MODELAGEM HIDROLÓGICA APLICADA AO PLANEJAMENTO DOS RECURSOS HÍDRICOS NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO ACRE MARCELO DE OLIVEIRA LATUF Presidente Prudente Outubro de 2011 2 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA Faculdade de Ciências e Tecnologia Campus de Presidente Prudente MODELAGEM HIDROLÓGICA APLICADA AO PLANEJAMENTO DOS RECURSOS HÍDRICOS NA BACIA HIDROGRÁFICA DO RIO ACRE MARCELO DE OLIVEIRA LATUF Orientador: Paulo Cesar Rocha Tese apresentada ao Programa de Pós- graduação em Geografia da FCT/UNESP, como requisito parcial para obtenção do Título de Doutor em Geografia. Área de Concentração: Dinâmica e Gestão Ambiental Presidente Prudente 2011 3 FICHA CATALOGRÁFICA Latuf, Marcelo de Oliveira. L386m Modelagem hidrológica aplicada ao planejamento dos recursos hídricos na bacia hidrográfica do rio Acre / Marcelo de Oliveira Latuf. - Presidente Prudente : [s.n], 2011 xxii, 240 f. : il. Orientador: Paulo Cesar Rocha Tese (doutorado) - Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Tecnologia Inclui bibliografia 1. Recursos hídricos. 2. Rio Branco. 3. Acre. I. Rocha, Paulo Cesar. II. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências e Tecnologia. III. Título. iii 4 iv 5 Dedico este trabalho À minha esposa, Vanessa Latuf, por me fazer não desistir ao longo desta caminhada. v 6 AGRADECIMENTOS A Deus, pelo dom da vida e por dar-me forças para a conclusão deste trabalho. À Universidade Estadual Paulista (UNESP), campus de Presidente Prudente, por intermédio do Departamento de Geografia, pela oportunidade de realização deste curso. Ao Professor Paulo Cesar Rocha, meu orientador, pela amizade estabelecida ao longo destes últimos anos. Obrigado por entender minha situação e sempre apoiá-la, mas acima de tudo, pela confiança depositada neste trabalho e em minha pessoa. Espero que nossa parceria possa ser duradoura em muitos projetos. Obrigado PC! À minha esposa Vanessa Latuf que sempre esteve ao meu lado, apoiando-me em diversas etapas de minha vida. Obrigado pelo seu carinho, compreensão e entrega. Te amo meu amor, obrigado por tudo! À minha família, minha Mãe Gislene, minhas tias e tios, minhas irmãs Glória e Gisele e a meu sobrinho Pedro Henrique, que este trabalho possa servir de exemplo que com estudo e determinação a gente chega lá. À minha outra família, que me acolheu como filho, ao meu sogro Sr. Deusdeth e à minha sogra Sra. Lúcia, sempre apoiando e sendo generosos, obrigado. Ao meu grande amigo Lúcio Flávio, o grande responsável por levar-me para o Acre. Obrigado pelas diversas insistências! Por seus méritos, cresci muito trabalhando neste estado. Força para superar todas as adversidades, e lembre-se, você sempre poderá contar comigo! A todos(as) amigos(as) acreanos(as), em especial a Emanuel Amaral, pela amizade e companheirismo, a Willian Flores pelos conselhos e amizade e a Eufran Amaral, pelos ensinamentos, amizade e insistência por buscar um Acre ambientalmente mais justo. À Gilnei e Cris, meus anjos da guarda, que abriram as portas de sua casa para mim. Muito obrigado pelo suporte e amizade, e saibam que sem vocês em minha vida eu não teria conseguido chegar até aqui, Obrigado! vi 7 Aos amigos e amigas inseparáveis de Presidente Prudente, em especial a Ricardo Bozza (bob), Odair Sonegatti, Alexandre Bergamin e sua esposa Cláudia, Fernanda e Beatriz, pelo convívio sempre descontraído. Vocês estarão sempre em meus pensamentos, boa sorte a todos(as) e espero reencontrá-los(as) sempre! Ao grande amigo Maurício Foganholo pela amizade e ao sempre harmonioso convívio na república “café com leite”, meu Obrigado! Aos colegas da pós-graduação em Geografia, em especial a Caio Augusto, Leandro “Astorrga”, Edilson Pereira, Denise Bomtempo, Sônia e seu marido Divino, Luiz Carlos Flávio, Túlio, Atamis, Sampaio dentre outros, abraço a todos(as). Aos amigos do curso de Geografia da Universidade Federal da Bahia pela amizade, companheirismo e pela coragem no desenvolvimento de uma Geografia crítica e compromissada no Oeste Baiano, em especial a Evanildo Cardoso, Marcos Mondardo, Paulo Baqueiro e Ricardo Reis. Aos funcionários do Departamento de Geografia e da Pós-Graduação em Geografia, pelo suporte e dedicação, em especial nas pessoas de Lúcia e Cinthia, respectivamente. A todos(as) os(as) demais amigos(as), professores(as) e funcionários(as) que, direta ou indiretamente, contribuíram para a realização deste trabalho, o meu sincero agradecimento. vii 8 “Os cientistas não são de forma alguma os capitães do navio da sociedade humana, mas estão na posição do homem no topo do mastro que vê mais longe do que o resto da tripulação”. (H. Thirring) viii 9 SUMÁRIO LISTA DE FIGURAS .................................................................................................................... 11 LISTA DE GRÁFICOS .................................................................................................................. 15 LISTA DE TABELAS ................................................................................................................... 17 LISTA DE SIGLAS ....................................................................................................................... 19 RESUMO ....................................................................................................................................... 21 ABSTRACT ................................................................................................................................... 22 INTRODUÇÃO .............................................................................................................................. 23 JUSTIFICATIVA ........................................................................................................................... 25 PROBLEMA .................................................................................................................................. 27 HIPÓTESE ..................................................................................................................................... 28 OBJETIVOS ................................................................................................................................... 28 Objetivo geral ................................................................................................................................. 28 Objetivos específicos ...................................................................................................................... 28 CAPÍTULO I .......................................................................................................................... 30 LOCALIZAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO ............................. 30 1.1. Geologia ................................................................................................................... 35 1.2. Clima ........................................................................................................................ 41 1.3. Rede hidrográfica ................................................................................................... 43 1.4. Geomorfologia ......................................................................................................... 48 1.4.1. Planície aluvial ......................................................................................... 48 1.4.2. Depressão do Endimari-Abunã ................................................................ 50 1.4.3. Depressão do Iaco-Acre ........................................................................... 51 1.4.4. Depressão de Rio Branco ......................................................................... 52 1.4.5. Depressão do Juruá-Iaco .......................................................................... 52 1.5. Solos na bacia do rio Acre ...................................................................... 53 1.5.1. Argissolos ............................................................................................... 53 1.5.2. Plintossolos .......................................................................................... 55 1.5.3. Luvissolos ............................................................................................ 57 1.5.4. Gleissolos ............................................................................................. 58 1.5.5. Latossolos ............................................................................................ 60 1.6. Uso e ocupação do solo ........................................................................................... 62 CAPÍTULO II ......................................................................................................................... 64 ix 10 REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO ............................................................. 64 2.1. A bacia hidrográfica como um sistema natural .................................................... 65 2.2. Planejamento e gestão dos recursos hídricos ........................................................ 68 2.3. Modelos hidrológicos: características, potenciais e limitações ............................ 75 2.4. O modelo IPH II de transformação chuva x vazão .............................................. 85 2.4.1. Algoritmo de perdas por evaporação e interceptação ................................. 86 2.4.2. Algoritmo de separação do escoamento ..................................................... 87 2.4.3. Algoritmo de propagação dos escoamentos superficiais e subterrâneos .... 93 CAPÍTULO III ....................................................................................................................... 96 MATERIAL E MÉTODOS ................................................................................................... 96 3.1. Inventariação de dados hidrológicos ..................................................................... 97 3.1.1. Precipitação ................................................................................................ 98 3.1.2. Vazões ...................................................................................................... 100 3.2. Calibração do modelo hidrológico IPH II ........................................................... 103 3.2.1. Entrada de dados ....................................................................................... 103 3.3. Simulação de cenários de comportamento para 2030 ........................................ 113 CAPÍTULO IV ...................................................................................................................... 117 RESULTADOS E DISCUSSÕES ....................................................................................... 117 4.1. Inventário de dados hidrológicos a montante de Rio Branco ........................... 118 4.1.1. Precipitação .............................................................................................. 118 4.1.2. Vazões ...................................................................................................... 139 4.1.2.1. Vazões médias ................................................................................... 139 4.1.2.2. Vazões máximas ................................................................................ 145 4.1.2.3. Vazões mínimas ................................................................................. 151 4.1.2.4. Vazões obtidas da curva de permanência .......................................... 157 4.2. Calibração de modelo chuva-vazão IPH II ......................................................... 160 4.3. Simulação de comportamentos hidrológicos ....................................................... 176 4.3.1. Simulação da mancha de inundação ocorrida em 1988 ............................ 177 4.3.2. Comportamento estimado da vazão máxima para 2030 ........................... 188 4.3.3. Comportamento estimado da vazão mínima para 2030............................ 