UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDAE DE CIÊNCIAS AGRONÔMICAS CAMPUS DE BOTUCATU VARIABILIDADE GENÉTICA E FITOQUÍMICA DE Casearia sylvestris Sw. EM POPULAÇÕES DO CERRADO E MATA ATLÂNTICA DO ESTADO DE SÃO PAULO MAGNÓLIA APARECIDA SILVA DA SILVA Tese apresentada à Faculdade de Ciências Agronômicas da UNESP – Campus de Botucatu, para obtenção do título de Doutor em Agronomia - Área de Concentração em Horticultura. BOTUCATU – SP Dezembro - 2003 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDAE DE CIÊNCIAS AGRONÔMICAS CAMPUS DE BOTUCATU VARIABILIDADE GENÉTICA E FITOQUÍMICA Casearia sylvestris S EM POPULAÇÕES DO CERRADO E MATA ATLÂNTICA DO ESTADO DE SÃO PAULO MAGNÓLIA APARECIDA SILVA DA SILVA Orientador : Prof. Dr. Lin Chau Ming Co-orientadora: Profa. Dra. Ana Maria Soares Pereira Tese apresentada à Faculdade de Ciências Agronômicas da UNESP – Campus de Botucatu, para obtenção do título de Doutor em Agronomia - Área de Concentração em Horticultura. BOTUCATU – SP Dezembro – 2003 1 RESUMO Na espécie Casearia sylvestris Sw. (Flacourtiaceae) são consideradas duas variedades botânicas: C. sylvestris var. língua, com característica arbustiva e ocorrência em savanas arbustivas e C. sylvestris var. sylvestris, de caráter arbóreo em vegetação florestal ou arbustiva. A literatura afirma ser bastante problemático definir os limites destas variedades através de parâmetros morfológicos sendo portanto, importante identificar diferenças genéticas e fitoquímicas entre estas. Este trabalho teve como objetivo identificar em seis populações naturais de Casearia sylvestris de ocorrência no Cerrado e Mata Atlântica do estado de São Paulo diferenças genéticas e químicas entre as variedades lingua e sylvestris, realizando estudo da variabilidade genética da espécie, por meio de marcador molecular do tipo RAPD. Foram coletados dados de localização geográfica (altitude, latitude e longitude). As extrações de DNA foram feitas a partir de 100 mg de folhas utilizando o método de extração CTAB. Nove primers foram utilizados para aplicação da técnica. A partir de matriz binária de similaridade gerou-se o dendrograma pelo índice de Jacard, utilizando o método de agrupamento UPGMA. A correlação das distâncias geográficas com distâncias genéticas foi obtida pelo teste de Mantel, enquanto que a análise de variância molecular (AMOVA) e o índice de Shannon foram utilizados para verificar as diferenças entre e dentro das populações. Folhas da espécie foram submetidas à extração em metanol, e a quantificação de rutina foi realizada utilizando um cromatográfo líquido de alta eficiência. Praticamente toda variabilidade da espécie é representada pela variabilidade intrapopulacional e a análise de agrupamento mostrou maior similaridade entre as populações de um mesmo bioma, revelando uma diferença genética entre as duas variedades botânicas. A maioria dos solos de ocorrência do estado de São Paulo, onde foram executadas as coletas de guaçatonga possui acidez elevada com textura predominantemente média. No entanto, os valores da maioria dos indicadores do solo apresentaram diferenças entre as populações do cerrado e mata. Existe grande variabilidade no conteúdo de rutina entre os indivíduos dentro e entre as populações estudadas. As comparações estabelecidas entre as populações e entre os dois biomas estudados em relação aos teores de rutina mostraram que as populações do cerrado foram as que apresentaram os valores significativamente maiores. Foi evidenciada uma relação positiva entre a altitude e o teor de rutina, ou seja, maiores altitudes estão associadas a maiores teores de rutina, e ao bioma cerrado. Para o estabelecimento de um banco de germoplasma da espécie faz-se necessárias coletas de maior número de indivíduos dentro de cada população para que se possa representar a variabilidade existente na espécie. Por outro lado, quando se pensa na conservação “in situ” será necessária a manutenção de populações com número grande de indivíduos.PHYTOCHEMICAL AND GENETIC VARIABILITY OF Casearia sylvestris Sw. FROM SÃO PAULO STATE ATLANTIC FOREST AND CERRADO POPULATIONS. Botucatu, 2003. 128p. Tese (Doutorado em Agronomia/Horticultura)- Faculdade de Ciências Agronômicas, Universidade Estadual Paulista. Author: MAGNÓLIA APARECIDA SILVA DA SILVA Adviser: LIN CHAU MING Co-Adviser: ANA MARIA SOARES PEREIRA 2 SUMARY Two botanical varieties have been considered in Casearia sylvestris species: C. sylvestris, lingua variety with a shrubby characteristic, occurring in bushy savannah and C. sylvestris, sylvestris variety with an arboreous type in forest or shrubby vegetation. The limits of these varieties based on morphological parameters are vey tenuos, making molecular and phytochemical markers very important to identify. This work aimed to identify genetic and chemical diffrences between lingua and sylvestris varieties in six natural populations of Casearia sylvestris from Cerrado and the Atlantic Forest in São Paulo state, using (RAPD) molecular marker and chemical markers. Samples have been collected in order to analyze geographic location data (altitude, latitude and longitude). DNA extraction was performed using 100 mg of leaves through the CTAB procedure. Nine primers were used for the technique application. The dendrogram was obtained from the matrix of pairwise distances through the Jaccard’s similarity index using the UPGMA grouping method. A Mantel test was used to analyze correlations between genetic and geographical distances, while the molecular variance analysis and the Shannon index were used to determine the intra- and interpopulation divergences. For the phytochemical study leaves of the species were submitted to extraction in methanol and rutin quantification was carried out using a high-performance liquid chromatographer. Practically all species variability are represented by the intrapopulation variability and the grouping analysis showed higher similarity among populations of the same biome, revealing a genetic diversity between the two botanical varieties. The majority of soils where was collected“guaçatonga” is present is of high acidity and predominantly of medium texture. Nevertheless, most soil indicator values showed diversity among populations of savannah and forest. There is a high variability in the rutin content among accessions within and among the study populations. The proposed comparisons among populations and the two study biomes in relation to the rutin content showed that the savannah populations have presented significant higher values. A positive correlation between altitude and rutin content has been clearly shown, i.e., higher altitudes are associated with higher rutin content and savannah biome. In order to establish a germplasm bank of the species, it is necessary to collect a higher number of individuals within each population so that the existing variability in the species could be represented. On the other hand, for “in situ” conservation, the population maintenance with a great number of individuals has been necessary. ___________________________ Keywords: Casearia sylvestris, Flacourtiaceae,medicinal plant, RAPD, phytochemistry, rutin. 3 INTRODUÇÃO O Brasil está incluído no grupo dos países com altos níveis de diversidade biológica ou megadiversidade, uma decorrência dos diferentes biomas e ecossistemas que caracterizam o país. As regiões tropicais não só mantêm a maior diversidade, mas também um grande número de interações ecológicas entre os organismos nas florestas tropicais, por exemplo, provocam um cem número de adaptações, muitas das quais se apresentam nas plantas na forma de compostos bioquímicos, traduzidos pelo grande número de espécies vegetais de uso medicinal. O desconhecimento dos valores reais dessa biodiversidade tem constituído sério obstáculo para que os tomadores de decisão reconheçam a necessidade de introduzir estratégias de conservação dos recursos biológicos nos planos nacionais de desenvolvimento (Heck, 1996). O Brasil, diante de sua riqueza em diversidade biológica, assume extrema responsabilidade na manutenção dessas espécies quando se depara com a extração das plantas medicinais, que através dos métodos atualmente realizados pelos extratores, configura fato potencialmente comprometedor da manutenção das populações da flora nativa. Na última década no Brasil esforços têm sido feitos no sentido de coletar e preservar a variabilidade genética de plantas medicinais. No entanto, os estudos da variabilidade genética existente, vinculados aos estudos fitoquímicos para identificação de compostos secundários com ação terapêutica e sua implicação na conservação, ainda são incipientes. A Casearia sylvestris Sw. (Flacourtiaceae), vulgarmente conhecida como guaçatonga ou chá-de-burgre, erva de lagarto, entre outros, é uma espécie de uso medicinal indicada para várias enfermidades. As folhas, a casca e a raiz possuem ação anti-séptica e febrífuga, além da ação cicatrizante, depurativa do sangue e no tratamento de sífilis; o chá das folhas é usado no combate à bronquite asmática e a casca como antidiarréica, em moléstias hepéticas e também contra picada de cobra (Almeida et al., 1998). Como a maioria das demais espécies nativas encontradas no Brasil, Casearia sylvestris não é cultivada, sendo obtida por processo de extrativismo. Segundo Scheffer et al. (1999) a espécie encontra-se listada entre aquelas com aspecto comercial importante, sendo consumidas em grande escala seja no mercado brasileiro ou no exterior, e é atualmente comercializada com o nome vulgar de porangaba com uma suposta ação emagrecedora, aumentando dessa forma, a ação antrópica sobre essa espécie. Na 1ª Reunião Técnica Sobre Recursos Genéticos de Plantas Medicinais e Aromáticas - Estratégias para Conservação e Manejo Sustentável, realizada em outubro de 2001 em Brasília, a espécie foi listada como prioritária para conservação e manejo sustentável (Vieira et al., 2002). Essa espécie tem ampla distribuição, do Rio Grande do Sul até o Amazonas, com ocorrência no Cerradão Mesotrófico e Distrófico, Cerrado, Campo Limpo, Mata de Galeria e Restinga (Almeida et al.,1998), incluindo na Floresta Amazônica. No estado de São Paulo ocorre em campo, capoeira, cerrado, cerradão e matas. Além de ocupar diferentes ambientes apresenta grande variação morfológica das folhas, ramos e flores (Torres & Yamamoto, 1986). A espécie é econômica e socialmente importante pelo seu uso popular e tem recebido considerável atenção dos pesquisadores pelo uso farmacêutico. No entanto, as áreas de ocorrência da espécie (cerrado e mata atlântica) vêm desaparecendo pela ação antrópica, colocando em perigo a sobrevivência de espécies nativas desses biomas. Portanto, faz-se necessário conhecer geneticamente as populações dessa espécie para que programas de conservação “in situ” e “ex situ” possam ser executados, garantido assim a existência dessas populações. São consideradas duas variedades da espécie: C. sylvestris var. língua, com característica arbustiva e ocorrência em savanas arbustivas, e C. sylvestris var. sylvestris, de porte arbóreo, em vegetação florestal ou arbustiva (Mendonça et al., 1998 e Klein & Sleumer, 1984). No entanto, admite-se a ocorrência de formas intermediárias, dificultando a identificação. Torres & Yamamoto (1986), analisando os exemplares ocorrentes em São Paulo, constataram ser bastante problemático definir os limites destas variedades no Estado através de parâmetros morfológicos sendo, portanto importante identificar diferenças genéticas e fitoquímicas entre as duas variedades, a fim de se estabelecer um futuro programa de conservação da espécie, levando-se em consideração ou não a classificação das duas variedades presentes nos biomas cerrado e mata atlântica. A partir das novas tecnologias da biologia molecular disponíveis tem-se ferramentas que detectam diferenças genéticas traduzidas pelo polimorfismo diretamente do genoma. Dentre as técnicas moleculares para análise do DNA, o RAPD (Random Amplified Polymorphic DNA) utiliza iniciadores (primers) aleatórios para amplificar regiões no genoma e assim mostrar o polimorfismo entre indivíduos. Outra forma de realizar estudos de variabilidade é o desenvolvimento de técnicas analíticas que possam quantificar marcadores químicos com atividade medicinal nas espécies em estudo. Pode-se assim, identificar quimiotipos e correlacioná-los com a variabilidade genética existente. Recentes estudos realizados com C. sylvestris mostraram a presença de compostos fenólicos, principalmente flavonóides com rutina em sua constituição, os quais podem ser apontados como marcadores químicos. Os flavonóides têm sido intensamente utilizados como marcadores químicos em espécies medicinais. Esse uso é justificado pela sua ampla distribuição no reino vegetal, associada à estabilidade e, principalmente, à menor influência do ambiente no seu acúmulo. Além, é claro, do vasto uso medicinal como: no tratamento de doenças circulatórias, hipertensão, como cofator da vitamina C e ainda pela ação anti-tumoral, antivirais e anti-hemorrágica, entre outras (Zuanazzi, 2000). 