LUIZ FELIPE ORSI GAMEIRO ANÁLISE DA EFICÁCIA E EFICIÊNCIA DA APLICABILIDADE DA ESCALA DE MOBILIDADE PERME EM PACIENTES EM UTI E SEUS DESFECHOS RELACIONADOS À MORTALIDADE E QUALIDADE DE VIDA: REVISÃO SISTEMÁTICA Relatório de Pós-doutorado realizado na Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Medicina de Botucatu. Supervisora da Pesquisa NORMA SUELI PINHEIRO MÓDOLO Botucatu 2024 2 RESUMO INTRODUÇÃO: A mortalidade em Unidades de Terapia Intensiva ((UTIs) pode ser associada a diversos fatores como aumento do tempo de ventilação mecânica e internação, insucesso no processo de extubação, alto risco de infecções e fraqueza muscular adquirida. Esses fatores são relevantes nesse contexto, pois levam à perda da funcionalidade. OBJETIVOS: Avaliar a importância da mobilização precoce e utilização de métricas, e analisar desfechos clínicos e funcionais relacionados as intervenções fisioterapêuticas mais comuns utilizadas nas UTIs. MÉTODOS: Essa revisão sistemática foi registrada em 30 de setembro de 2022 na International Prospective Register of Systematic Reviews, sob número CRD42022361431, conduzida de acordo com as diretrizes Cochrane para revisões sistemáticas e relatada de acordo com o Preferred Reporting Items Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA) declaração de 2020. A avaliação do risco de viés nos estudos incluídos foi realizada pela ferramenta RoB 1.0 em todos os seus domínios em duplicata dos revisores, além da análise estatística demonstrada pelos gráficos de forrest-plot. RESULTADOS: Foram incluídos e contabilizados 50 pacientes entre os diferentes estudos desta revisão. Na análise do risco de viés, todos foram avaliados como baixo risco de viés em todas as categorias. Em relação aos gráficos da floresta com representações de meta-análise, observamos que não houve diferença estatisticamente significativa em relação ao tempo de ventilação mecânica e nas demais intervenções convencionais ou com eletroestimulação no desfecho de fraqueza muscular adquirida. CONCLUSÃO: Podemos inferir que os estudos apresentam boa qualidade metodológica. Em relação as diferentes intervenções fisioterapêuticas utilizadas para melhora da capacidade funcional, não observamos significância nas análises. A fim de obter maior definição e qualidade metodológica se faz necessário padronizar as avaliações por meio de métricas funcionais em pacientes internados nas Unidades de Terapia Intensiva. Palavras-chaves: Unidades de terapia intensiva; Escala de Funcionalidade; Fraqueza muscular adquirida. 3 1 INTRODUÇÃO Diversos fatores comumente observados em Unidades de Terapia Intensiva (UTI), podem estar associados ao aumento do risco de mortalidade, tais fatores como aumento no tempo de ventilação mecânica e internação, além do insucesso no processo de extubação, alto risco de infecções e fraqueza muscular adquirida. Esses longos períodos levam a perda da funcionalidade e são fatores extremamente relevantes no que tange a melhora clínica do paciente 1. O imobilismo em âmbito de terapia intensiva, condiciona a aplicação de métricas funcionais avaliativas que sejam objetivas, assertivas e específicas o suficiente para poderem auxiliar no direcionamento das condutas fisioterapêuticas 2, bem como encontrar novas estratégias de reabilitação respeitando a individualidade e função de cada de paciente 3. Além desse direcionamento de conduta que auxiliam na prevenção ou diminuição dos efeitos deletérios causados pela internação em UTI, sugestivelmente o status funcional pós alta hospitalar tende a ser melhor 1,4. A literatura é clara sobre pacientes gravemente enfermos com desfechos desfavoráveis, além das altas taxas de mortalidade, responsáveis pelos gastos hospitalares excessivos 5, sendo de suma importância estratégias avaliativas e intervencionistas que possam reduzir esses índices, podendo salvar milhares de vidas ao redor do mundo anualmente 6. 2 OBJETIVO Diante disso, o intuito dessa revisão sistemática teve como objetivo avaliar e analisar as diferentes intervenções em fisioterapia mais utilizadas em âmbito de terapia intensiva além de quais escalas funcionais auxiliam na mensuração da mobilidade e função intrisicos à morbi-mortalidade desses pacientes. 