206 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 216 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 218 x 11 LISTA DE FIGURAS Figura 1. Localização da bacia do rio Acre no contexto político da tríplice fronteira ................... 32 Figura 2. Localização da bacia do rio Acre no contexto da bacia do rio Purus ............................. 33 Figura 3. Divisões da bacia do rio Acre no contexto político internacional (Brasil, Bolívia e Peru) ........................................................................................................................................................ 34 Figura 4. Localização da Bacia do Acre no contexto geotectônico amazônico. a) Formação Solimões. Adaptado de Bezerra (2003) citado por Cavalcante (2006) .......................................... 35 Figura 5. Unidades litoestratigráficas na bacia do rio Acre ........................................................... 38 Figura 6. Hipótese de evolução da paisagem proposta por Amaral (2007) para o estado do Acre 40 Figura 7. Precipitação média na bacia do rio Acre, de acordo com dados das Normais Climatológicas do INMET (1961 a 1990) ...................................................................................... 42 Figura 8. UGRHs definidas pelo PLERH para a bacia do rio Acre, no estado do Acre ................ 45 Figura 9. Modelo digital de elevação hidrologicamente consistente (MDEHC) da bacia do rio Acre ................................................................................................................................................ 46 Figura 10. Mapa de declividades da bacia do rio Acre extraído do MDEHC ................................ 47 Figura 11. Unidades geomorfológicas na bacia do rio Acre. Adaptado de SIPAM/IBGE (2004) . 49 Figura 12. Classes de solos na bacia do rio Acre ........................................................................... 54 Figura 13. Perfil modal de Argissolos no estado do Acre. (A) Prisma pedológico, em escala e com a indicação dos horizontes. (B) Padrão fisiográfico na imagem de satélite LANDSAT TM 5. (C) Paisagem de ocorrência. (D) Localização no estado do Acre. Fonte: ACRE (2006). .................... 55 Figura 14. Perfil modal de Plintossolo no Estado do Acre. (A) Prisma pedológico, em escala e com a indicação dos horizontes. (B) Padrão fisiográfico na imagem de satélite LANDSAT TM 5. (C) Paisagem de ocorrência. (D) Localização no Estado do Acre. Fonte: ACRE (2006). ............. 56 Figura 15. Perfil modal de Luvissolo no Estado do Acre. (A) Prisma pedológico, em escala e com a indicação dos horizontes. (B) Padrão fisiográfico na imagem de satélite LANDSAT TM 5. (C) Paisagem de ocorrência. (D) Localização no Estado do Acre. Fonte: ACRE (2006) .................... 57 Figura 16. Perfil modal de Gleissolo no Estado do Acre. (A) Prisma pedológico, em escala e com a indicação dos horizontes. (B) Padrão fisiográfico na imagem de satélite LANDSAT TM 5. (C) Paisagem de ocorrência. (D) Localização no Estado do Acre. Fonte: ACRE (2006) .................... 59 Figura 16a. Perfil modal de Neossolo Flúvico no Estado do Acre. (A) Prisma pedológico, em escala e com a indicação dos horizontes. (B) Padrão fisiográfico na imagem de satélite LANDSAT TM 5. (C) Paisagem de ocorrência. (D) Localização no Estado do Acre. Fonte: ACRE (2006) ............................................................................................................................................. 60 Figura 17. Perfil modal de Latossolo no Estado do Acre. (A) Prisma pedológico, em escala e com a indicação dos horizontes. (B) Padrão fisiográfico na imagem de satélite LANDSAT TM 5. (C) Paisagem de ocorrência. (D) Localização no Estado do Acre. Fonte: ACRE (2006) .................... 61 Figura 18. Localização de Terras Indígenas na bacia do rio Acre ................................................. 62 Figura 19. Localização de Unidades de Conservação na bacia do rio Acre ................................... 62 Figura 20. Localização de Projetos de Assentamentos do INCRA na bacia do rio Acre ............... 63 xi 12 Figura 21. Algoritmo de perdas por evaporação e interceptação. Fonte: Mine (1998) .................. 86 Figura 22. Aplicação da equação da continuidade na camada superior do solo. Fonte: Mine (1998) ........................................................................................................................................................ 88 Figura 23. Representação das funções do algoritmo de separação do escoamento. Fonte: Mine (1998) ............................................................................................................................................. 89 Figura 24. Situações contempladas pelo algoritmo de separação de escoamento .......................... 92 Figura 25. Histograma tempo-área pelo método de Clark (1945). Mine (1998) ............................ 93 Figura 26. Isócronas e histograma tempo-área pelo método de Clark (1945). Bravo et al. (2006) 94 Figura 27. Formas do histograma sintético para diferentes valores de n. Silva (2006).................. 94 Figura 28. Rede de postos pluviométricos na bacia do rio Acre e arredores ................................. 97 Figura 29. Rede de postos fluviométricos na bacia do rio Acre ..................................................... 98 Figura 30. Localização das estações pluviométricas utilizadas ...................................................... 99 Figura 31. Estações pré-selecionadas para a bacia hidrográfica do rio Acre ............................... 101 Figura 32. Método de obtenção de dados das estações fluviométricas (tela do SisCAH 1.0) ..... 102 Figura 33. Importação de dados das estações fluviométricas (tela do SisCAH 1.0) .................... 102 Figura 34. Módulo entrada de dados do software WIN_IPH2 ..................................................... 105 Figura 35. Grade de 4x4 km das imagens do Hidroestimador para área de interesse .................. 106 Figura 36. Estimativa de evapotranspiração real média diária - janeiro/2004 ............................. 107 Figura 37. Estimativa de evapotranspiração real média diária - setembro/2004 .......................... 107 Figura 38. Métodos de separação de escoamento (superficial e subterrâneo). (Tucci, 2009) ...... 109 Figura 39. Módulo “Limites de Parâmetros” do software WIN_IPH2 ........................................ 110 Figura 40. Funções objetivo disponíveis no software WIN_IPH2 (Bravo et al., 2007) ............... 112 Figura 41. Evidência de alta correlação espacial entre áreas desmatadas (a) e evapotranspiração (b) ................................................................................................................................................. 115 Figura 42. Precipitação média na bacia do rio Acre ..................................................................... 119 Figura 43. Imagens da “grande seca” de 2005. Fonte: Google imagens (2011) .......................... 120 Figura 44. Comportamento da precipitação em Rio Branco (Duarte, 2005) ................................ 138 Figura 45. Variações do traçado de curvas de permanência......................................................... 157 Figura 46. Critérios de outorga nos estados da federação em 2006. (Marques, 2006) ................. 158 Figura 47. Amostra do campo de precipitação do Hidroestimador em 10/02/2005 para a bacia do rio Acre ......................................................................................................................................... 169 Figura 48. Correlação diária entre postos pluviométricos e dados do Hidroestimador Fonte: Saldanha et al. (2007) ................................................................................................................... 172 Figura 49. MDE obtido pelo sensor SRTM .................................................................................. 179 Figura 50. MDE com resolução espacial de 5 m do centro da capital acreana ............................ 179 Figura 51. Relações altimétricas e cotas do rio Acre - estação 13600002 (Vectra, sem data) ..... 180 Figura 52. Mancha de inundação registrada em 1988 (cota linimétrica 17,11 m) ....................... 182 xii 13 Figura 53. Mancha de inundação registrada em 1988 (cota linimétrica 17,11 m), sob fotos aéreas de 2006. ........................................................................................................................................ 183 Figura 54. Mancha de inundação registrada em 1988 (cota linimétrica 17,11 m), sob fotos aéreas de 2006 (detalhe 1) ....................................................................................................................... 184 Figura 55. Mancha de inundação registrada em 1988 (cota linimétrica 17,11 m), sob fotos aéreas de 2006 (detalhe 2) ....................................................................................................................... 185 Figura 56. Nível do rio Acre na região da Gameleira em época de cheia (Fonte: Google Imagens, 2011) ............................................................................................................................................. 186 Figura 57. Localização dos perfis topográficos ............................................................................ 186 Figura 58. Perfis topográficos elaborados no rio Acre ................................................................. 187 Figura 59. Áreas desmatadas em 1988, 2005 e estimativa para 2030 na bacia contribuinte à estação 13600002 ......................................................................................................................... 189 Figura 60. Média de previsão de 15 modelos climáticos (IPCC, 2008) ....................................... 191 Figura 61a. Evapotranspiração estimada para os meses de 2030, caso haja o incremento de áreas desmatadas previstas por Soares Filho et. al. (2008) .................................................................... 192 Figura 61b. Evapotranspiração estimada para os meses de 2030, caso haja o incremento de áreas desmatadas previstas por Soares Filho et. al. (2008) .................................................................... 193 Figura 62a. Dados de entrada para a simulação de comportamento hidrológico das vazões máximas em 2030 ......................................................................................................................... 195 Figura 62b. Dados de entrada para a simulação de comportamento hidrológico das vazões máximas em 2030 ......................................................................................................................... 196 Figura 63. Comparativo das áreas de inundação provocadas pela enchente de 1988 (cota de 17,11m) e projeção de 2030 (cota de 21m) .................................................................................. 199 Figura 64. Comparativo das áreas de inundação provocadas pela enchente de 1988 (cota de 17,11m) e projeção de 2030 (cota de 21m) – detalhe 1 ................................................................ 200 Figura 65. Comparativo das áreas de inundação provocadas pela enchente de 1988 (cota de 17,11m) e projeção de 2030 (cota de 21m) – detalhe 2 ................................................................ 201 Figura 66. Diferentes níveis de inundação associados às cotas altimétricas ................................ 202 Figura 67. Diferentes níveis de inundação associados às cotas altimétricas (isolinhas) .............. 203 Figura 68a. Inundação em Rio Branco (abril 2011). Fonte: www.pagina20.com.br ................... 204 Figura 68b. Inundação em Rio Branco (abril 2011). Fonte: www.pagina20.com.br ................... 205 Figura 69. Localização da área registrada com inundação em abril de 2011 ............................... 205 Figura 70. Nível das águas do rio Acre em setembro de 2005 (sem data) ................................... 