UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA
Júlio de Mesquita Filho
Instituto de Artes - Campus São Paulo
KATHLEEN ALMEIDA SILVA
LINHAS, MONTAGENS, ENGRENAGENS:
reflexões sobre arte, seu propósito, e processos criativos
SÃO PAULO
2025
KATHLEEN ALMEIDA SILVA
LINHAS, MONTAGENS, ENGRENAGENS:
reflexões sobre arte, seu propósito, e processos criativos
Trabalho de Conclusão de Curso
apresentado como parte dos requisitos para
a conclusão do Curso de Bacharelado em
Artes Visuais no Instituto de Artes da
UNESP, sob a orientação do Prof. Dr. Carlos
Eduardo Riccioppo Freitas.
SÃO PAULO
2025
Ficha catalográfica desenvolvida pelo Serviço de Biblioteca e Documentação do
Instituto de Artes da UNESP. Dados fornecidos pelo autor.
S586l Silva, Kathleen Almeida, 2001-
Linhas, montagens, engrenagens : reflexões sobre arte, seu propósito,
e processos criativos / Kathleen Almeida Silva. -- São Paulo, 2024.
49 f. : il.
Orientador: Prof. Dr. Carlos Eduardo Riccioppo Freitas.
Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Artes Visuais) –
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Instituto de Artes.
1. Arte. 2. Criação (Literária, artística, etc.). 3. Cultura popular. 4.
Indústria cultural. I. Riccioppo, Carlos Eduardo (Carlos Eduardo Riccioppo
Freitas) II. Universidade Estadual Paulista, Instituto de Artes. III. Título.
CDD 700.103
Bibliotecária responsável: Catharina Silva Gois - CRB/8 11323
KATHLEEN ALMEIDA SILVA
LINHAS, MONTAGENS, ENGRENAGENS:
reflexões sobre arte, seu propósito, e processos criativos
Trabalho de Conclusão de Curso
apresentado como parte dos requisitos para
a conclusão do Curso de Bacharelado em
Artes Visuais no Instituto de Artes da
UNESP.
Trabalho aprovado em: 17/01/2025
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________________________
Prof. Dr. Carlos Eduardo Riccioppo Freitas
UNESP - Instituto de Artes - Orientador
___________________________________________________________
Mestre Marco Antônio Baena Fernandes
UNESP - Instituto de Artes
AGRADECIMENTOS
Agradeço à minha família pelo apoio ao longo da minha graduação, em
especial à minha irmã Kessi e ao meu pai Antonio, que sempre acreditaram em mim.
Minha gratidão também à minha médica Karla e à minha psicóloga Ana Paula, por
cuidarem de mim com tanto carinho. Um agradecimento especial ao Prof. Dr. Cadu,
por enxergar tanto potencial na minha pesquisa.
RESUMO
Este trabalho nasce do processo de concepção de “AAAAAAAAAAAAAAAAAA!!!!!!!!
Uma experiência educativa com o 9º Ano A”, apresentado como Trabalho de
Conclusão de Curso de Licenciatura em Artes Visuais ao IA-Unesp, e que consistia
na construção, aplicação e relato de uma sequência didática que envolvia o
desenvolvimento do pensamento crítico por meio da arte e da indústria cultural.
Aqui, discorro sobre meu processo criativo, que envolve a relação entre arte e
cultura de massas e como relaciono as imagens e objetos advindos de ambos os
registros.
Palavras-chave: sequência didática; arte; indústria cultural; processo criativo
ABSTRACT
This work starts from the process of conceiving “AAAAAAAAAAAAAAAAAA!!!!!!!!
Uma experiência educativa com o 9º Ano A” (An educational experience with 9th
graders), which was presented to the IA-Unesp as the final coursework for a degree
in Art-Education and consisted of the construction, application and reporting of a
lesson plan involving the development of critical thinking through art and the cultural
industry. Here, I discuss my creative process, which involves the relationship
between art and mass culture and how I relate the images and objects from both
spheres.
Keywords: lesson plan; art; cultural industry; creative process
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1- Segunda folha da atividade diagnóstica.....................................................23
Figura 2 - frame do vídeo de Larissa Gloor................................................................28
Figura 3 - frame do filme Coraline..............................................................................36
SUMÁRIO
1. Introdução.............................................................................................................10
1.1 De onde venho.....................................................................................................10
1.2 Para onde quero ir................................................................................................12
2. Fundamentações e considerações iniciais........................................................14
2.1 Processo criativo e criatividade............................................................................14
2.2 Sobre a Indústria Cultural.....................................................................................15
2.3 Raiva!!!!!!!!!!!.........................................................................................................18
3. A sequência e seus processos...........................................................................21
3.1 eu sou sua professora de artes, é claro que eu quero saber sua
opinião........................................................................................................................21
3.2 eu sou a única pessoa que, de verdade, consegue acalmar ele.........................27
3.3 PLEASE I’M A STAR!!!!!!......................................................................................28
3.4 que a sorte esteja sempre a seu favor.................................................................32
3.5 a dona aranha subiu pela parede.........................................................................34
3.6 costura de Rosana Paulino..................................................................................37
4. Conclusões ????.................................................................................................40
Referências...............................................................................................................42
10
1. Introdução
ATENÇÃO!!!!!!!!!!!!!!
você irá ler um trabalho que dialoga diretamente com meu Trabalho de Conclusão
de Curso de Licenciatura em Artes Visuais, “AAAAAAAAAAAAAAAAAA!!!!!!!! Uma
experiência educativa com o 9º Ano A”.
os trabalhos são independentes, mas estão conectados por suas reflexões e
abordagens.
boa leitura, beijos de luz! ✨
1.1 De onde venho
Tudo que sei, aprendi através da irmã mais velha, Kessi, ou da vastidão da
internet.
Minha memória mais antiga relacionada à arte remonta a um circuito cultural
que fiz com ela quando eu tinha oito anos e ela dezoito. Visitamos o Museu da
Língua Portuguesa, a Pinacoteca e o Centro Cultural São Paulo. Recordo-me bem
do acervo da Pinacoteca e de uma exposição de Paulo Nazareth no CCSP, cujas
obras só consigo reconhecer graças às fotos que tiramos naquele dia. Nessa
mesma época, Kessi me apresentou ao primeiro single da Lady Gaga, Poker Face
(2009), e ao primeiro álbum de Bárbara Eugênia, Journal de BAD (2010).
Meu primeiro post no Tumblr1 foi em julho de 2013, quando eu tinha doze
anos, e adotei o usuário “rainhadaunicornilandia”. Na plataforma, compartilhava e
reblogava gifs de filmes e séries, fotos dos meus cantores, bandas e atores
favoritos, imagens com edições que eu acreditava ser uma representação de como é
tomar ácido, muitos pensamentos depressivos escritos em inglês com ajuda do
Google Tradutor, trechos da fanfic de Percy Jackson e os Olimpianos2 (2008-2010),
2 Percy Jackson e os Olimpianos é uma série literária infanto-juvenil de aventura e fantasia, escrita
por Rick Riordan. O adolescente Percy descobre ser um semideus, e se envolve em uma jornada
para evitar uma guerra entre os deuses.
1 Tumblr é uma plataforma de blogging, estando em uma categoria intermediária entre o microblog, e
blogs de formato convencionais. O usuário pode postar textos, imagens, vídeos, links, citações,
áudios e “diálogos”; pode seguir outros usuários, e favoritar e/ou reblogar posts de outros blogs.
11
que nunca terminei de escrever, memes do Vine3, e muitos posts que sugerem
claramente minha futura identificação como pessoa bissexual.
Minha irmã me ensinou a baixar filmes ilegalmente com o filme Moonrise
Kingdom (2012), de Wes Anderson; também me levou pra ver Mommy (2014), de
Xavier Dolan, e Hoje Eu Quero Voltar Sozinho (2014), de Daniel Ribeiro, no cinema
de rua Espaço Itaú Augusta. Minha exploração no Tumblr me levou a descobrir
outros filmes como Trainspotting (1996), Adeus, Lênin! (2003), Encontros e
Desencontros (2003), Les 400 coups (1959), Deus e o Diabo na Terra do Sol (1964),
Heathers (1988), The Rocky Horror Picture Show (1975), além de obras de Woody
Allen, Stanley Kubrick, Jean-Luc Godard, Sofia Coppola.
A internet também me apresentou a uma variedade de músicos como Lou
Reed, Bob Dylan, Bikini Kill, BROCKHAMPTON, FKA Twigs, Best Coast; na MTV,
conheci Of Monsters and Men e Lana Del Rey. Kessi me introduziu à Belle and
Sebastian, Sky Ferreira, Tatá Aeroplano, Gal Costa, Pavement, Jaloo, Blood Orange
e Diana, enquanto na escola, eu e minha amiga Isabela assistíamos aos clipes de
Nicki Minaj, Anitta e MC Livinho.
Por meio do Tumblr, meu interesse pela arte se aprofundou, influenciado
pelas inúmeras imagens que romantizavam o realismo técnico das obras
renascentistas e neoclássicas. Isso me motivou a pesquisar mais sobre movimentos
artísticos, que me guiaram para os mais abstratos e contemporâneos, e expandindo
organicamente meu repertório para outras áreas, como moda, design, arquitetura e
literatura.
As redes sociais, aliádas à minha irmã, proporcionaram-me uma introdução e
aprofundamento em movimentos político-sociais, como a luta feminista e
LGBTQIAPN+, o movimento antirracista, o vegetarianismo e a luta contra o
aquecimento global como ações políticas, e os movimentos de esquerda.
Hoje, acompanho todas as séries adolescentes lançadas na Netflix4, maratono
pelo menos uma vez ao ano a saga Crepúsculo5 (2008-2012) com Kessi, e também
assisto aos indicados ao Oscar com ela. Minha rotina matinal inclui escutar Taylor
Swift e funk automotivo; Joni Mitchell é a trilha sonora da minha auto-manicure
5 Série de filmes de romance-fantasia, baseado na série de livros de mesmo nome da escritora
Stephenie Meyer.
