UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JULIO DE MESQUITA FILHO” INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS E CIÊNCIAS EXATAS Trabalho de Conclusão de Curso Curso de Graduação em Geologia ANÁLISE ESTRUTURAL E GEOFÍSICA NO EMBASAMENTO DE BARRAGEM DE REJEITOS NA MINA OSAMU UTSUMI, POÇOS DE CALDAS (MG) Matheus Mistrinel Pacine Feitoza do Nascimento Prof. Dr. César Augusto Moreira (orientador) Rio Claro – SP 2019 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA Instituto de Geociências e Ciências Exatas Campus de Rio Claro MATHEUS MISTRINEL PACINE FEITOZA DO NASCIMENTO ANÁLISE ESTRUTURAL E GEOFÍSICA NO EMBASAMENTO DE BARRAGEM DE REJEITOS NA MINA OSAMU UTSUMI, POÇOS DE CALDAS (MG) Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto de Geociências e Ciências Exatas - Campus de Rio Claro, da Universidade Estadual Paulista ‘Júlio de Mesquita Filho’, para obtenção do grau de Bacharel em Geologia. Rio Claro - SP 2019 Matheus Mistrinel Pacine Feitoza do Nascimento ANÁLISE ESTRUTURAL E GEOFÍSICA NO EMBASAMENTO DE BARRAGEM DE REJEITOS NA MINA OSAMU UTSUMI, POÇOS DE CALDAS (MG) Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Instituto de Geociências e Ciências Exatas - Campus de Rio Claro, da Universidade Estadual Paulista ‘Júlio de Mesquita Filho’, para obtenção do grau de Bacharel em Geologia. Comissão Examinadora Cesar Augusto Moreira (orientador) Fernanda Teles Gomes Rosa Matheus Felipe Stanfoca Casagrande Rio Claro, 29 de novembro de 2019. ___________________________ ___________________________ Assinatura do aluno Assinatura do orientador AGRADECIMENTOS Por toda minha vida estive cercado por boas amizades, e em Rio Claro (SP) não foi diferente. Foram muitas as pessoas que contribuíram para meu crescimento acadêmico, profissional, e acima de tudo pessoal. Desta forma, não seria possível deixar a agradece-las e tentar resgistrá-las de alguma forma em minha trajetória. Agradeço aos meus pais, Reinaldo e Marli, por possibilitarem a realização do meu sonho de estudar em uma boa universidade e por estarem ao meu lado nos momentos mais difíceis da vida, me apoiando e segurando para que não desistisse nunca de caminhar. Aos meus irmãos, Phelipe e Ghabriel, por serem para mim como um porto seguro, onde sei que posso me apoiar e me alegrar. À grande República Kaizuka, meu lar por quatro anos e local onde tive o privilégio de conhecer pessoas inigualáveis, que contribuíram para a construção do homem que sou hoje. André (Ponce), Bruno (Beck), Gustavo (Job), Otávio, Marcelo, Matheus (Chupeta), Renan (Mundrungo), Rodrigo (Silte) e William, obrigado por todos esses anos juntos e pelas experiências até aqui vividas. Que o futuro nos reserve muitas outras! Aos meus colegas de classe na figura da Turmalinda, nome este dado a turma dos ingressantes de 2015, por todas as dificuldades e alegrias que vivenciamos juntos, sempre apoiando uns aos outros (“ninguém solta a mão de ninguém”). Ao meu orientador, César Augusto Moreira, por contribuir imensamente na realização deste trabalho e no meu crescimento acadêmico, através dos campos, discussões, explicações e todo suporte técnico fornecido. Por fim, agradeço a UNESP, enquanto universidade pública e de qualidade, por possibilitar e fomentar o acesso ao conhecimento científico, que é um dos agentes modeladores de fundamental importância para a sociedade e para o indivíduo. A ciência me possibilitou enxergar o mundo com outros olhos, questionar valores pré-estabelecidos, ter a liberdade de fazer minhas próprias escolhas e principalmente ser quem eu sou. A todos, meu muito obrigado! O conhecimento liberta. RESUMO A Mina Osamu Utsumi está inserida no contexto geológico do Maciço Alcalino de Poços de Caldas, na porção sudoeste do Estado de Minas Gerais. Atualmente a mina se encontra em processo de descomissionamento e enfrenta problemas relacionados a presença de surgências no afloramento do maciço rochoso sob o qual a barragem de rejeitos se insere, a jusante da mesma. Entretanto, não se sabe a procedência desse fluxo hidrogeológico, que pode ser originado tanto por um sistema natural de águas subterrâneas da região quanto pelo reservatório de rejeitos localizado a montante do afloramento. A fim de caracterizar esse fluxo hidrogeológico foi realizada uma análise estrutural através de 200 medidas no afloramento do maciço, com intuito de identificar a atitude das principais famílias de fraturas que ali ocorrem, além do levantamento de estruturas regionais por meio do software Spring. O levantamento estrutural no afloramento revelou duas principais famílias de fraturas com direção preferencial NW-SE e variações nos ângulos de mergulho, e o levantamento das estruturas regionais, ao entorno da mina, também revelou uma direção preferencial NW-SE e NE-SW, mas com predominância da primeira direção. Foi realizada também uma aquisição de dados de eletrorresistividade sobre a barragem de rejeitos, com as linhas perpendiculares ao afloramento. Esse método geofísico revelou zonas de baixa resistividade correspondentes a presença de fluxos hidrogeológicos, tanto nas porções laterais dos perfis (nos limites entre a barragem e o embasamento cristalino) quanto nas porções abaixo do barramento, no substrato rochoso. A correlação dos dados estruturais e geofísicos permitiu a identificação da origem dos fluxos hidrogeológicos que formam as surgências. Estes são causados devido a pressão que a lâmina d’água, represada no reservatório de rejeitos, exerce sobre a água em contato com o substrato rochoso. Esta relação favorece a injeção de água do reservatório nas fraturas do maciço rochoso, e essas fraturas por sua vez, se interligam formando uma espécie de caminho para a água subterrânea, que leva os fluidos por de baixo do barramento até seu extravasamento no afloramento a jusante da barragem. Palavras-chave: eletrorresistividade; surgência; fluxo hidrogeológico; fraturas; INB. Structural and Geophysical analysis on tailings dam basemant at Osamu Utsumi Mine, Poços de Caldas (MG) ABSTRACT The Osamu Utsumi Mine is located within the geological context of the Poços de Caldas Alkaline Massif in the southwestern portion of the state of Minas Gerais. It is currently in the process of decommissioning and faces problems related to the presence of water resurgence in the rock massif environment under which it is a tailings dam. However, it does not know the provenance of this hydrogeological flow, which can originate either from a natural groundwater system in the region or from the tailings reservoir located upstream. In order to characterize this hydrogeological flow, a structural analysis was performed through 200 measurements on the outcrop of the rock mass, aiming to identify an attitude of the major families of fractures that occur, as well as identification of regional structures through Spring software. The outcrop structural survey revealed two major families of NW-SE preferred direction fractures and variations in dive angles, and the survey of regional structures around the mine also revealed a preferred NW-SE and NE-SW direction, but with predominance of the first direction. An electroresistivity data acquisition was also performed on the tailings dam, with the lines perpendicular to the outcrop. This geophysical method revealed zones of low resistivity corresponding to the presence of hydrogeological flows, both in the lateral parts of the profiles (in the boundaries between the dam and the crystal basement) and in the portions below the dam, at rocky substrate. The correlation of the structural and geophysical data allowed the identification of the origin of the hydrogeological flows that form the water resurgence. These are caused by the pressure that the water slide, trapped in the tailing’s reservoir, exerts on the water in contact with the rocky substrate. This relationship favors the injection of water from the reservoir into rock mass fractures, and these fractures are interconnected, forming a kind of path to groundwater, which carries the fluids below the dam to its extravasation in the downstream outcrop from the dam. Key words: electroresistivity; water resurgence; hydrogeological flow; fractures; INB. LISTA DE FIGURAS Figura 1. Elementos estruturais de uma barragem de terra. .................................................... 13 Figura 2. Métodos construtivos de barragens de rejeito. ......................................................... 14 Figura 3. Localização da área de estudos. ............................................................................... 18 Figura 4. Localização do maciço rochoso (retângulo branco) na base da barragem de rejeitos. Os possíveis fluxos hídricos estão indicados pelas setas nas cores laranja e amarelo. ............ 20 Figura 5. Vista transversal usual de uma barragem de rejeitos. .............................................. 21 Figura 6. Mapa geológico do Maciço Alcalino de Poços de Caldas, e em destaque a área pertencente à INB. .................................................................................................................... 23 Figura 7. Mapa geológico da Mina Osamu Utsumi. ............................................................... 23 Figura 8. Afloramento estudado localizado a jusante da barragem de rejeitos. ...................... 25 Figura 9. Interface do Software Spring 5.5.5 com ênfase para o MAPC. ............................... 26 Figura 10. Interface do software stereonet 10.0 com ênfase para os dados estruturais. .......... 27 Figura 11. Métodos geofísicos. ............................................................................................... 28 Figura 12. Disposição genérica de quatro eletrodos. ............................................................... 30 Figura 13. Arranjo de eletrodos para um levantamento elétrico em 2D. ................................ 31 Figura 14. Arranjo Schlumberger. ........................................................................................... 32 Figura 15. Equipamento ABEM Terrameter LS utilizado na aquisição de dados geofísicos. 33 Figura 16. Linha de aquisição de dados em funcionamento. Eletrodo a direita ligado ao cabo por uma garra. ........................................................................................................................... 