209 Figura 71. Nível das águas do rio Acre em 29/08/2011. (Fonte: AC24 horas, 2011) .................. 214 Figura 72. Nível das águas do rio Acre em 29/08/2011. (Fonte: AMARAL, 2011) .................... 214 Figura 73. Confirmação do nível das águas do rio Acre em 29/08/2011. (Fonte: SNIRH, 2011) 215 ANA. Agência Nacional de Águas. Sistema Hidroweb. Disponível em: . Acesso em 28/11/2010. ............................................................... 218 xiii 14 COSTA, J. C.. A Conquista do Deserto Ocidental: subsídios para a história do Território do Acre. São Paulo: Nacional. (2005[1924]). In: MORAIS, M. J. “Acreanidade”: Invenção e reinvenção da identidade acreana. Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2008. (Tese de Doutorado). ...................................................................................................................................................... 219 MARENGO, J. A. e VALVERDE, M. C. Caracterização do clima no século XX e cenário de mudanças de clima para o Brasil no século XXI usando modelos do IPCC-AR4. Campinas: Revista Multiciência, 24p., 2005. ................................................................................................. 221 MOLION, L. C. B. Perspectivas climáticas para os próximos 20 anos. Revista Brasileira de Climatologia. 12p, 2008. (ISSN 1980-055X). .............................................................................. 221 MORAIS, M. J. “Acreanidade”: Invenção e reinvenção da identidade acreana. Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2008. (Tese de Doutorado). .................................................. 221 SEMA. Secretaria de Estado de Meio Ambiente. Banco de fotos da seca de 2005. Sem data. . 223 SILVA, J. B. L. Modelos de previsão de enchentes em tempo real para o município de Nova Era-MG. Viçosa: Universidade Federal de Viçosa, 2006. (Tese de Mestrado). ......................... 223 SIPAM. Sistema de Proteção da Amazônia. Banco de dados espaciais do projeto “Banco de Dados de Recursos Naturais da Amazônia Brasileira”, realizado em parceira com IBGE/CISCEA/SIPAM (1999). Porto Velho: SIPAM, 2004. ...................................................... 223 xiv 15 LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1. Separação de escoamentos entre 01/01/2003 a 21/01/2004 ........................................ 109 Gráfico 2. Precipitação média anual para a bacia do rio Acre a montante de Rio Branco ........... 118 Gráfico 3. Desvios em relação à média histórica ......................................................................... 121 Gráfico 5. Mudanças de tendências associadas a eventos de El Niño e La Niña ......................... 123 Gráfico 6. Distribuição anual de lâminas precipitadas médias mensais ....................................... 124 Gráfico 7. Identificação de meses chuvosos e secos .................................................................... 124 Gráfico 8. Distribuição média mensal da precipitação na estação Assis Brasil ........................... 125 Gráfico 9. Variações da precipitação em torno da média (estação Assis Brasil) ......................... 126 Gráfico 10. Tendências observadas (estação Assis Brasil) .......................................................... 127 Gráfico 11. Distribuição média mensal da precipitação na estação Brasiléia .............................. 128 Gráfico 12. Variações da precipitação em torno da média (estação Brasiléia) ............................ 128 Gráfico 13. Distribuição média mensal da precipitação na estação Cobija .................................. 130 Gráfico 14. Variações da precipitação em torno da média (estação Cobija) ................................ 130 Gráfico 15. Variações da precipitação após 1970 (estação Cobija) ............................................. 131 Gráfico 16. Tendência ajustada para a estação Cobija ................................................................. 133 Gráfico 17. Distribuição média mensal da precipitação na estação Xapuri ................................. 133 Gráfico 18. Variações da precipitação em torno da média (estação Xapuri) ............................... 134 Gráfico 19. Distribuição média mensal da precipitação na estação Fazenda Santo Afonso ........ 135 Gráfico 20. Variações da precipitação em torno da média (estação Fazenda Santo Afonso) ...... 136 Gráfico 21. Distribuição média mensal da precipitação na estação UFAC .................................. 137 Gráfico 22. Variações da precipitação em torno da média (estação UFAC) ................................ 137 Gráfico 23. Ajuste de tendência para a estação UFAC ................................................................ 139 Gráfico 24. Distribuição média mensal da vazão na estação 13600002 (Rio Branco) ................ 141 Gráfico 25. Variações das vazões médias anuais em torno da média (estação 13600002) .......... 142 Gráfico 26. Desvios em relação à média histórica de vazões médias (estação 13600002) .......... 143 Gráfico 27. Ajuste de tendência no período 1971 a 2005 - Qmédia (estação 13600002) ............ 144 Gráfico 28. Variações de média e desvio padrão entre 1971/1987 e 1988/2005 (estação 13600002) ...................................................................................................................................................... 144 Gráfico 29. Ocorrência de vazões máximas (estação 13600002) ................................................. 145 Gráfico 30. Variações das vazões máximas anuais em torno da média (estação 13600002) ....... 147 Gráfico 31. Ajuste de tendência no período 1971 a 2005 - Qmáxima (estação 13600002) ......... 147 Gráfico 32. Ajuste de tendência no período 1971 a 2010 - Qmáxima (estação 13600002) ......... 148 Gráfico 33. Número de dias chuvosos no período 1971 a 2010 para a BMRB ............................ 149 Gráfico 34. Desvios em relação à média histórica de vazões máximas (estação 13600002) ....... 150 xv 16 Gráfico 35. Ocorrência de vazões mínimas (estação 13600002) ................................................. 153 Gráfico 36. Variações das vazões mínimas anuais em torno da média (estação 13600002)........ 153 Gráfico 37. Ajuste de tendência no período 1971 a 2005 - Qmínima (estação 13600002) .......... 154 Gráfico 38. Variações de tendências das vazões mínimas (estação 13600002) ........................... 155 Gráfico 39. Desvios em relação à média histórica de vazões mínimas (estação 13600002) ....... 156 Gráfico 40. Curva de permanência obtida para a estação 13600002 ............................................ 159 Gráfico 41. Calibração do biênio 1987/1988 adotando F.O. Desvio absoluto médio .................. 162 Gráfico 42. Correlação entre vazões observadas e estimadas (1988) - F.O. Desvio absoluto médio ...................................................................................................................................................... 162 Gráfico 43. Correlação entre vazões observadas e estimadas (1988) - F.O. Desvio relativo médio ...................................................................................................................................................... 164 Gráfico 44. Calibração do biênio 1987/1988 adotando F.O. Desvio relativo médio ................... 164 Gráfico 45. Correlação entre vazões observadas e estimadas (2005) - F.O. Desvio relativo médio ...................................................................................................................................................... 167 Gráfico 46. Calibração do biênio 2004/2005 adotando F.O. Desvio relativo médio ................... 168 Gráfico 47. Calibração do biênio 2004/2005 adotando F.O. Desvio padrão o inverso das vazões ...................................................................................................................................................... 170 Gráfico 48. Correlação entre vazões observadas e estimadas (2005) - F.O. Coef. Nash e Sutcliffe ...................................................................................................................................................... 171 Gráfico 49. Calibração do biênio 2004/2005 adotando F.O. Coef. Nash e Sutcliffe ................... 171 Gráfico 50. Correlação entre vazões observadas e estimadas (2005) - F.O. Desvio quadrado relativo médio ............................................................................................................................... 173 Gráfico 51. Calibração do biênio 2004/2005 adotando F.O. Desvio quadrado relativo médio ... 174 Gráfico 52. Correlação entre cota altimétrica e cota linimétrica da estação 13600002 ............... 180 Gráfico 53. Desmatamento na bacia a montante da estação 13600002 ........................................ 188 Gráfico 54. Simulação de cenário de comportamento hidrológico para 2029 e 2030 .................. 197 Gráfico 55. Relação vazão x cota para estação 13600002 ........................................................... 198 Gráfico 56. Estimativa de crescimento da população urbana da cidade de Rio Branco/AC ........ 207 Gráfico 57. Simulação de cenário de comportamento hidrológico para 2029/2030 (Qmínima) . 209 Gráfico 58. Estimativas de vazões captadas para abastecimento humano ................................... 211 xvi 17 LISTA DE TABELAS Tabela 1. Feições estratigráficas das unidades aflorantes na bacia hidrográfica do rio Acre ........ 37 Tabela 2. Unidades litoestratigráficas encontradas na bacia do rio Acre, apenas em território brasileiro ......................................................................................................................................... 37 Tabela 3. Características morfométricas da bacia do rio Acre e da bacia a montante da seção fluviométrica Rio Branco ............................................................................................................... 44 Tabela 4. Unidades geomorfológicas encontradas na bacia do rio Acre, apenas em território brasileiro ......................................................................................................................................... 48 Tabela 5. Classes de solos encontrados na bacia do rio Acre, apenas em território brasileiro....... 53 Tabela 6. Modelos para o planejamento e gerenciamento de recursos hídricos ............................. 81 Tabela 7. Métodos adotados para o ajuste de modelos hidrológicos .............................................. 84 Tabela 8. Parâmetros do modelo IPH II ......................................................................................... 85 Tabela 9. Lista de estações pluviométricas utilizadas .................................................................... 99 Tabela 10. Estações fluviométricas pré-selecionadas e período de observações ......................... 101 Tabela 11. Parâmetros a serem ajustados pela etapa de calibração .............................................. 110 Tabela 12. Dados de entrada para a realização dos testes de calibração ...................................... 111 Tabela 13. Ocorrência de El Niños no período-base selecionado ................................................ 122 Tabela 14. Ocorrência de La Niñas no período-base selecionado ................................................ 122 Tabela 15 - Teste de estacionariedade da série de vazões médias anuais .................................... 140 Tabela 16 - Teste de estacionariedade da série de vazões máximas anuais ................................. 146 Tabela 17. Amplitudes entre os valores registrados de vazões máximas (1971 a 2005) ............. 150 Tabela 18. Vazões máximas anuais associadas aos períodos de retorno de 10, 20 e 30 anos ...... 151 Tabela 19 - Teste de estacionariedade da série de vazões mínimas anuais .................................. 152 Tabela 20. Vazões mínimas Q7 associadas aos períodos de retorno de 10, 20 e 30 anos ............ 