3.1 Objetivos: Geral: Identificar em populações naturais de Casearia sylvestris do Cerrado e Mata Atlântica do estado de São Paulo diferenças genéticas e químicas entre as variedades Casearia sylvestris var. lingua e Casearia sylvestris var. sylvestris a fim de fornecer informações relevantes para programas de conservação da espécie. Específicos: - realizar estudo da variabilidade genética da espécie, por meio de marcador molecular do tipo RAPD, em indivíduos coletados em seis populações naturais do estado de São Paulo; - identificar diferenças fitoquímicas entre as variedades a partir da quantificação de marcador químico rutina; - obter informações sobre a heterogeneidade espacial da variabilidade genética existente; - correlacionar as características químicas dos solos dos locais de coleta das populações com o conteúdo de rutina encontrado. 4 REVISÃO DE LITERATURA Casearia Jacq. (tribo Casearieae) é um dos maiores gêneros da família Flacourtiaceae, com cerca de 180 espécies distribuídas pela região neotropical, África, Malásia, Austrália e ilhas do Pacífico. Nas regiões tropicais e subtropicais das Américas encontra-se a maior diversidade do gênero, com cerca de 75 espécies agrupadas em seis seções. Somente a seção Casearia está representada nas outras partes tropicais do mundo (Klein & Sleumer, 1984). Em levantamento florístico realizado por Torres & Yamamoto em 1986 no estado de São Paulo, ocorreriam apenas sete espécies de Casearia. No entanto, este número foi ampliado, pois de acordo com levantamento realizado para o projeto “Flora Fanerogâmica do Estado de São Paulo” e também outros estudos florísticos efitossociológicos, mais de 11 espécies de Casearia já foram identificadas no Estado (Torres, 2002). A família Flacourtiaceae tem várias espécies com propriedades medicinais salientando-se Hydnocarpus kurzii (King) Waburg e H. wightiana Blume, cujo óleo da semente é usado no tratamento de lepra; além de Carpotroche brasiliensis (Raddi) A. Gray, que fornece o óleo denominado de sapucainha, também usado no tratamento de lepra (Absy & Scavone, 1973). Na literatura há referências das aplicações medicinais de algumas espécies do gênero Casearia, destacando-se as seguintes espécies: - Casearia sculenta Rexburgh, cujas raízes são utilizadas na Índia como antidiabético; - Casearia obliquia Spreng.: empregada para curar moléstias de pele, tendo ainda propriedade anestésica; - Casearia sylvestris var. lingua (Cambess.) Eichler- usada como antifebril; Casearia combaymense Tulasne - contém óleo graxo nas sementes, usado no tratamento da lepra; Casearia obliqua: empregada pelo povo no curativo de mordedura de cobra, em moléstias de pele e lepra (Absy & Scavone, 1973; Klein & Sleumer, 1984). 4.1 Casearia sylvestris Sw. A espécie Casearia sylvestris Sw. tem ampla distribuição em muitos estados brasileiros como Amapá, Amazonas, Bahia, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Pernambuco, Rio de Janeiro, Roraima, São Paulo, Tocantins e Rio Grande do Sul, além de outros países como Guianas, do México às Antilhas, Paraguai, Uruguai e Argentina. (Almeida et al., 1998, Correa, 1984). LeCointe 1947, citado por Scavone et al. (1979), fez referência desta planta na Amazônia nas regiões do rio Tapajós e Ribeiro et al. (1999), citam a espécie como sendo encontrada na Flora da Reserva Ducke na Amazônia Central. No estado de São Paulo, C. sylvestris tem ampla distribuição sendo encontrada em quase todo o estado (Torres & Yamamoto, 1986; Torres, 2002), mesmo nos arredores da capital (Scavone et al. 1979). Segundo Almeida et al, (1998) e Ceccantini (1996), a espécie tem ocorrência em Cerradão Mesotrófico e Distrófico, Cerrado, Campo Limpo, Mata de Galeria e Restinga o que é confirmado por Torres & Yamamoto (1986), que afirmam ser esta espécie de ocorrência de Campo, Capoeira, Cerrado, Cerradão e Matas (Mata Secundária, mata semi-decídua, mata Chuvosa com solos argilosos e Mata de galeria) e é comum em regiões elevadas. Já Lorenzi (2000), referindo-se às informações ecológicas, descreve a espécie como planta perenefólia, heliófita ou esciófita, seletiva higrófita, pioneira, característica e preferencial dos sub-bosques dos pinhais, menos freqüente na floresta pluvial, e rara na floresta estacional semidecídua, podendo ocorrer também com grande freqüência nas formações secundárias, como capoeiras e capoeirões. A espécie Casearia sylvestris Sw. apresenta as seguintes sinonímias científicas: C. affinis Gardner, Samyda sylvestris (Swartz) Poiret, C. punctata Spreng, C. samyda (Gaertner F.) ADC., C. parviflora Willd., C. ovoidea Sleumer, C. subsessiliflora Lundel, C. caudata Uitt. (Sleumer,1953 citado por Scavone et al. ,1979; Almeida et al., 1998). Correa (1984) ainda menciona uma outra espécie, Casearia lingua Camb. ou Casearia carpinfolia Benth como sinonímia da espécie. Sleumer (1980) considera duas variedades para esta espécie, C. silvestris var. sylvestris e C. sylvestris var. lingua, sendo essa classificação também mencionada por Mendonça et al. (1998). A chave proposta por Klein & Sleumer (1984) descreve da seguinte forma as duas variedades: - var. sylvestris - ocorrência em vegetação florestal ou arbustiva com folhas geralmente oblongas, reticulação das veias e veinhas um pouco obscura; flores glabras ou laxa a densamente cinzento-pubérulas. São árvores comumente de 10 a 15 m, raramente até 20 m de altura e 30 a 40 cm de diâmetro, tronco geralmente tortuoso, raramente reto, casca externa cinza-escura, ou parda, folhagem verde escura e brilhante, folhas dísticas ao longo dos ramos finos, com bordos serreados e forma ovado-oblongas até elípticas, lembrando folhas compostas, ápice delgadamente longo-acuminado, ponta obtusa e base assimétrica geralmente acuneada ou obtusa, membranácea até coriácea. As inflorescências são axilares, sésseis, fasciculadas; brácteas pequenas, glabras ou pubescentes, formando um tufo; pedicelos delgados, articulados próximo ou debaixo da metade, glabros ou pilosos. Flores com cheiro desagradável, com sépalas em número de 5 de 1,5 a 2,0 mm de comprimento, ligeiramente unidas na base, um pouco amarelas até esbranquiçadas. Os 10 estames com comprimento que varia de 1,0 a 1,5 mm são glabros ou esparsamente pilosos e fortemente inequilongos; anteras didínamo-subglobosas, 0,3 mm de diâmetro com uma pequena glândula apical. O ovário é ovóide-obtuso-angular, glabro ou esparsamente piloso em direção ao estilete trífido curto e delgado. O fruto é uma cápsula ovóide-globosa, subtendida pelos sépalos patentes persistentes, amarela, tornando-se parda ou avermelhado-purpúrea com a idade, possui 3,0 a 4,0 mm de comprimento, partindo em 3 valvas subcoriáceas. As sementes em número de 2 a 6 um pouco achatadas de forma elipsoidal, de 1,5 a 2,0 mm de comprimento; testa claro-pardo, glabra, reticulado- oveolada; arilo avermelhado, pregado e incompleto. - var. lingua - ocorre em savanas arbustivas, com folhas mais ou menos ovadas a oblongo- ovada, reticulação das veias e veinhas mais marcadas em ambas as faces, que muitas vezes são discolores; flores geralmente menos densamente pubérulas. Difere da variedade sylvestris pela reticulação mais marcadamente e muitas vezes discolor nas folhas, as quais são geralmente ovado-acuminadas e delgadas, muitas vezes deflexamente pecioladas. Ligada com a var. sylvestris pelas formas intermediárias. Embora sendo detalhadamente descrita, alguns autores consideram ser problemático definir os limites destas variedades, como relatado por Torres & Yamamoto (1986) em estudos com C. sylvestris no estado de São Paulo. Correa (1984), citando autores que trabalharam com a espécie no Rio Grande do Sul e Paraguai, acredita na existência de numerosas variedades. Segundo o autor, a espécie é um exemplo notável da adaptação e surgimento de novas formas; algumas diferenças morfológicas nas brotações relacionam-se a diferença no ambiente da variedade: variedades arbustivas de região campestre e variedades arbóreas de beira de mata e consorciadas a cipós. Também são relatadas pelo autor as variações no aroma, dimensões de folhas entre outras, que são tão numerosas que seria quase preciso atribuir cada indivíduo a uma forma especial. Em trabalho de anatomia ecológica do lenho de Casearia sylvestris do cerrado e mata, Ceccantini (1996), observou diferenças qualitativas e quantitativas no lenho entre as árvores dos dois biomas. Os parâmetros diâmetro das fibras, comprimento das fibras e tamanho das árvores foram significativamente maiores para as árvores da mata. Esta espécie pode ocupar diferentes ambientes e apresenta grande variação com relação ao tamanho, forma e textura das folhas, à pilosidade dos ramos mais jovens, assim como da inflorescência quanto ao número de flores por inflorescência e ao comprimento dos pedicelos. (Torres & Yamamoto, 1986). Provavelmente devido à sua ampla distribuição geográfica, é grande o número de citações de denominações vulgares para espécie, sendo elas: guaçatonga, café-bravo, café-do-diabo, cafezeiro-do-mato, caroba, caiubim, chá-de-frade, erva-de- bugre, erva-de-lagarto, erva-de-pontada, folha-de-carne, fruta-de-saíra, gaibim, guaçatunga, vassatonga, vassatunga, cassatunga, língua-de-lagarto, língua-de-teiú, língua- de-tiú, petumba, catinguá-verde, marmelada-vermelha, marmelinho-do-campo, pau-de- lagarto, pioia, pitomba-de-folha-miúda, são-gonçalinho, saritá, guaçatunga-falsa, marmelada vermelha, marmelinho do campo, mata-gato, erva-de-macucu, fruta-de-pomba, apiá- acanoçu e paratudo (Almeida et al., 1998; Correa, 1984; Absy & Scavone, 1973, Scavone et al. 1979, Klein & Sleumer, 1984; Torres & Yamamoto, 1986). A literatura com relação à fenologia da espécie revela-se bem variada. Segundo Torres & Yamamoto (1986), em trabalho sobre a taxonomia de Casearia no estado de São Paulo, a espécie C. sylvestris tem sua floração de março a dezembro e frutificação de agosto a novembro, enquanto Lorenzi (2000), afirma que o florescimento ocorre durante os meses de junho-agosto e amadurecimento dos frutos a partir de setembro prolongando-se até meados de novembro. Para Almeida et al., (1998) a floração da guaçatonga ocorre de maio a outubro com seu pico em agosto, às vezes mais cedo, e a frutificação se dá de junho a outubro. Informações sobre a obtenção de sementes são fornecidas por Lorenzi (2000). O autor afirma que um quilograma de sementes, colhidas diretamente das árvores quando os frutos iniciam a abertura, contém aproximadamente 84.000 unidades, com baixa germinação. Para produção de mudas, Lorenzi (2000) sugere a colocação em canteiros semi-sombreados contendo substrato organo-argiloso. A emergência ocorre em 20 a 30 dias, sendo logo após transplantada para embalagens individuais e, após 4 meses, as mudas podem ser levadas ao local definitivo. Em relação à propagação vegetativa, Zanco et al. (1996), estudando o efeito do ácido indolbutírico e da época da coleta de material para enraizamento de estacas de ramos de C. sylvestris, observaram que o ácido aumentou o percentual de estacas enraizadas e a melhor época de coleta para enraizamento foi entre os meses de dezembro e março. A guaçatonga, como a maioria das espécies nativas do Brasil, não é cultivada, sendo obtida por processo de extrativismo. Estudos sobre o extrativismo de espécies nativas tem sido foco de alguns autores, com o intuito de orientar as atividades extrativistas, baseando-se na aplicação de um manejo sustentável. Assim, Pavan (1999), estudando métodos de amostragem para manejo sustentado de plantas medicinais de Mata Atlântica no vale do Ribeira-SP, obteve interessantes informações sobre a C. sylvestris, através de entrevistas com extratores da região. Segundo a autora, a parte extraída são os ramos finos, sem ponteiras, pois as mesmas “pretejam” durante a secagem. A preferência é por local aberto para coleta, no período da manhã e/ou em dias de chuva. A espécie é coletada preferencialmente de setembro a outubro, ou ainda durante todo o ano sendo vendida para laboratórios, atacadistas e lojas de produtos naturais com valores de R$ 0,85 (30 g) e R$ 15,00 (300 g). 