UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE ODONTOLOGIA - CAMPUS DE ARAÇATUBA Curso de Medicina Veterinária DIAGNÓSTICO DA LEISHMANIOSE VISCERAL CANINA PELAS TÉCNICAS DE IMUNOISTOQUÍMICA E PCR EM TECIDOS CUTÂNEOS EM ASSOCIAÇÃO COM A RIFI E ELISA-TESTE Nina Marí Gual Pimenta de Queiroz Bióloga ARAÇATUBA – SP 2008 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE ODONTOLOGIA - CAMPUS DE ARAÇATUBA Curso de Medicina Veterinária DIAGNÓSTICO DA LEISHMANIOSE VISCERAL CANINA PELAS TÉCNICAS DE IMUNOISTOQUÍMICA E PCR EM TECIDOS CUTÂNEOS EM ASSOCIAÇÃO COM A RIFI E ELISA-TESTE Nina Marí Gual Pimenta de Queiroz Orientadora: Profª. Drª. Wilma Aparecida Starke Buzetti Co-orientadora: Profª. Drª. Caris Maroni Nunes Dissertação apresentada à Faculdade de Odontologia – UNESP, Campus de Araçatuba, como parte das exigências para a obtenção do título de Mestre em Ciência Animal (Medicina Veterinária Preventiva e Produção Animal). ARAÇATUBA – SP 2008 Ficha Catalográfica elaborada pela Biblioteca da FOA / UNESP Queiroz , Nina Marí Gual Pimenta de Q3d Diagnóstico da leishmaniose visceral canina pelas técnicas de imunoistoquímica e PCR em tecidos cutâneos em associação com a Rifi e Elisa-teste / Nina Marí Gual Pimenta de Queiroz. – Araçatuba: [s.n.], 2009. 125 f. : il. + CD ROM Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Odontologia, Curso de Medicina Veterinária, Araçatuba, 2009. Orientador: Profa. Dra. Wilma Aparecida Starke Buzetti Co-orientador: Profa. Dra. Caris Maroni Nunes 1. Leishmania. 2. Cães. 3. Serologia. CDD 616.9364 DADOS CURRICULARES DO AUTOR NINA MARÍ GUAL PIMENTA DE QUEIROZ – nascida em Ribeirão Preto (SP), a 16 de março de 1984. Ingressou em 2002 no curso de Licenciatura em Ciências Biológicas da Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), colando grau em dezembro de 2006. Em março de 2007, iniciou como aluna regular da Pós- graduação em Ciência Animal, do Curso de Medicina Veterinária da FOA - UNESP, Campus de Araçatuba. �������� � � � � ��� � ���� �� � �� � �� ���� �� � � �� � � � � � ��� � � � �� �� ������������ ��� ��� �� � DEDICATÓRIA Dedico este trabalho a uma flor que tem enfrentado com coragem as asperezas do ambiente, pois é tempo de desabrochar e florir para a vida. Esta linda flor, ao escolher renascer entre nós, tem alegrado e servido de exemplo para cuidarmos do jardim de nossos corações e buscarmos viver com fé, alegria, gratidão e muito esforço para evoluirmos e crescermos seguindo as diretrizes do mestre Jesus, pois é assim que ela tem enfrentado os desafios do caminho e a cada vitória exala perfume ainda mais doce. Esta flor tem nome e se chama Maíra. AGRADECIMENTOS Em busca de aprimorar meus conhecimentos e conquistar o título de mestre, muitos outros mestres, com ou sem título, ensinaram-me as diversas facetas da vida, a eles sou grata: Acima de tudo agradeço a Deus e aos ensinos do grande mestre Jesus que iluminam minha caminhada, abençoando, orientando e dando segurança a cada um de meus passos. Aos meus queridos pais e avós, mestres da vida, que me aceitaram com carinho e me educaram para o mundo, sem deixar que se desfizessem os laços que nos unem e me amparam constantemente. Os maiores aprendizados com certeza estão entre os mais próximos, por isto agradeço a toda minha família, em especial às minhas irmãs, que nunca faltaram com estímulos para que eu seguisse confiante. Entre tantos mestres que tive durante minha formação acadêmica, agradeço em especial à prof. Drª Wilma A. Starke Buzetti, por aceitar sempre os desafios, incluindo o de orientar-me, de permitir lançar-se em novas áreas de pesquisa, investir neste projeto e mostrar-me os caminhos deste universo que pretendo percorrer. Agradeço por sempre trabalharmos de forma agradável, numa relação de compreensão, carinho e amizade, proporcionando a mim outros aprendizados além da ciência. Agradeço às pessoas que desde o início da idealização deste projeto até a sua conclusão, auxiliaram-me com muito esforço e amizade: Kika, Camila, Rita, Mychele, Silvana, Karen, Flávia e em especial à Juliana que enfrentou comigo os desafios desta etapa do mestrado. Aos funcionários do Departamento de Biologia e Zootecnia da Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira, em especial aos técnicos do Laboratório de Parasitologia. Em nome do Carlinhos, agradeço a toda equipe do Centro de Controle de Zoonoses de Ilha Solteira que não mediu esforços em apoiar e colaborar com o projeto. Ainda nesta união de forças em prol da ciência, gostaria de agradecer imensamente à equipe do Laboratório de Imunoparasitologia da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias – Universidade Estadual Paulista (FCAV- UNESP), Campus de Jaboticabal, em especial à prof. Drª Rosângela Zacarias Machado e à Tricia, pela realização dos exames sorológicos e incansável orientação e colaboração. Da mesma forma, agradeço em especial à prof. Drª Caris Maroni Nunes pela co-orientação e toda a equipe do Laboratório de Bioquímica e Biologia Molecular da Faculdade de Odontologia de Araçatuba – Universidade Estadual Paulista (FOA-UNESP), onde foram realizados os exames moleculares. Sinceros agradecimentos à instituição, aos funcionários e ao diretor da Universidade Estadual Paulista, Campus de Araçatuba. Ao incentivo e ao financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), através dos quais foi possível desenvolver e concluir esta pesquisa com qualidade. Enfim, a cada um dos amigos dos dois planos, que se sentirem parte integrante desta curta, mas valorosa caminhada, agradeço pelo amparo e pelas oportunidades constantes de evolução. SUMÁRIO RESUMO ABSTRACT 1 INTRODUÇÃO E REVISÃO DE LITERATURA ........................................ 12 2 OBJETIVOS .............................................................................................. 30 2.1 Objetivo Geral ..................................................................................... 30 2.2 Objetivos Específicos .......................................................................... 30 3 MATERIAL E MÉTODO ............................................................................ 31 3.1 Local ................................................................................................... 31 3.2 Animais ............................................................................................... 31 3.2.1 Formação dos Grupos de Cães ................................................. 32 3.3 Exames Sorológicos ........................................................................... 33 3.3.1 ELISA indireto ............................................................................. 33 3.3.1.1 Descrição da técnica ........................................................... 33 3.3.1.2 Tratamento dos dados ........................................................ 34 3.3.2 Reação de Imunofluorescência Indireta (RIFI) ........................... 35 3.3.2.1 Descrição da técnica .......................................................... 35 3.4 Exames Parasitológicos ...................................................................... 36 3.4.1 Histoquímica (HE) ....................................................................... 36 3.4.2 Imunoistoquímica (IMIQ) ............................................................ 37 3.5 Exame Molecular ................................................................................ 38 3.5.1 Reação em Cadeia pela Polimerase (PCR) .............................. 38 3.5.1.1 Extração do DNA ................................................................ 38 3.5.1.2 Concentração e pureza do DNA ........................................ 39 3.5.1.3 Amplificação do DNA ......................................................... 39 3.5.1.4 Análise do DNA ................................................................. 40 3.6 Análise Estatística ............................................................................... 40 4 RESULTADO ............................................................................................ 41 4.1 Sinais Clínicos e Alterações Anatomopatológicas .............................. 41 4.2 Exames Parasitológicos ...................................................................... 43 4.2.1 Exame Histoquímico (HE) e Avaliação Histopatológica ............. 43 4.2.2 Exame Imunoistoquímico (IMIQ) ................................................ 48 4.3 Exames sorológicos (ELISA e RIFI) ................................................... 50 4.4 Exame Molecular por PCR ................................................................. 51 4.5 Análise comparativa entre os métodos de diagnóstico ...................... 55 5 DISCUSSÃO ............................................................................................. 60 6 CONCLUSÃO ........................................................................................... 70 REFERÊNCIAS .......................................................................................... 71 APÊNDICES ................................................................................................ 87 Apêndice A ................................................................................................ 88 Apêndice B ................................................................................................ 90 DIAGNÓSTICO DA LEISHMANIOSE VISCERAL CANINA PELAS TÉCNICAS DE IMUNOISTOQUÍMICA E PCR EM TECIDOS CUTÂNEOS EM ASSOCIAÇÃO COM A RIFI E ELISA-TESTE RESUMO - A leishmaniose visceral canina (LVC) é causada pelo protozoário Leishmania (L.) chagasi e a presença deste parasita na pele dos cães reforça a importância destes animais no ciclo de vida da L. (L..) chagasi e na infecção humana. O objetivo deste trabalho foi avaliar o teste imunoistoquímico (IMIQ) e a PCR (Reação em Cadeia da Polimerase) em tecidos cutâneos caninos para o diagnóstico da LVC e compará-los com os exames histoquímico (HE) e sorológicos (ELISA e RIFI). Dos 34 cães naturalmente infectados, classificados em assintomáticos, oligossintomáticos e polissintomáticos, foram colhidas amostras de pele sadia ou com lesão para a realização da IMIQ, HE e PCR. Não somente peles lesionadas (56,5%), mas também peles sadias (31,8%) encontravam-se positivas pela IMIQ, confirmadas posteriormente pela PCR em 97,8% das amostras. No grupo assintomático, 87,5% estavam negativos pelos testes sorológicos, mas positivos em 50% dos casos pela IMIQ e 100% pela PCR. Entre os oligossintomáticos, 100%, 85,7% e 28,6% encontravam-se positivos, respectivamente pela PCR, sorologia e IMIQ. 91,7% dos polissintomáticos eram soro positivos e tinham parasitas intactos na pele. A PCR apresentou maior positividade, detectando amastigotas na pele de 100% dos cães independente do quadro clínico, do resultado dos exames sorológicos e do teste HE. A eficiência de cada teste variou de acordo com a evolução da doença, demonstrando a necessidade da associação de técnicas, usando IMIQ para confirmação da sorologia e a PCR apenas nos casos ainda suspeitos após a IMIQ, podendo assim aumentar os níveis de positividade e contribuir para o controle desta zoonose. Palavras-Chave: Leishmania, cães, serologia. IMMUNOHISTOCHEMISTRY AND PCR IN SKIN TISSUES IN ASSOCIATION WITH RIFI AND ELISA-TEST FOR CANINE VISCERAL LEISHMANIASIS DIAGNOSIS SUMMARY - Canine visceral leishmaniasis (CVL) is caused by a protozoa of the specie Leishmania (L.) chagasi and the presence of parasite in the skin reinforces the importance of dogs in the L. (L.). chagasi life cycle and for human infection. The purpose of the present study was to evaluate the immunohistichemistry (IMHC) and PCR (Polymerase Chain Reaction) tests for CVL diagnosis and compared the results with serological tests such as the indirect fluorescence antibody test (IFAT), ELISA and a parasitalogical test (microscopic direct examination of the parasite stained with haematoxylin and eosin - HE). For this study, samples of healthy or lesion skin tissues were obtained from 34 CVL naturally infected dogs classified in three groups: asymptomatic, oligosymptomatic and polisymptomatic. Not only lesion (56.5%) but also healthy skins (31.8%) were positives by IMHC and confirmed by PCR in 97.8% of skin samples. In asymptomatic group, 87.5% dogs were negatives by serological tests, but positives by IMHC in 50% and by PCR in 100%. In oligosymptomatic group, 100%, 85.7% and 28.6% of dogs were positives, respectively by PCR, serological and IMHC tests. In addition, 91.7% of polisymptomatic dogs were serum positives and had intact parasites in the skin. PCR showed higher positivity, detecting amastigotes in skins of 100% dogs regardless their clinical status or the serological or IMHC or HE test results. The efficiency of each test varied in agreement with the evolution of the disease. IMHC may be used to confirm the results of the serology and PCR only in suspicious cases after IMHC. The association of techniques proposed in this study may increase the positivity and contributed to the control of this zoonoses. Keywords: Leishmania, dogs, serology. 