INSTITUTO DE BIOCIÊNCIAS PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS ZOOLOGIA LABORATÓRIO DE SISTEMÁTICA ZOOLÓGICA TASSIA TURINI GOMES DIVERSIDADE MORFOLÓGICA DE CERDAS DO APARATO BUCAL EM TRÊS ESPÉCIES DE SESARMIDAE (CRUSTACEA, DECAPODA, BRACHYURA, GRAPSOIDEA) BOTUCATU 2021 TASSIA TURINI GOMES DIVERSIDADE MORFOLÓGICA DE CERDAS DO APARATO BUCAL EM TRÊS ESPÉCIES DE SESARMIDAE (CRUSTACEA, DECAPODA, BRACHYURA, GRAPSOIDEA) Dissertação de mestrado apresentada ao Instituto de Biociências, Pós-graduação em Ciências Biológicas - Zoologia, como parte dos requisitos para obtenção do título de mestre em Zoologia, sob orientação do Prof. Dr. William R. A. Santana. BOTUCATU 2021 Aos meus pais Arnaldo e Creusa AGRADECIMENTOS Em especial, toda minha gratidão aos meus pais Arnaldo e Creusa, pelo amor, apoio e incentivo. À minha irmã Tamara pelo carinho, ajuda e companheirismo. Dedico esse trabalho à eles, que sempre prezaram muito pela minha educação e acreditaram em mim. Ao Prof. Dr. William Santana, pela oportunidade e pelos ensinamentos. À Profa. Dra. Carla Gheler, uma mulher incrível e inspiradora, pelo incentivo à pesquisa e pela amizade. À Profa. Dra. Maria Lucia Negreiros-Fransozo pelo auxílio e contribuições, sempre disposta a compartilhar seus conhecimentos. Ao Departamento de Zoologia, juntamente com os professores e funcionários. Ao Prof. Dr. Francisco (Chicão) e ao Nebecc, por disponibilizarem espaço físico e equipamentos que muito me auxiliaram. Aos meus colegas de laboratório Michele, Janaína, Fran, Rafael, João Victor, Peixe e Laira, pela ajuda e por tantos bons momentos que vivemos juntos, e à todos os outros colegas da Zoologia, que sempre estiveram dispostos a me ajudar. Em especial, à Jéssica Colavite, minha grande parceira de laboratório, que se tornou grande amiga, por toda ajuda, ensinamentos e dedicação, por todas risadas e cervejas que partilhamos ao longo desses anos. À Isabel Soares, presente em forma de amizade que a Unesp me deu, por toda ajuda e companheirismo. Aos meus queridos, Anne Capra, Marina Príncipe e Guilherme de Santis, que tanto me ajudaram nos momentos mais difíceis que enfrentei, que nunca mediram esforços para me dar suporte emocional. À todas minhas queridas e valiosas amizades, Aline Nobiato, Letícia Lamesa, Maira Justo, Paola Sitta, Rodrigo Wandekin, Tatiane Flauzino, Vinícius Novaes, que me mostram sempre o significado de uma amizade verdadeira, e a todos outros amigos que fazem parte da minha jornada. À todos aqueles que contribuíram de alguma forma, sou grata. Ao Universo, e aos Mestres de Luz que me guiam, muito obrigada. resumo minha epígrafe à apenas uma palavra, Resiliência! RESUMO No presente estudo foi investigada a diversidade dos tipos de cerdas do aparato bucal nas espécies de sesarmídeos Aratus pisonii, Armases angustipes e Sesarma rectum. O aparato bucal, em espécies de Decapoda, exibe uma variedade de funções e adaptações, não só relacionadas a alimentação, mas também são importantes no comportamento secundário de grooming. Caranguejos grapsóideos, especialmente os pertencentes a Sesarmidae, apresentam forte tendência à herbivoria. O amplo repertório de hábitos alimentares e diferentes estratégias para limpeza do corpo levou a um interesse na morfologia e nas adaptações das peças bucais e de suas unidades funcionais constituintes, as cerdas. Foram encontradas cerdas dos seguintes tipos: paposa, plumosa, plumodenticulada, serrada, simples, cuspidada, e respectivos subtipos. Dois novos tipos de cerdas sem registros na literatura, cerda capitada e cluster serrated, são descritas. A morfologia funcional das cerdas paposas parece estar mais relacionada com formação de tela setal e filtração de água inalante; plumosas em promover fluxo de água; plumodenticuladas apresentam multifuncionalidade; serradas, em ação de escovação ou abrasão; simples e cuspidadas, com manipulação de alimentos. Os aparatos bucais das três espécies são majoritariamente semelhantes, mas A. pisonii possui diferenças marcantes, sendo a única espécie a possuir o tipo de cerda capitada nas peças bucais, cerdas plumodenticuladas no processo mandibular e tufos de cerdas cluster serrated no quelípodo. Por ser considerada a espécie mais herbívora, dentre as estudadas, essas diferenças são possivelmente relacionadas a esta tendência alimentar. Palavras chave: cerdas; aparato bucal; morfologia funcional; herbivoria. ABSTRACT In the present study, the diversity of the setal types of the oral apparatus in the species of sesarmids Aratus pisonii, Armases angustipes and Sesarma rectum was investigated. The oral apparatus, in Decapoda species, exhibits a variety of functions and adaptations, not only related to feeding, but also important in secondary grooming behavior. Grapsoid crabs, especially those belong to Sesarmidae, have a strong tendency to herbivory. The wide repertoire of eating habits and different strategies for cleaning the body led to an interest in the morphology and adaptations of the oral parts and their constituent functional units, the setae. Setae of the following types were found: pappose, plumose, plumodenticulate, serrated, simple, cuspidate, and respective subtypes. Two new types of setae, without records in the literature, capitated setae and cluster serrated, are described. The functional morphology of the pappose setae seems to be more related to the formation of a setal mesh and filtration of inhalant water; plumose in promoting water flow; plumodenticulate have multifunctionality; serrated, in action of brushing or abrasion; simple and cuspidate, with food handling. The buccal apparatus of the three species are mostly similar, but A. pisonii has marked differences, being the only species to have the type of capitated setae in the oral parts, plumodenticulate setae in the mandibular process and tufts of cluster serrated setae in the chelipod. As it is considered the most herbivorous species, among those studied, these differences are possibly related to this feeding trend. Keywords: seate; buccal apparatus; functional morphology; herbivory. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 10 2.1. OBJETIVO GERAL ............................................................................................ 15 2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS: ............................................................................. 15 3. MATERIAIS E MÉTODOS .................................................................................... 16 3.1. ÁREA DE ESTUDO, COLETA E IDENTIFICAÇÃO DE DADOS ................. 16 3.2. MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE VARREDURA ....................................... 18 3.3. HISTOLOGIA ..................................................................................................... 18 3.4. DESCRIÇÃO DAS CERDAS E ELABORAÇÃO DE PRANCHAS ................ 18 4. RESULTADOS ......................................................................................................... 23 4.1. DESCRIÇÕES DOS TIPOS DE CERDAS ........................................................ 23 4.2. LOCALIZAÇÃO DAS CERDAS DO APARATO BUCAL .............................. 40 5. DISCUSSÃO ............................................................................................................. 