Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” Faculdade de Ciências/Campus de Bauru Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Materiais Igor Lebedenco Kitagawa PROCESSOS DE FUNCIONALIZAÇÃO DE SUBSTRATOS DE TITÂNIO PELA TÉCNICA LAYER-BY-LAYER PARA APLICAÇÕES EM ODONTOLOGIA Bauru 2021 IGOR LEBEDENCO KITAGAWA PROCESSOS DE FUNCIONALIZAÇÃO DE SUBSTRATOS DE TITÂNIO PELA TÉCNICA LAYER-BY-LAYER PARA APLICAÇÕES EM ODONTOLOGIA Tese apresentada como parte dos requisitos para a obtenção do título de Doutor em Ciências e Tecnologia de Materiais do Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Materiais da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” - UNESP/Bauru. Orientador: Paulo Noronha Lisboa Filho PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE MATERIAIS - FACULDADE DE CIÊNCIAS - UNESP Bauru 2021 Kitagawa, Igor Lebedenco. Processos de funcionalização de substratos de titânio pela técnica Layer-by-Layer para aplicações em odontologia / Igor Lebedenco Kitagawa, 2021 83 f. : il. Orientador: Paulo Noronha Lisboa Filho Tese (Doutorado)–Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências, Bauru, 2021 1. TiO2. 2. Poli (4-estirenossulfonato de sódio). 3. Implante dentário. 4. Layer-by-Layer. 5. Testes in vivo. I. Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências. II. Título. Dedico este trabalho a Deus e à toda minha família. AGRADECIMENTOS A Deus, pela vida, pela oportunidade, pelas bençãos, por me guiar e guardar, por me ensinar, enfim, pelo seu eterno amor. À minha esposa, Gabriela, pelo amor vivenciado em cada momento de nossas vidas. Por me apoiar, incentivar, criticar. Pela cumplicidade e dedicação. Te amo! Aos meus filhos, Yuri e Monalisa, que me ajudavam quando o papai tinha que ficar trancado estudando, tinha que ir ao laboratório, etc e, também, deram aquele toque de alegria e amor indescritível nessa jornada. Aos meus pais, Lídia e Roberto, pelo amor, apoio, carinho, incentivo e dedicação de sempre. A toda minha família, em especial, à minha sogra Rosana por dedicar parte de seu tempo para auxiliar-nos. Ao professor Dr. Paulo Noronha Lisboa Filho pela oportunidade, por ter acreditado em mim mesmo eu estando num momento bastante complexo de minha vida profissional, pela paciência, dedicação e pelos inúmeros ensinamentos, os quais me fizeram crescer profissionalmente e pessoalmente. À professora Dra. Roberta Okamoto pela parceria, cooperação, apoio, dedicação e pelo marcante carinho de sempre no trato. À professora Dra. Celina Massumi Miyazaki pelas excelentes discussões de resultados que tivemos, pelo respeito, dedicação e persistência nessa parceria. Aos colegas e amigos Orisson, Érika, Leonardo, Odair, Marcela, João Pedro, Luciana, Adriana, Jean, Lucas Afonço, Ana Carolina, pelas inúmeras trocas de experiências profissionais e pessoais que vivenciamos. Também pelos risos e pelo apoio para cada devido momento. A todos os colegas do POSMAT/UNESP e da FOA/UNESP - Araçatuba pelo apoio e troca de experiências que contribuíram para a execução deste trabalho. Ao professor Dr. Carlos José Leopoldo Constantino, o Casé, pelo apoio, confiança e cooperação quando das medidas de micro-Raman e por ter aceitado fazer parte deste trabalho. Ao professor Dr. José Humberto Dias da Silva por ter cedido, gentilmente, o espectrofotômetro UV-VIS. Ao professor Dr. Fenelon Martinho Lima Pontes por ter cedido, gentilmente, o difratômetro de raios X. À Glenda pelas medições de MEV. Ao Pastor Herberth Martinez Korps Soler, sua esposa Eunice e seus filhos, Mateus e Samuel e também à Cláudia, esposa do professor Paulo, por orarem por nós e nos apoiarem, em especial, quando da mudança de cidade. A todos os meus irmãos em Cristo que oraram por mim. KITAGAWA, I. L. Processos de Funcionalização de Substratos de Titânio pela Técnica Layer-by-Layer para Aplicações em Odontologia. 2021. 83 f. Tese (Doutor em Ciência e Tecnologia de Materiais) – UNESP, Faculdade de Ciências, Bauru, 2021. RESUMO A colocação de implantes é um método de reparo importante em odontologia. Esforços crescentes têm se concentrado na otimização das propriedades de biocompatibilidade e osseointegração de titânio (Ti) e ligas de Ti devido ao envelhecimento da população e das complicações que podem surgir em pacientes com comorbidades. Neste trabalho, a superfície de uma liga de Ti utilizada comercialmente foi modificada pela simples e versátil técnica Layer-by-Layer (LbL). Foram crescidas multicamadas LbL de dióxido de titânio (TiO2), material bastante utilizado em implantes dentários, com poli (4- estirenossulfonato de sódio) (PSS), um polieletrólito com vasta utilização em filmes LbL, inclusive na área biomédica. A morfologia e a estrutura química dos filmes LbL de nanopartículas de PSS com TiO2 foram inicialmente caracterizadas empregando espectroscopias de absorção no ultravioleta-visível (UV-VIS) e infravermelho com transformada de Fourier (FTIR), bem como microscopia de força atômica (AFM), para posterior aplicação em implantes de liga à base de Ti. As alterações provocadas pelo filme LbL PSS/TiO2 nas superfícies da liga de Ti foram então investigadas por AFM, microscopia eletrônica de varredura e micro-Raman. Por fim, testes in vivo (imunomarcação e análise biomecânica) realizados com implantes do tipo parafuso em ratos sugeriram que as multicamadas PSS/TiO2 promovem alterações tanto na topografia quanto nas propriedades químicas da superfície do implante, proporcionando efeitos benéficos para a atividade dos osteoblastos. O revestimento desenvolvido nesse trabalho é particularmente vantajoso para implantes posicionados em áreas com densidade óssea muito baixa ou locais que requerem um procedimento rápido de regeneração óssea. Palavras chave: TiO2, Poli(4-estirenossulfonato de sódio), Implante dentário, Layer-by- Layer, Testes in vivo ABSTRACT Implant placement is an important repair method in dentistry. Increasing efforts have focused on optimizing the biocompatibility and osseointegration properties of titanium (Ti) and Ti-based alloys and due to the aging population and complications that can arise in patients with comorbidities. In this work, a Ti-based alloy surface used was modified by the simple and versatile Layer-by-Layer technique (LbL). The LbL multilayers were grown made of titanium dioxide (TiO2), a material widely used in dental implants, and poly(sodium 4-styrenesulfonate) (PSS), a polyelectrolyte vastly used in LbL films, including the biomedical area. The morphology and chemical structure of LbL multilayers of PSS and TiO2 nanoparticles were first characterized employing ultraviolet–visible (UV-VIS) and Fourier- transform infrared (FTIR) spectroscopies as well as atomic force microscopy (AFM), for further application in Ti-based alloy implants. The changes provoked by the LbL PSS/TiO2 film on the Ti-based alloy surfaces were then investigated by AFM, scanning electron microscopy and micro-Raman techniques. Finally, in vivo tests (immunolabeling and biomechanical analysis) performed with screw implants in rats suggested that PSS/TiO2 multilayers promote changes in both topography and chemical surface properties of the screw, providing beneficial effects for osteoblast activity. The coating developed in this work is particularly advantageous for implants placed in areas with very low bone density or places that require a rapid bone regeneration procedure. Keywords: TiO2, Poly(sodium 4-styrenesulfonate), dental implant, Layer-by-Layer, in-vivo tests LISTA DE FIGURAS Figura 1. Representação esquemática de um osso humano. Adaptado de (SCHEINPFLUG et al., 2018). ..................................................................................................................... 18 Figura 2. Radiografia de uma região da cavidade oral de um paciente com implante dentário. Adaptado de (FOKAS; MATTHEOS, 2018). ................................................................... 19 Figura 3. Esquemas de crescimento de filmes multicamadas pela técnica LbL. Adaptado de (RICHARDSON; BJÖRNMALM; CARUSO, 2015). ...................................................... 30 Figura 4. Fases cristalográficas mais conhecidas do TiO2. Adaptado de (HAGGERTY et al., 2017). .............................................................................................................................. 33 Figura 5. Estrutura química do PSS (Disponível em: Acesso 24 de nov. de 2021). .............................................................................................................................. 36 Figura 6. Espectro de difração de raios X do pó de TiO2 obtido através da rota sol-gel após evaporação do solvente. Picos de anatase (1 0 1) em 2θ = 25° e bruquita (1 2 1) em 2θ = 31°. Anatase: JCPDS 21-1272, Bruquita: JCPDS 29-1360. ...................................................... 46 Figura 7. Espectros de absorção de UV-VIS coletados após a deposição de cada umas das três primeiras camadas do filme de PSS e TiO2: (a) TiO2, (b) PSS e (c) TiO2, respectivamente, em substratos de sílica para quatro diferentes intervalos de tempo: 1, 5 e 15 min e t~0. ... 47 Figura 8. (a) Espectros de absorção de UV-VIS coletados após cada etapa de deposição de camadas de PSS e TiO2 em substratos de sílica. Inserção: esquema de crescimento de um filme LbL. (b) A relação entre a absorbância em 234 nm e o número de camadas depositadas. Inserção: Absorbância em 234 nm versus número da bicamada. ....................................... 49 Figura 9. Espectros de absorção UV-VIS na faixa de 200-250 nm de i) TiO2 - camada 1 e PSS - camada 2, ii) TiO2 - camada 2 e PSS - camada 3, iii) TiO2 - camada 3 e PSS - camada 4, iv) TiO2 - camada 4 e PSS - camada 5 e v) TiO2 - camada 5 e PSS - camada 6. ............ 50 Figura 10. Espectros FTIR em duas regiões (4000 - 2500 cm-1 e 1800 - 400 cm-1) de TiO2 puro e PSS (filmes fundidos) e o filme LbL (TiO2/PSS)20. ν: stretching; νa: stretching assimétrico; νs: stretching simétrico; δ: bending. .............................................................. 52 Figura 11. Imagem de AFM do substrato de lâmina de sílica fundida após tratamento com solução “piranha”. Rugosidade RMS de cerca de 0,3 nm. ................................................. 54 Figura 12. Imagens de AFM da morfologia da superfície de (a) uma monocamada de TiO2 e dos filmes LbL (b) (PSS/TiO2)1PSS, (c) (PSS/TiO2)5 e (d) (PSS/TiO2)5PSS em substrato de sílica fundida.................................................................................................................... 55 Figura 13. Imagens de AFM da morfologia da superfície de (a) uma monocamada de TiO2 e dos filmes LbL (b) (PSS/TiO2)1PSS, (c) (PSS/TiO2)5 e (d) (PSS/TiO2)5PSS em substrato de sílica fundida.................................................................................................................... 56 Figura 14. Imagens de AFM da morfologia da superfície de (a) um disco de liga de Ti, sem deposição e deste disco com os filmes LbL (b) (PSS/TiO2)5 e (c) (PSS/TiO2)5PSS. .......... 57 Figura 15. Espectros Raman de (a) duas regiões distintas do disco limpo (cinza e preto), e após a cobertura com os filmes (b) (PSS/TiO2)5 (amarelo) e (c) (PSS/TiO2)5PSS (azul e verde). Filmes casting puros de PSS (rosa) e TiO2 (vermelho) são apresentados para comparação. (d) espectros da região entre 125 e 200 cm-1 de discos de liga de Ti modificados com (PSS/TiO2)5, (PSS/TiO2)5PSS e do filme casting de TiO2. Os espectros de cores idênticas referem-se ao mesmo espectro. (e) imagens ópticas com ampliação de 500 × do (i) disco limpo, (ii) discos modificados com (PSS/TiO2)5 e (iii) (PSS/TiO2)5PSS. ................. 59 Figura 16. Micrografias de MEV de (a) implante limpo, (b) TiO2 - casting e (c) PSS - casting em lâminas planas de vidro, (d) filme (PSS/TiO2)5 sobre o implante e (e) filme (PSS/TiO2)5PSS sobre o implante..................................................................................... 