UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA-UNESP “Júlio de Mesquita Filho” Câmpus de Ourinhos MÁRIO SÉRGIO PEREIRA DE OLIVEIRA LEVANTAMENTO DO USO DA TERRA PARA SUBSÍDIO À CONSERVAÇÃO E GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NA MICROBACIA DO CÓRREGO DA CASCAVEL, MATÃO-SP OURINHOS/SP 2015 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA-UNESP “Júlio de Mesquita Filho” Câmpus de Ourinhos MÁRIO SÉRGIO PEREIRA DE OLIVEIRA LEVANTAMENTO DO USO DA TERRA PARA SUBSÍDIO À CONSERVAÇÃO E GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS NA MICROBACIA DO CÓRREGO DA CASCAVEL, MATÃO-SP Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à banca examinadora para obtenção do título de Bacharel em Geografia pela UNESP – Câmpus de Ourinhos. Orientador: Prof. Adj. Dr. Edson Luís Piroli OURINHOS/SP 2015 Banca examinadora Prof. Adj. Dr. Edson Luís Piroli (Orientador) _________________________________________ Prof. Dr. Rodrigo Lilla Manzione _________________________________________ Me. Júlio Cesar Demarchi __________________________________________ Ourinhos, 11 de novembro de 2015. Dedicatória À minha mãe Marineiza, mulher íntegra e batalhadora que, como muitos nordestinos, deixou sua juventude em meio ao árduo trabalho nas lavouras de cana-de-açúcar e laranja paulistas, para que nunca nos faltasse nada, dedico. Agradecimentos A Deus, por tudo. Aos meus pais (Marineiza e Amaro) e as minhas irmãs (Mirely, Katarina e as minhas univitelinas preferidas: Milene e Milena), que souberam entender a minha ausência constante ao longo desses anos. Ao meu orientador, Prof. Adj. Dr. Edson Luís Piroli, que mesmo com muito trabalho na gestão executiva do Câmpus de Ourinhos, ministrando aulas e orientando discentes em nível de graduação e pós-graduação, dedicou tempo para este TCC desde o início, concedendo grandes e sábias contribuições (Professor, muito obrigado por tudo! Principalmente pela amizade, por incentivar minha iniciação à pesquisa, mesmo já no final da graduação, pelo apoio incondicional e pelas boas conversas durante as viagens de divulgação do vestibular). Ao amigo Me. Júlio Cesar Demarchi por, gentilmente, aceitar fazer parte da banca avaliadora deste trabalho. Mas, principalmente, pelas contribuições, examinação cuidadosa e minuciosa com que o teve com meu trabalho. Um exemplo de profissional, pelo comprometimento e excelência em tudo aquilo que se dispõe a fazer (Muito obrigado, Julio!). Ao Prof. Dr. Rodrigo Lilla Manzione por também, gentilmente, aceitar fazer parte da banca avaliadora deste trabalho, pelas contribuições e sugestões. Aos moradores e agregados da república Baião de 2, companheiros de convivência ao longo dos anos de graduação: Carlos (Mussum), Michel (Sustagem), Wilian Zenateli (Boneka), Edinho, Everton, Alessandro, Mário Azzolini, Wagner (Chorão) e Júllio Gomes. (Muito obrigado, pessoal! Pelo apoio nos momentos difíceis, pela amizade e discernimento na convivência diária). A todos os colegas da 9ª turma do curso de Geografia da Unesp - Ourinhos e, principalmente, aos amigos José Claro (Gaucho), Fátima (Filó), Marcel (Boi) Cássio (Sid), Daiane; Fran; Glazi, Fernando (Fio), Edeval e Olimpio. (Amigos de trabalhos, seminários, resenhas, trabalhos de campo, sem vocês, não tenho dúvidas, a caminhada universitária teria sido mais difícil. Muito obrigado!) Aos amigos (alunos e ex-alunos) da UNESP – Ourinhos, Eduardo Martins, Franciele Guerra, Felipe Aleixo(Mister M), Gabriela (Judô), Gabriela Lourenço, Angélica, Lauriane, Angela Crespo e Estevão (Caconde). A todos os professores da UNESP – Ourinhos, em especial à Profª. Drª. Maria Cristina Perusi e ao Prof. Dr. Leandro Bruno Santos pelos ensinamentos, incentivo e pela amizade. À UNESP – Câmpus de Ourinhos e a todos os funcionários, principalmente ao Alexandre Catania, pela ajuda no início da pesquisa, ao Rafael Crepaldi, pelas “quebras de galho” com as renovações de livro da biblioteca e ao Leonardo Horie, pela ajuda na prestação de constas da FAPESP. À Pró-Reitoria de Extensão Universitária – PROEX pela concessão das bolsas de auxílio e permanência por alguns anos. Essas foram fundamentais. À Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP pela concessão da bolsa de Iniciação Científica (processo nº 14/17358-8), a qual possibilitou o desenvolvimento da pesquisa que resultou neste Trabalho de Conclusão de Curso. SUMÁRIO RESUMO..................................................................................................................................10 ABSTRACT..............................................................................................................................10 1 INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA...........................................................................11 2 OBJETIVOS.................................................................................................................13 2.1 Objetivo geral....................................................................................................13 2.2 Objetivos específicos.........................................................................................13 3 REVISÃO DE LITERATURA...........................................................................................14 3.1 Breve Histórico de Ocupação da Área..............................................................14 3.1.1 Fazenda Cambuhy.....................................................................16 3.2 Levantamento do Uso da Terra........................................................................18 3.3 Sensoriamento Remoto, Geoprocessamento e Sistemas de Informações Geográficas (SIGs) ......................................................................22 3.4 Manejo de Microbacias Rurais e Urbanas........................................................25 3.5 Gestão dos Recursos Hídricos..........................................................................28 3.6 Áreas de Preservação Permanentes (APPs) ....................................................29 3.7 Classes de Declividade e Uso da Terra............................................................31 4 MATERIAIS E MÉTODOS...............................................................................................33 4.1 Caracterização da área de estudo.....................................................................33 4.2. Materiais................................................................................................................36 4.3. Procedimentos Metodológicos...............................................................................37 4.3.1. Mapa de Drenagem..................................................................................38 4.3.2. Mapa de Uso da Terra.............................................................................38 4.3.2.1. Classificação dos usos da terra........................................................38 4.3.3. Mapa de Áreas de Preservação Permanente (APP)................................ 44 4.3.4. Mapa Hipsométrico.................................................................................44 4.3.5. Mapa de declives.....................................................................................44 4.3.6. Cruzamento do uso da terra com as classes de declive...........................45 4.3.7. Trabalhos de Campo...............................................................................46 5 RESULTADOS E DISCUSSÃO........................................................................................51 5.1 Drenagem da Microbacia do Córrego da Cascavel...........................................51 5.2 Hipsometria da Microbacia do Córrego da Cascavel........................................52 5.3 Uso da Terra na Microbacia do Córrego da Cascavel.......................................52 5.4 Uso da Terra nas Áreas de Preservação Permanente da Microbacia do Córrego da Cascavel..........................................................................................55 5.5 Declividade na Microbacia do Córrego da Cascavel........................................61 5.6 Uso da terra por classe de declividade na Microbacia do Córrego da Cascavel........................................................................................................63 5.6.1 Uso da terra na classe de declive de 0-3%................................63 5.6.2 Uso da terra na classe de declive de 3-6%................................64 5.6.3 Uso da terra na classe de declive de 6-12%..............................66 5.6.4 Uso da terra na classe de declive de 12-20%............................68 5.6.5 Uso da terra na classe de declive de 20-40%...........................69 5.6.6 Uso da terra na classe de declive acima de 40%.......................71 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................................75 7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS................................................................................77 ÍNDICE DE FIGURAS Figuras Página Figura 1: Caminhões carregados com toras das matas nativas da época..................................14 Figura 2: A - Serraria dos Irmãos Baldan; B - Transporte de uma enorme tora de Peroba pelos irmãos Baldan......................................................................................................14 Figura 3: Localização da Área de Estudo.................................................................................33 Figura 4: Município de Matão na UGRHI 16 (Tietê/Batalha)..................................................34 Figura 5: Mata da Virgínia, no município de Matão.................................................................36 Figura 6: Esquema das classes de uso da terra na Microbacia do Córrego da Cascavel.........39 Figura7: Áreas com usos industriais na microbacia do Córrego da Cascavel..........................39 Figura 8: Áreas com uso urbano na microbacia do Córrego da Cascavel................................40 Figura 9: Áreas com cobertura de vegetação campestre na microbacia do Córrego da Cascavel..............................................................................................................................40 Figura 10: Áreas com cobertura de Floresta Nativa na microbacia do Córrego da Cascavel...41 Figura 11: Áreas com uso agrícola, cultura permanente (Laranja) na microbacia do Córrego da Cascavel.................................................................................................................41 Figura 12: Áreas com uso agrícola, cultura temporária (A: cana/B:Milho/C: Mandioca)........42 Figura 13: Áreas com Silvicultura (Eucalipto).........................................................................42 Figura 14: Áreas com pastagem na microbacia do Córrego da Cascavel.................................43 Figura 15: Rodovias (A e B: Rod. Washington Luís -SP-310 / C: Rod. Brigadeiro Faria Lima-SP-326)...........................................................................................................................43 Figura 16: Represa na Microbacia do Córrego da Cascavel....................................................44 Figura 17: Imagem de satélite mostrando cana-de-açúcar e floresta nativa. Fotografias do mesmo local.........................................................................................................................47 Figura 18: Imagem de satélite afluente do Córrego da Cascavel/Fotografias da mesma área em situação degradada depois de um episódio de intensa precipitação...........................48 Figura 19: Processo erosivo em pequena propriedade rural nos arredores da cidade...............49 Figura 20: Imagem de satélite mostrando algumas áreas rurais e urbanas da microbacia e fotografias do mesmo ponto..................................................................................................50 