RESSALVA Atendendo solicitação do(a) autor(a), o texto completo desta dissertação será disponibilizado somente a partir de 26/02/2018. 1 INFLUÊNCIA DAS INTERAÇÕES COM ABELHAS MUTUALISTAS E ANTAGONISTAS E DA DISPONIBILIDADE DE RECURSOS MATERNOS SOBRE O SUCESSO REPRODUTIVO DE UMA ESPÉCIE DE BIGNONIACEAE DE CERRADO MARÍLIA MONTEIRO QUINALHA BOTUCATU – SP 2016 Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências, Campus de Botucatu, UNESP, para obtenção do título de Mestre no Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas (Botânica), Área de concentração: Morfologia e Diversidade Vegetal 2 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “Julio de Mesquita Filho” INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS DE BOTUCATU INFLUÊNCIA DAS INTERAÇÕES COM ABELHAS MUTUALISTAS E ANTAGONISTAS E DA DISPONIBILIDADE DE RECURSOS MATERNOS SOBRE O SUCESSO REPRODUTIVO DE UMA ESPÉCIE DE BIGNONIACEAE DE CERRADO MARÍLIA MONTEIRO QUINALHA PROFA. DRA. ELZA MARIA GUIMARÃES SANTOS ORIENTADORA PROF. DR. ANSELMO NOGUEIRA COORIENTADOR BOTUCATU – SP 2016 Dissertação apresentada ao Instituto de Biociências, Campus de Botucatu, UNESP, para obtenção do título de Mestre no Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas (Botânica), Área de concentração: Morfologia e Diversidade Vegetal 3 4 Dedico este trabalho ao meu pai, Walter Quinalha, pela educação, pelo apoio, amor, carinho e por seguir sempre ao meu lado, até que eu pudesse ser responsável pelo meu próprio caminho... (In memoriam) 5 Agradecimentos À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa de estudos concedida. Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), processo 446949/2014-0, projeto coordenado pela Prof. Dra. Elza Maria Guimarães Santos, pelo auxílio financeiro. Ao projeto Biota FAPESP, processo 2008/55434-7, coordenado pela Prof. Dra. Silvia Rodrigues Machado, pelo auxílio financeiro. À Profa. Dra. Elza Maria Guimarães Santos, pela dedicação e compromisso durante minha orientação, por todos os ensinamentos, pela confiança, paciência e por me incentivar e motivar a crescer profissionalmente. Ao Dr. Anselmo Nogueira, pela excelente coorientação, paciência, pelas experiências trocadas e pelo apoio em todas as etapas desse trabalho. Ao Instituto Florestal do Estado de São Paulo, pelo apoio e infraestrutura das reservas. Ao Alexandre Zuntini pela identificação de Jacaranda caroba. A Elaine Françoso pela idenfificação de Bombus morio. Aos meus amigos, César Trevelin e Sérgio Adachi, pela ajuda no campo e pelos registros fotográficos. Aos funcionários da Estação Ecológica de Águas de Santa Bárbara, Carlos Roberto da Silva, José do Prato, José Benedito Desidério, Marcos Soler e Josimar de Souza, pela disponibilidade em me ajudar e por todo auxílio prestado durante minhas coletas em campo. A Heloíza Cassola, pelo auxílio no processamento do material de campo. Aos meus queridos amigos, alunos e ex-alunos do Laboratório de Ecologia e Evolução das Interações Planta-Animal, Adriano Valentin, Vinícius Nunes e Erika Ramos, pelas conversas, pelo companheirismo, apoio e pelos bons momentos vividos dentro e fora do laboratório. Em especial, agradeço as minhas amigas, Camila Vaz de Souza , Priscila Tunes e Bruna de Campos, que além da amizade e apoio em todos os momentos, foram fundamentais para a realização desse trabalho. Obrigada pela enorme ajuda no campo, pela parceria, pelos momentos divertidos e descontraídos durante a coleta de dados e pelo apoio na elaboração final dessa dissertação. 6 Às minhas amigas, Fernanda Palermo, Ana Maria Ruocco, Laís Tavares, Suyen Naide, Juliana Sthal, Katiane Reis, Elisa Cardoso e Ana Lis Uchida, por todos esses anos de convivência e amizade, pelo apoio, pelas experiências trocadas e pelos bons momentos que fizeram dessa etapa da minha vida mais leve e divertida. Às minhas companheiras e amigas de mestrado, Ellen de Oliveira, Maria Angélica Paraizo e Janete Ferreira, mesmo em áreas diferentes, vivemos juntas todas as dificuldades e todos os aprendizados da pós-graduação. Obrigada pelas conversas e experiências trocadas. À minha família, em especial a minha mãe, Neusa Quinalha, pela educação, pelos conselhos e pelo apoio incondicional pra que eu realizasse os meus sonhos. 