60 Figura 17. Fotomicrografias ilustrando as proteínas Runx2, Fosfatase Alcalina (ALP), Osteopontina (OPN) e Osteocalcina (OCN) para imunomarcação para as superfícies de (PSS/TiO2)5PSS, (PSS/TiO2)5 e controle (implante convencional). Símbolos: setas vermelhas - células imunologicamente marcadas. Contra-coloração: hematoxilina de Harris. Ampliação de 20 ×. ............................................................................................................................ 62 Figura 18. Gráfico dos resultados da análise biomecânica entre os grupos de implantes revestidos com (PSS/TiO2)5PSS, (PSS/TiO2)5 e superfícies de controle. ........................... 65 LISTA DE TABELAS Tabela 1. Propriedades mecânicas do osso alveolar e de materiais de implante comumente utilizados (LI, Jinmeng et al., 2020). ................................................................................ 24 Tabela 2. Bandas FTIR e suas respectivas atribuições para TiO2, PSS e um filme LbL (TiO2/PSS) (ν: stretching; νa: stretching assimétrico; νs: stretching simétrico; δ: bending).53 Tabela 3. Pontuações (scores) de imunomarcação das proteínas Runx2, Fosfatase alcalina (ALP), Osteopontina (OPN) e de osteocalcina (OCN) para os implantes recobertos com os filmes LbL (PSS/TiO2)5PSS e (PSS/TiO2)5 e as superfícies de controle. Pontuações: não observado (-), marcação leve (+), marcação moderada (++) e marcação intensa (+++). .... 63 LISTA DE SÍMBOLOS E ABREVIAÇÕES AFM: microscopia de força atômica ALP: Fosfatase Alcalina DNA: ácido desoxirribonucleico DRX: Difração de raios X FTIR: Espectroscopia por absorção no infravermelho com Transformada de Fourier LbL: Layer-by-Layer MEO: matriz extracelular óssea MEV: microscopia eletrônica de varredura micro-Raman: espectroscopia de espalhamento Raman com microscopia óptica OCN: Osteocalcina OPN: Osteopontina PAH: poli (cloridrato de alilamina) PDDA: poli (dialildimetilamônio) PEM: multicamadas de polieletrólito pH: potencial hidrogeniônico PSS: poli (4-estirenossulfonato de sódio) RMS: rugosidade média quadrática Ti: Titânio TTIP: isopropóxido de titânio (IV) TiO2: dióxido de titânio UV: irradiação ultravioleta UV-C: ultravioleta - C UV-VIS: espectroscopia de absorção molecular no ultravioleta-visível SUMÁRIO 1. Introdução e motivação ................................................................................... 17 2. Fundamentação Teórica .................................................................................. 22 2.1. Utilização do titânio e suas ligas em implantes ............................................... 22 2.2. Funcionalização de superfícies de implantes de titânio e suas ligas ............... 25 2.3. A técnica Layer-by-Layer - LbL ....................................................................... 28 2.4. O dióxido de titânio – TiO2 .............................................................................. 33 2.5. O poli(4-estireno sulfonato de sódio) – PSS .................................................... 35 3. Objetivos .......................................................................................................... 37 3.1. Objetivos gerais ................................................................................................ 37 3.2. Objetivos específicos ........................................................................................ 38 4. Materiais e Métodos ......................................................................................... 38 4.1. Materiais utilizados .......................................................................................... 38 4.2. Síntese sol-gel de TiO2 e determinação de fases cristalinas ............................ 39 4.3. Crescimento dos filmes LbL e filmes casting .................................................. 39 4.4. Caracterizações dos filmes LbL ...................................................................... 41 4.4.1. Espectroscopia de Absorção Molecular na Região do Ultravioleta e Visível – UV-VIS 41 4.4.2. Espectroscopia por absorção no infravermelho com Transformada de Fourier – FTIR ............................................................................................................... 41 4.4.3. Microscopia de força atômica – AFM ............................................................. 41 4.4.4. Espectroscopia Micro-Raman ......................................................................... 42 4.4.5. Microscopia eletrônica de varredura – MEV ................................................. 42 4.5. Testes in vivo .................................................................................................... 42 4.5.1. Análises de Imunomarcação ............................................................................ 44 4.5.2. Análises Biomecânicas ..................................................................................... 45 5. Resultados e Discussões ................................................................................... 45 5.1. Determinação de fases cristalinas via difração de raios-X (DRX) ................. 45 5.2. Caracterizações dos filmes LbL sobre lâmina de sílica fundida ou de silício 46 5.2.1. UV-VIS ............................................................................................................. 46 5.2.2. FTIR ................................................................................................................. 50 5.2.3. AFM ................................................................................................................. 53 5.3. Caracterizações dos filmes LbL sobre substrato de liga de Ti ....................... 58 5.3.1. Micro-Raman ................................................................................................... 58 5.3.2. MEV ................................................................................................................. 60 5.4. Testes in vivo .................................................................................................... 61 5.4.1. Análises de Imunomarcação ............................................................................ 61 5.4.2. Análises Biomecânicas ..................................................................................... 64 6. Conclusões ........................................................................................................ 66 7. Perspectivas para trabalhos futuros decorrentes da Tese .............................. 67 8. Referências Bibliográficas ............................................................................... 68 17 1. Introdução e motivação O tecido ósseo é uma das estruturas mais complexas e dinâmicas do corpo humano. Capaz de se regenerar parcialmente após uma lesão, acidente ou mesmo após uma doença, o tecido ósseo distingue-se pela sua multifuncionalidade em função de três principais características: ductilidade, rigidez e resiliência. Sua multifuncionalidade tem papel fundamental na qualidade de vida de um ser humano pois implica em quatro funções essenciais: suporte mecânico, equilíbrio mineral, proteção de outros órgãos e hematopoese (FLOREA et al., 2020). A dinamicidade desse tecido envolve um mecanismo biológico baseado em um equilíbrio de formação e de reabsorção de dois tipos principais de células: os osteoclastos - tendo um papel principal na reabsorção e os osteoblastos - principais estruturas celulares formadoras de osso. O equilíbrio entre a reabsorção e a formação é mantido por biomoléculas específicas que inibem e controlam a atividade de cada tipo de célula, sendo que, em um ser humano saudável, a atividade dos osteoclastos e dos osteoblastos é sincronizada (FLOREA et al., 2020). A Figura 1 ilustra o modelo de um osso humano. Nota-se um sistema consideravelmente heterogêneo e complexo. O tecido ósseo compreende diferentes níveis de estruturas hierárquicas nas escalas macro, micro e nano. Sua flexibilidade deve-se ao entrelaçado orgânico enquanto a resistência mecânica é relativa à parte composta de cristais de hidroxiapatita (LI, Jinmeng et al., 2020). 18 Figura 1. Representação esquemática de um osso humano. Adaptado de (SCHEINPFLUG et al., 2018). Diariamente, o tecido ósseo é exposto a esforços mecânicos com variadas cargas aplicadas sobre ele. Quando a intensidade da carga mecânica aplicada ao osso é extrema, ocorre uma fratura óssea. Para a maioria das fraturas, o processo de regeneração é bem- sucedido e o tecido ósseo danificado é recuperado. Contudo, entre 5 e 10% dos indivíduos com fraturas sofrem com um processo de recuperação lento ou com a falta de união entre as partes danificadas desse tecido. Nos casos em que as fraturas ocorrem em indivíduos com comorbidades, tais como o diabetes, determinados fatores genéticos, estilo de vida 19 inadequado (consumo excessivo de álcool, sedentarismo, etc), aumenta-se o risco de se fazer parte desse percentual de indivíduos (HO-SHUI-LING et al., 2018). Apesar de todas as suas qualidades, mesmo para um indivíduo saudável, o tecido ósseo não é suficiente em si para promover sua plena regeneração em algumas circunstâncias, por exemplo, fraturas ósseas complexas de tamanhos críticos e de ambiente circundante severamente danificado. Devido a tal potencial restrito e de seu papel essencial na qualidade de vida de um ser humano, a utilização de dispositivos médicos visando a plena regeneração do tecido ósseo avariado é de vital importância. Ademais, um aumento no desenvolvimento de novos dispositivos médicos para esse fim e a otimização daqueles já empregados é implicação direta de sua relevância. Os implantes dentários têm sido utilizados em um número crescente de pacientes parcialmente ou totalmente edêntulos e se tornaram rotineiros em tratamentos para reabilitação oral (LI, Jinmeng et al., 2020). A busca por maior funcionalidade, mais rápida e contínua (de estabilidade de longa duração), dos implantes tem impulsionado as pesquisas nas áreas de odontologia, medicina, materiais, física, química, biologia, dentre outras. Essa abrangente busca por um material adequado para implantes dentários tem como foco a biocompatibilidade do mesmo, ou seja, a capacidade do material funcionar com uma resposta apropriada do hospedeiro em uma aplicação específica. A Figura 2 apresenta uma radiografia onde identifica-se um implante dentário já inserido no tecido ósseo de um paciente. Figura 2. Radiografia de uma região da cavidade oral de um paciente com implante dentário. Adaptado de (FOKAS; MATTHEOS, 2018). 20 No caso da odontologia, os implantes dentários precisam se comportar, em termos funcionais, o mais próximo possível, de dentes saudáveis e naturais. Para isso, a compatibilidade com o tecido rígido para a formação e colagem óssea e a compatibilidade com o tecido mole para a adesão do epitélio gengival são necessárias aos implantes dentários (HANAWA, 2019). Quando o procedimento cirúrgico é bem-sucedido e o material do implante é adequado, cria-se uma conexão direta estrutural e funcional entre o osso vivo e a superfície de um implante. Tal fenômeno é chamado “osseointegração” e ocorre em três principais estágios: a resposta primária do hospedeiro após a inserção do implante, seguida por processos de osteogênese e remodelação (FLOREA et al., 2020). Quando o implante é inserido no tecido nativo, o corpo humano desencadeia o processo de inflamação de um a três dias após a inserção do implante. Após essa etapa, ocorre a vascularização dentro da lacuna no osso nativo. Esse processo dura cerca de uma semana. Finalizada a vascularização ocorre a expressão gênica, ou seja, o DNA (ácido desoxirribonucleico) é convertido em um sinal funcional na forma de moléculas ou proteínas específicas com o objetivo de gerar uma resposta biológica. Portanto, moléculas como osteonectina, osteocalcina ou osteopontina influenciarão a via de diferenciação das células- tronco mesenquimais em osteoblastos que formarão a nova matriz extracelular óssea (MEO) (FLOREA et al., 2020). A expressão gênica dos osteoblastos também é influenciada por flutuações mecânicas surgidas na interface peri-implantar e é um fator fundamental que controla de forma positiva o comportamento dos osteoblastos e proporcionará um aumento do nível de osso maduro neoformado (FLOREA et al., 2020). A estabilidade do implante em estágios iniciais é um dos fatores mais importantes que afetam o sucesso da osseointegração. O sucesso no processo de osseointegração está relacionado diretamente a muitos fatores, como design do implante (nano e microestrutura), técnica cirúrgica, tipo de implante usado e qualidade e quantidade de osso no local do implante (ALMASSRI et al., 2020; LÓPEZ-VALVERDE et al., 2020). O aumento da molhabilidade da superfície do implante oferece grandes vantagens durante os primeiros estágios da cicatrização de feridas e durante a cascata de eventos que ocorre durante a osseointegração (ALMASSRI et al., 2020). 