4.2 Propriedades medicinais Casearia sylvestris está inscrita na Farmacopéia Brasileira onde consta como parte usada, a folha (Scavone et al., 1979). Há mais de 50 anos, farmacêuticos do Rio Grande do Sul preparam elixires depurativos e anti-reumáticos, reconhecidos como eficazes contra as moléstias da pele de origem sifilítica (Correa, 1984). No entanto, Ferreira (1980), estudando as plantas com uso medicinal popular do cerrado de Minas Gerais, aponta o uso popular como anti-séptico e antifebril. Essas informações são também mencionadas por Correa (1984) que cita a casca como útil contra febres perniciosas e inflamatórias, além do suco ou a decocção das folhas para diarréia e moléstias herpéticas. O chá das folhas e raízes também é usado no tratamento de bronquite asmática (Rizzo et al.,1990). Extrato de folhas é indicado para as chamadas “pontadas” ou seja dores pleuríticas e também, como depurativo é muito usado nos reumatismos, em eczemas, sarnas e úlceras (Klein & Sleumer, 1984). O efeito analgésico do extrato bruto hidroalcoólico de C. sylvestris foi comprovado em estudo desenvolvido por Borges et al. (1998), revelando a presença de princípios ativos com essa atividade, embora estes ainda não tenham sido identificados. Correa (1984) acrescenta que uma resina de aparência âmbar retirada da espécie era usada como ornamento para os lábios dos índios coroados e botocudos. Outro aspecto medicinal apontado pelo autor é o uso interno e externo contra mordedura de cobras, sendo esse efeito atribuído à espécie C. sylvestris var. lingua, vulgarmente chamada de tiú. Esse efeito foi investigado por Borges et al. (2000) a partir de extrato aquoso de C. sylvestris sobre os venenos de cobra e abelha. Nesse estudo o extrato foi capaz de inibir atividade anticoagulante, além de reduzir o edema provocado pela ação do veneno de Bothops moojeni e B. jararacussu. A eficiência do uso empírico do chá-de-bugre como abortivo e para retirar placenta em pós-parto de animais da região centro-oeste do estado do Rio Grande do Sul não foi ainda comprovado. Entretanto, segundo Silva et al., (1988) o extrato bruto de folhas da espécie é capaz de modificar a atividade uterina “in vitro”, o que poderia explicar o uso abortivo da planta. Segundo Coimbra (1958), citado por Basile et al. (1990) há indicações de uso popular da guaçatonga com atividade antiúlcera. Neste estudo com extrato de folhas frescas foi demonstrada a atividade protetora da mucosa estomacal, e ausência de sintomas tóxicos. Em recente levantamento etnobotânico realizado com plantas com ação anti-câncer, Graham et al., (2000), resgatou que na Colômbia, folhas e ramos de C. sylvestris são utilizados como agente antitumoral. Absy (1972), baseando-se em alguns estádios de desenvolvimento da folha jovem C. sylvestris, demonstrou a origem esquizógena de glândulas produtoras de óleo essencial, descritas por Gilg (1925) citado por Scavone et al. (1979) como glândulas de resina. Nesse aspecto Absy & Scavone (1973) observaram também a presença de inclusões cristalinas, principalmente sob a forma de drusa. A presença nas estruturas vegetativas e reprodutivas de glândulas de óleo essencial e inclusões de cristais é reforçada por Basile et al. (1990). Foram encontradas no mesofilo bolsas secretoras contento óleo essencial e também idioblástos com ráfides tanto no mesofilo quanto na nervura principal das folhas (Luz et al.,1996; Sato et al.,1996). Passolo & Ferreira (1949) verificaram na folha a presença de óleo etéreo, saponinas e alcalóides. No entanto, em material coletado por Absy & Scavone (1973) não foi constatada a presença de alcalóides. Os autores atribuem essa controvérsia às condições em que foram feitos os ensaios químicos, assim como o local, a época de coleta, bem como a presença de quimiotípos distintos. Com relação ao óleo essencial presente nas folhas, Silva & Bauer (1970) obtiveram teores em torno 0,2%, valor este inferior ao obtido por Absy & Scavone (1973) que foi de 2,1% e de 2,5% por Possolo & Ferreira (1949). Ao analisar o óleo essencial da espécie Silva & Bauer (1970), constataram elevada percentagem de terpenos (77,78%), sendo um deles provavelmente o isolimoneno. Como ácido majoritário no óleo, o autor encontrou o ácido hexanóico (0,58%). A composição do óleo essencial de C. sylvestris também foi avaliada por Silva et al. (2002). Nesse estudo, o rendimento encontrado apresentou valor de 0,6% e oito sesquiterpenos foram determinados, sendo δ-elemeno o componente majoritário. Já Gomes et al. (2002), avaliando a variação circadiana na mesma espécie, encontrou como majoritário o composto β-elemeno. Itokawa et al. (1990), testando extrato etanólico das folhas de C. sylvestris, demonstraram atividade antineoplástica sobre sarcoma em ratos. Nesse estudo os autores identificaram seis novos diterpenos clerodanos, chamados casearinas A-F. Em outro estudo, Morita et al, (1991), encontraram em extratos etanólicos de folhas atividade antitumoral, além de isolarem doze novos diterpenos clerodanos citotóxicos, chamados casearinas G-R. Jamal (2002), estudando a presença de compostos fenólicos em extrato aquoso de folhas de C. sylvestris, identificou rutina, isoquercetina, ácido cafeico e ácido clorogênico, compostos que ainda não tinham sido descritos nesse gênero. 4.3 Recursos genéticos de plantas medicinais Segundo estimativa da Organização Mundial da Saúde, 80% da população mundial usa, principalmente, as medicinas tradicionais (populares) para suprir as necessidades de assistência médica primária. Esse valor indica que cerca de 3,5 a 4 bilhões de pessoas no mundo são dependentes de plantas para cura de doenças (Elisabetsky, 1987; Vieira, 1993). O Brasil possui a mais diversificada flora do mundo, com cerca de 60.000 espécies vegetais superiores (Prance, 1977). Aliada à vasta extensão territorial está a grande quantidade de diferentes condições climáticas, geomorfológicas e de solos, o que resulta na grande variedade de tipos vegetacionais (Scheffer et al.,1999). Essa diversidade não pode ser desprezada. No entanto, o desconhecimento dos valores reais dessa biodiversidade tem constituído sério obstáculo para que os tomadores de decisão reconheçam a necessidade de introduzir estratégias de conservação dos recursos biológicos nos planos nacionais de desenvolvimento (Heck, 1996). Nesse sentido, Pereira (1998), citando Loyd & Jackson (1986), ressaltaram que existe uma preocupação crescente com respeito à conservação de plantas medicinais. Aqueles autores afirmam que estas plantas têm sido multiplicadas ao longo do tempo sem domesticação e que, conseqüentemente, não foram selecionadas visando a preservação de genes responsáveis por alta produtividade. Populações selvagens dessas plantas constituem, portanto, uma grande fonte de recursos genéticos. O Brasil, diante de sua riqueza de diversidade, assume extrema responsabilidade na manutenção dessas espécies quando se depara com a extração das plantas medicinais que, através de métodos atualmente desenvolvidos pelos extratores, configura fato potencialmente comprometedor da manutenção da população da flora nativa (Heck, 1996). Além disso, autores como Gottlieb & Mors (1980) alertam no sentido de mostrar que o número de áreas devastadas nas florestas tropicais, onde encontra-se a maioria das espécies vegetais do planeta, cresce em velocidade muito mais acelerada do que os trabalhos científicos relacionados com plantas. Os autores ressaltam ainda que mais da metade das espécies encontradas nestas regiões não são conhecidas do ponto de vista científico, e muito pouco se sabe sobre a fitoquímica de mais de 99% das espécies da flora brasileira. Os recursos genéticos de plantas medicinais têm importância estratégica no cenário da pesquisa brasileira, pois as graves deficiências do sistema de saúde oficial e a baixa renda da população, associadas aos conhecimentos acumulados pelas comunidades, fazem com que grande parte da população utilize as plantas medicinais como recurso terapêutico (Scheffer et al.,1999). Cabe, portanto, às instituições de pesquisa incrementar os trabalhos que visem a proteção e a utilização dos recursos genéticos destas espécies em perigo de extinção através de sua coleta, conservação, multiplicação e avaliação da variabilidade genética existente. Segundo Vieira (1994), as atividades com recursos genéticos de plantas medicinais iniciam-se com estudos etnobotânicos. Estes estudos identificam nas comunidades espécies empregadas para cura e tratamento de enfermidades. Baseado nestes dados parte-se para estudos químicos e farmacológicos que determinarão as espécies prioritárias para pesquisa e que justifiquem a sua conservação e uso. Os métodos de conservação de germoplasma vegetal conduzem para dois sentidos, ísto é, a conservação “in situ” e a “ex situ”. Em ambas modalidades a conservação busca o enriquecimento e/ ou manutenção da variabilidade genética de espécies para utilização em benefício do desenvolvimento sustentado. Na conservação “in situ” as populações são mantidas em área natural nas chamadas reservas genéticas, as quais permitem a continuação do processo evolucionário da espécie, ficando a mesma sujeita a efeitos ambientais e à ação antrópica. Por outro lado, na conservação “ex situ” o germoplasma é coletado (sementes, estacas, orgãos subterrâneos, brotos) em seu habitat, em feiras, em pequenas propriedades e, essa amostra devidamente identificada pelos dados de passaporte e voucher de herbário deve representar aquela população original. O germoplasma neste caso é conservado através de banco de germoplasma (para sementes ortodoxas armazenadas a -20ºC), coleções de campo, cultura de tecido e criopreservação (Vieira, 1999). No Brasil, a conservação de germoplasma de plantas medicinais está focalizada em três pontos: estudos etnobotânicos, coleta e caracterização de germoplasma e conservação “in situ” (Vieira, 1999). Segundo Scheffer et al. (1999) não há nenhum relato de conservação de plantas medicinais “in situ”. Nas unidades de conservação oficiais que têm por objetivo preservar também espécies medicinais, não são realizados trabalhos sistemáticos de levantamentos a respeito das espécies, estudos de sua variabilidade genética e características ecológicas. Informações essas relevantes quando se pretende estabelecer um programa de conservação “in situ”. Além das variações ambientais e morfológicas que comumente ocorrem nas espécies medicinais, também são verificadas variações químicas. A enorme diversidade de compostos, produto do metabolismo secundário das plantas, que incluem as substâncias ativas das plantas medicinais expressando diferentes propriedades sensoriais e farmacológicas, têm atraído equipes das mais diversas áreas com o objetivo de entender e documentar a variação encontrada nesses produtos secundários das plantas. Esse entendimento passa também pelo estudo genético de suas biossínteses, especialmente quando há o interesse na obtenção de variedades estáveis e uniformes através do melhoramento genético vegetal. A variabilidade genética também é expressa nos compostos químicos, produtos da