156 Tabela 21. Vazões de permanência para a estação 13600002 ...................................................... 159 Tabela 22. Lista de estações pluviométricas utilizadas na calibração do biênio 1987/1988 ........ 160 Tabela 23. Evapotranspiração média mensal na cidade de Rio Branco ....................................... 160 Tabela 24. Resultados das calibrações por funções-objetivo (anos 1987/1988) .......................... 161 Tabela 25. Dados e valores de entrada utilizados na calibração do biênio 2004/2005 ................ 165 Tabela 26. Evapotranspiração média diária e mensal estimada pelo produto MOD16A ............. 166 Tabela 27. Lista de estações pluviométricas utilizadas na calibração do biênio 2004/2005 ........ 166 Tabela 28. Resultados das calibrações por funções-objetivo para o Teste 1 (anos 2004/2005) ... 167 Tabela 29. Resultados das calibrações por funções-objetivo para o Teste 2 (anos 2004/2005) ... 170 Tabela 30. Resultados das calibrações por funções-objetivo para o Teste 3 (anos 2004/2005) ... 173 Tabela 31. Dados comparativos entre as vazões máxima e mínima de 2005 (dados observados x dados estimados) .......................................................................................................................... 175 xvii 18 Tabela 32. Parâmetros ajustados* para o biênio 1987/1988 ........................................................ 175 Tabela 33. Parâmetros ajustados* para o biênio 2004/2005 ........................................................ 176 Tabela 34. Comparação entre as vazões de permanência observada e estimada para 2004/2005 176 Tabela 35. Desabrigados na enchente do rio Acre em 1988 ........................................................ 177 Tabela 36. Valores comparativos entre a evapotranspiração no biênio 2004/2005 e sua estimativa com incremento do desmatamento para o biênio 2029/2030 ....................................................... 192 Tabela 37. Dados comparativos entre a vazão de enchente de 1988 e projeção de 2030 ............ 197 Tabela 38. Relações entre cotas linimétricas e altimétricas para a estação 13600002 ................. 204 Tabela 39. Demanda projetada de água para 2030 ....................................................................... 208 Tabela 40. Dados comparativos entre a vazão mínima de 2005 e projeção de 2030 ................... 210 xviii 19 LISTA DE SIGLAS AIMP - Área impermeável ANA - Agência Nacional de Águas BMRB - Bacia a montante de Rio Branco CEDEC - Coordenadoria Estadual de Defesa Civil do estado do Acre CIDS - Centro Internacional de Desenvolvimento Sustentável CNRH - Conselho Nacional de Recursos Hídricos CTC - Capacidade de troca catiônica CT-HIDRO - Fundo Setorial de Recursos Hídricos ECO 92 - Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento EMBRAPA - Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária ETA - Estação de tratamento de água F.O. - Função-objetivo FGV - Fundação Getúlio Vargas GeoSNIC - Sistema de Geoprocessamento e Dados Cadastrais dos Municípios Brasileiro GOES-12 - Geostationary Operational Environmental Satellite GTZ - Agência de Cooperação Técnica Alemã HEC - Hydrologic Engineering Center HTA - Histograma tempo-área IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDW - Inverso do Quadrado da Distância INMET - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais INPE - Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais IPAM - Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia IPCC - Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas IPH - Instituto de Pesquisas Hidráulicas KML - Keyhole Markup Language LANDSAT-TM - Land Remote Sensing Satellite – Thematic Mapper MAP - Madre de Dios, Acre e Pando MDE - Modelo digital de elevação MDEHC - Modelo digital de elevação hidrologicamente consistente MMA - Ministério do Meio Ambiente MO - Matéria orgânica MODIS - Moderate Resolution Imaging Spectroradiometer xix 20 NASA - National Aeronautics Space and Administration NDC - Número de dias de chuva OMM - Organização Mundial de Meteorologia ONU - Organização das Nações Unidas pH - Potencial hidrogeniônico PLERH - Política Estadual de Recursos Hídricos do estado do Acre PNRH - Política Nacional dos Recursos Hídricos RLS - Reservatório linear simples SAERB - Serviço de Água e Esgoto de Rio Branco SCE-UA - Shuffled Complex Evolution - University of Arizona SEMA - Secretaria de Estado de Meio Ambiente SIG - Sistemas de Informação Geográfica SIPAM - Sistema de Proteção da Amazônia SisCAH - Sistema Computacional para Análises Hidrológicas SNIRH - Sistema Nacional de Informações sobre Recursos Hídricos SRTM - Shuttle Radar Topographic Mission TXT - Arquivo no formato texto UFAC - Universidade Federal do Acre UGRH - Unidade de Gerenciamento de Recursos Hídricos WIN_IPH2 - Software de calibração do modelo IPH II ZEE - Zoneamento Ecológico-Econômico xx 21 RESUMO A bacia hidrográfica do rio Acre localiza-se na porção Sul-Ocidental da Amazônia brasileira, palco de intensas modificações em sua estrutura socioeconômica e ambiental nas últimas décadas. Possui característica marcante por ser transfronteiriça, tendo terras localizadas além das fronteiras Brasileiras, em territórios da Bolívia e Peru, bem como fazendo divisas com o estado do Amazonas. O rio Acre é marcado por expressivas amplitudes em suas vazões diárias anuais, tendo este comportamento já sido registrado por expedicionários estrangeiros, em meados do século XIX. Assim, o presente trabalho objetiva- se na compreensão do comportamento hidrológico das vazões interanuais do rio Acre e das precipitações na área de drenagem da seção Rio Branco (13600002), localizada na cidade de Rio Branco/AC, bem como na elaboração de cenários de comportamento hidrológico para as vazões máxima e mínima, para o ano de 2030, por meio do uso de técnicas de modelagem hidrológica. Desta maneira, utilizou-se dados de pluviometria e fluviometria disponibilizados pela Agência Nacional de Águas (ANA), por meio do sistema Hidroweb, sendo o tratamento dos mesmos realizado através dos softwares Hidro 1.2 e SisCAH 1.0, respectivamente. Aliado a estes dados, foram utilizadas as informações das Normais Climatológicas de 1961-1990, registradas pelo Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) na estação localizada na Universidade Federal do Acre; bem como as imagens do campo de precipitação do satélite GOES-12, pela técnica Hidroestimador. Estes dados foram processados com o apoio do SIG ArcGIS 9.3 utilizando-se como referência as bases cartográficas do estado do Acre nas escalas de 1:100.000 e 1:250.000, além das bases disponibilizadas pela ANA na escala ao milionésimo. Ainda caracterizaram-se como insumos deste trabalho, as imagens do sensor MODIS, por meio do produto MOD16A (Evapotranspiração) para os anos de 2004 e 2005, além do shapefile da projeção de desmatamento para 2030, elaborado por Soares-Filho et al. (2008), cedido pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM). Quanto à estimativa de mudanças no padrão de chuvas na bacia, apoiou-se em informações do relatório técnico n.º IV, elaborado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). Com relação aos procedimentos de modelagem hidrológica utilizou-se o modelo IPH II, desenvolvido por Tucci et al. (1981), tendo os procedimentos de calibragem e simulação realizados pelo software WIN_IPH2, desenvolvido por Bravo et al. (2006). Resultados demonstram que o contínuo aumento das áreas desmatadas na bacia do rio Acre, aliado às projeções de crescimento populacional, aumento da evapotranspiração nos períodos de estiagem e mudanças no padrão de chuvas na bacia irão refletir um quadro crítico para 2030, trazendo projeções de aumento nas vazões de pico, bem como na diminuição das vazões de vazante; aumentando a vulnerabilidade de toda a população residente em Rio Branco/AC, seja pelo aumento na frequência de ocorrência de enchentes ou pelo risco de redução expressiva na disponibilidade de água, em épocas de estiagem. Desta forma, acredita-se estar subsidiando com este trabalho, ações de planejamento e gestão dos recursos hídricos da bacia hidrográfica do rio Acre, por meio do suporte ao Plano Estadual de Recursos Hídricos (PLERH), ainda em fase de elaboração, no que tange ao conhecimento sobre a dinâmica do rio Acre, bem como em projeções futuras de comportamento hidrológico crítico relacionados às vazões de enchente e estiagem, para o suporte à criação de um sistema de alerta mais eficiente para a bacia, além de alertar as autoridades competentes para o Planejamento do Uso do Solo mais criterioso às margens do rio Acre, na cidade de Rio Branco. Palavras-chave: Recursos hídricos, Rio Branco, Acre, Cenários de comportamento. xxi 22 ABSTRACT The Acre river watershed is located in South-Western Amazonia, Brazil, where in the last decades was focus in the intenses modifications on socioeconomics and environmental structure. The Acre river watershed has a singular characteristic to belong the three different countries, Brazil, Bolivia and Peru, as well as the Brazilian state of Amazonas. The Acre river is marked by expressive variability of its annual flows, being registered by foreign voyager in last part of century XIX. Thus, this thesis focus on the hydrological behaviour comprehension of the Acre river annual flows, and the rainfall behaviour on the Rio Branco’s monitoring station watershed (13600002), located in Rio Branco/AC city, beyond the scenarios projections preparation of the hydrological behaviour for the maximum and minimum flows, to the 2030, by using hydrological modelling techniques. In this way, were used rainfall and flows data from Waters Brazilian National Agency (ANA), by the access of the Hidroweb system and these databases were processed by Hidro 1.2 and SisCAH 1.0 software’s. Beyond these data’s were also used the Climatological Normal (1961-1990) by the Meteorological Brazilian National Institute (INMET) to the unique monitoring point located at Federal University of Acre, and the field precipitation images from GOES-12 satellite, by the Hidroestimator technique. These databases were processed by ArcGIS 9.3 software using the Acre State cartographical references on the 1:100,000 and 1:250,000, as well as the ANA references in 1:1,000,000. Others sources of this work were the images of MODIS sensor by the MOD16A product (Evapotranspiration) for the 2004 and 2005, as well as the deforestation projection for 2030 elaborated by Soares Filho et al. (2008), given by Amazon Institute of Environmental Research (IPAM). To the rainfall behaviour evaluation was used technical report N.