7 Sumário Resumo............................................................................................................... 9 Abstract....................................................................................................................... 11 Introdução..................................................................................................................... 13 Material e Métodos........................................................................................................ 18 Resultados................................................................................................................... 30 Discussão.................................................................................................................... 44 Referências bibliográficas............................................................................................. 58 Considerações finais...................................................................................................... 66 8 Este trabalho foi redigido na forma de artigo científico a ser submetido ao periódico Naturwissenschaften 9 Influência das interações com abelhas mutualistas e antagonistas e da disponibilidade de recursos maternos sobre o sucesso reprodutivo de uma espécie de Bignoniaceae de cerrado Marília Monteiro Quinalha 1 , Anselmo Nogueira 1 & Elza Guimarães 1 1 Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Instituto de Biociências, Distrito de Rubião Júnior, Botucatu, São Paulo, Brasil. 1. Resumo As plantas normalmente apresentam um limite máximo de frutificação que é determinado pela disponibilidade de recursos maternos, no entanto, o sucesso reprodutivo feminino de determinadas espécies é ainda menor que o potencial intrínseco à planta-mãe. Nesse caso, fatores extrínsecos à planta, como a limitação de pólen, decorrentes das interações ecológicas estabelecidas com mutualistas e antagonistas da comunidade, podem interferir e impactar negativamente a reprodução. Considerando que a investigação simultânea de fatores intrínsecos e extrínsecos à planta pode ajudar a estabelecer o papel de cada um deles sobre a baixa produção de frutos em angiospermas, neste trabalho nós avaliamos experimentalmente a contribuição relativa da limitação de recursos maternos e da limitação de pólen sobre o sucesso reprodutivo de Jacaranda caroba (Bignoniaceae), uma espécie selecionada como modelo por ser zoófila, predominantemente xenógama e apresentar baixa frutificação natural. Assim, testamos as seguintes hipóteses: (1) o número total de frutos é menor que o número total de flores produzidas pela planta na ausência de limitação de pólen; (2) a frutificação natural é ainda inferior à capacidade de formação de frutos das plantas devido à limitação de pólen; (3) a baixa frequência de visitas do polinizador ou a transferência de grãos de pólen inadequados resulta em limitação quantitativa e qualitativa, respectivamente; (4) abelhas que roubam ou pilham recursos atuam como antagonistas 10 afetando negativamente, de forma direta ou indireta, o sucesso reprodutivo. Nossos resultados experimentais mostraram que a baixa produção de frutos em relação ao número de flores produzidas por planta é determinada pela limitação de recursos maternos, mas a frutificação natural foi ainda menor do que a capacidade reprodutiva das plantas devido à limitação de pólen na população. A baixa frequência de visitas do polinizador foi o principal fator responsável pela limitação quantitativa de pólen. Evidências indiretas mostraram que a transferência de pólen incompatível, devido ao comportamento do polinizador em visitar diversas flores em uma mesma planta, também pode afetar o sucesso reprodutivo da espécie pela limitação qualitativa de pólen. Experimentos que testaram o efeito das abelhas antagonistas indicam que a pilhagem de pólen pode não ter grande impacto sobre a quantidade de pólen disponível para a polinização e que, eventualmente, abelhas pequenas que coletam recursos, podem atuar como mutualistas. Assim, em condições naturais, a