ISSN 0102-5716 ISSN Eletrônico 2178-3764 Veterinária e Zootecnia Ciarlini LDRP, Koivisto MB, Fernandes MAR, Soreano M, Silva RB, Silva ARS. Uso da radioterapia no tumor venéreo transmissível em cães. Vet. e Zootec. 2014 jun.; 21(2): 279-287. 279 USO DA RADIOTERAPIA NO TUMOR VENÉREO TRANSMISSÍVEL EM CÃES Luciana Del Rio Pinoti Ciarlini1 Marion Burkhardt de Koivisto2 Marco Antônio Rodrigues Fernandes3 Márcio Soreano4 Rúbia Bueno da Silva5 Alexandre Redson Soares da Silva6 RESUMO Desde a descoberta dos raios-x, o uso das radiações em oncologia avançou extraordinariamente. No Brasil, a radioterapia em animais limita-se em pesquisas isoladas em algumas universidades públicas, sendo os procedimentos realizados de forma ainda precária devido à dificuldade de aquisição de equipamentos de radiação e principalmente face à carência de profissionais especializados. O tumor venéreo transmissível (TVT) é neoplasia de ocorrência espontânea, de caráter contagioso, comumente tratado com a vincristina. O presente trabalho relata experiência positiva da radioterapia como opção isolada ou combinada com tratamento com a vincristina em três casos confirmados de TVT. Observou- se que a radioterapia é passível de ser utilizada na rotina clínica isolada ou combinada à quimioterapia, desde que se utilizem as fontes de radiação adequadas. Palavras –chave: canino, tumor venéreo transmissível, radioterapia. USE OF RADIOTHERAPY IN TRANSMISSIBLE VENERAL TUMOR IN DOGS ABSTRACT Since the discovery of x rays, the use of radiation in oncology has advanced remarkably. In Brazil, radiation therapy in animals is limited to some isolated studies in public universities and the procedures performed is still precarious because radiation equipments are expensive and there is still a lack of skilled professionals. The transmissible venereal tumor (TVT) is a contagious neoplasm of spontaneous occurrence, commonly treated with vincristine. This paper describes the positive experience of radiotherapy as an isolated option or as an combined treatment with vincristine in three cases of TVT. It was observed that radiotherapy may be used in routine clinical chemotherapy alone or combined with chemotherapy since suitable sources of radiation are provided. Keywords: canine transmissible venereal tumor, radiotherapy. 1 Profa. Ass. Dra. do Departamento de Clínica, Cirurgia e Reprodução Animal, da FMV do Campus de Araçatuba, Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" – UNESP, Araçatuba, Correspondência 2 Profa. Adj. Departamento de Clínica, Cirurgia e Reprodução Animal, Faculdade de Medicina Veterinária, Campus de Araçatuba. Universidade Estadual Paulista "Júlio de Mesquita Filho" – UNESP 3 Departamento de Dermatologia e Radioterapia, Faculdade de Medicina de Botucatu, UNESP 4 Técnico em Radiologia do Colégio CETEA/Araçatuba/Brasil. 5 FSP- Faculdade Sudoeste Paulista, Curso de Medicina Veterinária 6 Pós graduando do Departamento de Reprodução Animal e Radiologia Veterinária - Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia – UNESP/Botucatu/Brasil ISSN 0102-5716 ISSN Eletrônico 2178-3764 Veterinária e Zootecnia Ciarlini LDRP, Koivisto MB, Fernandes MAR, Soreano M, Silva RB, Silva ARS. Uso da radioterapia no tumor venéreo transmissível em cães. Vet. e Zootec. 2014 jun.; 21(2): 279-287. 