UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA PRESIDENTE PRUDENTE GEOGRAFIA ANA CAROLINA TARGINO THEODORO E SILVA; RODRIGO JOSÉ DE ALMEIDA ANÁLISE SEDIMENTOLÓGICA NOS RIO AGUAPEÍ (UGRHI 20) E RIO DO PEIXE (UGRHI 21) NO OESTE PAULISTA E INTERVENÇÃO EDUCATIVA AMBIENTAL ATRAVÉS DE CARTILHA DIDÁTICA Monografia submetida ao Conselho do Curso de Geografia, da Faculdade de Ciências e Tecnologia, Câmpus de Presidente Prudente, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, visando à obtenção do título de Bacharel em Geografia. Orientador: Prof. Dr. Paulo César Rocha PRESIDENTE PRUDENTE - SP 2024 DEDICATÓRIA Aqueles que cuidaram e nos apoiaram em nossa trajetória pela graduação. AGRADECIMENTOS A conclusão deste trabalho de conclusão de curso é fruto de uma jornada repleta de aprendizado, desafios e superação. Gostaríamos de expressar nossa profunda gratidão a todos que, de alguma forma, contribuíram para que este momento fosse possível. Agradecemos primeiramente aqueles que estiveram sempre presente em nossa jornada, nossos ancestrais, pela força, orientação, conselhos e resiliência que fizeram ser possível seguir em frente mesmo diante das dificuldades. Às nossas famílias, por serem nosso alicerce, oferecendo apoio, paciência e encorajamento durante toda essa caminhada. Eu Ana Carolina preciso destacar a importância da minha mãe Adriana Targino Carrazedo e meus irmãos, por sempre serem aqueles que me alegraram mesmo de longe, por me darem suporte e forças, o amor de vocês é sentido mesmo a quilômetros de distância, então deixo meu agradecimento, eu amo e preservo toda nossa conexão. Ao Prof. Dr. Paulo César Rocha, pela sabedoria compartilhada e pela orientação que nos ajudou a aprimorar este trabalho. Suas contribuições somadas aos conselhos e acolhimentos que recebemos do corpo docente e principalmente das professoras da universidade que sempre nos inspiraram e foram essenciais para o nosso desenvolvimento acadêmico e pessoal. Aos nossos colegas de curso, por serem parceiros nessa jornada, compartilhando ideias, desafios, conquistas, assim como também presença em todas as festas, rolês, comemorações e momentos únicos que passamos juntos. O companheirismo de vocês tornou essa trajetória mais leve e inspiradora. Levaremos conosco essas lembranças dessa etapa que se encerra. Somos gratos a todos os espaços de aprendizagem que fizeram parte da nossa trajetória e contribuíram para o nosso amadurecimento científico e acadêmico, com destaque para o LABGEO, CEETAS e LAG. Não poderíamos deixar de agradecer à Universidade Estadual Paulista. Não somente pelo acolhimento, pois fomos estudantes de permanência estudantil; mas por ter nos fornecido as condições materiais necessárias para chegarmos até aqui e para nos dar suporte aos nossos próximos passos. Pois sabemos que “Você pode passar pela universidade pública, ou você pode vivenciá-la!” Unespianos com muito orgulho! EPÍGRAFE All I need in this life of sin is me and my girlfriend Down to ride till the happy end is me and my girlfriend Where would you be be without me ? We'll never find out What would I do do without you ? We'll never know now Talking bout the lights, the dirt, the ****, that hurts We're not gonna turn around We're doing this for good, for worse The gift, the curse we're not gonna back down! (Icona Pop) RESUMO Este estudo tem como objetivos gerais analisar a sedimentologia em conjunto de dados hidrológicos numa série temporal dos rios Aguapeí e Peixe localizados no Oeste Paulista e elaboração de cartilha pedagógica aplicada. Para o estudo foram utilizados os dados de sólidos suspensos totais das estações de medição da CETESB, onde os pontos localizados para dados de sedimentos são Junqueirópolis (AGUA02800) para o Rio Aguapeí e Dracena (PEIX02800) para o Rio do Peixe. Já para o estudo hidrológico, foram utilizados os dados de vazão dos rios a partir das estações fluviométricas do SigRH-SP, sendo elas de Luiziânia (7C-002) para o Rio Aguapeí, e da base de dados da ANA para o ponto do Rio do peixe, sendo os dados de hidrologia retirados da estação Quatá (63710000). Para a análise sedimentológica, foram feitas tabelas no software Excel, onde a relação de sedimentos e vazão foram postas a fim de compreender melhor o comportamento temporal da disposição dos sedimentos. Os resultados apontaram que há picos isolados em alguns anos nos valores de sedimentos e vazão, assim como há um “atraso” na resposta sedimentológica do rio aos valores de vazão. Em conjunto a esse estudo, foi realizada uma abordagem de educação ambiental visando uma conscientização que possam vir a ter contato com os locais estudados, fazendo assim um projeto de cartilha para auxiliar nesses objetivos. Na elaboração do documento, foram empregadas ferramentas de edição de design, somados à dados de uso e ocupação do solo pela plataforma MapBiomas. Tendo como produto um documento didático que promove algumas reflexões a respeito da dinâmica hídrica dos rios e o seu bem estar, ao passo em que traz algumas curiosidades interessantes dos rios do Pontal do Paranapanema. Palavras-chave: Bacia Hidrográfica; Dinâmica Fluvial; Educação Ambiental; Rio Aguapeí; Rio do Peixe; Sedimentologia. ABSTRACT This study has as general objectives to analyze the sedimentology set of hydrological data in a time series of the rivers Aguapeí and Peixe located in West Paulista and development of applied pedagogical booklet. For the study, data of total suspended solids from CETESB measuring stations were used, where the points located for sediment data are Junqueirópolis (AGUA02800) for the Rio Aguapeí and Dracena (PEIX02800) for the Rio do Peixe. For the hydrological study, we used river flow data from the SigRH-SP fluviometric stations, being them of Luiziânia (7C-002) to the Rio Aguapeí, and the database of ANA to the point of the fish river, being the hydrology data taken from Quatá station (63710000). For sedimentological analysis, tables were made in the Excel software, where the relationship of sediment and flow rate were put in order to better understand the temporal behavior of the arrangement of the sediments. The results showed that there are isolated peaks in some years in the sediment and flow values, as well as a "delay" in the sedimentological response of the river to the flow values. In conjunction with this study, an environmental education approach was carried out aiming at raising awareness that may come to have contact with the studied places, thus making a booklet project to help these objectives. In the elaboration of the document, design editing tools were used, added to the data of land use and occupation by the MapBiomas platform. Having as a product a didactic document that promotes some reflections about the water dynamics of rivers and their well being, while bringing some interesting curiosities of the rivers of Pontal do Paranapanema. Keywords: River basin; Fluvial dynamics; Environmental education; Aguapeí River; Fish River; Sedimentology. LISTA DE FIGURAS Figura 1 – Mapa da UGRHI 20 destacando o Parque do Aguapeí. ....................................... 14 Figura 2 – Mapa da UGRHI 21 destacando o Parque do Rio do Peixe. .................................. 15 Figura 3 – Componentes de uma bacia hidrográfica............................................................... 20 Figura 4 – Transporte de carga em função do tamanho do material e velocidade do fluxo. .. 22 Figura 5 – Diagrama de Hjulström ........................................................................................ 24 Figura 6 – Esquematização do propósito de uma Educação Ambiental. ................................ 26 Figura 7 – Rio aos arredores do parque Aguapeí. ................................................................... 27 Figura 8 – Instalações do parque Aguapeí. ............................................................................. 28 Figura 9 – Mapa geológico das bacias dos Rios Peixe e Aguapeí. .......................................... 40 Figura 10 – Localização das áreas que compõem o “Pantaninho Paulista”............................ 41 Figura 11 – Área total do Parque Estadual do Aguapeí e uso da terra ................................... 42 Figura 12 – Área total do Parque Estadual do Rio do Peixe e uso da terra ............................ 43 Figura 13 – Uso e ocupação do solo na área do Parque Estadual do Rio Aguapeí ................ 44 Figura 14 – Uso e ocupação do solo na área do Parque Estadual do Rio do Peixe ................ 45 Figura 15 – Estado de São Paulo em 1904. ............................................................................ 47 Figura 16 – Avanço das empreitadas mineiras no século XX. ............................................... 48 Figura 17 – A expansão urbana da estrada de Ferro Sorocabana ........................................... 50 Figura 18 – Mapa da estação de Luiziânia (7C-002) para vazão. ........................................... 57 Figura 19 – Mapa da estação de quatá para vazão (63710000) .............................................. 57 Figura 20 – Mapa da estação de Junqueirópolis para sedimentos (AGUA02800) .................. 59 Figura 21 – Mapa da estação de dracena para sedimentos (PEIX02800). .............................. 59 Figura 22 – Gráfico de Regressão Linear. .............................................................................. 60 Figura 23 – Gráfico da média de sedimentos por ano na estação AGUA02800. ................... 65 Figura 24 – Gráfico da média de sedimentos por ano na estação PEIX02800. ...................... 66 Figura 25 – Padrões de Drenagem, apresentação esquemática dos padrões de drenagem mais comuns ..................................................................................................................................... 67 Figura 26 – Variabilidade mensal em série histórica da pluviosidade em Presidente Prudente- SP .............................................................................................................................. 68 Figura 27 – Mapa de Fragilidade Ambiental do Pontal do Paranapanema. ............................ 69 LISTA DE QUADROS Quadro 1 – Problemas decorrentes do transporte e deposição de sedimentos. ...................... 25 Quadro 2 – Conteúdos da BNCC presentes na cartilha… ...................................................... 70 SUMÁRIO INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA .................................................................................. 13 OBJETIVOS ............................................................................................................................ 17 Objetivos específicos. .............................................................................................................. 17 1. REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................................................ 19 1.1. Dinâmica fluvial................................................................................................................ 19 1.2. Educação Ambiental ......................................................................................................... 28 1.2.1. Histórico da Educação Ambiental. ................................................................................. 28 1.2.2. A evolução da educação ambiental no Brasil. ............................................................... 34 1.2.3. A educação ambiental no contexto dos parques estaduais. ............................................ 35 2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO ............................................................. 39 2.1. Meio físico-biótico. ............................................................................................................ 39 2.2. Histórico dos usos e usos atuais. ........................................................................................ 42 2.3. A formação do Pontal do Paranapanema. ......................................................................... 