limitação de pólen que afeta o sucesso reprodutivo de J. caroba decorre dos efeitos combinados das interações simultâneas com mutualistas e antagonistas. Palavras chave: limitação de recursos maternos, limitação de pólen, sucesso reprodutivo, Jacaranda caroba 11 Abstract Plants normally present a maximum limit of fruit set that is determined by the maternal resources availability, however, the female reproductive success of certain species is even small than the intrinsic plant potential. In this case, extrinsic factors, as pollen limitation, related to the ecological interactions established with mutualists and antagonists, may interfere and negatively impact the reproduction. The simultaneous investigation of intrinsic and extrinsic factors to the plant can help us to establish the role of each one of them on the low fruit production in angiosperms. In this study we experimentally evaluated the relative contribution of the maternal resources limitation and the pollen limitation over the Jacaranda caroba (Bignoniaceae) reproductive success. We selected this species as model, because it is zoophilous, predominantly xenogamous and has low natural fruiting. Therefore, we tested the following hypothesis: (1) total number of fruits is smaller than the total number of flowers produced by the plant in the absence of pollen limitation; (2) natural fruit set is still smaller than the fruit set plant capacity due to the pollen limitation; (3) low frequency of pollinator visits or inadequate transfer of pollen grains results in quantitative and qualitative limitation, respectively; (4) bees that steal or rob resources act like antagonists negatively affecting, directly or indirectly, the reproductive success. Our experimental results showed that the low fruit set in relation to the number of flower produced per plant is determined by the maternal resources limitation, but natural fruit set was still smaller than the plant reproductive capacity due to the pollen limitation in the population. The low frequency of pollinator visits was the main cause of the quantitative pollen limitation. Indirect evidences showed that the transfer of incompatible pollen, due to pollinator behavior in visiting several flowers in the same plant, can also affect the specie reproductive success by the qualitative pollen limitation. 12 Experiments with antagonist bees indicate that pollen theft may not have a negative impact in the pollen quantity available to the pollination and, eventually, small bees collecting resources, can act like mutualists. Therefore, in natural conditions, the pollen limitation that affects the J. caroba reproductive success comes from the combined effects of simultaneous interaction involving mutualists and antagonists. Word keys: maternal resources limitation, pollen limitation, reproductive success, Jacaranda caroba. 13 2. Introdução As razões subjacentes às baixas taxas de frutificação natural, comumente observadas nas espécies hermafroditas (Stephenson 1981; Sutherland 1987), necessitam ser investigadas de forma integrada. Estudos realizados nas últimas décadas têm enfocado a limitação de pólen (Burd 1994, Larson e Barret 2000, Ashman et al 2004, Knight et al. 2005) ou a limitação de recursos maternos (Stephenson 1981; Sutherland 1987) como fatores associados ao baixo sucesso reprodutivo das plantas. A limitação do êxito feminino devido ao recebimento inadequado de pólen parece ser um fenômeno comum em angiospermas, pois estudos envolvendo dados de centenas de espécies indicam que cerca de 60% delas apresentam limitação de pólen significativa (Burd 1994, Knight 2005). Burd (1994) ressalta que, se a disseminação de pólen através de vetores não é suficiente, então, o êxito reprodutivo de ambos os componentes, masculino e feminino, irão ser limitados; neste caso, o componente feminino será limitado mais pelo número incipiente de cruzamentos (limitação de pólen) do que pela disponibilidade recursos. A alocação de recursos para a reprodução em espécies vegetais hermafroditas é dividida entre a produção de pólen e sementes (Lloyd 1979). Uma vez que ocorreu a polinização adequada, os recursos