� �� � �� � � � � � �� � �� �� � �� � �� �� ��� ���� ���� ��� IFT Instituto de F́ısica Teórica Universidade Estadual Paulista DISSERTAÇÃO DE MESTRADO IFT–D.002/11 SOBRE INTERFERÊNCIA E DISCOS DE ACREÇÃO EM ESPAÇOS CURVOS Raissa Fernandes Pessoa Mendes Orientador Prof. Dr. George Emanuel Avraam Matsas Março de 2011 Agradecimentos Dedicado a Dinah, minha mãe, meu maior exemplo de força e amor, com o coração cheio de saudade. Agradeço ao Prof. George Matsas, pela orientação dedicada e pelo exemplo inspirador. Agradeço à minha famı́lia, pelo amor, apoio e presença constantes em minha vida; aos amigos, que me acolheram tão prontamente e com tanto carinho em São Paulo; a Daniel, meu namorado, pela grande amizade e companheirismo. Agradeço à Fapesp pelo apoio financeiro. Agradeço ainda à Mãe Natureza, da qual somos todos partes, e que nos dá a bênção de, das mais diversas formas, penetrar um pouco em seu Mistério. i Resumo A Teoria Quântica de Campos em Espaços Curvos fornece um arcabouço teórico consistente para o estudo de diversos fenômenos em que o caráter quântico dos campos e a curvatura clássica do espaço-tempo são importantes, mas em que a natureza quântica da gravitação não exerce um papel relevante. Em particular, a emissão de radiação por uma fonte nas imediações de um buraco negro tem sido analisada, nesse contexto, com perspectivas diversas, dentre as quais está a busca de uma compreensão detalhada dos processos de emissão por discos de acreção e da influência da curvatura espaço-temporal sobre tais processos. De fato, a emissão de radiação por discos de acreção é uma das principais evidências observacionais da existência de buracos negros. Além da emissão térmica de bremsstrahlung devida a efeitos de colisões locais, o movimento global de cargas individuais ao redor do buraco negro também as faz irradiar, efeito por vezes chamado de radiação śıncrotron gravitacional. Nesta dissertação, nós estendemos a análise da radiação devida a uma fonte, considerando um conjunto de fontes em rotação ao redor de um buraco negro. Discutimos a contribuição desse efeito para discos de acreção e investigamos os processos de interferência e como eles são modificados pela curvatura espaço- temporal. Palavras Chaves: teoria quântica de campos; radiação śıncrotron gravitacional; discos de acreção; interferência. Áreas do conhecimento: Teoria de Campos; Gravitação e Cosmologia. ii Abstract Quantum Field Theory in Curved Spacetimes provides a theoretical framework for the investigation of phenomena in which the quantum nature of fields and the classical spacetime curvature are important but in which the quantum nature of gra- vitation does not play a crucial role. In particular, radiation emission by a source in the vicinity of a black hole has been analyzed in this context with a number of moti- vations, one of which is to fully understand radiation emission processes by accretion discs and how they are modified by the nontrivial curvature of the black hole space- time. In fact, radiation emission by accretion discs is one of the main observational evidences of the existence of black holes. Besides thermal bremsstrahlung emission due to local collision effects, the global motion of individual charges around a black hole also causes them to radiate; an effect often called gravitational synchrotron radiation. In this thesis, we extend the analysis of radiation due to one source by considering an ensemble of sources orbiting a black hole. We discuss the contribu- tion of this effect to accretion discs, and investigate the interference processes that take place and how they are modified by space-time curvature. iii Sumário 1 Introdução 1 2 Teoria Quântica de Campos em Espaços-tempos Estáticos 5 2.1 Quantização do campo escalar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 6 2.2 Acoplamento com uma corrente clássica e emissão de radiação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 3 Espaço-tempo de Minkowski 11 3.1 Radiação emitida por uma fonte escalar em movimento circular . . . 12 3.2 Radiação emitida por duas fontes escalares em movimento circular . . 17 3.3 Radiação emitida por N fontes escalares em movimento circular . . . 24 3.3.1 Configuração neutra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 3.3.2 Configuração carregada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 3.3.3 Análise gráfica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30 4 Espaço-tempo de Schwarzschild 33 4.1 Modos normais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 4.1.1 Formas assintóticas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34 4.1.2 Regime de baixas frequências . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37 4.1.3 Regime de altas frequências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39 4.2 Radiação emitida por uma fonte escalar em movimento circular . . . 43 4.2.1 Radiação ćıclotron . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 4.2.2 Radiação śıncrotron . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47 4.3 Radiação emitida por duas fontes escalares em movimento circular . . 52 4.4 Radiação emitida por N fontes escalares em movimento circular . . . 58 4.4.1 Configuração neutra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 58 iv 4.4.2 Configuração carregada . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 59 4.4.3 Análise gráfica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 60 5 Discussão e conclusões 64 A Emissão de radiação escalar: alguns resultados em Teoria Clássica de Campos 67 B Considerações sobre radiação ćıclotron no Eletromagnetismo 70 C Órbitas circulares no espaço-tempo de Schwarzschild 74 Referências 77 v Caṕıtulo 1 Introdução A Teoria Quântica de Campos, de um lado, e a Relatividade Geral, de outro, se es- tabeleceram, nas últimas décadas, como teorias-padrão em F́ısica devido à sua con- sistência matemática, dentro de certos limites, e ao seu sucesso quando confrontadas com dados observacionais e experimentais. Contudo, ainda hoje permanece em aberto a questão da construção de uma teoria quântica para a gravitação, e muitos problemas, conceituais bem como técnicos, desafiam as propostas existentes. De fato, uma teoria completa de gravitação quântica, necessária para a descrição de fenômenos cuja escala seja comparável à escala de Planck (lP = 10−33cm), deve desafiar a nossa intuição sobre o espaço-tempo, uma vez que essa estrutura, tida em geral como simples “pano de fundo”, passaria a ser discretizada e ganharia uma nova dinâmica. Na ausência de uma teoria consistente e satisfatória de gravitação quântica, é razoável trabalhar, exceto nas vizinhanças de singularidades, com uma teoria semiclássica em que a métrica do espaço-tempo seja tratada classicamente, mas que seja acoplada a campos de matéria descritos quanticamente. Assim, a Teoria Quântica de Campos em Espaços Curvos (TQCEC) permite a abordagem de pro- blemas em que a gravitação e a natureza quântica dos campos são de interesse, mas em que a natureza quântica da gravitação é pouco relevante. A TQCEC começou a ser desenvolvida na década de 60, possibilitando, então, o estudo da criação de part́ıculas em universos em expansão [1]. Uma das previsões mais impressionantes desse tipo de abordagem é o efeito Hawking, de evaporação de buracos negros, descoberto em 1974 [2, 3]: buracos negros, objetos tão densos que deles nenhuma 1 informação clássica pode escapar, emitem radiação com um espectro de corpo ne- gro, com temperatura inversamente proporcional à sua massa (TH = �c3/8πkBGM , como medida por observadores estáticos no infinito)∗. A TQCEC fornece um arcabouço teórico para o estudo de diversos fenômenos de interesse. Dentre eles, a emissão de radiação por uma fonte nas proximidades de um buraco negro tem sido analisada em vários contextos e com perspectivas diversas. Uma motivação recorrente (ver [4, 5, 6], por exemplo), ligada à Astrof́ısica, é a de compreender os detalhes dos processos de emissão pela matéria em volta de um buraco negro, tendo em vista a identificação e caracterização apropriada desse tipo de objeto. Em particular, é necessário um bom entendimento teórico dos processos de emissão para que se possa fazer uma análise adequada dos dados cada vez mais precisos de telescópios, bem como dos dados esperados de experimentos como LISA, LIGO e VIRGO, projetados para a detecção de ondas gravitacionais. As caracteŕısticas observacionais de buracos negros dependem basicamente do ambiente que os cerca. Estima-se que um buraco negro no meio interestelar emita de 1029 a 1035 ergs/s de radiação eletromagnética concentrada na região óptica do espectro. Para sistemas binários de buracos e estrelas, a taxa de emissão esperada é de aproximadamente 1037 erg/s em raios-X e, para um buraco negro supermassivo no centro de uma galáxia, ela é de aproximadamente 1045 ergs/s em ultravioleta e azul [7]. Em todos esses casos, o fenômeno f́ısico de interesse é a acreção de gás do meio interestelar ou de ventos estelares, e a consequente emissão de radiação. A radiação, aqui, é em grande parte térmica: a viscosidade aquece o gás, fazendo que ele irradie, efeito geralmente intensificado pela presença de campos magnéticos. Contudo, a f́ısica de discos de acreção é complexa, envolvendo de forma intrincada conceitos de Hidrodinâmica e Eletromagnetismo, por exemplo. Além da emissão de radiação devido ao efeito de colisões locais, o movimento global das part́ıculas ao redor do buraco negro também as faz irradiar. Se as part́ıculas são carregadas, ondas eletromagnéticas são emitidas, e, para todo tipo de matéria, há emissão de ondas gravitacionais. O estudo desse tipo de processo no contexto da Relatividade Geral teve ińıcio nos anos 70, quando Misner e seus colaboradores iniciaram um programa de radiação śıncrotron gravitacional [8, 9]. Sua motivação era fornecer um modelo capaz de explicar os dados de ondas gra- vitacionais supostamente obtidos por Weber [11]. O modelo de radiação śıncrotron ∗Esse resultado é válido para buracos negros com carga e momento angular despreźıveis. 2 era capaz de explicar diretamente a anisotropia da radiação esperada para tornar plauśıveis aqueles dados. Desde então, a emissão de radiação por uma carga em movimento ao redor de um buraco negro tem sido investigada em diversas situações de interesse e com motivações variadas, usando abordagens clássicas e quânticas. Neste trabalho, buscamos estender a análise da emissão de radiação de uma part́ıcula para um conjunto de part́ıculas em rotação ao redor de um buraco negro, no contexto da TQCEC, com o intuito de nos aproximarmos mais da situação f́ısica de interesse, de discos de matéria ionizada. A radiação, aqui, será descrita por um campo escalar real não massivo. A análise do campo escalar, além de tecnicamente mais simples, se justifica por capturar muitas das caracteŕısticas básicas do caso da emissão de ondas eletromagnéticas ou gravitacionais, com a exceção óbvia daquelas diretamente relacionadas ao spin. Na aproximação utilizada aqui, consideramos que os campos habitam um espaço-tempo fixo, não levando em conta a contribuição deles próprios para a gravitação. Nos casos em que efeitos de backreaction são importantes, pode-se utilizar a equação semiclássica de Einstein, Gμν = 8π〈T̂μν〉, para calculá-los. Nela, o valor esperado do operador tensor de energia-momento do campo faz o papel de fonte. No estudo da emissão de radiação por um conjunto de part́ıculas, a interferência surge como um fenômeno de grande importância. Da Teoria Eletromagnética, sabe- mos que uma carga em movimento circular uniforme irradia ondas eletromagnéticas, uma vez que está acelerada. Duas fontes, colocadas na mesma órbita, em geral emitem uma potência ainda maior. Contudo, no limite do cont́ınuo, quando temos um aro carregado em rotação, a corrente é estacionária (regime da Magnetostática) e não deve