UNESP - Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Faculdade de Odontologia de Araraquara Barbara Kuhnen Mensuração da espessura de tecidos moles faciais de crianças e adolescentes brasileiros Araraquara 2018 UNESP - Universidade Estadual Paulista Faculdade de Odontologia de Araraquara Barbara Kuhnen Mensuração da espessura de tecidos moles faciais de crianças e adolescentes brasileiros Dissertação apresentada à Universidade Estadual Paulista (Unesp), Faculdade de Odontologia de Araraquara, para obtenção do título de Mestre em Odontologia, na área de Ciências Forenses. Orientadora: Profa. Dra. Mônica da Costa Serra Coorientador: Prof. Dr. Clemente Maia da Silva Fernandes Araraquara 2018 Kuhnen, Barbara Mensuração da espessura de tecidos moles faciais de crianças e adolescentes brasileiros / Barbara Kuhnen. -- Araraquara: [s.n.], 2018 69 f. ; 30 cm. Dissertação (Mestrado em Odontologia) – Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Odontologia Orientadora: Profa. Dra. Monica da Costa Serra Coorientador: Prof. Dr. Clemente Maia S. Fernandes 1. Antropologia Forense 2. Odontologia legal 3. Crânio 4. Medicina legal I. Título Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária Marley C. Chiusoli Montagnoli, CRB-8/5646 Universidade Estadual Paulista (Unesp), Faculdade de Odontologia, Araraquara Serviço Técnico de Biblioteca e Documentação Barbara Kuhnen Mensuração da espessura de tecidos moles faciais de crianças e adolescentes brasileiros Comissão julgadora Dissertação para obtenção do grau de Mestre em Ciências Forenses Presidente e orientadora: Profa. Dra. Mônica da Costa Serra 2o examinador: Prof. Dr. Marcelo Gonçalves 3o examinador: Prof. Dr. Orivaldo Pereira Ramos Araraquara, 11 de Abril de 2018. DADOS CURRICULARES Barbara Kuhnen NASCIMENTO: 13/02/1993 – Araraquara - SP FILIAÇÃO: Edson W. Kuhnen Patrícia C.P.A.Kuhnen 2000-2010 Ensino Médio (Fundamental e Ensino médio) A A P M da Escola Estadual Eleodoro Ébano Pereira, AAPM, Brasil. 2012-2015 Graduação em Biomedicina. Universidade de Araraquara, UNIARA, Brasil. 2016-2018 Mestrado em Odontologia (Conceito CAPES 6). Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, UNESP, Brasil. Orientador: Mônica da Costa Serra. Bolsista do(a): Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, CAPES, Brasil. DEDICATÓRIA Dedico primeiramente a Deus, por dar-me forças todos os dias para perseverar e alcançar um almejado sonho. Dedico aos meus amados pais, Edson Kuhnen e Patrícia C.P.A. Kuhnen, por me ensinarem com muito amor e carinho a viver com integridade e perseverança, estando sempre presentes em todos os momentos. Por acreditarem, juntamente comigo, que tudo daria certo e ocorreria conforme o querer e o efetuar de Deus. Dedico a todos os meus familiares, alguns mesmo que distantes, sempre demonstraram seu carinho e apoio nessa fase especial. Dedico ao meu amor e companheiro Rafael, pois com toda paciência, sempre se posicionou ao meu lado e me apoiou a cada instante, trazendo-me sempre a memória que tudo daria certo, conforme a vontade de Deus. Dedico aos meus amigos, por estarem presentes em diversas situações, ajudando- me a tornar a caminhada da vida mais leve. Em especial, dedico à minha grande amiga Franciéllen de Barros, pois sempre se fez presente em minha vida, tanto em momentos bons quanto em ruins, demonstrando ser mais que uma amiga, mas sim uma verdadeira irmã. Sou grata, por ter feito parte da minha história, e podermos sonhar e construir todos os dias projetos e objetivos. Hoje, juntas, estamos realizando nosso grande sonho e creio que outras realizações virão. AGRADECIMENTOS Agradeço em primeiro lugar a Deus, por proporcionar-me essa realização tão importante. Pude vivenciar as grandes maravilhas do Seu amor, dando-me fortalecimento, crescimento, preparando-me para que num futuro próximo eu prosseguisse em Seus caminhos, alcançando novos sonhos sem jamais desistir. Sabemos que nada em nossas vidas acontece por acaso. E todos esses dias o agir e o amor de Deus, sempre estiveram presentes, pois conforme Romanos 8:28 “Todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus”. À minha família, pela união e alegria, especialmente aos meus pais, pois não mediram esforços para alcançarmos juntos, essa grande vitória. À minha querida orientadora Profª. Drª. Mônica da Costa Serra, por confiar-me essa almejada oportunidade. E por ter compartilhado seus grandes ensinamentos com muito amor e sabedoria, apresentando–se como um exemplo de professora, orientadora e acima de tudo como uma verdadeira mulher de caráter íntegro e irrepreensivo, nos impulsionando sempre a extrairmos o nosso melhor. Ao meu Coorientador Prof. Dr. Clemente Maia da Silva Fernandes, que se demonstrou sempre presente em carinho, confiança e entusiasmo. Sendo um exemplo de liderança e profissionalismo por sua conduta eficaz. Aos professores, Prof. Dr. Marcelo Gonçalves e Prof. Dr. José Scarso Filho, que confiaram a mim todo auxílio e dedicação para a execução desse trabalho. À CAPES, pelo apoio a essa pesquisa, por meio do Edital Programa Ciências Forenses no 25/2014 – “Pró Forenses”. Ao Departamento de Pós- Graduação da FOAr, que sempre prestaram seus serviços com muita dedicação e excelência. À toda equipe técnica da Biblioteca FOAr, por todo apoio e disposição, fornecendo todos os requisitos necessários aos alunos. À Faculdade de Odontologia de Araraquara da Universidade Estadual Paulista- UNESP, em especial ao Programa de Pós - Graduação em Odontologia, que me proporcionou a realização de um sonho, fornecendo-me todo respaldo e contribuição para um crescimento profissional e pessoal. Kuhnen B. Mensuração da espessura de tecidos moles faciais de crianças e adolescentes brasileiros [dissertação de mestrado]. Araraquara: Faculdade de Odontologia da UNESP; 2018. RESUMO Na sociedade, a identificação humana é indispensável tanto por razões legais como humanitárias. Porém, existem situações em que corpos encontrados não são passíveis de reconhecimento ou quando não há suspeição, impossibilitando a identificação. Nesses casos, análises antropológicas são de extrema importância, pois permitem estabelecer o perfil biológico do sujeito. Assim, realiza-se a Reconstrução Facial Forense (RFF) para possibilitar o reconhecimento e levar a uma possível identificação. A RFF, para ser realizada, precisa dos valores das espessuras de tecidos moles faciais (ETMF) em diversos pontos craniométricos. Essas medidas servem como guia para se estabelecer um limiar do contorno da face e podem ser influenciadas por diferentes fatores como sexo, ancestralidade, idade e índice de massa corporal (IMC). Não há na literatura tabelas de ETMFs de crianças e adolescentes brasileiros, para auxiliarem na RFF. O objetivo desse trabalho foi realizar a mensuração da espessura de tecidos moles de crianças e adolescentes brasileiros, a partir de dados de imagens de Tomografias Computadorizadas de Feixe Cônico (TCFC) de indivíduos vivos, considerando-se as variáveis sexo, idade, cor da pele e índice de massa corporal. Neste estudo, foram mensurados os 21 pontos craniométricos pré- determinados por meio do software Osírix Lite, de imagens de TCFC da região de cabeça e pescoço de 103 não adultos brasileiros (39 crianças e 64 adolescentes), obtidas junto aos arquivos de imagens de uma clínica de Radiografias e Documentações Odontológicas localizada na cidade de Araraquara – SP. De acordo com os resultados obtidos houve diferença significativa (p≤0,05) nos pontos supraglabela, glabela, rinio, supradentale, supraorbital e gonion mensurados em crianças, e na amostra de adolescentes as diferenças significativas existentes foram nos pontos nasion, rinio, filtro-médio, supradentale, infradentale e na eminência frontal. Em todos esses pontos o sexo feminino apresentou média de espessura menor do que a do sexo masculino. Em 16 pontos craniométricos, crianças do sexo feminino brancas apresentaram médias de ETMFs mais baixas do que as não brancas. O mesmo, no sexo masculino, aconteceu com 9 pontos. No ponto gonion, houve evidência de que a média de espessura de crianças com cor da pele não branca é maior do que as brancas, seja qual for o sexo. Adolescentes brancos do sexo feminino apresentaram médias de ETMFs mais baixas do que não brancos em 17 pontos. No ponto suborbital, independente do sexo, a média encontrada para indivíduos brancos foi significativamente menor. Dezesseis adolescentes do sexo feminino com IMC acima do normal apresentaram valores médios de ETMFs maiores do que os com IMC normal. O mesmo ocorreu em 15 pontos nos adolescentes do sexo masculino. Novos estudos são sugeridos para auxiliar nos processos de investigação forense, em especial no que diz respeito à população não adulta brasileira, visto que em nosso país há um alto índice de desaparecimento e de homicídios de crianças e adolescentes. Palavras-chave: Antropologia forense. Odontologia legal. Crânio. Medicina legal Kuhnen B. Measurement of facial soft tissue thickness of Brazilian children and adolescents [dissertação de mestrado]. Araraquara: Faculdade de Odontologia da UNESP; 2018. ABSTRACT In society, human identification is indispensable both for legal and humanitarian reasons. However, there are situations in which bodies found are not recognizable or when there is no suspicion, making identification impossible. In these cases, anthropological analyzes are extremely important, since they allow to establish the biological profile of the subject. Thus, Forensic Facial Reconstruction (FFR) is performed to enable recognition and lead to a possible identification. The RFF, to be performed, needs the values of facial soft tissue thicknesses (FSTT) at several craniometric points. These measures serve as a guide to establish a threshold of the face contour and can be influenced by different factors such as sex, ancestry, age and body mass index (BMI). There are no tables in the literature of FSTTs of Brazilian children and adolescents, to assist in FFR. The objective of this study was to measure the thickness of soft tissues of Brazilian children and adolescents, based on data from Cone-Beam Computed Tomography (CBCT) images of living individuals, considering the variables gender, age, skin color and body mass index. In this study, 21 pre-determined craniometric points were measured using the Osírix Lite software, from head and neck CBCT images of 103 non-Brazilian adults (39 children and 64 adolescents), obtained from the image files of a Clinic of Radiology and Dental Documentation located in the city of Araraquara - SP. According to the obtained results, there were significant differences (p≤0.05) in the supraglabella, glabella, rhinium, supradentale, supraorbital and