46 2.3.1. A chegada do café .......................................................................................................... 49 2.3.2. A chegada da Cana e Evolução das Áreas de Canaviais. ............................................... 51 2.3.3. As áreas das bacias hidrográficas do Rio do Aguapeí e Peixe ...................................... 54 3. MATERIAIS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ........................................ 55 3.1. Análise hidrológica e sedimentológica ............................................................................. 56 3.2. Análise de Conteúdos pedagógicos e Elaboração da cartilha. .......................................... 61 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO ........................................................................................63 4.1. DINÂMICA HIDROSSEDIMENTOLÓGICA NOS RIOS AGUAPEÍ E PEIXE E PROPOSTA DE INTERVENÇÃO EDUCACIONAL. ........................................................... 64 4.2. Dinâmica hidrossedimentológica nos rios Aguapeí e Peixe ............................................. 64 4.3. Proposta de intervenção educacional. ............................................................................... 70 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................ 73 BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................... 75 ANEXO I – Tabela de correções para dados nulos na estação de Luiziânia .......................... 83 ANEXO II – Cartilha educacional. .......................................................................................... 84 13 INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA As Bacias Hidrográficas são uma unidade física bem definida, revelando-se um importante meio de estudo no âmbito hidrológico, seu início é marcado pela precipitação e o fim no escoamento. Através do escoamento (descarga), pode-se observar padrões ao longo de séries históricas, o que só se torna possível a partir da média anual máxima e mínima da área de estudo (ROCHA e SANTOS, 2018, p.2). A dinâmica do escoamento, no que se refere à perspectiva geomorfológica, ganha significância na atuação exercida pela água sobre os sedimentos do leito fluvial, no transporte dos sedimentos, nos mecanismos deposicionais e na esculturação da topografia do leito (CHRISTOFOLETTI, 1981). Portanto, ao obtermos essa unidade como área de estudo, é importante salientar como os sedimentos fazem parte dessa dinâmica, tendo papel fundamental em toda formação e auxiliando no momento de analisar padrões ou alterações dentro dessas bacias hidrográficas que são compostas pelos canais fluviais, visto que seu transporte é regido pelo escoamento e a força necessária para deslocar tais partículas (ROCHA, 2016) É de suma importância utilizar e compreender as bacias hidrográficas para estudos como no âmbito de gestão de recursos naturais, planejamento e ambiental, com esse intuito, de acordo com a Lei Estadual n.º 9.034 de 27 de dezembro de 1994, se fez necessário uma classificação não apenas das regiões hidrográficas nacionais, mas também dividir o estado de São Paulo em vinte e duas Unidades Hidrográficas de Gerenciamento de Recursos Hídricos (UGRHIs). Para auxiliar na manutenção dos corpos hídricos que englobam as bacias hidrográficas, há postos de coleta que no estado de São Paulo são adquiridos pela CETESB (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), onde através dos dados de sedimentos é possível relacionar com dados de vazão, visto que os sedimentos em suspensão aumentam muito de acordo com o aumento de vazão (GRISON e KOBIYAMA, 2011, p. 30). Com esses dados numa determinada escala histórica, podemos correlacionar dados de sedimentos com dados de vazão, em que através de gráficos produzidos por softwares se torna visível a relação das variáveis. Com a intenção de analisar a relação sedimentológica na região do Oeste Paulista, temos as bacias hidrográficas Aguapeí e Peixe Mapa 1 e 2, que através dos seus canais fluviais possuem importantes aspectos socioambientais, como para abastecimento de água 14 potável em alguns pontos à montante, e preservação de habitats como temos na Unidade de Conservação criada (PEA) sendo elas o Parque do Aguapeí na UGRHI 20, e o Parque do Rio do Peixe na UGRHI 21, que possuem um papel importantíssimo em questão de conservação e preservação nas áreas. Portanto, ao observar esse cenário e a importância dos rios, o atual estudo se mostra ainda mais relevante, visto que possíveis alterações nas características dos rios podem significar sinais para que seja possível realizar uma análise ambiental em busca de possíveis cuidados em locais afetados no seu entorno. Figura 1: Mapa da UGRHI 20 destacando o Parque do Aguapeí. Fonte: Autores. 15 Figura 2: Mapa da UGRHI 21 destacando o Parque do Rio do Peixe. Fonte: Autores. Por fim, convém salientar que a presente proposta tem como um de seus produtos finais um esboço de material didático em forma de cartilha que contemplem os parques com as bacias analisadas; que poderá ser empregada como instrumento de educação ambiental no sentido de promover a conscientização da utilização de recursos hídricos e a conservação dos mesmos no contexto do Parque Estadual do Aguapeí. A instituição foi escolhida devido a longevidade de sua implementação, pois o parque foi criado em 1998; seu histórico de atuação como agente promotor de iniciativas de educação ambiental, onde são desenvolvidas atividades e ações que visem integrar comunidade com a natureza local; e pela proximidade com a universidade e a pesquisa, pois a instituição possui vínculos de pesquisas com universidades próximas, como a Unesp, onde são desenvolvidos diversos projetos. A aproximação com as instituições de ensino superior permitiu a realização de trabalhos de campo que corroboraram para fundar o alicerce de ideias contidas nesse projeto. A iniciativa de educação ambiental, possibilita a formulação de estratégias de abordagens educacionais para o público do ensino médio e público geral que visitará a área do parque, onde o material poderá ser disponibilizado. 16 A instrumentalização de produtos cartográficos com dados visuais como gráficos e mapas dispostos e elaborados de maneira didática como em formato de cartilha, podem ser utilizados como instrumentos educacionais no sentido de possibilitar um material educativo, em que busca-se contribuir para a construção de valores sociais, conhecimentos, habilidades, atitudes e competências voltadas para a conservação do meio ambiente com enfoque na proteção manutenção e no bom de uso de corpos hídricos de planície; como previsto na Política Nacional de Educação Ambiental (PNEA Lei 9.795/99). Com o objetivo de cumprir com a sensibilização por parte da comunidade e de proporcionar reflexões a respeito das dinâmicas hidrológicas e sua importância como recurso natural para o funcionamento da sociedade. Portanto, com essa abordagem ligada ao estudo sedimentológico, é capaz de proporcionar reflexões em como a área tem sido utilizada ou se atentar em determinados tópicos que podem estar prejudicando o meio, logo através da cartilha se torna possível uma conscientização, reverberando em um ensino que futuramente tem a capacidade de ter uma relação melhor com o meio. 17 OBJETIVO GERAL Estudar a sedimentologia em conjunto com dados hidrológicos ao longo de uma série temporal dos rios Aguapeí e Peixe, situados no Oeste Paulista. Com base nesse contexto, propor a elaboração de um projeto de cartilha voltado à conscientização e educação ambiental, que poderá ser utilizado no Parque do Aguapeí, por ser um parque que possui estrutura para visitação, contribuindo para destacar a relevância do Estudo Ambiental. Objetivos Específicos - Analisar o regime hidrológico através de dados de vazão da UGHRI 20 e 21; - Estimar e avaliar a carga suspensa dos rios Aguapeí e Peixe; - Identificar as correlações entre a carga sedimentar e as vazões dos rios, a fim de traçar possíveis alterações ao entorno. - Possibilitar possíveis abordagens educativas para turmas de ensino médio e público geral visitante do Parque Estadual do Aguapeí. - Elaborar material educativo em forma de cartilha no sentido de promover a educação ambiental sobre as dinâmicas dos rios estudados. 18 19 1. REFERENCIAL TEÓRICO 1.1 Dinâmica Fluvial Para possibilitar uma análise mais detalhada nos estudos geográficos, é fundamental definir um recorte espacial. Nesse sentido, no atual estudo a bacia hidrográfica, ou bacia de drenagem, foi escolhida como recorte. Ela é caracterizada como uma área da superfície terrestre composta por um rio principal e seus afluentes, onde a drenagem da água converge para um único ponto de saída, denominado exutório (BIGARELLA & SUGUIO, 1979). De acordo com (MANOEL & ROCHA, 2017) a bacia hidrográfica apresenta um papel importante na topografia, cobertura vegetal, litologia, tipo de solo e também em toda a estrutura das rochas nesta bacia. Logo podemos compreender também que a bacia hidrográfica possui elementos que mantêm uma relação entre o biológico, físico e socioeconômico, o que expande ainda mais a sua importância para estudos do meio (Rocha, 2011) Sua formação deve partir do ponto inicial que se faz pelo rio principal, cujas águas seguem um percurso até atingirem seu ponto mais baixo que é conhecido como exutório (BERNARDI et al, 2013, apud BRAGA et al., 2005; AZEVEDO; BARBOSA, 2011), esses escoamentos concentrados são nomeados como vazão, onde seu volume depende do regime hidrológico da bacia que os canais fazem parte (Novo, 2008). Como definição de afluentes compreende-se que são rios de menores proporções que deságuam no rio principal. A interação desses componentes resulta na rede de drenagem, no entanto, as características morfológicas assim como a estrutura de toda bacia, influenciam diretamente na forma que a mesma irá efetuar sua drenagem, como exemplo o fator declividade que influencia na velocidade de escoamento (MANOEL & ROCHA, 2017), ou também pelos sedimentos que envolvem a área. A formação dos escoamentos, essenciais para a estrutura dos cursos d'água, resulta do ciclo hidrológico. Segundo Bernardi et al. (2013, apud Tucci, 1993), o ciclo hidrológico consiste no movimento da água entre os continentes, oceanos e a atmosfera, com mudanças no estado físico da água, sendo a energia solar o motor desse sistema. O ciclo hidrológico é composto por processos como evaporação, precipitação, transpiração das plantas, percolação, infiltração e drenagem (Tundisi, 2003). Com o aquecimento do solo, ocorre a evapotranspiração, que gera o acúmulo de vapor e a formação de nuvens, resultando na precipitação. A água precipitada atinge a superfície terrestre e segue diferentes caminhos; a porção que chega ao canal é denominada escoamento fluvial. A quantidade de água que chega a esses corpos hídricos varia conforme o tipo de solo, 20 cobertura vegetal, tipo de rocha, entre outros fatores, além de ser influenciada pelo regime de chuvas, infiltração e drenagem (Christofoletti, 1981). Assim que a água sai do seu exutório, ela começa a fazer parte de outra bacia ou do oceano, logo as divisões das bacias se dão pelo seu ponto mais alto como mostrado na Figura 3. Figura 3: Componentes de uma bacia hidrográfica. Fonte: Bernardi et al (2013) Dentro das bacias há o que é chamado balanço hídrico, ele se dá de acordo com a entrada e saída de água, onde se obtemos um local com entrada maior que a saída, vamos ter corpos de água maiores, e se ocorrer de haver uma saída maior que a entrada, os corpos se tornam menores devido ao volume de água se tornar menor, com isso as bacias se tornam importantes meios de monitorar o quanto de água passa por determinados pontos, o quanto se tem para abastecimento, ou seja, manter maior controle dessas águas. (Bernardi et al, 2013) Por ser um sistema considerado aberto já que recebe energia das forças tectônicas e climática (SOUZA, 2013, p. 227 apud COELHO NETTO, 1998), a bacia de drenagem de acordo com (SOUZA, 2013) ao sofrer qualquer tipo de intervenção reverbera em uma desestabilização em seu sistema, assim sendo muito difícil analisar a bacia de forma isolada dos seus componentes assim como cita de acordo com (SOUZA, 2013, p. 227 apud MATTOS e PEREZ FILHO, 2014, p. 17). A bacia hidrográfica não pode ser entendida pelo estudo isolado de cada um dos seus componentes: sua estrutura, funcionamento e organização são decorrentes das inter-relações desses elementos, de modo que o todo resultante não é resultado da soma da estrutura, funcionamento e organização de suas partes. Analisar separadamente os processos que ocorrem nas vertentes e aqueles que acontecem nos canais fluviais não permite compreender como o sistema bacia hidrográfica funciona enquanto unidade organizada complexa. 