1 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE MEDICINA ENEIDA MARIA BOTEON SCHMITT Efeito da suplementação de vitamina D sobre o perfil de adipocinas em mulheres na pós-menopausa DEFESA DE DOUTORADO Orientadora: Profa. Associada Eliana Aguiar Petri Nahas Coorientador: Prof. Claudio Lera Orsatti Botucatu 2022 2 ENEIDA MARIA BOTEON SCHMITT Efeito de suplementação de vitamina D sobre o perfil de adipocinas em mulheres na pós-menopausa Defesa de tese apresentada à Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus de Botucatu para obtenção do Título de Doutor no Programa de Pós- Graduação em Tocoginecologia. Orientadora: Profa. Associada Eliana Aguiar Petri Nahas Coorientador: Prof. Claudio Lera Orsatti Botucatu 2022 3 4 DEDICATÓRIAS À Deus, Que a cada dia está mais presente em meu caminho, obrigada por permitir que tudo aconteça segundo sua vontade e no seu devido tempo. Ao meu marido, Juliano Vilaverde Schmitt, pela ajuda e paciência, obrigado por ser meu parceiro de todas as horas e por fazer tudo parecer mais leve. Aos meus pais, Antonio e Maria Boteon, que com muito amor, estiveram sempre ao meu lado, incentivando, acreditando e vivenciando cada conquista. Aos meus filhos, Marina, Manuela e Lucas, vocês são minhas maiores inspirações para seguir em frente. Às minhas irmãs Elaine e Erica Boteon, minhas companheiras de toda hora, que com todo carinho e atenção sempre me apoiaram e ajudaram. 5 AGRADECIMENTOS ESPECIAIS Às pacientes do ambulatório de Climatério e Menopausa da Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP, que tornaram possível este trabalho. À minha orientadora Profª. Associada Eliana Aguiar Petri Nahás, um exemplo de pessoa, médica e pesquisadora, obrigada pelos conhecimentos transmitidos de forma serena e tranquila e pelo incentivo sempre presente. Ao meu co-orientador Prof. Claudio Lera Orsatti pelo suporte técnico e auxílio na realização deste trabalho. Aos colegas da disciplina de Ginecologia da Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP, pela verdadeira parceria em todo e qualquer momento. A todos os meus familiares, pelos votos de confiança e incentivo. 6 AGRADECIMENTOS Aos professores do Programa de Pós-Graduação em Tocoginecologia da Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP, por todos os conhecimentos partilhados. Aos funcionários da Seção Técnica de Pós-Graduação da Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP, em especial a Solange Sako Cagliari, pela competência com que nos auxilia na resolução de problemas institucionais. Ao escritório de Apoio à Pesquisa (EAP) da Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP, em especial a José Eduardo Corrente, pela assessoria estatística e análise dos resultados do estudo. Às funcionárias da secretaria do Departamento de Ginecologia e Obstetrícia da Faculdade de Medicina de Botucatu – UNESP sempre atenciosas e prestativas. Às bibliotecárias da Biblioteca Central do Campus de Botucatu – UNESP pela elaboração da ficha catalográfica. 7 Esta pesquisa contou com o apoio financeiro: Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP Auxílio à Pesquisa- Processo nº 2014/19382-3 8 SUMÁRIO Página Lista de Abreviaturas 09 Resumo 11 Abstract 13 1. Introdução 15 2. Objetivos 33 3. Métodos 34 4. Resultados 4.1. Artigo Original Efeito da suplementação isolada de vitamina D sobre o perfil de adipocinas em mulheres na pós-menopausa: ensaio clínico randomizado. 43 5. Conclusões 73 6. Referências 74 7. Anexos 7.1. Anexo I - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido 85 7.2. Anexo II- Aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da FMB 86 7.3. Anexo III-Consolidated Standards of Reporting Trials (CONSORT) 2010 89 9 LISTA DE ABREVIATURAS 1,25(OH)2D - 1,25-diidroxivitamina D, calcitriol 25(OH)D - 25 hidroxivitamina D, calcidiol AGL - ácidos graxos livres CC – Circunferência da cintura CDC - Centers for Disease Control and Prevention CONSORT - Consolidated Standards of Reporting Trials DAC - Doença arterial coronariana DCV - Doença cardiovascular DRC - Doença renal crônica EAP - Escritório de Apoio à Pesquisa EDTA - ácido etilenodiaminotetracético FMB - Faculdade de Medicina de Botucatu FR - Fator de risco HOMA - Homeostasis Model Assessment HOMA-IR - Homeostasis Model Assessment-Insulin Resistant HPLC - Cromatografia líquida de alta eficiência IAM - Infarto agudo do miocárdio ICAM-1 - molecula de adesão intercelular-1 IL6 – Interleucina 6 IL-10 – Interleucina 10 IL-12 - Interleucina 12 IL-1β – interleucina 1 β IMC – Índice de massa corpórea IOF - International Osteoporosis Foundation LED - Light emitting diode NCEP-ATP III - National Cholesterol Education Program: Adult Treatment Panel III NF-κB - factor nuclear kappa B PAD - Pressão arterial diastólica PAI-1 - Inibidor do ativador de plasminogênio tipo 1 PAS - Pressão arterial sistólica 10 PCR - Proteína C- reativa PL - Placebo PTH – Paratormônio REBEC - Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos RI - Resistência insulínica SAS - Statistical Analyses System SBEM - Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia SBPC - Sociedade Brasileira de Patologia Clínica SM - Síndrome metabólica SWAN - Study of Women’s Health Across the Nation TCLE - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido TFPI - Inibidor da via do fator tecidual total TGFβ - fator de crescimento de transformação β TH - Terapia hormonal TM - Tempo de menopausa em anos TNF- - Fator de necrose tumoral alfa tPA - plasminogênio tecidual UNESP - Universidade Estadual Paulista uPA - plasminogênio da uroquinase UVB - Ultravioleta B VD - Vitamina D VDR - receptor nuclear de VD WOMAN - Woman on the Move through Activity and Nutrition 11 Resumo Objetivo: Avaliar o efeito da suplementação isolada de vitamina D (VD) sobre o perfil de adipocinas em mulheres na pós-menopausa. Métodos: Foi conduzido ensaio clínico, duplo-cego, placebo-controlado envolvendo 160 mulheres com idade entre 50-65 anos e amenorreia ≥ 12 meses. Foram excluídas mulheres com histórico de doença cardiovascular, diabetes insulino dependente, doença renal crônica, doença hepática, doença autoimune, disfunção da paratireoide e usuárias de terapia hormonal da menopausa e de VD. As participantes foram randomizadas em dois grupos: VD, ingestão de colicalciferol 1.000 UI/dia via oral (n=80) ou placebo (n=80). O tempo de intervenção foi de 9 meses, com avaliações nos momentos inicial e final. Para avaliação do perfil de adipocinas foram dosadas adiponectina, resistina, adipsina e PAI-1 (Inibidor do ativador de plasminogênio tipo 1). Os valores séricos de 25-hidroxivitamina D [25(OH)D] foram mensurados por cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC). A análise estatística foi per protocol, empregando-se ANOVA e medidas repetidas por meio da Distribuição Gama seguido do teste de comparação múltipla de Wald. Resultados: Os grupos foram similares nos parâmetros iniciais clínicos, bioquímicos e no perfil de adipocinas. A média de idade foi de 58,8 ± 6,6 anos no grupo VD e de 59,3 ± 6,7 anos no grupo placebo, com tempo de menopausa de 12,0 ± 8,8 anos e 12,3 ± 8,4 anos, respectivamente (p>0.05). Após 9 meses, valores médios de 25(OH)D aumentaram de 15,0 ± 7,5 ng/ml para 27,5 ± 10,4 ng/ml (+45,4%) no grupo VD, e diminuíram de 16,9 ± 6,7 ng/ml para 13,8 ± 6,0 ng/ml (-18,5%) no placebo (p<0.001). No grupo VD, na comparação entre momentos, observou-se aumento nos valores médios de adiponectina (18.6%) e redução de resistina (-32.4%) e PAI-1 (-39.3%), (p<0.05). E no grupo placebo houve 12 redução no PAI-1 (-25.5%) (p<0.05). Na comparação entre os grupos no momento final, foi observada diferença significativa entre os grupos placebo e VD nos valores médios de adiponectina e resistina (11.5 ± 5.5 ng/mL vs 18.5 ± 21.8 ng/mL, p=0.047, e 16.5 ± 3.5 ng/mL vs 11.7 ± 3.3 ng/mL, p=0.027, respectivamente). Não foram observadas diferenças entre grupos e entre momentos nos valores de adipsina e PAI-1. Conclusões: A suplementação diária e isolada de 1.000 UI de VD por 9 meses associou-se com aumento no valor de adiponectina e redução da resistina quando comparada ao placebo, sugerindo efeito benéfico sobre o perfil de adipocinas em mulheres na pós- menopausa com deficiência de VD. 13 Abstract Objective: To evaluate the effect of supplementation of vitamin D (VD) alone on adipokines profile in postmenopausal women. Methods: In this double-blind, placebo-controlled trial, 160 postmenopausal women were randomized into two groups: VD group, vitamin D3 supplementation 1,000 IU/day orally (n=80) or placebo group (n=80). Women with amenorrhea ≥ 12 months and age 50- 65 years were included. Those with established cardiovascular disease, insulin dependent diabetes, primary hyperparathyroidism, renal failure (or creatinine >1.4 mg/dL), liver disorders, autoimmune diseases, and previous use of menopausal hormone therapy and VD were excluded. The intervention time was 9 months, with assessments at the start and end of treatment. Serum levels of adiponectin, resistin, adipsin and PAI-1 (Inhibitor of plasminogen activator type 1) were determined. The plasma concentrations of 25- hydroxyvitamin D [25(OH)D] were measured by HPLC (high-performance liquid chromatography). Statistical analysis was by intention-to-treat (ITT), using ANOVA and Gamma distribution in repeated measures design followed by multiple comparison Wald’s test. Results: The two groups were similar at baseline in terms of clinical and laboratory parameters. The mean age of the patients included was 58.8 ± 6.6 years in the VD group and 59.3 ± 6.7 years in the placebo group, with time since menopause of 12.0 ± 8.8 years and 12.3 ± 8.4 years, respectively (p>0.05). After 10 months, there was increase in the 25(OH)D concentrations from 15.0 ± 7.5 ng/ml to 27.5 ± 10.4 ng/ml (+45.4%) in VD group, and decrease from 16.9 ± 6.7 ng/ml to 13.8 ± 6.0 ng/ml (-18.5%) in placebo group (p<0.001). In the VD group, in the comparison between moments, there was significant 14 increase in adiponectin (+18.6%) and decrease in resistin (-32.4%) and PAI-1 (-39.3%) (p<0.05). And in the placebo group, there was decrease in PAI-1 (-25.5%) (p<0.05). In the comparison between groups at the end point, a significant difference was observed between the PL and VD groups in the mean values of adiponectin and resistin (11.5 ± 5.5 ng/mL vs 18.5 ± 21.8 ng/mL, p=0.047, and 16.5 ± 3.5 ng /mL vs 11.7 ± 3.3 ng/mL, p=0.027, respectively). There were no significant intervention effects on serum levels of adipsin and PAI-1. Conclusion: In postmenopausal women with vitamin D deficiency, daily isolated supplementation of 1,000 IU of vitamin D3 for 9 months was associated with an increase in adiponectin value and a decrease in resistin when compared to placebo, suggesting a beneficial effect on the adipokine profile. 