47 5.1 COMPARAÇÕES COM DESCRIÇÕES PRÉVIAS ........................................... 47 5.2 MORFOLOGIA FUNCIONAL DOS TIPOS DE CERDAS ............................... 51 5.3 COMPARAÇÕES DOS TIPOS DE CERDAS ENTRE AS ESPÉCIES ............. 60 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 61 REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 62 10 1. INTRODUÇÃO Cerdas são projeções cuticulares alongadas que apresentam uma variedade de formas e componentes microestruturais, normalmente com uma articulação distinta na base e um lúmen contínuo, podendo ou não ter um poro apical (Bauer, 1981; Watling 1989). Este tipo de especialização cuticular é encontrado por todo o corpo, desempenhando um papel extremamente importante e variado na vida dos crustáceos, desde a camuflagem à alimentação, higiene e detecção de estímulos sensoriais (Garm, 2004a). As interações entre os tecidos vivos e o ambiente externo, em todos os níveis, ocorre por meio destas estruturas cuticulares, indicando que a cutícula desempenha um papel fundamental na biologia do grupo. Por essas estruturas apresentarem diversas funcionalidades possuem morfologia extremamente diversificada, dependendo das necessidades funcionais em cada parte do corpo (Pohle & Telford, 1981; Garm, 2004b). Altamente provido de muitos tipos de cerdas, o aparato bucal em espécies de Decapoda exibe uma variedade de funções e adaptações, em virtude dos diversos ambientes que colonizam e do tipo de alimentos que consomem (Crane, 1975; Wolcott, 1978). De modo geral, as espécies manipulam os alimentos antes da ingestão por seis pares de apêndices cefalotorácicos modificados, localizados na região bucal sendo: um par de apêndices mais externo, os terceiros maxilípedes, que formam um anel opercular cobrindo os segundo e primeiro maxilípedes; prosseguindo para dentro da cavidade bucal, temos a segunda e primeira maxilas e, finalmente, as mandíbulas (Borradaile, 1922; Miller; 1961; Davie et al. 2015). Este conjunto de peças bucais apresenta funções não só relacionadas a alimentação, mas também são importantes no comportamento de grooming (Holmquist, 1989). Grooming é um comportamento para remover resíduos, sedimento e organismos incrustados das superfícies do corpo, realizado, principalmente, por pereópodos e 11 maxilípedes (Bauer, 1977). Esta limpeza evita a incrustação em estruturas utilizadas na respiração (brânquias), recepção sensorial (antenas), movimentação e alimentação (pereópodos e apêndices bucais), pois a incrustação nestas estruturas pode resultar na diminuição da eficiência destes mecanismos (Bauer 1981, 1989). Apesar dos crustáceos terem um exoesqueleto que periodicamente passa por ecdise, o que pode remover a maioria das incrustações das superfícies externas do corpo, o período de intermudas pode ser longo, especialmente para indivíduos mais velhos que normalmente são maiores e mudam com menos frequência e, portanto, têm uma capacidade reduzida de se livrar de incrustações, sendo relevante a realização do comportamento de grooming (Skinner et al. 1985). Por conseguinte, essa diversidade de funções exercidas pelos apêndices, também é apresentada nas cerdas que os compõe. O amplo repertório de hábitos alimentares e diferentes estratégias para limpeza do corpo levou a um interesse na morfologia e nas adaptações das peças bucais e de suas unidades funcionais constituintes, as cerdas (Schembri, 1982a). Em caranguejos detritívoros, modificações das peças bucais servem para criar correntes de água que minimizam a quantidade de matéria inorgânica não-nutritiva que é ingerida (Warner, 1977). Nos caranguejos ocípodideos, por exemplo, cerdas especialmente modificadas do tipo spoontipped, presentes no segundo maxilípede, funcionam para raspar e remover o material orgânico de grandes partículas inorgânicas (Miller, 1961; Maitland, 1990; Costa & Negreiros-Fransozo, 2001; Colpo & Negreiros-Fransozo, 2013). Nestas espécies a quantidade de cerdas spoontipped está diretamente relacionada ao tamanho da partícula do sedimento em que esses caranguejos habitam (Miller, 1961). Nos caranguejos herbívoros, as especializações morfológicas existentes nos apêndices utilizados para alimentação, descritos na literatura, incluem quelípodos com formato de colher ou espátula para colher plantas (Coen, 1987), partes modificadas do 12 aparato bucal e dentes robustos de moinho gástrico para processamento de material vegetal fibroso (Warner, 1977; Coen, 1987). No entanto, o conhecimento dos tipos de cerdas relacionados à alimentação por herbivoria é praticamente desconhecido nestes animais. A família Sesarmidae com cerca de 265 espécies, distribuídas em 31 gêneros, representa a maior riqueza dentre os caranguejos grapsóideos (Ng et al., 2008) e destaca- se pela sua abundância em áreas de manguezal. Os representantes desta família são espécies comumente encontradas em manguezais e marismas de regiões costeiras tropicais e subtropicais. Os sesarmídeos são comuns nos sedimentos e, ainda, sobre as árvores de manguezais. Estes caranguejos também ocorrem em habitats inusitados, tais como a roseta de bromélias, dentro de conchas vazias de moluscos e até mesmo em cavernas (Anger, 1995; Diesel & Horst, 1995; Fratini et al., 2005; Schubart et al., 2010). Caranguejos grapsóideos, especialmente os pertencentes a Sesarmidae, apresentam forte tendência à herbivoria. Mesmo em espécies consideradas carnívoras ou onívoras pode existir uma quantidade significativa da nutrição fornecida pelo consumo de vegetais (Warner, 1977). Contudo, a herbivoria, independente da proporção de material vegetal ingerida na dieta, apresenta desafios para os consumidores, pois as plantas têm um arsenal diversificado de defesas contra herbívoros, como a presença de lignina e sílica, que conferem resistência e dureza, influenciando assim na colheita, processamento e digestão do material vegetal (Coen, 1987; Duffy & Hay, 1991). Em contrapartida, este tipo de alimentação apresenta benefícios, como maior massa e disponibilidade previsível de plantas no ambiente (Wolcott & Wolcott, 1984). Sendo assim, estudos sobre sesarmídeos são particularmente importantes, pois espécies deste grupo influenciam no aumento da velocidade do consumo e decomposição de folhas e facilitam também a liberação de nutrientes dos manguezais (Seiple, 1979). 13 As espécies de caranguejos sesarmídeos Aratus pisonii (H. Milne Edwards,1837), Armases angustipes (Dana, 1852) e Sesarma rectum Randall, 1840 incluem uma grande diversidade de material vegetal em sua dieta natural (Brogin & Lana, 1997) e são abundantes em manguezais da costa brasileira. Contudo, as três espécies habitam áreas bastante distintas no mangue, o que implica em uma grande variação na quantidade e qualidade de matéria vegetal ingerida, podendo refletir em modificações do aparato bucal. O caranguejo arborícola Aratus pisonii, por exemplo, é uma espécie abundante, distribuída no Atlântico Ocidental desde a Flórida até o Brasil e na maior parte das ilhas do Caribe e também no Pacífico Leste, do México ao Peru (Rathbun, 1918; Melo, 1996). Esta espécie habita as árvores do manguezal, consumindo principalmente folhas, mas podendo consumir também a casca (Hartnoll, 1965; Beever et al., 1979; Wilson, 1981; Mattson, 1982; Erickson et al., 2003) e, geralmente, complementa sua dieta com ingestão oportunista de pequenos insetos e organismos da infauna (Warner 1967; Beever et al. 1979; Diaz & Conde 1988). A espécie Armasses angustipes distribui-se ao longo da costa oeste do Oceano Atlântico, desde o México, Antilhas e Brasil (Melo, 1996). Trata-se de um caranguejo pequeno, quando comparado com outros sesarmídeos e é encontrado na água acumulada entre as rosetas foliares de bromélias localizadas, principalmente, em zonas marginais dos manguezais (Anger et al., 1990). Por meio da análise do conteúdo estomacal de A. angustipes, coletados em bromélias, Satler & Satler (1965) constataram que estes crustáceos incluíam em sua dieta partes de insetos, detritos, material vegetal e muitos tricomas estrelados, característicos de bromélias, sugerindo que os mesmos alimentam- se do próprio habitat formado por essas epífitas (Fischer et al., 1997; Canela & Sazima, 2003). 