO Este capítulo foi dividido em três partes, sendo a primeira parte os resultados obtidos no estudo cinemático, a segunda parte os resultados do experimento de laboratório e a terceira parte os resultados do experimento de campo. 6.1 Estudo cinemático A Figura 40 mostra a visualização gráfica gerada pelo programa diskin 7, para um disco com três lâminas de borda reta, com movimento de rotação no sentido horário e translação para a direita na direção positiva de X. A coordenada de origem X e Y estava no centro do disco. A simulação mostrou que existe parte do colmo da planta que não foi cortado pela lâmina. A Figura 41, obtida pelo programa diskin 8, mostra o percurso da lâmina inclinada para trás. O diagrama mostra duas linhas correspondendo às trajetórias da primeira lâmina (em vermelho) e da lâmina seguinte (em azul), representando que houve suficiente sobreposição para evitar o contato entre a cana e o disco. 55 Figura 40 - Visualização do caminhamento do bordo reto de lâminas vizinhas. -0.4 -0.2 0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 -0.4 -0.3 -0.2 -0.1 0 0.1 0.2 0.3 0.4 Figura 41 - Trajetória das lâminas com inclinação para trás. A trajetória e os vetores velocidades no bordo da lâmina podem ser traçados para um caso típico como é mostrado na Figura 42, que foi obtido com o programa 56 diskin 8d3. As lâminas são representadas em vermelho e as flechas representam as direções e as magnitudes das velocidades tangencial em azul (deslizamento) e normal em verde (impacto) para um ponto médio ao longo do bordo. Os vetores velocidade são diferentes para cada ponto sobre o bordo curvo da lâmina. Cinematicamente a maior diferença entre as lâminas com inclinações para frente e para trás é que o vetor da velocidade normal é para dentro nas lâminas com inclinação para frente, e para fora lâminas com inclinação para trás o vetor velocidade é para fora. Isso sugere que lâminas com curvaturas para frente podem auxiliar na alimentação da colhedora uma vez que a força de corte na base do caule atua na direção contrária ao deslocamento da máquina, o que facilita na alimentação. -0.4 -0.2 0 0.2 0.4 0.6 0.8 1 -0.5 -0.4 -0.3 -0.2 -0.1 0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 V 3 omega 60 R1 0.46 R0 0.3 thetar 0.7 Figura 42 - Vetores velocidades normal e tangencial para lâmina inclinada para frente (rotação horária e translação para a direita). A relação de velocidades Vt/Vn varia para cada ponto do bordo da lâmina e para cada posição angular. Portanto, para uma posição dada sobre o bordo pode ser representado pelo seu valor médio para toda posição angular do disco. Este valor médio sobre o arco durante cada corte ocorrido pode ser usado para identificar a melhor configuração de 57 lâmina e disco, visando maximizar a proporção de corte por deslizamento, ou seja, aumentando o valor da relação Vt/Vn. As simulações também podem ser usadas para mostrar a magnitude relativa das direções das velocidades normal e tangencial. A Figura 43, obtida com o programa diskin 7a2, mostra uma série de posições da lâmina com os vetores velocidades Vt e Vn para uma lamina com inclinação para trás, rotação no sentido horário e translação para a direita. O centro do disco é posicionado na coordenada de origem (X,Y) no ponto (0,0) Figura 43 - Relação entre velocidade tangencial (Vt) e velocidade normal (Vn). Com a lâmina inclinada para trás, a resultante da força de corte empurra a cana-de-açúcar para fora dos elementos de alimentação da máquina, enquanto que as lâminas com inclinação para frente, a resultante da força de corte puxa a cana para dentro da máquina. 58 As Tabelas 3 e 4 mostram os resultados da simulação da relação entre velocidades normal e velocidade tangencial considerando um valor médio da parte frontal do disco, para duas velocidades angulares (�) diferentes. Tabela 3 - Valores da relação Vt / Vn, para diferentes �r ângulos e velocidades angulares, para uma lâmina inclinada para frente. Média da relação Vt / Vn para diferentes �r ângulos Ângulo �r (rad) Velocidade angular 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 rpm ___________ sem dimensões ___________ 450 1,097 1,383 1,904 2,321 2,747 600 1,209 1,530 2,138 2,568 2,832 Tabela 4 - Valores da relação Vt / Vn, para diferentes �r ângulos e velocidades angulares, para uma lâmina inclinada para trás. Média da relação Vt / Vn para diferentes �r ângulos Ângulo �r (rad) Velocidade angular 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 rpm ___________ sem dimensões___________ 450 1,132 1,374 1,623 1,881 2,150 600 1,465 1,456 1,730 2,021 2,326 6.2 Experimento de laboratório As análises foram conduzidas separadamente para lâminas inclinadas para trás e para frente e a lâmina convencional foi usada para efeito de comparação. As quatro variáveis estudadas (danos, perdas de massa, força e energia) apresentaram diferenças em função dos parâmetros investigados (velocidade angular, ângulo de ataque e tipo de bordo cortante, liso ou serrilhado). 