15 1. Introdução 1.1. Vitamina D A vitamina D (VD) é uma vitamina lipossolúvel, essencial para manutenção do esqueleto e para absorção de cálcio. Se proveniente da síntese em animais, é denominada de colecalciferol (vitamina D3). É adquirida na dieta pela ingestão de alimentos ricos em óleo de peixe, fígado e ovos. Entretanto, a maior fonte decorre da ativação na pele (derme e epiderme). A partir da exposição aos raios UVB ocorre a ativação na pele (derme e epiderme), do composto 7-deidrocolesterol que se transforma em vitamina D3, sendo armazenada e liberada pelas células de gordura (Rosen, 2011; Bouillon et al, 2019). Essa forma, cuja ativação não é metabólica, necessita das funções hepáticas e renais preservadas. É transportada pela corrente sanguínea até o fígado, onde sofre uma hidroxilação no carbono 25, tornando-se 25 hidroxivitamina D [25(OH)D] ou calcidiol, forma inativa da VD. Para se tornar ativa, a 25(OH)D necessita ainda de uma hidroxilação na posição 1, nos túbulos proximais dos rins, sob a ação da enzima 1α- hidroxilase, transformando-se em 1,25-diidroxivitamina D [1,25(OH)2D] ou calcitriol, que é responsável pelos efeitos biológicos (DeLuca, 2004; Heaney et al, 2010, Bouillon, 2019). A VD tem importante e reconhecido papel na mineralização óssea, na concentração de cálcio/fósforo e na regulação da paratireoide (Rosen, 2011; Cianferotti et al 2015). Atualmente, a dosagem de 25(OH)D é empregada para avaliar e monitorizar o estado nutricional de VD no organismo humano, pois os valores plasmáticos são os principais indicadores das reservas corporais (Dawson-Hughes et al, 2005; Holick, 2010). Em diretriz clínica da Task Force Norte-Americana, a insuficiência de VD foi definida como valores entre 21–29 ng/ml (52,5–72,5 nmol/l) e a deficiência de VD como valores 16 inferiores a 20 ng/ml (50 nmol/l) (Holick e tal, 2011). Número crescente de estudos sugere que são necessários valores acima de 30ng/ml para garantir melhor disponibilidade de VD (Dawson-Hughes et al, 2010; Hanley et al, 2010; Holick, 2010). Recentemente, a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM) e a Sociedade Brasileira de Patologia Clínica (SBPC) recomendaram valores de referência para a concentração sérica de 25(OH)D, valores inferiores a 20 ng/mL como deficiência; valores entre 20-60 ng/mL como adequados para a população geral com idade inferior a 65 anos; valores entre 30 a 60 ng/mL como ideal para população de risco de osteoporose; e valores acima de 100 ng/mL de risco para intoxicação (Moreira et al, 2020). Caracterizam-se como hipovitaminose D concentrações plasmáticas de 25(OH)D abaixo do limiar de 30ng/ml, ou seja, do limiar considerado suficiente para manutenção da secreção normal de paratormônio (PTH) pelas paratireoides (Holick e tal, 2011). Na insuficiência de VD evidencia-se elevação do PTH circulante, traduzindo um hiperparatireoidismo secundário, com redução da fração ativa de 1,25(OH)2D, que aumenta a reabsorção óssea (Dawson-Hughes et al, 2005; Holick, 2010). A suplementação diária de VD é capaz de reverter esse quadro de hiperparatiroidismo e impedir a perda óssea em mulheres com idade superior a 50 anos (Tang et al, 2007; Cianferotti et al, 2015). A deficiência da VD pode ser confirmada pela aferição dos níveis séricos de 25(OH)D. Por outro lado, as concentrações de 1,25(OH)2D estão usualmente dentro dos valores normais de referência ou mesmo aumentada em pacientes deficientes/ insuficientes, razão pela qual não é utilizada como referência na prática clínica diária (Dawson-Hughes et al, 2005; Holick, 2010). Reconhece-se que a deficiência de VD é condição médica frequente em todo mundo (Hilger et al, 2014). Imaginava-se que o Brasil, por ser um país tropical e 17 ensolarado, não apresentasse população exposta à deficiência de VD. No entanto, pesquisas brasileiras têm revelado números alarmantes (Russo et al, 2009; Unger et al, 2010; Maeda et al, 2013; Schmitt et al, 2018; Lima-Costa et al, 2020). O estado de hipovitaminose D é comumente encontrado em mulheres na pós-menopausa (Schmitt et al, 2018). Entre as prováveis causas descrevem-se: baixa exposição solar e capacidade reduzida de produção de VD; função renal diminuída; menor absorção de VD pelo trato gastrintestinal; e uso de múltiplas drogas que podem interferir na absorção e metabolização da VD. Outros fatores também influenciam a capacidade de produção de VD pela pele: uso de filtro solar, cor da pele, roupa e idade (Holick, 2004; Maeda et al, 2013). Sabendo-se que as fontes dietéticas de vitamina D são inadequadas, é interessante que mulheres na pós-menopausa recebam suplementação para garantir a saúde óssea (Holick, 2010). A International Osteoporosis Foundation publicou posicionamento sobre a VD, com base em dados observacionais, recomendando manutenção de valores séricos de 25(OH)D de 30ng/ml para pessoas idosas e afirmando que o consumo de VD de até 2000UI/dia pode ser necessário para atingir valor recomendável em alguns pacientes (Dawson-Hughes et al, 2010). Em contraste, Institute of Medicine baseado em evidências a partir de estudos observacionais e randomizados sugere que nível sérico de 20 ng/ml protegeria 97,5% da população contra efeitos adversos na massa óssea, tais como fraturas e quedas (Rosen et al, 2012). A suplementação diária de 1000UI de VD (dentro de um período mínimo de seis meses) aumenta os valores séricos em torno de 10ng/ml, dose esta sugerida para pacientes com idade inferior a 65 anos. Com idade superior deveriam receber dose diária de 2000UI (Mason, 2011). Em geral, para cada 100UI de VD suplementada há aumento de 1ng/ml a 18 nível sérico de 25(OH)D e quanto menor os valores séricos basais, melhor a resposta a suplementação. A suplementação destina-se a elevar valores séricos de 25(OH)D acima de 30ng/ml de modo a aproveitar ao máximo os benefícios da VD (Bischof-Ferrari et al, 2006). A relevante função desempenhada pela VD sobre a massa óssea está bem definida, contudo efeitos extraósseos da VD sobre os marcadores cardiometabólicos e imunoinflamatórios estão sob investigação atual. A forma ativa da VD regula a transcrição de número expressivo de genes que codificam proteínas transportadoras de cálcio e proteínas da matriz óssea e está envolvida em processos biológicos, incluindo o metabolismo ósseo, a modulação da resposta imune, e a regulação da proliferação e da diferenciação celular (Uitterlinden et al, 2004; Bouillon et al, 2019). Uma grande variedade de células extrarrenais expressa o receptor nuclear de VD (VDR), como adipócitos, células do sistema imunológico, cólon, pâncreas, pele e vasos, sintetizando a forma ativa da VD, a 1,25(OH)2D3. Esta produção local de VD é responsável pela modulação extraesquelética de vários outros processos fisiológicos (Mutt et al, 2014; Bouillon et al, 2019). Assim, hipovitaminose D estende os seus efeitos negativos para além da homeostase de cálcio e da saúde esquelética desempenhando um papel fisiopatológico em diferentes outras doenças crônicas não transmissíveis (Krivosíková et al, 2015; Bouillon et al, 2019; Surdu et al, 2021). 1.2. Menopausa, Obesidade e Vitamina D A deficiência de VD e o aumento na prevalência da obesidade são considerados importantes questões de saúde pública (Ding et al, 2012; Vranić et al, 2019). A obesidade parece afetar a bioatividade da VD (Bassuk et al, 2020). O excesso de peso corporal se 19 correlaciona com níveis mais baixos de 25(OH)D total e livre (Walsh et al, 2016; Bonnet et al, 2019). No entanto, a contribuição precisa da hipovitaminose D para a obesidade e saúde em geral não estão bem estabelecidas (Boullion et al, 2019). Evidências sugerem o envolvimento da hipovitaminose D em diversas doenças crônicas não transmissíveis como obesidade, hipertensão, diabetes e consequentemente a síndrome metabólica e a doença cardiovascular (DCV) (Vacek et al, 2012; Wang, 2013; Strange et al, 2015; Park et al, 2018; Schmitt et al, 2018; Ferreira et al; 2020; Surdu et al 2021). Por outro lado, a transição menopausal é caracterizada por aumento do risco cardiovascular, ganho de peso e de adiposidade para muitas mulheres (Everson-Rose et al, 2021). Recente metanálise, incluindo 11 estudos longitudinais e 2472 mulheres, demonstrou que a massa gordurosa total aumentou significativamente entre mulheres na pós-menopausa na maioria das avaliações, incluindo índice de massa corpórea (IMC), porcentagem de gordura corporal, circunferência da cintura e gordura visceral (Ambikairajah et al, 2019). Em análise longitudinal, o estudo SWAN (Study of Women’s Health Across the Nation), com seguimento médio de 11,8 anos, analisou a mudança da composição corporal na transição menopausal. A gordura abdominal aumentou 1,2% ao ano na pré-menopausa e 5,5% ao ano na transição menopausal, com aumento também na gordura visceral de 6,2% ao ano. Assim, esse período de transição menopausal esteve associado ao desenvolvimento da obesidade abdominal (Greendale et al, 2021). Estudos epidemiológicos demonstraram que indivíduos obesos têm menores concentrações séricas de 25(OH)D, com associação inversa entre a concentração de VD e o índice de massa corpórea (IMC) e a circunferência da cintura (Botella-Carretero et al, 2007; Goldner et al, 2008; McGill et al, 2008; Taheri et al, 2012; Stokić et al, 2015a). Uma revisão sistemática e metanálise de dados transversais avaliando a relação entre os níveis 20 séricos de VD e o índice de massa corpórea, em adultos de ambos os sexos, demonstrou que existe fraca correlação inversa, porém significativa, entre os valores de 25(OH)D e massa corporal na população adulta (Saneei et al, 2013). Os mecanismos envolvidos não estão completamente descritos (Cimini et al, 2017). É possível que o sequestro de metabólitos da VD no tecido adiposo diminua sua biodisponibilidade (Worstman et al, 2000; Blum et al, 2008; Vranić et al, 2019). Diferentes explicações foram sugeridas para a insuficiência de VD associada à obesidade incluindo: 1) Diluição volumétrica, significa que os valores séricos de VD diminuem como o tamanho corporal (Drincic et al, 2012); 2) Diferenças no estilo de vida entre pessoas obesas e magras. Pessoas obesas podem ser sensíveis sobre a forma do corpo, participar de menos atividades ao ar livre, encobrir e usar mais roupas do que indivíduos magros, o que minimiza sua exposição ao sol (Abbas, 2017); 3) Diferenças na capacidade de ativar a VD entre indivíduos magros e obesos. Nestes o nível de expressão das enzimas ativadoras de VD (25-hidroxilase CYP2J2 e 1-hidroxilase CYP27B1) foram menores no tecido adiposo visceral em comparação a indivíduos magros (Wamberg et al, 2013); 4) Sequestro de VD dentro do tecido adiposo, indicando que a VD sintetizada está fortemente ligada aos depósitos de gordura, não sendo liberada na circulação para manter concentrações séricas de 25(OH)D. Indivíduos obesos apresentam uma resposta mais fraca a dose padrão de radiação UVB que pessoas com peso normal (Wortsman et al, 2000). Contudo, os mecanismos que controlam a deposição e a liberação de VD a partir do tecido adiposo ainda são desconhecidos (Malmberg et al, 2014; Walsh et al, 2016; Vranić et al, 2019). O tecido adiposo e os músculos são os principais locais de armazenamento da VD (Abbas, 2017). O tecido adiposo funciona como um sistema de armazenamento de VD 21 que previne a síntese descontrolada de 25(OH)D no fígado. A liberação lenta de VD a partir de tecido adiposo em condições de jejum pode limitar a potencial toxicidade das quantidades em excesso da VD. Nos seres humanos, cerca de 20% da dose de VD administrada por via oral é armazenada em tecido adiposo e o resto é consumido ou metabolizado (Heaney e tal, 2011). Concentrações plasmáticas elevadas de 25(OH)D foram associadas a menores quantidades de tecido adiposo visceral e tamanho reduzido de adipócitos (Cheng et al, 2010; Caron-Jobin et al, 2011; Earthman et al, 2012; Stokić et al, 2015b), sugerindo uma ligação entre os níveis de VD e distribuição de gordura (Cimini et al, 2017). 1.3. Adipocinas O tecido adiposo é considerado um órgão endócrino, sendo capaz de sintetizar e liberar citocinas, complementos e fatores de crescimento, proteínas da matriz extracelular e agentes vasoativos, coletivamente conhecidos como adipocinas (Cimini et al, 2017; Recinella et al, 2020). Estas têm diferentes funções, como regulação de apetite e balanço energético, imunidade, sensibilidade à insulina, angiogênese, inflamação e metabolismo de lipídeos (Rahimlou et al, 2016; Recinella et al, 2020). As adipocinas secretadas pelo tecido adiposo estão associadas à resistência à insulina, síndrome metabólica e DCV (Everson-Rose et al, 2021). Entre as adipocinas temos a adiponectina que influencia a sensibilização insulínica e tem propriedades anti-inflamatórias e antiaterogênicas (Trujillo & Scherer, 2006; Ziemke et al, 2010; Turer et al, 2012; Fang & Judd, 2018); a resistina que interfere no desenvolvimento à resistência insulínica e tem atividade pró-inflamatória (Park et al, 2017); a adipsina participa na manutenção da homeostase do tecido adiposo (Tafere et al, 2020); e o inibidor do ativador de 22 plasminogênio 1 (PAI-1), associado a fibrinólise e inflamação (Kaji, 2016; Chen et al, 2017). 