haver emissão de radiação. Se estamos interessados em um disco de material ionizado, composto de um número finito mas muito grande de part́ıculas, é importante analisar se a potência irradiada por essa configuração é significativa e em que situações isso acontece. Mas ainda, gostaŕıamos de entender os detalhes da interferência e investigar como ela é influenciada pela curvatura do espaço-tempo. Dessa forma, o estudo, neste trabalho, da radiação emitida por um conjunto de part́ıculas em rotação ao redor de um buraco negro, além de possibilitar algumas discussões sobre discos de acreção, permite desenvolver a nossa intuição sobre a interferência e analisá-la quando levamos em conta a curvatura e a topologia não- triviais do espaço-tempo de um buraco negro. Esta dissertação está organizada da seguinte forma: no Caṕıtulo 2, apresentamos 3 em linhas gerais o procedimento de quantização do campo escalar real sem massa em um espaço-tempo globalmente hiperbólico e estático. Introduzimos também o acoplamento do campo com uma corrente semiclássica e apresentamos os observáveis que serão de interesse na análise seguinte. No Caṕıtulo 3, estudamos o problema da radiação emitida por um conjunto de fontes escalares em rotação no espaço-tempo de Minkowski com gravitação Newtoniana: primeiro tratamos o caso de uma única carga em movimento circular e, então, generalizamos para o caso de duas fontes e de um conjunto de part́ıculas dispostas em um anel. Uma vez compreendido o problema em espaços planos, no Caṕıtulo 4 voltamos a nossa atenção para o problema da emissão de radiação por um conjunto de part́ıculas em rotação no espaço-tempo de Schwarzschild, destacando a influência da geometria espaço-temporal sobre a interferência. Por fim, no Caṕıtulo 5, fazemos algumas discussões e considerações finais. Nota: Nesta dissertação, utilizaremos unidades naturais, � = c = G = k = 1 e assinatura (+−−−) da métrica. 4 Caṕıtulo 2 Teoria Quântica de Campos em Espaços-tempos Estáticos No espaço-tempo de Minkowski, o procedimento padrão de quantização consiste em se decompor o campo em componentes de frequência positiva e negativa e identificar os coeficientes dessa expansão com operadores de criação e aniquilação de part́ıculas, que obedecem a relações de comutação bem definidas. De fato, a simetria do espaço- tempo de Minkowski por transformações de Poincaré permite escolher como espaço de Hilbert, H, as soluções de frequência positiva que surgem naturalmente da in- variância da teoria por translações temporais. Contudo, em um espaço-tempo curvo arbitrário, existe uma grande liberdade na escolha de H e não há, em geral, um critério (como a invariância de Poincaré) que permita uma escolha privilegiada e uma forma natural de decompor o campo. Como consequência, os conceitos de vácuo e de part́ıculas, que aparecem naturalmente no espaço-tempo de Minkowski, podem ter pouco ou nenhum significado f́ısico em um background curvo arbitrário∗. Contudo, um espaço-tempo globalmente hiperbólico† dotado de um campo de ∗Ainda assim, é posśıvel definir de forma consistente uma teoria quântica de campos em espaços- tempos curvos causalmente bem comportados. No caso geral, não-estacionário, isso precisa ser feito, contudo, por meio de uma construção algébrica que não recorra a uma base privilegiada de auto-funções para a expansão do campo. Não há, também, uma noção provilegiada de part́ıculas na teoria assim definida (ver [14], por exemplo). †Um espaço-tempo (M, gμν) que possui uma superf́ıcie de Cauchy Σ é dito globalmente hiperbólico. Essa propriedade implica em uma estrutura causal bem definida para o espaço-tempo, uma vez que toda a sua história pregressa e futura pode ser conhecida a partir das condições dadas em Σ [29]. 5 Killing‡ tipo tempo global admite uma escolha preferencial de vácuo, e a quantização dos campos nesse espaço-tempo pode ser conduzida de forma análoga à quantização usual em Minkowski (ver [13, 14], por exemplo). Neste caṕıtulo, trataremos, por- tanto, da quantização do campo escalar real, linear e não massivo em um espaço- tempo globalmente hiperbólico e estático e da descrição, no contexto da TQCEC, da emissão de radiação por uma fonte semiclássica acoplada minimamente ao campo. 2.1 Quantização do campo escalar Em um espaço-tempo globalmente hiperbólico, estático e assintoticamente plano descrito pelo elemento de linha ds2 = f(x)dt2 − hij(x)dx idxj, (2.1) a equação de Klein-Gordon sem massa obtida através do procedimento de acopla- mento mı́nimo com o campo gravitacional é dada por ∇μ∇μφ = 0. (2.2) Essa equação pode ser derivada da densidade Lagrangeana L = √ fh ( 1 2 ∇μφ∇μφ ) , (2.3) onde h ≡ det(hij). Como observado anteriormente, nesta dissertação trataremos a radiação como um campo escalar real não massivo. Notamos que, no calibre de Lorenz (∇μA μ = 0), a equação dinâmica para o potencial Aμ se escreve como �Aμ = 0. A semelhança entre a Eq. (2.2) e a equação para o potencial eletromagnético sugere a interpretação do campo escalar como um “fóton sem spin”, ou seja, sugere que o campo escalar possa codificar muitas das caracteŕısticas básicas do caso eletromagnético (e gravi- tacional), sem as complicações técnicas advindas do spin e da liberdade de calibre. É com essa motivação em mente que prosseguimos o estudo desse campo. ‡Para que um campo vetorial ξ seja dito um campo de Killing, deve satisfazer a equação ∇αξβ+∇βξα = 0. As curvas integrais dos campos assim definidos são isometrias no espaço-tempo, ou seja, curvas em que a métrica se mantém contante. 6 A densidade de momento canonicamente conjugada ao campo φ é definida como π(x) ≡ ∂L/∂φ̇. Usando a Eq. (2.3), ela pode ser escrita como π(x) = √ hf−1φ̇(x). (2.4) Dadas duas soluções, ua e ub, da Eq. (2.2), pode-se definir a densidade de corrente de Klein-Gordon como Jμ[ua, ub](x) ≡ u∗a(x)∇μub(x)− ub(x)∇μu∗a(x). (2.5) Como essa quantidade é conservada, ou seja, ∇μJ μ[ua, ub](x) = 0, podemos associar a ela um produto interno que seja independente do tempo, o que pode ser verificado por meio do teorema de Gauss. Esse produto interno (de Klein-Gordon) é dado por (ua, ub)KG ≡ ı ∫ Σt dΣtnμJ μ[ua, ub], (2.6) onde Σt é a superf́ıcie tipo-espaço definida por t constante e nμ é um vetor unitário normal à hipersuperf́ıcie Σt e que aponta para o futuro. Em termos da métrica (2.1), nμ = √ f−1(∂t) μ e dΣt = √ hd3x. Em termos das densidades de momento πa e πb conjugadas às soluções ua e ub, o produto interno de Klein-Gordon assume a forma (ua, ub)KG = ı ∫ Σt d3x[u∗a(x)πb(x)− π∗ a(x)ub(x)]. (2.7) O produto interno (2.6) permite dividir o espaço de soluções da Eq. (2.2) em soluções de norma positiva e negativa§; em outras palavras, existe um conjunto completo {ui} de modos que satisfazem a Eq. (2.2) e são ortonormais pelo produto interno de Klein-Gordon, ou seja, satisfazem (ui, uj)KG = δij, (u∗i , u ∗ j)KG = −δij, (ui, u ∗ j)KG = 0. (2.8) O campo φ pode expandido, portanto, como φ(x) = ∑ i [aiui(x) + a†iu ∗ i (x)]. (2.9) O ı́ndice i representa, aqui, o conjunto de números quânticos necessários para se caracterizar completamente os modos. O procedimento de quantização canônica, §Ver [14] para uma discussão em um contexto mais geral. 7 adotado aqui, consiste em associar às quantidades φ e π, que caracterizam o espaço de fase clássico, operadores φ̂ e π̂ que satisfazem às seguintes relações de comutação a tempo constante: [φ̂(t,x), φ̂(t,x′)] = [π̂(t,x), π̂(t,x′)] = 0, (2.10) [φ̂(t,x), π̂(t,x′)] = ıδ3(x− x′). (2.11) Devido à ortonormalidade dos modos pelo produto interno de Klein-Gordon, obtêm-se as relações de comutação usuais para os operadores ai e a † i : [ai, a † j] = δij (2.12) e demais comutadores nulos. Há uma ambiguidade, contudo, na construção prece- dente [15], uma vez que existem outros conjuntos completos de modos ortonormais que também são bases posśıveis para a expansão do campo. Como discutido ante- riormente, existe, no espaço-tempo de Minkowski, um conjunto natural de modos normais, associados à simetria desse espaço-tempo por transformações de Poincaré. De fato, os modos normais naturais em Minkowski são autofunções do vetor de Killing ∂t com autovalores −iω e iω (ω > 0). Em um espaço-tempo arbitrário, porém, não há um conjunto natural de modos normais, e a quantização deve ser feita usando uma abordagem algébrica, que não dependa da introdução de uma base privilegiada de auto-funções. Nesta dissertação, porém, estamos interessados apenas em espaços tempos estáti- cos, com a métrica da forma (2.1). Nesse caso, assim como no caso plano, existe uma isometria global tipo tempo gerada pelo vetor de Killing ∂t. Isso nos permite expandir o campo φ̂ em termos de um conjunto completo natural de modos de norma positiva e negativa. Para isso, utilizamos como modos normais as auto-funções da derivada de Lie com relação a este campo de Killing, ou seja, uωsλ(x) e u ∗ ωsλ(x) tais que L∂tuωsλ = −iωuωsλ, L∂tu ∗ ωsλ = iωu∗ωsλ, (2.13) com ω > 0. Esses modos podem ser escritos como uωsλ(x μ) = √ ω π Uωsλ(x) exp(−ıωt) (ω > 0), (2.14) e analogamente para u∗ωsλ(x μ). Aqui, Uωsλ(x) representa a parte espacial dos modos e s = (s1, ..., sn) e λ = (λ1, ..., λn) representam conjuntos de números quânticos 8 cont́ınuos e discretos, respectivamente, necessários para sua caracterização completa. O fator √ ω/π é introduzido por conveniência de cálculo. Os modos são norma- lizados de acordo com o produto interno de Klein-Gordon, como na Eq. (2.8), ou, explicitamente, ı ∫ Σt d3x √ hnμ(u ∗ ωsλ∇μuω′s′λ′ −∇μu∗ωsλ · uω′s′λ′) = δλλ′δ(s− s′)δ(ω − ω′), (2.15) ı ∫ Σt d3x √ hnμ(uωsλ∇μuω′s′λ′ −∇μuωsλ · uω′s′λ′) = 0. (2.16) com nμ = √ f−1(∂t)μ. O campo φ̂ pode ser expandido, portanto, da seguinte forma: φ̂(xμ) = ∑ λ ∫ dωds[uωsλaωsλ + u∗ωsλa † ωsλ]. (2.17) A escolha da normalização dos modos através do produto interno de Klein-Gordon permite, como já foi dito, que os operadores aωsλ e a†ωsλ, interpretados, respectiva- mente, como operadores de aniquilação e criação de part́ıculas, satisfaçam relações de comutação da forma usual: [aωsλ, a † ω′s′λ′ ] = δλλ′δ(s− s′)δ(ω − ω′), (2.18) com demais comutadores nulos. Para construirmos o espaço de Fock, definimos o vácuo como o estado |0〉 aniqui- lado por todos os operadores aωsλ, ou seja, aωsλ |0〉 = 0 |0〉, e obtemos, a partir dele, estados de várias part́ıculas, através da aplicação sucessiva de operadores de criação sobre |0〉. Um fator de normalização apropriado é também introduzido, de forma que o estado assim definido se adeque à estat́ıstica de Bose-Einstein para part́ıculas idênticas. 