34 Figura 17. Disposição das linhas de aquisição de dados de resistividade elétrica sobre a barragem de rejeitos da MOU em amarelo e localização do afloramento estudado (retângulo branco). ..................................................................................................................................... 35 Figura 18. Arranjo dos blocos usados em um modelo juntamente com os dados dos pontos na pseudo-seção. ............................................................................................................................ 36 Figura 19. Maciço Alcalino de Poços de Caldas com padrão de fraturamento regional indicado. .................................................................................................................................................. 37 Figura 20. Diagrama de rosetas com padrão de frequência absoluta das fraturas da região do MAPC. ...................................................................................................................................... 38 Figura 21. Descontinuidades no afloramento em frente a barragem de rejeitos. .................... 39 Figura 22. Processo intempérico nas rochas potássicas. Formação de caulinita próximo às surgências. ................................................................................................................................ 39 Figura 23. Estereograma com 200 medidas estruturais. São obervadas duas concentrações de atitudes e direção preferencial das famílias de fraturas. ........................................................... 40 Figura 24. Linha 1 de aquisição de dados de eletrorresistividade representada em modelo 2D. .................................................................................................................................................. 42 Figura 25. Linha 2 de aquisição de dados de eletrorresistividade representada em modelo 2D. .................................................................................................................................................. 42 Figura 26. Linha 3 de aquisição de dados de eletrorresistividade representada em modelo 2D. .................................................................................................................................................. 43 Figura 27. Em azul e roxo são indicadas as atitudes médias das famílias de fraturas 1 e 2, respectivamente, em laranja, a atitude média regional, e em amarelo, as medidas tiradas em campo de fraturas com surgências. ........................................................................................... 45 Figura 28. Padrão de drenagem condicionado ao controle estrutural de fraturas regionais próximo à Mina Osamu Utsumi. .............................................................................................. 46 Figura 29. Projeto executivo das Barragem de Rejeitos da MOU com localização das linhas geofísicas e seus respectivos modelos bidimensionais. ............................................................ 47 Figura 30. Fluxo hidrogeológico correlacionado às duas principais famílias de fraturas do afloramento. .............................................................................................................................. 49 Figura 31. Concentração de surgências próximas ao barramento (área 1), e pouca concentração das mesmas na área 2 (mais longe da barragem de rejeitos). ................................................... 50 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 9 2. OBJETIVO ....................................................................................................................... 11 3. CONCEITOS FUNDAMENTAIS ................................................................................... 12 3.1 Barragens ................................................................................................................... 12 3.1.1 Tipos de barragens .............................................................................................. 13 3.2 Leis e órgãos fiscalizadores ....................................................................................... 15 3.3 Barragem de rejeitos .................................................................................................. 16 3.4 Principais problemas em barragens de terra .............................................................. 16 3.4.1 Recalques e trincas ............................................................................................. 16 3.4.2 Surgência ............................................................................................................ 17 3.4.3 Erosão ................................................................................................................. 17 4. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDOS .......................................................... 18 4.1 A Mina Osamu Utsumi (MOU) ................................................................................. 18 4.2 Barragem de rejeitos da MOU ................................................................................... 21 4.3 Contexto geológico regional e da MOU .................................................................... 22 5. MATERIAIS E MÉTODOS ............................................................................................. 24 5.1 Revisão bibliográfica ................................................................................................. 24 5.2 Levantamento de dados estruturais ............................................................................ 24 5.3 Análise estrutural ....................................................................................................... 26 5.4 Métodos geofísicos .................................................................................................... 27 5.4.1 Método da eletrorresistividade (ER)................................................................... 29 5.4.2 Técnica de tomografia elétrica ........................................................................... 31 5.4.3 Técnicas de arranjos ........................................................................................... 32 5.5 Aquisição de dados geofísicos ................................................................................... 32 5.6 Processamento de dados geofísicos ........................................................................... 35 6. RESULTADOS ................................................................................................................ 37 6.1 Estruturas regionais .................................................................................................... 37 6.2 Estruturas locais ......................................................................................................... 38 6.3 Resultados geofísicos ................................................................................................. 41 7. DISCUSSÃO .................................................................................................................... 44 7.1 Diagnóstico estrutural ................................................................................................ 44 7.2 Diagnóstico geofísico ................................................................................................ 46 7.3 Correlação estrutural e geofísica ................................................................................ 49 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................... 51 9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................. 52 9 1. INTRODUÇÃO As barragens, ao longo do tempo, foram utilizadas como meio facilitador do desenvolvimento de diversas civilizações. Suas utilizações são inúmeras, desde o armazenamento de água para a irrigação, abastecimento urbano e industrial, até a navegação de grandes navios, controle de cheias e recreação. Atualmente, um dos grandes usos das barragens é na mineração como barragens de rejeitos, cuja finalidade é de reter resíduos sólidos e água dos processos de beneficiamento de minério (LOZANO, 2006). Apesar da sua grande importância, muitas barragens no Brasil enfrentam o descaso com a falta de manutenção e fiscalização, o que gera um grande potencial de risco para acidentes, muitas vezes fatais, causando prejuízos ambientais, sociais e econômicos. Mesmo com as recentes tecnologias para a construção de barramentos mais seguros, muitos problemas ainda ocorrem no Brasil pois grande parte de suas barragens são antigas, e a adequação das mesmas é inviável devido a fatores econômicos, o que torna pouco atrativo para as empresas. Grandes tragédias no Brasil podem exemplificar tais riscos, como o acidente na barragem de rejeitos da mineradora Samarco no município de Bento Rodrigues, MG, em 2015 (LACAZ; PORTO; PINHEIRO, 2016); ou mais recentemente o colapso da Barragem I da Mina do Feijão, da Vale, em Brumadinho, MG (SOUZA; FELLET, 2019). Esses desastres vêm reforçar a importância dos estudos sobre a integridade física dos barramentos e das estruturas diretamente ligadas a eles, como por exemplo, o maciço rochoso que lhes oferece sustentação. Dentre os problemas geotécnicos usualmente encontrados em barragens, alguns são associados ao embasamento cristalino, que muitas vezes pode apresentar fraturas por onde ocorre a percolação e extravasamento de material contaminado, ou ainda de fluídos que contribuem para o enfraquecimento e instabilidade das estruturas de retenção de rejeitos. Próximo ao município de Poços de Caldas, no estado de Minas Gerais, as Indústrias Nucleares do Brasil (INB) coordenam uma Unidade de Tratamento de Minério (UTM), INB – Caldas. Esta unidade, o Complexo Mínero-Industrial de Poços de Caldas (CIPC), foi o primeiro complexo a produzir concentrado de urânio no Brasil, com início de suas atividades de lavra e beneficiamento do minério em 1982, na mina Osamu Utsumi. Em meados de 1995, devido ao exaurimento do minério e a descoberta de novos depósitos de minério de urânio em Caetité, na Bahia, a mina encerrou suas atividades. Após o encerramento das atividades, foi iniciada a descontaminação das instalações e terrenos (ALBERTI, 2017). O maior problema atual enfrentado pela mina são os passivos ambientais como a drenagem ácida de mina (DAM), que é gerada nas pilhas de rejeitos e de material estéril. Os sulfetos 10 metálicos presentes nestas pilhas são naturalmente