1.3.1. Adiponectina A adiponectina é uma proteína composta de 244 aminoácidos, sintetizada no tecido adiposo por adipócitos diferenciados, e que circula com valores séricos relativamente altos, entre 5-30 µg/mL (Pittas et al, 2004; Ziemke et al, 2010; Fang & Judd, 2018). Regula a gordura hepática pelo seu efeito na sensibilização a insulina, possui ação anti-inflamatória reduzindo os níveis séricos de interleucina-6 (IL-6) e fator de necrose tumoral alfa (TNF-α), além do efeito antifibrogênico (Berg et al, 2002; Turer et al, 2012; Abbas, 2017). Um dos mecanismos propostos para ação da adiponectina na melhora da resistência à insulina (RI) é a diminuição de ácidos graxos livres (AGL) por meio do aumento da oxidação no músculo esquelético (Pittas et al, 2004; Fang & Judd, 2018). Valores reduzidos de adiponectina foram associados com RI, diabetes, dislipidemia e obesidade (Trujillo & Scherer, 2006; Milewicz et al, 2010; Ziemke et al, 2010). Por outro lado, valores elevados estiveram associados à diminuição do risco de doença cardiovascular (DCV). A adiponectina parece inibir a formação da placa ateromatosa em função da sua capacidade de inibir a formação de células espumosas (“foam cell”) e estimular a proliferação de células musculares lisas (Trujillo & Scherer, 2006). Em estudo avaliando 925 mulheres com diagnóstico de diabetes tipo II, os autores observaram que valores elevados de adiponectina foram associados com melhor controle glicêmico, perfil lipídico mais favorável e redução do processo inflamatório (Mantzoros et al, 2005). Li et al, em metanálise, concluíram que elevados valores de adiponectina estiveram associados a baixo risco de diabetes (Li et al, 2011). Estudos sugerem que 23 baixos valores plasmáticos da adiponectina correlacionem com o estabelecimento da síndrome metabólica (Funahashi et al, 2004; Geloneze et al, 2009), uma vez que indivíduos obesos apresentam valores plasmáticos de adiponectina menores em comparação a indivíduos com peso adequado (Weyer et al, 2001). Mulheres possuem valores mais elevados de adiponectina que os homens (Nop et al, 2003). Com o objetivo de encontrar um valor de corte apropriado de adiponectina sérica para o rastreamento da síndrome metabólica (SM), 290 mulheres na peri e pós- menopausa (média de idade 54,25 ± 8,6 anos) foram recrutadas. Nas participantes com SM, a obesidade abdominal foi o principal critério diagnóstico. A adiponectina sérica foi menor em mulheres com SM quando comparada àquelas sem SM (6,0 ± 4,6 vs 9,2 ± 5,2 µg/mL, respectivamente; p<.0001). Os autores concluem que adiponectina sérica é um bom biomarcador para SM, e recomendam um valor de corte para adiponectina sérica inferior a 7,15 µg/mL para triagem de SM (Wattanapol et al, 2020). Recente estudo transversal avaliou a associação entre valores de adiponectina com a espessura da íntima-média da artéria carótida em 1399 mulheres na pós-menopausa participantes do estudo SWAN. Valores mais baixos de adiponectina associaram-se a maior espessura da íntima-média da artéria carótida. Essa associação foi atenuada após o ajuste para fatores de risco cardiovascular (Everson-Rose et al, 2021). 1.3.2. Resistina A resistina é uma pequena proteína secretada que regula o metabolismo da glicose (Acquarone et al, 2019). A resistina foi descoberta em 2001 e representa a mais nova das adipocinas. Foi assim denominada pela sua capacidade de promover resistência à insulina (Carvalho et al, 2006). Altos níveis de resistina induzem resistência à insulina 24 (RI) e exercem efeitos pró-inflamatórios (Acquarone et al, 2019). É uma adipocina pró- inflamatória, pertencente à família das moléculas resistin-like35, secretada principalmente nos adipócitos em roedores e nos monócitos e macrófagos em humanos (Patel et al, 2003). Promove RI, diminuindo a gliconeogênese hepática e tem ação regulatória da adipogênese devido à sua alta expressão nos pré-adipócitos (Mcternan et al, 2002). É considerada marcador de inflamação, uma vez que pode induzir a expressão do TNF-α, da IL-6 e da interleucina 12 (IL-12) (Bokarewa et al, 2005; Larochelle et al, 2007; Acquarone et al, 2019). Nas células endoteliais, a resistina aumenta a expressão de vários fatores pró-inflamatórios, incluindo endotelina-1 e metaloproteinases de matriz, bem como moléculas de adesão celular, como molécula de adesão intercelular-1 (ICAM-1), molécula de adesão celular vascular 1 (VCAM-1) e P-selectina (Manduteanu et al, 2010; Hsu et al, 2011). Especificamente, a resistina promove a formação de células espumosas, onde se desencadeia processos inflamatórios ativando o inflamassoma, um complexo de proteínas responsável pela ativação de processos inflamatórios (Lee et al, 2009). 1.3.3. Adipsina Adipsina foi a primeira adipocina descrita em 1987 (Cook et al, 1987). Posteriormente foi identificada como fator do complemento D (White et al, 1992). Os fatores do complemento, incluindo C3, C3aR e D, também são produzidos pelo tecido adiposo sugerindo efeitos nas células imunes e nos adipócitos (Pattrick et al, 2009). A adipsina é produzida por adipócitos diferenciados predominantemente na gordura visceral (Legakis et al, 2016). Estudo in vitro demonstrou que a adipsina promoveu o acúmulo de lipídios e a diferenciação de adipócitos, atuando em C3aR, indicando que os 25 fatores de complemento exercem ações duais em células imunes e adipócitos (Song et al, 2016). A adipsina, juntamente com a proteína estimulante da acetilação, promove a absorção de glicose nos adipócitos e aumenta a síntese de triglicerídeos regulando os níveis séricos desses metabólitos (Calan et al, 2016; Vasilenko et al, 2017). A adipsina está envolvida na manutenção da homeostase do tecido adiposo e no aumento da secreção de insulina em resposta à glicose (Tafere et al, 2020). De acordo com diferentes estudos experimentais e clínicos, as concentrações plasmáticas de adipsina são baixas em animais e pacientes com diabetes melitus (Tafere et al, 2020). Estudo in vitro observou que adipsina teria um papel benéfico na manutenção da função das células β e identificou C3a, um peptídeo produzido pela adipsina, como potente secretor de insulina. Esses achados indicam que a via da adipsina/C3a conecta a função do adipócito à fisiologia da célula β (Lo et al 2014). Além disso, a adipsina pode ser importante para melhorar a hiperglicemia, preservando e melhorando a sobrevivência das células β (Tafere et al, 2020). 1.3.4. Inibidor de ativação do plasminogênio (PAI)-1 No grupo das adipocinas com função predominantemente cardiovascular, destaca- se o inibidor de ativação do plasminogênio (PAI)-1 (Song et al, 2017). O PAI-1, uma glicoproteína de 50 kDa, é um importante regulador do sistema fibrinolítico (Chen et al, 2011). É o principal inibidor do ativador do plasminogênio tecidual (tPA) e do ativador do plasminogênio da uroquinase (uPA) na circulação, desempenhando papel na fibrinólise e na hemostasia (Kaji, 2016; Chen et al, 2017). Embora as fontes mais importantes do PAI-1 sejam os hepatócitos e as células endoteliais, os adipócitos também contribuem para os 26 níveis circulantes desta proteína, que estão elevados na obesidade (Chen et al, 2017). O PAI-1 derivado de adipócitos, expresso predominantemente na gordura visceral, é liberado na circulação em paralelo com o aumento da massa gorda e funciona como uma adipocina, afetando negativamente a biologia vascular (Kaji, 2016). O PAI-1 apresenta correlação positiva com os parâmetros de RI, particularmente a insulinemia, além do IMC e o acúmulo de gordura visceral, que explica 28% da variância da atividade do PAI-1 (Laumen et al. 2008; Kaji, 2016). Entretanto, o aumento do PAI-1 na obesidade visceral é independentemente dos níveis de insulina, triglicerídeos e glicose (Chen et al, 2017). Em condições normais, PAI-1 está presente no plasma em concentrações muito baixas. Níveis elevados de PAI-1 são causados por uma série de mecanismos, incluindo a estimulação por fatores pró-fibróticos, como fator de crescimento de transformação β (TGFβ) e fatores inflamatórios, como TNFα e a interleucina-1 β (IL-1β) (Kasza et al, 2002; Hou et al, 2004). Níveis elevados de PAI-1 induzem resistência à insulina e anormalidades metabólicas durante processos pró-inflamatórios envolvendo várias citocinas e quimiocinas (Kaji, 2016). O PAI-1 pode ser considerado um indicador da resposta inflamatória (Chen et al, 2011). O PAI-1 poderia ser o elo causal entre obesidade e DCV. As anormalidades da fibrinólise induzida pelo PAI-1, associadas à obesidade e síndrome metabólica, levam à DCV por meio da coagulação vascular desregulada, disfunção endotelial e anormalidades metabólicas (Kaji, 2016). Estudos relataram a correlação de PAI-1 com múltiplos fatores de risco da DCV como obesidade, diabetes e síndrome metabólica (Smits et al, 2013; Kaji, 2016; Yarmolinsky et al, 2016). 27 1.4. Adipocinas e Vitamina D Os metabólitos de VD podem influenciar a produção de adipocinas e a resposta inflamatória no tecido adiposo (Ding et al, 2012). Assim, a deficiência de VD comprometeria o funcionamento metabólico normal do tecido adiposo. E pela importância do tecido adiposo no balanço de energia, no metabolismo de lipídios e na inflamação, a concentração de VD pode ter impacto significativo na manutenção da saúde metabólica (Strange et al, 2015). Estudos in vitro mostraram que a VD exerce ação anti- inflamatória nos adipócitos de ratos e de humanos, diminuindo a expressão de quimiocinas e citocinas através do envolvimento da p38 MAP quinase e da via inflamatória clássica NF-κB (Vitseva et al, 2008; Lorente-Cebrián et al, 2012; Karkeni et al, 2015). Pesquisa demonstrou que a VD modula a expressão de microRNA em adipócitos in vitro e em tecido adiposo in vivo através da via de sinalização de NF-kB, representando, assim, novo mecanismo de regulação da inflamação do tecido adiposo pela VD (Karkeni et al, 2018). Os valores baixos de 25(OH)D e adiponectina estão ambos associados à obesidade (Young et al 2009; Brochu-Gaudreau et al, 2010; Matsuzawa, 2010; Vaidya et al, 2012; Karonova et al, 2018; Wattanapol et al, 2020). Estudos transversais sugeriram que as concentrações de 25(OH)D estão positivamente associadas à adiponectina e que essa relação pode se fortalecer com o aumento do IMC (Gannage-Yared et al, 2009; Nimitphong et al, 2009). Por outro lado, estudos populacionais indicam relação direta entre valores séricos de 25(OH)D e adiponectina, independentemente do IMC (Vaidya et al, 2012; Husemoen et al, 2014). Estudo realizou análises transversais em 1206 mulheres (idade 30-55 anos) do Nurse’s Health Study I e em 439 homens (idade 40-75 anos) do Health Professionals Follow-Up Study, para avaliar a associação entre 25(OH)D e 28 adiponectina, controlado pelo IMC. Os valores médios de 25(OH)D foram de 24,4 ± 9,4 ng/mL em mulheres e 28,7 ± 9,9 ng/mL em homens, consistente com insuficiência de VD. As mulheres apresentaram maiores concentrações de adiponectina que os homens (17,9 ± 7,7 vs 10,0 ± 8,1 μg/mL, respectivamente). As mulheres na pós-menopausa apresentaram maiores valores séricos de adiponectina que mulheres na pré-menopausa (18,3 ± 7,7 vs. 15,7 ± 7,0 μg/mL, respectivamente). As concentrações de 25(OH)D foram positivamente associadas à adiponectina em ambas as populações, sendo que o IMC não modificou essa associação (Vaidya