biossíntese das plantas, tanto inter quanto infraespecificamente. Espécies de marcante variabilidade morfológica como tomilho (Thymus vulgaris L., Lamiaceae) e erva-cidreira (Lippia alba (Mill.) N.E.Br., Verbenaceae) podem mostrar também ampla variação química, enquanto que espécies reconhecidamente estáveis morfologicamente, como camomila (Matricaria recutita L., Asteraceae) podem apresentar diferentes quimiotipos. Assim, além da coleta e de análises de materiais representativos, a avaliação da variabilidade química envolve estudos de três fatores de grande importância: variabilidade genética individual e populacional, variabilidade morfológica e ontogenética e as modificações devidas ao meio ambiente (Franz, 1993 citado por Barros et al.,1999). A variabilidade genética é uma condição fundamental para que exista evolução adaptativa, uma vez que a seleção natural atua sobre as variantes fenotípicas e, indiretamente sobre genótipos, que ocorrem dentro das populações (Clegg, 1990). Além dos fatores evolutivos, diferentes fatores podem influenciar na variabilidade genética das populações naturais. Segundo Hamrich e Godt (1990), a variação na diversidade genética entre populações é influenciada predominantemente pelo sistema de cruzamento e, em nível de espécie, pela distribuição geográfica. A variabilidade surge como resultado de várias forças como mutação, tanto gênica como cromossômica, recombinação e fluxo gênico e a seleção natural direciona esta variabilidade eliminando ou reduzindo a freqüência das combinações menos adaptadas e aumentando a freqüência de genótipos com maior valor adaptativo (Gauer, 1999). A variabilidade genética de plantas medicinais está intimamente relacionada com as variabilidades interespecíficas e intraespecíficas (inter-populações), em especial nas espécies nativas (Scheffer et al., 1999) e é resultante da pressão ambiental nos diversos biomas produzindo características que são muito importantes nos trabalhos de recursos genéticos. Portanto, a variabilidade genética das plantas medicinais exige o estabelecimento de diferentes estratégias de manejo e conservação. A variabilidade genética se constitui na fonte primária dos estudos genéticos e sem ela não é possível ocorrer adaptações e evolução nas espécies, bem como se realizar melhoramento genético, pois em padrão genético único não se tem o que selecionar. O sucesso de qualquer programa de melhoramento depende, fundamentalmente, da variabilidade genética (Oliveira et al., 1999) e do aprofundamento dos estudos com recursos genéticos, que constitui a fonte de variabilidade. Durante os últimos anos têm sido feitos numerosos estudos que relatam níveis de variação genética dentro e entre populações de plantas e animais. Estes estudos envolvem a aplicação de isoenzimas, e mais recentemente, análises com marcadores moleculares em nível de DNA. 4.4 Marcadores moleculares Os estudos realizados com aloenzimas em populações naturais de plantas têm revelado a existência de níveis consideráveis de variação entre as mesmas (Kercher e Conner, 1996; Moraes, et al., 2002). Entretanto, com a introdução de técnicas de genética molecular no início da década de 80, os estudos de identificação e caracterização genética estão sendo realizados com maior segurança, rapidez e eficiência. Estas oferecem a possibilidade de identificar diferentes genótipos entre os indivíduos ao invés de apenas caracterizar fenotipicamente o que pode mudar com o ambiente. A utilização de marcadores moleculares possibilita a avaliação da variabilidade genética existente dentro e entre espécies distintas (Bered et al., 1997). Os principais tipos de marcadores moleculares podem ser classificados em dois grupos, conforme a metodologia utilizada para identificá-los: hibridação ou amplificação de DNA. Entre os revelados por hibridação estão os marcadores RFLP (Restriction Fragment Length Polymorphism) e Minisatélites ou locos VNTR (Variable Number of Tandem Repeats). Enquanto que os identificados por amplificação incluem-se: RAPD (Random Amplified Polymorphic DNA); SCAR (Sequence Caracterized Amplified Regions); STS (Sequence Tagged Sites) ou ASA (Amplified Specific Amplicon); Microsatélites ou SSR- Simple Sequence Repeats) e AFLP (Amplfied Fragment Length Polymorphism) (Milach, 1998). A classe de marcadores identificados por amplificação de DNA está baseada na reação em cadeia da polimerase ou PCR (Polymerase Chain Reaction). A tecnologia de PCR foi concebida por Kary Mullis em meados da década de 80 (Mullis & Faloona, 1987 e Saiki et al., 1985 citados por Ferreira e Grattapaglia, 1998). Segundo esse autor, são a facilidade, rapidez, versatilidade e sensibilidade da PCR que tornam essa técnica particularmente útil. Em comparação com as técnicas que envolvem hibridação de DNA, as de PCR são de custo menor, facilitando dessa forma a rotina nos laboratórios e a obtenção de resultados. PCR é uma técnica que envolve a síntese enzimática “in vitro” de milhões de cópias de um segmento específico de DNA na presença da enzima DNA polimerase. A técnica tem como base o anelamento e extensão enzimática de um par de oligonucleotídeos (pequenas moléculas de DNA de fita simples) utilizados como iniciadores (primers - sintetizados artificialmente) que delimitam a seqüência de DNA de fita dupla alvo da amplificação (Ferreira e Grattapaglia, 1998). A técnica de amplificação do polimorfismo de DNA ao acaso, ou RAPD (Random Amplified Polymorfhic DNA) é uma aplicação da técnica de PCR. Este método envolve a amplificação simultânea de vários locos anônimos no genoma, utilizando primers de seqüência arbitrária para iniciar a reação de amplificação (Ferreira & Grattapaglia, 1998 e Virk et al.,1995). Esta técnica permite a detecção de polimorfismo no comprimento de seqüências amplificadas entre sítios de pareamento dos primers. Quando à distância entre os sítios de pareamento varia em indivíduos diferentes, o padrão das bandas geradas por PCR também varia, revelando polimorfismo essencialmente genético (Gauer, 1999). Os primers utilizados normalmente tem 10 pb (pares de base) de comprimento contendo ao menos 50% de GC (guaninas e citosinas), sendo um único primer utilizado na amplificação (Bittencourt, 2000). Dois sítios de ligação com orientação desejada entre uma distância limite, tipicamente menor que 3000 pb, precisam existir no DNA genômico para que ocorra a amplificação com sucesso. Os produtos da amplificação são visualizados por meio da separação em gel de agarose e posteriormente corados com brometo de etídeo (Williams et al. 1990; Whitkus et al., 1994). Diferenças entre os genótipos são refletidas nas diferenças no padrão das bandas. O principal inconveniente dos marcadores RAPD reside no fato de tratar-se de marcadores dominantes que não mostram o estado heterozigoto, ou seja, os indivíduos contendo duas cópias de um alelo não são distinguíveis daqueles que contêm somente uma cópia do alelo (Williams et al., 1990). Outro problema potencial levantado por Penner et al., (1993) e Ferreira e Grattapaglia, (1998), é a reprodutividade da técnica, dada a impossibilidade de padronização das condições de amplificação. No entanto, Whitkus et al. (1994) e Ferreira e Grattapaglia (1998), apontam as principais vantagens do uso destes marcadores, dentre eles: menor trabalho de laboratório com custos inferiores, quando comparados a métodos de hibridização, não exige a construção de bibliotecas genômicas; requer pequenas quantidades de DNA (poucos nanogramas) e possibilidade de gerar um número ilimitado de marcadores. Cabe salientar que a opção pelo uso de marcadores moleculares para medida da quantificação da variabilidade genética de uma espécie não coloca estes como a parte fundamental e mais importante do trabalho. Trata-se apenas de um método que, como qualquer outro, oferece uma técnica com resultados mais eficientes e rápidos para alcance dos objetivos de um trabalho. Em pesquisas com recursos genéticos de plantas medicinais a questão principal está na busca urgente do conhecimento através de estudos botânicos e genéticos, onde estão envolvidos estudos fitoquímicos, moleculares e ambientais. Análise dos marcadores RAPD tem fornecido informações sobre a variabilidade genética de populações, níveis de similaridade entre e dentro das mesmas, permitindo que se façam inferências sobre o relacionamento entre populações naturais e mantidas em instituições como fonte de germoplasma (Gunter et al., 1996). Atualmente tem aumentado o interesse pelos marcadores RAPD na análise da variabilidade de populações (Charlmers et al., 1992; Chong et al.1994; Haig et al. 1994; Crochemore et al., 1996; Ciampi, 2001). Em estudos com plantas medicinas destacam-se os de Gauer e Cavalli-Molina (2000), com erva-mate (Ilex paraguariensis A. St.-Hil, Aquilifoliaceae) e Bittencourt (2000) com espinheira-santa (Maytenus ilicifolia (Schrad. Planch, Celastraceae). Ciampi (2001), desenvolveu pesquisas para estimar a variabilidade genética em populações de espécies florestais usando RAPD. Segundo a autora, em estudos com virola [Virola surinamensis (Rol. Ex Rottb.) Warb, Myristicaceae], a análise de similaridade genética revelou baixos valores, portanto com alta variabilidade da população de Caxinã-PA estudada na floresta amazônica. O mesmo foi observado em jacarandá-da-Bahia (Dalbergia nigra Vell. Allemao ex Benth.- Fabaceae) em população do parque do Rio Doce -MG. A mesma autora supra citada desenvolveu estudos com jatobá (Hymnaea spp., Fabaceae) de três diferentes biomas: cerrado, mata atlântica e floresta amazônica. A análise de similaridade genética agrupou os indivíduos em três grupos distintos, de acordo com os diferentes biomas. A análise de variância nesse caso mostrou que a maior parte (54%) da variabilidade está dentro dos biomas, embora exista também significativa variabilidade entre os biomas (46%). O trabalho realizado por Gauer (2000) com quatro populações de Ilex paraguariensis coletadas no Mato Grosso do Sul, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul, mostrou baixa variabilidade intrapopulacional e baixa divergência entre populações. Em outro estudo usando marcadores RAPD, Bittencourt (2000) propôs estratégias para conservação genética de Maytenus ilicifolia a partir dos resultados obtidos com os marcadores RAPD e do grau de similaridade entre os indivíduos de duas regiões geologicamente distintas no Paraná. A autora obteve dois grupos distintos arranjados segundo características geológicas e classes de solos em que os indivíduos se encontravam. Assim, a autora sugeriu que deveriam ser levados em consideração os parâmetros ecológicos para as coletas da espécie. 4.5 Uso de marcadores químicos e moleculares Os estudos de produção de produtos naturais têm sido incrementados nos últimos tempos principalmente associando a caracterização molecular de DNA (genética). Em trabalho com a espécie kava-kava (Piper methysticum G. Forst., Piperaceae), Lebot e Levesque (1996), estudaram o controle genético, usando isoenzmas, e a composição de flavonóides, analisados por HPLC, em 121 cultivares da espécie originários de 51 ilhas do pacífico. Os experimentos demonstraram que os quimiotipos (6) não eram afetados por fatores ambientais, e os ensaios com isoenzimas apresentaram 3 tipos. O controle genético estudado mostrou a existência de poucos genes responsáveis pela variação dos quimiotipos entre os clones estudados. Vieira et al. (2001) uaram óleos essenciais e flavonóides presentes em 12 indivíduos de alfavaca-cravo (Ocimum gratissimum L., Lamiaceae) como marcadores taxonômicos para examinar a relação entre o RAPDs e esses marcadores químicos. Os autores identificaram seis grupos distintos quando os indivíduos foram analisados pelos óleos constituintes, e apenas três geneticamente distintos. Santos-Mendes (2001), em estudos de caracterização morfológica, fitoquímica e molecular de oito formas de Lippia alba provenientes de diferentes locais do Brasil, obteve concordância entre a caracterização molecular e fitoquímica na separação das oito formas, mostrando-se o uso de RAPD ser uma ferramenta adequada para caracterizar a espécie. 