i PAULA DA CRUZ LANDIM DESIGN/EMPRESA/SOCIEDADE: Tese apresentada à FAAC - Faculdade de Arquitetura, Artes e Comunicação UNESP, campus de Bauru para obtenção do Título de Livre-Docente na Disciplina Design e Arquitetura: do Ecletismo ao Pós- Modernismo: interfaces. Bauru 2009 ii REMEMBER YESTERDAY, LIVE TODAY, DESIGN TOMORROW iii AGRADECIMENTOS A realização deste trabalho só foi possível graças ao apoio incondicional de algumas pessoas e instituições. Ao meu marido, Geraldo, um grande companheiro, por acreditar que eu seria capaz, mesmo quando eu não achava. Aos meus filhos, meus melhores projetos, Pedro e Júlia, pela compreensão das minhas ausências e por estarem sempre presentes. Aos meus pais, sempre, e por tudo. Aos Judice: Marcelo, Andrea e Lucas, meu pedaço de Brasil na Finlândia. E aos que estiveram comigo nesse período, pessoalmente e virtualmente. Ao Prof. Pekka Korvenma, que tornou possível meu estágio de pós-doutorado junto a Universidade de Artes e Design de Helsinque, na Finlândia. Aos meus colegas do Departamento de Desenho Industrial da FAAC, UNESP – Bauru, pelo apoio e estímulo. Particularmente ao Prof. Plácido. À Reitoria da UNESP, especialmente à Pró-Reitoria de Pesquisa, pela Bolsa de Pós-Doutorado. À FUNDUNESP, pelo auxílio pesquisa concedido. Aos designers, conhecidos ou não, que gentilmente responderam à minha questão. A todos, meu muito obrigado. iv ÍNDICE AGRADECIMENTOS ..........................................................................iii RELAÇÃO DE FIGURAS ..................................................................... v RESUMO ......................................................................................... vii ABSTRACT ..................................................................................... viii INTRODUÇÃO ................................................................................ 01 DESIGN E DESIGNER ...................................................................... 12 DESIGN E CULTURA DE MASSA ...................................................... 30 DESIGN FINLANDES: ANTECEDENTES HISTÓRICOS ......................... 64 DESIGN BRASILEIRO: ANTECEDENTES HISTÓRICOS ....................... 114 PANORAMA ATUAL BRASILEIRO .................................................. 128 O ENSINO DO DESIGN NO BRASIL ................................................ 150 DISCUSSÃO .................................................................................. 164 CONCLUSÃO ................................................................................ 196 BIBLIOGRAFIA .............................................................................. 208 v RELAÇÃO DE FIGURAS Figura 01: Mobiliário e peças de vidro de Alvar Aalto. Museu Alvar Aalto, Jyväskylä, Finlândia.............................................................. 02 Figura 02: exemplos da produção da marca Marimekko ................ 08 Figura 03: Raymond Lowey (a); criação do Volkswagen (b) ............ 43 Figura 04: Modelo da tradicional faca PUKKO finlandesa ............... 67 Figura 05: vista externa e vistas internas de Hvïtträsk .................... 69 Figura 06: exemplo da cerâmica arte da década de 1970 ............... 80 Figura 07: exemplo da indústria de vestuário da década de 1970 .. 80 Figura 08: metro de Helsinque ...................................................... 81 Figura 09: influência Pós-moderna no mobiliário finlandês ............ 82 Figura 10: re-edição de obras de Eliel Saarinen .............................. 83 Figura 11: design para roupas esportivas ....................................... 83 Figura 12: exemplo da estética industrial para os mais diversos produtos ....................................................................................... 84 Figura 13: linha “i” da Iittala .......................................................... 86 Figura 14: exemplo da joalheria KALEVALA .................................... 88 Figura 15: (a) arte ryijy tradicional. (b) tapeçaria ryijs em relevo .... 90 Figura 16: design têxtil da Marimekko ........................................... 91 Figura 17: exemplo da série Kilta ................................................... 94 Figura 18: exemplos da produção de Alvar Aalto ........................... 97 Figura 19: Museu Alvar Aalto em Jyväskylä, Finlândia .................... 97 Figura 20: cadeira Domus ............................................................ 101 Figura 21: exemplos atuais do mobiliário produzido pela ASKO ... 102 Figura 22: exemplos atuais do mobiliário produzido pela ISKU .... 102 Figura 23: Pastilli (a) e Ball Chair (b) de Eero Aarnio e Karuselli (c) de Yrjö Kukkapuro ............................................................................ 105 Figura 24: cadeira Polaris ............................................................ 106 Figura 25: Poltrona Mole, (1961) de Sérgio Rodrigues (a). Projeto de Geraldo de Barros para a UNILABOR (b). Projeto de Carlos Millan para Móveis Preto & Branco (c) ................................................... 119 Figura 26: criação dos irmãos Campana para a coleção Verão 2009 da Melissa, inspirada na poltrona Corallo .................................... 133 vi Figura 27: cadeira Anêmona (2000) (a). Mesa Sushi (2002) (b) ..... 140 Figura 28: ventilador Spirit (1984) (a). Garrafa térmica Alladin Futura (1996) (b) .................................................................................... 141 Figura 29: Lavadora semi-automática Duppla, da Arno (a). Fogão GE Profile Digital (b). ........................................................................ 141 Figura 30: Balde para garrafa Ritz (a). Jarra Due (b). Conjunto para picar temperos (c) ....................................................................... 144 Figura 31: Luminária Bossa (a). Secador de cabelos com difusor (b). Drinn (c) ...................................................................................... 145 Figura 32: Banco Bandeirola (a). Poltrona Gisele (b). Cadeira de balanço Verão (c)......................................................................... 146 Figura 33: “Concurso Abiplast Design 2005” ................................ 156 Figura 34: “I Concurso OndaAzul Design Recult 2005” (a). “Prêmio Planeta Casa – Categoria Estudante” (b). ..................................... 156 Figura 35: “Concurso Masisa para Estudantes de Design”, Masisa e Centro de Design do Paraná, Curitiba, PR, 2002. Mesa de Centro Pettia (a) Mesa Piano (b) ............................................................. 157 Figura 36: “VIII Edição Salão Design MOVELSUL”, Bento Gonçalves, RS, 2002. Namoradeira Oriental (a), Cadeira M (b) ...................... 157 Figura 37: Mesa Flex (a), Gaveteiro 360° (b) ................................ 157 vii esumo O presente trabalho se propôs a estudar, através de um levantamento sobre o “estado da arte” do ensino do design no Brasil, da sua prática pelos designers e da visibilidade das condições daí resultantes, discutir eventuais estratégias que tornem tanto o ensino como os seus produtos condizentes com a realidade nacional sem perda da universalidade. Os resultados estão fortemente subsidiados pelo estágio de pós-doutorado cumprido na Universidade de Arte e Design de Helsinque entre agosto de 2006 e maio de 2007. R viii BSTRACT The present work brings a historical reflection of the Brazilian design and how the profession is adapting to cultural, temporal and technological changes. In other words, through a survey on the 'state of the art' of the teaching of design, of its practice by the designers, and the visibility of the conditions resulting, discuss possible strategies to make the teaching of design, as their products, commensurate with the national reality without loss of the universality. At the same time, collecting subsidies for the discussion of the situation of the teaching of design and the development of strategies to enable their improvement, as a way to have appropriate professionals to the development of products that, although with the mark of our reality and culture, are also universal The main objective of this research, was to verify how the academic training in the Brazilian design meets the expectations of society and the productive sector. The results are mainly subsidized by the research developed at UIAH - University of Art and Design in Helsinki, Finland, as a visitor researcher. A ntrodução Design é um conceito complexo. É ao mesmo tempo processo e resultado do processo. No mundo moderno, a responsabilidade da relação entre indústria e cultura recai nos ombros do design. O produto é o mediador entre a fabricação e o consumidor, e o seu design é que contém a mensagem. Com a globalização da economia de livre mercado, também o design se tornou um fenômeno verdadeiramente global. Por todo o mundo industrializado, fabricantes de todos os tipos reconhecem e implementam cada vez mais o design como um meio essencial para chegar a um novo público internacional e para adquirir vantagem competitiva. Mais do que nunca, os produtos do design dão forma a uma cultura material mundial e influenciam a qualidade do nosso ambiente e o nosso cotidiano. O design então, segundo MORAES (1999), tende a suplantar suas referências regionais, passando a utilizá-las com discrição e sutileza, como forma de identidade cultural decodificada, sem entretanto comprometer o produto final, face à competição global. Desta forma, a inserção da cultural local seria mais um aspecto a ser considerado no desenvolvimento de novos produtos. Assim, os produtos globais tornaram-se um novo desafio para designers e fabricantes, ao mesmo tempo que se transformaram em potencial estratégico de mercado para os países e suas respectivas indústrias. I 2 Por exemplo, a Finlândia, que ao longo da história da sua cultural material, se destacou no design com o uso da madeira curvada em mobiliários, tradicionalmente reconhecidos pela sua inovação, qualidade e bom design, principalmente na pessoa de Alvar Aalto. (Figura 01) Figura 01: Mobiliário e peças de vidro de Alvar Aalto. Museu Alvar Aalto, Jyväskylä, Finlândia. Esses produtos, – além de uma imagem de produção semi-artesanal cuidadosamente preservada – possuem características que os destacam nitidamente dos produtos de outros países, e portanto considerados sinônimos do design finlandês, funcionando como estratégia promocional de marketing. Paralelamente, atualmente, a Finlândia é um dos primeiros países a investir no design social, exemplificado em soluções voltadas para as limitações da terceira idade, reintegração dos deficientes na sociedade e busca de melhor qualidade e adequaçao dos produtos e equipamentos de uso médico-hospitalar. A aplicação de tais produtos destina-se ao mercado global, e apresentam também uma inovação no tocante ao design finlandês: a utilização de materiais 3 termoplásticos monomateriais na confeccção quase integral dos produtos, ilustrando a preocupação dos designers e fabricantes com os aspectos ecológicos, principalmente envolvendo a reciclagem. O design social não é nenhuma novidade enquanto discurso, mas ainda é enquanto prática. Portanto, nas palavras de MORAES, (1999): A Finlândia se insere no mercado global de grande escala industrial e de grande consumo (pequenos e médios objetos) mantendo-se fiel e coerente com sua cultura e tradição, mas ao mesmo tempo voltando-se para os caminhos que aponta o mercado internacional. A expansão de mercado empreendida pelas indústrias finlandesas não implica na sustituição dos produtos de vidro e madeira, tradicionalmente reconhecidos; ao contrário, tende a confirmar o estado de maturação dos seus designers, fabricantes e do seu próprio governo. Em contrapartida, o design no Brasil ainda não está devidamente disseminado. E ainda, quando isto ocorre, é de forma induzida por ações institucionais, levando muitas empresas a adiar seus investimentos nesta área. Por outro lado, as empresas que investem em design acabam por se destacar da concorrência nas fatias de mercado em que atuam. A importância do design não pode, por isso, ser subestimada. O design não só abrange uma extraordinária gama de funções, técnicas, atitudes, idéias e valores, todos eles influenciando a nossa experiência e percepção do mundo que nos rodeia, como também as escolhas que fazemos hoje sobre a futura direção do design terão um efeito significativo e possivelmente duradouro sobre a qualidade das nossas vidas e no ambiente nos anos futuros. 