ANDRÉA ALVES SILVA SOARES O GESTOR NO PROCESSO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA O USO DE MEIOS DIGITAIS NA CONSTRUÇÃO DE UMA ESCOLA DE QUALIDADE Presidente Prudente 2005 ANDREA ALVES SILVA SOARES O GESTOR NO PROCESSO DE FORMAÇÃO DE PROFESSORES PARA O USO DE MEIOS DIGITAIS NA CONSTRUÇÃO DE UMA ESCOLA DE QUALIDADE Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Universidade Estadual Paulista Júlio Mesquita Filho de Presidente Prudente-SP, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Educação, sob a orientação da Profª Drª Elisa Tomoe Moriya Schlünzen e co- orientação da Profª Drª Ana Maria da Costa Santos Menin. Presidente Prudente 2005 BANCA EXAMINADORA ___________________________________________________________________________ Prof. Dra Elisa Tomoe Morya Schlunzen ________________________________________________________________ Prof. Dra Maria Elizabeth Biancocini Almeida ________________________________________________________________ Prof. Dra Arilda Inês Miranda Ribeiro DEDICATÓRIADEDICATÓRIADEDICATÓRIADEDICATÓRIA Dedico este trabalho a algumas pessoas especiais que estão sempre ao meu lado e dividiram comigo esta caminhada. Luís Eduardo, meu esposo amado, que com paciência e dedicação aceitou compartilhar este momento de nossas vidas. Bianca, Luísa e Lucas, filhos adorados, luzes em meu viver, cujos sorrisos e beijos carinhosos tornaram esta etapa tão especial. Nilton e Neusa, pais presentes e carinhosos, que deram-me todo o apoio para concluir com êxito esta jornada. Neusa Silva Soares (in memorian), pelo exemplo de educadora que sempre foi para mim. A vocês, o meu amor e agradecimentos sinceros. AGRADECIMENTOSAGRADECIMENTOSAGRADECIMENTOSAGRADECIMENTOS À minha orientadora, Prof. Dra Elisa Tomoe Morya Schlünzen, pela presença constante e relacionamento respeitoso. Agradeço-lhe a paciência e a confiança depositadas em mim, além do privilégio de poder conviver com uma das mulheres mais ética e inclusiva que tive a oportunidade de conhecer. À Profª., Dra Ana Maria da Costa Santos Menin, minha co-orientadora, agradeço o estímulo, ajuda imprescindível e sábia no decorrer e conclusão desta investigação. A você, meu respeito. Às Profª., Dra Maria Elizabeth Bianconcini Almeida e Dra Arilda Inês Miranda Ribeiro, por terem me ajudado a enxergar as “luzes” que esta investigação tinha a oferecer. Vocês desafiaram-me com suas observações, apurando-me o olhar para aspectos importantes da minha atuação enquanto gestora, formadora e pesquisadora. À Neusa Rotter Montibeller, vice-diretora da escola pesquisada, amiga verdadeira, que soube apoiar-me, ajudando na superação dos momentos difíceis e vibrando comigo diante das conquistas. Sua ajuda foi essencial para que este trabalho fosse concluído tão seriamente. Aos Professores Sujeitos da Pesquisa, ao professor-coordenador-pedagógico e aos funcionários da escola pesquisada. Vocês confirmaram minhas convicções de que a escola pública do estado de São Paulo é realmente um espaço onde a educação pode ser inovadora e de qualidade para todos. A vocês, o meu afeto e reconhecimento. Aos alunos da escola, pelo comprometimento, e por terem trazido um brilho tão intenso às atividades realizadas ao longo destes dois anos de trabalho. Ao Prof., Dr Klaus Schlünzen Junior, pela análise criteriosa, orientação séria e comprometida em várias etapas desta pesquisa. À Danielle Aparecida Nascimento dos Santos, “irmã de alma”, que caminhou comigo, dando-me força e auxiliando-me a tornar esta investigação tão significativa para a minha formação profissional. Aos amigos, Helton Augusto de Carvalho, Beatriz Soares Nogueira e Miriam Deise Rodrigues Chella, pelo incentivo e cooperação no decorrer do desenvolvimento deste trabalho. Às Profª., Ms. Andréa Marques Leão Doescher e Ms.Maria Urbana da Silva, pela colaboração e ajuda oferecida durante a conclusão da investigação. Aos docentes do Programa de Pós-Graduação da FCT/Unesp de Presidente Prudente. A vocês o meu reconhecimento e a certeza de que fui privilegiada por poder partilhar de ensinamentos tão preciosos no decorrer destes três anos de convivência. Aos alunos do Programa de Pós-Graduação da FCT/Unesp de Presidente Prudente, em especial: Flaviana, Flávia, Daniela Jordão, Renata Benisterro, Adriana, Carminha, Marcos, Marcelo, Denis, Renata, Maria da Graça, Dejanira, Márcia, Cristina e Adriano, pela amizade e por terem partilhado comigo suas experiências profissionais. Aos funcionários do departamento de Pós-Graduação da FCT/Unesp de Presidente Prudente, pelo respeito e orientações sempre tão precisas. Aos meus irmãos, Elisandra e Nilton Rafael, pelo carinho e por acreditarem que um dia eu estaria concluindo este momento de minha vida. A vocês o meu eterno amor. À Secretaria da Educação do Estado de São Paulo que, por meio do Programa Bolsa Mestrado, subsidiou esta investigação. À Dirigente Regional de Ensino da cidade de Araçatuba, pela colaboração, e por acreditar no trabalho que seria desenvolvido junto à escola pesquisada. Ao Secretário da Educação do Estado de São Paulo, Sr. Gabriel Chalita, por valorizar a escola pública e seus profissionais, fazendo-me sentir orgulho em integrar esta rede de ensino tão conceituada e por acreditar que podemos construir uma escola pública de qualidade para todos. RESUMO A presente dissertação apresenta uma Pesquisa-ação, de caráter essencialmente qualitativo, na qual o objetivo principal foi investigar o papel do gestor na formação docente para a transformação pedagógica, física e social de uma escola cujo contexto de exclusão social e de alto índice de violência refletia-se na depredação do prédio escolar, na indisciplina e no desinteresse dos alunos em relação à aprendizagem. Considerando as dificuldades da prática pedagógica em modificar a realidade dessa escola pública da cidade de Araçatuba, Estado de São Paulo, delineou-se coletivamente o problema a fim de focar, essencialmente, a construção de uma escola de qualidade para todos, usando como estratégia o desenvolvimento de projeto de trabalho interdisciplinar e como recursos os meios digitais. Para o levantamento dos dados, optou-se pela observação assistemática e sistemática, pela aplicação de questionários, realização de entrevistas e observação participante, registrados por meio de anotações, fotografias e filmagens. O desenvolvimento da pesquisa deu-se de maio/2003 a janeiro/2004, pela qual os professores foram formados em serviço para o uso das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), enquanto ferramentas potencializadoras de habilidades na construção de um projeto interdisciplinar. No decorrer da formação, as intervenções constituíram-se em reflexões semanais nas Horas de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC), permeadas por acompanhamento em sala de aula e na Sala Ambiente de Informática (SAI). A análise dos dados e registros ateve-se, principalmente, à prática docente em relação ao uso das TIC, à aprendizagem dos conteúdos disciplinares por meio do desempenho acadêmico dos alunos e à modificação do espaço físico escolar. Dentre os resultados, merecem destaque: o surgimento de um novo “fazer pedagógico” por meio do uso das TIC e a instituição da prática de trocas colaborativas, despertando-se as lideranças dos diferentes segmentos (docente, discente e administrativo) e uma nova forma de os alunos construírem conhecimentos. Esta pesquisa veio corroborar a tese de que os gestores são atores de fundamental importância para a consolidação da transformação do contexto escolar. Para tanto, é necessário que esse incentive e viabilize condições para tornar a escola um espaço acolhedor onde alunos e professores sintam-se valorizados, reflitam constante e conscientemente sobre seu papel educacional e percebam-se autônomos para construir a escola de qualidade para todos, usando os meios digitais disponíveis no ambiente educacional. Palavras-chave: Papel do Gestor, Tecnologia Educacional, Formação Continuada e em Serviço, Projeto de Trabalho Interdisciplinar e Transformação da Realidade Escolar. ABSTRACT The essay presents a research-action, whose feature is essentially qualitative, in which the main goal is to investigate the role of the administrator in the teaching formation for the pedagogical, physical and social transformation of a school whose the social exclusion context and the high rate of violence was reflected in the school building destruction owing to vandalism, in the indiscipline and in the lack of students interest to learn. Considering the teaching pedagogical practice inefficient to modify the reality of the Araçatuba public schools, in Sao Paulo State, the problem was collectively delineated intending to focus, essentially, the construction of a quality school for all of us, having the working project development as a strategy, and the digital means as an appeal. For the data statistics, we opted for the systematic and non-systematic observation, for the questionnaire application, interview and the observation registered by notes, pictures and films. The research development occurred from May/2003 to January/2004, by which the teachers graduated while working in the use of the Comunication and Information Technology (CIT), used as tools in the skills improving in the construction of an interdisciplinary project. During the graduation, some interventions occurred in the weekly analysis during the collective pedagogical working hours (CPWH), assisted in the classroom and in the computer classroom (CC). The data and registry analysis was mainly related to the teaching practice in the relation to the use of the (CIT), the disciplinary contents learning through the student academic development and the modification of the school physical room. Among the results, it is worth to remark: the rising of a new “pedagogical carry out” through the use of the (CIT) and the practice of contributive exchanges, raising the leadership of different segments (teaching, student and administrative) and a new way for the students to acquire knowledge. The present research was done to confirm the thesis the administrator, is fundamentally important for the consolidation of the school context transformation. For this, the administrator needs to stimulate and facilitate actions to turn the school into a welcoming place where the students and teachers feel appreciated, pondering constant and consciously on their educational value and feel free to build a school of quality for everybody, using the available digital means in the educational environment. KEY WORDS: Administrator Role, Educational Technology, Continual Working Graduation, Interdisciplinary Working Project and School Reality Transformation. LISTA DE ABREVIATURAS CF: Constituição Federal. LDBEN: Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. PCN: Parâmetros Curriculares Nacionais SEE: Secretaria Estadual de Educação. SEED: Secretaria de Educação a Distância. DITEC: Departamento de Infra- Estrutura Tecnológica. FDE: Fundação de Desenvolvimento da Educação. PROINFO: Programa de Informática e Educação SARESP: Sistema de Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo. ERR: Estudos de Recuperação e Reforço. PEC: Programa de Educação Continuada. ATP: Assistente-Técnico-Pedagógico. UE: Unidade Escolar. PC: Plano de Curso. PPP: Projeto-Político- Pedagógico. PC: Plano de Curso. HTPC: Hora de Trabalho Pedagógico Coletivo. TIC: Tecnologias de Informação e Comunicação. SAI: Sala Ambiente de Informática. ZPD: Zona Proximal de Desenvolvimento. CCS: Contextualizado, Cooperativo e Significativo. PSP: Professores Sujeitos da Pesquisa. PCP: Professores Convidados da Pesquisa. ACT: Admitido em Caráter Temporário. ONG: Organização Não Governamental. SESI: Serviço Social da Indústria. SBT: Sistema Brasileiro de Televisão. ARCA: Associação de Reinserção da Criança e do