2.2 Acoplamento com uma corrente clássica e emissão de radiação Em Teoria Quântica de Campos, a emissão de radiação escalar é descrita através do acoplamento do campo e da corrente que representa a fonte. Esta será representada 9 aqui por meio de uma corrente escalar clássica, dada por j(xμ) = q u0(τ) δ3(x− x(τ)), (2.19) onde xμ(τ) representa a linha de mundo associada à part́ıcula e parametrizada pelo tempo próprio τ , uμ(τ) ≡ dxμ/dτ representa sua quadrivelocidade e q determina a magnitude do acoplamento entre a fonte e o campo¶. A normalização da corrente é feita exigindo-se que ∫ dσj(xμ) = q, onde dσ é o elemento de 3-volume ortogonal à quadrivelocidade uμ. A corrente pode ser acoplada minimamente ao campo escalar, resultando na ação de interação Ŝint = ∫ d4x √−gj(xμ)φ̂(xν). (2.21) A amplitude de transição do estado de vácuo para o estado de uma part́ıcula, carac- terizado pelos números quânticos ω, s e λ, é dada, em primeira ordem na expansão em �, por Aωsλ = 〈ωsλ| ı ∫ d4x √−gj(xμ)φ̂(xν) |0〉 = ı ∫ d4x √−gj(xμ)u∗ωsλ(xν). (2.22) A taxa de emissão de part́ıculas com números quânticos s e λ, como medida por observadores seguindo a isometria temporal gerada por ∂t, é dada por Γsλ = ∫ ∞ 0 dω |Aωsλ|2 T , (2.23) onde T é o tempo total medido por observadores assintóticos [16, 17]: T = 2πδ(0) = ∫ ∞ −∞ eıt(w−w)dt = ∫ ∞ −∞ dt. (2.24) Neste trabalho, aplicaremos o formalismo desenvolvido aqui para analisar a emissão de radiação por um conjunto de fontes escalares em órbita circular ao re- dor de um corpo denso, em um espaço-tempo estático. Para isso, Γsλ e a potência emitida serão os observáveis de interesse. No que se segue, começaremos analisando a emissão de radiação no espaço-tempo de Minkowski, com gravitação Newtoniana, e, em seguida, no espaço-tempo de Schwarzschild. ¶Vale notar a semelhança entre a Eq. (2.19) e a expressão para a corrente eletromagnética que descreve uma part́ıcula localizada em x(τ), jμ(xν) = q u0 uμδ3(x− x(τ)). (2.20) 10 Caṕıtulo 3 Espaço-tempo de Minkowski O nosso primeiro pano de fundo para a investigação da radiação emitida por um con- junto de fontes é o espaço-tempo de Minkowski, onde incluiremos, posteriormente, a gravitação Newtoniana. Aqui, os modos normais na expansão do campo escalar, Eq. (2.9), têm uma expressão simples em termos de funções especiais conhecidas, o que nos permite um teste de consistência para casos mais complexos, além de comparações e análises interessantes. O espaço-tempo de Minkowski é descrito pelo elemento de linha ds2 = dt2 − dr2 − r2dθ2 − r2 sin2 θdφ2, (3.1) e, com essa métrica plana, a equação satisfeita pela parte espacial dos modos normais se reduz à equação de Laplace usual, cuja solução em termos de funções especiais - harmônicos esféricos e funções de Bessel - é bem conhecida. Isso nos permite escrever, para os modos de frequência positiva (Eq. (2.14)), uωlm(x μ) = √ ω π jl(ωr)Ylm(θ, φ)e −ıωt (ω > 0), (3.2) em que ω ≥ 0 está associado à frequência e l ≥ 0 (l ∈ N) e m ∈ [−l, l] são os números quânticos usuais associados ao momento angular. Os modos assim definidos são normalizados em relação ao produto interno de Klein-Gordon. A expansão do campo φ̂ em termos desse conjunto completo de soluções fornece, portanto, φ̂(xμ) = ∞∑ l=0 l∑ m=−l ∫ ∞ 0 dω[uωlm(x μ)aωlm + h.c.]. (3.3) 11 3.1 Radiação emitida por uma fonte escalar em movimento circular Primeiramente, vamos retomar alguns resultados sobre a radiação emitida por uma única fonte no espaço-tempo de Minkowski. Uma carga pontual em movimento circular no plano equatorial com velocidade Ω constante, como medida por obser- vadores estáticos, pode ser descrita pela densidade de carga (ver Eq. (2.19)) j(xμ) = q R2γ δ(r −R)δ(θ − π/2)δ(φ− Ωt), (3.4) onde γ = 1/ √ 1−R2Ω2 e a densidade de carga é normalizada de forma que∫ dσj(xμ) = q, (3.5) em que dσ = √−gελαβγuλdxα1dxβ2dxγ3 = √−gγεijkdxi1dxj2dxk3 é o elemento de volume ortogonal à quadrivelocidade uλ da fonte. Seguindo os passos descritos no caṕıtulo anterior, calculamos a amplitude de emissão a ńıvel de árvore. Partindo da Eq. (2.22), obtemos Aωlm = ıq R2γ √ ω π ∫ dtdrdθdφr2 sin2 θjl(ωr)Y ∗ lm(θ, φ)e ıωtδ(r −R)δ(θ − π/2)δ(φ− Ωt) = ıq γ √ ω π jl(ωR) ∫ dtY ∗ lm(π/2,Ωt)e ıωt = ıq γ √ ω π jl(ωR)Y ∗ lm(π/2, 0) ∫ dteı(ω−mΩ)t = 2ıqγ−1 √ πωjl(ωR)Y ∗ lm(π/2, 0)δ(ω −mΩ). (3.6) A delta de Dirac que aparece no cálculo acima restringe a frequência emitida a ω = mΩ. Uma vez que Ω > 0 e ω > 0, ondas com m ≤ 0 não são emitidas. Com isso, o número quântico magnético m, que assume em geral valores inteiros de −l a l, fica restrito ao intervalo [1, l], o que será levado em conta nas somas em m à frente. Um cálculo direto fornece, para a taxa de emissão e para a potência irradiada, Γlm = 2q2mΩγ−2[jl(mΩR)]2|Ylm(π/2, 0)|2, (3.7) Wlm = 2q2m2Ω2γ−2[jl(mΩR)]2|Ylm(π/2, 0)|2, (3.8) 12 onde usamos a Eq. (2.23) e definimos a potência irradiada com números quânticos l e m como Wlm = ∫ ∞ 0 dωω |Aωlm|2 T , (3.9) com T dado na Eq. (2.24). A taxa de emissão e a potência totais são dadas pela soma em todos os números quânticos: Γ = ∞∑ l=1 l∑ m=1 Γlm, (3.10) W = ∞∑ l=1 l∑ m=1 Wlm. (3.11) Notamos, aqui, que |Ylm(π/2, φ)|2 = 0 se l +m é ı́mpar e |Ylm(π/2, φ)|2 = 2l + 1 4π (l +m− 1)!!(l −m− 1)!! (l +m)!!(l −m)!! (3.12) se l + m é par [19]. Notamos também que n!! ≡ n(n − 2)...1 se n é ı́mpar, n!! ≡ n(n − 2)...2 se n é par e que (−1)!! ≡ 1. A maior contribuição para |Ylm(π/2, φ)|2 vem de valores de m próximos ao de l, o que pode ser visto na Figura 3.1. 0 20 40 60 80 100 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 |Y 10 0 m (π /2 ,φ )|2 m Figura 3.1: Valor de |Ylm(π/2, φ)|2 em função de m para l fixo, l = 100. A maior contribuição acontece para m = l. Observa-se um comportamento semelhante para todo l. 13 Notamos também que o uso da fórmula ∞∑ l=1 l∑ m=1 m2[jl(mz)] 2|Ylm(π/2, φ)|2 = 1 24π z2 (1− z2)3 , (3.13) válida para |z| < 1, e demonstrada em [4], permite verificar de forma imediata a igualdade da Eq. (3.8) e do resultado de Teoria Clássica de Campos para a potência, W class M = q2a2/12π, com a = γ2Ω2R (ver Apêndice A). Até aqui, nenhuma suposição foi feita sobre a força que mantém a part́ıcula em órbita circular. Contudo, se desejamos uma relação entre R e Ω, somos levados a supor uma forma espećıfica para essa força. Aqui, suporemos que a part́ıcula se mantém em órbita circular devido à atração gravitacional de um corpo central de massa M e assumiremos a gravitação Newtoniana, utilizando a terceira lei de Kepler, R(Ω) = (MΩ−2)1/3, para escrever R em função de Ω. Nas análises gráficas, essa relação estará impĺıcita. 0 1 2 3 4 5 6 -16 -14 -12 -10 -8 -6 -4 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 -30 -25 -20 -15 -10 -5 0 l=m=1 l=m=3 l=m=5 102× MΩ Lo g 1 0( M q-2 Γ l m ) l=m=1 l=m=10 l=m=100 MΩ Figura 3.2: Taxa de produção de part́ıculas em função da velocidade angular orbital para l = m = 1, 3, 5, no limite de baixas velocidades, e l = m = 1, 10, 100 para velocidades altas. No primeiro caso, l = m = 1 domina sobre os demais números quânticos. Porém, à medida que a velocidade angular aumenta, modos de momento angular maior são excitados. Pode-se observar o comportamento da taxa de emissão em função da velocidade 14 angular da fonte na Figura 3.2. Para velocidades angulares pequenas (radiação ćıclotron), apenas os primeiros números quânticos são relevantes, em particular l = 1. Contudo, na medida em que a velocidade angular aumenta, cada vez mais ordens superiores de l são excitadas (radiação śıncrotron). Na Figura 3.3, a mesma análise é feita para a potência e um comportamento semelhante é observado. 0 1 2 3 4 5 6 -18 -16 -14 -12 -10 -8 -6 -4 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 -14 -12 -10 -8 -6 -4 -2 0 l=m=1 l=m=3 l=m=5 Lo g 1 0( M 2 q-2 W lm ) 102×MΩ l=m=1 l=m=10 l=m=100 MΩ Figura 3.3: Potência irradiada função da velocidade angular orbital para l = m = 1, 3, 5, no limite de baixas velocidades, e l = m = 1, 10, 100 para velocidades altas. Um argumento f́ısico pode fornecer uma estimativa do número quântico m do- minante que é emitido quando a fonte gira com velocidade angular Ω (como medida por observadores estáticos). De fato, as Figs. 3.2 e 3.3 mostram que, quanto maior a velocidade angular da fonte e quanto mais seu movimento aproxima-se do li- mite relativ́ıstico (MΩ → 1), ordens cada vez maiores dos números quânticos l e m ganham importância. Gostaŕıamos, assim, de obter uma estimativa para o valor dominante dessas quantidades em função de Ω. Isso também nos permitiria justificar, nas análises gráficas, o corte das somas em (3.10) e (3.11), por exemplo, em um certo valor máximo de l, para uma órbita fixa. Vimos que a restrição do movimento das fontes a órbitas circulares implica no v́ınculo ω = mΩ, com Ω medido por observadores estáticos. Observadores comóveis com a fonte, por sua vez, associam um valor ω0 = ω/γ à frequência da radiação emitida. (Do ponto de vista de observadores inerciais parados no laboratório, esse 15 resultado pode ser interpretado da seguinte forma: os relógios que eles utilizam para medir T como o peŕıodo da órbita atrasam por um fator γ quando passados para os observadores comóveis, que medem um peŕıodo T0 = γT . Uma vez que a frequência angular é inversamente proporcional ao peŕıodo, ω0 = ω/γ.) Por outro lado, sabemos que um observador sobre a part́ıcula carregada com aceleração própria a se vê imerso em um banho térmico com temperatura T = a/2π, o que pode ser interpretado em termos do efeito Unruh [21]∗. Consequentemente, devido ao processo de emissão estimulada, a part́ıcula emite radiação com energia t́ıpica da ordem de E = ω0 ≈ a. Usando que a = γ2M/R2, obtemos que o valor t́ıpico de m (que chamaremos de mM) emitido por uma fonte com velocidade angular Ω é dado por mM ≈ (MΩ)1/3 (1− (MΩ)2/3)3/2 . (3.14) A Figura 3.4 mostra o comportamento da potência emitida com números quânti- cos l e m, Eq. (3.8), em função de m = l†. Fica claro que, para uma velocidade angular Ω fixa, exite um valor de m que maximiza a potência. Na medida em que Ω aumenta, o valor dominante de m também cresce e uma faixa maior de números quânticos é excitada. Observa-se uma boa concordância entre o valor de m que maximiza a potência e o valor t́ıpico de m previsto pela fórmula (3.14), em destaque no gráfico. A Tabela 3.1 corrobora essa concordância para mais valores da velocidade angular. MΩ 0.1 0.5 0.9 0.99 m 1 4 56 1796 mM 0.67 3.53 54.7 1826 Tabela 3.1: Comparação entre o valor t́ıpico mM previsto pela Eq. (3.14) e o valor dem que maximiza a expressão (3.8), com l = m. Observa-se uma boa concordância entre os dois valores. ∗Este resultado é rigorosamente válido para observadores uniformemente acelerados, seguindo as isometrias geradas pelos vetores de boost de Lorentz. No caso circular, o cálculo do efeito Unruh não é direto, pois não existe um vetor de Killing tipo tempo global que parametrize as órbitas de observadores em movimento circular. Contudo, a expressão usual para o efeito Unruh pode ser utilizada no caso circular para efeito de estimativa [18]. †Aqui, está sendo levado em conta que os harmônicos esféricos que aparecem na expressão da potência emitida selecionam os maiores valores de m para um dado l (ver Figura 3.1). 16 0 5 10 15 20 25 30 35 40 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 0 100 200 300 400 500 600 700 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 MΩ = 0,9 10 3 × M 2 q-2 W m m m MΩ = 0,5 10 2 × M 2 q-2 W m m m Figura 3.4: Potência irradiada nos números quânticos l = m em função de m, para mΩ = 0.5 e mΩ = 0.9. Em destaque, o valor mM previsto pela fórmula (3.14). Observa-se uma boa concordância desse valor com o valor de m que maximiza a potência. Uma vez discutidos esses resultados sobre a radiação emitida por uma fonte em movimento circular em volta de um corpo central denso, vamos, a partir de agora, generalizá-los pouco a pouco, considerando, primeiramente, o caso de duas part́ıculas separadas por uma distância arbitrária, e, posteriormente, uma configuração de N fontes escalares. 