280 UTILIZACIÓN DE LA RADIOTERAPIA EN EL TUMOR VENÉREO TRANSMISIBLE EN PERROS RESUMEN Desde el descubrimiento de los rayos X, el uso de radiación oncológica ha avanzado notablemente. En Brasil, la terapia de radiación en animales se limita en pesquisas aisladas en algunas las universidades públicas y los procedimientos realizados de una manera precaria a causa de la dificultad de adquirir equipos de radiación y sobre todo frente a la escasez de profesionales cualificados. El tumor venéreo transmisible (TVT) es una neoplasia de ocurrencia espontánea de carácter contagioso, comúnmente tratadas con vincristina. En este trabajo se describe la experiencia positiva de la radioterapia como una opción aislada o en combinación del tratamiento con vincristina en tres casos confirmados de TVT. Se observó que la radioterapia es capaz de ser utilizada en la rutina clínica aislada o en combinación con quimioterapia, siempre que utilicen fuentes de radiación adecuadas. Palabras clave: canino tumor venéreo transmisible radioterapia. INTRODUÇÃO O câncer é uma importante causa de morte natural em humanos e animais domésticos, sendo a pesquisa nesta área de extrema importância para os avanços da oncologia humana e veterinária. A radioterapia é uma das modalidades do tratamento do câncer, e é ainda pouco explorada na medicina veterinária do nosso país, devido à indisponibilidade dos equipamentos necessários (1). O primeiro relato de radioterapia em medicina veterinária data de 1906, e os primeiros estudos sobre radiossensibilidade e dosimetria, realizados em cães e cavalos foram apontados na Faculdade de Veterinária de Viena em 1927 (2). Já no final do ano de 2000, existiam 30 equipamentos de radioterapia veterinária em funcionamento na América do Norte e atualmente verifica-se uma tendência de crescimento e sofisticação tecnológica desses serviços (3). Não obstante, no Brasil, a radioterapia em animais se restringe às pesquisas isoladas em algumas universidades públicas (1). Os procedimentos são realizados de forma ainda precária devido à dificuldade de aquisição de equipamentos de radiação e principalmente face à carência de profissionais especializados (4). O tumor venéreo transmissível (TVT) é neoplasia de ocorrência espontânea (5,6) de caráter contagioso. Sua distribuição é mundial, mas parece ser mais prevalente em ambientes urbanos tropicais e subtropicais, principalmente em regiões com grandes populações de cães de rua, ocorrendo em menor freqüência nos países desenvolvidos (7). O uso da radiação como terapia no tratamento do TVT, bem como de sua extrema efetividade tem sido relatada (8,9) inclusive no tratamento de tumores resistentes a vincristina. Este trabalho objetiva relatar experiência positiva da radioterapia como opção isolada ou combinada à quimioterapia em três casos confirmados de TVT canino. ISSN 0102-5716 ISSN Eletrônico 2178-3764 Veterinária e Zootecnia Ciarlini LDRP, Koivisto MB, Fernandes MAR, Soreano M, Silva RB, Silva ARS. Uso da radioterapia no tumor venéreo transmissível em cães. Vet. e Zootec. 2014 jun.; 21(2): 279-287. 281 MATERIAL E MÉTODOS Foram atendidos no Setor de Reprodução Animal do Hospital Veterinário Luiz Quintiliano de Oliveira da Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – UNESP – campus de Araçatuba três cães com diagnóstico citológico confirmado de TVT, sendo duas fêmeas e um macho. O animal 1, canino, fêmea da raça poodle, 25 meses de idade, foi atendido apresentando aumento de volume exteriorizando-se da vulva com sangramento. A paciente, entrando na maturidade sexual, pariu uma vez, após primeiro cio. Parto normal, originando um produto viável. No segundo cio a cadela escapou e cruzou indesejavelmente. O intervalo entre os cios foi de 6 meses. Nega uso de anticoncepcional. Após o cruzamento observou-se aumento de volume na vulva. Hiporexia, normodipsia, normúria e normoquezia. Ao exame clínico, o animal apresentava-se com temperatura retal de 39º C, freqüência respiratória de 60 movimentos por minuto, freqüência cardíaca de 90 batimentos por minuto, mucosas normocoradas TPC = 2 segundos, sem sinais de desidratação e linfonodos sem alterações dignas de nota. No exame clínico específico observou-se aumento de volume com 5 cm de comprimento por 3 cm de largura, com aspecto de couve-flor, friável, com sangramento, exteriorizando-se pela vulva. As mamas estavam normais. Como exames complementares foram realizados imprint da massa em