21 Um implante dentário age semelhantemente a um dente real, ou seja, fica estruturalmente ligado a um dos maxilares como uma raiz dentária artificial servindo de esteio para fixação de uma coroa, uma prótese removível ou uma prótese total fixa. A prótese dentária é afixada sobre o esteio utilizando-se cimento dentário ou parafusos. O implante dentário é empregado como uma opção de tratamento em casos de doenças dentárias, ferimentos, acidentes, dentre outras ocorrências. O aspecto essencial de um implante dentário é sua capacidade de estabelecer uma interação adequada entre a superfície do implante e o osso humano fornecendo ao implante confinamento e suporte (FLOREA et al., 2020). Assim, o material do implante necessita ser um biomaterial, ou seja, um material projetado para assumir uma forma que possa dirigir, por meio de interações com sistemas vivos, o curso de qualquer procedimento terapêutico ou diagnóstico. Para além do fato dos biomateriais possuírem propriedades adequadas, os pacientes ainda estão expostos a possíveis complicações, incluindo infecções, desgaste do implante, falha ou deslocamento. A pesquisa desenvolvida atualmente nessa área está focada em estratégias que possam prevenir esses problemas e, ao mesmo tempo, serem economicamente viáveis. Nesse sentido, é importante considerar a relação custo-benefício do produto (o implante) e do procedimento cirúrgico necessário para sua implantação (HO-SHUI-LING et al., 2018). Mesmo que implantes possuam propriedades osseointegrativas, ainda existem algumas limitações a serem superadas quanto à colonização bacteriana e a consequente falha do implante por infecções. Infecções podem ocorrer após a inserção do implante no corpo do hospedeiro devido a uma indesejável adesão bacteriana. Os implantes dentários podem ser contaminados devido ao meio em que se encontram, a cavidade oral, que apresenta microrganismos abundantes. A adesão bacteriana é sucedida pela formação de um biofilme que encapsula o implante em detrimento ao suporte necessário a um implante bem-sucedido. A resistência do biofilme aos antibióticos é um dos principais problemas nas infecções relacionadas aos implantes e, no momento, não há tratamento disponível que garanta eficácia na prevenção e erradicação do biofilme. A falha do implante devido à adesão bacteriana é altamente complicada de tratar e, geralmente, requer a substituição do implante infectado. A ligação insuficiente dos implantes com tecidos moles torna possível a invasão de bactérias 22 que podem gerar inflamação, seguida de reabsorção óssea, soltura, movimentação e perda do implante. No caso dos implantes dentários, tais eventos são conhecidos como peri- implantites (BERGLUNDH et al., 2018; HEITZ-MAYFIELD; SALVI, 2018). Nos Estados Unidos (EUA), dois milhões de pacientes foram diagnosticados com infecções nosocomiais por conta de implantes. No Reino Unido, entre 7 e 11 milhões de libras esterlinas são gastas a cada ano para o tratamento de infecções associadas a implantes (FLOREA et al., 2020). Quanto aos fatores relacionados ao sucesso do implante inserido em tecido ósseo, destaca-se o papel de sua superfície que é a portadora das características fundamentais para uma bem-sucedida osseointegração: topografia e estrutura química. O material do implante a ser utilizado bem como sua superfície devem ser tratados considerando os fatores que influenciam de maneira positiva a estabilidade a longo prazo de um implante (FLOREA et al., 2020; LEO KUMAR; AVINASH, 2020). Assim, seus constituintes devem ser capazes de lidar com condições biológicas, físicas e químicas mutáveis durante sua vida útil. Existe uma grande variedade de dispositivos médicos disponíveis no mercado, mas a maioria deles ainda apresenta algumas desvantagens que precisam ser superadas. A fim de aprimorar a osseointegração, várias modificações de superfícies têm sido desenvolvidas ao longo dos anos. 2. Fundamentação Teórica 2.1. Utilização do titânio e suas ligas em implantes Os metais são materiais usados em uma ampla gama de dispositivos implantáveis em vários campos, incluindo cardiologia (coração artificial, stents coronários, etc.) e ortopedia (implantes temporários e permanentes, incluindo dentais). Eles desempenham um papel importante na indústria ortopédica devido à combinação de rigidez, dureza e resistência mecânica (FLOREA et al., 2020). O titânio (Ti) é utilizado como material de implante desde 1952 e suas possibilidades de utilização na ortodontia são atualizadas e implementadas periodicamente. A utilização do Ti teve início no final dos anos 1940. Celeremente ele surgiu como um material de implante cirúrgico de sucesso (LEO KUMAR; AVINASH, 2020). 23 O Ti e suas ligas possuem propriedades mecânicas distintas do osso conforme pode ser observado na Tabela 1Seus módulos de elasticidade são significativamente maiores que os módulos de elasticidade dos diferentes tipos de ossos. Quando comparado com o módulo de elasticidade da mandíbula, o módulo de elasticidade do Ti é, no mínimo, 5,8 vezes maior. Entretanto, comparado aos demais biomateriais indicados na tabela, as propriedades mecânicas do Ti e suas ligas são as que mais se aproximam dos valores encontrados para o osso. Além disso, o Ti e suas ligas apresentam excelente resistência à corrosão e boa compatibilidade com o tecido ósseo (HANAWA, 2019). Evidências substanciais de pesquisas básicas e o alto desempenho clínico atestam a boa compatibilidade interfacial e química do Ti e suas ligas com os tecidos. Por conta da melhor osseointegração apresentada em comparação com outros metais, o Ti (e também suas ligas) foram imediatamente difundidos entre pesquisadores de materiais dentários em todo o mundo. Uma das razões para a compatibilidade do tecido ósseo com o Ti é sua capacidade de formar fosfato de cálcio. Essa capacidade foi verificada em estudos sobre a capacidade de formação de fosfato de cálcio em fluidos corporais simulados. Além disso, o Ti mostrou resultados muito relevantes na avaliação da atividade osteoblástica e calcificação, avaliação histológica e biológica molecular quando implantado em animais (HANAWA, 2019). Todas essas características, aliadas ao baixo custo de produção, têm levado a uma grande demanda do Ti na fabricação de sistemas de ancoragem óssea, como implantes dentários (WAGSTAFFE et al., 2019). Atualmente, o Ti é um material alvo de muitas pesquisas na área de implantes com bons resultados bem documentados e, por isso, preferido pela maioria das empresas de implantes (LI, Jinmeng et al., 2020). Importa destacar e é amplamente aceito que, o osso humano e o osso animal reagem de forma semelhante à remodelação óssea induzida por carga. Tal característica oferece a oportunidade de estudar a relação das propriedades mecânicas dos materiais do implante e do corpo do implante em relação à osteogênese em modelos animais experimentais (LI, Jinmeng et al., 2020). 24 Tabela 1. Propriedades mecânicas do osso alveolar e de materiais de implante comumente utilizados (LI, Jinmeng et al., 2020). Módulo de elasticidade Dureza Maxila 16,52 ± 2,57 𝐺𝑃𝑎 0,47 ± 0,08 𝐺𝑃𝑎 Mandíbula 21,36 ± 3,60 𝐺𝑃𝑎 0,62 ± 0,09 𝐺𝑃𝑎 Cortical 15,85 ± 2,10 𝐺𝑃𝑎 0,53 ± 0,06 𝐺𝑃𝑎 Trabecular 7,95 ± 2,10 𝐺𝑃𝑎 0,55 ± 0,06 𝐺𝑃𝑎 Aço inoxidável 316L 200 𝐺𝑃𝑎 149 𝐻𝑉 Ti comercialmente puro – grau 4 104,1 𝐺𝑃𝑎 220 𝐻𝑉 Ti6Al4V 110 𝐺𝑃𝑎 400 𝐻𝑉 Óxido de Alumínio 380 𝐺𝑃𝑎 1800 𝐻𝑉 Óxido de zircônio 210 𝐺𝑃𝑎 1200 𝐻𝑉 A osseointegração do Ti é largamente investigada em ortopedia e odontologia, uma vez que as falhas dos implantes estão principalmente associadas à baixa integração entre a superfície do implante e o osso circundante (FERREIRA et al., 2019). O mercado de revestimentos para dispositivos médicos deve crescer devido ao aumento da população geriátrica e à contínua e crescente demanda por inovação (FERREIRA et al., 2019). Estudos experimentais sobre atrito, desgaste e lubrificação estão emergindo como uma área de pesquisa essencial em bioengenharia (LEO KUMAR; AVINASH, 2020). Os implantes são submetidos a micro movimentos cíclicos em contato com a interface óssea, o que resultaria em desgaste significativo produzindo resíduos tóxicos. Isso, então, implicaria em falha do implante por afrouxamento em um curto período. Nos implantes dentários, cada processo de mastigação é considerado um ciclo de tribocorrosão. A erosão repetida de filmes de dióxido de Ti (TiO2) no Ti e suas ligas por ciclos de mastigação resulta em desgaste na interação entre osso e implante. A resistência à corrosão e ao desgaste desempenha um papel vital no aumento da vida útil dos implantes. A seleção do material para aplicação biomédica deve ser feita com base nessas propriedades 25 que contribuem diretamente para a osseointegração (LEO KUMAR; AVINASH, 2020). Uma outra característica negativa do Ti e suas ligas é a fraquíssima ligação com o tecido mole. Apesar da importância da adesão do epitélio juncional ao Ti e suas ligas em implantes dentários, este desafio ainda não foi superado. A ligação do epitélio juncional ao Ti é tentada até o momento por uma ancoragem mecânica com superfícies de Ti rugosas ou ranhuradas uma vez que a adesão química do tecido mole aos metais é difícil (HANAWA, 2019). 2.2. Funcionalização de superfícies de implantes de titânio e suas ligas A superfície do Ti e de suas ligas é recoberta por uma camada constituída principalmente de TiO2 amorfo ou de baixa cristalinidade e não estequiométrica. Mesmo sendo o principal material escolhido pela indústria de implantes, o Ti ainda está sujeito a algumas limitações quando inserido no hospedeiro, tais como: detritos produzidos pelo desgaste do material, corrosão, adesão bacteriana, interações inadequadas com o ambiente biológico etc. Assim, o processo de perda de um implante osseointegrado pode ser considerado multifatorial (KUNRATH et al., 2021). A maioria dessas ocorrências indesejáveis tem levado às segundas intervenções cirúrgicas e, também, à falha total do implante. Os resíduos de metal contribuem muito para a infecção e o afrouxamento do implante. Os íons metálicos, provenientes dos implantes após um processo de tribocorrosão ou corrosão, também podem estimular a produção de mediadores pró-inflamatórios pelos osteoblastos e podem contribuir para a reação inflamatória geral na osteólise peri-implantar (COSTA et al., 2019; FLOREA et al., 2020). A fim de se superar os desafios inerentes à osseointegração e, considerando-se as características do Ti e sua ampla utilização como material de implantes ósseos, é imperativo o tratamento superfície do implante. A superfície de um implante é a região de contato entre o implante e o tecido circundante. Quando um implante é circundado por tecido ósseo, inicialmente, a superfície do implante entra em contato com o tecido. A superfície de um implante também desempenha um papel crucial no aumento da osseointegração e na redução do tempo necessário para a integração adequada do tecido e do implante. A adesão inicial, o crescimento celular e muitos outros processos dependem do comportamento da superfície do 26 implante (LEO KUMAR; AVINASH, 2020; LÓPEZ-VALVERDE et al., 2020). A resposta do hospedeiro a um biomaterial está correlacionada com fatores específicos, muitos deles dependendo das