12 1 INTRODUÇÃO E REVISÃO DE LITERATURA As Leishmanioses são doenças de caráter crônico e com ampla distribuição mundial, causadas por protozoários digenéticos, pertencentes ao filo Sarcomastigophora, ordem Kinetoplastida, família Trypanosomatidae e gênero Leishmania (ROSS, 1906). Existem duas formas principais deste parasita, sendo uma flagelada ou promastigota, encontrada no tubo digestório do inseto vetor e em alguns meios de cultura artificiais, e outra aflagelada ou amastigota, que parasita principalmente células do sistema fagocitário nos tecidos dos hospedeiros vertebrados (BRASIL, 2006). O gênero Leishmania é dividido em dois subgêneros de acordo com o comportamento evolutivo do parasita no tubo digestório do vetor: Leishmania, com distribuição restrita à porção anterior e média (ROSS, 1903) e Viannia, com desenvolvimento desde o intestino posterior até a porção anterior do tubo digestório (LAINSON; SHAW, 1987). Dentro do gênero Leishmania existem cerca de 30 espécies, das quais aproximadamente 21 têm capacidade de produzir a enfermidade na espécie humana (ASHFORD, 2000; HERWALDT, 1999). De acordo com a espécie do parasita e das interações entre esses e seus hospedeiros, as patologias são divididas em leishmaniose tegumentar, que envolve manifestações cutânea, mucocutânea e cutânea difusa, e a leishmaniose visceral com alterações sistêmicas comuns a todos os hospedeiros vertebrados e também cutâneas muito freqüentes nos cães (ASHFORD, 2000; MICHALSKY et al., 2002; RIBEIRO, 1997). A leishmaniose visceral (LV) é causada por três espécies que tem características clínicas e epidemiológicas distintas, além de ocorrerem em 13 diferentes regiões geográficas, sendo a Leishmania (Leishmania) donovani encontrada na Índia, Bangladesh e Nepal; a L. (L.) infantum de manifestação na região do mar Mediterrâneo, Europa, África e China e a L. (L.) chagasi nas Américas do Norte, Central e do Sul (WHO, 2002). A morfologia da L. (L.) chagasi e da L. (L.) infantum é muito semelhante, por isso, alguns autores compararam suas estruturas em estudos bioquímicos e moleculares e sugeriram que ambas podem ser consideradas como uma única espécie, permitindo assim denominar de L. (L.) infantum o agente etiológico desta zoonose também nas Américas (MAURÍCIO et al., 1999). A LV caracteriza-se por um conjunto de manifestações complexas e multifacetadas, causadas por diversas espécies do gênero Leishmania, transmitidas por insetos vetores que afetam tanto humanos como animais domésticos e silvestres e estão distribuídas por todos os continentes, com exceção da Oceania e da Antártida. As leishmanioses são um grave problema de saúde pública, com prevalência mundial estimada em 12 milhões de casos e incidência anual de 1,5 - 2 milhões de casos, sendo 1 - 1,5 milhões de leishmaniose cutânea e 500.000 da forma visceral, distribuídos em áreas cada vez maiores e muitas delas que não eram anteriormente endêmicas (WHO, 2002). Esta doença já foi considerada uma doença rural, tipicamente silvestre. Todavia, as modificações ambientais causadas pelo homem e a constante migração das populações da zona rural para as zonas urbanas tem promovido a urbanização da doença (MARZOCHI; MARZOCHI, 1994; MENDES et al., 2002). Outros fatores associados com o aparecimento da doença são a coleta de lixo, o sistema de esgotos irregulares ou ausentes e o acúmulo de matéria orgânica devido à presença de animais no peridomicílio (BARBOZA et al., 2006; MOREIRA JUNIOR et al., 2003; MORENO et al., 2005). A característica genética determina as diferentes respostas imunológicas nos cães, sendo que alguns animais ou raças podem ser mais resistentes do que outros, determinando a susceptibilidade à doença (SOLANO-GALLEGO et al., 2000). 14 Os casos humanos de LV estão freqüentemente associados à pressão antrópica sobre o meio ambiente, os principais atingidos são as crianças menores de 10 anos (DANTAS-TORRES et al., 2006) e pessoas imunodeprimidas, especialmente aquelas infectadas pelo HIV (ALVAR, 1999; WHO, 2007). A elevada freqüência desta associação está relacionada tanto à reativação da infecção quanto a uma forma alternativa (antroponótica) de infecção primária, decorrente da inoculação intravenosa de Leishmania sp, por meio de compartilhamento de agulhas e seringas na transmissão inter-humana. Cerca de 90% desta ocorrência atinge pessoas do sexo masculino que são usuários de drogas intravenosas (SÃO PAULO, 2003). A letalidade da LV vem aumentando gradativamente, passando de 3,6% no ano de 1994 para 6,7% em 2003, o que representa um incremento de 85% (BRASIL, 2006). A doença ocorre em 65 países, sendo que 90% dos casos são provenientes das regiões rurais pobres ou suburbanas de cinco países (Bangladesh, Índia, Nepal, Sudão e Brasil). Em toda a América já foram registrados mais de 5.000 casos de LV (PAHO, 2007). Na América Latina, a doença já foi descrita em pelo menos 12 países, distribuídos desde o México até o norte da Argentina, sendo 90% dos casos de ocorrência no Brasil (BRASIL, 2003; DESJEUX, 2004; GUERIN et al., 2002; LAINSON; RANGEL, 2005). O primeiro caso, no Brasil, foi registrado em 1913, quando Migone, no Paraguai, descreveu a doença em material de necropsia de paciente oriundo do município de Corumbá no Mato Grosso do Sul (SÃO PAULO, 2003). Em 1934, Henrique Penna observou formas amastigotas de Leishmania sp em amostras de fígado de pacientes durante a necropsia. Somente em 1953 registrou-se o primeiro surto da doença no município de Sobral-CE e mais tarde, na década de 80, observou-se uma mudança na distribuição geográfica e a primeira epidemia urbana da leishmaniose visceral em Teresina - PI (COSTA et al., 2005; GONTIJO; MELO, 2004; LAINSON; RANGEL, 2005). Atualmente, a leishmaniose visceral ocorre de forma endêmica em 20 dos 27 Estados do Brasil, além do Distrito Federal, sendo que em todos eles tem sido 15 relatada a associação entre a existência de cães infectados e a presença do vetor (LAINSON; RANGEL, 2005; MILES et al., 1999). Nas últimas duas décadas, a LV tem ocorrido com grande freqüência em áreas urbanas de cidades, como: São Luis - MA, Natal - RN, Aracaju - SE, Cuiabá - MT, Campo Grande - MS, Belo Horizonte - MG e Rio de Janeiro - RJ (DESJEUX, 2004; GONTIJO; MELO, 2004). A leishmaniose visceral no Estado de São Paulo, até 1998, era conhecida pela detecção de casos importados, oriundos de outras regiões endêmicas do país. A partir deste ano registrou-se pela primeira vez um caso autóctone de leishmaniose visceral canina (LVC) em Araçatuba, região noroeste do Estado, com posterior registro do primeiro caso humano em 1999 (GALIMBERTTI et al., 1999). Desde a sua primeira detecção em 1999 até outubro de 2007 a LVC foi registrada em 57 municípios, abrangendo todas as regiões em que o vetor Lutzomyia longipalpis foi detectado (regiões administrativas de Araçatuba, Bauru, Marília e Presidente Prudente), exceto a Região Metropolitana de São Paulo, em que o mecanismo de transmissão ainda não foi elucidado. A prevalência canina média obtida no Estado de São Paulo em 2006, a partir de inquéritos censitários realizados em 30 municípios, dos 43 com transmissão canina, foi de 7,3%, variando de 0,0% a 20,0%. No entanto, o percentual de eutanásia canina foi inferior a 30% dos cães diagnosticados com a infecção pelo parasita (CAMARGO-NEVES, 2008). A transmissão da doença na população humana, no período de 1999 até outubro de 2007, foi observada em 48 municípios do Estado de São Paulo. Destes, em 23 notificaram-se casos humanos em 2007 e em sete verificou-se o registro do primeiro caso humano, mostrando claramente que a LV está em fase de expansão no Estado (CAMARGO-NEVES, 2008). Acredita-se que o aparecimento dos primeiros casos na região Oeste do Estado de São Paulo se deu em continuidade ao avanço da doença no Estado do Mato Grosso do Sul. A expansão e a disseminação da doença aconteceram entre 1998 e 2004, período correspondente à construção do gasoduto Brasil- Bolívia que mobilizou grande número de trabalhadores e seguiu o traçado da 16 ferrovia e da rodovia BR-262, a qual liga Corumbá ao Espírito Santo (Figura 1). Antes deste período a doença estava praticamente restrita à cidade de Corumbá, no pantanal sul-matogrossense, fronteira com a Bolívia. Ao final da década de 90 já havia se expandido no sentido Oeste - Leste, atingido a capital, Campo Grande, e chegado a Três Lagoas, na divisa com o Estado de São Paulo (ANTONIALLY et al., 2006). No Estado de São Paulo a expansão continuou na mesma direção, e mais recentemente vem acontecendo também no sentido Norte - Sul, na região Leste do Estado de São Paulo, a partir do Estado de Minas Gerais (Figura 2) (CAMARGO-NEVES, 2008). FIGURA 1 - Mapa mostrando a evolução da LV no Mato Grosso do Sul entre os anos de 1913 a 2004 e a coincidência com três distúrbios antropogênicos do desenvolvimento no estado. Fonte: Antonially et al., 2006 17 FIGURA 2 - Distribuição de municípios com transmissão da leishmaniose visceral canina, por início de ano de transmissão. estado de São Paulo, 2006. Fonte: GEL/CCD/SUCEN Estudos recentes na cidade de Ilha Solteira, área endêmica para LVC, mostram que dos 3798 cães examinados entre julho de 2006 a janeiro de 2007, 355 (9,35%) eram sorologicamente positivos pela RIFI e outros 120 (3,16%) pelo exame parasitológico direto em amostras coletadas através de punção de linfonodo e coradas por hematoxilina e eosina. Em outra avaliação no mês de junho de 2008, 33 cães com sinais clínicos para a LVC foram positivos por exame parasitológico e cinco positivos pelo teste sorológico. Os registros freqüentes de casos de LVC no município indicaram a necessidade de uma melhor adequação dos métodos de controle e diagnóstico da doença (ASSIS et al., 2008). A forma promastigota é a responsável pela infecção nos hospedeiros vertebrados e se reproduz, sob a forma de amastigotas, por divisão binária simples no interior de vacúolos das células de Kupffer do fígado, nos macrófagos do baço, da medula óssea e dos linfonodos, que são órgãos extremamente ricos em células fagocitárias, bem como nos rins, intestinos, 18 pulmões e pele (REY, 2001). As amastigotas caracterizam-se pela forma circular e aflagelada, com núcleo grande e arredondado, citoplasma contendo uma estrutura mitocondral em forma de bastonete e composta por filamentos de ácido desoxirribonucléico (kDNA), denominada cinetoplasto (MICHALIK, 2005). As formas promastigotas são alongadas, com um flagelo inserido na porção anterior, livre e longo, um núcleo arredondado e um cinetoplasto em forma de bastão (MICHALIK, 2005). Os vetores responsáveis pela transmissão da LV são insetos da família Psychodidae, subfamília Phlebotominae, sendo a Lutzomia longipalpis a principal espécie nas Américas (REY, 2001). Há também registros no Brasil de L. cruzi no estado do