3.2 Radiação emitida por duas fontes escalares em movimento circular Consideramos, como uma primeira generalização, o caso de de duas part́ıculas es- calares puntiformes em movimento circular no plano equatorial. As órbitas são caracterizadas pelos raios R1 e R2 e pelas velocidades angulares Ω1 e Ω2. A corrente 17 que descreve o sistema é dada por j(xμ) = q R2 1γ1 δ(r −R1)δ(θ − π/2)δ(φ− Ω1t) ∓ q R2 2γ2 δ(r −R2)δ(θ − π/2)δ(φ− Ω2t− λ), (3.15) com γi = 1/ √ 1−R2 iΩ 2 i , i = 1, 2, e λ representando a distância angular entre as part́ıculas em t = 0. A expressão com sinal negativo descreve o caso de part́ıculas com cargas opostas, ao passo que aquela com sinal positivo descreve o caso de part́ıculas com mesma carga. A amplitude de emissão é, nesse caso, Aωlm = A1 ωlm + A2 ωlm = 2ıqγ−1 1 √ ωπjl(ωR1)Y ∗ lm(π/2, 0)δ(ω −mΩ1) ∓ 2ıqγ−1 2 √ ωπjl(ωR2)Y ∗ lm(π/2, λ)δ(ω −mΩ2). (3.16) A taxa de emissão dessa configuração (ver Eq. (2.23)) é a soma das taxas indi- viduais e de um termo de interferência: Γlm = Γ1 lm + Γ2 lm + Γ12 lm, (3.17) com (ver Eq. (3.7)) Γi lm = 2q2mΩiγ −2 i [jl(mΩiRi)] 2|Ylm(π/2, 0)|2, i = 1, 2 (3.18) e Γ12 lm = ∫ ∞ 0 dω 1 T (A1 ωlmA 2∗ ωlm + A2 ωlmA 1∗ ωlm) = ∓4πq2 γ1γ2 ∫ ∞ 0 dω ω T jl(ωR1)jl(ωR2)δ(ω −mΩ1)δ(ω −mΩ2) × (Y ∗ lm(π/2, 0)Ylm(π/2, λ) + Ylm(π/2, 0)Y ∗ lm(π/2, λ)) = ∓4πq2 γ1γ2 mΩ2jl(mΩ2R1)jl(mΩ2R2)|Ylm(π/2, 0)|2(eımλ + e−ımλ) δ(mΩ2 −mΩ1) T = ∓8πq2 γ1γ2 mΩ2jl(mΩ2R1)jl(mΩ2R2)|Ylm(π/2, 0)|2 cos(mλ) δ(mΩ2 −mΩ1) T A função δ(mΩ2 − mΩ1), que aparece no cálculo acima, implica que, para um disco fino, em que as cargas estão distribúıdas apenas no plano equatorial, só ocorre 18 interferência entre a radiação emitida por fontes numa mesma órbita, uma vez que assumimos que Ω1 = Ω2 para R1 = R2. Nesse caso, Γ12 lm = ∓4q2 γ2 mΩ[jl(mΩR)]2|Ylm(π/2, 0)|2 cos(mλ), (3.19) onde usou-se que lim Ω2→Ω1 δ(mΩ2 −mΩ1) T = 1 2π . (3.20) Intuitivamente, podemos pensar que, para fontes em órbitas distintas, não existe uma relação de fase bem definida entre elas, uma vez que a distância angular varia com o tempo. Dessa forma, é natural que não haja emissão coerente e que elas emitam de forma independente quando uma média temporal em um peŕıodo longo é feita. Sendo assim, na modelagem de um disco, podemos analisar cada órbita individualmente e somar a contribuição de todas elas de forma incoerente. No que segue, nos limitaremos, portanto, ao caso de part́ıculas em uma mesma órbita circular. A taxa de emissão total é obtida pela soma de Γlm em todos os números quânticos, Γ = ∞∑ l=1 l∑ m=1 4q2 γ2 mΩ|jl(mΩR)|2|Ylm(π/2, 0)|2(1∓ cos(mλ)). (3.21) Um cálculo inteiramente análogo leva à expressão seguinte para a potência total emitida: W = ∞∑ l=1 l∑ m=1 4q2 γ2 m2Ω2|jl(mΩR)|2|Ylm(π/2, 0)|2(1∓ cos(mλ)). (3.22) Para analisarmos graficamente o comportamento da potência‡, consideramos a gravidade Newtoniana e usamos a terceira lei de Kepler para expressar R em função de Ω. O caso de duas fontes em uma mesma órbita circular e separadas por um ângulo λ está representado na Figura 3.5 no limite de baixas frequências. Para part́ıculas com cargas opostas, a potência emitida é máxima para λ = π e vai a zero na medida em que a separação das cargas diminui. O limite λ = 0 corresponde às duas cargas sobrepostas e é natural que nada seja irradiado nessa condição. De fato, para ‡A taxa de emissão tem um comportamento qualitativamente semelhante ao da potência. 19 0 1 2 3 4 5 6 0 2 4 6 8 10 12 0 1 2 3 4 5 6 0 1 2 3 4 5 6 7 8 �������� �� ���� � λ=π λ=π/2 λ=π/4 λ=π/8 λ=0 ���×�Ω 10 5 ×M 2 q-2 W �������� �� ����� λ=π λ=π/2 λ=π/4 λ=π/8 ���×�Ω Figura 3.5: Dependência da potência irradiada com relação à velocidade angular de rotação, para configurações neutras (ângulos de separação de π, π/2,π/4 e π/8) e carregadas (ângulos de separação de π, π/2,π/4, π/8 e 0), no regime de baixas frequências. velocidades baixas, a maior contribuição para a radiação vem da ordem dipolar (l = m = 1) e a potência irradiada nesse limite em geral depende da magnitude do momento de dipolo [26], que é máxima para fontes diametralmente opostas e nula para fontes sobrepostas. Já para o caso de duas part́ıculas de mesma carga, o inverso acontece: a potência é máxima no caso em que elas estão sobrepostas e chega a um mı́nimo quando a separação entre as fontes é máxima (λ = π). Nesse caso, não há uma interpretação tão direta em termos da expansão multipolar uma vez que o momento de dipolo depende da origem. Porém, considerando o centro como a origem, o momento de dipolo é máximo para as cargas sobrepostas (interferência totalmente construtiva) e diminui na medida em que as fontes são separadas. Para λ = π, a contribuição de dipolo é nula e domina a ordem quadrupolar. A Figura 3.6 também ilustra um pouco do limite de radiação ćıclotron (MΩ = 0.01), que é um pouco mais explorado no Apêndice B, onde usamos conceitos e resultados conhecidos do Eletromagnetismo clássico. Na medida em que a velocidade angular aumenta, modos de momento angular 20 0,0 1,0x10-7 2,0x10-7 3,0x10-7 4,0x10-7 5,0x10-2 0,0 2,0x10-7 4,0x10-7 5,0x10-2 1,0x10-1 �������� �� � ��� M 2 q-2 W �Ω � ���� �Ω � ��� λ �Ω � ���� �Ω � ��� �������� �� � �� � � λ � π�� π�� 3π�� π π3π��π��π��� Figura 3.6: Potência irradiada em função da separação angular λ entre as cargas, para configurações neutras e carregadas com MΩ = 0.01 e 0.5. maior são excitados, influenciando a emissão de radiação por cada configuração. O regime de velocidades angulares maiores é também ilustrado na Figura 3.6 (MΩ = 0.5). Nela, nota-se o comportamento não-trivial (não-monotônico) da potência em função da separação angular na medida em que Ω aumenta, o que decorre da soma de muitas ordens multipolares em (3.22). A Figura 3.7 mostra a razão W2/(2W1) entre a potência emitida por duas part́ıculas (com separações angulares variadas) e o dobro da potência emitida por uma part́ıcula individualmente. Para a configuração neutra, no limite de baixas frequências, essa razão varia de 0 a aproximadamente 2, sendo que a interferência é maximamente construtiva para um ângulo λ = π e totalmente destrutiva para λ = 0. Para a configuração carregada, o oposto ocorre: no regime de baixas frequências, essa razão varia de 2§, para cargas sobrepostas (qtotal = 2q) a um mı́nimo para cargas com separação máxima (λ = π). Fazendo uma extrapolação para velocidades an- gulares mais altas, vemos que, no limite de velocidades ultrarrelativ́ısticas, a razão §O valor 2 para essa razão surge uma vez que a potência é proporcional a |q|2: WN=2 2WN=1 ∼ (|q|+ |q|)2 2|q|2 . 21 0,0 0,2 0,4 0,6 0,5 1,0 1,5 2,0 0,0 5,0x10-3 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 �Ω W N =2 /(2 W N =1 ) ������� ��� ���� λ=π/6 λ=π/3 λ=π/2 λ=2π/3 λ=π (a) 0,0 0,2 0,4 0,6 0,5 1,0 1,5 2,0 0,0 5,0x10-3 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 �Ω W N =2 /(2 W N =1 ) λ=π/6 λ=π/3 λ=π/2 λ=2π/3 λ=π ������ �� � �� ����� (b) Figura 3.7: Razão entre a potência emitida por duas part́ıculas e o dobro da potência emitida por uma única fonte em função da velocidade angular. Para “velocidades suficientemente altas”, as part́ıculas emitem independentemente (ver discussão a seguir). 22 entre a potência emitida e o dobro da potência irradiada por uma única carga se aproxima de 1. Assim, nesse limite, as part́ıculas emitem independentemente. Um argumento de ordem f́ısica pode nos dar uma estimativa da velocidade angu- lar a partir da qual as part́ıculas começam a emitir independentemente, ou, equiva- lentemente, a velocidade angular abaixo da qual ocorre interferência. Fixado o raio da órbita (e, consequentemente, sua velocidade angular), as part́ıculas começarão a se “ver”, ou seja, começará a haver interferência na radiação por elas emitida, quando o comprimento de onda emitido for da ordem da separação angular λ entre elas: ω−1 0 ≈ Lλ/2π, (3.23) onde ω−1 0 é o comprimento de onda da radiação e L é o peŕımetro da órbita, como medidos por observadores inerciais instantaneamente em repouso com a fonte. Em função do raio R da órbita medido por observadores inerciais, escrevemos L = 2πRγ, onde γ = 1/ √ 1−R2Ω2. (Do ponto de vista dos observadores inerciais parados no laboratório, esse resultado pode ser interpretado da seguinte forma: as mesmas réguas que eles usam para medir L = 2πR como o peŕımetro da órbita, quando passadas para observadores em movimento circular, encolhem por um fator γ, e, consequentemente, os observadores em rotação medem um tamanho γ vezes maior.) Pensando em termos do efeito Unruh (ver discussão anterior), pode-se estimar a energia t́ıpica emitida, no referencial da fonte, como E = ω0 ≈ a. O comprimento de onda da radiação, no referencial da part́ıcula, é, portanto, ω−1 0 = 1/a, com a = γ2M/R2. Inserindo essas relações na Eq. (3.23), e utilizando a terceira lei de Kepler para escrever o raio em função da velocidade angular Ω, obtemos λ ≈ R γ3M = (1−M/R) 2 3 M/R = (1− (MΩ) 2 3 ) 3 2 (MΩ) 2 3 . (3.24) A Tabela 3.2 mostra o valor de MΩ a partir do qual part́ıculas separadas por um ângulo λ emitem de forma aproximadamente independente. λ π/6 π/3 π/2 2π/3 5π/6 π MΩ 0.42 0.27 0.20 0.15 0.12 0.10 Tabela 3.2: Valor de MΩ a partir do qual as part́ıculas passam a emitir indepen- dentemente, para alguns valores da separação angular λ. 23 A análise da Figura 3.7 mostra que esses valores são compat́ıveis com os obtidos com o cálculo completo. 3.3 Radiação emitida por N fontes escalares em movimento circular Para nos aproximarmos mais da situação f́ısica de interesse, de um disco ionizado girando ao redor de um corpo central denso, vamos considerar a órbita¶ populada por N part́ıculas igualmente espaçadas. Consideraremos as configurações neutra e carregada ilustradas na Figura 3.8. (a) (b) Figura 3.8: Configuração (a) neutra e (b) carregada para N = 8. 3.3.1 Configuração neutra Seja, portanto, um anel com N fontes igualmente espaçadas por um ângulo λ (Nλ = 2π, N par) e cujas cargas têm sinais trocados de forma alternada, de modo que o sistema como um todo seja neutro. As fontes estão em movimento circular, com velocidade Ω constante, como medida por observadores estáticos. A densidade volumétrica de carga que descreve o sistema é (ver Eq. (2.19)) j(xμ) = N−1∑ n=0 (−1)n q R2γ δ(r −R)δ(θ − π/2)δ(φ− Ωt− nλ), (3.25) ¶A generalização para um disco, como discutido na seção anterior, é direta. 24 e a amplitude de radiação emitida por essa configuração é dada por (ver Eq. (2.22)) Aωlm = ı N−1∑ n=0 ∫ d4x √−gjn(xμ)u∗ωlm = 2ıqγ−1 √ ωπδ(ω −mΩ)jl(ωR)Y ∗ lm(π/2, 0) N−1∑ n=0 (−1)neımnλ. (3.26) Para N = 2, λ = π e ∑1 n=0 (−1)neımnλ = 1 − eımπ. Levando em conta que Ylm(θ, φ) = Ylm(θ, 0)e −ımφ, vemos que a expressão (3.26) se reduz à Eq. (3.16) para N = 2 e λ = π. Para N arbitrário, temos, da teoria das progressões geométricas, que N∑ n=0 rn = 1− rN+1 1− r , (3.27) o que nos permite calcular a soma em n: N−1∑ n=0 (−1)neımnλ = 1− (−eımλ)N 1− (−eımλ) = 1− e2πım 1 + eımλ , (3.28) onde usamos λ = 2π/N . Para computarmos os observáveis de interesse f́ısico, precisamos do módulo da amplitude ao quadrado. Como∣∣∣∣1− e2πım 1 + eımλ ∣∣∣∣ 2 = 1− cos(2πm) 1 + cos(mλ) , (3.29) obtemos, para a taxa de emissão e a potência irradiada, Γlm = 2q2γ−2mΩ|jl(mΩR)|2|Ylm(π/2, 0)|2 1− cos(2πm) 1 + cos(2πm/N) , (3.30) Wlm = 2q2γ−2m2Ω2|jl(mΩR)|2|Ylm(π/2, 0)|2 1− cos(2πm) 1 + cos(2πm/N) . (3.31) De forma geral, podemos escrever Γlm = f (Γ) lm (Ω)gm(N), e, analogamente, Wlm = f (W ) lm (Ω)gm(N), com f (Γ) lm (Ω) = 2q2γ−2mΩ|jl(mΩR)|2|Ylm(π/2, 0)|2, (3.32) f (W ) lm (Ω) = 2q2γ−2m2Ω2|jl(mΩR)|2|Ylm(π/2, 0)|2, (3.33) 25 gm(N) = 1− cos(2πm) 1 + cos(2πm/N) . (3.34) Nessa decomposição, os termos f (Γ) lm (Ω) e f (W ) lm (Ω) correspondem às expressões para a taxa de emissão e a potência emitida por uma única part́ıcula (ver Eqs. (3.7) e (3.8)), ao passo que a função gm(N) codifica a informação sobre a interferência. O comportamento da função f (W ) lm (Ω) pode ser observado na Figura 3.4. Como observado na Seção 3.1, f (W ) mm (Ω) possui um máximo para m dado aproximadamente pela Eq. (3.14). A função f (Γ) lm (Ω) está ilustrada na Figura 3.9 como função de l = m, para alguns valores de Ω. Observa-se que a taxa de emissão cai a zero mais rapidamente que a potência emitida, mas que ambas possuem um comportamento qualitativamente semelhante. 