Adolescente. PUC/SP: Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. P1: Professora de Português – Ensino Fundamental. P2: Professora de Português – Ensino Médio. PBEM: Professora de Biologia Ciências do Ensino Médio. PCEF: Professora de Ciências do Ensino Fundamental. PEA: Professora de Educação Artística. PH: Professora de História. PMEF: Professor de Matemática Ensino Fundamental. LISTA DE FIGURAS: Figura 1 - Uso das TIC segundo a Abordagem Construcionista 41 Figura 2 - Ciclo e Espiral da Aprendizagem 46 Figura 3 - Reunião com os PSP 87 Figura 4 - Entrevista realizada junto aos irmãos gêmeos e alunos egressos da escola 101 Figura 5 - Alunos trabalhando na SAI 104 Figura 6 - Alunos em trabalho de campo 110 Figura 7 - Alunos pesquisando no site da Prefeitura Municipal 114 Figura 8 - Painel ilustrativo da figura do negro 117 Figura 9 - Quadra coberta após a realização das pinturas 119 Figura 10 - Alunas pintando parede do banheiro 120 Figura 11 - Visita da Dirigente Regional de Ensino à escola 121 Figura 12 - Situação da escola antes da realização do projeto 123 Figura 13 - Professores pesquisando 127 Figura 14 - Um dos encontros para reflexão com os professores 130 Figura 15 - Grafitagem 134 Figura 16 - Aluno da turma B 138 LISTA DE QUADROS: Quadro 1 - Atuação profissional dos Professores Sujeitos da Pesquisa (PSP) no Uso das TIC 70 Quadro 2 - Características das turmas participantes da pesquisa 71 Quadro 3 - Fases da pesquisa 73 Quadro 4 - Análise da entrevista realizada junto a equipe escolar 81 Quadro 5 - Análise da entrevista realizada junto aos alunos 82 Quadro 6 - Análise da entrevista realizada junto aos professores 83 Quadro 7 - Cronograma dos encontros durante o processo de formação 90 Quadro 8 - Atividades e Conteúdos Trabalhados pela P1 98 Quadro 9 - Atividades e Conteúdos Trabalhados pela P2 99 Quadro 10 - Atividades e Conteúdos Trabalhados pela PCEF 102 Quadro 11 - Atividades e Conteúdos Trabalhados pela PBEM 106 Quadro 12 - Atividades e Conteúdos Trabalhados pela PH 107 Quadro 13 - Atividades e Conteúdos Trabalhados pela PMEF 111 Quadro 14 - Atividades e Conteúdos Trabalhados pela PEA 115 SUMÁRIO CAPÍTULO 1: Primeiras Palavras 15 1.1 Origem do Problema e Relevância da Pesquisa 16 1.2 Definição do Problema 22 1.3 Delimitação do Problema 22 1.4 Objetivo Geral 23 1.5 Objetivos Específicos 23 1.6 Delineamento Metodológico da Pesquisa 24 CAPÍTULO 2: Discurso Teórico 27 2.1 As Atribuições do Gestor na Atualidade 30 2.2 As Transformações na Realidade Escolar 37 2.3 A Implementação da Utilização das TIC nas Atividades Escolares 39 2.4 Projetos de Trabalho: Um Novo Fazer Pedagógico 48 2.5 O Gestor no Processo de Formação de Professores para o Uso dos Meios Digitais 53 CAPÍTULO 3: Percurso Metodológico 60 3.1 Caracterização do Cenário e dos Sujeitos da Pesquisa 61 3.1.1 Contextualização histórica do bairro em que a escola está inserida 61 3.1.2 A Escola e seu Projeto Político-Pedagógico 63 3.1.3 Os sujeitos da pesquisa 64 3.1.4 As turmas selecionadas 70 3.2 Caracterização da Pesquisa 71 3.2.1 Fase Diagnóstica 74 3.2.2 Fase de Formação Continuada e em Serviço dos Professores 76 3.2.3 Fase de Análise dos Resultados 77 CAPÍTULO 4: O Caminho Percorrido pela Equipe Escolar 80 4.1 Fase diagnóstica 81 4.2 A Construção do Projeto Conhecendo o Bairro de nossa Escola 86 4.2.1 P1 – Língua Portuguesa – Turma A 97 4.2.2 P2 – Língua Portuguesa – Turma B 99 4.2.3 PCEF – Ciências – Turma A e PBEM –Biologia – Turma B 102 4.2.4 PH – História – Turmas A e B 4.2.5 PMEF – Matemática – Turma A 107 111 4.2.6 PEA – Educação Artística – Turmas A e B 115 CAPÍTULO 5: Conquistas Significativas 122 5.1 Fase Diagnóstica 123 5.2 Fase de Formação e Construção do Projeto Interdisciplinar 126 5.3 Modificação da Cultura Escolar em relação ao uso das TIC CAPITULO 6: Palavras Finais. Não Últimas... 131 143 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 152 ANEXOS 157 Anexo 1 – Roteiro das entrevistas elaboradas pelos alunos da turma B(P2) 158 Anexo 2 – Certificado elaborado pelos alunos da turma B 160 Anexo 3 – Roteiro de questionário elaborado pelos Alunos (PCEF) 161 Anexo 4 – Roteiro de entrevistas elaboradas pelas Turmas A e B (PH) 163 Anexo 5 – Roteiro de questionário elaborado pelos alunos da Turma A (PMEF) 164 Anexo 6 – Matéria publicada no Jornal no início de 2004 165 Anexo 7 – Matéria publicada no site oficial da SEE 166 Anexo 8 – Manchete da Capa do Jornal 167 APÊNDICES 169 Apêndice 1 - Roteiro de questionário aplicado junto aos Professores 170 Apêndice 2 – Roteiro de entrevista aplicada junto a Equipe Gestora 172 Apêndice 3 – Roteiro de entrevista aplicada junto aos Alunos 173 Apêndice 4 – Roteiro de entrevista aplicada junto aos Professores 174 Apêndice 5 – Roteiro da Ação Pedagógica – Projeto Interdisciplinar/2003 175 CAPÍTULO 1 PRIMEIRAS PALAVRAS 16 No decorrer de meu caminhar profissional e pessoal sempre houve uma busca por uma educação mais humana, inclusiva e inovadora. Este propósito levou-me a refletir sobre a questão do gestor escolar viabilizar o processo de formação dos professores, por meio da construção de projetos de trabalho, nos quais as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) fossem utilizadas como ferramentas potencializadoras da melhoria do processo ensino- aprendizagem nas escolas públicas do Estado de São Paulo. Assim, antes de apresentar os caminhos pelos quais enveredei, pretendo demonstrar os motivos que conduziram a construção desta pesquisa. 1 Origem do Problema e Relevância da Pesquisa Minha história como educadora já podia ser percebida desde a infância, pois sempre manifestara o desejo de ser professora, principalmente por meio das brincadeiras com minha irmã caçula, sentindo-me realizada em acreditar que conseguia ensiná-la. O anúncio de minha carreira docente deu-se quando cursei o magistério. Entretanto, por influência de meu pai, optei por graduar-me em Direito. Após encerrar o curso, senti que esta área não me trazia satisfação profissional. Dessa forma, ingressei em Pedagogia, realizando com êxito as disciplinas e o estágio supervisionado. Paralelamente ao segundo curso de graduação, ministrava aulas para o ensino Fundamental do ciclo I (1ª a 4ª séries) na rede pública estadual. No decorrer deste período, buscava, sempre, inovar minha prática por meio de um trabalho Construtivista1, cuja teoria havia tido contato no curso de graduação. No entanto, a pedido da gestora da escola em que trabalhava não dei continuidade ao trabalho, uma vez que ela era contra essa forma de ensinar. 1 Teoria construtivista é uma das correntes teóricas que explica como a inteligência humana aprimora-se partindo do princípio de que o desenvolvimento da inteligência é determinado por ações mútuas entre o indivíduo e o meio. A idéia é que o homem não nasce inteligente, mas não é passivo sob a influência do meio, isto é, ele 17 Senti-me frustrada e inquieta e, quando possível, sempre buscava trocar experiências com outros professores. Incentivada pela professora-coordenadora-pedagógica da escola onde atuava, participei, em 1997, do processo seletivo de professores para atuar no Centro de Aperfeiçoamento e Formação do Magistério (CEFAM) da cidade, onde passei a ministrar aulas de Didática e Estágio Supervisionado para a turma de quarto ano do antigo magistério. No papel, agora, de formadora, senti necessidade de aprofundar meu conhecimento na área de formação de professores, no intuito de melhorar meu trabalho. Em 1998, cursei Especialização em Educação na Área de Interdisciplinaridade no Ensino e Currículo nas Séries Iniciais na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campus de Três Lagoas2. Vale ressaltar, que inicialmente, confrontei-me com inúmeras dificuldades, por meus conhecimentos serem restritos e pelo fato de estar em contato com um grupo de profissionais experientes na formação de professores do Ensino Fundamental e Médio, docentes da área de Educação Especial, coordenadores pedagógicos, psicólogos e gestores escolares. Os relatos, troca de informações e práticas com os cursistas e professores da universidade possibilitaram-me a construção de conhecimentos significativos - desenvolvimento do hábito de leitura e organização de idéias para produção de textos científicos, reflexão sobre minha prática docente a partir dos relatos de experiências destes profissionais, estudo dos princípios norteadores da interdisciplinaridade, bem como a formação de professores para trabalhar com a temática. Como conclusão de curso, elaborei uma monografia intitulada “A Construção do Projeto Político-Pedagógico da Escola”, tendo despertado em mim um grande desejo de prosseguir estudando tal assunto. responde aos estímulos externos agindo sobre eles para construir e organizar o seu próprio conhecimento, de forma cada vez mais elaborada. (Piaget, 1979) 2 Para cursar a Especialização na UFMS era necessário que os alunos fossem submetidos ao processo seletivo constituído por prova escrita e entrevista com professores da universidade. 18 No decorrer desta caminhada, em 2001, surgiu a oportunidade de trabalhar no Programa de Educação Continuada (PEC)3 - Formação Universitária, como tutora da turma B da cidade de Araçatuba (cujo pólo era situado em Presidente Prudente), pois seria muito oportuno vivenciar um processo prático dos estudos realizados no curso de especialização concluído recentemente. O PEC, além do material de qualidade e da participação em videoconferências e teleconferências, proporcionou às cursistas e às tutoras a oportunidade de realizarem atividades em ambiente virtual denominado Learning Space 4, interagindo com os professores- assistentes das turmas que auxiliavam no desenvolvimento teórico e cognitivo das alunas. Participar desta capacitação oportunizou-me observar as dificuldades apresentadas pelas professoras quanto à utilização do computador. Ao constatar tal fato, considerei importante indagá-las sobre o uso dos recursos tecnológicos na escola. Em seus relatos, as docentes descreveram os equipamentos disponíveis em suas respectivas escolas, afirmando usarem mais freqüentemente a televisão e o vídeo e salientando que o maior dificultador do uso da Sala Ambiente de informática (SAI) da escola era a posição do gestor. Esses depoimentos levaram-me a refletir sobre a atitude dos gestores das escolas nas quais trabalhei – semelhante à maioria dos gestores das outras escolas públicas – sempre mantendo os recursos da escola restritos a fim de evitar sua danificação, apesar dos motivos da existência destes serem a utilização imediata por professores e alunos em razão de sua acelerada obsolescência e da possibilidade de facilitarem a aprendizagem segundo a Abordagem Construcionista. 3 Programa de Formação Continuada de Professores efetivos da rede estadual de ensino que ainda não tinham a graduação mínima exigida pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN) 9394/96 em nível superior. A formação Nível Superior ocorreu entre os meses de agosto de 2001 a dezembro de 2002 no Estado de São Paulo. Oferecida pela Secretaria Estadual de Educação teve como parceiros as instituições: UNESP, PUC e USP. 4 Caracteriza-se como um ambiente de apoio, desenvolvido pela Lótus, para a publicação de material multimídia. Ainda pode ser usado para facilitar o trabalho interativo. 