4 A pesquisa em design tem se expandido e ganho profundidade nos últimos anos. O que este campo de pesquisa pode oferecer de vital nas esferas da indústria, inovação e competitividade? Como compartilhar idéias e experiências com especialistas das esferas da indústria, desenvolvimento de inovações e da universidade? De que forma explorar e demonstrar como a educação em design, a pesquisa e a parceria com indústrias impulsionam as inovações, tanto no âmbito local como internacional? Como deve ser a pesquisa, num paradigma onde o design está se tornando uma intensiva aplicação de conhecimento por um profissional com notória independência disciplinar? O que a pesquisa em design pode oferecer no desenvolvimento de produtos? Como pode ser fortalecido o uso estratégico do design? Quais são os benefícios do design e da pesquisa em design para sistemas de inovação e competitividade industrial? Como pode a forma de pensamento do design fortalecer a criatividade industrial? Por outro lado, por que ainda estamos formando designers como talentos criativos isolados no “Planeta Design”? Em que pese a existência de afirmações em contrário, o mercado do design é dirigido pelo gerenciamento da percepção, baseando-se numa estratégia de visibilidade, trabalhando basicamente o tripé imagem/percepção/emoção, onde os pontos de tangência e as interfaces com o marketing podem ser observados, e dependendo do campo de atuação do design difícil de serem separados. Desta forma, qual deveria ser o modelo de pesquisa em design? Por que nos apropriamos de modelos de outras áreas de conhecimento? O “projetar em design” baseia-se nos esquemas clássicos de qualquer criação: definição conceitual, geração de 5 idéias, público-alvo, tendências, disponibilidade tecnológica, cultura... Em outras palavras, na necessidade de se entender para quem está se projetando, como e por que. Não pretendo entrar numa discussão do termo design. Apesar da minha discordância pessoal, por entender que ‘design’ - se traduzido para o português - quer dizer apenas projeto, havendo, portanto a necessidade de se complementar que tipo de projeto. Design pode ser entendido como projeto. Projeto equivale a sonho, que por sua vez é igual a desejo. Projeta-se a casa, uma viagem, o relacionamento ideal... Colocado desta maneira, é claro que o projeto enquanto ideário sempre existiu, mas é importante ressaltar a relação desejo/aspiração/possibilidade que se estabelece a partir da mecanização, com a Revolução Industrial. Hoje em dia tudo tem “design”. A questão que se coloca é: qual design? De boa ou má qualidade? Qual o impacto do design na sociedade industrial? Como trabalhar com as necessidades e escolhas culturais, assim como com a tradição frente a novas sensibilidades? Sendo arquiteta de formação e tendo feito o mestrado e doutorado em urbanismo, mas por força das circunstâncias trabalhando como docente em um curso de design de uma universidade brasileira há 20 anos, tenho observado a evolução/transformação tanto do design, (particularmente de produto, apenas por ser esta a minha área de atuação) quanto do seu ensino, assim como a crescente formação de massa crítica nacional. E uma questão tem sistematicamente surgido em minhas constantes indagações: até que ponto a formação acadêmica responde aos anseios da sociedade e do setor produtivo? 6 Desde o início de 2004 vinha mantendo contato com o Prof. Pekka Korvenma, da Universidade de Arte e Design de Helsinque, na Finlândia, e assim surgiu a possibilidade de verificar estas mesmas questões numa realidade sócio-cultural e econômica bastante diversa da realidade nacional, ou seja, estabelecendo um paralelo com a produção finlandesa, ao mesmo tempo em que me aperfeiçoando na área em que atuo. A Universidade de Arte e Design de Helsinque é uma universidade internacional dedicada ao design, comunicação audiovisual, educação de arte e arte. É a maior universidade do seu tipo na Escandinávia e tem uma presença internacional forte e ativa. A Universidade foi fundada em 1871, e é pioneira em pesquisa e educação. É a única instituição oficial a ter graduação em design. Quando o termo design é utilizado na Finlândia, quase sem exceções se refere a profissionais graduados por esta escola. A universidade também tem sido lembrada como centro de debates sobre a profissão de designer. A agenda de pesquisa, material empírico e métodos aqui apresentados também foram pertinentes no contexto finlandês. Encontrei profissionais interessados e pesquisadores nos programas de Design de Interiores e de Mobiliário assim como no de Design Estratégico, sendo que um dos trabalhos de pós-doutorado de pesquisadores locais tem uma temática muito próxima da minha própria pesquisa, fazendo com que ocorresse uma troca frutífera de idéias. Os resultados então são fortemente subsidiados pelo estágio de pós-doutorado cumprido na Universidade de Arte e Design de Helsinque entre agosto de 2006 e maio de 2007. O objetivo desta pesquisa foi verificar até que ponto a formação acadêmica ministrada nos cursos de design 7 responde aos anseios da sociedade e do setor produtivo e o de coletar subsídios para a discussão da situação do ensino de design no Brasil e elaboração de estratégias que permitam sua melhoria de maneira a ter profissionais adequados ao desenvolvimento de produtos que embora com a marca da nossa realidade e cultura, sejam tambem universais. Muitas das questões estão ainda em aberto, tornando necessária uma perspectiva interdisciplinar juntamente com um entendimento da relação de causa e efeito. Mas de qualquer forma, as universidades têm um papel chave em desenvolvimentos futuros. Principalmente numa sociedade em rede e com a competição globalizada; a educação e pesquisa vão constituir importante capital privado nacional. Por exemplo, o fator principal que contribuiu para o sucesso internacional dos anos dourados do design finlandês foi o esforço determinado de designers talentosos com o significativo papel de H. O. Gummerus, diretor de negócios da Sociedade Finlandesa de Artesanato e Design. Mas qual foi o papel da educação? Qual foi a função de suporte do Estado e a demanda da sociedade depois da Segunda Guerra? Como pode o Funcionalismo e o Modernismo promover a emergência do design finlandês? Era Marimekko1 (Figura 02) mais um movimento popular, social e cultural do que um negócio envolvendo marketing e design? 1 http://www.marimekko.fi/eng Companhia têxtil, fundada em 1951, dentro da política de reconstrução da Finlândia após o final da II Guerra. Ganhou fama internacional na década de 1960. Produz e comercializa roupa de alta qualidade, tecidos para decoração de interiores, bolsas e outros acessórios. 8 Figura 02: exemplos da produção da marca Marimekko. SPARSHOTT, (1998) filósofo canadense e pesquisador da área de estética, alerta que o futuro é dependente do futuro da filosofia, que por sua vez baseia-se no desenvolvimento das universidades, assim como em geral o futuro do design. O tema principal é o papel da pesquisa universitária na criação de “um mapa de conhecimento”. Por mapa, Sparshott entende a classificação do material pertinente a uma área específica – em estética pela classificação sistemática das artes. O futuro da estética é assim necessário para o futuro da filosofia e por extensão para o futuro da sociedade, onde as universidades e pesquisas representam um papel importante. Num ponto de vista similar, poderia ser sugerido que as artes aplicadas, assim como a arquitetura e o design, dependem especialmente do desenvolvimento das artes puras e da cultura, assim como das universidades e suas pesquisas. Estética é tradicionalmente estudada sob o domínio da filosofia associada com arte e conceito de beleza. Design e estudo de estética têm feito muito pouco em conjunto. A pesquisa em design tem emprestado largamente suas abordagens da história, da sociologia e da semiótica, e mais recentemente da economia. Tem havido relativamente pouca pesquisa sobre design – este 9 mapa de conhecimento precisa ser construído constantemente. Para JULIER (2006) Design Culture é o estudo das inter- relações entre os artefatos de design, em todas as suas manifestações possíveis, ou seja, o trabalho dos designers e a produção do objeto, – incluindo marketing, publicidade e distribuição – e seu consumo. Portanto Design Culture refere- se às características formais, como estas são criadas e/ou surgem, e os vários significados e funções que o design representa. Estamos vivendo tempos impressionantes. Mídia digital, biotecnologias, sustentabilidade, globalização, mudanças nas estruturas pessoais e políticas, tudo abrindo novos desafios e possibilidades para o design. Existe atualmente um crescimento sem precedentes do uso de design no mundo. Ao mesmo tempo, a prática do design está se tornando incrivelmente exigente. A profissão requer avanço, pensadores criativos que possam entender as circunstâncias complexas e propor respostas inovativas. Mas se Design Culture é para ser consolidada como uma disciplina acadêmica, que relação deve ter com outras categorias e com a prática do design? Qual seria o papel da universidade neste contexto? Poucas profissões estão tão ligadas ao ensino universitário como o design, e pode-se até afirmar que a sua auto-imagem passa pela Universidade, pois o perfil deste profissional foi dado pela Bauhaus. A escola alemã fundada por Walter Gropius em 1919, em meio à euforia com o fim da I Guerra Mundial, e seus métodos de ensino, forneceu a espinha dorsal para os cursos superiores de design por todo o mundo, marcando de tal modo a imagem do designer que se 10 torna praticamente impossível entender o que é o design e o designer atualmente sem entender o que foi a Bauhaus. Este trabalho justifica-se pelo momento extremamente frutífero que atravessa o design nacional. E da mesma forma, nos Cursos de Pós-Graduação em Design das Universidades Brasileiras, o momento também é propício para ações que tenham por objetivo principal o fomento à ciência, tecnologia e inovação nesta área, contribuindo para o cenário futuro do design nacional a curto e médio prazo. As questões relacionadas ao design nacional sejam elas de cunho analítico ou projetual, são mais do que nunca pertinentes e relevantes no atual contexto brasileiro. Durante a última década do século XX e nestes anos iniciais do século XXI, vê-se com satisfação a atividade do designer assim como a sua produção crescer e florescer tanto nos meios acadêmicos como empresariais. O design brasileiro tem se firmado inclusive internacionalmente, não apenas em termos de premiações em concursos, mas como diferencial competitivo em termos de mercado internacional, com o incremento do design nacional, paralelamente a uma definição de identidade, através de uma reflexão histórica do design brasileiro e o modo como a profissão tem se adaptado às mudanças culturais, temporais e tecnológicas. Paralelamente, os críticos do marketing moderno costumam dizer que quanto mais aumentam as opções de consumo, menos o consumidor parece ter qualquer outra opção senão consumir cada vez mais. Existe um fundo de verdade inegável nessa afirmação. Certamente há um ganho, pois há uma variedade maior de opções de consumo, mas existe uma perda também, em termos de conseguir enxergar opções para além do consumo. Não restam dúvidas que 11 existem mais opções de consumo hoje do que trinta anos atrás, mas isto não necessariamente se traduz em um aumento proporcional