4.5.1 Flavonóides como marcadores químicos Os flavonóides constituem uma das maiores classes de compostos fenólicos. O esqueleto básico dos flavonóides contém 15 carbonos em arranjo com dois anéis aromáticos oriundos de duas vias biossintéticas, conectados por uma cadeia de três carbonos aberta ou fechada. Um anel provém da via do ácido chiquimico, através da fenilalanina e o outro anel se origina de três unidades de acetato na via do ácido mevalônico (Cook & Samman, 1996). Os flavonóides estão presentes em todas as plantas vasculares, estando distribuídos principalmente nas partes aéreas dos vegetais, como flores e folhas, em quantidades variadas (Castro et al. 2001). Estes compostos atraem a atenção dos pesquisadores por suas potencialidades medicinais, especialmente sua atividade antiinflamatória (quercitina, luteolina e galantina), antivaricosa (rutina, diosmina, hesperidina), diurética, antivirótica (quercitina, turina e hespertina), antioxidante (quercitina), antimicrobiana (quercitina), fungistática (campferol). Além das referidas propriedades antialergências, mutagênicas, carcinogênicas, anticarcinogênicas, citotóxicas, antineoplásticas e hipoglicemiantes (Atroch 1999; Mors et al., 2000; Silva et al., 2001). Rutina é um flavonóide bem conhecido que tem sido extensivamente estudado e exibe múltiplas atividades farmacológicas, incluindo atividade antibactericida, antiviral, antitumoral, antianalgésica, anti-inflmatória, vasodilatadora, entre outras (Janbaz et al., 2002). Na espécie Casearia sylvestris ainda não foi determinada a ação dos flavonóides, mas as evidências sugeridas pelo uso popular da espécie podem estar relacionadas à ação destes compostos. Por exemplo, o uso interno e externo contra mordedura de cobras (Borges et al. 2000), poderia ser atribuído à presença destes compostos, conforme demostrado por Mors et al. (2000), que atribui aos flavonóides ação inibidora da fosfolipase A2, importante componente de veneno de cobras. A presença de flavonóides, como rutina, quercetina e isoquercetina em Casearia sylvestris (Jamal et al., 2000) sugere a possibilidade de se usar esses compostos como marcadores químicos já que, segundo Zuanazzi (2000), os flavonóides possuem características que reforçam essa escolha, como: sua abundância relativa em quase todo reino vegetal; sua especificidade em algumas espécies; relativa facilidade de identificação; estabilidade e seu acúmulo ter menor influência do meio ambiente. Alguns autores, como Brantner & Males (1999), sugerem que os flavonóides não são os compostos responsáveis pela atividade medicinal em determinada espécie, embora estes possam ser considerados como um marcador químico em extrato. Muitos trabalhos têm sido desenvolvidos com o uso de flavonóides como marcadores químicos para estudo de famílias, gênero, espécie e populações de uma mesma espécie medicinal ou não (Webby et al., 1996; Fiasson et al., 1997; Chaves et al., 1997; Häberlein et al., 1998; Kaudun et al., 1998; Salatino & Prado, 1998). Devido à dificuldade de distinguir espécies por critérios morfológicos, Keinänen et al. (1999), estudaram a implicação taxonômica na variação dos flavonóides em dez espécie de bétula (Betula L., Betulaceae). Os resultados mostraram uma coincidência entre a classificação intragenérica proposta e os quimiotipos, exceto para B. schmidtii Regel, que exibiu uma composição similar à bétula branca. Em trabalho desenvolvido por Williams et al. (2000), quatro raças químicas foram encontradas em Pulicaria dysenterica (L.) Bernh., Asteraceae, coletadas na Europa com base na presença de flavonóides de superfície ou externos. Esse tipo de flavonóide também foi estudado anteriormente por Grayer et al. (1996), em 60 indivíduos de Ocimum basilicum, L. Lamiaceae, de diferentes variedades e cultivares, um indivíduo de alfavaca-cheirosa (Ocimum x citriodorum Vis.) e outro de manjericão (O. minimum L.). O perfil dos flavonóides de superfície nas plantas estudadas de O. x citriodorum foi muito similar ao de O. basilicum, mas significativamente diferentes em O. minimum o que permitiu ao autor concluir, ao contrario de outros autores, que O. minimum deve ser tratada como espécie separada e não como uma variedade de O. basilicum. Em investigação de quimiotipos em populações naturais de erva-de- são joão (Hypericum perforatum L., Clusiaceae) da Itália, Martonfi et al. (2001), encontraram dois quimiotipos diferentes: um com e outro sem rutina. Os resultados não mostraram nenhuma correlação entre caracteres morfológicos e químicos e nem que plantas sem rutina ocorrem em baixas altitudes, conforme referido anteriormente por outros autores. Além disso, os autores acreditam tratar-se de um caso de polimorfismo químico visto que plantas que crescem lado a lado em uma mesma população apresentam diferentes quimiotipos. Novos quimiotipos interespecíficos baseados na presença de flavonóides metoxilados foram encontrados por Repcak et al. (1999) em camomila (Matricaria recutita). Os quimiotipos jaceidina e o crisoplenetina foram identificados em cultivares diplóides e tetraplóides, sendo que o nível de ploidia não influenciou no conteúdo desses flavonóides para os dois quimiotipos. 5 MATERIAL E MÉTODOS 5.1 Coleta do material vegetal O material foi coletado em populações naturais de dois biomas do estado de São Paulo: Cerrado e Mata Atlântica, que preferencialmente estavam localizados em unidades de conservação sendo elas: Bioma Cerrado: Parque Estadual de Vassununga - Reserva Pé-do- Gigante (Santa Rita de Passa Quatro-SP), Parque Estadual de Furnas de Bom Jesus (Pedregulhos-SP), Reserva Biológica e Estação Experimental de Mogi-Guaçu (Mogi- Guaçu-SP). Bioma Mata Atlântica: Fragmento de Mata da Fazenda Edgardia e Fazenda Lageado da Faculdade de Ciências Agronômicas da UNESP (Botucatu-SP); Estação Experimental do IAC de Capão Bonito (Capão Bonito - SP) e Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira (Iporanga-SP). - Parque Estadual de Vassununga Reserva Pé-do-Gigante : A reserva está localizada no município de Santa Rita do Passa - Quatro, com área total da Reserva totaliza 1.225 ha, entre 21° 36-39’S e 47° 36-38 W com clima, segundo classificação de Köppen Cwag, caracterizado por precipitação anual em torno de 1500mm, e altitude média variando de 590 a 740 m. O solo foi classificado como Latossolo vermelho amarelo (Pivello, 1998). O nome Pé-de-Gigante foi dado em função da formação geomorfológica em forma de pé A área de coleta tem representadas todas as fisionomias do cerrado (campo cerrado, cerrado stricto sensu e cerradão), sendo considerada Área de Relevante Interesse Ecológico, de acordo com a legislação brasileira. As temperaturas médias de verão e inverno são respectivamente: 25,3°C e 14, 6 °C. A coleta foi realizada em 13 de janeiro de 2002 em indivíduos de beira de mata. - Parque Estadual de Furnas de Bom Jesus: O parque localiza-se no município de Pedregulho, com uma área de 2.069,06 ha, entre as coordenadas 28°11'14'' a 20°16'03'' S e 47°22'13'' a 47°29'17'' W. Fazem parte da área do parque dois ecossistemas: mata atlântica (floresta tropical semi- decídua) e cerrado. As coletas ficaram concentradas nas áreas de cerrado. As temperaturas médias no verão quente e úmido são: mínima de 18°C e máxima de 32° C; já no inverno são observados valores no inverno frio e seco, de mínima de 3° C e máxima de 13° C. a coleta foi realizada em 18 de outubro de 2001 em área de cerrado ralo, onde se verificou a presença de gado. - Reserva Biológica e Estação Experimental de Mogi-Guaçu: A Reserva Biológica com área de 470 ha está localizada entre as coordenadas 22°18’S e 47°11’W no município de Mogi-Guaçu. Essa reserva é parte da antiga Fazenda Campininha e é coberta predominantemente por cerrado, com variações do cerradão ao campo cerrado, possuindo também matas ciliares. Segundo informações da estação metereológica da reservas as temperaturas máxima e mínima no ano de 2002 foram de 33° C e 10°C, respectivamente, e temperatura média anual de 21,4° C, com precipitação media de 1350,5 mm. A coleta foi realizada no dia 16 de abril de 2002, com vinte indivíduos coletados no interior das áreas de cerrado e vinte coletados nas beiras da mata ciliar. - Parque Estadual Turístico do Alto Ribeira (PETAR): O PETAR está localizado na região do alto rio Ribeira com área de 35.712 ha entre as coordenadas: 24° 17' a 24° 38' S- 48° 27' a 48° 44' W. O parque está localizado no município de Iporanga, sendo que 85% da área do município pertence ao PETAR. Os principais grupos de solos presentes na área do parque são: litossolos, podozolizados hidromorfos. A precipitação média anual está entre 1400 e 1700 mm, sendo a temperatura média do mês mais frio de 18° C com verões quentes onde a temperatura média é de 22° C. O clima segundo Köppen é classificado como cfa (quente com inverno menos seco). A coleta foi realizada no dia 20 de agosto de 2002, quando coletaram-se indivíduos na beira da mata ao longo de trilha pré-existente. - Fragmento de Mata da Fazenda Lageado e Fazenda Edgardia da Faculdade de Ciências Agronômicas da UNESP: As duas fazendas são unidades de ensino e pesquisa da UNESP/Campus de Botucatu e estão localizadas no município de Botucatu. A primeira área de coleta fica localizada na área experimental do Departamento de Produção Vegetal - Horticultura - compreende fragmento de vegetação natural de Floresta Estacional Semidecidual. Segundo Jorge & Sartori (2002), a Fazenda Experimental Edgardia, está localizada em área de Cuesta, inclui em seus limites cinco fragmentos de vegetação natural das tipologias Floresta Semidecidual e cerradão, situada nas coordenadas de 22o 48’51’’ S e 48o 24’15’’W. Segundo a classificação de Köeppen, o clima é do tipo Cfa, que corresponde ao clima Temperado, típico de região constantemente úmida, tendo quatro ou mais meses com temperaturas médias superiores a 22°C. A precipitação média anual para região é de 1300 mm, oscilando entre 650 mm e 1850 mm, respectivamente, para os anos mais secos e mais úmidos. O solo é do tipo Neossolo Litólico próximo ao Neossolo Flúvico (solos aluviais) (Vital, 2002; Fonseca & Rodrigues, 2000). A coleta foi realizada nos dias 11 e 12 de dezembro de 2002, sendo os dezoito primeiros indivíduos coletados na Fazenda Edgardia em beira de mata ao longo de estrada e, os dez indivíduos restantes coletados na Fazenda Lageada, no interior da mata localizada na área experimental do Departamento de Horticultura. - Estação Experimental de Capão Bonito (Unidade de Pesquisa e Desenvolvimento de Capão Bonito): A coleta foi realizada em fragmento de mata que está localizada na área de pesquisa da Estação. A estação experimental do IAC, com as coordenadas geográficas de 24° S e 48° 27’W, está localizada no sudoeste do Estado de São Paulo, a 6 km da cidade de Capão Bonito, apresentando relevo, suave ondulado a ondulado. A região apresenta temperatura média anual de 18,8°C, variando de 14,7°C, em julho a 22,1°C em fevereiro. A precipitação apresenta índice anual médio de 1236 mm de chuva. O clima foi classificado com cfa de acordo com a classificação de Köppen. O solo foi classificado como latossolo vermelho-escuro distrófico ou álico com textura argilosa (Menk et al., 1987). A coleta foi realizada no dias 15 e 15 de abril de 2002, em beira da mata. As expedições de coleta foram realizadas no período de outubro de 2001 a dezembro de 2002. Nas coletas foram registrados dados de localização geográfica (altitude, latitude e longitude) através de GPS (Global Positioning System). O receptor portátil de sinal de satélite usado foi o GPS (Garmin Modelo Legendado 79728002), com unidade de recepção e antena embutida. O equipamento sintoniza satélites simultaneamente com capacidade de medição instantânea em coordenadas geográficas (latitude/longitude e UTM). O dados obtidos no GPS foram processados no software Trackmaker (versão 11.4 by Odilon Ferreia Jr.), do qual se obteve as distâncias entre os indivíduos dentro das populações e entre populações. De cada população foram coletadas folhas de 30 indivíduos adultos (Marshall & Brown, 1975 citados por Moraes, 1997). Esse número ficou determinado pelo tamanho da população encontrada, ou seja, coletaram-se todos os indivíduos possívéis. Para cada ponto de coleta teve-se também o cuidado de coletar material de plantas não muito próximas (no mínimo 10 m). Foram coletadas aproximadamente 10 folhas jovens de cada indivíduo para facilitar a extração de DNA, que foram limpas com gaze e acondicionadas em tubos Falcon de 50 mL com sílica gel, devidamente identificados. Os tubos contendo as folhas coletadas foram estocados em freezer a -2°C até o momento de extração. Além do material coletado para estudo genético foi coletado material botânico para confecção de exsicatas de todos indivíduos coletados, de preferência material fértil. As exsicatas de todos os indivíduos foram depositadas no Herbário da Universidade de Ribeirão Preto (Herbário HPM -UNAERP). Além disso, para o estudo fitoquímico também foram coletadas amostras das folhas de todos os indivíduos que foram acondicionadas em sacos de papel para posterior secagem em estufa a 40ºC por 48 horas. Amostras compoostas de solo do local de coleta (0-20 cm) foram coletadas e conduzidas ao laboratório de Análises de Solo do Departamento de Ciência do Solo da FCA/UNESP - Botucatu. 