14 O caranguejo Sesarma rectum é uma espécie, relativamente, abundante nos manguezais do Brasil, sendo encontrada apenas no Atlântico Ocidental, desde a costa da Venezuela até o Brasil (Melo, 1996). No manguezal, habitam tocas cavadas em áreas de gramado mais seco, próximo à zona de maré alta (Tavares & Albuquerque, 1989). Brogin & Lana (1997), ao analisarem o espectro alimentar de S. rectum constataram que mais de 90% de sua dieta é constituída por vegetais. Na literatura existente para estas espécies não há registros sobre a morfologia de seus aparatos bucais. Levando em consideração a importância das cerdas presentes nesta região, que desempenham diferentes funções em caranguejos braquiúros, este estudo visa uma descrição detalhada sobre a morfologia das cerdas do aparato bucal dos sesarmídeos, Aratus pisonii, Armasses angustipes e Sesarma rectum, relacionando-as putativamente com as respectivas funcionalidades. 2. OBJETIVOS 2.1. OBJETIVO GERAL Descrever a morfologia dos tipos de cerdas do aparato bucal de três espécies de caranguejos sesarmídeos, Aratus pisonii (H. Milne Edwards,1837), Armases angustipes (Dana, 1852) e Sesarma rectum Randall, 1840 utilizando técnicas de microscopia eletrônica de varredura, microscopia de luz e histologia. 2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS:  Descrever detalhadamente os tipos de cerdas dos apêndices bucais (i.e. maxilípedes, maxilas e mandíbula) e primeiro pereópodo de cada espécie;  Apresentar uma comparação morfológica das cerdas entre as espécies com a literatura;  Atribuir possíveis funcionalidades à morfologia dos tipos de cerdas;  Estabelecer as diferenças e/ou semelhanças entre os tipos de cerdas presentes nos aparatos bucais das três espécies. 3. MATERIAIS E MÉTODOS 3.1. ÁREA DE ESTUDO, COLETA E IDENTIFICAÇÃO DE DADOS Os espécimes de Aratus pisonii, Armases angustipes e Sesarma rectum (Figura 1) foram coletados em Ubatuba, litoral norte do Estado de São Paulo, no manguezal do Rio Escuro, Praia Dura (23º 29'S e 45º 09'W). As coletas foram realizadas entre os meses de outubro de 2018 a dezembro de 2019. Os indivíduos de cada espécie foram coletados por busca ativa e captura manual. Somente indivíduos adultos de ambos os sexos foram considerados. Após as coletas, os espécimes foram eutanasiados em banho de gelo, fixados em glutaraldeído 2,5% e conservados em etanol 70%. Em laboratório dados morfométricos e classificação quanto ao sexo foram registrados. Posteriormente, os espécimes (mínimo de 10 indivíduos de cada espécie alvo) foram submetidos à dissecção e limpeza manual dos pares de apêndices do aparato bucal (i.e. mandíbulas, maxilas, 1º, 2º e 3º maxilípedes, quelípodos), para análises em microscopia de luz e de varredura (MEV). Fig. 1. Aratus pisonii (H. Milne Edwards, 1837). Fêmea, LC= 19,57mm; CC= 19,16mm, vista dorsal. Armases angustipes (Dana, 1852). Fêmea, LC= 18,79mm; CC= 19,07mm, vista dorsal. Sesarma rectum Randall, 1840. Macho, LC= 21,79mm; CC= 19,98mm, vista dorsal. LC: largura da carapaça. CC: comprimento da carapaça. 3.2. MICROSCOPIA ELETRÔNICA DE VARREDURA Os apêndices do aparato bucal destinados às análises MEV, para descrição das cerdas, seguiram o seguinte protocolo: fixação em glutaraldeído 2,5% por 24hrs e tampão fosfato 0,1M ph 7,3 por 4h; desidratação em sequência crescente de soluções de álcool 15-100%; secagem completa do material em ponto crítico CPD 020 (Balzers Union) com CO2 líquido; metalização MED 010 (Balzers Union). Em seguida os apêndices foram analisados e fotografados em Microscópio Eletrônico de Varredura Philips modelo 515, do Centro de Microscopia Eletrônica da Universidade Estadual Paulista (UNESP) campus de Botucatu. 3.3. HISTOLOGIA Amostras de cerdas do tipo capitada, foram destinadas a histologia, na tentativa de obter informações da morfologia interna, devido a esta apresentar uma haste com extremidade irregular, seguindo o seguinte protocolo: fixação em paraformaldeído 4% por 24hrs e tampão fosfato 0,1M ph 7,3 por 4h; descalcificação de acordo com Gunthorpe et al. (1990) utilizando 10% de tetra-acetato de etilenodiamina-acético (EDTA) pH 8,0 por 12h; amostras desidratadas, embebidas e incluídas em resina, seguindo rotina histológica. Cortes seriados de 4 a 6μm foram obtidos em micrótomo rotativo, secagem em estufa, posterior coloração de hematoxilina e eosina e montagem das lâminas histológicas. 3.4. DESCRIÇÃO DAS CERDAS E ELABORAÇÃO DE PRANCHAS As descrições para cada tipo de cerda foram feitas da região proximal para região distal, considerando-se as seguintes estruturas ou parte delas: tipo de articulação, comprimento da haste, presença ou ausência de anulus, poros, sétulas, e dentículos; assim como a disposição dos mesmos na haste da cerda. A Figura 2 apresenta como cada parte foi esquematicamente classificada. São considerados dois tipos de articulação de cerda, articulação infracuticular, em forma de socket na cutícula do apêndice e supracuticular, na qual o socket é estendido, a partir a cutícula (Watling, 1989). A Figura 3 indica a diferença entre ambos. A distinção entre sétulas e dentículos é dada, principalmente, pela articulação na haste da cerda. As sétulas são articuladas, embora articulação seja geralmente reduzida ou de difícil visualização, tendem a ser compridas e delgadas. Os dentículos não possuem articulação, são relativamente menores e mais robustos do que sétulas e, como o próprio nome implica, mais ou menos em forma de dente (Garm & Watling, 2013). A Figura 4 mostra a distinção entre sétulas e dentículos. Para montagem das pranchas fotográficas foi utilizado o programa Adobe Photoshop CS6. Fig. 2. Representação esquemática de uma cerda (modificado de Pohle & Telford, 1981). Fig. 3. Tipos de articulação. A, B, articulação infracuticular (Ai). C, articulação supracuticular (As). Setas indicam o socket de cada tipo de articulação. Fig. 4. Sétulas e dentículos. A, dentículo (De). Seta indica ausência de articulação do dentículo com a haste da cerda. B, sétula (Se). Seta indica articulação da sétula com haste da cerda. 4. RESULTADOS 4.1. DESCRIÇÕES DOS TIPOS DE CERDAS Nas análises de MEV, realizadas nos apêndices do aparato bucal das três espécies, encontramos e descrevemos sete grandes grupos de cerdas, paposa, plumosa, plumodenticulada, serrada, simples, cuspidada, capitada e seus respectivos subtipos. 