do número de consumidores. O crescimento do consumo não tem correspondido historicamente a uma ampliação do poder de compra médio; ao contrário, quanto mais rico fica o país, mais parece aumentar o número de pobres. Para o designer brasileiro, essa simples constatação coloca um grave problema profissional: como fazer design na periferia do sistema? Ou seja, qual seria o papel do design na sociedade brasileira? O que se projeta aqui? O que se deve projetar aqui? Como? Para quem? Será que se pode falar de um design brasileiro, propriamente dito, e como seria este? 12 esign e designer No mundo moderno, a responsabilidade da relação entre indústria e cultura recai nos ombros do design. O produto é o mediador entre a fabricação e o consumidor, e o seu design é que contém a mensagem. Para ver design desta maneira, mais do que simplesmente o mediador entre o status social instantâneo e estilo – o que a propaganda gostaria que acreditássemos – deve-se colocá-lo num contexto muito mais abrangente do que a mídia normalmente apresenta. De acordo com ONO, (2006): Considerando-se que o design envolve planejamento, seleção de modos de pensamentos e valores, entende-se que o designer é co-responsável pelas relações que se estabelecem entre os artefatos e as pessoas, bem como pelas suas implicações na sociedade. Design é um conceito complexo. É ao mesmo tempo processo e resultado do processo. As dimensões, estilo e significado dos artefatos foram “designed” 1. Vários fatores influenciam o processo: a idéias do designer (se houver um envolvido); as determinantes tecnológicas da fabricação do produto; os contrastes sócio-econômicos entre o processo de fabricação e o consumo do produto final; o contexto cultural que dá sentido a necessidade do objeto em primeiro lugar; e as condições de produção. A situação política do país produtor do objeto pode influenciar o modo como este será feito assim como sua aparência final. 1 “Desenhados e/ou projetados”, numa tradução livre. D 13 Pode-se ir mais além. Design por sua vez também é afetado por influências, ideologias sociais e mudanças. As mudanças no papel feminino, - tais como trabalho o fabril – estas e outras atitudes e mudanças sociais têm influenciado a natureza da produção em massa dos artefatos que nos circundam. Forças que encorajem coesão social são freqüentemente sentidas através do design dos objetos – algumas vezes são de fato estes que sugerem a mudança social. Desde o século XVIII a sustentação dominante para o design tem sido o sistema de produção e consumo em massa, baseada na junção de forças da indústria e do comércio. Um dos temas ao qual design é inevitavelmente ligado é ao crescimento da economia capitalista. Está evidente na evolução do design, e é parte integrante do seu desenvolvimento, assim como a divisão do trabalho, os objetos de desejo, e as empreitadas empresariais para captação de novos mercados. Moda e design, por exemplo, têm estado intrinsecamente ligados desde há muito até os dias atuais. Em países com a necessidade de comunicar uma identidade nacional forte, o design pode também se transformar numa ferramenta para tal, como é, por exemplo, o caso da Finlândia, logo após a II Guerra. Ou ainda, como forma de promover um novo estilo de vida para as donas de casa norte-americanas na década de 1950, através dos eletrodomésticos. Design, como significado de comunicação, é capaz de converter tantos significados quantos formos capazes de transmitir. Entretanto, existe perigo em enfatizar o significado do papel do design no contexto social, econômico, político e 14 ideológico. Apenas nas mãos de produtores responsáveis, designers, críticos e teóricos é que o design pode ser um poderoso agente de transformações. De qualquer maneira, compartilhando a opinião de ONO, (2006) o design pode se constituir em prática emancipatória, desde que participe do desenvolvimento de produtos que promovam o aperfeiçoamento, a auto-expressão e a soberania dos indivíduos e sociedades, inclusive daqueles que vivem em condições de pobreza e à margem dos mercados econômicos. A democratização do design tornou-se uma realidade que afeta praticamente toda escolha de consumo. A aceleração da redundância estilística tem feito o designer precisar constantemente providenciar novos estilos para substituir os existentes no mercado. Com as vantagens da automação, a indústria organizou seus métodos de produção de forma a atender a esta grande variação estilística. O antigo sistema fordista, o qual equivalia à produção em massa estandardizada, está morto, assim como a equação do Modernismo de mecanização e universatilidade. É lógico que os valores do Modernismo ainda determinam muito do design, particularmente em educação. Embora parte e parcela da produção e do consumo de massa, alguns designers ainda resistem a esta aliança, preferindo ter seus valores mais relacionados à área de produção artesanal. A história do design moderno desde o século XVIII é a história desta resistência, da tensão entre as inexoráveis regras do comércio e o idealismo de incontáveis indivíduos que se recusavam a aceitar a morte do artesanato e seus valores. A principal lição a ser aprendida é que as mudanças culturais são muito mais lentas que as na organização da produção e consumo. Apesar de desde os primórdios do consumo de 15 massa as regras da moda e a ligação entre a possessão de certos objetos e status social serem realidade já no início do século XVIII, até hoje ainda não se aprendeu completamente como chegar num acordo com estas forças. As responsabilidades do designer são várias. Estas incluem não apenas projetarem os componentes do objeto em si, colocando-os juntos de forma apropriada, mas também inclui serem os intérpretes dos nossos sonhos, das nossas aspirações e da nossa ansiedade, criando símbolos formais em objetos cotidianos apropriados para tal. Formamos nossas identidades, individuais e/ou coletivas, através das coisas que nos cercam, e os designers também tem que levar isto em conta. Designers também trabalham com um enorme número de contrastes. Se os objetos são para produção em massa – o que a partir do século XX é o caso mais comum – tem que se trabalhar com todas as demandas da produção industrial, assim como, e cada vez mais importante nas últimas décadas, para qual mercado. Tem que se entender as técnicas de produção e as possibilidades e limitações de cada material. Também se deve ter algum insight sobre as necessidades, desejos e gostos dos consumidores. São os criadores do meio- ambiente material que habitamos, e desta forma devem ter uma visão, ou ao menos saber como deveria ser este meio- ambiente, e qual o efeito sobre nossas vidas. Alguns têm explorado as possibilidades até o limite, imaginando novas formas e criando novos significados para o objeto projetado. Outros têm trabalhado nos aspectos teóricos e ideológicos do design, posicionando seu papel dentro do grande quadro cultural e econômico. E ainda outros têm tido visões pessoais 16 que tem coincidido com a estética e as necessidades emocionais do público. Desde os anos 80 do século XX o termo design tem sido apropriado pela mass media e pela indústria da propaganda como o “caminho” para agregar “desejabilidade” aos produtos. Consciência de estilo tornou-se condição sine qua non não apenas para os jovens, mas para todo um grupo de consumidores, e mesmo a mais sofisticada diferenciação entre produtos tem sido rotulada como possibilidades estilísticas de escolha, determinadas pelo sexo, idade ou classe. O uso da palavra design passou a ser muito explorado pelos meios de comunicação, principalmente na publicidade, demonstrando com isso a força que o design agrega como valor de imagem, mas pouco se fala do seu conteúdo. Possivelmente o desconhecimento da importância do design no contexto das empresas tenha provocado esse excesso de exposição, gerando equívocos e deturpações como a utilização do design como marca, como Hair Design em vez de cabeleireiro, Flower Design em vez de Floricultura, ou Design Tour para agência de turismo, só para citar alguns exemplos. O design engloba uma extraordinária variedade de funções, técnicas, atitudes, idéias e valores. É um meio através do qual se experimenta e se compreende o mundo que nos rodeia, desde bens de consumo e embalagens, até sistemas de transporte e equipamento de produção, e não pode ser totalmente compreendido fora dos contextos social, econômico, político, cultural e tecnológico que levaram à sua concepção e realização. Definido no sentido mais global, como concepção e planejamento de todos os produtos feitos pelo homem, em princípio o design pode ser visto como um instrumento para 17 melhorar a nossa qualidade de vida. Ao mesmo tempo, os interesses dos negócios para criar produtos competitivos conduziram à evolução e diversidade do design. Desta forma, ao refletir sobre a história do design industrial, verifica-se que este procura consistentemente desmistificar a tecnologia e oferecê-la em formas acessíveis ao maior número possível de pessoas. Como um canal de comunicação entre pessoas, o design oferece uma visão particular do caráter e do pensamento do designer e das suas convicções do que é importante na relação entre o objeto (solução do design), o utilizador/consumidor, e o processo do design e a sociedade. Os produtos, estilos, teorias e filosofias do design tornaram-se cada vez mais diversificados. Isto devido em grande parte à crescente complexidade do processo do design. Cada vez mais no design, principalmente para a produção industrial, a relação entre concepção, planejamento e fabricação é fragmentada e complicada por uma série de atividades especializadas interligadas envolvendo diferentes indivíduos, tais como autores dos modelos, pesquisadores de mercado, especialistas de materiais, engenheiros e técnicos de produção. Os produtos do design que resultam deste processo multifacetado não são fruto de designers individuais, mas de equipes de indivíduos, cada um com as suas idéias e atitudes sobre como as coisas devem ser feitas. A pluralidade também é devida às alterações de padrões de consumo, de gosto, alterações de imperativos comerciais e morais de inventores, designers, fabricantes, progresso tecnológico e variações de tendências nacionais do design. Ao realçar a natureza diversificada do design, objetiva- se demonstrar que as atitudes, idéias e valores comunicados pelos designers e fabricantes não são absolutas, mas sim 18 condicionais e flutuantes. As soluções do design, mesmo para o mais objetivo dos problemas, são inerentemente efêmeras, como as necessidades e preocupações dos designers, fabricantes e mudanças na sociedade. Talvez a razão mais significativa para a diversidade no design, no entanto, seja a crença generalizada de que, apesar da autoridade e sucesso de soluções de design particulares, há sempre uma maneira de fazer melhor as coisas. Nas palavras de Ono (2006): Várias propostas de designers e teóricos emergiram, em reação à multiplicidade de designs, na tentativa de se encontrar uma estética unificada, de abrangência universal e independente da diversidade cultural dos indivíduos, anseios, necessidades e realidades particulares. Proposições deste tipo tornam-se, no entanto, inconsistentes, na medida em que, por mais simples que seja um objeto, a percepção que se tem do mesmo, os significados e usos que assume para cada pessoa varia substancialmente. Com a globalização da economia de livre mercado, também o design se tornou um fenômeno verdadeiramente global. Por todo o mundo industrializado, fabricantes de todos os tipos reconhecem e implementam cada vez mais o design como um meio essencial para chegar a um novo público internacional e para adquirir vantagem competitiva. Mais do que nunca, os produtos do design dão forma a uma cultura material mundial e influenciam a qualidade do nosso ambiente e o nosso cotidiano. A importância do design não pode, por isso, ser subestimada. O design não só