° IV elaborated by Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC). To the hydrological modelling procedures was used the IPH II model developed by Tucci et al. (1981), but the calibration and simulation stages were executed by WIN_IPH2 software, developed by Bravo et al. (2006). Results shows that deforestation rates on the Acre river watershed is increasing, as well as the urban population growing, plus the evapotranspiration rates and the rainfall standards distribution are misbalanced, and will cause a critical situation in 2030, bringing increasing projections of peak flows, beyond the lower minimum flows, affecting the Rio Branco’s urban population, being increasing the floods frequencies or by the water availability reduction in dry seasons. In this way, believes with this research which water resources planning and management actions at Acre river could be executed, by the support to the Acre State Water Resources Plan (PLERH), in discussion phase, collaborating to amplify of the Acre river hydrological behaviour, as well as the critical hydrological behaviour related to floods and minimum flows, to support an efficient alert system construction. Keywords: Water resources, Rio Branco, Acre, Behaviour scenarios. xxii 23 INTRODUÇÃO No planejamento e gestão dos recursos hídricos são prioritárias as ações na busca por melhorias no manejo do solo e água em áreas urbanas, agrícolas e florestais, na preservação de áreas de recarga dos aquíferos e de preservação permanente, além do controle do uso e cobertura do solo, de concessões de vazões, dos padrões de qualidade das águas, bem como na elaboração de planos de bacias e no apoio à estruturação de órgãos gestores, comitês e agências de bacia, dentre outros. As etapas do planejamento e gestão dos recursos hídricos são dependentes de dados e informações para a elaboração dos planos de bacias e, assim, ações em prol da implantação, ampliação e melhorias na rede hidrometeorológica de monitoramento são essenciais em todo o processo. O quadro de baixa densidade da rede hidrometeorológica é, infelizmente, uma característica da região Amazônica brasileira, devido às dificuldades de acesso e à diversidade e extensão das paisagens. Neste contexto, enquadra-se a bacia hidrográfica do rio Acre, localizada na porção Sul-Ocidental da Amazônia brasileira, palco de intensas modificações em sua estrutura socioeconômica e ambiental nas últimas décadas, e que possui característica marcante por ser transfronteiriça, tendo terras localizadas além das fronteiras Brasileiras, em territórios da Bolívia e Peru, bem como fazendo divisas com o estado do Amazonas. O rio Acre foi palco, entre o final do século XIX e início do século XX, de intensas disputas territoriais entre Brasileiros e Bolivianos, pela posse das terras e seringueiras, para a extração e posterior comercialização do látex. Além deste contexto histórico, o rio Acre é marcado por expressivas amplitudes em suas vazões diárias anuais, tendo este comportamento já sido registrado por expedicionários estrangeiros, em meados do século XIX. A bacia do rio Acre encontra-se na porção Sudeste do estado do Acre, região esta que concentra a maior parte da população do estado, bem como as maiores taxas de crescimento econômico. Entretanto, com o crescimento econômico desta região e consequente aumento populacional, impactos são observados na paisagem, como por exemplo, o avanço do desmatamento e queimadas. Aliado aos pulsos naturais das vazões diárias anuais do rio Acre, este crescimento econômico vem degradando terras ao longo da bacia e, possivelmente, alterando os padrões naturais de infiltração da água no solo, bem como o escoamento superficial, refletindo em pulsos com maiores magnitudes tanto das cheias, quanto das vazantes. 24 Caso este quadro permaneça inalterado, expressivos problemas estarão sendo projetados em um futuro próximo, ferindo um dos objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei N.º 9.433/97), do acesso à água em quantidade e qualidade às futuras gerações. Desta maneira, o presente trabalho objetiva compreender o comportamento hidrológico das vazões interanuais do rio Acre e das precipitações na área de drenagem da seção fluviométrica Rio Branco, localizada na cidade de Rio Branco/AC, bem como elaborar cenário de comportamento hidrológico da vazão máxima e mínima, para o ano de 2030, por meio do uso de técnicas de modelagem hidrológica e com o apoio de Sistemas de Informação Geográfica. Desta forma, acredita-se estar subsidiando ações de planejamento e gestão dos recursos hídricos na bacia hidrográfica do rio Acre, por meio do suporte ao Plano Estadual de Recursos Hídricos (PLERH), ainda em fase de elaboração, no que tange ao conhecimento sobre a dinâmica do rio Acre, bem como em projeções futuras de comportamento hidrológico crítico relacionados às vazões de enchente e estiagem, para o suporte à criação de um sistema de alerta mais eficiente para a bacia. Assim, a presente tese está dividida em quatro capítulos, além da Introdução, Justificativa, Problema, Hipótese e Objetivos, conforme a seguir: O Capítulo I refere-se à Localização e Caracterização da Área de Estudo, sendo apresentadas características quanto a geologia, clima, rede hidrográfica, geomorfologia, solos e uso e ocupação. Já o Capítulo II, Referencial Teórico-Metodológico, está subdividido em quatro sub-capítulos, relacionados aos temas da bacia hidrográfica como um sistema natural, ao planejamento e gestão dos recursos hídricos, aos modelos hidrológicos: características, potenciais e limitações e ao modelo de transformação chuva x vazão utilizado nesta tese, o IPH II. O Capítulo III, Material e métodos, foi subdividido em três etapas, sendo a primeira a realização da inventariação de dados hidrológicos sobre vazões e precipitações, adotando métodos consagrados de manipulação de dados hidrológicos. A segunda etapa consistiu na fase de calibração do modelo hidrológico IPH II, por meio do software WIN_IPH2, testando- se três diferentes entradas para a precipitação, que são: (a) por pluviômetros da ANA, (b) pelas imagens do campo de precipitação do Hidroestimador e (c) pela associação entre as duas anteriores. A terceira e, última etapa, caracterizou-se pela simulação de cenários para 2030, utilizando-se as estimativas de crescimento populacional, aumento da evapotranspiração e aumento da precipitação média. 25 Já o Capítulo IV, Resultados e discussões, foi subdividido em três sub-capítulos “Inventário de dados hidrológicos a montante de Rio Branco”, “Calibração de modelo chuva- vazão IPH II” e “Cenários de comportamentos associados às mudanças projetadas para 2030”. No primeiro sub-capítulo são apresentados os resultados e a discussão sobre a inventariação de dados hidrológicos de precipitações e vazões, os efeitos de oscilações entre períodos, além da tentativa de correlacionamento a eventos El Niño e La Niña. No segundo sub-capítulo é discutido o processo de calibração do modelo IPH II. Finalmente, o terceiro e último sub- capítulo, apresenta os resultados e as análises sobre as projeções realizadas para o comportamento das vazões máxima e mínima para 2030. Na sequência, apresentam-se as conclusões, referências bibliográficas e anexos. JUSTIFICATIVA Localizada na Amazônia ocidental, a bacia do rio Acre, um dos principais afluentes da margem direita do rio Purus, insere-se no contexto latino-americano de planejamento e gestão das águas e recursos hídricos em áreas transfronteiriças entre Brasil, Bolívia e Peru. Adentram ao estado do Acre águas oriundas da Bolívia, mas principalmente do Peru, por meio das bacias dos rios Acre, Iaco, Purus, Envira, Tarauacá e Juruá, alimentando as bacias hidrográficas dos rios Juruá e Purus, importantes afluentes da margem direita do rio Amazonas, sendo a bacia do Purus, por meio dos rios Purus e Acre, a rota navegável entre Rio Branco/AC e Manaus/AM. Desde seu reconhecimento, onde o explorador inglês Chandless (1866), em um de seus artigos sobre o rio Acre (Notes on the River Aquiry, the Principal Affluent of the River Purus), publicado pelo Journal of the Royal Geographical Society of London (Jornal da Real Sociedade Geográfica de Londres), relatava a observação nítida das marcas de cheias, além da descrição das vazantes e surgimento de áreas de plantio utilizadas por ribeirinhos e índios, associadas aos baixos níveis do rio. As variações anuais das vazões no rio Acre destacadas por Chandless (1866) estão associadas à própria dinâmica natural do sistema climático reinante na bacia, com dois períodos distintos relacionados à distribuição espaço-temporal e altura de lâminas precipitadas, bem como das condições geológicas e pedo-geomorfológicas da bacia do Acre, refletindo variações sazonais no comportamento hidrológico de suas vazões anuais. Em contrapartida, novas ações vêm intensificando as variações naturais das vazões, como o crescente aumento das áreas desmatadas na bacia, prejudicando a recarga dos 26 aquíferos e proporcionando maior escoamento superficial, afetando principalmente as magnitudes das cheias e a redução da disponibilidade hídrica em períodos de estiagem. Associado a este quadro, registra-se o aumento populacional das cidades lindeiras ao rio Acre, bem como das atividades do setor agropecuário e industrial, refletindo no aumento na demanda pelo consumo de água em quantidade e qualidade, além de projeções de alteração no regime de chuvas na bacia realizadas pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC). Deste modo, a compreensão da dinâmica hídrica do rio Acre é essencial para o planejamento e gestão da água e dos recursos hídricos, em ações de revitalização de nascentes e áreas de preservação permanente, recuperação de áreas degradadas, disseminação de técnicas de manejo do solo e água em áreas agrícolas, uso racional, abastecimento humano, dentre outros. Devido à particularidade da bacia do rio Acre ser transfronteiriça, o planejamento e a gestão da bacia devem se pautar na busca por ações conjuntas entre os governos do Brasil, Bolívia e Peru, em suas diferentes esferas de poder, subsidiando os gestores públicos, e o pleno diagnóstico sobre a dinâmica do comportamento hidrológico anual e interanual, para que fortaleçam-se as tomadas de decisões sobre o planejamento e gestão do território e dos recursos hídricos. Entretanto, o monitoramento contínuo, in loco, de parâmetros do ciclo hidrológico na bacia e na região Amazônica, infelizmente ainda caracteriza-se como insuficiente, devido às diversidades de ambientes, grandes distâncias, locais com extremas dificuldades de acesso, dentre outros fatores. Por este motivo, há uma baixa densidade de rede de monitoramento hidrometeorológica da Agência Nacional de Águas (ANA), quando comparadas às demais regiões brasileiras. Neste sentido, técnicas baseadas no imageamento por satélite, pautadas no processamento e interpretação de imagens, vêm minimizando o déficit de dados sobre o ciclo hidrológico em várias regiões do globo. Assim, o uso de dados de campos de precipitação do satélite geoestacionário GOES-12, bem como a possibilidade de utilização gratuita dos diversos produtos gerados pelo programa MODIS, do satélite Terra/Aqua, ambos pertencentes à Agência Espacial Norte-Americana (NASA), vêm modificando o quadro de conhecimento acerca dos processos hidrológicos na Amazônia brasileira. Desta maneira, quando associados os dados de campo e dados estimados por sensores orbitais a modelos hidrológicos de conversão chuva-vazão, há a concreta possibilidade de compreensão e previsão do comportamento da dinâmica de vazões, tornando- 27 se ferramentas extremamente úteis, devido à potencialidade da geração de estimativas de condições diferentes das observadas, ou seja, da realização de simulações. Assim, Moreira (2005) relata que “com o desenvolvimento da tecnologia computacional, os modelos hidrológicos têm tido sua utilização amplamente difundida, dado o desenvolvimento, disseminação e popularização das técnicas computacionais”. Moreira (2005) destaca ainda que “é possível simular respostas do comportamento das vazões, submetidos a modificações no padrão de precipitação (entrada), ou mesmo aos componentes do sistema, como por exemplo, capacidade de infiltração de água no solo, umidade antecedente, modificação da cobertura vegetal, crescimento urbano dentre outros”. O processo de modelagem tornar-se-á um dos potenciais caminhos para a consolidação dos objetivos e instrumentos da Política Nacional de Recursos Hídricos, possibilitando análises mais criteriosas quanto aos efeitos na dinâmica hidrológica das vazões relacionados a impactos de construções de barragens, modificação do uso do solo, transporte de sedimentos, concessão de outorgas, previsão de cheias e áreas de alagamentos, bem como a estimativa de secas. Desta maneira, a utilização de procedimentos de modelagem atinge um dos objetivos propostos por Christofoletti (1999) e não “estaciona” apenas no ajuste dos modelos, sendo que, deste modo, o modelo e o procedimento de modelagem tornam-se instrumentos de suporte a sistemas de apoio a decisões, no que tange à construção de um sistema de alerta para a previsão de cheias e secas extremas, vindo a contribuir para o planejamento e gestão dos recursos hídricos na bacia do rio Acre. PROBLEMA A