0 5 10 15 20 25 30 35 40 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 0 50 100 150 200 250 0,0 0,3 0,6 0,9 1,2 10 3 × M q-2 f (Γ ) m m MΩ = 0,5 m MΩ = 0,9 m Figura 3.9: Dependência de f (Γ) mm(Ω) com relação a m para MΩ = 0.5 e MΩ = 0.9. Comparar com a Figura 3.4 para a potência. Como já observado, as funções f (Γ) lm (Ω) e f (W ) lm (Ω) são essencialmente a taxa de emissão e a potência emitida por uma única part́ıcula e não dependem do número N de fontes no anel. A função gm(N), por sua vez, condensa toda a informação sobre a interferência. Como m é um número inteiro, o numerador de gm(N) é sempre nulo. Contudo, a expressão como um todo pode diferir de zero quando o denominador 26 também se anula, ou seja, quando cos(2πm/N) = −1, ou m = 2k − 1 2 N, k ∈ N. (3.35) Assim, para um certo valor de N , uma regra de seleção estabelece que apenas alguns valores espećıficos de m contribuirão para a potência emitida. Para tais valores de m, gm(N) fica indeterminado. Aplicando a regra de L’Hôpital, temos que lim m→ 2k−1 2 N 1− cos(2πm) 1 + cos(2πm N ) = N2. (3.36) Assim, gm(N) = N2, para m = N/2, 3N/2, 5N/2... e é nulo caso contrário. Levando em consideração que somente os números quânticos magnéticos dados por (3.35) contribuem para a radiação emitida e utilizando a Lei de Kepler, R3Ω2 = M , de forma que as expressões sejam funções apenas de M e Ω, podemos escrever (ver Eqs. (2.23) e (3.9)) Γ M q2 = ∞∑ l=N/2 � l N + 1 2 �∑ k=1 2MΩ(1− (MΩ)2/3)(2k − 1)N/2 (3.37) × |jl((2k − 1)N(MΩ)1/3/2)|2|Yl(2k−1)N/2(π/2, 0)|2N2, e W M2 q2 = ∞∑ l=N/2 � l N + 1 2 �∑ k=1 2(MΩ)2(1− (MΩ)2/3)((2k − 1)N/2)2 (3.38) × |jl((2k − 1)N(MΩ)1/3/2)|2|Yl(2k−1)N/2(π/2, 0)|2N2, em que �x� representa o maior inteiro menor ou igual a x. Nas expressões anteriores, uma vez que, dado N , o primeiro m a contribuir é N/2, tomamos esse valor como o ińıcio da soma em l. A soma em k = m/N + 1/2 começa com k = 1 (m = N/2) e termina com o maior inteiro menor ou igual a l/N + 1/2 (m = l). A Figura 3.10 mostra o comportamento da potência irradiada em função do número de cargas N no regime de baixas e altas frequências. Mostra também, nesses dois regimes, a razão WN/(NW1) entre a potência emitida por N fontes e N vezes a potência emitida individualmente. Para baixas velocidades angulares, vê- se que a interferência rapidamente suprime a potência emitida por número grande de cargas. Por outro lado, é posśıvel que configurações com muitas cargas emitam significativamente para uma velocidade angular suficientemente alta (ver discussão na subseção 3.3.3). 27 0 4 8 12 16 20 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 0 8 16 24 32 40 0,0 0,5 1,0 1,5 MΩ = 0,01 WN/(NW1) 4 ⋅106× M2q-2WN N MΩ = 0,068 WN/(NW1) 104× M2q-2WN N (a) 0 40 80 120 160 200 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 0 200 400 600 800 1000 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2MΩ = 0,68 WN/(NW1) 10 -1× M2q-2 WN N MΩ = 0,9 WN/(NW1) 1/1500 × M2q-2WN N (b) Figura 3.10: Gráficos da potência total WN emitida por uma configuração de N cargas e da razão WN/(NW1) (potência total por N vezes a potência emitida por uma única carga), para uma configuração neutra no limite de (a) baixas (MΩ = 0.01 e 0.068) e (b) altas (MΩ = 0.68 e 0.9) frequências. 28 3.3.2 Configuração carregada Para um anel constitúıdo de cargas de mesmo sinal, o cálculo é essencialmente o mesmo. Nesse caso, a corrente é dada por j(xμ) = N−1∑ n=0 q R2γ δ(r −R)δ(θ − π/2)δ(φ− Ωt− nλ), (3.39) e a somatória que aparece na equação (3.26) envolve apenas termos positivos: Aωlm = 2ıqγ−1 √ ωπδ(ω −mΩ)jl(ωR)Y ∗ lm(π/2, 0) N−1∑ n=0 eımnλ. (3.40) Usando a expressão (3.27), calculamos N−1∑ n=0 eımnλ = 1− e2πım 1− eımλ . (3.41) Nesse caso, portanto, podemos escrever para a taxa de emissão e a potência irradiada Γ+ lm = f (Γ) lm (Ω)g+m(N) e W+ lm = f (W ) lm (Ω)g+m(N), respectivamente, com g+m(N) = 1− cos(2πm) 1− cos(2πm/N) (3.42) e f (Γ) lm (Ω) e f (W ) lm (Ω) definidos nas Eqs. (3.32) e (3.33). Da mesma forma que no caso neutro, o numerador de g+m(N) é sempre nulo e a expressão como um todo pode assumir valores diferentes de zero apenas quando o denominador também se anula. Isso acontece quando cos(2πm/N) = 1, ou seja, m = Nk, k ∈ N. (3.43) Nesses casos, a expressão também tende ao limite lim m→kN 1− cos(2πm) 1− cos(2πm N ) = N2. (3.44) A taxa de emissão e a potência total irradiada podem ser escritas como Γ M q2 = ∞∑ l=N � l N �∑ k=1 2MΩ(1− (MΩ) 2 3 )N3k|jl(Nk(MΩ) 1 3 )|2|YlNk(π/2, 0)|2, (3.45) 29 W M2 q2 = ∞∑ l=N � l N �∑ k=1 2(MΩ)2(1− (MΩ) 2 3 )(N2k)2|jl(Nk(MΩ) 1 3 )|2|YlNk(π/2, 0)|2. (3.46) A Figura 3.11 mostra o comportamento da potência irradiada e da razão WN NW1 em função do número de cargas no regime de baixas e altas frequências. Observa-se que a potência emitida por uma configuração de N fontes de mesma carga é inferior àquela emitida pela configuração neutra analisada na subseção 3.3.1 (ver discussão a seguir). 3.3.3 Análise gráfica Uma interpretação f́ısica das Figuras 3.10 e 3.11 pode ser feita como se segue. Quando a velocidade angular das part́ıculas é pequena, a radiação emitida tem frequência baixa (uma vez que ω = mΩ) e, por conseguinte, grande comprimento de onda. Com isso, à medida que povoamos a órbita, rapidamente as cargas começam a se “enxergar”, ou seja, começa a haver sobreposição dos pacotes de onda, e a in- terferência suprime a potência irradiada por muitas cargas. No caso de velocidades angulares maiores, a frequência da radiação emitida é mais alta, seu comprimento de onda é menor e, se a órbita é povoada com um número de cargas suficientemente pequeno, elas emitem independentemente (WN/(NW1) ≈ 1). Contudo, à medida que o número de part́ıculas na órbita aumenta, ocorre interferência, primeiramente de forma construtiva (WN/(NW1) > 1) - no caso da configuração neutra - e então de forma destrutiva (WN/(NW1) < 1), de forma que, para um número suficien- temente grande de part́ıculas, a energia liberada para o infinito é arbitrariamente pequena. As Figuras 3.10 e 3.11 também mostram que, fixado o número de cargas N na órbita, a configuração neutra irradia em geral uma potência superior à emitida por uma configuração carregada. Esse comportamento pode ser entendido com base nas fórmulas (3.35) e (3.43). Fixado N , a configuração neutra admite os números quânticos m = N/2, 3N/2, ..., ao passo que a carregada admite m = N, 2N, .... As- sim, como as ordens multipolares mais baixas em geral contribuem mais, a emissão da configuração neutra é em geral maior do que a da carregada. Quando analisamos a potência emitida por um anel de cargas em função do número de part́ıculas, vemos que, fixada a velocidade angular, existe um valor de N que maximiza a potência. Um racioćınio de base f́ısica semelhante ao exposto na 30 0 4 8 12 0,0 0,5 1,0 0 5 10 15 20 25 30 0,0 0,5 1,0 MΩ = 0,068MΩ = 0,01 WN/(NW1) 4 ⋅106× M2q-2WN N WN/(NW1) 104× M2q-2WN N (a) 0 30 60 90 120 150 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 0 100 200 300 400 500 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 1,2 MΩ = 0,68 WN/(NW1) 1/3 × M2q-2 WN N MΩ = 0,9 WN/(NW1) 1/400 M2q-2 WN N (b) Figura 3.11: Gráficos da potência total WN emitida por uma configuração de N cargas e da razão WN/(NW1), para uma configuração carregada no limite de (a) baixas (MΩ = 0.01 e 0.068) e (b) altas (MΩ = 0.68 e 0.9) 31 seção 3.2 pode nos dar uma estimativa desse N . Fixado o raio da órbita (e, conse- quentemente, sua velocidade angular), a interferência começa a acontecer quando ω−1 0 N ≈ L, (3.47) onde ω−1 0 é o comprimento de onda da radiação emitida e L é o peŕımetro da órbita, como medidos no referencial da part́ıcula. Como visto na seção 3.2, podemos escrever L = 2πRγ, (3.48) com γ = 1/ √ 1−R2Ω2. Além disso, vimos que observadores comóveis com uma part́ıcula carregada com aceleração própria a observam emissão de radiação prefe- rencialmente com frequência ω0 = a, o que pode ser interpretado em termos do efeito Unruh. Inserindo (3.48) e ω0 ≈ a = γ2M/R2 (3.49) na Eq. (3.47) e utilizando a terceira lei de Kepler para escrever R em termos de MΩ, obtemos Napr = 2π(MΩ)2/3 (1− (MΩ)2/3)3/2 . (3.50) MΩ 0.5 0.55 0.6 0.65 0.7 0.75 0.8 0.85 0.9 0.95 N0 26 34 42 54 70 96 140 222 428 1232 N+ 11 14 18 23 30 41 59 95 188 625 Nmedio 18.5 24 30 36.5 50 68.5 99.5 159 308 929 Napr 17.6 22.4 28.8 37.8 50.9 71.1 105 171 332 985 erro 5% 7% 4% 4% 2% 4% 6% 8% 8% 6% Tabela 3.3: Valor de N que maximiza a potência emitida em função da velocidade angular. Aqui, N0 corresponde à configuração neutra, N+ à carregada, Nmedio = (N0 +N+)/2, Napr é dado pela Eq. (3.50) e erro= |Napr −Nmedio|/Nmedio. A Tabela 3.3 compara o valor de N que maximiza a potência emitida como obtido através dos cálculos e aquele advindo da Eq. (3.50), e mostra a consistência do argumento acima. 32 Caṕıtulo 4 Espaço-tempo de Schwarzschild A solução das equações de Einstein descoberta por Schwarzschild em 1916 descreve o campo gravitacional exterior a um corpo estático e esfericamente simétrico. Descreve também, como será de interesse aqui, a geometria espaço-temporal após o colapso de um corpo sem carga ou momento angular em um buraco negro. O elemento de linha de Schwarzschild é dado por ds2 = f(r)dt2 − f(r)−1dr2 − r2dθ2 − r2 sin2 θdφ2, (4.1) com f(r) = 1− 2M r (4.2) e M sendo a massa do buraco negro∗. Na região exterior ao buraco negro, r > 2M , o espaço-tempo definido pela métrica (4.1) é globalmente hiperbólico e admite um vetor de Killing tipo-tempo global. Essa propriedade, associada à estaticidade dessa geometria, permite que a quantização de um campo escalar, real e não massivo no espaço-tempo de Schwarzschild seja uma aplicação direta do formalismo desen- volvido no Caṕıtulo 2. 4.1 Modos normais Tomamos, assim, um campo escalar real e não massivo φ̂ em um background descrito pela métrica (4.1). O campo pode ser decomposto, como na Eq. (2.9), em um ∗As geodésicas circulares nesse espaço-tempo são estudadas brevemente no Apêndice C. 33 conjunto {ui, u∗i } de modos de frequência positiva e negativa, que satisfazem ∇μ∇μui = 0, (4.3) com a derivada covariante dada em termos da métrica (4.1). Explorando a sime- tria esférica da métrica de Schwarzschild, podemos escrever os modos normais† de frequência positiva como uωlm(t, r, θ, φ) = √ ω π ψωl(r) r Ylm(θ, φ)e −iωt, (4.4) em que ω ≥ 0, l ≥ 0 (l ∈ N) e m ∈ [−l, l] são os números quânticos de frequência e momento angular que caracterizam os modos e o fator √ ω/π é introduzido por con- veniência algébrica. Inserindo esse ansatz na Eq.(4.3), obtemos a equação diferencial satisfeita pelas funções radiais ψωl(r):[ −f(r) d dr ( f(r) d dr ) + VS(r) ] ψωl(r) = ω2ψωl(r), (4.5) para o potencial efetivo VS(r) = f(r) [ 2M r3 + l(l + 1) r2 ] , (4.6) com a função f(r) dada em (4.2). Uma ilustração desse potencial pode ser vista na Figura 4.1, na qual o potencial em Minkowski, VM(r) = l(l + 1)/r2 é também representado para comparação. A solução da Eq. (4.5) em termos de funções especiais não é conhecida (ver [27], por exemplo), mas podemos analisar o seu comportamento em alguns limites adequados. No que segue, estudaremos primeiramente as formas assintóticas dessa solução e, em seguida, os limites de baixas e altas frequências, usando aproximações anaĺıticas convenientes. 4.1.1 Formas assintóticas Nas proximidades do horizonte de eventos, r ≈ 2M , e no limite de r →∞, os modos radiais ψωl(r) podem ser expressos de forma simples. Para tanto, reescrevemos primeiramente a Eq. (4.5) em termos da coordenada de tartaruga x ≡ r/2M + ln(r/2M − 1), (4.7) †A normalização dos modos é feita de acordo com o produto interno de Klein-Gordon, Eqs. (2.15) e (2.16). 34 0 1 2 3 4 5 0 1 2 3 4 5 (2M)2 VM (2M)2 VS r/2M Figura 4.1: Potenciais de espalhamento, VM e VS, em função de r/2M para l = 1. O potencial VS está definido apenas fora do horizonte de eventos, r > 2M , ao passo que a mesma restrição não existe para VM . Assintoticamente, os potenciais coincidem. na forma [ − d2 dx2 + 4M2VS[r(x)] ] ψωl(x) = 4M2ω2ψωl(x). (4.8) Podemos associar as duas soluções dessa equação, de forma conveniente, a modos ψ→ ωl(x) puramente incidentes do horizonte branco passado, H−, e modos ψ← ωl(x) puramente incidentes do infinito nulo passado, I−. Os modos assim escolhidos são ortogonais pelo produto interno de Klein-Gordon. Isso pode ser visto escolhendo uma folheação Σt = H− ∪ I− na Eq. (2.15) e notando que ψ→ ωl(x) e ψ← ωl(x) se anulam em I− e H−, respectivamente. Na vizinhança do horizonte de eventos, r ≈ 2M , vemos que x → −∞ e o potencial efetivo tende a zero, VS(r) ≈ 0, ao passo que, longe do horizonte, r � 2M , x� 1, e o potencial tende a VS(r) ≈ l(l + 1)/r2. Isso nos permite escrever, para os modos vindos do horizonte branco passado, ψ→ ωl(x) ≈ Aωl { e2iMωx +R→ ωle −2iMωx (x < 0, |x| � 1) 2il+1T → ωl Mωxh (1) l (2Mωx) (x� 1) (4.9) 35 Figura 4.2: Diagrama de Penrose para o espaço-tempo de Schwarzschild e ilustração esquemática dos modos puramente incidentes do horizonte branco passado e do infinito nulo passado. e, para os modos vindos do infinito nulo passado, ψ← ωl(x) ≈ Bωl { T ← ωl e −2ıMωx (x < 0, |x| � 1) 2Mωx[(−i)l+1h (1) l (2Mωx)∗ + ıl+1R← ωlh (1) l (2Mωx)] (x� 1) (4.10) onde h (1) l (x) é a função de Hankel esférica de primeira espécie [20], cujo comporta- mento assintótico, para |x| � 1, é dado por h (1) l (x) = (−i)l+1eix/x. Os coeficientes de reflexão e transmissão obedecem às condições de conservação de probabilidade na forma usual: |R→ ωl|2+ |T → ωl |2 = 1 e |R← ωl|2+ |T ← ωl |2 = 1. Além disso, esses coeficientes satisfazem |R← ωl|2 = |R→ ωl|2 e |T ← ωl |2 = |T → ωl |2. As constantes de normalização Aωl e Bωl são obtidas (a menos de uma fase arbitrária) pela exigência de que os modos (4.4) sejam normalizados em relação ao produto interno de Klein-Gordon, Eqs. (2.15) e (2.16). Usando a Eq. (4.8), a integral nas expressões do produto interno pode ser transformada em um termo de superf́ıcie, 1 ω − ω′ [ ψωl(x) d dx ψ∗ ω′l(x)− ψ∗ ω′l(x) d dx ψωl(x) ]∣∣∣∣ x→+∞ x→−∞ = 2πM ω δ(ω − ω′), (4.11) e, inserindo nessa expressão as soluções assintóticas (4.9) e (4.10), obtemos Aωl = 36 Bωl = 1/(2ω). 