energéticos da planta-mãe podem limitar o desenvolvimento de frutos e sementes (Stephenson 1981). Assim, o aborto de frutos e a inibição do desenvolvimento de novos botões a partir do início da frutificação podem ser respostas a essa limitação, evidenciando que a reprodução das plantas não depende apenas da quantidade de recurso materno disponível em si, mas também do balanço no investimento do mesmo em cada etapa do ciclo reprodutivo (Stephenson 1981). Além de fatores intrínsecos à planta, nos sistemas naturais a limitação de pólen também pode ser um fator crucial na determinação do sucesso reprodutivo das plantas 14 (Bawa e Webb 1984; Sutherland 1986; Ayre e Whelan 1989). Entretanto, os estudos que investigam a limitação de pólen, normalmente enfatizam a limitação quantitativa, pois se baseiam em comparações feitas entre a fertilização oriunda da polinização natural e a fertilização experimental após suplementação de pólen. Assim, Aizen e Harder (2007) ressaltam que a limitação qualitativa de pólen pode ocorrer muito mais comumente do que se imagina, mas que a mesma não é capturada na abordagem utilizada na maioria dos estudos sobre limitação de pólen. A limitação quantitativa de pólen é caracterizada pelo baixo número de grãos de pólen que chega até as flores, influenciando negativamente a fertilização dos óvulos e a produção de sementes (Ashman et al. 2004; Aizen e Harder 2007). Neste sentido, em espécies hermafroditas o excedente de flores produzidas pode ser interpretado como evidência de investimento no componente masculino, relacionada à dispersão de pólen (Sutherland e Delph 1984). Em espécies zoófilas a limitação quantitativa pode ser decorrente de diversos fatores, tais como a abundância e a composição da fauna de polinizadores (Aizen e Harder 2007), e a eficiência e frequência das visitas legítimas (Aizen 2001; Wilson e Thomson 1991). Outro fator adicional que pode influenciar o sucesso reprodutivo das plantas é a qualidade do pólen depositado sobre o estigma. A chegada de grãos de pólen viáveis e homoespecíficos ao estigma pode ser suficiente para a formação de sementes em algumas espécies vegetais (Ashman et al. 2004). No entanto, há casos em que pode haver limitação qualitativa de pólen devido à transferência de pólen entre flores de uma mesma planta (Herlihy e Eckert 2004). Por exemplo, espécies autoincompatíveis podem enfrentar uma problemática adicional quando uma alta proporção de pólen oriundo de flores da própria planta é depositada sobre os estigmas, podendo diminuir as chances de germinação do pólen advindo da polinização cruzada (Duncan et al. 2004). Este fato 15 pode ser intensificado em espécies zoófilas, pois é comum que os polinizadores visitem sequencialmente diversas flores em um mesmo indivíduo ou em indivíduos próximos, que podem ser aparentados (Snow 1982; Eckert 2000), efetuando a polinização cruzada (sensu Percival, 1965), mas sem que haja a subsequente fertilização. Mutualismos são especialmente susceptíveis aos ‘saqueadores’, espécies que não fornecem qualquer benefício aparente, como no caso dos ladrões de néctar associados ao mutualismo planta-polinizador por Darwin (1841). Assim, além dos polinizadores, que podem atuar diretamente na limitação qualitativa e quantitativa de pólen, as plantas também podem receber visitas de visitantes ilegítimos, que coletam recurso floral sem realizar a transferência do pólen, os quais podem interferir, em intensidades variáveis, na limitação de pólen afetando a reprodução da espécie vegetal. A pilhagem de néctar ou pólen ocorre quando esses recursos são obtidos pelos pilhadores sem danificar a flor, já o roubo de ambos envolve danos físicos à flor (Inouye 1980, Torezan-Silingardi 2012). A pilhagem de pólen pode reduzir a quantidade de pólen que poderia ser retirada e dispersa pelos polinizadores, e assim pode limitar a produção de sementes (do Carmo et al. 2004), contribuindo para a limitação de pólen na população por diminuir a quantidade de gametas masculinos disponíveis para a fecundação (Hargreaves 2007; Hargreaves et al. 2009). No entanto, quando pilhadores de pólen, ocasionalmente, tocam as estruturas reprodutivas