gonion points measured in children; in the adolescent sample, the significant differences were in nasion, rhinium, middle, supradentale, infradentale and frontal eminence. In all of these points the female sex presented a mean thickness less than that of the male sex. At 16 craniometric points, white female children presented mean FSTTs lower than non-white FSTT s. The same occured in the males group, with 9 points. At the gonion point, there was evidence that the mean thickness of children with non-white skin color was higher than white, regardless of sex. White female adolescents had averages of lower than non-white FSTT s at 17 points. At the suborbital point, regardless of sex, the mean value found for white individuals was significantly lower. Sixteen female adolescents with above-normal BMI had higher mean FSTT values than those with normal BMI. The same occurred in 15 points in the male adolescents. New studies are suggested to aid in forensic investigation processes, especially in regard to the Brazilian non- adult population, since in our country there is a high rate of disappearance and homicides of children and adolescents. Keywords: Forensic Anthropology. Legal Dentistry. Skull. Legal Medicine SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .................................................................................11 1.1 Reconstrução Facial Forense ....................................................13 1.2 Espessuras dos Tecidos Moles Faciais ....................................16 1.3 Métodos Utilizados para Determinar a Espessura dos Tecidos Moles Faciais ................................................................19 1.4 Tomografia Computadorizada e sua Aplicação na Mensuração da Espessura dos Tecidos Moles Faciais ............21 1.5 Variáveis que Influenciam na Espessura dos Tecidos Moles Faciais ..........................................................................................22 1.5.1 Sexo ............................................................................................22 1.5.2 Idade ...........................................................................................24 1.5.3 Índice de massa corporal ........................................................25 1.5.4 Ancestralidade ..........................................................................27 1.6 Crianças Desaparecidas no Brasil ..............................................30 2 PROPOSIÇÃO ..................................................................................32 3 PUBLICAÇÃO .................................................................................33 3.1 Publicação 1 .................................................................................33 4 CONCLUSÃO ..................................................................................50 REFERÊNCIAS ...............................................................................51 APÊNDICE A ...................................................................................60 ANEXO A ........................................................................................69 11 1 INTRODUÇÃO A identidade pode ser definida como “o conjunto de caracteres que individualiza uma pessoa, tornando-a distinta das demais”1,p.640. Ou ainda; “conjunto de características físicas, funcionais e psíquicas, que torna uma pessoa diferente das demais e idêntica a si mesma”2, p.254 . O processo pelo qual se determina a identidade é chamado de identificação1. É fundamental que pessoas mortas sejam identificadas, não somente por questões legais como também humanitárias, visando cessar o sofrimento daqueles que têm um amigo ou familiar desaparecido, sem saber se este está vivo ou morto3. Existem situações em que corpos chegam aos Institutos Médico-Legais (IMLs) em estado deplorável, não sendo passíveis de reconhecimento visual, pois estão em elevado grau de putrefação, esqueletização ou carbonização. Os dados ante- mortem do indivíduo são solicitados quando há suspeita sobre a identidade de determinado corpo, para que esses registros possam ser comparados com os dados post-mortem do corpo encontrado, na tentativa de se estabelecer uma possível identificação. Caso contrário, não havendo um suspeito, os corpos não são identificados, pois não haverá informações de dados ante-mortem para que sejam comparadas com as post-mortem. Nesses casos, análises antropométricas para estimar, ancestralidade, idade, sexo e estatura, são de grande valia. A Reconstrução Facial Forense (RFF), nessas situações será muito importante, pois depois de realizada, poderá ser veiculada na mídia, levando ao reconhecimento e, por conseguinte, aumentando as chances de uma identificação futura4 . A RFF, principalmente em casos de corpos encontrados esqueletizados de pessoas desaparecidas que necessitam ser identificados, é uma importante ferramenta de reconhecimento; por meio da mesma realiza-se a reconstrução da face do indivíduo a partir de um crânio seco não identificado5-8. A RFF já vinha sendo utilizada por antropologistas e anatomistas desde o século passado9. Porém, de acordo com a literatura, o marco inicial da reconstrução craniofacial deu-se no século XIX, quando já se realizava a recriação de faces de pessoas famosas e conhecidas pela sociedade10. Em meados de 1970, antropologistas realizavam reconstruções faciais por meio de dados médicos e odontológicos, para realizar investigações a fim de se 12 obter a identidade de uma pessoa desconhecida. Vale ressaltar que as RFFs servem como um guia nos processos investigativos, promovendo o reconhecimento, mas não estabelecem a identificação da vítima ou do suspeito11. A RFF pode ser manual ou digital, bi ou tridimensional. É considerada clássica ou tradicional a reconstrução facial realizada pela aplicação de argila ou material similar diretamente sobre o crânio11-13. E computadorizada a realizada em computadores, com o emprego de softwares de imagem 3D, utilizando “camadas” que se assemelham aos tecidos moles, em pontos craniométricos pré-determinados 7,14. Assim, o conhecimento da espessura dos tecidos moles que recobrem as estruturas ósseas do crânio e da face é de extrema importância15,16 . Existem três diferentes métodos para a realização de uma reconstrução facial: 1. Método Russo, que delineia as estruturas musculares da face (criado por Mikhail Gerasimov); 2. Método Americano, que realiza a inserção de tecidos moles em pontos craniométricos pré-estabelecidos, de acordo com uma tabela de espessuras pré- determinadas (proposto por Wilton Krogman); e 3. Método de Manchester (desenvolvido por Richard Neave), que corresponde a uma combinação dos dois anteriores17,18. O advento das novas Tecnologias de Informação possibilitou a realização da RFF de modo digital ou computadorizado, trazendo um significativo impacto na seara da identificação humana. O uso de meios digitais pode fornecer, em alguns casos, a identificação de maneira mais objetiva, rápida e segura4. O estudo 3D computadorizado da região craniofacial não vem sendo apenas aplicado na área da criminalística, mas também em identificação de múmias17, de crânios de interesse arqueológico 10 e em casos relacionados à Antropologia Forense e cirurgias com finalidade médica ou estética, dentre outros6,19-21. Os progressos na ciência da computação e os novos recursos na imaginologia médica e odontológica, tiveram uma grande influência na área pericial. Novos dados de parâmetros relativos à espessura dos tecidos moles faciais (ETMF), em adultos e crianças, foram obtidos por meio do uso de Tomografia Computadorizada (TC), Ultrassom (US), e Ressonância Magnética (RM) 2,5,6,10,16,22,24,25. O emprego destas novas tecnologias possibilitou RFFs mais precisas e acuradas22,26. 13 As medidas de espessuras de tecidos moles utilizadas para RFF advêm de trabalhos desenvolvidos com populações estrangeiras, devido à ausência de informações específicas para a população brasileira. Até a presente data, a população brasileira possui cinco tabelas de ETMFs elaboradas. Duas foram obtidas por meio de punção com agulha em cadáveres27, uma por meio de RM28 e outra por meio de TC29. A quinta tabela é referente a dados obtidos por meio de radiografias laterais da face de crianças. Porém, este trabalho apresenta somente dados para a linha média da face30, não apresentando dados suficientes para o estabelecimento de tabelas de ETMFs para população infantil. A ETMF de um mesmo indivíduo pode variar de acordo com o seu estado nutricional, além de outros fatores, como a idade. Ou seja, um sujeito com índice de massa corporal (IMC) considerado normal, quando obeso, terá os tecidos moles de sua face com maior espessura, o inverso ocorre caso este mesmo sujeito perca peso e atinja um IMC de pessoas consideradas magras31. Por esta razão, alguns autores propõem tabelas de espessura de tecidos moles que apresentam, para uma determinada população, dados para sujeitos magros, normais e obesos11,22,32-34. Além disso, utilizar a mesma tabela com valores de ETMFs de adultos em crianças e adolescentes se torna inviável, pois com a idade as espessuras também podem sofrer variações, o que pode trazer informações errôneas para a realização de uma reconstrução35,36. Vale ressaltar que, infelizmente, o número de crianças em idade escolar que desaparecem em nosso país é muito elevado, sendo frequente a necessidade da identificação de crianças e adolescentes37. Portanto, o fato de haver poucas publicações referentes às ETMFs de crianças e adolescentes de populações estrangeiras, e a inexistência destes referentes à população brasileira, levaram-nos a desenvolver este trabalho. 