4 Serviço on-line de streaming por assinatura.
3 Vine foi um serviço de armazenamento de vídeos em formato curto, de até seis segundos. Os
usuários podem gravar e editar seus vídeos, e também “revinar”, compartilhamento similar ao
“retweet” do Twitter, agora X.
12
semanal; The Cranberries acompanha minhas reflexões enquanto escrevo estas
palavras. Na mesma semana, leio Bridgerton6 (2013-2016) e Sylvia Plath com o
mesmo nível de engajamento.
Desde a infância, fui exposta a esses dois lados da arte que, com o passar
dos anos, tornaram-se um só. Ao consumir ambos, acredito que possa ter
desenvolvido um olhar crítico para todas as formas de arte e entretenimento que
consumo. Como diria Hannah Montana7, vivo o melhor dos dois mundos.
1.2 Para onde quero ir
O processo criativo, seja de um algoritmo computacional ou de uma
instalação artística interativa multimidiática, envolve uma série de decisões e
conexões entre ideias, referências e influências. Quando aplicado à montagem de
uma sequência didática, ele se aproxima do ato de criação artística, onde cada
etapa do planejamento é uma construção dinâmica.
Neste sentido, montar uma sequência didática é um exercício criativo que
reflete as influências culturais, artísticas e intelectuais do articulador. O educador,
nesse papel, vai além de ser um transmissor de conhecimento: ele organiza e
conecta múltiplas referências para criar uma experiência que faça sentido para seu
grupo de educandos e para si mesmo.
O processo criativo na sequência didática se revela em cada escolha feita:
como apresentar os conteúdos, como estruturar as atividades e como fazer com que
as diferentes partes se comuniquem e se entrelacem entre si. Essa teia de conexões
é muito parecida com a composição artística, em que cada decisão criativa adiciona
mais profundidade e significado à obra final.
Lawrence Lessig (2008), professor de Direito em Harvard e conhecido por seu
trabalho nas áreas de propriedade intelectual e cultura digital, ao discutir sobre
cultura remix, ressalta que o processo criativo é, por natureza, colaborativo e se
baseia na reinterpretação de referências preexistentes. Na montagem de um plano
de aula, o educador está constantemente remixando elementos para construir algo
novo. O produto final é o resultado dessas conexões: uma combinação de escolhas
7 Personagem de seriado de mesmo nome da Disney Channel.
6 Bridgerton é uma série de drama romântico ambientada na Londres do século XIX, é baseada nos
livros de Julia Quinn e explora as histórias de amor da família Bridgerton, envolvendo romance,
intrigas e alta sociedade.
13
individuais e influências coletivas. O processo de remixagem pode ser colocado
como uma metáfora para a criação de uma sequência didática, onde cada elemento
é selecionado, reinterpretado e reorganizado com um propósito criativo específico.
Uma garota que você encontra gritando em um show pode, mais tarde,
voltar para sua casa e editar os vídeos que gravou para criar GIFs e memes
que passarão por muitas outras mãos, transformando-se em algo
completamente diferente e totalmente bizarro. Insatisfeitas com a limitação
temporal, espacial e situacional do One Direction, garotas que gritam e
também são escritoras de fanfics reimaginam-os como funcionários de
cafeterias suburbanas, ou os transportam para os anos 1960 para interagir
com aquela outra famosa banda britânica, ou mergulham nos bastidores
com detalhes totalmente imaginados, explorando o que acreditam ser as
consequências emocionais da fama ou as dores universais de um amor
secreto. A escritora Zan Romanoff já entrevistou mulheres que se vestem
inspiradas no espírito de Harry Styles – entregando-se a um cosplay
elaborado – como uma expressão de devoção que também funciona como
um prolongado exercício criativo. (TIFFANY, 2022, p. 49, tradução nossa).
Vamos imaginar: ao preparar um plano de aula sobre o Modernismo Brasileiro
para três turmas de nono ano, é possível que uma turma se conecte mais com a
pintura, outra com a escultura, e a terceira com o teatro do movimento. Ou, talvez,
uma responda melhor à música, outra ao teatro, enquanto a última não demonstre
interesse em nenhuma das manifestações artísticas desse movimento. É como o
trabalho Uma e Três Cadeiras (1965), de Joseph Kosuth: cada turma, como cada
versão da cadeira, interpreta e compreende o conteúdo de formas diversas.
Este trabalho investiga o processo criativo das conexões feitas na elaboração
da sequência didática realizada em meu Trabalho de Conclusão de Curso de
Licenciatura em Artes Visuais. A sequência utiliza a indústria cultural como porta de
entrada para discussões sobre obras de arte, tendo como tema central a raiva,
explorada através dos elementos visuais escolhidos. A partir da análise das imagens
e obras que escolhi levar em sala de aula, reflito sobre a funcionalidade e o
propósito da arte no debate da dimensão pública. Este estudo propõe, ainda, uma
análise crítica do planejamento e replanejamento das aulas, compreendendo-os
como práticas artísticas que demandam reflexão, experimentação e inovação. Além
disso, aborda os conflitos entre a arte e os objetos da indústria cultural, explorando
como esses embates influenciam o processo educativo.
14
2. Fundamentações e considerações iniciais
2.1 Processo criativo e criatividade
Logo na introdução de seu livro Criatividade e processos de criação, Fayga
Ostrower (1987, p. 5) diz:
As potencialidades e os processos criativos não se restringem, porém, à
arte. Em nossa época, as artes são vistas como área privilegiada do fazer
humano, onde ao indivíduo parece facultada uma liberdade de ação em
amplitude emocional e intelectual inexistente nos outros campos de
atividade humana, e unicamente o trabalho artístico é qualificado de criativo.
Não nos parece correta essa visão de criatividade. O criar só pode ser visto
num sentido global, como um agir integrado em um viver humano. De fato,
criar e viver se interligam.
Para Ostrower (1987), o processo criativo envolve uma exploração contínua
de ideias, emoções, materiais e experiências, onde o indivíduo, em qualquer área,
combina e transforma elementos de maneira inovadora. É um ato de descoberta e
construção, que reorganiza experiências e referências, gerando novas formas de
compreensão e expressão. Esse conceito se aplica a qualquer atividade humana
que demande invenção e construção de significados, não apenas à criação artística.
A autora vê o processo como uma abertura ao novo, que reorganiza
experiências e referências, gerando novas formas de compreensão e expressão; “o
ato criador abrange, portanto, a capacidade de compreender; e esta, por sua vez, a
de relacionar, ordenar, configurar, significar” (1987, p. 9). Essa visão do criar como
algo abrangente e transformador ressoa com as ideias de bell hooks.
Em seu artigo Artistas Mulheres: O Processo Criativo, hooks explora a
importância do tempo ocioso para a “contemplação e devaneio” (2019, p. 237) como
parte fundamental do processo criativo. Argumenta que, especialmente para
mulheres e grupos marginalizados, a criatividade e a produção artística transcendem
a esfera individual, sendo práticas profundamente moldadas pelo contexto social e
político — nesse sentido, criar torna-se não apenas uma forma de expressão
pessoal, mas também um ato de afirmação identitária e resistência frente às forças
opressoras de uma sociedade patriarcal e racista (hooks, 2019). O ato de criar,
assim, é uma ação de sobrevivência, empoderamento e um espaço que, muitas
vezes, envolve sacrifícios.
15
Ao falar sobre Frida Kahlo, que trabalhou enfrentando tanta dor, hooks (p.
241) ressalta:
Com o exemplo de Frida, vi a necessidade de um trabalho sustentável.
Tendo aprendido com artistas com diferentes experiências e backgrounds
culturais, estava determinada a criar um mundo para mim mesma em que
minha criatividade fosse respeitada e sustentada. É um mundo que ainda
está em processo de produção. No entanto, a cada ano da minha vida me
vejo com mais tempo sem ser perturbada ou interrompida. Quando decidi
aceitar um salário mais baixo para lecionar em meio período, foi para me
dar mais tempo. De novo, a escolha exigiu sacrifício, um compromisso com
uma vida mais simples. No entanto, nós, artistas mulheres, precisamos
fazer essas escolhas se queremos mais tempo para contemplar, mais tempo
para trabalhar. Não podemos esperar pelas circunstâncias ideiais para
encontrar tempo e só então fazer o trabalho que é nossa vocação; temos de
criar na oposição, trabalhar contra o fluxo. Cada uma de nós deve inventar
estratégias alternativas que nos permitam desviar ou ultrapassar as
barreiras que se colocam em nosso caminho.
Unindo as reflexões de Ostrower e hooks, podemos entender o processo
criativo com um campo amplo, onde o indivíduo conecta suas vivências pessoais às
forças sociais a seu redor. Ostrower foca na reorganização contínua de referências e
na descoberta de novas formas e compreensão, enquanto hooks vê a criação como
uma ferramenta de resistência e afirmação.
Pensando naquela sequência didática de que parte este trabalho, talvez seja
o caso de indagar até que ponto sua elaboração não configure mais do que a
criação de um instrumento pedagógico. Ela reflete, antes, o poder do processo
criativo em sua forma mais ampla, onde o educador reconfigura e articula diferentes
elementos, transformando o ensino em uma prática inovadora, socialmente
engajada e consciente. Criar e ensinar tornam-se atos que interligam o íntimo e o
social, o pessoal e o coletivo, em um ciclo contínuo de construção, descoberta e
transformação.
2.2 Sobre a indústria cultural
O conceito de indústria cultural, criado por Theodor Adorno e Max Horkheimer
na primeira metade do século XX, trouxe à tona como o capitalismo usa a cultura de
massas como produto para espalhar suas ideias através dos meios de comunicação
(BRÍGIDO, NOGUEIRA, 2016).