19 Esses depoimentos motivaram-me, ainda, a compreender um pouco mais acerca dos obstáculos da utilização das TIC no trabalho docente. No percurso destas indagações, participava, no ano 2002, do processo seletivo para provimento do cargo de gestora escolar (diretora de escola) da rede pública estadual. Ao ser aprovada assumi este cargo, desvinculando-me do PEC. Ingressei na escola A5, que possuía dois mil (2000) alunos, os quais estavam distribuídos em sessenta (60) classes de Ensino Fundamental do Ciclo II (5ª a 8ª série) e Médio, divididas em três períodos. Após três meses retornei à minha cidade de origem, por meio de transferência, para assumir a escola B6 a qual é o universo desta pesquisa. Na escola B enfrentei sérios problemas: indisciplina dos alunos, destruição do prédio escolar e desrespeito em relação a professores e funcionários levaram-me a buscar entender o porquê desses problemas apresentados nesta nova instituição. Recebendo, na diretoria, os alunos encaminhados pelos professores em razão de indisciplina, procurava dialogar a fim de compreender os motivos de tais atitudes. Em um diagnóstico inicial concluí que a maioria dos discentes não gostava da escola, considerando-a “muito chata”. Reclamaram das aulas classificando-as como “sempre iguais” nas quais os professores só passavam matéria na lousa e exercícios de fixação, tornando-se monótono e desgastante estar em sala. Grande parte dos alunos demonstrou interesse em usar outros ambientes, como a biblioteca, e, principalmente, a SAI, questionando-me se a restrição ao uso desta partia de minhas determinações e se eu usava as atribuições como gestora para proibir a utilização destes ambientes. Novamente, confrontava-me com a temática da utilização das TIC. 5 Escola A localizava-se na Diretoria de Ensino da zona Leste 2 na Grande São Paulo. 6 Escola B localiza-se na Diretoria de Ensino de Araçatuba. 20 Movida pelas críticas, procurei analisar como era o funcionamento da SAI, constatando que, realmente, o ambiente não era utilizado pelos alunos. Esta situação reportou- me às idéias de Moraes (1997): Na escola, continuamos limitando nossas crianças ao espaço reduzido de suas carteiras, imobilizadas em seus movimentos, silenciadas em suas falas, impedidas de pensar. Reduzidas em sua criatividade e em suas possibilidades de expressão, as crianças encontram-se também limitadas em sua sociabilidade, presas à sua mente racional, impossibilitadas de experimentar novos vôos e de conquistar novos espaços. (p.50) Essa realidade levou-me a desejar intervir neste quadro e mudá-lo, questionando- me: Por que os recursos tecnológicos existentes não eram utilizados por professores e alunos? Aquela escola não estava acompanhando as mudanças do mundo e seria necessário rever a prática docente, principalmente em relação a essa utilização das TIC. Nesta ocasião, busquei o Programa de Pós-Graduação em Educação, nível Mestrado da FCT/UNESP – Campus de Presidente Prudente, à procura de conhecimentos que pudessem ajudar-me a encontrar alternativas para a superação do quadro encontrado na escola em que estava iniciando a carreira como gestora. Ao ingressar no mestrado, inicialmente como aluna especial, as duas primeiras disciplinas cursadas relacionavam-se ao tema “Informática na Educação”. Nos momentos de diálogos, inúmeras inquietações surgiram, fazendo-me refletir profundamente sobre a importância do gestor na formação do corpo docente da escola para o uso as TIC. Esses momentos de estudo subsidiaram-me na construção do pré-projeto de mestrado sustentador desta investigação. Com relação à formação de professores e o papel dos gestores neste processo, verificou-se um número pouco expressivo de trabalhos abordando o assunto. Dentre eles, destacam-se: - Almeida (2000), em sua tese de doutorado, investigou o processo de formação de professores para o uso do computador, comentando a importância da atuação do gestor; 21 - Silva (2000), em sua tese de doutorado, identificou as necessidades de formação continuada de professores das séries iniciais, e sua relação com a articulação teórico-prática da formação inicial, falando superficialmente sobre o papel do gestor; - Tavares (2001), na dissertação de mestrado, refletiu sobre o processo de formação continuada de professores de uma escola pública estadual em informática educacional somente mencionando a atuação do gestor; - Fernandes (2002), na dissertação de mestrado, identificou a ocorrência de mudanças na prática pedagógica a partir da formação continuada, pontuando alguns aspectos, entre eles a participação da gestão escolar; - Carrenho (2003), em sua dissertação de mestrado, analisou a capacitação em serviço dos professores para o uso da TV-Escola questionando a necessidade de envolvimento dos gestores; - Kuin (2005), em sua dissertação de mestrado, identificou as condições favoráveis para a apropriação das TIC, em uma escola pública da rede estadual de ensino, refletindo sobre diferentes aspectos, entre eles o papel da gestão escolar, sem, no entanto ser este o foco de sua investigação. Destaco que, ao analisar estas investigações, não localizei um maior aprofundamento sobre o papel do gestor em relação ao processo de formação dos professores, em especial, para o uso das TIC. Ao contrário, verifiquei pesquisas que comentam a questão da formação de professores e o uso das TIC, apontando-me a necessidade de estudar mais profundamente a temática, caracterizando-se esta a principal contribuição desta pesquisa. Diante do cenário apresentado, desenhei este percurso que conduziu-me às inquietações presentes. Em momentos importantes da minha caminhada profissional, os fatos relevantes destacam a importância desta investigação, principalmente para quem convive 22 diariamente com a realidade da escola pública da rede estadual de ensino, surgindo assim o problema da pesquisa. 1.2 Definição do Problema Como o gestor pode viabilizar a transformação da realidade educacional, elevando sua qualidade, com vistas à construção de uma escola de qualidade para todos, por meio de um processo de formação continuada e em serviço7 dos professores para o uso de meios digitais? 1.3 Delimitação do Problema Na busca para responder a questão maior e com base nos princípios e pressupostos norteadores, encaminhei estudos e análises a partir das questões a seguir: � O gestor tem influência no processo de revisão da prática docente no percurso de transformação da escola pública? � Como os espaços destinados à formação continuada e em serviço dos professores podem ser transformados em ambientes produtivos na construção de projetos de trabalho interdisciplinares para efetivar, assim, uma aprendizagem partindo da vivência docente e melhorando a realidade escolar em relação à experiência pedagógica dos alunos? � Podem as TIC – em especial o uso do computador – propiciarem a criação de um ambiente de aprendizagem na escola, por meio de um novo fazer, para permitir que alunos e professores busquem informações, expressem idéias e construam o seu conhecimento? 7 A escolha pela expressão “Formação continuada e em serviço” será fundamentada no Capítulo 2. 23 � Ao incentivar a construção desse novo ambiente de aprendizagem por meio do uso das TIC, o gestor estaria estimulando a formação de lideranças que gerissem mudanças na realidade escolar? Delimitado o problema, considerando o papel do gestor na formação em serviço do professor para um novo fazer pedagógico que usam as TIC como ferramentas potencializadoras da aprendizagem dos alunos e para a transformação da escola, defino a seguir os objetivos da pesquisa. 1.4 Objetivo Geral � Investigar como o gestor pode viabilizar o processo de transformação da realidade escolar, pela formação dos professores, criando um ambiente no qual, por meio do uso dos meios digitais, a equipe escolar edifique uma escola de qualidade para todos. 1.5 Objetivos Específicos � Identificar e analisar as razões da não utilização construcionista das TIC – especialmente o computador – no cotidiano da sala de aula; � Examinar as dificuldades e possibilidades oferecidas pelas TIC em relação ao trabalho administrativo e pedagógico do ponto de vista da equipe escolar (professores, alunos e funcionários); � Investigar como é possível transformar as HTPC em espaço de formação de professores pela revisão da prática docente; � Estudar a viabilização da inserção de um novo fazer pedagógico, por meio do uso das TIC, gerando interações e trocas colaborativas e estimulando o surgimento de lideranças entre as equipes de gestão, pedagógica, administrativa e dos alunos; 24 � Verificar que mudanças se fazem necessárias na realidade escolar, em relação ao uso das TIC como ferramentas potencializadoras para a construção do conhecimento contextualizado e significativo para todos os alunos. A partir dos objetivos: geral e específicos definidos, passarei a descrever o delineamento da pesquisa, justificando e fundamentando a escolha metodológica que subsidiou esta investigação. 1.5 Delineamento Metodológico da Pesquisa Trata-se, pois, de uma pesquisa qualitativa a qual, segundo Bogdan e Biklen (1994), envolve a obtenção de dados descritivos uma vez que o contato entre pesquisador e pesquisados dá-se de forma direta e cujo a ênfase é no processo e não no produto. Para Chizzotti (2001): [...] a abordagem qualitativa parte do fundamento de que há uma relação entre o mundo real e o sujeito, uma interdependência viva entre o sujeito e o objeto, um vínculo indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito. (p. 79) Dentre as categorias de pesquisa qualitativa optei pelo desenvolvimento de uma pesquisa-ação pelo fato de buscar, em parceria com os sujeitos da pesquisa, uma transformação da escola que apresentava um quadro preocupante, cuja superação era imprescindível para o alcance dos objetivos educacionais propostos em seu Projeto Político Pedagógico (PPP). Segundo Thiollent (2001), a pesquisa-ação possibilita ao pesquisador desempenhar um papel ativo diante dos problemas encontrados, no acompanhamento e na avaliação das ações desencadeadas em função das dificuldades. Além disso, de acordo com as idéias de Lüdke e André (1986), este tipo de investigação viabiliza ao pesquisador o contato direto e prolongado com o ambiente e a situação a ser analisada, envolvendo a obtenção de dados descritivos por meio da interação. Thiollent (2001) conclui: 25 A pesquisa ação é um tipo de pesquisa social com base empírica que é concebida e realizada em estreita associação com uma ação ou com a resolução de um problema coletivo e no qual os pesquisadores e os participantes representativos da situação ou do problema estão envolvidos de modo cooperativo ou participativo. (THIOLLENT, 2001, p. 04) O desenvolvimento desta pesquisa-ação permitiu a interação, ao longo de nove meses, com o ambiente escolar do universo da pesquisa, em um trabalho intensivo de formação e campo. Ressalto que, no papel de gestora, atuei intensamente junto aos Professores Sujeitos da Pesquisa8, acompanhando, apoiando e oferecendo suporte pedagógico e administrativo. No entanto, destaco que os demais membros da equipe de gestão (vice- diretora e professor-coordenador-pedagógico), apesar de não assumirem a liderança do processo de formação, envolveram-se concorrendo para o desenvolvimento das ações do projeto. Para Morin (2004), o sucesso do trabalho do pesquisador está vinculado à elaboração de um plano de pesquisa, seguindo algumas etapas: Identificar claramente as principais necessidades do grupo; compreender bem a finalidade do projeto; determinar a duração total do projeto; definir com precisão os papéis dos participantes, atribuir-lhes tarefas e concluir um entendimento ou um contrato aberto. (p. 125) Assim, a identificação das necessidades possibilitou-me sistematizar o encaminhamento e período das etapas favorecendo: uma reflexão sobre o cotidiano escolar; a observação dos problemas apresentados; uma análise sobre o funcionamento da SAI; a mediação pedagógica e política; o incentivo e acompanhamento da elaboração do projeto interdisciplinar de sala de aula, por meio do qual os professores necessitariam atuar como parceiros dos alunos e de seus colegas de trabalho; o desenvolvimento de competências e habilidades, uma vez que o objetivo era a transformação da realidade escolar. Como coleta de dados para a investigação, realizei entrevistas com alunos e professores participantes; aplicação de questionário; análise documental e observação 8 Os docentes