Figura 21- Drenagem da Microbacia do Córrego da Cascavel................................................51 Figura 22: Mapa hipsométrico da microbacia do Córrego da Cascavel...................................52 Figura 23: Mapa de Uso da Terra da Microbacia do Córrego da cascavel..............................53 Figura 24: Imagem aérea da Cabeceira do Córrego da Cascavel com seus usos urbanos e industriais..................................................................................................................55 Figura 25: Mapa de uso da terra das APPs da Microbacia do Córrego da Cascavel................56 Figura 26: (A e B) Afluente do Córrego cascavel com APP inadequada.................................57 Figura 27: Leito do Córrego Cascavel assoreado.....................................................................58 Figura 28: Ponto de lançamento de esgoto in natura................................................................59 Figura 29: Córrego Cascavel passando sob a Rodovia Washington Luís (SP-310).................59 Figura 30: Rodovia Washington Luís alagada..........................................................................60 Figura 31: Córrego da Cascavel alagando parte da rodovia Washington Luís em 2011..........61 Figura 32: Mapa de declividade da microbacia do Córrego da Cascavel, Matão-SP...............62 Figura 33: Mapa de Classe de uso da terra na classe de declive de 0-3%................................63 Figura 34: Mapa de Classe de uso da terra na classe de declive de 3-6%................................64 Figura 35: Mapa de Classe de uso da terra na classe de declive de 6-12%..............................66 Figura 36: Mapa de Classe de uso da terra na classe de declive de 12-20%............................68 Figura 37: Mapa de Classe de uso da terra na classe de declive de 20-40%............................70 Figura 38: Mapa de Classe de uso da terra na classe de declive acima de 40%.......................72 Figura 39: Bacias de contenção de água na Fazenda Cambuhy, Matão-SP.............................75 ÍNDICE DE TABELAS Tabelas Página Tabela 1: Classes de declividade..............................................................................................45 Tabela 2: Área das classes de uso da terra da Microbacia do Córrego da Cascavel, Matão-SP...................................................................................................................................54 Tabela 3: Área das classes de uso da terra das APPs da Microbacia do Córrego da Cascavel..............................................................................................................................56 Tabela 4: Classe de declive, área ocupada em hectares e porcentagem na microbacia do Córrego da Cascavel, Matão-SP..........................................................................................62 Tabela 5: Classe de uso da terra, área ocupada e percentual de uso na classe de declive de 0-3%....................................................................................................................................64 Tabela 6: Classe de uso da terra, área ocupada e percentual de uso na classe de declive de 3-6%....................................................................................................................................65 Tabela 7: Classe de uso da terra, área ocupada e percentual de uso na classe de declive de 6-12%...................................................................................................................................67 Tabela 8: Classe de uso da terra, área ocupada e percentual de uso na classe de declive de 12-20%................................................................................................................................68 Tabela 9: Classe de uso da terra, área ocupada e percentual de uso na classe de declive de 20-40%...............................................................................................................................70 Tabela 10: Classe de uso da terra, área ocupada e percentual de uso na classe de declive acima de 40%............................................................................................................................72 Tabela 11. Síntese do uso da terra por classe de declividade e porcentagem em relação à área total da microbacia do Córrego da Cascavel..................................................................73 10 RESUMO O presente trabalho buscou fazer um levantamento dos usos da terra da microbacia do Córrego da Cascavel no município de Matão-SP. E por meio dos resultados, reunir subsídios voltados para a conservação e gestão dos recursos hídricos. Para tanto, utilizou-se de produtos de sensoriamento remoto e técnicas de geoprocessamento para a produção de mapas temáticos da área de estudo, com ênfase nas Áreas de Preservação Permanente (APP). Ademais, os usos da terra também foram cruzados com a declividade da área. Foram levantadas dez classes de uso da terra: Área Urbana, Área Industrial, Campestre, Floresta Nativa, Cultura Permanente, Cultura Temporária, Silvicultura, Pastagem, Infraestrutura e Represa. Dessas, constatou-se que as classes Área Urbana e Área Industrial apresentaram os maiores impactos sobre os recursos hídricos. Observou-se ainda que há ocupação inadequada nas APP da microbacia tanto nas áreas urbanas quanto rurais. As classes de declive em função dos usos da terra permitiram inferir que a microbacia possui mais usos nos locais em que as características do relevo se enquadram como sendo moderadamente onduladas. As áreas urbanas, industriais e infraestrutura, bem como as áreas agrícolas predominam nas áreas de menor declividade. As vegetações nativas lideram os usos em classes de maior declividade como na classe de 20- 40%. Palavras-Chave: uso da terra; recursos hídricos; sensoriamento remoto; geoprocessamento. ABSTRACT The present study aimed to carry out a land use survey of the Cascavel stream watershed, located in the city of Matão, São Paulo as a subsidy for conservation and management of its water resources. To do so, Remote Sensing products and GIS techniques were used in the elaboration of thematic maps, with emphasis on Areas of Permanent Preservation (APP). Furthermore, the land use map was cross-tabulated to the slope map of the study area. Ten land use classes were mapped: urban area, industrial area, mixed forest, native forest, permanent crops, annual crops, forestry, pasture, infrastructure and dam. Among these classes, it was found that the urban and industrial areas caused the greatest impacts on water resources and that land use is inappropriate in APP on both urban and rural areas. From cross- tabulation between slope and land use classes, it was possible to deduce that the watershed is more intensively used in places where relief is moderately undulating. Urban, industrial and infrastructure areas, as well as agricultural ones, predominate in flat areas. Native forests lead the land uses in steeper slope classes, such as the 20-40% class. Key-Words: land use; water resources; remote sensing; geoprocessing. 11 1 INTRODUÇÃO E JUSTIFICATIVA Nos últimos anos, observaram-se períodos muito secos em boa parte do país. Essa escassez hídrica ainda vem desencadeando diversos problemas relacionados ao rebaixamento do nível da água de alguns reservatórios que abastecem áreas urbanas. Além das condições climáticas, outra questão que afeta diretamente o recurso natural água, é a degradação ambiental, resultado do desenvolvimento de um modelo predatório empreendido pelo sistema econômico e político na apropriação da natureza, bem como pelo aumento populacional que, por sua vez, conduz a um maior uso dos recursos naturais. Sabe-se que os recursos hídricos são de fundamental importância para a humanidade, seja para fins de consumo, produção de energia elétrica, navegação, lazer, agricultura etc, e desta forma, sua conservação e gestão adequada se fazem primordiais. Dentre a imensa gama de problemas ambientais, pode-se se dizer que um dos principais relacionados aos recursos hídricos, surge em virtude de que a maioria dos cursos d’água que estão inseridos nas cidades, ou mesmo que durante o seu percurso perpassam alguma área urbana, sofrem algum tipo de degradação. Esse tipo de situação ocorre, pois o deflúvio urbano, geralmente poluído por dejetos domésticos e industriais in natura, acaba indo direto para os cursos d’água, podendo ocasionar impactos como o processo de eutrofização da água (TUNDISI, 2006). Acrescenta-se a isso a questão do excesso de impermeabilização das cidades, que acaba se transformando em um problema socioambiental à medida que impede a infiltração da água no solo, acarretando um aumento do escoamento superficial e afetando diretamente o ciclo hidrológico além de contribuir com as enchentes (TUCCI et al., 2006). Ainda baseado nesse autor e, inerente a isso, entende-se que com a diminuição da infiltração, reduz-se a recarga do aquífero e diminui o nível do lençol freático. Isto é, áreas urbanas mal planejadas ambientalmente, além de contribuir para a degradação dos recursos hídricos superficiais, acabam degradando também os subterrâneos. Contudo, a degradação dos recursos hídricos não se resume às cidades. Além de áreas urbanas, os cursos d’água seguem também em meio às áreas de produção nas zonas rurais, as quais estão intensamente tomadas pelas atividades agrícolas, que por sua vez, possuem uma displicência histórica para com as questões ambientais. Sabe-se que a agricultura no Brasil é marcada por um processo de exploração e degradação ambiental que acompanhou os diversos ciclos econômicos existentes no país. Com a expansão das fronteiras agrícolas, esse processo de deterioração se intensificou à medida que mais áreas foram devastadas continuamente para 12 comportar o volume produtivo que a demanda crescente exigia ou que a possibilidade de lucro com a produção agropecuária e a posse da terra permitiam. No estado de São Paulo, o processo de degradação ambiental, tem seus precedentes mais evidentes no ciclo do café, no qual as florestas nativas foram devastadas e queimadas enquanto a cultura adentrava o interior. No tocante a isso, outra questão que contribuiu para a degradação ambiental da época se deu pela própria expansão da produção cafeeira, pois essa propiciou um desenvolvimento econômico, que por sua vez viabilizou um maior crescimento populacional, bem como dos processos de urbanização e industrialização (DEAN, 1996), demandando mais áreas para produção de alimentos e matérias primas. Essa sequência de desmatamento e supressão das vegetações nativas, principalmente das matas ciliares, para a implantação das atividades de urbanização, industrialização, implantação de sistemas agrícolas diversos, afetou e afeta os recursos hídricos de maneira contundente. No entanto, os ecossistemas vegetais, os quais naturalmente se encontravam ao redor dos cursos d’água, além de muitos outros benefícios ao meio ambiente, auxiliam na infiltração regulando o fluxo de água e protegendo o solo de processos erosivos que causam o assoreamento de rios. Ademais, a simples existência de uma densa vegetação ao redor dos corpos d’água caracteriza-se como uma barreira física e natural à penetração de máquinas evitando derramamento de óleo bem como o uso de insumos agrícolas em zonas ripárias (RODRIGUES; BUCCI, 2006). Mas, quando essas áreas são utilizadas, a intensa atividade agrícola que, por consequência do desmatamento pode ocorrer nesses locais, acaba contaminando os recursos hídricos através dos resíduos de agrotóxicos, fato esse, já conhecido como uma das principais causas de contaminação hídrica. Logo, percebe-se que a negligência com os problemas ambientais compromete profundamente o recurso natural água e, consequentemente, o solo, a fauna