4.1.2 Regime de baixas frequências É posśıvel encontrar aproximações anaĺıticas para os modos radiais em alguns limi- tes adequados; aqui, estaremos interessados em aproximações de baixas e altas frequências. O limite de baixas frequências é caracterizado por 2Mω|x| � 1. Nesse limite, podemos tomar ω ≈ 0 na Eq. (4.5) e, fazendo uso das mudanças de variáveis y ≡ r/2M e z ≡ 2y − 1, podemos reescrever essa equação como a equação de Legendre para ψωl(y)/y, d dz [ (1− z2) d dz ( ψωl(y) y )] + l(l + 1) ( ψωl(y) y ) = 0. (4.12) Essa equação admite duas soluções linearmente independentes, dadas pelas funções de Legendre de primeira e segunda espécie, Ql(z) e Pl(z): ψI ωl(y) ≡ CI ωyQl[2y − 1], (4.13) ψII ωl (y) ≡ CII ω yPl[2y − 1], (4.14) onde CI ω e CII ω são constantes de normalização. Para determiná-las, devemos impor consistência entre as soluções (4.13) e (4.14) e os limites assintóticos (4.9) e (4.10), da forma que segue [22]: Para determinar R→ ωl, notamos que, para 2Mω|x| � 1, ψ→ ωl(x) ≈ (2ω)−1(e2ıMωx +R→ ωle −2ıMωx) ≈ (2ω)−1(1 + 2ıMωx+R→ ωl − ıR→ ωl2Mωx) ≈ Mx [ 1 +R→ ωl 2Mωx + ı(1−R→ ωl) ] . Para que essa solução seja bem comportada quando ω ≈ 0, devemos impor R→ ωl ≈ −1 +O(ω) e, consequentemente, ψ→ ωl(x) ≈ 2ıMx (x < 0, |x| � 1). (4.15) Como modos de baixa frequência vindos do horizonte branco passado devem ser preferencialmente refletidos pelo potencial do buraco negro, devemos associar ψ→ ωl a ψI ωl, pois essa solução decresce assintoticamente, uma vez que Ql(z) ≈ z−l−1 para z 37 grande, ao passo que Pl(z) ≈ zl nesse regime. Fazemos, portanto, CII = 0 e fixamos CI da seguinte forma: primeiramente escrevemos Ql(z) = Pl(z) 2 ln z + 1 z − 1 − l∑ k=1 1 k Pk−1(z)Pl−k(z). (4.16) Quando r ≈ 2M , z ≈ 1 e temos que Pl(z) ≈ 1 e ψI ωl ≈ CI ( 1 2 ln y y − 1 − l∑ k=1 1 k ) ≈ CI ( 1 2 ln 1− 1 2 ln(y − 1)− l∑ k=1 1 k ) ≈ CI ( 1 2 − x 2 − l∑ k=1 1 k ) . Assim, para x < 0 e |x| � 1, ψI ωl ≈ −CIx/2 e, comparando com a solução assintótica, temos que CI = −4ıM e ψI ωl(r) = 2rQl(r/M − 1), (4.17) a menos de uma fase arbitrária. Para determinar a constante CII , notamos que os modos de baixa frequência vindos do infinito nulo passado, I−, devem ser refletidos para I+. Como Ql(z) ≈ − ln |z − 1|1/2 quando z ≈ 1, devemos impor CI = 0. Por outro lado, para x� 1 e ω pequeno (2Mωx� 1) notamos que jl(2Mωx) ≈ 2ll! (2l + 1)! (2Mωx)l, (4.18) ηl(2Mωx) ≈ −(2l)! 2ll! (2Mωx)−(l+1), (4.19) e ψ← ωl(x) se escreve como ψ← ωl(x) ≈ 1 ω (−ı)l+1Mωx ( 2ll! (2l + 1)! (2Mωx)l + ı (2l)! 2ll! (2Mωx)−(l+1) ) + 1 ω ıl+1R← ωlMωx ( 2ll! (2l + 1)! (2Mωx)l − ı (2l)! 2ll! (2Mωx)−(l+1) ) . 38 Para o coeficiente de reflexão, impomos R← ωl ≈ (−1)l+1 para ω pequeno, de forma que ψ← ωl(x) se comporte como xl+1 no domı́nio especificado de x. Assim, ψ← ωl(x) ≈ 22l+1(−ı)l+1l!ωl(Mx)l+1 (2l + 1)! . (4.20) Por outro lado, para z � 1, Pl(z) ≈ (2l)! 2l(l!)2 zl (4.21) e, tomando z = 2y + 1 ≈ 2y, temos que ψII ωl ≈ CII (2l)! (l!)2 yl+1. (4.22) Comparando as expressões para ψωl e ψII ωl e notando que x ≈ y no infinito, obtemos CII = 22l+1(−ı)l+1(l!)3ωlM l+1 (2l + 1)!(2l)! . (4.23) Portanto, ψII ωl (r) = 22l(−i)l+1(l!)3(Mω)l (2l + 1)!(2l)! rPl(r/M − 1). (4.24) As Eqs. (4.17) e (4.24) caracterizam, assim, a parte radial dos modos (4.4) no limite de baixas frequências. 4.1.3 Regime de altas frequências Uma boa aproximação para as funções radiais, em especial no limite de frequências altas (2Mω|x| � 1), é dada pelo método WKB (ver, por exemplo, [24]). Aqui, não vamos abordar esse método de forma exaustiva, mas apenas recordar algumas das principais ideias nele envolvidas. Notamos, primeiramente, que a equação para os modos radiais, − d2 dx2 ψωl(x)− 4M2(ω2 − VS(x))ψωl(x) = 0, (4.25) assemelha-se à equação de Schrödinger unidimensional com ω2 fazendo o papel de energia efetiva. 39 Se o potencial VS(x) é constante, essa equação tem como soluções e±ıkωlx (com kωl = 2M √ ω2 − VS); se ele varia lentamente, podemos considerar soluções da forma e±ıuωl(x). Inserindo esse ansatz na Eq. (4.8) e definindo kωl(x) ≡ 2M √ ω2 − VS(x), (4.26) obtemos a seguinte equação diferencial para uωl(x): ı d2uωl dx2 − ( duωl dx )2 + [kωl(x)] 2 = 0. (4.27) Em ordem zero, despreza-se o termo de derivada segunda e obtém-se, simplesmente, u (0) ωl (x) = ± ∫ x kωl(x)dx+ C. (4.28) Iterações sucessivas fornecem aproximações cada vez melhores para a solução. Em primeira ordem, obtemos a aproximação WKB, dada por [24] ψωl(x) ≈ e±ıu (1) ωl (x) = 1√ kωl(x) exp ( ±ı ∫ x kωl(x)dx ) . (4.29) O método WKB é válido na medida em que o potencial varia lentamente em relação ao comprimento de onda efetivo λ = 1/kωl; em outras palavras, quando o potencial é aproximadamente constante em uma região L � λ. Matematicamente, essa condição pode ser expressa como k−1 ωl d(ln kωl)/dx� 1. (4.30) Essa aproximação claramente não é válida nas vizinhanças de um ponto de retorno clássico, em que a energia efetiva se iguala ao potencial (ω2 = VS(x)), uma vez que 1/kωl diverge nesses pontos. Um aspecto crucial do método WKB é, portanto, a conexão das soluções definidas em regiões separadas por pontos singulares desse tipo. As fórmulas de conexão são obtidas pela linearização do potencial nas vizinhanças do ponto de retorno. A equação para kωl(x) assume, então, a forma da equação de Airy e, pela análise das formas assintóticas das soluções dessa equação, determinam-se os coeficientes que tornam cont́ınua a solução em todo o espaço. Para um potencial como o representado na Figura 4.3, com pontos de retorno x− e x+, as fórmulas de conexão das regiões com x < x− e x− < x < x+ são [24] 1√ kωl ( B 2 − ıA ) eı ∫ x− x kωldx+ ıπ 4 + 1√ kωl ( B 2 + ıA ) e−ı ∫ x− x kωldx− ıπ 4 40 -2,5 0,0 2,5 5,0 7,5 10,0 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 x- x+ (2 M )2 V [r( x) ] Eef=(2Mω)2 x x0 Figura 4.3: Ilustração do potencial VS(r(x)) (Eq.(4.6)) em função de x para l = 2. No gráfico, representamos o ponto x0 relativo à órbita com R = 6M , a energia efetiva Eef ≡ (2Mω)2 = (2mMΩ)2 ≈ (2lMΩ)2 associada a essa órbita e momento angular e os pontos de retorno clássicos x− ≈ −3.5 e x+ ≈ 10.6, em que VS = ω2. ⇐⇒ A√ κωl e − ∫ x x− κωldx + B√ κωl e ∫ x x− κωldx (4.31) e, das regiões com x− < x < x+ e x > x+, A√ κωl e − ∫ x x− κωldx + B√ κωl e ∫ x x− κωldx ⇐⇒ 1√ kωl ( A 2 e − ∫ x+ x− κωldx − ıBe ∫ x+ x− κωldx ) e ı ∫ x x+ kωldx+ ıπ 4 + 1√ kωl ( A 2 e − ∫ x+ x− κωldx + ıBe ∫ x+ x− κωldx ) e−ı ∫ x− x kωldx− ıπ 4 , (4.32) com kωl dado por (4.26) para ω2 > VS(x) e κωl definido como κωl(x) ≡ 2M √ VS(x)− ω2 = ıkωl(x), ω2 < VS(x). (4.33) Notamos que as duas constantes, A e B, necessárias para a caracterização completa da solução, devem ser determinadas por meio das condições de contorno adequadas ao problema em questão. 41 Para aplicarmos o método WKB na aproximação das funções ψωl, notamos, primeiramente, que a energia efetiva, ω2, é sempre menor do que o máximo do po- tencial (4.6) para as órbitas circulares permitidas no espaço-tempo de Schwarzschild [10]. Nas regiões em que VS(x) < ω2, ou seja, (−∞, x−) e (x+,∞), podemos escrever, desde que a condição (4.30) seja satisfeita, ψ← ωl(x) ≈ A← ω√ kωl { T ← ωl e −i(σωl(x)−π/4) (x < 0, |x| � 1) e−i(ρωl(x)+π/4) +R← ωle i(ρωl(x)+π/4) (x� 1) (4.34) e ψ→ ωl(x) ≈ A→ ω√ kωl { R→ ωle −i(σωl(x)−π/4) + ei(σωl(x)−π/4) (x < 0, |x| � 1) T → ωl e i(ρωl(x)+π/4) (x� 1) , (4.35) onde definimos σωl(x) ≡ ∫ x x− kωl(x ′)dx′ (4.36) e ρωl(x) ≡ ∫ x x+ kωl(x ′)dx′. (4.37) As constantes de normalização Aα ω são determinadas pela comparação das ex- pressões fornecidas pelo método WKB com as formas assintóticas dadas pelas Eqs. (4.9) e (4.10). Podemos reescrever estas expressões como ψ← ωl(x) ≈ 1 2ω { T ← ωl e −ıωr (r → 2M) e−ıωr +R← ωle iωr (r →∞) (4.38) e ψ→ ωl(x) ≈ 1 2ω { eıωr +R→ ωle −iωr (r → 2M) T → ωl e ıωr (r →∞) (4.39) Uma comparação direta com as Eqs. (4.9) e (4.10) nos permite deduzir que |Aα ω| =√ M/2ω, α =→,←. Tomando, agora, o caso em que V (x) > ω2, que ocorre no intervalo (x−, x+), podemos escrever, no limite de validade do método WKB, ψ← ωl(x) ≈ −i A← ω√ κωl e−ξωl(x) (4.40) e ψ→ ωl(x) ≈ −ı A→ ω√ κωl eξωl(x)−Θωl , (4.41) 42 onde definimos ξωl(x) ≡ ∫ x+ x κωl(x ′)dx′ (4.42) e o fator de barreira Θωl ≡ ∫ x+ x− κωl(x)dx. (4.43) Os coeficientes de transmissão e reflexão, |T α ωl|2 e |Rα ωl|2, podem ser facilmente calculados a partir das fórmulas de conexão (4.31) e (4.32). Para uma barreira larga, em que o fator de barreira é grande (Θωl � 1), eles são dados por |T α ωl|2 ≈ e−2Θωl (4.44) e, consequentemente, |Rα ωl|2 ≈ 1− e−2Θωl . Como já foi dito, pode-se mostrar que o raio das órbitas circulares no espaço- tempo de Schwarzschild, R = (MΩ−2) 1 3 , está em geral entre os pontos de retorno clássicos r− e r+ ‡ (ver Figura 4.3) [10]. Assim, sempre que a condição (4.30) é satisfeita, as funções de onda radiais podem ser aproximadas pelas expressões (4.40) e (4.41), com |Aα ω| = √ M/2ω. 4.2 Radiação emitida por uma fonte escalar em movimento circular Uma vez obtidas expressões para os modos normais, vamos revisitar alguns resulta- dos sobre a radiação emitida por uma fonte escalar em movimento circular geodésico no plano equatorial da geometria de Schwarzschild (veja, por exemplo, [8, 9, 10] para uma abordagem clássica e [4, 5] para uma abordagem semiclássica). Tal fonte pode ser descrita pela corrente normalizada j(xμ) = q√−gu0 δ(r −R)δ(θ − π/2)δ(φ− Ωt). (4.45) Aqui, Ω representa a velocidade angular da part́ıcula, como medida por observadores estáticos no infinito, e u0 é a componente zero da quadrivelocidade da fonte, uμ = (f(R)−R2Ω2)−1/2(1, 0, 0,Ω). (4.46) ‡Quando r → 3M , porém, r+ → 3M (tomando também l→∞). 43 A quadriaceleração da part́ıcula é dada por aμ = uν∇νu μ, ou, explicitamente, aμ = − f(R) f(R)−R2Ω2 ( 0, RΩ2 − M R2 , 0, 0 ) . (4.47) Uma vez que o movimento é geodésico, o escalar a = √ aμaμ deve se anular, o que implica em uma relação entre os valores posśıveis para o raio da órbita e a velocidade angular§: R3Ω2 =M. (4.48) A implementação do acoplamento da fonte (4.45) e do campo escalar é feita via a ação de interação (2.21). A amplitude de emissão a ńıvel de árvore, Eq. (2.22), é dada, nesse caso, por¶ Aωlm = 2ıq √ ωπ √ f(R)−R2Ω2 ψωl(R) R Ylm(π/2, 0)δ(ω −mΩ). (4.49) Também aqui, a frequência emitida é dada em termos da velocidade angular da fonte e do número quântico magnético m por ω = mΩ, o que implica em que apenas são emitidas ondas com m > 0. A taxa de emissão e a potência emitida são obtidas diretamente da amplitude: Γlm = 2q2mΩ[f(R)−R2Ω2]|ψmΩ,l(R)/R|2|Ylm(π/2, 0)|2, (4.50) Wlm = 2q2m2Ω2[f(R)−R2Ω2]|ψmΩ,l(R)/R|2|Ylm(π/2, 0)|2. (4.51) Como detalhado no Apêndice C, a geometria de Schwarzschild comporta órbitas circulares estáveis até R = 6M . As velocidades angulares alcançadas nessa região são relativamente pequenas e a aproximação de baixas frequências pode ser usada com alguma acurácia. Já entre R = 6M e R = 3M , órbitas circulares ainda são posśıveis, mas sem estabilidade. Em particular, a órbita geodésica em R = 3M é tipo-luz. Assim, nessa região, velocidades altas podem ser alcançadas e entramos em um regime de altas frequências. Nas subseções seguintes, usaremos os modos obtidos nas seções anteriores para estudar a emissão de radiação ćıclotron (baixas frequências) e śıncrotron (altas frequências) por uma fonte escalar no espaço-tempo de Schwarzschild. §No Apêndice C, pode-se encontrar outra derivação dessa expressão, que surge ao estudarmos as geodésicas no espaço-tempo de Schwarzschild. ¶Cabe notar que, para o cálculo da amplitude de emissão, o estado |0〉 utilizado na Eq. (2.22) foi o vácuo de Boulware [25]. Se o vácuo empregado tivesse sido o de Unruh ou de Hartle-Hawking [21, 28], a Eq. (4.49) estaria associada à radiação ĺıquida emitida pela fonte, uma vez que as taxas de absorção e emissão estimulada (induzidas pela presença de fluxos térmicos) são iguais. 