oxidados quando em interação com a água meteórica e oxigênio, gerando ácido sulfúrico e causando dissolução de metais pesados e redução do pH. Entretanto, outro ponto passível de investigação e que gera preocupação é a presença de fluxos hidrogeológicos no maciço rochoso fraturado no substrato da barragem de rejeitos da mina Osamu Utsumi. Essas surgências podem ser fruto tanto de um processo natural de infiltração e acúmulo de água subsuperficial, quanto pela presença da barragem de rejeitos, cuja pressão que o corpo d’água exerce em sua base pode forçar a percolação dos fluídos por entre as fraturas das rochas do local. Esse sistema de escape de água pode significar, além do extravasamento de material contaminando para o meio ambiente, um risco a integridade física do barramento, uma vez que as superfícies de lubrificação da base das barragens podem comprometer a estabilidade e provocar o rompimento da estrutura. O Brasil possui uma vocação natural para a mineração. Seja pelo seu tamanho, seja pela quantidade de bens minerais que o país possuí, o fato é que atualmente existem várias minerações espalhadas pelo Brasil. Muitas dessas minerações possuem barragens de rejeitos, onde são dispostos os materiais residuais do processo de beneficiamento de minério. A questão é que normalmente para a construção de uma mineração, ou das próprias barragens de rejeitos, ocorre a retirada de material superficial do local, o que pode ocasionar a descompactação de estruturas geológicas, tais como fraturas, proporcionando condições semelhantes às encontradas na Mina Osamu Utsumi. Desta forma, além de identificar os fluxos hidrogeológicos que ocorrem na área da barragem de rejeitos da MOU, este trabalho poderá ser útil na avaliação da efetividade do método de eletrorresistividade para a caracterização de fluxos hidrogeológicos em maciço rochoso fraturado, o que poderá ser aplicado em área com um contexto parecido. 11 2. OBJETIVO Caracterizar o fluxo hidrogeológico no embasamento cristalino de barragem de rejeitos em uma mineração de urânio. 12 3. CONCEITOS FUNDAMENTAIS 3.1 Barragens Segundo a Agência Nacional de Mineração (ANM), barragens são estruturas de contenção ou acumulação construídas em um curso permanente ou temporário de água, cujo objetivo é de possibilitar o acúmulo de água, de substâncias líquidas ou de misturas de líquidos e sólidos. A Lei nº 12.334, de 20 de setembro de 2010 complementa e diz que por barragem se entende tanto o barramento quanto as estruturas associadas. A Agência Nacional de Águas (ANA) diz que as barragens são estruturas físicas que barram o curso d’água, e que o acúmulo d’água proporcionado pela construção das barragens é entendido como reservatório. Dentre seus diversos usos, os mais comuns no Brasil são referentes a acumulação de água, abastecimento doméstico e industrial, hidroeletricidade, deposição final de rejeitos minerais, controle de inundações e disposição de resíduos industriais. Seja qual for o uso, é fato que a instalação de uma barragem sempre gera impactos ambientais a curto e a longo prazo, além de impactos locais e muitas vezes regionais. Os problemas mais frequentes relacionados a instalação de uma barragem são: a modificações no ecossistemas e regime fluvial local, devido ao aumento da área recoberta por água; sismicidade induzida, devido ao aumento da pressão no substrato da barragem originado pelo acúmulo de material; proliferação de vetores, em especial doenças relacionadas a água; alteração na qualidade da água; submersão de locais de interesse histórico, arqueológico ou paleontológico; e alterações no microclima da região. Por outro lado, os benefícios trazidos pela adequada instalação das barragens são enormes para a sociedade, vide o potencial hidroelétrico do Brasil, que constitui grande parte da matriz energética nacional. Os componentes estruturais básicos de uma barragem são: Barramento: constitui a estrutura principal de retenção e pode ser construído por diferentes técnicas construtivas. Crista: compreende a porção superior do barramento, com largura determinada pelo tráfego sobre ela, e não pode ser inferior a 3 m. Borda livre: é referente a distância vertical da crista até o nível limite do reservatório. Essencial para evitar transbordamento. Talude de montante: é a porção do barramento em contato direto com o material armazenado. http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/Viw_Identificacao/lei%2012.334-2010?OpenDocument 13 Talude de jusante: é o lado oposto ao talude de montante, voltado para o sentido em que a drenagem corre. Ombreiras: são os locais de contato entre a barragem e o terreno natural. Vertedouro: estão estruturas hidráulicas que permitem o fluxo de água de montante para jusante, a fim de controlar o nível do reservatório. Fundação: é a área sobre a qual o barramento será construído. Além dessas estruturas, nas barragens de terra são encontrados outros elementos essenciais para sua construção (Figura 1). São eles: proteção de talude de montante, proteção de talude a jusante, trincheira de vedação, filtro horizontal, filtro vertical, dreno de pé, poço de alívio e tapete impermeável (CARVALHO, 2011). Figura 1. Elementos estruturais de uma barragem de terra. Fonte: Imagem retirada de Carvalho, 2011. 3.1.1 Tipos de barragens Os tipos de barragens podem variar de acordo com o propósito da obra, morfologia do terreno, geologia local e necessidades de retenção e os tipos de materiais utilizados em sua construção. Este último permite classificar os barramentos em barragens de concreto, de terra e enrocamento (MARANGON, 2004). 14 As barragens de concreto são divididas em barragem de concreto – gravidade, que faz uso do próprio peso para manter sua estabilidade através da transferência das cargas recebidas para a sua fundação. Segundo Marangon (2004) estas são as mais resistentes com menor custo, porém, com altura limitada; barragem de concreto – arcos, constituem estruturas de comprimento pequeno em relação à altura que é grande. São pouco comuns no Brasil devido à morfologia aplainada dos vales; barragem em abóbadas, que constituem estruturas curvadas em planta e em altura, com a convexidade direcionada para montante. As barragens de terra contemplam um tipo muito comum no Brasil. Elas são divididas em dois tipos, as homogêneas, ou seja, compostas por apenas uma espécie de material que deverá ser suficientemente impermeável, e as zonadas, que apresentam um núcleo central impermeável que é envolvido por outros materiais mais permeáveis que protegem o núcleo. Normalmente as zonas permeáveis são constituídas de areia, fragmentos de rochas, cascalho ou uma mistura com esses materiais (MARANGON, 2004). As barragens de enrocamento são aquelas que utilizam blocos de rochas de diversos tamanhos, arranjados de forma para que seja obtido o maior contato de um bloco com outro. Os espaços vazios são preenchidos por material menor, e uma membrana impermeável é alocada na face de montante (MARANGON, 2004). Além dos tipos apresentados, existem as barragens a montante, a jusante e linha de centro (Figura 2). Figura 2. Métodos construtivos de barragens de rejeito. Fonte: Araujo (2006). 15 Estes são métodos empregados quando há necessidade de ampliação da barragem. Dentre eles, o mais seguro é o método a jusante, porém, também é o mais caro. O método a montante usualmente é empregado em barragens de rejeito, e faz uso dos rejeitos já sedimentados para promover a ampliação da barragem. É um dos métodos mais baratos, entretanto, também é também um dos mais instáveis (LAGES; MANSUR, 2016). 3.2 Leis e órgãos fiscalizadores A Lei Federal nº 12.334, de 20 de setembro de 2010 é responsável por estabelecer a Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB) e criar o Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de Barragens (SNISB). Esta lei é destinada às barragens responsáveis pela acumulação de água para quaisquer usos, disposição final ou temporária de rejeitos e acumulação de resíduos industriais, cujas características físicas contemplem ao menos uma das características a seguir: “I - altura do maciço, contada do ponto mais baixo da fundação à crista, maior ou igual a 15m (quinze metros); II - capacidade total do reservatório maior ou igual a 3.000.000m³ (três milhões de metros cúbicos); III - reservatório que contenha resíduos perigosos conforme normas técnicas aplicáveis; IV - categoria de dano potencial associado, médio ou alto, em termos econômicos, sociais, ambientais ou de perda de vidas humanas, conforme definido no art. 6o.” (BRASIL, 2010, p. 1) A mesma lei define a Agência Nacional de Águas (ANA) como responsável ela organização, implantação e gerência do SNISB. Entretanto, a responsabilidade pela segurança das barragens, bem como a fiscalização fica a cargo da instituição que outorgou o direito de uso dos recursos. Por exemplo, as barragens destinadas a geração de energia devem ser fiscalizadas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel); as usadas para contenção de rejeitos industriais, estão sob responsabilidade do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e órgãos ambientais estaduais; e as de acumulação de água e usos múltiplos , sob a responsabilidade da Agência Nacional de Água (ANA). Neste mesmo sentido, o órgão regulador responsável pela fiscalização das barragens de rejeitos de mineração é a Agência Nacional de Mineração (ANM), criada em 05/12/2018 em http://legislacao.planalto.gov.br/legisla/legislacao.nsf/Viw_Identificacao/lei%2012.334-2010?OpenDocument 16 substituição ao Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM). A ANM hoje é responsável pela fiscalização dos empreendimentos destinados a pesquisa e lavra para aproveitamento mineral do Brasil, o que inclui as barragens de rejeitos de cada mineradora. Entretanto, a barragem de rejeitos da Mina Osamu Utsumi (MOU) compreende um caso de fiscalização especial, uma vez que os rejeitos lançados no reservatório da barragem contêm radionuclídeos e requerem um tratamento diferenciado visando assegurar níveis de radioatividade baixos a quase exequíveis. Para isto, a Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN), órgão este responsável pela fiscalização da barragem de rejeitos da MOU, segundo o SNISB, estabeleceu a Norma CNEN NE 1.10, Resolução CNEN 07/80, de novembro de 1980, a fim de estabelecer informações e requisitos mínimos exigidos pela CNEN para a segurança de sistemas de barram de rejeitos que contém radionuclídeos. 