participantes da pesquisa serão doravante denominados PSP. 26 participante na sala de aula, na SAI, nas HTPC. O registro da coleta de dados foi efetuado por meio de gravações, anotações e fotos. Para Morin (2004): Nesta reflexão sobre os dados coletados, o mais importante não é corroborá- los como meio para chegar ao consenso, mas para agregá-los em um mosaico que leve à compreensão do sentido dos acontecimentos observados. (p. 158) A fim de possibilitar a descrição do percurso desta investigação, a dissertação encontra-se dividida em seis capítulos, sendo este o capítulo 1. No capítulo 2 explicito as teorias que fundamentaram a investigação, especificamente, em relação às atribuições do gestor na atualidade, à transformação da realidade escolar, à implementação da utilização das TIC nas atividades escolares, a um novo fazer pedagógico por meio dos projetos de trabalho e à formação continuada e em serviço de professores para o uso dos meios digitais. O detalhamento do cenário, dos sujeitos e dos pressupostos metodológicos da pesquisa pela descrição de três fases: diagnóstica; do processo de formação continuada e em serviço; da construção do projeto interdisciplinar e análise dos resultados, será apresentado no capítulo 3. A descrição da construção do projeto interdisciplinar e do processo de formação continuada e em serviço dos professores participantes, encontra-se no capítulo 4. A análise dos resultados do processo de formação e do desenvolvimento do projeto interdisciplinar, apontando aspectos comprobatórios da modificação da realidade e cultura escolar em relação à utilização das TIC está descrita no capítulo 5. No capítulo 6 são apresentadas as considerações finais e perspectivas futuras resultantes do percurso investigatório e das reflexões e acompanhamentos realizados no decorrer da pesquisa (formação continuada e em serviço dos professores). CAPÍTULO 2 DISCURSO TEÓRICO 28 Investir na melhoria da escola pública é desejo da sociedade brasileira. Oferecer à população um ensino de qualidade, em que ocorra o pleno desenvolvimento da pessoa, sua preparação para o exercício da cidadania, qualificando-a para o trabalho, é direito legal previsto na Constituição Federal (CF) de 1988, no art. 205 do capítulo III, sobre Educação. A LDBEN 9394/96 reitera estes princípios nos art. 1º e 2º, apontando para a necessidade de promover mudanças no contexto educacional. No entanto, garantir aos alunos o cumprimento previsto nos preceitos legais citados acima requer a revisão da estrutura e organização da escola. Isto porque o ser humano deste novo século deve ter competências profissionais mais exigentes e à escola cabe oferecer-lhe uma formação adequada a este novo contexto. Almeida (2000) alerta para a necessidade de a formação acadêmica considerar aspectos essenciais, dentre eles a preparação para a superação dos novos desafios da humanidade, dos paradoxos do progresso, das novas formas de trabalho, de organização social, das dificuldades com a manutenção do meio ambiente, das drogas e da constante necessidade de adequação às mudanças, dentre as quais destacamos o uso das TIC. Por acreditar na importância dessas mudanças, a Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEE) vem investindo no uso das TIC nas escolas desde 19979, por meio da implantação do Programa Escola de Cara Nova. Isto ocorreu para ir ao encontro das idéias dos idealizadores do Programa de Informática e Educação (PROINFO10) os quais acreditaram que a utilização das TIC favorece a criação de novos ambientes de aprendizagem, catalisando mudanças nas escolas com um novo fazer pedagógico dos professores. 9 Os detalhes sobre estes investimentos serão descritos no tópico 2.2 deste capítulo. 10 PROINFO é um programa educacional federal criado em 9 de abril de 1997 pelo Ministério da Educação, por meio da portaria 522 que visa à introdução das TIC na escola pública, para serem utilizadas como ferramentas de apoio ao processo ensino-aprendizagem, bem como para promover o enriquecimento pedagógico no ensino público. Suas estratégias de implementação constam do documento Diretrizes do Programa Nacional de Informática na Educação, de julho de 1997. O Programa é desenvolvido pela Secretaria de Educação à Distância (SEED), por meio do Departamento de Infra-Estrutura Tecnológica (DITEC), em parceria com as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação. 29 Neste sentido, pesquisadores como Schlünzen (2002), Valente (2003), Prado (2004), Almeida (2005), entre outros, têm comprovado, em suas publicações, que as TIC podem ser usadas como ferramentas facilitadoras e potencializadoras para a melhoria do processo ensino-aprendizagem. Além disso, possibilita tornar o ambiente escolar colaborativo e significativo, abrindo a perspectiva para todos 11 os alunos construírem seu conhecimento. Ainda, complementando as idéias citadas acima, Schlünzen (2000) atenta para a necessidade de buscar mudanças no currículo, na estrutura escolar, entre outros aspectos, bem como no fazer pedagógico do professor. Neste processo, o gestor tem um papel fundamental, uma vez que ele é imprescindível na implementação de uma formação continuada e em serviço dos professores, na viabilização de recursos, melhorando os aspectos administrativos e pedagógicos do ambiente escolar. Assim, nesse capítulo, abordarei as idéias por meio das quais foi fundamentada esta pesquisa, ou seja, os temas pertinentes que forneceram subsídios teóricos e metodológicos, no sentido de provocar uma reflexão sobre a importância do gestor atuar na formação de professores para o uso das TIC, visando à melhoria do processo educacional de uma escola situada em um ambiente complexo com alto índice de desinteresse e indisciplina. Para tanto, o capítulo foi organizado em quatro eixos temáticos: as atribuições do gestor na atualidade; a transformação da realidade escolar; a implementação da utilização das TIC nas atividades escolares; um novo fazer pedagógico por meio dos projetos de trabalho, e o gestor no processo de formação dos professores para o uso dos meios digitais. 11 Esta terminologia vem sendo usada após a publicação da LDBEN 9394/96 por meio do qual estabeleceram-se, nos Art. 3 e 4 os princípios do acesso e permanência de todas os cidadãos na escola, bem como determinou o atendimento gratuito as pessoas com necessidades especiais na rede pública, demonstrando assim o caráter inclusivo da lei. 30 2.1 As Atribuições do Gestor na Atualidade De acordo com Hessel (2004), a escola é uma instituição social e por isto, dentro dela existe um jogo de forças (marcado pela competividade, individualismo, entre outros), muitas vezes implícito, mas determinante de seus rumos e objetivos. E a determinação destes rumos e objetivos é observada quando analisamos o processo de construção do Plano de Escola ou Plano de Gestão, previsto no artigo 12, inciso I da LDBEN 9394/96 (p.6) ao mencionar “Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de: I – elaborar e executar sua proposta pedagógica”. Em muitas escolas os atores12 discutem igualitariamente o trabalho a ser desenvolvido pela organização nos próximos dois anos, gerando um projeto posteriormente assumido coletivamente; em outras é atribuída à equipe gestora (geralmente o diretor, vice-diretor e professor-coordenador-pedagógico) a decisão solitária sobre assuntos de interesse da comunidade escolar. Para Alonso (2002, p. 29), essa definição deve ser conjunta, salientando que as escolas por meio das quais o trabalho coletivo é priorizado, conseguem resultados duradouros e positivos, com o desenvolvimento de uma cultura de participação e comprometimento. Ele afirma que isso “permite a modernização da gestão, tornando-a mais condizente com as necessidades reais e locais”, gerando assim o redimensionamento dos papéis dos atores escolares por meio de experiências vivenciadas por eles. Esta nova gestão viabiliza a construção de acordos coletivos (estabelecimento de metas, ações pedagógicas, entre outros), permitindo a organização do trabalho escolar. O gestor, em uma de suas atribuições, necessita garantir a efetivação e o respeito aos acordos. Esta função está implícita no art.14° da LDBEN 9394/96 ao determinar: Os sistemas de ensino definirão as normas de gestão democrática do ensino público na educação básica, de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: 12 Entendido atores escolares como os professores, alunos e funcionários da escola. 31 I- participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II- participação das comunidades escolar e local em conselhos ou equivalentes. (LDBEN, 1996, p. 7) Com base no artigo citado acima, a participação da comunidade escolar na elaboração do PPP da escola é imprescindível, e cabe aos gestores, articular as diferentes ações pedagógicas, administrativas e discentes, trabalhando com as lideranças das equipes, para estimular as interações entre os diversos segmentos. Somente assim auxiliará a escola na elaboração de um plano eficiente e cujas ações contemplem os interesses da coletividade. Para Alonso (2003, p. 104), "a liderança é um trabalho que requer sacrifícios e habilidades especiais, sobretudo a capacidade de comunicação interpessoal e de interpretação dos desejos e aspirações dos membros do grupo". Segundo a autora, o gestor deve ser um líder, incentivando a cooperação, trabalhando em benefício do grupo, pois partilhando a autoridade com seus colaboradores, aumentará sua influência, fortalecendo e ganhando legitimidade. Para Fullan e Hargreaves (2000): [...] liderança compartilhada não significa ceder aos reinos do poder e da falta de opção. Mas também não significa usar a colaboração para fazer vigorar somente visões pessoais. Como um líder entre líderes, ou o primeiro entre eles, o diretor deve se envolver na promoção do envolvimento e da aprendizagem em todas as partes da escola. O diretor é também um profissional interativo, aprendendo e liderando através da cooperação. (p.113) Assim, ao estimular o surgimento das lideranças, o gestor gerencia e coloca professores e alunos em primeiro plano, estando em contato permanente e contínuo com os mesmos; solidifica o coletivo, cooperando para a solução de problemas, buscando e promovendo a melhoria da aprendizagem dos alunos, articulando as esferas pedagógicas, administrativas e respeitando a cultura escolar. Segundo Alonso (2003, p.109), “ [...] a cultura da escola deve ser conhecida e compreendida pelo diretor antes de propor qualquer transformação”, e “[...]compreender a cultura de sua escola envolve observação de tudo o que 32 acontece nela, ouvindo as pessoas, caminhando pelos corredores, procurando conhecer o que pensam, o que sentem e o que valorizam”. Com esta atitude o gestor trará à tona o potencial de cada um dos atores escolares. As afirmações citadas anteriormente podem ser confirmadas com a minha própria experiência. Tal fato ocorreu no período no qual atuei como professora da rede pública estadual, entre os anos de 1992 a 2002, por meio do qual observei e vivenciei práticas e posicionamentos inadequados por parte dos gestores das seis (6) escolas nas quais lecionei, não incentivando as lideranças nem respeitando a cultura escolar, mostrando-se resistentes em relação às inovações tecnológicas e pedagógicas. Essas práticas tinham como conseqüência um trabalho desarticulado e desmotivado por parte da equipe escolar em relação às transformações da prática pedagógica e ao uso das TIC. Um dos aspectos apontados como responsáveis pela consolidação destas atitudes de resistência em relação aos trabalhos inovadores na escola por parte dos gestores, refere-se ao seu processo de formação inicial, os quais ocorrem nos cursos de Pedagogia com Licenciatura Plena com Habilitação em Administração Escolar. Historicamente, estes cursos foram estruturados pela Resolução nº 02/1969, do antigo Conselho Federal de Educação (atualmente substituído pelo Conselho Nacional de Educação), regulamentando a Lei Federal nº 5.540/1968. Atualmente a LDBEN 9394/96 estabelece: A formação de profissionais para a administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica, será feita em curso de graduação em pedagogia ou em nível de pós-graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum nacional. (p. 25) Infelizmente é nestas exigências que ocorre a formação do gestor, realizando-se uma preparação generalizada em que não são contempladas as questões norteadoras do cotidiano escolar, não levando os profissionais responsáveis por cargos de liderança a 33 questionarem-se sobre aspectos fundamentais, como o repensar do ato de educar e das práticas administrativas vigentes. Santos (2002, p.3) afirma que os cursos de formação inicial deveriam possibilitar a preparação do gestor para “olhar para o futuro e perceber as tendências de mudança, aprender a investigar, analisar e interpretar os novos desafios, enfrentando o novo, o desconhecido, com alguma margem de segurança”. De acordo com o autor, o correto seria uma formação a qual considerasse questões decorrentes da atualidade, tais como os desafios enfrentados pelos sistemas educacionais, que exigem revisões constantes na elaboração dos objetivos, na construção da prática pedagógica e as mudanças provenientes das transformações econômicas, culturais e históricas da sociedade contemporânea. Em relação ao ingresso do gestor em seu cargo de atuação, constatei que a Lei Complementar nº 444/85 ao dispor sobre o Estatuto do Magistério Paulista no Estado de São Paulo, determina no art. 13 que "o provimento dos cargos da série de classes de docentes e das classes de especialistas de educação da carreira do Magistério far-se-á por meio de concurso público de provas e títulos (p. 94)". O último concurso público realizado pela SEE, em 2001, para provimento do cargo de diretor de escola, com o qual ingressei, teve como requisitos a habilitação em Pedagogia, oito (8) anos de experiência docente ou ter atuado por cinco (5) anos na função de especialista (supervisor de ensino, diretor substituto, vice-diretor ou professor-coordenador- pedagógico). Cabe ressaltar que após ingressar como diretora, tive dificuldades no cumprimento das funções envolvendo tanto aspectos administrativos como pedagógicos, relacionados a: como lidar com a indisciplina dos alunos; vandalismo em relação ao prédio; falta de recursos financeiros para prover melhorias no ambiente; carência de funcionários; rotatividade docente; excesso de procedimentos diários de secretaria, entre outros. Após realizar uma auto-análise conclui estarem estas limitações vinculadas ao meu despreparo no 34 processo de formação inicial, confirmando as afirmações relacionadas para a formação deste profissional. Aliadas ao problema de capacitação, as dificuldades devem-se às várias atribuições concomitantes do cargo. Libâneo (2001) define as principais atribuições do gestor declarando que o mesmo deve: 1.Supervisionar e responder por todas as atividades administrativas e pedagógicas da escola bem como as atividades com os pais e a comunidade e com outras instâncias da sociedade civil. 2. Assegurar as condições e meios de manutenção de um ambiente de trabalho favorável e de condições materiais necessárias à consecução dos objetivos da escola, incluindo a responsabilidade pelo patrimônio e sua adequada utilização. 3. Promover a integração e a articulação entre a escola e a comunidade próxima, com o apoio e iniciativa do Conselho de Escola, mediante atividades de cunho pedagógico, científico, social, esportivo e cultural. 4. Organizar e coordenar as atividades de planejamento e do projeto pedagógico-curricular, juntamente com a coordenação-pedagógica, bem como fazer o acompanhamento, avaliação e controle de sua execução. 5. Buscar todos os meios e condições que favoreçam a atividade profissional dos pedagogos especialistas, dos professores, dos funcionários, visando à boa qualidade do ensino. 6. Supervisionar e responsabilizar-se pela organização financeira e controle das despesas da escola, em comum acordo com o Conselho de Escola, pedagogos especialistas e professores. (p. 181 e 182) Complementando essas idéias, Santos (2002, p. 21) estabelece as competências dos gestores, os quais devem ser capazes de articular três dimensões que "compõem a organização escolar: a pedagógico-didática, a funcional e dos espaços e a administrativa financeira”. Além disso, o autor Neves (1997), aponta para a necessidade da gestão escolar buscar o equilíbrio entre três eixos: O eixo administrativo, que refere-se à organização da escola como um todo e nele destacam-se o estilo de gestão e a figura do diretor como agente promotor de um processo que envolve um outro padrão de relacionamento não só interno, mas também com a comunidade educacional na qual a escola está inserida. O eixo pedagógico, que está estreitamente ligado à identidade da escola, à sua missão social, á clientela, aos resultados e, portanto, ao projeto político pedagógico em sua essência. 35 O eixo financeiro, que trata da gestão dos recursos patrimoniais, da aplicação das transferências feitas pelo sistema educacional, da possibilidade de dispor de orçamento próprio e da capacidade de negociar e atrair parcerias e recursos externos que permitam fazer face às demandas concretas do processo educativo. (NEVES, 1997, p. 102-107) O autor alerta para o pressuposto de que a supervalorização de um dos eixos pode acarretar a degradação dos outros, com prejuízo para o trabalho educativo integral, o que pode ser evitado pela atuação de um gestor que estimula as lideranças. Para Hessel (2004), o gestor deve ter como meta estimular as lideranças, gerenciando e articulando ações estratégicas para criar novos canais de comunicação capazes de provocar mudanças profundas na escola. De acordo com as minhas experiências como docente e gestora, concluo que cabe ao dirigente abrir espaço para os atores escolares exercitarem suas habilidades, adquirindo autonomia ao desempenhar papéis, sem estimular uma prática “formatada e linear13”. Libâneo (2001) ainda apresenta características imprescindíveis ao gestor durante o cumprimento de suas funções, destacando a capacidade incentivar o trabalho em equipe, de gerenciar ambientes cada vez mais complexos, criar novos significados para implementar um ambiente inclusivo e ter visão de longo prazo. Comenta a habilidade de comunicação, o comprometimento com a emancipação e autonomia intelectual dos atores escolares, a visão pluralística das situações, a conscientização das oportunidades e manejo de tecnologias emergentes. Com o compromisso de modificar as deficiências no processo de formação dos gestores e dar ao profissional uma possibilidade de adquirir estas competências e habilidades, a SEE vem investindo em novas capacitações. Uma de suas ações diz respeito à compreensão das potencialidades das TIC, levando os gestores a refletirem sobre seus inúmeros benefícios, por meio de capacitações presenciais e à distância nos Núcleos Regionais de Tecnologia 13 Considero uma prática “formatada” e linear aquela em que o profissional realiza seu trabalho sem reflexão, simplesmente cumprindo o programa curricular. 36 Educacional (NRTE) localizado nas Diretorias Regional de Ensino14. Isto porque muitos gestores encontram dificuldades para implementá-las, tais como a falta de “segurança” em seu uso e carência de recursos financeiros para mantê-las em perfeito funcionamento. Esse tipo de formação é importante, porque de acordo com as idéias de Hessel (2004) as tecnologias auxiliam os gestores a: [..]dar suporte para a comunicação entre os elementos da escola, pais, comunidade e outros organismos. Pode ajudar na realização de atividades colaborativas que se propõem a enfrentar problemas locais ou desenvolver projetos inovadores para ampliar e modernizar a gestão administrativa e pedagógica na escola. (p. 06) Para a autora, a incorporação das TIC às práticas cotidianas fortalece o trabalho de gestão e o pedagógico, pois cria um sistema de informação eficiente, além de promover o trabalho cooperativo; estimula a equipe escolar a compartilhar informações; estabelecer contatos de todas as espécies; além de ativar uma rede comunicativa facilitando a interação e a construção de uma cultura coletiva dentro da escola; possibilitando facilidades para que o gestor consiga ter a atuação de acordo com as funções e características mencionadas anteriormente. Neste contexto, o papel do gestor é o de incentivar e viabilizar transformações na realidade escolar, pela revisão e análise dos posicionamentos e atitudes das diferentes equipes, possibilitando assim a construção de uma escola de qualidade para todos. Para possibilitar um melhor entendimento destas mudanças, refletirei, no próximo tópico, sobre a transformação da realidade escolar, destacando a revisão da prática pedagógica, bem como articulando o processo de modificação da cultura escolar ao estímulo oferecido pelo gestor. Segundo Alonso (2000, p. 110), o gestor deve incentivar o surgimento do potencial de cada membro da equipe escolar, para transformar "a escola num local de trabalho cooperativo e formativo". 14 Um dos cursos oferecido aos Gestores Escolares (diretor, vice-diretor e coordenador-pedagógico) foi promovido pelo Estado de São Paulo, entre os meses de agosto a dezembro de 2004. A metodologia do curso foi concebida pela equipe da 37 2.2 As Transformações na Realidade Escolar Ao se tocar neste tema, faz-se necessário conceituar o que significa a palavra transformar. No dicionário Aurélio (2001, p. 681) ela é definida como: “1. Dar nova forma, feição ou caráter a; mudar, modificar, transfigurar. 2. Converter”. Almeida (2004, p. 06) conceitua a palavra transformação “como qualquer alteração de meios e circunstâncias”. No entanto, quando pensamos na realidade escolar, é necessário relacionar as transformações a aspectos específicos. Aliado a este fato, Almeida (2004) interliga as mudanças ao incentivo oferecido por seus dirigentes, cujo resultado é o surgimento da participação, da autoconfiança, da criatividade, da argumentação, da solidariedade, do desenvolvimento de trabalho em grupo, bem como a consolidação da responsabilidade individual e a formação de valores individuais e coletivos. Novais (2004), afirma: Para produzir mudanças em uma organização social como a escola é preciso bem mais do que conseguir mudar a ação individual. Essencialmente trata-se de mudar as formas de integração social, o que só poderá ocorrer se a mudança tiver sentido coletivo. (p. 04) Segundo esta estudiosa, no ambiente escolar, a transformação vai além de uma mudança física. Ela deve ocorrer desde as atitudes, trabalho pedagógico e estrutura física. Neste sentido posso concluir que o uso das TIC pode promover mudanças, viabilizando a transformação da realidade escolar. O uso das tecnologias está previsto pela LDBEN 9394/96 que estabelece nos art. 32 e 36 a necessidade de incluir conhecimentos tecnológicos como ferramenta de aprendizagem, possibilitando a construção de novos conhecimentos pelos alunos. Esta exigência vem ao encontro dos paradigmas educacionais vigentes, entre eles: a busca pela qualidade do ensino, a utilização de novas estratégias de trabalho docente, a utilização das TIC, entre outros, norteando e direcionando a sociedade atual. Para Valente (1999), estes novos paradigmas provocam transformações profundas em diversos segmentos, PUC-SP numa parceria com a SEE, Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE) e Microsoft, objetivando a formação de gestores da rede estadual de ensino para implementar a utilização das TIC na realidade escolar. 