44 4.2.1 Radiação ćıclotron O regime de radiação ćıclotron corresponde ao limite de baixas frequências, carac- terizado por Mω � 1, com ω = mΩ. Nesse caso, utilizamos os modos (4.17) e (4.24) para escrever a taxa de emissão de part́ıculas com números quânticos l e m como Γlm = Γ→ lm + Γ← lm, com Γ→ lm(Ω) ≈ 8q2mΩ(f(R)−R2Ω2)|Ql(R/M − 1)|2|Ylm(π/2, 0)|2 e (4.52) Γ← lm(Ω) ≈ 24l+1q2(l!)6M2l(mΩ)2l+1 [(2l)!]2[(2l + 1)!]2 (f(R)−R2Ω2)|Pl(R/M − 1)|2|Ylm(π/2, 0)|2. (4.53) Para a potência irradiada, temos Wlm = W→ lm +W← lm, com W→ lm(Ω) ≈ 8q2m2Ω2(f(R)−R2Ω2)|Ql(R/M − 1)|2|Ylm(π/2, 0)|2 e (4.54) W← lm(Ω) ≈ 24l+1q2(l!)6m2l+2M2lΩ2l+2 [(2l)!]2[(2l + 1)!]2 (f(R)−R2Ω2)|Pl(R/M − 1)|2|Ylm(π/2, 0)|2. (4.55) 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 -30 -25 -20 -15 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 1,0 -45 -40 -35 -30 Lo g 1 0( M q-2 Γ← lm ) 103MΩ m=1 m=3 m=5 103MΩ Lo g 1 0( M q-2 Γ→ lm ) m=1 m=3 m=5 Figura 4.4: Taxa de produção de part́ıculas Γα lm em função da velocidade angular Ω para l = 5 e diferentes valores de m. A maior contribuição é a de m = l. Nas análises gráficas, utilizamos a relação R(Ω) = (MΩ−2)1/3 para expressar R em função de M e Ω, de forma que os observáveis sejam funções apenas dessas quantidades, que são medidas por observadores estáticos no infinito. 45 0 2 4 6 0 2 4 6 8 10 0,00 0,05 0,10 0 1 2 10 6 M 2 q-2 W lm 102 MΩ l=m=2 l=m=1 l=m=3 l=m=2 l=m =1 10 10 M 2 q-2 W lm Figura 4.5: Potência irradiada, Wlm, em função da velocidade angular da fonte para 0 < MΩ < 0.068, sendo que o valor máximo considerado, MΩ = 0.068, corresponde à órbita com R = 6M , última órbita circular estável permitida na geometria de Schwarzschild. Na construção deste gráfico, foi utilizada a aproximação de baixas frequências para os modos normais. As Figuras 4.4 e 4.5 ilustram algumas propriedades da radiação ćıclotron escalar. Na Figura 4.4, vemos que a contribuição dos modos com α =← é substancialmente maior do que a dos modos α =→ no intervalo de velocidades considerado. Além disso, vemos que a maior contribuição vem do número quântico l = m, como ob- servado anteriormente (ver Figura 3.1 e a discussão que a precede). Da Figura 4.5, vemos que, até a última órbita estável do espaço-tempo de Schwarzschild, R = 6M , predominam os modos de momento angular mais baixo. Para velocidades angulares suficientemente pequenas, apenas o modo com l = 1 contribui significativamente para a radiação emitida. Por fim, na Figura 4.6 se compara a emissão de radiação no espaço-tempo de Schwarzschild e de Minkowski, no limite de baixas frequências. Vemos que a razão WS/WM entre a potência total calculada assumindo o espaço-tempo de Schwarzschild e aquela assumindo o espaço-tempo de Minkowski com gravitação Newtoniana tende a 1 para velocidades angulares baixas e diminui à medida que a 46 velocidade angular aumenta. O limite WS/WM → 1 para MΩ → 0 está de acordo com o fato de o espaço-tempo de Schwarzschild ser essencialmente plano para com- primentos de onda muito maiores que o raio de Schwarzschild. 0 1 2 3 4 5 6 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0 102 MΩ W S /W M Figura 4.6: Razão WS/WM entre a potência emitida no espaço-tempo de Schwarzschild e de Minkowski em função da velocidade angular da fonte no limite de baixas frequências. As aproximações (4.17) e (4.24) foram utilizadas para as funções radiais. Uma análise semelhante usando também cálculos numéricos pode ser encontrada em [4] (ver Figura 3 dessa referência). 4.2.2 Radiação śıncrotron O regime de radiação śıncrotron é caracterizado por altas velocidades angulares e é alcançado, no espaço-tempo de Schwarzschild, nas proximidades da órbita fotônica em R = 3M . Nesse regime, usamos a aproximação WKB para as funções de onda radiais‖. Inserindo os modos radiais (4.40) e (4.41) na expressão (4.50) para a taxa ‖Uma análise numérica da radiação śıncrotron emitida por uma fonte em órbita ultrarrela- tiv́ıstica ao redor de um buraco negro de Schwarzschild pode ser encontrada em [5]. Uma com- paração da análise numérica e do método WKB é feita em [6]: o que se conclui é que esse método fornece uma boa aproximação para as funções de onda radiais em especial no limite de altas frequências. 47 de emissão, obtemos Γlm = Γ→ lm + Γ← lm, com Γ→ lm(Ω) ≈ q2M(f(R)−R2Ω2)R−2κ−1 lm(R)e2(ξlm(R)−Θlm(R))|Ylm(π/2, 0)|2, (4.56) Γ← lm(Ω) ≈ q2M(f(R)−R2Ω2)R−2κ−1 lm(R)e−2ξlm(R)|Ylm(π/2, 0)|2, (4.57) e ξωl(R) e Θωl(R) definidos em (4.42) e (4.43). De forma análoga, escrevemos, para a potência emitida (Eq. (4.51)), Wlm = W→ lm +W← lm, com W→ lm(Ω) ≈ q2MmΩ(f(R)−R2Ω2)R−2κ−1 lm(R)e2(ξlm(R)−Θlm(R))|Ylm(π/2, 0)|2, (4.58) W← lm(Ω) ≈ q2MmΩ(f(R)−R2Ω2)R−2κ−1 lm(R)e−2ξlm(R)|Ylm(π/2, 0)|2. (4.59) A potência total é dada pela soma em todos os números quânticos. Contudo, ao contrário do regime de baixas frequências, em que praticamente toda a radiação emitida escapa para o infinito, neste caso uma boa parte da radiação pode ser absorvida pelo buraco (cerca de 50% quando a órbita tende à órbita fotônica [6]). Aqui, porém, não levaremos essa perda explicitamente em conta e trabalharemos com a potência total emitida e não com a potência observada no infinito. A radiação śıncrotron é caracterizada pela excitação de altos valores de l e m, altas frequências (uma vez que ω = mΩ) e por uma forte colimação no plano da órbita [26, 10]. Algumas dessas propriedades ficam expĺıcitas na análise gráfica abaixo. Na Figura 4.7, vemos que, para órbitas próximas à órbita fotônica, modos com valores maiores de momento angular ganham importância. Dessa figura, nota-se que, quanto maior é o valor de l = m, maior é o valor máximo assumido pela potência, Wαmax lm (Ω), e maior é a velocidade angular Ω associada a esse máximo. A contribuição de altos múltiplos de l e m pode ser mais claramente vista na Figura 4.8, que mostra a potência Wlm emitida em função do número quântico l (m = l) para alguns valores de Ω no limite de altas frequências. Quanto mais a trajetória se aproxima da órbita fotônica, maior é a faixa de números quânticos l e m excitados e maior é o valor de m = l que fornece o máximo para a potência. Além disso, notamos que, fixados l e m, a contribuição dos modos vindos do infinito nulo passado (α =←) é maior que aquela dos modos vindos do horizonte branco passado (α =→) para quase todas as órbitas circulares, com exceção daquelas muito próximas de R = 3M , o que pode ser observado mais claramente na Figura 4.9. 48 0,00 0,05 0,10 0,15 0,20 0 1 2 3 4 5 0,00 0,05 0,10 0,15 0,20 0 1 2 3 4 5 6 10 5 M 2 q-2 W → lm l=m=5 l=m=1 MΩ 10 5 M 2 q-2 W ← lm l=m=5 MΩ l=m=1 Figura 4.7: Potência emitida, Wα lm, em função da velocidade angular Ω para l = m variando de 1 a 5. A aproximação WKB foi utilizada para os modos radiais na construção deste e dos demais gráficos desta seção. Uma comparação da emissão de radiação no espaço-tempo de Minkowski e de Schwarzschild, no limite de altas frequências, pode ser vista na Figura 4.10. Para velocidades angulares altas (e, consequentemente, comprimentos de onda pequenos da radiação emitida), a curvatura espaço-temporal passa a exercer um papel fun- damental. Em órbitas ultrarrelativ́ısticas, próximas à órbita fotônica em R = 3M , as part́ıculas emitidas podem ser altamente energéticas. De fato, para R → 3M , o valor dominante de m = l aumenta irrestritamente, bem como a frequência das part́ıculas emitidas, ω = mΩ (ver Figura 4.8 e a discussão que acompanha a Eq. (4.63) a seguir). Assim, a razão WS/WM deve divergir nesse limite, o que é indicado pela Figura 4.10. Estimativa do valor dominante de m A Figura 4.8 sugere que, quanto maior é a velocidade angular da fonte, maior é o número quântico magnético predominantemente emitido. Uma estimativa desse número é importante, por exemplo, para se justificar a escolha de um certo valor de corte nas somas em l e m no cálculo da potência total. Em [10], podemos encontrar 49 0 50 100 150 200 0 1 2 3 4 5 6 7 0 200 400 600 800 1000 0 1 2 3 4 5 6 7 Ω = 0,999 Ωγ α = ← α = → α = ← α = → 10 5 × M 2 q-2 W α ll l Ω = 0,99 Ωγ l Figura 4.8: Potência emitida em função de l = m, para Ω = 0.99Ωγ e Ω = 0.999Ωγ, onde Ωγ é a velocidade angular que corresponde à órbita fotônica (MΩγ ≈ 0.19245). Quanto maior a velocidade angular, maiores os números quânticos l e m excitados. uma estimativa de um valor cŕıtico de m a partir do qual as contribuições são significantemente menores que a do termo dominante. Para isso, lembramos que o modo ψ← ωl pode ser escrito, na aproximação WKB, como (ver Eq. (4.40)) ψ← ωl(x) = −iA← ω κ −1 lm(x) exp[−ξlm(x)]. Perto da órbita fotônica, podemos escrever R = (3+ δ)M , com δ � 1. Nesse limite, modos de número quântico l grande são excitados, e podemos escrever o potencial (4.6) como VS(r) ≈ ( 1− 2M r ) l(l + 1) r2 +O(l0). (4.60) O máximo do potencial assim escrito ocorre para r = 3M ; assim, para órbitas próximas dessa, podemos aproximar o potencial por uma parábola. Ao integrar a Eq. (4.42) com o potencial assim simplificado e tomar l = m, obtemos ξmm(x) = π 4 (1 +mδ). (4.61) Pode-se, então, introduzir um valor mcrit de corte, a partir do qual as contribuições sejam menores por um fator de e2 (e ≈ 2, 718) do que o termo fundamental (no caso, 50 0,10 0,12 0,14 0,16 0,18 0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 10 5 × M q-2 Γα lm MΩ α = ← α = → 0,1920 0,1922 0,1924 0,0 0,2 0,4 0,6 0,8 Figura 4.9: Taxa de emissão de part́ıculas em função da velocidade angular, para l = m = 15, no limite de altas frequências. m = 1, uma vez que ondas com m = 0 não são emitidas). Para isso, exigimos que ξmm|m=mcrit = ξmm|m=1 + 1. (4.62) Com isso, obtemos mcrit ≈ 4 πδ . (4.63) Os valores demcrit correspondentes às órbitas consideradas na Figura 4.8 sãomcrit ≈ 190 e mcrit ≈ 1910. Argumentos de ordem f́ısica podem fornecer uma outra estimativa para o valor t́ıpico (que chamaremos de mS) do número quântico m irradiado. Uma aproximação para essa quantidade pode ser obtida por meio da fórmula mS ≈ √ M R 1− 2M/R 1− 3M/R . (4.64) Na Tabela 4.2.2, mS é comparado com o valor de m = l que maximiza a potência emitida e com a estimativa obtida de [10] para um valor de corte param (Eq. (4.63)). Observa-se uma boa concordância, que se mantém na medida em que as órbitas se aproximam do limite de R = 3M . 51 0,14 0,15 0,16 0,17 0,18 0,19 0 2 4 6 8 10 W S /W M MΩ Figura 4.10: Razão WS/WM entre a potência emitida no espaço-tempo de Schwarzschild e de Minkowski em função da velocidade angular da fonte no limite de altas frequências. As somas em l necessárias para a computação da potência total foram feitas até l = 300 e a aproximação WKB foi utilizada. No limite fotônico, essa razão diverge. 