16
Embora, em alguns momentos, possa parecer que Adorno adote uma visão
elitista em relação à cultura popular, Brígido e Nogueira (2016, p. 65) argumentam
que:
Na verdade, Adorno não se opõe à cultura alguma, e a suposta preferência
pela cultura elitista deve ser desconsiderada, pois ele analisa a questão da
possibilidade de haver arte e a separação entre o que seria arte
padronizada e não padronizada. Conforme o filósofo, arte padronizada é
“aquilo” que cai no gosto popular, o que não tem tanta autonomia, isto é,
aquela arte que é produzida pela indústria. Por sua vez, na arte não
padronizada está implícita a noção de liberdade, ou seja, de não ter uma
forma onde ela se encaixe para que haja promoção e distribuição,
caracterizando assim, o que é tipicamente industrial.
Os autores identificam quatro aspectos principais da indústria cultural. O
primeiro é a estandardização, cujo objetivo é a uniformizar as mercadorias de modo
a atender ao maior número de consumidores. O segundo, a estereotipização que
resulta na falta de singularidade, uma vez que as produções tendem a seguir
fórmulas que limitam a originalidade. O terceiro aspecto é negação do novo: tudo
que é vendido como “novidade” é, na verdade, uma reciclagem de algo já existente,
apenas com uma nova roupagem. Por fim, a serialização, em que tudo é produzido
em grande escala, visando maximizar a eficiência e o lucro.
Todas essas características se dão diretamente pelo modo de produção
industrial dos bens culturais, fazendo com que a cultura e a arte passem a
ser meramente mercadorias produzidas em série, de forma padronizada e
repetitiva, ou seja, uma racionalidade técnica que visa produzir sempre mais
e mais mercadorias, não levando em consideração a individualidade,
transformando o homem, deste modo, num simples instrumento de trabalho
e de consumo, ou seja, objeto da Indústria Cultural e não protagonista dela.
(BRÍGIDO, NOGUEIRA, 2016, p. 70)
Diante desse panorama, estudar a ligação entre indústria cultural e arte
tornou-se cada vez mais relevante a partir do começo do século XX, pois ambas
estão cada vez mais entrelaçadas. Com a aceleração desse processo na atualidade,
cada vez mais a arte circula por plataformas midiáticas e redes sociais, e a indústria
cultural molda frequentemente como a arte é produzida, distribuída e consumida,
afetando o conteúdo das obras e a forma como o público interage com elas. Redes
sociais como o Instagram e o TikTok transformaram a maneira como instituições
culturais promovem e divulgam exposições e eventos, adaptando a apresentação
17
das obras para que sejam mais “instagramáveis"8 e visualmente atraentes nas
plataformas digitais.
Embora essa adaptação possa comprometer a profundidade e a
complexidade das criações, artistas contemporâneos como Yayoi Kusama, com suas
instalações interativas de bolinhas e espelhos, e JR, com suas fotos em larga escala
no meio da paisagem das cidades, conseguem destacar-se. Suas obras, embora
facilmente compartilhadas nas mídias sociais, preservam seu conteúdo crítico e
inovador.
Há também artistas que incorporam elementos da indústria em suas criações.
Takashi Murakami, por exemplo, funde arte tradicional japonesa com elementos da
cultura pop ocidental, incluindo padrões que refletem a estética visual da indústria
cultural, especialmente em suas colaborações com marcas como Louis Vuitton; o
próprio artista auto intitula-se como um artista comercial (LONGMAN, 2019)9. Outro
exemplo é Mariana Castillo Deball, que investiga a interseção entre arte e cultura
popular, analisando como as narrativas são construídas dentro da mídia.
Compreender essa interseção é essencial, pois revela como a indústria
cultural molda a estética e as narrativas predominantes, enquanto a arte atua como
uma ferramenta crítica, desafiando padrões e oferecendo novas perspectivas sobre
cultura e sociedade. Esse entendimento nos permite refletir sobre os produtos
culturais que consumimos e buscar expressões mais autênticas, equilibrando o
senso crítico com o prazer do entretenimento.
O papel do mercado da arte, nesse contexto, torna-se igualmente relevante,
especialmente por sua natureza elitizada. Galerias de renome, como as localizadas
no bairro dos Jardins em São Paulo, na Zona Sul do Rio de Janeiro, ou em distritos
internacionais de arte como o Soho, em Nova York, além de eventos como a Bienal
de Veneza e feiras de arte como a Art Basel, levantam questões sobre a relação
entre esses espaços e a indústria cultural. Até que ponto é aceitável que essas
esferas se aproximem da indústria? Como esse distanciamento reflete na relação
das massas com as chamadas “belas-artes”? Ao manter uma postura classista,
essas instituições e eventos restringem o acesso e a compreensão das produções
9 Veja mais em: .
8 O termo "instagramável" refere-se a lugares ou experiências visualmente atraentes que geram
conteúdos de fácil compartilhamento e engajamento na rede social Instagram. Esse conceito destaca
a influência das redes sociais nas escolhas de destinos e produtos, priorizando a estética em
detrimento de experiências mais significativas.
https://select.art.br/takashi-murakami-sou-um-artista-comercial-mesmo/
18
artísticas contemporâneas, que frequentemente dialogam com um círculo limitado de
pessoas. Assim, a arte nesses espaços tende a ser autossuficiente e
autorreferencial, até mesmo quando se volta para questões de impacto social. Essa
postura levanta questões sobre a função social da arte, porque manter-se fora do
alcance das massas reduz seu potencial transformador e limita sua relevância.
Em vez de se prender à lógica exclusiva do mercado de arte, uma
aproximação equilibrada com a indústria cultural pode ampliar o alcance e a
influência das artes plásticas, tornando-as não apenas uma expressão visual
agradável, mas também um meio para refletir sobre a sociedade.
Discutir os processos criativos no contexto da indústria cultural é essencial
especialmente diante da tendência à padronização, que privilegia a eficiência e a
produção em larga escala. Esse processo frequentemente suprime a individualidade
e a inovação, resultando em produtos moldados por fórmulas pré-estabelecidas para
atender às demandas do mercado de massa. Contudo, ao colocar os processos em
evidência, abre-se espaço para subverter essa lógica, destacando o valor da
experimentação, da liberdade artística e da autenticidade. Ao priorizar o processo, e
não apenas o produto final, promove-se uma reflexão crítica sobre as restrições
impostas pela indústria cultural, estimulando práticas mais singulares.
Explorar o processo criativo de minha sequência didática permite uma análise
crítica dessa relação. Como professora, assumo o papel de criadora e vou além do
papel de transmissora de conhecimento, para me tornar uma intérprete cultural. Ao
elaborar uma aula, o arte-educador pode unir os mundos distantes da indústria
cultural e das belas-artes, criando novos significados para obras já existentes e
construindo narrativas que celebrem a liberdade criativa. De certa maneira, é essa
tarefa que me faz compreender, em minha atuação enquanto arte-educadora,
igualmente, o nexo central de meu processo criativo enquanto artista.
2.3 Raiva!!!!!!!!!!!
Em Retórica, Aristóteles (2005, p. 161) define a raiva, a ira, a cólera como
um desejo acompanhado de dor que nos incita a exercer vingança explícita
devido a algum desprezo manifestado contra nós, ou contra pessoas da
nossa convivência, sem haver razão para isso.
19
As Dras. Lipp e Malagris (2013, p. 34), referências na Terapia Cognitiva e no
tratamento de stress, afirmam que a raiva é
um sentimento de intenso desconforto que resulta da percepção de alguma
provocação, seja ela uma ofensa, um desacordo, mau tratamento, rejeição,
agressão, frustração ou desmerecimento por parte de alguém ou entidade.
O desconforto experimentado é tão grande que leva a pessoa a querer
revidar e a atacar quem supostamente a enraiveceu.
Em 2006, Fiona Apple foi questionada se toda arte vem da angústia em uma
entrevista no The Late Late Show with Craig Ferguson10 (Fionna Apple Rocks,
2020). Ela responde que não, e Ferguson questiona como ela escreveu seu último
álbum, Extraordinary Machine, e Apple diz que estava angustiada quando escreveu.
Ela complementa sua própria fala:
I only write when I'm angry or sad or something, because that's when I just
have to write. And I only will work if I absolutely have to. If I'm having a good
time and I'm happy and things are going really well, why would I want to stop
what I'm doing to go and write at the piano?11
Seria a felicidade simples demais?
Se o mundo e a vida fossem perfeitos, em instância pessoal e coletiva,
saberíamos apreciar a beleza das coisas sem a feiura junto? A arte existiria?
Escolhi a raiva como tema da sequência didática porque é o sentimento que
eu mais conheço, e nossos momentos mais próximos foram durante minha
adolescência. Eu não sabia nomear nem dar forma pra tal sentimento que me
dominava. Ela se tornou uma sombra constante.
Nunca me considerei uma pessoa brava, briguenta, ou reativa, mas sei que
sou tudo isso, muitas vezes sem querer, como um mecanismo de defesa. No final do
filme Ilha dos Cachorros (2018), Boss, o cachorro principal e que se mostra o mais
arisco ao longo da trama, diz: “I’m not a violent dog. I don’t know why I bite.”12 Essa
fala ressoa em mim, mesmo não gostando muito do filme.
Por muito tempo, confundi essa raiva com tristeza, incapaz de reconhecê-la e
compreender suas nuances. Eu via a tristeza como a única forma de expressar a dor
que sentia, quando, na verdade, ela era um desdobramento da fúria que emanava
12 Tradução nossa: Eu não sou um cachorro violento. Eu não sei porquê eu mordo.
11 Veja mais em: . Tradução nossa: Eu só
escrevo quando estou com raiva ou triste ou algo do tipo, porque é nesse momento que eu
simplesmente preciso escrever. E só vou trabalhar se realmente for necessário. Se estou me
divertindo, estou feliz e as coisas estão indo muito bem, por que eu iria querer parar o que estou
fazendo para ir escrever no piano?