Mato Grosso do Sul (SANTOS et al., 1998) e L. intermedia no litoral do Rio de Janeiro (MARZOCHI et al., 1994). Estes flebotomíneos são vulgarmente conhecidos como mosquito palha, birigui ou tatuquiras e vivem em habitats variados de áreas silvestres, rurais, suburbanas e urbanas (REY, 2001). As formas imaturas desenvolvem-se em ambientes terrestres úmidos, ricos em matéria orgânica e de baixa incidência luminosa (BRASIL, 1996). Estes insetos são de porte pequeno (1,0 a 4,0 mm), com corpo e asas pilosas e coloração castanho claro ou palha, voam em pequenos saltos e pousam com as asas entreabertas, características que facilitam sua identificação (CASTRO, 1996). O ciclo biológico da espécie Lutzomia longipalpis ocorre em aproximadamente 28 a 36 dias. As fêmeas realizam a ovoposição em locais sombreados, úmidos e ricos em matéria orgânica. Os adultos de ambos os sexos necessitam de carboidrato como fonte de energia, mas somente as fêmeas são hematófagas, pois precisam ingerir sangue para a manutenção dos ovos (SOARES; TURCO, 2003). As fêmeas realizam o repasto sanguíneo no período noturno, iniciando-o cerca de uma hora após o crepúsculo (CASTRO, 1996). A principal forma de transmissão do parasita para o homem e outros hospedeiros vertebrados é através da picada de fêmeas de flebotomíneos infectados (SANTA ROSA; OLIVEIRA, 1997). Um dos componentes da saliva 19 de Lutzomyia longipalpis é um importante vasodilatador, o maxadilan, que exerce o papel de anticoagulante ao impedir a agregação plaquetária, além de ter ação quimiotática e imunorreguladora em monócitos e macrófagos, respectivamente, inibindo a estimulação dos últimos e reduzindo a capacidade destas células de produzir óxido nítrico ao fagocitar as Leishmanias (MICHALIK, 2005). No momento do repasto sanguíneo, as fêmeas infectadas inoculam as formas promastigotas metacíclicas no hospedeiro vertebrado, as quais são fagocitadas por macrófagos na derme. A adesão e internalização das promastigotas pelos macrófagos depende de vários receptores, como moléculas da superfície do parasita (lipofosfoglicanos e gp63) ou opsoninas derivadas do hospedeiro (complemento, fibronectina ou imunoglobulinas) e múltiplos receptores nos macrófagos (BLACKWELL et al., 1985; KANE; MOSSER, 2000; MOSSER; ROSENTHAL, 1993). No interior das células fagocitárias, nos vacúolos parasitóforos, as formas promastigotas diferenciam- se em amastigotas e iniciam intensa reprodução por divisão binária, causando o rompimento das células quando estas já estão repletas de parasitas (REY, 1991). As amastigotas livres são fagocitadas por novos macrófagos em um processo contínuo, ocorrendo então a disseminação hematogênica e linfática para outros tecidos ricos em células do sistema mononuclear fagocitário, como linfonodos, fígado, baço e medula óssea (BRASIL, 2006). Os insetos infectam-se ao alimentarem-se do sangue de algum hospedeiro vertebrado contendo formas amastigotas. No tubo digestório dos insetos as formas amastigotas transformam-se em formas promastigotas. Alguns mecanismos complexos e fatores de excreção sintetizados pelo protozoário facilitam a sua interação com o hospedeiro e determinam o sucesso da infecção (SCHLEIN, 1992). As formas promastigotas possuem uma camada de moléculas de lipofosfoglicanos (LPG) em sua superfície e expressam também outros glicoconjugados, como a metaloprotease - gp63, ambos capazes de proteger o parasita da ação das enzimas hidrolíticas presentes no intestino do flebotomíneo (ALEXANDER et al., 1999). Interações 20 envolvendo LPG com lectinas e moléculas tipo lectinas presentes no intestino do inseto, impedem que as formas promastigotas procíclicas sejam eliminadas juntamente com o bolo alimentar. Ao se transformarem nas formas metacíclicas infectantes, ocorrem modificações no tamanho e expressão de LPG (CHANG, 1979), que passa a ter reduzida a sua afinidade de ligação às lectinas, levando ao desligamento do epitélio intestinal e migração para a probóscide do inseto. Neste local, o parasita está pronto para uma posterior transmissão ao hospedeiro vertebrado no momento de um novo repasto sanguíneo (CUNNINGHAM, 2002), fechando-se o ciclo (CHANG, 1979; SCHLEIN, 1992; KILLICK-KENDRICK, 2002) que pode se completar em torno de 72 horas (RIBEIRO, 1997). No homem já foram registradas outras formas de transmissão da doença, tanto por via congênita quanto por transfusão de sangue infectado (PEARSON et al.; 1996). Mas, em cães a transmissão vertical não foi confirmada (ANDRADE et al., 2002). Além disso, na ausência de flebotomíneos no ciclo de transmissão, suspeitou-se da participação do carrapato (Rhipicephalus sanguineus) como vetor na transmissão da leishmaniose visceral canina. Experimentos utilizando estes ectoparasitas, infectados por Leishmania sp e coletados de cães com LVC, comprovaram a infectividade dos parasitas presentes nestes carrapatos quando administrados via oral em hamsters que adquiriram a doença, comprovando serem eles possíveis vetores alternativos no ciclo de transmissão da LVC (COUTINHO et al., 2005). O cão tem um papel importante dentro da epidemiologia da doença e é considerado como o principal reservatório para a transmissão ao homem em área urbana (ALENCAR, 1959; ALVAR et al., 2004; ASHFORD et al., 1998; CHAGAS et al., 1938; DEANE, 1956; DEANE; DEANE, 1962), pois neles o agente infeccioso sobrevive e mantem-se no ambiente (ASHFORD et al., 1998), além desta espécie ser abundante e viver tempo suficiente que permita ciclos de transmissão da doença (SALIBA; OUMEISH; 1999). Em ambientes rurais e silvestres outros animais como as raposas e os marsupiais, os roedores, edentados, procionídeos e primatas são relatados como 21 reservatórios naturais e potenciais da doença (ASHFORD, 1996; DANTAS- TORRES, 2006; DEANE ; DEANE, 1955b; LAINSON; RANGEL, 2005). As propriedades do parasita e do hospedeiro irão definir o desenvolvimento da LVC de caráter crônico ou agudo (GENARO, 1993; PINELLI et al., 1999). A resposta das células T é o principal fator que influência a evolução da doença. Estudos realizados em camundongos demonstram que as células apresentadoras de antígenos (APC), que incluem os macrófagos, células dendríticas e células de Langerhans, quando infectadas por estes parasitas, ativam linfócitos (CD4+) Ta1 e Ta2. Quando são estimuladas preferencialmente células Ta1, serão produzidas citocinas pró-inflamatórias, tais como interleucina-2 (IL-2), interferon gama (INF-�) e fator de necrose tumoral (TNF), os quais aumentam a eficiência das células fagocíticas e dos linfonodos citotóxicos, desencadeando uma resposta imune celular protetora no controle do parasitismo e podendo até mesmo levar à eliminação da infecção (CIARAMELLA; CORONA, 2003; FEITOSA et al., 2000; FERRER, 2002). Em contraste, a indução de linfócitos Ta2 promove a produção de citocinas anti- inflamatórias (IL-4, IL-5, IL-6, IL-10 e IL-13), as quais desencadearão a proliferação de linfócitos B com subseqüente produção de uma resposta imune humoral não protetora, estimulando a evolução da infecção (CIARAMELLA; CORONA, 2003; FEITOSA et al., 2000; FERRER, 2002). As manifestações clínicas da doença no cão e no homem são similares e apresentam sinais inespecíficos, como febre irregular por longos períodos, anemia, perda progressiva de peso e caquexia em seu estágio final (LONGSTAFF et al., 1983; MARZOCHI et al., 1985; RIBEIRO, 1997; SANTA ROSA; OLIVEIRA, 1997). As lesões de pele são manifestações comuns na LVC e muitas delas já foram descritas, como a alopecia e as dermatites esfoliativas, ulcerativas, nodulares ou papulares (ORDEIX et al., 2005; SOLANO-GALLEGO et al., 2004). A dermatite esfoliativa é a manifestação cutânea mais comum da LVC (CIARAMELLA et al., 1997; KOUTINAS et al., 1992). Mas, os animais com esta doença apresentam também outros sinais clínicos e alterações histopatológicas, como a ortoqueratose; crostas; edemas; 22 hiperplasia epidermal; dermatites perivascular, intersticial e nodular; perifoliculites; adenite sebácea e paniculites (PAPADOGIANNAKIS et al., 2005; SARIDOMICHELAKIS et al., 2007). Também são observados sinais gerais como linfadenomegalia (em 81% dos casos), hiporexia (58%), onicogrifose (51%) e emaciação (47%). A anemia é um achado clínico consistente em 30% dos animais com leishmaniose. Além disso, os cães apresentam sinais oculares (conjuntivite, edema e uveíte), emagrecimento, hipertermia, diarréia, melena, pneumonia, comprometimento do sistema urinário e hepático e sinais de alterações neurológicas (FEITOSA et al., 2000). No entanto, a maioria dos cães infectados não apresenta qualquer sinal clínico (CABRAL et al., 1998; SIDERIS et al., 1999). Em torno de 60% a 80% dos cães pertencentes a áreas endêmicas podem ter contato com o parasita e não desenvolver sinais clínicos da doença (FERRER, 1999). Existem evidências de que a taxa de prevalência da infecção em cães assintomáticos pode ser mais alta do que as obtidas por estudos sorológicos (SOLANO- GALLEGO et al., 2001). Os cães assintomáticos são reservatórios perigosos que merecem atenção quanto à expansão da leishmaniose visceral (CABRAL et al., 1998; SIDERIS et al., 1999; SILVA et al., 2001). Análises das peles clinicamente normais de cães com LVC demonstraram a presença de parasitas nestes tecidos, o que alerta para a chance de transmissão da doença (SOLANO-GALLEGO et al., 2004), comprovada em estudos experimentais por Michalsky et al. (2007) que observaram a capacidade de cães assintomáticos em infectarem flebotomíneos assim como os sintomáticos, porém em menor proporção. As estratégias de controle da doença, no Brasil, estão baseadas no diagnóstico e tratamento precoce de casos humanos, no controle dos vetores através do uso de inseticidas e na triagem sorológica com posterior eutanásia de cães positivos para leishmaniose (BRASIL, 2003). O custo destas atividades é alto e gera controvérsias, particularmente quanto à eliminação do reservatório canino, que não tem reduzido a incidência da LV em cães e humanos (BRAGA et al., 1998; COSTA; VIEIRA, 2001). A ineficiência desta medida está 23 relacionada a alguns prováveis fatores, como a incapacidade dos métodos diagnósticos em identificar todos os cães infectados, o longo período de tempo entre diagnóstico e eliminação dos cães positivos, a reposição dos cães por filhotes susceptíveis ou por cães já infectados e a possível existência de outros reservatórios (MILES et al., 1999; REITHINGER et al., 2002). Nunes et al. (2007) observaram que a reposição de uma considerável parcela de cães submetidos a eutanásia, em determinado bairro de Araçatuba – SP, aconteceu em curto período de tempo, preferencialmente por filhotes (< 1 ano) sabidamente mais susceptíveis, sendo uma parcela dos quais já sintomáticos (20,7%) e outra parcela (12,9%) sorologicamente positiva para LVC ao teste ELISA, o que contribuiu para manter no local o processo de transmissão da doença. A partir dos trabalhos de Chagas et al. (1938), Deane e Deane (1955a) e Alencar (1956), demonstrando a importância do cão na transmissão da leishmaniose visceral no Brasil, vários pesquisadores dedicaram-se ao estudo sorológico de cães infectados, visando obter métodos de diagnósticos que facilitassem a realização de inquéritos epidemiológicos e o conhecimento da distribuição geográfica da leishmaniose. No Brasil o cão é encontrado parasitado tanto pela L. chagasi como pela L. braziliensis e pelo Trypanosoma Cruzi, sendo comum o encontro de áreas de superposição das leishmanioses tegumentar e visceral, bem como da doença de Chagas (PESSÔA; MARTINS, 1982). Costa et al. (1991) realizaram um estudo comparativo da reação de imunofluorescência indireta em eluatos de sangue de cães infectados experimentalmente com diferentes tripanosomatídeos e utilizaram como antígenos promostigotas de L. mexicana, L. braziliensis e L. chagasi. Os resultados mostraram que a sensibilidade do método foi de 87,5% para diagnóstico da LVC, independentemente