características da sua superfície (FLOREA et al., 2020; LÓPEZ- VALVERDE et al., 2020). O tratamento de superfície é um processo que altera a morfologia, a estrutura e composição químicas da superfície, mantendo-se as propriedades mecânicas do volume restante (bulk) do material. Novos elementos físicos, químicos ou biológicos na superfície do implante podem oferecer funcionalidade aprimorada, biocompatibilidade e propriedades antibacterianas (FLOREA et al., 2020). A topografia de superfície em micro e nanoescala influencia fortemente a adesão de células humanas após a implantação. A modificação topográfica visa produzir micro poros, micro ranhuras, nanoporos, grades, colunas, rugosidade, textura, porosidade e hidrofilia. Os resultados de vários trabalhos mostraram que as respostas biológicas como o torque de remoção de um implante dentário foram significativamente influenciadas pela rugosidade e molhabilidade da superfície dos implantes (LEO KUMAR; AVINASH, 2020; LÓPEZ-VALVERDE et al., 2020). A pesquisa em tratamentos das superfícies de implantes busca uma nova geração de implantes ortopédicos e odontológicos com design adequado, que possam ser aplicadas nos mais distintos tipos de hospedeiros (por exemplo, pacientes com comorbidades) e custo viável que possam ser fabricados em escala industrial. Com esse intento, a pesquisa nessa área tem apresentado diversas alternativas com vistas à superação dos desafios iminentes. Até agora, a maioria das alternativas elaboradas por cientistas nos últimos anos apresentou resultados promissores, mas para torná-las clinicamente disponíveis é necessário aprofundar as investigações em termos de testes in vivo e ensaios clínicos (FLOREA et al., 2020). A necessidade de melhorar o desempenho dos componentes fabricados atua como uma força motriz para tecnologias de fabricação inovadoras (LEO KUMAR; AVINASH, 2020). Assim, a perspectiva para o indivíduo que necessita ou necessitará de um implante ósseo é animadora: resultados iniciais promissores, o atual volume de pesquisas nessa área e as novas pesquisas sendo desenvolvidas a cada dia. 27 Para melhorar a osseointegração, a modificação da superfície pode ser realizada em Ti e ligas à base de Ti alterando a morfologia da superfície, a estrutura da fase e a composição química (GAINTANTZOPOULOU et al., 2014; KHODAEI et al., 2020). Para melhorar os resultados clínicos dos implantes, muitos trabalhos têm sido realizados para modificar a superfície dos implantes de Ti , principalmente no preparo de diferentes modificações físicas e químicas para melhorar a osseointegração entre o osso alveolar e a superfície do implante. No que diz respeito à modificação física, a técnica de jateamento de areia (sandblasting) é o método físico mais comumente utilizado. Além disso, existem algumas outras tecnologias de modificação, como pulverização atmosférica por plasma (plasma spraying), co-pulverização magnetron (magnetron co-sputtering), eletroerosão, tratamento térmico, modificação de superfície a laser e irradiação ultravioleta (UV) (DONG et al., 2020). Esses métodos físicos podem alterar a morfologia da superfície e rugosidade dos implantes e fornecem uma base melhor para a osseointegração. Com relação às modificações químicas, a anodização é uma das técnicas de modificação química mais comumente utilizadas. Além disso, também são utilizadas a dupla corrosão ácida, a tecnologia de tratamento térmico alcalino, a oxidação por micro-arco e a hidroxiapatita bifásica preparada por métodos de oxidação eletrolítica por plasma que modifica o dióxido de titânio. Atualmente, uma combinação de vários métodos de tratamento alcançará efeitos clínicos mais otimizados (DONG et al., 2020). Além disso, as ligas de Ti e o Ti são os materiais mais usados na fabricação de implantes. Algumas desvantagens relacionadas ao acúmulo de partículas de Ti no tecido circundante levando a respostas inflamatórias (HE et al., 2020; REINHARDT; BEIKLER, 2014), e a cor acinzentada escura e consequentes problemas estéticos (ÖZKURT; KAZAZOǦLU, 2011; REINHARDT; BEIKLER, 2014) impulsionaram a investigação de materiais de implante de cerâmica. A zircônia tem sido sugerida como um material alternativo para os implantes dentários de Ti e alguns trabalhos têm tentado abordar as vantagens e desvantagens de cada um (ÖZKURT; KAZAZOǦLU, 2011; REINHARDT; BEIKLER, 2014; SIVARAMAN et al., 2018). 28 De fato, os implantes dentários de zircônia apresentam características excepcionais como cor dentária, boas propriedades mecânicas e biocompatibilidade. Foi relatada menor taxa de adesão de bactérias (AL-RADHA et al., 2012; REINHARDT; BEIKLER, 2014), menor citotoxicidade (HE et al., 2020) e liberação de íons reduzida quando comparada ao Ti (REINHARDT; BEIKLER, 2014). No entanto, conforme apontado por Sivaraman et al. (SIVARAMAN et al., 2018) e Reinhard et al. (REINHARDT; BEIKLER, 2014) a principal desvantagem dos implantes de zircônia é que os estudos clínicos referentes a este material são, principalmente, de curto prazo, com um número limitado de estudos de longo prazo. Com relação aos materiais de implante, é ideal ter uma investigação de longo prazo de 10 anos ou mais. Como a zircônia é um material de implante relativamente novo, são necessárias análises adicionais para prevenir o envelhecimento, melhorando as propriedades da superfície, estrutura e osseointegração (SIVARAMAN et al., 2018). Uma recente meta análise concluiu que os dados atuais sobre a utilização de Ti e zircônia como materiais de implante ainda não permitem apontar claramente para a utilização de um deles em detrimento do outro (KNIHA et al., 2021). Ademais, diferentes tipos de zircônia com várias composições foram investigados. Diferentes processos de sinterização e manufatura têm sido propostos. Ainda existe a necessidade de se estabelecer um protocolo padrão para a fabricação de implantes de zircônia (SIVARAMAN et al., 2018). Neste trabalho, optamos por trabalhar com Ti para modificação de superfície, um material bem conhecido e consagrado para implantes dentários. Como a maior parte da literatura reporta a modificação da superfície de Ti, comparar outros trabalhos é mais valioso para verificar os benefícios da modificação da superfície proposta. 2.3. A técnica Layer-by-Layer - LbL O método de preparação de filmes LbL deve-se às interações eletrostáticas com adsorção alternada de partículas coloidais com cargas opostas. Inicialmente, foi proposto por Iler em 1966 (ILER, 1966). Duas décadas mais tarde, Maoz e colaboradores propuseram um sistema de multicamadas baseado em interações químicas, geralmente ligações covalentes, entre as camadas depositadas, utilizando o termo “self-assembly” (MAOZ, J. NETZER, L. GUN, 1988). Na década de 90, Decher e colaboradores (DECHER, 1997) empregaram 29 moléculas contendo grupos iônicos como compostos anfifílicos e polieletrólitos, sendo este método denominado pela sigla LbL (do inglês “Layer-by-Layer”). Inicialmente, a técnica LbL consistia na imersão de um substrato sólido (geralmente com certo desequilíbrio de cargas em sua superfície) por um determinado intervalo de tempo numa solução aquosa contendo o material a ser depositado. A carga deste material em solução deveria ser contrária à do substrato para que ocorresse adsorção por atração eletrostática (força coulombiana como a principal força envolvida no crescimento deste tipo de filme). As ligações de hidrogênio e as interações de van der Waals também podem desempenhar um papel na adsorção dos materiais (SCHÖNHOFF, 2003). Posteriormente, o conjunto substrato + monocamada é lavado a fim de eliminar o excesso de material. Em seguida o conjunto poderia ser seco com ar comprimido, nitrogênio ou ventilador. Na sequência, o conjunto é imerso numa solução contendo um outro material, agora de carga contrária à do material inicialmente depositado, formando assim os filmes ultrafinos compostos por bicamadas moleculares catiônicas e aniônicas, alternadamente adsorvidas. O novo conjunto substrato + bicamada é lavado podendo ser secado novamente. Hipoteticamente, todo o procedimento citado acima pode ser repetido para que sejam crescidas quantas bicamadas se desejar. Atualmente, filmes LbL podem ser crescidos também por gotejamentos das soluções, jateamento em gotículas (spray) sobre substratos, além das técnicas eletromagnética e fluídica (RICHARDSON; BJÖRNMALM; CARUSO, 2015), como ilustra a Figura 3. 30 Figura 3. Esquemas de crescimento de filmes multicamadas pela técnica LbL. Adaptado de (RICHARDSON; BJÖRNMALM; CARUSO, 2015). 31 A técnica LbL tem chamado a atenção por causa de sua simplicidade e versatilidade para modificação de superfície. Os revestimentos constituídos de multicamadas de polieletrólito (PEM) depositados de acordo com a técnica de LbL proporcionam modificação de superfície eficaz e está entre as ferramentas mais amplamente exploradas atualmente usadas para modificar as propriedades de superfície de biomateriais para induzir respostas específicas do tecido (CATHERINE PICART; VOEGEL, 2015; PAHAL et al., 2017). Uma das vantagens mais importantes da abordagem LbL é a independência da geometria do substrato. Por exemplo, implantes disponíveis comercialmente, ou seja, parafusos, pinos, fios e abutments são muitas vezes curvados com diferentes formas geométricas, o que torna a modificação da superfície em nanoescala impraticável por meio de algumas outras técnicas (LI, Tao et al., 2018). Mesmo sobre essas diferentes formas geométricas, o método LbL permite o controle preciso de composição, morfologia e estrutura do filme sem alterar significativamente as propriedades físicas e mecânicas da superfície do substrato. Além disso, o crescimento de filmes via LbL por imersão do substrato em soluções (procedimento LbL mais utilizado) é bastante simples. Por isso também, essa técnica é bastante acessível. A morfologia do filme LbL pode ser ajustada em nanoescala para atingir a espessura desejada, biocompatibilidade e outras características que fornecem filmes robustos e homogêneos. Dependendo do polieletrólito e dos ajustes nas propriedades físicas e químicas dos materiais automontados, a técnica LbL pode ser usada para ajustar as propriedades do implante, por exemplo, promovendo adesão, proliferação e diferenciação de células relacionadas na superfície do implante e aumentar a osseointegração, ou mesmo, melhorar as características mecânicas. Essa técnica também representa um método versátil para modificar as propriedades da superfície, a fim de controlar a interação celular e, assim, melhorar as funções biológicas. Além disso, através dessa técnica pode-se revestir todos os tipos de superfícies com o crescimento de um filme homogêneo e incluir e controlar a liberação de biomoléculas e/ou drogas (FERREIRA et al., 2019). As propriedades físico-químicas dos materiais envolvidos no crescimento do filme, como concentração de polieletrólito na solução e densidade de carga, podem afetar as 32 propriedades finais das multicamadas. Outrossim, a natureza e a organização das biomoléculas ou polieletrólitos (ou seja, estrutura química, comprimento molecular das biomoléculas depositadas, etc) desempenham um papel fundamental na topografia e nas propriedades de superfície do biomaterial durante o crescimento do filme LbL (FERREIRA et al., 2019). A maioria das células tem melhor interação com PEMs cuja última camada tem carga negativa (CATHERINE PICART; VOEGEL, 2015). Por exemplo, um maior grau de diferenciação de células do músculo esquelético C2C12 foi alcançado com a camada terminal de poliânion que uma camada terminal de policátion (RICOTTI et al., 2011). Células de carcinoma humano semelhantes a osteoblastos SaOS-2 (geralmente usadas para avaliar fenótipos ósseos) foram cultivadas em diferentes PEMs e o fenótipo específico de ALP (fosfatase alcalina) foi mantido apenas quando a camada externa foi composta com os polieletrólitos carregados negativamente (TRYOEN-TTH et al., 2002). Recentemente, Wang et al. (WANG, Qiong et al., 2020) demonstraram que filmes