10 Talk show estadunidense apresentado pelo ator e comediante Craig Ferguson, de 2005 à 2014.
https://youtu.be/xyOMvd1zt4g?si=74jwS6w9wqknVYwi
20
das frustrações e mágoas que eu enfrentava. A raiva se manifestava em momentos
de descontrole, quando eu sentia uma vontade intensa de gritar, gritos que nunca se
materializaram em palavras, mas sim em cortes nos meus braços e coxas, e carrego
essas cicatrizes comigo.
Não consigo falar de amor sem falar de ódio. Não consigo falar de paz sem
falar de conflitos. Antes de amar e ser uma pessoa melhor, preciso reconhecer todas
as coisas ruins que fiz, que disse, que fui. Por muito tempo, enxerguei a vida nesses
dois extremos, e até alcançar uma ambivalência, foi uma longa jornada, algo difícil
de alcançar sendo uma pessoa com transtorno de personalidade borderline13.
A primeira vez que me reconheci em uma obra de arte foi com Can’t Help
Myself (2016), de Sun Yuan e Peng Yu. Eu tinha cerca de 16 anos e vi a obra pela
primeira vez no Facebook. O braço mecânico, confinado em paredes de
policarbonato e alumínio, lembra-me o banheiro do antigo apartamento da minha
mãe, revestido por azulejos bege-alaranjados. O éter de celulose vermelho me
lembra do sangue dos cortes mais profundos que já fiz em minha pele. O movimento
insistente do braço mecânico, limpando o fluido que escapa de si mesmo, me faz
pensar em mim mesma, sangrando e manchando minhas roupas, o tapete do
banheiro, minha toalha e meu lençol, torcendo para não chamar a atenção de
ninguém enquanto limpava os rastros da minha dor.
13 O transtorno de personalidade borderline (TPB) é caracterizado por instabilidade nas emoções,
relacionamentos interpessoais e autoimagem. Indivíduos com TPB frequentemente enfrentam
oscilações de humor intensas, medo de abandono e comportamento impulsivo, além de sentimentos
de vazio e dificuldade para regular a raiva.
21
3. A sequência e seus processos
3.1 eu sou sua professora de artes, é claro que quero saber sua opinião
Para a primeira aula naquela sequência didática, optei por aplicar uma
avaliação diagnóstica como uma forma de levantamento do repertório imagético e
crítico da turma. A atividade foi intitulada “eu sou sua professora de artes, é claro
que eu quero saber sua opinião”14, e é composta por quatro perguntas:
1. “Para você, o que é arte?”
2. “Tenho contato com arte e cultura através de:”
3. “Cite uma música, uma série e um filme que você goste:”
Para a pergunta 4, preparei um compilado de seis imagens e pedi para que
escolhessem qual lhes chama mais a atenção, justificando a escolha.
Inicialmente, minha ideia era selecionar imagens que mostrassem uma linha
do tempo simplificada da história da arte: arte rupestre, egípcia, greco-romana,
gótica, Renascimento, Barroco, Romantismo, Impressionismo, Cubismo,
Abstracionismo, Surrealismo, Futurismo e Modernismo Brasileiro. Pensei em
pesquisar cada movimento no Google, e utilizar a primeira imagem que aparecesse
como exemplo.
Também considerei trazer apenas obras não figurativas, transformando a
pergunta em uma espécie de Teste de Rorschach15 com os alunos. Para isso, pensei
em artistas como Kazimir Malevich, Lygia Clark, Piet Mondrian, Yves Klein, Amilcar
de Castro, Daniel Buren, Mark Rothko, Jackson Pollock, Willem de Kooning, Anish
Kapoor, Wassily Kandinsky, Yayoi Kusama, Paul Klee e Donald Judd.
Depois, cogitei selecionar imagens que exploram diretamente a raiva, o tema
central dessa sequência. Para ter inspiração, folheei as páginas de História da Arte,
de Ernst Gombrich (2015), e Arte Moderna, de Giulio Carlo Argan (1992), em busca
de referências que me transmitissem essa emoção. Considerei as obras Os
Fuzilamentos de 3 de Maio de 1808 (1814), de Francisco Goya; A Liberdade
guiando o povo (1830), de Eugène Delacroix; Puberdade (1895), de Edvard Munch;
15 O Teste de Rorschach é uma técnica projetiva criada pelo psiquiatra Hermann Rorschach em 1921.
Ele consiste em pranchas com manchas de tinta, onde o indivíduo descreve o que vê, e as respostas
são usadas para avaliar aspectos da personalidade e padrões emocionais.
14 Referência à trend no TikTok “eu sou... é claro que”, utilizada para se apresentar e falar algo da sua
vida, profissão, hobbies, etc.
22
e O Anjo Caído (1847), de Alexandre Cabanel. Para acompanhá-las, pensei em
incluir um trecho da música Diss pro Evaristo Costa16 (Lixeira do Calvo, 2023), de Zé
Felipe; uma imagem do meme de uma entrevista de Luciana Gimenez (“mas cê tá
brava?”)17 (Genivaldo Costa, 2016); e uma transcrição de um trecho de uma live de
Jojo Todynho18 (@memesemdecomposicao, 2022).
Pensei em trabalhar apenas com artistas internacionais, depois apenas com
nacionais, ou, ainda, usar um mesmo meme replicado e remixado diversas vezes;
quase utilizei vários memes da Tulla Luana, personalidade da internet brasileira
conhecida por seus vídeos onde expressa raiva e indignação de forma espontânea e
exagerada sobre diversos temas.
Por fim, decidi por uma seleção de imagens aparentemente desconexas, sem
uma relação óbvia entre si, abrangendo diferentes meios, materiais e épocas. O
critério principal para a escolha foi a minha própria afinidade com as imagens, e seu
poder de me intrigar visualmente.
18 Veja mais em: .
17 Veja mais em: .
16 Um diss é uma música que tem como objetivo atacar ou criticar publicamente uma pessoa,
geralmente usada no contexto de rivalidades no rap ou na música pop. O Diss para Evaristo Costa,
música de 2023, foi uma resposta do cantor Zé Felipe após ser ironizado pelo jornalista nas redes
sociais, devido a uma polêmica envolvendo a esposa de Zé Felipe, Virgínia Fonseca. Veja mais em:
.
https://www.youtube.com/shorts/0rFCfgQqFTg
https://www.youtube.com/watch?app=desktop&v=UNNuUSkIiQE
https://www.youtube.com/watch?v=D_lVOxDJJ6Y
23
Figura 1 - Segunda folha da atividade diagnóstica
Fonte: elaborada pela autora, 2024
24
Para a primeira imagem, escolhi um frame do filme Corra! (2017), dirigido por
Jordan Peele, um dos meus cineastas favoritos (ou assim eu acreditava, antes de
que ele, muito recentemente, tenha assinado a infame campanha ou “carta de
agradecimento” para o então Presidente dos EUA Joe Biden chamada
#NoHostageLeftBehind). Embora eu tenha pensado em trazer uma imagem de Jean
Jacket, o alienígena/OVNI de Não! Não Olhe! (2022), meu filme favorito dele, escolhi
não fazê-lo, por receio de que a turma pudesse associá-lo ao mascote da Copa do
Mundo de 2022. Assim, decidi por esse frame de Corra!, pois ele captura de maneira
eficaz a tensão central da narrativa.
A pintura O Pesadelo (1781), de Henri Fuseli, me intrigou desde que a vi pela
primeira vez na série de suspense The Fall (2013-2016). A trama acompanha a
detetive Stella Gibson em sua caçada ao Paul Spector, um homem que vive uma
vida dupla: de um lado, ele é um assassino de mulheres na faixa dos 30 anos, com
carreiras corporativas e que moram sozinhas; de outro, ele é pai de família e
conselheiro de luto. A série explora temas de controle e poder, além da linha tênue
entre caçador e presa.
No episódio final da primeira temporada, após a família de uma vítima fazer
um apelo público para que o assassino se entregue para a polícia, Paul liga para o
Departamento de Homicídios e pede para falar diretamente com Stella. Durante a
conversa, Stella o chama de artista, referindo-se à maneira meticulosa com que ele
posiciona os corpos de suas vítimas nas cenas dos crimes. Paul responde: “A arte é
uma mentira. A arte dá para o caos do mundo uma ordem que não existe”.
Essa visão sobre a natureza ilusória da arte ressurge no terceiro episódio da
segunda temporada, quando Paul invade o quarto de hotel de Stella, lê seu diário de
sonhos e altera o papel parede do computador dela para O Pesadelo, de Fuseli.
Paul transforma a pintura em um símbolo de sua manipulação da realidade e sua
tentativa de invadir a psique de Stella, assim como faz com suas vítimas: invade
suas casas, reorganiza objetos pessoais e coleta troféus antes de matá-las.
O Pesadelo carrega um poder aterrorizante e grotesco, evocando a sensação
de uma presença maligna e opressiva. No entanto, e se a imagem fosse interpretada
de outra forma? E se o íncubo, em vez de simbolizar uma força maléfica, estivesse
ali para proteger a mulher adormecida? A égua ao fundo, com os olhos arregalados,
poderia também ser vista sob essa mesma luz protetora, como uma sentinela,
25
pronta para intervir se necessário. Assim, levanto a questão: como a indústria
cultural lida com o conceito do sublime de Kant?19
Representações do grotesco na tradição do horror clássico, especialmente em
gêneros como o gore20, mantêm a visão mais convencional de monstros e figuras
grotescas como símbolos do mal absoluto e da ameaça iminente. Filmes como
Terrifier (2016), Jogos Mortais (2004) e A Centopeia Humana (2009) exploram o
horror corporal em situações extremas, destacando a violência explícita e a
brutalidade. Nessas narrativas, as figuras monstruosas carecem de redenção ou
complexidade, simbolizando o lado sombrio e implacável da humanidade e do
desconhecido. O foco está em provocar uma resposta visceral, reforçando a
dicotomia entre o humano e o monstruoso, sem espaço para ambiguidades ou a
ressignificação do medo, como na pintura de Fuseli.