do antígeno empregado; e que ocorreu reação cruzada com leishmaniose tegumentar em 75% dos casos e com doença de Chagas em 83,3%. Outras pesquisas continuaram comprovando a reação cruzada com malária, esquistossomose e tuberculose pulmonar (SUNDAR; RAI, 2002), com outros tripanossomatídeos 24 (ALVES; BEVILACQUA, 2004), e com Babesia canis e Ehrlichia canis (OLIVEIRA et al., 2008). Em estudo realizado por Ferrer (1999), demonstrou-se que a sensibilidade e a especificidade da RIFI variaram de 80 a 100% e Mettler et al. (2005) mostraram baixa sensibilidade desta técnica principalmente em cães assintomáticos. Assim, os autores sugeriram que a RIFI deveria ser usada com cautela nas campanhas de saúde pública, em relação à prevalência da LVC. Em função da RIFI apresentar baixa especificidade, novos métodos de diagnóstico foram propostos por vários autores nos últimos anos. Deste modo, o teste ELISA-padrão, com a vantagem da possibilidade de automação, foi aprimorado na década de 70 e surgiram diversas variações desta técnica (CABRERA et al., 1999; CHATTERJEE et al., 1999; RACHAMIN; JAFFE, 1988; SCOTT et al., 1991). Entretanto, reações cruzadas continuaram ocorrendo mesmo utilizando o método ELISA (BADARÓ et al., 1996; FERREIRA et al., 2007; OLIVEIRA et al., 2008; ROSÁRIO et al., 2005; ROSYPAL et al., 2007; ZANETTE, 2006). O teste ELISA indireto, bem como suas modalidades: Dot- ELISA, fucose-manose-ligante-ELISA, Fast-ELISA e Micro-ELISA, utilizam antígenos solúveis totais ou fracionados de formas amastigotas ou promastigotas de Leishmania sp. Este tipo de antígeno limita a especificidade das técnicas e novas buscas por antígenos mais específicos tem sido realizadas (ALVAR et al., 2004), incluindo o estudo de antígenos recombinantes como rK39 e rK26, os quais contribuíram para o aumento da especificidade do teste ELISA indireto, que foi de 100% com o rK-39 e de 96% com o rK-26 (METTLER et al., 2005; REITHINGER et al., 2002; SCALONE et al., 2002) e não apresentaram nenhuma reação cruzada com outros parasitas (ROSÁRIO et al., 2005). Atualmente, como preconizado pela Secretaria da Saúde do estado de São Paulo, um cão é considerado suspeito para LVC quando apresente pelo menos um dos três seguintes sintomas: descamação, úlceras de pele ou onicogrifose, associado(s) a dois ou mais dos seguintes sintomas: ceratoconjuntivite, coriza, apatia, emagrecimento, diarréia, hemorragia 25 intestinal, vômitos, edema das patas, paresia das patas posteriores e/ou caquexia. A confirmação da suspeita pode ser feita por exames laboratoriais: identificação de L. chagasi, a partir da cultura e/ou inoculação em hamster e/ou por técnicas moleculares; exame parasitológico direto; e pesquisa positiva de anticorpos contra antígenos de Leishmania sp. Os cães provenientes de área endêmica ou onde esteja ocorrendo surto, mesmo sem a confirmação de diagnóstico laboratorial, já serão considerados positivos para LVC apenas pela análise dos sinais clínicos citados acima (BRASIL, 2006). O diagnóstico de escolha para LVC é a demonstração do parasita através de exame direto em amostras de biópsia de linfonodo e medula óssea, coradas por Giemsa. Os testes sorológicos utilizando os “kits” fornecidos pelo Ministério da Saúde, produzidos pelo Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos Bio-Manguinhos, podem ser utilizados também para a confirmação de casos suspeitos e nos inquéritos epidemiológicos caninos, sendo o ELISA utilizado como técnica para a triagem das amostras, visando identificar as negativas, e a RIFI aplicada para a confirmação das amostras reagentes pelo ELISA, como demonstra o quadro 1. Na RIFI, a amostra será considerada reagente quando forem obtidos títulos iguais a 1:40 (BRASIL, 2006). Os testes sorológicos apresentam mais resultados falso positivos por causa das reações inespecíficas e/ou cruzadas com outros patógenos, além de serem ineficientes para diagnóstico no período de tempo entre infecção e soroconversão (BADARÓ et al., 1983; BARBOSA-DE-DEUS, et al., 2002; INIESTA et al., 2002; MANNA et al., 2004). A manutenção de animais em laboratório para fins diagnósticos é difícil e a cultura do protozoário é demorada e freqüentemente sofre contaminação, o que dificulta seu emprego em larga escala. Já os métodos parasitológicos são mais específicos, mas também trazem desvantagens por serem de difícil aplicação em inquéritos epidemiológicos, mais invasivos já que usualmente requerem punção de medula ou linfonodo e por apresentarem baixa sensibilidade, de 60% para 26 esfregaços de medula óssea e menor que 30% para esfregaços de linfonodos (FERRER, 1999). Quadro 1 - Resultado sorológico final para diagnóstico da leishmaniose visceral canina a partir dos resultados obtidos por ensaio imunoenzimático (ELISA) e reação de imunofluorescência indireta (RIFI). Condutas a serem empregadas segundo normas do Ministério da Saúde do Brasil: * Repetir após no mínimo 15 dias e no máximo de 30 dias da data da coleta, se NÃO REGENTE OU INCONCLUSIVO considerar NEGATIVO. A técnica a ser utilizada na repetição deverá ser a RIFI. Fonte: Brasil, 2006 Na LVC o parasitismo na pele é muito intenso, pois é nela que se inicia a infecção através da picada do flebotomíneo e durante todo o ciclo o parasita permanece no tecido cutâneo permitindo que novos mosquitos se infectem ao se alimentar do sangue e estejam aptos para transmitir os parasitas a outros vertebrados. Estudos demonstraram que o aumento da carga parasitária na pele estava diretamente relacionado à severidade dos sinais clínicos da doença (GIUNCHETTI et al., 2006; REIS et al., 2006; XAVIER et al., 2006). A detecção de Leishmania sp pela biópsia de pele, que pode ser obtida através de procedimentos cirúrgicos extremamente simples, é uma ferramenta alternativa para o diagnóstico. Entretanto, exames rotineiros, particularmente, secções histológicas coradas com hematoxilina/eosina são muitas vezes 27 inconclusivas (FERRER et al., 1988; TAFURI et al., 2001). Outra técnica interessante que vem sendo aprimorada é a detecção direta de formas amastigotas de Leishmania sp pelos métodos imunoistoquímicos, onde os cortes de tecidos de cão e de humanos (LIVNI et al., 1983) são fixados em formalina e embebidos em parafina. O método de imunoistoquímica para identificação da Leishmania sp em tecidos é simples, não precisa de equipamentos especiais e é mais sensível e específico do que o exame histoquímico (BOURDOISEAU et al., 1997; FERRER et al., 1988; LIVNI et al., 1983), pois diminui as reações cruzadas com outros tripanossomídeos. A imunoistoquímica, além de aumentar a detecção da forma amastigota da Leishmania sp em muitos órgãos, também aumenta em 50% a positividade na pele, quando comparada aos testes histopatológicos de rotina (TAFURI et al., 2004). Os métodos de amplificação gênica por PCR, mesmo tendo um custo mais elevado, têm se mostrado cada vez mais úteis tanto no diagnóstico como na identificação das espécies de Leishmania (CAMARGO; BARCINSKI, 2003; IKONOMOPOULOS et al., 2003), detectando mais adequadamente a população soronegativa e tentando ultrapassar as limitações do diagnóstico sorológico, pois são mais rápidos, mais sensíveis e específicos, particularmente para a detecção de cães assintomáticos. Rodriguez et al. (1994) mostraram que a PCR adaptava-se especialmente à situações onde poucos organismos são encontrados, com sensibilidade de 94% e podendo detectar a presença de tão pouco quanto 10 parasitas de Leishmania sp. Neste tipo de diagnóstico “primers” têm sido desenvolvidos para amplificação específica das regiões do DNA de Leishmania sp, podendo ser primers de ácidos desoxirribonucléicos (DNA) em seqüências de cinetoplastos (kDNA) (RODGERS et al., 1990; SMYTH et al., 1992), ácidos ribonucléicos (RNA) genes espaçadores (HASSAN et al., 1993; VAN EYS et al., 1992) ou repetitivas seqüências nucleares (PIARROUX et al., 1993). Entretanto, os seus resultados dependem de algumas variáveis envolvidas, entre elas temos: área endêmica; 28 tipo de amostra; alvo do DNA utilizado para amplificação; método de extração do DNA, etc. (BRASIL, 2003). O cinetoplasto é uma organela presente nos kinetoplastidas, formada por cerca de 10.000 minicírculos de DNA (kDNA), com 600 a 800 pb nos membros do gênero Leishmania (RODRIGUEZ et al., 2002). Rodgers et al. (1990), adotando “primers” específicos, sugeriram ser possível a amplificação do fragmento da região conservada do kDNA, contendo 120 pb, a partir de um único parasita presente na amostra, sendo a amplificação da região conservada 10 vezes mais sensível do que a região variável. Assim, desenvolveu-se um diagnóstico molecular baseado na amplificação feita por “primers” anelados na região alvo do kDNA de cepas de Leishmania sp pela PCR, que tem sido muito utilizado em diversos estudos (FISA et al., 2001; GOMES et al., 2007; IKONOMOPOULOS et al., 2003; LACHAUD et al., 2002; MANNA et al., 2004; NUNES et al., 2007; OLIVEIRA et al., 2005; QUINNEL et al., 2001; REALE et al., 1999; RODGERS et al., 1990; SOLANO-GALLEGO et al., 2001; XAVIER et al., 2006). As amostras clínicas mais comumente utilizadas para a detecção por PCR são os aspirados por punção de medula óssea, baço e linfonodos; e as biópsias de pele. Amostras de sangue circulante e “swab” conjuntival apresentam a vantagem de serem de colheita menos invasiva do que punções de medula óssea ou de linfonodos (FERREIRA, 2008; FISA et al., 2001; IKONOMOPOULOS et al., 2003; LACHAUD et al., 2002; MANNA et al., 2004; STRAUSS-AYALI et al., 2004). No entanto, Solano-Gallego et al. (2001) observaram maior positividade na PCR em amostras de pele de cães (51%) quando comparadas à conjuntiva (32%) e medula óssea (17,8%). E em outro estudo, Manna et al. (2004) encontraram maior positividade nas amostras de linfonodo (99%) quando comparadas às amostras de pele (95%) e de sangue (94%). Nunes et al. (2007) mostraram que a PCR de sangue periférico não foi uma boa ferramenta para triagem diagnóstica devido à baixa sensibilidade (55%) e especificidade (66,3%) quando comparada à RIFI. Outro estudo 29 realizado através da amplificação de kDNA de amostras de pele demonstrou uma positividade de 94,9%, enquanto a técnica ELISA revelou apenas 69,2%, mostrando que embora a coleta de pele seja mais invasiva do que a de sangue, a análise de tecidos cutâneos é importante quando se deseja determinar a presença do parasita e a possibilidade de transmissão ao vetor, permitindo assim melhor caracterizar o potencial de reservatório do cão (TRINCONI et al., 2007). Em áreas de risco para a doença é essencial o uso de métodos de diagnóstico principalmente sensíveis, apresentando altas taxas de positividade e que auxiliem no controle da zoonose. Mas, parece não haver um único método capaz de isoladamente diagnosticar a infecção em todos os cães. A sensibilidade das técnicas varia durante a evolução da doença bem como entre os indivíduos, sendo que no início, antes da soroconversão ou desenvolvimento de sintomas, o exame parasitológico e a PCR são mais sensíveis (QUINNELL et al., 2001). A combinação das técnicas sorológicas e moleculares tem aumentado a prevalência da infecção canina em diferentes áreas endêmicas (GRAMICCIA; GRADONI, 2005). Na comparação dos métodos de histoquímica, imunoistoquímica e PCR, utilizando diferentes regiões da pele de cães, Xavier et al. (2006) sugeriram que a PCR pode ser o melhor método de diagnóstico para LVC utilizando a pele da orelha como amostra, além de apontar a imunoistoquímica como método alternativo para diagnóstico da doença independentemente do estado clínico do animal. A intenção de auxiliar no controle e combate desta zoonose estimulou a realização desta pesquisa, que focou o estudo da utilização da PCR e da imunoistoquímica de biópsias de pele em busca de uma alternativa para colaborar na complementação e confirmação dos diagnósticos de LVC. 30 2 OBJETIVOS 2.1 Objetivo Geral O presente trabalho teve como objetivo a utilização da PCR e da imunoistoquímica de biópsias de pele para colaborar na complementação e confirmação dos diagnósticos de LVC e assim, ajudar no controle e combate desta zoonose. 