UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” Campus de Presidente Prudente Programa de Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional (PROFMAT) CRISTIANE BARCELLA SILVA PRESIDENTE PRUDENTE 2016 INTRODUÇÃO A ÁLGEBRA NO ENSINO FUNDAMENTAL – O “X” DA QUESTÃO CRISTIANE BARCELLA SILVA Dissertação apresentada como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre, junto ao Programa de Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional, do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Presidente Prudente. Orientadora: Prof.ª Drª Cristiane Nespoli Morelato França PRESIDENTE PRUDENTE 2016 INTRODUÇÃO A ÁLGEBRA NO ENSINO FUNDAMENTAL – O “X” DA QUESTÃO Silva, Cristiane Barcella. Introdução a álgebra no ensino fundamental : o x da questão / Cristiane Barcella Silva. -- São José do Rio Preto, 2016 70 f. ; il. Orientador: Cristiane Nespoli Morelato França Dissertação (mestrado profissional) - Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas 1. Matemática (Ensino fundamental) - Estudo e ensino. 2. Álgebra - Estudo e ensino. 3. Aprendizagem baseada em problemas. 4. Matemática – Metodologia. I. França, Cristiane Nespoli Morelato. II. Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho". Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas. III. Título. CDU – 512(07) Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca do IBILCE UNESP - Câmpus de São José do Rio Preto Cristiane Barcella Silva Introdução a Álgebra no Ensino Fundamenta - o “X” da questão Dissertação apresentada como parte dos requisitos para obtenção do título de Mestre, junto ao Programa de Mestrado Profissional em Matemática em Rede Nacional, do Instituto de Biociências, Letras e Ciências Exatas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Presidente Prudente. Comissão Examinadora Profª. Drª. Cristiane Nespoli Morelato França UNESP – Presidente Prudente Orientador Prof. Dr. Enio Garbelini UNIFADRA – Dracena Prof. Dr. Aylton Pagamisse UNESP – Presidente Prudente Presidente Prudente 29 de janeiro de 2016 Dedico este trabalho a vocês que sempre me fizeram acreditar na realização dos meus sonhos e trabalharam muito para que eu pudesse realizá-los, meus pais, Fátima e Juarez. Ao meu noivo Felipe, por ter permanecido ao meu lado, me incentivando a percorrer este caminho, por seu apoio e carinho inabaláveis. AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus, por me amparar nos momentos difíceis, me dar força interior para superar as dificuldades, mostrar os caminhos nas horas incertas, por me suprir em todas as minhas necessidades, por ter colocado pessoas tão especiais a meu lado, sem as quais certamente não teria dado conta! O que seria de mim sem a fé que tenho nEle. Aos meus pais Fátima e Juarez. Mãe seus cuidados e sua dedicação me deram, em alguns momentos, a esperança e a força para seguir, pai sua presença e seu ombro amigo nos momentos de angustia e dificuldade me trouxeram segurança e certeza de que tudo daria certo, obrigada pelo amor, apoio e incentivo incondicional. Ao meu irmão Bruno, que também desempenha a função de um grande amigo, obrigado por acreditar em mim quando muitas vezes nem eu mesma sou capaz, sei que sempre posso contar com você. Ao meu noivo Felipe, que em alguns dias será promovido a esposo, meu melhor amigo, meu companheiro, que ficou sempre ao meu lado, mesmo quando nem eu mesma me aguentava, me pondo pra cima e me fazendo acreditar que posso mais que imagino, sempre com seu jeito calmo e sua paciência qualidades que lhe transbordam e que na maioria das vezes me faltam, meu amor você me completa. Sem seus cuidados, incentivo, força, carinho, dedicação, paciência, compreensão e amor não teria chegado até aqui. Obrigado por ter feito do meu sonho o nosso sonho. Aos meus demais familiares, em especial meus tios Cido e Marlene que me tem como filha, e meus primos Alexandre e Tiago que considero meus irmãos, sei que comemoram minhas conquistas tanto quanto os da minha casa. A minha orientadora, Prof.ª Dr.ª Cristiane, não só pelo emprenho dedicado à elaboração deste trabalho, mas também por sua amizade, paciência, ensinamentos e compreensão. A Drª. Maria Raquel Miotto Morelatti, que nos ajudou e se fez presente em muitas das reuniões de orientação, sem sua ajuda e orientação esse trabalho não seria possível. Aos meus colegas da turma de mestrado, pela oportunidade de dividirmos durante esse período nossos conhecimentos, alegrias, angustias e desabafos. Aos professores do programa de mestrado por compartilharem seus conhecimentos por meio de suas aulas. Ao Profmat, pela oportunidade. À CAPES, pelo apoio financeiro Ninguém vence sozinho, OBRIGADA A TODOS! “Talvez não tenha conseguido fazer o melhor, mas lutei para que o melhor fosse feito. Não sou o que deveria ser, mas Graças a Deus, não sou o que era antes”. (Marthin Luther King) RESUMO Apesar de ocupar parte considerável do currículo escolar do Ensino Fundamental e Médio, a Álgebra tem sido a grande vilã no Ensino da Matemática. Os resultados do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB) mostram que raramente os itens referentes a Álgebra atingem um índice de 40% de acerto em muitas regiões do Brasil. É frequente a reclamação dos alunos diante de exercícios nos quais as variáveis e as incógnitas se fazem presentes, sempre questionando o porquê de misturar números com letras. O objetivo desse trabalho é colaborar com os professores de Matemática, principalmente do Ensino Fundamental, em especial aqueles que lecionam nos 7º anos, momento em que tradicionalmente se dá a introdução da Álgebra no Brasil. Nosso primeiro passo no desenvolvimento desse trabalho consistiu no levantamento de referenciais teóricos, através dos quais buscamos entender as dificuldades encontradas no ensino da Álgebra. Na sequência, realizamos um estudo sobre as diferentes concepções da Álgebra, segundo Usiskin (1995) e os PCNs (1998), permitindo uma melhor compreensão sobre os vários usos das “letras” no estudo dessa área. Este cenário nos permitiu identificar que um dos principais problemas no ensino da Álgebra está em tornar a linguagem algébrica significativa para o aluno, nos levando a explorar as possibilidades e os benefícios da sua introdução através da exploração de padrões e regularidades. Tal exploração tem como objetivo promover o desenvolvimento do pensamento algébrico, a capacidade de generalização e a compreensão da linguagem algébrica. Finalmente, como resultado apresentamos uma sugestão de sequência didática, composta de atividades elaboradas a partir de determinados padrões de regularidades, que podem auxiliar o professor na introdução da Álgebra e auxiliar o aluno no desenvolvimento do pensamento e da linguagem algébricos. Palavras-chave: matemática, atividades, padrões, ensino, pensamento algébrico ABSTRACT Despite occupying a considerable part of the Brazilian Elementary and High School Curriculum, Algebra has been the great villain in Mathematics teaching. The results of the National System of Basic Education Evaluation (SAEB) show that rarely items related to Algebra reach a success rate of 40 percent in many Brazilian regions.The students complaints often involve exercises containing variables and unknown constants, always questioning why to mix “numbers” with “letters”. The aim of this work is to collaborate with Mathematics teachers, mainly of primary education who teach at seventh year, when traditionally the Algebra is introduced in Brazil. Our first step was prepair a survey of theoretical references that allowed us to understand the difficulties associated with Algebra teaching. After we developed a study of the different conceptions of Algebra, according Usiskin (1995) and National Curriculum Parameters (PCN 1998), seeking a better understanding of the several uses for the “letters” in this study area. This scenario allowed us to identify one of the main problems in Algebra teaching that is to become significant for the studentes the algebraic language, leading us to explore the possibilities and benefits of introducing the Algebra through the exploration of patterns and regularities. Such exploration aims to promote the development of algebraic thinking, the ability to generalize and the understanding of algebraic language. As a final result we suggested a didatic sequence composed by activities developed from some regularities patterns that can help the teacher in the algebra introduction and assist students at the development of algebraic thinking and language. Keywords: math, activities, patterns, Algebra teaching, Algebraic thinking LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Diferentes interpretações da álgebra escolar e diferentes funções das letras ........................................................................................................................ 28 Figura 2 – Mosaico geométrico ................................................................................ 31 Figura 3 – Blusa com padrão em sua estampa ......................................................... 