e a flora, afetando também a população que depende direta e indiretamente desses recursos. Nesse sentido, Câmara (1991) já evidenciava essa problemática ao salientar que: Em muitos países, inclusive no nosso, a eliminação das matas nas cabeceiras dos cursos de água e a má gestão das áreas com florestas nativas levaram a acentuadas variações do fluxo dos rios e à carência pelo menos sazonal de recursos hídricos, agravada ainda por contaminação com dejetos domésticos e poluição agrícola e industrial. As alterações do regime hídrico e da qualidade da água das grandes bacias fluviais devido a desmatamentos extensos e às alterações ambientais devem ser, portanto, uma das preocupações dominantes no que se refere ao uso do território. (CÂMARA, 1991, p.164) Em face dessa realidade, nota-se que a degradação hídrica está atrelada a uma combinação inadequada de diversos usos da terra. Assim, além do mencionado, esse estudo se 13 faz importante, pois considera que uma análise acerca das condições a que estão submetidos os recursos hídricos, tendo em vista o uso e cobertura da terra, é de grande contribuição na identificação do nível de intervenção do homem no meio natural. Nesse contexto, a geografia permite uma abordagem ampla sobre essas questões, pois esta é conhecida como uma ciência que estuda, além de muitos outros assuntos, aspectos humanos e naturais, bem como a relação entre os mesmos na produção do espaço geográfico. E, por meio da análise holística, intrínseca a essa ciência, pode-se compreender de maneira multidisciplinar, os fenômenos que agem sobre essa relação. Algo de grande importância também, que vêm sendo associado a esses estudos, são as novas tecnologias que auxiliam a geografia atualmente. Sobre essa perspectiva, Bertrand e Bertrand (2007) evidenciam que: [...] a geografia se posicionaria no centro do debate, forte, por um lado, pela sua dupla competência social e naturalista, e, por outro lado, pelo seu domínio de espaço através do conceito de território e das tecnologias de aferição (cartografias e imagens por satélite) (BERTRAND; BERTRAND, 2007, p. 204). Dessa forma, nesse estudo foi feito uma análise geográfica das influências do homem, bem como de suas atividades, no meio natural, fato que, como já sabido, ocasiona as transformações das paisagens naturais. E, para esta análise, foram usados produtos de sensoriamento remoto e técnicas de geoprocessamento. 2 OBJETIVOS 2.1 Objetivo geral O presente estudo tem como objetivo geral identificar e analisar os tipos de uso da terra na microbacia do Córrego da Cascavel no município de Matão-SP e, a partir dos resultados, reunir subsídios voltados para a proposição de políticas de conservação e gestão adequadas dos recursos hídricos. 2.2 Objetivos específicos E para atingir tal propósito, os objetivos específicos foram:  Produzir mapas temáticos da área, como drenagem, APP, hipsometria e de declividade do relevo;  Avaliar a situação das Áreas de Preservação Permanente da microbacia; 14  Identificar a interferência dos usos inadequados da terra nos recursos hídricos da microbacia. 3 REVISÃO DE LITERATURA 3.1 Breve Histórico de Ocupação da Área O município de Matão surgiu como “Arraial do Senhor Bom Jesus das Palmeiras” em 1895, sendo emancipado em 27 de agosto de 1898, se desmembrando de Araraquara. Com a oficialização, o município passa a se chamar Matão por alusão às características naturais da área, com matas densas que cobriam a região à época (LEITE, 1992). Por meio das imagens abaixo (Figuras 1 e 2), pode-se observar, pelo tamanho das toras, o quão densas eram as matas de Matão e, isso já depois de um longo período de exploração, em meados do século XX. Figura1. Caminhões carregados com toras das matas nativas da época. A - Família Marchesan (Provavelmente em meados 1940, buscavam nas matas matonenses, a matéria prima para a empresa, que se tornou hoje a “Marchesan Implementos e Máquinas Agrícolas”). B - Família Baldan (também no início da construção de sua empresa, hoje “Baldan Implementos Agrícolas”). Fonte: Leite (1992). Figura 2: (A) Serraria dos Irmãos Baldan; (B) Transporte de uma enorme tora de Peroba pelos irmãos Baldan. Fonte: BALDAN (2015). 15 No que concerne ao histórico de ocupação de Matão, é preciso voltar à época em que o atual município fazia parte de toda uma região denominada “Campos de Araraquara” 1 ou ,como alguns autores mencionam, “Sertões de Araraquara”. Com a penetração bandeirante, essa área passa a ser melhor conhecida e aproveitada, pois era passagem para os que buscavam as minas de Cuiabá. Por volta de 1790, os primeiros e mais importantes moradores teriam chegado à região, alguns fugindo da chamada “Justiça de Itu”, que eram divergências políticas na região de Piracicaba. Outros receberam doações feitas pelo governo imperial, de grandes sesmarias e, assim, estabeleceram posses nas regiões de rancho Queimado, Cruzes, do Ouro, Lageado, Monte Alegre, Cambuí, Bonfim, Almas, Pinhal, Monjolinho entre outras, sendo posteriormente divididas em muitas partes de terras (CASALECCHI, 1973; MESSIAS, 2003). A princípio, a ocupação da área se dá com as atividades criatórias e de subsistência. No decorrer da segunda metade do século XVIII, o cultivo de cana-de-açúcar espalha-se pelo quadrilátero composto por Sorocaba, Piracicaba, Mogi Guaçú e Jundiaí. Na região de Araraquara, a ocupação pela cultura da cana iniciou-se por volta de 1817 e, assim, fazendeiros que cultivavam capitais e experiências em outras regiões, vinham em busca das terras férteis do Oeste e começara a cultivar cana na região. Em 1836, alguns autores indicam para Araraquara a existência de um engenho e oito fazendas de criar. Portanto, a atividade canavieira, não desbanca de vez a atividade criatória o que justifica o surgimento de fazendas mistas, em que a cultura da cana permanece ao lado da criação por um curto período na região (CASALECCHI, 1973). Após os anos de 1860, o café já havia conquistado boa parte das localidades produtoras de açúcar pertencentes ao quadrilátero e arredores. Nessa época, o Brasil passava por grandes transformações, em virtude da aprovação da Lei de Terras, bem como a extinção do tráfico internacional de escravos em 1850, fatos que resultaram em mudanças de toda a estrutura fundiária, e organização da mão-de-obra (MESSIAS, 2003). Com uma acentuada marcha para o Oeste, da metade para o final do século XIX, mais precisamente finais dos anos 1870 e início de 1880, é que o café chega à região de Araraquara, passando a cultura canavieira para segundo plano. No entanto, essa ainda tem grande importância na fase improdutiva do café (CASALECCHI, 1973). Nesse período, com o avanço do café na região, a Sesmaria do Cambuí começava a se destacar. 1 Segundo Messias (2003, p. 22), Os chamados “Campos de Araraquara” incluíam “Araraquara, Jaboticabal, São Carlos, Jaú, Brotas, Dois Córregos, sem limite de sertão adentro”. Ou seja, mesmo não mencionado, isso inclui também a área que hoje se localiza o município de Matão, pois esse pertencia a Araraquara. 16 3.1.1 Fazenda Cambuhy Nesse âmbito de análise, não se pode falar da história de ocupação de Matão, sem mencionar a fazenda Cambuhy, que representa o início de uma dinâmica agrícola que até hoje dá força à economia do município. Além disso, a fazenda e seus arredores são parte dessa pesquisa, pois o Córrego Cascavel percorre parte de suas dependências, sendo que muitos de seus afluentes nascem ali. Nesse sentido, boa parte da microbacia, se encontra nas dependências da fazenda. A antiga Sesmaria do Cambuí ou, como grafado atualmente, “Cambuhy”, de acordo com Casalecchi (1973), possuía uma área inicial de 31.510 alqueires. Limitava-se ao Norte com a estrada que liga Matão à Itápolis, ao Sul do rio Jacaré-Guaçu com Nova Europa, Nova Paulista e Gavião Peixoto. Ou seja, em seu tamanho original, a Cambuhy, se estendia por boa parte do município de Matão perpassando ainda por parte de alguns municípios vizinhos. Em relação às características físicas, o mesmo autor afirma ainda que, há na fazenda Cambuhy diferentes variedades de solo citando os chamados na época de “Terra Roxa”, “Terra Roxa Misturada” e “Terra Branca”, nos quais os dois primeiros mencionados são favoráveis ao cultivo do café. Outro ponto importante, é que nas dependências da fazenda existiam grandes extensões de Matas, que tomavam cerca de 50% da área total na época da ocupação inicial, na qual havia ocorrência de madeiras tais como óleo, peroba, cedro, chimbo, cacheta, etc. (CASALECCHI, 1973, p. 36). Além disso, de acordo com o autor supracitado, a área ainda possui outros tipos de vegetações, bem como vários cursos d´água. Cerca de 30% do total de sua área era revestidos de capoeiras e cerrados, e os 20% restantes, ocupados por campos argilosos. Cortada por abundantes cursos d´água: o Jacaré-Guaçu, Itaquere, Cascavel, Espírito Santo, os Córregos de Mulada, Açude, Neto, São João, etc., além das quedas do Jacaré-Guaçu, depois aproveitadas para o fornecimento de energia. (CASALECCHI, 1973, p. 36, grifo nosso). Toda essa área descrita, como mencionado anteriormente, diz respeito à área da Cambuhy na época, isto é, quando ainda era denominada Sesmaria da Cambuí, antes de muitas partilhas, vendas e compras das terras que hoje formam a Fazenda Cambuhy. Assim, a ocupação desta grande área sistematizou-se no início do século XX. Todavia, suas origens remontam quase um século antes, por volta do segundo decênio do século XIX, no período da divisão entre os sesmeiros dos “Campos de Araraquara”. No que diz respeito aos proprietários, doações e vendas ao longo da história, a Sesmaria do Cambuhy passou pelas mãos de importantes e abastados grupos familiares. 17 [...] Em 1820, D. João VI, rei de Portugal, doou a Sesmaria do Cambuhy ao Coronel Joaquim José de Moraes Leme que, por sua herança, a passou para o Conselheiro do Império, Dr. Bernardino Avelino de Gavião Peixoto, que iniciou a formação de fazendas de café. Após algumas vendas, em 1911, a família Gavião Peixoto vendeu o remanescente de 23.312,93 alqueires ao Dr. Carlos Leôncio de Magalhães (“Nhonhô Magalhães”), que deu seqüência na formação de fazendas de café. (MATÃO, 2005, s/p). A fazenda Cambuhy, de Carlos Leôncio Magalhães, possuía grande reputação sendo apontada como a maior propriedade agrícola de São Paulo à época. Além disso, era a maior produtora de café em coco, considerada uma “indústria a céu aberto” chegando a ser conhecida mundo afora. Com uma dimensão de cerca de 750 quilômetros quadrados, percorrendo municípios de Matão, Araraquara e Ibitinga (SÂO PAULO, 2005). [...] Finalmente, em 04 de novembro de 1924, o Dr. Magalhães vendeu a propriedade à Brazilian Warrant, através de sua subsidiária, Companhia Agrícolas Fazendas do Cambuhy, pela vultosa importância, na época, de meio milhão de libras esterlinas, o maior cheque jamais preenchido no Brasil, segundo jornais da época. A Brazilian Warrant, teve origem com a chegada ao Brasil, em 1820, do inglês Edward Johnston, que fundou, em 1842, a E. Johnston & Co. Durante muitos anos, a Cambuhy fora considerada um modelo de fazenda. E por sua localização privilegiada, foi projetada pelos ingleses para ser a sede da Companhia, passando as demais fazendas a denominar-se por seções para facilitar a localização e controle, pois na sua totalidade era denominada de “Fazendas do Cambuhy”. Existiam então 22 seções: Araruba, Água Sumida, Américo, Alabama, Boa Vista, Curupá, Califórnia, Córrego Fundo, Contribuição, Fazenda de Criar, Flórida, Guanabara, Lenheiro, Las Palmas, Mato Grosso, Niagara, Santa Cândida, São João, Tamanduá, Teixeira Leite, Toriba e Virgínia. Algumas dessas seções possuíam a extensão de mais de mil alqueires de terra, por onde eram distribuídos o plantio tendo como prioridade o nosso café [...]