21 Por haver diversas variáveis que compõem as bacias hidrográficas, é de suma importância que se compreenda seus sistemas internos a fim de entender toda sua estrutura como num geral. A circulação de matéria dentro das bacias é um dos processos que possibilita a modificação física de uma bacia, assim como uma resposta a intervenções que desequilibram o ecossistema estudado. Visando essa perspectiva, Christofoletti (1981), menciona a importância dos escoamentos fluviais para estudos na área sedimentológica onde a dinâmica do escoamento, na visão geomorfológica, destaca principalmente a ação da água sobre os sedimentos do leito fluvial, onde os rios são agentes geomorfológicos importantes que influenciam a erosão, deposição, transporte e por consequência a morfologia do leito. Obter essa visão integrada sobre o transporte de sedimentos se faz necessária a fim de entender a dinâmica envolvendo esse sistema. De acordo com (Zanandrea et al, 2020) “Uma das importantes matérias que têm sua transferência efetivada através do fluxo de água é o sedimento, o que comumente é chamado de conectividade de sedimentos”. Os sedimentos são formados por compostos inorgânicos e orgânicos, sendo os mesmos podendo advir de fontes internas ou externas dos rios. Os compostos orgânicos incluem detritos originados de materiais em decomposição, microrganismos, restos de macrófitas e outros organismos diversos (SOUZA, 2013). Já os materiais inorgânicos advém de processos erosivos, onde esse material é constituído através da força erosiva dos rios, assim removendo parte do material contido em suas vertentes e fundo do canal fluvial, porém, essa força erosiva pode receber influências externas, a deixando mais forte ou menos intensa dependo da vegetação do meio, topografia, das precipitações, portanto, o fluxo de transporte dos sedimentos, são como respostas ao estado de equilíbrio em um sistema fluvial (Christofoletti, 1981). Todo o processo de sedimentação possui passos, como o de remoção, transporte e deposição, assim tendo como consequência um fenômeno capaz de esculpir os canais e também toda a paisagem em seu entorno, assim, de acordo com (Christofoletti, 1981) o ambiente de sedimentação fluvial pode explicar ou ser fonte de interpretação da evolução histórica e paisagens numa escala de tempo geológica, o que acaba se tornando uma importante ferramenta para compreender a situação atual de determinados meios fluviais, pois, ao entender que a sedimentação sofre alterações de acordo com o tempo e mudanças no entorno, realizar essas interpretações e ligar com mudanças no ambiente seja natural ou advindo de intervenções antrópicas, há uma possibilidade de maior compreensão de casos e realizar possíveis intervenções. 22 Atividades humanas são capazes de aumentar ou diminuir os escoamentos, alterando todo o meio fluvial, assim para haver um controle de determinados cenários, se faz necessário estudo sobre os mecanismos variados assim como os de sedimentação fluvial, buscando melhorias, controle ou predizer futuras condições que tragam malefícios ao meio. O atual trabalho leva em consideração materiais sedimentares tanto orgânicos quanto inorgânicos, partindo desta premissa compreendemos que a seção do canal junto com a velocidade do fluxo de um rio, são responsáveis por determinar o tamanho do material que é movido pela área, esse fator é denominado competência do rio, já o volume da carga transportado se chama capacidade do rio (BIGARELLA & SUGUIO, 1979). Entendemos como carga, o material que percorre a área fluvial, sendo que ela pode se dar de duas formas, ou seja, em suspensão ou carga de fundo. De acordo com (Novo, 2008) a carga suspensa é formada geralmente por partículas orgânicas e inorgânicas, onde elas possuem tamanho reduzido como silte e argila, materiais como areia podem também ser suspensos, no entanto se faz necessário uma corrente intensa e por períodos curtos de tempo para que seja realizado tal ocorrido como demonstrado na Figura 4. Já a carga de fundo é formada por partículas maiores, sendo cascalho, fragmentos de rocha ou areia. Figura 4: Transporte de carga em função do tamanho do material e velocidade do fluxo. Fonte: Leli, Stevaux e Nobrega (2010). 23 Apesar de haver essa separação entre carga suspensa e de fundo, o transporte em suspensão abrange não apenas os materiais suspensos, mas também aqueles que são transportados ao longo do leito, seja por arraste, saltos ou deslizamentos (SOUZA, 2013), logo os materiais da carga de fundo de acordo com a velocidade do rio podem também estar ora em suspensão ora de transportando por saltos ou rolando, por exemplo, não podendo assim dissociar as cargas. O transporte de sedimentos é dependente do tamanho, forma, peso da partícula assim como da força efetuada pela ação dos escoamentos (Carvalho, 2008), nesse âmbito para (Christofoletti, 1981) há duas noções importantes para a compreensão do transporte aluvial, sendo elas competência e capacidade. A competência se trata do tamanho que uma partícula consegue ser movimentada pelo fluxo fluvial, levando como base aquela de maior diâmetro que é transportada. A capacidade corresponde ao máximo de carga que consegue ser transportada em unidade de tempo, logo se trata do limite que um rio pode movimentar de determinados sedimentos de acordo com uma classe granulométrica. A capacidade de transporte de um rio depende da sua velocidade, como também do tamanho das partículas. Essas relações entre granulometria, velocidade da corrente e capacidade de transporte, acordo com (Novo, 2008, p.224 apud Hugget, 2003) foram determinadas por Hjulström, cujo o autor construiu um diagrama denominado diagrama de Hjulström, em que se determina a faixa velocidade que um rio perde a capacidade de transporte de carga, ou seja, quando ele começa um processo de deposição das partículas nos leitos do rio, onde essa velocidade depende não apenas da granulometria da carga, mas também da forma e densidade do material, por esse motivo os rios necessitam de maiores velocidades para erodir argila do que areia, mesmo a argila obtendo uma granulometria menor, conforme mostra a Figura 5. No caso de sedimentos em suspensão eles são transportados por conta da velocidade da corrente e também recebem influência do seu peso, podendo mudar sua quantidade por vários motivos, como por exemplo uso da terra ou ocorrência de chuvas no local (SOUZA, 2013). 24 Figura 5: Diagrama de Hjulström Fonte: Novo, 2008, p.224 apud Hugget (2003). 25 Por conta da sua relação com os recursos hídricos, climáticos e também pedológicos, os estudos hidrossedimentológicos apresentam uma importância na compreensão de vários âmbitos no ambiente fluvial, como exemplo econômicos, ambientais e sociais. Através de estudos dos sedimentos é possível notar padrões e por consequência mudanças no meio que podem ser reflexos de mudanças climáticas, uso da terra e outras variáveis. O Quadro 1 sistematiza alguns problemas que podem ser acarretados devido ao transporte e deposição do rio, de acordo com (Souza, 2013 apud Carvalho, 2008). Quadro 1: Problemas decorrentes do transporte e deposição de sedimentos. Problemas ambientais Problemas sociais Problemas econômicos O excesso de sedimentos em suspensão bloqueia a penetração de luz e calor, diminuindo a atividade fotossintética essencial para a saúde dos cursos d'água Os sedimentos em excesso comprometem a qualidade da água para abastecimento e recreação Sedimentos em suspensão comprometem o uso da água e elevam os custos de tratamento Os sedimentos servem como transportadores de outros poluentes, como nutrientes químicos, inseticidas, herbicidas e metais pesados. O acúmulo de sedimentos pode assorear as calhas dos rios, reduzindo a profundidade e dificultando a navegação, além de aumentar o risco de enchentes A colisão de areia em suspensão causa abrasão em turbinas, máquinas e comportas, especialmente quando as partículas se movem em alta velocidade, reduzindo a eficiência ou até danificando as peças Em cursos d'água assoreados, o aumento do nível da água causa erosão nas margens O aumento da turbidez da água compromete a qualidade estética do curso d'água O acúmulo de sedimentos em reservatórios pode causar seu assoreamento, diminuindo o volume de água e a vida útil do lago Fonte: Adaptado de Souza (2013 apud Carvalho, 2008). O conhecimento acerca do tema como a procedência dos sedimentos, padrões do meio, tamanho do material, etc…se faz necessário para reverter e mitigar problemas em ambientes fluviais, assim como é importante para avaliar e efetuar uma gestão adequada do entorno, assim como para um manejo efetivo, viabilizando melhoria na distribuição deste recurso para a população. No sentido de compreender a configuração atual do território que compõem o Pontal do Paranapanema, a atual proposta analisa o histórico da formação da regiões, tratando-se de 26 um processo bem recente, com seu início em meados do século XIX; ao passo em que é demarcada pela luta de posse pelo território, ora com as glebas organizando-se no sentido de retirar os nativos da área, ora com os grileiros de terra em conflito com outros agentes ligados ao campesinato para defender suas terras. De forma geral, as proporções atuais da porção do extremo oeste do Estado de São Paulo são um reflexo de como seus primeiros colonizadores apropriaram-se do espaço e constituem um fator importante para ter uma compreensão das dinâmicas desse território atualmente. Desse modo, os estudos históricos da região que abriga os dois parques estaduais abordados podem fornecer perspectivas do panorama atual. A atual proposta também propõe-se a elucidar os processos envolvidos na implementação de uma educação ambiental efetiva e eficaz; no sentido de buscar compreender a evolução dos conceitos relacionados ao tema, trazendo uma contextualização dos conceitos, no intuito de buscar compreender desde suas origens e motivações, os contextos históricos em que a mesma estava inserida, e trazendo para o momento presente visto o panorama ambiental atual, que enfatiza a urgência de se debater a temática. O projeto discorre sobre as discussões relacionadas à educação ambiental no contexto internacional e no contexto brasileiro, frisando avanços e derrocadas, e oferecendo parâmetros de como pode-se alcançar suas pretensões, como mostra a esquematização na Figura 6 adiante. Figura 6: Esquematização do propósito de uma Educação Ambiental. Fonte: Dias (2001). Ademais, a proposta visa elucidar alguns processos que decorrem da ausência de uma educação ambiental efetiva, e que estão além das questões puramente ecológicas e ambientais, 27 como a perda de diversidade cultural associada à homogeneização da cultura propiciada pelos processos de globalização (Viola, 1995). No sentido de desenvolver a proposta que estabelecesse a relação com os estudos de bacias hidrográficas e as intervenções da educação ambiental pensou-se na elaboração de uma cartilha didática. O documento teria como recorte espacial principal o Parque Estadual do Aguapeí, este que está localizado na UGRHI 20, abrangendo partes dos municípios de Castilho, São João do Pau d’Alho, Nova Independência, Monte Castelo, Guaraçaí e Junqueirópolis. O Parque Estadual do Aguapeí é uma unidade de conservação estadual, classificado como uma Unidade de Proteção Integral. A classificação permite apenas o uso indireto dos recursos naturais, onde, as regras e normas são mais restritivas definidas pela lei (BRASIL, 2000). Figura 7: Rio aos arredores do parque Aguapeí. Fonte: https://aguapei.ingressosparquespaulistas.com.br/. 