3.3 Barragem de rejeitos Segundo a Agência Nacional de Mineração (2019), as barragens de rejeitos de mineração são estruturas destinadas a contenção dos rejeitos oriundos dos processos de beneficiamento mineral, além dos sedimentos e água descartados ou de reuso. As características dos barramentos irão depender dos materiais utilizados em sua construção, do tipo de rejeito armazenado na bacia de decantação e do método de construção, porém normalmente compreendem taludes de jusante e montante, crista, berma de segurança, um ou mais diques e entre outras estruturas. 3.4 Principais problemas em barragens de terra 3.4.1 Recalques e trincas As barragens de terra e enrocamento são estruturas construídas através da concentração e compactação em camadas de blocos de rochas e terra. Com o passar do tempo, o material compactado continua sua acomodação em decorrência do peso da própria estrutura e da gravidade. Esta acomodação resulta em pequenos movimentos do maciço, geralmente verticais, ou até mesmo subverticais, a depender da componente lateral ali existente. Estas movimentações são de certa forma esperadas, visto as caraterísticas do material utilizado, entretanto, a porcentagem de movimentação, quando muito alta, pode gerar recalques 17 e fissuras na estrutura. Se estas movimentações forem ainda mais altas, podem ocorrer deslocamento de camadas (ANA, 2013). No caso de grandes recalques, o rebaixamento da crista da barragem poderá representar a diminuição da borda livre, e isto poderia acarretar em problemas maiores caso a água represada passasse por cima da crista. No caso de recalques diferenciais (quando regiões muito próximas sofrem quantidades de recalques muito diferentes), há possibilidade de geração de trincas nas estruturas, o que acarretaria em problemas ainda maiores, visto que para a retenção de água, a estrutura não pode ter aberturas. Ocorrem ainda trincas por ressecamento, normalmente no talude de jusante, por ser uma porção exposta ao sol e naturalmente mais ressecada. Essas trincas são de menos profundas e a princípio não oferecem grandes riscos a estruturas. Entretanto, o desenvolvimento delas por meio de águas pluviais acarretaria em grandes problemas, logo, são questões que precisam ser sanadas para garantir a segurança do barramento. 3.4.2 Surgência As surgências são ocorrem quando a água que percola pela barragem de terra ou em sua fundação surge em lugares em que não deveriam aparecer. Elas podem ser resultantes do entupimento das drenagens ou falhas do projeto e/ou construção. A saturação provocada pelas surgências podem propiciar alterações nas propriedades físicas do matérias constituintes em contato com a água, como a redução da coesão entre as partículas e superfícies de lubrificação, o que gera instabilidade no maciço (ANA, 2013). 3.4.3 Erosão A erosão é um processo de carreamento de partículas normalmente ocasionado por água ou pelo ar. Nas barragens de terra e enrocamento ela pode ocorrer de três formas principais. A primeira é referente a ação externa e superficial. A ação das águas pluviais (chuvas e enxurradas) possibilitam o desgaste superficial do talude, o que ocasiona ravinamentos, e quando mais desenvolvidos, erosões profundas; o segundo processo erosional ocorre quando há incapacidade de contenção do material, o que resulta num transbordamento das águas de numa erosão lateral; o terceiro caso ocorre quando há erosão interna (piping), o que ocasiona o carreamento do material que compõe a estrutura e que pode levar a barragem à ruptura (ANA, 2013). 18 4. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDOS 4.1 A Mina Osamu Utsumi (MOU) A Mina Osamu Utsumi (MOU) está localizada no sudoeste de Minas Gerais, próxima ao município de Poços de Caldas (Figura 3). Ela é inserida no Complexo Mineiro Industrial de Poços de Caldas (CIPC), que é operado pelas Indústrias Nucleares do Brasil (INB), e este, representa o primeiro complexo de produção de urânio do país. O CIPC fica inserido no Planalto de Poços de Caldas, no município de Caldas (MG) e ocupa uma área de 15 km² (NASCIMENTO, 1998). Figura 3. Localização da área de estudos. Fonte: Modificado do Google Earth (2019). 19 A história da MOU está intimamente ligada ao desenvolvimento da política nuclear brasileira. O país começa a desenvolver pesquisas na área a partir da década de 1930, porém, só a partir de 1945 que surge mais interesse na questão, devido ao ataque nuclear em Hiroshima (KURAMOTO; APPOLONI, 2000). Com o passar dos anos o governo brasileiro tenta estabelecer alguns acordos com países como Estados Unidos e Alemanha, entretanto, é a partir da década de 1970, com o desenvolvimento da tecnologia de ultracentrifugação pelo Centro de Tecnologia Marinha em São Paulo (CTMSP) em conjunto com o Instituto de Energia e Pesquisa Nuclear (IPEN / CNEN), que o país entra para o seleto grupo de países que dominam a tecnologia de enriquecimento de urânio. É só no final de 1982 que é registrada a primeira experiência de enriquecimento isotópico de urânio, com uso de ultracentrífugas feitas totalmente pelo Brasil (KURAMOTO; APPOLONI, 2000). Estes fatores em conjunto a crise do petróleo, na década de 70, fizeram com que o país tivesse interesse na busca de novas fontes energéticas, como a energia nuclear (CIPRIANI,2002). Desde a década de 1940 se tem conhecimento do urânio na região do Maciço Alcalino de Poços de Caldas. Sua descoberta data mais especificamente de 1948 (FRANKLIN, 2007). Com as descobertas de jazidas de caldasito (mistura de óxido e silicato de zircônio), foi iniciada a construção da Mina Osamu Utsumi, em 1959, na mesma época em que foram descobertas grandes mineralizações de urânio na região (MACIEL, 2007). Contudo, foi apenas em 1982 que as primeiras operações de produção industrial de urânio do país começaram no CIPC, através da lavra a céu aberto, do processamento físico e químico. Durante seu funcionamento, o CIPC produziu cerca de 1272 toneladas de yellow-cake (diuranato de amônio), 2,39 x 106 m³ de rejeitos de beneficiamento químico (“tailings”) e aproximadamente 4,48 x 107 m³ de rejeitos de mineração (URÂNIO DO BRASIL, 1988; FRANKLIN, 2007; MAJDALANI e TAVARES, 2001). A operação da mina consistia principalmente no processo de lavra e no beneficiamento físico e químico do material lavrado. A lavra foi iniciada após a decapagem do terreno e trabalhava com um teor de corte de 170 ppm de U3O8. O minério lavrado então passava pela cominuição, que contemplava os processos de britagem (primária e secundária), moagem e espessamento, a fim de promover a redução da granulometria do material, para que ele pudesse enfim passar pelo beneficiamento químico. Como produto final era obtido yellow cake, produto usado como matéria prima na produção dos combustíveis nucleares. A planta da MOU consiste basicamente em área da cava, onde o minério era lavrado; área administrativa; planta de beneficiamento de minérios, responsável tratamento do minério em produto final, a fim de atender as especificações do mercado; e a barragem de rejeito, onde a 20 polpa de baixo teor, proveniente do beneficiamento, era disposta para a decantação de partículas (FRANKLIN, 2007). Atualmente o CIPC é chamado de Unidade de Tratamento de Mineração (UTM), e está em processo de descomissionamento e recuperação ambiental. Órgãos fiscalizadores como o Ibama, CNEM (Comissão Nacional de Energia Nuclear) e FEAM (Fundação Estadual de Meio Ambiente de MG) acompanham o Plano de Recuperação de Áreas Degradadas (PRAD) apresentado pela mina. Dentre as problemáticas enfrentadas pela empresa no processo de descomissionamento existem aquelas ligadas a presença de surgências no maciço rochoso fraturado sob o qual a barragem de rejeitos foi construída. A origem desses fluxos hidrogeológicos pode estar a ligada tanto a presença do barramento, cuja pressão da lâmina d’água do reservatório favoreceria a injeção de água pelas fraturas do maciço, quanto a um sistema natural de escoamento superficial e subsuperficial, alimentado pelos sistemas pluviais, fluviais e aquíferos fraturados, como indicado na figura 4. Figura 4. Localização do maciço rochoso (retângulo branco) na base da barragem de rejeitos. Os possíveis fluxos hídricos estão indicados pelas setas nas cores laranja e amarelo. Fonte: Imagem retirada do Google Earth e modificada pelo autor. 21 4.2 Barragem de rejeitos da MOU A barragem de rejeitos da Mina Osamu Utsumi (Figura 5) está localizada na porção sudeste da mina, e compreende um sistema de contenção de rejeitos e uma bacia artificial de decantação para os rejeitos advindos dos processos de exploração e beneficiamento do urânio. Na Unidade de Tratamento de Minério de Caldas a sistemática adotada para a construção da barragem de rejeitos foi a mixagem e compactação de solo e rocha. O local da barragem está inserido dentro da bacia do rio Soberbo, que é separado da bacia do rio das Antas por um divisor natural de águas, uma sela topográfica. Os efluentes lançados na barragem, antes de voltarem ao curso d’água natural, são tratados em uma unidade disposta a jusante do barramento, através da adição de uma solução de cloreto de bário (BaCl2) que reduz e decanta o elemento rádio (Ra), a fim de reduzir a concentração presente. Segundo o projeto executivo da barragem de rejeitos, a estrutura constitui um corpo de eixo curvo, com raio de 380 m e 435 m de comprimento de concavidade para jusante. A crista possui cota de 1310 m e 42 m de altura em relação ao seu entorno. É um enrocamento compactado de núcleo argiloso, de dois níveis de construção expostos a jusante, com vertedouro interno e monitoramento por piezômetros. O volume de rejeito armazenado é de 1,98 x 106. O tapete drenante interno do barramento capta a água que percolada na barragem e fundação. Figura 5. Vista transversal usual de uma barragem de rejeitos. Fonte: Imagem modificada projeto executivo da barragem de rejeitos da Mina Osamu Utsumi. 