et al, 2012). Estudo de corte transversal avaliou 452 participantes saudáveis de ambos os sexos, com idade entre 18-80 anos, quanto aos fatores de risco cardiometabólicos e valores de 25(OH)D. Adiponectina, resistina, IL-6, TNF- e PCR foram determinados. A média de 25(OH)D e de adiponectina diminuiu com o aumento do número de fatores de risco cardiometabólicos (diabetes, hipertensão e RI), enquanto a PCR e a resistina aumentaram. Contudo, os autores não observaram associação entre os valores de 25(OH)D e adipocinas (Krivosíková e tal 2015). Pesquisa, avaliando a associação entre dieta hipossódica e valores plasmáticos de resistina e VD em 177 indivíduos hipertensos, observou que a redução na ingestão de sódio reduziu os níveis de resistina, possivelmente por suprimir o sistema renina-angiotensina. E que a concentração de 25(OH)D foi positivamente associada à resistina, podendo a VD estar envolvido na regulação da resistina por mecanismo desconhecido (Vaidya et al 2011). Associação entre valores reduzidos de 25(OH)D e aumento de PAI-1 foi demonstrada em estudos observacionais (Jorde et al, 2007; Hypponen et al, 2010). Pesquisa experimental observou que 1,25(OH)2D3 faz downregulation no PAI-1 ao bloquear a ativação de NF-kB. A inibição da produção de PAI-1 pode contribuir para os 29 efeitos cardioprotetores da VD (Chen et al, 2011). Em coorte prospectiva multicêntrica de adultos norte-americanos, participantes do Multi-Ethnic Study of Atherosclerosis, foi avaliado se a deficiência de 25(OH)D está associada a perfil biológico pró-trombótico. Foram incluídos 6443 indivíduos, sem DCV estabelecida, com 62,1 anos em média, 46,6% homens e IMC médio de 28,3 kg/m2. Foram avaliados dez marcadores hemostáticos: dímero-D, fibrinogênio, fator VIII, plasmina-antiplasmina, homocisteína, fator de von Willebrand, fator tecidual solúvel, inibidor da via do fator tecidual total (TFPI) e PAI-1. Para cada redução de 10 ng/ml nos valores de 25(OH)D foram observados elevação de 3,7% na homocisteína, 7,0% no PAI-1 e 2,1% no TFPI. Não foram observadas associações significativas entre VD e outros biomarcadores hemostáticos (Blondon et al, 2016). 1.5. Suplementação de Vitamina D e Adipocinas Alguns estudos clínicos, em populações de ambos os sexos, avaliaram a suplementação da VD sobre as adipocinas em pacientes diabéticos (Breslavsky et al 2013; Tabesh et al, 2015; Hussain et al 2019), idosos (Waterhouse et al, 2015) e obesos (Mai et al, 2017; Mousa et al, 2020). Breslavsky et al., avaliando 47 pacientes com diabetes tipo 2, com 65 anos em média, observaram aumento nas concentrações de 25(OH)D e de adiponectina apenas no grupo suplementado (1000UI VD/dia, 12 meses) quando comparado ao placebo (Breslavsky et al 2013). Recente ensaio clínico examinou o efeito da suplementação de VD sobre as concentrações de adipocinas em 65 adultos, sobrepeso ou obesos, com deficiência de VD. Foram randomizados para VD (100.000 UI dose única, seguido por 4.000 UI/dia) ou placebo, por 16 semanas. A suplementação de VD aumentou as concentrações de 25(OH)D em comparação ao placebo. Em análise não ajustada não houve diferenças entre os grupos nos valores de adiponectina, resistina ou adipsina. 30 Após ajustes para idade, sexo e porcentagem de gordura corporal, houve aumento na adiponectina (OR 13.7, IC 95% 2.0-255, p = 0,02) no grupo da VD em comparação ao placebo. Os autores concluem que são necessários mais estudos para esclarecer as interações moleculares entre a VD e as adipocinas e as implicações clínicas dessas interações no contexto da obesidade (Mousa et al, 2020). Por outro lado, Tabesh et al. em ensaio clínico, randomizado, controlado por placebo, estudando o efeito da suplementação de cálcio (1000mg/dia) e VD (50.000UI/semana) em 118 indivíduos com diabetes tipo 2, não encontraram alteração nos valores de adiponectina ao final de 8 semanas. Waterhouse et al. acompanharam 644 indivíduos (idade entre 65-84 anos) randomizados para receber placebo (n=214) ou VD 30.000UI/mês (n=215) ou 60.000UI/mês (n= 215) durante 12 meses. Não houve diferenças significantes nos valores de PCR, IL-6, IL-10, e adiponectina entre o grupo placebo e os grupos suplementados. Até o momento não foram apresentados estudos na população específica de mulheres na pós-menopausa, importante grupo de risco tanto para deficiência de VD (Lipps e tal, 2006; Pérez-López et al, 2020) quanto para obesidade abdominal (Zhang et al, 2008; Greendale et al, 2021). Poucas pesquisas e com número pequeno de participantes estudaram o impacto da suplementação de VD sobre as adipocinas em mulheres na pré- menopausa (Witham e tal, 2013; Greco et al, 2018; Seyyed et al, 2018) e um estudo em mulheres na pós-menopausa (Duggan et al, 2015). Witham e tal. realizaram estudo duplo- cego, placebo controlado, com 50 mulheres (41 anos em média) com deficiência de VD, randomizadas para receber dose única de 100.000 UI de VD ou placebo. Foram avaliados a função endotelial pelo doppler da artéria braquial e dosagens da RI, lipídios séricos, marcadores inflamatórios e adipocinas. Após 8 semanas, não houve alterações 31 significativas no fluxo arterial, na RI e nos marcadores inflamatórios no grupo da VD em relação ao placebo. Contudo, níveis de PAI-1 reduziram significativamente apenas no grupo suplementado (Witham e tal, 2013). Seyyed et al. avaliaram 44 mulheres com síndrome dos ovários policísticos (idade entre 20-38 anos), com valores de 25(OH) <20 ng/mL, randomizadas para 50.000 UI de VD oral/semana ou placebo. Após 8 semanas de intervenção, no grupo VD houve diminuição significativa da glicose de jejum, melhora da RI pelo HOMA e aumento significativo da adiponectina e dos valores séricos de VD em comparação ao grupo placebo (Seyyed et al, 2018). Greco et al. acompanharam 31 mulheres na pré-menopausa (média de 33.7±8.0 anos), não obesas, com valores de 25(OH)D < 20ng/mL que foram suplementadas com VD (1.500-2.000UI/dia) por 3 meses. Os autores observaram melhora significativa do perfil de adipocinas séricas, com aumento na adiponectina (+50,6%, p <0,0001) e diminuição na resistina (-24,3%, p <0,0001) (Greco et al, 2018). Por outro lado, Duggan et al. avaliaram 208 mulheres na pós menopausa, com sobrepeso e hipovitaminose D que foram randomizadas a intervenção de perda de peso com ou sem suplementação de VD (2.000 UI/dia). Foram avaliadas adipocinas e biomarcadores inflamatórios. Aos 12 meses não houve efeitos da intervenção sobre adiponectina ou leptina. A suplementação de vitamina D3 em combinação com perda de peso de pelo menos 5% do peso inicial foi associada a reduções significativas apenas nos níveis de IL6 (Duggan et al, 2015). Revisão sistemática e metanálise objetivou avaliar o papel da suplementação de VD sobre as adipocinas. Foram incluídos nove estudos clínicos, com 484 participantes de ambos os sexos. A metanálise de sete estudos não encontrou alteração significativa nas concentrações de adiponectina plasmática após a suplementação de VD. As alterações observadas foram consideradas independentes da 32 duração do tratamento e dos valores de 25(OH)D. Para os autores, uma vez que as adipocinas estão associadas como melhor controle glicêmico e outros indicadores metabólicos, mais estudos são necessários procurando se a suplementação de VD poderia ter um impacto nos níveis de adipocinas, principalmente em pacientes com síndrome metabólica ou obesidade (Dinca et al, 2016). 1.6. Justificativa A relevante função desempenhada pela VD sobre a massa óssea está bem definida, no entanto, receptores de VD são encontrados na maioria das células e tecidos humanos, indicando efeitos extra esqueléticos e que estão sob investigação atual. Resultados de ensaios clínicos apoiam o papel da VD na redução da incidência de algumas doenças, mas, globalmente, as conclusões são inconsistentes, indicando a necessidade de mais estudos para definir melhor se o estado da VD pode ser otimizado para melhorar aspectos da saúde humana além da massa óssea. A literatura carece de estudos direcionados às mulheres na pós-menopausa, importante grupo de risco para hipovitaminose D e obesidade abdominal. Poucos estudos até o momento avaliaram a relação entre os valores séricos de VD, o perfil de adipocinas e o impacto da suplementação de VD em população específica de mulheres na pós-menopausa. Pesquisas de natureza clínica são importantes repercutindo no sentido de melhorar a qualidade de vida de mulheres na pós-menopausa e reduzir custos assistenciais de saúde. 1.7. Hipótese A hipótese desse estudo é que a suplementação de VD proporciona significativa melhora no perfil de adipocinas em mulheres na pós-menopausa com deficiência de VD. 33 2. OBJETIVOS 2.1. Objetivo Principal Avaliar o efeito da suplementação isolada de vitamina D sobre o perfil de adipocinas em mulheres na pós-menopausa. 2.2. Objetivos Específicos 2.2.1. Investigar a correlação entre os valores de 25(OH)D e o perfil de adipocinas em mulheres na pós-menopausa. 2.2.2. Estudar o impacto da suplementação de vitamina D sobre o perfil de adipocinas em mulheres na pós-menopausa. 34 3. MÉTODOS 3.1. Desenho do estudo e Seleção da Amostra Trata-se de ensaio clínico randomizado, duplo-cego, placebo-controlado, para avaliar os efeitos da suplementação isolada de VD (1000IU/dia). O grupo populacional foi constituído de pacientes atendidas no Ambulatório de Climatério & Menopausa da Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB)-UNESP nos anos de 2016-2018. Foram incluídas mulheres com data da última menstruação há pelo menos 12 meses e idade ≥ 45 anos que aceitaram participar do estudo. Os critérios de exclusão foram: presença de DAC manifesta atual ou prévia; doença arterial cerebrovascular; doença aneurismática; doença arterial periférica; diabetes insulinodependente; doença renal crônica ou creatinina > 1,4 mg/dl; doença hepática; síndrome de má absorção; doenças autoimunes; disfunção da paratireoide; obesidade grau III; câncer; uso de terapia hormonal da menopausa ou de doses farmacológicas de VD (>100 UI/dia); etilistas ou drogaditas. Todas as voluntárias participantes do estudo foram informadas sobre os objetivos da pesquisa, procedimentos e confidencialidade dos dados, sem quaisquer prejuízos para as mesmas. Foi solicitada a todas as participantes a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo I), de acordo com exigência da resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da FMB-UNESP sob número do parecer 2.709.692 (Anexo II). O estudo foi registrado e aprovado pelo Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos (REBEC) sob o número de registro RBR-4MHS32. Este ensaio clínico foi realizado de acordo com o Consolidated Standards of Reporting Trials (CONSORT) 2010 (Anexo III) (Schulz et al, 2010). 