1.1 Reconstrução Facial Forense Na sociedade, a identificação humana é indispensável tanto por razões legais como humanitárias. Há diversas atividades periciais e, dentre elas, as que buscam estabelecer a identidade humana, por meio de métodos de identificação. Estes implicam em processos comparativos de dados anteriores que possam ser 14 comparados com os encontrados quando da necessidade do estabelecimento da identidade. No caso da identificação de mortos, o primeiro registro é ante-mortem, e o segundo é post-mortem. De acordo com a Interpol, há vários métodos utilizados, como a datiloscopia, a análise de dados odontológicos e a análise de DNA, que são considerados métodos primários de identificação38. Porém, apesar da introdução da análise do DNA na identificação, existem muitos casos em que não há chances de identificação. Aproximadamente 10% dos cadáveres desconhecidos não são identificados por meio de dados odontológicos ou de outros métodos39. Além disso, existem situações em que são encontrados corpos em estado de putrefação ou esqueletização, e os mesmos não podem ser identificados, pois muitas vezes, não há um “suspeito” (e, portanto não há dados ante-mortem para serem comparados com os post-mortem). Nesses casos, análises antropométricas para estimar, por exemplo, idade, sexo e estatura, são de grande valia. Em contextos assim, a RFF será muito importante, pois pode possibilitar o reconhecimento do indivíduo e, por conseguinte, aumentar as chances de identificação40. A reconstrução facial é um método de recriação da aparência facial de uma pessoa, a partir de um crânio seco não identificado. Como a face é uma estrutura biológica, a realização dos métodos de reconstrução depende de um conhecimento preciso da anatomia facial41. Aulsebrook et al.42 definem RFF como sendo a reprodução das características da face perdidas ou desconhecidas de um indivíduo, com a finalidade de reconhecimento e por conseguinte a identificação. A primeira utilização da reconstrução facial foi na Alemanha, no final do século XIX, sendo empregada por antropologistas americanos que tinham a finalidade de trazer de volta a aparência de esqueletos encontrados em sítios arqueológicos. Snow et al.43, por meio de sua publicação puderam demonstrar pela primeira vez que havia grandes chances do uso deste processo na área das Ciências Forenses11. Os pioneiros na aplicação da metodologia de reconstrução facial foram os russos; sua técnica baseia-se no delineamento das estruturas musculares e outros 15 tecidos sobre o crânio humano44. Os norte-americanos realizam a aposição de tecido mole em determinados pontos da face, de acordo com as espessuras pré- determinadas13,44,45. E o método conhecido como Manchester tem como metodologia a combinação dos dois métodos anteriores13. A RFF pode ser manual ou digital40, sendo considerada clássica ou tradicional a reconstrução realizada pela aplicação de argila ou material similar diretamente sobre o crânio11-13. A reconstrução facial plástica corresponde à modelagem em argila dos tecidos da cabeça e face de um crânio não identificado, ou de sua réplica, na tentativa de uma reprodução da sua imagem em vida42. A aplicação de argila em crânios humanos tem a finalidade de produzir uma aparência do indivíduo morto. Assim, fotografias das faces produzidas podem ser divulgadas na mídia para que possam ser reconhecidas, permitindo uma futura identificação, que poderá ser realizada com o emprego dos métodos tradicionais11. Snow et al.43 realizaram reconstruções faciais plásticas de duas pessoas, uma do sexo feminino e a outra do sexo masculino. Estas foram comparadas com fotografias de outros seis sujeitos do mesmo sexo, ancestralidade e faixa etária. Houve um reconhecimento do primeiro sujeito por 26% dos examinadores, o segundo foi reconhecido por 67% dos avaliadores. Para Wilkinson46, a reconstrução facial pode ser considerada como a alternativa final em uma investigação forense. A reconstrução facial e a campanha publicitária com a divulgação da mesma trazem a possibilidade do reconhecimento por alguém que o conhecia, levando a uma possível identificação. Além disso, ressalta-se que a RFF não é considerada um método de identificação, mas sim uma ferramenta para o reconhecimento. Por meio desta, realiza-se a produção de uma lista de nomes, a partir da qual o indivíduo poderá ser identificado por meio de métodos primários de identificação14,46-48. De acordo com Olivarría49, a reconstrução facial plástica ou manual, é uma tarefa complexa, o que confere aos especialistas a necessidade da obtenção de um aprimoramento e preparo a fim de chegarem a um resultado positivo. O advento de novas Tecnologias de Informação possibilitou a realização da mesma de modo digital ou computadorizado, trazendo um significativo impacto na 16 seara da identificação humana. O uso de meios digitais, além de facilitar o processo de reconstrução, traz a possibilidade da realização de mais de uma reconstrução digital da face do suspeito, possibilitando maiores chances da obtenção de uma identificação mais objetiva, rápida e segura40. O reconhecimento facial é considerado como a parte mais subjetiva do processo, uma vez que depende da percepção humana; o mesmo pode ser auxiliado por métodos digitais, possibilitando a diminuição de erros50. Evison et al.51 consideram a reconstrução facial como o último recurso da investigação forense, sendo presente em um considerável número de casos, pois há situações em que os métodos de identificação não podem ser realizados. Fernandes40 afirma que o objetivo da realização da RFF é veicular ao público a existência de um indivíduo não identificado. Espera-se com esta publicação o estímulo do reconhecimento por familiares e pessoas próximas, trazendo a possibilidade de gerar uma lista restrita de suspeitos, e com isto, levantar chances de futuras análises para o estabelecimento da identidade, a ser determinada a partir de informações trazidas pelos familiares e amigos próximos, de dados ante-mortem para comparação e identificação. Vale lembrar que a reconstrução facial não corresponde a uma fotografia do indivíduo enquanto vivo, mas pode ser suficientemente realista para produzir uma boa resposta do público, trazendo resultados positivos à identificação7,8,10,22,25,51-53. A RFF é uma ferramenta de reconhecimento18,35,47 que depende do conhecimento das características populacionais e da análise das medidas de tecidos moles da face que recobrem os pontos craniométricos pré- estabelecidos, a fim de proporcionar grandes chances de uma identificação42,54. 1.2 Espessura dos Tecidos Moles Faciais Para a realização da reconstrução facial é necessário um conhecimento prévio da espessura dos tecidos moles que recobrem as estruturas ósseas do crânio e da face15. Essas medidas servem como guia para se estabelecer um limiar do contorno facial. Os valores das ETMFs podem variar de acordo com diferentes fatores, tais como idade, sexo e índice de massa corporal - IMC35,36. 17 A reconstrução facial possibilita restabelecer os contornos dos tecidos moles a partir de um crânio seco, produzindo uma face e aumentando a probabilidade de reconhecimento. Assim, a avaliação dos valores de ETMF observados nas diferentes populações possibilita a confiabilidade desta técnica27. Os ossos cranianos são determinantes na aparência facial45. As técnicas de RFF baseiam-se no entendimento das espessuras dos tecidos e da variação do esqueleto24. Outros autores afirmam que a reconstrução facial depende das ETMFs5. Igualmente, Wilkinson46 entende que a técnica de reconstrução facial necessita de dados sobre a ETMF para a sua execução, e Vanezis55 afirma que é essencial para a reconstrução facial o conhecimento da espessura de tecidos moles em pontos craniométricos específicos. A pesquisa pioneira realizada a fim de avaliar as ETMFs foi realizada por Welcker, anatomista alemão, que mediu nove pontos da linha média sagital em 14 cadáveres do sexo masculino, em 188353. Com o avanço e a expansão da RFF, novos dados sobre ETMFs e inovações nas metodologias de obtenção desses dados foram trazidos à literatura. Com o desenvolvimento dos exames imaginológicos foi possível à mensuração dessas espessuras em indivíduos vivos, utilizando as radiografias laterais de face, o US, a RM e a TC56. As TCs, consideradas um método não invasivo de obtenção de medidas de ETMFs, trazem a possibilidade de acesso aos dados existentes em indivíduos vivos57. Os métodos consagrados para a realização de reconstrução facial baseiam- se na aplicação de marcadores que representam a espessura dos tecidos moles em pontos craniométricos de referência16,46,53. Estes correspondem a pontos localizados no esqueleto, bastante utilizados como referência em craniometria e cefalometria. Além disso, possuem grande valia no estudo da RFF, visto que por meio deles se obtém os valores médios de ETMFs. Stephan e Cicolini58 afirmam que as ETMFs, em pontos craniométricos definidos, funcionam como guias para a deposição do material representante de tecidos moles. 18 Não existe uma padronização de conjuntos de pontos anatômicos para se empregar na RFF59. Porém, convencionalmente, os trabalhos fazem uso dos marcos descritos por Prag e Neave56, que estão a seguir apresentados, na Figura 1: Figura 1 - Pontos craniométricos Fonte: Prag, Neave56,p.256 Na literatura internacional há várias tabelas de espessura de tecidos moles publicadas, referentes a determinadas populações de indivíduos adultos dos sexos masculino e feminino, como brancos americanos32, negros americanos11, portugueses34, europeus53, chineses60, franceses61, tchecos35, sudaneses62, alemães63, entre outros. Para algumas populações, há várias tabelas, propostas por diferentes autores. Porém, há poucos trabalhos internacionais com propostas de tabelas de ETMFs para crianças e adolescentes. Populações como sul-africanos64, japoneses65-67, canadenses68, brasileiros30, paquistaneses69, italianos36, entre outras, possuem os dados em tela propostos para indivíduos não adultos. As ETMFs de um mesmo indivíduo podem variar de acordo com o seu estado nutricional, além de outros fatores, como a ancestralidade, idade e sexo31. Wilkinson et al.70 reconstruíram 6 faces de um mesmo crânio a partir de dados de ETMFs de populações distintas. Os resultados obtidos pelos autores foram 19 melhores quando a RFF foi realizada com as informações teciduais do grupo populacional ao qual o indivíduo pertencia. O mesmo ocorreu num estudo realizado por Fernandes et al.4 , em que foram realizadas Reconstruções Faciais Forenses Digitais (RFFDs) de um indivíduo brasileiro utilizando padrões de ETMF estrangeiros e nacionais. O indivíduo a quem pertencia o crânio apresentou taxas de reconhecimento mais elevadas com as informações teciduais nacionais. Stephan71 destaca a grande importância do uso de dados com maior precisão nas técnicas de RFF. Vários questionamentos surgiram devido à utilização dos mesmos dados teciduais em populações distintas. O uso de tabelas de ETMFs em populações específicas possibilita maior acurácia na RFF. Além disso, a organização dos dados de ETMF deve ser comumente feita em relação ao sexo, idade e massa corpórea não apenas pelo fator “população”. 