5.2 Análise genética O estudo da variabilidade populacional foi feito no Laboratório de Biologia Molecular do Departamento de Biotecnologia Vegetal da UNAERP -Ribeirão Preto,SP. Esse estudo foi realizado pela análise de polimorfismo do DNA do tipo RAPD e seguiu as etapas descritas a seguir: 5.2.1 Extração e amplificação do DNA pelo método CTAB (Ferreira & Grattapaglia, 1998) O DNA foi extraído das amostras de folhas jovens, utilizando-se aproximadamente 100 mg de folhas, de modo a obter-se aproximadamente de 40 a 1000 ng de DNA/µL. A amostra foi colocada em tubo eppendorf e macerada em nitrogênio líquido com auxílio de bastão de vidro e pó de sílica até formação de um pó. No tubo foi adicionado 1000 µL de tampão de extração CTAB, que foi misturado suavemente para posterior incubação em banho-maria a 65ºC por 30 minutos. Após a remoção do banho- maria as amostras foram resfriadas à temperatura ambiente, onde adicionou-se 200 µl de clorofol (clorofórmio + álcool isoamílicoc24:1). Após centrifugação a 12000 rpm por dois minutos, a fase aquosa foi transferida para um novo tubo. Foram adicionados então 600ul de isopropanol (-20ºC) e deixado precipitar por dez minutos. Após centrifugação de 12000 rpm por 5 minutos foi coletado o precipitado descartando o sobrenadante. No tubo com precipitado foi adicionado um ml de tampão de lavagem, que após agitação deslocou o sedimento do fundo do tubo, permanecendo o eppendorf em temperatura ambiente por 20 minutos. Após este período foi feita nova centrifugação a 12000 rpm por cinco minutos, e novamente foi descartado o sobrenadante, e o precipitado (DNA) foi submetido a purificação devido à presença de substâncias fenólicas. 5.2.2 Purificação do DNA Este procedimento foi realizado segundo Ferreira & Gratapaglia (1998), com modificações. O precipitado citado no item anterior foi ressuspendido em 500 µL de solução 1M de NaCl, permanecendo em banho-maria por 5 min. a 65 ºC. A seguir, o material foi incubado a 4 ºC por 30 min e centrifugado a 12.000 rpm/5 mim. O sobrenadante contendo DNA foi transferido para um tubo no qual foi adicionado 350µL de isopropanol. Após 10 min de repouso, houve a precipitação e o material centrifugado a 12.000 rpm/5 min. Em seguida descartou-se o sobrenadante, o precipitado foi lavado duas vezes com etanol 70%, seguido de centrifugação a 12.000 rpm/5 min e posteriormente foi feita uma última lavagem em etanol absoluto, deixando-se secar os tubos invertendo-os sobre papel higiênico. Após uma hora de secagem em temperatura ambiente o sedimento foi ressuspendido em 100µL de água milliq. A quantidade e a qualidade do DNA foram analisadas através de eletroforese em gel de agarose 1% e tampão TBE1X, sob corrente elétrica contínua de 50 mA, por 1 hora. 5.2.3 Otimização do Protocolo de RAPD Após a quantificação do DNA foi realizada a otimização das concentrações de todos os componentes da reação de PCR, sendo eles: DNA Taq polimerase (Pharmacia), MgCl2 (Pherkmelmer), DNA genômico, primer (Operon) e temperatura de anelamento. As temperaturas de anelamento testadas foram: 30 °C, 35°C e 40°C. Após estabelecidas as condições de amplificação, testaram-se 100 diferentes primers da Operon Tecnologies Inc. para escolha de bandas adequadas (bem definidas) em primers polimórficos. Dos 100 primers testados selecionaram-se 9 primers (Quadro 1), que foram os que apresentaram melhor qualidade de amplificação. Quadro 1. Seqüência de nucleotídeos dos primers utilizados no RAPD. Botucatu-SP, 2003. Primer Seqüência 5’-3’ Operon A-04 AAT CGG GCT G Operon A-05 AGG GGT CTT G Operon A-01 TGC CGA GCT G Operon A-08 GTC ACG TAG G Operon H-03 AGA CGT CCA C Operon B-08 GTC CAC ACG G Operon A- 13 CAG CAC CCA C Operon AV-15 GGC AGC AGG T Operon A-02 TGC CGA GCT G As reações de amplificação constaram de um volume final de 30 µl contendo: 13,0 µl de H2O, 4 µl de DNA genômico (5ng/µl), 3 µl de dNTP (2,5 mM), 1,8 µl de MgCl2 (25mM), 5µl do primer (10ng/µl), 0,2 µl de enzima DNA“Taq polimerase” (5U/µl) e 3 µl de Tampão 10X (Tris-HCL 200 mM pH=8,6;KCl 500 mM). As amostras foram amplificadas em termociclador (PTC-100 - MJ Research Inc.) programado para: 2 ciclos (94 °C por 2 min.; 37 °C por 1 min.; 72°C por 2 min.) ; 33 ciclos (94°C por 10 seg; 40 °C por 20 seg.; 72°C por 2 min); 72°C por 5 min. e 4 °C por tempo indeterminado. Embora a purificação tenha sido cuidadosamente realizada em todos os indivíduos das populações coletadas, a presença de compostos fenólicos afetou drasticamente as reações de RAPD. Na maioria dos indivíduos de todas as populações não se conseguiu obter amplificação. . 5.2.4 Análise da distância genética obtida por RAPD Os fragmentos amplificados, resultantes dos marcadores RAPD da espécie, foram mensurados para a sua presença (1) ou ausência (0). A partir destes dados foi montada uma matriz binária com os diferentes fenótipos RAPD. Devido ao fato de esses marcadores serem dominantes, foi assumido que cada banda representada foi o fenótipo em um locus bi-alélico (Williams et al.,1990). A análise da distância genética foi realizada pelo agrupamento das amostras segundo os princípios da taxonomia numérica. Foi utilizada uma matriz binária para estimar as distâncias e similaridades genéticas. Os exemplares de Casearia sylvestris provenientes das diferentes populações avaliadas tiveram suas bandas de RAPD codificadas sob estrutura binária e analisados por meio de análise de agrupamento (Cluster Analysis). Para a definição dos agrupamentos, foi utilizado o coeficiente de Jaccad (Jci,j) (1) (Cruz & Regazzi,1997). Amostra j ( ) ( ),i j a Jc a b c = + + (1) (+) (-) Amostra i (+) A B (-) C D Uma matriz de similaridade entre os exemplares foi obtida, para posterior confecção de dendrogramas. O método de ligação utilizado foi ligação média não- ponderada (Unweighted Pair Group Mean Average - UPGMA) (Cruz & Regazzi, 1997). A partir desta matriz os valores médios de similaridade entre as populações foram obtidos e um novo dendrograma utilizando as populações como objetos foi confeccionado, já que o elevado número de objetos dificultou a visualização. Os dendrogramas foram confecionados com o auxílio do software MVSP. A diversidade foi avaliada utilizando o “Shanon - information index”, conforme descrito por Ashburner et al.(1997) e apresentada na expressão abaixo: ∑ = −= k i pipiH ln , onde: H = diversidade de marcas RAPD na população; k = número de marcas RAPD na população; e, pi = freqüência da i-ésima marca RAPD na população. A diversidade média de RAPD de todas as populações (Hpop) é a média de Ho, que é diversidade de marcas dentro de cada população. H tot é a diversidade considerando todas as marcas da área em estudo. A relação Hpop/Htot representa a proporção da diversidade encontrada dentro das populações, e [1- (Hpop/Htot)] é a proporção da diversidade entre populações. Foi realizada a análise Variância Molecular (AMOVA) para os dados de RAPD pelo programa ARLEQUIN ver. 2000, para detecção de possíveis diferenças entre e dentro das populações estudadas. 5.3 Associação espacial entre a distância genética e geográfica Como medida de associação espacial foi utilizado o teste de Mantel (Z), definido como um teste para detectação de interações espaço-temporais entre observações amostradas, sendo sua expressão (2) dada pela soma de produtos das distâncias espaço-temporais entre todos os pares de casos possíveis, podendo ser tomado um outro efeito, como no caso do genético, assim a associação sugerida pelo teste de Mantel deve-se a uma interação genético-espacial, dada pelas matrizes de distâncias genética e geográfica. A distribuição de Z é obtida por meio de métodos Monte Carlo, permutando os elementos de uma das matrizes de distâncias, mantendo-se a outra constante. Sob esta condição o número de simulações maior ou igual ao valor de Z sob condição da hipótese nula são divididos pelo número total de simulações empregadas, expressando a significância do teste de Mantel. 1 1= = = ∑ ∑ N N ij ij i j Z s t (2) Onde: sij - distância geográfica; t ij - distância temporal ou outro efeito a ser considerado. Uma representação de mais fácil interpretação é expressar o teste de Mantel sob a forma de uma padronização ou correlação (rM) (3) com valores entre -1 a 1. ( )2 1 1 1 1 − − = = = − − ∑ ∑ N N s s t tij ij M s ss ti j r N N (3) Onde: N - número de casos; sij - distância geográfica; t ij - distância temporal ou outro efeito a ser considerado; s , t - distâncias médias geográficas e temporais ou de outro fator; ss, st - desvio padrão das distâncias geográficas e temporaisou de outro fator. As análise foram conduzidas com auxílio do software Mantel 2.0 (http://www.sci.qut.edu.au/NRS/mantel.htm) de distibuição gratuita. 5.4 Estudo fitoquímico da espécie O estudo fitoquímico foi realizado no Laboratório de Fitoquímica do Departamento de Biotecnologia Vegetal da UNAERP -Ribeirão Preto-SP. 5.4.1 Preparo dos extratos vegetais O material vegetal obtido da planta in natura passou por um processo de secagem em estufa de ar quente circulante a 40°C e pulverizado em moinho de faca. O pó (200 mg) foi submetido à extração com 5 mL de metanol + H20 (1:1) em ultrassom por 30 min. O extrato foi filtrado inicialmente com auxílio de seringa e algodão e, em seguida, foi centrifugado. Cerca de 500 µL foram filtrados utilizando filtro com membrana de 0,45 um. 5.5 Caracterização química 5.5.1 Quantificação de Rutina A quantificação de rutina, foi realizada em triplicata utilizando um cromatográfo líquido de alta eficiência LC 10ADvp (Shimadzu) com detector de arranjo de diodo e injetor automático, sendo empregada uma coluna em fase reversa RP-18 (SupelcoSilTM) e a fase móvel foi um gradiente linear utilizando MeOH: (H2O : MeCO2H, 0,1%): 1:9 à 62,5:37,5 em 30 min; 62,5:37,5 à 1:9 em 2 min e 1:9 em 3 min. O comprimento, diâmetro e tamanho da partícula foram respectivamente coluna 250 x 4,6 mm, 5 µm, sendo a quantidade de solução injetada de 20 µL.A detecção foi realizada à 280 nm que é o comprimento de onda que a rutina absorve e o fluxo foi de 1,0 mL/min. Foi feita curva de calibração para a quantificação. A metodologia empregada para a quantificação foi a padronização externa, utilizando como padrão a rutina obtida da Aldrich. Os procedimentos executados no trabalho foram baseados em literatura. O modelo de análise adotado foi do tipo hierárquico (4), sendo que o efeito dos locais (β(i)j) foi aninhado no efeito das biomas (αi) e verificado por meio de análise de variância (ANOVA) e testado por F. Os valores médios de rutina foram ordenados pelo teste de Tukey, tanto na análise de variância, quanto no teste de comparação múltipla, o nível de significância adotado foi o de 5% (α=0,05). ( ) ( )µ α β ε= + + +i i j ij ky (4) Os intervalos de confiança de cada uma das populações nas biomas foram obtidos e representados graficamente. As análise foram conduzidas com auxílio da proc glm do SAS System e do STATISTICA 5.5. 