28 Figura 8: Instalações do parque Aguapeí. Fonte: https://aguapei.ingressosparquespaulistas.com.br/. Portanto, o atual trabalho objetivou a análise sedimentológica através de dados recolhidos em estações, para analisar o meio e refletir sobre o atual estado do local tendo como auxílio o panorama histórico da área, assim como avaliar quais variáveis podem estar relacionadas comportamento exercido pelos sedimentos, para que se torne possível propor um material que traga uma abordagem educativa ambiental, visando a melhoria no entorno dos parques e a conservação dos corpos hídricos. 1.2 EDUCAÇÃO AMBIENTAL E ELABORAÇÃO DE MATERIAL DIDÁTICO 1.2.1 Histórico da Educação Ambiental A educação ambiental tem desempenhado um papel crucial no avanço das questões ambientais no cenário global, sobretudo em contextos de acordos e conferências internacionais. O Brasil, ao longo das décadas, tem assumido um papel cada vez mais proeminente como signatário de importantes tratados ambientais. Desde a assinatura da Convenção sobre o Patrimônio Mundial, Cultural e Natural em 1972, passando pela adesão ao Programa Homem e a Biosfera (MaB) da UNESCO, em 1972, até o apoio à Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Fauna e Flora em Perigo de Extinção (CITES) em 1973, o país tem mostrado seu compromisso com a preservação do meio ambiente. Além disso, o Brasil se engajou na Convenção sobre a Conservação das Espécies Migratórias de Animais Silvestres em 1979 e na "Estratégia Mundial para a Conservação" de 1980. A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD) de 1992, que resultou na assinatura da Convenção sobre a Diversidade Biológica e da Agenda XXI, consolidou ainda mais o protagonismo do Brasil na agenda internacional de 29 sustentabilidade, refletindo seu compromisso com a educação ambiental e a preservação do planeta (FUNDAÇÃO FLORESTAL, 2010; p.14). A agenda internacional voltada para os debates ambientais, demarcam o surgimento da Educação Ambiental como ferramenta educativa essencial. E foi a partir desses grandes eventos em colaboração com outras nações que o Brasil mostrou-se disposto a engajar-se na discussão ao passo em que suas particularidades e seu tamanho continental trazem diferentes desafios. Com o advento da revolução industrial, nossa espécie experienciou nos últimos anos mudanças sem precedentes em seu padrão de vida, e sobretudo, no que se refere a seu consumo; onde as relações humanas sofreram profundas alterações em um tempo histórico muito curto. Essas mudanças trouxeram consigo uma padronização dos hábitos de consumo de uma grande parcela da população mundial, o que exerce uma crescente pressão sobre recursos finitos e coloca em questão a capacidade de suporte da Terra à viabilidade biológica da espécie humana. (MARTINE; ALVES, 2015). A preocupação com o meio ambiente em que vivemos e a sua manutenção se constitui como um dos mais relevantes debates da atualidade, porém vale lembrar que essa temática foi muito subestimada ao longo das décadas e que sua notoriedade é algo relativamente recente na história humana, visto que “O atual momento histórico, marcado por profundas crises ecológicas, econômicas e sociais, exige repensar essa situação à luz dos limites que estão sendo impostos pela própria natureza” (MARTINE; ALVES, 2015; p. 434). Em 1863, o primeiro ensaio sobre a interdependência dos seres humanos para com os demais seres vivos é publicado; Evidências sobre o lugar do homem na natureza sob autoria de Thomas Huxley chama a atenção do mundo, seguido pela obra do diplomata George Perkin, O homem e a natureza: ou a geografia física modificada pela ação do homem publicada um ano após o ensaio de Huxley. Este último tratando da disponibilidade de recursos naturais e a exploração preocupante promovida pelos humanos; que em algum ponto iriam exaurir os bens naturais. Mesmo com obras ousadas para seu período, a preocupação com o ambiente estava restrito a alguns pesquisadores e entusiastas dos estudos da natureza. (DIAS, 1999, p. 107). É nesse sentido que se tem a criação do primeiro Parque Nacional (Yellowstone National Park) em 1872; ao passo em que a corte brasileira assinava acordos com empresas privadas de corte de madeira, culminando na extinção da espécie de Pau-Brasil em 1920 (DIAS, 2001; p.75). A preocupação com o meio ambiente estava restrita aos poucos intelectuais que debatiam o assunto, pois o tema não era sequer mencionado na constituição 30 brasileira de 1891, sendo um reflexo da forte pressão que os europeus ainda mantinham sobre os recursos naturais da ex-colônia. No período pós guerra, em 1945, estudiosos da Grã-Bretanha passam a utilizar a expressão “estudos ambientais”, a temática ganha centralidade em 1949, com a publicação do County Sand Almanac do biólogo Aldo Leopoldo onde é abordado a ética do uso da terra. Esta obra consagrou o pesquisador como patrono do movimento ambientalista. Já em 1952, a cidade de Londres vislumbra as consequências do seu crescimento urbano desenfreado seguido da forte poluição atmosférica causada pela revolução industrial. Após a morte de cerca de 1.600 pessoas pela qualidade péssima do ar densamente poluído, foi instaurado na Inglaterra a sensibilização com a qualidade ambiental, tendo por consequência, a aprovação da Lei do Ar Puro em 1956 (DIAS, 2001; p.77). Foi no final da década de 60 que o mundo encontrava-se face às piores consequências do modelo de desenvolvimento econômico vigente. Grandes centros urbanos nos países ricos apresentavam sua qualidade do ar em níveis insalubres -Los Angeles, Tóquio, Nova Iorque, Berlim, Londres-. Grandes corpos hídricos importantes como o Tâmisa, Sena, Danúbio e Mississippi, encontravam-se envenenados por resíduos industriais. O panorama geral que chamava a atenção de todos, sobretudo da imprensa internacional, era de que pela primeira vez na história humana havia tamanha devastação do meio natural em uma velocidade sem precedentes (DIAS, 2001; p.77). Foi nesse contexto que a jornalista estadunidense Rachel Carson publicou sua obra que viria a ser um clássico do movimento ambientalista mundial; Primavera Silenciosa (1962) foi publicado enfatizando o descuido e a irresponsabilidade que os setores produtivos da economia espoliavam a natureza, e suscitado grandes discussões no cenário internacional. Nesse sentido, foi criado na Universidade de Keele o termo "environmental education", onde foi de consenso geral que a educação deveria ser parte obrigatória da educação de todos os cidadãos, temas que abordassem a conservação ambiental e a ecologia aplicada. Foi em 1969 que o governo inglês criou a “Sociedade para a Educação Ambiental” e que a grande imprensa, artistas e políticos vinham a público discutir e promover debates acerca do tema (DIAS, 1999, p. 107). Foi em 1968, que trinta especialistas de diversas áreas foram reunidos na cidade de Roma no intuito de debater acerca dos problemas e desafios enfrentados pela humanidade e quais seriam os panoramas para o futuro da nossa espécie; desse encontro foi publicada a obra “Os Limites do Crescimento” em 1972. O documento denunciava a busca incessante por bens materiais e denunciava a forma de produção de riqueza da nossa sociedade a qualquer custo. 31 A obra advertia que tal retórica levaria a humanidade a um limite, este que poderia levar nossa sociedade e espécie a um colapso. A humanidade foi alertada sobre os riscos que seus padrões de vida ofereciam ao planeta pois dessa reunião ficou evidente que “O homem deve examinar a si próprio, seus objetivos e valores. O ponto [...] não é somente a sobrevivência humana, porém, [...] a sua possibilidade de sobreviver sem cair em um estado inútil de existência.” (REIGOTA, 1994; p.14). No mesmo ano do lançamento da obra, a Organização das Nações Unidas promoveu a “Conferência da ONU sobre o Ambiente Humano”, que ficou consagrada como a Conferência de Estocolmo, reuniu 113 países “com o objetivo de estabelecer uma visão global e princípios comuns que servissem de inspiração e orientação à humanidade, para a preservação e melhoria do ambiente humano” (DIAS, 2001; p.77). Parte dos frutos dessa conferência foi o documento “Declaração do sobre o Ambiente Humano” e o estabelecimento de um Programa Internacional de Educação Ambiental; sendo esta uma das ferramentas reconhecidas como elemento crítico de combate à crise ambiental. Em 1975 a Unesco promoveu em Belgrado (atual capital da Sérvia) o primeiro Encontro Internacional de Educação Ambiental; que ficou definido como “contínua, multidisciplinar e integrada às diferenças regionais e voltada para os interesses nacionais” (DIAS, 2001; p.80). Foi em Belgrado também que nasceu a ideia da realização de uma conferência intergovernamental em dois anos com o objetivo de “estabelecer as bases conceituais e metodológicas para o desenvolvimento da Educação Ambiental, em nível mundial” (Ibidem; p.80). O Brasil ainda encontrava-se totalmente desconexo com a abordagem educacional que os temas ambientais estavam exigindo e que fomentada pelas discussões por parte da comunidade internacional. Nesse sentido, os órgãos ambientais estaduais passaram a atuar como agentes promotores da Educação Ambiental no Brasil, formulando parcerias entre secretarias de educação dos Estados e instituições de meio ambiente. O cenário à época expunha uma divisão enorme de visões e valores por parte das nações, onde países ricos não apoiavam técnicas que pudessem expor os problemas éticos, ambientais, culturais produzidos por seus modelos econômicos impostos aos países menos favorecidos. Foi dessa forma que foi realizada em 1975 em Tbilisi (atual capital da Geórgia) a Primeira Conferência de Intergovernamental de Educação Ambiental, organizada pela Unesco em parceria com o Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente). A conferência consagrou a Primeira Fase do Programa Internacional de Educação Ambiental iniciado em Belgrado (DIAS, 2001; p.82). 32 No sentido de desenvolver uma educação ambiental efetiva, se faz necessário a abrangência de todos os aspectos que compõem a educação ambiental, como os aspectos culturais, políticos, sociais, tecnológicos, científicos etc; na noção de que: [...] a Educação Ambiental deveria ser o resultado de uma reorientação articulado de diversas disciplinas e experiências educativas, que facilitassem a visão integrada do ambiente; que os indivíduos e a coletividade pudessem compreender a natureza complexa do ambiente e adquirir os conhecimentos, os valores, os comportamentos e as práticas para participar eficazmente da prevenção e solução dos problemas ambientais; que se mostrassem, com toda clareza, as interdependências econômicas, políticas e ecológicas do mundo moderno, no qual as decisões e comportamentos dos diversos países poderiam produzir consequências de alcance internacional; [...] estruturando suas atividades em torno dos problemas concretos que se impõe à comunidade e enfocando-as através de uma perspectiva interdisciplinar e globalizadora; que fosse concebida como um processo contínuo, dirigido a todos os grupos de idade e categorias profissionais (DIAS, 2001, p.83). Dessa forma, a educação ambiental estabelece os elementos que permitiriam capacitar os seres humanos de perceber, de forma nítida, reflexiva e crítica,os mecanismos que tentavam estabelecer uma dinâmica global diferente que tinha por objetivo, a melhoria não restrita às questões ambientais, mas a da qualidade de vida e da experiência humana. Essas orientações estavam alinhadas com a ideia que se nutria à época em relação à educação ambiental no sentido de que a mesma. teria como finalidade promover a compreensão da existência e da importância da interdependência econômica, política, social e ecológica da sociedade; proporcionar a todas as pessoas a possibilidade de adquirir conhecimento, o sentido dos valores, o interesse