1. Paposas 1.1. Paposa tipo 1 (Fig. 5A, B): cerda com articulação infracuticular; com haste longa, sem anulus e sem poro distal, com extremidade afilada; sétulas longas, moderadamente rígidas e regularmente espaçadas, dispostas aleatoriamente em torno de toda haste. 1.2. Paposa tipo 2 (Fig. 5C, D): cerda com articulação infracuticular; com haste longa, sem anulus e sem poro distal, com extremidade afilada; densamente recoberta por sétulas longas e flexíveis, dispostas aleatoriamente em torno de toda haste. 2. Plumosas 2.1. Plumosa tipo 1 (Fig. 6A): cerda com articulação supracuticular; com haste longa, sem anulus e sem poro distal, com extremidade afilada; densamente recoberta com sétulas longas e flexíveis dispostas em duas fileiras opostas ao longo de toda haste. 2.2. Plumosa tipo 2 (Fig. 6B, C, D): cerda com articulação supracuticular; com haste longa, sem anulus e sem poro distal, com ponta afilada; haste com metade proximal lisa e metade distal com sétulas longas e densas dispostas em duas fileiras opostas até a região terminal. Fig. 5. Cerdas paposas. A, B, cerda paposa tipo 1. C, D, cerda paposa tipo 2. Fig. 6. Cerdas plumosas. A, cerda plumosa tipo 1. B, C, D, cerda plumosa tipo 2. Em B, cerdas plumosas tipos 2, presentes nos epipoditos, mostram a articulação supracuticular das plumosas. 3. Plumodenticuladas 3.1. Plumodenticulada tipo 1 (Fig 7A, B, C): cerda com articulação infracuticular; com haste de comprimento médio a longo, sem anulus e sem poro distal, com extremidade afilada em formato tridente; metade proximal da haste com poucas sétulas longas e espaçadas dispostas de maneira irregular; metade distal da haste com sétulas curtas e densas seguidas de dentículos, ambos dispostos em duas fileiras opostas, em direção a região terminal, onde também ocorre uma retorção na haste. Em algumas destas cerdas, a haste também pode ter uma fileira adicional de sétulas. (Fig. 7E). 3.2. Plumodenticulada tipo 2 (Fig. 7D): cerda com articulação infracuticular; com haste de comprimento longo, anulus medial e sem poro distal, extremidade afilada; metade proximal da haste lisa; metade distal da haste com sétulas curtas e densas seguidas de dentículos, ambos dispostos em duas fileiras opostas, em direção a região terminal, onde não ocorre retorção. Fig. 7. Cerdas plumodenticuladas. A, B, C, cerda plumodenticulada tipo 1. Em B, pontas de seta indicam formato tridente e retorção na haste. Em C, ponta de seta indica fileira adicional de sétulas na haste. D, cerda plumodenticulada tipo 2; ponta de seta indica anulus. (Se) sétulas; (De) dentículos indicados por setas completas. 4. Serradas 4.1. Serrada (Fig 8A, B): cerda com articulação infracuticular geralmente reduzida; com haste de comprimento médio a longo, sem anulus e sem poro distal, com extremidade afilada; metade proximal da haste lisa; metade distal da haste com duas fileiras de dentículos, dispostos em lados opostos, até a região terminal. 4.2. Paposserrada (Fig 8C, D): Cerda com articulação infracuticular; com haste de comprimento longo, sem anulus e sem poro distal, com extremidade afilada; metade proximal da haste com sétulas espaçadas aleatoriamente, sem padrão específico; metade distal da haste com fileiras de sétulas curtas e densas, que circundam a haste, seguidas de dentículos até a região terminal. 4.2. Cluster Serrated (Fig. 15B, C, D): cerda com articulação infracuticular; haste com comprimento longo, sem anulus e sem poro distal, com extremidade afilada; haste com metade proximal lisa; metade distal composta por agrupamentos de dentículos curtos e espaçados circundando a haste. Fig. 8. Cerdas serradas. A, B, cerda serrada. C, D, cerda paposserrada tipo 1. Em D, aproximação mostrando parte da haste circundada por sétulas. 4.3. Cerda Brush (Fig. 9A, B, C): Cerda com articulação infracuticular; haste com comprimento médio a curto, sem anulus e sem poro distal, com extremidade pouco afilada; haste com metade proximal lisa; terceiro distal com fileiras de sétulas longas, rígidas e densas, em apenas uma face da circunferência da haste, até a região terminal. 4.4. Cerda Half Anchor (Fig. 9D, E): Cerda com articulação supracuticular; haste de comprimento longo, sem anulus e sem poro distal, com extremidade afilada; haste lisa, desprovida de sétulas ou dentículos, possuindo projeções cuticulares na região subdistal, no formato de meia âncora, antes da região terminal da haste. 4.5 Cerda Brush Epipodal (Fig. 10): Cerda com articulação infracuticular; haste de comprimento longo, com anulus medial, sem poro distal, com extremidade afilada; metade proximal da haste lisa; metade distal da haste com sétulas curtas e rígidas densamente agrupadas, cobrindo três quartos da circunferência da haste, que se tornam alinhadas em fileira única na extremidade da haste. 5. Simples 5.1. Simples tipo 1 (Fig. 11A): cerda com articulação infracuticular; haste com comprimento curto, médio ou longo, anulus não aparente, sem poro distal; haste lisa e extremidade afilada em relação a base. 5.2. Simples tipo 2 (Fig. 11B, C): cerda com articulação infracuticular; com haste de comprimento médio, anulus não aparente, sem poro distal, extremidade afilada; haste lisa com uma grande curvatura a partir da metade distal. Fig. 9. Cerda brush e half anchor. A, B, C, cerda brush. D, E, cerda half anchor. (Pc) Projeção cuticular. Fig. 10. A, B, C, D. Cerda brush epipodal. Em B, ponta de seta indica a cobertura de sétulas em três quartos da circunferência da haste. (An) ânulus indicado por seta. Fig. 11. Cerdas simples e cuspidadas. A, cerda simples tipo 1. B, C, cerdas simples tipo 2. Em C, ponta de seta indica curvatura na metade distal. D, cerda cuspidada tipo 1; pontas de seta indicam articulação infracuticular reduzida. E, cerda cuspidada tipo 2; note os dentículos na parte distal. 6. Cuspidadas 6.1. Cuspidada tipo 1 (Fig. 11D): cerda com articulação infracuticular geralmente reduzida; haste de comprimento médio, anulus não aparente, sem poro distal e extremidade arredondada; haste lisa, robusta, com base ampla e que diminui em direção a região terminal. 6.2. Cuspidada tipo 2 (Fig. 11E): cerda com articulação infracuticular geralmente reduzida; haste de comprimento médio, com anulus medial, aparentemente poro distal e extremidade arredondada; haste com metade proximal lisa e metade distal com dentículos pequenos e espessos. 7. Cerda Capitada (i.e. do latim ‘caput’, que significa cabeça) (Fig. 13) Cerda com articulação infracuticular; haste de comprimento variável, de médio a longo, anulus medial, nem sempre visível, extremidade da haste com formato irregular apresentando uma estrutura similar a uma cápsula envolvendo a região terminal da cerda; haste com sétulas e/ou dentículos dispostos de maneira irregular. Fig. 13.A, B, C, D, E, F, G. Cerda capitada. Note pontas das hastes com formato irregular. Fig. 14 A, B, C, D, E. Morfologia interna da cerda capitada. EXC, exocutícula. ENC, endocutícula. EP, epitélio. * septo. Setas indicam canais da articulação que atravessam a cutícula. Fig. 15. Aratus pisonii (H. Milne Edwards,1837). Micrografia de varredura. Quela do primeiro pereópodo e cerda cluster serrated. A, vista dorsal da quela do primeiro pereópodo, mostrando a presença de grandes agrupamentos de cerdas. B, C, D, cerdas cluster serrated. Fig. 16. Aratus pisonii (H. Milne Edwards,1837). Micrografia de varredura. Mandíbula. A, vista dorsal do processo mandibular e palpo, indicando a presença de cerdas no processo mandibular. B, C, cerdas plumodenticuladas. Fig. 17. Quela do primeiro pereópodo. A, Aratus pisonii. B, Armases angustipes. C, Sesarma rectum. 