38 entre eles os sociais, econômicos, culturais e humanos, modificando a maneira de aprender, de pensar e de conceber o conhecimento dos seres humanos. Ao longo destes anos em que atuei como professora e gestora, por experiência própria, reconheço que, quando pensamos em educação, os processos inovadores em relação a prática docente, em especial para o uso das TIC, os quais são capazes de provocar mudanças na realidade escolar, demoram a ser incorporados. Sobre este aspecto, Valente (1999) alerta que do ponto de vista pedagógico as alterações que acarretam transformação no contexto institucional são praticamente inexistentes. Silva (2003, p. 101) acrescenta que “As escolas não podem mudar sem o empenho dos professores e estes, por sua vez, não mudam sem uma transformação das instituições em que trabalham”. Ainda Valente (2002) salienta que as propostas educacionais não estão acompanhando as inovações tecnológicas, mantendo-se fiel à concepção da transmissão de informação, com estrutura de disciplinas e apresentação de conteúdos estanques aos alunos. Segundo o pesquisador, as TIC não são vistas pelos atores escolares como recursos para ampliar o acesso à informação ou favorecer a criação de ambientes colaborativos de aprendizagem. Preocupada com este quadro, a SEE tem investido no aprimoramento da área pedagógica desde 1997 e iniciou-o distribuindo Kits tecnológicos às escolas, principalmente as de Ensino Fundamental (5ª a 8ª séries) e Médio. Estes Kits eram compostos por televisão, vídeo cassete, rádio gravador, máquina fotográfica, softwares educativos, computadores e impressora para implementar os laboratórios de informática. No entanto, incorporar as inovações ao projeto pedagógico da escola é um grande desafio capaz de provocar mecanismos viabilizadores da construção de uma escola de qualidade para todos. Segundo Almeida (2003), a incorporação das TIC pressupõe a necessidade de um processo de formação que subsidie os atores escolares (em especial os 39 professores) para usar as tecnologias de maneira a possibilitar a modificação das práticas vigentes, tanto nas dimensões pedagógicas, quanto nas administrativas. De acordo com as idéias de Barreto (2002), antes de lançar-se em um processo de apropriação tecnológica, a equipe escolar deve estar atenta a alguns fatores: A inovação tecnológica é um conjunto de conhecimentos, com um elevado teor de novidade, relacionado a estes conhecimentos. (...) A toda tecnologia se associa uma considerável quantidade de informação. Esta informação, quando assimilada pelo indivíduo, grupo ou sociedade, gera um conhecimento que permite a adoção ou a rejeição de uma determinada técnica. (...) A adoção de uma tecnologia requer, portanto, a absorção de determinado conhecimento e uma decisão de iniciar, modificar ou aperfeiçoar um produto ou serviço, seu processo de produção ou de comercialização. Quando se estabelece esta cumplicidade de intenções, um processo de absorção e um processo de decisão, podemos dizer que se efetivou uma inovação em determinada realidade. (p. 03) O autor alerta ser preciso ir além do que somente equipar as escolas com os recursos tecnológicos. É preciso realmente dar sentido à incorporação das TIC à prática pedagógica e administrativa. Ou seja, os atores escolares, em especial os professores, precisam descobrir como usar os recursos tecnológicos disponíveis para possibilitarem uma melhor aprendizagem dos alunos. A realidade que encontramos hoje é que existem escolas que mesmo com poucos recursos tecnológicos, conseguem desenvolver projetos e outras com melhores equipamentos não se lançam em experiência de usá-los. Tal fato demonstra que a mudança não está na implantação das tecnologias e sim no uso que fazemos dela enquanto ferramenta de aprendizagem para os alunos. Assim, é necessário entender melhor sobre as facilidades e a utilização das TIC nas atividades escolares, assunto esse que será tratado no próximo tópico. 2.3 A Implementação da Utilização das TIC nas Atividades Escolares O uso das TIC no contexto escolar requer a formação, o envolvimento e o compromisso dos atores escolares, no sentido de refletir sobre o processo de ensino e 40 aprendizagem vigente nas escolas. Segundo Almeida (2004), os atores escolares têm papéis distintos e, portanto, o uso da tecnologia deve atender às especificidades da área de atuação de cada segmento, de tal maneira que suas ações possam ser articuladas ao desenvolvimento de uma cidadania participativa e crítica, tornando-os aptos a apropriarem-se das inovações tecnológicas no contexto escolar, em seu trabalho, para buscar informações e para construir conhecimentos. Por um lado, não podemos atribuir às TIC a função de catalisadora de uma mudança pela simples adoção de métodos e estratégias de ensino ou de gestão: é preciso que as mesmas propiciem a criação de redes de conhecimentos. De acordo com as idéias de Almeida (2005), as inovações tecnológicas devem contribuir para a construção de comunidades colaborativas de aprendizagem. Entretanto, as TIC somente poderão ser utilizadas com este fim, se a equipe escolar souber quais são as suas reais contribuições. A partir desta constatação surge um dos grandes desafios do gestor: levar os membros da equipe escolar, em especial os docentes, a um processo de desequilíbrio, por meio da reflexão, para usar as TIC em prol da melhoria da qualidade do ensino. Assim, no caso do professor, poderá oferecer ao aluno condições para desenvolver habilidades e competências, possibilitando a transformação das informações em conhecimentos em um ambiente construcionista. Esta atitude contempla o que Dewey (1979) considerava como aquisição do conhecimento o qual, segundo suas idéias, decorre da reconstrução da atividade humana e do estado de desequilíbrio, a partir de um processo de reflexão sobre a experiência, progressivamente repensada ou reconstruída. Sobre o aspecto citado acima, Schlünzen (2000) interliga-o à formação do professor, salientando que este profissional deve estar preparado para viabilizar a construção de um ambiente Construcionista, de maneira que o aluno usufrua de seus benefícios. Neste sentido, é necessário que o educador compreenda bem a base teórica que Papert (1986) 41 utilizou para construir essa abordagem. Este pesquisador articulou conceitos da inteligência artificial com a teoria piagetiana, propondo inicialmente que o aluno usasse o computador a partir de uma linguagem de programação denominada Logo15. Esta linguagem possibilitaria a ele resolver problemas e permitiria que explicitasse o seu pensamento. Cabe ainda ressaltar que a utilização de computadores, de acordo com os princípios construcionistas, proposta por Papert (1985), contempla as teorias de diversos pensadores contemporâneos. Os principais são Piaget (1977), Vygotsky (1978) e Freire (1979). Almeida (2000, p. 49) reafirma que as idéias oferecidas por estes pesquisadores “não se contrapõem, mas se inter-relacionam, em um diálogo que as incorpora a um processo de descrição-execução-reflexão-depuração”, ciclo definido por Valente (1993). A Figura 1 ilustra como as teorias destes pesquisadores estão presentes na Abordagem Construcionista definida por Papert (1994). Figura 1: Uso das TIC segundo a abordagem construcionista. Adaptado do Ciclo de Valente (1999, p 101) 15 O LOGO foi desenvolvido no MIT, o Instituto de Massachussetes, por Seymour Papert, na década de 1960. Segundo Valente (1998), a linguagem de programação LOGO apresenta as seguintes características do ponto de vista computacional: exploração de atividades espaciais, fácil terminologia e capacidade de criar novos termos ou procedimentos. 42 Nessa abordagem, Papert (1994) considerou a importância do sujeito aprender a fazer construindo conhecimento de seu interesse e para o qual esteja motivado, interagindo com a ferramenta de aprendizagem, que no caso é o computador. Ao realizar estas afirmações, o estudioso considerou os princípios da teoria de Piaget (1977), entre eles que o conhecimento é constituído progressivamente, por meio de ações e coordenações de ações, que são interiorizadas e se transformam continuamente, pelos indivíduos. Assim, neste processo, ao construir novos conhecimentos, permitimos que os alunos elaborem suas próprias estruturas intelectuais. Papert (1985, p. 13) enfatiza o aspecto cognitivo da teoria piagetiana, afirmando que “a compreensão da aprendizagem deve referir- se à gênese do conhecimento”. Segundo Piaget (1977), é preciso levar o sujeito a refletir sobre suas ações quando interage com os objetos do ambiente de atuação, e para isto ocorrer é preciso a viabilização de situações desafiadoras as quais favoreçam o desenvolvimento das habilidades necessárias para a aprendizagem. As idéias do estudioso levam-nos à conclusão de que a reflexão empírica realizada pelo aluno sobre seus objetos de aprendizagem, levantando hipóteses, experimentando, podem ser enriquecidas pela utilização das TIC, permitindo assim a construção de novos conhecimentos. A principal contribuição da teoria de Piaget (1977) às idéias de Papert (1994) está vinculada à construção do conhecimento pelo aluno a partir de sua inserção no ambiente informatizado, favorecendo a integração entre os conceitos aprendidos e sua estrutura mental. Para Papert (1994), a aprendizagem deve ter um caráter intervencionista quando empregada em ambientes computacionais, considerando as capacidades dos alunos, proporcionando o estabelecimento de relações entre as estruturas existentes, tendo como foco a construção de estruturas atuais e complexas de aprendizagem. 43 Segundo Valente (1993), a diferença entre o construtivismo de Piaget (1977) em relação ao Construcionismo de Papert (1994) é a presença do computador. Neste processo, aa abordagem construcionista permite ao aprendiz construir conhecimento por meio do exercício de capacidades como: procurar e selecionar informações para descrevê-las segundo um raciocínio lógico e resolver problemas a partir de uma situação problema, possibilitando assim que o aluno aprenda de forma independente, refletindo sobre conceitos, criando novas situações de aprendizagem, trocando experiências por meio das práticas colaborativas, entre outros aspectos. Para Vygotsky (1978), um outro estudioso do processo de construção do conhecimento, a criança somente aprende quando atua dentro de limites estabelecidos por ela mesma, situados entre o seu desenvolvimento cognitivo e as possibilidades intelectuais. Segundo ele, existe uma Zona Proximal de Desenvolvimento (ZPD) que é caracterizada como a distância entre o nível de desenvolvimento atual da criança, determinado pela resolução do problema de forma independente, e o nível de desenvolvimento potencial determinado pela resolução de um problema com o auxílio de um adulto ou a ajuda dos colegas. De acordo com as idéias de Vygotsky (1978), é preciso a identificação, por parte do educador, da ZDP do aluno para uma melhor compreensão do potencial de suas produções. Segundo suas idéias, “O que a criança é capaz de fazer hoje em cooperação, será capaz de fazer sozinha amanhã. Portanto o aprendizado deve ser orientado para o futuro, e não para o passado” (Vygotsky, 1989, p. 89). A abordagem construcionista de Papert (1994) utilizou-se da teoria de Vygotsky (1978) no que diz respeito ao papel das interações estabelecidas entre o aluno e o computador, mediada pelo professor e por suas relações com os colegas, ressaltando a importância da comunicação na aprendizagem dos alunos. Isto pelo fato de a linguagem oral ter uma função essencial e fundamental nas interações estabelecidas entre aluno-aluno, aluno-professor e 44 aluno-computador, no ambiente informatizado. Almeida (2000, p. 71) ressalta esta idéia afirmando que “para promover a aprendizagem em ambientes computacionais, segundo o enfoque construcionista de Papert, além de trabalhar com os conhecimentos significativos, o educador deve identificar a ZDP de cada aluno”. No trabalho em ambiente computacional, abre-se a possibilidade dos discentes expressarem seus conhecimentos da maneira como está interiorizado, permitindo a comunicação de seus pensamentos às outras pessoas. Este inter-relacionamento possibilita um melhor desenvolvimento nos processos mentais superiores, favorecendo o emprego das etapas do ciclo descrição-execução-reflexão-depuração, acarretando o pensamento reflexivo e a depuração das idéias. Em relação às idéias de Freire (1970), Papert (1994) apropriou-se dos aspectos referentes à construção da autonomia pelas pessoas, enfatizando a influência do social no aprimoramento do conhecimento. Para Freire (1970), o aluno pode aprender com a comunidade, bem como auxiliá-la a identificar seus problemas, propondo e apresentando soluções, visto que está inserido neste contexto social e não isolado no mundo. Segundo Valente (1993, p. 37), “este contexto social pode ser utilizado como fonte de suporte intelectual e afetivo ou mesmo de problemas contextuais para serem resolvidos”. Papert (1994) ainda recupera, da teoria de Freire (1970), a crítica à educação bancária quando este último estudioso reitera a necessidade do aluno ser sujeito de seu próprio processo de aprendizagem, por meio da experiência direta. De acordo com Papert (1985, p. 187), neste momento o aprendiz deixará de ser consumidor de informações para atuar como criador de conhecimento, desenvolvendo sua “alfabetização com o uso de ferramentas computacionais”, de acordo de seu próprio estilo de aprendizagem. Para Papert (1994), “a verdadeira alfabetização computacional não é apenas saber como usar o computador e as idéias computacionais. É saber quando é apropriado fazê-lo”. 