. (MATÃO, 2005, s/p). Em relação à ocupação cafeeira, pode-se afirmar que esta apresentou um grande aumento da produção na área em virtude da chegada da ferrovia. A estrada de Ferro Araraquarense alcança Matão em 1899, posteriormente, em razão da importância política de Dr. Gavião Peixoto, em 1908, foi construído um ramal da Araraquarense ligando Silvânia a Tabatinga, o qual percorria o interior das terras da Cambuhy, proporcionando uma melhor distribuição e transporte da produção de café da sesmaria, bem como da região (CASALECCHI, 1973). Nessa época, por volta do fim do século XIX e início do XX, as fazendas do Cambuhy apresentavam grande relevância para o município de Matão e região, ao passo em que habitavam na cidade e seus distritos, cerca de 5 mil habitantes, enquanto que nas colônias da Cambuhy, a população chegava a 12 mil habitantes, fato esse, que proporcionava uma movimentação intensa aos finais de semana no comércio da cidade (MATÃO, 2005). 18 No início da década de 1950, Walter Moreira Salles compra grande parte das ações da empresa britânica Brazil Warrant, passando a controlar o grupo. Por volta de 1960, com seu tamanho atual de 14.063 ha, a fazenda começa um processo de diversificação das atividades, através da implantação de um projeto de gado de corte, com uma criação à época de 16 mil cabeças de gado da raça Nelore. Entre o final da década de 1970 e início de 1980, a Cambuhy dá início a atividade da citricultura, por meio do plantio de 400 mil pés de laranja. Posteriormente, também consegue grande atuação na atividade seringueira, tendo até meados da década de 1990, um seringal com cerca de 600 mil árvores (COOPERCITRUS, 1990). Como observado, o município de Matão, ao longo da história, passou por diversos tipos de ocupação da terra, desde a sua cobertura natural com suas matas nativas e cerrados, passando por processos de desmatamentos, criação de animais em algumas áreas, grandes ciclos agrícolas como da cana-de-açúcar e café, além das atividades mais recentes que, proporcionaram um aumento de núcleos coloniais com o aumento da ocupação humana na área. Pensando nisso, considera-se que a área de estudo dessa pesquisa possui um histórico dinâmico em seus usos e cobertura da terra, que culminaram em uma intensa transformação da paisagem em pouco menos de dois séculos de exploraçã, isto é, os primeiros impactos ambientais na microbacia do Córrego da Cascavel certamente advêm desse período. Uma vez estabelecidas as linhas gerais que explicam o histórico de ocupação e aproveitamento da área de estudo ao longo da história, a sequência desse trabalho abarca uma revisão de literatura em busca de um aprofundamento teórico dos temas que envolvem essa pesquisa. 3.2 Levantamento do Uso da Terra Entender e identificar os padrões de uso e cobertura da terra se tornou algo muito importante nos dias atuais, em função de que esses estudos podem dar grande contribuição para inúmeras atividades, como nos diversos tipos de zoneamento e planejamento. O uso da terra, diz respeito ao modo como a terra é utilizada pela humanidade (JENSEN, 2009). Nesse sentido, o homem ao longo da história, usou e usa a superfície terrestre da maneira que lhe é conveniente e muitas vezes não considerando as verdadeiras aptidões, limitações e vulnerabilidade a riscos ambientais de cada localidade, fatos esses que podem ocasionar desequilíbrios ao meio. De acordo com IBGE (2006; 2013, sem paginação) os primeiros trabalhos envolvendo o uso da terra, no Brasil, se deram em um período que vai do final da década de 1930 até 1940. Esses permeavam por análises acerca da colonização na Região Sul do Brasil, bem 19 como da ocupação da Amazônia. Após esse período, de 1950 até 1960, ainda haviam estudos a respeito da colonização, no entanto, começam a prevalecer análises ligadas aos “padrões espaciais”, os quais eram analisados a partir de processos produtivos. Através desses, surgem análises dedicadas às variáveis específicas da ocupação. No decorrer da década de 1970, ocorreram progressos em “análises classificatórias das formas e das dinâmicas de uso da terra” bem como do “uso do meio técnico e acadêmico de procedimentos estatísticos na geografia”, e isso refletiu nos trabalhos da época, através de uma forte ênfase em análises quantitativas (IBGE, 2006; 2013, sem paginação). Além disso, ainda segundo o IBGE, o primeiro trabalho sistemático no qual se utilizou de produtos de sensoriamento remoto em análises de “fenômenos especializáveis” de importância nacional, se deu por meio da utilização de imagens de radar por parte do projeto RADAMBRASIL (IBGE, 2006; 2013, sem paginação). Em relação à terminologia, muitos trabalhos que abordam a espacialização das características físicas de uma determinada área, utilizam expressões como: uso do solo, uso da terra ou uso e cobertura da terra, etc. Nesse mesmo raciocínio conceitual, alguns autores estabelecem que é mais adequado utilizar o termo “uso da terra” por ser mais abrangente que o termo “uso do solo”, uma vez que envolve variáveis físicas, bem como relações socioeconômicas. Nessa perspectiva, Lepsch et al. (1983) salientam que: O conceito de solo é mais restrito, podendo ser considerado como o conjunto de corpos tridimensionais que ocupam a porção superior da crosta terrestre, capazes de suportar plantas, apresentando atributos internos próprios e características externas (declividade, pedregosidade, rochosidade) tais que é possível descrevê-los e classifica-los (LEPSCH et al, 1983, p. 13). Em relação à definição de uso da “terra”, o autor aponta ser um termo mais amplo dizendo que: [...] terra inclui, entre suas características, não apenas o solo, mas também, outros atributos físicos, como localização, relevo, vegetação, tipos e grau de erosão, suprimento de água (clima), impedimentos à motomecanização, e cuja utilização agrícola depende também de condições de infraestrutura (meios de transporte, instalações, máquinas e equipamentos) e, ainda, condições socioeconômicas (salubridade da região, disponibilidade de mão- de-obra, mercado, preços de insumos e de produtos agropecuários) (LEPSCH et al, 1983, p. 13). Mesmo com algumas diferenças conceituais, muitos autores fazem suas contribuições, relatando suas perspectivas sobre estudos que abarcam as formas de uso da terra. Nesse ínterim, Novo (2012) destaca que: O termo Uso da Terra refere-se a utilização “cultural” da terra, enquanto que o termo “cobertura da terra” ou “land cover” refere-se ao seu revestimento. 20 Um exemplo desta diferenciação é o de áreas florestais que, embora sejam de um só tipo sob o ponto de vista de cobertura, podem ter diferentes usos: lazer, exploração de madeira, reservas biológicas etc. Deste modo, um sistema de classificação de uso da terra não pode basear-se apenas em dados de Sensoriamento Remoto que fornecem principalmente informações sobre a cobertura do solo (NOVO, 1992, p. 276). Nota-se que, nesse tipo de estudo, é fundamental levar em consideração todas as variáveis, as quais podem estar diretamente relacionadas com os usos, sejam elas “culturais” ou “naturais”. Nesse sentido, deve-se além de analisar através de artifícios como das geotecnologias, ter um conhecimento aprofundado, empírico da área de estudo, tendo em vista as características de cada padrão de uso e, se são, e como são utilizados pelo homem. Nesse contexto, Rosa (2007) pontua que: O estudo do uso da terra e ocupação do solo consiste em buscar conhecimento de toda a sua utilização por parte do homem ou, quando não utilizado pelo homem, a caracterização dos tipos de categorias de vegetação natural que reveste o solo, como também suas respectivas localizações. De forma sintética, a expressão “uso da terra ou do solo” pode ser entendida como sendo a forma pela qual o espaço está sendo ocupado pelo homem (ROSA, 2007, p. 171). O mesmo autor afirma ainda que o conhecimento sobre os usos deva ser atualizado, aludindo que: O conhecimento atualizado das formas de utilização e ocupação do solo, bem como o uso histórico, tem sido um fator imprescindível ao estudo dos processos que se desenvolvem na região, tornando-se de fundamental importância na medida em que os efeitos de seu mau uso causam deterioração do meio ambiente. Os processos de erosão intensos, desertificação, inundações assoreamento de cursos d´água, têm sido exemplos cotidianos de seu mau uso (ROSA, 2007, p. 171). Desse modo, o levantamento do uso da terra é imprescindível para se obter o conhecimento atualizado dos padrões de uso e cobertura da terra. Esse conhecimento sobre a distribuição de áreas ocupadas pela agricultura, áreas urbanas ou vegetação natural, bem como o acompanhamento dessas transformações, “tornam cada vez mais necessários aos legisladores e planejadores, seja ao nível de governo federal, estadual ou municipal, para permitir a elaboração da melhor política de uso e ocupação do solo” (ROSA, 2007, p. 171). Através do levantamento do uso da terra, pode-se identificar no que diz respeito, por exemplo, à agricultura, à capacidade de uso da terra, permitindo assim, se ter informações as quais poderão ser aplicadas com vistas a um manejo sustentável do recurso solo, pois se terá bases para inferir se determinado uso ou cultivo é apropriado para determinada área, evitando processos como os de erosão do solo. Dessa forma, essa aplicação é ligada a questão do 21 planejamento, ao passo que se apontam conflitos sobre os usos impróprios, como evidencia Santos (2004). O tema derivado capacidade de uso é bastante desenvolvido em planejamento, pois fornece duas respostas básicas: o potencial de uso da área (ou o uso adequado, com práticas adequadas, voltadas à conservação e proteção do recurso) e a ocorrência de inadequação de uso (ou ocorrência de conflitos envolvendo o uso atual e o uso recomendável) (SANTOS, 2004, p. 84). No que concerne ao espaço urbano, o levantamento do uso da terra pode auxiliar na identificação de áreas próprias e impróprias para a ocupação. Corrêa (1989, p. 7), ao discorrer sobre o espaço urbano, evidencia que esse é composto de um “conjunto de diferentes usos da terra justapostos entre si”, e esses diferentes usos acabam por definir áreas com características em comum, como por exemplo, no centro da cidade concentram-se atividades comerciais e de serviços, diferentemente de atividades industriais e residenciais que, geralmente, se localizam em áreas distintas. Em um processo de desenvolvimento urbano sem um certo grau de planejamento, que considere e respeite as condicionantes sociais, econômicas, culturais e ambientais, muito provavelmente, esses diversos usos podem ter algum tipo de conflito em determinado momento, ou seja, é fundamental que se pense no ordenamento territorial adequado. O levantamento do uso da terra por meio do zoneamento é um instrumento de grande relevância no ordenamento territorial das cidades, pois institui um equilíbrio entre as diferentes formas de uso do espaço urbano. Nesse sentido, esses aspectos devem estar presentes nos planos diretores das cidades, na medida em que possam evitar conflitos entre os padrões de uso urbano, tais como uso ambiental, residencial, industrial, comercial, de circulação do fluxo urbano e até mesmo de lazer. Assim, essas ações permitem que nenhum desses usos influa de maneira drástica sobre o outro, podendo comprometer de alguma forma a dinâmica urbana. Além disso, outra forma eficaz de aplicar o levantamento do uso da terra é nos estudos relacionados ao planejamento ambiental, tendo em vista a crescente degradação dos recursos naturais por parte do homem na tentativa de manter um padrão cultural de excessos, no sistema de produção atual. Desse modo, ações que abranjam a organização do uso da terra pensando na preservação ambiental, são de grande contribuição socioambiental. Nessa mesma linha de planejamento ambiental e uso da terra, Santos (2004) diz que: 22 O planejamento ambiental, surgiu nas três últimas décadas em razão do aumento dramático da