LbL contendo lipopolissacarídeo-amina e ácido hialurônico funcionalizado com catecol podem resistir a danos mecânicos e manter a integridade estrutural em um processo clínico simulado. Em trabalhos recentes, foram produzidos revestimentos via técnica LbL a base de proteína morfogenética óssea-2 (BMP-2) imobilizada em superfície de Ti (EAWSAKUL; TANCHAROEN; NASONGKLA, 2021), com incorporação do antibiótico gentamicina (POURAGHAEI et al., 2021), de ácido desoxirribonucleico (DNA) (OUNI et al., 2021) e com incorporação de ácido tânico (WANG, Guofeng et al., 2021). Tais revestimentos possuíam boa biocompatibilidade. Além disso, promoveram a proliferação de células de osteoblastos e tiveram boa estabilidade e, em alguns casos, apresentaram também propriedade antibacteriana. Quanto à necessidade de tratamentos de superfície que promovam mais rapidamente a osseointegração, que sejam estáveis (química e biologicamente seguros) após a implantação no corpo do hospedeiro a longo prazo, o crescimento de filmes pela técnica LbL apresenta- se como uma tecnologia consolidada com potencial ilimitado de sistemas multicamadas que tem contribuído significativamente na fabricação de dispositivos médicos ósseos inovadores e eficientes com baixo custo e alta reprodutibilidade. Há ainda alguns desafios inerentes à 33 esta técnica a serem superados: em alguns casos, o processo é demorado e tem baixa eficiência de produção, muitas vezes exigindo horas ou dias para fazer um lote de amostras, dependendo do número de camadas; a deposição repetitiva limita o número de camadas de revestimento e, portanto, a espessura do revestimento, que pode não ser adequada para certas aplicações; a deposição repetitiva pode causar contaminação cruzada de diferentes materiais usados para a fabricação do revestimento (ZHU; WANG, 2021). Porém, os avanços e superações de desafios referentes à técnica LbL estão acontecendo mais rapidamente do que nunca nos mais diversos campos de pesquisa, principalmente no campo da biomedicina (FERREIRA et al., 2019). 2.4. O dióxido de titânio – TiO2 O dióxido de Ti (TiO2) e Ti metálico têm sido as duas formas principais de utilização do Ti, tendo, o primeiro, um consumo muito maior em comparação com o último (LIANG; DING, 2020). Em 2019, a produção de TiO2 ultrapassou os 3 milhões de toneladas por ano, com crescimento anual de cerca de 10% sendo a China o país com maior produção no mundo (LIANG; DING, 2020). O TiO2 é um material branco, de relativo baixo custo e pouco solúvel em água com inúmeras aplicações em campos biomédicos, como cosméticos, medicamentos, produtos farmacêuticos, biomateriais, dispositivos médicos e muitos outros campos (LIANG; DING, 2020). A Figura 4 ilustra as três conformações cristalográficas mais conhecidas do TiO2: anatase, rutilo e bruquita. Figura 4. Fases cristalográficas mais conhecidas do TiO2. Adaptado de (HAGGERTY et al., 2017). 34 Um filme passivo de óxido de Ti é formado espontânea e quase instantaneamente na superfície de Ti quando esta é exposta ao ar atmosférico. Tal filme é amorfo, composto majoritariamente de TiO2 (GAINTANTZOPOULOU et al., 2014) e, dificilmente contém contornos de grão ou defeitos estruturais por isso, geralmente são resistentes à corrosão. Os filmes passivos de TiO2 amorfos se formam rapidamente (~ 30 ms) sobre um substrato metálico de Ti e têm de 1 a 5 nm de espessura (HANAWA, 2011). O TiO2, ou titânia, possui rigidez, resistência à corrosão, estabilidade química e estabilidade térmica favoráveis à osseointegração (RADTKE et al., 2017; VISENTIN et al., 2019). A biocompatibilidade do Ti está diretamente ligada às propriedades da camada superficial de dióxido de Ti (TiO2), incluindo sua estrutura, composição e morfologia (SCARANO; POSTIGLIONE; et al., 2020). Essa camada superficial de TiO2 tem impacto direto na adsorção de proteínas e desenvolvimento de células/tecidos (WAGSTAFFE et al., 2019). O cálcio (Ca) e o fósforo (P) são incorporados à camada de óxido quando o implante de titânio entra em contato com o sangue do sítio cirúrgico, o que acelera o processo de osseointegração (SOUZA et al., 2019). Embora tenha sido bem documentado que a camada amorfa de TiO2 interage com o osso, a hidroxiapatita não cresce prontamente em tal superfície, uma vez que nem todas as porções de oxigênio são ordenadas (GAINTANTZOPOULOU et al., 2014; NAVARRO et al., 2021). Nas fases cristalográficas do TiO2, rutilo e anatase, os grupos de oxigênio interagem assertivamente com os grupos hidroxila da hidroxiapatita atuando como um facilitador da osseointegração. Entretanto, o surgimento dessas fases requer tratamentos adicionais. Segue daí a estratégia de implementar tratamentos de superfície em implantes de titânio criando-se domínios cristalinos de anatase e rutilo para melhorar a osseointegração (GAINTANTZOPOULOU et al., 2014; KHODAEI et al., 2020). Vários estudos in vitro e in vivo evidenciaram o efeito positivo da funcionalização de superfícies de Ti com uma camada de titânia cristalina em comparação com TiO2 nativo, demonstrando bioatividade aprimorada (POPESCU et al., 2007; VISENTIN et al., 2019). Recentemente, implantes de titânio revestidos com solução de prata-anatase ligaram- se muito bem ao osso e não apresentaram efeito adverso no tecido ósseo quando implantados 35 em coelhos, o que sugere possíveis aplicações clínicas para tal implante (SCARANO; CARINCI; et al., 2020). Partículas esféricas de Ti foram submetidas a tratamento com solução de H2O2 obtendo-se em sua superfície, ao final, uma “casca” de TiO2 na fase rutilo (RAJENDRAN; PATTANAYAK, 2020). Para essas partículas, os estudos de citocompatibilidade com células do tipo osteoblasto, MG63, mostraram boa viabilidade e adesão celular para as partículas de Ti. Os resultados sugerem que partículas de Ti encapsuladas com TiO2 podem ser candidatos a material para enchimento de osso ou cavidade dentária ou, ainda, cimento ósseo para materiais de substituição total do quadril. 2.5. O poli(4-estireno sulfonato de sódio) – PSS Polieletrólitos são polímeros compostos por um grande número de subunidades ionizáveis covalentemente ligadas. Podem ser dissociados em solventes polares (como água, metanol e etilenoglicol, e em solventes orgânicos, como tetra-hidrofurano) (ZOGHLAMI; GUETTARI; TAJOURI, 2017) em grupos iônicos fixados na cadeia, poliíons, e pequenos íons livres chamados contraíons. São muito utilizados como materiais para crescimento de multicamadas via técnica LbL (ADAMCZYK et al., 2009). O poli(4-estireno sulfonato de sódio) – PSS, ilustrado na Figura 5, é obtido pela polimerização de um tensoativo aniônico, o estireno sulfonato de sódio. É um polieletrólito aniônico (poliânion) forte (facilmente dissociável em água) em forma de um pó fino levemente amarelado. As moléculas de água formam ligações de hidrogênio com os átomos de oxigênio dos sítios de SO3 do PSS (ESQUIVEL-SIRVENT; YUN; STUMPF, 1994). O PSS apresenta, também, a interessante propriedade de quelação. Num trabalho, esta propriedade mostrou-se dependente do pH da solução e foi verificada para diversos íons metálicos (RIVAS, 1998). Este poliânion é amplamente utilizado em estudos básicos, em sistemas de liberação de drogas em organismos vivos, como o material para os invólucros das cápsulas e para regulação de carga e estabilização de várias suspensões (ADAMCZYK et al., 2009). 36 Figura 5. Estrutura química do PSS (Disponível em: Acesso 24 de nov. de 2021). No que concerne à sua aplicação em implantes ósseos, o PSS tem sido aplicado principalmente via técnica LbL. Recentemente, junto a outros materiais, o PSS foi utilizado num revestimento multicamadas responsivo a estímulos e independente de substrato para inibição, sob demanda, de fibrose tecidual causada por transplante de biomateriais artificiais e reparo de tecido (YUAN et al., 2020). No referido trabalho, a conjugação de medicamentos antiinflamatórios com implantes utilizando ponte clivável para liberação local responsiva ao ambiente não apenas reduziu os efeitos não específicos dos medicamentos em outros tecidos/ órgãos saudáveis, mas foi capaz de realizar uma terapia eficaz por dosagem moderada e controlável, resultando em diminuição dramática dos efeitos tóxicos e colaterais. Em um outro trabalho (JIA et al., 2019), partículas de bagdadita sintética modificadas com catecol e um polímero foram comontadas com polieletrólitos (inclusive o PSS) em substratos, resultando em cerâmicas confinadas que poderiam ser facilmente reticuladas posteriormente e adicionalmente funcionalizadas. No referido trabalho, os benefícios foram múltiplos, variando de estabilidade estrutural/química significativa (robustez) a propriedades físico- químicas de superfície otimizadas (molhabilidade, afinidade de proteína e bioatividade) e as atividades osteoblásticas e antibacterianas se apresentaram mais equilibradas. 37 O PSS e o poli (dialildimetilamônio) (PDDA) foram utilizados num revestimento (filme LbL) (YUAN et al., 2019) no qual partes de PSS e PDDA são fisicamente substituídas por polietilenoglicol (PEG) hetero-bifuncional terminando com um grupo carboxila e peptídeo antimicrobiano (ε-Poli-l-lisina, ε-PL) exibindo atividade antimicrobiana contra bactérias Gram-positivas e negativas e, também, atividade “anti-incrustação” superior em vários substratos, incluindo vidro e plástico. Superfícies de ligas de Ti foram funcionalizadas com multicamadas de PSS e poli (cloridrato de alilamina) – PAH combinando-se as técnicas polimerização por plasma e LbL (CHEN, Rui et al., 2020). Investigou-se a propriedade antibacteriana deste recobrimento. Os resultados mostraram uma propriedade antibacteriana eficaz contra Escherichia coli e Staphylococcus aureus. Recentemente, o PSS foi utilizado via técnica LbL num sistema drug delivery de gentamicina (THAHER, 2021) apresentando melhor carregamento e controle para liberação em comparação com os métodos de aprisionamento e adsorção deste antibiótico. Num outro trabalho, o PSS foi utilizado na construção de uma microcápsula contendo CaCO3 + dexametasona para funcionalização de scaffold de liga de Ti (CHUDINOVA et al., 2021) transformando sua superfície de hidrofóbica para hidrofílica. Os resultados de teste in vitro indicaram a não toxicidade desta superfície. Os dois materiais aqui mencionados, TiO2 e PSS foram investigados isolados ou combinados com outros materiais anteriormente a este trabalho demonstrando resultados promissores quanto à modificação da superfície do implante, conforme discutido acima. Este trabalho representa o primeiro estudo do efeito sinérgico entre os dois compostos através da formação de filmes nanoestruturados de multicamadas Layer-by-Layer para aplicação em implantes dentários. 3. Objetivos 3.1. Objetivos gerais • Contribuir para o desenvolvimento de uma nova geração de superfícies com potencial de osseointegração funcionalizadas de implantes. 38 • Avançar no conhecimento científico e tecnológico do PSS, do TiO2 e da técnica LbL aplicados à obtenção de superfícies biologicamente melhor compatíveis que as atuais, promovendo simultaneamente osseointegração precoce e a estabilidade mecânica de longo prazo nos implantes. 3.2. Objetivos específicos • Crescer filmes finos de multicamadas, via técnica LbL, de TiO2 e PSS sobre substratos de silício, sílica fundida e, também, em liga de Ti já utilizada em implantes dentários. • Havendo crescimento destes filmes, caracterizá-los físico-quimicamente pelas seguintes técnicas: espectroscopia de absorção molecular no ultravioleta- visível (UV-VIS), espectroscopia de absorção molecular no infravermelho com transformada de Fourier (FTIR), espectroscopia de espalhamento Raman com microscopia óptica (micro-Raman), microscopia de força atômica (AFM) e microscopia eletrônica de varredura (MEV). • Avaliar o desempenho de implantes funcionalizados com as multicamadas de TiO2 e PSS em testes in-vivo em ratos. • Analisar a resposta biológica de células ósseas quando em contato direto com as superfícies modificadas por meio de testes de imunomarcação. 