2.2 Objetivos Específicos - Verificar a presença de anticorpos anti-Leishmania sp em soros de cães assintomáticos, oligossintomáticos e polissintomáticos pela RIFI e ELISA; - Verificar a presença de amastigotas de Leishmania sp em amostras de tecidos cutâneos com lesão e sadios, através de exames parasitológicos diretos para detecção do parasita (histoquímica e imunoistoquímica) e por exame molecular (PCR); - Realizar a descrição histopatológica dos tecidos cutâneos infectados com amastigotas de Leismania sp; - Realizar a comparação entre os métodos de diagnóstico e a associação entre eles, buscando uma alternativa para complementar e confirmar o diagnóstico da LVC. 31 3 MATERIAL E MÉTODO 3.1 Local Os cães do presente trabalho pertenciam ao município de Ilha Solteira localizado na região noroeste do Estado de São Paulo, a uma latitude 20º25'58" Sul e a uma longitude 51º20'33" Oeste. As técnicas aplicadas neste estudo foram desenvolvidas nos seguintes laboratórios: - Histoquímica e Imunoistoquímica foram desenvolvidas no Laboratório de Parasitologia/Imunologia do Departamento de Biologia e Zootecnia da Faculdade de Engenharia de Ilha Solteira - Universidade Estadual Paulista (FEIS-UNESP); - Exames Sorológicos (RIFI e ELISA) realizados no Laboratório de Imunoparasitologia da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias – Universidade Estadual Paulista (FCAV-UNESP), Campus de Jaboticabal; - PCR realizada no Laboratório de Bioquímica e Biologia Molecular da Faculdade de Odontologia de Araçatuba – Universidade Estadual Paulista (FOA-UNESP). 3.2 Animais Para este trabalho, foram utilizadas amostras de sangue e pele, sendo 22 amostras de pele sadia e 23 de pele com lesão, colhidas no período de agosto a novembro de 2005 de 34 cães de idade adulta, ambos os sexos e raças variadas, os quais foram doados para pesquisa pelo Controle de 32 Zoonoses (CCZ) do município de Ilha Solteira - SP. As amostras de pele com lesão foram coletadas principalmente dos locais onde as lesões eram maiores ou estavam mais evidentes e as peles sadias preferencialmente do focinho e ponta de orelha. Estes animais foram entregues pelos proprietários ao CCZ ou recolhidos por este órgão em áreas de risco por serem suspeitos de estarem positivos para leishmaniose visceral. Os animais tiveram positividade confirmada pelos testes padrões recomendados pelo Ministério da Saúde e realizados rotineiramente nos animais do CCZ (RIFI - utilizando kit Bio Manguinhos, título 1:40). Os cães foram submetidos à eutanásia pelo CCZ, em cumprimento ao Decreto no. 51.838 do Ministério da Saúde do Brasil, de 14 de março de 1963, o qual estabelece que animais domésticos portadores de leishmaniose devem ser eutanasiados. Para a eutanásia os cães foram anestesiados com pentobarbital sódico (15 mg/kg/iv) e ainda em plano anestésico, aplicou-se posteriormente uma ampola de cloreto de potássio (Samtec) a 19,1%, por via intravenosa, seguindo as recomendações da Resolução nº. 714, de 20 de junho de 2002, do Conselho Federal de Medicina Veterinária, que dispõe sobre procedimentos e métodos de eutanásia de animais. Durante as necropsias, foram realizados “imprinting” de amostras de fígado, baço e linfonodo e a presença de amastigotas de Leishmania sp nestes órgãos confirmou a leishmaniose visceral nos cães (dados não mostrados). 3.2.1 Formação dos Grupos de Cães Antes da eutanásia os animais foram examinados quanto aos sinais clínicos e após a necropsia foram avaliados os sinais anatomopatológicos mais evidentes para leishmaniose visceral e assim, os cães foram separados em três grupos: • Cães Assintomáticos (n = 8): cães sem alterações ao exame físico e macroscópico realizados durante a necropsia; 33 • Cães Oligossintomáticos (n = 14): cães que possuíam até três sinais clínicos, evidenciados por meio de exame físico, ou comprometimento de até três órgãos (evidenciado por exame macroscópico durante a necropsia), independente da gravidade ou dos órgãos acometidos; • Cães Polissintomáticos (n = 12): cães com mais de três sinais clínicos, evidenciados por meio de exame físico, ou com mais de três órgãos acometidos (evidenciado por exame macroscópico durante a necropsia), independente da gravidade ou dos órgãos acometidos. 3.3 Exames Sorológicos Antes da eutanásia amostras de sangue foram coletadas por venopunção cefálica dos 34 cães e armazenadas em tubo sem EDTA, para obtenção de soro e posterior investigação de anticorpos anti-Leishmania sp pelos exames sorológicos. 3.3.1 ELISA indireto O teste ELISA indireto foi realizado de acordo com a técnica descrita por Machado et al. (1997) para B. bovis e adaptado por Oliveira et al. (2005; 2008) para L. chagasi. 3.3.1.1 Descrição da técnica O antígeno solúvel bruto de L. chagasi foi obtido após ciclos de congelamento e descongelamento das formas promastigotas. As amastigotas eram coletadas por punção de medula óssea de cão sintomático para LVC e mantidas em meio de cultura RPMI até o desenvolvimento para a forma promastigota. Em cada cavidade das microplacas de fundo plano (Nunclon TM Surface, Nunc. Denmark) para ELISA eram adicionados 100μL do antígeno solúvel de L. 34 chagasi (na concentração 5µg/ml), diluído em tampão carbonato-bicarbonato de sódio 0,05M, pH 9,6. Após a incubação da placa por 8 a 10 horas em câmara úmida a 4ºC o excesso de antígeno era removido por três lavagens consecutivas com tampão PBS 0,01M, pH 7,4, contendo 0,05% de Tween 20 (PBS-Tween 20). As placas foram previamente bloqueadas com PBS-Tween 20 acrescido de 6% de leite em pó, em câmara úmida, a 37ºC por 90 minutos. Após nova lavagem para retirada do bloqueador foram adicionados, em duplicata, 100μL dos soros testes e dos soros de referência positivos e negativos na diluição de 1:100 em PBS-Tween 20, com 5% de leite em pó desnatado. As placas foram então novamente incubadas e lavadas. Em seguida, 100 μL do conjugado (IgG de coelho anti IgG de cão, acoplada à fosfatase alcalina, SIGMA A-0793) diluído em PBS-Tween 20, acrescido de 5% de soro de coelho, foram adicionados a cada cavidade da placa, seguindo- se nova incubação e lavagem como as anteriores. O substrato da enzima fosfatase alcalina (paranitrofenilfosfato diluído a 1mg/mL em tampão dietanolamina pH 9,8; SIGMA N-9389) foi adicionado, incubando-se a reação por 45 minutos à temperatura ambiente. Decorrido esse período, a leitura da reação foi realizada em um leitor de microplacas de ELISA (Microplate Reader MRX TC Plus, Dynex Technology), a um comprimento de onda de 405 nm. 3.3.1.2 Tratamento dos dados Os valores de Densidade Óptica média (D.O.) dos soros foram agrupados em níveis de ELISA (NE), os quais variaram de 0 (zero) a 9 (nove). O ponto de corte foi para o NE � 3. O limite máximo do nível zero foi determinado pela média das D.O. de animais negativos para L. chagasi, acrescido de dois desvios padrão. A partir desse limite, os intervalos entre os outros níveis de ELISA foram definidos por acréscimo de 35%, e o ponto de corte do teste de ELISA correspondeu a duas vezes e meia o valor médio das D.O. dos soros de referência negativos, conforme preconizado por Machado et al. (1997). 35 A atividade imunológica de cada soro testado foi calculada mediante a determinação do valor A/P (amostra em relação ao positivo), considerando-se os soros de referência negativos e positivos de acordo com a seguinte equação: Absorbância média - Absorbância média do da amostra soro de referência negativo A/P= _____________________________________________________ Absorbância média do - Absorbância média do soro de referência positivo soro de referência negativo 3.3.2 Reação de Imunofluorescência Indireta (RIFI) A RIFI foi realizada conforme a técnica utilizada pelo Centro de Pesquisas René Rachou/FIOCRUZ, de Belo Horizonte-MG, para diagnóstico de animais infectados por L. chagasi, adaptada por Oliveira et al. (2005; 2008). 3.3.2.1 Descrição da técnica As lâminas contendo o antígeno (promastigotas de L. chagasi) foram retiradas do “freezer” e descongeladas à temperatura ambiente. Em cada círculo contendo o antígeno foram dispensados 10μL de cada soro teste diluído na concentração de 1:40. As lâminas foram então incubadas em câmara úmida a 37oC, por 30 minutos e, a seguir, submetidas a três lavagens em PBS por imersão, de cinco minutos cada. Após secagem à temperatura ambiente, os círculos das lâminas foram recobertos com 10μL do anticorpo anti-IgG de cão conjugado ao isotiocianato de fluoresceína (KPL cat no 02-19-02), diluído a 1:30, em solução de PBS, contendo azul de Evans 1mg%. As lâminas foram novamente incubadas e lavadas conforme descrito acima. Após a secagem das lâminas, estas foram montadas com lamínula, utilizando-se glicerina tamponada a uma relação de 9:1 de glicerina/tampão carbonato-bicarbonato 36 0,5M pH 9,6 e, posteriormente, observadas em microscópio equipado para fluorescência (Olympus, BX-FLA). Após a leitura neste microscópio foram consideradas positivas as reações fluorescentes em soros com diluição > 1:40. 3.4 Exames Parasitológicos Os exames parasitológicos e moleculares foram realizados em amostras de pele dos 34 cães, sendo 22 amostras de pele sadia e 26 de pele com lesão. As amostras cutâneas foram fixadas em formalina tamponada a 10% ou em solução Bouin para a histoquímica e a imunoistoquímica. 3.4.1 Histoquímica (HE) Os tecidos fixados foram emblocados em parafina e três secções de cada amostra foram montadas em lâminas e coradas com Hematoxilina e Eosina para posterior avaliação, através de microscópio de luz branca, relativa ao grau de parasitismo de uma a quatro cruzes (+ a ++++) e à histopatologia. Os tecidos foram avaliados conforme a visualização de formas amastigotas de Leishmania sp da seguinte forma: tecido negativo (-), sem amastigotas; tecido suspeito (+), quando a coloração não permitiu visualizar e definir claramente os parasitas no tecido, mas havia forte suspeita de que naquele fragmento poderiam haver células parasitadas por amastigotas; tecidos positivos, quando os parasitas foram visualizados dentro ou fora de macrófagos, sendo considerado: tecido fraco positivo (++), quando os parasitas estavam distribuídos esparsamente no tecido; tecido moderado positivo (+++), quando os parasitas estavam presentes em torno de 50% do tecido e tecido forte positivo (++++), quando os parasitas estavam presentes em mais de 50% do tecido. Os animais só foram considerados negativos ou suspeitos após a análise de no mínimo cinco cortes teciduais. 37 3.4.2 Imunoistoquímica (IMIQ) A imunoistoquímica seguiu os procedimentos indicados por Tafuri et al. (2004), com algumas adaptações. O anticorpo primário foi o soro hiperimune de cães naturalmente e comprovadamente infectados com L. chagasi (RIFI com título = 1: 2560) e como anticorpo secundário anti-IgG biotinilado de coelho produzida em cabra, que reage de forma cruzada com imunoglobulinas de cão produzindo pouco “background”. Nesta técnica as lâminas foram previamente desparafinizadas e hidratadas em passagens sucessivas em xilol e álcool etílico. Antes de adicionar o anticorpo primário, a enzima peroxidase endógena foi bloqueada usando-se a solução de peróxido de hidrogênio (H2O2) a 0,3% diluído em 0,01M de solução salina fosfatada tamponada (PBS) e as reações inespecíficas do anticorpo secundário foram inibidas usando-se o soro normal de coelho na diluição 1/50. O anticorpo primário foi incubado sobre o tecido a ser analisado em uma câmara úmida a 4ºC por aproximadamente 12 horas. Após os enxágües em PBS, o anticorpo secundário foi usado na diluição 1/500 e incubado por 30 minutos à temperatura ambiente. O anticorpo secundário utilizado foi uma anti-IgG de coelho (reação cruzada com cão) produzido em cabra, conjugado à biotina e não à peroxidase, sendo esta a alteração realizada por nós na técnica descrita por Tafuri et al (2004). O complexo “Avidin-Biotin Peroxidase” (Vectstain ABC Kit; Vector Laboratories Inc, Burlingame, CA, USA) foi usado para detecção da reação imunológica. Após os devidos enxágües em PBS, as lâminas foram imersas por 7-15 minutos em uma solução preparada a fresco de substrato cromógeno específico para peroxidase (Substrato “New Red”- Vector Laboratories). Após outro enxágüe, mas em água destilada, os tecidos foram corados pela hematoxilina de Mayer, desidratados e montados em bálsamo do Canadá entre lâmina e lamínula. Os controles negativos sofreram este mesmo procedimento, mas sem o anticorpo primário ou o secundário. Duas lâminas para cada grupo de animal foram analisadas imunoistoquimicamente. Soros e tecidos de cães sadios também 38 foram testados como controle negativo da reação. Os parasitas quando presentes nos tecidos coraram-se na cor vermelho tijolo. As amostras de tecido tratadas como descrito acima tiveram o diagnóstico concluído após exame de uma a cinco secções, sendo o resultado já considerado positivo quando pelo menos em uma secção detectou-se a presença de amastigotas. 