32 Figura 4 – Papel de parede ....................................................................................... 32 Figura 5 – Livro da coordenação do sistema de ensino analisado, programação anual do 7ºano – 1º ao 4º, p. 9 .................................................................................. 40 Figura 6 – Livro da coordenação do sistema de ensino analisado, programação anual do 7ºano – 1º ao 4º, p. 10 ................................................................................ 41 Figura 7: Enunciado da primeira atividade da unidade 8, p. 38 ................................ 45 Figura 8: Enunciado da primeira atividade da unidade 8 itens a e b, p. 38 ............... 45 Figura 9: Enunciado da primeira atividade da unidade 8 itens c, p. 39 ..................... 46 Figura 10: Enunciado da primeira atividade da unidade 8 itens d (p. 39) .................. 46 Figura 11: Enunciado da primeira atividade da unidade 8 itens e e f (p. 39) ............. 47 Figura 12: Diferença entre expressões numéricas e expressões algébricas, p. 39 ... 47 Figura 13: Exercício 07 proposto na seção aplicando conhecimentos, p. 44 ............ 48 Figura 14: Exercício 10 proposto na seção aplicando conhecimentos, p. 45 ............ 49 Figura 15: Exercício 02 proposto na seção usando números e letras, p. 47 ............. 49 Figura 16: Mapa de percurso .................................................................................... 53 Figura 17 - Relação entre diversos tipos de tarefas, em termos do seu grau de desafio e de abertura. .............................................................................................. 54 LISTA DE TABELAS Tabela 1 – Concepções e uso das variáveis ............................................................. 24 Tabela 2 – Comparativo entre as Concepções de Usiskin (1995) e as Dimensões de BRASIL (1998) .......................................................................................................... 29 Tabela 3 – Classificação das atividades do analisado – 7º ano – Volume 2 – Unidade 8 quanto as concepções da álgebra. ......................................................................... 44 13 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 15 2 AS DIFICULDADES ENCONTRADAS NO ENSINO DA ÁLGEBRA .................... 19 3 AS CONCEPÇÕES DA ÁLGEBRA ....................................................................... 23 3.1 AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE ÁLGEBRA SEGUNDO USISKIN (1994) .................. 23 3.1.1 A ÁLGEBRA COMO ARITMÉTICA GENERALIZADA ................................................... 24 3.1.2 ÁLGEBRA COMO ESTUDO DE PROCEDIMENTOS PARA RESOLVER CERTOS TIPOS DE PROBLEMA ............................................................................................................... 25 3.1.3 A ÁLGEBRA COMO ESTUDO DE RELAÇÕES ENTRE GRANDEZAS ............................. 26 3.1.4 A ÁLGEBRA COMO ESTUDO DAS ESTRUTURAS .................................................... 26 3.2 UM COMPARATIVO ENTRE AS CONCEPÇÕES DA ÁLGEBRA DE USISKIN (1995) E AS DIFERENTES INTERPRETAÇÕES DA ÁLGEBRA ESCOLAR E AS DIFERENTES FUNÇÕES DAS LETRAS DE ACORDO COM OS PCNS (BRASIL, 1998) .................................................. 27 4 PADRÕES E GENERALIZAÇÕES NO ENSINO DE ÁLGEBRA .......................... 31 4.1 CONCEITO DE PADRÃO ....................................................................................... 31 4.1 PADRÕES E GENERALIZAÇÕES E A ÁLGEBRA ......................................................... 33 5 ANÁLISE DO ASPECTO ALGÉBRICO DO MATERIAL DIDÁTICO DE UM SISTEMA DE ENSINO QUANTO A INTRODUÇÃO DA ÁLGEBRA NO 7° ANO. ... 37 5.1 CARACTERIZAÇÃO DA OBRA ................................................................................ 39 5.2 ANÁLISE DA ABORDAGEM ALGÉBRICA NA OBRA ...................................................... 42 6 UMA PROPOSTA DE SEQUÊNCIA DE ATIVIDADES COM USO DE PADRÕES E GENERALIZAÇÕES PARA INTRODUÇÃO DA ÁLGEBRA .................................... 52 6.1 SEQUÊNCIA DIDÁTICA .......................................................................................... 55 14 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 66 8 REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 68 15 1 INTRODUÇÃO Quando comecei minha trajetória como professora de Matemática, lecionando nas escolas estaduais e também na rede municipal, durante meu segundo ano de graduação em Licenciatura em Matemática pela FCT/UNESP no ano de 2007, observei que era habitual a ocorrência do seguinte comentário feito pelos alunos “Eu até gostava de Matemática professora, e era bom, mas depois que começou com esse negócio de números misturados com letras...aí não entendi mais nada”. Desde então, observo que essa fala continua recorrente em minha carreira profissional. Nos últimos anos, tenho trabalhado com anos finais do Ensino Fundamental (8° e 9° ano), e a reclamação dos alunos com relação às unidades de Álgebra presentes na apostila continua a mesma. Este fato me levou a questionar o porquê de tanta dificuldade em aprender Álgebra, uma vez que, particularmente, sempre tive maior dificuldade com Geometria, tanto em meus anos como aluna do Ensino Básico, como quando aluna na Graduação. Neste contexto, a primeira pergunta que se impõe é por que de tantas barreiras e dificuldades com o uso da simbologia em algumas resoluções de problemas? A Álgebra ocupa parte considerável do currículo escolar do Ensino Fundamental e Médio, com a quantidade de carga horária dedicada a ela o comum seria esperar bons resultados no processo ensino-aprendizagem dessa área da Matemática. No entanto, de acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), a ênfase que os professores dão ao ensino da Álgebra não está garantindo o sucesso dos alunos, a julgar pelas pesquisas em Educação Matemática e também pelo desempenho dos alunos nas avaliações que têm ocorrido em muitas escolas. De 16 acordo com os PCNs, os resultados do Sistema Nacional de Avalição da Educação Básica (SAEB) mostram que raramente os itens referentes a Álgebra atingem um índice de 40% de acerto em muitas regiões do país. Diante desse cenário, da experiência acumulada com os anos de magistério, das reclamações recorrentes por parte dos alunos, das angústias dos professores, dentre os quais me incluo, e dos resultados insatisfatórios envolvendo o ensino de Álgebra, surgiu a motivação para estudar este tema durante a realização do Mestrado Profissionalizante em Matemática. Tradicionalmente, no Brasil, o ensino da Álgebra tem início no sétimo ano do Ensino Fundamental (regime de nove anos), quando as letras são apresentadas com a função de representar valores que, de início, são desconhecidos e que por meio de relações determinadas, em função do problema apresentado, podem ser encontrados. Nesta fase, surge uma nova linguagem que busca traduzir em símbolos matemáticos ideias da forma “um certo número”. Acreditamos que um dos maiores desafios no ensino da Álgebra seja justamente tornar essa linguagem algébrica significativa para o aluno, visto que muitos não compreendem o verdadeiro significado da incógnita presente nas generalizações e equações estudadas ao longo da vida escolar. Ou seja, observamos que o aluno não consegue verdadeiramente se apropriar da linguagem algébrica. De certa forma podemos dizer que nossos alunos sofrem de “analfabetismo algébrico”. O fato dos alunos não compreenderem a junção de letras com números leva os mesmos a procurarem caminhos mecanizados para a resolução de exercícios, fazendo com que assim, após a resolução de vários exercícios, acabem executando cálculos mecanicamente sem sentido, apenas na busca de uma resposta plausível. De fato, para reverter este processo, uma das recomendações dos pesquisadores em Educação Matemática e também uma orientação dos PCNs é trabalhar a Álgebra em sala de aula da seguinte forma: [...] para que a aprendizagem possa ser significativa é preciso que os conteúdos sejam analisados e abordados de modo a formarem uma rede de significados. Se a premissa de que compreender é apreender o significado, e de que para apreender o significado de algum objeto ou acontecimento é 17 preciso vê-lo em suas relações com outros objetos ou acontecimentos, é possível dizer a ideia de conhecer assemelha-se a ideia de tecer uma teia. (BRASIL, 1998, p. 75) Por sua vez, também acreditamos que além de se apropriar da linguagem algébrica, é preciso que o aluno desenvolva o chamado pensamento algébrico. Os adolescentes desenvolvem de forma significativa a habilidade de pensar “abstratamente”, se lhes forem proporcionadas experiências variadas envolvendo noções algébricas, a partir dos ciclos iniciais, de modo informal, em um trabalho articulado com a aritmética. Assim, os alunos adquirem base para uma aprendizagem de álgebra mais sólida e rica em significados. (BRASIL, 1998, p.117) De acordo com Fiorentini et al. (2005), a apropriação da linguagem pode potencializar e promover o desenvolvimento do pensamento algébrico mas, a linguagem não necessariamente antecede o pensamento. Para ele, a iniciação ao desenvolvimento do pensamento algébrico, pode ocorrer já desde os primeiros anos de escolarização. Segundo o educador matemático Ken Milton (1989) "aquilo que ensinamos em aritmética e a forma como a ensinamos têm fortes implicações para o desenvolvimento do pensamento algébrico". Por meio deste trabalho procuramos investigar como introduzir a Álgebra no Ensino Fundamental de forma expressiva, clara e significativa para o aluno, colaborando para o desenvolvimento do pensamento e da linguagem algébricos. Mais especificamente, através da leitura reflexiva de artigos e livros que tratam das dificuldades dos alunos relacionadas à Álgebra e de diferentes abordagens e concepções do ensino da Álgebra no Ensino Fundamental, exploramos as possibilidades e os benefícios da introdução da Álgebra através da exploração de padrões e regularidades e organizamos uma sugestão de sequência didática1 1 Uma sequência didática pode ser definida como: “conjunto de atividades, estratégias e intervenções planejadas etapa por etapa pelo docente para que o entendimento do conteúdo ou tema proposto seja alcançado pelos discentes” (KOBASHIGAWA et al., 2008). 