35 3.2. Dados Clínicos Inicialmente, no dia da consulta foram coletados por meio de entrevista os seguintes dados clínicos: idade, idade da menopausa, tempo de menopausa, paridade, tabagismo atual, uso de terapia hormonal ou de suplementação de VD, histórico de doenças crônicas (hipertensão, diabetes, doença cardiovascular, doenças autoimunes, doenças de má absorção), atividade física, pressão arterial, peso e altura. A medida da pressão arterial foi aferida no braço direito com o antebraço apoiado no nível do precórdio, palma da mão para cima, com uso de esfigmomanômetro aneróide padrão, com a paciente na posição sentada. Foram definidas como tabagistas as pacientes com o hábito de fumar diariamente, não importando o número de cigarros fumados. Foram consideradas ativas as mulheres que praticam exercícios físicos aeróbicos de intensidade moderada, pelo menos 30 minutos, cinco vezes na semana (150/min/sem) ou exercícios de resistência três dias por semana (CDC). Foram obtidos os seguintes dados para avaliação antropométrica: peso, altura, índice de massa corpórea (IMC=peso/altura2) e circunferência da cintura. Para mensuração do peso, foi utilizada balança antropométrica eletrônica microdigital tipo plataforma (Filizola®, Brasil), com capacidade de 150 kg com precisão 0,1 Kg e 0,5 cm (peso e estatura), com a paciente descalça e com o mínimo de roupa. Para medir a estatura, a paciente permaneceu com os braços ao longo do corpo ereto, mantendo os olhos fixos em plano horizontal paralelo ao chão, medida por haste vertical com graduação de 0,5 cm, acoplada à balança. Foram empregados os critérios da World Health Organization de 2002 para classificação das pacientes, conforme o IMC: menor que 24,9 kg/m2 normal, de 25 a 29,9 kg/m2 sobrepeso, de 30 a 34,9 kg/m2 obesidade grau I, de 35 a 39,9 kg/m2 obesidade grau II e maior ou igual a 40 kg/m2 obesidade grau III. Para a 36 medida da cintura foi considerada a menor circunferência entre a última costela e a crista ilíaca anterossuperior, sendo a leitura feita no momento da expiração. Foi considerada aumentada acima de 88 cm (NCEP-ATP III, 2001). 3.3. Protocolo de suplementação Após a seleção inicial, todas as participantes receberam uma numeração (1-160) de acordo com a ordem de inclusão no estudo. Um processo de randomização computadorizado centralizado foi conduzido empregando software específico para o protocolo do estudo (SAS for Windows, v. 9.2 using Procedure Plan). As pacientes foram randomizadas, em sequência de numeração pré-estabelecida, em dois grupos: VD, com suplementação de vitamina D3 (n=80) e PL, usuárias de placebo (n=80) (Figura 1). Os investigadores e as pacientes não tinham conhecimento prévio dos referidos grupos e das diferentes numerações, apenas o farmacêutico responsável pela manipulação do placebo. Assim, 80 pacientes receberam diariamente 1.000 UI de VD (colecalciferol), cinco gotas via oral (cada gota contém 200 UI, frasco de 20 ml), durante 9 meses. As outras 80 pacientes receberam placebo (composição de água e óleo mineral com essência de limão, em 20 ml), com mesma característica e sabor, cinco gotas, via oral. 37 Figura 1- Fluxograma das pacientes incluídas no estudo Os frascos foram idênticos, embalados e numerados em código pelo farmacêutico para não identificação do grupo pelas participantes do estudo (Figura 2). Para o controle da suplementação, as pacientes foram orientadas a trazer os frascos a cada retorno para avaliar a medicação usada e determinar a aderência. O tempo de seguimento foi de 9 meses com avaliações clínicas em dois momentos, inicial e final. 38 Figura 2 – A semelhança dos suplementos e a maneira como foi entregue para as pacientes. 3.4. Avaliação Laboratorial Amostras sanguíneas foram colhidas nos momentos basal e 9 meses, pela manhã, após 12 horas de jejum. Por meio de punção venosa, em sistema fechado a vácuo (Vacutainer, England), foram obtidos 30 ml de sangue, diretamente em dois tubos secos (10 ml) com gel separador de soro e um tubo heparinizado com EDTA (10 ml) para obtenção de plasma. Ao final de cada colheita, foram centrifugadas por 10 min (3.000 rpm). Um tubo com o soro obtido seguiu para dosagens bioquímicas imediatas e outro tubo com soro e um tubo com plasma foram congelados a -80C até a leitura das dosagens do perfil de adipocinas (soro) e dosagem da VD (plasma). Foi realizada avaliação do perfil glicídico pela mensuração de glicose e insulina, para cálculo da resistência insulínica, baseada na medida estática desses dois 39 constituintes plasmáticos, além de dosagem da creatinina. Todas as avaliações bioquímicas foram realizadas pelo Laboratório de Análises Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu. A mensuração da glicose foi processada pelo analisador bioquímico automático (Technicon, RA-XT System; Global Medical Instrumentation, Minessota, USA) e quantificada pelo método enzimático colorimétrico, utilizando-se reagente comercial específico (Sera-Pak, Bayer Corporation, Diagnostics Division, NY, USA). O valor considerado ótimo foi glicose < 100mg/dL. Para dosagem de creatinina foi empregado o método da química seca com equipamento de automatização, modelo Vitros 950® (Johnson-Johnson, Rochester, NY, USA). O valor da concentração sérica da creatinina foi considerado dentro do limite da normalidade de 0,7 a 1,2 mg/dL. A insulina foi quantificada pelo Sistema Immulite (DPC,USA), que emprega imunoensaio, em fase sólida, por quimioluminescência, para uso em analisador automático, designado para leitura quantitativa. A taxa de normalidade segundo o método empregado foi de 6,0 a 27,0 µIU/ml. Para a avaliação da resistência insulínica foi empregado o HOMA-IR (Homeostasis Model Assessment-Insulin Resistant), calculado pela fórmula: Insulina (µUI/mL) x glicose de jejum (mg/dl) / 405. Valores que indicam RI foi definido como HOMA-IR > 2,71 (Geloneze et al, 2006). 3.5. Análise de Vitamina D Os valores de 25(OH)D foram dosados no momento basal e aos 9 meses (para avaliar a biodisponibilidade e aderência ao tratamento). A 25(OH)D foi dosada por Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (HPLC), pelo sistema HPLC Isocrático com injetor manual Rheodyne, modelo 7725i, com loop de 20 μL e detector de UV-VIS Waters, modelo M-484, com coluna RP 18 com 4.0 mm x 15 cm e partículas de 5 micros (Sigma- 40 Aldrich Co. LLC, St. Louis, MO, USA). O limite de detecção foi de 2,5 ng/ml e o coeficiente de variação < 7,0%. Foram considerados suficientes valores de 25(OH)D ≥ 30 ng/mL, insuficiência de 21 a 29 ng/mL e deficiência < 20 ng/mL (Dawson-Hughes et al, 2005; Bischoff-Ferrari et al, 2006). Todas as dosagens foram realizadas em único momento para minimizar variações interensaios. 3.6. Análise das Adipocinas As adipocinas [adiponectina, resistina, adipsina e inibidor do ativador de plasminogênio tipo 1 (PAI-1)] foram quantificadas utilizando o instrumento de teste analítico Magpix, que utiliza a tecnologia xMAP (Luminex Corp., Austin, TX, USA) e o software xPONENT 4.2 (Luminex), seguindo os protocolos específicos dos Kits fornecidos por Millipore (Millipore Corp., Billerica, MA, USA). A tecnologia xMAP (Multi-Analyte Profiling) usa microesferas magnéticas codificadas por fluorescência revestidas com anticorpos de captura específicos para medir simultaneamente múltiplos analitos em uma amostra. Depois que as microesferas capturaram os analitos, um anticorpo de detecção biotinilado liga-se a esse complexo. A estreptavidina PE liga-se então como uma molécula de sinalização. Dentro do instrumento de leitura, as microesferas magnéticas são mantidas em uma monocamada por um íman, onde dois LEDs (Light Emitting Diode) são usados para excitar o corante interno de microesfera e o corante da molécula de sinalização, respectivamente. Uma câmera captura essas imagens, que são analisadas pelo software Milliplex Analyst (Millipore Corp., Billerica, MA, USA) (Shetty et al, 2013). As concentrações das adipocinas foram determinadas com base no ajuste de uma curva padrão para a intensidade média de fluorescência em ng/ml. Foram realizados dois controles de qualidade para cada ensaio (controle 1, nível baixo e controle 2, nível 41 elevado). Todas as adipocinas encontravam-se dentro da curva de controle de qualidade. Todas as dosagens foram realizadas pelo mesmo pesquisador biomédico especializado (Orsatti CL) para minimizar variações intraensaios. 3.7. Análise Estatística O cálculo do tamanho amostral foi embasado no estudo de Breslavsky et al (2013) que demonstraram aumento nos valores de adiponectina pós-suplementação de VD (pré 10.4 ± 6.6 ng/mL e pós 13.1 ± 7.2 ng/mL). Considerando a diferença entre os valores, e para um poder de 90%, margem de erro de 5% e confiabilidade de 95%, estimou-se tamanho amostral de no mínimo 50 mulheres por grupo. Considerando perda de seguimento ao redor de 30%, o tamanho amostral adotado foi de 80 mulheres por grupo. O método de análise estatística utilizado foi por per protocol. A partir dos dados foram construídas tabelas das variáveis clínicas e dos parâmetros avaliados. As variáveis foram analisadas quanto à normalidade de distribuição pelo Teste de Shapiro-Wilk e a homogeneidade pelo Teste de Levene. Para análise dos dados foi calculado média e desvio-padrão para variáveis quantitativas e, frequência e porcentagem para variáveis qualitativas. Foram analisadas variáveis clínicas (idade e tempo de menopausa, pressão arterial, peso, altura, IMC, exercício físico, tabagismo e doenças) e laboratoriais [25(OH)D, bioquímicos e perfil de adipocinas]. Para comparação entre os grupos em relação às características iniciais foi empregado o Teste t-student (variáveis quantitativas), distribuição Gama (variáveis quantitativas assimétricas) e o teste do Qui-quadrado (variáveis qualitativas). Na comparação dos valores de 25(OH)D entre os momentos (basal e 9 meses) e entre os grupos, utilizou-se o delineamento em medidas repetidas no tempo (ANOVA) seguido do 42 teste de comparação múltipla de Tukey ajustado para interação entre grupo x momento. E na comparação do perfil de adipocinas (variáveis assimétricas) foi empregado o mesmo delineamento em medidas repetidas através da distribuição Gama seguido do teste de comparação múltipla de Wald. As correlações entre as variáveis foram realizadas por análise de correlação bivariada de Pearson (r). Em todos os testes foi adotado o nível de significância de 5% ou o P-valor correspondente. As análises foram realizadas utilizando- se o programa Statistical Analyses System (SAS) for windows, versão 9.4, pelo Escritório de Apoio à Pesquisa (EAP) da Faculdade de Medicina de Botucatu que deu o atendimento metodológico e conduziu os procedimentos estatísticos. 43 4. RESULTADOS 4.1. Artigo Original Efeito da suplementação isolada de vitamina D sobre o perfil de adipocinas em mulheres na pós-menopausa: ensaio clínico randomizado. Effect of isolated vitamin D supplementation on adipokines in postmenopausal women: a randomized clinical trial Schmitt EMB, Orsatti CL, Nahas EAP 44 Resumo Objetivo: Avaliar o efeito da suplementação isolada de vitamina D (VD) sobre o perfil de adipocinas em mulheres na pós-menopausa. Métodos: Neste ensaio clínico randomizado, 160 mulheres (idade 50-65 anos, amenorreia ≥12 meses) foram incluídas. Mulheres com histórico de doença cardiovascular, diabetes insulinodependente, doença renal crônica ou hepática, e usuárias de terapia hormonal e de VD foram excluídas. As participantes foram randomizadas para suplementação com colicalciferol 1.000UI/dia/oral (VD, n=80) ou placebo (PL, n=80). O tempo de intervenção foi de 9 meses, com avaliações nos momentos inicial e final. Para avaliação do perfil de adipocinas foram dosadas adiponectina, resistina, adipsina e PAI-1 (Inibidor do ativador de plasminogênio tipo 1). Resultados: Após 9 meses, valores médios de 25(OH)D aumentaram de 15,0±7,5 ng/ml para 27,5±10,4 ng/ml (+45,4%) no grupo VD, e diminuíram de 16,9±6,7 ng/ml para 13,8±6,0 ng/ml (-18,5%) no placebo (p<0.001). No grupo VD observou-se aumento nos valores de adiponectina (+18.6%) e redução de resistina (-32.4%) e PAI-1 (-39.3%) (p<0.05). E no grupo PL houve redução no PAI-1 (-25.5%) (p<0.05). Ao final, foi observada diferença significativa entre os grupos PL e VD nos valores de adiponectina e resistina (11,5±5,5 ng/mL vs 18,5±21,8 ng/mL, p=0.047, e 16,5±3,5 ng/mL vs 11,7±3,3 ng/mL, p=0.027, respectivamente). Não foram observadas diferenças entre grupos e entre momentos nos valores de adipsina e PAI-1. Conclusões: A suplementação diária e isolada de 1.000 UI de VD associou-se com aumento de adiponectina e redução da resistina, sugerindo efeito benéfico sobre o perfil de adipocinas em mulheres na pós-menopausa com deficiência de VD. Palavras-chave: Adipocinas; Ensaio clínico randomizado;Menopausa; Vitamina D. 45 Abstract