que se observou a presença de hemácias, neutrófilos, células grandes com núcleos grandes e citoplasma de coloração azul clara vacuolizado, sendo que o núcleo de algumas dessas células apresentava-se em mitose (Figura 1). Também foi realizada sorologia para leishmaniose apresentando resultado negativo. O diagnóstico foi de TVT e como primeira opção terapêutica optou-se pela aplicação de sulfato de vincristina intravenoso (0,025mg/kg, IV, 1 vez por semana). Figura 1. Exame citológico da massa vulvar do animal 1, típica de TVT, onde observa-se presença de células com núcleos proeminentes e cromatina agrupada, citoplasma celular sem coloração contendo vacúolos múltiplos e pequenos. Fonte: Setor de Reprodução Animal da FMVA – UNESP Araçatuba. Após sete semanas do tratamento quimioterápico frente ao tumor não apresentar melhora clínica significativa provavelmente devido às interrupções frequentes da quimioterapia que por sua vez resultaram do não comparecimento do proprietário semanalmente nos retornos agendados, optou-se pela realização da radioterapia. Para as sessões de radioterapia utilizou-se aparelho de Raio-X da marca Siemens modelo Dermopan 2. A primeira sessão de radioterapia teve a duração de 2 minutos, sendo utilizada a técnica de 50 KV/25 mA aplicada por meio de um cone de aproximadamente 15 cm o que produziu uma radiação aproximada de 397 Gy. Para as sessões seguintes utilizou-se o mesmo protocolo ISSN 0102-5716 ISSN Eletrônico 2178-3764 Veterinária e Zootecnia Ciarlini LDRP, Koivisto MB, Fernandes MAR, Soreano M, Silva RB, Silva ARS. Uso da radioterapia no tumor venéreo transmissível em cães. Vet. e Zootec. 2014 jun.; 21(2): 279-287. 282 radioterápico, sendo o intervalo entre as aplicações de 24 horas. O tratamento radioterápico consistiu de cinco sessões sendo que após a segunda o proprietário já relatou uma melhora significativa do sangramento vulvar. Após a última sessão de radioterapia foi relatado que o sangramento vulvar cessou e que a massa desapareceu. O animal 2, canino, SRD, com 36 meses de idade, fêmea, apresentava grande massa em região vulvar que se expandia para a região inguinal. Normorexia. Normúria e normoquezia. Ao exame clínico, o animal apresentava-se com temperatura retal de 39,6 C, freqüência cardíaca de 120 batimentos por minuto com a presença de arritmia sinusal, freqüência respiratória de 20 batimentos por minuto, mucosas róseas, TPC 2 segundos e linfonodos submandibulares infartados. Sem sinal de desidratação. No exame físico específico observou- se a presença de grande massa, de consistência firme e friável com secreção sanguinolenta com aproximadamente 6 cm de largura por 4,5 cm de extensão, localizada em região vulvar e vestíbulo vaginal (Figura 2). Mamas: presença de massa ulcerada de consistência firme entre a vulva e a massa inguinal com tamanho aproximado de 3,0 cm de comprimento por 4,0 cm de largura, com sangramento. Foram solicitados os seguintes exames complementares: hemograma completo, sorologia para leishmaniose, eletrocardiograma e exame citopatológico da massa vulvar. Os resultados dos exames laboratoriais estavam dentro da normalidade para a espécie e no exame citopatológico observou-se a presença de hemácias, neutrófilos, células grandes com núcleos grandes e citoplasma de coloração azul clara vacuolizado. Figura 2. Aspecto macroscópico demonstrando grande massa de consistência firme e friável com secreção sanguinolenta com aproximadamente 6 cm de largura por 4,5 cm de extensão, localizada em região vulvar e vestíbulo vaginal, mesmo após tratamento com quimioterapia do animal 2. Fonte: Setor de Radiologia Veterinária da FMVA – UNESP Araçatuba. O diagnóstico foi de TVT sendo a primeira opção terapêutica a utilização da quimioterapia intravenosa com a utilização de sulfato de vincristina, na dose de 0,025mg/kg, IV com intervalo de sete dias entre as aplicações. Neste