ativo e as atitudes necessárias para proteger, melhorar a qualidade ambiental; induzir novas formas de conduta nos indivíduos, nos grupos sociais e na sociedade em seu conjunto, tornando-a apta a agir em busca de alternativas de soluções para os seus problemas ambientais, como forma de elevação da sua qualidade de vida (DIAS, 2001, p.83). Após Tbilisi, estavam determinadas as bases de orientação da educação ambiental no mundo, sendo atribuído às nações a sua adaptação e implementação dentro de suas características e particularidades através das suas bases educacionais e ambientais. Nesse sentido o MEC propôs a inserção do conteúdo contido no documento intitulado Ecologia - Uma proposta para o ensino de 1º e 2º graus, que reduzia as abordagens à área das ciências biológicas, o que reduzira a capacidade analítica e crítica do problema, como também sua associação com outros elementos de alta complexidade e relevância como os aspectos 33 políticos, sociais e culturais. A medida satisfazia os interesses dos países altamente industrializados, pois coibia a possibilidade de ações tanto locais como globais e restringia o potencial catalítico-indutor de ações. Em 1984 surge a proposta de resolução ao Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) que definia a educação ambiental no país como: O processo de formação e informação social, orientado para o desenvolvimento da consciência crítica sobre a problemática ambiental; de habilidades necessárias à solução de problemas ambientais; de atitudes que levem à participação das comunidades na preservação do equilíbrio ambiental (SEMA, 1984; p.8). A proposta foi amplamente boicotada na época sobretudo pela classe política que sustentava a ditadura no qual o Brasil estava submetido. É nesse contexto que diversas instituições de ensino e fomento à pesquisa unem-se para formar recursos humanos que possibilitaram o desenvolvimento da educação ambiental. Em 1987 com os esforços conjuntos da Sema, Universidade de Brasília, CNPq, Capes e Pnuma foi ofertado o “1º Curso de Especialização em Educação Ambiental”, este que perdurou por pouco tempo em função de boicotes políticos, por muitas veze mascarados de dificuldades financeiras (DIAS, 2001, p.85). Nesse sentido, o Conselho Federal de Educação aprova a resolução 226/87 que considerava necessária a inclusão da Educação Ambiental dentre os conteúdos a serem explorados nas propostas curriculares das escolas de 1º e 2º graus. Mesmo com a resolução saindo às vésperas da Conferência em Moscou, a vergonhosa ausência de resultados apresentados pelo Brasil não passou despercebida no cenário internacional, chegando a agentes de maior poder coercitivo internacional como o Banco Mundial. À época, o planeta estava vivenciando as mais diversas crises de diversas ordens, desde as notórias consequências causadas pelo efeito estufa, Chernobyl, o acidente na fábrica que matou milhares de pessoas na Índia em Bhopal, e os efeitos da poluição química causada em Cubatão. Cabe salientar que durante Estocolmo, Brasil e Índia foram Estados que durante a conferência, declararam abertamente que “a poluição é o preço que se paga pelo progresso” (REIGOTA, 1994; p.14). 1.2.2 A evolução da educação ambiental no Brasil Em 1988, a constituição recém promulgada trazia um capítulo inédito discorrendo sobre o meio ambiente. Dentre os artigos que a nova carta magna trazia, havia diversas 34 menções ao papel desempenhado pelo poder público no sentido de “promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para a preservação do meio ambiente” (BRASIL, 1988, art. º225). No ano seguinte, o Estado promove a fusão de quatro diferentes órgãos ambientais (A Secretaria do Meio Ambiente (Sema), Instituto Brasileiro do Desenvolvimento Florestal (IBDF), Superintendência do Desenvolvimento da Pesca (Sudepe) e a Superintendência da Borracha (Sudhevea)) têm-se a criação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), com a tarefa de articular e executar as novas políticas de meio ambiente; tais como a preservação, a conservação, o fomento e o controle dos recursos naturais, proteger bancos genéticos da fauna e flora, promover a educação ambiental entre outros. Apesar das diversas competências conferidas ao órgão, o mesmo não obteve o investimento em recursos humanos necessários para capacitação profissional de seus servidores, o que acarretou em uma inoperância do órgão em alguns aspectos, sendo a educação ambiental um deles. No final de 1989 e início da década de 90 mostraram fortes avanços no Brasil, onde o MEC iria formular o Grupo de Trabalho para a Educação Ambiental, e no ano de 1991, quatorze anos após a Conferência de Tbilisi, em uma parceria entre Ibama e MEC é lançado o documento-questionário com enfoque na orientação dos profissionais de educação, Projeto de Informações sobre Educação Ambiental. O mesmo evidenciou dados alarmantes quando uma grande maioria dos educandos que tiveram contato com o material afirmaram ser a primeira vez que estavam tendo contato com aquele tipo de conteúdo. Todas essas iniciativas foram alavancadas pelas Conferências das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento e o Meio Ambiente no Rio de Janeiro (Rio-92). Mesmo após a realização da conferência no Rio de Janeiro, e os debates em relação ao tema no âmbito internacional, o Brasil ainda persiste na resistência à implantação sistemática do processo de educação ambiental nacional, devido principalmente à falta de oportunidades de capacitação de profissionais e da formação de especialistas na área. O caminho percorrido pelo Brasil em termos de educar seus cidadãos a temas tão necessários no contexto histórico atual é um reflexo de um conflito de interesses, em sua grande maioria político, em detrimento da dura realidade que se apresenta, com a natureza cada vez mais exaurida. Um dos contextos que impulsionam a urgência de uma educação ambiental eficaz está relacionado à mudança do clima, que nunca estiveram tão em alta como nos últimos anos, visto que a crise climática exacerba vulnerabilidades de grupos marginalizados resultando em 35 múltiplas crises socioambientais (IPCC, 2014). As Mudanças Climáticas apontam as ações antrópicas como o principal fator do aumento da temperatura no planeta, com repercussões negativas sobre a sociedade e sobre todos os ecossistemas Fernández García (2015 apud AMORIM, 2020). As discussões permeiam os mais diversos ambientes da academia, na literatura científica, na mídia e nas salas de aula; pois o clima, assim como o meio ambiente como um todo, é parte efetiva de todas as atividades humanas e está intimamente relacionado a todos os aspectos de nosso modo de vida (SANT’ANNA NETO, 2013; p. 317). O contexto que as crises ambientais percebidas no atual contexto histórico são, no mínimo, preocupantes; e no entendimento de que suas consequências serão testemunhadas principalmente por grupos etários mais novos, como crianças e jovens. Estes sujeitos que irão sentir os piores efeitos da crise, tornam-se parte dos grupos mais vulneráveis às consequências que as crises poderão proporcionar (UNICEF UK, 2013). Os piores efeitos sentidos pelas novas gerações, somam-se a fatores de vulnerabilidade que podem tornar sujeitos mais sucessíveis aos danosos efeitos do aumento de temperaturas (TRAJBER, 2019, p. 88). Nesse sentido, se faz necessário um esforço para capacitar e sensibilizar as novas gerações dos desafios e cenários que estarão presentes no futuro próximo, e a educação ambiental mostra- se como uma ótima ferramenta para engajar os estudantes nessa tarefa. 1.2.3 A educação ambiental no contexto dos parques estaduais Nesse sentido, os corpos hídricos estão paulatinamente sendo submetidos a pressões cada vez maiores, à exemplo do ano de 2024, onde a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) em seu último relatório, aponta para a urgência do aumento de temperaturas no Brasil em decorrência da permanência e continuidade na emissão de gases do efeito estufa na atmosfera. O documento, baseando-se em projeções realizadas a partir da análise de modelos de impacto de recursos hídricos, apontam para uma diminuição de cerca de 40% da disponibilidade hídrica em 2040, e períodos alarmantes de estiagem em partes da região sudeste, o que oferece um vislumbre preocupante sobre o futuro. A preservação do meio ambiente é um dos componentes ontológicos que compõem as propostas de uma unidade de conservação; como definidos pela Lei nº 9.985 que discorre sobre a necessidade da criação de áreas de interesse público voltadas para a conservação e conscientização a respeito do meio ambiente (BRASIL, 2000). É neste contexto que o Parque Estadual do Aguapeí e Parque Estadual do Rio do Peixe, se fazem necessários, em um esforço para proporcionar um contato maior com a rica diversidade biológica que a região onde os 36 parques estão inseridos possui e o esforço de sensibilizar a população dos desafios e cenários que estarão presentes no futuro próximo em relação à crises e dificuldades ambientais. Nesse sentido, a educação ambiental, como discorrido anteriormente, mostra-se como um mecanismo necessário no engajamento da comunidade. A educação ambiental, segundo Reigota (1994) pode ser entendida como um conjunto de práticas pedagógicas que podem ser empregadas no sentido de capacitar os sujeitos não a compreender o ambiente onde o mesmo vive, e seus mecanismos que atuam no seu funcionamento compõem uma rede interconectada. Convidando os indivíduos a realizar uma leitura crítica de sua realidade e a identificar e correlacionar problemas de origem ambiental, política, econômica e social. A mesma se propõe a enfatizar a finalidade de determinada tarefa antes de compreender o modo de realizá-la, numa dialética onde o “por que fazer” vem antes do “como fazer”. Ao passo em que se faz presente nos dias atuais, ela se consolida em um mundo sob profundas mudanças e tende a questionar opções políticas e o próprio conceito de educação, exigindo criatividade, inovação e crítica. Como apresentado anteriormente, é indissociável o caráter político de uma educação ambiental efetiva, visto que é um de seus objetivos a formação de cidadãos que possuam atividade participativa e crítica nas decisões que afetam sua vida cotidiana, pois: Assim a educação ambiental deve ser entendida como educação política, no sentido de que ela reivindica e prepara os cidadãos para exigir justiça social, cidadania nacional e planetária, autogestão e ética nas relações sociais e com a natureza. Reigota (1994, p.10) As práticas e as didáticas relacionadas à educação ambiental surgem no contexto de preocupação com as ações da humanidade sobre o ambiente e a forma como essa espécie usufrui de seus recursos. No encontro em Belgrado citado previamente, um documento foi concebido no sentido alertar ao mundo sobre a necessidade de se proporcionar os meios materiais para os povos poderem trabalhar juntos na erradicação da crise ambiental. A Carta de Belgrado, como ficou conhecida, “expressava a necessidade do exercício de uma nova ética global, que proporcionasse a erradicação da pobreza, da fome, do analfabetismo, da poluição e da dominação e exploração humana” (DIAS, 2001; p.80). Em um dos documentos mais lúcidos da época, a carta preconizava que os recursos do mundo deveriam ser utilizados no sentido de beneficiar toda a humanidade, proporcionando uma melhoria geral de qualidade de vida a todos. 