18 composta de atividades elaboradas a partir de padrões de regularidades que podem auxiliar ao professor na introdução da Álgebra e auxiliar o aluno no desenvolvimento do pensamento e linguagem algébricos. Com o intuito de demonstrar como essa proposta de sequência didática foi elaborada, no segundo capítulo apresentamos um levantamento das dificuldades relacionadas ao ensino da Álgebra, considerando os levantamentos com base no livro intitulado “As ideias da Álgebra”, organizado por Arthur F. Coxford e Albert P. Shult (1995), que traz uma coletânea de artigos dos mais eminentes especialistas da área. No terceiro capitulo tratamos das diferentes concepções da Álgebra e a relação com os diferentes usos das variáveis segundo Usiskin (1995) e Brasil (1998). No quarto capitulo buscamos definir o conceito de padrão e justificar como a utilização de padrões e generalizações pode tornar a Álgebra mais significativa para o aluno, desenvolvendo seu pensamento algébrico e introduzindo a escrita algébrica de forma menos dolorosa. Apresentamos então no quinto capítulo uma análise do material didático adotado pela rede municipal de educação de uma cidade do interior de São Paulo nos últimos quatro anos. Essa análise foi realizada quanto a forma que ocorre a introdução a Álgebra, quanto as concepções apresentadas no terceiro capitulo, a linguagem algébrica e ao objetivo das atividades propostas. Por sua vez, no sexto capitulo disponibilizamos o mapa de percurso e uma proposta de sequência didática para introdução da Álgebra, composta de atividades voltadas a generalizações de padrões. 19 2 AS DIFICULDADES ENCONTRADAS NO ENSINO DA ÁLGEBRA Os PCNs de Matemática (Brasil, 1998) trazem diferentes interpretações da Álgebra, sendo elas: Aritmética Generalizada, Funcional, Equações e Estrutural. Segundo o Dicionário Michaelis (2004), a Álgebra é a parte da Matemática que ensina a calcular, generalizando e simplificando as questões aritméticas, por meio de letras do alfabeto. A Álgebra escolar ocupa um lugar de destaque no currículo de matemática, e mesmo assim é uma das áreas de estudo onde os alunos tendem a encontrar maior dificuldade de aprendizagem. A introdução no ensino da Álgebra costuma se dar entre o sétimo e nono ano do Ensino Fundamental (regime de nove anos) e tem sido motivo de muitas pesquisas, dada as dificuldades de aprendizagem encontradas pelos alunos e a angústia que leva muitos professores a buscar metodologias e práticas que facilitem a aprendizagem de tal conteúdo. Imenes (1994) em “O currículo tradicional e o problema: um descompasso” retratam bem a situação do ensino da Álgebra e reconhecem a problemática no processo de ensino-aprendizagem: Professores e alunos sofrem com a álgebra da 7ª série. Uns tentando explicar outros tentando engolir técnica de cálculo com letras que, quase sempre, são desprovidas de significados para uns e outros. Mesmo nas tais escolas de excelência, onde aparentemente os alunos da 7ª série dominam todas as 20 técnicas, esse esforço tem pouco resultado. (IMENES, L. M., 1994, p. 2) Mas por que é difícil aprender Álgebra? De acordo com Booth (1995) umas das maneiras de encontrar o que torna a Álgebra difícil é identificar os tipos de erros que os alunos cometem com mais frequência e analisar as razões desses erros. Em um estudo realizado entre 1980 e 1983 no Reino Unido com alunos de treze a dezesseis anos, Booth (1995) verificou erros semelhantes em todas as séries, além disso as entrevistas realizadas com esses alunos mostraram que os erros podiam ser consequência de suas ideias sobre aspectos como: a) O foco da atividade algébrica e a natureza das “respostas”: Muitos alunos não “aceitam” expressões algébricas como resposta, como no caso de exercícios de generalização, ou seja, têm dificuldade em “aceitar a ausência de fechamento” (Collins, 1975), o aluno acredita que o exercício só está finalizado quando ele encontra uma solução numérica, como ocorria na aritmética. b) O uso da notação e da convenção em Álgebra: Em aritmética, símbolos como + e = são interpretados geralmente em termos de ações a serem efetuadas, de maneira que + significa efetivamente realizar a operação, e = significa escrever a resposta, os alunos tendem a considerar o sinal de igual (=) como um símbolo unidirecional, e que após ele deve existir uma resposta numérica. c) O significado das letras e das variáveis: A necessidade do aluno em assimilar a letra presente na equação com um valor numérico, alguns acabam fazendo associações com sua posição no alfabeto (a = 1, b = 2, c = 3..., z = 26) ou com objetos que se iniciam com a letra em questão (8b então 8 bananas) ou ainda que letras diferentes representam valores diferentes, ou seja, se x é igual a 5, de maneira alguma x poderá assumir o valor 6. d) Os tipos de relações e métodos usados em Aritmética: A Álgebra não é isolada na Aritmética, na verdade a Álgebra é, em muitos aspectos, a “aritmética generalizada”. Para compreender a generalização das 21 relações e procedimentos aritméticos é preciso primeiro que tais relações e procedimentos sejam apreendidos dentro do contexto aritmético. Esses aspectos nos levam a refletir a forma como a Aritmética vem sendo ensinada, e ao significado que o aluno tem de operações básicas como 5 + 2. Se ao ensinar a adição passarmos a ideia que para 5 + 2 basta somar 5 com 2 e pronto, e não trabalharmos o significado do valor encontrado, no caso 7, como “o número que é 2 mais que 5”, ficará ainda mais abstrato para o aluno entender que y + 2 pode representar sim um valor numérico, ou seja “um número que excede em 2 o valor de y”. Diante deste contexto, para tornarmos a Álgebra significativa para o aluno, primeiramente devemos tornar a Aritmética mais significativa do que apenas cálculos, fazendo com que a introdução à Álgebra ocorra com mais facilidade. Os PCNs de Matemática trazem orientações a esse respeito mencionando que “é fundamental a proposição de situações-problema que possibilitem o desenvolvimento do sentido numérico e os significados das operações” (Brasil, 1998, p. 66). As dificuldades encontradas no processo de ensino-aprendizagem de Álgebra, por partes dos alunos se dá muitas vezes pela falta de aplicações reais aos conceitos apresentados. Tornar a Álgebra mais significativa é um passo determinante para que a mesma venha a ser de fato compreendida pelo aluno e deixe de ser esquecida ano a ano da vida escolar do mesmo, como vem ocorrendo com a maioria. O fato do conteúdo não ter significado para o aluno faz com que o mesmo não se aproprie de fato dele, mas sim que mecanize procedimentos para resolver exercícios. Assim, à medida que tais exercícios deixam de ser exigidos, tais procedimentos acabam parecendo desnecessários e por fim são deixados para trás, pois para o aluno o único objetivo é resolver exercícios propostos em sala de aula pelo professor e atingir a nota exigida na avaliação. O fato do aluno não conseguir assimilar o uso da Álgebra em seu dia a dia desmotiva e gera desinteresse com relação a esse conteúdo. Por fim, observamos que a educação algébrica deve promover o desenvolvimento do pensamento algébrico, proporcionando assim ao educando a possibilidade da construção da linguagem algébrica, assegurando assim o domínio e 22 a compreensão das diversas concepções da álgebra, conforme descritas no capítulo a seguir. 23 3 AS CONCEPÇÕES DA ÁLGEBRA O que é Álgebra? De acordo com Usiskin (1995, pag. 9) “não é fácil definir a Álgebra”, isso ocorre pelo fato da Álgebra escolar ter uma acepção diferente da Álgebra do Ensino Superior. A seguir faremos um breve estudo sobre as diferentes concepções de Usiskin (1995) sobre a Álgebra e as diferentes interpretações da Álgebra escolar de acordo com os PCNs de Matemática (BRASIL, 1998). 