abrange uma extraordinária gama de funções, técnicas, atitudes, idéias e valores, todos eles influenciando a nossa experiência e percepção do mundo que nos rodeia, como também as escolhas que fazemos hoje sobre a futura direção do design 19 terão um efeito significativo e possivelmente duradouro sobre a qualidade das nossas vidas e no ambiente nos anos futuros. O mercado está gerando um número excessivo de produtos semelhantes, com a mesma tecnologia, o mesmo preço, o mesmo desempenho e as mesmas características. Essa avalanche de opções acaba confundindo o consumidor que tem dificuldade em perceber essas diferenças, e em atribuir a elas o seu devido valor. Desse modo, de maneira crescente, muitas indústrias e firmas utilizam o design como forma de se diferenciar das demais. Atualmente, o design se destaca como um dos principais fatores para o sucesso de uma empresa, desde o desenvolvimento de produtos e serviços até sua comercialização, por meio da otimização de custos, embalagens, material promocional, padrões estéticos, identidade visual, adequação de materiais, fabricação e ergonomia. Além disso, também é um fator essencial de estratégia de planejamento, produção e marketing. O design de embalagem e as estratégias de branding passaram a ser alguns dos grandes diferenciais de um produto ao criarem o impacto visual necessário para a sua identificação no ponto-de-venda. O design de embalagem não apenas atrai o consumidor; ele também estabelece um contato emocional com este. O design tem também uma enorme importância na gestão. Valorizar o design é garantir competitividade ao produto e desenvolvimento à empresa, desde que realizado por profissionais experientes, que saibam adequar recursos da 20 empresa, necessidades do mercado e metas a serem alcançadas. Além disso, é pouco provável que o designer, ao seguir toda a metodologia de desenvolvimento de produtos que, entre outras questões, considera: a problematização, o estudo da tarefa, os requisitos e restrições projetuais, entre outras questões e sistemas, os materiais, os processos, a semiótica e o mercado, desenvolva um produto menos competitivo do que aquele empresário que considere, apenas, alguns fatores. Desenvolver um produto sem a participação de um designer pode, muitas vezes, envolver menos custos, mas é um enorme risco. Quando o produto é lançado no mercado é que se evidencia o grande diferencial: os consumidores percebem que o produto não satisfaz e a sua reação é não comprar. Com isso, os volumes de venda não atingem patamares satisfatórios, gerando prejuízos. É importante que o empresariado tenha consciência de que as suas decisões de gastar pouco com o desenvolvimento de produtos, pode levá-lo a gerar grandes prejuízos mais adiante. O custo de se contratar o trabalho de um bom profissional de design é facilmente absorvido diante dos bons resultados que a empresa experimenta ao longo da vida útil do produto. Para ser usado de modo estratégico, o design deve estar integrado e participar das definições estratégicas, a partir de nível decisório mais alto e integrado com todas as áreas relevantes. O design estratégico se materializa quando o importante é desenvolver o produto certo - eficácia do processo de design e não somente desenvolver corretamente o produto - eficiência no processo de design. No design estratégico, a forma segue primeiramente a função de 21 comunicar. É importante que os consumidores entendam que aquele produto fornecerá os benefícios desejados, sejam eles oferecidos por funções práticas, estéticas ou por funções simbólicas. Sendo assim, para um design estratégico, a forma segue a mensagem. A linha de bons produtos de uma empresa garante sua sobrevivência. Mas, o que podemos conceituar como sendo um bom produto? Sob o ponto de vista comercial, o bom produto é aquele que se vende em quantidades suficientes para cobrir os custos fixos e variáveis e ainda gerar lucro que garanta a manutenção e o desenvolvimento da empresa. Gerenciar a área de desenvolvimento de produtos é uma tarefa desafiadora que envolve inúmeros aspectos: design; mercado; produção; custos; concorrência; novas tecnologias; novos materiais e processos de fabricação; ergonomia, engenharia de produção e muitos outros. Esse é um aspecto que, há algum tempo, estão incorporados às grandes corporações e as marcas de alta visibilidade, que investem em design e obtêm resultados expressivos na conquista da preferência do consumidor. Seja para uma empresa de grande, médio ou pequeno portes, no ponto-de-venda todos têm acesso ao consumidor e aquela que investe em design tem mais condições de se destacar e se tornar uma marca vencedora. Um design bem- feito aumenta a utilidade e o valor de um produto, reduz custos com matéria-prima e produção, além de ampliar a interação com o usuário e realçar a estética. O design de fato desempenha papel econômico expressivo, entretanto o público tem enorme dificuldade em compreender a atividade e seus benefícios, tais como o papel social gerador de empregos, educação, qualificação 22 profissional e social. A maioria dos benefícios percebidos é superficial, ligados à beleza e à comunicação comercial. A percepção dos benefícios dos produtos é agregada às marcas proprietárias. O “mercado” tem seus vícios e só consegue avaliar o benefício econômico direto: a cada centavo investido, a quantia de centavos de retorno. Em outras palavras, se essa compreensão da função do design é tão elementar e os benefícios tão aparentes, por que ainda hoje é tão difícil justificar o papel do design como atividade transformadora e geradora de benefícios palpáveis? Por outro lado, assim como existe um prazer do design, existe um design para o prazer. Porém a formação dos designers privilegia as demandas mercadológicas sobre a invenção e inibe a demanda interna pela auto-expressão. Ou seja, a especialização difundida na maioria dos programas de ensino caminha na direção inibidora da inventividade. Entretanto, sendo o design uma atividade social, geradora de bens coletivos, exige uma formação mais ampla, humanista, consciente do impacto ambiental. Se o objetivo principal do design é o de tornar a vida das pessoas melhor, a prática do design deve responder às necessidades técnicas, funcionais e culturais e criar soluções inovadoras que comuniquem significado e emoção e que transcendam idealmente as suas formas, estrutura e fabricação. Independentemente deste objetivo comum, as respostas à questão "Qual é a sua visão sobre o futuro do design?”, são notavelmente variadas. A crescente disponibilidade de novos materiais sintéticos é largamente identificada como uma das forças de motivação-chave por detrás do surgimento de novos produtos. Mas enquanto a maioria dos designers prevê, que "a integração 23 de materiais e processos de alta tecnologia alargará e tornar-se-á mais acessível", outros têm demonstrado a preocupação de que os sintéticos podem por vezes ser difíceis de trabalhar e nem sempre são desenvolvidos para resistir ao desgaste do tempo. As novas tecnologias - computadores, comunicações e processos industriais - têm, nos últimos anos, ajudado muito na pesquisa e implementação do design, e prevê-se que originem produtos cada vez mais miniaturizados, multifuncionais e de melhor desempenho. Estes tipos de tecnologias estão contribuindo para melhorar o processo de design, desde o conceito inicial até o protótipo de trabalho. Ao acelerar o processo de design, estas tecnologias não só reduzem os custos iniciais dos fabricantes, como também proporcionam aos designers grande liberdade de experimentação. Espera-se que as tecnologias de informação sejam incorporadas no design de produtos de tal forma que passarão eventualmente a ser consideradas como qualquer outro tipo de material -tal como o vidro ou os plásticos -, com o qual se poderão desenvolver soluções inovadoras e de melhor desempenho. No entanto, em oposição a esta visão de um esplêndido novo mundo de penetrante tecnologia avançada, alguns designers promovem o uso de processos mais naturais, que não só tenham um impacto mínimo no ambiente natural, como também rejeitem a exigência instável da cada vez maior variedade e volume de produtos. Em resposta à complexidade tecnológica corrente, a simplificação tornou-se claramente um objetivo-chave do design. Há poucas dúvidas de que a futura tarefa dos designers será a de conceber produtos fáceis de compreender e que possam ser usados de forma intuitiva. Da mesma forma, a 24 simplificação da forma estrutural não só proporcionará o meio através do qual os designers poderão obter o máximo a partir do mínimo, mas também ajudará na realização de formas que possuam uma pureza emocional inerente. A simplificação no design reduzirá assim o ruído branco da vida contemporânea e proporcionará um dos melhores meios de realçar a qualidade dos produtos e, por isso, a sua durabilidade. Os aspectos psicológicos do design são também extensamente mencionados com uma importância sem precedentes. Há um consenso generalizado de que os produtos devem estar para além das considerações de forma e função se pretendem tornar-se "objetos de desejo" num mercado cada vez mais competitivo. Para se conseguir isto, os produtos precisam estabelecer ligações emocionais agradáveis com os seus usuários através do prazer da manipulação e/ou da beleza da sua forma. A emotividade é considerada por muitos dos designers não só uma forma poderosa e essencial de facilitar ligações melhores e mais significativas entre os produtos e os seus usuários, como também um meio eficaz de diferenciar as suas soluções das dos seus competidores. Vivemos num mundo de signos e simbologias, e esta realidade é também um dos pilares de sustentação do design. Numa sociedade globalizada, adquire-se não apenas o objeto, mas o discurso do objeto. De todos os temas que emergem, a tendência para as soluções individuais ou universais inclui potencialmente as conseqüências mais abrangentes do futuro curso do design. Enquanto alguns designers promovem o individualismo no design como um canal para a expressão criativa pessoal ou para satisfazer a exigência do consumidor por produtos individualistas, outros advogam soluções universais, que 25 normalmente são mais sãs em termos ambientais e cuja ênfase sobre a maior durabilidade estética e funcional oferece um melhor valor em termos financeiros. O individualismo no design pode ser visto como uma reação contra a uniformidade da produção em massa e, em último caso, contra a crescente homogeneização da cultura global. Mas, com o objetivo de proporcionar maior conteúdo expressivo, as soluções individualistas de design conduzem muitas vezes a custos mais elevados e obsolescência estilística acelerada. Posto isto, não é surpreendente que, como forma de abordagem do design, o individualismo se tenha mantido até agora no reino dos produtos da peça-única e da fabricação por lotes, em vez de fazer sérias incursões pela produção industrial em grande escala. Apesar da discussão do individualismo contra a universalidade ter começado no início da prática do design moderno, mantém-se um paradoxo fundamental: enquanto a natureza das soluções de design universais pode por vezes ser alienada, as soluções de design individualistas continuam a ser apanágio de uma elite abastada. No entanto, as novas tecnologias têm-se tornado cada vez mais acessíveis proporcionando talvez os meios necessários para que finalmente estes dois campos se reconciliem. O futuro do design poderá assim basear-se na criação de soluções universais que possam ser eficientemente adaptadas para responder às exigências individualistas. O debate dos designers sobre a adequação das soluções individualistas contra as universais talvez se possa explicar através da relativa ausência de hipóteses sobre uma teoria unificada ou uma nova base filosófica de design. Enquanto muitos discutem o atrativo que poderia haver em satisfazer as necessidades de um maior individualismo no 26 design, poucos