Objective: To evaluate the effect of supplementation of vitamin D (VD) alone on adipokines profile in postmenopausal women. Methods: In this randomized clinical trial, 160 women were randomized into two groups: VD, cholecalciferol supplementation 1,000IU/day/orally (n=80) or placebo (PL, n=80). Women with amenorrhea ≥12 months and age 50-65 years were included. Those with established cardiovascular disease, insulin dependent diabetes, renal failure, liver disorders, and previous use of menopausal hormone therapy and VD were excluded. The intervention time was 9 months, with assessments at the start and end of treatment. Serum levels of adiponectin, resistin, adipsin and PAI-1 (Inhibitor of plasminogen activator type 1) were determined. Results: After 9 months, there was increase in the 25(OH)D concentrations from 15.0±7.5 ng/ml to 27.5±10.4 ng/ml (+45.4%) in VD group and decrease from 16.9±6.7 ng/ml to 13.8±6.0 ng/ml (-18.5%) in PL group (p<0.001). In the VD group, there was increase in adiponectin (+18.6%) and decrease in resistin (-32.4%) and PAI-1 (-39.3%) (p<0.05). And in the placebo group, there was decrease in PAI-1 (-25.5%) (p<0.05). At the end point, a difference was observed between the PL and VD groups in the mean values of adiponectin and resistin (11.5 ± 5.5 ng/mL vs 18.5 ± 21.8 ng/mL, p=0.047, and 16.5 ± 3.5 ng /mL vs 11.7 ± 3.3 ng/mL, p=0.027, respectively). There were no significant intervention effects on serum levels of adipsin and PAI-1. Conclusion: Daily isolated supplementation of 1,000 IU of VD was associated with an increase in adiponectin and decrease in resistin, suggesting a beneficial effect on the adipokine profile in postmenopausal women with VD deficiency, Keywords: Adipokines; Randomized clinical trial; Menopause; Vitamin D. 46 Introdução A deficiência de vitamina D (VD) é bastante prevalente1-2, com especial importância para mulheres na pós-menopausa3-4. Reconhecidamente, a hipovitaminose D estende seus efeitos negativos para além da homeostase de cálcio e da saúde esquelética1,5-7. Uma grande variedade de células expressa o receptor nuclear de VD (VDR), como adipócitos, células do sistema imunológico, cólon, pâncreas e vasos, sintetizando a forma ativa da VD, a 1,25-diidroxivitamina D [1,25(OH)2D]. Esta produção local de VD é responsável pela modulação extraesquelética de vários outros processos fisiológicos, inclusive no tecido adiposo6,8. Evidências sugerem o envolvimento da hipovitaminose D em diversas doenças crônicas não transmissíveis como obesidade, hipertensão, diabetes e consequentemente a síndrome metabólica e a doença cardiovascular (DCV)3, 7, 9-12. A menopausa é caracterizada pelo aumento do risco de DCV, ganho de peso e de adiposidade para muitas mulheres13, associado ao aumento da gordura abdominal e visceral14,15. A obesidade parece afetar a bioatividade da VD16. O excesso de peso corporal se correlaciona com níveis plasmáticos mais baixos 25-hidroxivitamina D [25(OH)D]17,18. No entanto, a contribuição precisa da hipovitaminose D na obesidade e saúde em geral não estão bem estabelecidas6. Concentrações plasmáticas elevadas de 25(OH)D foram associadas a menores quantidades de tecido adiposo visceral e tamanho reduzido de adipócitos19-21, sugerindo uma ligação entre os níveis de VD e o tecido adiposo22. O tecido adiposo é considerado um órgão endócrino, sendo capaz de sintetizar e liberar citocinas, complementos e fatores de crescimento, proteínas da matriz extracelular e agente vasoativos, coletivamente conhecidos como adipocinas22-24. Algumas adipocinas secretadas pelo tecido adiposo podem associar-se à resistência à 47 insulina, síndrome metabólica e DCV13 como a adiponectina, a resistina, a adipsina e o inibidor do ativador de plasminogênio tipo 1 (PAI-1). Por outro lado, os metabólitos de VD podem influenciar a produção de adipocinas e a resposta inflamatória no tecido adiposo25. Assim, a deficiência de VD comprometeria o funcionamento metabólico normal do tecido adiposo. E pela importância do tecido adiposo no balanço de energia, no metabolismo de lipídios e na inflamação, a concentração de VD pode ter impacto significativo na manutenção da saúde metabólica 9,13,26. Alguns estudos clínicos, em populações de ambos os sexos, avaliaram a suplementação da VD sobre as adipocinas em pacientes idosos27 e com comorbidades como diabéticos28-30 e obesos31,32. Estudo de revisão sistemática avaliando o papel da suplementação de VD sobre as adipocinas incluiu nove estudos com 484 participantes de ambos os sexos. Em sete estudos não foram encontradas alterações significativas nas concentrações de adiponectina após a suplementação de VD. Para os autores, mais estudos são necessários procurando se a suplementação de VD poderia ter um impacto nos valores de adipocinas, principalmente em pacientes com síndrome metabólica ou obesidade33. Até o momento não foram apresentados estudos na população específica de mulheres na pós-menopausa, importante grupo de risco tanto para deficiência de VD3,34 quanto para obesidade abdominal13,15. Poucas pesquisas e com número pequeno de participantes avaliaram o impacto da suplementação de VD sobre as adipocinas em mulheres na menacme35-37 e apenas um estudo em mulheres na pós-menopausa38. Sendo assim, mais estudos de intervenção são necessários para esclarecer as interações entre a VD e as adipocinas e o impacto da suplementação da VD especialmente em mulheres na pós-menopausa. Baseado nesses dados, o objetivo deste estudo foi avaliar o efeito da 48 suplementação isolada de vitamina D sobre o perfil de adipocinas em mulheres na pós- menopausa. Métodos Desenho do estudo e Seleção da Amostra Neste ensaio clínico randomizado foram incluídas mulheres com data da última menstruação há pelo menos 12 meses e idade ≥ 45 anos atendidas em Ambulatório de Climatério e Menopausa, entre 2016-2018. Foram excluídas aquelas com DCV manifesta atual ou prévia, diabetes insulinodependente, doença hepática ou renal crônica ou creatinina > 1,4 mg/dl, síndrome de má absorção, doenças autoimunes, disfunção da paratireoide, obesidade grau II, câncer, e uso de terapia hormonal (TH) da menopausa ou de doses farmacológicas de VD (>100 UI/dia). Foi solicitada, a todas as participantes, a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e o projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da FMB-UNESP. O estudo foi registrado e aprovado pelo Registro Brasileiro de Ensaios Clínicos (REBEC) sob o número de registro RBR-4MHS32. Este ensaio clínico foi realizado de acordo com o Consolidated Standards of Reporting Trials (CONSORT) 201039. Dados Clínicos Foram coletados por meio de entrevista os seguintes dados clínicos: idade, idade da menopausa, tempo de menopausa, tabagismo atual, uso de TH ou de suplementação de VD, histórico de doenças crônicas (hipertensão, diabetes, doença cardiovascular), atividade física, pressão arterial, peso e altura. Foram definidas como tabagistas as pacientes com o hábito de fumar diariamente, não importando o número de cigarros 49 fumados. Foram consideradas ativas as mulheres que praticam exercícios físicos aeróbicos de intensidade moderada, pelo menos 30 minutos, cinco vezes na semana (150/min/sem) ou exercícios de resistência três dias por semana (CDC). Foram obtidos os seguintes dados para avaliação antropométrica: peso, altura, índice de massa corpórea (IMC=peso/altura2) e circunferência da cintura. Foram empregados os critérios da World Health Organization de 2002 para classificação das pacientes, conforme o IMC: menor que 24,9 kg/m2 normal, de 25 a 29,9 kg/m2 sobrepeso, de 30 a 34,9 kg/m2 obesidade grau I, de 35 a 39,9 kg/m2 obesidade grau II e maior ou igual a 40 kg/m2 obesidade grau III. Para a medida da cintura foi considerada a menor circunferência entre a última costela e a crista ilíaca anterossuperior, sendo a leitura feita no momento da expiração. Foi considerada aumentada acima de 88 cm40. Protocolo de suplementação Após a seleção inicial, todas as participantes receberam uma numeração (1-160) de acordo com a ordem de inclusão no estudo. Um processo de randomização computadorizado centralizado foi conduzido empregando software específico para o protocolo do estudo (SAS for Windows, v. 9.2 using Procedure Plan). As pacientes foram randomizadas, em sequência de numeração pré-estabelecida, em dois grupos: VD, com suplementação de vitamina D (n=80) e PL, usuárias de placebo (n=80) (Figura 1). Os investigadores e as pacientes não tinham conhecimento prévio dos referidos grupos e das diferentes numerações, apenas o farmacêutico responsável pela manipulação do placebo. Assim, 80 pacientes receberam diariamente 1.000 UI de VD (colecalciferol), cinco gotas via oral (cada gota contém 200 UI, frasco de 20 ml), durante 9 meses. As outras 80 50 pacientes receberam placebo (composição de água e óleo mineral com essência de limão, em 20 ml), com mesma característica e sabor, cinco gotas, via oral. Os frascos foram idênticos, embalados e numerados em código pelo farmacêutico para não identificação do grupo pelas participantes do estudo. Para o controle da suplementação, as pacientes foram orientadas a trazer os frascos a cada retorno para avaliar a medicação usada e determinar a aderência. O tempo de seguimento foi de 9 meses com avaliações clínicas em dois momentos, inicial e final. Figura 1- Fluxograma das pacientes incluídas no estudo 51 Avaliação Laboratorial Amostras sanguíneas foram colhidas nos momentos basal e 9 meses, pela manhã, após 12 horas de jejum. Foi realizada avaliação do perfil glicídico pela mensuração de glicose e insulina, para cálculo da resistência insulínica, baseada na medida estática desses dois constituintes plasmáticos, além de dosagem da creatinina. A mensuração da glicose foi processada pelo analisador bioquímico automático (Technicon, RA-XT System; Global Medical Instrumentation, Minessota, USA) e quantificada pelo método enzimático colorimétrico, utilizando-se reagente comercial específico (Sera-Pak, Bayer Corporation, Diagnostics Division, NY, USA). O valor considerado ótimo foi glicose < 100mg/dL. Para dosagem de creatinina foi empregado o método da química seca com equipamento de automatização, modelo Vitros 950® (Johnson-Johnson, Rochester, NY, USA). O valor da concentração sérica da creatinina foi considerado dentro do limite da normalidade de 0,7 a 1,2 mg/dL. A insulina foi quantificada pelo Sistema Immulite (DPC,USA), que emprega imunoensaio, em fase sólida, por quimioluminescência, para uso em analisador automático, designado para leitura quantitativa. A taxa de normalidade segundo o método empregado foi de 6,0 a 27,0 µIU/ml. Para a avaliação da resistência insulínica foi empregado o HOMA-IR (Homeostasis Model Assessment-Insulin Resistant), calculado pela fórmula: Insulina (µUI/mL) x glicose de jejum (mg/dl) / 405. Valores que indicam RI foi definido como HOMA-IR > 2,7141. Análise de Vitamina D Os valores de 25(OH)D foram dosados no momento basal e aos 9 meses (para avaliar a biodisponibilidade e aderência ao tratamento). A 25(OH)D foi dosada por Cromatografia Líquida de Alta Eficiência (HPLC), pelo sistema HPLC Isocrático com injetor 52 manual Rheodyne, modelo 7725i, com loop de 20 μL e detector de UV-VIS Waters, modelo M-484, com coluna RP 18 com 4.0 mm x 15 cm e partículas de 5 micros (Sigma- Aldrich Co. LLC, St. Louis, MO, USA). O limite de detecção foi de 2,5 ng/ml e o coeficiente de variação < 7,0%. Foram considerados suficientes valores de 25(OH)D ≥ 30 ng/mL, insuficiência de 21 a 29 ng/mL e deficiência < 20 ng/mL42,43. Todas as dosagens foram realizadas em único momento para minimizar variações interensaios. Análise das Adipocinas As adipocinas - adiponectina, resistina, adipsina e PAI-1 - foram quantificadas utilizando o instrumento de teste analítico Magpix, que utiliza a tecnologia xMAP (Luminex Corp., Austin, TX, USA) e o software xPONENT 4.2 (Luminex), seguindo os protocolos específicos dos Kits fornecidos por Millipore (Millipore Corp., Billerica, MA, USA). A tecnologia xMAP (Multi-Analyte Profiling) usa microesferas magnéticas codificadas por fluorescência revestidas com anticorpos de captura específicos para medir simultaneamente múltiplos analitos em uma amostra. Uma câmera captura as imagens, que são analisadas pelo software Milliplex Analyst (Millipore Corp., Billerica, MA, USA)44. As concentrações das adipocinas foram determinadas com base no ajuste de uma curva padrão para a intensidade média de fluorescência em ng/ml. Foram realizados dois controles de qualidade para cada ensaio (controle 1, nível baixo e controle 2, nível elevado). Todas as adipocinas encontravam-se dentro da curva de controle de qualidade. Todas as dosagens foram realizadas pelo mesmo pesquisador biomédico especializado (Orsatti CL) para minimizar variações intraensaios. 