4. Materiais e Métodos 4.1. Materiais utilizados O isopropóxido de titânio (IV) (TTIP) 97%, Triton X-100 e PSS (MW ~ 70.000) foram adquiridos da Sigma-Aldrich. Os demais reagentes utilizados, a saber, ácido nítrico (HNO3), ácido clorídrico (HCl), ácido sulfúrico (H2SO4), peróxido de hidrogênio (H2O2) e 2-propanol (C3H8O) eram de grau analítico. Todos os produtos químicos foram usados sem qualquer purificação adicional. A água ultrapura, usada para todas as soluções aquosas, foi obtida de um sistema Millipore Milli-Q. 39 Os filmes foram crescidos em quatro distintos substratos: i) de sílica fundida (University Wafer, Inc.) e ii) de silício (Si) (Semiconductor Wafer, Inc.), ambos em formato de lâminas com 0,5 mm de espessura; iii) discos de liga de Ti (com 8 mm de diâmetro e 2 mm de espessura) e; iv) implantes (com 2,0 mm de diâmetro e 4,0 mm de comprimento), ambos (iii e iv) com superfícies previamente tratadas com duplo ataque ácido foram gentilmente cedidos pela Medens® (Emfils - Indústria e Comércio de Produtos Odontológicos LTDA). 4.2. Síntese sol-gel de TiO2 e determinação de fases cristalinas O TiO2 foi sintetizado seguindo-se uma rota sol-gel de acordo com (TRINO, 2018). A síntese ocorreu por reações de hidrólise e condensação do TTIP empregando uma alta razão molar de água: alcóxido (200: 1), 2-propanol como co-solvente, HNO3 como catalisador e Triton X-100 como surfactante. Um volume de 185 ml de água ultrapura foi misturado a 56,7 ml de 2-propanol e 2,6 ml de HNO3. Em seguida, foram adicionados 15 ml de TTIP e a mistura foi agitada. A peptização foi iniciada sob agitação magnética durante 30 min. A evaporação dos solventes durante a hidrólise resultou na condensação do coloide, que apresentou uma coloração azul translúcida clara. Para formar a fase de gel, a solução foi mantida a temperatura constante de 85 °C e agitada até o volume final de 50 mL de uma suspensão de cor branca leitosa. Finalmente, o surfactante Triton X-100 foi adicionado e a solução foi agitada por 30 min em temperatura ambiente. O gel de TiO2 foi seco em estufa a 60 °C e o pó foi analisado por um difratômetro de raios-X Rigaku Miniflex600 (fonte de radiação CuKα, λ = 1,54056 Å, operando a 15 mA e 40 kV) para determinação das fases cristalográficas. 4.3. Crescimento dos filmes LbL e filmes casting Para crescer os filmes LbL de multicamadas, a suspensão de TiO2 foi preparada por diluição da suspensão em gel de TiO2 sintetizada em uma proporção de 1:50 em HCl aquoso, pH 2,5. A suspensão de PSS foi preparada a 1 g.L-1 usando o mesmo solvente. Em pH 2,5, a solução coloidal de TiO2 é carregada positivamente (PRIYA; MODAK; RAICHUR, 2009; 40 WANG, Zhong Sheng et al., 2003), enquanto o PSS é carregado negativamente (pKa do PSS ~ 1) (KHARLAMPIEVA et al., 2008). Lâminas de sílica fundida, utilizadas como substrato, foram previamente tratadas com solução de "piranha" (mistura de H2O2 e H2SO4 - 1: 3, v/v) por duas horas. Tal tratamento confere ao substrato carga resultante negativa (HORN; ONODA, 1978). Para o crescimento do filme LbL, o substrato de sílica foi manualmente i) imerso na suspensão TiO2 por 5 min; ii) lavado em HCl aquoso, pH 2,5, durante 30 s; iii) imerso na suspensão de PSS por 5 min, e iv) lavado em HCl aquoso, pH 2,5, por 30 s. As etapas de i a iv desta seção foram repetidas n vezes, fornecendo o filme LbL (TiO2/ PSS)n. O filme LbL sobre sílica foi caracterizado em diversas etapas de seu crescimento tal que 𝑛 ≤ 6. A lavagem realizada após cada etapa de imersão teve como finalidade remover materiais fracamente adsorvidos e para evitar contaminação cruzada. Para a análise da cinética de crescimento das camadas do filme LbL foram obtidos espectros UV-VIS de cada etapa da adsorção das três primeiras camadas do filme: TiO2, PSS e TiO2, respectivamente. Cada uma das camadas foi crescida em quatro distintos intervalos de tempo de imersão em solução: 1, 5, 15 min e 𝑡~0. Na segunda e na terceira camada, os intervalos de tempo de imersão para crescimento da(s) camada(s) subsequente(s) foram padronizados em 5 min, o intervalo de tempo já escolhido para o crescimento dos filmes objeto deste estudo. Discos de liga de Ti grau V (substratos planos que reproduzem as características da superfície de implantes típicos) e implantes foram gentilmente fornecidos pela Medens®. Durante 15 min os discos e implantes foram irradiados com radiação UV-C (λ ~ 254 nm). Neles, foram crescidos filmes LbL de multicamadas, seguindo as etapas iii – iv – i – ii descritas na seção 4.3, cinco vezes para fornecer a estrutura (PSS/TiO2)5. Os substratos de liga de Ti possuem uma camada passivadora de TiO2 que, quando em pH ácido, adquirem carga resultante positiva (PRIYA; MODAK; RAICHUR, 2009). Para investigar a influência do PSS como a camada externa no filme LbL, uma arquitetura LbL alternativa foi montada com as mesmas 5 repetições e uma camada PSS mais externa adicional terminando com o procedimento de lavagem, fornecendo a arquitetura (PSS/TiO2)5PSS. 41 Tendo finalizado o crescimento, todos os filmes LbL (independentemente de substrato) citados nesta seção foram secos em estufa a 60 °C. Para efeitos de análise, foram preparados filmes a partir da secagem a 60 °C do solvente (filmes casting) das soluções de PSS e de TiO2 em substratos de vidro BK7, lâmina de sílica fundida e discos de liga de Ti. 4.4. Caracterizações dos filmes LbL 4.4.1. Espectroscopia de Absorção Molecular na Região do Ultravioleta e Visível – UV-VIS O crescimento dos filmes LbL sobre sílica foi monitorado por medições de absorbância no UV-VIS realizadas na faixa de 200-600 nm usando um espectrofotômetro PerkinElmer Lambda 1050. 4.4.2. Espectroscopia por absorção no infravermelho com Transformada de Fourier – FTIR A análise estrutural por espectroscopia FTIR foi realizada em um espectrômetro Bruker Vertex 70 na faixa de 4000 - 400 cm-1 com resolução de 4 cm-1. Para esta caracterização, ambos os filmes, casting e LbL, foram depositados em substratos de Si tendo como linha de base um espectro, em ar atmosférico, do substrato de Si limpo. 4.4.3. Microscopia de força atômica – AFM A morfologia dos filmes LbL sobre lâmina de sílica fundida e discos de liga de Ti foi analisada por AFM em um microscópio Park System XE7. Os perfis topográficos de regiões das superfícies das amostras foram obtidos no modo sem contato e coletados usando um cantiléver de silício (PPP-NCHR, Park Systems Inc.) com uma constante de força de 42,0 N/m e uma frequência de ressonância de 330 Hz. Todas as medidas foram registradas ao ar em temperatura ambiente. Nas amostras em substrato de sílica fundida, as imagens foram obtidas em áreas de 1 𝜇𝑚 × 1 𝜇𝑚 e 3 𝜇𝑚 × 3 𝜇𝑚. A técnica de AFM também foi utilizada para fins de obtenção de valores da espessura dos filmes LbL sobre substrato de sílica. Para 42 isso o conjunto substrato de sílica + filme LbL foi cuidadosamente riscado com um cortador de ponta diamantada. Foram obtidos perfis topográficos de 3 𝜇𝑚 × 3 𝜇𝑚 em triplicata e, a partir dos valores de altura obtidos através do software de imagem Gwyddion, foi calculada a espessura média dos filmes LbL em diferentes etapas de deposição. Para o substrato de disco de liga de Ti, os perfis topográficos foram obtidos em áreas de 1,0 μm x 1,0 μm. A rugosidade média representada pela rugosidade média quadrática (RMS) da região da superfície analisada foi baseada em uma fórmula padrão integrada com o software supracitado. 4.4.4. Espectroscopia Micro-Raman Alterações estruturais e morfológicas causadas pelos filmes LbL nas superfícies de discos de liga de Ti foram investigadas por caracterização micro-Raman com espectrógrafo micro-Raman Renishaw, modelo in-Via, equipado com microscópio Leica e linha de laser em 514,5 nm. As medidas foram realizadas com grade de 1800 linhas/mm, tempo de exposição de 10 s e lente objetiva de 50 ×. Este arranjo leva a uma resolução espacial de cerca de 1 μm (diâmetro do ponto do feixe de laser focalizado). 4.4.5. Microscopia eletrônica de varredura – MEV A morfologia de regiões da superfície dos discos de liga de Ti (as modificadas e as não modificadas pelo crescimento de filmes LbL) foi analisada por MEV usando um equipamento modelo Carls Zeiss EVO LS15, com detector de elétrons secundários e alto vácuo. Um metalizador Sputter Coater Quorum Modelo Q 150R ES foi usado para metalizar as amostras com ouro (Au). 4.5. Testes in vivo Todos os testes in vivo apresentados nessa tese foram realizados na Faculdade de Odontologia de Araçatuba – FOA/Unesp pela professora Dra. Roberta Okamoto e seu grupo. O estudo foi realizado seguindo as diretrizes do Animal Research: Reporting of In Vivo Experiments (ARRIVE) (KILKENNY et al., 2010) e seguiram as normas do Comitê de Ética 43 em Pesquisa (00335-2018) da Universidade Estadual Paulista - Unesp. Vinte e oito ratas (Rattus norvegicus albinus, Wistar), com peso de 250 g e com 3 meses de idade foram divididas em três grupos de acordo com a superfície do implante sendo dez ratas para (PSS/TiO2)5PSS, dez ratas para (PSS/TiO2)5 e oito ratas para o implante convencional onde não fora crescido filme LbL. Os animais foram mantidos em gaiolas em ambiente de temperatura estável (22 °C ± 2 °C, ciclo de luz controlada com 12 h luz/12 h escuro), dieta balanceada (NUVILAB, 1,4% Ca e 0,8% P + água com libitum) durante este estudo. Os animais foram submetidos a procedimento cirúrgico para instalação do implante na metáfise tibial (um implante por animal e foi realizada uma randomização para definir o lado onde o implante foi instalado) e permaneceram em jejum por oito horas antes da cirurgia. Foram sedados com a combinação de 50 mg/kg de cetamina intramuscular (Vetaset® - Fort Dodge Animal Health Ltda.) e 5 mg/kg de cloridrato de xilazina (Dopaser - Laboratórios Calier do Brasil Ltda.). Os ratos receberam cloridrato de mepivacaína (0,3 ml/kg, escandicaína 2% com epinefrina 1: 100.000, Septodont) como anestésico local e hemostasia do campo operatório. A tricotomia foi realizada na região medial de ambas as tíbias juntamente com a antissepsia com germicida tópico de iodopovidona (10% PVP-I, Riodeine Soft Derma Degerming, Rioquímica). Foi realizada incisão de 3 cm com avulsão de partes moles para expor a metáfise tibial. Em seguida, foram instalados vinte e oito implantes (Medens®) de acordo com o tratamento de suas superfícies, conforme citado acima. Esses implantes apresentavam tipo de conexão hexagonal interna, com 2,0 mm de diâmetro e 4,0 mm de comprimento. A fresagem foi realizada com fresa espiral de 1,6 mm de diâmetro, montada em motor elétrico (BLM 600®; Sondador) à velocidade de 1000 rpm sob irrigação com solução salina 0,9% (Fisiológico®, Biosintética Ltda.), e profundidade de 4,0 mm, com travamento e estabilidade inicial. A instalação foi realizada manualmente com chave digital. Após a instalação do implante, a sutura foi realizada com fio absorvível (Poliglactina 910 - Vicryl 4.0, Ethicon, Johnson & Johnson) no plano profundo e com sutura monofilamentar (Nylon 5.0, Ethicon, Johnson & Johnson) no plano externo. Foi administrado Pentabiótico® (0,1 mL / kg, Fort Dodge Animal Health Ltda.) em dose única 44 intramuscular e metamizol de sódio (1 mg/kg/dia, Ariston Indústrias Químicas e Farmacêuticas Ltda.) no pós-operatório imediato. 