competição por terras, água, recursos energéticos e biológicos que gerou a necessidade de organizar o uso da terra, de compatibilizar esse uso com a proteção de ambientes ameaçados e de melhorar a qualidade de vida das populações [...] (SANTOS, 2004, p. 27, grifo nosso). Nesse ínterim, sabe-se da grande contribuição dos estudos de levantamento e análise do uso da terra em projetos de conservação e gestão dos recursos hídricos, principalmente ao nível de bacias e microbacias hidrográficas, pois essas informações dão suporte à identificação de padrões de usos que, porventura, possam estar interferindo inadequadamente nos corpos d´água. Para Vanzela et al. (2010), a cobertura do solo se faz um elemento crucial no escoamento de superfície, bem como no transporte de sedimentos, podendo influenciar a qualidade e também a disponibilidade de água dos mananciais. Do mesmo modo, pensando nos recursos hídricos e no uso do solo urbano, por exemplo, Carneiro et al. (2010), evidenciam que é necessário haver a integração entre o planejamento do uso do solo e a gestão dos recursos hídricos, buscando estabelecer relações entre as formas de uso do solo urbano e os problemas ligados ao recurso água, tais como as inundações que ocorrem em muitas cidades (CARNEIRO et al., 2010). Assim, observa-se que estudos que retratam a dinâmica de ocupação da terra tornam- se instrumentos de muita relevância na constituição de indicadores da capacidade de suporte ambiental, considerando os variados manejos adotados pelos setores que compõem a sociedade. Os estudos de uso e cobertura da terra fornecem auxílios às análises de cunho ambiental, tendo em vista os diversos impactos oriundos de processos de desmatamentos, perda da biodiversidade, aumento da urbanização bem como das alterações constantes no meio rural (IBGE, 2013). 3.3 Sensoriamento Remoto, Geoprocessamento e Sistemas de Informações Geográficas (SIGs) De acordo com Florenzano (2007), a origem do Sensoriamento Remoto (SR) está ligada ao surgimento das fotografias aéreas, bem como ao seu uso militar, sendo que a primeira fotografia aérea foi registrada de um balão no ano de 1856. Posteriormente, essas tecnologias foram se aprimorando e, na Primeira Guerra Mundial, intensificou-se o uso de fotografias tiradas de aviões. Ainda no âmbito militar, concomitante à Guerra Fria, muitos sensores de alta resolução foram desenvolvidos com intuito de espionagem. Na década de 1960, a partir do lançamento do primeiro satélite meteorológico da série Tiros, deu-se início aos primeiros registros sistemáticos por meio de imagens da Terra. Na 23 década seguinte, mais especificamente em 1972, a Agência Espacial Americana (NASA) lança o primeiro satélite de recursos terrestres, o Landsat-1, que a princípio era chamado de ERTS-1 (Earth Resources Technology Satellite) (FLORENZANO, 2007). Observado esse breve histórico do SR e, tendo em vista a consolidação dessa tecnologia nos dias de hoje, a mesma autora define que: Sensoriamento remoto é a tecnologia que permite obter imagens e outros tipos de dados da superfície terrestre, por meio da captação e do registro da energia refletida ou emitida pela superfície. O termo sensoriamento remoto refere-se à obtenção dos dados, e remoto, que significa distante, é utilizado porque a obtenção é feita à distância, ou seja, sem o contato físico entre o sensor e a superfície terrestre...” (FLORENZANO, 2007, p.11) Jensen (2009, p. 4), utiliza uma conceituação mais simples ao expor que “Sensoriamento remoto é a aquisição de dados sobre um objeto sem tocá-lo” sendo que nas próprias palavras do autor, essa definição é “curta, simples, geral e memorizável”. No entanto, o autor apresenta ainda uma definição mais técnica abrangendo maiores especificações sobre o sensoriamento remoto. Sensoriamento remoto é o registro da informação das regiões do ultravioleta, visível e infravermelho e micro-ondas do espectro eletromagnético, sem contato, por meio de instrumentos tais como câmeras, escâneres, lasers, dispositivos lineares e/ou matriciais localizados em plataformas tais como aeronaves ou satélites, e análise da informação adquirida por meio visual. (JENSEN, 2009, p. 4) Do mesmo modo, Novo (1992) afirma que o sensoriamento remoto é definido como “a utilização conjunta de modernos sensores, equipamentos para processamento de dados, equipamentos de transmissão de dados, aeronaves, espaçonaves etc.” acrescentando ainda a esse conceito, o objetivo de estar estudando a superfície terrestre por meio do “registro e análise de interações entre a radiação eletromagnética e as substâncias componentes do planeta Terra e suas mais diversas manifestações” (NOVO, 1992, p. 2). Assim, o Sensoriamento Remoto torna-se um divisor de águas no âmbito científico, pois obter informações de determinado local, sem um contato direto, isto é, remotamente, proporcionou uma grande evolução em pesquisas acadêmicas. Dessa forma, as técnicas de sensoriamento remoto vêm se tornando um “instrumento imprescindível aos planejadores, ambientalistas e pesquisadores ligados à Ciência da Terra”, pois permite “a obtenção de informações sobre determinada área e os fenômenos que nela ocorrem” (LUCHIARI et al, 2005, p. 33). 24 Aliado ao sensoriamento remoto, o geoprocessamento também trouxe suas contribuições, evidenciadas em diversas pesquisas científicas, como também por diversos autores. De uma maneira mais simples, Câmara e Medeiros (1998, p. 3) evidenciam que o geoprocessamento é “uma disciplina do conhecimento que utiliza técnicas matemáticas e computacionais para o tratamento de informações geográficas”. Fitz (2008) conceitua o geoprocessamento em um âmbito mais amplo, pois atribui o trabalho com dados referenciados tendo como base alguma informação geográfica, evidenciando que seria: [...] uma tecnologia, ou mesmo um conjunto de tecnologias, que possibilita a manipulação, a análise, a simulação de modelagens e a visualização de dados georreferenciados. Trata-se, portanto, de uma técnica agregada ou não ao uso de um SIG. (FITZ, 2008, p.24) Para Piroli (2010), geoprocessamento é definido como ramo da ciência que analisa o processamento de informações georreferenciadas por meio de Sistemas de Informações Geográficas (SIGs), equipamentos computacionais, além de dados de fontes variadas, possibilitando a manipulação, geração e avaliação de produtos, geralmente cartográficos para fins como de localização na superfície terrestre. Portanto, o geoprocessamento, com seu sentido de processamento de dados georreferenciados, constitui a implantação de processos que tragam progressos na representação da Terra, ou seja, integrando a essa ação uma nova visão, através das informações resultantes desse conhecimento (MOURA 2005). Nesse ínterim, como mencionado, outra ferramenta muito utilizada, constitui os Sistemas de Informações Geográficas (SIGs), pois são elementos fundamentais nos trabalhos com produtos de sensoriamento remoto e técnicas de geoprocessamento. No sentido de melhor compreender a ideia de SIGs, Fitz (2008) os define como: [...] um sistema constituído por um conjunto de programas computacionais, o qual integra dados, equipamentos e pessoas com o objetivo de coletar, armazenar, recuperar, manipular, visualizar e analisar dados espacialmente referenciados a um sistema de coordenadas conhecidos (FITZ, 2008, p. 23). Nesse contexto, Câmara e Medeiros (1998, p. 3) apontam que os Sistemas de Informações Geográficas “permitem a realização de análises complexas ao integrar dados de diversas fontes e ao criar bancos de dados georreferenciados.” Além disso, os SIGs possibilitam ainda “a automatização da produção de documentos cartográficos” (CÂMARA; MEDEIROS, 1998, p. 3). 25 Então, através desse conjunto de informações possibilitadas por meio da relação entre essas ferramentas, é possível realizar uma série de estudos e análises sobre as mais variadas áreas, sobretudo as que envolvam o estudo da superfície terrestre. No que diz respeito ao uso dessas geotecnologias em análises das questões ambientais, diversos autores confirmam essas aplicações em seus trabalhos, tais como Piroli (2002), Prado (2004), Kawakubo et al. (2005), Piroli (2013) e Romagnoli (2013), entre outros. Em vista disso, nota-se que a adesão a essas três geotecnologias (Sensoriamento Remoto, Geoprocessamento e os Sistemas de Informações Geográficas) permite grande contribuição multidisciplinar, pois como observado, além da utilização das mesmas ser de muita confiabilidade em amplas áreas do conhecimento, dão luz ainda, com muita eficiência, aos estudos de cunho ambiental de variados níveis, como os de modificação da paisagem, os de uso da terra, bem como os de recursos hídricos. 3.4 Manejo de microbacias rurais e urbanas Como já é sabido, a alteração do meio natural por parte do ser humano conduz a um processo de degradação desse meio, pois acabam surgindo novos usos que, via de regra, ocorrem de maneira inadequada. Nesse sentido, essa situação vem alavancando uma série de estudos relacionados ao modo como lidar e gerir os desequilíbrios causados por essas mudanças em determinado local. São um conjunto de medidas, estratégias e ações a serem tomadas em determinado local, ou seja, um manejo, que seria a compreensão e conhecimento sobre os meios, de como lidar de maneira adequada frente a uma atividade ou realidade de uso e ocupação distintos que porventura possam estar interferindo negativamente no equilíbrio e na dinâmica ambiental da área. O manejo de bacias e microbacias hidrográficas não é diferente. Nessa perspectiva, de se entender melhor a relevância dos estudos em Bacias Hidrográficas e de se compreender o que é, e como se dão as dinâmicas nessa escala de análise, Silveira (2007) conceitua de maneira mais direta ao evidenciar que seria: Uma área de captação natural da água de precipitação que faz convergir o escoamento para um único ponto de saída. Compõe-se de um conjunto de superfícies vertentes e de uma rede de drenagem formada por cursos de água que confluem até resultar em um leito único no seu exutório. [...] compõe-se basicamente de um conjunto de superfícies vertentes e de uma rede de drenagem formada por cursos de água que confluem até resultar um leito único no exutório (SILVEIRA, 2007, p. 40). Dessa forma, observa-se que esse tipo de intervenção é de suma importância, pois é nessa escala de análise que ocorre a inter-relação de variados processos com características 26 totalmente diferentes. Esses, comumente, se dão sem nenhum tipo de embasamento, tendo como resultados a degradação ambiental, uma vez que são nas bacias e microbacias hidrográficas que ocorrem processos de devastação de matas nativas para a implantação de sistemas agrícolas diversos. Ocorrem também nesse local, a urbanização, a industrialização, entre outras atividades. Nesse sentido, ações de manejo nessa escala são fundamentais. Nesse contexto, a bacia hidrográfica, por apresentar essa integração de elementos naturais, sociais e econômicos, foi definida pela Política Nacional de Recursos Hídricos como “a unidade territorial para implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos e atuação do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos” (BRASIL, 1997). Dessa forma, todo o planejamento das políticas públicas sobre os recursos hídricos tem essa escala de análise como referência. Pensando nisso, Rocha (1991 apud NARDINI, 2013 p. 27) salienta que: para corrigir o meio ambiente deteriorado, é necessário gerenciar as unidades de planejamento: naturais (bacia hidrográfica e a região fisiográfica) e políticas (propriedade rural, Município e Estado). Aconselha a começar a recuperação do meio ambiente pelas bacias hidrográficas, que subdivididas em sub-bacias e microbacias, têm mostrado grande eficiência em trabalhos de campo (ROCHA, 1991 apud NARDINI, 2013, p. 27). Dessa forma, o manejo de bacias hidrográficas para