4 3 MÉTODOS Esta revisão sistemática e meta-análise foi registrada em 30 de setembro de 2022 na plataforma International Prospective Register of Systematic Reviews (PROSPERO), com o seguinte número de registro CRD42022361431, conduzida de acordo com as diretrizes Cochrane para revisões sistemáticas de intervenções 7 e relatada de acordo com o Preferred Reporting Items Systematic Reviews and Meta-Analyses (PRISMA) declaração de 2020 8. A avaliação do risco de viés nos estudos incluídos foi realizada pelo instrumento RoB 1.0 9 em todos os seus domínios em duplicata de revisores, além da análise estatística demonstrada pelos gráficos de forrest-plot. Para a busca dos estudos a serem incluídos nesta revisão sistemática, utilizou-se uma estratégia baseada na Prática Baseada em Evidências (PBE), ordenada pelo PICOS, sigla para Population (P), Intervention (I), Comparison (C), Outcomes (O) e Study Design (S). Assim, a estratégia de busca e seleção dos estudos foi ordenada da seguinte forma: P: pacientes internados em unidade de terapia intensiva; I: mobilização precoce (exercícios, cicloergometro; estimulação elétrica); C: Fisioterapia convencional ou sem intervenções; O: Tempo limite de ventilação mecânica, complicações, óbito; S: Ensaio clínico randomizado. Dois revisores (LFO e RRC) examinaram independentemente os títulos e resumos de relevância por meio do EndNote para exclusões. Quando não havia consenso entre os revisores, um terceiro revisor (NM) era consultado para julgamento. Quando não foi mais possível excluir textos por títulos e resumos, procedeu-se à leitura dos textos completos (LFO e RRC) de acordo com os critérios de elegibilidade, chegando ao número final de textos a serem resumidos nesta revisão. Em caso de divergências, adotou-se o mesmo procedimento para títulos e resumos. Risco de viés O risco de viés para cada estudo incluído foi avaliado por meio da versão 2 da ferramenta Cochrane risk of bias 10,11. O viés foi avaliado com base em cinco domínios: processo de randomização (viés de seleção), desvios das intervenções pretendidas (viés de desempenho), dados faltantes de desfecho (viés de atrito), mensuração do desfecho (viés de detecção) e seleção do resultado relatado (viés de relato). Cada fonte potencial 5 de viés foi classificada como alta, baixa ou pouco clara, juntamente com uma justificativa para cada decisão em uma tabela de "Risco de viés". Os julgamentos sumários foram categorizados como baixo risco, algumas preocupações ou alto risco, de acordo com as diretrizes Cochrane handbook for systematic reviews of Interventions 7. 4 RESULTADOS Inicialmente na primeira busca nas bases de dados, utilizando a respectiva estratégia de busca, foram encontrados 512 estudos. Com auxílio do software Rayyan, foram excluídas as duplicatas (43), permanecendo 469 estudos para análise subsequente. Os revisores selecionaram independentemente todos os títulos e resumos identificados com o software, 200 estudos foram considerados inelegíveis, divididos em pastas por motivos de exclusão, além das exclusões duplicadas que apareceram após a exclusão automática e foram feitas visualmente. Sendo assim 7 estudos foram incluídos para uma análise de texto mais detalhada e completa, sendo definidos como potencialmente elegíveis. Destes, 4 estudos foram excluídos por não atenderem aos critérios de elegibilidade (delineamento diferente, faixa etária fora do estipulado pelo estudo, métodos de avaliação que não contemplavam a temática estudada), finalizamos com a inclusão de três estudos a serem analisados, conforme fluxograma de seleção dos estudos representado na figura 1. 6 Figura 1. Fluxograma PRISMA 2020 para novas revisões sistemáticas que incluiu apenas buscas em bases de dados e registros Fonte: Page MJ, McKenzie JE, Bossuyt PM, Boutron I, Hoffmann TC, Mulrow CD, et al. The PRISMA 2020 statement: an updated guideline for reporting systematic reviews. BMJ 2021;372:n71. doi: 10.1136/bmj.n71 Figura 1. Fluxograma PRISMA 2020 para novas revisões sistemáticas que incluiu apenas buscas em bases de dados e registros Fonte: Page MJ, McKenzie JE, Bossuyt PM, Boutron I, Hoffmann TC, Mulrow CD, et al. The PRISMA 2020 statement: an updated guideline for reporting systematic reviews. BMJ 2021;372:n71. doi: 10.1136/bmj.n71 Registros identificados nas Bases de dados (n = 512) Web of Science (n = 264) PubMed (n = 220) Cochrane (n = 14) Lilacs (n = 13) PeDro (n=1) Scopus (n = 0) Registros removidos antes da triagem: Registros duplicados removidos (n = 43) Registros triados (n = 469) Registros excluídos (n = 200) Registros procurados para recuperação (n = 269) Relatórios não recuperados (n = 262) Relatórios avaliados quanto à elegibilidade (n = 7) Relatórios excluídos (n = 4) Estudos incluídos na revisão (n= 3) Identificação dos estudos através de bases de dados e registos Id e n ti fi c a ç ã o P e n e ir a m e n to In c lu s o 7 Risco de viés