4.2. LOCALIZAÇÃO DAS CERDAS DO APARATO BUCAL Os tipos de cerdas predominantes em cada segmento dos apêndices estão apresentados nas Tabelas 1, 2 e 3, a seguir. Tabela 1. Aratus pisonii (H. Milne Edwards,1837). Tipos de cerdas presentes nos segmentos dos apêndices do aparato bucal de Aratus pisonii. Apêndices Segmentos PP PL PD SR PS 1 PS 2 BS BSE HA S 1 S 2 CP 1 CP 2 CT 1º pereópodo quela + 3ºmxpd coxa+base + + ísquio + + + mero + + + + carpo + + própodo + + + dáctilo + + exopodito + + + + epipodito + + + 2ºmxpd base+coxa + ísquio+mero + + + carpo + própodo + dáctilo + + + exopodito + + epipodito + + Tabela 1. Continuação. PP: paposa; PL: plumosa; PD: plumodenticulada; SR: serrada; PS1: paposerrada tipo 1; PS2: paposerrada tipo 2; BS: brush; BSE: brush epipodal; HA: half anchor; S1: simples tipo 1; S2: simples tipo 2; CP1: cuspidada tipo 1; CP2: cuspidada tipo 2; CT: capitada. Apêndices Segmentos PP PL PD SR PS 1 PS 2 BS BSE HA S 1 S 2 CP 1 CP 2 CT 1ºmxpd coxa+base + + + + endopodito + + exopodito + + epipodito + + Maxila coxa + + + base + + + escafognatito + + Maxilula coxa + + + + base + + + Mandíbula processo mandibular + palpo + + + Tabela 2. Armases angustipes (Dana, 1852). Tipos de cerdas presentes nos segmentos dos apêndices do aparato bucal de Armases angustipes. Apêndices Segmentos PP PL PD SR PS 1 PS 2 BS BSE HA S 1 S 2 CP 1 CP 2 CT 1º pereópodo quela + 3ºmxpd coxa+base + + ísquio + mero + + + carpo + + própodo + + dáctilo + + exopodito + + + epipodito + + + 2ºmxpd base+coxa + ísquio+mero + + carpo + própodo + dáctilo + + + exopodito + + epipodito + + Tabela 2. Continuação. PP: paposa; PL: plumosa; PD: plumodenticulada; SR: serrada; PS1: paposerrada tipo 1; PS2: paposerrada tipo 2; BS: brush; BSE: brush epipodal; HA: half anchor; S1: simples tipo 1; S2: simples tipo 2; CP1: cuspidada tipo 1; CP2: cuspidada tipo 2; CT: capitada. Apêndices Segmentos PP PL PD SR PS 1 PS 2 BS BSE HA S 1 S 2 CP 1 CP 2 CT 1ºmxpd coxa+base + + + endopodito + + exopodito + + epipodito + + Maxila coxa + + + base + + escafognatito + + Maxilula coxa + + + + base + + + + Mandíbula processo mandibular palpo + + Tabela 3. Sesarma rectum Randall, 1840. Tipos de cerdas presentes nos segmentos dos apêndices do aparato bucal de Sesarma rectum. Apêndices Segmentos PP PL PD SR PS 1 PS 2 BS BSE HA S 1 S 2 CP 1 CP 2 CT 1º pereópodo quela + 3ºmxpd coxa+base + ísquio + + + mero + + carpo + + própodo + + + dáctilo + exopodito + + + + epipodito + + + 2ºmxpd base+coxa + ísquio+mero + carpo + própodo + dáctilo + + exopodito + + epipodito + + Tabela 3. Continuação. PP: paposa; PL: plumosa; PD: plumodenticulada; SR: serrada; PS1: paposerrada tipo 1; PS2: paposerrada tipo 2; BS: brush; BSE: brush epipodal; HA: half anchor; S1: simples tipo 1; S2: simples tipo 2; CP1: cuspidada tipo 1; CP2: cuspidada tipo 2; CT: capitada. Apêndices Segmentos PP PL PD SR PS 1 PS 2 BS BSE HA S 1 S 2 CP 1 CP 2 CT 1ºmxpd coxa+base + + + endopodito + + exopodito + + epipodito + + Maxila coxa + + base + + + escafognatito + + Maxilula coxa + + + base + + + + Mandíbula processo mandibular palpo + + 5. DISCUSSÃO 5.1 COMPARAÇÕES COM DESCRIÇÕES PRÉVIAS As cerdas do aparato bucal dos decápodes exibem uma grande diversidade, provavelmente devido à variedade de funções que desempenham (Alexander & Hindley, 1985). Apesar da variabilidade morfológica dos tipos de cerdas existentes, padrões são claramente observáveis, principalmente relacionados a presença ou ausência de sétulas e/ou dentículos. Assim, a disposição destes no eixo setal permite a definição de conjuntos de tipos de cerdas distintos, sendo importante um sistema de classificação unificado. Thomas (1970) foi o primeiro a reconhecer a diversidade de conjuntos de cerdas. Seu trabalho descreve e relaciona possíveis funções das cerdas corpóreas no lagostim Austropotamobius pallipes (Lereboullet, 1858). Fish (1972) também apresenta um estudo primordial sobre variedade e morfologia funcional de cerdas no isópode Eurydice pulchra Leach, 1818. A partir destes trabalhos, as classificações dos tipos de cerdas passaram por mudanças, adaptações e novas descobertas, dependendo do táxon estudados. Os principais estudos que propuseram sistemas de classificação de cerdas em crustáceos foram desenvolvidos não só baseados nos tipos de cerdas da carapaça e pereópodos, mas também com enfoque nos conjuntos de cerdas do aparato bucal, apêndices de grooming, cerdas larvais e de desenvolvimento juvenil (Farmer, 1974; Factor, 1978; Bauer 1981; Pohle & Telford, 1981; Schembri, 1982a; Schembri, 1982b; Skillter & Anderson, 1986; Holmquist, 1989; Watling, 1989; Garm, 2004a, b; Matsouka & Suzuki, 2011; Wortham et al., 2014). Por tratar de diferentes grupos de decápodes, os sistemas de classificação dos tipos de cerdas já existentes apresentam variação em sua complexidade e no grau de concordância entre si. As técnicas utilizadas para descrição podem ter interferência na definição do tipo de cerda e podem ser apontadas como um dos motivos para muitas divergências nas classificações, por exemplo, trabalhos mais antigos que não contaram com o auxílio da microscopia eletrônica de varredura, que permite maior detalhamento na visualização de estruturas pequenas em suas descrições. Estas divergências são geralmente evidenciadas quando se trata das extensões cuticulares, como sétulas e dentículos, por estes implicarem diretamente na nomeação das cerdas e serem um dos principais motivos dos problemas de classificação de cerdas em crustáceos (Watling, 1989; Garm & Watling, 2013). Wortham (2014) destaca que os termos dentículo e sétula são frequentemente mal interpretados e, como resultado, usados incorretamente. Em particular, uma estrutura pode ser descrita como um sétula em uma publicação (Garm, 2004a), mas a mesma estrutura pode ser denominada dentículo em outra (Watling, 1989). A classificação adequada desses termos depende da articulação na haste da cerda. Provas de presença ou ausência desta articulação devem ser claras antes de denominar a estrutura (Wortham & Pascual, 2019). Para as espécies aqui em estudo, não há registros na literatura sobre morfologia de aparato bucal, tampouco sobre cerdas. Além de descrever os tipos de cerdas presente nas peças bucais de tais espécies, o presente estudo traz a descrição de dois novos tipos de cerdas, sem registros na literatura, a cerda capitada e a cerda cluster serrated. Embora haja diferenças nas descrições e nomeações, para os demais tipos e subtipos aqui descritos, já houve alguma descrição similar prévia. Os tipos de cerdas paposas, plumodenticuladas e serrada, e os subtipos plumosa tipo 1, simples tipo 1 e cuspidada tipo 1, aqui descritos, são as cerdas mais comumente encontradas nos trabalhos sobre cerdas, desde os mais antigos até os atuais, onde não há divergências descritivas significativas (Thomas, 1970; Fish, 1972; Farmer, 1974; Factor, 1978; Kunze & Anderson, 1979; Pohle & Telford, 1981; Holmquist, 1989; Pohle, 1989; Schembri, 1982a, b; Skillter & Anderson, 1986; Johnston & Alexander, 1999; Coelho & Rodrigues 2001; Garm, 2004a, b; Matsouka & Suzuki, 2011; Vieira et al., 