Por outro lado, algumas narrativas reconfiguram a relação com o grotesco ao
deslocá-lo do âmbito do medo absoluto para a possibilidade de compreensão e
transformação. Em A Chegada (2016), naves alienígenas pousam na Terra, e a
linguista Louise Banks é convocada para decifrar a linguagem dos visitantes,
enquanto as nações, em um estado de tensão crescente, debatem a ameaça
representada por sua presença. À medida que Louise avança na comunicação,
aprendendo a língua alienígena enquanto eles assimilam o inglês, o grotesco deixa
de ser uma manifestação de ameaça bidimensional, e ela cria uma relação afetuosa
com aqueles seres. Essa interação transcende a barreira do estranhamento inicial,
transformando o desconhecido, e reconfigurando os paradigmas sobre o que
constitui ameaça ou possibilidade.
De maneira semelhante, Irmão Urso (2003) subverte o grotesco ao explorar
sua potência transformadora. Após buscar vingança pela morte de seu irmão,
atacado por um urso, o jovem inuíte Kenai é transformado em urso pelos espíritos
ancestrais. Para recuperar sua forma humana, ele embarca em uma jornada ao lado
de Koda, um filhote de urso. Durante a jornada, ambos encontram uma caverna com
pinturas rupestres que retratam um urso em posição de ataque e uma figura humana
armada com uma lança. Diante da imagem, Koda comenta assustado: “Olha só,
20 O gênero gore se caracteriza pela representação explícita de violência e mutilações, visando
chocar ou provocar reações intensas. Embora comum no cinema de terror, também aparece em
outras mídias, como videogames e literatura.
19 Embora não mencionaremos neste trabalho a conceituação exata do “sublime” e de seu
correspondente histórico imediato, o “grotesco”, referimo-nos neste trabalho às acepções já acatadas
da história da arte com relação a esta terminologia. A este respeito, ver ARGAN, 1999, p. 12 e ss.
26
esses monstros são de assustar... Principalmente com essas lanças.” Nesse
momento, o grotesco, inicialmente percebido como ameaça, é ressignificado por
meio de uma nova perspectiva.
Essas histórias subvertem o grotesco ao mostrar figuras ameaçadoras que,
com o tempo, revelam sensibilidade e se tornam aliadas. O que inicialmente provoca
medo adquire profundidade, abrindo espaço para a ambiguidade entre ameaça e
acolhimento. A monstruosidade reflete não apenas o desconhecido, mas uma forma
de diferença que, quando compreendida, pode trazer novos significados sobre a
complexidade emocional humana e a possibilidade de transformação.
Escolhi a obra Aves da Noite (1942), por me identificar com os temas de
solidão recorrentes nas obras de Edward Hopper. A composição de Hopper, com
suas figuras dispersas e o cenário noturno de uma lanchonete vazia, evoca um
sentimento de alienação e introspecção que eu conheço bem. Esse isolamento
espacial, somado ao vazio emocional, pode ser visto como uma metáfora para os
ambientes em que as interações humanas parecem mecanizadas ou rarefeitas,
como pode ocorrer em uma sala de aula, onde cada aluno vive sua própria
experiência de solidão ou integração social.
A obra de Jackson Pollock foi escolhida por seu caráter inteiramente não
figurativo. Pollock propõe uma imersão total na abstração, como em todo seu
trabalho, onde a experiência estética se dá pela materialidade da tinta e pela energia
do gesto. Essa escolha abre espaço para questionar como a arte pode comunicar
emoções de forma puramente sensorial, sem a necessidade de narrativas ou
simbologias.
As duas últimas obras foram escolhidas por seu caráter tridimensional. Fonte
Luminosa (2021), de Carmela Gross, vai além da imagem: ela incorpora luz como
matéria-prima, criando uma relação entre o espectador e o espaço ao redor; a obra
transita entre escultura, instalação e performance. Já Parede com incisões a la
Fontana (2000), de Adriana Varejão, foi escolhida pela sua desconstrução da
superfície pictórica, através das incisões que rompem com a bidimensionalidade da
pintura e a transforma em objeto artístico.
27
3.2 eu sou a única pessoa que, de verdade, consegue acalmar ele
Enquanto folheava o livro de história da arte de Argan (1992), deparei-me
com a obra A Intervenção das Sabinas (1799), de Jacques-Louis David. Nessa
pintura, as mulheres, lideradas por Hersília, colocam-se entre os homens em guerra,
tentando interromper a batalha entre os romanos e os sabinos.
David foi um fervoroso apoiador de Maximilien Robespierre, influente político
revolucionário durante a Revolução Francesa. Robespierre instaurou o Reino do
Terror na França, um período marcado pela perseguição implacável aos inimigos da
Revolução, resultando na execução e prisão de muitos, incluindo inocentes. Após a
queda de Robespierre, David escapou da guilhotina, mas foi preso. Durante seu
exílio, sua esposa, Marguerite-Charlott David, sugeriu que ele pintasse A
Intervenção das Sabinas como uma oferenda de paz ao governo francês. Hersília
representa a busca pela paz em meio ao conflito, ressaltando a complexidade das
relações humanas e a importância da reconciliação.
Embora já conhecesse essa obra, dessa vez, ao buscar imagens que
dialogassem com a indústria cultural, imediatamente me veio à mente o TikTok da
comediante Larissa Gloor (2021)21. No vídeo, Larissa encena uma menina
separando uma briga entre dois colegas em ambiente escolar, tentando acalmar um
dos rapazes. Curiosamente, seus gestos se assemelham aos de Hersília da pintura
de David, enquanto ela ordena que o personagem Gabriel se afaste de Caio, a quem
ela tenta confortar. A primeira mediação é Neoclássica; a segunda, cômica.
21 Veja mais em: .
https://www.tiktok.com/@larissagloor/video/7034947059132222722
28
Figura 2 - frame do vídeo de Larissa Gloor
Fonte: Gloor, 2021.
Entretanto, o papel de um artista não é jamais algo definido. Varia tanto de
acordo com o tempo, a posição histórica, quanto em relação à personalidade
empírica do sujeito em questão. Não se limita apenas à mediação e à pacificação; a
arte pode também incitar mais violência e provocar o lado oposto. Em contextos de
conflito, como aquele entre Israel e Palestina, por exemplo, como me alertou um
aluno a quem apliquei a sequência didática, um artista palestino pode criar obras
que deliberadamente ofendam Israel, e vice-versa. Assim, o poder da arte se mostra
ambíguo, diretamente ligado às intenções do artista, podendo tanto promover a paz
quanto intensificar divisões.
3.3 PLEASE I’M A STAR!!!!!!
O tema da female rage (“fúria feminina”, em sua tradução literal) trata da
validação das emoções das mulheres, especialmente em relação a dor, raiva e
frustração, que historicamente foram desvalorizadas ou vistas como exageradas
(NG, 2024). A raiva feminina foi constantemente associada a percepções históricas
29
de histeria, instabilidade e irracionalidade, sempre vinculadas à feminilidade, o que
limitou a expressão legítima dessas emoções (CRAVEN, 2024; NG, 2024).
Essa temática tem ganhado força nos últimos anos, com artistas e
movimentos culturais utilizando a raiva feminina como uma ferramenta de expressão
autêntica e libertadora (CRAVEN, 2024). Hoje, as mulheres reconhecem sua raiva
como legítima, utilizando-a como um veículo para desafiar injustiças e expectativas
sociais contraditórias, além de questionar a romantização nas representações do
sofrimento feminino (NG, 2024). Na literatura, no cinema e na música, essa raiva é
transformada em um meio de afirmar a complexidade da experiência feminina, indo
além da dor, para incluir também a alegria e a resistência (CRAVEN, 2024; NG,
2024). Ao apresentar a raiva como uma resposta válida às injustiças e às
contradições impostas às mulheres, essas narrativas tornam a arte mais acessível,
criando um espaço de identificação para experiências femininas reais (CRAVEN,
2024).
Meu interesse por esse tema cresceu em 2022, quando li Estou feliz que
minha mãe morreu, a autobiografia da atriz Jennette McCurdy (2022). No livro,
McCurdy relata sua experiência na indústria televisiva desde a infância, suas
gravações em iCarly22, a relação abusiva com sua mãe narcisista, e sua luta contra
transtornos alimentares. A partir dessa leitura, revisitei A redoma de vidro (2014), de
Sylvia Plath, o que me incentivou a explorar outras narrativas sobre a fúria e traumas
femininos. Assim, li Objetos cortantes (2015), e Gone Girl (2013), de Gillian Flynn,
Garota em pedaços (2017), de Kathleen Glasgow, toda a Tetralogia Napolitana
(2021) de Elena Ferrante, Animal (2022) e Três mulheres (2019), de Lisa Taddeo,
Writers & Lovers (2021), de Lily King, e The Miseducation of Cameron Post
(2017),amiga genial de Emily M. Danforth.
Todas essas ficções trazem personagens femininas profundamente reais:
falhas, invejosas, orgulhosas, ciumentas, raivosas, mal-humoradas, tristes, confusas,
burras, inteligentes, deprimidas, maníacas, perdidas, odiosas, complexas, intensas,
imprevisíveis, contraditórias, obsessivas, vulneráveis, cruéis, autodestrutivas,
frágeis, manipuladoras. Mulheres loucas. Mulheres como eu.