1.3 Métodos Utilizados para Determinar a Espessura dos Tecidos Moles Faciais Com o advento de novas tecnologias e a expansão da realização de RFFs, novos dados sobre ETMFs e a obtenção destes foram trazidos à literatura. O desenvolvimento de exames imaginológicos possibilitou a realização da mensuração dessas espessuras em indivíduos vivos, utilizando as radiografias laterais de face, o US, a RM e a TC2. Estes diferentes métodos possuem vantagens e desvantagens57. A realização da punção por agulhas em cadáveres tem, como aspectos positivos, a não movimentação durante a mensuração, pelo fato de serem mensurados indivíduos mortos. Além disso, o baixo custo, o não envolvimento de radiação e a realização da mensuração da região da cabeça de forma direta, também são positivos. Os aspectos negativos podem ser considerados o fato de ser um método invasivo e de ocorrerem alterações teciduais post-mortem. Além do efeito da gravidade devido à posição supina dos indivíduos, o que pode levar a uma interferência nas espessuras. Outra desvantagem corresponde às dúvidas que podem ser suscitadas em relação à localização dos pontos craniométricos, pois devido à deformidade dos tecidos, a inserção da agulha na pele pode interferir na mensuração57. 20 As radiografias possuem vantagens como: a posição vertical dos pacientes, ser um método não invasivo, podendo ser utilizado em indivíduos vivos, além de não haver contato direto com os pacientes. Porém, a radiação presente e a possibilidade da existência de artefatos na imagem, apresentam–se como desvantagens57,72. O US possui vantagens significativas: é um método não invasivo, pode ser medido em participantes vivos e não coloca em risco a saúde do indivíduo por não emitir radiação. Além disso, apresentam informações relevantes, permitindo estudos em amostras populacionais maiores73. Stephan e Preisler74 realizaram um estudo utilizando o US a fim de mensurar as ETFMs de 63 australianos vivos em posição vertical e supina. A mensuração foi feita em 14 pontos craniométricos. O estudo foi comparado com outros pré- existentes que utilizaram amostras cadavéricas da mesma população. Dentre os resultados, apenas 2 pontos em relação aos 14 analisados tiveram valores superiores a 1 mm quando houve mudança de posição. Os valores obtidos, quando comparados aos dados pré-existentes, foram similares em sua maioria. Porém, há desvantagens no emprego do US, pelo fato do aparelho ficar em contato com a pele, ocasionando a compressão dos tecidos, influenciando na precisão e mensuração das espessuras de tecido mole. Hwang et al.75 também citam que há grande demanda de tempo para a obtenção dos dados por meio do US, sendo este um fator limitante em caso de grandes amostras. Com o intuito de aumentar a precisão da coleta de dados da espessura dos tecidos moles em indivíduos vivos, a RM se apresenta como uma nova alternativa, podendo auxiliar positivamente nas reconstruções faciais76. Os exames de RM apresentam vantagens, destacando-se o não envolvimento de riscos de radiação, a boa confiabilidade e podem apresentar medições reprodutíveis77. Porém, a presença de artefatos, o alto custo e a disposição dos corpos em posição supina, em que a gravidade existente pode interferir na profundidade dos tecidos moles, representam desvantagens57. Claes et al.8, Jones78, Nelson e Michael52, Phillips e Smuts64, Quatrehomme et al.79 e Rocha80 fizeram uso da TC na mensuração dos tecidos moles da face. Esta técnica tem como vantagem o fornecimento de informações de tecidos duros e moles sem que as estruturas estejam sobrepostas. https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S037907381730470X?via%3Dihub#! 21 As TCs de feixe cônico (ou Cone-beam) são consideradas exames que apresentam maior precisão, pois além das vantagens existentes de uma TC, possuem alta resolução, agilidade na aquisição dos dados e menor quantidade na emissão de raios ionizantes. Além disso, devido à posição do paciente, há uma diminuição da distorção causada nos tecidos moles pela força da gravidade81. As principais desvantagens são em relação às exposições ionizantes e o alto custo dos equipamentos82. 1.4 Tomografia Computadorizada e sua Aplicação na Mensuração da Espessura dos Tecidos Moles Faciais Os exames imaginológicos são considerados como as metodologias com maior confiabilidade na obtenção de dados de ETMFs, por permitirem localizar os pontos anatômicos de interesse de maneira precisa e trazerem mensurações reprodutíveis57,81. Para Tyrell et al.25 , a grande problemática com a técnica de reconstrução facial reside na obtenção de dados de espessuras de tecidos utilizadas para reconstruir a face do indivíduo. Com os avanços tecnológicos, a captação de dados digitais a partir de imagens tridimensionais de indivíduos vivos utilizando TCs ou RMs proporcionou a obtenção das mensurações com significativa precisão, gerando melhorias na realização das reconstruções. As TCs podem auxiliar nas reconstruções faciais, servindo como fonte de imagem (Apêndice A). Rocha et al.6 desenvolveram um estudo em que observaram que as medidas lineares realizadas nas reconstruções em três dimensões (3D) de uma TC em cinco cadáveres, foram precisas, com alta qualidade e resolução de imagem. Kim et al.5 realizaram as mensurações fisicamente e por meio de TC em um cadáver. As medidas físicas foram realizadas por dois examinadores com o emprego de um paquímetro digital, e as medidas digitais foram por meio da TC. Os autores encontraram diferenças significantes entre as medidas realizadas por TC e as realizadas fisicamente em 10 mensurações, concluindo que protocolos de TC podem ser utilizados na mensuração de ETMFs com precisão. 22 Andersson e Valfridsson39 realizaram a reconstrução digital da face de um indivíduo, a fim de demonstrar que a mesma pode ser feita através da utilização de imagens de TC. Segundo Turner et al.24, tanto a estrutura óssea como os tecidos moles são diferenciados em uma TC, trazendo a possibilidade da extração de superfícies para crânios e tecidos moles, para a realização da mensuração das espessuras. Lopes et al.83 realizaram um estudo a fim de determinar a precisão de medidas angulares com o emprego de TC 3D. Foram realizadas 6 medidas angulares, baseadas em 9 pontos craniométricos de 28 crânios secos. Os autores puderam concluir que as medidas obtidas foram precisas, e por meio desta técnica foi possível distinguir a anatomia craniofacial em protocolos de tecido ósseo. Nos últimos anos, o desenvolvimento da Tecnologia da Informação, incluindo as imagens médicas, teve grande relevância no processo de RFF. Além disso, por meio das imagens de TCs, o crânio pode ser visualizado como uma estrutura bem definida. O tecido mole pode ser facilmente separado da estrutura óssea por meio das TCs53. Ramsthaler et al.84 constataram que, nos últimos anos, exames imaginológicos, em especial TCs e RMs, vem sendo aceitos como métodos não invasivos na área forense. Em situações post-mortem, incluindo análise de traumas, identificação, entre outras, a TC é uma ferramenta com grande utilidade. 1.5 Variáveis que Influenciam na Espessura dos Tecidos Moles Faciais A ETMF de um mesmo indivíduo pode variar devido determinados fatores, como sexo, estado nutricional, ancestralidade e idade35,36. Estes fatores têm sido considerados como significativos e importantes no estabelecimento da individualização da RFF85. 1.5.1 Sexo De acordo com estudos realizados, vários autores afirmam, de modo geral, que os valores de ETMFs são maiores para indivíduos do sexo masculino, quando comparados aos valores encontrados para o sexo feminino22,69,77,86,87. 23 Lebedinskaya et al.73, observaram ligeira variação entre os sexos nas análises que realizaram. Para Garlie e Saunders88 o sexo masculino possui maiores valores tissulares na face, comparado ao feminino, porém são significativos somente após os 14 anos de idade. No estudo de Simpson e Henneberg15, os resultados foram evidentes nas diferenças de médias para homens e mulheres. Os homens, em geral, apresentaram maiores valores de espessuras de tecidos moles em relação às mulheres. Também para De Greef et al.22, os dados tissulares na população masculina foram maiores do que na feminina. Para Sahni et al.77, os dados para variações observadas nas ETMFs, considerando-se o sexo, foram maiores no sexo masculino do que no feminino em pontos correspondentes, ocorrendo exceções em alguns marcos laterais do rosto. Do mesmo modo, Stephan e Simpson57, a partir de dados de ETMFs de caucasoides obtidos de seu estudo, puderam verificar que os homens obtiveram maiores valores de ETMFs em relação às mulheres em quase todos os pontos craniométricos, com exceção na região das bochechas. De Greef et al.89 realizaram uma análise de dados de ETMFs por meio de US de 967 indivíduos. Dentre os pontos craniométricos mensurados, a lateral da órbita foi o ponto que apresentou maior diferença entre os sexos. Além disso, verificaram que a região das bochechas é mais espessa em mulheres, já os outros pontos tiveram espessuras maiores em homens. Panenková et al.82 em seu trabalho, também encontraram grandes diferenças entre os sexos para a região “lateral da órbita”. Jia et al.90 investigaram fatores que influenciam nas ETMFs, tais como o sexo e o índice de massa corporal. Neste estudo, as espessuras dos tecidos de 12 pontos variaram de forma significativa entre homens e mulheres. Da mesma forma, em estudos da população chinesa, Shui et al.91 estudaram imagens radiográficas de 171 indivíduos adultos, observando que a espessura dos tecidos são maiores em homens do que em mulheres. 24 Strapasson et al.92, em seu estudo, mostraram que houve diferenças significativas nas medidas de ETMFs de homens e mulheres, ao realizarem a correlação entre a cartilagem alar e a abertura piriforme. No estudo feito por Gomez et al.93 os autores puderam observar as diferenças entre os sexos nas relações entre os tecidos moles da sínfise mandibular, a classe esquelética e o padrão facial. 1.5.2 Idade Os tecidos moles podem sofrer mudanças com o avanço da idade, que variam de indivíduo para indivíduo13. Zylinski et al.94 observaram variações nas espessuras dos tecidos moles faciais de meninos entre 5 e 10 anos e de homens entre 22 a 32 anos. Puderam verificar que, comparando as médias das variáveis para os dois grupos, houve um indicativo de que a face do adulto é diferente da face da criança de maneira significativa. Garlie e Saunders88, em seu estudo sobre o mesmo tema, concluíram que há um aumento das espessuras do tecido com o crescimento dos indivíduos, examinando ETMFs de jovens de 8 a 20 anos. Para a avaliação de alterações nas ETMF em relação à idade, Stephan e Simpson57 analisaram dados de cinco trabalhos que realizaram mensuração ETMFs de indivíduos não adultos, e observaram que os tecidos moles faciais podem sofrer aumento ou diminuição de acordo com o avanço da idade. A alteração mais expressiva ocorreu entre 1 e 18 anos de idade, no filtro médio. Sahni et al.77 também estudaram a relação de espessura dos tecidos moles com a idade em ambos os sexos. Os autores encontraram uma correlação significante da espessura facial com o avanço da idade em determinados pontos dos indivíduos do sexo masculino. Panenková et al.82 analisaram ETMFs utilizando TCs e puderam verificar que a espessura do filtro médio diminui com a idade. Briers et al.95 realizaram um estudo com o objetivo de fornecer informações sobre ETMFs para crianças sul-africanas. Verificaram as diferenças existentes das espessuras com relação à idade, sexo e grupos étnicos. Um número amostral de 388 radiografias de crianças de 6 a 13 anos foi utilizado. Foram mensurados 10 25 pontos. Os autores mostraram que, de acordo com seus resultados, há diferenças de ETMFs em relação a sexo, etnia e idade. Drgáčová et al.35 realizaram um trabalho para a população adulta Checa a fim de definir valores de ETMFs considerando as variáveis sexo, idade e assimetria facial. Foi demonstrada uma influência significativa da idade na face superior das mulheres. Já nos homens, a idade teve um efeito significativo em 4 pontos de referência. Segundo estes autores, os valores de ETMFs tenderam a aumentar com a idade, tanto para os homens como para mulheres. Gibelli et al.36 mensuraram, em radiografias cefalométricas as ETMFs sobre a linha média de crianças e adolescentes brancos italianos, entre 6 e 18 anos de idade, e observaram variações das espessuras estudadas, em relação a idade e sexo. Afirmaram serem necessários mais dados populacionais referentes às ETMFs para as crianças italianas. 