3.1 As Diferentes Concepções de Álgebra segundo Usiskin (1994) Um dos autores que se dedicou à investigação das concepções de Álgebra foi Zalman Usiskin, em seu artigo “Concepções sobre a Álgebra da escola média e utilização das variáveis” ele lista quatro concepções a respeito da Educação Algébrica, conforme seguem: 24 Tabela 1 – Concepções e uso das variáveis Concepções da álgebra Uso das variáveis Aritmética generalizada Generalizadoras de modelos (traduzir, generalizar) Meio de resolver certos problemas Incógnitas, constantes (resolver, simplificar) Estudo de relações Argumentos, parâmetros (relacionar, gráficos) Estrutura Sinais arbitrários no papel (manipular, justificar) Fonte: USISKIN, 1995, p. 20 3.1.1 A Álgebra como aritmética generalizada Essa concepção da Álgebra têm as variáveis como generalizadoras de modelos, como o próprio nome já sugere. Segundo o autor dentro dessa concepção as instruções-chave são traduzir e generalizar, e essas técnicas são importantes tanto para álgebra quanto para a aritmética. Dentro dessa concepção podemos ampliar ideias da Aritmética. Tomemos o seguinte exemplo: O recorde Mundial T (em segundos) para a prova de uma milha no ano Y, desde 1900, pode ser descrito com bastante proximidade pela equação T = -0,4Y + 1020. Essa equação generaliza foi usada por Usiskin para prever o recorde 25 em 1985. 3.1.2 Álgebra como estudo de procedimentos para resolver certos tipos de problema De acordo com essa concepção de Álgebra, diferente da primeira, as variáveis são incógnitas ou constantes. Talvez esses venham a ser os papeis mais comuns empenhados pelas variáveis durante as aulas de matemática no Ensino Básico. Na concepção da Álgebra como generalizadora fazemos uma tradução da Aritmética para a Álgebra, ou seja, encontramos um modelo geral da situação apresentada. Porém de acordo com a concepção da Álgebra como estudo de procedimentos para resolver problemas isso não basta, a tradução se resume apenas ao início. Adotemos a equação abaixo como exemplo: 2x + 5 = 17. Os alunos podem seguir diferentes caminhos para solucioná-la, mesmo assim se os procedimentos forem feitos de maneira correta o resultado encontrado será x = 6. Um dos problemas que podem ocorrer na resolução dessa equação se relaciona com a passagem da Aritmética para a Álgebra. Enquanto a resolução aritmética consiste em subtrair 5 e dividir por 2, a algébrica depende exatamente do contrário, multiplicar por 2 e somar 5. Nessa concepção as instruções-chave são simplificar e resolver. 26 3.1.3 A Álgebra como estudo de relações entre grandezas Nessa concepção a variável pode ser um argumento, isto é, representa valores do domínio de função, ou um parâmetro, representando um número do qual dependem outros números. Neste caso não temos a sensação de estar lidando com uma incógnita, pois não estamos resolvendo nada, diferente da concepção anterior, na concepção da Álgebra como estudo de relação de grandezas as variáveis de fato variam. No caso da pergunta: O que ocorre com o valor de 1/x quando x se torna cada vez maior? A questão parece simples à primeira vista, afinal, basta ir tomando valores para x cada vez maiores, ou seja, x vai assumindo diferentes valores, no caso, sempre maiores que o valor anterior já assumido. Mas para o aluno, uma questão como essa pode se tornar motivo de grande confusão, já que não pedimos um valor para x, mas sim o comportamento de 1/x diante do crescimento de x. Portanto x não assume o papel de incógnita. Não pedimos para o aluno traduzir, e apesar de haver um modelo generalizado, não é um modelo que se pareça com a Aritmética. Nesse caso trata-se de um modelo fundamentalmente algébrico. 3.1.4 A Álgebra como estudo das estruturas No caso da concepção da álgebra como estudo das estruturas, Usiskin (1995, p. 18) afirma que: “[...] não se trata de nenhuma função ou relação; a variável não é um argumento. Não há equação alguma a ser resolvida, de modo que a variável não atua como uma incógnita. Também não há nenhum modelo aritmético a ser generalizado”. A Álgebra como estudo das estruturas pode ser reconhecida quando 27 aplicamos propriedades de simplificação que podem ser uteis ou não para resolver problemas algébricos, tais como equivalência entre equações e simplificação de polinômios. Um exemplo que cabe a essa concepção é: Determine o valor de a² - b², sabendo que a – b = -17 e a + b = 7. Nesse caso não queremos que o aluno encontre o valor de a e b, mas sim que as variáveis se tornem objetos arbitrários de uma estrutura estabelecida por certas propriedades. Logo, queremos que o aluno remeta à diferença de dois quadrados: a² - b² = (a + b)(a – b), encontrando assim, após a substituição necessária, a resposta a² - b² = 7. (-17) = -119. Outro exemplo pode ser encontrado ao pedir que o aluno simplifique uma expressão algébrica, como: 3�� + 3�� 6� nesse caso, se o aluno não souber distinguir uma equação de uma expressão algébrica o mesmo pode não aceitar �� + � 2 como solução, pois para ele o exercício só termina quando é encontrado um valor numérico para a incógnita presente, ou seja como já mencionado no Capitulo 2 o aluno tem dificuldade em “aceitar a ausência de fechamento”. 3.2 Um comparativo entre as Concepções da Álgebra de Usiskin (1995) e as diferentes interpretações da Álgebra escolar e as 28 diferentes funções das letras de acordo com os PCNs (BRASIL, 1998) Os PCNs Matemática (1998) visam a construção de um referencial que oriente a prática escolar de forma a contribuir para o acesso ao conhecimento matemático. É de fácil percepção a preocupação dos PCNs em garantir o desenvolvimento do pensamento algébrico. Para isso sugerem atividades que inter- relacionam diferentes concepções da Álgebra. O quadro a seguir (figura 1), mostra de forma clara e simplificada as diferentes interpretações da Álgebra escolar segundo os PCNs: Figura 1 - Diferentes interpretações da álgebra escolar e diferentes funções das letras Fonte: BRASIL, 1998, p.116 Podemos analisar frente do quadro acima as diferentes dimensões, segundo os PCNs, nas quais a Álgebra escolar pode ser dividida, ou seja, em aritmética generalizada, funcional, equações e estrutural. A anuência entre Usiskin (1995) e Brasil (1998) é nítida, conforme 29 podemos notar as concepções defendidas por Usiskin estão em conformidade com as dimensões da Álgebra estabelecidas pelos PCNs. Tabela 2 – Comparativo entre as Concepções de Usiskin (1995) e as Dimensões de BRASIL (1998) Usiskin (1995) Brasil (1998) Concepções da álgebra Uso das variáveis Dimensões da Álgebra Uso das Letras Aritmética generalizada Generalizadoras de modelos (traduzir, generalizar) Aritmética Generalizada Letras como generalização do modelo Aritmético Meio de resolver certos problemas Incógnitas, constantes (resolver, simplificar) Equações Letras como incógnitas Estudo de relações Argumentos, parâmetros (relacionar, gráficos) Funcional Letras como variáveis para expressar relações e funções Estrutura Sinais arbitrários no papel (manipular, justificar) Estrutural Letras como símbolos abstratos Fonte: Elaborada pelo autor Vale observar que a falta de conhecimento, tanto de professores quanto de alunos, sobre as várias concepções da Álgebra pode ser um dos motivos das frustrações dos nossos alunos com relação a essa área da matemática. Os PCNs afirmam: A noção de variável, de modo geral, não tem sido explorada no ensino fundamental e por isso muitos estudantes que concluem esse grau de 30 ensino (e também o médio) pensam que a letra em uma sentença algébrica serve sempre para indicar (ou encobrir) um valor desconhecido, ou seja, para eles a letra sempre significa uma incógnita. (BRASIL, 1998, p 118). 31 4 PADRÕES E GENERALIZAÇÕES NO ENSINO DE ÁLGEBRA 4.1 Conceito de Padrão Sempre que pensamos em padrões normalmente nos remetemos a padrões visuais, como mosaicos (figura 2), tecidos (figura 3), papeis de parede (figura 4), formas e cores, mas o conceito de padrão vai muito além desses exemplos. Figura 2 – Mosaico Geométrico 32 Figura 3 – Blusa com padrão em sua estampa Figura 4 – Papel de parede O ser humano sempre foi fascinado pela busca de regularidades, buscando explicar certas situações através de padrões. Podemos citar exemplos como a definição das quatro estações do ano, ao notar-se que a cada três meses o clima sofria mudanças, ou ainda a migração dos pássaros de tempos em tempos e até mesmo o ciclo menstrual de uma mulher em idade fértil, em todas essas situações apareceram visíveis padrões. Por sua vez, encontramos padrões em diversas áreas 33 de conhecimento, como na Física, na Biologia, na Arte etc. De acordo com Balmond (2000, p. 157), “A essência da Matemática consiste em procurar padrões. O nosso espírito parece estar estruturado para procurar relações e sucessões. Procuramos a ordem escondida”. Devlin (2002) considera a Matemática como a ciência dos padrões. Foi só nos últimos vinte anos, mais ou menos, que surgiu a definição de Matemática que é hoje consensual entre a maioria dos matemáticos: a Matemática é a ciência dos padrões. O que o matemático faz é examinar “padrões” abstratos – padrões numéricos, padrões de forma, padrões de movimento, padrões de comportamento, etc. Esses padrões tanto podem ser reais como imaginários, visuais ou mentais, estáticos ou dinâmicos, qualitativos ou quantitativos, puramente utilitários ou assumindo um interesse pouco mais que recreativo. Podem surgir a partir do mundo à nossa volta, das profundezas do espaço e do tempo, ou das atividades mais ocultas da mente humana. (DEVLIN, 2002, p.9) Para Vale et al. (2007, p. 2), “o conceito de padrão tem se revelado bastante fluido, com definições muito díspares, consoante à utilização que é pretendida”. 