comentam a futura viabilidade de tal abordagem, com as suas implicações em relação à crescente produção de resíduos. No entanto, alguns designers adotam uma visão global das preocupações correntes e a longo prazo. Na verdade, há uma necessidade crescente para que os designers se vejam a si próprios como responsáveis pelas suas soluções de produto e que as desenvolvam dentro de uma compreensão do impacto ambiental de cada aspecto da sua produção, uso e eventual eliminação - do berço á cova. O design de produto começa a manifestar respostas compatíveis com seu papel, recorrendo à promoção do desenvolvimento sustentado pela utilização de matérias- primas de origem certificada, cuja produção envolve a qualificação profissional local e impacto social e ambiental positivo. As tendências atuais do design ilustram a preocupação em reverter danos causados ao planeta pela industrialização em massa dos séculos XIX e XX, através de uma abordagem mais responsável da durabilidade dos produtos, ou seja, produtos mais eficientes em relação ao consumo de energia, com preocupações ecológicas e bens recicláveis, com baixo custo, economia de materiais e racionalização dos componentes. Mas também há uma pressão em relação à exigência de ligar o consumidor de modo mais significativo a produtos cada vez mais complexos tecnologicamente. Para este fim, parece que uma abordagem do design mais considerada e centrada no homem poderia proporcionar os melhores meios para satisfazer as necessidades funcionais e psicológicas. Como os designers desempenham claramente um papel-chave na determinação da natureza dos produtos 27 manufaturados, há poucas dúvidas de que eles influenciem excepcionalmente as expectativas e hábitos de compra dos consumidores. Há conseqüentemente um crescente imperativo moral para que eles tracem uma nova e melhor orientação para o design, nomeadamente uma que se concentre no desenvolvimento de soluções de necessidade real, humanas e sustentáveis. Ao optar pelos materiais e tecnologias avançadas, e empenhando-se ao mesmo tempo em proporcionar soluções de design simplificadas com uma ligação emocional mais fácil com o consumidor, os designers devem conseguir criar os tipos de produtos éticos e relevantes que irão ser necessários no futuro. A qualidade da cultura material global está sendo determinada pelas ações e escolhas que fazemos agora, e por isso deve ser correto que cada indivíduo - criador, fabricante e consumidor - compreenda a necessidade de uma cultura baseada na responsabilidade e deve partilhar o objetivo coletivo de construir um amanhã melhor. A natureza dos produtos industriais é determinada por um processo de design ainda mais complexo que está sujeito a muitas influências e fatores diferentes, de que avultam as restrições impostas pelos contextos sociais, econômicos, políticos, culturais, de organização e comerciais, dentro dos quais os novos produtos são desenvolvidos, e o caráter, pensamento e capacidades criativas dos designers individuais ou equipes de designers, especialistas alinhados e fabricantes envolvidos na sua produção. A discussão sobre a cultura e a identidade de indivíduos e grupos sociais é fundamental para o entendimento do papel do design no desenvolvimento dos artefatos que compõem a cultura material, e desta forma se 28 tornam os referenciais que contribuem para o (re) conhecimento dos povos e da sociedade que os desenvolvem. A pluralidade e a dinâmica cultural das sociedades requerem um conceito igualmente plural e dinâmico de identidade no design, onde seja considerada a herança cultural dos indivíduos e grupos sociais, suas transformações e inter- relações. Neste contexto, é necessária uma postura que considere os valores culturais fundamentais, mas que também esteja aberta às contribuições do mundo, as quais possam ser absorvidas pelas culturas locais na construção de um caminho próprio. A identidade cultural se fundamenta na diversidade, e, portanto possui um caráter dinâmico e multidimensional, não podendo ser entendida como algo imutável. Da mesma forma que a discussão sobre a diversidade cultural como expressão de identidade é fundamental para o entendimento do papel do design no desenvolvimento de produtos para a sociedade, diante dos imperativos de padronização e diversificação e da questão local e global que se remetem à dialética entre a uniformização cultural e a diversidade de identidades, no contexto da cultura material. Desta forma, cabe ao designer, – no desenvolvimento de produtos para a sociedade mundial – contribuir para a formação de uma comunidade global, eliminando-se as rivalidades entre as nações, e ao mesmo tempo preservando as diferentes identidades culturais. Desta maneira: Configura-se, portanto, um grande desafio: perceber as diferentes realidades e necessidades dos indivíduos e grupos sociais, e buscar soluções menos egoístas e mais adequadas para o desenvolvimento da sociedade como um todo. Isto exige uma visão não-reducionista e o esforço conjunto das 29 sociedades “centrais” e “periféricas”, cuja diversidade cultural não deve ser considerada como um obstáculo, mas antes uma riqueza e importante fonte estratégica para o desenvolvimento sustentável de produtos com qualidade, voltados para o bem estar das pessoas. ONO (2006) “Pense globalmente, aja localmente”, a globalização dos produtos, de acordo com ONO, (2006) exige que estes se comuniquem com os mercados de maneira a transpor as barreiras culturais. Isto é, a globalização, apesar de inevitável, não ocorre de modo homogêneo, e assim sendo, ao contrário de submeter-se passivamente aos padrões impostos, buscar soluções criativas que reduzam ao máximo os custos sociais. 30 esign e Cultura de Massa O que irá acontecer à cultura nacional num mundo caracterizado pela internacionalização, convergência e globalização? O mundo da internet, o qual substituiu hierarquias no conhecimento de lugares, está fazendo com que seja inevitável pensar sobre isto. Qual o futuro do design? O futuro do design é dependente de uma contínua reavaliação do passado, dos futuros designers e do desenvolvimento da cultura e da sociedade como um todo. As necessidades dos jovens designers é que irão moldar o futuro, através do conhecimento do passado, seus sucessos e falhas, da história e suas análises, ou seja, o mapa do conhecimento do passado, e ainda, da análise perceptiva do presente e seus fenômenos. A idéia de cultura, segundo HESKETT, (2008) diz respeito aos valores compartilhados em uma comunidade. E desta forma pode ser entendido como o modo de vida característico dos grupos sociais, o qual é assimilado e expressado através de vários elementos tais como valores, comunicações, organizações e artefatos. Na verdade este conceito engloba o dia a dia cotidiano dos indivíduos, estando assim, intrinsecamente ligado ao papel do design no cotidiano das pessoas. Designers não trabalham sozinhos. Eles precisam de ordens, comissões, críticas e de quem os compreenda. A funcionalidade e todos os fatores de pano de fundo são D 31 condições necessárias para o sucesso em parte individual de um designer. O futuro do design requer cooperação, envolvendo educação em design, organização em design, designers, pesquisadores, críticos, a imprensa, a comunidade empresarial e pública. Também como pano de fundo está o Estado e a Sociedade. Design e designers são, e tem sido por muitos anos, um “sine qua non” do sistema comercial moderno. Pensando as atividades de produção e consumo, quais as necessidades e desejos as pessoas (conscientemente ou não) vão encontrar através de imagens visuais, materiais e artefatos que entram no mercado e ajudam a definir quem somos nós. Nas interfaces da cultura com o design, a relação é significante em ambos os níveis, seja “alto” ou “popular”. Se a cultura do consumo torna o design necessário, o progresso tecnológico o torna possível. Assim o design carrega uma mensagem tecnológica dentro de um contexto sócio-cultural. Na primeira metade do século XX o termo “design” pode ser entendido inicialmente como sinônimo de design “moderno”, embora suas características variem de acordo com qual “modernidade” está em questão, e em certas instâncias “moderno” pode inclusive ser expresso pela adoção de um estilo histórico. A última metade do século XX apresentou um quadro mais complexo, caracterizado pelo tema guarda-chuva “Pós- Modernismo”, usado como um “vale-tudo” para descrever a cultura pluralística que surgiu naqueles anos. Dentro da pós- modernidade, discutivelmente, design tinha até um papel mais integrado. Entretanto, até mesmo com a pós-modernidade, um dos níveis de conceito sobre “design” e “modernidade” 32 continuou a ser ligado, e isto lembrava quão difícil seria desligar um termo do outro. Agora é muito mais fácil entender que design não tinha - e continua a ter - nenhuma definição fixa de limites, ou um ideal a ser seguido. As transformações conceituais são constantes, refletindo um cenário de práticas influenciado pelas mudanças nas ideologias e discursos o qual foi afetado por seus parâmetros. Se um discurso de design pode ser desenvolvido é preciso ser um no qual possa ser reconhecido o alto nível de relativismo, pragmatismo e contextualização que tem determinado o conceito passado e qual irá sem dúvida continuar afetar seu futuro. Design irá continuar a ser influenciado pelo consumo, o sistema de moda, identidades de todos os tipos, e produção, seja industrial ou de bases artesanais, assim como sustentado por ideologias e discursos fora de seu controle. Isto é um movimento contínuo, embora seu futuro seja - como tudo mais - significativamente influenciado pelo passado. A idéia de coisas e imagens impregnadas de características estéticas e funcionais enquanto significado de atração e encontro com as necessidades dos consumidores e usuários têm uma longa história e isto se encontra intimamente ligado ao desenvolvimento do que tem sido chamado de sociedade “moderna”. Sem dúvida a idéia de modernidade existia antes dos arquitetos e designers criarem uma correlação visual/material no início do século XX. Havia, entretanto, vários sinais da mão humana no olhar da cidade – fosse Londres, Paris, Viena ou Nova York – no final do século XIX. Tecnologia e design trabalharam lado a lado para facilitar a transformação deste impacto visual e material na construção do ambiente urbano, 33 o qual por outro lado teve um efeito transformador além do esperado. Mais significante foi o surgimento de um conceito de design definido pelos papéis em formação da modernidade. Estes novos espetaculares “displays” eram criados por um novo “artista”, criador de vitrines, cujo trabalho era criar um foco visual dramático, uma armação para os numerosos flanêurs que presenciavam a transformação nas ruas da cidade. O papel da publicidade pública, nesta forma de vitrines, determinou o que mais tarde passou a ser chamado de “design para a indústria”, e os artistas das vitrines das lojas do século XIX podiam ser visto como um antecessor dos criativos artistas do período entre - guerras, conhecidos como designers industriais, que foram quem transformaram a aparência das coisas. Nesses anos de formação os sinais em questão continuavam a incluir as tradicionais artes decorativas, as quais continham dentro delas uma segurança da familiaridade e eram desta forma, livres de risco para consumidores que estavam incertos sobre seus gostos. Como a importância dos modismos e da modernidade começou a aumentar sobre o papel da tradição aumentando o número de pessoas, entretanto, cultura material começou a refletir este fato. Isto foi mais aparente, num primeiro momento, no mundo das duas dimensões das promoções comerciais, que abrangiam anúncios, revistas e embalagens criadas para os produtos. O desenvolvimento de um sistema de informação visual e mediação envolvendo bens de consumo tornaram os consumidores atentos para o que estava disponível para eles e ajudou a plantar em suas mentes uma imagem