Brooks et al. (1991 apud LIMA, 2008, p. 2) se define como sendo o “processo de organizar e orientar o uso da terra e de outros recursos naturais numa bacia hidrográfica, a fim de produzir bens e serviços, sem destruir ou afetar adversamente o solo e a água”. Tonello (2005) vai mais além, atribuindo o caráter integrador das ações de manejo em bacias hidrográficas. O manejo de bacias hidrográficas corresponde ao processo que permite formular um conjunto integrado de ações sobre o meio ambiente, a estrutura social, econômica, institucional e legal de uma bacia, a fim de promover a conservação e utilização sustentável dos recursos naturais, principalmente os recursos hídricos, e o desenvolvimento sustentável (TONELLO, 2005. p. 2). Em microbacias hidrográficas, que se encontram em áreas predominantemente ou parcialmente rurais, onde o uso agrícola é intenso, o manejo deve ser pensado como uma alternativa sustentável, unindo produção e conservação. Para isso, é fundamental ter em vista que nessas áreas, os principais problemas se dão por conta do avanço da fronteira agrícola sobre os recursos naturais da microbacia. Portanto, há um processo de devastação das matas nativas em virtude desse cultivo crescente. Além disso, na manutenção dessas culturas pode suceder contaminação do solo e da água por conta do uso inadequado de agrotóxico. É importante também analisar o tipo de irrigação apropriada para a área, para que não haja 27 desperdício, considerando que os maiores usos consuntivos da água ocorrem através da irrigação de culturas (TELLES; DOMINGUES, 2006). No que diz respeito às microbacias localizadas em áreas urbanas, os problemas também são inúmeros, ao passo que envolvem várias questões, tais como abastecimento, saneamento básico, drenagem urbana, moradia, lazer, entre outras. Dessa forma, pensar em um modelo de manejo de uma microbacia urbana é pensar em um modelo de planejamento urbano que seja socioambientalmente viável para determinada área, isto é, um planejamento que abranja e contemple esses diversos pontos. Nesse contexto, é importante levar em consideração a situação ambiental de rios e córregos, tendo a sua conservação como prioridade, bem como a questão dos efluentes urbanos e industriais, que contribuem na poluição desses mananciais urbanos. No que diz respeito à drenagem urbana, deve-se dar atenção para políticas públicas que norteiem adequadamente os processos de urbanização, excesso de impermeabilização do solo, pois essas condições proporcionam um aumento do escoamento superficial que, associado a um planejamento urbano impróprio, podem dar origem a problemas como as enchentes. Nesse cenário, observa-se que os recursos hídricos são fortemente impactados em consequência do processo de urbanização, principalmente nos países em desenvolvimento. Sendo assim, Tucci (2003) afirma que: O ciclo hidrológico sofre fortes alterações nas áreas urbanas devido, principalmente, à alteração da superfície e a canalização do escoamento, aumento de poluição devido à contaminação do ar, das superfícies urbanas e do material sólido disposto pela população. Esse processo apresenta grave impacto nos países em desenvolvimento, onde a urbanização e as obras de drenagem são realizadas de formas totalmente insustentáveis, abandonadas pelos países desenvolvidos já há trinta anos. (TUCCI, 2003, p. 36). Assim sendo, constata-se que as bacias e microbacias hidrográficas estão estruturadas em usos múltiplos. Desse modo, esses vários usos demandam um plano adequado de manejo, no qual a implementação dependa, além de um conjunto de medidas estratégicas, de profissionais capacitados para atuar nessa perspectiva. Fato que não se vê com frequência nas prefeituras e órgãos competentes das cidades brasileiras. Posto isso, o manejo de microbacias deve ser elaborado por profissionais de variadas áreas, bem como possuir um caráter integrador, unindo os diversos setores da sociedade, objetivando agregar todas as dinâmicas que ocorrem na área da microbacia, seja ela de natureza rural ou urbana. 28 3.5 Gestão dos Recursos Hídricos A degradação do solo e a contaminação dos mananciais em consequência do processo de ocupação irregular, do crescimento das cidades e também as práticas agrícolas inadequadas evidenciam a necessidade de pesquisas pautadas no estudo da paisagem considerando suas dinâmicas, de modo que possibilitem a criação de diretrizes e leis que corroborem com a regularização ambiental. Para minimizar os impactos da degradação, contribuir para a preservação dos recursos hídricos e assegurar a qualidade da água para das gerações presentes e futuras, instituindo políticas de conservação de maneira integrada e participativa, foi alterado o “Código de Águas”, decreto 24.643/34 que já não contemplava tais ações. Assim, em 8 de janeiro de 1997, foi instituída a Lei nº 9.433/97, a chamada “Lei das Águas” que estabeleceu a Política Nacional de Recursos Hídricos e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH), (BRASIL, 1997). Esse órgão, por meio do Conselho Nacional de Recursos Hídricos (CNRH), promove articulações sob o viés do planejamento de recursos hídricos, entre entidades nacionais, estaduais, e regionais, além de usuários. Ademais, esse documento (Política Nacional de Recursos Hídricos) guia ações referentes à gestão das águas no Brasil, estabelecendo políticas públicas e diretrizes voltadas a um uso racional da água, levando em conta a qualidade e quantidade desse recurso. E como já mencionado anteriormente, a bacia hidrográfica é a unidade territorial para implementação das políticas, bem como do planejamento dos recursos hídricos. Nesse sentido, para Leal (2012), o planejamento dos recursos hídricos se compõe de um instrumento essencial no gerenciamento da água e da bacia hidrográfica, ao passo que esse mecanismo contribui na indução ou restrição do uso e cobertura da terra e na criação de planos que orientem o desenvolvimento econômico nessas áreas, tendo em vista a direção e controle sobre o acesso e o uso da água. O mesmo autor afirma ainda que: [...] gerenciar águas e bacias hidrográficas exige que se considerem diversos processos naturais e sociais interligados, com abordagem holística e sistêmica, visando compatibilizar o uso e ocupação do solo nas bacias hidrográficas com a garantia de disponibilidade de água para a sustentabilidade do desenvolvimento econômico, social e ambiental. (LEAL, 2012, p. 69) Considerando essa visão sistêmica sobre a bacia hidrográfica, Ab’Saber (1987, apud TUNDISI, 2003 p. 3), evidencia que o uso dessa unidade “ecogeofisiográfica” permite “a clara delimitação e a natural interdependência de processos climatológicos, hidrológicos, 29 geológicos e ecológicos sobre os quais atuam as forças antropogênicas, em que as atividades e sistemas econômicos, sociais e biogeofísicos interagem”. Nesse sentido, autores como Valente e Gomes (2005), também confirmam a importância da bacia hidrográfica no planejamento e na gestão dos recursos hídricos pontuando que: Qualquer ação exercida sobre a água como captação, tratamento, distribuição, uso recreativo etc., pressupõe a sua prévia existência em um determinado local e em quantidade necessária. Daí a importância da bacia hidrográfica, pois é ela que recebe a água que chega à superfície da Terra em forma de chuva, processa essa água e cria disponibilidades através de nascentes ou de lençóis freáticos e artesianos. As nascentes formam os córregos e rios e os lençóis podem ser explorados através da abertura de poços (VALENTE; GOMES, 2005, p. 32). Além disso, a gestão adequada dos recursos naturais, bem como dos recursos hídricos, é orientada também pela legislação ambiental que, apesar de muitas controvérsias, é uma ferramenta de suma importância nas questões que envolvem o planejamento ambiental. Segundo Garcia (2012), a legislação ambiental brasileira é considerada uma das mais avançadas do mundo, pois insere-se de forma contundente nas atuais discussões envolvidas na questão ambiental moderna. Todavia, sua execução é complexa e exige, dessa forma, maior atenção em sua implementação, pois um dos grandes problemas é que nem sempre é fiscalizada adequadamente. Nesse sentido, o Código Florestal Brasileiro possui falhas, brechas que acabam contribuindo para a apropriação incorreta do meio ambiente e de seus recursos. Contudo, mesmo com os problemas, o Código Florestal, desde a sua criação em 1934 editado em setembro de 1965 por meio da Lei nº. 4.771 e também nas atuais mudanças por meio da Lei nº 12.651/2012, juntamente com as críticas e colaboração de especialistas no assunto, vem buscando alternativas que norteiam a proteção do meio ambiente e, consequentemente, o bem estar da população. Nessa mesma perspectiva, outra questão diretamente ligada aos recursos hídricos, é a presença das Áreas de Preservação Permanente (APP) ao longo dos corpos d´água, que foram muito discutidas nos últimos anos, pois juntamente com a Reserva Legal (RL), é considerada uma das principais fontes de proteção e conservação ambiental previstas no Código Florestal. 3.6 Áreas de Preservação Permanentes (APPs) De acordo com a Lei nº 12.651/12 (BRASIL, 2012) as Áreas de Preservação Permanente são consideradas como sendo: 30 [...] área protegida nos termos dos artigos 2 e 3 desta Lei, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas. Sendo assim, essas áreas unem diversos elementos e se constituem de uma importância tanto física, quanto ecológica, na qual se encontram na função ambiental de preservar os recursos hídricos, o meio natural, bem como a biodiversidade local. Tratam-se, portanto, de “ecossistemas únicos, dotados de características peculiares que os diferenciam dos ecossistemas maiores, nos quais estão inseridas” (PIROLI, 2013, p. 9). No que diz respeito às APPs, o Código Florestal Brasileiro define atualmente, em seu Artigo 4º da Lei nº 4.771/1965, reeditado pela Lei nº 7.803 de 18 de julho de 1989 e incluído na Lei nº 12.651/12 (BRASIL, 2012), que serão de preservação permanente as áreas estabelecidas: a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será: 1 - de 30 (trinta) metros para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de largura; 2 - de 50 (cinqüenta) metros para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinqüenta) metros de largura; 3 - de 100 (cem) metros para os cursos d'água que tenham de 50 (cinqüenta) a 200 (duzentos) metros de largura; 4 - de 200 (duzentos) metros para os cursos d'água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura; 5 - de 500 (quinhentos) metros para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros [...]. [...] IV - as áreas no entorno das nascentes e dos olhos d’água perenes, qualquer que seja sua situação topográfica, no raio mínimo de 50 (cinquenta) metros; V - as encostas ou partes destas com declividade superior a 45°, equivalente a 100% (cem por cento) na linha de maior declive; VI - as restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues; VII - os manguezais, em toda a sua extensão; VIII - as bordas dos tabuleiros ou chapadas, até a linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais; IX - no topo de morros, montes, montanhas e serras, com altura mínima de 100 (cem) metros e inclinação média maior que 25°, as áreas delimitadas a partir da curva de nível correspondente a 2/3 (dois terços) da altura mínima da elevação sempre em relação à base, sendo esta definida pelo plano horizontal determinado por planície ou espelho d’água adjacente ou, nos relevos ondulados, pela cota do ponto de sela mais próximo da elevação; X - as áreas em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a vegetação. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12727.htm 31 Deste modo, pensando na água como recurso fundamental para a sobrevivência humana, constata-se a necessidade de se analisar o uso dessas Áreas de Preservação Permanente, pois estão intimamente ligadas aos cursos d´água e, assim, à conservação dos recursos hídricos. Isto posto, percebe-se relevância da gestão apropriada de bacias e microbacias hidrográficas na conservação dos recursos hídricos, assim como de suas Áreas de Preservação Permanente. Dessa forma, proporcionará um uso mais sustentável do recurso água, contribuindo assim para um desenvolvimento com o menor impacto aos recursos hídricos e consequentemente ao meio ambiente. Nesse sentido, a gestão de recursos hídricos deve considerar ações que visem dirigir os usos, o domínio, bem como a proteção hídrica por meio de uma fiscalização efetiva, tendo em vista legislações que norteiem essa problemática. Assim sendo, é nítido que o processo de conservação e gestão dos recursos hídricos começa nas nascentes das microbacias e nas margens dos cursos d´água. 3.7 Classes de declividade e uso da terra Considerando a declividade um dos fatores mais importantes na formação do escoamento superficial e, que esse, dependendo do tipo de uso e cobertura da terra, bem como da forma de manejo da área, contribui para diversos problemas ambientais que afetam diretamente os recursos hídricos, o estudo da relação entre essas áreas não pode ser deixado de lado. Como já mencionado nesse trabalho, em áreas urbanas este tipo de situação, guardadas as proporções, favorece episódios de alagamentos e enchentes nas áreas mais baixas das cidades. Já em áreas rurais, as declividades mais acentuadas associadas ao escoamento superficial da água, proporcionam a formação de processos erosivos que, além de levar à perdas de solo, matéria orgânica e nutrientes, ocasionam a deposição de sedimentos em corpos d´água próximos, causando impactos como assoreamento e contaminação. Os conflitos de uso da terra podem ocorrer por diversos tipos de ocupação da terra em áreas inadequada. No caso de elevadas declividades, por exemplo, Ruhoff (2004) aponta que: Os conflitos de uso da terra ocorrem quando são exercidas atividades sobre o solo, sem que este tenha capacidade de suportar tais ações. Culturas agrícolas ou pastagens, ocupações urbanas, desmatamento são exemplos de conflitos de uso da terra quando realizados em áreas impróprias, como em elevadas declividades e topos de morros. Estes figuram entre os maiores responsáveis pelas erosões, assoreamento dos rios, enchentes e secas, contaminação de lençóis freáticos, poluição hídrica e lixiviação do solo (RUHOFF, 2004, p. 64). 32 Dessa forma, entender e conhecer a declividade de determinadas áreas da superfície terrestre, principalmente em bacias hidrográfica é uma etapa fundamental em estudos que envolvem a análise ambiental, ou capacidade de uso da terra. E, pensando no uso adequado do solo, de acordo com Lepsch et al. (1989, p. 87), “em muitos casos, é a topografia do terreno, especialmente a declividade, o principal condicionador de sua capacidade de uso”. Nesse sentido, Silva (2011) salienta que obter informações sobre a declividade de uma área é essencial para a tomada de decisão na escolha, no caso da agricultura, de técnicas de manejo adequado do solo. O mesmo autor diz que conhecer a declividade é importante também para os recursos hídricos, salientando que: Através do conhecimento da declividade do terreno há a possibilidade de se compreender o comportamento do processo de escoamento da água na bacia hidrográfica bem como de suas propriedades hidrológicas ou mesmo a sensibilidade do terreno a processos erosivos (SILVA, 2011, p. 38). Desse modo, entende-se a grande influência da declividade no surgimento e desenvolvimento de erosões. A inclinação do declive do terreno possui grande relevância nas perdas de solo e água por erosão hídrica, uma vez que com seu aumento, se diminui a capacidade de infiltração no solo e aumentam as enxurradas (COGO et al., 2003). De acordo com Bertoni e Lombardi Neto (2012): A topografia do terreno, representada pela declividade e pelo comprimento dos lançantes, exerce acentuada influência sobre a erosão. O tamanho e a quantidade do material em suspensão arrastada pela água dependem da velocidade com que ela escorre, e essa velocidade é uma resultante do comprimento do lançamento e do grau de declive do terreno (BERTONI; LOMBARDI NETO, 2012, p. 56). Os mesmos autores definem ainda que: Erosão é o processo de desprendimento e arraste acelerado das partículas do solo causado pela água e pelo vento. A erosão do solo constitui, sem dúvida, a principal causa do depauperamento acelerado das terras. A enxurradas, provenientes das águas de chuva que não ficam retidas sobre a superfície, ou não se infiltram, transportam partículas de solo em suspensão e elementos nutritivos essenciais em dissolução. Outras vezes, esse transporte de partículas de solo se verifica, também, por ação do vento (BERTONI; LOMBARDI NETO, 2012, p. 69). Para Lepsch et al. (1983), o estágio de uma erosão do solo, ponderando suas várias formas, denota importante aspecto a ser analisado, tendo em vista que aponta o nível de perda de sua produtividade, além das características de práticas conservacionistas a serem exercidas. Assim, entende-se que são grandes os problemas causados pelas erosões, no entanto, existem diversas práticas e técnicas de manejo para o controlá-las, dependendo do nível de desenvolvimento, bem como do tipo dessa erosão. 33 Dessa forma, percebe-se o quanto é importante buscar identificar e analisar as áreas de grandes declividades e associá-las com os diversos usos e coberturas da terra, bem como com as dinâmicas que existam em determinada área, para que se possa evitar ou diminuir situações como as mencionadas. 4 MATERIAL E MÉTODOS 4.1 Caracterização da área de estudo A microbacia do Córrego da Cascavel se encontra na franja urbana do município de Matão-SP, abrange uma área de 5.214 hectares, e possui algumas de suas várias nascentes no Jardim Paraíso, um dos bairros do município. Durante seu curso de cerca de14 km, percorre tanto áreas urbanas como industriais e rurais até se encontrar com o Rio São Lourenço, sendo o maior afluente desse rio no município. Além disso, essa microbacia é cortada por duas importantes rodovias, a Washington Luís (SP-310) e a Rodovia Brigadeiro Faria Lima (SP- 326). A imagem abaixo (Figura 3) mostra a localização da área de estudo. Figura 3. Localização da Área de Estudo 34 O Município de Matão situa-se na região central do estado de São Paulo, e tem sua sede nas coordenadas 21º 36’10”S e 48º 22’ 03”O. Ao norte faz fronteira com os municípios de Taquaritinga e Dobrada; ao sul, com Nova Europa e Gavião Peixoto; a leste, com Araraquara; a nordeste, com Motuca; a oeste, com Itápolis e a sudoeste com Tabatinga. Possui uma população aproximada de 80.990 habitantes e uma densidade demográfica de 146,30 hab/km² compreendidos em uma área de 524,85 km² (IBGE, 2014). No que diz respeito ao Sistema Paulista de Gerenciamento de Recursos Hídricos, o município de Matão-SP, pertence a três Unidades de Gerenciamento de Recursos Hídricos (UGRHI), sendo elas: Tietê/Batalha (UGRHI-16), Tietê/Jacaré (UGRHI-13) e Mogi-Guaçu (UGRHI-09). No entanto, a microbacia do Córrego da Cascavel pertence à bacia do Rio São Lourenço (que nasce no município de Matão, tendo sua foz no município de Borborema, mais precisamente no Rio dos Porcos, já próximo ao Rio Tietê) que por sua vez, estão inseridas na Unidade de Gerenciamento de Recursos Hídricos-Tietê/Batalha (UGRHI-16). Na Figura 4, pode-se observar o município de Matão subdividido em três UGRHI e inserido na UGRHI-16. Figura 4. Município de Matão na UGRHI 16 (Tietê/Batalha) Fonte: http://valordaagua.com.br/comite-da-bacia-hidrografica-do-tiete-batalha.html. Adaptado por Oliveira (2015). Além disso, é importante considerar também a questão da disponibilidade de recursos hídricos superficiais do município, pois de acordo com Calijuri et al. (1997) apud Carvalho (2004), foi constatado através de pesquisa que, em termos quantitativos, no município de http://valordaagua.com.br/comite-da-bacia-hidrografica-do-tiete-batalha.html 35 Matão existe uma baixa disponibilidade de recursos hídricos superficiais, sendo que o principal curso d’água do município, o rio São Lourenço, após a zona urbana apresentou vazão próxima a 1,0 m³/s. Considerando essa escassez de recursos hídricos superficiais do município, a captação de água é realizada por meio de poços profundos. Nesse sentido, o município é abastecido por 16 poços artesianos com profundidades que variam de 120 a 620 metros, os quais retiram água direto do Aquífero Guarani. Depois da captação, a água segue para reservatórios, local onde passa por tratamento adequado acionado por bombas dosadoras (CAEMA, s/d) 2. Analisando a composição geomorfológica do município, a partir do Mapa Geomorfológico do Estado de São Paulo (IPT, 1981), identificou-se que a área do município se encontra na Unidade Morfoestrutural da Bacia Sedimentar do Paraná, sendo que sua Unidade Morfoescultural se localiza no Planalto Central Ocidental, na qual os modelos dominantes são de colinas amplas e baixas. No que concerne à geologia da área, predominam rochas sedimentares do Grupo Bauru, Formação Adamantina (Ka). Essa formação é composta por depósitos fluviais com predominância de arenitos finos, podendo apresentar cimentação e nódulos carbonáticos, com lentes de siltitos e argilitos, ocorrendo em bancos maciços, estratificação plano paralela e cruzada (IPT, 1981). No entanto, de acordo com Oliveira (2005), além da Formação Adamantina e subjacentes, ocorrem também na região do município, no contato inferior, o basalto da formação Serra Geral e os arenitos eólicos das formações Botucatu e Pirambóia, ambas do Grupo São Bento. A composição pedológica do município, de acordo com o Mapa Pedológico do Estado de São Paulo (EMBRAPA, 1999), é de classes de solo do tipo Argissolos Vermelho- Amarelos, antigo Podzólico Vermelho-amarelo (PVA2) com ocorrência também de Latossolos Vermelhos (LV45). O clima do município, segundo a classificação de Koeppen, é do tipo Aw (tropical chuvoso com inverno seco) com uma temperatura média anual em torno de 23,5ºC, sendo que a temperatura média dos meses mais frios chega a 20,0ºC e dos meses mais quentes atinge 26,0ºC. A precipitação média anual do município é de aproximadamente 1.268,3 mm havendo uma precipitação média no mês mais seco (agosto) e o mais chuvoso (janeiro), respectivamente, de 21,5 mm e 224,8. (CEPAGRI/UNICAMP, 2013). A composição vegetacional do município se dá pelos biomas de Cerrado e de Mata Atlântica do Interior ou Floresta Estacional Semidecidual (IBGE, 2014). Existem alguns fragmentos de mata Atlântica do Interior pela área do município. O maior deles é considerado 2 CAEMA: (site) Companhia de Água e Esgoto de Matão, sem data. Citado nas referências bibliográficas. 36 um dos maiores fragmentos de Mata Atlântica do Noroeste paulista e pertence à Fazenda Cambuhy, sendo conhecido como “Mata da Virgínia”. Com seus 1.900 hectares, essa mata abriga inúmeras espécies de animais silvestres, bem como uma rica flora, sendo objeto de muitos estudos de diversas áreas do conhecimento. Na Figura 5, pode-se observar o tamanho deste fragmento florestal, tendo como base a mancha urbana do município de Matão. Figura 5. Mata da Virgínia, no município de Matão Fonte: Google Earth Pro. Adaptado pelo Autor (2015). 4.2 Materiais Para a elaboração deste trabalho, foram utilizados os seguintes equipamentos e materiais: -Computador com 8 Gb de memória RAM com capacidade de armazenamento superior a 500 Gb; -Editor de texto (Word-2007); -Planilha eletrônica (Excel-2007); -SIG ArcGIS 9.1.3 e 10.1; -Aplicativo do Google Earth; -Carta topográfica do município de Matão-SP (SF-22-X-D-VI-1), Folha de Matão (IBGE, 1971); -Imagens multiespectrais do Satélite Landsat-8, de 26 de março de 2014, órbita 220, ponto 75, sensor OLI (Operational Land Imager), bandas 2, 3 e 4; - Imagens SRTM (Shuttle Radar Topography Mission) com resolução de 30 metros; 37 -Câmera fotográfica para registros em trabalhos de campo. 