e depositam pólen sobre o estigma das flores, podem atuar como mutualistas (Hargreaves et al. 2009, Ballantyne et al. 2015). O roubo e a pilhagem de néctar também podem ter diversos efeitos sobre a reprodução das plantas (Irwin e Brody 1999,Valdivia e González-Gómez 2006). Esses visitantes podem alterar a quantidade e a qualidade do néctar (Valdivia e González- Gómez 2006 ) e modificar o comportamento do polinizadores (Reddy et al. 1992, 16 Valdivia e González-Gómez 2006), afetando indiretamente o sucesso reprodutivo da espécie. No entanto, os efeitos do roubo de néctar são complexos e vão depender da identidade do ladrão e do polinizador, bem como da quantidade de néctar que o ladrão remove e da variedade de recursos disponíveis no ambiente (Maloof e Inouye 2000). Bignoniaceae possui uma ampla rede de interações com os visitantes florais, sendo que 75% das relações são estabelecidas com visitantes que coletam recursos sem realizar transferência do pólen, gerando uma rede modular em que os ladrões de néctar conectam os módulos, enquanto os ladrões de pólen apresentam ligações mais especializadas (Genini et al. 2010). Levando em conta esse cenário, a avaliação do papel de cada grupo funcional se torna importante para melhor entender os fatores envolvidos no baixo sucesso reprodutivo das plantas desta família. Assim, para este estudo, selecionamos como modelo Jacaranda caroba, uma espécie de Bignoniaceae com baixa frutificação natural, predominantemente xenógama e envolvida em uma rica rede de interações, incluindo antagonistas diversos que atuam como pilhadores de pólen, ladrões de pólen, pilhadores de néctar e ladrões de néctar, além de apresentar certa especialização para polinização, com apenas duas espécies de abelhas médias atuando como mutualistas (Guimarães et al. 2008). Considerando que a investigação simultânea de fatores intrínsecos e extrínsecos à planta pode ajudar a estabelecer o papel de cada um deles sobre a baixa produção de frutos em angiospermas, neste trabalho nós avaliamos experimentalmente a contribuição relativa da limitação de recursos maternos e da limitação de pólen sobre o sucesso reprodutivo desta espécie. Dado que a reprodução de uma planta pode ser determinada, pelo menos em parte, pela quantidade de recursos maternos disponíveis, nós esperamos que o número total de frutos seja menor que o número total de flores produzidas pela planta na ausência de limitação de pólen, evidenciando um limite energético da planta- 17 mãe para a reprodução. Por outro lado, a limitação de pólen pode ocorrer em função de variações nas interações ecológicas estabelecidas com mutualistas e antagonistas da comunidade. Dessa forma, nós esperamos que a limitação de pólen possa diminuir o sucesso reprodutivo da planta, seja pela baixa frequência de visitas ou ineficiência dos polinizadores, seja pela transferência de grãos de pólen inadequados (inviáveis, heteroespecíficos ou geneticamente incompatíveis). Separar a limitação quantitativa da qualitativa não é simples, mas segundo Aizen e Harder (2007) pode haver uma mistura destes dois efeitos nos trabalhos que comparam apenas a frutificação natural com a experimental através de suplementação de pólen. Assim, nós procuramos testar experimentalmente quanto de pólen da própria planta uma flor de J. caroba pode receber sem afetar decisivamente a fertilização cruzada. Outro fator que pode afetar o sucesso reprodutivo de uma espécie vegetal é a alta incidência de antagonistas que podem atuar direta ou indiretamente sobre a limitação de pólen. Ladrões geralmente não são polinizadores, segundo Inouye (1980), entretanto, Maloof e Inouye (2000) ressaltam que, em muitos estudos, isso é previamente assumido e que, na verdade, são necessários estudos experimentais para explorar esse pressuposto. Assim, neste trabalho avaliamos experimentalmente se abelhas pequenas, referidas como pilhadoras e ladras de pólen e néctar (Guimarães et al. 2008), podem atuar também como polinizadoras de J. caroba. O objetivo geral deste estudo foi investigar os fatores que podem estar associados ao baixo sucesso reprodutivo Jacaranda caroba. 