5.6 Análise das características químicas do solo As amostras de solo representativas de cada local de coleta foram encaminhadas ao Departamento de Recursos Naturais, Setor de Ciência do Solo da Faculdade de Ciências Agronômicas da UNESP de Botucatu-SP. As propriedades químicas dos solos dos locais de coleta das populações de C. sylvestris foram utilizadas na ordenação dos locais e como indicadores discriminantes entre os biomas, a saber: mata e cerrado. A discriminação entre os biomas foi obtida por meio de teste t, com nível de significância de 5% (α=0,05). Associações entre as propriedades químicas do solo e os teores de rutina foram obtidas por meio de regressão linear simples. Todas as técnicas de análise empregadas foram efetuadas com auxílio do pacote estatístico STATISTICA 5.5. 6 RESULTADOS 6.1 Coleta A guaçatonga (C. sylvestris), espécie de ampla distribuição e de ocorrência no cerrado e mata, é de vasta ocorrência no estado de São Paulo no entanto, estudos de sua variabilidade genética não são relatados na literatura. Para este trabalho buscaram-se áreas de ocorrência da espécie com características de ambiente de cerrado e mata bem definidas. As expedições de coleta só foram realizadas após licença para coleta nas unidades de conservação, e confirmação da existência da espécie nas áreas escolhidas. Foram coletados 184 indivíduos em seis populações nos dois biomas em estudo (Figura 1). Nas coletas foram tomados dados de localização geográfica (altitude, latitude e longitude) através de GPS, que estão detalhadas no Apêndice 1, e são apresentadas de maneira resumida no Quadro 2. Quadro 2. Caracterização geográfica das áreas de coleta de Casearia sylvestris no Estado de São Paulo. Botucatu-SP. 2003. População Bioma Latitude Longitude Altitude (m) Vassununga (Sta Rita do Passa-Quatro-SP) Cerrado S21°36’32,5’’a S21°38’48,5’’ WO47°36’50,6’’a WO40°38’54’’ 620-745 Pedregulho (Pedregulho-SP) Cerrado S20°12’39,2’’a S20° 15’04,9’’ WO47°26’16,3’’a WO47°27’44,5’’ 765-1031 Botucatu (Botucatu-SP) Mata Atlântica S22°48’38,6’’a S22° 50’27,8’’ WO48°23’22,6’’a WO48°25,5’50,6’’ 472-773 Capão Bonito (Capão Bonito-SP) Mata Atlântica S24°01’56,7’’a S24° 02’31,8’’ WO48°22’37,4’’a WO48°23’0,59’’ 719-763 Mogi-Guaçu (Mogi-Guaçu-SP) Cerrado S22°14’48,7’’a S22° 15’22,3’’ WO47°09’29,5’’a WO47°10’47,9’’ 598-661 Vale do Ribeira (Iporanga-SP) Mata-Atlântica S24°34’30,8’’a S24° 34’45,4’’ WO48°37’44,1’’a WO48°37’53,4’’ 125-245 As coletas representaram atividade facilmente realizável, já que em todas as unidades de conservação visitadas foram encontrados indivíduos em número suficiente. Ao longo das atividades de coleta nos diferentes biomas ficaram evidentes as diferenças entre as duas variedades botânicas (língua e sylvestris) citadas na literatura (Correa, 1984; Klein & Sleumer, 1984; Torres & Yamamoto, 1986; Mendonça et al., 1998). No cerrado, os indivíduos apresentavam características de porte de planta, cor e forma da folhas bem diferente da mata. No primeiro bioma (cerrado), a maioria dos indivíduos apresentavam-se como arbusto ou arboreta (Figura. 2), com folhas mais coreáceas, de coloração verde clara e de menor largura e comprimento. Ao contrário, os indivíduos de mata que apresentava-se como árvores de variáveis alturas, sempre acima de 2 m (Figura. 3), com folhas mais largas e compridas, de coloração verde escura. Diferenças nas estratégias vegetativas da espécie nos dois ecossistemas também foram relatadas por Ceccatini (1996). O autor relatou a grande dificuldade na padronização de coleta de indivíduos, pela variação no porte das árvores encontradas na mata e no cerrado. No trabalho, o autor obteve indivíduos com altura que variavam de 2,5 e 3,7 m de altura no cerrado, mas na mata os valores eram muito mais elevados (5,2 a 9,5 m). Também foi observada variação no DAP (diâmetro da altura do peito) dos indivíduos estudados na mata e cerrado. Nos indivíduos do cerrado, para DAP = 6 cm, a altura foi de 2,5 m, por sua vez na mata, quando eram encontradas árvores de alturas da mesma ordem das encontradas no cerrado estas possuíam mais de 2 cm de DAP. Segundo Hallé et al. (1978) citado por Ceccatini (1996), o gênero Casearia é conhecido como um “nômade biológico”, ou seja, suas espécies são heliófilas de crescimento rápido e floração precoce. Assim, o crescimento rápido na floresta provavelmente explica o descompasso entre espessura e altura. Provavelmente, na floresta, Casearia só passa a ter um desenvolvimento em espessura considerável, quando atinge níveis mais elevados do dossel. Já no cerrado, sem o dossel que sombreia as árvores, essas se desenvolvem em espessura mais precocemente. As especulações acima levantadas pretendem chamar a atenção para aspectos que devem ter conseqüência sobre o processo de coleta da espécie. No caso da padronização na coleta das folhas para estudos genéticos e especialmente fitoquímicos, esta atividade é dificultada quando se deseja coletar ao mesmo tempo plantas nos biomas cerrado e mata. Árvores adultas e férteis no cerrado são encontradas com menos de 50 cm de altura, ao passo que populações precoces desta espécie não são encontradas nas áreas de matas. Assim, a padronização necessária dos indivíduos coletados para determinação do conteúdo de certo composto secundário nos dois biomas, deve levar em consideração as diferenças nas estratégias vegetativas da espécie. Figura 1. Mapa dos locais de coleta de Casearia sylvestris. Botucatu-SP, 2003. Figura 2. Aspecto de indivíduo de Casearia sylvestris var. lingua coletado no cerrado no Parque Estadual de Furnas de Bom Jesus- Pedregulho-SP. Botucatu-SP, 2003. Figura 3. Aspecto de indivíduo de Casearia sylvestris var. sylvestris coletado no bioma mata na Estação Experimental do IAC -Capão Bonito -SP. Botucatu-SP, 2003. 6.2 Estudo da variabilidade genética 6.2.1 Análise da distância genética obtida por RAPD Neste trabalho, foram testados 100 primers arbitrários para avaliar sua habilidade em promover a amplificação através da técnica de RAPD e obter padrões eletroforéticos com boa resolução. Observou-se que o processo de extração de DNA ficou dificultado pelo alto conteúdo de compostos fenólicos. Embora para todas as populações coletadas a extração tenha sido feita no máximo 24 horas após a coleta das folhas, percebeu-se que o DNA obtido foi de coloração escura, o que influênciou na quantificação e aplicação da técnica de RAPD. Para maioria dos indivíduos de todas as populações não se conseguiu obter amplificação. Após todos os testes recomendáveis para sanar o problema, optou-se pela redução da temperatura de anelamento para 30°C juntamente com a ciclagem por duas vezes do material. Só assim, conseguiu-se obter a amplificação de boa qualidade com número de bandas suficientes para o estudo proposto. Do total de indivíduo coletados (184) obteve-se amplificação com qualidade suficiente para estudo em apenas 111 indivíduos (Vassununga: 28 indivíduos; Pedregulho: 11 indivíduos; Botucatu: 11 indivíduos; Capão Bonito: 12 indivíduos; Mogi-Guaçu: 32 acesssos; Vale do Ribeira: 17 indivíduos). Os nove primers escolhidos para análise foram então utilizados para amplificação da amostra total das 111 plantas das seis populações. Estes primers produziram poucas bandas, das quais 46 bandas entraram na análise por apresentarem boa resolução (Figura 4). Bandas de intensidade muito fraca e com problemas para determinação da homologia entre indivíduos no mesmo gel ou géis diferentes foram descartadas. Das 46 bandas analisadas, 97,8 % (45) mostraram-se polimórficas e apenas 1 monomórfica. O número médio de fragmentos gerados foi de 7,6 bandas por primer. Este conjunto de bandas obtido foi utilizado para determinar a distância genética entre as populações, a partir de uma matriz binária de similariadade e dendrograma. O número e a percentagem de bandas polimórificas por população está apresentada no Quadro 3 e constitui uma forma simplificada de mensurar a variabilidade intrapopulacional (Cardoso et al., 1998). Assim, a população com menor variabilidade intrapopulacional foi a de Botucatu (58,6%) e a maior a de Mogi-Guaçu (89,7%). Quadro 3. Porcentagem de bandas RAPD polimórficas (PPB) em cada população de Casearia sylvestris. Botucatu, SP. 2003. Populações Número de bandas polimórficas PPB Cerrado Vassununga 23 79,3 Pedregulho 19 65,5 Mogi-Guaçu 26 89,7 Mata Atlântica Botucatu 17 58,6 Vale do Ribeira 24 82,7 Capão Bonito 23 79,3 M1 M2 Figura 4. Análise eletroforética dos produtos de amplificação do DNA de alguns indivíduos das populações : POP 1(Vassununga); POP 2 (Pedregulho); POP 3 (Capão Bonito); POP 4 (Vale do Ribeira) de Casearia sylvestris com primer AV-15; DNA padrão :M1 (100pb) e M2 (1 Kb).Botucatu -SP, 2003. A análise do dendrograma apresentada na Figura 5 permitiu verificar que a formação de dois grupos maiores, um com a maior parte dos indivíduos da população do Vale do Ribeira, Mogi-Guaçu e Capão Bonito e o outro com indivíduos de Vassununga, Pedregulho e Botucatu. Estes resultados apontam para uma pequena tendência de agrupamento das populações pelo bioma de origem, confirmando as diferenças taxonômicas existentes e mostrando que a variedade botânica sylvestris (mata) difere geneticamente da variedade língua (cerrado). A presença da população de Botucatu no grupo do bioma cerrado, poderia ser justificado pela indicação na literatura de área de ocorrência de áreas de cerrado dentro da Fazenda Edgardia e as coletas possam ter sido feitas em uma área de transição entre os dois biomas. Com relação a Mogi-Guaçu a mesma explicação pode ser dada, já que as coletas foram feitas em área de cerrado e de mata ciliar em populações de plantas muito próximas. Dentro dos grupos formados os indivíduos se distribuíram sem formar agrupamentos bem definidos com indivíduos da mesma população. Além disso, foi observada similaridade genética entre indivíduos de uma mesma população e também entre vários indivíduos de populações diferentes. Para melhor visualização dos grupos formados tendo as populações como unidade de análise, foi construído um dendrograma (Figura 6) ilustrando a similaridade média entre as seis populações de Casearia sylvestris obtidas pelo Índice de Jaccard. Neste dendrograma, tal como no dendrograma da Figura 5, dois grandes grupos são formados. O dendrograma não mostrou nenhum padrão explicável, tanto por padrões genéticos como ambientais com exceção das populações com maior proximidade geográfica como Pedregulho e Vassununga que apresentaram maior similaridade (72%) e Mogi-Guaçu de mata e cerrado que formaram um grupo com similaridade de 60 %. SImilaridade(Média) (Jc(i,j) ) VR(M) MG(M) MG(C) CB(M) V(C) P(C) B(M) 0,75 0,73 0,70 0,68 0,65 0,63 0,60 0,58 0,55 0,53 0,5 Figura 6. Dendrograma ilustrando a similaridade média entre as seis populações de Casearia sylvestris obtidas pelo Indice de Jaccard fornecida pelo marcador RAPD pelo método UPGMA, atavés do Programa MVSP. Botucatu-SP, 2003. 