53 Análise Estatística O cálculo do tamanho amostral foi embasado no estudo de Breslavsky et al (2013) que demonstraram aumento nos valores de adiponectina pós-suplementação de VD (pré 10.4 ± 6.6 ng/mL e pós 13.1 ± 7.2 ng/mL)28. Considerando a diferença entre os valores, e para um poder de 90%, margem de erro de 5% e confiabilidade de 95%, estimou-se tamanho amostral de no mínimo 50 mulheres por grupo. Considerando perda de seguimento ao redor de 30%, o tamanho amostral adotado foi de 80 mulheres por grupo. O método de análise estatística utilizado foi por per protocol. A partir dos dados foram construídas tabelas das variáveis clínicas e dos parâmetros avaliados. As variáveis foram analisadas quanto à normalidade de distribuição pelo Teste de Shapiro-Wilk e a homogeneidade pelo Teste de Levene. Para análise dos dados foi calculado média e desvio-padrão para variáveis quantitativas e, frequência e porcentagem para variáveis qualitativas. Foram analisadas variáveis clínicas (idade e tempo de menopausa, pressão arterial, peso, altura, IMC, exercício físico, tabagismo e doenças) e laboratoriais [25(OH)D, bioquímicos e perfil de adipocinas]. Para comparação entre os grupos em relação às características iniciais foi empregado o Teste t-student (variáveis quantitativas), distribuição Gama (variáveis quantitativas assimétricas) e o teste do Qui-quadrado (variáveis qualitativas). Na comparação dos valores de 25(OH)D entre os momentos (basal e 9 meses) e entre os grupos, utilizou-se o delineamento em medidas repetidas no tempo (ANOVA) seguido do teste de comparação múltipla de Tukey ajustado para interação entre grupo x momento. E na comparação do perfil de adipocinas (variáveis assimétricas) foi empregado o mesmo delineamento em medidas repetidas através da distribuição Gama seguido do teste de 54 comparação múltipla de Wald. As correlações entre as variáveis foram realizadas por análise de correlação bivariada de Pearson (r). Em todos os testes foi adotado o nível de significância de 5% ou o P-valor correspondente. As análises foram realizadas utilizando- se o programa Statistical Analyses System (SAS) for windows, versão 9.4, pelo Escritório de Apoio à Pesquisa (EAP) da Faculdade de Medicina de Botucatu que deu o atendimento metodológico e conduziu os procedimentos estatísticos. Resultados A comparação das características clínicas e laboratoriais iniciais entre as mulheres submetidas à suplementação de VD (n=80) ou ao placebo (n=80) está demonstrada na Tabela 1. Observa-se que os grupos foram homogêneos para as todas as variáveis avaliadas (p>0,05). A média de idade das pacientes incluídas foi de 58,8 ± 6,6 anos para o grupo VD e de 59,3  6,7 anos para o grupo placebo, com tempo de menopausa 12,0 ± 8,8 anos e 12,3  8,4 anos, respectivamente (p>0.05). Em ambos os grupos, as pacientes foram classificadas, em média, como sobrepeso (IMC de 25 a 29,9 kg/m2) e com deposição central de gordura (CC > 88 cm). Nos dois grupos os valores médios de 25(OH)D indicavam insuficiência de VD (<20,0ng/mL). Não foram encontradas diferenças significativas nos parâmetros bioquímicos avaliados (Tabela 1). Na análise de correlação no momento basal, o valor de 25(OH)D foi negativamente associado com IMC (r=-0.18) e circunferência da cintura (r=-0.21) (p<0.05). Em relação ao perfil de adipocinas, foi observada correlação positiva da resistina com a insulina (r= 0.16) e com o HOMA (r= 0.16). E houve correlação negativa da adipsina com a glicose (r= -0.18) (p<0.05) (Tabela 2). 55 A Tabela 3 demonstra a comparação das características antropométricas e dos valores de 25(OH)D entre grupos e entre momentos. Observou-se aumento significativo na concentração plasmática de 25(OH)D para o grupo suplementado com VD, com variação positiva de 45,4%. E para o grupo placebo houve diminuição dos valores de 25(OH)D, com variação negativa de 18,5%, com diferença significativa entre os grupos (p=0.049) e entre o momento final (p<0.001). No momento final, pela estratificação dos valores plasmáticos de 25(OH)D demonstrou-se que 62,5% das pacientes do grupo placebo apresentavam insuficiência de VD contra 26,3% daquelas do grupo suplementado (Tabela 3). A deficiência de VD foi encontrada apenas no grupo placebo em 21,3% (dado não demonstrado). Também foi observada redução significativa da insulina (-13,7%, p=0,008) e HOMA-IR (-17,9%, p=0,007), apenas no grupo suplementado com vitamina D, porém sem diferença entre os grupos ao final da intervenção. Por outro lado, no grupo placebo houve aumento da glicose (+6,2%, p=0,009), com diferença significativa entre os grupos e entre o momento final (p<0,001). Não foram observadas diferenças no IMC e CC entre grupos e entre momentos (Tabela 3). Na comparação entre os grupos do perfil de adipocinas no momento inicial não foram observadas diferenças (p>0.05). No grupo de mulheres suplementadas com VD, na comparação entre os momentos inicial e final, observou-se aumento significativo nos valores médios de adiponectina (+18.6%) e redução significativa de resistina (-32.4%) e PAI-1 (-39.3%) (p<0.05). E no grupo placebo houve redução significativa no momento final de PAI-1 (-25.5%) (p<0.05). Na comparação entre os grupos no momento final, foi observada diferença significativa entre os grupos placebo e VD nos valores médios de adiponectina e de resistina (11.5 ± 5.5 ng/mL vs 18.5 ± 21.8 ng/mL, p=0.047, e 16.5 ± 3.5 56 ng/mL vs 11.7 ± 3.3 ng/mL, p=0.027, respectivamente). Não foram observadas diferenças entre grupos e entre momentos nos valores de adipsina (Tabela 4). A taxa de adesão foi de 92% para o estudo, sem diferenças entre os grupos de tratamento (VD ou placebo). Das 160 mulheres analisadas, 21 descontinuaram o estudo antes de 10 meses (Figura 1). Os eventos adversos notificados foram leves e igualmente distribuídos entre os grupos de suplementação e do placebo. No grupo VD, duas participantes, e no grupo placebo, três participantes, descontinuaram o estudo por queixas gastrointestinais e dor epigástrica. Nenhum outro efeito adverso foi relatado. 57 Tabela 1. Comparação das características clínicas e laboratoriais iniciais entre as mulheres na pós-menopausa submetidas à suplementação de vitamina D (n=80) ou placebo (n=80). Vitamina D Placebo Valor de P* Parâmetros Clínicos Idade (anos) 58.8 (6.6) 59.3 (6.7) 0.654a Idade menopausa (anos) 46.8 (6.2) 46.9 (5.6) 0.882a Tempo de Menopausa (anos) 12.0 (8.8) 12.3 (8.4) 0.804b PAS (mmHg) 134.3 (19.8) 136.5 (21.0) 0.499a PAD (mmHg) 81.5 (12.6) 81.0 (10.8) 0.794a IMC (kg/m2) 29.4 (5.4) 29.9 (4.7) 0.505a CC (cm) 94.0 (12.1) 94.1 (10.3) 0.994a Tabagismo n (%) 21 (26.2) 19 (23.8) 0.457c Exercício físico n (%) 25 (31.2) 21 (26.2) 0.428c Hipertensão n (%) 44 (55.0) 49 (61.2) 0.423c Diabetes n (%) 12 (15.0) 16 (20.0) 0.405c Parâmetros Bioquímicos 25(OH)D (ng/mL) 15.0 (7.5) 16.9 (6.7) 0.086a Creatinina (mg/dL) 0.7 (0.2) 0.7 (0.1) 0.955a Glicose (mg/dL) 92.5 (10.6) 93.5 (10.9) 0.564a Insulina (µUI/mL) 11.7 (8.1) 10.1 (5.8) 0.085b HOMA-IR 2.7 (2.1) 2.4 (1.5) 0.125b Valores médios (± desvio padrão) ou número (%). PAS, pressão arterial sistólica; PAD, pressão arterial diastólica; IMC, índice de massa corporal; CC, circunferência da cintura; 25(OH)D, 25-hidroxivitamina D. *Diferença significativa se P<0,05 (aTeste t-Student, bTeste de Distribuição Gama ou cTeste do Qui-Quadrado). 58 Tabela 2- Correlação entre os valores plasmáticos de 25(OH)D e parâmetros clínicos e o perfil de adipocinas em 160 mulheres na pós-menopausa no momento inicial. Variáveis 25(OH) D Adiponectina Resistina Adipsina PAI-1 25(OH)D 1.0 0.048 -0.004 -0.003 0.056 Idade -0.038 0.025 0.002 -0.098 -0.119 TM -0.005 0.009 -0.081 -0.075 -0.087 IMC -0.178* -0.026 -0.016 -0.050 -0.051 CC -0.213* -0.063 0.073 -0.068 0.041 Glicose 0.043 -0.037 0.099 -0.182* 0.132 Insulina 0.058 -0.055 0.162* -0.069 0.084 HOMA 0.053 0.060 0.165* -0.007 0.107 25(OH)D, 25-hidroxivitamina D; TM, tempo de menopausa; IMC, índice de massa corpórea; CC, circunferência da cintura; PAI-1, Inibidor do ativador do plasminogênio Tipo 1. Coeficiente de Correlação de Pearson (r). * p < 0.05. 59 Tabela 3. Comparação das concentrações de 25(OH)D, das medidas antropométricas e do perfil glicídico entre as mulheres na pós-menopausa submetidas à suplementação de vitamina D (n=80) ou ao placebo (n=80) nos momentos basal e após 10 meses de intervenção. Indicador/Grupo Basal 10 meses Variação (%) *Valor de p 25(OH)D (ng/mL) Placebo 16.9 (6.7) a 13.8 (5.9) a -3.2 (-18.5%) 0.049 Vitamina D 15.0 (7.5) a 27.5 (10.4) b 12.5 (45.4%) <0.001 IMC (kg/m2) Placebo 29.9 (4.7) a 30.2 (4.6) a 0.21 (0.7%) 0.993 Vitamina D 29.2 (5.3) a 29.6 (5.6) a 0.36 (1.2%) 0.968 CC (cm) Placebo 93.9 (10.5) a 94.5 (10.7) a 0.57 (0.6%) 0.989 Vitamina D 93.4 (12.3) a 94.5 (13.4) a 1.05 (1.1%) 0.942 Glicose (mg/dL) Placebo 93.5 (10.9) a 99.6 (15.6) a 6.1 (6.2%) 0.009 Vitamina D 92.5 (10.6) a 92.0 (8.5) b 0.5 (0.5%) 0.994 Insulina (µUI/mL) Placebo 10.1 (5.8) a 10.6 (6.7) a 0.6 (4.7%) 0.344 Vitamina D 11.7 (8.1) a 10.1 (7.6) a -1.6 (-13.7%) 0.008 HOMA-IR Placebo 2.4 (1.5) a 2.7 (1.5) a 0.3 (11.1%) 0.054 60 Vitamina D 2.8 (2.1) a 2.3 (1.6) a -0.5 (-17.9%) 0.007 Valores médios (desvio padrão). IMC, índice de massa corporal; CC, circunferência da cintura. Variação Absoluta: valores finais subtraídos dos valores basais. *p-valor mostra a diferença significante entre momentos (p < 0.05) e (a,b) mostram diferenças significante entre grupos e (a,a) sem diferença (p>0,05) (ANOVA no desenho de medidas repetidas seguido pelo teste de Tukey ajustado) 61 Tabela 4. Comparação do perfil de adipocinas entre as mulheres na pós-menopausa submetidas à suplementação de vitamina D (n=80) ou associada ao Placebo (n=80) nos momentos basal e após 10 meses de intervenção. Indicador/Grupo Basal 10 meses Variação (%) *Valor de p Adiponectina (ng/mL) Placebo 13.2 (7.9)a 11.5 (5.5)a -1.7 (-12.8%) 0.142 Vitamina D 15.6 (13.3)a 18.5 (21.8)b 2.9 (18.6%) 0.002 Resistina (ng/ml) Placebo 17.6 (2.7)a 16.5 (3.5)a -1.1 (-6.2%) 0.520 Vitamina D 17.3 (2.6)a 11.7 (3.3)b -5,6 (-32.4%) <.0001 Adipsina (ng/ml) Placebo 23.4 (18.1)a 25.1 (11.6)a 1.7 (7.3%) 0.087 Vitamina D 18.3 (5.8)a 19.2 (14.8)a 0.9 (4.9%) 0.138 PAI-1 (ng/ml) Placebo 9.0 (3.0)a 6.7 (3.1)a -2.3 (-25.5%) <.0001 Vitamina D 8.9 (2.8)a 5.4 (2.8)a -3.5 (-39.3%) <.0001 Valores médios (desvio padrão). PAI-1, Inibidor do ativador do plasminogênio Tipo 1. Variação Absoluta: valores finais subtraídos dos valores basais. *p-valor mostra a diferença significante entre momentos (p < 0.05) e (a,b) mostram diferenças significante entre grupos e (a,a) sem diferença (p>0,05) (Medidas repetidas por meio da distribuição Gama seguido do teste de comparação múltipla de Wald). 