1.5.3 Índice de massa corporal Embora existam vários indicadores para estimar a quantidade de tecido adiposo, o índice de massa corporal (IMC) tem sido recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para avaliação do estado nutricional de crianças e adolescentes96. É utilizado principalmente devido à facilidade e baixo custo de sua obtenção97,98. No entanto, enquanto nos adultos existem pontos de corte bem estabelecidos para classificar o IMC, em indivíduos não adultos diferentes critérios podem ser utilizados para essa classificação99,100. Para crianças e adolescentes, o IMC é específico para idade e sexo. Nesta população, o diagnóstico do estado nutricional é realizado através do cálculo do percentil. Este é calculado utilizando coeficientes parametrizados com as informações de sexo, idade, peso corporal (kg) e estatura (m²) informados. As classificações utilizadas, a partir do valor de IMC encontrado para crianças e adolescentes, são: baixo peso (BP), IMC inferior ao percentil 3; peso normal (PN), IMC superior ao percentil 3 e inferior ao percentil 85; sobrepeso (SP), IMC superior ao percentil 85 e obesidade (OB), IMC igual ou superior ao percentil P 97, para idade e sexo101. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=Drg%C3%A1%C4%8Dov%C3%A1%20A%5BAuthor%5D&cauthor=true&cauthor_uid=26860069 26 O IMC pode influenciar na conformação da face e, consequentemente, nas ETMFs. Isto se torna relevante no Brasil, pois pesquisas nacionais evidenciaram que 4,8% das crianças menores de 10 anos e 4,6% entre um e quatro anos de idade apresentam sobrepeso102-105. Assim, há necessidade de se levar em consideração o IMC do indivíduo, quando se for confeccionar uma RFF, possibilitando reconstruções faciais mais semelhantes ao indivíduo, e favorecendo o seu reconhecimento. Starbuck e Ward44 analisaram os efeitos das variações das ETMFs nas reconstruções, no que diz respeito ao estado nutricional: magro, normal, e obesos. Confeccionaram três reconstruções de um mesmo crânio – uma para cada estado nutricional. Os resultados evidenciaram diferentes taxas reconhecimento, em função das tabelas utilizadas. Estes autores indicam a confecção de várias RFFs para um mesmo sujeito, considerando-se os vários IMCs, com o objetivo de aumentar as chances de reconhecimento. Sahni et al.77 verificaram que as variações nos tecidos da face de sujeitos masculinos estão mais relacionadas com o IMC quando comparados aos tecidos faciais femininos. De Greef et al.89 verificaram a influência da massa corporal nas ETMFs, constatando que as regiões de mandíbula e bochechas são as áreas mais influenciadas. Guyomarc’h et al.61, realizaram um estudo utilizando 500 TCs de indivíduos vivos da França, e coletaram dados de ETMFs em 37 pontos craniométricos. Foram levados em consideração o sexo, a idade, e o IMC. Os autores puderam verificar a existência de correlações significantes entre ETMF e massa corporal. Baillie et al.106 investigaram as ETMFs de dois grupos de mulheres e verificaram que, em todos os pontos estudados, o IMC exerceu influência nos valores médios de tecidos obtidos, exceto no ponto prostion. Kotrashetti e Mallapur107 observaram as espessuras tissulares de indivíduos adultos do sul da Índia, correlacionando-as com as variáveis de sexo, idade e outros parâmetros do corpo. Os resultados demonstraram que o IMC possui um papel importante na alteração das ETMFs. Além disso, os fatores idade, sexo e estatura devem ser considerados para reconstruções faciais futuras. 27 Buyuk et al.108 realizaram uma análise das ETMFs e das larguras transversais do crânio por meio de radiografias cefalométricas laterais e postero-anteriores de 80 adolescentes com diferentes IMCs, os quais foram divididos em três grupos de acordo com o percentil: indivíduos de peso normal, com sobrepeso e obesos. Observaram que a espessura do ponto nasion foi maior em indivíduos com sobrepeso; enquanto que a da glabela, pogonion e gnathion foi maior em indivíduos obesos. As larguras cranianas foram semelhantes em todos os indivíduos. 1.5.4 Ancestralidade A população brasileira é uma das mais heterogêneas do mundo; é resultado de cinco séculos de miscigenação entre povos de três continentes: os colonizadores europeus, sobretudo portugueses, os africanos e os indígenas109. A partir do século XIX, o Brasil passou a receber também considerável número de imigrantes, podendo-se destacar portugueses e italianos, seguidos de espanhóis, alemães, japoneses e sírio-libaneses110. Pela heterogeneidade e miscigenação de nosso país, os valores de referência de tabelas de ETMFs produzidas de diferentes povos apontam para diferenças que devem ser consideradas na aplicação da técnica de RFF em indivíduos brasileiros111. Schwartzman112 afirma que o Brasil não possui demarcação específica entre populações, em termos de características étnicas, culturais ou históricas, o que dificulta a classificação dos indivíduos. O IBGE113 considera, de acordo com o censo populacional, cinco categorias para a classificação dos indivíduos de acordo com sua cor ou raça: branca, preta, amarela, parda e indígena. Para Grover et al.114, a análise da ancestralidade está atrelada à morfologia do crânio e de características dentárias específicas das populações. As técnicas cranioscópicas e craniométricas permitem, no processo de análise craniana, identificar a variabilidade de sua morfologia115. Vale ressaltar a necessidade de estudos específicos para cada população, os quais podem ser dificultosos devido às características antropológicas de cada 28 grupo populacional, diferenciadas por conta das condições climáticas, genéticas, alimentares e socioculturais116. Albanese e Saunders117 consideram a estimativa da ancestralidade como um alvo importante no tratamento de questões forenses. Vanrell118 propôs facilitar o estudo da variabilidade populacional, agrupada em grandes troncos geográficos e raciais: caucasoide, mongoloide e negroide, agrupando tendências no conjunto de fatores anatômicos como cor da pele, forma do crânio ou forma do cabelo e caracteres prosopográficos. Em relação ao nosso país, há uma dificuldade maior em diferenciar os grupos populacionais e determinar seu perfil, devido o alto grau de miscigenação119. De acordo com Vanrell2, traços morfológicos podem ser encontrados em características cranianas específicas, as quais podem ser analisadas por meio de estudos craniométricos e cranioscópicos. A craniometria está relacionada a medidas das dimensões dos ossos cranianos115 e com isso, pode-se avaliar índices craniométricos, como por exemplo, os índices facial, nasal, horizontal, vertical e transversal2. O índice nasal é também importante para a estimativa da ancestralidade. L’Abbe´ et al.120 entendem que a abertura piriforme apresenta uma relação com a ancestralidade estatisticamente significativa. Roquette-Pinto121, para identificar os tipos antropológicos do Brasil, utilizou como critério de classificação a pigmentação da pele e a morfologia do crânio, reunindo quatro grupos antropológicos caracterizados na população brasileira como: leucodermas (brancos), faiodermas (miscigenação entre brancos e negros), xantodermas (miscigenação entre brancos e índios) e melanodermas (negros). Phillips e Smuts64 realizaram mensurações de ETMFs de pessoas miscigenadas na África do Sul com a finalidade de empregar tais informações para a reconstrução facial. Os autores puderam concluir que os resultados obtidos são representativos daquele grupo populacional, e que pesquisas com outras populações para a obtenção de dados específicos devem ser realizadas, a fim de serem aplicados na reconstrução de faces de populações de origem miscigenadas. Além disso, os rostos de homens e mulheres do grupo racial 29 misto apresentaram diferenças importantes quando comparados aos rostos de norte- americanos brancos. Hashim e Albarakati122 encontraram diferenças significativas na maior parte das espessuras dos tecidos moles da população saudita, em comparação com outros grupos populacionais. De acordo com Tedeschi-Oliveira31, as diferentes etnias foram consideradas como um dos fatores que podem exercer influência nas ETMFs, as quais foram alvo do estudo de variadas populações. Como a população da Ásia Central, estudadas por Lebedinskaya73, negros americanos por Rhine e Campbell11, brancos Australianos por Domaracki e Stephan122 e Simpson e Henneberg15; Zulus da África por Aulsebrook et al.124, Sauditas por Hashim e Albarakati122 e indianos do noroeste da Índia por Sahni et al.77. Do mesmo modo, Sahni et al.77, comparando as ETMFs obtidas de indivíduos do noroeste da Índia aos trabalhos de outras populações, encontraram variações consideráveis. De acordo com Cunha125, a análise da ancestralidade não pode ser taxativa, mas deve servir como probabilidade do indivíduo pertencer a um certo grupo populacional. Isto ocorre devido ao fato do Brasil ser um país muito miscigenado, dificultando as estimativas. O entendimento de que a reconstrução facial deve ser realizada baseada em estudos de espessuras teciduais, de acordo com a ancestralidade do crânio utilizado é disseminado na literatura científica 27,31,46, 126-128. Otto129 observou que a miscigenação brasileira confere aos indivíduos características bem marcantes, trazendo determinada complexidade aos estudos. Esta autora analisou 6 crânios, obtendo resultados diferentes para o mesmo crânio. Ou seja, o crânio de um mesmo indivíduo apresentou características populacionais de negro, amarelo e branco. Porém, segundo a autora, foram encontradas características craniofaciais que indicavam para um determinado perfil de ancestralidade. 