4.1 Padrões e Generalizações e a Álgebra Quando falamos em Álgebra automaticamente muitos acabam remetendo a expressões algébricas, a um conjunto de letras misturado com símbolos de operações, a uma fórmula, seja ela a fórmula de Bhaskára utilizada para resolver uma equação do segundo grau ou o Teorema de Pitágoras com o qual podemos encontrar a medida desconhecida de um dos lados de um triângulo retângulo conhecendo o valor dos outros dois lados. Ou seja, a Álgebra acaba sendo ligada ao desígnio de se encontrar um valor desconhecido, tendo a variável apenas como incógnita. Alguns ficariam admirados ao se deparar com uma Álgebra intuitiva que poderia ser explorada já nos anos iniciais do ensino da Matemática através do estudo de padrões, que podem levar o aluno a desenvolver o seu pensamento algébrico. 34 Segundo Brasil (1998): As atividades algébricas propostas no Ensino Fundamental devem possibilitar que os alunos construam seu conhecimento a partir de situações problema que confiram significados à linguagem, aos conceitos e procedimentos referentes a esse tema, favorecendo o avanço do aluno quanto às diferentes interpretações das letras. Os contextos dos problemas deverão ser diversificados para que eles tenham oportunidade de construir a “sintaxe” das representações algébricas, traduzir as situações por meio de equações (ao identificar parâmetros, incógnitas e variáveis), e construir as “regras” para resolução de equações. (BRASIL, 1998, p.121-122). Como vemos o desenvolvimento do pensamento algébrico tem papel reconhecidamente importante no processo de ensino aprendizagem da Álgebra. Conforme Fiorentini et al. (2005), o pensamento algébrico pode ser anterior a linguagem algébrica. Os alunos, antes mesmo de tomarem contato com tópicos associados a Álgebra, já possuem suas próprias estratégias de pensamento para soluções de problemas. Cabe ao professor, em sala de aula, explorar isto: É função do professor [...] utilizar metodologias de ensino que, partindo dessas estratégias informais do aluno, proporcionem o desenvolvimento do pensamento algébrico com o intuito de, gradativamente, alcançar de maneira significativa o formalismo algébrico. Conduzir o ensino da Matemática a partir de experiências com padrões é uma tentativa de torná-lo mais significativo, de fazer o aluno vivenciar o processo de construção da Matemática privilegiando o desenvolvimento do pensamento algébrico e a criação de uma linguagem simbólica. (HAWKE, p.69) Por sua vez, conforme Vale et al. (2007): Quando apelamos aos padrões no ensino da Matemática é normalmente porque queremos ajudar os alunos a aprender uma Matemática significativa e/ou a envolver-se na sua aprendizagem facultando-lhes um ambiente de aprendizagem que tenha algo a ver com sua realidade e experiências. O estudo de padrões vai de encontro a esse aspecto, apoiando a aprendizagem dos estudantes para descobrirem relações, encontrarem conexões e fazerem generalizações e também previsões. (VALE et al.,2007, p.5). 35 A generalização de padrões de regularidades pode ser uma ferramenta para o desenvolvimento do pensamento algébrico, proporcionando ao educando momentos de observação, análise, identificação, generalização, formalização, entre outros, ou seja, possibilita ao aluno a construção da Matemática. Durante a execução de uma atividade de generalização de padrões bem empregado pelo professor é dado ao aluno a oportunidade de uma melhor compreensão da linguagem algébrica, uma vez que a generalização do evento estudado deve ser feita pelo aluno, fazendo com que o mesmo sinta a necessidade de utilizar um símbolo para representar a continuação daquele evento estudado por ele no momento por um número indeterminado de vezes. Através de atividades de generalizações de padrões podemos levar o aluno a vivenciar o processo da construção da matemática privilegiando o desenvolvimento do seu pensamento algébrico e possibilitando ao mesmo a criação de uma linguagem simbólica. Fiorentini et al. (1993) afirmam que existem várias formas de expressar o pensamento algébrico, que o mesmo pode ser apresentado através de diversas formas de linguagem seja ela aritmética, natural, geométrica ou até mesmo através da criação de uma linguagem própria, mas também alertam: Não devemos esquecer, porem que esse pensamento se potencializa à medida que, gradativamente, o estudante desenvolve uma linguagem mais apropriada a ele. Nesse sentido, se a introdução precoce e sem suporte concreto a uma linguagem simbólica abstrata pode funcionar como um freio à aprendizagem significativa da Álgebra, o menosprezo ao modo de expressão simbólico formal constitui-se também em impedimento para seu pleno desenvolvimento. (FIORENTIMI, MIGUEL E MIORIN, 1993, p.89) BRASIL (1998) destaca que situações de investigação de padrões podem favorecer o aluno na construção de uma linguagem algébrica, na busca de descrever simbolicamente regularidades apresentadas por exemplo em sucessões numéricas ou representações geométricas. Considerando o exposto anteriormente, no próximo capítulo disponibilizamos uma análise do material didático utilizado na rede municipal de educação do município onde leciono no que se refere a introdução da Álgebra e o uso 36 de padrões e generalizações. Posteriormente, no Capítulo 6 apresentamos uma sugestão de sequência didática composta de atividades elaboradas a partir da generalização de padrões que podem auxiliar ao professor na introdução da Álgebra e auxiliar o aluno no desenvolvimento do pensamento e linguagem algébricos. 37 5 ANÁLISE DO ASPECTO ALGÉBRICO DO MATERIAL DIDÁTICO DE UM SISTEMA DE ENSINO QUANTO A INTRODUÇÃO DA ÁLGEBRA NO 7° ANO. Optamos por analisar o material fornecido por uma editora brasileira voltado para o ensino público adotado pela Secretaria Municipal de Educação de uma cidade do interior de São Paulo desde 2010 até o presente momento, na qual leciono desde 2012. O município em questão está localizado na região oeste do Estado de São Paulo, atualmente conta com uma população com cerca de 24 mil habitantes2, sua Secretaria de Educação conta com oito escolas, dentre Escolas de Ensino Infantil e Escolas de Ensino Fundamental I e II, atendendo cerca 2600 alunos3. 2 Fonte: IBGE. Diretoria de Pesquisas - DPE - Coordenação de População e Indicadores Sociais - COPIS. 3 Ministério da Educação, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais - INEP - Censo Educacional 2012. 38 Nossa opção pela análise de um material produzido por um sistema privado de ensino também se deu pelo crescimento da adoção desse tipo de material por secretarias municipais de educação nos últimos anos. Segundo pesquisa realizada pela professora Theresa Adrião, da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e citada no artigo escrito por Avancini “A peso de ouro”, da revista Educação, o número de prefeituras a adotar o material estruturado desenvolvido por empresas privadas saltou de 16 para 225 no Estado de São Paulo entre o período de 2001 e 2009. De acordo com Adrião et al. (2009): [...] informações coletadas indicam uma tendência crescente nos municípios paulistas, sobretudo naqueles com até 50 mil habitantes, considerados de pequeno porte, a buscar suporte político e pedagógico para o atendimento educacional sob sua responsabilidade junto a empresas privadas que oferecem serviços e produtos, tais como materiais didáticos para alunos e professores, incluindo apostilas e CD-ROMs, formação docente em serviço e monitoramento do uso dos materiais adquiridos. (ADRIÃO et al, 2009, p.802) A escolha por esse material em especial se dá pela familiaridade adquirida em sala de aula e pelos cursos de capacitação frequentados até o momento, assim como pelo fato do material ser adotado por todas as escolas do município em questão. No último ano (2015) o referido material passou por uma reformulação, sendo assim optamos por analisar aquele utilizado entre o período de entre 2010 e 2014. Neste capitulo analisaremos especificamente o material didático impresso para os 7° anos, pois a introdução da Álgebra se faz presente nesse volume, tendo por objetivo: Investigar como estão sendo abordados os conteúdos algébricos e qual a importância dada nas atividades propostas ao desenvolvimento do pensamento algébrico e analisar como se dá a introdução da Álgebra destacando as diferentes concepções presentes. 