2013; Wortham, 2014; Azis & Scher, 2016; Wortham & LaVelle, 2016; Wortham & Pascual, 2019). Wortham & Pacual (2019) relatam paposserrada como uma cerda híbrida, com sétulas em parte do eixo e dentículos distalmente, assim como é aqui descrita o subtipo paposerrada 1, relatada também por Colpo & Negreiros-Fransozo (2011). A mesma cerda é diferentemente nomeada como trisserrada em Holmquist (1989), Schembri (1982a) e Pohle (1989a), mas com descrições semelhantes, uma vez que trisserrada indica três fileiras de extensões cuticulares circundando eixo da cerda. Para a cerda do subtipo brush, há um tipo morfologicamente muito semelhante descrito em Zimmer et al. (2009), porém definida como paposa. Esse tipo de morfologia de cerda não se encaixa numa classificação de paposas, por não apresentar sétulas dispostas aleatoriamente na haste, e sim com uma disposição em apenas uma face da circunferência da haste. Factor (1978) define como serrada um tipo morfologicamente corroborado com nosso subtipo escovada. Cerdas do epipodito são comumente descritas em literaturas sobre grooming e limpeza de brânquias, devido a participação dos mesmos nesta ação. O subtipo aqui encontrado, apenas no epipodito e nomeado como cerda brush epipodal apresenta uma morfologia singular, com descrição e nomeação similar encontrada apenas no trabalho de Batang & Suzuki (2003), que descreve mecanismos de limpeza de brânquias em uma espécie de caranguejo de água doce. Já para o subtipo cerda half anchor, encontrada também apenas nos epipoditos no presente trabalho, há vários registros similares na literatura (Pohle, 1989b; Barutot et al., 2001; Batang & Suzuki, 2003; Bolla Júnior et al., 2008; Matsouka & Suzuki, 2011; Matsouka et al., 2012; Wortham & LaVelle, 2016; Wortham & Jedlicka, 2019; Wortham & Pacual, 2019). Embora haja similaridade entre os tipos já descritos, diferenças na presença ou ausência de sétulas e/ou dentículos no eixo dessa cerda, assim como no formato da projeção cuticular, que recebe denominações como âncora, meia âncora, gancho ou harpoon, são evidenciadas e, consequentemente, influenciam os diferentes nomes para esse tipo de cerda. O subtipo de cerda simples, que possui uma grande curvatura a partir da metade distal da haste, descrita aqui como simples tipo 2, apresenta similaridade com tipo de cerda simples exposta em Farmer (1974) e em Factor (1978). Cerdas cuspidadas com presença de dentículos também conferem peculiaridade. Em Factor (1978) e Schembri (1982b), são descritos tipos de cuspidadas com projeções cuticulares presente no eixo, similar a cuspidada tipo 2, descrita nesse estudo. 5.2 MORFOLOGIA FUNCIONAL DOS TIPOS DE CERDAS O aparato bucal e suas estruturas associadas formam uma série de unidades estruturais funcionais (Schembri,1982). Sua morfologia e especialmente as características das cerdas parecem refletir a variedade dos mecanismos, principalmente os de alimentação (Thomas, 1970; Fish, 1972). A análise da morfologia é apresentada como um método indireto para estudar as funções e características anatômicas de apêndices, cerdas e posição espacial são itens que sendo analisados, permitem inferências nos papéis desempenhados pelos anexos durante o processo de alimentação (Farmer,1947; Kunze & Anderson, 1979). Peças bucais e seus respectivos conjuntos de cerdas, no entanto, não estão exclusivamente relacionados apenas com a ingestão de alimento, já que estes também possuem adaptações para grooming e limpeza (Bauer, 1981, Holmiquist 1989). Por apresentar esta diversidade, Garm (2004a) enfatiza que a morfologia funcional deve ser considerada com pesquisas comportamentais, descrições detalhadas e posicionamento das cerdas. Sendo assim, o presente trabalho apresenta considerações relevantes para as demais funções exercidas pelas mesmas além da alimentação. A estrutura das cerdas está correlacionada com sua função e estas são parte integrante do sofisticado aparelho de alimentação em decápodes (Schembri, 1982b). Sendo assim, ações de alimentação e limpeza, parecem estar altamente relacionadas, uma vez que ambas são realizadas pelos mesmos tipos de cerdas e, parcialmente, mesmos apêndices. Apêndices de grooming em braquiúros incluem, majoritariamente, maxilípedes (peças bucais) e o primeiro pereópodo (quelípodo) (Wortham & Jedlicka, 2014). Em diversos táxons de Decapoda, como em dendrobranquiatas, carídeos, astacídeos, axídeos e anomuros, os maxilípedes e os pereópodos são usados como o principal mecanismo de grooming e limpeza de brânquias (Bauer, 1981; Schembri 1982a; Batang & Suzuki, 2000; Coelho & Rodrigues, 2000). Embora decápodes lavem periodicamente a câmara branquial, invertendo a corrente respiratória, a maioria das espécies possui estruturas de limpeza de brânquias com as quais são raspadas por cerdas semelhantes a escovas (Bauer, 1981). Alguns escovam ativamente as brânquias com tufos de cerdas nos quelípodos, como é o caso em todos os grupos de anomuros marinhos (Martin & Felgenhauer, 1986), enquanto axídeos possuem cerdas epipodais para tal função (Bauer, 1981), assim como em todos braquiúros. Os epipoditos, conectados a cada um dos maxilípedes e encontrados na câmara branquial, funcionam como as estruturas de limpeza de brânquias, não apresentando relação com alimentação (Pohle, 1989). Esses apêndices de limpeza em crustáceos são providos de muitas cerdas do tipo serrada que funcionam como pentes raspando regiões do corpo para reduzir incrustação, como constatado nas espécies aqui estudadas (Bauer, 1981, 1989; VanMaurik & Wortham, 2014). Epipoditos e seus conjuntos de cerdas também são bastantes discutidos e comparados na literatura. VanMaurik & Wortham (2014), no entanto, destacaram o comportamento de grooming como sendo secundário, num estudo comportamental em camarões da espécie Macrobrachium rosenbergii, no qual foi constatado que comportamentos primários (de maior prioridade), como alimentação e defesa, são de maior importância e devem ocorrer com mais frequência, pois grooming estava ausente ou raro quando primários estavam ocorrendo. Bauer (1989) também presumiu este comportamento como secundário, ocorrendo apenas quando outros comportamentos primários não eram essenciais. Pertencente a um dos principais comportamentos primários, a alimentação, as peças bucais funcionam em agarrar, manipular, escovar alimentos em direção à boca e cortar a comida. Na alimentação, os pares de apêndices bucais, exceto as mandíbulas, atuam principalmente na transferência de material alimentar para o interior da boca. A função das mandíbulas, que varia de acordo com a dieta, pode rasgar o alimento em pedaços pequenos, o suficiente para ingestão, ou pode simplesmente ajudar a pressionar o material para o esôfago com o auxílio do processo e palpos mandibulares. A trituração do alimento ocorre somente no estômago, por um complexo arranjo de ossículos interconectados, denominado moinho gástrico, presente nesta região (Caine, 1975). Em braquiúros, o quelípodo (primeiro pereópodo), mesmo não fazendo parte do aparato bucal, também tem funções de captura, colheita e abrasão na alimentação. Os maxilípedes auxiliam na introdução do alimento para o interior da cavidade bucal; mais especificamente os pares do terceiro maxilípede transfere o material dos quelípodos para o espaço bucal, enquanto os do segundo maxilípede