cidade de Rio Branco/AC, localizada na bacia hidrográfica do rio Acre, é alvo de expressivas variações nas vazões anuais do rio Acre, trazendo transtornos para toda a população urbana do município. Estes transtornos estão associados na época de chuvas (inverno amazônico, de novembro a abril) à ocorrência de enchentes, afetando vários bairros da capital acreana. Entretanto, entre os meses de março a outubro, na época de estiagem (verão amazônico), constantes problemas relacionados ao desabastecimento público da capital são registrados, 28 devido principalmente às baixas vazões do rio Acre e ao expressivo percentual de perdas da rede de distribuição. Aliado a este quadro, o avanço do desmatamento na bacia, somados às projeções de crescimento populacional urbano e mudanças climáticas, inserem a bacia hidrográfica do rio Acre em um contexto de expressiva vulnerabilidade socioambiental. HIPÓTESE A região Amazônica caracteriza-se por possuir baixa densidade de postos de monitoramento hidrometeorológico, quando comparadas a outras regiões no Brasil. Este quadro repete-se na bacia hidrográfica do rio Acre, localizada na parte Ocidental da Amazônia brasileira. Entretanto, acredita-se que o monitoramento e a previsão hidrológica para as sub- bacias Amazônicas possam ser realizados, apoiando-se na utilização de recentes tecnologias de monitoramento da precipitação e evapotranspiração por satélite, associados a procedimentos tradicionais de coleta de dados hidrometeorológicos, promovendo melhorias em ações de planejamento e gestão dos recursos hídricos nesta região. OBJETIVOS Objetivo geral Realizar a modelagem do comportamento hidrológico do rio Acre, na seção da estação fluviométrica 13600002 (Rio Branco), gerando subsídios para o planejamento e gestão dos recursos hídricos na bacia, atrelado ao início da construção de um sistema de alerta mais eficiente contra enchentes e vazantes. Objetivos específicos Diante do objetivo geral proposto neste trabalho, têm-se os seguintes objetivos específicos: - Elaborar o diagnóstico da bacia a montante da estação 13600002, por meio da confecção do inventário de dados hidrológicos sobre vazões e precipitações anuais, no período de 1971 a 2005; 29 - Calibrar o modelo hidrológico IPH II, por meio do software WIN_IPH2, para os biênios de 1987/1988 e 2004/2005, caracterizando-se pelos eventos extremos das ocorrências de vazões máxima e mínima absoluta, respectivamente; - Simular cenários de comportamento hidrológico para 2030, associados à expansão da frente de desmatamento, incremento de precipitação e evapotranspiração, bem como ao crescimento populacional da cidade de Rio Branco/AC. 30 CAPÍTULO I LOCALIZAÇÃO E CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO 31 Segundo Morais (2008) até a deflagração da Revolução Acreana, “não existiam acreanos nos altos rios e sim cearenses, maranhenses, pernambucanos, rio grandenses – ligados ao extrativismo da borracha – e, árabes, portugueses, sírios, libaneses, turcos – ligados ao comércio de mercadorias; todos viviam nos rios Acre, Purus, Xapuri, Iaco, Caeté e tantos outros. Esse povo só passou a ser denominado de acreano após a criação do Território Federal do Acre, em 1904. Antes desta data, os brasileiros do Acre eram identificados pelos rios que habitavam. O acreano (ex- nordestino, ex-cearense, o banido pela seca, o renegado) surgiu na relação com o chão (com o Acre, o rio)”. Bastos (1927) citado por Morais (2008) relata que os “acreanos” – seringalistas e seringueiros – “lutaram contra os bolivianos, mas tinham interesses diferenciados, os primeiros lutavam para manter as suas propriedades – os seringais, ameaçados pela presença boliviana e os seringueiros, guiados por Plácido de Castro, que estava a serviço dos seringalistas, sonhavam que a guerra iria quebrar todas as pesadas correntes que os amarravam na grande selva”. Os seringueiros, para Bastos (1927) citados por Morais (2008) foram enganados pela promessa de que “seriam donos das terras que ocupavam e foram “incentivados” a se engajarem na luta a partir do perdão de suas dívidas. Estes, ao largarem “a tigelinha, o balde e a machadinha, empunhavam o mosquetão”. Realizavam, assim, três movimentos libertários: livrar o Acre do boliviano; livrar os proprietários dos impostos; livrarem-se a si próprios da opressão dos centros”. Morais (2008) cita que o Acre “nasceu” por meio dos seringueiros, (re)conhecidos como os “soldados de guerra” ou “soldados da borracha”, bem como do extrativismo do látex na última década do século XIX e início do século XX. O rio Uakiry origem do nome do rio Acre, de acordo com Morais (2008). 32 “provém do dialeto Apurinã falado pelos índios que habitavam a região do Vale do Purus. Nome este que foi se “corrompendo para Aquiri, Aqri, Akre, Acre que por corruptela de nome chegou a fixar-se, não só particular, como, oficialmente, em Acre”, nome de Estado da federação brasileira (Castelo Branco, 1945 apud Porto- Gonçalves, 1998)”. A bacia do rio Acre que aparecia nos mapas bolivianos, segundo Morais (2008) “como tierras non discubiertas, foi um dos mais povoados de maior produção de borracha – cerca de 60% da borracha amazônica exportada na época. O comércio era realizado por 15 vapores e havia 15 mil habitantes em 1899 (Costa, 2005[1924])”. A bacia hidrográfica do rio Acre localiza-se na Amazônia Sul-Ocidental, na tríplice fronteira entre Brasil, Bolívia e Peru (Figura 1), onde encontram-se o estado do Acre, o Departamento Boliviano de Pando e Departamento Peruano de Madre de Dios, estando inserida na bacia do rio Purus (Figura 2), com área aproximada de 35.967,5 km2, sendo que 87,5% pertencem ao território brasileiro (87,6% pertencente ao estado do Acre e 12,4% ao estado do Amazonas), restando 7,1% ao Peru e 5,4% à Bolívia, conforme observa-se na Figura 3. Figura 1. Localização da bacia do rio Acre no contexto político da tríplice fronteira 33 Fi gu ra 2 . L oc al iz aç ão d a ba ci a do ri o A cr e no c on te xt o da b ac ia d o rio P ur us 34 Fi gu ra 3 . D iv is õe s d a ba ci a do ri o A cr e no c on te xt o po lít ic o in te rn ac io na l ( B ra si l, B ol ív ia e P er u) 35 1.1. Geologia No estado do Acre, a unidade geotectônica mais importante é a Bacia do Acre (Figura 4). Compreende unidades, de acordo com Cavalcante (2006) “essencialmente cenozóicas, entretanto, em sua porção mais a oeste ocorrem remanescentes mesozóicos e até pré-cambrianos. Sua história geológica envolve primeiramente deposição pericratônica e marginal aberta no Paleozóico, resultando em sedimentos continentais intercalados a sedimentos marinhos”. Figura 4. Localização da Bacia do Acre no contexto geotectônico amazônico. a) Formação Solimões. Adaptado de Bezerra (2003) citado por Cavalcante (2006) 36 A análise de feições sismoestratigráficas, em seções sísmicas realizadas pela Petrobrás das principais estruturas da bacia permite concluir que a sedimentação inicial deu-se por rifteamento intracontinental com possíveis incursões marinhas. Amaral (2007) relata que após o soerguimento do Andes, a deposição se deu em ambiente essencialmente intracontinental, com a presença de lagos e posteriormente, de megaleques aluviais, sendo que durante o Cretáceo houve momentos de incursões e regressões marinhas sucessivas, resultando na deposição do Grupo Acre. De acordo com Cavalcante (2006) “o Arco de Iquitos (que separa a Bacia do Acre da Bacia do Solimões) funciona como área fonte de sedimentos nos momentos de sedimentação clástica regressiva (momentos de saída do mar)”. Após o soerguimento dos Andes, o Arco de Iquitos é rebaixado e a Bacia do Acre torna-se intracontinental, com área-fonte vinda de oeste. Isso acarreta uma inversão no fluxo das drenagens principais, que se preserva até hoje (fluxo dos rios Solimões, Juruá e Purus de oeste para leste), sendo neste momento o início da deposição de sedimentos para a consolidação da Formação Solimões. Maia et al. (1977) em função de análises de sondagens e perfurações, separa o material da base da então Formação Solimões em uma outra formação, a Ramon (constituída por material arenoso de ambiente oxidante). Porém, não foram encontrados registros no banco de dados do SIPAM/IBGE (2004) sobre a mesma. De acordo com IBGE (1999) em seguida são alternados momentos de quietude (em que se dá instalação dos perfis lateríticos – coberturas detrito-lateríticas) com outros de movimentação tectônica. Essa nova tectônica gera reativações de antigas falhas, soerguendo e rebaixando blocos e sendo a responsável pela deposição do material holocênico, além de controlar a distribuição do relevo e da drenagem atuais. Na Tabela 1 estão listadas as unidades mapeadas na escala de 1:250.000, que compreendem as feições estratigráficas da bacia do rio Acre (IBGE, 1999 citado por ACRE, 2006). Já na Tabela 2 apresentam-se os resultados das ocorrências das unidades litoestratigráficas para a bacia do rio Acre, bem como observam-se as classes mapeadas na Figura 5. Ressalta-se que, infelizmente, estes resultados não estendem-se aos territórios da bacia, na Bolívia e no Peru. 37 Tabela 1. Feições estratigráficas das unidades aflorantes na bacia hidrográfica do rio Acre Fonte: IBGE (1999) Tabela 2. Unidades litoestratigráficas encontradas na bacia do rio Acre, apenas em território brasileiro Unidades geológicas Área (km2) Ocupação (%) Aluviões holocênicos 2.268,3 7,2 Formação Solimões 24.968,8 79,3 Terraços holocênicos 1.974,0 6,3 Terraços pleistocênicos 621,51 2,0 Cobertura detriticos-laterítica 1.638,9 5,2 Fonte: SIPAM/IBGE (2004) Observa-se que aproximadamente 79% da bacia pertencem a uma única unidade litoestratigráfica, a Formação Solimões, sendo as primeiras referências ao estudo desta formação representados por trabalhos de Hartt (1870), Orton (1876) e Brown (1879). De acordo com dados de Acre (2006) a Formação Solimões é a mais extensa das unidades litoestratigráficas do Acre, estendendo-se além-fronteira para os territórios Peruano e Boliviano. Encontram-se, em algumas partes no lado leste, encoberta pelas coberturas detrito-lateríticas pleistocênicas, expondo-se nas áreas próximas aos vales. Era Período Época Formação Características litológicas C EN O ZÓ IC O Q U A TE R N Á R IO Holoceno Aluviões holocênicos Depósitos grosseiros a conglomeráticos, representando residuais de canal, arenosos relativos a barra em pontal e pelíticos relacionados a transbordamentos. Terraços holocênicos Depósitos de planície fluvial, cascalhos lenticulares de fundo de canal, areias de barra em pontal e siltes e argilas de transbordamento. Pleistoceno Terraços Pleistocênicos Terraços fluvias antigos. Argilas, silte e areias, localmente com intercalações lenticulares de argilitos e conglomerados. Coberturas detrito- lateríticas Material argilo-arenoso amarelado, caolinítico, alóctone e autóctone. TE R C IÁ R IO Plioceno Mioceno Formação Solimões Sedimentos pelíticos fossilíferos (argilitos com intercalações de siltitos, arenitos, calcários e material carbonoso), de origem fluvial e flúvio-lacustre, com estratificações plano-paralelas e cruzadas tabulares e acanaladas. 