39 5.1 Caracterização da Obra As apostilas do sistema analisado são divididas por ano de escolaridade indo do 1º ano ao 9º ano do Ensino Fundamental II, sendo que dentro de cada ano apresentam uma divisão por bimestre. A cada bimestre o aluno recebe uma apostila referente ao seu ano e ao bimestre letivo que abrange as disciplinas de Língua Portuguesa, Matemática, Ciências, Artes, Geografia, Língua Inglesa e História, nessa ordem. Temos assim no 7° ano, com relação a apostila de matemática: 40 Figura 5 – Livro da Coordenação do Sistema de Ensino Analisado, Programação Anual do 7ºano – 1º ao 4º, p. 9 Fonte: Material Analisado 41 Figura 6 – Livro da Coordenação do Sistema de Ensino Analisado, Programação Anual do 7ºano – 1º ao 4º, p. 10 Fonte: Material Analisado Como pode ser notado os volumes são divididos em unidades, e cada unidade em tópicos, e cada tópico em sub-tópicos. Todas as unidades apresentam as seções Tempo de ouvir, falar e registrar que em geral apresentam uma ou mais atividades que de acordo com o projeto pedagógico do material “servirão para uma conversa inicial sobre o conteúdo abordado” (p. 5), Aplicando conhecimentos com exercícios diversificados que vão além dos apresentados na seção anterior e uma seção ao final da unidade com o mesmo título da unidade onde são propostos exercícios de revisão do conteúdo abordado, outras seções também se fazem presentes no material, mas não em todas as unidades, como Espaço aberto com proposta de aprendizagem lúdica, por meio de jogos, construção de instrumentos e/ou textos matemáticos que envolvem o conteúdo abordado, Na trilha da história com textos que remetem a história das mais variadas ciências e Desfaça o nó com desafios referentes ao conteúdo abordado na unidade. Ao longo do conteúdo apresentado na 42 apostila também podemos nos deparar com códigos do tipo @MAT151 – Construção de gráficos, para o Conteúdo Digital presente no Portal do Sistema, no qual tanto aluno como professor tem acesso através do cadastro que deve ser realizado com uma chave de acesso presente no primeiro volume do material impresso, algumas atividades pedem a utilização do material de apoio, presente ao final de cada volume. O livro do professor conta ainda com Apresentação, Projeto Pedagógico e Orientações Metodológicas onde são apresentados os objetivos da unidade, assim como uma sugestão de números de aulas, os conhecimentos privilegiados, os objetivos, as orientações didáticas, sendo algumas apresentadas ao longo da própria unidade do livro do professor e outras nesse momento em especial, sugestão de algumas atividades e uma lista com o códigos do Conteúdo Digital com uma breve descrição de cada um, o livro do professor diferentemente do livro do aluno vem com resposta e resoluções das atividades e exercícios propostos. 5.2 Análise da abordagem algébrica na obra O material analisado traz a introdução a Álgebra em seu segundo volume, Unidade 8 – “Usando números e letras”, de acordo com as orientações metodológicas presentes no livro do professor “esta unidade tem como objetivo fazer com que os alunos utilizem a linguagem algébrica para expressar generalizações, traduzir situações-problemas e expressões numéricas” (p. 14). O ensino da Álgebra também se faz presente na Unidade 9 – “O equilíbrio da balança” e na Unidade 13 – “Variação de grandezas: uma questão de proporção”. Como nosso objetivo está em como se dá a introdução da Álgebra, analisaremos apenas a Unidade 8 – “Usando letras e números”, com relação a forma que ocorre a introdução a Álgebra, as concepções da Álgebra apresentadas no terceiro capitulo, a linguagem algébrica e ao objetivo das atividades propostas. 43 As orientações metodológicas dão uma sugestão de 8 aulas para o desenvolvimento dessa unidade e descrevem os conhecimentos privilegiados e os objetivos das mesmas como (p. 14): Conhecimentos privilegiados Expressões algébricas - Generalização de diferentes situações, utilizando a linguagem algébrica - Construção da ideia de variável - Cálculo do valor numérico de expressões algébricas - Simplificação de expressões algébricas - Análise, interpretação e resolução de situações-problema Objetivos • Generalizar diferentes situações utilizando a linguagem algébrica • Construir a ideia de variável • Calcular o valor numérico de expressões algébricas • Simplificar expressões algébricas • Analisar, interpretar e resolver situações-problema, por meio de diferentes estratégias A unidade é composta por 13 atividades algébricas, as quais buscamos classificar de acordo com as concepções algébricas já apresentadas no Capitulo 3 desse trabalho. 44 Tabela 3 – Classificação das atividades do material analisado – 7º ano – Volume 2 – Unidade 8 quanto as concepções da álgebra. Concepções da álgebra segundo Usiskin (1995) Quantidade de Atividades Aritmética generalizada 3 Meio de resolver certos problemas (Resolução de equações) - Estudo de relações - Estrutura 10 Fonte: Elaborada pelo autor O material já parte no seu início da unidade com uma proposta de atividade onde é orientado ao professor que o mesmo deve mediar o processo de resolução, sempre estando atento a alguns aspectos referentes a propriedades algébricas ainda não apresentadas aos alunos, como quando duas ou mais letras ou uma letra e um número aparecem uma ao lado da outra, assumindo a existência da operação de multiplicação entre elas mesmo sem a presença do sinal operatório (x ou ∙). A atividade consiste na exploração de uma situação cotidiana que poderia ter sido apresentada em diferentes contextos, sendo que o escolhido foram mesas e cadeiras de um laboratório de ciências de uma escola (figura 7), outros materiais trazem a mesma situação envolvendo contextos diferentes, como mesas para uma festa de aniversário, mesas de um restaurante e outros semelhantes. No primeiro momento é solicitado ao aluno que represente por meio de desenho a vista 45 superior de uma das mesas, em seguida o aluno é questionado sobre a quantidade de lugares de duas mesas juntas (figura 8). Figura 7: Enunciado da primeira atividade da unidade 8, p. 38 Fonte: Material Analisado Figura 8: Enunciado da primeira atividade da unidade 8 itens a e b, p. 38 Fonte: Material Analisado Logo após, a situação se altera para três mesas, sendo que nesses dois itens o aluno pode e deve fazer uso da representação por meio de desenho, o 46 livro destina um quadro para execução de tal passo (figura 9). Figura 9: Enunciado da primeira atividade da unidade 8 item c, p. 39 Fonte: Material Analisado Já no item d (figura 10) o aluno deve explicar através de palavras como determinar o número de lugares disponíveis quando forem unidas 4 mesas, ainda não como nos itens anteriores fazendo uso da linguagem algébrica, mas podemos notar que o pensamento algébrico já se faz presente desde o segundo item. Figura 10: Enunciado da primeira atividade da unidade 8 item d (p. 39) Fonte: Material Analisado Após explicar no item anterior como determinar o número de lugares disponíveis sem a necessidade da representação na forma de desenho o aluno deve completar uma tabela (figura 11) colocando o número de lugares disponíveis de acordo com o número de mesas utilizadas e por fim, no item f, o mesmo deve em conjunto com o professor e os colegas de sala expressar o número de lugares (l), dado um número de mesas (m) (figura 12). 47 Figura 11: Enunciado da primeira atividade da unidade 8 itens e e f (p. 39) Fonte: Material Analisado Após essa primeira atividade o material traz um quadro onde descreve a diferença entre expressão numérica e expressão algébrica. Figura 12: Diferença entre expressões numéricas e expressões algébricas, p. 39 Fonte: Material Analisado Nesse momento acreditamos que a proposta do material foi ligar conhecimentos já adquiridos pelo aluno anteriormente durante seus estudos de aritmética com o novo conteúdo agora apresentado. Mesmo ocorrendo de forma rápida deixa um espaço para o professor explorar com os alunos o que já foi aprendido com o novo conteúdo que está sendo apresentado. Essa atividade é a única presente na seção Tempo de ouvir, falar e registrar, as próximas atividades agora pertencem a seção Aplicando conhecimento, 48 atividades 01 a 10, a seção Espaço aberto com a proposta de um jogo algébrico e a seção Usando números e letras com exercícios de revisão da unidade 01 e 02. As atividades 01 e 02 da seção Aplicando conhecimentos contam com o uso do material de apoio presentes no final livro do aluno e do professor, no caso dessa atividade quatro planificações de cubos que devem ser montadas e utilizadas ao longo da resolução das atividades, de acordo com Vale (2013): A tradução algébrica da generalização de um padrão pode ser facilitada e mais bem entendida pelos alunos se for efetuada através de tarefas em contextos figurativos (sempre que possível e necessário com recurso a materiais concretos). (VALE, p. 77) Essas atividades ainda se classificam na concepção da álgebra de Usiskin (1995) denominada aritmética generalizada, buscando que o aluno, com uso da aritmética, encontre um padrão e o generalize primeiramente com suas palavras e em seguida por meio de uma expressão algébrica. Já nas páginas seguintes podemos notar a ênfase dada a álgebra como estudo de estruturas, como no exercício 07 (figura 13), 08 e 10 (figura 14) da seção Aplicando Conhecimentos, 01 e 02 (figura 15) da seção Usando números