caso o fato da grande extensão da massa apresentar uma regressão muito lenta e devido ao intenso sangramento vulvar mesmo após três sessões de quimioterapia optou-se pela associação da quimioterapia com a radioterapia. A primeira sessão associada de quimioterapia e radioterapia foi realizada e teve a duração de 2 minutos, sendo utilizada a técnica de 50 KV/25 mA aplicada por meio de um cone de aproximadamente 15 cm o que produziu uma radiação aproximada de 397 Gy. Para as quatro sessões seguintes utilizou-se somente a radioterapia, sendo que o intervalo entre as aplicações foi de 36 horas. A sexta sessão de radioterapia foi associada à quimioterapia, com ISSN 0102-5716 ISSN Eletrônico 2178-3764 Veterinária e Zootecnia Ciarlini LDRP, Koivisto MB, Fernandes MAR, Soreano M, Silva RB, Silva ARS. Uso da radioterapia no tumor venéreo transmissível em cães. Vet. e Zootec. 2014 jun.; 21(2): 279-287. 283 24 horas de intervalo da última sessão isolada de radioterapia, seguida de mais três sessões de quimioterapia com intervalo de sete dias (Figuras 3 e 4). Figura 3. Aspecto macroscópico da vagina do animal 2 após sessões de radioterapia demonstrando regressão das lesões. Fonte: Setor de Radiologia Veterinária da FMVA – UNESP Araçatuba. Figura 4. Exame citológico da massa peniana do animal 3, após radioterapia, onde observa-se presença de células normais. Fonte: Setor de Reprodução Animal da FMVA – UNESP Araçatuba. O animal 3, canino, SRD, com aproximadamente 50 meses de idade, macho, foi atendido apresentando duas massas no pênis, com sangramento. Ao exame clínico não foram observadas alterações dignas de nota e também não foram relatadas outras alterações nos demais sistemas. Ao exame específico observou-se duas massas no pênis, com consistência firme e friável, aspecto de couve-flor, sendo uma na base, com aproximadamente 3 cm de extensão e outra menor na região próxima a glande (Figura 5). Os exames laboratoriais solicitados incluíram hemograma completo, sorologia para leishmaniose e exame citopatológico da massa peniana, não sendo detectadas alterações dignas de nota nos dois primeiros exames. Pela associação entre o exame citopatológico e macroscópico da lesão peniana, o animal foi diagnosticado portador de TVT. Pela facilidade de exposição das massas penianas a opção terapêutica foi a radioterapia isolada com sessões a cada três dias e utilização de técnica de 50 KV/25 mA aplicada por meio de um cone de aproximadamente 15 cm o que produziu uma radiação aproximada de 397 Gy. Logo após a primeira sessão o proprietário já relatou melhora no sangramento peniano. Foram realizadas ISSN 0102-5716 ISSN Eletrônico 2178-3764 Veterinária e Zootecnia Ciarlini LDRP, Koivisto MB, Fernandes MAR, Soreano M, Silva RB, Silva ARS. Uso da radioterapia no tumor venéreo transmissível em cães. Vet. e Zootec. 2014 jun.; 21(2): 279-287. 284 quatro sessões radioterápicas, sendo o animal acompanhado semanalmente, onde observou-se a regressão continua das lesões penianas (Figura 6). Figura 5. Aspecto macroscópico demonstrando duas massas de consistência firme e friável com aproximadamente 2 cm de largura por 3 cm de extensão, localizada em região peniana, no animal 3. Fonte: Setor de Radiologia Veterinária da FMVA – UNESP Araçatuba. Figura 6. Aspecto macroscópico demonstrando remissão das massas localizadas em pênis após quatro sessões de radioterapia, no animal 3. Fonte: Setor de Radiologia Veterinária da FMVA – UNESP Araçatuba. No caso do animal 2, após análise dos especialistas, optou-se pela utilização combinada das duas modalidades terapêuticas, quais sejam a radio e quimioterapia. Neste caso específico, como o tumor apresentava um tamanho considerável e mesmo após três semanas consecutivas de quimioterapia, o sangramento vulvar persistia e não havia indícios de involução da massa tumoral, a opção foi a introdução da radioterapia