30 1.6 Crianças Desaparecidas no Brasil O desaparecimento de pessoas, em especial de crianças e adolescentes, tem sido um tema recorrente, apresentado pela na mídia no Brasil. Embora provoque uma comoção geral na população, pois mostra dramas familiares em busca de algumas informações sobre o paradeiro de entes desaparecidos, não há ações de Estado que possam enfrentar esse problema de maneira consistente e madura130. A grande problemática do desaparecimento de crianças afeta milhares de famílias, dispostas no mundo todo. Inúmeros motivos podem causar o desaparecimento de pessoas, tais como conflitos de diversas intensidades ou até mesmo desastres naturais. Ou ainda, situações nas quais crianças e adolescentes desaparecem sem evidências de razões muito claras, trazendo dificuldades nas investigações131. Em nível mundial, de acordo com dados divulgados pela Anistia Internacional, 1,2 milhões de crianças por ano desaparecem, por diversos motivos. O relatório da ONG inclui os raptos, fugas, utilização de mão-de-obra escrava, adoção ilegal, pedofilia, tráfico de órgãos e prostituição, entre outros131. Dados de 2015 demonstram que, em média, anualmente cerca de 250 mil pessoas desaparecem no Brasil sem deixar vestígios. Dessas, 40 mil de acordo com estimativas oficiais, têm menos de 18 anos37. Desta forma, a realização de RFFs em casos infantis é de extrema importância. E, consequentemente, a existência de tabelas de ETMFs para indivíduos não adultos é essencial. Segundo informações da Secretaria Especial de Direitos Humanos132, há cerca de 11 anos havia estimativas de aproximadamente 40.000 ocorrências de desaparecimento de crianças e adolescentes registradas, a cada ano, nas delegacias de polícia de todo o país. Dados revelam que a criança e o adolescente permanecem desaparecidos por longos períodos e que alguns jamais são encontrados, o que corresponde em 10 a 15% dos casos. Isto significa que anualmente por volta de 4.000 a 4.500 crianças e adolescentes em todo o país desaparecem sem deixar qualquer rastro130. Em média, nos últimos 10 anos, 190 pessoas desapareceram por dia, estimando-se oito desaparecimentos por hora. De acordo com dados obtidos de 31 2007 a 2016, o estado de São Paulo lidera as estatísticas, com 242.568 registros de desaparecimentos, seguido pelo Rio Grande do Sul, com 91.469, e Rio de Janeiro, com 58.365133. Além disso, são registrados em média 8.000 casos de desaparecimento de crianças e adolescentes anualmente em São Paulo. Porém, estes dados não demonstram verdadeiramente o quadro de desaparecidos em São Paulo ou no Brasil, pois são baseados em Boletins de Ocorrência. Existe um alto índice de casos que não são computados como desaparecimento, devido ao não encaminhamento aos sistemas formais de notificação. Isto demonstra que, infelizmente, há um número muito maior de casos de crianças e adolescentes desaparecidos, os quais precisam ser identificados131. Cabe ressaltar que tabelas de ETMFs da população infantil são necessárias para auxiliar na RFF e, consequentemente no processo futuro de identificação. 32 2 PROPOSIÇÃO O objetivo geral deste trabalho é realizar a mensuração da espessura de tecidos moles de crianças e adolescentes brasileiros, a partir de dados de imagens de Tomografias Computadorizadas de Feixe Cônico de indivíduos vivos, considerando-se as variáveis sexo, idade, cor da pele e índice de massa corporal. 33 3 PUBLICAÇÃO Foi realizado, durante o meu Mestrado, um estudo sobre as ETMFs de crianças e adolescentes brasileiros, considerando as variáveis sexo, IMC, idade e cor da pele. 3.1 Publicação 1 Espessura de tecidos moles faciais de crianças e adolescentes brasileiros Resumo Na sociedade, a identificação humana é indispensável tanto por razões legais como humanitárias. Porém, existem situações em que corpos encontrados não são passíveis de reconhecimento ou quando não há suspeição, impossibilitando a identificação. Nesses casos, análises antropológicas são de extrema importância, pois permitem estabelecer o perfil biológico do sujeito. Assim, realiza-se a Reconstrução Facial Forense (RFF) para possibilitar o reconhecimento e levar a uma possível identificação. A RFF, para ser realizada, precisa dos valores das espessuras de tecidos moles faciais (ETMF) em diversos pontos craniométricos. Essas medidas servem como guia para se estabelecer um limiar do contorno da face e podem ser influenciadas por diferentes fatores como sexo, ancestralidade, idade e índice de massa corporal (IMC). Não há na literatura tabelas de ETMFs de crianças e adolescentes brasileiros, para auxiliarem na RFF. O objetivo desse trabalho foi realizar a mensuração da espessura de tecidos moles de crianças e adolescentes brasileiros, a partir de dados de imagens de Tomografias Computadorizadas de Feixe Cônico (TCFC) de indivíduos vivos, considerando-se as variáveis sexo, idade, cor da pele e índice de massa corporal. Neste estudo, foram mensurados os 21 pontos craniométricos pré- determinados por meio do software Osírix Lite, de imagens de TCFC da região de cabeça e pescoço de 103 não adultos brasileiros (39 crianças e 64 adolescentes), obtidas junto aos arquivos de imagens de uma clínica de Radiografias e Documentações Odontológicas localizada na cidade de Araraquara – SP. De acordo com os resultados obtidos houve diferença significativa (p≤0,05) nos pontos supraglabela, glabela, rinio, supradentale, supraorbital e gonion mensurados em crianças e na amostra de adolescentes as diferenças significativas existentes foram nos pontos nasion, rinio, filtro-médio, supradentale, infradentale e na eminência frontal. Em todos esses pontos o sexo feminino apresentou média de espessura menor do que a do sexo masculino. Em 16 pontos craniométricos, crianças do sexo feminino brancas apresentaram médias de ETMFs mais baixas do que as não brancas. O mesmo, no sexo masculino, aconteceu com 9 pontos. No ponto gonion, houve evidência de que a média de espessura de crianças com cor da  Este artigo segue as normas do periódico Forensic Science International, ao qual será submetido.  O material e métodos deste artigo foram obtidos do trabalho de dissertação de mestrado da própria autora. 34 pele não branca é maior do que as brancas, seja qual for o sexo. Adolescentes brancos do sexo feminino apresentaram médias de ETMFs mais baixas do que não brancos em 17 pontos. No ponto suborbital, independente do sexo, a média encontrada para indivíduos brancos foi significativamente menor. Dezesseis adolescentes do sexo feminino com IMC acima do normal apresentaram valores médios de ETMFs maiores do que os com IMC normal. O mesmo ocorreu em 15 pontos nos adolescentes do sexo masculino. Novos estudos são sugeridos para auxiliar nos processos de investigação forense, em especial no que diz respeito à população não adulta brasileira, visto que em nosso país há um alto índice de desaparecimento e de homicídios de crianças e adolescentes. Palavras-chave: Identificação Humana. Antropologia Forense. Odontologia Legal. Reconstrução Facial Forense. Espessura de Tecidos Moles Faciais. Crianças e Adolescentes. 1. INTRODUÇÃO O processo de identificação, pelo qual se determina a identidade [1], é fundamental não somente por questões legais como também humanitárias, visando cessar o sofrimento daqueles que têm um amigo ou familiar desaparecido, sem saber o seu paradeiro [2]. Existem situações em que corpos chegam aos Institutos Médico-Legais (IMLs) em estados deploráveis, impossibilitando seu reconhecimento visual, pois estão em elevado nível de putrefação, carbonização ou esqueletização. Assim, não havendo um suspeito, os corpos não são passíveis de identificação, pois não há informações suficientes de dados ante-mortem para que sejam comparados com os post-mortem. Nesses casos, são de grande valia as análises antropométricas para estimar ancestralidade, idade, sexo e estatura. Neste contexto, pode ser realizada uma Reconstrução Facial Forense (RFF), que reconstrói a face do indivíduo a partir de um crânio seco não identificado [3-6]. A face obtida poderá posteriormente ser veiculada na mídia, levando ao reconhecimento e trazendo grandes chances de uma identificação futura [7]. É importante ressaltar que a reconstrução facial não corresponde a uma fotografia do indivíduo enquanto vivo, mas pode ser realista o suficiente para produzir uma boa resposta do público e trazer resultados positivos à identificação [5,8-14]. Portanto, a RFF é uma ferramenta de reconhecimento [15-17] que depende do conhecimento das características populacionais e da análise das espessuras de tecidos moles faciais (ETMF) que recobrem os pontos craniométricos pré- determinados [18,19]. Ou seja, para a realização da reconstrução facial, o conhecimento prévio da espessura dos tecidos moles que recobrem as estruturas ósseas do crânio e da face, se faz necessário [20]. Essas medidas servem como guia para se estabelecer um limiar do contorno facial. 35 Com o advento de novas tecnologias e a expansão da realização de RFFs, novos dados sobre ETMFs e a obtenção destes, foram trazidos à literatura. Por meio do desenvolvimento de exames imagenológicos, se fez possível à mensuração dessas espessuras em indivíduos vivos, utilizando as Radiografias laterais de face, o Ultrassom (US), a Ressonância Magnética (RM) e a Tomografia Computadorizada (TC) [21]. Esses diferentes métodos possuem vantagens e desvantagens [22]. Destacam-se as tomografias computadorizadas de feixe cônico (TCFC), consideradas com maior precisão, pois além das vantagens existentes de uma TC, possuem alta resolução, agilidade na aquisição dos dados e menor quantidade na emissão de raios ionizantes [23]. Os valores de ETMF de um indivíduo podem variar de acordo com determinados fatores, como sexo, estado nutricional, ancestralidade e a idade [17], [24]. Estes fatores têm sido considerados como significativos e importantes no estabelecimento da individualização da RFF [25]. Vários autores propuseram tabelas de ETMFs, para diferentes populações, considerando suas particularidades, como o estado nutricional dos indivíduos, e apresentando dados para sujeitos magros, normais e obesos [12,26-30]. Além disso, se torna inadequado utilizar a mesma tabela com valores de ETMFs de adultos em crianças e adolescentes, pois as espessuras podem ser influenciadas de acordo com a idade [17,24], entre outros fatores, os quais devem ser considerados. Há poucos trabalhos internacionais com propostas de tabelas de ETMFs para crianças e adolescentes. Foram desenvolvidos estudos de mensuração de ETMFs em não adultos referentes a determinadas populações, como sul-africanos [31], britânicos [32], japoneses [33-35], canadenses [36], paquistaneses [37], italianos [24], entre outros. A literatura apresenta somente uma única publicação com dados nacionais [38], que apresenta somente medidas para a linha média facial, o que não é suficiente para a realização de RFFs. O mesmo ocorre de forma majoritária nos trabalhos internacionais encontrados, realizados com o emprego de radiografias, em que somente são estudados pontos da linha média da face. Além disso, infelizmente o número de desaparecimentos de crianças em idade escolar em nosso país é muito elevado, sendo frequente a necessidade da identificação de crianças e adolescentes [39]. Dados de 2015 demonstram que, em média, anualmente cerca de 250 mil pessoas desaparecem no Brasil sem deixar vestígios. Dessas, 40 mil de acordo com estimativas oficiais, têm menos de 18 anos [39]. Desta forma, a realização de RFFs em casos infantis é de extrema importância. E, consequentemente, a existência de tabelas de ETMFs para indivíduos não adultos é essencial. O objetivo deste trabalho foi realizar a mensuração da espessura de tecidos moles de crianças e adolescentes brasileiros, a partir de dados de imagens de Tomografias Computadorizadas de Feixe Cônico de indivíduos vivos, considerando- se as variáveis sexo, idade, cor da pele e índice de massa corporal. 