22 iCarly (2007-2012) foi uma série de comédia da Nickelodeon, criada por Dan Schneider. A trama
acompanha Carly Shay, uma adolescente que se torna famosa ao criar um webcast com seus amigos
Sam e Freddie, explorando o humor e a cultura digital da época.
30
As personagens com que mais me conecto são Camille Preaker, de Objetos
Cortantes, uma jornalista marcada por traumas familiares e automutilação, que
retorna à sua cidade natal para investigar o assassinato de duas meninas; e Joan,
de Animal, uma mulher consumida por traumas profundos e uma raiva intensa. Ao
longo da narrativa, Joan reflete sobre sua vida marcada por relacionamentos
abusivos, traumas sexuais, violências e suas complexas relações com o gênero
masculino, além de explorar temas como dor, desejo e dinâmicas de poder.
Female rage ganhou popularidade nas redes sociais, especialmente no
TikTok, com os fan edits, ou apenas edits: edições criadas por fãs que reorganizam
ou modificam material original de filmes, séries ou videoclipes, para gerar novas
interpretações. Essas edições muitas vezes fazem referência a tendências atuais,
incluindo músicas populares, eventos contemporâneos e memes, refletindo o que
está em alta nas mídias e discussões do momento. Sobre a imagem e o poder
criativo do fã, Kaitlyn Tiffany (2022, p.50), escritora da revista estadunidense The
Atlantic, diz:
A imagem da fã histérica é tão familiar e dramática que impede a curiosidade.
Mas, há décadas, os fãs não se limitam a apreciar passivamente ou a desejar
intensamente os objetos de sua admiração. Eles também os editam,
recirculam e os usam como inspiração para uma gama de trabalhos criativos
tão vasta – e em grande parte não catalogada – que é impossível
compreendê-la por completo. As artes, as histórias e as piadas internas são
tão parte do que significa ser fã quanto esperar em um aeroporto ou decorar
dezenas de músicas. (tradução nossa)
Confesso que minha própria curiosidade sobre o tema da ira feminina foi
influenciado pelo TikTok. O edit mais famoso23 sobre fúria feminina na plataforma,
criado pela usuária bel6va (2023), atingiu 11,8 milhões de visualizações, 1,4 milhão
de curtidas e 58,9 mil compartilhamentos. O áudio desse vídeo foi reutilizado por
outros usuários em mais de 362 mil vídeos. No entanto, também existem muitos
outros vídeos que utilizam o mesmo áudio, mas sem que apareça o crédito como
uma reutilização direta do áudio original.
Esse edit foi o primeiro elemento escolhido para a aula. O vídeo é uma
compilação de cenas dos filmes Casamento Sangrento (2019), Pearl (2022),
Hereditário (2018), Estrelas Além do Tempo (2016), Avatar: O Caminho da Água
(2022), além de trechos do vídeo game The Last of Us e de sua adaptação em série,
23 Veja mais em: .
https://www.tiktok.com/@bel6va/video/7207062985829846278
31
e da série Euphoria (2019-presente). Dos mencionados,o único que não assisti foi
Avatar.
O segundo edit (@rslfiless, 2024)24, apresentado para mim pelo algoritmo do
TikTok, traz uma perspectiva brasileira da fúria feminina, reunindo cenas das novelas
Avenida Brasil (2012), A Força do Querer (2017), Pantanal (2022), Travessia (2022),
Todas as Flores (2022), Fuzuê (2023), Terra e Paixão (2023), Amor de Mãe (2019),
A Favorita (2008), e Vai na Fé (2023). Dessas, tenho mais familiaridade com
Avenida Brasil, enquanto as demais conheço de forma mais superficial.
Desde o início do planejamento, sabia que abordaria o tema da fúria feminina
com esses edits, mas ainda não tinha certeza de qual referência artística incluir. A
primeira obra que me veio à mente foi A noiva hesitante (1866), de Auguste
Toulmouche, que também se tornou viral no TikTok através de uma trend25. Optei por
não escolhê-la, pois a raiva está tão claramente presente na obra que acabaria
trazendo reflexões excessivamente óbvias.
Em seguida, considerei a tela Grupo num balcão (1810-15), de Francisco
Goya. A forma como as figuras masculinas observam as mulheres sempre me
transmitiu uma sensação de assédio, sugerindo uma dinâmica de poder e
desconforto: sensações comuns na vida de uma mulher. Escolhi por não incluí-la,
por acreditar que uma pintura tão antiga e feita por um homem não dialogava com
temas mais contemporâneos, especialmente no que diz respeito às novas
representações da raiva feminina.
Pensei em todas as artistas mulheres que conheço e em quais delas se
relacionam com a fúria feminina. Considerei trazer obras de Frida Kahlo, Tracey
Emin, Louise Bourgeois, Marina Abramovic, Cindy Sherman, Rosana Paulino, Ana
Mendieta.
No final, decidi apresentar As duas Fridas (1939), de Frida Kahlo, obra que
representa de forma profunda a dualidade emocional e a complexidade da fúria
feminina. Essa obra não apenas aborda a luta interna da artista, mas também
questões universais de identidade, amor e dor.
Kahlo retrata duas versões de si mesma: uma vestida com trajes tradicionais
mexicanos, representando sua herança e sua conexão com suas raízes, e a outra,
25 Para exemplos da trend, veja mais em:
.
24 Veja mais: .
https://www.tiktok.com/search?q=reluctant%20bride&t=1729707821984
https://www.tiktok.com/@rslfiless/video/7345207630559776005
32
em um vestido europeu, simbolizando a influência da cultura ocidental e suas
experiências de rejeição e sofrimento (WOLFE, 2019). Essa dualidade reflete não só
o conflito entre culturas, mas também a dificuldade que mulheres enfrentam em ser
quem realmente desejam, e quem a sociedade patriarcal espera que sejam. Essa
luta entre diferentes aspectos da identidade — a aceitação, a negação e o confronto
com as expectativas externas — captura a essência da fúria feminina, que muitas
vezes emerge dessa batalha interna.
Além disso, a obra expressa a dor emocional que Frida vivenciou ao longo de
sua vida, incluindo a traição e a perda, temas que ressoam em muitas mulheres que
enfrentam conflitos internos semelhantes. A força visual e a carga emocional da
pintura não apenas desafiam estereótipos, mas também celebram a complexidade
das emoções femininas (WOLFE, 2019).
3.4 que a sorte esteja sempre a seu favor
Não me recordo exatamente quando vi pela primeira vez a pintura O Mar de
Gelo (1823-24), de Caspar David Friedrich, mas, ao vê-la no contexto da sequência
didática, lembrei-me imediatamente das Cornucópias de Jogos Vorazes.
Jogos Vorazes (2009-2020; 2012-2023) é uma série de livros para jovens
adultos adaptada para o cinema, que li pela primeira vez aos 12 anos. A história se
passa em uma sociedade distópica e futurista chamada Panem, onde a população é
rigidamente dividida em 12 distritos subordinados à Capital. Cada distrito tem uma
função econômica específica e um nível de riqueza diferente, sendo o Distrito 1 o
mais abastado, e o Distrito 12, o mais pobre. Como forma de controle e punição
pelos levantes e revoluções do passado, a Capital organiza anualmente os Jogos
Vorazes, um evento brutal transmitido ao vivo em toda Panem, em que um menino e
uma menina entre 12 e 18 anos de cada distrito são sorteados para lutar até a morte
em uma arena, da qual apenas um poderá sair vivo. A protagonista da série é
Katniss Everdeen, uma jovem do Distrito 12 que se voluntaria para participar dos
jogos no lugar de sua irmã mais nova, Prim.
Em cada arena, há uma estrutura central nomeada Cornucópia: um grande
chifre dourado repleto de suprimentos, armas, alimentos e outros itens que podem
ser cruciais para a sobrevivência dos tributos. Localizada no centro da arena, a
Cornucópia se torna um ponto estratégico e mortal, pois logo nos primeiros minutos
33
dos Jogos, os tributos correm até ela para pegar recursos, resultando em um intenso
"banho de sangue", no qual muitos são eliminados em batalhas por armas e
suprimentos.
Inicialmente, pensei em apresentar a obra de Friedrich junto às cenas dos
filmes que mostram os tributos entrando na arena pela primeira vez nas 10° (Panem
propaganda, 2023)26, 74° (Movieclips, 2014)27 e 75° (tyler malay, 2014)28 edições dos
jogos, seguindo a linha temporal do universo da saga, e não a ordem de lançamento
dos filmes. A visão da natureza desconhecida e inóspita da arena tem uma
semelhança visual com a atmosfera de desolação e brutalidade da pintura de
Friedrich. No entanto, ao refletir mais profundamente, percebi que essa conexão era
superficial, limitando-se ao aspecto figurativo, sem explorar o conceito mais profundo
de ambos.
Estava pronta para abandonar a ideia, mas ainda queria muito apresentar as
cenas de Jogos Vorazes. Refleti sobre com qual artista ou obra eu poderia
acompanhar essas cenas, conversei com amigos e colegas, mas todas as
sugestões recaíam em comparações visuais simples, como eu mesma vinha
fazendo.
Foi então que, durante um almoço, meu colega e amigo de trabalho Lucas me
apresentou o trabalho de Lyz Parayzo, e tudo fez sentido. A série Próteses Bélicas
(2018-2020) de Parayzo explora o conflito e a resistência, trazendo uma crítica
contundente aos papeis de opressão e resistência, temas centrais em Jogos
Vorazes. Parayzo utiliza o metal como material principal, criando esculturas-objetos
que se assemelham a armas de proteção, evocando tanto defesa quanto ameaça, e
transformando a ideia de vulnerabilidade em força. Suas esculturas funcionam como
instrumentos de autodefesa, espelhando a luta dos tributos dentro da arena. Porém,
no caso de Parayzo, a arena são as ruas e o inimigo é a transfobia.