38 Fi gu ra 5 . U ni da de s l ito es tra tig rá fic as n a ba ci a do ri o A cr e 39 A seqüência litológica constitui-se de argilitos sílticos cinza a esverdeados; siltitos argilosos, localmente com concreções e lentes calcárias, concreções gipsíferas e limoníticas, e níveis ou lentes com matéria vegetal carbonizada (turfa e linhito) em geral fossilíferos. Intercalados ou sobrepostos aos pelitos ocorrem arenitos finos a grosseiros. Em determinadas áreas, predominam sobre os pelitos, permitindo sua individualização. Esses litotipos dispõem- se em seqüências cíclicas, típicas de ambiente continental fluvial e flúvio-lacustre, com fácies de leque aluvial (ACRE, 2006). Maia et al. (1977), com base em seu conteúdo fossilífero, estabeleceram o intervalo de idade Mioceno-Plioceno. Latrubesse et al. (1994) admitiram para Formação Solimões um único ciclo deposicional contínuo, por meio de leques gigantes, durante o Mioceno Superior e o Plioceno (idade correlacionada à da fauna abundante e variada de mamíferos) (ACRE, 2006). Segundo dados de Amaral (2007), a Formação Solimões teve como início a formação do Lago Amazonas, hipótese defendida por Frailey et al. (1998) “onde reforça a teoria, segundo a qual as condições geológicas, pedológicas e biológicas só podem ser bem entendidas a partir de um modelo de evolução da paisagem” (Figura 6). Este modelo tenta responder o porquê da Formação Solimões ser expressivamente extensa na parte Ocidental da Amazônia. Amaral (2007) descreve a seguinte evolução da paisagem no estado do Acre: A. Fase I: Sedimentação da borda continental (Sanozama); B. Fase II: Compressão preliminar (transgressões marinhas); C. Fase III: Formação de Ilha em Arco (inversão do sentido geral da drenagem, com ocorrências de grandes lagos secundários e a formação do lago Amazonas); D. Fase IV: Clímax orogênico (Cordilheira dos Andes e Formação Solimões, paisagem atual). Ainda segundo Amaral (2007) “as evidências atuais da presença de gipsita (CaSO4) e concreções carbonáticas (CaCO3) nos solos (KRONBERG et al., 1989; AMARAL, et al., 2002), fósseis de grandes répteis (CUNHA, 1963; RANZI, 2000) e pequena profundidade do solum (AMARAL et al., 2000), confirmam a presença de um ambiente oriundo do esvaziamento de grandes lagos, que recebiam os sais solúveis trazidos pelos rios (BRASIL, 1976)”. 40 Figura 6. Hipótese de evolução da paisagem proposta por Amaral (2007) para o estado do Acre Registros fora da bacia hidrográfica do rio Acre apontam que são conhecidas três variedades de gipsita: (a) a selenita, (b) a gipsita fibrosa (a mais freqüente e economicamente importante) e (c) o alabastro. A gipsita do Acre é do tipo selenita e ocorre predominantemente nos rios Purus, Chandless e Iaco, nas imediações de Sena Madureira/AC e Manoel Urbano/AC, além de ocorrências menores nas proximidades de Marechal Thaumaturgo/AC. 41 Nas descrições são destacadas pequenas espessuras de suas exposições e inibidas iniciativas exploratórias, entretanto, cabe ser ressaltado aqui os múltiplos usos desse mineral: a gipsita é consumida sob as formas bruta e beneficiada (ACRE, 2006). Sob a forma bruta é utilizada pelos setores cimenteiro e agrícola. Sob a forma beneficiada, denominada gesso, é utilizada predominantemente pela indústria da construção civil na forma de pré-moldados, em revestimento de paredes e como elemento de decoração arquitetônica e, subordinadamente, pelos setores ceramista, odontológico, médico e de adereços (joalharia). 1.2. Clima Com relação ao clima reinante na bacia, Guerra (1955) e Acre (2000) caracterizam- no segundo o sistema de classificação de Köppen, como sendo do tipo Am, ou seja, quente e úmido, possuindo uma curta estação seca e altos índices pluviométricos. De acordo com o Atlas Geográfico e Ambiental do estado do Acre, citado por Carmo (2006), a precipitação anual em Rio Branco (único posto climatológico na região) varia entre 2.000 a 2.100 mm ano-1. Em relação à bacia do rio Acre, apoiado em isoietas traçadas por meio das Normais Climatológicas para o Brasil (1961 a 1990), acessadas pelo site do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), www.inmet.gov.br ou pelo SigWeb do Ministério do Meio Ambiente no endereço http://mapas.mma.gov.br/, a precipitação na bacia caracteriza-se pela média anual de 1.942,2 mm, atingindo valores superiores a 2.700 mm ano-1 em regiões de cabeceiras, conforme pode ser visualizado na Figura 7. Carmo (2006) cita que o clima da bacia do rio Acre é regido pela Massa Equatorial Continental (mEc), “a qual origina-se na Amazônia Ocidental, apresentando altas temperaturas e altos níveis de umidade”, aliado à ocorrência do fenômeno conhecido por Friagem, que é responsável por bruscas quedas de temperatura, advindo do terceiro ramo da Massa Polar Atlântica (mPa), amenizando as altas temperaturas do verão Amazônico na região. 42 Fi gu ra 7 . P re ci pi ta çã o m éd ia n a ba ci a do ri o A cr e, d e ac or do c om d ad os d as N or m ai s C lim at ol óg ic as d o IN M ET (1 96 1 a 19 90 ) 43 1.3. Rede hidrográfica O rio Acre possui sua nascente em território peruano em cotas de aproximadamente 400 m e corre na direção Oeste-Leste, deixando-o na altura do município de lñapari, e segue fazendo fronteira com Brasil e Bolívia (ACRE, 2006). Próximo à sua foz, na cidade amazonense de Boca do Acre/AM, o rio Acre adentra-se no Purus com vazão média anual de aproximadamente 627,7 m3 s-1, atingindo no período de vazante (verão amazônico) média de 71,6 m3 s-1 e no período chuvoso (inverno amazônico) média de 1.995,1 m3 s-1. Seus principais afluentes, em território acreano estão localizados em sua margem direita, o rio Xapuri, com área física estimada em 5.948 km² e o Riozinho do Rôla, com área física estimada de 7.606 km², que apresenta-se como o maior e mais importante afluente da bacia hidrográfica do rio Acre (ACRE, 2006). A rede de drenagem da bacia hidrográfica do rio Acre é caracterizada por rios notadamente sinuosos e volumosos, com padrão de drenagem dendrítico, escoando suas águas no sentido sudoeste a nordeste e possui estreitas planícies fluviais de deposição de sedimentos retirados pela morfodinâmica de seu leito (ACRE, 2006). A descarga do rio Acre medida em Rio Branco/AC, principal cidade na bacia, alcança média 1.453,4 m³ s-1 em épocas de índices pluviométricos elevados (inverno amazônico) e 39,5 m³ s-1 em épocas de pouca precipitação (verão amazônico), tendo uma descarga média anual de 354,9 m³ s-1. De acordo com dados da estação fluviométrica da Agência Nacional de Águas (ANA), de código 13600002 (Rio Branco), localizada na capital acreana, ao longo dos últimos 32 (trinta e dois) anos de registros diários consistidos do rio Acre, o mesmo já atingiu, em 2005, sua cota mínima 1,64 m, época da maior seca registrada na Amazônia, enquanto a sua cota máxima chegou a medir 17,11 m em 1988. O regime hídrico desta bacia se alterna em períodos de cheias e de vazantes, originando, assim, o ciclo que regula e mantém a vida vegetal e animal e, conseqüentemente, as oportunidades de subsistência tanto por meio da caça, como da pesca. Após a vazante dos rios, o solo fica mais fértil e a bacia se torna mais abundante em alimentos silvestres e também agrícolas, enquanto que, nas cheias, há uma relativa escassez de alimentos e uma dispersão da fauna aquática (ACRE, 2006). Quanto aos instrumentos de gestão dos recursos hídricos, o estado do Acre está recém estruturando-se para implantar sua política de gestão de recursos hídricos e iniciou o processo através da proposição de uma metodologia para elaboração do Plano Estadual de 44 Recursos Hídricos (PLERH), cuja elaboração foi coordenada pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente (SEMA), com o apoio da GTZ (Cooperação Técnica Alemã). Nesta proposta propõe-se a divisão da bacia do rio Acre, no estado do Acre, em seis Unidades de Gestão de Recursos Hídricos – UGRHs (Figura 8): (a) Alto Acre, (b) Baixo Acre, (c) Xapuri, (d) Riozinho do Rôla, (e) Andirá e (f) Antimary, consideradas como recortes espaciais de referência para o estabelecimento dos objetivos estratégicos de gestão de recursos hídricos. Desta forma, de acordo com Acre (2006) cada UGRH deverá elaborar, futuramente, os Planos de Bacia ou de Desenvolvimento Estratégico, através de uma Agenda 21 da Bacia Hidrográfica, pelos respectivos Comitês de Bacias Hidrográficas, quando implantados, conforme metodologia também adotada na bacia do rio Doce em Minas Gerais. De modo geral, a topografia da bacia do rio Acre caracteriza-se por apresentar valores de elevação, próximo às cabeceiras, de 400 m de altitude, chegando a aproximadamente 107 m próximo à foz, conforme observa-se na Figura 9. A declividade média na bacia do rio Acre é de 3,9%, com desvio padrão de 3%, caracterizando-se por ser uma região classificada segundo Embrapa (2006) como plana a suavemente ondulada, porém setores a montante da bacia possuem declividades acima de 20%, chegando até 46%, conforme observa-se por meio da Figura 10. Na Tabela 3 são apresentados alguns dos parâmetros morfométricos associados à bacia do rio Acre, bem como a bacia a montante da estação 13600002, localizada na cidade de Rio Branco. Tabela 3. Características morfométricas da bacia do rio Acre e da bacia a montante da seção fluviométrica Rio Branco Características morfométricas Bacia do rio Acre Bacia a montante da estação Rio Branco Área (km2) 35.967,5 23.651,2 Perímetro (km) 1.577,7 1.136,9 Densidade de drenagem (km/km2) 0,71 0,70 Índice de compacidade (adimensional) 2,33 2,07 Comprimento do rio principal (km) 934,7 669,1 Altitude média (m) 225,9 251,7 Declividade média (%) 3,91 4,06 * Dentro do território acreano foi utilizado o mapeamento da hidrografia na escala de 1:100.000, tendo sido utilizados, tanto no Peru, como na Bolívia e Amazonas, o mapeamento da ANA ao milionésimo. 45 Fi gu ra 8 . U G R H s d ef in id as p el o PL ER H p ar a a ba ci a do ri o A cr e, n o es ta do d o A cr e 46 Fi gu ra 9 . M od el o di gi ta l d e el ev aç ão h id ro lo gi ca m en te c on si st en te (M D EH C ) d a ba ci a do ri o A cr e 47 Fi gu ra 1 0. M ap a de d ec liv id ad es d a ba ci a do ri o A cr e ex tra íd o do M D EH C 48 1.4. Geomorfologia Influenciada pelo substrato geológico, a constituição da Geomorfologia da bacia do rio Acre segue a mesma tendência de homogeneidade espacial das feições, como observa-se na Figura 11. Na Tabela 4 encontram-se os dados a respeito das ocorrências de unidades geomorfológicas, para a bacia do rio Acre, exceto para os territórios da Bolívia e Peru. Observa-se que a unidade geomorfológica predominante caracteriza-se pela Depressão Rio Branco, com 11.899,4 km2; tendo a classe de solo Argissolo a maior ocorrência, com 72,6%. Tabela 4. Unidades geomorfológicas encontradas na bacia do rio Acre, apenas em território brasileiro Unidades geológicas Área (km2) Ocupação (%) Planície aluvial 4.356,2 13,8 Depressão Rio Branco 11.899,4 41,0 Depressão Juruá-Iaco 2.163,3 6,9 Depressão Iaco-Acre 10.182,5 32,4 Depressão Endimari-Abunã 1.870,1 5,9 Fonte: Adaptado de SIPAM/IBGE (2004) Assim, conforme levantamento de SIPAM/IBGE (2004) e Acre (2006) faz-se, neste momento, uma breve descrição de cada unidade geomorfológica, associando as ocorrências de solos nas mesmas. 1.4.1. Planície aluvial O processo de formação da planície aluvial se dá por colmatagem de sedimentos em suspensão e construção de planícies e terraços orientada por ajustes tectônicos e acelerada por evolução de meandros. Os padrões de drenagem nela presentes são o meândrico e o anastomosado, indicando ajuste hidrodinâmico em áreas rebaixadas (ACRE, 2006). É caracterizada por vários níveis de terraços e as várzeas recentes, contêm diques e paleocanais, lagos de meandro e de barramento, bacias de decantação, furos, canais anastomosados e trechos de talvegues retilinizados por fatores estruturais. O contato desta unidade com as demais é em geral gradual, mas com ressaltos nítidos nos contatos das planícies com as formas de dissecação mais intensas das unidades vizinhas. 