36 2. MATERIAL E MÉTODOS Foram obtidas tomografias computadorizadas de feixe cônico (TCFC) da região de cabeça e pescoço de indivíduos não adultos, de ambos os sexos, brasileiros, junto aos arquivos de imagens de uma clínica de Radiografias e Documentações Odontológicas localizada na cidade de Araraquara – SP. O sigilo da identidade dos sujeitos foi assegurado, pois obter o consentimento de cada um se fez inviável. Sendo assim, apenas os pesquisadores tiveram acesso às imagens e aos dados pessoais, os quais cumpriram todos os requisitos para que nenhuma informação dos sujeitos fosse divulgada. O projeto foi aprovado pelo comitê de Ética em pesquisa da Faculdade de Odontologia de Araraquara - UNESP em 05/07/2012 (CAAE - nº 02835412.1.0000.5416). De acordo com a faixa etária, a amostra foi classificada em 2 grupos: até 11 anos (crianças) e de 12 a 18 anos (adolescentes). O conceito de crianças e adolescentes seguiu a legislação brasileira [40]: Art. 2o Considera-se criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. A amostra foi também classificada de acordo com a cor da pele e com o IMC. A cor da pele foi estimada por meio da observação sigilosa das imagens dos indivíduos, existentes em seus arquivos pessoais, classificando-os de acordo com o IBGE [41]. A análise do estado nutricional foi feita através do cálculo do percentil, utilizando coeficientes parametrizados com as informações de sexo, idade, peso corporal (Kg) e estatura (m²) informados. O IMC foi calculado por meio da fórmula peso dividido por altura ao quadrado (𝐼𝑀𝐶 = peso altura² ), classificando os valores de referência para crianças e adolescentes como: Baixo Peso (0,05). A correlação entre as duas medidas de espessura foram todas maiores do que 0,700. Foram obtidas as médias gerais (ou globais) de ETMFs de acordo com a faixa etária, para crianças e adolescentes, para cada um dos 21 pontos craniométricos em estudo. Para cada grupo, foram então obtidas as médias de acordo com o sexo. Na Tabela 1 são apresentadas as médias e desvios padrão das espessuras em análise (Global), além daquelas da classificação pelo sexo, para crianças e adolescentes. O teste t identificou diferença significativa (p≤0,05) em seis pontos craniométricos de crianças e sete de adolescentes. Em todos esses pontos o sexo feminino apresentou média de espessura menor do que a do sexo masculino. 40 Tabela 1 Média (Desvio padrão) de medições de espessuras, em mm, nos pontos de referência craniométricos de crianças e de adolescentes, global e de acordo com o sexo Ponto Crianças Adolescentes Global Fem. Masc. P Global Fem. Masc. p (n=39) (n=22) (n=17) (n=64) (n=28) (n=36) Supraglabela 4,1 (0,9) 3,8 (0,9) 4,4 (0,9) 0,042 * 4,3 (0,8) 4,0 (0,6) 4,5 (0,8) 0,013 * Glabela 5,0 (1,0) 4,7 (0,8) 5,5 (0,9) 0,005 * 5,2 (1,0) 5,0 (1,0) 5,4 (1,0) 0,138 Nasion 6,2 (1,1) 6,0 (0,9) 6,5 (1,3) 0,226 6,3 (1,1) 5,8 (1,1) 6,6 (1,0) 0,007 * Rinio 1,7 (0,4) 1,6 (0,4) 1,9 (0,5) 0,039 * 1,8 (0,6) 1,5 (0,2) 2,1 (0,6) <0,001 * Filtro Médio 12,3 (1,7) 12,0 (1,9) 12,6 (1,5) 0,299 14,6 (2,4) 13,9 (2,0) 15,1 (2,5) 0,037 * Supradentale 10,9 (1,7) 10,4 (1,4) 11,6 (1,8) 0,028 * 11,6 (1,9) 10,9 (1,6) 12,2 (1,8) 0,002 * Infradentale 10,5 (1,4) 10,3 (1,5) 10,7 (1,3) 0,328 11,4 (1,5) 10,7 (1,2) 12,0 (1,5) <0,001 * Supramentale 10,8 (1,4) 10,5 (1,3) 11,1 (1,5) 0,148 11,3 (1,6) 11,1 (1,5) 11,5 (1,7) 0,421 Eminência Mentoniana 10,3 (2,6) 10,2 (3,0) 10,4 (2,0) 0,810 11,2 (2,1) 11,3 (2,2) 11,2 (2,1) 0,894 Menton 6,7 (2,7) 6,1 (2,2) 7,5 (3,0) 0,086 7,0 (1,9) 6,7 (1,6) 7,3 (2,1) 0,223 Eminência Frontal 3,9 (1,1) 3,8 (0,9) 4,1 (1,2) 0,269 4,3 (1,0) 3,9 (1,1) 4,6 (0,8) 0,009 * Supraorbital 6,3 (1,3) 5,9 (1,2) 6,9 (1,1) 0,017 * 6,5 (1,1) 6,3 (1,0) 6,7 (1,2) 0,215 Suborbital 5,6 (1,6) 5,3 (1,4) 5,9 (1,8) 0,261 5,8 (1,4) 5,6 (1,6) 6,0 (1,3) 0,362 Malar Inferior 17,8 (2,3) 17,3 (2,2) 18,5 (2,4) 0,119 17,9 (3,0) 18,3 (3,1) 17,6 (3,0) 0,403 Lateral da órbita 11,4 (2,5) 11,1 (2,5) 11,8 (2,6) 0,404 10,4 (2,6) 11,1 (2,6) 10,0 (2,6) 0,099 Arco Zigomático 9,0 (2,2) 8,6 (0,0) 9,6 (2,4) 0,082 7,8 (2,2) 8,1 (0,0) 7,7 (2,2) 0,330 Supraglenóide 10,0 (2,0) 9,5 (1,9) 10,5 (2,1) 0,131 9,5 (1,9) 9,6 (2,0) 9,4 (1,8) 0,765 Gonion 14,7 (3,8) 13,3 (3,7) 16,4 (3,3) 0,011 * 12,9 (3,8) 13,3 (3,4) 12,5 (4,0) 0,370 Supra M2 28,6 (3,6) 28,2 (3,5) 29,1 (3,7) 0,466 29,6 (3,5) 29,8 (3,3) 29,4 (3,7) 0,650 Linha oclusal 21,2 (3,4) 20,5 (3,3) 22,2 (3,4) 0,118 20,7 (3,2) 20,8 (2,9) 20,7 (3,4) 0,851 Sub M2 24,9 (3,5) 24,1 (3,2) 25,9 (3,7) 0,104 25,1 (3,4) 25,3 (2,6) 24,9 (3,9) 0,613 Nota - p: nível descritivo do teste t de Student * diferença entre médias de sexo significativa ao nível de 5% Foram desenvolvidas análises de variância do sexo contra as variáveis cor da pele e IMC. Os resultados dessas análises são apresentados nas Tabelas de 2 a 4, juntamente com as médias e desvios padrão de espessuras em cada ponto craniométrico para, respectivamente, sexo e cor da pele de crianças, sexo e cor da pele de adolescentes e sexo e IMC de adolescentes. No cruzamento de sexo e IMC somente em dois pontos houve evidência de diferença entre médias de espessura, as duas envolvendo o sexo, independente do IMC. No rinio, com indicação de média de espessura das mulheres menor do que a dos homens, enquanto, no gonion, ao contrário, com evidência de média de espessura de mulheres maior do que a de homens. Em relação ao sexo e cor da pele de crianças (Tabela 2), nos pontos glabela, supradentale e supraorbital, se mantiveram, comparado com os resultados na Tabela 1, as evidências de médias de ETMF das meninas são menores do que as dos meninos, sem dependência com a cor da pele. No gonion, houve evidência de que a média de espessura de crianças com cor da pele não branca é maior do que as brancas, seja qual for o sexo. Em 16 pontos craniométricos, os sujeitos do sexo 41 feminino brancos apresentaram médias de ETMFs mais baixas do que os não brancos. O mesmo, no sexo masculino, aconteceu com 9 pontos. Para os adolescentes (Tabela 3), somente no rinio e no supradentale repetiram as médias de indivíduos do sexo feminino menores do que as do sexo masculino, não importando a cor da pele. Adolescentes brancos do sexo feminino apresentaram médias de ETMFs mais baixas do que não brancos em 17 pontos. No ponto suborbital, independente do sexo, a média de branco foi significativamente menor. Por fim, nos pontos infradentale, supramentale e eminência frontal houve efeito significativo da interação. No cruzamento de sexo e IMC (Tabela 4), somente em dois pontos houve evidência de diferença entre médias de espessura, as duas envolvendo o sexo, independente do IMC. No ponto rinio, com indicação de média de espessura das mulheres menor do que a dos homens, enquanto, no ponto gonion, ao contrário, com evidência de média de espessura de mulheres maior do que a de homens. Dezesseis adolescentes do sexo feminino com IMC acima do normal apresentaram valores médios de ETMFs maiores do que os com IMC normal. O mesmo ocorreu em 15 pontos nos adolescentes do sexo masculino. Tabela 2 Média (Desvio padrão) de medições de espessuras, em mm, nos pontos de referência craniométricos de crianças, de acordo com o sexo e cor da pele (B: branca e NB: não branca) Ponto Fem. Masc. B NB B NB (n=18) (n=4) (n=13) (n=4) Supraglabela 3,8 (0,9) 4,1 (0,9) 4,5 (0,9) 4,1 (0,7) Glabela 4,6 (0,9)a 4,9 (0,7)a 5,4 (1,0)b 5,7 (0,7)b * Nasion 6,0 (1,0) 6,0 (0,4) 6,6 (1,5) 6,1 (0,7) Rinio 1,5 (0,4) 1,7 (0,5) 1,8 (0,5) 1,9 (0,5) Filtro Médio 12,2 (1,9) 11,2 (2,1) 12,7 (1,4) 12,3 (1,8) Supradentale 10,5 (1,5)a 9,9 (1,1)a 11,5 (1,5)b 11,9 (2,8)b * Infradentale 10,4 (1,5) 9,9 (1,7) 10,9 (1,3) 10,3 (1,4) Supramentale 10,3 (1,2) 11,2 (1,5) 11,0 (1,6) 11,5 (0,9) Eminência Mentoniana 10,1 (2,4) 11,0 (5,4) 10,5 (1,6) 10,3 (3,5) Menton 5,9 (2,0) 6,9 (2,9) 7,2 (2,0) 8,6 (5,6) Eminência Frontal 3,7 (0,9) 4,2 (0,8) 4,1 (1,1) 4,3 (1,7) Supraorbital 6,0 (1,3)a 5,7 (1,3)a 6,7 (1,0)b 7,4 (1,1)b * Suborbital 5,1 (1,3) 6,1 (1,7) 5,9 (1,9) 5,9 (1,8) Malar Inferior 17,1 (2,0) 18,3 (2,9) 18,7 (2,3) 17,7 (3,1) Lateral da órbita 10,9 (2,2) 12,3 (3,6) 12,0 (2,5) 11,3 (3,4) Arco Zigomático 8,3 (1,6) 9,8 (2,7) 9,8 (2,1) 9,2 (3,7) Supraglenóide 10,3 (2,0) 11,7 (1,1) 11,4 (2,5) 10,8 (2,4) Gonion 12,5 (3,2)a 17,1 (3,9)b 16,2 (2,7)a 17,0 (5,3)b * Supra M2 27,9 (3,5) 29,7 (3,3) 29,1 (3,8) 29,0 (4,1) Linha oclusal 20,1 (3,3) 22,3 (3,2) 22,3 (3,1) 22,0 (4,6) Sub M2 23,9 (3,3) 24,8 (2,9) 25,8 (3,7) 26,3 (4,1) * Médias na linha acompanhadas de letras iguais não são significativamente diferentes pela ANOVA (p<0,05) 42 Tabela 3 Média (Desvio padrão) de medições de espessuras, em mm, nos pontos de referência craniométricos de adolescentes, de acordo com o sexo e cor da pele (B: branca e NB: não branca) Ponto Fem. Masc. B NB B NB (n=22) (n=6) (n=25) (n=11) Supraglabela 4,0 (0,7) 4,0 (0,6) 4,8 (0,8) 4,0 (0,7) Glabela 5,0 (0,9) 5,2 (1,4) 5,5 (1,0) 5,2 (1,0) Nasion 5,8 (1,0) 6,0 (1,3) 6,8 (1,0) 6,1 (0,9) Rinio 1,5 (0,3)a 1,5 (0,1)a 2,1 (0,6)b 2,0 (0,7)b * Filtro Médio 13,7 (1,7) 14,7 (2,9) 15,5 (2,6) 14,3 (2,1) Supradentale 10,7 (1,6)a 11,4 (1,3)a 12,4 (1,8)b 11,9 (2,1)b * Infradentale 10,5 (1,2)a 11,5 (1,1)ab 12,2 (1,5)b 11,6 (1,3)ab * † Supramentale 10,7 (1,3)a 12,6 (1,2)b 11,8 (1,9)ab 10,6 (0,9)a * † Eminência Mentoniana 11,0 (2,2) 12,3 (2,4) 11,2 (1,9) 11,3 (2,4) Menton 6,7 (1,6) 6,8 (1,3) 7,4 (2,1) 6,9 (2,3) Eminência Frontal 3,8 (0,8)a 4,3 (1,8)ab 4,7 (0,8)b 4,2 (0,7)ab * † Supraorbital 6,4 (1,0) 6,1 (1,1) 6,9 (1,1) 6,2 (1,3) Suborbital 5,3 (0,9)a 6,8 (2,8)b 5,8 (1,4)a 6,3 (1,2)b * Malar Inferior 17,8 (2,6) 19,8 (4,6) 18,2 (2,7) 16,4 (3,2) Lateral da órbita 10,9 (2,4) 11,6 (3,6) 10,2 (2,9) 9,5 (1,7) Arco Zigomático 8,1 (2,1) 7,9 (2,6) 7,9 (2,3) 7,1 (1,9) Supraglenóide 10,3 (2,0) 11,7 (1,1) 11,4 (2,5) 10,8 (2,4) Gonion 12,7 (3,0) 15,6 (4,1) 13,0 (4,2) 11,4 (3,4) Supra M2 29,6 (2,9) 30,7 (4,6) 30,0 (3,5) 28,1 (3,9) Linha oclusal 20,7 (2,8) 21,1 (3,5) 21,4 (3,2) 19,0 (3,5) Sub M2 25,2 (2,8) 25,7 (2,3) 25,8 (4,0) 22,9 (2,8) Nota - Médias na linha acompanhadas de letras iguais não são significativamente diferentes (p<0,05): * pela ANOVA e † teste de Bonferroni. 