22 4.3 Contexto geológico regional e da MOU A área de estudo está situada sobre o Maciço Alcalino de Poços de Caldas, parte integrante do Planalto de Poços de Caldas, uma estrutura circular, delimitada por escarpas de falhas, de formato dômico e individualizada por cristas e escarpas abruptas (COSTA; DELGADO; CARMO, 2001). É caracterizado por intrusões de magmatismo alcalino marcada por expressivas anomalias de urânio e tório e está situado próximo a borda leste da Bacia Sedimentar do Paraná, porção meridional do Escudo Atlântico. Almeida Filho e Paradella (1977) mapearam estruturas circulares através da interpretação de imagens de satélites, e estas estruturas possivelmente estão associadas à presença de cones vulcânicos. Sua evolução é inicia com sucessivas intrusões de magmatismos félsicos desenvolvidas entre 89 Ma e 54 Ma (SONOKI; GARDA, 1988; ULBRICH; ULBRICH, 2000), seguido de um domeamento e colapso do material vulcânico extravasado que resultou em uma estrutura em caldeira. Por fim, ocorreram a colocação dos fonólitos, tinguaítos e nefelina sienitos ao longo das fendas (ELLERT, 1959; ULBRICH e ULBRICH, 1992). Consequentemente as principais litologias associadas ao Maciço Alcalino de Poços de Caldas são fonólitos, tinguaítos, nefelina sienitos, foiaítos, rochas piroclásticas e sedimentares epiclásticas. (GARDA, 1990). O Maciço Alcalino de Poços de Caldas (Figura 6) apresenta uma expressiva quantidade de planos de descontinuidades, entre falhas e juntas, segundo as direções preferenciais N40E, relacionada com o processo formador da caldeira, e N60W, associada a tectônica regional (FRAENKEL et al., 1985). Segundo Almeida (1986) esse sistema de falhas é resultado da reativação tectonomagmática da plataforma Sul-Americana. As rochas predominantes na mina Osamu Utsumi (Figura 7) são os nefelina sienitos e fonólitos, que são cortados por diques de fonólitos e brechas vulcânicas. As mineralizações de urânio estão principalmente concentradas na matriz das brechas vulcânicas e são resultado da alteração metassomática e hidrotermal das rochas encaixantes. A forma de ocorrência do urânio é como minerais de uraninita e pechblenda, que ocorrem disseminados nos poros das rochas. 23 Figura 6. Mapa geológico do Maciço Alcalino de Poços de Caldas, e em destaque a área pertencente à INB. Fonte: Modificado por Alberti (2017) de Fraenkel et al (1985). Figura 7. Mapa geológico da Mina Osamu Utsumi. Fonte: Capovilla (2001). 24 5. MATERIAIS E MÉTODOS 5.1 Revisão bibliográfica Esta etapa consiste na leitura dos principais trabalhos realizados na área de estudo, tanto em caráter regional, por meio do estudo das características do Maciço Alcalino de Poços de Caldas, contexto geológico no qual a mina Osamu Utsumi está inserida, quanto em caráter local, ou seja, os trabalhos já realizados na própria mina. Além disso, nesta etapa foi realizada a fundamentação teórica e compilação dos principais conceitos ligados ao tema do trabalho, especialmente os que discutem as características das barragens, leis, órgãos fiscalizadores, aplicação de métodos geoelétricos e conceitos para o levantamento de dados estruturais. 5.2 Levantamento de dados estruturais As feições estruturais abordadas no trabalho foram principalmente fraturas encontradas dispostas por todo afloramento do maciço rochoso localizado a jusante da barragem de rejeitos. Foi estudado também o padrão estrutural da área através da bibliografia referente ao Maciço Alcalino de Poços de Caldas (MAPC) e dos elementos estruturais como drenagens presentes no entorno da mina. Todo o processo de aquisição de dados de geologia estrutural foi desenvolvido em três etapas. A primeira etapa foi a identificação do padrão estrutural na região do MAPC através do estudo bibliográfico de trabalhos contidos na literatura. Nestes trabalhos foram estudados os lineamentos regionais da área. A segunda etapa consistiu na visita a área de trabalho, identificação do afloramento a ser estudado (Figura 8) e na aquisição de dados estruturais por meio da medida das atitudes dos planos de descontinuidades do maciço rochoso. Um total de 200 planos de fraturas foram estudados em um único afloramento de cerca de 60 m de comprimento por 3 m de altura, localizado paralelamente ao eixo central da barragem de rejeitos. As medições foram realizadas com o auxílio de uma bússola Clar (direção do mergulho / megulho), e a declinação magnética da encontrada para a área é de 21° 37’. Dentre as medidas realizadas, algumas foram feitas em fraturas com a presença de surgências, a fim de identificar a quais famílias de fraturas estas pertencem e definir o padrão para o fluxo hidrogeológico atuante. 25 Figura 8. Afloramento estudado localizado a jusante da barragem de rejeitos. Fonte: Autor. A terceira etapa foi a análise do padrão estrutural regional por meio do software Spring 5.5.5 Português 64 bits (Figura 9), disponível para download gratuitamente pelo site do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Para isto, foram baixadas imagens do satélite LANDSAT-8, sensor OLI e TIRS, do catálogo de imagens do INPE, que recobriam toda a área do MAPC. Em seguida, a imagem foi ampliada para as regiões do entorno da MOU para a realização de um estudo de sensoriamento remoto de melhor definição. No tratamento da imagem foi aplicada a ferramenta de contraste para aumento da escala de cinza e o filtro passa- alta, ideal para estruturas de variação abrupta, como as drenagens e fraturas. As composições coloridas em RGB foram feitas através do uso das bandas 4 e 5 do LANDSAT-8, a fim de 26 destacar as estruturas geológicas. Por fim, foi feita a edição vetorial dos elementos estruturais da região e aplicada uma análise de lineamentos por meio da análise exploratória, o que resultou num diagrama de rosetas de frequência absoluta, que indicou a direção preferencial estrutural da região. Nestas medidas não foi possível identificar o ângulo de mergulho das fraturas, uma vez que as atitudes não foram tiradas em campo, o que torna possível reconhecer apenas a direção dos fraturamentos. Figura 9. Interface do Software Spring 5.5.5 com ênfase para o MAPC. Fonte: Autor. 5.3 Análise estrutural A análise estrutural teve por objetivo a correlação e interpretação dos dados estruturais encontrados em afloramento, por meio da medição das atitudes dos planos de fraturas; com os padrões estruturais regionais encontrados pelo software Spring 5.5.5; e os elementos geológicos estruturais descritos na bibliografia do MAPC. Para isto, foi feito o processamento dos dados estruturais encontrados no maciço rochoso através do software Stereonet 10.0 (Figura 10). Nele foram inseridos dados das atitudes de 200 planos de fraturas por meio de arquivos txt, no formato dip dir/dip, com o intuito de identificar as famílias de fraturas de maior relevância. Após a inserção dos arquivos foi realizado o 27 tratamento de dados, que consistiu no cálculo dos polos dos planos das descontinuidades e a aplicação de contornos para delimitação das famílias. Figura 10. Interface do software stereonet 10.0 com ênfase para os dados estruturais. Fonte: Autor. O programa utilizado consiste em um software para tratamento de dados estatísticos estruturais que possibilita análises e interpretações geológicas. Através dele é possível realizar a projeção espacial de lineamentos e planos o que possibilita a identificação de padrões, direções preferenciais e relações geométricas, a depender do objeto de estudo. Segundo Carneiro (1996), as projeções estereográficas são amplamente utilizadas na geologia estrutural. As projeções podem ser feitas através de dois tipos de rede, a rede de Wullf, que possui ângulos de mesmas dimensões, e a rede de projeção Schmidt, que possui área de distribuição igualitária. Esta última foi utilizada no trabalho, visto que é a mais adequada para as feições planares como os planos de descontinuidades. 5.4 Métodos geofísicos A geofísica é a ciência que estuda as estruturas internas da Terra, bem como a localização de materiais delimitados segundo os contrastes de suas propriedades físicas em relação ao meio 28 em que o material é encontrado. Para isto, usa medidas tomadas em superfície, seja em terra, água ou em levantamentos aéreos (ORELLANA, 1972). As propriedades físicas encontradas nos materiais são velocidade de propagação de ondas sísmicas, elásticas, resistividade elétrica, densidade, cargabilidade, potencial elétrico natural, propriedades magnéticas, radioativas, além de outros. A partir do contraste dessas propriedades físicas com os elementos que compõem a Terra, é possível obter uma avaliação qualitativa e quantitativa. Os métodos geofísicos (Figura 11) mais comuns encontrados na literatura são os métodos sísmicos, os potenciais, que são divididos em gravimetria e magnetometria, os geotérmicos e os métodos geoelétricos, utilizados neste trabalho. Figura 11. Métodos geofísicos. Fonte: Autor. Dentre a atuação dos métodos geoelétricos, são destacados o mapeamento de plumas de contaminação, identificação de zonas de vazamento em barramentos, locação de poços, determinação da profundidade de um corpo rochoso, mapeamento do nível freático e identificação de zonas de infiltração em maciços rochosos, este último é foco deste trabalho. Uma das principais vantagens da utilização desses métodos está em sua natureza indireta, o que significa a não necessidade de grandes alterações físicas no terreno estudado. GEOFÍSICA ELÉTRICOS ELETRORRESISTIVIDADE TÉCNICA DE TOMOGRAFIA ELÉTRICA (Utilizada neste trabalho) POLARIZAÇÃO INDUZIDA POTENCIAL ESPONTÂNEO ELETROMAGNETICOS MAGNÉTICOS SÍSMICOS GRAVIMÉTRICOS RADIOATIVOS 29 Os métodos geoelétricos são baseados na indução e detecção em superfície de sinais elétricos artificiais (com exceção do método do potencial espontâneo) em corpos condutores de campos elétricos e magnéticos que estão em subsuperfície. Os métodos mais comuns são os de eletrorresistividade, que usa como parâmetro físico a resistividade elétrica; a polarização induzida, que capta variações de voltagem em função do tempo ou frequência; os de pontencial espontâneo, que usa o potencial natural gerado pelo próprio material; o eletromagnético, que usa a condutividade e o radar de penetração, que faz uso da constante de permissividade. No desenvolvimento deste trabalho o método geoelétrico utilizado foi o de eletroresistividade (ER), a fim de identificar zonas de fluxos hidrogeológicos em maciço fraturado. 