49 Fi gu ra 1 1. U ni da de s g eo m or fo ló gi ca s n a ba ci a do ri o A cr e. A da pt ad o de S IP A M /IB G E (2 00 4) 50 Sua composição varia de argilas, siltes e areias muito finas a grosseiras, estratificadas, localmente intercaladas por concreções ferruginosas e concentrações orgânicas, resultando em Neossolos flúvicos, Luvissolos hipocrômicos, Gleissolos melânicos, Argissolos vermelho-amarelo e amarelo e Plintossolos háplicos (SIPAM/IBGE, 2004). Apresenta-se, na área em questão, em quatro categorias distintas e dentro delas, há ainda uma compartimentação em função do grau de, são elas: Atf: acumulação em terraço fluvial: São acumulações de forma plana, apresentando ruptura de declive em relação ao leito do rio e às várzeas recentes situadas em nível inferior, entalhadas devido à variação do nível de base. Ocorrem nos vales contendo aluviões finos a grosseiros, pleistocênicos e holocênicos. Aptf: acumulação em planícies e terraços fluviais: São áreas planas resultantes de diferentes acumulações fluviais, periódica ou permanentemente inundadas, comportando meandros abandonados e diques fluviais com diferentes orientações, ligadas com ou sem ruptura de declive a patamar mais elevado. Ocorrem nos vales com preenchimento aluvial contento material fino a grosseiro, pleistocênicos e holocênicos. Af: acumulação em planície fluvial: Áreas planas resultantes de acumulação fluvial sujeitas a inundações periódicas, incluindo as várzeas atuais, podendo conter lagos de meandros, furos e diques aluviais paralelos ao leito atual do rio. Ocorrem nos vales com preenchimento aluvial. Aptfl: área plana resultante de processos de acumulação fluvial/lacustre: Podendo comportar canais anastomosados ou diques marginais, com ou sem ruptura de declive em relação à bacia do lago e às planícies flúvio-lacustres situadas em nível inferior. Ocorre em setores sob o efeito de processos de acumulação fluvial e lacustre, sujeitos ou não a inundações periódicas, com barramentos formando lagos e lagunas, e nos vales contendo bacias lacustres. 1.4.2. Depressão do Endimari-Abunã De acordo com SIPAM/IBGE (2004), esta unidade apresenta altitudes variando entre 160 e 240 m nivelada por pediplanação pós-terciária, posteriormente dissecada pela drenagem atual. Trata-se de superfície suavemente dissecada, com topos tabulares e algumas áreas planas. Esta unidade caracteriza-se por formas de dissecação, descritas a seguir: 51 Dc: dissecação homogênea convexa: Gera formas de relevo de topos convexos, esculpidas em variadas litologias, às vezes denotando controle estrutural, definidas por vales pouco profundos, vertentes de declividade suave, entalhadas por sulcos e canais de primeira ordem. Dt: dissecação homogênea tabular: Gera formas de relevo de topos tabulares, conformando feições de rampas suavemente inclinadas e lombas esculpidas em coberturas sedimentares inconsolidadas, denotando eventual controle estrutural. Quanto ao modelado de aplanamento, distingue-se: Pri: pediplano retocado inumado: Trata-se de superfície de aplanamento elaborada durante fases sucessivas de retomada dos processos de erosão, os quais geraram sistemas de planos inclinados, às vezes levemente côncavos. Aparece inumada por coberturas dentríticas e/ou de alteração. 1.4.3. Depressão do Iaco-Acre Unidade com altitude variando entre 160 e 350 m com padrão de drenagem dendrítico. Admite-se para sua formação um possível truncamento pela pediplanação pós- terciária, podendo ter sofrido tectônica de soerguimento relacionada à reativação do Arco de Iquitos. Posteriormente foi dissecada pela drenagem atual (ACRE, 2006). Compreende uma superfície muito dissecada e com declives muito expressivos. As áreas de topo aguçado com declives fortes e as de topo convexo com declives medianos refletem a presença de fácies arenosa da Formação Solimões. No segmento mais setentrional, percebe-se uma nítida diferenciação na intensidade da dissecação sem, contudo, definir uma linha de ruptura entre uma unidade e outra (SIPAM/IBGE, 2004). Os sedimentos da Formação Solimões geraram principalmente Argissolos com caráter plíntico. No segmento mais a noroeste, a fácies arenosa dessa formação deu origem a Plintossolos háplicos e Argissolos vermelho-amarelos. Suas formas de dissecação são a convexa e a tabular, descritas anteriormente (Dc e Dt) e a aguçada, a seguir, conforme dados do IBGE (1999): Da: dissecação homogênea aguçada. Trata-se de um conjunto de formas de relevo de topos estreitos e alongados, esculpidas em sedimentos, denotando controle estrutural, definidas por vales encaixados. 52 1.4.4. Depressão de Rio Branco Unidade com padrão de drenagem angular, o que implica um controle estrutural. A tectônica parece ter um papel importante na área, provavelmente uma movimentação tardia no Arco de Iquitos provocou o soerguimento da unidade de relevo, que foi posteriormente dissecada pela drenagem atual (ACRE, 2006). Caracteriza-se por um relevo muito dissecado, com topos convexos e densidade de drenagem muito alta, apresentam declives medianos na parte centro-norte, diminuindo para sul, onde se torna suave ondulado. O contato com outras unidades se dá de forma gradual. No entanto, com a Depressão do Iaco-Acre observa-se diferença na altitude e na intensidade da dissecação, porém, sem que se perceba a presença de uma linha nítida de ruptura topográfica (SIPAM/IBGE, 2004). Os sedimentos da Formação Solimões presentes nessa unidade originaram dominantemente Argissolos vermelho-amarelos. As formas de dissecação relacionadas a essa unidade são a convexa e a tabular (descrições apresentadas anteriormente). 1.4.5. Depressão do Juruá-Iaco De acordo com IBGE (1999) esta unidade apresenta altitude variável entre 150 a 300 m. Trata-se de uma área nivelada por pediplanação pós-terciária e provavelmente afetada por neotectônica tardia. A erosão descaracterizou o aplainamento resultando em modelados de dissecação. Sua principal característica é a de apresentar-se como uma superfície dissecada com elevada densidade de drenagem de primeira ordem e padrão dendrítico. Apresenta modelados de topos convexos, por vezes aguçados, com declives que variam de medianos a fortes. Seus contatos são graduais, de um modo geral, e por diferença altimétrica, mas sem gerar linha de ruptura marcante com as depressões do Purus - Juruá e do Iaco - Acre. Em termos sedimentológicos há domínio dos sedimentos síltico-argilo-arenosos, com presença de material carbonático da Formação Solimões. Nesses locais imprime caráter carbonático aos solos gerados (ACRE, 2006). 53 1.5. Solos na bacia do rio Acre Na Tabela 5 encontram-se os dados a respeito das ocorrências das classes de solos, para a bacia do rio Acre, exceto para os territórios da Bolívia e Peru, podendo ser observada sua distribuição espacial na Figura 12. A classe de solo predominante na bacia hidrográfica do rio Acre é o Argissolo, com a ocorrência em 72,6% da área de estudo, com extensões acima de 22.800 km2. Tabela 5. Classes de solos encontrados na bacia do rio Acre, apenas em território brasileiro Unidades geológicas Área (km2) Ocupação (%) Argissolos 22.847,7 72,6 Gleissolos 2.276,2 7,2 Latossolos 1.242,1 3,9 Luvissolos 2.303,5 7,3 Plintossolos 2.802,0 8,9 Fonte: SIPAM/IBGE (2004) 1.5.1. Argissolos São solos constituídos por material mineral, apresentando horizonte B textural imediatamente abaixo do A ou E, com argila de atividade baixa ou alta conjugada com saturação por bases baixa e/ou caráter alítico na maior parte do horizonte B, podendo apresentar horizonte plíntico ou horizonte glei, desde que não satisfaça os requisitos para Plintossolos ou Gleissolos (EMBRAPA, 2006). De acordo com Amaral et al. (2011) esta classe de solo “encontra-se distribuída em todas regionais do Estado, principalmente no Alto Acre (89%), Juruá (65,9%) e Baixo Acre (60,5%), e, em menor área, nas zonas do Purus (33%) e Tarauacá/Envira (2,7%)”. Os Argissolos - em algumas regiões - apresentam drenagem interna naturalmente deficiente e baixa ou média fertilidade natural. Por ocorrem muitas vezes em condições de relevo mais movimentado, são também bastante suscetíveis à erosão. A presença de caráter plíntico em parte destes solos evidencia problemas por deficiência de drenagem. As cores do horizonte Bt variam de acinzentadas a avermelhadas e as do horizonte A são sempre mais escurecidas. A profundidade dos solos é variável, mas em geral são pouco profundos e profundos (IBGE, 2005). 54 Fi gu ra 1 2. C la ss es d e so lo s n a ba ci a do ri o A cr e 55 Apresenta-se na Figura 13 o perfil modal dos Argissolos encontrados no estado do Acre, de acordo com Acre (2006). Figura 13. Perfil modal de Argissolos no estado do Acre. (A) Prisma pedológico, em escala e com a indicação dos horizontes. (B) Padrão fisiográfico na imagem de satélite LANDSAT TM 5. (C) Paisagem de ocorrência. (D) Localização no estado do Acre. Fonte: ACRE (2006). 1.5.2. Plintossolos São solos constituídos por material mineral, apresentando horizonte plíntico, litoplíntico ou concrecionário, em uma das seguintes condições: começando dentro de 40 cm da superfície; ou começando dentro de 200 cm da superfície quando precedido de horizonte glei ou de horizonte A ou E ou de outro horizonte que apresente cores pálidas, variegadas ou com mosqueados em quantidade abundante. Quando precedidos de horizonte ou camada de coloração pálida (acinzentadas, pálidas ou amarelado claras), podendo ocorrer ou não mosqueados de coloração desde avermelhadas até amareladas (EMBRAPA, 2006). A plintita, cuja ocorrência em quantidade expressiva caracteriza o horizonte plíntico, submetida a diversos ciclos de umedecimento e secagem e após o rebaixamento do lençol freático, desidrata irreversivelmente tornando-se extremamente dura (AMARAL et al., no prelo). Ocorrem principalmente na região leste do Estado, no município de Rio Branco/AC, e no extremo oeste. São solos sujeitos a excesso de água (encharcamento) temporário, 56 apresentando drenagem imperfeitamente ou mal drenado. Isso resulta numa variabilidade morfológica e analítica, o que dificulta sua caracterização. Tendo horizonte plíntico de coloração variegada com cores acinzentadas, alternadas com cores avermelhadas e intermediárias entre elas (AMARAL et al., no prelo). Os Plintossolos localizados em terraços de sedimentação recente (ambientes conservadores), têm o predomínio de cores mais claras no horizonte plíntico (2,5Y), o valor varia de 6 a 7 e o croma entre 1 e 2. Já em ambientes de menor sedimentação, ou seja, em níveis mais elevados na paisagem, estes solos apresentam cores mais avermelhadas com matizes 5 YR e 2,5 YR, o que indica um ambiente de maior oxidação e menor flutuação do lençol freático (AMARAL et al., no prelo; ACRE, 2006). Apresenta-se na Figura 14 o perfil modal dos Plintossolos encontrados no estado do Acre, de acordo com Acre (2006). Figura 14. Perfil modal de Plintossolo no Estado do Acre. (A) Prisma pedológico, em escala e com a indicação dos horizontes. (B) Padrão fisiográfico na imagem de satélite LANDSAT TM 5. (C) Paisagem de ocorrência. (D) Localização no Estado do Acre. Fonte: ACRE (2006). 57 1.5.3. Luvissolos São solos minerais de argila de atividade alta, alta saturação por bases e horizonte B textural imediatamente abaixo de horizonte A fraco, moderado ou proeminente ou horizonte E, e que satisfazem os seguintes requisitos: (a) horizontes plíntico, glei e plânico, se presentes, não satisfazem os critérios para Plintossolos, Gleissolos e Planossolos, respectivamente; não é coincidente com a parte superficial do horizonte B textural; (b) horizonte glei, se ocorrer inicia-se após 50 cm de profundidade, não coincidindo com a parte superficial do horizonte B textural (EMBRAPA, 2006). Os Luvissolos, normalmente associados a solos pouco profundos, ocorrem em áreas de relevo mais movimentado, o que lhes confere certo grau de susceptibilidade à erosão, o que, aliado ao fato de apresentarem drenagem deficiente, restringe seu uso agrícola, apesar da elevada fertilidade natural (AMARAL et al., 2006). Apresenta-se na Figura 15 o perfil modal dos Luvissolos encontrados no estado do Acre, de acordo com Acre (2006). Figura 15. Perfil modal de Luvissolo no Estado do Acre. (A) Prisma pedológico, em escala e com a indicação dos horizontes. (B) Padrão fisiográfico na imagem de satélite LANDSAT TM 5. (C) Paisagem de ocorrência. (D) Localização no Estado do Acre. Fonte: ACRE (2006) 58 Os Luvissolos no Acre apresentam horizonte B textural ou B nítico, com argila de atividade alta e saturação de bases alta, imediatamente abaixo do horizonte A fraco ou moderado, ou horizonte E. Os Luvissolos no Acre variam de bem a imperfeitamente drenados, normalmente pouco profundos (60 a 120 cm), com seqüência de horizontes A, Bt e C, e nítida diferenciação entre os