idealizada onde suas aspirações podiam ser baseadas. O crescimento da 34 propaganda moderna e da moderna revista de comunicação de massa, destinada em primeira instância para as mulheres, serviu para criar novos níveis de desejo e acelerou o crescimento da cultura de consumo, a qual estava impregnada da idéia de modernidade. O significado de “valor agregado” representou um primeiro estágio no processo que se concluiu nos anos entre - guerras, como design industrial, onde a manufatura finalmente percebeu que o impacto visual dos bens de consumo os tornava competitivos, de uma forma que os anúncios, as embalagens e as vitrines das lojas não conseguiam por si só. Resumindo, nos primeiros anos do século XX, o mundo comercial estava preocupado em estimular e retribuir o desejo do consumidor, desenvolvendo estratégias de marketing associadas á uma nova tecnologia orientada para um conceito de modernidade, traduzindo assim o fenômeno de novos consumidores usando cultura material enquanto forma de definir e comunicar suas identidades e aspirações, através da disponibilidade de mais e mais bens de consumo, imagens e serviços no mercado. Criou-se assim um cenário de fundo necessário para o surgimento de um conceito de design moderno, - ainda que não denominado desta forma, e apenas definido por uma extensão significante por seu papel dentro de consumo conspícuo e as exigências socioculturais do mercado - o qual era caracterizado por suas possibilidades únicas na interface entre consumo e produção. E assim nos anos entre as duas Guerras Mundiais a Modernidade era um conceito sem limites. Apontava para uma extensão onde as pessoas podiam imaginar o futuro e trazer esta visão para o presente. Isto era freqüentemente 35 experienciado como um conceito aspiracional, algo que prometia um nível de “valor agregado” na vida das pessoas, que ia além da “necessidade”, para o mundo do “desejo”. Talvez as características-chave da Modernidade, o modo como foi apresentada aos consumidores do mundo industrializado, foram suas ambivalências e contradições. Inevitavelmente os designers, pagos para serem imaginativos e visualmente inovativos, tinham uma parte chave neste processo de desenvolvimento de vários modelos de modernidade e assegurando isto, sendo constantemente renováveis e renovados. Durante os anos entre - guerras, cultura visual e material projetada para o consumo, e assim abraçando a modernidade, se tornou um dos principais meios através do qual a maioria dos habitantes do mundo industrializado adquiria sua identidade e se posicionava na sociedade. E foi com a intensificação e expansão deste processo que os designers se acharam não mais ao longo das margens, mas no epicentro da moderna cultura de consumo. Enquanto um processo intrínseco de massificação da manufatura, assim como um fenômeno que comunicava valores sócio-culturais, o design entendido como o divisor da tecnologia e da cultura, era embutido igualmente e firmemente dentro dos mundos do consumo e da produção. De fato, isto era uma das forças determinantes que ajudavam a se conectar á esses dois mundos, e ao mesmo tempo fazer uma conexão entre eles. Para entender o papel do design no contexto sócio- cultural do consumo é também importante apreciar sua posição dentro da história das mudanças tecnológicas assim como o que ele afeta e pelo que é afetado, na manufatura e 36 no mundo dos materiais. Na virada do século XIX para o século XX as inovações tecnológicas e os novos materiais desafiavam e excitavam a imaginação dos designers, assim como se constituíam numa nova área de cultura material. O advento da cultura do consumo de massa também requereu que novas tarefas fossem empreendidas pelos designers, que tinham uma única perspectiva no mercado. Como resultado, o design emergiu como uma nova atividade, ou melhor, como uma nova combinação de atividades. Em resposta as transformações sociais que a industrialização trouxe consigo, e a segurança para cultura material carregar novos significados sócio-culturais, o design combinava um novo cenário de atividades as quais cruzavam a divisa produção/consumo. Por conseguinte, isto foi colocado para representar a noção de “modernidade”, e como isto relacionou ambas as arenas. A distinção entre invenção e design era bastante clara. Enquanto o papel dos inventores era criar novas aplicações para as tecnologias disponíveis, o designer atuava como a interface entre estas aplicações, indústria manufatureira e consumidores. E ao longo do século XX esta descoberta de novos materiais e inovações em produção tecnológicas constantemente desafiou designers a encontrar formas e significados para as mesmas. O trajeto tecnológico e econômico para frente era necessariamente mediado pela aceitação do consumidor, mas as agressivas técnicas de vendas empregando propaganda e design era arejado enquanto um significado de “desejo” criativo e aumentando o apelo moderno dos materiais em questão. O design atuava como uma importante ponte entre tecnologia e cultura, antecipando demanda de consumo e 37 fazendo novas tecnologias e materiais ambos disponíveis e desejáveis ao mercado de massa. O impacto cultural de novos materiais, auxiliado pelo design, foi uma contribuição altamente significante para a modernização das vidas de um grande número de pessoas nos anos entre - guerras. Ambos, a materialidade do novo modo de vida, e a maneira como esses novos produtos “avulsos” eram “catapultados” na vida cotidiana, aparentemente intocados pela mão humana, proveu consumidores com um novo jogo de experiências determinado pela cultura em lugar de pela natureza, e que levava a Humanidade um passo mais distante do mundo que tinha se tornado inabitado depois que a industrialização mudou as coisas para sempre. Como parte de um quadro que vinha se desenvolvendo desde os anos 1914, pode-se notar o surgimento de uma nova “raça” de visualidade treinada, ou ao menos visualmente atenta: indivíduos que podiam prover de opções estéticas baseadas nas quais os consumidores podiam fazer suas decisões de escolha. Com o crescimento acelerado do consumo, que foi trazido pela possibilidade de “conspicuidade” para um setor expandido da sociedade, – e com as indústrias de produção em massa tendo reorganizado suas operações assim como seus produtos, imagens e serviços ao gosto requerido pelo mercado de massa – tornou-se praticamente imperativa a necessidade de clarificar a natureza do processo de design e o trabalho dos indivíduos envolvidos. Se o design era para ser a força harmonizadora entre a sociedade que queria expressar-se através do gosto e a tecnologia que aspirava ultimar racionalidade e eficiência, isto precisava educar a criatividade individual de quem podia entender os dois lados da equação. 38 Por volta de 1914, o design lembrava uma atividade muito diversa e indefinida. De fato, não era uma atividade isolada, mas consistida de um número de práticas com diferentes filosofias e trato profissional, em sintonia com o trabalho dos operários fabris, engenheiros, decoradores, artistas, arquitetos e publicitários. Apenas retrospectivamente uma linha única pode ser traçada através dessas práticas variadas, cujos praticantes, naquele tempo, ignoravam a existência uns dos outros. Entretanto eram sinais de um conflito emergente entre aqueles que se autodenominavam como “operadores” dentro do sistema comercial e aqueles (na maioria arquitetos) que tinham um ponto de vista mais idealista sobre seu envolvimento com a criação da cultura material. Entretanto, ambos os grupos viam suas participações na elaboração estética dos objetos cotidianos e suas imagens. Nos anos entre - guerras as duas abordagens estavam abertas uma a outra, sob o manto do progresso, arquitetos e outros abraçaram a face comercial da cultura material. Antes de 1914 a atividade de design - mesmo que não fosse denominada assim - estava firmemente estabelecida, cujos aspectos fundamentais eram as indústrias manufatureiras e os contextos comerciais, ou seja, criação/desenvolvimento de bens de consumo e suas respectivas imagens. Entretanto, enquanto um indivíduo com uma ocupação especificamente definida, o conceito de designer ainda não existia. O “link” entre a social democracia e o design relembra uma constante articulação dentro de um quadro de princípios do design moderno que emergiram em várias nações, entre elas Alemanha, França, Holanda e na Escandinávia nos anos entre - guerras. Explícita e implicitamente ambos eram 39 considerados como sendo interdependentes. Esta crença de que o design estava ligado à ideologia da social democracia explica a hostilidade que era freqüentemente expressada pelos escritos modernistas, e isto fazia ter sentido o forte comprometimento manifestado em todos aqueles países para com a moradia social; o conceito de mínimo espaço e seu mobiliário, o significado da estandardização em fazer mais barato, e objetos funcionais para todos. Como se isso fosse um elemento intrínseco da campanha modernista para uma sociedade igualitária com acesso a moradia e bens de consumo. Assim como foi ligado às mudanças sociais e políticas, as qualidades do racionalismo e idealismo que sustentavam o modernismo eram especialmente aparentes na educação dos designers. Nos anos 1930, a aparência da arquitetura e do design moderno era limitada a uma audiência que apreciava esta mensagem subliminar. Na encarnação da moradia social podia ser visto como um estilo que foi imposto por uma classe sobre a outra. Em termos gerais isto tinha limitado o apelo de mercado, especialmente no contexto doméstico. Era evidente por volta de 1914 uma sofisticada compreensão da forma como a cultura material projetada podia ser manipulada e usada por grupos, instituições e nações, de modo a forjar identidades e comunicá-la a um grande número de pessoas. Grupos de interesse de todos os tamanhos, concentrados em persuadir outros do seu status e autoridade, começam a usar artefatos projetados e imagens como uma forma de se expressar e tentando persuadir outros do que eles acreditavam ser, seu econômico, político, tecnológico ou cultural pré-eminente. Em nenhuma parte este processo foi mais aparente neste período do que nações 40 emergentes que usaram o design como um significado de formação, expressão e promoção de suas identidades individuais para si mesmos e para o mundo em geral. As estratégias empregadas para ligar cultura material com identidade nacional neste momento eram essencialmente duplas. Elas envolviam um olhar para as tradições da produção artesanal vestida com as luzes das preocupações atuais, ou saltando com fé dentro do futuro e desenvolvendo um programa “arte dentro da indústria” o qual propunha novas formas e modernas identidades apropriadas a idade da máquina. Inevitavelmente as duas estratégias freqüentemente se sobrepunham, e a distância entre elas se tornava nitidamente obscurecida. A aliança entre design e programas nacionais de reforma e competição internacional foi largamente observada durante o século XX. A manipulação ideológica da cultura material e dos espaços projetados e caracterizados nas numerosas exibições que ocorreram em todo mundo industrializado durante os séculos XIX e XX. O design representou um papel significativo, notadamente pela presença de objetos de arte decorativos, produtos da nova indústria e as realizações da engenharia nas áreas de nova tecnologia. A virada do século XIX para o século XX presenciou transformações no mundo material como nunca tinha sido visto até então. Foi nesta época que nasceu o que hoje se entende por “Idade Moderna”. A vida das pessoas, e não apenas daquelas que viviam no mundo industrializado, mudou de modo irrevogável. O advento do transporte de massa, comunicação de massa, e produção em massa de bens de consumo alteraram as coisas para sempre. A força dominante 41 atrás dessas mudanças foi a tecnologia, aparentemente racional, progressiva, mas sobretudo impossível de ser detida. Várias pessoas tinham fé de que esse seria o caminho a ser seguido. Para quem acreditava, ia ser repleto de progresso material, igualdade social e eficiência racional na resolução dos problemas cotidianos. De várias maneiras a I Guerra Mundial foi um divisor de águas na evolução do Design Moderno. Por volta de 1914 o Art Nouveau já não era um movimento de design e se transformara num estilo da moda. Havia, entretanto outra abordagem em design, baseada no pensamento do Arts and Crafts, com uma nova simplicidade e atitude racional, que tinha por ponto de partida os materiais empregados e as suas características surgidas depois da I Guerra Mundial, conhecido como Funcionalismo. Os anos pós 1918 viram essa abordagem se tornar a base da racionalidade para uma arquitetura e design radicais, os quais até a II Guerra tiveram grande impacto internacional. Duas faces do Modernismo emergente, uma extremamente progressista, e outra mais orientada historicamente e conservadora por natureza. Por volta de 1914 era evidente que cultura material projetada era importante na formação e comunicação de um grande número de identidades nacionais, especialmente na Europa. Isto tinha um significado importante, através do qual governos e corporações podiam definir seus cidadãos e seus consumidores, e, igualmente importante, através do qual cidadãos e consumidores podiam definir a si mesmos. A identificação nacional nesta era adquiriu novo significado de expressar-se a si mesmo nas modernas, urbanizadas e altamente tecnológicas sociedades. 