e letras. Figura 13: Exercício 07 proposto na seção Aplicando Conhecimentos, p. 44 Fonte: Material Analisado 49 Figura 14: Exercício 10 proposto na seção Aplicando Conhecimentos, p. 45 Fonte: Material Analisado Figura 15: Exercício 02 proposto na seção Usando números e letras, p. 47 Fonte: Material Analisado Todas essas atividades contemplam apenas uma concepção da Álgebra na qual Usiskin define como estudo de estruturas. Brasil (1998) afirma que: [...] é mais proveitoso propor situações que levem os alunos a construir noções algébricas pela observação de regularidades em tabelas e gráficos, 50 estabelecendo relações, do que desenvolver o estudo da Álgebra apenas enfatizando as manipulações com expressões e equações de uma forma meramente mecânica. Existe um razoável consenso de que para garantir o desenvolvimento do pensamento algébrico o aluno deve estar necessariamente engajado em atividades que inter-relacionem as diferentes concepções da Álgebra. (BRASIL, 1998, p.116) Por meio dessa análise, conseguimos, então, perceber uma abordagem que explora a utilização da investigação de padrões e regularidades, assim como a generalização, levando o aluno a construção do pensamento algébrico e ao amadurecimento da linguagem álgebra. No entanto, ao longo do desenvolvimento das atividades presentes no material notamos que embora a exploração da concepção da Álgebra como aritmética generalizada seja proposta de forma a possibilitar ao aluno construir o conhecimento, a concepção da Álgebra como estudo das estruturas já não tem a mesma abordagem, pois é composta por atividades de enunciados diretos e exercícios repetitivos, não oferecendo ao aluno atividades motivadoras. O desenvolvimento de expressões algébricas e suas propriedades se apresentam por meio de atividades que não deixam claro seus objetivos e a passagem entre uma atividade e outra. Não há nenhuma orientação didática ao professor com relação a essas atividades, ou seja, o material deixa totalmente a cargo do professor a elaboração de um percurso para aplicação de tais atividades, sendo assim, a sistematização do conhecimento depende da ação do professor. A falta de orientação ao professor pode levar este muitas vezes a apenas dar sequência aos exercícios propostos pelo material, não deixando claro ao aluno o porquê da realização de tal atividade, já que muitas vezes nem ele mesmo consegue identificar o objetivo da mesma. Como consequência o aluno pode ficar com a sensação de que esse conteúdo só serve para “passar de ano” e não irá influenciar em nada seu dia a dia. Como já afirmamos anteriormente um dos motivos que podem levar o ensino da Álgebra ao fracasso é a falta de significado da mesma para o aluno. 51 A análise desse material juntamente com todo o estudo feito nesse trabalho nos levou a elaboração de uma proposta de sequência didática, para introdução da Álgebra através do uso de padrões e generalizações, apresentada no próximo capitulo. 52 6 UMA PROPOSTA DE SEQUÊNCIA DE ATIVIDADES COM USO DE PADRÕES E GENERALIZAÇÕES PARA INTRODUÇÃO DA ÁLGEBRA Apresentamos agora uma proposta de sequência didática composta por atividades que podem ser empregadas para introdução da Álgebra. Como já mencionamos anteriormente, tradicionalmente no Brasil, a introdução da Álgebra se dá no 7o ano do Ensino Fundamental, sendo assim primeiramente elaboramos um mapa de percurso, com a função de mapear os conteúdos que realmente são necessários para atingir as competências esperadas. 53 Figura 16 – Mapa de percurso Fonte: Elaborada pelo autor As atividades a seguir foram selecionadas de acordo com o que já foi mencionado anteriormente e buscam possibilitar ao aluno a construção da Matemática. Existem diferentes classificações para uma atividade, Ponte (2005) as classifica de acordo com o esquema apresentado na figura abaixo. 54 Figura 17 - Relação entre diversos tipos de tarefas, em termos do seu grau de desafio e de abertura. Fonte: PONTE, 2005, p. 8 Ou seja, para Ponte (2005) as atividades podem variar entre os dois níveis de dificuldade, do desafio reduzido (fácil) ao desafio elevado (difícil), ou ainda quanto a estrutura, que pode ser fechada ou aberta, sendo fechada a atividade onde fica claro o que é dado e o que é pedido e aberta a atividade onde nem sempre é possível identificar onde a atividade vai chegar. Sendo assim, exercícios são consideradas atividades relativamente fáceis e com estrutura fechada, já problemas, apesar de também possuírem uma estrutura fechada são considerados atividades difíceis que requerem um pouco mais do aluno. Por sua vez, atividades de exploração e de investigação são atividades de estrutura aberta, mas diferem no nível de complexidade, sendo que as de investigação são consideradas de nível mais elevado que as de exploração. Na sequência didática aqui proposta, optamos por utilizar atividades de cunho exploratório com a finalidade de levar o aluno a construção do conhecimento mediante um direcionamento do professor. Essa sequência propõe que a abordagem do novo conteúdo se inicie com uma proposta de atividade e não pela definição, como é comum em muitos casos. De acordo com Brasil (1998): [...] a situação-problema é o ponto de partida da atividade matemática e não 55 a definição. No processo de ensino e aprendizagem, conceitos, ideias e métodos matemáticos devem ser abordados mediante a exploração de problemas, ou seja, de situações em que os alunos precisem desenvolver algum tipo de estratégia para resolvê-las; (BRASIL, 1998, p. 40) A sequência didática a seguir foi respaldada em todo o estudo apresentado até agora e poderá ser utilizada na íntegra ou passar por adaptações consideradas necessários pelo professor, de acordo com sua estratégia de ensino e necessidade de sua turma. 6.1 Sequência didática Introdução a Álgebra por meio de Atividades de Padrões e Generalizações Conteúdo: • Generalização de Padrões Objetivo: • Desenvolvimento do pensamento algébrico • Identificar padrões de regularidades • Generalizar padrões • Desenvolver a linguagem algébrica Ano de escolaridade: • 7º ano do Ensino Fundamental (Regime de nove anos) 56 Tempo estimado: • Oito aulas Material: • Lápis e borracha • Papel • Lápis de cor ou giz de cera • Imagens das atividades propostas Desenvolvimento: 1ª etapa Nessa etapa, apresentamos uma atividade de sondagem inicial, de modo que os alunos demonstrem sua capacidade de percepção de padrões. Apresente as atividades abaixo e peça que resolvam. Após propor a atividade procure caminhar pela sala e observar como os alunos se saem. Procure discutir com a sala sobre as dificuldades que eles encontraram e a respeito das diferenças das Atividades 1 e 2. Atividade 1: Observe as sequências de figuras abaixo e construa as próximas três figuras de cada uma delas. a) 57 b) c) 1ª Fig. 2ª Fig. 3ª Fig. 4ª Fig. 5ª Fig. Atividade 2: E agora? Nas sequências numéricas abaixo, você consegue encontrar os três próximos elementos que a compõem? a) 0; 3; 6; 9; b) 1; 6; 11; 16; c) 1; 4; 9; 16; 2ª etapa Agora proponha situações-problema para que os alunos possam identificar padrões e descrevê-los. Peça de desenvolvam essa situação: 58 Atividade 3: Situação-problema Miguel está organizando com seu pai as mesas para sua festa de aniversário. Quando começou a juntar as mesas percebeu que poderia ter um problema, afinal sozinha uma mesa tem 4 lugares disponíveis, ou seja duas mesas sozinhas são oito lugares, mas ao juntar essas duas mesas ficam apenas seis lugares. Veja o esquema abaixo: a) Se Miguel juntar três mesas, quantos lugares ele terá? b) E se forem quatro mesas? E cinco? c) Determine, sem usar a representação de desenhos, quantos lugares ele terá se juntar 20 mesas? 3ª etapa Reúna os alunos em pequenos grupos, não mais que três ou quatro alunos por grupo, possibilitando assim que todos possam participar ativamente da atividade e peça que socializem as respostas. 59 Após esse momento entregue a segunda parte da atividade e peça para que resolvam. d) É possível juntar mesas de modo que tenha lugar para 63 pessoas exatamente e não sobre nenhum lugar vazio? Justifique sua resposta. e) Você consegue encontrar o número de lugares para qualquer quantidade de mesas que Miguel juntar só através de cálculos? Como você explicaria esse processo para Miguel? Peça para que cada grupo eleja um representante e promova a socialização dos resultados obtidos por cada grupo. O importante nesse momento não é a linguagem utilizada pelos alunos, as explicações podem ser textuais, o objetivo nessa atividade é a investigação, discussão e conclusão da regularidade sem ser necessário o uso da simbologia. 4ª etapa Agora peça que os alunos, individualmente ou em duplas, desenvolvam a situação a seguir. Cada aluno, ou cada dupla, deverá receber apenas 8 palitos de fósforo. 1- Construa sobre sua carteira um triângulo usando três palitos de fósforo 2- Agora construa mais um triângulo aproveitando um dos lados do triangulo anterior. 3- Faça o mesmo processo para a construção do terceiro triangulo, você deve obter algo semelhante à figura abaixo: 60 4- Quantos palitos serão necessários para construir quatro triângulos? 