Assim como Katniss é forçada a lutar e a resistir em uma arena que expõe
tanto sua força quanto sua fraqueza, as obras de Parayzo remetem ao poder de se
armar contra o sistema opressor, ressignificando a luta. Enquanto a arena se
transforma em um palco de sobrevivência para os tributos, as obras da artista se
28 Veja mais em: .
27 Veja mais em: .
26 Veja mais em: .
https://youtu.be/m_FeDKePDxE?si=T8jsn0QfIxuoeoIF
https://youtu.be/oISBveQNkzA?si=qGA_GBW3k4JJvrB9
https://youtu.be/cn29eYDTOiY?si=PYHya0vRLdUZz44I
34
tornam símbolos de proteção e confronto, desafiando as opressões sociais e
governamentais, tal como Katniss faz na sua jornada.
Parayzo parte de uma urgência explícita e prática. Em Próteses Bélicas, a
arte vai além da contemplação, e se torna uma arma de resistência, uma ferramenta
de sobrevivência e um grito por justiça. Suas obras desafiam a violência estrutural
contra pessoas transgêneras, transformando a fragilidade em força e a opressão em
empoderamento — reflexões que podem se estender a outros grupos
marginalizados. Parayzo expande seu impacto para além das paredes de um museu
ou galeria — suas esculturas dialogam diretamente com as lutas do cotidiano,
mostrando que a arte também pode ser um ato de resistência e transformação.
3.5 a dona aranha subiu pela parede
Maman (1999) é uma escultura monumental de autoria da artista
franco-americana Louise Bourgeois. Representando uma aranha, a obra é composta
de aço inoxidável, bronze e 32 ovos de mármore. Com dez metros de altura, Maman
está entre as maiores esculturas do mundo.
A relação de Louise Bourgeois com aranhas teve início nos anos 1990,
quando ela começou a associá-las à sua mãe, que faleceu quando a artista tinha
apenas vinte e um anos. Dias após a perda, em um momento de sofrimento e diante
da indiferença de seu pai em relação a seu luto, Bourgeois jogou-se dentro do rio
Bièvre.
Sobre um de seus desenhos, ela escreveu: “A amiga (a aranha, por que a
aranha?). Porque minha melhor amiga era minha mãe, e ela era tão
inteligente, paciente, limpa e útil, razoável, indispensável quanto uma
aranha. Ela era capaz de se defender.” [...] A aranha tecendo sua teia está
associada à mãe e ao seu trabalho de reparação de tapeçarias. A artista
associa seu próprio trabalho a uma teia de emoções e memórias que ela
tece, desfaz e tece novamente, como Penélope, ao longo da vida.
Bourgeois dá a uma de suas obras de 1999-2000 um título revelador: Eu
faço, desfaço e refaço, título que expõe o funcionamento psicológico e
criativo de Louise Bourgeois. Enquanto "fazer" é uma referência ao ato da
artista, "desfazer" e "refazer" seguem uma lógica que, segundo a
psicanálise, especialmente Melanie Klein, alude aos impulsos agressivos do
bebê em relação ao objeto materno. "Desfazer" significaria destruir a mãe
má que não é amorosa, "refazer" corresponderia a passar pela fase
depressiva associada à culpa e superá-la, fazendo reparações. [...] “O
trabalho artístico atua como uma reparação, uma restauração tanto no
sentido literal quanto figurado”, escreve Marie-Laure Bernadac sobre o tema
[...].(LEONI-FIGINI, 2008, tradução nossa)
35
O conceito psicanalítico da agressão infantil contra a figura materna tem
paralelos na narrativa do filme Coraline (2009), baseado no livro homônimo de Neil
Gaiman (2020). A história acompanha Coraline Jones, uma menina pré-adolescente
que se muda com seus pais para uma cidade no Oregon, nos Estados Unidos.
Coraline enfrenta dificuldades em seu relacionamento familiar, especialmente com a
mãe, que, assim como o pai, está frequentemente ocupada trabalhando e demonstra
impaciência. Essa dinâmica faz com que Coraline se sinta negligenciada, sozinha e
incompreendida.
Na nova casa, Coraline descobre uma pequena porta na sala de estar, que, à
noite, revela um túnel misterioso para um "Outro Mundo". Nesse universo alternativo,
ela conhece seus “Outros” Pai e Mãe, versões aparentemente perfeitas de seus pais
reais, mas com botões no lugar dos olhos. A Outra Mãe, em particular, é carinhosa e
atenciosa, proporcionando a Coraline todas as coisas que ela sente faltar em sua
vida real, tornando o Outro Mundo sedutor e acolhedor.
No entanto, a ilusão de perfeição se desfaz quando a Outra Mãe propõe que
Coraline permaneça no Outro Mundo para sempre, sob a condição de ter botões
costurados em seus olhos. Horrorizada, Coraline recusa e tenta escapar, mas a
Outra Mãe revela-se uma criatura monstruosa: a Beldam, um híbrido entre um
esqueleto e uma aranha, com quatro pernas, mãos feitas de agulhas de costura, e o
rosto craquelado como uma porcelana quebrada.
Após retornar ao Mundo Real, Coraline percebe que seus pais foram
sequestrados pela Outra Mãe. Determinada a salvá-los, ela enfrenta seus medos e
retorna ao Outro Mundo para um confronto final. Nesse embate, a Beldam
transforma o chão da sala em uma teia, tentando capturar Coraline, mas ela
consegue escapar, selando a porta entre os mundos e encerrando o domínio da
Outra Mãe, libertando seus pais e recuperando a harmonia no Mundo Real.
A figura da Beldam, ou Belle-dam (“bela-dama”, em sua tradução), refere-se a
uma figura vilanesca comum em lendas e histórias de origem folclórica, geralmente
representadas como uma bruxa ou criatura enganadora. Caracteriza-se por atrair
vítimas com uma fachada acolhedora ou atrativa, mas tem intenções malévolas,
manipulando pessoas para prendê-las ou prejudicá-las.
36
Figura 3 - frame do filme Coraline
Fonte: Laika, 2009
Durante o filme, Coraline descobre que Beldam, há mais de 150 anos, atrai
crianças solitárias para o Outro Mundo. Ao ser trancada dentro de um espelho pela
Beldam, ela encontra os fantasmas de três outras crianças que foram enganadas
pela criatura. Essas almas perdidas revelam que também foram atraídas para o
Outro Mundo, tiveram seus desejos atendidos e aceitaram trocar seus olhos por
botões, mas a um preço: Beldam devorou suas almas, deixando-as presas dentro
daquele espelho para sempre. O Outro Mundo é uma teia cuidadosamente tecida
pela Outra Mãe, onde as crianças são atraídas e imobilizadas como insetos
indefesos, vítimas de sua fome insaciável.
No final, Coraline compreende que, apesar das falhas de sua mãe real, ela
não representa uma ameaça, ao contrário da figura destrutiva da Outra Mãe. Ao
derrotar a Beldam e salvar sua família, Coraline reforça sua conexão com a mãe
real, realizando, simbolicamente, o “desfazer” e o “refazer” descritos por Klein e
explorados por Bourgeois em suas obras.
Mesmo sabendo que Maman é uma ode para a mãe de Bourgeois, não
consigo vê-la com esses olhos. Quando a artista escreve que sua mãe era sua
37
melhor amiga, isso não faz sentido para mim. Eu vejo a escultura do mesmo jeito
que vejo a Outra Mãe: uma ameaça.
Assisti Coraline pela primeira vez aos dez anos e, aos doze, desenvolvi uma
obsessão, quase um hiperfoco, com o filme. Eu tinha um DVD pirata, um DVD
player, e tardes vazias. Minha rotina era simples: voltava da escola, almoçava, fazia
minha lição de casa e assistia Coraline repetidamente até dar a hora de dormir.
Coraline se tornou tudo que eu queria ser. Eu queria cortar meu cabelo bem
curto, pintá-lo de azul, usar a mesma capa de chuva amarela dela. Na época, eu
morava em um prédio antigo na Vila Mariana com minha mãe, seu ex-marido e
minha irmã. Sonhava que, um dia, encontraria uma portinha que me levasse à minha
versão do Outro Mundo. No térreo do prédio, até havia uma porta para um porão
misterioso, mas nunca desci nem soube o que tinha guardado lá. Acho que os
moradores não tinham permissão de descer, mas eu imaginava que, se o fizesse,
encontraria minha Outra Mãe. Mas não a Outra Mãe que Coraline encontra, a
Beldam. No meu imaginário, era o oposto: no mundo real, minha mãe era a Beldam.
Nociva, invasiva, tóxica. Naquele Outro Mundo, minha Outra Mãe seria como a mãe
real de Coraline se torna no final do filme, passando pelo processo de desfazer e
refazer — uma mãe mais amorosa, que me veria e me acolheria de verdade.
Eu e meus irmãos sempre tivemos uma relação complexa com nossa mãe.
Brigas intensas, períodos de afastamentos, meses sem conversarmos, áudios de
seis minutos no WhatsApp cheios de acusações e xingamentos, gritos dentro do
carro, muito choro. Toda vez que tento me reconectar com ela, me sinto como
Coraline ao chegar no Outro Mundo: sou recebida com atenção, carinho, presentes
e comida gostosa, e, de repente tudo muda, e logo me vejo no mesmo ciclo de
angústia, como se quisessem costurar botões em meus olhos e devorar minha alma.
Quando olho para a escultura de Bourgeois, sinto essa mesma ameaça, uma
teia emocional que aprisiona qualquer um que chegar perto. Também sinto uma
ponta de inveja de Bourgeois — gostaria de saber como é ter uma mãe que é, de
fato, uma amiga.