5.4.1 Método da eletrorresistividade (ER) Segundo Musset e Khan (2000, p.181) a resistividade das rochas normalmente depende da quantidade de água subterrânea e da quantidade de sais dissolvidos no local investigado, além da presença de minerais metálicos e altas temperaturas. Os principais usos do método de eletroresistividade são para o mapeamento de rochas com diferentes porosidades, como na hidrogeologia para a localização de aquíferos e áreas contaminadas, além da prospecção mineral e detecção de zonas de fluxos hidrogeológicos. É importante ressaltar que geralmente os solos e rochas em subsuperfície terrestre apresentam alta resistividade, entretanto, esses materiais quando apresentam água percolando dentre suas fraturas e poros podem virar condutores (ERNESTO & USSAMI, 2002) e consequentemente permitem o contraste de resistividade. Este fato torna viável a utilização da ER na aquisição de dados geofísicos para o trabalho. O método de ER é baseado na Lei de Ohm que define a seguinte equação: (Equação 1) em que ρ é a resistividade, R é a resistência, L é o comprimento e S é a seção transversal do condutor. A resistividade irá depender da natureza e do estado físico do material em questão. A partir disso, têm que a resistividade elétrica pode ser dada através da equação: (Equação 2) 30 Logo, a resistividade pode ser entendida como a resistência que um material oferece à passagem da corrente elétrica, ou seja, é o produto de uma resistência elétrica por uma longitude, com a unidade expressa por ohm.m. Autores como Keller e Frischknechy (1966) dizem que quando se considera a subsuperfície da Terra como uma estrutura homogênea e isotrópica, o estudo teórico da resistividade elétrica das rochas fica mais simples. Telford et al. (1990) introduz uma equação para o cálculo do potencial elétrico para o caso de haver uma fonte de corrente pontual em superfície de um semi-espaço. Esta é descrita como (Equação 3) Onde V é o potencial elétrico em um determinado ponto a uma distância r, a corrente elétrica I e ρ a resistividade do meio. Quando a disposição dos eletrodos é considerada como na Figura 12, a diferença de potencial entre M e N é tida por Figura 12. Disposição genérica de quatro eletrodos. Fonte: Borja (2018). (Equação 4) Quando a resistividade é isolada nesta equação, resulta em (Equação 5) 31 É possível reduzir a equação quando se considera o conceito do fator geométrico K, que representa o arranjo dos eletrodos. É obtida então a equação (Equação 6) Segundo Parasnis (1962), com os valores da corrente, a diferença potencial e a geometria, é possível calcular o valor de resistividade. No caso do semi-espaço ser formado por rochas que possuam variações verticais ou laterais de valores de resistividade, a resistividade ρ varia em conjunto com o arranjo geométrico. Telford et al. (1990) reforça que em geral, o valor obtido normalmente representa a resistividade aparente (ρa). 5.4.2 Técnica de tomografia elétrica Na aquisição de dados de resistividade elétrica por meio da tomografia elétrica, usualmente é observada uma configuração típica de investigação. Dependendo do propósito do trabalho, a distância entre os eletrodos é constante, e estes então são colocados de forma adjacente em linha preferencialmente reta. Então, o cabo multi-core é acoplado a unidade de comutação eletrônica que está conectada a um laptop. Por fim, um arquivo de texto é inserido no software com informações como a sequência de medições que irão ser tomadas, a corrente elétrica necessária, o tipo de matriz a ser usada, entre outros parâmetros usados na medição. Figura 13. Arranjo de eletrodos para um levantamento elétrico em 2D. Fonte: Loke (2000). 32 É importante ressaltar que a aquisição de dados de resistividade elétrica pode ser feita por diferentes modos básicos de operação, através de configurações típicas de aquisição 2D (Figura 13), como o Profiling (mapeamento), a Sondagem combinada e perfilhamento (imagens 2D), Sondagem Elétrica Vertical (VES); Análise de Resistência Tridimensional; e Tomografia de Resistividade Elétrica (ERT), este último utilizado na aquisição de dados do trabalho. 5.4.3 Técnicas de arranjos A técnica de arranjo utilizada neste trabalho é conhecida como Schlumberger (Figura 14). Segundo Everett (2013, p. 77), a técnica consiste na disposição de quatro eletrodos colocados simetricamente ao ponto médio do arranjo. Enquanto os eletrodos M e N, espaçados a uma distância b, medem a diferença de potencial, os eletrodos A e B introduzem a corrente elétrica no solo, e ficam espaçados a uma distância de 2a. Através da técnica de Schlumberger é possível obter uma excelente resolução de penetração em profundidade, a depender das separações de AB, entretanto, a matriz possui resolução lateral limitada, visto que foi projetada para sondagens geofísicas verticais. Figura 14. Arranjo Schlumberger. Fonte: Everett (2013). 5.5 Aquisição de dados geofísicos As medidas de eletrorresistividade foram obtidas através da técnica de tomografia elétrica aplicada sobre a barragem de rejeitos da Mina Osamu Utsumi. O equipamento utilizado para tal foi o resistivímetro ABEM Terrameter LS feito na Suécia, de potência de 250W, corrente máxima de 2,5 A, 84 canais e resolução de 1μV (ABEM Instrument AB, 2012) (Figura 15). O Resistividade superfície 33 sistema contempla a aquisição de dados para Polarização Induzida (PI), Eletrorresistividade (ER) e Potencial Espontâneo (PE). Para o funcionamento do equipamento é necessário acoplar uma bateria, neste caso uma bateria de carro, que fornece energia para os sistemas. Os cabos de aquisição de dados são plugados no equipamento e estendidos de forma retilínea sobre a área a ser estudada e a cada 6 metros são fincados eletrodos no solo, seguindo a direção do cabo. Figura 15. Equipamento ABEM Terrameter LS utilizado na aquisição de dados geofísicos. Fonte: Foto registrada em campo. Por fim, presilhas metálicas são conectadas nos eletrodos (Figura 16) e em pontos específicos do cabo, os eletrodos são molhados com água, a afim de melhorar os contatos do aparelho com o solo, e o equipamento é ligado. O tempo de aquisição de dados varia de acordo com o tamanho da linha montada. 34 Figura 16. Linha de aquisição de dados em funcionamento. Eletrodo a direita ligado ao cabo por uma garra. Fonte: Foto registrada em campo. Em campo, foram feitas 3 linhas de aquisição de dados (Figura 17), a primeira (linha 1) com cerca de 156 m de comprimento, localizada na crista da barragem; a segunda e terceira nas bermas do talude, com aproximadamente 230 m de comprimento e paralelas entre si, com espaçamento de 14 m. A disposição das linhas foi transversal a barragem, com sentido NE/SW de forma a recobrir as porções próximas ao afloramento do maciço rochoso estudado. O espaçamento dos eletrodos foi de 6 m entre si, tamanho este definido segundo o tamanho e a profundidade da barragem de rejeitos. O método aplicado permitiu a coleta de dados de resistividade aparente, que por sua vez corresponde a um valor de resistividade que o meio teria caso ele fosse homogêneo, não representando o valor de resistividade verdadeiro do local (BORGES, 2002) 35 Figura 17. Disposição das linhas de aquisição de dados de resistividade elétrica sobre a barragem de rejeitos da MOU em amarelo e localização do afloramento estudado (retângulo branco). Fonte: Imagem retirada do Google Earth e modificada pelo autor. 5.6 Processamento de dados geofísicos O processamento dos dados geofísicos foi realizado através do software RES2DINV, que é um programa de computador que determina automaticamente um modelo de resistividade bidimensional (2D) de acordo com os dados obtidos em superfície de pesquisas de imagens elétricas (GRIFFITHS; BARKER 1993). O programa é baseado no Windows, e todas as placas gráficas e impressoras compatíveis com o mesmo. O programa foi projetado para processar grandes conjuntos de dados, até 21000 pontos de dados, coletados através de um sistema com grande número de eletrodos (cerca de 25 a 16.000). O processamento usado pelo programa consiste em vários blocos retangulares 36 (Figura 18). A disposição dos blocos é ligada à distribuição dos pontos coletados. A distribuição e tamanho dos blocos são gerados automaticamente pelo programa, por meio da distribuição dos pontos de dados como um guia aproximado. A aquisição de dados normalmente é feita através de um sistema em que os eletrodos são dispostos ao longo de uma linha reta com espaçamento constante entre os eletrodos adjacentes, entretanto, o programa também consegue processar conjuntos de dados com eletrodos não uniformemente espaçados (RES2DINV ver. 3.59, 2010). Figura 18. Arranjo dos blocos usados em um modelo juntamente com os dados dos pontos na pseudo-seção. Fonte: RES2DINV ver. 3.59 (2010). Foram inseridos no RES2DINV os valores de resistividade aparente e a localização dos eletrodos adquirios pelo Terrameter através de um arquivo em formato de txt. Posteriormente as informações foram lidas pelo software que subdivide o substrato em diferentes porções, por meio da modelagem estatística baseada no método de mínimos quadrados a fim de se obter o valor de resistividade coerente para cada porção do perfil. Por fim, é elaborado um modelo 2D que contém os valores de resistividade elétrica em função da variação lateral e da profundidade. A intenção é que os valores de resistividade aparente calculados pelo programa sejam próximos aos encontrados em campo. 37 6. RESULTADOS 6.1 Estruturas regionais O padrão de faturamento regional (Figura 19), aqui representado principalmente pelas drenagens e lineamentos presentes na área do MAPC, indicam duas direções preferenciais, a primeira e predominante NW-SE, e a segunda NE-SW. No entorno da Mina Osamu Utsumi são observadas essas mesmas direções preferenciais nas drenagens. Já no entorno do MACP são observadas fraturas nas bordas que acompanham a forma do mesmo, com direções preferenciais diferentes daquelas obtidas em seu interior. Figura 19. Maciço Alcalino de Poços de Caldas com padrão de fraturamento regional indicado. Fonte: Autor. O diagrama de rosetas de frequência absoluta gerado a partir do Spring 5.5.5 (Figura 20) indica uma frequência maior de elementos estruturais com direções que variam entre N60W e N75W, o que pode ser observado em azul escuro no diagrama. Os elementos com direção preferencial entre N30W e N45W, descritos em marrom no diagrama, são o de segunda maior ocorrência na aquisição realizada, seguidos dos elementos com direção que variam entre N15W 38 e N30W, mostrados na cor branca. Dos menores valores observados são destacados em vermelho os que variam de N60E a N75E, verde claro entre N45E e N60E, e azul (menor valor) com variação entre N30E e N45E. Em termos gerais, a porção NW do diagrama de rosetas apresenta uma quantidade de elementos estruturais expressivamente maior quanto comparada a porção NE. Ocorrem ainda alguns elementos com valores próximos a E-W. Figura 20. Diagrama de rosetas com padrão de frequência absoluta das fraturas da região do MAPC. Fonte: Autor. 