43 Tabela 4 Média (Desvio padrão) de medições de espessuras, em mm, nos pontos de referência craniométricos de adolescentes, de acordo com o sexo e IMC (N: Normal e AN: Acima do Normal) Ponto Fem. Masc. N AN N AN (n=6) (n=6) (n=8) (n=7) Supraglabela 3,7 (0,2) 4,3 (0,8) 4,3 (1,2) 4,8 (1,1) Glabela 5,0 (0,8) 5,7 (1,4) 5,1 (1,1) 5,4 (1,1) Nasion 6,0 (1,4) 6,4 (1,0) 6,5 (0,8) 6,4 (1,0) Rinio 1,5 (0,1)a 1,4 (0,2)a 1,8 (0,5)b 2,0 (0,4)b * Filtro Médio 14,7 (0,8) 15,2 (2,7) 15,1 (2,9) 15,0 (2,7) Supradentale 11,3 (1,0) 11,8 (1,7) 11,6 (1,5) 11,8 (1,5) Infradentale 11,3 (1,1) 10,8 (0,7) 11,3 (1,4) 12,0 (1,2) Supramentale 11,6 (1,2) 11,2 (1,5) 10,6 (1,8) 10,7 (1,6) Eminência Mentoniana 11,7 (0,9) 12,0 (2,8) 10,2 (1,7) 11,9 (1,1) Menton 6,9 (1,1) 6,6 (1,8) 7,0 (2,2) 8,0 (2,5) Eminência Frontal 3,9 (0,6) 4,3 (1,7) 4,7 (0,9) 4,3 (1,3) Supraorbital 6,6 (1,2) 6,4 (1,3) 6,4 (1,3) 6,7 (1,3) Suborbital 5,6 (1,0) 6,3 (2,8) 6,6 (1,4) 5,4 (1,4) Malar Inferior 17,7 (2,6) 19,1 (5,1) 17,1 (2,0) 16,7 (3,4) Lateral da órbita 9,7 (1,9) 11,4 (4,0) 8,8 (1,6) 9,3 (2,7) Arco Zigomático 7,4 (2,7) 8,1 (2,3) 7,1 (1,7) 7,7 (2,1) Supraglenóide 9,1 (2,1) 8,6 (1,6) 9,3 (1,7) 9,3 (1,7) Gonion 12,6 (3,5)b 15,0 (4,7)b 9,8 (2,0)a 11,7 (2,4)a * Supra M2 27,5 (2,7) 30,6 (4,5) 28,5 (2,2) 30,0 (1,5) Linha oclusal 19,6 (2,5) 21,9 (3,8) 19,0 (2,5) 20,4 (2,7) Sub M2 23,5 (2,1) 26,1 (3,4) 22,7 (1,9) 24,1 (2,6) * Médias na linha acompanhadas de letras iguais não são significativamente diferentes pela ANOVA (p<0,05) 4. DISCUSSÃO A RFF, principalmente em casos de corpos encontrados em estado deplorável de pessoas desaparecidas que necessitam ser identificadas, é uma importante ferramenta. Por meio da mesma é realizada a reconstrução da face do indivíduo a partir de um crânio seco não identificado [3-6]. Para isso, o conhecimento das espessuras dos tecidos moles que recobrem as estruturas ósseas do crânio e da face é de extrema importância [6,20]. As ETMFs de um mesmo indivíduo podem variar devido alguns fatores, como: estado nutricional, idade, sexo e ancestralidade. Por isso, alguns autores propõem tabelas de espessura de tecidos moles que apresentam, para uma determinada população, dados considerando as diferentes variáveis [12,26-28,30]. Até o momento, há somente um estudo publicado com ETMFs de indivíduos brasileiros não adultos, realizado com o emprego de radiografias laterais da face de crianças. Porém, este trabalho apresenta dados somente para a linha média da face [38], não possuindo informações suficientes para o estabelecimento de tabelas de 44 ETMFs para população infantil, pois para a realização de RFFs, são necessários os valores de ETMFs bilaterais, e não somente da linha média. É importante lembrar que o número do desaparecimento de crianças em idade escolar no Brasil é muito elevado, sendo frequente a necessidade da identificação de crianças e adolescentes [39]. De acordo com os resultados obtidos neste estudo, houve diferença significativa (p≤0,05) nos pontos supraglabela, glabela, rinio, supradentale, supraorbital e gonion mensurados em crianças e na amostra de adolescentes as diferenças significativas existentes foram nos pontos nasion, rinio, filtro-médio, supradentale, infradentale e na eminência frontal. Em todos esses pontos o sexo feminino apresentou média de espessura menor do que a do sexo masculino. Isso vem de encontro com os estudos de vários autores. Garlie e Saunders [44] afirmaram que sexo masculino possui maiores valores teciduais na face comparado às mulheres. Os trabalhos de Utsuno et al. [34] e Utsuno et al. [35], que avaliaram crianças japonesas de diferentes grupos etários e o de Peckmann et al. [36] que analisaram 392 crianças canadenses, apresentaram diferenças nos valores das espessuras entre os sexos. Chung et al. [45], estudaram 193 crianças taiwanesas com base na idade e sexo por meio de tomografias computadorizadas, obtendo média da espessura dos tecidos moles maior nos indivíduos do sexo masculino. Ao avaliar o sexo e cor da pele, as evidências de médias de espessuras do tecido mole das meninas apresentaram-se menores do que as dos meninos, independente da cor da pele. Apenas no gonion houve evidência de que a média de espessura de crianças com cor da pele não branca é maior do que as brancas, seja qual for o sexo. Para os adolescentes, somente os pontos rinio e supradentale repetiram as médias de indivíduos do sexo feminino menores do que as do sexo masculino, não importando a cor da pele. No ponto suborbital, independente do sexo, a média dos sujeitos brancos foi significativamente menor. Havendo interação de ambas as variáveis nos pontos infradentale, supramentale e eminência frontal. Isso demonstra que mais dados em relação às variáveis devem ser avaliados, para que se obtenham informações da influência de cada uma delas. Manhein et al. [46] analisaram dados de 515 crianças, utilizando o ultrasson em 19 pontos faciais, indicando que idade, sexo e raça são fatores significativos quando se considera a profundidade do tecido em diferentes pontos craniométricos. Briers et al. [47] estudaram as mensurações de ETMFs de crianças sul-africanas e mostraram de acordo com seus resultados que há diferenças de ETMF em relação ao sexo, etnia e a idade. O estudo de Ferrario et al. [48] verificou que as estruturas faciais dos adolescentes obesos de ambos os sexos foram significativamente mais largas, quando comparadas com aos dados coletados em indivíduos normais da mesma idade, etnia e sexo. 45 No presente estudo, no cruzamento de sexo e IMC, somente em dois pontos houve evidência de diferença entre médias de espessura, as duas envolvendo o sexo, independente do IMC. O ponto rinio apresentou média de espessura das mulheres menor do que a dos homens, enquanto que o gonion, ao contrário, evidenciou média de espessura de mulheres maior do que a de homens. O estudo de Wilkinson [32], que avaliou as ETMFs de crianças britânicas de ambos os sexos por meio do ultrasson em 21 pontos, observou que a maioria dos pontos apresentaram espessuras de tecido maiores nos homens do que nas mulheres, com exceção do zigomático, que obteve valores maiores de ETMFs em mulheres. Isto evidencia que as espessuras dos pontos localizados na bochecha de mulheres podem apresentar-se em determinadas situações maiores do que em homens. Gibelli et al. [24] avaliaram dados de ETMFs de 222 sujeitos de 6 a18 anos, demonstrando que estas podem variar em relação a idade e o sexo. Os autores ressaltaram a necessidade de mais dados populacionais referentes às RFFs para as crianças italianas. O mesmo ocorre em relação ao presente trabalho, pois até a data, são inexistentes valores de ETMFs de crianças e adolescentes brasileiros, existindo apenas um estudo, que avaliou a espessuras de jovens nordestinos utilizando radiografias laterais da face, impossibilitando a obtenção de dados dos pontos bilaterais, os quais são necessários para uma RFF. Isso traz a grande necessidade de bancos de dados referentes à população infantil brasileira, onde grande é o índice de desaparecimento e homicídio infantil, além de novos estudos considerando as diferentes variáveis. A existência de tabelas considerando os diferentes IMCs, possibilita a criação de diferentes versões de reconstruções faciais, aumentando a probabilidade de reconhecimento. Além disso, é importante destacar que o Brasil é um país com grande miscigenação, o que aumenta a importância de estudos referentes à ancestralidade/cor da pele dos indivíduos. Neste trabalho não foi possível realizar o cruzamento de sexo e IMC da amostra de crianças, pois o número amostral existente de acordo com o IMC apresentou-se com a maioria acima do peso normal, possuindo apenas um único indivíduo com peso normal. Isto chama a atenção da grande problemática frente à obesidade infantil. De acordo com Ferrario et al. [48], o número de não adultos obesos está aumentando consideravelmente. Os autores afirmam que as ETMFs de crianças e adolescentes obesos possuem valores diferentes, comparadas com indivíduos normais. Assim, há necessidade da realização de mais estudos com amostras de indivíduos não adultos brasileiros, com diferentes IMCs. 5. CONCLUSÃO Neste estudo, em ambas as faixas etárias consideradas – crianças e adolescentes, os sujeitos do sexo masculino apresentaram espessuras de tecidos moles faciais maiores do que o sexo feminino. Em 16 pontos craniométricos, crianças do sexo feminino brancas apresentaram médias de ETMFs mais baixas do que as não brancas. O mesmo, no 46 sexo masculino, aconteceu com 9 pontos. No ponto gonion, houve evidência de que a média de espessura de crianças com cor da pele não branca é maior do que as brancas, seja qual for o sexo. Adolescentes brancos do sexo feminino apresentaram médias de ETMFs mais baixas do que não brancos em 17 pontos. No ponto suborbital, independente do sexo, a média encontrada para indivíduos brancos foi significativamente menor. Dezesseis adolescentes do sexo feminino com IMC acima do normal apresentaram valores médios de ETMFs maiores do que os com IMC normal. O mesmo ocorreu em 15 pontos nos adolescentes do sexo masculino. Novos estudos são sugeridos para auxiliar nos processos de investigação forense, em especial no que diz respeito à população não adulta brasileira, visto que em nosso país há um alto índice de desaparecimento e de homicídios de crianças e adolescentes. REFERÊNCIAS [1] G.V. França. Medicina Legal. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 8a ed, (2008) 640. [2] L. Vermeulen, Reconstitutions faciales manuelles en médicine légale, Rev Belge Med Dent. 60 (3) (2005) 227-36. [3] K.D. Kim, A. Ruprecht, G. Wang, J.B. Lee, D.V.Dawson, M.W. Vannier, Accuracy of facial soft tissue thickness measurements in personal computer- based multiplanar reconstructed computed tomographic images. Forensic Sci Int.155(1): (2005) 28- 34. [4] S.S. Rocha, D.L. Ramos, M.G. 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