3.5 Exame Molecular 3.5.1 Reação em Cadeia pela Polimerase (PCR) No momento das necropsias as amostras de pele dos 34 animais (22 amostras de pele sadia e 26 de pele com lesão), colhidas assepticamente, foram imediatamente colocadas em nitrogênio líquido antes de serem armazenadas em freezer a -70º C até a extração do DNA. 3.5.1.1 Extração do DNA A extração do DNA das amostras de pele foi realizada utilizando o “Kit QIAamp Blood and Tissue” (Qiagen, Santa Clarita, CA, USA), conforme o protocolo a seguir: 30 mg de tecidos cutâneos sofreram lavagem rápida com tampão fosfato-salina (PBS) sendo depositados em tubos de 1,5 mL. Os tecidos foram macerados com o auxílio de pistilo de plástico, foram adicionados 180 µL de “Buffer ATL” e 20 µg/mL de Proteinase K, sendo as misturas intensamente homogeneizadas (Vortex®) e incubadas a 56º C por três horas e agitadas a intervalos de 15 minutos ou durante a noite. Após a incubação, as amostras foram homogeneizadas por 15 segundos e adicionou-se 200 µL de “Buffer AL” seguindo-se de nova agitação e incubação a 70º C por 10 minutos. Após este procedimento, adicionou-se 200 µL de álcool etílico absoluto gelado, seguida de nova agitação por 15 segundos e deposição da mistura no centro da coluna de cromatografia contida no kit, que foi centrifugada por 6.000 g por 39 dois minutos. O tubo contendo o líquido eluído foi descartado, sendo substituído por outro igual. Foram adicionados 500 µL de “Buffer AW1” à coluna de cromatografia, que foi centrifugada a 6.000 g por dois minutos. O mesmo procedimento de descarte e substituição foi realizado e, após a adição de 500 µL de “Buffer AW2” foi realizada a centrifugação da coluna contendo a amostra (20.000 g por três minutos), seguida pelo descarte do líquido e nova centrifugação por mais um minuto. A coluna, contendo o DNA aderido, foi introduzida em um tubo de 1,5 mL, onde foram adicionados 50 µL de tampão AE e em seguida incubada a temperatura ambiente por cinco minutos, com subseqüente centrifugação (6000 g por dois minutos). Este procedimento foi realizado novamente sendo o DNA eluído da coluna em volume final de 100µL. 3.5.1.2 Concentração e pureza do DNA A concentração de DNA extraído foi avaliada por espectrofotômetro, sendo que a referência foi determinada na DO de 260 nm, enquanto a pureza do DNA foi determinada pela razão de DO de 260 a 280 nm. 3.5.1.3 Amplificação do DNA Na reação de amplificação utilizou-se o par de oligonucleotídeos para o gênero Leishmania sp descrito por Rodgers et al. (1990): 13A 5´-dGTG GGG GAG GGG CGT TCT-3´ e 13B 5´-dATT TTA CAC CAA CCC CCA GTT-3´ como iniciadores para a amplificação de fragmentos de DNA de 120 pares de base (pb) conservados do minicírculo do cinetoplasto. As reações foram constituídas de 1 U de DNA polimerase Platinum® Taq (Invitrogen-Carlsbad- Califórnia), 15,25 μL de água ultra pura, tampão de PCR 1X, 1,5 mM de MgCl2, 0,31 mM de cada dNTP (dATP, dCTP, dGTP e dTTP), 0,26 μM de “Primer” “Foward”, 0,26μM “Primer” “Reverse” e 2,5 μL de DNA extraído da amostra, sendo que a quantidade de DNA variou de 50 ng a 300 ng nas reações, num volume final de 25 μL. Os DNAs das amostras foram submetidos 40 a ciclos de temperaturas pelo aparelho termociclador (MJ Research Thermal Cycler GMI, Inc. Ramsey-Minnesota) com desnaturação inicial a 95° C por 5 minutos e 35 ciclos de 95° C por 30 segundos para d esnaturação, 63° C por 45 segundos para associação, 72° C por 30 segundos par a extensão e 5 minutos por 72° C para extensão final. Os controles positiv os utilizados foram DNA de Leishmania sp extraído de pele de cães naturalmente infectados, segundo Nunes et al. (2007); e os controles negativos foram DNA de pele de cães sadios de área não endêmica para leishmaniose visceral (Lençóis Paulista – SP), sabidamente negativos pela PCR. Além disso, uma mistura contendo apenas 22,5 μL dos reagentes, sem DNA, foi utilizado para o controle da reação (NO). 3.5.1.4 Análise do DNA Para analisar os resultados das reações, 8μL dos produtos amplificados foram submetidos à eletroforese em gel de poliacrilamida a 8%, por 3 horas e meia, a 100 V, em tampão TBE (89 mM Tris borato, 2 mM EDTA, pH 8,3). Como controle foi adicionado também o peso molecular de 100pb em cada gel. Após a corrida o gel foi corado com nitrato de prata e fotografado com câmera digital Cyber-shot de 7.2 Mega pixels, modelo DSC-W70 – SONY. 3.6 Análise Estatística Para avaliar a concordância entre os diferentes métodos de diagnóstico, calculou-se o índice Kappa (κ) de concordância (intervalo de confiança 95%), usando o programa Biostat (versão 4.0) (AYRES et al., 2005), sendo κ < 0,4 aceito como concordância fraca, 0,4 < κ < 0,7 como concordância boa e κ > 0,7 como ótima. 41 4 RESULTADO 4.1 Sinais Clínicos e Alterações Anatomopatológicas De acordo com os exames clínicos os cães foram subdivididos em três grupos: cães assintomáticos, oligossintomáticos e polissintomáticos. Desta forma, no grupo dos assintomáticos os cães apresentavam aparência saudável. Nos cães oligossintomáticos, as alterações clínicas e anatomopatológicas mais comuns foram: alterações gerais de pele 10/14 (71,0%) e mucosas pálidas 5/14 (36,0%) (Figura 3). Já os cães sintomáticos estavam bastante comprometidos, apresentando principalmente alterações gerais de pele em 12/12 (100,0%), esplenomegalia em 10/12 (83,0%), fígado ictérico em 9/12 (75,0%), emagrecimento 7/12 (58,0%), linfonodos hipertróficos e onicogrifose em 6/12 (50,0%), além de outros sinais clínicos menos freqüentes (Figura 4). 42 FIGURA 3 - Sinais clínicos e alterações anatomopatológicas observados em 14 cães oligossintomáticos, portadores de leishmaniose visceral canina e provenientes de Ilha Solteira (Araçatuba-SP, 2008). FIGURA 4 - Sinais clínicos e alterações anatomopatológicas observados em 12 cães sintomáticos, portadores de leishmaniose visceral canina e provenientes de Ilha Solteira (Araçatuba-SP, 2008). 43 4.2 Exames Parasitológicos 4.2.1 Exame Histoquímico (HE) e Avaliação Histopatológica Dentre os 34 cães estudados no presente trabalho, oito (23,5%) foram classificados como assintomáticos, 14 (41,2%) oligossintomáticos e 12 (35,3%) polissintomáticos para leishmaniose visceral canina. Pela avaliação clínica, os cães assintomáticos não apresentavam qualquer lesão cutânea aparente e pelo exame parasitológico direto verificou- se que a maioria das amostras de peles sadias colhida destes animais estava de fato negativa (5/8 ou 62,5%) (Tabela 1). No entanto, 3/8 (37,5%) dos cães assintomáticos apresentaram de moderada a intensa carga parasitária (++ a ++++) nas amostras sadias de pele, especialmente o animal nº 19 que apresentava numerosos macrófagos parasitados com Leishmania sp. No grupo dos cães oligossintomáticos, as amostras foram colhidas tanto de peles com lesão (11 cães) como de peles sadias (14 cães). Embora neste grupo (Tabela 1), 11/14 (78,6%) cães apresentassem lesões de pele, apenas 2/11 (18,2%) das amostras de pele destes cães foram confirmadas como positivas e 7/11 (63,6%) foram consideradas suspeitas. Nas amostras de pele sadia, por outro lado, 10/14 (71,6%) eram negativas, 2/14 (14,2%) consideradas suspeitas e 2/14 (14,2%) positivas com carga parasitária variando de moderada a intensa (++ e ++++). As análises microscópicas das amostras de pele dos cães oligossintomáticos revelaram diferentes manifestações de dermatites, sendo as dermatites perivasculares e perifoliculares as mais comuns (Figura 5). Semelhante ao assintomático, um cão oligossintomático nº 12 (Figura 5 e Apêndice) apresentou carga parasitária intensa (++++) mesmo na pele aparentemente sadia. Amastigotas foram vistas, particularmente dentro dos macrófagos da derme superior, média (Figura 5A, 5B e 5D) e profunda, hipoderme (Figura 5C) e entre as fibras musculares (Figura 5E e F). Porém, na maioria dos casos, os parasitas não foram identificados nos cães apresentando 44 dermatites com predominância de células polimorfonucleares, especialmente neutrófilos, edema, epidermes lesionadas, hemorragias e congestão dermal. Entre os cães polissintomáticos, 100% apresentavam lesões de pele e destes 75,0% foram positivos com cargas parasitárias variando de ++ (25,0%), +++ (16,7%) e ++++ (33,3%) (Tabela 1). A dermatite esfoliativa foi a manifestação observada na maioria destes cães caracterizada pela ocorrência de hipotricose e alopecia em diferentes partes do corpo e por presença de crostas e hiperqueratose, principalmente em regiões correspondentes a articulações dos membros torácicos e pélvicos. Os animais apresentavam também alopecia periocular e lesões na ponta dos pavilhões auriculares. Estes animais com positividade intensa, particularmente o animal nº 30 (Apêndice), apresentaram intenso infiltrado de células mononucleares, com predominância de macrófagos repletos de amastigotas de Leishmania sp em todas as camadas da pele: derme superior (Figura 6A e D), média e profunda (Figura 6C) e ao redor das células musculares logo abaixo da hipoderme. Observou-se ainda uma inflamação dermal difusa com desarranjo completo das fibras conjuntivas que foram substituídas por uma reação inflamatória mononuclear (Figura 6A) nodular (Figura 6B) e dermatite perivascular (Figura 6D). Além disso, poucas amastigotas foram vistas fora das células, pois na maioria dos casos havia predominância de amastigotas de Leishmania sp intramacrofágicas (Figura 6E e F). 