37 No contexto da Rio-92, a educação ambiental era caracterizada pela incorporação da dimensão socioeconômica, cultural, política e histórica, devendo ser flexível e ausente de pautas rígidas com premissas de serem universalmente aplicáveis. Nesse sentido, a educação ambiental deve permitir a compreensão da natureza complexa do meio ambiente associados aos padrões de usos de seus recursos. Para tal, a temática deve abranger os mais diversos aspectos no sentido de proporcionar uma visão holística da realidade e despertar uma consciência planetária, necessária para o desenvolvimento e avanço humano. Trata-se da compreensão do funcionamento do meio ambiente, como a humanidade depende do mesmo, os efeitos que esta causa, e como é possível promover a harmonia entre esses dois agentes através da sustentabilidade (DIAS, 2001; p.100). Sendo assim, cabe salientar o protagonismo que as práticas pedagógicas desenvolvidas nos ambientes de formação -como em escolas ou instituições de formação ambiental-, visto que a educação é, entre outras coisas, uma forma de intervenção na realidade (ZANGALLI JR, 2014). Logo, tais ambientes exploram o potencial de pensar o seu espaço como ferramenta de intervenção; onde são propostas diferentes maneiras de constituir currículo escolar, aprendizado, mentalidades e por consequência novas formas de pensar cidadania. 38 39 2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO 2.1 Meio físico-biótico As bacias estudadas estão localizadas sobre a Bacia Sedimentar do Paraná e o Planalto Ocidental Paulista, com rochas do Grupo Bauru, composto principalmente por formações areníticas, algumas cimentadas por carbonato de cálcio. A região é dominada pela Formação Adamantina, caracterizada por sedimentos mais finos e bem selecionados. De acordo com o Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT), o Mapeamento Geológico oferece algumas perspectivas de como se deu a constituição do território que abriga as unidades estudadas. Através do mapa é possível observar a Formação Adamantina, esta que é subdividida em algumas unidades litológicas; sendo a Unidade Ka1, composta por arenitos finos, siltitos arenosos e arenitos argilosos, predominantemente de quartzo. A Unidade Ka2 é formada por arenitos muito finos e siltitos, com quartzo, minerais opacos e pequenos feldspatos. A Ka3, constituída por arenitos finos, siltitos e argilitos siltosos, com predominância de quartzo e pouca mica. A Ka4 que apresenta arenitos finos a muito finos, com feldspato, sílica amorfa e mica e por fim, a Unidade Ka5, esta que é composta por arenitos finos e muito finos, frequentemente cimentados por carbonato de cálcio. 40 Figura 9: Mapa geológico das bacias dos Rios Peixe e Aguapeí. Fonte: IPT (2011). O clima do Oeste Paulista é predominantemente tropical, caracterizado por um período mais seco no inverno e chuvoso no verão. A região está em uma zona de transição climática, influenciada por sistemas atmosféricos intertropicais e extratropicais, muito influenciada por massas de ar como a Tropical Atlântica, a Tropical Continental e, ocasionalmente, a Polar Atlântica e a Equatorial Continental. A precipitação média anual fica entre os 1200 e 1500 mm, enquanto a temperatura média anual é superior a 22°C. As bacias hidrográficas do Aguapeí e Peixe estão localizadas em um relevo composto por colinas amplas e de altura média, tendo características como topos extensos e aplainados, e vertentes com perfis convexos e retilíneos. Também são localizadas dentro do Planalto Ocidental Paulista, este que apresenta um relevo suavemente ondulado, caracterizado principalmente por colinas amplas e baixas, com topos nivelados (Santos, 2013). No caso do solo, as áreas estudadas possuem principais associações pedológicas da área são os Latossolos Vermelhos distróficos e os Argissolos Vermelho-Amarelos (Santos, 2013). Vale salientar que estes tipos de solo obtêm o risco natural de erosão, o qual é influenciado pela diferença de textura entre as camadas superficial e subsuperficial, e sua 41 relação com a declividade pode intensificar fenômenos como o citado anteriormente, logo reverberando na distribuição de sedimentos. Apesar dos Parques Rio do Peixe e Aguapeí estarem isolados por terras agrícolas em constante mudança, eles estão conectados pelas águas dos rios que lhes dão nome, que deságuam no Rio Paraná, formando um fluxo contínuo de nutrientes e espécies. A foz de ambos os rios, apesar do represamento causado pela Usina Hidrelétrica Sérgio Mota, possui um delta que favorece a presença de espécies aquáticas e aves migratórias. Como parte das medidas de conservação, a CESP criou a Reserva Privada do Patrimônio Natural (RPPN), com mais de 13.000 hectares, incluindo a área de Ilha Comprida, localizada na calha do Rio Paraná. Essa reserva tem limites próximos aos Parques Estaduais do Aguapeí e Peixe, ampliando a área de conservação e melhorando as condições para a fauna e flora local. Com os Parques Rio do Peixe e Aguapeí e suas zonas de amortecimento, o total de áreas protegidas soma cerca de 130.000 hectares, e com as RPPNs, esse valor ultrapassa os 150.000 hectares. Esse conjunto de Unidades de Conservação (UCs) formam um mosaico com características ecológicas únicas, constituindo o "pantaninho paulista" (FUNDAÇÃO FLORESTAL, 2010). O Figura 10 adiante mostra a localização das áreas que compõem o mosaico de reservas ambientais. Figura 10: Localização das áreas que compõem o “Pantaninho Paulista”. Fonte: Fundação Florestal (2010). 42 O Rio Aguapeí tem uma área de drenagem de 13.196 km², dividida em 89 sub-bacias, e abrange 32 municípios total ou parcialmente. O Rio do Peixe, por sua vez, cobre uma área de 10.769 km², com 78 sub-bacias e 26 municípios em sua bacia hidrográfica. 2.2. Histórico dos usos e usos atuais Atualmente, os mapeamentos evidenciam que na região do Parque Estadual do Aguapeí, há uma predominância de pastagens voltadas à pecuária extensiva, e um rápido avanço das áreas de plantio canavieiro. O Relatório da Situação das Bacias Hidrográficas do Aguapeí e Peixe apontam o domínio do setor de serviços e comércio como característica econômica predominante na região dos parques, com exceção das cidades que possuem o papel de pólos regionais como Marília e Presidente Prudente que possuem atividades industriais significativas. No âmbito rural, as lavouras de café, milho e cana de açúcar se destacam na região da bacia do Aguapeí; já para a bacia do Rio do Peixe tem-se a forte presença da agropecuária. As Figuras 11 e 12 logo adiante mostram um pouco dos usos da terra das duas áreas. Figura 11: Área total do Parque Estadual do Aguapeí e uso da terra. Fonte: MapBiomas (2023). Figura 12: Área total do Parque Estadual do Rio do Peixe e uso da terra. 43 Fonte: MapBiomas (2023). Como mencionado anteriormente, a cultura canavieira vem se mostrando como o cultivo predominante na área ao redor do Parque Estadual do Aguapeí, ocupando quase toda a região. Entre os campos de cana, existem pequenas áreas de florestas isoladas e também algumas zonas de pastagem e outras culturas, mas em menor escala. Na porção nordeste da área, há assentamentos rurais representativos, embora distantes das fronteiras do parque. A expansão da cana-de-açúcar sobre as áreas do entorno está transformando cada vez mais a paisagem, o que sugere uma futura ocupação quase total da região pela cultura. A conversão das pastagens em canaviais tem gerado mudanças significativas, com a diminuição das árvores isoladas e benefícios ambientais no que diz respeito à conservação do solo, ao passo em que a agricultura canavieira reduz os processos erosivos e a fragmentação da vegetação nativa, problemas associados à intensa atividade pecuária que prevaleceu na área. Entretanto, os impactos da cana-de-açúcar sobre o parque e a região incluem a morte de animais silvestres devido às queimadas nas plantações (estas que foram proibidas totalmente desde 2014) e o risco de contaminação da água por defensivos químicos usados no manejo da cultura. Os figura 13 e 14 a seguir evidenciam o uso do solo no entorno das áreas de ambos os parques. Figura 13: Uso e ocupação do solo na área do Parque Estadual do Rio Aguapeí. 44 Fonte: Fundação Florestal (2010). 45 Figura 14: Uso e ocupação do solo na área do Parque Estadual do Rio do Peixe. Fonte: Fundação Florestal (2010). O mapa de uso e ocupação do solo do Parque Estadual do Rio do Peixe evidência pequenos fragmentos de área de mata, resquícios de vegetação nativa que possui uma relevância substancial no sentido da preservação das espécies presentes na área do entorno e para propiciar a integração com outras pequenas áreas que ainda possuem o mínimo de fragmentos florestais preservados, possibilitando a formação de pequenos corredores ecológicos utilizados pela vida selvagem. Nos últimos anos, a estrutura fundiária da região tem passado por profundas mudanças nos últimos anos, em um ritmo acelerado. Essas alterações são atribuídas, sobretudo, à expansão da cana-de-açúcar sobre as áreas de pastagens que predominam na região. Nos Escritórios de Desenvolvimento Rural (EDRs) que abrangem essa área, os dados indicam que os maiores avanços no cultivo de cana ocorreram, especialmente sobre as pastagens (CAMARGO et al., 2008; apud FUNDAÇÃO FLORESTAL, 2010), sendo também essa a região com os maiores índices de concentração de terra. Para os autores, essa nova dinâmica da configuração para das atividades agropecuárias, influencia diretamente a estrutura fundiária da região. Em relação ao potencial hidrelétrico, segundo o Comitê das Bacias Hidrográficas dos Rios Aguapeí e Peixe, apenas a Bacia do Rio do Peixe possui uma Pequena Central 46 Hidrelétrica (PCH), chamada Usina Quatiara, localizada no município de Rancharia, com uma área inundada com cerca de 0,93 km². Além disso, a bacia é afetada pelo lago artificial da Usina Sérgio Mota, situado no leito do Rio Paraná. Embora não haja barragens para geração de energia hidrelétrica na região, os municípios de Panorama, Presidente Epitácio, Paulicéia e Santa Mercedes, que estão todos localizados próximos às margens do Rio Paraná, são impactados pelo lago da Usina Sérgio Mota. Quanto à demanda de água, os rios Aguapeí e Peixe são utilizados como fontes de abastecimento urbano, industrial e rural de importantes centros urbanos da região. O Rio Aguapeí tem dois pontos de captação para o abastecimento público de Marília. Já o Rio do Peixe tem três pontos de captação, sendo dois destes também destinados à Marília, para abastecer a área urbana do município, e um que está no território do município de Caiabu, destinado ao abastecimento da área urbana de Presidente Prudente. 2.3. A formação do Pontal do Paranapanema As bacias hidrográficas abordadas estão inseridas na décima região administrativa do Estado de São Paulo, denominada como a região do Pontal do Paranapanema; este recorte espacial carrega em sua história a marca do desenvolvimento lastreado principalmente pela implementação da estrada de ferro da Alta Sorocabana; entretanto, o histórico de desenvolvimento da região e seus modelos implementados são indissociáveis das práticas de uso e manejo do solo instaladas na região, muitas das quais são contínuas até os dias atuais. As decorrências que este modo de produção proporcionou nessa região do Estado se fazem visíveis até o presente momento, definindo, por muitas vezes, a paisagem e os múltiplos usos empregados aos solos. Os corpos hídricos, nesse contexto, mostram-se como agentes vulneráveis aos componentes que os cercam e podem vir a afetar sua condição, pois as condições dos rios são também um reflexo da história de uma localidade. Até meados do século XIX, o que se conhece hoje por Pontal do Paranapanema era tido como um sertão despovoado e desconhecido, e o surgimento dos primeiros povoados que deram origem ao município de Presidente Prudente tiveram uma relação intrínseca com os sertanistas que desbravaram o interior do Estado a procura de riquezas e recursos; estes sujeitos protagonizaram um papel determinante na consumação do espaço na região do Oeste Paulista como ele se apresenta atualmente. Na Figura 15 adiante é possível observar como se configurava a cartografia do Estado de São Paulo nos primeiros anos do século XX, com destaque para a região do extremo oeste do Estado, onde lhe é atribuída a nomeação de 47 “terrenos desconhecidos” devido às terras dessa parte do Estado ainda não terem sido devidamente analisadas. Figura 15: Estado de São Paulo em 1904. Fonte: Abreu (1972). A região que avistava o alvorecer de seu povoamento, já possuía alguns grupos indígenas estabelecidos como os Guaranis e os Caingangs; onde alguns desses grupos eram descritos como parte das populações