4.3 Procedimentos metodológicos No que se refere à parte prática, essa envolveu a aquisição do material necessário para o desenvolvimento do trabalho. Desse modo, foi obtido junto ao GeoServer UNESP/Ourinhos, a carta topográfica 1:50.000 do município de Matão-SP, folha SF-22-X-D- VI-1, a qual foi georreferenciada por meio do software ArcGis 9.3.1. Esse programa está disponível no Laboratório de Geoprocessamento, bem como no Laboratório do Grupo CEDIAP-GEO (Centro de Estudo e Divulgação de Informação sobre Áreas Protegidas - APPs, RLs, APAs), Bacias Hidrográficas e Geoprocessamento da UNESP - Câmpus de Ourinhos. Utilizando o mesmo programa, foi identificada e delimitada na carta, a microbacia do Córrego da Cascavel. Depois disso, foram adquiridas imagens do satélite Landsat-8, sensor OLI (Operational Land Imager) cuja resolução espacial no modo multiespectral é de 30 metros. As imagens abrangendo o município de Matão, são datadas de 26 de março de 2014 e foram adquiridas do site Earth Explorer do Serviço Geológico dos Estados Unidos. Essas imagens foram também processadas no software ArcGIS 9.3.1. de modo que se pudesse georreferenciá-las com base na carta topográfica da área de estudo. Dando sequência aos procedimentos, foi feita a composição colorida com as bandas do Landsat-8 (RGB-432) para melhor discriminar os alvos analisados, facilitando a interpretação da cobertura do uso da terra. Em seguida, foi vetorizado o limite da Microbacia do Córrego da Cascavel, com base na delimitação anteriormente feita na carta topográfica. É conveniente ressaltar, que foi utilizado o Sistema de Referência Geocêntrico para as Américas - SIRGAS 2000 em todo o mapeamento da pesquisa. A partir disso, foram elaborados os primeiros mapas (Drenagem, Uso da Terra e APP), os quais possibilitaram a sistematização dos primeiros resultados da pesquisa. 38 4.3.1 Mapa de drenagem O mapa de drenagem foi elaborado por meio da vetorização dos corpos d´água da microbacia do Córrego da Cascavel na carta topográfica, utilizando o SIG ArcGis. Além disso, houve atualização da drenagem por meio das imagens de satélite. 4.3.2 Mapa de uso da terra A classificação dos usos e coberturas da terra foi realizada também utilizando o SIG ArcGis e por meio de classificações visuais para identificar e vetorizar os usos na imagem de satélite, a qual, ao mesmo tempo ia sendo confirmada com ajuda do Google Earth e, posteriormente, pelos trabalhos de campo. Nessa classificação, ainda foram utilizados critérios visuais como tonalidade, textura, rugosidade, sombra e aspectos da vizinhança, conforme Jensen (2009). 4.3.2.1 Classificação dos usos da terra Baseado no Manual Técnico do Uso da Terra (IBGE, 2013), por meio do levantamento do uso da terra, análise das imagens de satélite, bem como dos trabalhos de campo, foram identificadas dez classes de uso e ocupação na microbacia do Córrego da Cascavel. Essas classes foram separadas em algumas grandes classes: Áreas Antrópicas Não Agrícolas; Áreas Antrópicas Agrícolas, Áreas de Vegetação Natural e Água (IBGE, 2013). Assim, as classes identificadas foram: Área Industrial, Área Urbana, Campestre, Floresta Nativa, Cultura Permanente, Cultura Temporária, Silvicultura, Pastagem, Infraestrutura e Represa, como pode-se observar na Figura 6. . 39 Figura 6. Esquema das classes de uso da terra na Microbacia do Córrego da Cascavel. Fonte: Organizado pelo Autor (2015), Adaptado de IBGE (2013). A seguir estão as descrições de cada classe de uso identificada na microbacia do Córrego da Cascavel, assim como fotografias das mesmas, registradas nos trabalhos de campo. Áreas industriais: De acordo com IBGE (2013), podem estar incluídos em área urbana, ou urbano-industriais, compreendendo distritos industriais, micro e pequenas unidades até grandes empresas. Essas indústrias ainda podem ser leves, pesadas, usinas, com vínculo com o setor agropecuário ou com algum parque tecnológico. Na Figura 7 são mostrados exemplos de áreas industriais na microbacia. Figura7. Áreas com usos industriais na microbacia do Córrego da Cascavel. Foto: Oliveira (2015). 40 Áreas Urbanas: Segundo IBGE (2013), são áreas correspondentes a superfícies artificiais não agrícolas, como as metrópoles, cidades, vilas, distritos. Áreas com uso intensivo, estruturadas com sistema viário e edificações, áreas de serviço, comércio, indústrias, transporte, energia e comunicação. Na figura 8, são mostradas imagens de áreas urbanas. Figura 8. Áreas com uso urbano na microbacia do Córrego da Cascavel. Foto: Oliveira (2015). Campestre: Conforme IBGE (2013), esta classe apresenta diferentes categorias de vegetação, com estrato predominantemente arbustivo e espaçadamente distribuído, possuindo também gramíneas. Na Figura 9, são mostradas imagens identificadas como campestre. Figura 9. Áreas com cobertura de vegetação campestre na microbacia do Córrego da Cascavel. Foto: Oliveira (2015). Floresta Nativa: IBGE (2013) diz que florestas nativas são formações arbóreas com porte superior a 5 m, incluindo as fisionomias da Floresta Densa, Floresta Aberta, Floresta Estacional e Floresta Ombrófila Mista. Além disso, nessa classe, incluem ainda, áreas de remanescentes primárias e estágios evoluídos de recomposição florestal. Na Figura 10, são mostrados exemplos de floresta nativa. 41 Figura 10. Áreas com cobertura de Floresta Nativa na microbacia do Córrego da Cascavel. Foto: Oliveira (2015). Cultura Permanente: É o cultivo de plantas perenes, ou seja, de ciclo vegetativo longo, que produzem por vários anos sucessivos sem a necessidade de novos plantios após a colheita. Nessa classe, estão espécies frutíferas, como o cultivo de laranja, caju, coco, maçã, banana, café, entre outras, podendo combinar culturas agrícolas com florestas (IBGE, 2013). Na figura 11, observam-se imagens com cultura agrícola permanente. Figura 11. Áreas com uso agrícola, cultura permanente (laranja) na microbacia do Córrego da Cascavel. Foto: Oliveira (2015). Cultura Temporária: De acordo com o IBGE (2013), é o cultivo de plantas de curta ou média duração, na maioria das vezes com ciclo vegetativo inferior a um ano, deixando o terreno disponível após a produção, ficando livre para um novo cultivo. Nessa classe destacam-se o cultivo de grãos e cereais, raízes, tubérculos e hortaliças entre outras plantas de pequeno porte. Inclui ainda cultivos semipermanentes tais como cana-de-açúcar e mandioca e outras forrageiras destinadas ao corte. Abaixo, na Figura 12, observam-se imagens das culturas temporárias identificadas na microbacia. 42 Figura 12: Áreas com uso agrícola, cultura temporária (A: cana/B:Milho/C: Mandioca). Foto: Oliveira (2015). Silvicultura: Conforme IBGE (2013), a silvicultura está ligada a ações de composição, trato e cultivo de florestas visando o fornecimento de matéria-prima para indústria de madeira, papel e celulose ou para consumo familiar. Apresenta papel de agente protetor e embelezador da paisagem. Na Figura 13, são mostradas imagens de silvicultura. Figura 13. Áreas com Silvicultura (Eucalipto). Foto: Oliveira (2015). Pastagem: Segundo IBGE (2013), pastagem é a área dedicada ao pastoreio de gado, com solo coberto de vegetação gramínea e/ou leguminosas. A pecuária é a atividade desenvolvida nessas áreas, tendo em vista a produção, criação, tratamento de animais de grande, médio e pequeno porte com objetivos econômicos. Nas imagens abaixo, Figura 14, observam-se áreas com pastagem na área de estudo. 43 Figura 14. Áreas com pastagem na microbacia do Córrego da Cascavel. Foto: Oliveira (2015). Infraestrutura: Essa classe foi proposta para compreender elementos artificiais, que podem estar ligados a outras classes como áreas urbanas, industriais, agrícolas, tais como: rodovias, estradas, chácaras, aeroportos, sedes de fazendas, casas e pequenos sítios. Na Figura 15, podem-se observar imagens com a classe infraestrutura. Figura 15. Rodovias (A e B: Rod. Washington Luís -SP-310 / C: Rod. Brigadeiro Faria Lima-SP-326). Foto: Oliveira (2015). Represa: São corpos d´água naturais ou artificiais que não possuem origem marinha (IBGE, 2013). A figura 16 mostra imagens da classe represa identificadas na microbacia. 44 Figura 16. Represa na Microbacia do Córrego da Cascavel. Foto: Oliveira (2015). 4.3.3 Mapa de Áreas de Preservação Permanente (APP) A partir do mapa de uso da terra da microbacia, utilizando as mesmas classes, foi elaborado o mapa de APP, por meio do SIG ArcGis 9.3.1. Assim, foram gerados medidores de distância buffers na drenagem sobre o mapa de uso da terra, acordo com a legislação Lei nº 12.651/12 (BRASIL, 2012), segundo a qual em cursos d´água e afluentes de até 10 metros de largura, as APPs serão de 30 metros cada lado, já para as nascentes, a APP gerada foi de 50 metros. Nas áreas de represa, a APP gerada foi de 15 metros, de acordo com a Resolução CONAMA 302/02 (BRASIL, 2002). Depois disso, as feições geradas foram unidas por meio da ferramenta Merge. Os usos da terra nas APP foram extraídas do mapa de uso da terra utilizando a ferramenta Clip, utilizando os vetores das APPs como máscara. 4.3.4 Mapa Hipsométrico O mapa hipsométrico, ou de altitudes, foi desenvolvido a partir da extração das curvas de nível do SRTM (Shuttle Radar Topography Mission) da área da microbacia, que foram interpoladas utilizando TIN (Triangular Irregular Network). A partir disso, foi feito uma reclassificação das altitudes com intervalos de 20 metros. 4.3.5 Mapa de declividade Para a elaboração do mapa de declividade e de suas respectivas classes, foi necessário adquirir imagens SRTM (Shuttle Radar Topography Mission) da área de estudo. Estas imagens podem ser adquiridas no site da EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária - Serviço Brasil em Relevo) ou por meio do site do Serviço Geológico dos http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12727.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2011-2014/2012/Lei/L12727.htm 45 Estados Unidos USGS (United States Geological Survey), que possuem uma resolução espacial melhor (30 metros). Ainda utilizando o SIG ArcGIS, foi feito o recorte da área de estudo na folha SRTM baixada e, posteriormente foi calculado o declive nas áreas da microbacia em valores percentuais por meio do módulo Slope da ferramenta Spacial Analyst/Surface. Dessa forma, os dados gerados foram reclassificados nas seguintes classes: 0-3%; 3-6%; 6-12%; 12-20%; 20-40% e >40% (FRANÇA, 1963). Os dados da tabela abaixo (Tabela 1) mostram as características dessas classes. Tabela 1: Classes de declividade Classe de declive (%) Relevo 0-3% Plano 3-6% Levemente ondulado 6-12% Moderadamente ondulado 12-20% Ondulado 20-40% Fortemente ondulado >40% Montanhoso Organização: Oliveira (2015). Adaptado de França (1963). 4.3.6 Cruzamento do uso da terra com as classes de declive Primeiramente, foi preciso transformar o arquivo de declividade do formato raster para vetor, já que o arquivo de uso da terra já está neste formato. Para isso, foi necessário fazer uma reclassificação no módulo Reclass da ferramenta Spatil Analyst Tools do ArcGIS 10.1, atribuindo os intervalos de declive mencionados anteriormente. Com os dois arquivos no formato vetorial, o cruzamento foi executado por meio da função intersecção Intersect do ArcGIS. Após esta estapa, foram gerados seis mapas com os respectivos declives, por meio da adição de valores na função Symbology do mesmo programa. Os cálculos da área de declive foram extraídos da tabela de atributos do arquivo intersecsionado, gerando assim a área de cada uso da terra por classe de declive. 46 4.3.7 Trabalhos de campo A confirmação dos usos e cobertura da terra in loco, bem como a compreensão das dinâmicas existentes em determinada área por meio de um conhecimento prévio, s