6.2 Estruturas locais O afloramento estudado tem cerca de 60 m de comprimento por 3 m de altura e é um dos poucos locais nas proximidades onde ocorre a exposição do maciço rochoso. Ele é composto por rochas potássicas intensamente fraturadas, de coloração bege e intemperizadas (Figura 21). As fraturas estão dispostas de forma plana, paralela e cruzadas, indicando mais de uma família de fraturas. Seu espaçamento que varia de muito denso a denso (< 5 cm até 30 cm de espaçamento), com persistência horizontal e sem preenchimento mineral aparente. Por vezes ocorre a presença de caulinita (material esbranquiçado) nas rochas do afloramento, porém, em maior concentração próximas das fraturas com surgências (Figura 22). Acima do afloramento há um perfil de solo pouco desenvolvido, de coloração escura e encoberto por uma vegetação rasteira com alguns blocos de rochas esparsos pelo local. Este está presente até o topo da colina. No contato entra a rocha inalterada e o solo ocorre, em alguns pontos, o extravasamento de fluídos. 39 Figura 21. Descontinuidades no afloramento em frente a barragem de rejeitos. Fonte: Autor. Figura 22. Processo intempérico nas rochas potássicas. Formação de caulinita próximo às surgências. Fonte: Autor. 40 Através do levantamento estrutural foram identificadas duas famílias principais de fraturas, cuja direção preferencial é NW-SE (Figura 23). A primeira (F1) é marcada pela atitude média 016/70 (notação clar), referente a fraturas com direção NW e alto ângulo de mergulho; a segunda família (F2) é indicada pela atitude média 020/32, referente a fraturas cuja direção também é NW, entretanto, com baixo ângulo de mergulho. As outras fraturas encontradas no maciço rochoso, por ocorrem com baixa frequência, não têm significância estatística e formam sub-famílias de fraturas secundárias com pouco valor para o projeto. Foram registradas 46 descontinuidades para a família 1 e 43 para a família 2. Dentre as medidas de fraturas feitas em campo, três delas foram realizadas em descontinuidades onde havia percolação de fluídos. A direção preferencial dessas fraturas é dada pelas atitudes 043/41, 071/58 e 025/36. Figura 23. Estereograma com 200 medidas estruturais. São obervadas duas concentrações de atitudes e direção preferencial das famílias de fraturas. Fonte: Autor. Na Tabela 1 estão listadas as atitudes das principais fraturas e famílias de fraturas. Tabela 1. Levantamento estrutural (principais fraturas e famílias de fraturas encontradas). Fraturas Quantidade Rumo Mergulho Família 1 (F1) 46 016 70 Família 2 (F2) 43 020 32 Fratura com surgência 1 1 043 41 Fratura com surgência 2 1 071 58 Fratura com surgência 3 1 025 36 Fraturas Spring 5.5.5 130 N70W x Fonte: Autor. 41 6.3 Resultados geofísicos Os valores de resistividade aparente para cada linha de aquisição geofísica foram discutidos e interpretados através de perfis bidimensionais feitos no software RES2DINV. Cada perfil 2D fornece dados sobre a resistividade aparente em função da profundidade e do comprimento da linha. Os valores de resistividade aparente, dados em ohm.m, variam segundo as características dos materiais presentes na área de estudo. Nesses perfis, as cores frias indicam baixa resistividade, enquanto que as cores quentes indicam áreas de maior resistividade. Na tabela 2 podem ser observados os valores de referência. Tabela 2. Valores baixos, médios e altos de resistividade aparente usados neste trabalho. Fonte: Autor. A linha 1 (Figura 24), realizada no topo do barramento, é a de menor comprimento, com aproximadamente 156 m de comprimento com uma profundidade de 35 m, e foi posicionada no sentido SW-NE. Nela podem ser observados valores altos de resistividade nas porções superiores do perfil, que chegam a mais de 600 ohm.m nas zonas próximas a crista da barragem, representado pelas variações de vermelho, entre as cotas de 1300 m e 1310 m, que varia para valores menores nas extremidades (153 ohm.m) representado pelas cores laranja e amarelo. Ocorrem nas porções laterais do perfil, entre as cotas 1300 m e 1285 m, valores de resistividade muito baixos (entre 5 ohm.m a 19,6 ohm.m) marcados pelas variações dos tons de azul e destacados pelo tracejado branco. No lado SW (A), esses valores baixos de resistividade estão presentes dos 24 m até os 72 m de comprimento da linha, enquanto que no lado NE (B), eles são iniciados no comprimento de 99 m e vão até 123 m. Nesta mesma cota a porção central do perfil oferece valores médios de resistividade, indicados pela cor amarela (153 ohm.m). Os 10 m restantes (entre as cotas 1285 m a 1275 m) são marcados por porções de baixa a média resistividade representados nas cores amarelo e verde, com predomínio deste último no lado SW e predomínio do primeiro no lado NE. 42 Figura 24. Linha 1 de aquisição de dados de eletrorresistividade representada em modelo 2D. Fonte: Autor. A linha 2 (Figura 25) possui cerca de 45 m de profundidade na sua parte central por aproximadamente 230 m de comprimento, disposta segundo a direção SW-NE. A profundidade é diferente da linha anterior em decorrência do comprimento da linha. Nela são observados valores resistividade aparente predominantemente elevados no topo, acima de 303 ohm.m nas porções centrais, representados pelas tonalidades de vermelho e valores menores na borda NE, com mudança para cores frias até o verde claro. Entre as cotas 1260 m e 1285 m são observadas zonas de baixa resistividade que atingem valores de cerca de 19,6 ohm.m (C). Estas zonas, assim como no perfil anterior, estão concentradas nas porções laterais do modelo 2D, enquanto que a porção central apresenta valores de cerca de 153 ohm.m, representada pela coloração amarela. Na porção inferior restante é observado o mesmo padrão de cor (amarelo) da região central do modelo, com uma pequena variação para valores de resistividade maiores no canto sudeste da figura, acima de 303 ohm.m. Figura 25. Linha 2 de aquisição de dados de eletrorresistividade representada em modelo 2D. Fonte: Autor. 43 A linha 3 (Figura 26) também é disposta segundo a direção SW-NE, com aproximadamente 230 m de comprimento e cerca de 45 m de profundidade, que atingem valores de cota maiores no lado SW. Nela são observadas zonas de baixa resistividade caracterizadas pelas cores azul claro e variações de azul na porção SW do perfil. Ainda, no comprimento 84 m entre as cotas 1270 m e 1275 m pode ser observada uma zona circular de baixa resistividade (cerca de 19,6 ohm.m) acompanhada por uma aureola de resistividades com valores superiores. As porções de média resistividade, representadas pelos tons de verde escuro, laranja e amarelo, predominam neste perfil, e estão dispersas nas porções centrais e leste do mesmo. Nestas áreas os valores de resistividade aparente variam de 38,9 ohm.m a 153 ohm.m. Já as zonas de alta resistividade do perfil estão concentradas na porção superior modelo 2D, do comprimento de 96 m a 204 m, entre as cotas 1273 m a 1285 m, representadas pelos tons de vermelho. Essa última linha foi feita em uma bancada mais baixa, e atinge cotas mais inferiores do que as demais, e é interessante para a investigação do substrato rochoso. Figura 26. Linha 3 de aquisição de dados de eletrorresistividade representada em modelo 2D. Fonte: Autor. 44 7. DISCUSSÕES 7.1 Diagnóstico estrutural O padrão de faturamento regional obtido neste trabalho indica um controle estrutural do Maciço Alcalino de Poços de Caldas dado por descontinuidades nas direções NE-SW e NW- SE, esta última é a que predomina. Tal padrão corrobora com o estudo feito por Scudino (1992), que identifica para as grandes estruturas rúpteis do MAPC uma orientação preferencial N55- 60W e N30-45E. Para Scudino, as direções NE estariam relacionadas ao aparelho vulcânico, enquanto que as direções NW estariam associadas ao embasamento cristalino. O levantamento estrutural realizado no afloramento sugere a presença de duas famílias de fraturas, ambas com direção NW-SE, mas com variações no ângulo de mergulho. Essa configuração das famílias de fraturas, apesar de sugerir a interação das mesmas com o reservatório de rejeitos, visto que seu prolongamento as projetam para o substrato da barragem, não é o suficiente para explicar o extravasamento dos fluídos. Para que haja um fluxo hidrogeológico, além de existirem descontinuidades no maciço é necessário que elas estejam dispostas espacialmente e conectadas, a fim de permitir a movimentação dos fluídos em meio fraturado. O estudo realizado na Mina Osamu Utsumi indica que as fraturas analisadas na apresentam grande persistência (continuidade vertical e horizontal), assim como sugere ISRM (1993), e que o espaçamento entre as descontinuidades presentes no afloramento ocorre de forma adensada. Essa interação dos parâmetros, persistência e espaçamento, seria capaz de propiciar uma boa condutividade hidráulica no maciço rochoso, o que permitiria o escape dos fluídos armazenados pela barragem por entre as fraturas do afloramento. Na figura 27 estão indicadas as direções preferenciais de faturamento presentes no afloramento estudado. Em amarelo, estão descritas as atitudes de planos de fratura que apresentavam surgências durante o estudo. Estas possuem direção NW-SE com variação nos ângulos de mergulho de 36° a 58°. A linha roxa indica a direção preferencial da família de fraturas 2, cuja atitude média é dada como 020/32. O prolongamento desta família também resultaria a interceptação do substrato rochoso logo abaixo da barragem de rejeitos. A linha em azul claro representa a direção preferencial da família de fraturas 1, cuja direção média da família é dada pela atitude 016/70. Esta última família foi a que concentrou maior número de atitudes durante o levantamento estrutural, entretanto, devido a pouca diferença referente as quantidades de fraturas entre as 45 famílias 1 e 2 e a grande proximidade de suas direções preferenciais, as duas famílias representam o padrão estrutural local para o maciço rochoso estudado. Figura 27. Em azul e roxo são indicadas as atitudes médias das famílias