empurram esse material. As maxilas (i.e coxa e base da maxila e maxilula) genericamente escovam alimento retido em maxilípedes, manipulam e empurram, direcionando-o para mandíbula (Schembri, 1982b). Formação de telas setais que impedem o alimento de cair da região da boca, criação de correntes de água inalante e exalante e limpeza dos próprios apêndices e região branquial estão entre as principais funções das cerdas presentes no aparato bucal. A disposição destas cerdas acontece de tal maneira, que as cerdas que apontam anteriormente na face externa se entrelaçam com as cerdas que apontam posteriormente na face interna (voltada para boca) de um apêndice, para formar uma tela lateral entre os dois apêndices, evitando que o material alimentar caia lateralmente e exercer suas demais funções (Schembri, 1982a, b). As cerdas paposas são o tipo setal mais abundante nas espécies de caranguejos estudadas, cada apêndice, em pelo menos um segmento, tem o tipo de cerda paposa. Garm (2004a) observou que cerdas paposas são quase sempre encontradas lateralmente nas peças bucais, fato que também foi observado aqui, podendo servir como barreiras, impedindo partículas de alimentos de escapar da área de alimentação. As sétulas das cerdas paposas não são fortemente rígidas, provavelmente não sendo útil no grooming grosseiro (Wortham et al., 2014; Wortham & LaVelle, 2016). Estas sétulas mais finas tornam-se emaranhados que, na função de limpeza, provavelmente removem partículas menores. Wortham & Kostecka (2018) e Farmer (1974) também apontaram cerdas paposas presentes em muitos segmentos com funcionalidades na limpeza de partes adjancentes dos apêndices. A parte basal do epipodito do terceiro maxílipede, junto com a coxa do quelípodo, forma a Abertura inalante de Milne Edwards (MEA), que têm um denso campo de cerdas paposas (ver coxa+base, tab. 1, 2, 3). Esse campo setal provavelmente filtra a água inalada através do MEA, antes de atingir as brânquias (Matsouka & Suzuki, 2011). Grandes quantidades de cerdas plumosas, comumente arranjadas em conjuntos, denotam uma adaptação para reter partículas, para selar áreas entre apêndices ou para promover um fluxo de água devido as extensões de superfície bastante flexíveis, criados pelas densas sétulas que esse tipo setal apresenta (Miller, 1961; Thomas, 1970; Schembri 1982a). Cerdas plumosas, assim como as paposas, são mais frequentes nas partes laterais dos apêndices do aparato bucal, refletindo tais funcionalidades. Os escafognatitos das maxilas, que funcionam para movimentar água na câmera branquial, evidenciam tal fato, possuindo em toda sua extensão de superfície cerdas densamente plumosas, que além de promoverem fluxo de água, podem evitar que finas incrustações entrem na câmara branquial, assim como os protopoditos (coxa+base) dos terceiros maxilípedes que são providos de cerdas plumosas (Tab. 1, 2, 3), juntamente com paposas, podendo servir na filtração da água do fluxo inalante, como citado anteriormente (Johnston & Alexander, 1999; Garm, 2004a; Matsouka & Suzuki, 2011). As cerdas plumosas nos flagelos dos exopoditos também são apontadas por promoverem a corrente de água no aparato bucal, auxiliando na expulsão de partículas inadequadas para a corrente de água exalante (Schembri, 1989b; Farmer, 1974; Alexander e Hindley, 1985). No presente estudo, as cerdas plumosas, correspondentes aos exopoditos, nas tabelas de localização dos tipos setais, são referentes a seus flagelos. O subtipo plumosa tipo 2 possui haste com metade proximal lisa e sétulas apenas na região distal. Essa característica morfologia também não foi encontrada na literatura, uma vez que os tipos comuns de cerda plumosa, apresentam haste totalmente recoberta por sétulas. Vale ressaltar que esse tipo foi apenas encontrado nos epipoditos do terceiro maxilípede, na parte superior, próximo à coxa, o que pode indicar funções relacionadas com a filtração do fluxo inalante. As cerdas plumodenticuladas podem combinar funções de cerdas serradas e plumosas, e dependendo da proporção e tipos de sétulas e dentículos no eixo setal, uma função ou outra pode prevalecer (Pohle e Telford, 1981; Coelho & Rodrigues, 2000). Cerdas plumodenticuladas nos terceiros maxilípedes e maxilas, presumivelmente, são para obter melhor aderência à comida, já que esses apêndices escovam os anteriores trazendo o alimento região interna na boca (Schembri, 1982b). Farmer (1974) e Pohle (1989) também considera esse tipo setal numa função de autolimpeza dos apêndices, para manter superfícies livres de incrustações. Estas cerdas parecem possuir multifuncionalidade e também são apontadas como formadoras de telas nos estudos de Schembri (1982b), Johnston & Alexander (1999) e Wortham et al (2014). Cerdas serradas (ou serrilhadas, denominação também encontrada na literatura) configuram um grande grupo setal, apresentando ampla variação morfológica e funcional, diferentes densidades e distribuições de sétulas e dentículos na haste e, por isso, bastante discutidas na literatura. Para alimentação, são normalmente encontradas nas áreas envolvidas diretamente no manuseio do alimento. Em geral, coletam, prendem e empurram itens com o uso dos dentículos e sétulas em sua parte distal. Os dedos (carpo, própodo, dáctilo) do terceiro maxilípede têm muitos campos de cerdas serradas que funcionam em raspar material dos pereópodos para o interior da cavidade bucal (Tab. 1, 2, 3) (Schembri, 1982a). Estudos anteriores, combinando microscopia eletrônica de varredura com algumas observações comportamentais, sustentam que esta é a função mais comum de cerdas serradas na alimentação (Farmer, 1974; Lavalli & Factor, 1992; Garm, 2004a). Além do envolvimento na alimentação, grooming também é uma função importante atribuída ao grupo de cerdas serradas. É interessante notar que em todos os decápodes estudados, aquelas estruturas que são envolvidos na limpeza são todos equipados com cerdas serradas (Borradaile, 1922; Farmer 1974; Hindley e Alexander 1978; Bauer 1981; Schembri, 1989a, b, Garm, 2004a). Densos agrupamentos de cerdas serradas sugerem uma ação importante de escovação ou abrasão, agindo como um pente (Thomas, 1970; Martin & Felgenhauer, 1986). O subtipo paposserada, similarmente à cerda serrada, pode atuar como telas ou pincéis limpando partículas, agarrarando ou transferindo alimentos, dependendo de seu comprimento, formato e densidade de sétulas e dentículos (Pohle & Telford 1981). A cerda cluster serrated, para qual não foram encontrados registros na literatura, possui morfologia bastante singular, com agrupamentos de dentículos e foi encontrada somente no quelípodo da espécie de Aratus pisonii (Fig. 15A). Caranguejos escaladores de árvores, como A. pisonii, usam as quelas para quebrar folhas em pequenos pedaços e também para raspar o tecido foliar (Camilleri, 1989; Cannicci et al., 1996; Erickson et al., 2003). Os tufos dessas cerdas, presentes apenas nos quelípodos, podem demonstrar adaptações para essa raspagem de tecido foliar antes da ingestão. Cerda brush epipodal e cerda half anchor são os tipos somente encontrados nos epipoditos para as espécies analisadas e classificadas como um subtipo de cerdas serradas. Matsuoka et al. (2011) observou que a maioria das cerdas epipodais, com funções de limpeza de brânquias, parecem ser serradas, pelo