5- E cinco triângulos? 6- Complete a tabela abaixo Número de triângulos Número de palitos de fósforo 1 2 3 4 5 6 7 8 61 7- Uma pessoa com 33 palitos conseguirá construir quantos triângulos? 8- Quais contas você faria para encontrar o número necessário de palitos de fósforo para formar 20 triângulos? 9- Descreva com suas palavras passo a passo o que você fez no item 8. 10- Você consegue descrever uma regra que associe o número de palitos de fósforo com o número de triângulos? 11- Verifique a validade da regra encontrada por você refazendo a tabela e depois compare os novos resultados com os obtidos anteriormente. Nesse momento é importante que os alunos compartilhem com o restante da turma seu raciocínio e as respostas encontradas. Logo após o professor pode refazer os itens 9, 10 e 11 na lousa aproveitando o que já foi apresentado pelos alunos, mas agora expondo para a turma a possibilidade de formalizar o item 10 com o uso de letras, como por exemplo usando a letra p para representar o número de palitos de fósforo utilizados e t para o número de triângulos construídos. Nessa etapa se inicia a introdução ao uso da linguagem algébrica, pedindo para que o aluno faça uso de símbolos ou letras para representar os objetos e as situações presentes nas atividades propostas. 5ª etapa Nesse momento peça aos alunos que individualmente voltem para a primeira atividade, a atividade das mesas e cadeiras, e peça para que tentem formalizar o item e, onde deixaram uma explicação de como Miguel deveria calcular o número de lugares de acordo com o número de mesas. O professor pode deixar uma 62 dica sobre quais letras os alunos podem utilizar na formalização, mas o interessante seria deixar essa tomada de decisão para cada um e posteriormente pedir que justifiquem sua escolha e que sinalize juntamente com a expressão algébrica o que cada letra representa. 6ª etapa Essa última atividade propõe uma avaliação do que foi explorado até o momento com a sala. Nesse ponto o professor pode analisar se serão necessárias novas atividades de generalização para melhor compreensão dos alunos e assimilação da nova linguagem, ou se já pode avançar com relação às atividades. Para que essa análise posso ocorrer de forma consistente acreditamos que o melhor é que seja feita individualmente, assim o professor poderá observar as particularidades de cada educando. Entregue a atividade abaixo, intitulada “Os índios”, para cada aluno da sala e peça para que resolvam. Essa atividade pode ser recolhida ao seu final, corrigida pelo professor e posteriormente resolvida para a sala com o destaque dos pontos mais importantes observados durante sua correção, tanto com relação aos erros, quanto com relação aos acertos. De outra forma, a atividade pode ser desenvolvida item a item, onde o professor oferece aos alunos um tempo para resolução de um item e imediatamente debate com a sala e faz a correção desse item. Os Índios Os chefes de nove nações indígenas juntaram-se para uma reunião. Colocaram suas tendas em círculo no cume de um monte. Cada tenda tinha um caminho para cada uma das outras. Quantos caminhos há ao todo entre as tendas? 63 1) Represente na forma de desenho a situação a cima para quatro tendas representando também os caminhos que ligam as tendas. 2) Observando sua representação acima responda • Quantos caminhos há? • Quantos caminhos partem de cada tenda? 3) Faça o mesmo procedimento do item 1, mas agora com cinco tendas e responda • Quantos caminhos há? • Quantos caminhos partem de cada tenda? 4) Se você observar só os caminhos nos desenhos que você fez, eles formam alguma Figura conhecida? Se sim, Qual? 5) Faça o mesmo agora para 6, 7 e 8 tendas e preencha a tabela abaixo Número de tendas Polígono Número de caminhos que partem de uma tenda Número total de caminhos 4 5 6 7 8 64 6) Agora tente resolver o problema inicial com nove tendas e descreva o processo que você utilizou. 7) E se fossem 20 tendas como você faria? 8) Crie uma formula que estabeleça uma relação entre o número de tendas e o número de caminhos que as ligam. Se o professor desejar poderá utilizar a atividade para explorar a relação entre o número de vértices e o número de diagonais de um polígono convexo. 7ª etapa – AVALIAÇÃO Recomendamos que a avaliação ocorra a cada etapa com verificação das atividades aplicadas, é necessário que o professor analise se os objetivos propostos foram alcançados e faça um levantamento das dificuldades apresentadas pela turma. Caso os objetivos não tenham sido atingidos, os conteúdos deverão ser retomados e o professor deverá apresentar atividades complementares para efetiva aprendizagem. Diferentemente do material analisado, aconselhamos que o professor após finalizar esta sequência didática não inicie imediatamente o estudo da Álgebra como estudo das estruturas, antes de trabalhar dentro dessa concepção o aluno deve ter atingindo um amadurecimento da linguagem algébrica para que realmente as simplificações e as manipulações com os símbolos venham a fazer sentido e não apenas se tornem algo mecânico. Se o aluno realmente não tiver assimilado o significado dos símbolos em meio a expressões, poderá cometer erros como � + � + � + = 3� . Para um maior desenvolvimento da linguagem algébrica além de trabalhar a sequência didática apresentada o professor pode recorrer a outras atividades como por exemplo: Atividade 4: Represente cada situação abaixo utilizando letras para representar o número desconhecido: 65 a) Um número adicionado quatro: b) O dobro de um número: c) O dobro de um número menos 7: d) A metade de um número: e) O dobro da terça parte de um número: Assim como a atividade anterior, outras podem ser escolhidas pelo professor até que se observe que, de fato, o aluno se apropriou da linguagem algébrica mencionada. 66 7 CONSIDERAÇÕES FINAIS Tornar o ensino da Álgebra significativo é um grande desafio e um anseio de muitos professores de Matemática, mas para que isso venha a ocorrer é necessário que professores estudem, entendam e explorem as diferentes concepções da Álgebra durante suas aulas, possibilitando assim ao educando o contato com os diferentes usos das letras e seus significados. O uso de atividades exploratórias pode ser um dos caminhos para levar o aluno a participar ativamente do processo de construção da matemática, e assim atribuir significado para o que lhe está sendo apresentado. Embora saibamos que as dificuldades dos alunos com relação a Álgebra sejam muitas, um dos caminhos para o sucesso no ensino dessa área da Matemática seria garantir que sua introdução ocorra de forma significativa para o aluno, levando-o a um amadurecimento do pensamento algébrico já existente mas normalmente desconhecido pelo mesmo e à formalização desse pensamento por meio de uma linguagem algébrica. Alcançar a formalização do seu pensamento algébrico possibilitará ao educando entender e interpretar situações que envolvam essa nova linguagem, tornando assim o conteúdo que até então lhe parecia distante do seu dia a dia, uma ferramenta facilitadora para problemas e situações que o cercam a todo o instante. O uso de generalização de padrões favorece essa construção e possibilita ao professor explorar com a sala diversas situações onde a linguagem algébrica, que tanto assusta aos alunos, não precisa ser o foco inicial, mas um objetivo 67 alcançado ao fim das atividades propostas. Assim, espera-se que a sequência didática proposta nesse trabalho possa contribuir com o professor que pretende proporcionar aos seus alunos o desenvolvimento do pensamento algébrico e apresentar aos mesmos uma nova linguagem, a linguagem algébrica. Por fim, a sequência didática aqui sugerida, se aplicada, requer alguns cuidados por parte do professor em cada atividade proposta, visto que a avaliação deve ocorrer em cada uma delas, e às vezes em cada item. Isto permitirá ao professor elencar as dificuldades apresentadas pelos alunos e possibilitar a busca de novas alternativas para saná-las. 68 8 REFERÊNCIAS ADRIÃO, T. et al. Uma modalidade peculiar de privatização da educação pública: a aquisição de “sistemas de ensino” por municípios paulistas. Educação & Sociedade, Campinas, v. 30, n. 108, p.799-818, out. 2009 ÁLGEBRA. In: Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa. Disponível em: . Acesso em: 18 out. 2015. BALMOND, C. (2000). O Número 9: Em Busca do Código Sigma. Lisboa: Replicação. BOOTH, Lesley. (1995) Dificuldades das crianças que se iniciam em Álgebra. In: A. Coxford, & A. Shulte,A. (Org.). As ideias da Álgebra. São Paulo: Atual. BRASIL, Ministério da Educação. Guia de livros didáticos PNLD 2014 (Anos Finais do Ensino Fundamental – Brasília: MEC, 2013. BRASIL, Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais. Brasília: MEC/SEF, 1998 COLLINS, Kevin F.. A study of Concrete and Formal Operations in School Mathematics: A Piagetian Viewpoint. Melbourne: Australian Council for Educational Research, 1975. COXFORD, A. F.; SHULTE, A. P. (org). As Idéias da Álgebra. São Paulo. Ed. 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