42 A mass media do entre - guerras, - a impressa, o cinema e o radio - tinham o poder de padronizar, homogeneizar e transformar ideologias populares assim como explorá-las para seus propósitos de propaganda deliberada pelos interesses privados e estatais. Através da produção industrial em massa e outras formas de reprodução (fotografia, por exemplo), projetar imagens e objetos tinham se constituído em um componente importante da mass media, capaz de representar o mesmo significado das formas que o acompanhavam. De fato, através destas múltiplas manifestações – enquanto representações, imagens, artefatos, espaços e ambientes – design era mais eficiente do que outros aspectos da mass media, comunicando valores e idéias de um modo persuasivo. Ao final dos anos 1930 design tinha se tornado uma ferramenta disponível para ser usada tanto pela iniciativa privada como pelas nações para persuadir outros tantos a consumirem seus produtos ou reconhecer sua autoridade. Como uma forma de propaganda, tanto econômica como política, isto tinha um potencial enorme. Era capaz de transmitir valores que encorajavam consumidores a comprar produtos e imagens como uma forma de formação de identidade. Os mesmos poderes de persuasão e ofertas de identidade podiam ser usados por regimes políticos para encorajar a lealdade nacional. Dois países que usaram design efetivamente para representar a si mesmo como nações foram os Estados fascistas da Alemanha e da Itália. Ao contrário do rádio e de outras formas de mass media, o design podia trabalhar em várias camadas, tais como os significados das comodidades e imagens, já codificados pelos designers, ou ainda podia ser representado por outros designers dentro do 43 contexto de código duplo de uma exibição, uma vitrine, uma folha impressa ou uma campanha publicitária. Durante os anos entre - guerras várias nações e corporações tinham começado a depender do design para seus fins comerciais ou ideológicos, e eram completamente atentos ao este potencial, tanto de persuasão como de preencher necessidades e desejos. Figura 03: como exemplo, vale a pena lembrar o papel desempenhado pelos designers americanos, principalmente Raymond Lowey, dentro do New Deal. E ainda, Hilter e a criação do Volkswagen. O Art Deco promoveu uma noção elitista de luxo e uma idéia de qualidade derivada de habilidades artesanais e uso de materiais caros, assim como o Art Nouveau, mas foi gradativamente transformado num estilo popular, sendo que por volta de 1930 tinha penetrado no ambiente de massa de uma forma sem precedentes. Do seu início nos luxuosos transatlânticos franceses até chegar a adornos de fachadas de fábricas e cinemas, tornando-se um estilo popular em todo o mundo, com seus objetos plásticos de produção em massa, de aparelhos de jantar a louça para pic-nic. Começou a vida como um fenômeno exclusivo e ironicamente, após a II Guerra, tornou-se um estilo popular da idade moderna. 44 O mesmo já não aconteceu com a outra face do Modernismo, a face que se manifestava o mínimo num estilo visual. Os países escandinavos, por exemplo, todos com fortes tradições folclóricas e/ou artesanais, neste momento encontraram uma forma nova para os objetos decorativos – cerâmica, vidro, mobiliário entre outros – pelos quais eram bem conhecidos no mercado internacional. Em adição a esta ambição, entretanto, estava um forte comprometimento com a idéia de igualdade social através do design moderno, aliado a produção industrial em massa, poderia prover a oportunidade para todos melhorarem suas condições materiais de vida. Neste momento o design do século XX estava preocupado com a reputação reacionária do Modernismo, e assim permitiram adições decorativas e a incorporação do tradicional, materiais familiares, em lugar de sua marca mais rígida que influenciou e continua influenciando nossa vida cotidiana. A metáfora predominante para o design moderno na primeira metade do século XX era, sem dúvida nenhuma, a máquina. Percebida como um poderoso e perpetuador símbolo do progresso, democracia e controle sobre o mundo natural, a máquina estimulava a imaginação de vários arquitetos e designers que viviam em países industrializados e respondiam ao chamado urgente de renovar constantemente o ambiente. Isto foi mais aparente nas três primeiras décadas do século XX. Dentro do clima de mudanças culturais, políticas, econômicas e tecnológicas estavam também a idéia e o fato que a mecanização inspirava o trabalho experimental de uma forma sem precedentes. Ao final da I Guerra os países europeus envolvidos no conflito estavam empenhados em criar um novo mundo 45 democrático no qual o desenvolvimento material tinha papel vital. Vários arquitetos e designers viram uma oportunidade de aplicarem seus dotes visuais e intelectuais ao gosto da criação de um novo modo de vida para a massa populacional. Ao final eles combinavam as inovações fazendo-as possíveis para a produção em massa, – como o pioneirismo norte-americano na indústria automobilística – com as inovações estilísticas que arquitetos e designers progressistas vinham fazendo desde o início do século baseados nos princípios da abstração e simplificação geométrica. Pela primeira vez essas forças estavam adicionadas em uma poderosa fórmula para um novo movimento em design. Um movimento essencialmente idealístico por natureza e baseado na necessidade de mudança e renovação. Essas abordagens em design moveram-se da arquitetura para as artes aplicadas – mobiliário, cerâmica, vidro, trabalhos em metal e têxteis – e eventualmente para desenho industrial, e ao final dos anos 1920, o Modernismo tinha se tornado um ideal internacional, representado em numerosos eventos. Inevitavelmente o idealismo do movimento significava que o esforço individual dos protagonistas falhou em atingir a massa de modo significativo. Entretanto sua influência foi sentida de várias maneiras tangíveis, como por exemplo, na presença de ferro tubular em mobiliário escolar e hospitais em todo o mundo. A influência do Modernismo foi mais importante num nível teórico, onde dominava em revistas internacionais e coleções de museus. Embora a maioria dos esforços pioneiros estivesse na Europa, os Estados Unidos não estavam imunes aos efeitos do que se tornou conhecido como Movimento Moderno na arquitetura e design. Os Estados Unidos também foi a pátria 46 do movimento mais comercialmente orientado em design que houve, com impacto internacional nos anos pós-guerra. Enquanto os europeus se limitavam principalmente à arquitetura e as artes aplicadas, os “desenhistas industriais” americanos drasticamente repaginaram o mundo dos refrigeradores, caixas registradoras, máquinas fotográficas, e por último, mas não menos importante, automóveis. Com experiência em propaganda e vitrines, esses designers não estavam ideologicamente direcionados como os europeus. Sua missão era a modernização do meio-ambiente popular. Em 1939, ano da Feira Mundial em Nova York, a máquina moderna dominava a vida moderna, tanto nas fábricas como no trabalho doméstico, possibilitando a todos acreditar que poderiam participar do futuro. Na concretização dessa possibilidade os designers tiveram um papel fundamental. Até a II Guerra o design do movimento moderno, nas suas mais variadas formas de manifestação, estava formado e sua influência era sentida internacionalmente, tanto em níveis reais como ideológicos. Essa credibilidade foi plenamente articulada, e seus pioneiros reconhecidos. Depois de 1945 os designers tinham uma tradição moderna para trabalhar com ou contra, e líderes para serem seguidos ou rejeitados. O mais sofisticado caminho para o progresso do design no pós-guerra na Europa foi a questão das identidades nacionais. Várias das nações que precisavam se reconstruir após a II Guerra queria projetar uma nova imagem de si mesmo no mercado internacional, e o design se configurou com um caminho através do qual isto poderia ser feito, pois, de acordo com HESKETT, (2OO8) “objetos e ambientes podem ser usados 47 pelas pessoas para formar uma idéia de quem elas são e para expressar sua noção de identidade”. Na Europa isto foi mais visível na Escandinávia, na Itália, na Alemanha e na Grã-Bretanha. Os Estados Unidos e o Japão também utilizaram o design moderno para ilustrar o progresso de suas economias e culturas, e posteriormente os países que foram libertados com desintegração do império soviético no final da década de 1980. Os Estados Unidos foram representados pelos objetos aerodinâmicos os quais foram exportados para vários países em todo o mundo. Em resposta, vários países europeus reformularam suas próprias tradições, cada qual ao seu modo. Na Escandinávia, por exemplo, a tradição artesanal foi reformulada sob a luz dos pré-requisitos da modernidade como um significado da sua própria identidade. Todos os países em questão procuraram promover suas próprias imagens de good design nesse período, e várias estratégias diferentes foram adotadas para tornar isso possível. No sonho da modernidade pós 1945 o conceito de design começou a ser ligado com o de “modernidade” traduzido no design norte-americano do pós-guerra. Isto se explica através de uma “americanização” da Europa no final dos anos 1950, presente na democratização da expressão de “gosto”, pessoas que desejam melhorar sua condição material/social, uma nova identidade nacional, materialismo e consumo de massa, e ainda nos filmes, TV, seriados e propaganda. Assim como os anos pré-guerra, também depois 1945 o design continuou a carregar consigo o potencial de representar as nações e seus desejos de projetar suas identidades no mundo como um todo. Exemplo disto é a 48 influência da Bauhaus somada ao modelo americano de produção em massa. O resultado foi um casamento de sucesso do cultural e do comercial que produziu fortes identidades para os produtos. O consumo da moderna cultura material tornou-se o significado primário da formação de identidade e uma manifestação de aspiração social para a maioria das pessoas no oeste industrializado nos anos 1950 e 1960. E mais importante, para os novos consumidores em particular, a ênfases estava no consumo do moderno (produtos e imagens). Os consumidores eram gradativamente introduzidos então, não meramente ao design moderno, e sim ao conceito, mais particularmente de “good design”. O visual e material equivalente que eles eram encorajados a usar quando comprassem, em outras palavras, “bom gosto”. Em um nível, este espírito