de fraturas 1 e 2, respectivamente, em laranja, a atitude média regional, e em amarelo, as medidas tiradas em campo de fraturas com surgências. Fonte: Imagem retirada do Google Earth e modificada pelo autor. Tomando por base os resultados obtidos no levantamento estrutural, é possível levantar a hipótese de que as surgências sejam originadas pela interação das fraturas do maciço rochoso com os fluídos armazenados pela barragem de rejeitos. A conexão entre essas fraturas serviria como um caminho para o fluxo hidrogeológico o que permitiria o extravasamento de água. Entretanto, existe outra hipótese a ser abordada. Esta outra hipótese sugere que as surgências sejam originadas por aquíferos fraturados presentes na região. Dado o caráter das fraturas regionais e locais, seria possível a movimentação de um fluxo hidrogeológico de origem natural (alimentado por chuvas, rios e aquíferos fraturados) por entre o maciço rochoso, o que poderia resultar no extravasamento de água pelas fraturas onde o maciço aflora. Trabalhos como o de Waber et. al (1992) sugerem a existência de um forte controle estrutural na rede de drenagem do Maciço Alcalino de Poços de Caldas, cujos canais fluem de 46 sudeste para noroeste. Ainda, o IPT (1976) e Alberti (2017) argumentam que as fraturas da Mina Osamu Utsumi com direção NW são de suma importância para a movimentação das águas dentro do maciço rochoso, visto que o abastecimento da Bacia Hidrográfica do Ribeirão das Antas é feito por meio delas. A figura 28 demonstra o padrão estrutural das drenagens ao redor da MOU. Figura 28. Padrão de drenagem condicionado ao controle estrutural de fraturas regionais próximo à Mina Osamu Utsumi. Fonte: Targa (2018). 7.2 Diagnóstico geofísico Os modelos bidimensionais de eletrorresistividade obtidos no trabalho indicam porções secas (alta resistividade), úmidas (média resistividade) e zonas saturadas (baixa resistividade). As zonas saturadas são interpretadas, neste trabalho, como aquelas cujos valores de resistividade são inferiores a aproximadamente 30 ohm.m. Os valores obtidos nos modelos 2D de eletrorresistividade estão relacionados ao local da barragem em que as linhas de aquisição foram feitas (Figura 29). 47 Figura 29. Projeto executivo das Barragem de Rejeitos da MOU com localização das linhas geofísicas e seus respectivos modelos bidimensionais. Fonte: Imagem modificada do projeto executivo da empresa e perfis feitos pelo autor. 48 A linha 1, realizada na crista da barragem de rejeitos, apresenta altos valores de resistividade nas porções superiores em decorrência do enrocamento da barragem, feito com blocos de rochas e material de menor granulação para preencher os espaços entre blocos. Já os valores de baixa resistividade presentes no restante do perfil são o resultado da interceptação do tapete drenante da barragem, indicado na figura 29 como núcleo de material argilo-siltoso compactado, responsável por canalizar a água que infiltra no enrocamento a montante para as saídas por baixo do barramento. Já a linha 2 foi realizada em uma berma logo abaixo, após o tapete drenante. Esta não apresenta tantos valores de baixa resistividade como no perfil anterior pois não intercepta o tapete drenante, além de ela ter sido realizada próxima ao meio do enrocamento, sobre os blocos de rochas e materiais menores como silte e argila. Entretanto, nela podem ser observados alguns valores menores de resistividade em suas laterais. Isso ocorre, pois, estas zonas marcam o limite entre a construção do barramento e o maciço rochoso fraturado. Desta forma, o perfil da linha 2 indica uma infiltração de água no enrocamento ocasionado por fluxos hidrogeológicos provenientes das descontinuidades do maciço rochoso fraturado. A definição exata dos limites entre o barramento e o maciço rochoso é difícil de ser obtida uma vez que o enrocamento da barragem é feito com material semelhante ao do maciço. A linha 3, por sua vez, é a de maior importância para o trabalho, pois esta, intercepta tanto o final do barramento quanto parte do maciço rochoso sobre o qual a barragem se insere. Nesta linha, as porções de alta resistividade localizadas no meio do perfil são referentes ao final do barramento (sinalizado pela linha pontilhada preta), visto que este foi construído em formato trapezoidal, ou seja, sua porção inferior tem comprimento menor que a superior (crista). O restante das informações é interpretado como maciço rochoso. Neste perfil, a porção superior esquerda (D), caracterizada por baixa resistividade, indica a presença de fraturas saturadas por água. O mesmo acontece com a zona circular indicada pela letra E, que indica a presença de um fluxo hidrogeológico dentro do maciço rochoso. É interessante notar que as porções de baixa e média resistividade no perfil fazem um caminho da lateral esquerda (zona menos resistiva) para a direita (zona de resistividade média) o que sugere uma conexão entre as fraturas (indicado pela linha preta contínua). Logo, através da geofísica é possível inferir a presença de fluxos hidrogeológicos que ocorrem por de baixo da barragem de rejeitos. O mais interessante deles para o projeto, é o indicado pela letra E, localizado pela linha de aquisição de dados 3. 49 7.3 Correlação estrutural e geofísica Através dos estudos estrutural e geofísico realizado na área da barragem de rejeitos da Mina Osamu Utsumi, foi possível correlacionar dados sobre a direção preferencial das famílias de fraturas que ocorrem no afloramento com os dados de eletrorresistividade da barragem e do maciço rochoso sobre o qual ela se insere. Esta correlação mostra que as direções preferenciais das duas principais famílias de fraturas que ocorrem no maciço estão diretamente ligadas aos fluxos hidrogeológico que ocorrem por de baixo da barragem de rejeitos. Ou seja, as fraturas do maciço interceptam as zonas saturadas obtidas nos perfis geofísicos, em especial a zona destacada como E no perfil 3. Na imagem podem ser observadas as duas principais famílias de fraturas (azul e roxo) e a posição do fluxo hidrogeológico (E) encontrado no perfil da linha 3 (Figura 30). Figura 30. Zona circular de baixa resistividade da linha 3 (fluxo hidrogeológico) correlacionado às duas principais famílias de fraturas do afloramento. Fonte: Imagem retirada do Google Earth e modificada pelo autor. Outro importante fator que auxilia na interpretação de que o fluxo hidrogeológico seja proveniente do reservatório de rejeitos, é a concentração das surgências próximas ao 50 barramento, como mostrado na figura 31 (área 1). Consequentemente, quanto mais distante da barragem menores são as ocorrências de surgências (área 2). Isto ocorre, pois, a pressão da lâmina d’água armazenada pela barragem faz com que a água localizada na parte inferior do reservatório seja injetada pelas fraturas do maciço rochoso e projetadas para jusante. À medida que a água se distancia do reservatório, a pressão exercida pela lâmina d’água diminui, fazendo com que as surgências se concentram próximas ao barramento. Figura 31. Concentração de surgências próximas ao barramento (área 1), e pouca concentração das mesmas na área 2 (mais longe da barragem de rejeitos). Fonte: Foto registrada e modificada pelo autor. 51 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS O trabalho realizado consistiu na caracterização de fluxos hidrogeológicos que ocorrem na Mina Osamu Utsumi, Poços de Caldas (MG), mais especificamente na área da barragem de rejeitos da mina, visando identificar a origem das surgências que ocorrem no afloramento do maciço rochoso fraturado ali presente. Essas surgências poderiam ser ocasionadas tanto por um sistema natural de percolação de águas subterrâneas quanto por fluxos hidrogeológicos provenientes do reservatório de rejeitos. Através deste trabalho, foi possível inferir as direções preferenciais das famílias de fraturas que ocorrem no afloramento a jusante da barragem, correspondente a parte do maciço rochoso sob o qual a barragem se insere; e identificar zonas saturadas de água abaixo e nas laterais da barragem, correspondentes a fluxos hidrogeológico em maciço fraturado. Apesar da análise estrutural neste caso ter sido limitada, devido a falta de afloramentos próximos ao barramento, os resultados obtidos concordam com os descritos na literatura e com os que foram obtidos no levantamento regional. Estes, apontam um padrão estrutural regional regido pela orientação preferencial NE-SW e NW-SE, este último, segundo Scudino (1992), relacionado ao embasamento cristalino. O método de eletrorresistividade aplicado sobre a barragem de rejeitos e a elaboração dos modelos bidimensionais possibilitaram a comparação dos valores de resistividade aparente entre os materiais presentes. Para este trabalho, as zonas de alta resistividade foram interpretadas como rochas e material silto-argiloso, comumente utilizado na construção dos enrocamentos; as zonas de média resistividade como materiais úmido, com interações esporádicas com água; e as áreas de baixa resistividade como zonas saturadas. A junção desses dois estudos, estrutural e geofísico, indicou uma relação entre as surgências e a água represada no reservatório. A direção das fraturas do afloramento intercepta uma zona circular de baixa resistividade que ocorre por de baixo da barragem. Isto se junto ao fato das surgências do afloramento se concentrarem próximas ao barramento, mesmo havendo fraturas por toda essa área exposta. Por fim, o estudo mostrou que as surgências que ocorrem no afloramento a jusante da barragem de rejeitos da Mina Osamu Utsumi, são decorrentes da infiltração e percolação de água do reservatório de rejeitos nas fraturas do substrato rochoso, o que ocasiona a formação de fluxos hidrogeológicos que são extravasados pelas descontinuidades do afloramento. 52 9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGÊNCIA NACIONAL DE ÁGUAS. Material Didático do Curso de Segurança de barragens (320h), 2013. Disponível em http://dspace.agencia.gov.br:8080/conhecerhana/110. Acesso em 23 de ago. 2019. AGÊNCIA NACIONAL DE MINERAÇÃO. Perguntas e Respostas sobre Barragens de Mineração e o caso de Brumadinho, 2019. Diposnível em: http://www.anm.gov.br/assuntos/barragens/perguntas-e-respostas-sobre-barragens-de- mineracao-e-o-caso-de-brumadinho/view. Acesso em: 22 de ago. 2019. ALBERTI, H. L. C. 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