59 6.2.1 Danos A Tabela 5 mostra que a redução na velocidade angular do disco aumentou significativamente os danos. Quando a velocidade angular é reduzida, acredita-se que as fibras individuais da cana têm mais tempo para se re-arranjarem (acomodar) na presença de uma força externa, distribuindo a força ao longo da seção a ser cortada e a ruptura ocorre com maior deslocamento destas fibras, consequentemente causando maiores danos. Tabela 5 - Danos em função da velocidade angular do disco. Lâminas Velocidade angular Convencional Inclinada para trás Inclinada para frene (rpm) _______________ (notas) _______________ 450 4,5 A 3,26 A 3,44 A 600 3,5 B 2,64 B 2,58 B Números seguidos de letras iguais, nas colunas, não diferem significativamente. Diferença mínima significativa para lâmina convencional 0,44 lâmina inclinada para trás 0,18 e lâmina inclinada para frente 0,19 Estes resultados estão de acordo com Kroes (1997) e Novais (1977) que mostraram que cortes a velocidades mais altas causam menos danos. Mesmo com os maus resultados a 450 rpm, esta velocidade angular foi estudada para verificar seu comportamento com lâminas serrilhadas. Para bordo cortante os resultados são apresentados na Tabela 6. É possível observar que a lâmina com bordo liso causou mais danos enquanto que o serrilhado pequeno apresentou os menores valores. Lâminas inclinadas com perfil liso cortam a cana por deslizamento enquanto que as com perfil serrilhado cortam pelo princípio do serrilhado. Os ângulos de ataque não apresentaram um efeito consistente sobre os danos. Esses resultados consideram a variação do ângulo para todos os tipos de serrilhados e bordo liso. A Tabela 7 mostra a variação dos danos em função do ângulo de ataque. 60 Tabela 6 - Danos em função tipo de bordo cortante das lâminas. Lâminas Bordo cortante Inclinada para trás Inclinada para frente _______ (notas) _______ Liso 3,05 AB 2,90 AB Serrilhado grande 2,80 BC 2,60 BC Serrilhado médio 2,40 C 2,25 CD Serrilhado pequeno 1,45 D 1,65 D Números seguidos de letras iguais, nas colunas, não diferem significativamente. Diferença mínima significativa para lâmina inclinada para trás 0,57 e lâmina inclinada para frente 0,61. Tabela 7 - Danos em função do ângulo de ataque das lâminas com velocidade angular de 600 rpm. Lâmina inclinada para trás Lâmina inclinada para frente Ângulo (grau) Danos (nota) Ângulo (grau) Danos (nota) 63,4 2,80 A 43,7 2,75 A 67,3 2,50 A 51,7 2,40 A 70,6 2,40 A 58,3 2,23 A 73,3 2,65 A 63,4 2,50 A 75,5 2,85 A 67,3 2,86 A Números seguidos de letras iguais, nas colunas, não diferem significativamente. Diferença mínima significativa para lâmina inclinada para trás 0,57 e lâmina inclinada para frente 0,61. Para melhor visualizar a influência do ângulo do bordo cortante sobre os danos, a Tabela 8 mostra a interação do ângulo com o bordo cortante a 600 rpm. A Figura 44 é a representação gráfica dos dados apresentados na Tabela 8. É possível observar que com a lâmina lisa quando o ângulo de ataque aumentou houve uma redução inicial seguido de um aumento progressivo. O serrilhado pequeno apresentou os menores valores. Esta observação indica que para lâmina com bordo cortante liso, existe um ângulo onde a combinação das forças normal e tangencial produzem um dano mínimo. Com lâminas serrilhadas o deslizamento ocorre dentro do dente, o que possivelmente explica a pouca influência dos ângulos de ataque estudados. 61 Tabela 8 - Interação do ângulo de ataque com o bordo cortante para lâmina inclinada para frente. Bordo cortante Ângulo Liso Serrilhado grande Serrilhado médio Serrilhado pequeno (grau) __________________ (nota) __________________ 43,7 3,00 3,25 2,50 1,50 51,7 2,25 2,25 2,25 1,75 58,3 2,50 2,25 2,00 1,75 63,4 3,00 2,00 2,50 1,50 67,3 3,75 3,25 2,00 1,75 0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 3,5 4 43.7 51.7 58.3 63.4 67.3 Ângulo (grau) D an os (n ot a) LIso Grande Médio Pequeno Figura 44 - Valores dos danos em função do ângulo de ataque para os diferentes tipos de serrilhado. 6.2.2 Perdas de massa Assumindo uma densidade de 12 caules/metro e um grama de perda por corte, pode-se estimar uma perda de aproximadamente 800 kg há-1. Dois tipos de perdas foram observados durante a condução do experimento. Uma pequena quantidade causada pela perda de suco e células sacarifica (perdas invisíveis) e uma perda maior causada pela remoção de fragmentos de caule. 