para melhorar a qualidade de vida do paciente e potencializar a diminuição da massa tumoral. Já o animal 3 apresentava duas massas no pênis, sendo a exposição das mesmas facilitada pela própria anatomia do órgão, fato este decisivo para a opção da radioterapia isolada (Figura 5). O diagnóstico definitivo dos três casos foi baseado na observação dos sinais clínicos característicos do TVT, os quais foram nódulos e massas lobuladas com aspecto de couve- ISSN 0102-5716 ISSN Eletrônico 2178-3764 Veterinária e Zootecnia Ciarlini LDRP, Koivisto MB, Fernandes MAR, Soreano M, Silva RB, Silva ARS. Uso da radioterapia no tumor venéreo transmissível em cães. Vet. e Zootec. 2014 jun.; 21(2): 279-287. 285 flor, de consistência firme e friável. As massas apresentaram vascularização intensa e coloração vermelha viva, liberando de forma intermitente ou constante, fluido de aspecto serosanguinolento ou hemorrágico associada à realização do exame citológico que revelou um ou dois núcleos proeminentes com a cromatina agrupada, citoplasma celular sem coloração ou ainda azul claro, contendo vacúolos citoplasmáticos múltiplos e pequenos (Figura 1). RESULTADOS Os animais submetidos à radioterapia isolada ou combinada a quimioterapia apresentaram boa tolerância ao tratamento. O tratamento radioterápico no animal 1 consistiu de cinco sessões de radiação ionizante, sendo que após a segunda o proprietário já relatou uma melhora significativa do sangramento vulvar. Após a última sessão foi relatado que o sangramento vulvar havia cessado. No animal 2 o tratamento consistiu de uma sessão de quimio e radioterapia, quatro sessões de radioterapia, uma sexta sessão de quimio e radioterapia associadas e três sessões exclusivas de quimioterapia. Após a última sessão isolada de quimioterapia foi realizada a reavaliação citológica sendo que não foi observada mais evidência citológica da presença de TVT (Figura 3). No animal 3 foram realizadas quatro sessões radioterápicas, sendo o animal acompanhado semanalmente, onde observou-se a regressão continua das lesões penianas (Figuras 5 e 6) . A utilização isolada do Dermopan proporcionou um aumento da sobrevida com preservação da qualidade de vida do animal 3, com diminuição considerável do sangramento peniano já na primeira sessão de radioterapia, quando comparada com a outra modalidade terapêutica usualmente utilizada na rotina hospitalar veterinária, além de ter reduzido o valor financeiro do tratamento com quimioterápico. Nenhum animal tratado apresentou evidências de recidiva da enfermidade durante o período em que foram assistidos, com tempo de seguimento aproximado de um ano para os três animais. DISCUSSÃO Em geral, o TVT, tem crescimento localizado no aparelho reprodutivo, apresenta baixa taxa de metástase e é radiossensível ao tratamento com radiações ionizantes, por ser um tumor com características histológicas compatíveis com células redondas (10). Os aspectos macroscópicos das lesões genitais foram semelhantes aos citados por Brown et al. (11), também os achados citológicos foram semelhantes aos citados por Rogers (4). O aspecto macroscópico das lesões é bem característico e a confirmação da suspeita clínica ocorreu pela associação entre as alterações macroscópicas e o exame citológico. Théon (12) relata que após a avaliação da extensão e das características patológicas do tumor, o objetivo primeiro da radioterapia deve definir a taxa de cura esperada e a morbidade do tratamento, com base na probabilidade de disseminação do tumor. Neste trabalho, este objetivo foi definido anteriormente à formulação da estratégia terapêutica e afetou a seleção da modalidade de tratamento, ou seja, a radioterapia isolada ou combinada à quimioterapia. Ainda de acordo com Théon (12), a correta avaliação do objetivo do tratamento é uma das decisões mais importantes na radioterapia e esta avaliação foi realizada de forma interdisciplinar. Assim como na radioterapia humana, o sucesso do tratamento depende do planejamento adequado com os cálculos precisos de distribuição de dose nos planos de tratamento baseados em protocolos já reconhecidos, além da eficiência no controle de qualidade dos equipamentos ISSN 0102-5716 ISSN Eletrônico 2178-3764 Veterinária e Zootecnia Ciarlini LDRP, Koivisto MB, Fernandes MAR, Soreano M, Silva RB, Silva ARS. Uso da radioterapia no tumor venéreo transmissível em cães. Vet. e Zootec. 