menos na região distal do eixo, e classifica também o tipo de âncora (ou gancho) como uma serrilha. Cerda brush epipodal têm maior similaridade morfológica, em relação a distribuição de sétulas no eixo, com o tipo cerda pincel epipodal descrita em Batang & Suzuki, 2003. Embora outros tipos epipodais serrados sejam encontrados em demais literaturas, apenas esse se assemelhou a morfologia singular encontrada aqui. Em relação a morfologia funcional, esse tipo de cerda de escova, pode funcionar raspando diretamente as superfícies das brânquias, auxiliando na retirada de detritos. Cerdas âncora, com suas regiões distais recurvadas em formato de âncora ou meia âncora, podem indicar uma alta eficiência de raspagem, auxiliando na limpeza e evitando a quebra de outras cerdas (Pohle, 1989; Matsouka et al., 2011). Wortham & Jedlicka (2019) inferem que estas cerdas em forma de gancho podem ter mecanismo anti- incrustante, o que pela ausência de sétulas impede o acúmulo de incrustações, potencializando sua eficácia na limpeza. Cerdas simples, com eixo setal desprovido de extensões cuticulares, são associadas a cerdas cuspidadas, que também apresentam eixo liso para a manipulação de alimentos (Garm, 2004a, b; Wortham & Lavelle, 2016). As cerdas simples ocorrem em todo aparato bucal de forma aleatória. Destacam-se em conjuntos nas maxilas, apêndices que já foram mencionados anteriormente nas funções de manipulação de material alimentar (Tab. 1, 2, 3 continuação). A cerda simples tipo 2, embora apresente descrições similares em Farmer (1974) e Factor (1978), não possui inferências funcionais que se relacionem a sua morfologia distinta com haste recurvada. As cerdas cuspidadas, também envolvidas na manipulação do alimento, provavelmente funcionam como as pontas de um garfo, agarrando alimentos (Thomas, 1970; Schembri, 1982a, b; Garm 2004a, b; Wortham & LaVelle, 2016; Wortham & Jedlicka, 2019; Wortham & Pascual, 2019). Dáctilos do segundo maxilípede, maxila e maxilula, apresentam esse tipo setal (Tab. 1, 2, 3) evidenciando tal funcionalidade de acordo com a função destes apêndices. O subtipo dois da cerda cuspida, é descrito pela presença de dentículos. Factor (1978) descreve tipo similar, mas não apresenta inferências sobre uma possível função. As diferenças nas formas e tamanhos dos dentículos podem revelar diferenças em sua funcionalidade. Um dentículo mais robusto e resistente, como o presente no subtipo cuspidada, pode remover e/ou manipular resíduos volumosos ou duros (Wortham et al., 2014) e uma vez que cerdas cuspidadas são atribuídas à manipulação, se torna plausível essa associação. A cerda capitada, que não possui descrições prévias na literatura, apresenta extremidade com uma morfologia irregular, que varia de formato e tamanho. Por meio da observação histológica procurou-se analisar sua morfologia interna. A histologia mostrou cerda longa e delgada, de parede fina e lúmen relativamente largo; articulação infracuticular robusta, estendendo-se por canal em toda cutícula (endocutícula e exocutícula) até a epiderme (canal esse comumente encontrado nas cerdas, e que confere a comunicação da cerda com a meio interno) (Babu & Anger, 1987). A presença de septo, do tipo transverso, geralmente situado a uma curta distância da articulação da haste, também pode ser observado (Fig.14). Presença ou ausência de septo numa mesma categoria de cerdas é geralmente caráter diagnóstico para gêneros ou famílias. (Thomas, 1970; Jacques, 1989). Quanto à morfologia interna da extremidade da cerda, devido a sua haste muita longa e seu posicionamento no bloco, os cortes histológicos não atingiram essa extremidade e para possíveis conclusões serão necessárias mais análises. No entanto, por essa cerda ser encontrada em apêndices que manipulam diretamente o alimento (base e coxa de maxila e maxilula, e palpo mandibular) e, apenas na espécie A. pisonii, pode- se demonstrar possível adaptação para herbivoria. 5.3 COMPARAÇÕES DOS TIPOS DE CERDAS ENTRE AS ESPÉCIES Os terceiros maxilípedes, são majoritariamente semelhantes, mas única espécie a apresentar subtipo cerda brush, presente na superfície do mero, é Sesarma rectum. A maioria dos segmentos dos segundos maxilípedes são compostos por mesmas cerdas, mas o subtipo cuspidada tipo 2, nos dáctilos, não está presente em A. pisonii. Primeiros maxilípedes, maxila e maxilula também apresentam similaridade em maioria. Porém, a diferença destacada nesses apêndices está na presença da cerda capitada, presente somente em A. pisonii. Na mandíbula, as diferenças estão nos processos mandibulares, que só apresenta cerdas em Aratus pisonii (Fig. 16), além deste também, novamente, ser única espécie a possuir cerda capitada no palpo mandibular. A figura 17 mostra o tipo de quela do primeiro pereópodo nas três espécies. Em Armases angustipes e Sesarma rectum, as quelas apresentam apenas algumas cerdas simples, distribuídas aleatórias na superfície, que não são visíveis a olho nu. Já em Aratus pisonii, é possível perceber agrupamentos de cerdas, mostrados em detalhes pela figura 15, com suas respectivas cerdas cluster serrated. Como já mencionado anteriormente, caranguejos escaladores de árvores usam as quelas para quebrar folhas em pequenos pedaços e também para raspar o tecido foliar (Camilleri, 1989; Cannicci et al., 1996; Erickson et al., 2003). Estas cerdas, morfologicamente, parecem ser apropriadas para raspagem. Por Aratus pisonii ser considerada a espécie mais hervíbora e que de fato vive sobre as árvores, dentre as três aqui estudadas, todas essas diferenças possivelmente podem ter relação com esse hábito alimentar. Futuros estudos comportamentais seriam necessários para tais comprovações, uma vez que essas informações estão sendo inferidas pela primeira vez. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS O estudo da diversidade morfológica de cerdas do aparato bucal das espécies Aratus pisonii, Armases angustipes e Sesarma rectum apresentou duas novas descrições de tipos de cerdas. A cerda cluster serrated e a cerda capitada, são apresentadas como possíveis adaptações relacionadas ao hábito alimentar. Os aparatos bucais apresentaram uma grande variedade de tipos de cerdas, o que é associado com as diversas funções atribuídas a este conjunto de apêndices. Modificações neste conjunto podem demonstrar adaptações para diferentes hábitos alimentares e comportamentais dos táxons. Aratus pisonii foi a espécie que mais apresentou diferenças quando comparada as demais, é a única a possuir as novas cerdas do tipo cluster serrated e cerda capitada. Contudo, as descrições dos tipos de cerdas do aparato bucal aqui apresentadas, para as três espécies, são primárias na literatura podendo contribuir para posteriores trabalhos sobre hábito alimentar e herbivoria das espécies em questão. REFERÊNCIAS Alexander, C.G. and Hindley, J.P.R. 1985. The mechanism of food ingestion by the banana prawn, Penaeus merguiensis. Marine & Freshwater Behaviour and Physiological, 12(1), 33-46. Anger, K., Harms, J., Montú, M. and De Bakker, C. 1990. Effects of salinity on the larval development of a semiterrestrial tropical crab, Sesarma angustipes (Decapoda: Grapsidae). Marine Ecology Progress Series, 89-94. Anger, K., Schreiber, D. and Montú. M. 1995. 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