58 antese não apresentaram indícios de visitas legítimas (estigma com 100 ou mais grãos de pólen). De fato, estudos referem que os polinizadores podem evitar flores e até mesmo plantas que foram exploradas por ladrões de néctar (Maloof e Inouye 2000, Irwin 2000). Algumas espécies de abelhas parecem ser especializadas no roubo de recursos, como, por exemplo, Oxaea flavescens, uma abelha altamente especializada em roubar néctar em flores de Bignoniaceae de cerrado (Gottsberger e Silberbauer- Gottsberger 2006). De fato, dentre as abelhas que roubavam néctar de J. caroba, Oxaea flavescens foi o visitante mais frequente e apresentou comportamento agressivo frente a outros visitantes florais. Com isso, o roubo de néctar poderia de alguma forma alterar o padrão de visitação dos polinizadores e impactar o sucesso reprodutivo das plantas. No entanto, o pico de visitação dos polinizadores foi anterior ao das abelhas que roubavam néctar. Assim, novos estudos utilizando abordagem experimental estão em andamento para melhor compreendermos o efeito dos ladrões de néctar sobre a polinização e o sucesso reprodutivo de J. caroba. 6. Referências Bibliográficas Aizen MA (2001) Flower sex ratio, pollinator abundance, and the seasonal pollination dynamics of a protandrous plant. Ecology 82: 127–144. Aizen MA, Harder LD (2007) Expanding the limits of the pollen-limitation concept: effects of pollen quantity and quality. Ecology 88: 271–281. 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Além disso, a falta de recursos maternos para a reprodução foi evidenciada pela menor produção de flores e maior proporção de frutos abortados em plantas que tiveram um alto esforço reprodutivo, bem como menor frutificação obtida após alto investimento energético no período reprodutivo anterior. No entanto, o que realmente afetou o sucesso reprodutivo em condições naturais foi a limitação de pólen. (2) Limitação de pólen: nesse trabalho evidenciamos dois tipos de limitação de pólen, quantitativa e a qualitativa. Registramos a baixa frequência de visitas dos polinizadores como principal responsável pela limitação quantitativa de pólen na população. A ausência de evidências de visitas legítimas nas flores com danos provenientes da coleta de néctar, sugerem que as abelhas que roubam recursos podem ter um efeito indireto sobre o comportamento dos visitantes legítimos, no entanto, novos trabalhos estão conduzidos para compreender o real impacto dessa interação. Em relação à limitação qualitativa de pólen, temos evidências indiretas de que o comportamento do polinizador em visitar uma sequência de flores na mesma planta pode ocasionar uma diminuição na produção de frutos e sementes devido à transferência de pólen autoincompatível, já que esta espécie é predominantemente 67 xenógama. Nossos resultados indicam que a remoção dos grãos de pólen pelos pilhadores é pouco relevante para o sistema avaliado. Vimos também que esses visitantes, assim como as abelhas pequenas que coletam néctar, podem eventualmente realizar polinização, embora com eficiência inferior ao dos polinizadores, e também contribuírem para o sucesso reprodutivo das plantas. A limitação de pólen encontrada na população de J. caroba se deve às relações ecológicas estabelecidas dentro da comunidade. Os efeitos dessas relações sobre o sucesso reprodutivo de J. caroba são variáveis. Assim, o sistema avaliado nesse trabalho é complexo e mostra que o comportamento de um dado visitante floral durante a coleta de recursos pode ocasionar diferentes efeitos para a planta, podendo ser ora positivos, ora negativos. Assim, em condições naturais, o papel de grupo de visitantes sobre o sucesso reprodutivo não é bem definido, sendo determinado pelas combinações destes efeitos. Dessa forma, grupos descritos principalmente como mutualistas, por exemplo abelhas médias polinizadoras, podem eventualmente atuar como antagonistas, transferindo pólen incompatível ao visitar flores de uma mesma planta; assim como grupos que causam algum tipo de prejuízo para a planta, por exemplo abelhas pequenas pilhadoras e ladras de recursos, podem ocasionalmente contribuir para o sucesso reprodutivo atuando como mutualistas.