2014 jun.; 21(2): 279-287. 286 utilizados (4). No presente trabalho a presença da equipe multidisciplinar, constituída por médicos veterinários, físico e técnico em radiologia, corroborou para a excelência dos resultados atingidos. Os resultados obtidos reforçaram as orientações de Thrall (13) de que para sua efetividade, a radioterapia depende de alguns fatores tais como um bom posicionamento do animal, um aparelho especializado e um técnico capaz de manipulá-lo corretamente. Estes fatores foram essenciais para o sucesso dos tratamentos ora relatados. O técnico em radiologia, acompanhado do médico veterinário responsável pelo caso atuaram em tempo integral nas sessões de radioterapia. A radioterapia apresentou-se como uma opção para o tratamento isolado como verificado no caso 3, por não haver evidências de disseminação de metástases, por haver uma possibilidade finita de destruição do tumor e por se tratar de um tumor de células redondas. De acordo com Théon (12), os tumores que são diagnosticados e tratados em estágio precoce e anteriormente ao aparecimento de metástases com freqüência são curáveis pela radioterapia. Nos casos 1 e 2 a radioterapia foi associada com a quimioterapia, por se tratar de doença localmente avançada e assim constituir uma abordagem mais promissora. Os esquemas das terapias combinadas podem ser simultâneos, com ambas as modalidades administradas próximas, ou alternadas, como os tratamentos fornecidos em modelo não sobreposto. A abordagem combinada simultaneamente, como no animal 2 utiliza dose intensiva, aproveitando a atividade complementar independente da radioterapia local e da quimioterapia sistêmica (cooperação espacial) e a atividade local potencialmente aumentada (dentro do campo radioterápico). A associação também foi selecionada para colaborar no alívio dos sintomas e, em especial, no sangramento, e deste modo possibilitar uma vida mais confortável para o animal e seu proprietário. Uma substancial melhora no tratamento do câncer poderia ser obtida imediatamente se todos os animais recebessem o melhor tratamento disponível. Isso requer que os veterinários individualmente compreendam o potencial dos tratamentos disponíveis e, em especial, a vantagem dos atendimentos multidisciplinares no momento do diagnóstico e do tratamento inicial. CONCLUSÕES Conclui-se que a radioterapia é passível de ser utilizada na rotina clínica isolada ou combinada à quimioterapia, desde que se tenham as fontes de radiação adequadas. A melhora substancial no tratamento do câncer poderia ser obtida imediatamente se todos os animais recebessem o melhor tratamento disponível. Isso requer que os veterinários individualmente compreendam o potencial dos tratamentos disponíveis e, em especial, a vantagem dos atendimentos multidisciplinares no momento do diagnóstico e do tratamento inicial. REFERÊNCIAS 1. Cunha SCS, Carvalho LAV, Canary PC, Reisner M, Pereira NA, Corgozinho KB, et al. Aplicação da radioterapia em felino portador de carcinoma epidermóide nasal e palpebral utilizando protocolo de hipofracionamento. Acta Sci Vet. 2007;35:239-43. 2. Burk RL, King GK. The veterinary clinics of north america – small animal practice: radiation oncology. Philadelphia - USA: W.B. Saunders Company; 1997. 3. Morris J, Dobson J. Oncologia em pequenos animais. 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