45 Assim, das contribuições dos três estudiosos destacados acima, Papert (1986, p. 33) definiu o Construcionismo como a “construção do conhecimento que acontece quando o aluno constrói um objeto de seu interesse, como uma obra de arte, um relato de experiência ou um programa de computador”. De acordo com suas concepções existem dois pressupostos envolvendo o processo de aprendizagem: o primeiro refere-se a aprender “pelo fazer” e a outro diz respeito ao “interesse e motivação dos alunos” durante a construção de novos conhecimentos. Desta maneira, para motivar os alunos em suas aprendizagens, o professor pode sustentar seu trabalho pela criação de um ambiente Construcionista, Contextualizado e Significativo (CCS). Concomitantemente, ele favorecerá o despertar dos interesses dos discentes, motivando-os a explorar, pesquisar, descrever, refletir e depurar suas idéias. Segundo Schlünzen (2002), esta nova forma de ensinar e aprender possibilita a criação do ambiente CCS que permite o surgimento de problemas a partir do movimento na sala de aula, em que alunos e professores, com o auxílio do computador, desenvolvem um projeto, considerando a vivência e o contexto social dos alunos. Ao desenvolver este projeto, os alunos se deparam com os conteúdos curriculares e o professor assume o papel de mediador, agindo na sistematização e formalização dos conceitos. Logo, as informações significativas para o aluno serão transformadas em conhecimento, por meio da construção e reconstrução. Além disso, a referida pesquisadora acrescenta que o aluno pode relacionar suas aprendizagens com as experiências prévias e as habilidades individuais, criando um ambiente cooperativo por meio do qual as particularidades de cada um são valorizadas e compartilhadas. Valente (1993, p.33) afirma que “quando o aprendiz está interagindo com o computador ele está manipulando conceitos e isso contribui para seu desenvolvimento mental. Ele estará adquirindo conceitos da mesma maneira que adquire quando interage com objetos 46 do mundo, como observou Piaget”. Valente (2003) destaca ainda que a abordagem construcionista possibilita aos alunos vivenciarem uma espiral de aprendizagem quando utiliza as TIC. Esta espiral constitui-se em: descrição – execução – reflexão – depuração – descrição, demonstrada na Figura 2. Figura 2: Ciclo e Espiral da Aprendizagem. Adaptado de Valente (1993, 1999). Ao vivenciar a espiral da aprendizagem o aluno pode construir conhecimentos significativos e contextualizados. Pois, no ciclo ele descreve sua estrutura de conhecimento: os conceitos envolvidos no problema, as estratégias de aplicação dos conceitos, entre outros, para tentar solucioná-lo. Na próxima etapa, por meio do computador, que executa os comandos dados pelo aluno, ou seja, o problema é resolvido, oferecendo a resposta e podendo ser considerado um feedback. O resultado obtido é fruto do que o aluno idealizou por meio do equipamento utilizado. Em seguida, ele pode refletir e comparar com os resultado previstos e esperado, o que lhe permite realizar diversos níveis de abstração, podendo provocar alterações em sua estrutura mental, o que o levará a repensar sobre suas próprias idéias. Caso o resultado 47 obtido não seja o esperado, ele deverá depurá-lo, levantando as falhas e corrigindo-as, realizando assim uma nova descrição, completando a espiral. Por meio da vivência da espiral citada acima é possível ao aluno descrever suas idéias e, ao mesmo tempo, observar e refletir sobre suas respostas, identificando mecanismos de correção. Sobre este aspecto, Schlünzen (2002) afirma que o aluno aprende formalizando, explicitando, testando e construindo seu conhecimento, possibilitando que reflita e possa propor ações capazes de melhorar seu contexto social e escolar. Para Almeida (2004), além dos benefícios relacionados à aprendizagem dos alunos, as TIC podem servir de suporte para a comunicação entre os professores, pais, gestores, funcionários, membros da comunidade; criar experiências que subsidiem decisões para os diferentes segmentos; promover a realização de atividades colaborativas; incentivar as lideranças entre os atores escolares, cujo produto final permita o enfrentamento dos problemas da realidade e o desenvolvimento de projetos inovadores relacionados com a gestão administrativa e pedagógica. Em relação aos amplos benefícios das TIC, Massetto (2003) afirma: São elas que permitem o acompanhamento das diversas atividades da escola: Projeto pedagógico, formação contínua de professores e funcionários, reuniões com professores, alunos, pais de alunos, processos e solicitações da delegacia ou Secretaria da Educação com as respectivas respostas, banco de experiências e projetos inovadores desta e de outras escolas ou de novidades no ensino das disciplinas, registro dos dados do processo de avaliação dos alunos (não só das notas e freqüências, embora esses dados também sejam importantes), organização de toda a correspondência da direção, documentação, do plano econômico-financeiro da escola e o acompanhamento de sua realização (p.77). Após analisar os aspectos apresentados neste tópico, é possível constatar que a implementação do uso das TIC permite criar um ambiente CCS na escola. E tal fato pode trazer benefícios à realidade institucional, possibilitando a viabilização de projetos e ações pedagógicas e administrativas realmente inovadores, trazendo benefícios aos diferentes segmentos que compõem a equipe escolar. 48 No próximo tópico deter-me-ei na reflexão sobre o fazer pedagógico, por meio da implementação de projetos de trabalho, por acreditar que o fortalecimento da prática docente, acompanhada e incentivada pelo gestor, é essencial para provocar uma mudança real no paradigma atual de educação, transformando assim a realidade escolar. 2.4 Projetos de Trabalho: Um Novo Fazer Pedagógico Não podemos conceber uma educação inovadora sem rever seus procedimentos metodológicos. A LDBEN 9394/96 aponta, em diversos momentos, para a construção do projeto político-pedagógico da escola, destacando a necessidade de investir em melhorias no processo ensino e aprendizagem. Isto porque os pressupostos que sustentavam uma educação onde somente a instrução (tradicional)16 é valorizada, não atendem às necessidades emergentes das novas demandas exigidas pela sociedade da informação. Analisando os pressupostos citados acima, podemos perceber sua interligação aos projetos de trabalho, já que estes têm justamente a função de possibilitar mudanças substanciais na maneira de ensinar e aprender e de alunos e professores. Atualmente, reconhecendo a importância da viabilização dos projetos de trabalho, a SEE tem incentivado os professores a implementá-los, sugerindo o desenvolvimento de projetos interdisciplinares com temas relevantes ao longo do ano letivo17, oferecendo inclusive orientações pedagógicas aos docentes, por meio de capacitações ministradas pelos assistentes-técnicos-pedagógicos (ATP) responsáveis pelas oficinas pedagógicas das diretorias de ensino. Pesquisas como a de Schlünzen (2000) comprovam que por meio dos projetos de trabalho é possível articular os conceitos trabalhados e aprendidos com os disciplinares. 16 Libâneo (2001) esclarece que a instrução está associada à mera transmissão de informações aos alunos. 49 Almeida (2004) defende esta nova forma de atuar, afirmando que o trabalho com projetos permite aos alunos e professores analisar os problemas sociais e existenciais, contribuindo para sua solução por meio da prática concreta de transformação da realidade. Almeida (2003) salienta ainda que, nos projetos de trabalho, o foco da educação é a construção social, emocional e afetiva do aluno, e que os caminhos os quais ele percorrerá devem levá-lo a uma reconstrução cognitiva. Com o professor mediando os alunos em suas descobertas, estes podem tornar-se sujeitos ativos no processo de ensino e aprendizagem. Para Valente (2003): No desenvolvimento do projeto o professor pode trabalhar com os alunos diferentes tipos de conhecimentos que estão imbricados e representados em termos de três construções: procedimentos e estratégias de resolução de problemas, conceitos disciplinares e estratégias e conceitos sobre aprender. (p. 04). E ao explorar diferentes competências e habilidades no desenvolvimento dos projetos, os professores possibilitam aos alunos construírem conhecimentos concretos e significativos, capazes de modificar o seu entorno. Para Machado (2000, p. 6), “[...] o projeto não é uma simples representação do futuro, do amanhã, do possível, de uma idéia; é o futuro a fazer, um amanhã a concretizar, um possível a transformar em real, uma idéia a transformar em acto”. Destaco que o trabalho com projetos não é recente. Historicamente rever a prática docente tem sido objeto de estudo de pesquisadores que buscam uma nova forma de ensinar para atender à demanda atual. Ressalto ainda os estudos de Montessori (1985), que contrária à concepção de ensino por meio da qual somente a instrução era valorizada, deu início a uma reflexão sobre os projetos. Porém, quem realmente sistematizou o método de projetos foi 17 Os temas sugeridos são “Prevenção também se ensina”, “Comunidade presente”, “Educação fiscal”, “Tá na roda”, “Combate à dengue”, “Projeto Água”, “Saúde Bucal”, “Educação e Cidadania”, “Agita Galera”, entre outros. 