62 Discussão No presente estudo, a suplementação isolada de VD por 9 meses resultou no aumento dos valores séricos de adiponectina e redução dos valores de resistina quando comparado ao placebo. Não foram observadas diferenças entre os grupos em relação à adipsina e ao PAI-1. As adipocinas liberadas pelo tecido adiposo apresentam diferentes funções, como regulação de apetite e balanço energético, sensibilidade à insulina, angiogênese, inflamação e metabolismo de lipídeos22,24,45. Entre as adipocinas temos a adiponectina que influencia a sensibilização insulínica e tem propriedades anti- inflamatórias46-48. E a resistina que interfere no desenvolvimento à resistência insulínica e tem atividade pró-inflamatória49. Assim, os resultados obtidos neste estudo sugerem que em mulheres na pós-menopausa com deficiência de VD, a suplementação de VD pode ter efeito benéfico sobre o perfil de adipocinas. A descoberta que a suplementação de VD aumenta as concentrações de adiponectina é apoiada por várias linhas de evidência. A adiponectina regula a gordura hepática pelo seu efeito na sensibilização a insulina, além de possuir ação anti- inflamatória reduzindo os níveis séricos de interleucina-6 (IL-6) e fator de necrose tumoral alfa (TNF-α)47, 50. Valores reduzidos de adiponectina foram associados com a presença de resistência à insulina, diabetes, dislipidemia e obesidade 33,46,51,52. Um dos mecanismos propostos para ação da adiponectina na melhora da resistência à insulina é a diminuição de ácidos graxos livres (AGL) por meio do aumento da oxidação no músculo esquelético51,48. Por outro lado, o tecido adiposo e os músculos são os principais locais de armazenamento da VD50. O tecido adiposo funciona como um sistema de armazenamento de VD que previne a síntese descontrolada de 25(OH)D no fígado. Aproximadamente 20% da dose de VD administrada por via oral é armazenada em tecido 63 adiposo e o resto é consumido ou metabolizado53. Os mecanismos que controlam a deposição e a liberação de VD a partir do tecido adiposo ainda são desconhecidos17,54,55. Demonstrando interação entre VD e adiponectina, estudos observacionais encontraram que valores baixos de 25(OH)D e de adiponectina estão ambos associados à obesidade23,56-58. Recente estudo, avaliando a relação entre adipocinas, VD e adiposidade visceral em 318 mulheres na pós-menopausa observaram associação positiva entre valores séricos 25(OH)D com adiponectina. A análise de regressão linear múltipla indicou que VD e HOMA são fatores independentes que afetam significativamente os níveis adiponectina23. A VD pode afetar a adiponectina através do sistema renina- angiotensina37. A atividade do sistema renina-angiotensina do tecido adiposo aumenta com a adiposidade, e pode representar mecanismo potencial para redução da adiponectina relativa observada na obesidade. A relação positiva entre as concentrações de 25(OH)D e adiponecitna circulantes pode ser mediada pela regulação negativa do sistema renina-angiotensina do tecido adiposo pela VD, com diminuição na produção de angiotensina e aumento na produção de adiponectina56. Entre as mulheres na pós menopausa avaliadas nesta pesquisa foi observada elevação dos valores de adiponectina e redução da resistina apenas no grupo suplementado com VD. Em concordância aos nossos resultados, alguns estudos avaliaram o efeito da suplementação de VD sobre a adiponectina e resistina em mulheres na menacme36-37. Seyyed et al. avaliaram 44 mulheres com síndrome dos ovários policísticos (idade entre 20-38 anos) e com deficiência de VD, randomizadas para 50.000 UI de VD oral/semana ou placebo. Após oito semanas de intervenção, no grupo VD houve diminuição significativa da glicose, melhora da resistência da insulina pelo HOMA e aumento significativo da adiponectina e dos valores séricos de VD em comparação ao 64 grupo placebo37. Greco et al. acompanharam 31 mulheres na menacme (média de 33.7±8.0 anos), não obesas, com deficiência de VD e que foram suplementadas com VD (1.500-2000UI/dia) por 3 meses. Os autores observaram melhora significativa do perfil de adipocinas séricas, com aumento na adiponectina (+50,6%) e diminuição na resistina (- 24,3%)36. Por outro lado, Duggan et al. avaliaram 208 mulheres na pós menopausa, com sobrepeso e hipovitaminose D que foram randomizadas a intervenção de perda de peso com ou sem suplementação de VD (2.000 UI/dia). Foram avaliadas adipocinas e biomarcadores inflamatórios. Aos 12 meses não houve efeitos da intervenção sobre adiponectina ou leptina. A suplementação de VD em combinação com perda de peso de pelo menos 5% do peso inicial foi associada a reduções significativas apenas nos níveis de IL6 38. Em nosso estudo foi observada correlação positiva entre os valores de resistina com a insulina (r= 0.16) e com o HOMA (r= 0.16). A resistina é secretada pelos adipócitos e regula o metabolismo da glicose. Altos níveis de resistina induzem a resistência à insulina e exercem efeitos pró-inflamatórios59. É considerada marcador de inflamação, uma vez que pode induzir a expressão do TNF-α, da IL-6 e IL-1259-61. Recente estudo observacional investigou a associação entre níveis séricos de VD e de resistina em 161 mulheres na pós-menopausa, idade entre 50-70 anos. Houve uma correlação negativa significativa entre a resistina sérica e a VD em mulheres na pós-menopausa com osteoporose. A VD sérica foi considerada um preditor independente dos níveis séricos de resistina62. A suplementação de VD repercutindo com o aumento da adiponectina e redução da resistina em nossa população, possivelmente influenciou o efeito positivo sobre a resistência à insulina, que foi observado pela redução significativa dos valores séricos de 65 insulina (-13,7%) e do HOMA-IR (-17,9%). Não foram observadas alterações significativas nas medidas antropométricas entre grupos, com as pacientes classificadas, em média, como sobrepeso e com deposição central de gordura. Resultados esses corroborados por estudos prévios, de corte transversal57,63. Em estudo avaliando 925 mulheres na pós- menopausa, com diagnóstico de diabetes tipo II, participantes do Nurses’ Health Study, os autores observaram que valores elevados de adiponectina foram associados com melhor controle glicêmico, perfil lipídico mais favorável e redução do processo inflamatório63. Em 2021, uma revisão sistemática e metanálise avaliou o efeito da suplementação de VD na concentração sérica de adiponectina, sendo incluídos nove estudos, com diferentes perfis de pacientes, de ambos os sexos, e com tipos e doses de VD variáveis. Os resultados indicaram que a VD pode ser considerada um secretagogo (que promove ou estimula a secreção) de adiponectina entre os pacientes com diabetes e esse efeito pode ser potencializado se a ingestão de VD for diária64. No presente estudo, apesar de uma redução significativa em ambos os grupos nos valores séricos de PAI-1, não houve diferenças entre momentos e entre grupos em relação a suplementação de VD ou placebo. O PAI-1 é um importante regulador do sistema fibrinolítico, embora as fontes mais importantes sejam os hepatócitos e as células endoteliais, os adipócitos contribuem para os níveis circulantes de PAI-1, podendo ser o elo causal entre obesidade abdominal e DCV65,66. Níveis elevados de PAI-1 induzem resistência à insulina e anormalidades metabólicas durante processos pró-inflamatórios envolvendo várias citocinas e quimiocinas67. Estudos relataram correlação de PAI-1 com fatores de risco da DCV como obesidade, diabetes e síndrome metabólica 67-69. Pesquisa experimental observou que 1,25(OH)2D3 faz downregulation no PAI-1 ao bloquear a ativação de NF-kB. A inibição da produção de PAI-1 pode contribuir para os 66 efeitos cardioprotetores da VD70. Associação entre valores reduzidos de 25(OH)D e aumento de PAI-1 foi demonstrada em coorte prospectiva norte-americana do Multi- Ethnic Study of Atherosclerosis71. Estudo clínico incluindo 35 adultos com insuficiência em VD que receberam suplementação de 2000 UI/dia por 12 semanas não encontrou alterações significativas em relação ao PAI-172. Por outro lado, ensaio clínico randomizado, avaliando 50 mulheres, média de idade de 41 anos, com deficiência de VD, demonstrou que, após 8 semanas de dose única de 100.000UI de VD ou placebo, níveis de PAI-1 reduziram significativamente apenas no grupo suplementado35. Nesta pesquisa não foram observadas diferenças entre os grupos em relação à adipsina e a suplementação de VD. Contudo, foi demonstrada correlação negativa entre valores séricos de adipsina e a glicose (r=-0.18). A adipsina é produzida por adipócitos diferenciados predominantemente na gordura visceral73, e está envolvida na manutenção da homeostase do tecido adiposo e no aumento da secreção de insulina em resposta à glicose74. Estudo in vitro observou que adipsina teria um papel benéfico na manutenção da função das células β e identificou C3a, um peptídeo produzido pela adipsina, como potente secretor de insulina. Esses achados indicam que a via da adipsina/C3a conecta a função do adipócito à fisiologia da célula β75. Além disso, a adipsina pode ser importante para melhorar a hiperglicemia, preservando e melhorando a sobrevivência das células β74. Em concordância com nossos resultados, recente ensaio clínico examinou o efeito da suplementação de VD sobre as concentrações de adipocinas em 65 adultos, sobrepeso ou obesos, com deficiência de VD, randomizados para VD (100.000 UI dose única, seguido por 4.000 UI/dia) ou placebo, por 16 semanas. Em análise não ajustada não houve diferenças entre os grupos nos valores de adiponectina, resistina ou adipsina. Após ajustes para idade, sexo e porcentagem de gordura corporal, houve aumento na 67 adiponectina (OR 13.7, IC 95% 2.0-255, p = 0,02) no grupo da VD em comparação ao placebo. Os autores concluem que são necessários mais estudos para esclarecer as implicações clínicas e as interações moleculares entre a VD e as adipocinas32. Os pontos fortes do presente estudo incluem seu desenho prospectivo, duplo- cego e placebo-controlado e um conjunto de adipocinas que foram avaliadas em mulheres na pós-menopausa e sem comorbidades. Consequentemente, nossos resultados podem ser mais relevantes para a população de mulheres na pós-menopausa residentes na comunidade do que os estudos focados em pessoas com doenças específicas. A duração da intervenção e a dose administrada foram suficientes para provocar aumentos mensuráveis nos valores séricos de 25(OH)D. Este estudo também apresentou altas taxas de adesão (92% das participantes), sem diferenças entre os grupos de intervenção (VD ou placebo). E entre as limitações deste estudo, relaciona-se a representatividade da amostra. Por tratar de um grupo de mulheres na pós-menopausa atendidas em serviço público de saúde, entende-se que estão em contato periódico com profissionais médicos e em cuidado permanente com a saúde em geral. E por tratar-se de uma população de estudo relativamente homogênea, nossos resultados não podem ser generalizados para outros grupos raciais/étnicos. Em conclusão, a suplementação diária e isolada de 1.000 UI de vitamina D3 por 9 meses associou-se com aumento nos valores de adiponectina e redução da resistina quando comparada ao placebo em mulheres na pós-menopausa com deficiência de VD. Esses resultados sugerem que o tratamento da deficiência de VD pode ser benéfico para regular as concentrações circulantes de adipocinas. Contudo, mais estudos são necessários para esclarecer as interações moleculares entre a VD e as adipocinas e a implicações clínicas dessas interações no contexto da menopausa. 68 Referências 1. Roth DE, Abrams SA, Aloia J, Bergeron G, Bourassa MW, Brown KH, Calvo MS, Cashman KD, Combs G, De-Regil LM, Jefferds ME, Jones KS, Kapner H, Martineau AR, Neufeld LM, Schleicher RL, Thacher TD, Whiting SJ. 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