Kaiowá e outros grupos denominados de Coroados que habitavam o território até então desconhecido aos colonizadores, do sertão do Paranapanema (MONBEIG; 1952. p. 113). Há indícios de que as ocupações guaranis estendiam-se até as proximidades do Rio Tietê, compondo um mosaico de ocupações de dois grupos com distintas produções materiais (METRAUX; 1979 apud KASHIMOTO, MARTINS; 2000) sendo primeiramente reconhecidas por Keller (1867), onde o autor descreve as cerâmica Caingang como “bem cozida” porém “menos elegante” em comparação com as produções dos povos Guaranis como os Kaiowá. Após o período de implementação das populações colonizadoras, 48 a região foi povoada por pequenos grupos Ofaiés-Xavantes que ocuparam a região até a construção da Usina Hidrelétrica Sérgio Motta (KASHIMOTO, MARTINS; 2000). As populações nativas desempenharam um papel muito importante no contexto da colonização da região, pois sangrentos conflitos com os nativos faziam parte do cotidiano dos brancos recém chegados. Os mesmos organizavam-se no que Cobra (1923) descreveu como uma “dada”, uma forma de guerrilha organizada a partir de alguns voluntários, que saíam à caça de nativos, sejam em indivíduos ou em grandes grupos como em suas aldeias. O ataque a grandes ocupações era feito geralmente em contexto de festividades, onde esperava-se um horário propício em que todos estivessem dormindo, e então o ataque ocorria promovendo a dizimação da população nativa, salvo algumas mulheres e crianças que eram enviadas a alguma fazenda para servir de mão-de-obra escravizada. A tímida penetração de colonizadores no território do Estado teve um começo da chegada de ralas populações, sobretudo rio-grandenses e mineiras nas primeiras levas sob comando de José Teodoro de Souza; este que era natural de Pouso Alegre em Minas Gerais, aventurou-se, primeiramente, na até então, vila de Botucatu, de onde partiu em direção ao encontro dos rios Paraná e Paranapanema, ajudando a fundar alguns povoados conforme seu avanço em direção ao oeste. A Figura 12 a seguir mostra um pouco de como foi o trajeto de João Teodoro durante esse período. Figura 16: Avanço das empreitadas mineiras no século XX. Fonte: Abreu (1972). A empreitada só foi possível pois a região demonstrou um favorecimento do plantio cafeeiro, devido a descoberta de terras roxas ainda virgens nas regiões dos divisores de águas 49 das bacias afluentes do Paraná, pelo menos no lado paulista, onde esse tipo de solo podia ser encontrado em cerca de 30 km para o interior. Os colonizadores também percebiam a excelência das terras levando em conta as madeiras que aqui se encontravam, desde pau d’alho, jacarandá, peroba, cedro, chimbuva, jataí etc (ABREU, 1972; p. 17). 2.3.1 A chegada do café Com a queda dos metais preciosos em Minas Gerais no século XVIII, que levou a coroa portuguesa a apontar a economia brasileira para outros rumos como a agricultura intensiva (JÚNIOR, 1956; p.81); onde se teve um movimento imigratório intenso, tendo como principal mecanismo que possibilitasse a livre circulação, nesse sentido a Estrada Boiadeira possui uma significativa relevância por possibilitar a entrada desses sujeitos no território; este processo imigratório perdurou por anos até a chegada da Estrada de Ferro Sorocabana que ampliou consideravelmente as dinâmicas dos fluxos de imigratórios da época. O avanço do café pelo planalto central a partir do século XIX especulou, dentre outros projetos, a criação da Estrada de Ferro Sorocabana no final do mesmo século; que a partir de 1871 é concedido o privilégio exclusivo por 90 anos de construir, custear e usar uma linha ferroviária que ligasse São João do Ipanema à São Paulo. Esta linha nasce com o objetivo inicial de escoar a produção de ferro para a capital e para abastecer mercados estrangeiros. Com o tempo, surgiu o interesse na produção agropastoril, o que a fez ligar-se com a região de Botucatu em 1889. Após alguns trâmites burocráticos onde a empresa foi adquirida por uma iniciativa franco-estadunidense onde passou a se chamar São Paulo Railway Company Limited. A nova empresa teve como objetivo alcançar o próprio Rio Paraná com a estrada de ferro, onde o traçado seria sobre o divisor de águas do Paranapanema - Peixe que ofereciam vantagens por serem as regiões mais altas com melhores condições de tráfego e de conservação da linha. Ao longo dessa malha, multiplicaram-se núcleos urbanos, como mostra a Figura 17 adiante. 50 Figura 17: A expansão urbana da estrada de Ferro Sorocabana. Fonte: Abreu (1972). À época as estradas de ferro mostravam-se como “estradas do café”; nesse sentido as mesmas eram tidas como: [...] Transporte rápido, seguro e barato, a comunicação fácil com os grandes centros. [...] favoreceu a penetração, os loteamentos, a ocupação, o aproveitamento do solo. [...] Sem a ferrovia não teriam entrado tantos compradores, colonos em busca de fortuna, aventureiros de tôda a espécie. Ela foi um fator marcante para o progresso da região. E no caso particular de Presidente Prudente, o aparecimento e desenvolvimento da cidade ligaram-se estreitamente à Estrada de Ferro Sorocabana. (ABREU, 1972; p. 38). A produção de café impulsionou a expansão da malha ferroviária fornecendo suporte fundamental para sua expansão. A marcha do café pelos espigões, a busca de solos virgens para o seu plantio, a colonização pelo loteamento por grandes glebas, resumem o surgimento dos núcleos urbanos, estes que surgem como pontos de apoio para a exploração econômica da região da Alta Sorocabana. A chegada do “ouro verde” mudou profundamente o perfil da região, estabelecendo um novo paradigma da produção de espaço no Oeste Paulista, segundo Nunes (2009) os novos meios técnicos que chegavam associados à utilização das vias fluviais disponíveis, propiciaram novas possibilidades econômicas como o transporte de madeira, produtos agrícolas e pessoas, ao passo em que proporciona um desmatamento desenfreado e a implementação de sistemas agropecuários, pois: 51 A esta primeira alteração ambiental promovida pela colonização, sucederam se outras alterações dentre as quais podem ser destacadas aquelas provocadas pelo processo de urbanização desde os anos de 1960; pela substituição das culturas agrícolas por outras e pela pecuária; pela construção de barragens de grande porte nos principais rios que delimitam o Planalto - o Grande, o Paraná e o Paranapanema – que transformaram seus principais cursos d’água em lagos artificiais, durante os anos de 1960 a 1990 (DEAN, 1996 apud OLIVEIRA & BRANNSTROM, 2004). 2.3.2 A chegada da Cana e Evolução das Áreas de Canaviais Ao longo do século XX, a monocultura da cana-de-açúcar no Brasil tem se constituído como um dos pilares da economia do país, como ocorreu com outras commodities que auxiliaram na sustentação da economia brasileira. De mesmo modo, a cana possui relações diretas com o modo de ocupação do território paulista, sobretudo em regiões onde seu emprego foi implementado de maneira mais incisiva como no Oeste Paulista; esta configuração do espaço que perdura até os dias atuais decorre de um processo político, econômico e histórico (ANTONIO, 1981; p.35). Uma das grandes diretrizes que tornaram o investimento aos canaviais mais interessante e lucrativo foi a implementação do programa PROÁLCOOL (Programa Nacional do Álcool), que segundo Francisco (2019) foi criado em 1975, durante o período militar, sob o governo de Ernesto Geisel. O principal objetivo do programa era de reduzir a dependência do país em relação ao petróleo -e as nuances do mercado externo ocasionados pelas oscilações do seu preço- promovendo a produção de etanol como combustível alternativo e uma maior autonomia por parte do Brasil. O programa incentivava a produção de etanol a partir da cana- de-açúcar e o uso deste combustível, com o intuito de diminuir os custos com importação de petróleo e impulsionar a agricultura, além de gerar empregos. O programa também foi o responsável pela contribuição da criação de uma infraestrutura de destilarias e postos de combustível específicos para a produção de etanol. É nesse contexto em que o Estado de São Paulo passa a perder terras férteis que antes eram destinadas a produção alimentícia para a massiva produção canavieira, esta por sua vez, que necessitava de solos de boa qualidade, o que acarretou na gradual ocupação da monocultura nas terras roxas das regiões de Piracicaba e Ribeirão Preto por exemplo (ANTONIO, 1981; p.35). A evolução desse setor agrícola, especialmente após a Segunda Guerra Mundial, pode ser compreendida por meio das transformações econômicas, industriais e políticas que ocorreram no Brasil, onde o Estado de São Paulo tornou-se uma das entidades da federação 52 mais beneficiadas, pois apresentava um contexto histórico favorável para a expansão do cultivo canavieiro. Durante e após a Segunda Guerra Mundial, o consumo de açúcar no país, especialmente em São Paulo, experimentou um aumento significativo. Este crescimento foi impulsionado principalmente devido a algumas particularidades do Estado como a expansão populacional, a urbanização, a industrialização e o fortalecimento do setor alimentício, que utilizava o açúcar como matéria-prima. Segundo Szmrecsányi (1979, p. 218), o aumento da demanda resultou em uma ampliação da produção, com o estado de São Paulo ultrapassando a marca de 5 milhões de sacos de açúcar. Com a implementação de cotas de produção baseadas no consumo, São Paulo se destacou como principal produtor, o que contribuiu para uma mudança nas dinâmicas de comercialização de açúcar, anteriormente dominadas pelos estados nordestinos (RODRIGUES e ROSS, 2020). Nesse sentido, São Paulo passou a ser favorecido não apenas pela demanda crescente, mas também pelas características vantajosas de sua industrialização. De acordo com Pina (1972, p. 41), a agroindústria paulista possuía maior capacidade financeira, mercado vantajoso, instalações industriais modernas e condições agrícolas favoráveis, permitindo o aumento da produção e a modernização do setor. Em contraste, o setor nordestino enfrentou dificuldades devido à interrupção causada pela guerra, o que resultou em usinas obsoletas e uma falta de investimentos em tecnologia e maquinário. Andrade (1994, p. 109) observa que São Paulo, ao investir na indústria metalúrgica pesada, foi capaz de fornecer máquinas para as suas usinas. A expansão da lavoura canavieira se deu principalmente em direção ao Oeste Paulista, nas áreas que antes eram dominadas pela cafeicultura e pela pecuária (ANDRADE, 1994; p. 170). Esse processo resultou no fortalecimento do controle do capital comercial e industrial sobre a produção de açúcar no estado. Entre as décadas de 1930 e 1940, três dos quatro maiores produtores de açúcar eram grandes grupos industriais, como a Société des Sucrèries Brésiliennes, que eram compostos por grandes companhias, dentre elas, o Grupo Morganti e o Grupo Matarazzo. A consolidação da linha ferroviária nas porções do oeste do estado, favoreceram a chegada e a gradual consolidação do plantio canavieiro; e a concentração de poder na mão desses grupos contribuiu para que São Paulo se tornasse a principal região produtora de açúcar, superando o tradicional estado de Pernambuco (RODRIGUES e ROSS, 2020; p. 129). Nos anos 1980, o Estado de São Paulo vinha gradualmente incorporando mais áreas para a produção de cana-de-açúcar, visando a produção de álcool e combustível no intuito de 53 atender às demandas do PROÁLCOOL. Segundo a Secretaria de Agricultura de São Paulo, as regiões mais propensas à expansão da produção seriam as regiões de Araçatuba, Bauru, Marília, São José de Rio Preto e Presidente Prudente. Esta última teve por consequência a perda de áreas de cultivo de bens agrícolas que já estavam consolidados como também sua exportação, commodities como amendoim, feijão e milho foram perdendo espaço para a inserção da cultura canavieira. Dificuldades técnicas também atrapalharam a implementação do cultivo da cana, pois a mesma demandou uma intensa mobilização de maquinário para aração, gradagem, curvas de