de reforma do design, forte desde meados do século XIX, pode ser visto como uma resposta ao rápido crescimento do consumo que envolvia “não educados” setores da população. O receio de ser infectado pelo “kitsch” ou pelo “mau design”, associado com um descontrolado mercado que estava atento a uma sociedade ordenada, era experienciado internacionalmente. A necessidade de uma face “super-cultural” do design nos anos pós-guerra está relacionada ao desejo de uma parte da classe média, interessada em distinguir-se, através do exercício do “gosto educado” no ato de consumo, dos consumidores da cultura de massa. Não foram apenas as nações que rapidamente se utilizaram da retórica visual e ideológica do design como um significado de criação de identidade instantânea nos anos depois de 1945. Companhias multinacionais também viram no 49 design o potencial para definir identidades globais que poderiam habilitá-las a controlar esses mercados. Segurança sueca, eficiência tecnológica alemã, idiossincrasia francesa, elegância italiana... No mercado internacional, cada imagem representando quase uma caricatura da identidade nacional. Era o design semântico em sua riqueza, a criação de um cenário de linguagens de design que comunicavam aos consumidores mais do que apenas “aptidão para o propósito” nos produtos que acompanhavam. O embasamento do design moderno do pós-guerra para esses diversos tipos de democracia surgiu após 1945. O cenário do Modernismo pré-guerra deu o tom, e o design moderno após essa data e o ideal de objetos bem projetados foi avaliado caso a caso. Os anos 1950 viram os bens de consumo atravessar o Atlântico dos Estados Unidos até a Europa. Houve um espantoso e crescente interesse por objetos feitos com materiais modernos, os quais eram vistos como sinais de um novo estilo de vida, com consumidores em todo o mundo querendo representar suas aspirações pessoais nos interiores domésticos. Os interesses sem precedente nas variações do estilo moderno disponíveis no mercado encorajavam os designers a criar mais escolhas, e as manufaturas a produzir uma grande variedade de coisas. Assim como nos anos pré-guerra, a década após 1945 assistiu ao sucesso internacional do pioneirismo individual. Todas as correntes estilísticas foram disseminadas internacionalmente. Novos materiais, a madeira compensada particularmente, tornaram possível aos objetos exibir uma nova expressividade, enquanto os avanços em eletrônica liberavam o consumidor de maquinário para tornar-se 50 estilisticamente sofisticado. Enquanto objetos relacionados com a decoração doméstica tendiam a mover-se em direção das formas orgânicas, rejeitando a máquina em favor de formas abstratas derivadas do corpo humano e do mundo da natureza, firmas como a BRAUN ou a SONY definiam a si mesmas como caracterizadas por suas virtuosidades tecnológicas. Designers se tornaram mais e mais adeptos da tese de construir novos estilos para os objetos, conscientes de que aquele era o significado dos objetos, e não apenas os princípios subliminares que importavam. Com o consumo de massa do estilo moderno, as possibilidades tecnológicas sempre em expansão e a natureza global do mercado que ocorreu no final dos anos 1950, abriu-se para os designers várias possibilidades. Evidentemente que o design moderno estava completamente integrado na economia capitalista da segunda metade do século XX, e tornou-se uma das maiores forças culturais do período. Os anos 1960 caracterizam-se como ponto culminante desta cultura de massificação de consumo que vinha se desenhando desde o pós-guerra, com a crise e revisão da modernidade e uma nova fase na relação entre design e cultura. A cultura foi redefinida e encorajada a abraçar grupos sociais e culturais diferentes e dar a todas as vozes iguais. O design foi forçado a quebrar suas primeiras ligações com a modernidade e abraçar uma abordagem mais pragmática, orientada para o mercado, popular2. Ignorar a linha que tinha separado “alta cultura” do seu popular equivalente. E os anos 1970 vão assistir ao revival do artesanato e uso do vernacular. 2 “I prefer “both-and” to “either-or”, black and white, and sometimes gray, to black or white”. 51 Mais do que nunca design e designers se alinharam com a mass media e tiveram um papel central dentro da construção dos numerosos estilos de vida que eram oferecidos. Este novo caminho de comunicação com os consumidores significava que, para um determinado do mercado, o design tinha se tornava um aliado muito próximo dos processos de marketing. Com o aspecto visual dos produtos, imagens e espaços incrementando a dependência da comunicação da mensagem instantânea, na qual havia uma unidade entre imagem e criação, traduzida, por exemplo, na agregação de valor ao nome do designer, e no papel desempenhado, através do consumo, do designer (discurso do objeto) como formador de identidade, em ambientações nostálgicas cenográficas, tais como reconstrução do passado através do presente: “Living in an old country”, e ainda, a hiper-realidade, mais interessante que a própria realidade, mais viva e colorida, remasterizada. As manufaturas continuavam a direcionar seu mercado para grupos específicos, mas gradativamente esses começaram a serem definidos menos pela identidade geográfica, classe, gênero, ou idade do que gostos culturais, valores, estilo de vida e tipos de personalidade. Assim o design transforma-se numa experiência cotidiana, do shopping ao turismo. Os designers tinham encontrado um papel para si mesmo que era inexpugnável. As novas tecnologias e novos materiais no pós-guerra eram agora iguais a novos objetos. Em 1960, o desejo democrático inicial dos modernistas de usar produção em massa para tornar bens materiais disponíveis para todos foi substituído pelo reconhecimento que design foi um símbolo importante do modernismo e, em termos sociais, um marco de sofisticação da consciência 52 cultural. Como conseqüência, os designers tiveram a grande responsabilidade em encontrar adequadamente aqueles requisitos simbólicos, e em criar bens que poderiam representar este papel. O otimismo que os países mostravam através da produção em design nos anos 1960 refletia o cume do boom de consumo do pós-guerra. Os ideais do design estabelecidos antes da II Guerra Mundial foram reorganizados e reformulados para encontrar as mudanças nas necessidades sociais e psicológicas de uma nova audiência que via o design moderno como uma forma de identificar a si mesmo com o presente e, mais importante, com o futuro. Entretanto não eram como os primeiros Modernistas, com seus fortes comprometimentos ideológicos, que tinham sido identificados com malícia e exclusividade por vários designers dos anos 1960. Progressivamente estes vieram a estar em pé de igualdade com o alto nível de consumo elevado que caracterizou aqueles anos. Enquanto vários designers se encaminhavam para o campo de criação de bens de visualidade inovadora que recheavam as revistas, outros começaram a sentir que um tipo de traição estava surgindo. Esta situação que surgiu repentinamente em meados dos anos 1960 foi estimulada por um número de elementos convergentes. O surgimento de um mercado consumidor jovem, acompanhado da ênfase na diversão e tempo livre tendo um papel chave, ajudando a minar o sistema de valores, baseado nas idéias de racionalidade e universatilidade, que tinham baseado o Movimento Moderno. A nova estética Pop priorizava o descartável e o temporário. O foco em valores de consumo teve um enorme impacto nas idéias prévias sobre 53 design, e em meados dos anos 1960 um novo radicalismo emergiu no mundo. Agora design abertamente tirava sua inspiração da cultura popular. Não foi a primeira vez que isto aconteceu, mas representou um desafio real para os valores do Modernismo que tinha dominado os ideais do design através do século XX. O trabalho dos consultores norte-americanos para há indústria nos anos 1930 embasou a idéia do design baseado no sonho popular e aspiração, e a estética aerodinâmica tinha tido pouco em comum com a elite cultural. Na década de 1960, entretanto, uma divisão fundamental, - a qual existia desde o início do século, quando o maquinário da produção em massa mudou os ideais dos heróis do Movimento Moderno para estilistas de opções de consumo - tornou-se aparente, com designers abertamente desafiando a relevância do Modernismo no mercado de massa. E em meados da década o mundo do design claramente percebeu que de fato o Modernismo estava em crise. Os avanços tecnológicos ajudaram a “por lenha na fogueira”: desenvolvimentos em eletrônica, fazendo os componentes dos produtos tão pequenos que não era mais necessário que seus invólucros refletissem o funcionamento do seu interior. Nas mãos dos designers os produtos gradativamente tornaram-se acompanhamentos do estilo de vida, objetos de moda, e as teorias do Funcionalismo tornaram-se por conseqüência, redundantes. Todavia não muitos designers corresponderam. A maioria havia sido, e continuava a ser, educado dentro da tradição do Modernismo e estavam relutantes em abandonar suas crenças confortáveis e persuasivas. Um comprometimento com valores, qualidade e regras de função 54 dificultava, e de fato para muitos era até indesejável, juntar-se ao que começava a parecer com a nova era “Pós-Moderna” em design. Apenas poucos estavam preparados e desejosos de refletir o novo impulso em sã consciência. Por volta de 1970 mais novos materiais e técnicas de manufatura tinham transformado a face do mundo cotidiano, fazendo-o muito mais diferente do que trinta anos antes. Na linguagem do modernismo utópico o poder da tecnologia em prover um mundo melhor, e o design com um papel mediador, interfaceando alternadamente com a tecnologia. Assegurando que tecnologia, se expressada através da cultura material, comunicava mensagens apropriadas. A fé no poder da tecnologia em transformar o tempo livre era expressa na linguagem estética nascida da própria tecnologia. Nos anos 1970 chegou ao fim a dominação de um único movimento internacional em design. Por um lado o Modernismo continuava sob ataque, e a ser largamente desacreditado, e por outro, modernistas contemporâneos apareciam para provar a validade desse movimento, para nos persuadir que, mesmo com as mudanças das condições econômicas, sociais e culturais, o impulso do progresso tecnológico poderia nos levar para um futuro brilhante. Como no início do Modernismo, o debate mais acalorado ocorreu na arquitetura, seguida pelo design. O que era evidente nesses debates era que, ao menos estilisticamente, existia alternativas para o Modernismo, e mais importante, se encaminhando para o pluralismo. Enquanto os arquitetos discutiam a validade do estilo do dia, tal quais seus predecessores no século XIX, os designers nos anos 1970 também tinham outras coisas a considerar. Entre elas estavam o efeito da crise do petróleo no 55 custo dos plásticos e o crescimento do interesse da sociedade em abordagens ecológicas assim como em reciclagem. Essa foi a ênfase onde o debate fugiu da discussão sobre estilo e sugeriu um papel social mais sério para os designers em termos da relação com a indústria manufatureira. O senso geral de desilusão com a tecnologia e tudo que ela tinha prometido também contribuiu para desestabilizar as premissas onde o design moderno tinha se baseado. Embora o design tivesse um papel decisivo neste processo, assegurando que as formas nas quais a tecnologia buscava usuários estavam visualmente e simbolicamente adequados e usáveis, era sem dúvida a tecnologia, quem dava o tom e os designers seguiam-na, criando caixas atrativas para os complexos eletrônicos que iam dentro delas. A tecnologia também transformou a natureza das imagens, dos bens de consumo e serviços e trouxe consigo a reação dos consumidores. Os designers tiveram que responder a estes desafios que apareciam e redefinir seus papéis e práticas a luz destes. Em adição a transformação do processo de design por si só, novos mét