45 Tabela 1 – Resultados em números (N) e porcentagens (%) da pesquisa de formas amastigotas de Leishmania sp em fragmentos de pele com ou sem lesão processados por histoquímica (HE), obtidos de cães naturalmente acometidos por leishmaniose visceral no município de Ilha Solteira e classificados de acordo com a presença de sintomas em assintomáticos (A), oligossintomáticos (O) e polissintomáticos (P). Araçatuba, SP, 2008. Números e porcentagens de fragmentos de peles negativas ou positivas pela HE Positivos Negativos Suspeitos ++ +++ ++++ Total Grupos (N) Classifi- cação das Peles (N) N (%) N (%) N (%) N (%) N (%) N (%) A (8) Sadia (8) 05 (62,5) 00 (00,0) 02 (25,0) 00 (00,0) 01 (12,5) 03 (37,5) Sadia (14) 10 (71,6) 02 (14,2) 01 (07,1) 00 (00,0) 01 (07,1) 02 (14,2) O (14) Lesão (11) 02 (18,2) 07 (63,6) 01 (9,1) 01 (9,1) 00 (0,0) 02 (18,2) P (12) Lesão (12) 00 (00,0) 03 (25,0) 03 (25,0) 02 (16,7) 04 (33,3) 09 (75,0) Total de amostras (45) 17 (37,8) 12 (26,7) 7 (15,5) 3 (06,7) 6 (13,3) 16 (35,5) ++ = fraco positivo, +++ = moderado positivo, ++++ = forte positivo. N = número de animais ou amostras de pele. 46 FIGURA 5 - Fotomicrografias de secções de pele sadia de focinho de um cão portador de leishmaniose visceral e oligossintomático (cão nº 12). (A) Moderada dermatite pervivascular e perifolicular na derme superior e profunda. (B) Ampliação da Fig. A, mostrando muitos macrófagos infectados com amastigotas de Leishmania sp logo abaixo da epiderme. (C) Moderada reação inflamatória na hipoderme, com parasitas nos macrófagos ao redor dos vasos linfáticos e sanguíneos (D). Nas Figs. E e F, é possível ver uma reação inflamatória nodular entre as fibras musculares abaixo da hipoderme com predominância de células mononucleares, especialmente macrófagos, poucos linfócitos e plasmócitos. Muitas células infectadas por Leishmania sp no centro do nódulo e ao redor de vasos sanguíneos podem ser vistas (F). Setas pretas mostram amastigotas intracelulares. Barra = 100 µm (A); 50 µm (B, C e E); 10 µm (D e E). Coloração HE. A B C D E F 47 FIGURA 6 - Fotomicrografias de secções de pele com lesão de um cão portador de leishmaniose visceral e sintomático (cão nº 30) que apresentava intensa carga parasitária. Dermatite mononuclear difusa (A) e nodular (B) mostrando um alto número de células inflamatórias mononucleares, com predominância de macrófagos na região superior e média da derme com grande quantidade de amastigotas. (C) Dermatite perivascular na região média da derme e reação inflamatória intensa na derme profunda e hipoderme (D). Ampliação destas secções na E e F mostrando predominância de amastigotas de Leishmania sp intramacrofágicas. Setas pretas mostram amastigotas intracelulares. Barras = 50 µm (A, B, C e D) e 10 µm (E e F). Coloração HE. A B C D E F 48 4.2.2 Exame Imunoistoquímico (IMIQ) O método IMIQ foi utilizado para detectar Leishmania sp em amostras de pele dos cães e para confirmação dos resultados do HE. Os resultados relativos à técnica de coloração IMIQ estão na Tabela 2 e mostraram que 04/08 (50%) das amostras cutâneas dos cães assintomáticos e 03/14 (29,4%) dos oligossintomáticos tinham parasitas intactos nas amostras de pele sadia, enquanto 02/11 (18,2%) e 11/12 (91,7%) dos oligossintomáticos e polissintomáticos, respectivamente, apresentavam amastigotas nas amostras de pele com lesão. A Figura 7 mostra uma reação imune positiva em amostra de pele com lesão do cão sintomático nº 30 (Apêndice), onde haviam muitos macrófagos repletos de amastigotas de Leishamania sp. As amastigotas foram coradas em vermelho tijolo pela imunoperoxidase devido ao cromógeno utilizado e assim foi possível visualizar um alto grau de contraste entre o parasita e o tecido do hospedeiro. Quando os resultados das técnicas HE e IMIQ foram comparados, observou-se que o número de cães positivos foi maior pela IMIQ (19/34, 55,9%) do que pela HE (15/34; 44,1%) (Tabela 8 e Apêndice) e 11/34 (32,3%) cães foram considerados suspeitos (+) ou inconclusivos na HE, principalmente no grupo dos oligossintomáticos. Quando estas amostras de pele inconclusivas foram especificamente coradas por imunoistoquímica, três delas passaram a ser consideradas positivas e nove negativas. O índice Kappa de concordância entre IMIQ x HE não foi testado em função da presença do alto número de suspeitos pelo exame parasitológico HE. 49 Tabela 2 – Resultados em números (N) e porcentagens (%) da pesquisa de formas amastigotas de Leishmania sp em fragmentos de pele com ou sem lesão processados por imunoistoquímica (IMIQ), obtidos de cães naturalmente acometidos por leishmaniose visceral no município de Ilha Solteira e classificados de acordo com a presença de sintomas em assintomáticos (A), oligossintomáticos (O) e polissintomáticos (P). Araçatuba, SP, 2008. Números e porcentagens de fragmentos de peles negativas ou positivas pela IMIQ Grupos (N) Classificação das peles (N) Negativos N (%) Positivos N (%) A (8) Sadia (8) 04 (50,0) 04 (50,0) Sadia (14) 11 (78,6) 03 (21,4) O (14) Lesão (11) 09 (81,8) 02 (18,2) P (12) Lesão (12) 01 (08,3) 11 (91,7) Total de amostras (45) 25 (55,5) 20 (44,5) FIGURA 7 - Fotomicrografias de secções de pele com lesão de um cão portador de leishmaniose visceral e sintomático (cão nº 30), mostrando amastigotas coradas por imunoistoquímica em vermelho escuro (técnica utilizando o complexo Avidina-biotina peroxidase, contraste por hematoxilina) na região média da derme. Setas pretas mostram amastigotas intracelulares. Barras = 10 µm. 50 4.3 Exames sorológicos (ELISA e RIFI) Na Tabela 3 encontram-se os dados dos resultados dos testes sorológicos, tanto RIFI quanto ELISA para diagnosticar cães com leishmaniose visceral, mas divididos nos grupos assintomáticos, oligossintomáticos e polissintomáticos. Desta forma, observou-se que estes testes sorológicos diagnosticaram 24/34 (70,6%) dos cães para LVC. Destes testes, ELISA detectou anticorpos anti-Leishmania sp em 22 cães (64,7%) e a RIFI um número levemente inferior de 19 (55,9%) cães. Através dos exames sorológicos encontrou-se apenas um cão positivo (12,5%) para leishmaniose visceral no grupo dos assintomáticos, nos oligossintomáticos foram 12 (85,7%) cães e entre os polissintomáticos 11 (91,6%) animais (Tabela 3). Além disso, no grupo dos animais oligossintomáticos, 7/14 (50,0%) dos cães foram positivos em ambos os exames sorológicos (ELISA e RIFI), mas em quatro cães houve discordância entre os exames, ou seja, um cão foi positivo pela RIFI e negativo pelo ELISA e três cães foram positivos pelo ELISA e negativos pela RIFI. Estes três cães negativos somente na RIFI apresentaram os tecidos cutâneos também negativos pela IMIQ e/ou suspeitos pela HE (Apêndice). Tabela 3 – Resultados em números (N) e porcentagens (%) da positividade em 34 cães de Ilha Solteira, classificados de acordo com a presença de sintomas em assintomáticos (A), oligossintomáticos (O) e polissintomáticos (P) e que foram sororreagentes nos exames sorológicos (ELISA e RIFI) para leishmaniose visceral canina. Araçatuba, SP, 2008. Positividade Grupos (N) ELISA N (%) RIFI N (%) TOTAL N (%) A (8) 01 (12,5) 01 (12,5) 1 (12,5) O (14) 11 (78,6) 08 (57,1) 12 (85,7) P (12) 10 (83,3) 10 (83,3) 11 (91,6) Total de animais (34) 22 (64,7) 19 (55,9) 24 (70,6) 51 4.4 Exame Molecular por PCR Nas Figuras 8 a 11, estão ilustrados os resultados das amplificações pela PCR de DNA de Leishmania sp em amostras de pele, tanto sadias (PS) como com lesão (PL) dos 34 cães. Entre todas as amostras analisadas apenas a pele com lesão do cão oligossintomático de número 14 (14PL) não apresentou banda positiva de DNA (Figura 8). As amostras cutâneas 1PS, 2PL, 6 PS e 6 PL (Figura 8), 11 PL, 15 PS (Figura 9), 21 PS e 22 PS (Figura 10) e 34 PL (Figura 11), apresentaram bandas de fraca intensidade, mas, consideradas positivas. Já todas as demais amostras apresentaram bandas coradas intensamente. Embora a amostra de pele (14PL) tenha sido negativa pela PCR, a amostra de pele sem lesão deste mesmo animal (14 PS) estava positiva (Figura 9). Desta forma, pode-se afirmar pelo resultado da PCR realizada nas amostras cutâneas (Tabela 4), que todos os cães eram positivos para LVC. Apesar da HE e IMIQ terem detectado um menor número de amostras cutâneas positivas com formas amastigotas de Leishmania sp com 16/45 (45,6%), 20/45 (44,4%) e 44/45 (97,8%), respectivamente para o teste HE, IMIQ e PCR, todos os testes detectaram o parasita tanto nas peles sadias como nas peles com lesão. PCR, IMIQ e HE detectaram respectivamente, 100,0%, 31,8% e 22,7% de peles sadias e 95,6%, 56,5% e 47,8% de peles com lesão infectadas com Leishmania sp (Tabela 5). 52 PB C- 1PS 2PS 14PL 3PS 3PL 4PS 4PL 5PS 5PL 6PS 6PL 7PS 7PL C+ NO FIGURA 8 - Eletroforese em gel de poliacrilamida 8% corado com nitrato de prata. Produtos de amplificação por PCR de fragmentos de 120pb de DNA de Leishmania sp em amostras de peles sadias (PS) e com lesão (PL) dos seguintes animais: cão 1 DNA de pele sadia (1PS), cão 2 DNA de pele sadia (2PS), cão 14 DNA de pele com lesão (14PL), cão 3 DNA de pele sadia (3PS), cão 3 DNA de pele com lesão (3PL), cão 4 DNA de pele sadia (4PS), cão 4 DNA de pele com lesão (4PL), cão 5 DNA de pele sadia (5PS), cão 5 DNA de pele com lesão (5PL), cão 6 DNA de pele sadia (6PS), cão 6 DNA de pele com lesão (6PL), cão 7 pele sadia (7PS), cão 7 DNA de pele com lesão (7PL). PB = marcador molecular em escala de 100 pb (Invitrogen®); C- = controle negativo (DNA pele sadia de cão de área não endêmica); C+ = controle positivo (DNA pele sadia cão 12); NO. PB C- 8PS 8PL 9PS 9PL 10PS 10PL 11PS 11PL 12PS 13PS 14PS 15PS 15PL C+ NO FIGURA 9 - Eletroforese em gel de poliacrilamida 8% corado com nitrato de prata. Produtos de amplificação por PCR de fragmentos de 120pb de DNA de Leishmania sp em amostras de peles sadias (PS) e com lesão (PL) dos seguintes animais: cão 8 DNA de pele sadia (8PS), cão 8 DNA de pele com lesão (8PL), cão 9 DNA de pele sadia (9PS), cão 9 DNA de pele com lesão (9PL), cão 10 DNA de pele sadia (10PS), cão 10 DNA de pele com lesão (10PL), cão 11 DNA de pele sadia (11PS), cão 11 DNA de pele com lesão (11PL), cão 12 DNA de pele sadia (12PS), cão 13 DNA de pele sadia (13PS), cão 14 DNA de pele sadia (14PS), cão 15 pele sadia (15PS), cão 15 DNA de pele com lesão (15PL). PB = marcador molecular em escala de 100 pb (Invitrogen®); C- = controle negativo (DNA pele sadia de cão de área não endêmica); C+ = controle positivo (DNA pele sadia cão 12); NO. 120 pb 120 pb 53 PB C- 16PS 16PL 17PS 17PL 18PS 19PS 20PS 21PS 22PS 23PS 24PL 25PL 26PL C+ NO FIGURA 10 - Eletroforese em gel de poliacrilamida 8% corado com nitrato de prata. Produtos de amplificação por PCR de fragmentos de 120pb de DNA de Leishmania sp em amostras de peles sadias (PS) e com lesão (PL) dos seguintes animais: cão 16 DNA de pele sadia (16PS), cão 16 DNA de pele com lesão (16PL), cão 17 DNA de pele sadia (17PS), cão 17 DNA de pele com lesão (17PL), cão 18 DNA de pele sadia (18PS), cão 19 DNA de pele sadia (19PS), cão 20 DNA de pele sadia (20PS), cão 21 DNA de pele sadia (21PS), cão 22 DNA de pele sadia (22PS), cão 23 DNA de pele sadia (23PS), cão 24 DNA de pele com lesão (24PL), cão 25 pele com lesão (25PL), cão 26 DNA de pele com lesão (26PL). PB = marcador molecular em escala de 100 pb (Invitrogen®); C- = controle negativo (DNA pele sadia de cão de área não endêmica); C+ = controle positivo (DNA pele sadia cão 12); NO. PB C- 27PL 28PL 29PL 30PL 31PL 32PL 33PL 34PL C+ NO FIGURA 11 - Eletroforese em gel de poliacrilamida 8% corado com nitrato de prata. Produtos de amplificação por PCR de fragmentos de 120pb de DNA de Leishmania sp em amostras de peles sadias (PS) e com lesão (PL) dos seguintes animais: cão 27 DNA de pele com lesão (27PL), cão 28 DNA de pele com lesão (28PL), cão 29 DNA de pele com lesão (29PL), cão 30 DNA de pele com lesão (30PL), cão 31 DNA de pele com lesão (31PL), cão 32 DNA de pele com lesão (32PL), cão 33 DNA de pele com lesão (33PL), cão 34 DNA de pele com lesão (34PL). PB = marcador molecular em escala de 100 pb (Invitrogen®); C- = controle negativo (DNA pele sadia de cão de área não endêmica); C+ = controle positivo (DNA pele sadia cão 12); NO. 120 pb 120 pb 54 Tabela 4 – Resultados em números (N) e porcentagens (%) da pesquisa de produtos de amplificação por PCR de fragmentos de 120pb de DNA de Leishmania sp extraídos de amostras de pele com ou sem lesão, obtidos de cães naturalmente acometidos por leishmaniose visceral no município de Ilha Solteira e classificados de acordo com a presença de sintomas em assintomáticos (A), oligossintomáticos (O) e polissintomáticos (P). Araçatuba, SP, 2008. Números e porcentagens de fragmentos de peles negativas ou positivas pela PCR Grupos Clínicos (N) Classificação das Peles (N) Negativas N (%) Positivas N (%) A (8) Sadia (8) 00 (00,0) 8 (100,0) Sadia (14) 00 (00,0) 14 (100,0) O (14) Lesão (11) 01 (09,1) 10 (90,9) P (12) Lesão (12) 00 (00,0) 12 (100,0) Total de amostras (45) 01 (02,2) 44 (97,8) Tabela 5 - Resultados em números (N) e porcentagens (%) da pesquisa de formas amastigotas de Leishmania sp em fragmentos de pele com ou sem lesão processados por histoquímica (HE), imunoistoquímica (IMIQ) e PCR, obtidos de cães naturalmente acometidos por leishmaniose visceral no município de Ilha Solteira. Araçatuba, SP, 2008. Positividade dos fragmentos de pele Classificação