nível; e a introdução massiva de defensivos agrícolas devido a moderada fertilidade do solo arenoso, tais como adubos nitrogenados, fosfatados e potássicos misturados com pesticidas (ANTONIO, 1981; p.36). A partir da década de 1990, o setor canavieiro entra em uma nova fase, caracterizada por um processo de desregulamentação. Esse período trouxe dinamismo à agroindústria, ao passo em que impôs desafios significativos. Segundo Vian (2003, p. 96-98), a crise e as transformações no setor se refletiram em novos modelos de produção e comercialização, que embora promovessem inovações, também contribuíram para uma fragmentação das decisões empresariais, onde cada unidade buscou soluções de acordo com suas condições políticas e geográficas. Um dos principais impactos dessa desregulamentação foi a descentralização da produção, o que provocou uma redistribuição das áreas canavieiras. Em 1990, o estado de São Paulo ainda mantinha a liderança na produção de açúcar, mas os estados do Centro-Sul, como Minas Gerais e Goiás, passaram a ocupar posições de destaque, enquanto as regiões do oeste e noroeste do Estado vislumbravam uma expansão da monocultura em detrimento de regiões mais tradicionais de produção, como Piracicaba e Campinas (Vian, 2003; p. 116). Enquanto São Paulo consolidava-se como um líder na sua produção sucroalcooleira, os estados do Nordeste enfrentavam dificuldades para se adaptar às novas condições de mercado e à competição interna. A falta de preparação do setor nordestino para enfrentar um mercado competitivo resultou em uma diminuição da participação dos estados nordestinos na produção de açúcar, o que favoreceu a expansão da cultura pelos estados do Centro-Sul. A evolução da monocultura da cana-de-açúcar no Brasil reflete uma série de transformações econômicas, políticas, industriais e históricas que foram fundamentais para o fortalecimento da agroindústria paulista. O estado de São Paulo se beneficiou de uma série de vantagens competitivas, incluindo o investimento em infraestrutura e tecnologia, que lhe permitiram se tornar o principal produtor de açúcar do país. 54 Nesse contexto a região do Pontal do Paranapanema destaca-se como uma área de forte produção da commodity, por outro lado, é preocupante observar as relações de produção canavieira, ao passo em que a mesmas vêm ocupando uma grande parte do uso do solo da região, correndo o risco do Oeste Paulista “se tornar um verdadeiro “mar verde de cana-de- açúcar”, trazendo como consequência desastres ecológicos irreversíveis” (ANTONIO, 1981; p.36-37). 2.3.3 As áreas das bacias hidrográficas do Rio do Aguapeí e Peixe Nos primeiros anos do século XX, o governo do Estado começa a organizar expedições no sentido de mapear a malha hídrica e os aspectos naturais da paisagem, como também observar o potencial econômico que a região poderia oferecer. As expedições para levantar os primeiros dados do Rio do Peixe começaram em 1905, sob a coordenação da “Comissão Geográfica e Geológica” (ABREU, 1972; p. 30). Na década de 1940, o algodão ganhava o prestígio antes ocupado pelo café, reduzindo sua hegemonia na economia rural do Estado, e contribuindo para a implementação de pequenas propriedades, sobretudo no vale do Aguapeí (FUNDAÇÃO FLORESTAL, 2010). A cultura algodoeira ganhava fôlego e trazia consigo o uso do maquinário agrícola especializado, porém seu uso indiscriminado somados às condições climáticas, do solo arenoso, relevo irregular, e a própria planta do algodão que exige bastante por parte do solo, proporcionaram o surgimento de erosões e a degradação do solo. Posteriormente, a conservação dos solos da região ainda viria a sofrer com a onda canavieira que chegava paulatinamente no Oeste Paulista. As áreas que se constituem como parte de onde estão localizados os corpos hídricos do Aguapeí e Peixe são reflexos do recorte histórico e de ocupação no qual essas localidades estão inseridas. A boa manutenção dos corpos hídricos, devem levar em consideração os fatores históricos que formaram a região, no sentido de proporcionar um planejamento e estratégias de conservação mais eficazes. 55 56 3. MATERIAIS E PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS 3.1. Análise hidrológica e sedimentológica Para analisar mais detalhadamente o perfil temporal dos cursos d’água do Aguapeí e Peixe acerca dos dados hidrossedimentológicos buscando compreender melhor os processos fluviais que ocorrem no mesmo, primeiramente se fez necessário acessar uma bibliografia acerca do tema proposto para o atual estudo. Após a coleta dos dados bibliográficos, iniciou- se o armazenamento das informações, esta etapa pode ser realizada in situ, visando uma observação mais detalhada do local, no entanto, esse tipo de procedimento demanda tempo e recursos, dificultando sua execução (MENEZES & MARCUZZO, 2018). No entanto, para obter os dados necessários para a análise hidrossedimentológica, também é possível utilizar dados secundários. Inicialmente, é necessário construir um banco de dados com os principais valores utilizados no estudo, sendo eles vazão e sedimentos. Para sua elaboração o acesso primário se efetuou na plataforma DAEE (Departamento de Águas e Energia Elétrica), a mesma é fornecida através do site SigRH (Sistema Integrado de Gerenciamento de Recursos Hídricos do Estado de São Paulo). O DAEE foi responsável por fornecer dados de vazão para o estudo no Aguapeí, onde a estação utilizada é nomeada Fazenda Bom Retiro, que se encontra no município de Luiziânia (7C-002), observado no Figura 18. Os dados referentes ao rio do Peixe foram coletados através do Hidroweb, a plataforma provém da plataforma ANA (Agência Nacional de Águas) que está representada no Figura 19, a estação empregada se encontra no município de Quatá (63710000). 57 Figura 18: Mapa da estação de Luiziânia (7C-002) para vazão. Fonte: Autores. Figura 19: Mapa da estação de quatá para vazão (63710000). Fonte: Autores. A utilização das plataformas de valores diferentes em cada bacia ocorre por conta da disponibilidade dos dados, é necessário obter dados completos em determinada série histórica, portanto para estudos como o proposto é essencial que haja um banco de dados com o máximo 58 de valores possíveis, assim como o posicionamento geográfico das estações se faz relevante, pois, ao estudar mais de um bacias tentando assim efetuar comparações é preferível que a coleta seja realizada em pontos semelhantes relacionados ao seu relevo e declividade, pois o mesmo é responsável por interferir na vazão de um corpo hídrico através da velocidade (MANOEL & ROCHA, 2017). Os dados de sedimentos totais em suspensão foram disponibilizados através do banco de dados Infoáguas da CETESB (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo), onde os pontos de coleta para o Rio Aguapeí foram da estação de Junqueirópolis (AGUA02800), sendo melhor visualizado no Figura 20. Já as informações para o Peixe, vieram da estação contida em Dracena (PEIX02800). Pela disponibilização dos pontos de coleta em relação aos sedimentos fica visível a forma como estão próximas dos parques, sendo eles o Parque Estadual do Aguapeí e Parque Estadual do Rio Peixe (Em amarelo nos mapas seguintes), os quais prestam uma importante função de preservação nos entornos dos locais de estudo, logo observando tais dados adquiridos, é possível detectar alterações no uso e ocupação do solo, assim como auxiliar os parques em seus planos de manejo. 59 Figura 20: Mapa da estação de Junqueirópolis para sedimentos (AGUA02800). Fonte: Autores. Figura 21: Mapa da estação de dracena para sedimentos (PEIX02800). Fonte: Autores. Com os materiais reunidos, foi iniciado a fase de manipulação dos valores adquiridos nas bases de dados em relação aos sedimentos, se utilizou do software Excel, onde para melhor organização esses valores foram separados por mês e ano, a fim de se obter maior eficácia e facilidade na correlação com os dados hidrológicos. 60 Apesar dos bancos de dados serem uma fonte de dados muito necessária a ser utilizada em pesquisas, os valores dados pelas plataformas podem apresentar algumas falhas ou erros, sendo eles advindos de erros na coleta de dados in situ, problemas na digitação, e apesar da limitação em certos âmbitos que isso acarreta, há formas de se tentar corrigir os valores, chegando a estimativas. Visando obter tabelas dos dados faltantes preenchidos, foi necessário realizar correções Primeiramente foi efetuado uma correlação entre os dados da estação, para isso é necessário se ter estações que estejam em posicionamentos geográficos semelhantes ou próximos. Utilizando da estação de Quatá (63710000) no Rio do Peixe foi possível corrigir a tabela de Luiziânia (7C-002) que apresentou valores faltantes na série histórica. Os valores de vazão que se apresentavam na tabela de Quatá foram aplicados em outra tabela Anexo I ao lado dos valores de Q (vazão) em Luiziânia onde essa correção foi efetuada. Após essa etapa, os valores foram postos em um gráfico de regressão linear como é observado o exemplo da Figura 22, este processo é necessário para obter a equação da regressão, onde ela auxilia nessa correlação para ter dados aproximados da vazão naquele local, onde o valor de X são os dados de Quatá e Y os de Luiziânia. Com a equação fornecida através da correlação dos dados entre as estações, é posto a equação no local dos dados nulos da estação de Luiziânia, assim substituindo o valor de X (valor da estação de Quatá), ao aplicar esta equação um valor estimado da vazão é fornecido. Figura 22: Gráfico de Regressão Linear. Fonte: Autores. 61 Pode ocorrer também de ser necessário realizar correções em alguns dados que se mostraram negativos ao aplicar o método, logo a partir do gráfico de regressão antes elaborado se observa pontos fora do padrão esperado, nestes casos é necessário retirar esses valores fora do padrão da tabela, com isso ao efetuar novamente a substituição dos valores nulos na tabela, com essa correção feita, os valores antes negativos se mostram positivos e com isso melhores de se trabalhar. Por meio da análise dos dados coletados, foi possível desenvolver um material que visa a facilitação de avaliação da situação atual dos corpos hídricos estudados. Na Tabela 3 e na Tabela 4, apresentados no tópico seguinte, foram correlacionados os valores médios anuais dos sedimentos suspensos totais com as médias anuais de vazão. A Tabela 3 é composta por dados de sedimentos totais em suspensão da série histórica que abrange 1979 até 2022 para o ponto de coleta do rio Aguapeí. Já para a estação selecionada para o rio do Peixe que se localiza em Dracena há dados que estão compostos na série histórica de 1979 a 2022. 3.2. Análise de Conteúdos e Elaboração da cartilha No intuito de cumprir com o propósito de informar e conscientizar a população sobre as dinâmicas hidrológicas e as implicações do uso da terra nas áreas ao redor de corpos hídricos, o projeto contou com a elaboração de um documento em formato de cartilha educativa. O documento traz uma breve explanação histórico-geográfica dos processos que formam a região do Pontal do Paranapanema através da perspectiva dos corpos hídricos, propondo ao final uma reflexão sobre a saúde dos corpos hídricos e a sua relação com seu entorno. Para a realização do levantamento de informações técnicas sobre o conteúdo abordado foi empregado o uso da bibliografia deste projeto acerca da formação histórica da região em que os corpos hídricos estão inseridos, somados a informações sobre o uso da terra nas áreas dos parques com o auxílio da plataforma MapBiomas, selecionando tal variável por conta da sua conexão com o fator sedimentos, apresentado ao longo do estudo. A cartilha está dividida em tópicos informativos, com explicações, que tem por objetivo, serem acessíveis e complementadas por algumas imagens. O conteúdo da cartilha foi determinado seguindo o critério de apresentar a região do Pontal do Paranapanema, com foco nos rios locais e sua importância histórica e econômica, ao passo em que traz informações sobre a história da exploração da re