4.3 Radiação emitida por duas fontes escalares em movimento circular Assim como no Caṕıtulo anterior, vamos considerar como uma primeira genera- lização o caso de duas part́ıculas-teste em movimento circular no plano equatorial. As órbitas são caracterizadas pelos raios R1 e R2, pelas velocidades angulares Ω1 e Ω2 e pelas quadrivelocidades uμi = (f(Ri)−R2 iΩ 2 i ) −1/2(1, 0, 0,Ωi), i = 1, 2. (4.65) O sistema é descrito pela corrente normalizada j(xμ) = q√−gu01 δ(r −R1)δ(θ − π/2)δ(φ− Ω1t) (4.66) ∓ q√−gu02 δ(r −R2)δ(θ − π/2)δ(φ− Ω2t− λ). (4.67) A expressão com sinal negativo descreve part́ıculas de cargas de sinal oposto, en- quanto a com sinal positivo descreve part́ıculas de mesma carga. A quantidade λ 52 MΩ 0.5MΩγ 0.9MΩγ 0.99MΩγ 0.999MΩγ 0.9999MΩγ m 1 3 27 264 2623 mS 0.72 3.1 29 289 2874 mcrit 0.72 5.8 63 636 6336 Tabela 4.1: Comparação entre o valor de m que dá a maior contribuição para Wlm = W→ lm +W← lm (com l = m) e as aproximações mS e mcrit obtidas das fórmulas (4.64) e (4.63). representa a distância angular entre as part́ıculas em t = 0. A amplitude de emissão é, nesse caso, Aωlm = 2ıq √ ωπ √ f(R1)−R2 1Ω 2 1 ψωl(R1) R1 Ylm(π/2, 0)δ(ω −mΩ1) (4.68) ∓ 2ıq √ ωπ √ f(R2)−R2 2Ω 2 2 ψωl(R2) R2 Ylm(π/2, λ)δ(ω −mΩ2). (4.69) A taxa de emissão é calculada de forma análoga ao que foi feito na Seção 3.2 e pode ser escrita como a soma das taxas de emissão individuais e um termo de interferência: Γlm = Γ1 lm + Γ2 lm + Γ12 lm, (4.70) com (ver Eq. (4.50)) Γi lm = 2q2mΩi[f(Ri)−R2 iΩ 2 i ]|ψmΩi,l(Ri)/Ri|2|Ylm(π/2, 0)|2, i = 1, 2 (4.71) e Γ12 lm = ∓8πq2mΩ2 √ f(R1)−R2 1Ω 2 2 √ f(R2)−R2 2Ω 2 2 ψmΩ2,l(R1) R1 ψmΩ2,l(R2) R2 × |Ylm(π/2, 0)|2 cos(mλ) δ(mΩ2 −mΩ1) T . (4.72) A função delta de Dirac que aparece na expressão acima implica que só ocorre interferência para a radiação emitida por fontes numa mesma órbita. Nesse caso, Γlm = 4q2mΩ[f(R)−R2Ω2]|ψmΩ,l(R)/R|2|Ylm(π/2, 0)|2(1∓ cos(mλ)). (4.73) Para a potência irradiada, um cálculo análogo fornece Wlm = 4q2m2Ω2[f(R)−R2Ω2]|ψmΩ,l(R)/R|2|Ylm(π/2, 0)|2(1∓ cos(mλ)). (4.74) 53 0 1 2 3 4 5 6 0 1 2 3 0 1 2 3 4 5 6 0 1 2 3 4 �������� �� � ��� 10 5 ×M 2 q-2 W λ=π λ=π/2 λ=π/4 λ=π/8 �� �× �Ω �� �×�Ω �������� �� � �� � � λ=π λ=π/2 λ=π/4 λ=π/8 λ=0 Figura 4.11: Dependência da potência irradiada em relação à velocidade angular de rotação, para configurações neutras e carregadas, no regime de baixas frequências. O valor máximo de MΩ considerado (0.068) corresponde à última órbita estável na geometria de Schwarzschild. Na construção do gráfico, utilizou-se a aproximação de baixas frequências para as funções radiais. Comparar com a Figura 3.5, referente ao espaço-tempo de Minkowski. Como, na modelagem de um disco fino, podemos analisar cada órbita individual- mente e somar todas as contribuições de forma incoerente, restringiremos as nossas considerações a fontes em uma mesma órbita circular. Na Figura 4.11, vemos o comportamento da potência emitida em função da ve- locidade angular das fontes para algumas separações angulares no regime de baixas frequências. O gráfico é qualitativamente análogo à Figura 3.5 para o espaço- tempo de Minkowski. Para frequências suficientemente baixas há uma concordância também quantitativa entre os gráficos, o que é consistente com o fato de que, como já foi dito, para comprimentos de onda muito maiores que R = 2M , a curvatura do espaço-tempo de Schwarzschild não é sensivelmente percebida. Para frequências maiores, nesse regime, a potência emitida em Schwarzschild é inferior àquela emitida em Minkowski, o que está de acordo com a Figura 4.6. 54 Discussão: interferência em espaços curvos 0,950 0,955 0,960 0,28 0,32 0,36 0,40 3π��π�� π W S /W M λ ����� �� �� �� ��� ����� �� �� ����� ��� � π�� �Ω=0.001 �Ω=0.068 π3π��π��π��� ����� �� �� �� ��� ����� �� �� ����� ��� λ Figura 4.12: Razão WS/WM entre a potência irradiada por duas fontes no espaço- tempo de Schwarzschild e de Minkowski em função da distância angular λ entre as fontes, no regime de baixas frequências (MΩ = 0.001 e 0.068). A linha tracejada representa o valor dessa razão para uma carga, 0.962 e 0.375 (ver Figura 4.6). A dispersão das curvas em relação a esse valor aponta para a influência da curvatura espaço-temporal sobre a interferência. Aqui, gostaŕıamos de investigar a influência da curvatura espaço-temporal sobre a interferência. Vimos que se a emissão das duas part́ıculas é independente, a potência total é simplesmente a soma das potências individuais e a razão WN=2 S /(2WN=1 S ) é igual a 1. Se existe interferência, essa razão pode nos dar uma medida de sua inten- sidade. Assim, se a interferência fosse independente da geometria espaço-temporal, essa razão deveria ser a mesma tanto no espaço-tempo de Schwarzschild quanto no de Minkowski, ou seja, deveria valer que: WN=2 S (MΩ, λ) 2WN=1 S (MΩ) = I(MΩ, λ) = WN=2 M (MΩ, λ) 2WN=1 M (MΩ) . (4.75) Desse modo, uma forma de captar a influência da geometria espaço-temporal sobre a interferência é comparar essa razão no caso curvo e plano ou, alternativamente, 55 estudar o comportamento da curva WN=2 S /WN=2 M em função de λ e compará-la com o valor dessa razão para N = 1: a oscilação da curva WS/WM (para N = 2) em relação ao valor dessa razão para N = 1 aponta, portanto, para a influência da geometria espaço-temporal sobre a interferência. A Figura 4.12 representa a razão WS/WM em função de λ no limite de baixas frequências, paraMΩ = 0.001 eMΩ = 0.068. No primeiro caso, essa razão varia em torno de 96%; no segundo, tem um mı́nimo de aproximadamente 26% e um máximo de cerca de 42%. De fato, o termo que codifica a interferência nas expressões (4.74) e (3.22) é o mesmo, (1 ∓ cos(mλ)), uma vez que a estrutura angular das métricas de Minkowski e Schwarzschild, que é relevante para a derivação desse termo, é a mesma. Porém, no cálculo da taxa de emissão e da potência totais, a soma no número quântico m acopla esse termo às funções radiais espećıficas de cada caso. Para velocidades angulares suficientemente baixas, somente o número quântico l = 1 é relevante, e tal acoplamento é muito fraco, como acontece no caso em que MΩ = 0.001 na Figura 4.12∗∗. Para MΩ = 0.068, ordens um pouco maiores de l e m são excitadas, o que se reflete na Figura 4.12 em uma maior variação das curvas, indicando uma dependência maior da interferência em relação à métrica empregada. Quando o raio da órbita circular aproxima-se de R = 3M , os efeitos da curvatura espaço-temporal sobre a interferência tornam-se mais acentuados. A Figura 4.13 ilustra a razão entre a potência emitida em Schwarzschild e em Minkowski em função da separação angular entre as cargas paraMΩ = 0.16 e 0.18. No primeiro caso, essa razão oscila entre 0.72 e 1.16 para a configuração carregada e entre 3.5 e 0.9 para a neutra. No segundo, entre 1.17 e 2.63 para fontes de mesma carga e entre 31 e 1.9 para fontes de cargas opostas. A flutuação mais acentuada decorre do acoplamento do termo de interferência com as funções radiais espećıficas de cada caso por meio da soma em m. Na Seção 3.2, obtivemos uma estimativa da distância angular a partir da qual duas part́ıculas em uma órbita circular no espaço-tempo de Minkowski emitem in- dependentemente. Essa estimativa, dada pela Eq. (3.24), foi obtida com base na argumentação f́ısica de que a interferência ocorre quando o comprimento de onda caracteŕıstico da radiação emitida é maior ou da ordem da distância entre as fontes. ∗∗A queda da curva associada à configuração carregada quando λ→ π ocorre porque, nesse caso, a contribuição de dipolo é nula e a primeira ordem a contribuir é a quadrupolar. 56 1 2 3 0 5 10 15 20 25 30 W S /W M �Ω=0.16 ������ �� � �� � � ������ �� � �� ����� π3π��π��π��� λ λ π�� 3π�� ππ��� ������ �� � �� � � ������ �� � �� ����� �Ω=0.18 Figura 4.13: Razão WS/WM entre a potência irradiada por duas fontes no espaço- tempo de Schwarzschild e de Minkowski em função da distância angular λ entre as fontes, para MΩ = 0.16 e 0.18 (esses valores correspondem, respectivamente, a 83.1 e 93.5% da velocidade angular da órbita fotônica). A linha tracejada representa o valor dessa razão para uma carga, dado por 1.01 no primeiro caso e 2.19 no segundo (ver Figura 4.10). Na construção desse gráfico, a aproximação WKB foi utilizada no cálculo dos modos radiais. Um argumento semelhante no espaço-tempo de Schwarzschild leva a λ ≈ 1− 3(MΩ)2/3 (MΩ)2/3(1− 2(MΩ)2/3)1/2 . (4.76) Essas aproximações podem ser usadas, em particular, para se interpretar o grande aumento da razão WS/WM para a configuração neutra quando a separação angular entre as part́ıculas diminui. De fato, para MΩ = 0.18, a Eq. (3.24) indica que, para separações angulares maiores que 1.76 radianos, as part́ıculas emitem de forma aproximadamente independente no espaço-tempo de Minkowski. Para separações angulares menores que essa, a interferência passa a ser importante, de forma que, para as part́ıculas sobrepostas (λ = 0), a potência emitida se anula. No espaço- tempo de Schwarzschild, a potência emitida também vai a zero quando λ→ 0, mas mais lentamente: da Eq. (4.76), vemos que, para MΩ = 0.18, as part́ıculas emitem 57 independentemente a partir de λ = 0.23 e apenas para distâncias inferiores a essa começa a haver interferência. Como a potência emitida por part́ıculas de cargas opostas vai para zero mais rapidamente no espaço-tempo de Minkowski do que no de Schwarzschild para órbitas próximas a R = 3M , a razão WS/WM aumenta de forma significativa para λ pequeno nesse regime. Finalmente, notamos que os resultados para a emissão de radiação por uma carga encontrados na literatura (ver [4, 5, 6, 10], por exemplo) podem ser diretamente generalizados para duas ou mais cargas apenas quando a emissão é independente (separação angular superior à fornecida pela Eq. (4.76)). 4.4 Radiação emitida por N fontes escalares em movimento circular Como discutido na Introdução, sabemos, do Eletromagnetismo, que uma carga em movimento circular uniforme irradia ondas eletromagnéticas, uma vez que está acel- erada, e que, ao adicionarmos mais cargas à órbita, a potência em geral aumenta. Contudo, no limite do cont́ınuo, quando temos um aro carregado em rotação, a cor- rente é estacionária (Magnetostática) e não deve haver emissão de radiação. Como estamos interessados em um disco de material ionizado, composto de um número finito mas muito grande de part́ıculas, é importante analisar se a potência irradiada por essa configuração é significativa e em que situações isso ocorre. Para isso, estu- daremos, nesta seção, a emissão de radiação por um anel de cargas em rotação no espaço-tempo de Schwarzschild. Mostraremos que, para órbitas circulares estáveis, R > 6M , as velocidades angulares atingidas são relativamente pequenas e a potência irradiada por um número maior de cargas rapidamente tende a zero. Contudo, para órbitas circulares instáveis, 3M < R < 6M , a potência irradiada por um número grande de cargas pode ser significativa se a velocidade de rotação for suficientemente alta. 4.4.1 Configuração neutra Consideramos, primeiramente, um anel formado de N cargas igualmente espaçadas, de um ângulo λ (Nλ = 2π, N par), e com sinais trocados de forma alternada, de modo que o sistema como um todo seja neutro (ver Figura 3.8). As cargas estão em 58 movimento circular no espaço-tempo de Schwarzschild, com velocidade Ω constante, como medida por observadores assintóticos. A densidade volumétrica de carga que descreve o sistema é j(xμ) = N−1∑ n=0 (−1)n q√−gu0 δ(r −R)δ(θ − π/2)δ(φ− Ωt− nλ), (4.77) onde u0 é a componente temporal da quadrivelocidade das part́ıculas, uμ(Ω, R) = (f(R)−R2Ω2)−1/2(1, 0, 0,Ω). (4.78) Um cálculo semelhante ao realizado na Seção 3.3.2 fornece, para a taxa de emissão e para a potência irradiada, Γlm = f (Γ) lm (Ω)gm(N) e Wlm = f (W ) lm (Ω)gm(N), com f (Γ) lm (Ω) = 2 q2 (u0)2 mΩ |ψmΩ,l(R)|2 R2 |Ylm(π/2, 0)|2, (4.79) f (W ) lm (Ω) = 2 q2 (u0)2 (mΩ)2 |ψmΩ,l(R)|2 R2 |Ylm(π/2, 0)|2 (4.80) e gm(N) = { N2, m = 2k−1 2 N, k ∈ N 0, caso contrário. (4.81) Vale notar que a dependência desses observáveis em relação ao número de cargas, N , que é codificada na função gm(N),