das Pele (N) HE N (%) IMIQ N (%) PCR N (%) Sadia (22) 5 (22,7) 7 (31,8) 22 (100,0) Lesão (23) 11 (47,8) 13 (56,5) 22 (95,6) Total (45) 16 (35,6) 20 (44,4) 44 (97,8) 55 4.5 Análise comparativa entre os métodos de diagnóstico A Tabela 6 mostra uma análise comparativa entre as técnicas IMIQ x ELISA, IMIQ x RIFI e ELISA x RIFI para avaliar o diagnóstico de leishmaniose visceral em cães classificados como assintomáticos, oligossintomáticos e polissintomáticos. Por esta análise comparativa, observou-se que no geral o índice de concordância entre os dois testes sorológicos (RIFI e ELISA) foi bom (κ = 0,57), porém, quando o nível de concordância foi analisado de acordo com a presença dos sinais clínicos, a concordância entre RIFI e ELISA foi ótima ou de 100,0% somente entre os assintomáticos (κ = 1,0), mas regular (83,3%) nos polissintomáticos e fraca (64,3%) nos oligossintomáticos (Tabela 6). Quando o teste IMIQ foi comparado com o ELISA ou a RIFI, no grupos dos assintomáticos, verificou-se uma concordância fraca com ambos os testes sorológicos, de apenas 6,5% (κ = 0,25) (Tabela 6). Isto aconteceu devido ao fato de que apenas um cão assintomático (cão nº 19) foi positivo com alto título de anticorpos anti-Leishmania sp (ELISA e RIFI), confirmado pela intensa carga parasitária na pele, mas em contrapartida outros três cães foram negativos pelos testes sorológicos e positivos nos exames parasitológicos (Apêndice). Comparando-se ainda o teste parasitológico IMIQ e o sorológico, a concordância continuou baixa, sendo a menor entre IMIQ e ELISA onde houve apenas 50,0% de concordância e κ = 0,20, pois neste grupo apenas 5/14 (35,7%) dos cães foram simultaneamente positivos na sorologia e nos testes parasitológicos da pele (Apêndice). Desta forma, o teste ELISA detectou anticorpos anti-Leishmania sp em maior número de amostras séricas de cães do que a RIFI, mas sem correlação com a presença dos parasitas na pele pela IMIQ. Embora os níveis de concordância entre IMIQ x ELISA e ELISA x RIFI tenham sido baixos, entre IMIQ x RIFI esta concordância foi boa (concordância 71,4% e κ = 0,46) (Tabela 6). No grupo dos cães sintomáticos, o nível de concordância entre esses testes foi o mais alto, atingindo porcentagens de concordância variando de 56 83,3% a 91,7% e índices Kappa variando de 0,40 a 0,62 (Tabela 6). Porém, um animal polissintomático (cão nº 28) deste grupo foi negativo para todos esses testes (Apêndice), o que fez com que diminuísse o nível de concordância entre os métodos neste grupo. Já a Tabela 7 mostra os dados da análise comparativa entre a técnica PCR e as técnicas IMIQ, ELISA e RIFI. Quando a PCR foi comparada com IMIQ, ELISA e RIFI verificou-se uma concordância muito baixa, obtendo os menores valores entre a PCR e os exames sorológicos (RIFI ou ELISA) no grupo assintomático (concordância de 12,5%), seguido pelos oligossintomáticos e polissintomáticos (Tabela 7). Finalmente, através da Tabela 8 e da Figura 12, observaram-se os números e as porcentagens de cães positivos para leishmaniose visceral canina pelos testes sorológicos (RIFI e ELISA), parasitológicos (HE e IMIQ) e pela PCR em amostras de pele sadia e com lesão dos cães assintomáticos, oligossintomáticos e polissintomáticos. Desta forma, estes resultados mostraram que os testes PCR, IMIQ, HE, RIFI e ELISA apresentaram respectivamente os seguintes resultados de positividade: 100,0%, 55,9%, 44,1%, 55,9% e 64,7%. 57 Tabela 6 – Análise comparativa de concordância e índice Kappa entre as técnicas imunoistoquímica (IMIQ) x ELISA, imunoistoquímica x RIFI e ELISA x RIFI para diagnóstico de leishmaniose visceral em cães naturalmente acometidos por esta doença no município de Ilha Solteira e classificados de acordo com a presença de sintomas em assintomáticos (A), oligossintomáticos (O) e polissintomáticos (P). Araçatuba, SP, 2008. Análise comparativa entre os métodos de diagnóstico Grupos IMIQ x ELISA N (%) IMIQ x RIFI N (%) ELISA x RIFI N (%) Cães (n = 34) Concordância 23 (67,6) 26 (76,5) 27 (79,4) Índice Kappa 0,32 0,52* 0,57* Assintomáticos (n = 8) Concordância 5 (62,5) 5 (62,5) 8 (100%) Índice Kappa 0,25 0,25 1,0 Oligossintomáticos (n = 14) Concordância 7 (50,0) 10 (71,4) 9 (64,3) Índice Kappa 0,20 0,46* 0,22 Polissintomáticos (n = 12) Concordância 11 (91,7%) 11 (91,8) 10 (83,3) Índice Kappa 0,62* 0,62* 0,40 *Estatisticamente significante p � 0,05. Intervalo de confiança = 95%. 58 Tabela 7 – Análise comparativa de concordância entre a PCR e as técnicas imunoistoquímica (IMIQ), ELISA e RIFI para diagnóstico de leishmaniose visceral em cães naturalmente acometidos por esta doença no município de Ilha Solteira e classificados de acordo com a presença de sintomas em assintomáticos (A), oligossintomáticos (O) e polissintomáticos (P). Araçatuba, SP, 2008. Análise comparativa entre os métodos de diagnóstico Grupos PCR x IMIQ N (%) PCR x ELISA N (%) PCR x RIFI N (%) Cães (n = 34) Concordância 19 (55,9) 22 (64,7) 19 (55,8) Assintomáticos (n = 8) Concordância 4 (50,0) 1 (12,5) 1 (12,5) Oligossintomáticos (n =14) Concordância 4 (28,6) 11 (78,6) 8 (57,1) Polissintomáticos (n = 12) Concordância 11 (91,6%) 10 (83,3) 10 (83,3) Tabela 8 – Número (N) e porcentagens (%) de cães positivos para leishmaniose visceral pelos testes sorológicos (RIFI e ELISA), parasitológicos (histoquímica - HE e imunoistoquímica - IMIQ) e molecular (PCR) em amostras de peles sadias e com lesão de cães naturalmente acometidos por esta doença no município de Ilha Solteira e classificados de acordo com a presença de sintomas em assintomáticos (A), oligossintomáticos (O) e polissintomáticos (P). Araçatuba, SP, 2008. Positividade dos cães para leishmaniose visceral Grupos (N) ELISA N (%) RIFI N (%) HE N (%) IMIQ N (%) PCR N (%) A (8) 1 (12,5) 1 (12,5) 3 (37,5) 4 (50,0) 8 (100,0) O (14) 11 (78,6) 8 (57,1) 3 (21,4) 4 (28,6) 14 (100,0) P (12) 10 (83,3) 10 (83,3) 9 (75,0) 11 (91,7) 12 (100,0) Total (N = 34) 22 (64,7) 19 (55,9) 15 (44,1) 19 (55,9) 34 (100,0) 59 FIGURA 12 - Porcentagem (%) de cães positivos para leishmaniose visceral pelos testes sorológicos (RIFI e ELISA), parasitológicos (histoquímica - HE e imunoistoquímica - IMIQ) e molecular (PCR) em amostras de peles sadias e com lesão de cães naturalmente acometidos por esta doença no município de Ilha Solteira. Araçatuba, SP, 2008. 64.7 55.9 44.1 55.9 100.0 0.0 20.0 40.0 60.0 80.0 100.0 120.0 ELISA RIFI HE IMIQ PCR Métodos de Diagnóstico P O S I T I V I D A D E (%) 60 5 DISCUSSÃO Na leishmaniose visceral canina a pele é a parte do corpo que mais comumente apresenta os sinais da doença e a presença do parasita. Assim, a pele dos cães infectados é o reservatório do parasita e tem um papel importante na infecção dos insetos vetores e na transmissão do parasita para os cães e o homem. Da infecção cutânea localizada, o parasita pode se disseminar através dos vasos linfáticos ou sanguíneos, infectando macrófagos da medula óssea, linfonodos, fígado, baço, rins e trato gastrointestinal, dentre outros (DIAS et al., 1999; GENARO et al., 1988). Estudos anteriores revelaram a dermatite esfoliativa como a manifestação cutânea mais comum da LVC, com freqüência registrada de 56%-91% (CIARAMELLA et al., 1997; KOUTINAS et al., 1992). Em concordância, a anormalidade mais freqüentemente observada nas peles analisadas foi a dermatite esfoliativa, com presença de descamação, hiperqueratose e alopecia. Neste trabalho, várias amostras de tecido cutâneo com e sem lesões foram colhidas das patas, tórax, abdômen, focinho, ponta da orelha, região peri-ocular e outras partes da face e do corpo, mas particularmente das regiões onde haviam lesões evidentes de pele. Na maioria dos casos os tecidos eram do focinho e da orelha. A colheita das amostras foi feita de forma aleatória e a intensidade da carga parasitária das diferentes regiões não foi comparada. Segundo Xavier et al. (2006), a sensibilidade da IMIQ e da HE não depende da região anatômica de onde são colhidas as amostras e de acordo com Saridomichelakis et al. (2007) a densidade parasitária não tem diferença significante entre as diferentes partes do corpo. 61 Os cães foram classificados como assintomáticos (23,5%), oligossintomáticos (41,1%) e polissintomáticos (35,2%) por meio da análise dos sinais clínicos e anatomopatológicos evidentes para leishmaniose visceral. Embora, as amostras séricas de 7/8 (87,5%) cães assintomáticos tenham sido negativas nos testes sorológicos, os exames HE e IMIQ revelaram positividade em 50% dos animais deste grupo, com carga parasitária variando de moderada a intensa e a PCR revelou positividade de 100% nas amostras de pele sadia. De forma semelhante, Abranches (1991) demonstrou que os cães naturalmente infectados com L. infantum apresentaram grande quantidade de parasitas na pele independente da presença de lesões. A baixa detecção de anticorpos nos animais assintomáticos pode indicar que estão no início da infecção e que ainda não houve soroconversão, mas com parasitas presentes na pele. Estudos mostraram uma variação no período de soroconversão em cães naturalmente infectados de 94 dias até um ano (OLIVA et al., 2006; QUINNELL et al., 1997; QUINNELL et al., 2003; SOLANO-GALLEGO et al.; 2005). Quinnell et al. (2001) sugerem que antes da soroconversão ou desenvolvimento de sintomas, o exame parasitológico e a PCR são mais sensíveis. Relativo aos cães oligossintomáticos, 85,7% foram positivos pelos testes sorológicos (RIFI ou ELISA) e apenas 28,6% destes animais foram simultaneamente positivos nos testes sorológicos e parasitológicos (IMIQ ou HE), com carga parasitária de moderada a intensa, incluindo três cães que tiveram os mais altos títulos de anticorpo anti-Leishmania sp e forte parasitismo, mesmo sem lesão nas amostras de pele. Por outro lado, 66,6% dos cães soropositivos (particularmente ELISA) não apresentaram amastigotas nas amostras de pele pelos métodos HE e IMIQ. Porém, o resultado positivo do teste sorológico presume um contato com o parasita e uma subseqüente resposta imune humoral, não indicando necessariamente infecção ativa por Leishmania sp ou presença dela na pele. Além disso, a maioria dos cães com amostras de pele onde não se verificou a presença de parasitas foi também negativa pela RIFI, mas com ELISA positivo, sugerindo maior sensibilidade 62 desta última técnica. A infecção por Leishmania sp ficou comprovada posteriormente pelos resultados da PCR que foram positivos em 97,0% das amostras de pele destes animais. No momento em que os parasitas migram do local de infecção na pele para outras partes do organismo, provocando o aparecimento dos sintomas, percebe-se o aumento da produção de anticorpos, sendo possível que as pequenas quantidades de parasitas restantes na pele durante esta fase, possam ser detectadas apenas por técnicas mais sensíveis como a PCR, semelhante ao que sugere Rodgers et al. (1990). Courtenay et al. (2002), observaram correlação positiva entre infectividade, nível de anticorpos anti-Leishmania sp, detecção de DNA do parasita por PCR e presença de sinais clínicos. A presença de amastigotas de Leishmania sp foi observada pela IMIQ em 56,5% das amostras de pele com lesão e em apenas 31,8% das peles clinicamente sadias, sendo esta positividade aumentada pela PCR nas amostras de pele com lesão (100,0%) e principalmente nas de pele sadia (95,6%). Trabalhos anteriores também revelaram a presença de parasitas em peles clinicamente sadias, independente da manifestação clínica dos cães de áreas endêmicas, através da imunoistoquímica (PAPADOGIANNAKIS et al., 2005; SARIDOMICHELAKIS et al., 2007) e da PCR (SOLANO-GALLEGO et al., 2004). Além disso, Rodríguez-Cortés et al. (2007) sugerem que as biopsias de pele para diagnóstico não precisam ser obtidas apenas de peles com lesão, mas também podem ser colhidas de peles sadias. No presente trabalho, um cão assintomático e dois oligossintomáticos soropositivos, com altos níveis de anticorpos, mas com leve ou ausente reação inf