De modo geral, em suma com todos os domínios que demonstram baixo risco de viés. A avaliação completa do risco de viés é mostrada na figura 2. Figura 2. Resumo do risco de viés: revisar os julgamentos dos autores sobre cada item de risco de viés para cada estudo incluído 8 Metanálise Os desfechos clínicos relacionados ao tempo fora da ventilação mecânica, não foram observadas diferenças estatisticamente significativas, pode-se notar o toque na linha da hipótese nula com uma tendência demonstrada no gráfico em relação ao grupo controle quando comparada ao grupo intervenção, entretanto tal tendência não pode ser levada em consideração para julgamento de sua aplicabilidade clínica, conforme demonstrado na figura 3. Figura 3. Forest plot de estudos no desfecho timeout ventilação mecânica, comparado mobilização precoce versus grupo controle usado para metanálise Em relação a fraqueza muscular adquirida em unidade de terapia intensiva é notável enaltecermos a mobilização precoce com o uso da eletroestimulação como uma intervenção favorável em relação a desfechos clínicos relacionados a mobilidade funcional, conforme demonstrado na figura 4. Figura 4. Forest plot de estudos no desfecho fraqueza adquirida, comparado mobilização precoce (estimulação elétrica) versus grupo controle usado para metanálise. 9 5 DISCUSSÃO Na análise dos desfechos secundários propostos em nosso estudo, acabam corroborando com a literatura, tais desfechos como tempo de internação, tempo em ventilação mecânica invasiva podem aparentemente ser reduzidos pelo fato da mobilização precoce 12–15. Nesse cenário ainda precisamos contextualizar os diferentes aspectos que podem influenciar os desfechos analisados principalmente em um ambiente tão orgânico quanto uma unidade de terapia intensiva, população estuda, tempo e dosagem do tipo de mobilização realizada, além das condutas e tipos de unidades o que intrinsicamente prediz a relação de profissionais por leito e outros aspectos que podem ser estudados futuramente 2. Vale ressaltarmos que desfechos de cegamento são praticamente impossíveis de serem conduzidos, podendo então ser um risco de viés na condução dos estudos, implicando diretamente em seu nível de consciência e sedação consequentemente na avaliação e seguimento do nível de mobilidade. Devemos considerar ainda dentro das intervenções aplicadas como técnicas específicas na mobilização precoce o uso de eletroestimulação, além de sua fácil aplicabilidade clínica, um estudo piloto demonstrou que sua aplicação na musculatura abdominal auxilia no processo de desmame e diminuem o tempo de ventilação mecânica16. Outro aspecto a se considerar com a eletroestimulação é tentativa de prevenção de atrofia muscular que acaba tendo uma proteólise atenuada em pacientes em estado crítico17. Burtin et al., (2009)18, demonstrou a eficácia da utilização prévia do cicloergômetro em pacientes mecanicamente ventilados com desfechos favoráveis em sua funcionalidade avaliados posteriormente pela escala Perme, diante isso infere-se que a fisioterapia convencial tem seus reais benefícios mais à associação de intervenções pode ser extremamente benéfica potencializando esses resultados funcionais. Para realização da mobilização precoce faz-se necessário a integração de engrenagens importantes como a expertise clínica, tempo e recursos a importância das 10 discussões interdisciplinares, promovendo alinhamento de condutas que podem ser mais assertivas em relação a mobilização precoce em pacientes em estado crítico 19. Implicações e recomendações para práticas futuras Consideramos a mobilização precoce um instrumento importante nas mãos dos fisioterapeutas em âmbito de terapia intensiva, precisamos vencer as barreiras socioculturais nas diferentes populações, lembrando que esses checklists são facilitadores em sua implementação garantindo a segurança e plano de atividades bem direcionados. Contribuições dos autores Luis Felipe Orsi Gameiro (LFO) e Ronny Rodrigues Correia (RRC), escreveram o primeiro rascunho do manuscrito e pesquisaram a literatura; Luis Felipe Orsi Gameiro (LFO) e Ronny Rodrigues Correia (RRC), extraíram e analisaram os dados e finalizaram o manuscrito; Norma Sueli Pinheiro Módolo (NPM), revisou o manuscrito, supervisionou o trabalho e extraiu os dados. Todos os autores leram e aprovaram o manuscrito final. REFERÊNCIAS 1. Huang, M. et al. Functional Status Score for the ICU: An International Clinimetric Analysis of Validity, Responsiveness, and Minimal Important Difference. 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