4.5.1. Análises de Imunomarcação Catorze dias após o procedimento cirúrgico, três animais de cada grupo/superfície foram sacrificados e tiveram suas tíbias coletadas para análise de imunomarcação. As tíbias foram removidas e fixadas em solução contendo formol por 48 h. Em seguida, a amostra foi lavada por 24h em água corrente e descalcificada em EDTA (10%) por seis semanas. Em seguida, a desidratação foi realizada utilizando uma sequência de álcoois. A diafanização foi realizada com xilol para posterior inclusão em parafina para obtenção de cortes de 5 µm de espessura, os quais foram posteriormente montados em lâminas. Foram selecionados anticorpos policlonais de cabra (Santa Cruz Biotechnology, Inc., Santa Cruz, CA, EUA) para detectar RUNX2 (SC8788), que sinaliza a diferenciação de pré- osteoblastos em osteoblastos; Fosfatase Alcalina (ALP - SC23430), que é uma proteína da matriz extracelular envolvida com a precipitação de fosfato associada à etapa inicial do processo de mineralização; Osteopontina (OPN - SC10593), proteína envolvida no processo de mineralização e relacionada ao início da precipitação do cálcio na matriz óssea extracelular; e Osteocalcina (OCN - SC18319), outra proteína relacionada à precipitação do cálcio, mas em uma etapa mais avançada do processo de mineralização. Experimentos de imunoistoquímica foram realizados utilizando imunoperoxidase como método de detecção. Foi utilizado anticorpo secundário de coelho anti-IgG de cabra (H + L) biotinilado (Pierce Biotechnology, Rockford, IL, EUA); o amplificador foi avidina biotina (Vector Laboratories, Burlingame, CA, EUA.) e o cromógeno foi diaminobenzidina (Dako North America, Inc., Carpinteria, CA, EUA). Para cada anticorpo utilizado, a expressão das proteínas foi avaliada semiquantitativamente, atribuindo-se diferentes “escores”, de acordo com o número de células imunomarcadas no processo de cicatrização da ferida. A análise foi realizada em microscópio óptico Leica DMLB por meio de escores (análise qualitativa ordinal), em que 45 os escores indicaram marcação leve (+), marcação moderada (++) e marcação intensa (+++) (MANRIQUE et al., 2015; PALIN et al., 2018; PEDROSA et al., 2009). A marcação da diaminobenzidina foi considerada positiva, havendo cautela quanto à manutenção de controles negativos para avaliação da especificidade dos anticorpos. A região de interesse restringiu-se ao osso neoformado na porção medular da tíbia, visto que o osso ali formado apresenta turnover semelhante aos ossos maxilares. Os escores foram atribuídos de acordo com a extensão da área com marcação positiva para cada um dos anticorpos analisados, respeitando as diversas características dos padrões de imunomarcação, seja em células ou matriz extracelular. 4.5.2. Análises Biomecânicas Trinta dias após a instalação do implante, os demais animais (seis animais para cada superfície) foram eutanasiados para realização do teste de torque reverso. A região metafisária tibial foi aberta para exposição do implante e uma chave de torque digital foi fixada na cavidade hexagonal do implante. Nesse caso, foi aplicado um torque de intensidade progressiva no sentido anti-horário até o rompimento da interface osso/implante, a fim de se registrar o pico do torque de quebra em N.cm. Os valores obtidos foram agrupados e submetidos à análise estatística (RAMALHO-FERREIRA et al., 2015). Para a análise estatística, foi utilizado o software GraphPad Prism 7.0. A análise de homoscedasticidade foi realizada com o teste de Kolmogorov Smirnov que confirmara a distribuição normal dos dados. Foi realizada a análise de variância (ANOVA) unilateral e o nível de significância adotado foi de p <0,05. 5. Resultados e Discussões 5.1. Determinação de fases cristalinas via difração de raios-X (DRX) A Figura 6 ilustra o padrão de DRX do pó de TiO2 sintetizado via rota sol-gel. As fases cristalinas, bruquita e anatase, foram identificadas com os principais picos de difração centrados em 2θ = 25° [anatase (1 0 1)] e 31° [bruquita (1 2 1)] (KOZHEVNIKOVA et al., 2019; MUTUMA et al., 2015). A ocorrência de nucleação das fases bruquita e anatase pós 46 síntese sol-gel de TiO2 sem tratamento térmico adicional já foi reportada em outros trabalhos (KOZHEVNIKOVA et al., 2019; MUSIĆ et al., 1997; SRIDEVI et al., 2020). Nenhum padrão de difração associado à fase rutilo foi observado. As nanoestruturas de TiO2 sintetizadas foram então empregadas para fabricar os filmes LbL. Figura 6. Espectro de difração de raios X do pó de TiO2 obtido através da rota sol-gel após evaporação do solvente. Picos de anatase (1 0 1) em 2θ = 25° e bruquita (1 2 1) em 2θ = 31°. Anatase: JCPDS 21-1272, Bruquita: JCPDS 29-1360. 5.2. Caracterizações dos filmes LbL sobre lâmina de sílica fundida ou de silício 5.2.1. UV-VIS Todos os filmes caracterizados nesta seção foram crescidos em substrato de lâmina de sílica fundida. A Figura 7 ilustra os espectros de absorção UV-VIS para a análise da cinética de crescimento dos filmes. Foram obtidos espectros UV-VIS de cada etapa da adsorção das três primeiras camadas do filme: TiO2, PSS e TiO2, respectivamente. Cada uma das camadas foi crescida em quatro distintos intervalos de tempo de imersão em solução: 1, 5, 15 min e 𝑡~0. Na segunda e na terceira camada, os intervalos de tempo de imersão para crescimento da(s) camada(s) subsequente(s) foram padronizados em 5 min, o intervalo de tempo já escolhido para o crescimento dos filmes objeto deste estudo. Em cada conjunto de espectros na Figura 7, as diferenças observadas nas absorbâncias não são significativas indicando que a quantidade de material adsorvida e, possivelmente, o crescimento do filme deve ser semelhante para qualquer um dos quatro intervalos de tempo analisados. As diferenças observadas nos valores de absorbância para amostras de uma mesma camada do 47 filme podem estar associadas à uma possível distribuição heterogênea dos materiais ao longo da superfície do substrato ou substrato + filme e/ou formação de agregados dos materiais utilizados. Figura 7. Espectros de absorção de UV-VIS coletados após a deposição de cada umas das três primeiras camadas do filme de PSS e TiO2: (a) TiO2, (b) PSS e (c) TiO2, respectivamente, em substratos de sílica para quatro diferentes intervalos de tempo: 1, 5 e 15 min e 𝑡~0. 48 A Figura 8 (a) ilustra os espectros de absorção UV-VIS para cada etapa de adsorção de camadas de PSS e TiO2 sobre o substrato de sílica. A banda centrada em 234 nm pode ser atribuída ao TiO2 (ZHANG et al., 2007) e/ou ao anel aromático do PSS (QUINN; YEO; CARUSO, 2004). A dependência da absorbância em 234 nm em função do número de camadas depositadas é apresentada na Figura 8 (b). Inicialmente, tentou-se crescer na sílica um filme cuja primeira camada fosse PSS. Após a primeira imersão do substrato em solução de PSS, não foi verificada sua adsorção por conta da repulsão eletrostática entre o poliânion e o substrato de sílica com carga negativa (HORN; ONODA, 1978). No entanto, esta primeira camada de PSS deve se depositar adequadamente nas superfícies dos discos de liga de Ti que assumem carga positiva em pH ácido, como é o caso da solução de PSS (PRIYA; MODAK; RAICHUR, 2009). A Figura 8 (b) ilustra o crescimento da primeira camada de TiO2, provavelmente iniciada pela atração eletrostática com a superfície de sílica. A adsorção de PSS foi, então, possível para a próxima camada. Um comportamento de crescimento “em escada” no gráfico “absorbância x comprimento de onda” foi observado com aumentos menores causados pela deposição de PSS e maiores incrementos de absorbância causados pelo TiO2. A análise de espectroscopia UV-vis ainda revela uma deposição uniforme e linear por bicamada depositada até as cinco bicamadas [ver inserção na Figura 8 (b)]. 49 Figura 8. (a) Espectros de absorção de UV-VIS coletados após cada etapa de deposição de camadas de PSS e TiO2 em substratos de sílica. Inserção: esquema de crescimento de um filme LbL. (b) A relação entre a absorbância em 234 nm e o número de camadas depositadas. Inserção: Absorbância em 234 nm versus número da bicamada. Este comportamento “em escada”, melhor visualizado na Figura 9 pode estar relacionado às forças que atuam na adsorção de multicamadas. A provável adsorção de PSS é impulsionada pela atração eletrostática à superfície com TiO2. O incremento de absorbância devido à adsorção de PSS aumenta com o número de camadas depositadas, em função: i) do equilíbrio de carga positiva aumentado na superfície causado pelo aumento da quantidade de 50 TiO2 carregado positivamente no substrato e ii) do aumento da distância para a superfície de sílica carregada negativamente, minimizando a repulsão. No caso da camada de TiO2, o incremento na absorbância de cada camada é maior e uniforme, o que pode ser explicado pela ação tanto da atração eletrostática (entre TiO2 e PSS) quanto da interação TiO2 – TiO2 (adsorções sequenciais) (SCHULZE; KIRSTEIN, 2005). Porém, conforme indicado pela Figura 7, o crescimento do filme TiO2/PSS está condicionado à interação entre os dois materiais visto que a adsorção de TiO2 é limitada e volta a aumentar apenas após a adsorção de PSS. Figura 9. Espectros de absorção UV-VIS na faixa de 200-250 nm de i) TiO2 - camada 1 e PSS - camada 2, ii) TiO2 - camada 2 e PSS - camada 3, iii) TiO2 - camada 3 e PSS - camada 4, iv) TiO2 - camada 4 e PSS - camada 5 e v) TiO2 - camada 5 e PSS - camada 6. 5.2.2. FTIR A Figura 10 mostra os espectros FTIR do filme (PSS/TiO2)20 em comparação com os materiais puros (filmes casting). O espectro de filme casting de TiO2, na Figura 10, 51 apresenta as bandas de estiramento (stretching) típicas de Ti – O em 648 e 562 cm-1, e de estiramento Ti – O – Ti em 446 cm-1 (MUSIĆ et al., 1997). Uma banda larga entre 3372 e 3215 cm-1 é atribuída ao estiramento de hidroxilas da água adsorvida (CONNOR; DOBSON; JAMES MCQUILLAN, 1999; IVANOVA; HARIZANOVA, 2001). Aliado à banda adicional devido à vibração de deformação H – O – H em 1640 cm-1, esta é uma evidência de uma grande quantidade de água absorvida nas superfícies de TiO2 conforme já relatado (BEZRODNA et al., 2004; CONNOR; DOBSON; JAMES MCQUILLAN, 1999; MUSIĆ et al., 1997). Os espécimes orgânicos atribuídos no espectro do TiO2 se devem à hidrólise incompleta do isopropóxido de Ti. O espectro do filme casting de PSS também apresentou a banda de stretching da hidroxila (centrada em 3457 cm-1) e sua vibração de torção (bending) a 1638 cm-1 relativo à água adsorvida pelos grupos sulfônicos. Bandas em 1130 e 1010 cm-1 são atribuídas às torções do anel benzênico (BONAZZOLA; CALVO; NART, 2003). Bandas típicas de grupos sulfônicos aparecem em 1195 e 1042 cm-1, que surgem de seus estiramentos assimétrico e simétrico (CHEN, Liang; LU, 2006; SOCRATES, 2001). Para o filme LbL, ambas as bandas de TiO2 e PSS são facilmente identificadas, indicando que ambos os materiais estão presentes na estrutura do filme LbL. No espectro do PSS puro, a banda de estiramento assimétrico do grupo sulfônico aparece como uma única banda em 1195 cm-1 decorrente dos grupos sulfônicos não afetados pela interação com o meio (ZUNDEL, 1982). No filme LbL, esta banda mostra a estrutura de dupleto com duas bandas centradas em 1215 e 1161 cm-1, caracterizando interações com um contra-íon (ZUNDEL, 1982). A distância entre os centros das bandas depende da intensidade do campo elétrico gerado pelo contra-íon, relatado como 38, 77 e 130 cm-1 para Na+, Co2+ e Fe3+, respectivamente (KURTH; VOLKMER; KLITZING, VON, 2003). Aqui, o desdobramento observado foi em torno de 54 cm-1. Este comportamento foi observado em outros filmes LbL contendo grupos sulfônicos, por exemplo, ftalocianinas sulfonadas interagindo eletrostaticamente com policátions demonstraram divisão variando de 35 a 47 cm-1 (ALENCAR et al., 2009; DE LUCENA et al., 2018). Além disso, o espectro do filme LbL teve as bandas relacionadas às vibrações do anel de benzeno sutilmente deslocadas para o vermelho de 1130 para 1128 cm-1, e de 1010 para 1007 cm-1. 52 Aliados aos pequenos deslocamentos nas posições das bandas de estiramento de Ti – O, todos esses resultados corroboram para indicar uma interação em nível supramolecular entre as multicamadas, possivelmente por meio de interações eletrostáticas entre grupos sulfônicos e o Ti (com estado de carga +3 no TiO2) (KOCH; MANZHOS, 2017a, b). As atribuições completas e as posições da banda estão listadas na Tabela 2. Figura 10. Espectros FTIR em duas regiões (4000 - 2500 cm-1 e 1800 - 400 cm-1) de TiO2 puro e PSS (filmes fundidos) e o filme LbL (TiO2/PSS)20. ν: stretching; νa: stretching assimétrico; νs: stretching simétrico; δ: bending. 