3.6 costura de Rosana Paulino
Diferente de todas as outras obras de que falei sobre até agora, não tenho
nenhuma conexão pessoal ou íntima com as que apresento adiante, devido ao
38
simples fato de eu ser branca. Existem dores e vivências que nunca poderei
compreender plenamente, pois não fazem parte da minha experiência. Ainda assim,
reconheço a importância crucial e inegável de discutir essas questões.
Preparei-me para apresentar a série Bastidores (1997), de Rosana Paulino,
tanto pela relevância de sua obra quanto por sua trajetória como artista. Paulino,
uma artista multimidiática, explora questões relacionadas a raça e gênero, refletindo
sobre a representação e a construção do imaginário em torno da mulher negra,
assim como a violência dirigida à população negra. Suas obras mesclam reflexões
críticas entre sua vivência pessoal e a dimensão coletiva dessas experiências.
A série Bastidores consiste em seis fotografias de mulheres negras,
reproduzidas sobre tecidos e enquadradas em bastidores de costura em formato
tondo. Sobre essas imagens, Paulino aplica costuras agressivas que atravessam
bocas, olhos e gargantas, criando uma metáfora visual contundente para o
silenciamento imposto às mulheres negras na sociedade brasileira. Essa obra
denuncia as marcas históricas de opressão, ao mesmo tempo em que resgata e
reafirma a humanidade e a resistência dessas mulheres.
Essa série foi inicialmente escolhida para encerrar minha sequência didática,
mas, com o desenrolar das aulas, percebi que ela estava perdendo o sentido no
contexto específico da turma. Esse processo me levou a repensar minhas escolhas
e, nesse movimento, encontrei a obra Encruzilhadas (2021), de Maxwell Alexandre.
Essa instalação é composta por 14 piscinas Capri de diferentes dimensões,
concebidas para ocupar o pátio do Paço Imperial, no Rio de Janeiro, durante a
exposição dos vencedores do Prêmio Pipa, em novembro de 2021. Nos últimos dias
da exposição, um grupo de jovens negros ocupou as piscinas para se banhar, o que
gerou estranhamento e atrito com os seguranças do local29.
No entanto, minha escolha por essa obra não se baseia nesse episódio de
conflito. O que realmente me interessa é o que aconteceu em fevereiro de 2023,
quando Maxwell Alexandre reinstalou Encruzilhadas no Morro do Santo Amaro, e
organizou o evento Descoloração Global Pré-Carnaval. Nesse contexto, as piscinas
passaram a ser usadas pela comunidade local em um ambiente de festa: churrasco,
música e a descoloração dos cabelos se uniram em uma celebração coletiva, uma
29 Para mais informações sobre o ocorrido, consulte o post publicado pelo artista em seu perfil no
Instagram, veja mais em:
.
https://www.instagram.com/p/CWi0tdgjCQQ/?utm_source=ig_web_copy_link&igsh=MzRlODBiNWFlZA==
https://www.instagram.com/p/CWi0tdgjCQQ/?utm_source=ig_web_copy_link&igsh=MzRlODBiNWFlZA==
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preparação para uma festa maior, que estaria por vir nos próximos dias. Esse
deslocamento da obra para a favela transformou seu significado, dando-lhe uma
dimensão profundamente conectada ao cotidiano, às dinâmicas sociais e culturais
da periferia.
Essa transição do espaço institucional da arte contemporânea para o
ambiente da favela revela uma crítica incisiva às barreiras que frequentemente
afastam a arte das pessoas para quem ela poderia ter maior e mais profundo
impacto. No Paço Imperial, Encruzilhadas era parte do circuito oficial da arte
contemporânea, restrito a um público que, em sua maioria, está desconectado das
vivências representadas pela obra. Nesse contexto, ela acabava por reforçar o
caráter autossuficiente e autorreferencial comum do mundo da arte, em que a obra é
contemplada à distância, delimitada por uma fita crepe no chão que separa
espectador e objeto. Por outro lado, ao ser instalada no Morro do Santo Amaro, a
obra se transforma em um elemento dinâmico e integrado à comunidade. Esse
deslocamento rompe com a noção de arte como algo intocável e distante,
trazendo-a para a vivência coletiva e cotidiana. Dessa forma, Encruzilhadas não
apenas muda de espaço, mas também de propósito e significado, tornando-se uma
experiência participativa que desafia as fronteiras tradicionais do que é considerado
"arte legítima".
Esse gesto de Maxwell Alexandre ressignifica a obra ao enfatizar que seu
valor não está apenas na visualidade ou na instalação em si, mas na interação com
as pessoas que ela envolve. As piscinas deixam de ser apenas um símbolo e se
tornam parte ativa de um cotidiano que celebra a resistência, a alegria e a
coletividade. Esse deslocamento também desafia as hierarquias implícitas no mundo
da arte, demonstrando que o contexto e a participação são tão fundamentais quanto
a própria obra. Assim, Encruzilhadas ganha potência e autenticidade ao habitar um
espaço onde a arte pode, de fato, transformar e dialogar com a realidade de quem
vive essas encruzilhadas diariamente.
40
4. Conclusões ????
Por quê?
Por que criar?
Por que dedicar horas, dias ou até anos a processos que culminam em algo
que pode ser reduzido a um simples objeto? Essa é uma pergunta que transcende a
superfície da arte, tocando o cerne de sua existência.
Não seria mais fácil Jacques Louis-David escrever uma carta ao governo
francês, pedindo o fim de seu exílio? Ou para Frida, escrever em um diário sobre
seus questionamentos sobre sua identidade e origens? Ou a Parayzo, fazer uma
aula de defesa pessoal, Bourgeois, fazer uma sessão de terapia? Rosana Paulino e
Maxwell Alexandre fundarem ONGs focadas na população negra brasileira, quem
sabe até se tornarem políticos para promover mudanças concretas no país?
Afinal, se simplificarmos as coisas ao extremo, todas essas obras são apenas
coisas. A Intervenção das Sabinas é apenas mais um retrato de uma cena cuja
veracidade histórica é incerta, uma representação de uma lenda sobre a formação
de Roma. As Duas Fridas não passa de tinta a óleo sobre algodão. As obras de
Parayzo são apenas alumínio polido. A aranha gigante de Bourgeois é apenas uma
aranha gigante, ou, como um aluno a quem apliquei a sequência didática descreveu,
um poste em forma de aranha. Maxwell Alexandre compra piscinas e as enche de
água. E qual, afinal, é a diferença entre os bordados de Paulino e os bordados de
um pano de prato?
Por que o ser humano insiste em criar artisticamente?
A Odisseia (2011), um dos principais poemas épicos da Antiguidade Clássica,
é tradicionalmente atribuída a Homero e foi composta entre 750-650 a.C. A obra
narra a longa e atribulada jornada de Odisseu de volta à sua terra natal, Ítaca, após
ter passado dez anos lutando na Guerra de Tróia. Essa odisseia se estende por
mais de uma década, e é repleta de desafios e provações, que testam a astúcia e a
resistência do herói.
EPIC: The Musical é uma reinterpretação moderna dessa narrativa clássica,
criada por Jorge Rivera-Herrans originalmente como parte de sua Tese final para a
Universidade de Notre Dame. O projeto é classificado como um musical conceito,
pois ainda não foi encenado como uma produção teatral ou cinematográfica. À
medida que o musical evolui, Rivera-Herrans continua lançando novas músicas,
41
todas acompanhadas de animações digitais por diferentes artistas disponíveis no
YouTube. Além disso, Jorge documenta e compartilha amplamente seu processo
criativo nas redes sociais, oferecendo uma visão detalhada da concepção do
musical. Ele aborda a escrita e reescrita das canções, a produção das animações,
as audições para as personagens e a escolha de instrumentais. No entanto, mesmo
com tanta documentação, Jorge não menciona explicitamente por que escolheu
reinterpretar uma narrativa milenar.
Essa escolha, contudo, reflete algo intrínseco ao ato de criar. Reinterpretar a
Odisseia é, por si só, um diálogo com o passado, uma forma de revisitar uma história
que ressoa através dos tempos e traduzi-la para um público contemporâneo. A
criação, em qualquer forma, transcende a funcionalidade ou a praticidade. É um
esforço para expressar o que não pode ser articulado plenamente por meio das
palavras ou das ações cotidianas.
Criar é um ato de resistência — resistência contra o esquecimento, contra o
conformismo e contra as limitações impostas pelas realidades imediatas. A arte não
muda leis diretamente, não resolve desigualdades com ações concretas, mas ela
questiona, inquieta e propõe novas formas de ver e pensar o mundo. No caso de
EPIC, a escolha de Rivera-Herrans pode ser vista como um esforço para tornar uma
narrativa antiga e distante relevante para o presente, mostrando que as lutas,
dilemas e conquistas humanas continuam a reverberar em novas formas e
contextos. Assim, o ato de criar não apenas reinterpreta o passado, mas também
constrói pontes para o futuro, propondo novas formas de pensar, sentir e existir.
A condição para isso por certo muda historicamente, mudou historicamente.
Hoje, é bem provável que as questões de representação – e a defesa da arte
enquanto esfera isolada das dinâmicas mais contingentes da cultura e do cotidiano –
que alimentaram o debate da arte do século XX precisem ser revistas; do mesmo
modo que EPIC revisa a tradição grega. Talvez o que ocorra – e este é o cerne da
discussão aqui proposta – seja que aqueles pares de oposição que fomentaram
discussões fortes ao longo do século XX (arte/cultura; cultura comercial/alta cultura;
vanguarda/kitsch; arte/indústria cultural; espaço do museu/espaço da vida;
instituição/cotidiano; arte analógica/mundo digital; mictório no banheiro/mictório no
museu…) reclamam hoje uma profunda revisão de sua pertinência – e uma
indagação mais certeira acerca de se se tratam de fato de pares de oposição, ou
faces de um mesmo fenômeno –, isto que este trabalho apenas arrisca elaborar.
42
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