62 A análise de variância mostrou que houve diferença significativa para bordo cortante e velocidade, mas não houve diferença significativa para ângulo. A Tabela 9 mostra as médias de perdas em função da velocidade para todos os bordos cortantes e ângulos de ataque. Nas baixas velocidades (450 rpm) as perdas não mostraram diferença significativa para lâmina convencional, mas apresentaram um aumento para as lâminas inclinadas para trás e para frente. Esses dados confirmam que a redução da velocidade angular causa maiores perdas e danos. Tabela 9 - Perdas de massa em função da velocidade angular. Lâminas Velocidade angular Convencional Inclinada para trás Inclinada para frente (rpm) _______________ (g) _______________ 450 1,56 A 1,48 A 1,44 A 600 1,40 A 1,24 B 1,09 B Números seguidos de letras iguais, nas colunas, não diferem significativamente. Diferença mínima significativa para lâmina convencional 0,19 lâmina inclinada para trás 0,19 e lâmina inclinada para frente 0,20 Para o bordo cortante a Tabela 10 mostra as médias de perdas para todos os ângulos e velocidades. O serrilhado grande mostrou as maiores médias. Tabela 10 - Perdas de massa em função do tipo de bordo cortante. Bordo cortante Lâminas Inclinada para trás Inclinada para frente _______ (g) _______ Liso 1,23 A 1,12 AB Serrilhado grande 1,74 B 1,45 B Serrilhado médio 1,29 A 1,39 B Serrilhado pequeno 1,07 A 0,88 A Números seguidos de letras iguais, nas colunas, não diferem significativamente. Diferença mínima significativa lâmina inclinada para trás 0,42 e lâmina inclinada para frente 0,45. 63 A interação entre ângulo e serrilhado a 600 rpm é apresentado na Tabela 11. O bordo liso mostrou o menor valor de perdas (0,54 g/corte) enquanto que serrilhado grande apresentou as maiores perdas 2,46 g/corte. Tabela 11 - Interação entre ângulo de ataque e bordo cortante para lâmina inclinada para trás. Bordo cortante Ângulo Liso Serrilhado grande Serrilhado médio Serrilhado pequeno (grau) __________________ (g) __________________ 63,4 0,68 2,20 0,97 0,96 67,3 0,81 0,87 0,93 0,90 70,6 0,54 1,18 1,14 0,90 73,3 0,96 2,46 1,34 0,98 75,5 2,36 1,42 1,31 0,97 A Figura 45 mostra os dados da Tabela 11 graficamente. Nota-se que as lâminas com bordo liso inicialmente mostraram perdas pequenas, até o ângulo de 73,3°, mas aumentou consideravelmente a partir deste valor. As perdas com serrilhado pequeno permaneceram praticamente constante com o aumento do ângulo ataque. 0 0,5 1 1,5 2 2,5 3 63.4 67.3 70.6 73.3 75.5 Ângulo (grau) Pe rd as (g ) Liso Grande Médio Pequeno Figura 45 - Variação de perdas em função do ângulo de ataque. 64 6.2.3 Forças de corte A força de corte foi decomposta em força normal e tangencial. Dependendo da direção da força tangencial, esta foi chamada de força avante e a ré. Força avante corresponde à força no sentido do deslocamento da máquina, enquanto que a força a ré corresponde ao sentido oposto ao deslocamento. Para a lâmina convencional o movimento das amostras de cana em contato com a lâmina causou uma força tangencial avante devido a fricção entre a cana e a lâmina durante o corte. A Figura 46 mostra as forças de corte para uma lâmina convencional trabalhando a 600 rpm. A ocorrência de um segundo pico de força normal é devido à presença de casca da cana-de-açúcar na finalização do corte. Quando a velocidade foi reduzida para 450 rpm, o corte causou mais danos no caule criando forças avante e a ré ao mesmo tempo como mostra a Figura 47. Para produzir forças avante e a ré simultaneamente assumiu-se que a cana foi esmagada e seu diâmetro aumentado na direção perpendicular ao corte. Este fenômeno também foi observado com serrilhado grande onde a penetração de um grande dente na cana causou forças avante e a ré ao mesmo tempo. -50 0 50 100 150 200 250 300 350 400 0, 4 1, 03 1, 66 2, 29 2, 92 3, 55 4, 18 4, 81 5, 44 6, 07 6, 7 7, 33 7, 96 8, 59 9, 22 9, 85 10 ,5 11 ,1 11 ,7 12 ,4 Tempo (ms) Fo rç a de c or te (N ) Força avante Força normal Força a ré Figura 46 - Forças de corte para uma lâmina convencional a 600 rpm. 65 -100 0 100 200 300 400 500 0, 01 1, 27 2, 53 3, 79 5, 05 6, 31 7, 57 8, 83 10 ,1 11 ,4 12 ,6 13 ,9 15 ,1 16 ,4 17 ,7 Tempo (ms) Fo rç a de c or te (N ) Força avante Força normal Força a ré Figura 47 - Forças de corte para uma lâmina convencional a 450 rpm. Schembri e Harris (1996) notaram que o corte por impacto normalmente resultam na formação de uma rachadura no caule em forma de “Y”. Eles explicam que a rachadura é o resultado do efeito de uma zona de impacto. Se a resistência das células for menor que a força de impacto aplicada, a parede celular irá se ro