50 Dewey (1979). Segundo Almeida (2000), no Brasil, esta temática foi iniciada a partir das reflexões levantadas pelo movimento denominado Escola Nova18. Em relação às contribuições de Dewey (1979), suas idéias apontam que a aquisição do saber durante o desenvolvimento dos projetos é decorrente de uma reelaboração constante, por meio do qual as pessoas refletem sobre suas experiências, pensada e repensada continuamente. Ao valorizar as experiências anteriores dos alunos, o professor permite que as mesmas interfiram nas descobertas em desenvolvimento e influenciem nas vivências futuras. Se, por um lado, este novo conhecimento deve estabelecer conexão com as experiências do passado, pois sem isto não ocorrerá construção e nem a motivação dos alunos para uma aprendizagem prazerosa, por outro, a experiência humana é social e baseada em interações externas e internas. Assim compete ao professor preparar-se para identificar situações as quais possibilitem o desenvolvimento da aprendizagem dos alunos, conhecendo seus interesses, suas capacidades e limitações cognitivas, suas experiências educativas anteriores, para então propor ações as quais resultem em um trabalho cooperativo. Dewey (1979) já afirmava que compete à escola proporcionar aos alunos condições de desenvolvimento do autodomínio. No entanto, isto não significa que o aluno deve ser deixado desamparado. O autor propôs substituir o domínio externo por movimento, ação e julgamento. Sobre esta questão, Almeida (2000, p. 52) acrescenta “Liberdade é autodomínio”. Muitos pesquisadores têm se apoiado nas idéias de Dewey (1979), dedicando-se a investigar sobre a temática dos projetos, defendendo a necessidade de uma mudança na maneira de pensar e repensar a escola, a prática pedagógica, os tempos e espaços escolares, a forma de trabalhar os saberes institucionais, para assim ser possível uma modificação substancial em nossa maneira de aprender e ensinar. 18 O movimento da Escola Nova opunha-se às práticas pedagógicas tidas como tradicionais, visando a 51 Um destes estudiosos é Schlünzen (2000) a qual salienta que, quando trabalhamos com projetos, os alunos tornam-se sujeitos ativos do processo ensino e aprendizagem, sob a mediação pedagógica do professor. O docente, por sua vez, precisa ter intencionalidade pedagógica permitindo aos discentes compreenderem os caminhos percorridos durante seu processo de aprendizagem, seu universo cognitivo e afetivo, como a cultura e o contexto social no qual está inserido. Hernández (1998, p.49) lembra que “o trabalho com projetos deve provocar um repensar das funções da escola, desde a estrutura administrativa, a pedagógica, os objetivos escolares, entre outros aspectos, e não ser encarado apenas como uma opção metodológica”. Os pressupostos citados pelo autor apontam a necessidade dos atores escolares conhecerem os procedimentos e as técnicas inovadoras que norteiam o desenvolvimento de projetos significativos. E para isso são necessárias ações básicas, entre elas o planejamento e replanejamento por parte da equipe escolar. Sobre essas ações, Almeida (2000, p. 27) destaca que vão desde: “identificação do problema; levantamento de hipótese e soluções; mapeamento do aporte cientíifico necessário; seleção de parceiros; definição de um produto; documentação e registro; método de acompanhamento e avaliação; duração; divulgação”. Ao colocar em prática as ações planejadas no desenvolvimento dos projetos de trabalho, o professor deve ter abertura e flexibilidade para analisar seu trabalho e as estratégias pedagógicas utilizadas, avaliando globalmente e cotidianamente as produções cognitivas dos alunos, proporcionando ao final, a construção de novos conhecimentos por eles. No entanto, os docentes só conseguem ter êxito nessa nova caminhada se contarem com o apoio dos gestores e da equipe escolar. uma educação que pudesse integrar o indivíduo na sociedade, ampliando o acesso de todos à escola. 52 Em relação ao papel do gestor é fundamental que o mesmo viabilize condições estruturais, materiais e pedagógicas para a realização dos projetos, e se necessário prepare os docentes para atuar de maneira competente diante desta nova demanda. Isto pelo fato de que, durante o desenvolvimento dos projetos de trabalho, o professor necessita estar preparado para articular os conteúdos das diferentes disciplinas, realizando as parcerias cabíveis, numa atitude de cooperação e colaboração. Esta consolidação das práticas cooperativas e colaborativas é chamada, por Fazenda (1994), de ação interdisciplinar, a qual deve acontecer sem ocorrer a perda da identidade de cada disciplina, nem o abandono dos saberes historicamente acumulados. Ao contrário, deve integrá-los no desenvolvimento das investigações escolares em sala de aula, aprofundando-os verticalmente em sua própria identidade, estabelecendo articulações horizontais em uma relação de reciprocidade. Almeida (2002, p.58) ratifica as idéias de Fazenda (1994), comentando que “o projeto rompe com as fronteiras disciplinares, tornando-as permeáveis na ação de articular diferentes áreas de conhecimentos mobilizadas na investigação de problemáticas e situações da realidade”. Prado (2004, p.2) complementa estas idéias, chamando esta articulação de “integração”, afirmando ser esta prática capaz de gerar ações interdisciplinares contemplando o uso de diferentes tecnologias as quais podem extrapolar o tempo, o espaço da sala de aula e da escola. Em relação ao uso das TIC, quando os projetos de trabalho são usados para viabilizá-las na realidade escolar, o resultado é demasiadamente positivo e aceito por professores e alunos. A este respeito Schlünzen (2000) acrescenta que os projetos de trabalho, em especial quando as TIC são utilizadas, possibilitam aprendizagens interessantes, as quais surgem da necessidade e do cotidiano dos alunos, viabilizando a construção de conhecimentos 53 conceituais, atitudinais e procedimentais, vivenciados, formalizados e aprendidos de forma integralizada. Isto acarreta a criação de situações de aprendizagens desafiadoras, motivando a exploração, a pesquisa, a descrição, a reflexão e a depuração de idéias para a solução de problemas, gerando um ambiente favorável de aprendizagem. No entanto, para as TIC serem utilizadas como ferramentas potencializadoras da aprendizagem dos alunos, faz-se imprescindível a construção de um novo fazer pedagógico, que exige o envolvimento dos gestores e cujos benefícios estendem-se aos demais segmentos da escola. Dessa forma, analisarei, no próximo tópico, o papel do gestor no processo de formação dos professores para a utilização das TIC por meio dos projetos de trabalho. 2.5 O Gestor no Processo de Formação de Professores para o Uso dos Meios Digitais. A profissão docente requer do professor um repensar diário de sua prática pedagógica. Neste sentido, entendo que sua formação não pode se estática e passiva. Ao submeter-se ao processo de formação, o docente deve ter a oportunidade de “construção de conhecimentos profissionais adequados a sua evolução e ao sistema educacional ao qual pertence” (Perrenoud, 1997, p. 205). Além disso, esta nova prática oferece ao professor condições de adquirir habilidades, ampliando suas perspectivas, aprofundando seus conhecimentos e saberes. De acordo com Perrenoud (2001), a aquisição de novas capacidades permite ao professor: [..]assimilar condutas, rotinas circunstanciadas, isto é, nas circunstâncias e no momento em que elas são eficazes. Além disso, permite vivenciar seus resultados. Esse aprendizado na ação supõe um posicionamento por parte do professor, ele pode agir nas situações, modificá-las, experimentando novas condutas, mais do que sofrê-las (p. 93) O autor ainda relaciona a concretização das idéias apresentadas acima a determinadas atitudes, entre elas, a aceitação dos próprios erros por parte do docente. 54 Segundo suas idéias, os professores precisam participar ativamente do processo de aprendizagem, assumindo riscos, administrando as incertezas e verdades absolutas. Mas para superar as dificuldades que vierem a surgir, os docentes necessitam do apoio dos gestores. Assim, cabe aos gestores ajudar e incentivar os docentes a partilhar, questionar e avaliar sua prática pedagógica. Sobre este aspecto, Huberman (2000) acrescenta que essa atitude favorece a construção de redes de trabalho colaborativas, pelas trocas e discussões das experiências vividas, pela busca de soluções para os problemas enfrentados. As HTPC podem constituir-se o local ideal para a consolidação de tais reflexões. Todavia, a realidade que observamos hoje é que, infelizmente, os docentes encontram dificuldades para vivenciar esta nova demanda pela falta do diálogo aberto. Para Nóvoa (1995, 26) “o diálogo entre os professores é fundamental para consolidar saberes emergentes da prática profissional”. Essas dificuldades estão relacionadas ao próprio processo de formação dos professores, o qual dificulta a construção de redes colaborativas de trabalho. Isto pelo fato dos cursos de licenciatura nos quais os professores são formados atualmente, seja em universidades públicas ou particulares, geralmente apresentarem inúmeras lacunas. Para Valente (2003) o resultado da formação “deficiente” nos cursos de licenciatura tem provocado, por exemplo, o uso incorreto das TIC na realidade escolar, de maneira mecanizada, fragmentada, sem reflexão sobre a prática, por meio do qual o professor somente aprende a trabalhar com programas e softwares. De um lado, analisando o meu próprio curso de formação inicial concordo com as colocações de Almeida (2000) e Valente (2003), ressaltando que a má formação docente acarreta sérios problemas na realização do trabalho pedagógico e, conseqüentemente, na aprendizagem dos alunos. Por outro lado pouco contribui para a formação pessoal e profissional desses profissionais. 55 Estes fatos podem ser associados a uma formação ainda pautada na abordagem Instrucionista19, a qual não leva as pessoas a refletirem sobre temas relevantes, enfraquecendo a prática pedagógica, gerando um desânimo diante das dificuldades encontradas na realidade escolar, em especial, para a utilização das tecnologias. Em relação às falhas no processo de formação inicial, para o uso das TIC, Almeida (2000) reitera: Os professores treinados apenas para o uso de certos recursos computacionais são rapidamente ultrapassados por seus alunos, que têm condições de explorar o computador de forma mais crítica, e isso provoca diversas indagações quanto ao papel do professor e do educador. (p. 109) Uma alternativa viável para superar este quadro caótico em relação a formação inicial deficiente para a incorporação das inovações tecnológicas, parece ser o investimento no processo de formação continuada e em serviço dos professores. Segundo Almeida (2004) a formação continuada constitui-se em todo o aprimoramento do conhecimento e atitudes ao qual o professor é submetido após a conclusão de seu curso de formação inicial e deve ocorrer durante a vida profissional. Nesse processo, a reflexão, a autonomia, a pesquisa, a descoberta, o repensar de paradigmas e modelos já consolidados precisam ser vivenciados pelos docentes em seu local de trabalho, possibilitando assim uma formação baseada na ação e na reflexão sobre a ação, articulando teoria e prática de maneira contínua. Ribas (1998) acrescenta que a formação continuada deve apresentar as seguintes características: - ser um processo que se efetiva desde a formação inicial e se estende por toda a vida profissional do professor; - enfatizar de fato o desenvolvimento da competência pedagógica do professor; - propiciar espaços e modos de reflexão sobre a prática desenvolvida e as em andamento; 19 Papert (1994) define como “Instrucionista” a arte de ensinar por meio da instrução, da transmissão de informações para os alunos. 56 - ser um processo que possibilite a inclusão de inovações com a possibilidades de ida e volta a ação; - estar fundamentado no conhecimento histórico e socialmente construído, a partir do questionamento e da crítica do professor. (RIBAS, 1998, p. 67) Ainda, a formação continuada deve relacionar-se ao deslocamento do espaço restrito da ação em sala de aula, possibilitando ao professor perceber-se como sujeito articulador da sua aprendizagem. Complementando esta idéia, Silva (2003) acrescenta: A formação continuada tem como tarefa atenuar a defasagem entre o que os professores aprenderam durante sua formação inicial e o que foi acrescentado, a partir da evolução de saberes, das propostas, das novas pesquisas e de forma mais ampla, do que acontece no mundo da educação. (p.100) No decorrer de minha vivência como professora e hoje como gestora, reconheço que o educador precisa ser incentivado pelos gestores a formar-se continuamente e essa formação deve considerar as novas demandas educaciona