53 Tabela 2. Bandas FTIR e suas respectivas atribuições para TiO2, PSS e um filme LbL (TiO2/PSS) (ν: stretching; νa: stretching assimétrico; νs: stretching simétrico; δ: bending). Atribuições Número de onda (cm-1) TiO2 PSS LbL (OH) hidroxila absorvida a,b 3372–3215 3438–3493 3372–3215  –CH c 2952 3047 2957 a –CH2–c 2925 2927 2930 s –CH2–c 2876 2846 2875 δOH b,d 1640 1638 1640 Deformação do grupo O–H, no plano, em álcoois primários e secundáriosc 1421 a SO3 - c,e 1195 1215, 1161 vibração planar do anel benzênico e 1130 1128 s SO3 - c,e 1042 1036 bending, no plano, do anel benzênicoe 1010 1007 Ti–O f,g 648 633 562 546 Ti–O–Ti f,g 446 447 a T. Ivanova and A. Harizanova, Solid State Ionics 138 (2001) 227–232. b P.A. Connor, K.D. Dobson, A. James McQuillan, Langmuir 15 (1999) 2402–2408. c G. Socrates, Infrared and Raman characteristic group frequencies. Tables and charts, 3rd ed., Johw Wiley & Sons, Chichester, 2001. d T. Bezrodna et al. J. Mol. Struct. 700 (2004) 175–181. e L. Chen and G. Lu, J. Electroanal. Chem. 597 (2006) 51–59; f S. Musić et al., Mater. Sci. Eng. B. 47 (1997) 33–40; g C. Bonazzola, E.J. Calvo and F.C. Nart, Langmuir 19 (2003) 5279–5286. 5.2.3. AFM A técnica de AFM foi empregada para caracterizar a morfologia da superfície em diferentes etapas do crescimento dos filmes LbL. O substrato de sílica limpo tem uma superfície plana com rugosidade RMS de cerca de 0,3 nm para uma imagem de 1 𝜇𝑚 × 1 𝜇𝑚, conforme ilustra a Figura 11. Este substrato foi utilizado a fim de minimizar a interferência direta da superfície rugosa dos discos de liga de Ti na análise da rugosidade do filme LbL bem como possíveis equívocos de interpretação considerando que, o filme LbL contendo TiO2 estaria em contato com uma camada de TiO2 (camada passivadora) presente nas superfícies dos discos. 54 Figura 11. Imagem de AFM do substrato de lâmina de sílica fundida após tratamento com solução “piranha”. Rugosidade RMS de cerca de 0,3 nm. As imagens de regiões da superfície de uma monocamada de TiO2 [Figura 12 (a)] ilustram a superfície coberta pelas nanoestruturas e/ou nanoclusters (aglomerados) de TiO2, geralmente menores que 100 nm. O valor do tamanho médio das partículas de TiO2 obtido foi de 28 ± 3 𝑛𝑚 (KITAGAWA et al., 2021). Esta primeira camada é provavelmente formada devido às interações TiO2 – substrato e interações TiO2 – TiO2. O TiO2 assume carga positiva em pH abaixo de seu ponto isoelétrico (pH 6,6) (WANG, Zhong Sheng et al., 2003). A rugosidade RMS calculada após a adsorção desta camada de TiO2 foi de 2,7 nm. A adsorção da próxima camada de PSS implicou numa rugosidade RMS de 3,4 nm {ver a morfologia da superfície do filme (PSS/TiO2)1PSS, na [Figura 12 (b)]} com agregados aumentados, possivelmente devido à adsorção do PSS em ilhas (CZERWIENIEC et al., 2018; NGANKAM; MAO; VAN TASSEL, 2004). Nota-se que a rugosidade aumentou em torno de 27% após a adsorção da camada de PSS. A imagem da morfologia da superfície do filme LbL (PSS/TiO2)5 [Figura 12 (c)] apresentou uma pequena diminuição na rugosidade RMS (de 3,4 para 3,0 nm) em comparação com o filme LbL (PSS/TiO2)1PSS. Isso pode ser explicado devido às partículas de TiO2 preencherem os vazios anteriores na camada de PSS. Com uma camada adicional de PSS, o filme (PSS/TiO2)5PSS [Figura 12 (d)] apresentou uma rugosidade de 3,8 nm. Embora semelhante, um aumento de rugosidade de 27% foi observado após a adsorção da camada de 55 PSS. O PSS aparentemente aumenta a rugosidade da superfície, enquanto nanoestruturas/nanoclusters de TiO2 diminuem as irregularidades da superfície, possivelmente preenchendo os vazios. Figura 12. Imagens de AFM da morfologia da superfície de (a) uma monocamada de TiO2 e dos filmes LbL (b) (PSS/TiO2)1PSS, (c) (PSS/TiO2)5 e (d) (PSS/TiO2)5PSS em substrato de sílica fundida. A Figura 13 (a), obtida da região da interface filme/risco de uma monocamada de TiO2 é semelhante às demais imagens obtidas para os filmes de 1, 2, 3, 4, 5, 5,5 e 6 bicamadas e exemplifica-as. A Figura 13 (b) ilustra o gráfico “espessura versus bicamadas” obtido através dos dados das imagens de AFM citadas na Figura M (a). A espessura do filme aumenta proporcionalmente à quantidade de bicamadas crescidas no filme. Porém, nota-se que a espessura do filme não deve ser constante ao longo de sua superfície. Tal comportamento já fora aventado na seção 5.2.1. que trata sobre a caracterização via UV-VIS. Destes dados, utilizando-se a equação obtida pode-se inferir que a espessura média do filme (TiO2/PSS)6 é ~ 44 𝑛𝑚 e, subtraindo-se a espessura da primeira camada de TiO2, para o filme (PSS/TiO2)5 temos ~ 37 𝑛𝑚, e ~ 40 𝑛𝑚 para o filme (PSS/TiO2)5PSS. 56 Figura 13. Imagens de AFM da morfologia da superfície de (a) uma monocamada de TiO2 e dos filmes LbL (b) (PSS/TiO2)1PSS, (c) (PSS/TiO2)5 e (d) (PSS/TiO2)5PSS em substrato de sílica fundida. A Figura 14 ilustra imagens de AFM de regiões de 1 𝜇𝑚 × 1 𝜇𝑚 das superfícies dos discos de liga de Ti sem deposição (a) e das superfícies dos discos de liga de Ti com (PSS/TiO2)5 (b) e com (PSS/TiO2)5PSS. Após a deposição dos filmes LbL, observa-se uma sutil redução na rugosidade (RMS) da superfície. Tais valores de rugosidade são consideravelmente superiores (~ 3 ×) aos valores RMS observados para a superfície de sílica 57 + filmes LbL, indicando que os filmes não alteram significativamente a rugosidade da superfície das amostras de liga de Ti. Figura 14. Imagens de AFM da morfologia da superfície de (a) um disco de liga de Ti, sem deposição e deste disco com os filmes LbL (b) (PSS/TiO2)5 e (c) (PSS/TiO2)5PSS. 58 5.3. Caracterizações dos filmes LbL sobre substrato de liga de Ti 5.3.1. Micro-Raman A Figura 15 (a) mostra uma imagem obtida por microscópio óptico (500 × de ampliação) e espectros Raman de um disco de liga de Ti. A imagem óptica ilustrou uma superfície rugosa em microescala como efeito do processamento mecânico e do tratamento ácido sofrido pelo disco. O espectro indicou um padrão característico de camada de TiO2 passivadora amorfa na superfície do disco. Em algumas regiões, os modos A1g e Eg em 612 cm-1 e 415 cm-1, respectivamente (MANUEL OCANA, JOSE V. GARCIA-RAMOS, 1992), podem ser identificados. A larga banda em 260 cm-1 é um fônon de segunda ordem do TiO2 amorfo (MANUEL OCANA, JOSE V. GARCIA-RAMOS, 1992) relacionada à fase rutilo, com a ausência de ordem de longo alcance (MANUEL OCANA, JOSE V. GARCIA- RAMOS, 1992; SHIN et al., 2004). Nenhuma banda relacionada à alguma outra fase cristalina do TiO2 foi observada na superfície do disco limpo. Os espectros Raman para discos cobertos com (PSS/TiO2)5 e (PSS/TiO2)5PSS são apresentados na Figura 15 (b) e (c) em comparação com o disco limpo e os filmes casting dos materiais puros. As imagens ópticas (inserções) ilustram que os filmes LbL não afetam significativamente a superfície em microescala. Como as imagens ópticas foram obtidas nas mesmas condições de luz, a mudança de cor observada nas inserções também indica a deposição de multicamadas. Os espectros Raman sugerem o crescimento bem-sucedido das multicamadas nos substratos. Os sinais mais significativos das fases cristalinas das nanoestruturas de TiO2 variam de 100 a 900 cm−1. Eles apontam para a presença de fases cristalinas de TiO2 anatase e bruquita (Anatase: 152, 206 e 637 cm-1 relacionadas aos modos Eg, 400 e 516 cm-1 relacionados aos modos B1g; Bruquita: 152, 243, 321, 409 e 637 cm-1 relacionados aos modos A1g, 206 e 290 cm-1 relacionados aos modos B1g; 362 cm-1 relacionado aos modos B2g; e 453 cm-1 relacionado aos modos B3g) (ILIEV; HADJIEV; LITVINCHUK, 2013; OHSAKA; IZUMI; FUJIKI, 1978; SCHIPPOREIT; MERGEL, 2018; SINGH; MEHATA, 2019). Portanto, os espectros Raman corroboram com os resultados de DRX. 59 Observe que a banda de TiO2 mais intensa emerge em cada espectro para as duas amostras de multicamadas distintas, indicando que mesmo as regiões amorfas e "distorcidas" de rutilo não causam interferência significativa na adsorção de multicamadas. As bandas de PSS não foram identificadas nos espectros de filme LbL devido à intensidade de sinal relativamente alta do TiO2. A Figura 15 (d) mostra a região espectral em 125 – 200 cm-1 do (PSS/TiO2)5, do (PSS/TiO2)5PSS e do filme casting de TiO2. O deslocamento para o azul da banda de modo Eg de anatase (152 cm-1) após o crescimento das multicamadas foi relatado e atribuído ao efeito de confinamento de fônon (HARDWICK et al., 2007; HAZEM et al., 2019; LEJON; ÖSTERLUND, 2011; LI, W. S. et al., 2001), possivelmente devido à tensão causada pelo revestimento da superfície nos nanocristalitos e sua consequente tensão interna. A interação entre PSS e TiO2 pode causar uma tensão nas superfícies de nanoestruturas de TiO2 sendo uma possível razão para o deslocamento para o azul. Figura 15. Espectros Raman de (a) duas regiões distintas do disco limpo (cinza e preto), e após a cobertura com os filmes (b) (PSS/TiO2)5 (amarelo) e (c) (PSS/TiO2)5PSS (azul e verde). Filmes casting puros de PSS (rosa) e TiO2 (vermelho) são apresentados para comparação. (d) espectros da região entre 125 e 200 cm-1 de discos de liga de Ti modificados com (PSS/TiO2)5, (PSS/TiO2)5PSS e do filme casting de TiO2. Os espectros de cores idênticas referem-se ao mesmo espectro. (e) imagens ópticas com ampliação de 500 × do (i) disco limpo, (ii) discos modificados com (PSS/TiO2)5 e (iii) (PSS/TiO2)5PSS. 60 5.3.2. MEV A Figura 16 (a) mostra a micrografia de MEV de uma região da superfície de um implante limpo com ampliação de 50.000 ×. As Figura 16 (b) e (c) retratam as micrografias de regiões das superfícies dos filmes casting, sobre lâmina de vidro, de TiO2 e PSS, respectivamente. O filme de TiO2 puro apresenta aglomerados de TiO2 microdimensionados com uma superfície rugosa em nanoescala, enquanto a superfície do filme casting de PSS é relativamente plana. A superfície do implante modificada pelo filme LbL (PSS/TiO2)5 (em que o TiO2 é a camada mais externa) exibe as partículas de TiO2 de tamanho nanométrico cobrindo toda a superfície, enquanto os microclusters observados na Figura 16 (b) não são exibidos. Isso indica que os microclusters são formados durante o processo de secagem do filme casting e são evitados pela nanoestruturação das multicamadas via LbL. A falta de mudanças significativas em microescala (em comparação com o implante limpo) implica uma adsorção homogênea e uniforme da nanocamada de TiO2. A micrografia do filme (PSS/TiO2)5PSS [Figura 16 (e)], em que o PSS é a camada mais externa, é bastante diferente do implante limpo e do implante revestido de (PSS/TiO2)5. Desta vez, a rugosidade em nanoescala nas superfícies [conforme visto nas Figura 16 (b) e (d)] provocada pelas nanoestruturas de TiO2 não foi identificada, indicando que a camada PSS cobre completamente a superfície e a camada anterior de TiO2. Figura 16. Micrografias de MEV de (a) implante limpo, (b) TiO2 - casting e (c) PSS - casting em lâminas planas de vidro, (d) filme (PSS/TiO2)5 sobre o implante e (e) filme (PSS/TiO2)5PSS sobre o implante. 61 5.4. Testes in vivo 5.4.1. Análises de Imunomarcação Nessa análise, proteínas relacionadas às diferentes etapas de maturação dos osteoblastos foram imunomarcadas para caracterizar o comportamento dessas células para o osso perimplantar formado pelo contato com as diferentes superfícies. A Figura 17 mostra fotomicrografias de imunomarcação de Runx2, ALP, OPN e OCN para o implante revestido com os filmes LbL (PSS/TiO2)5PSS, (PSS/TiO2)5 e superfícies de controle (implante convencional sem deposição de filme LbL). Runx2: este fator de transcrição não foi observado na superfície de (PSS/TiO2)5PSS ou de (PSS/TiO2)5. Além disso, na superfície do (PSS/TiO2)5, menos osso se formou próximo ao implante comparado à superfície de (PSS/TiO2)5PSS. Na superfície controle, observou-se a presença sutil de Runx2 próximo ao osso neoformado, caracterizando um atraso no processo de reparo, em relação às superfícies revestidas. Fosfatase Alcalina (ALP): a marcação intensa para esta proteína responsável pela precipitação de fosfato na matriz colágena foi observada no grupo (PSS/TiO2)5PSS e em menor extensão no grupo (PSS/TiO2)5. A marcação sutil na superfície de controle pode ser associada com a menor f