6.2.2 Estudo da diversidade genética dentro e entre populações Para calcular a diversidade genética da espécie Casearia sylvestris entre e dentro das populações analisadas foi calculada pelo índice de Shannon modificado para análises de RAPD. Os resultados obtidos são apresentados no Quadro 4. Quadro 4. Diversidade genética entre e dentro de populações de guaçatonga (Casearia sylvestris) calculada pelo Indice de Shannon (Ho). Botucatu-SP. 2003. Diversidade dentro de populações1 Vassununga Pedregulho Botucatu Capão Bonito Mogi-Guaçu Vale do Ribeira Hpop 0,175 0,166 0,185 0,241 0,242 0,251 0,208 Htot = 0,247 Variabilidade dentro (Hpop/Htot) = 0,208/0,247= 0,84 Variabilidade entre 1- 0,84 = 0,16 ∑ = −= k ji pipiH ln1 onde H= diversidade de marcas RAPD na população; k= número de marcas RAPD na população; e pi = freqüência da i-ésima marca RAPD na população. A média de H é a diversidade de marcas RAPD dentro da população (Ho). Hpop é a média de Ho. Htot é a diversidade considerando todas as marcas das populações da área em estudo. A diversidade genética média dentro das populações (Hpop) foi de 0,208 e a diversidade calculada entre as populações estudadas (Htot) foi 0,247. A proporção da diversidade dentro das populações foi de 0,84 (84%) obtida pela razão entre Hpop/Htot, enquanto que a diversidade entre as populações [1 - (Hpop/Htot)] obteve valor igual a 0,16 (16%). Assim, a diversidade dentro das populações foi maior que entre as populações. A maior diversidade dentro das populações também foi obtida quando se realizou a Análise de Variância Molecular (AMOVA) para os dados de RAPD pelo programa ARLEQUIN ver. 2000 (Quadro 5), onde a variância dentro da população (78,04 %) foi maior que entre populações (21,96%). Observa-se também que a varibilidade entre biomas (ecossistemas) não foi significativa e muito baixa ou nula (-5,73 %). Quadro 5. Análise de variância molecular interpopulacional e intrapopulacional de 111 indivíduos de seis populações coletadas no cerrado e mata atlântica do estado de São Paulo. Botucatu,SP. 2003. Fontes de Variância Graus de Liberdade Quadrados Médios Componentes de Variância Porcentagem de Variação Total Interpopulacional Entre ecossistemas 1 12,60 -0,27 - 5,73 ns Entre populações/ Ecossistemas 4 24,97 1,21 25,80 * Dentro de populações 105 3,76 3,76 79,93 * Total 110 4,61 Intrapopulacional Entre populações 5 22,50 1,06 21,96 * Dentro de populações 105 3,76 3,76 78,04 * Total 110 4,61 * significância de 1%. Praticamente toda variabilidade da espécie é representada pela variabilidade intrapopulacional. Hamirick et al. (1979), mostraram que várias outras características, além de diferenças taxonômicas, contribuem marcadamente para o nível de variação genética intrapopulacional que uma espécie contém. Espécies com um período longo de vida, ampla distribuição geográfica, reproduzindo-se através de fecundação cruzada, com alta fecundidade e participando de estágios posteriores de sucessão na ocupação de ambientes, mantêm níveis intrapopulacional de variação mais elevados que espécies com características diferentes. A variabilidade detectada dentro das populações estudadas de C. sylvestis e detectada por marcadores RAPD, deve estar relacionada a alguma característica desta espécie, como de seu sistema de cruzamento (fecundação cruzada). Segundo Barbosa (1997), C. sylvestris apresenta autoincompatibilidade, com polinização realizada por moscas, evidenciando que a fecundação cruzada é o sistema de cruzamento predominante. Segundo Gauer (1999), o sistema de cruzamento de cada espécie apresenta um efeito marcante na composição genética de suas populações. Espécies de fecundação cruzada possuem, em geral, uma alta variabilidade, suas populações normalmente têm um alto polimorfismo interno, mas uma baixa divergência entre populações, quando há fluxo gênico entre as mesmas. Assim, a maior parte de variabilidade se concentra dentro das populações ao contrário das populações de autofecundação, onde há uma acentuada diferenciação entre as populações e maior parte da variabilidade da espécie encontra-se entre as mesmas. Vários autores têm estudado a variabilidade genética em populações de diferentes espécies. Wolff et al., (1997) em estudo com a espécie Alkanna orientalis, obteve através do Índice de Shannon,variabilidade intrapopulacional de 62% e interpopulacional de 38%, a espécie é perene de vida curta com fecundação cruzada obrigatória. Valores semelhantes foram encontrados por Monogahan et al. (1996) em Tylosena esculentum, com valores de 84,6% e 15,4% para as variabilidades intra e interpopulacional, respectivamente. Da mesma forma que as outras espécies, T. esculentum também se caracterizava pela perenidade, com vida longa e fecundação cruzada predominante. Os resultados obtidos em C. sylvestris são reforçados pelo trabalho realizado com Ilex paraquarensis por Gauer (1999), usando o Índice de Shannon. A espécie foco do estudo da autora possui características semelhantes a guaçatonga, como fecundação cruzada obrigatória, perenidade de vida longa e distribuição relativamente ampla. Em concordância com a baixa variabilidade entre populações, Ohashi et al. (1992), estudando variação genética entre populações de Euterpe oleraceae Mart., a partir de caracteres quantitativos, encontraram pequena variação genética entre e grande variação dentro de populações. Este padrão de distribuição da variação genética é o esperado para espécies alógamas, que apresentam eficientes mecanismos de dispersão de pólen e sementes. Estas características favorecem o fluxo gênico entre populações, homogeneizando suas freqüências alélicas e reduzindo a divergência genética por deriva e seleção. Em populações naturais da espécie medicinal, bolsa-de-pastor (Zeyheria montana Mart., Bignoniaceae), Bertoni (2003), usando o mesmo índice, obteve valores que concordam com os autores anteriormente citados. A variabilidade intra e inter populacional foi 90,5% e 9,5%, respectivamente. Além disso, foi determinada a alogamia facultativa e indicada a fecundação cruzada como opção presente no sistema reprodutivo da espécie. Por outro lado, em estudo com a espécie medicinal autógama infalível (Mandevilla velutina Mart Woodson, Apocynaceae) Biondo (2003) usando também o Índice de Shannon, encontrou valores superiores para diversidade dentro de populações (68%) e 32% entre populações, discordando assim, do que seria esperado para espécies autógamas. Entretanto, Allard et al. (1968), ressaltam que a autofecundação não é sinônimo de pequena variabilidade genética, existindo espécies de autofecundação altamente polimórficas, isto porque o sistema de cruzamento não é o único determinante da variabilidade de uma espécie. Populações de plantas perenes com um período longo de vida são representantes de muitas gerações, de tal modo que diferentes alelos ou genótipos foram mantidos e ou selecionados durante a fase de estabelecimento de várias gerações, plantas que sobrevivem até a maturidade mantêm um registro genético destes eventos evolutivos passados, preservando assim, uma maior variabilidade genética (Hamrick et al., 1979). A distribuição geográfica de uma espécie tem grande influência sobre o nível de variabilidade da mesma (Gauer, 1999). Espécies com ampla distribuição geográfica como a guaçatonga, de uma maneira geral, possuem uma variabilidade genética superior a espécies com distribuição restrita. Isto ocorre porque populações de espécies com ampla distribuição geográfica normalmente sofrem diferentes pressões seletivas nos diferentes ambientes que ocupam. A baixa divergência entre as populações estudadas de guaçatonga poderia ser explicada pela ocorrência de fluxo gênico entre as mesmas. Populações que se encontram geograficamente próximas normalmente apresentam baixa divergência genética devido à possibilidade de fluxo gênico entre as mesmas. Além disso, a autoincompatibilidade associada a possível ampla distribuição de sementes justificada pelo consumo de frutos da espécie por pássaros (Almeida et al. 1998), podem estar contribuindo para o fluxo gênico entre as populações, já que algumas espécies de pássaros podem voar por longas distâncias. Uma outra explicação também dada por Gauer (1999) para explicar a pequena divergência genética em Ilex paraguariensis pode ser aproveitada para C. sylvestris. Segundo a autora, o isolamento geográfico das populações estudadas possivelmente tenha sido realizado em um tempo curto, para permitir a diferenciação entre as mesmas. Provavelmente as populações de erva-mate não formavam um continuo, mas as distâncias entre elas eram bem menores que as atuais, o que poderia permitir o fluxo gênico entre as mesmas, o que permaneceu até as populações estudadas. A maior variação genética dentro da população indica que a estratégia de conservação genética da espécie deve priorizar a amostragem dentro das populações (Siqueira et al., 2000). Assim, para o estabelecimento de um banco de germoplasma, a alta variabilidade genética verificada dentro das populações de Casearia sylvestris, indica a necessidade de coletas de maior número de indivíduos dentro de cada populações para representar a variabilidade existente na espécie. Por outro lado, quando se pensar na conservação “in situ” da espécie, a alta variabilidade intrapopulacional implicará na manutenção de populações com número grande de indivíduos e na preservação da espécie como um todo. 4.3 Relação espacial entre distância genética e geográfica No Quadro 6 são apresentados os dados de distância geográfica entre as populações. Estes dados foram processados pelo software Trackmaker de onde se obteve os valores de distância que foram utilizados na medida de associação espacial. Quadro 6. Distância média em Km entre as populações de Casearia sylvestris coletadas no estado de São Paulo. Botucatu-SP, 2003. População Vassununga Pedregulho Mogi-Guaçu Botucatu Capão Bonito Vale do Ribeira Vassununga 159 184,13 155 279 373 Pedregulho 224 304 432 493 Mogi-Guaçu 137 236 301 Botucatu 142 208 Capão Bonito 69,74 Vale do Ribeira A medida de associação espacial, utilizando o teste de Mantel (Z), estabeleceu correlação entre a matriz de distância genética e a matriz de distância geográfica. Para um número de 1000 permutações, com valor de significância de 0,1 %, o teste de Mantel obteve correlação significativa com r = 0,509. Portanto, existe uma correlação positiva entre a divergência genética entre as populações em estudo e a distâncias geográficas entre estas populações. Para Dillon (1984), a teoria evolucionária que considera que a distância genética entre pares de populações locais deve estar positivamente correlacionada com a distância geográfica e diferenças ambientais. O autor estudando populações de Goniobasis próxima (Say), observou que a divergência genética entre populações estava fortemente correlacionada com a distância geográfica. Resultado semelhante foi obtido por Martins (2000) com poaia (Psycotria ipecacuanha Standl., Rubiaceae), cujo valor de correlação foi de r = 0,87. A alta correlação positiva foi atribuída à grande distância geográfica e genética entre a população mais distante do Mato Grosso e as demais (Minas Gerais, Rio de Janeiro, Espírito Santo e Bahia). O valor de r reduziu a nível não significativo quando eliminada a população do Mato Grosso, indicando que as diferenças entre as demais populações deveriam estar principalmente correlacionadas com as diferenças ambientais. Por outro lado, Bertoni (2003) não obteve correlação significativa entre as distâncias genéticas e geográficas para populações de Zeyheria montana, não havendo, portanto, um padrão espacial para espécie. Allphin et al. (1998), também não obteve correlação significativa entre estas distâncias na espécie Artomecon humilis, e concluíram que a distribuição da diversidade genética e dificuldade de fluxo gênico na espécie deve ter sido causada por fatores históricos e geológicos ainda não conhecidos, mais do que por uma simples fragmentação do ambiente. 6.4 Caracterização química através da quantificação de rutina As Figuras 7 e 8 mostram os cromatrogramas e espectros no ultra- violeta de amostras de cerrado e mata. O Quadro 7 apresenta os valores médios de rutina em todas as populações coletadas no estado de São Paulo. A análise estatística dos dados obtidos por CLAE mostrou diferenças significativas nos teores de rutina entre os indivíduos de uma mesma população, independente da população estudada. Os indivíduos com maiores teores de rutina foram: população de Botucatu - indivíduo 13 (6,50 mg/g peso seco); população de Capão Bonito - indivíduo 2 (3,07 mg/g peso seco); população do Vale do Ribeira - indivíduo 22 (4,03 mg/g peso seco); população de mata ciliar em Mogi- Guaçu - indivíduo 38 (10,12 mg/g peso seco); população de cerrado de Mogi-Guaçu - indivíduo 1 (12,10 mg/g peso seco); população de Pedregulho - indivíduo 16 (12,99 mg/g peso seco) e população de Vassununga - indivíduo 18 (8,23 mg/g de peso seco). Minutes 2.5 5.0 7.5 10.0 12.5 15.0 17.5 20.0 22.5 25.0 27.5 30.0 32.5 35.0 m A U 0 100 200 300 400 500 25 .8 41 26 .2 30 27 .3 02 Detector A-280 nm Casearia Casearia54 Retention Time Spectrum at time 27.31 min. nm 200 220 240 260