UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIA HUMANAS E SOCIAIS Giuseppe Cammilleri Falco ACERCA DA NORMATIVIZAÇÃO DOS CONCEITOS DE DOLO E CULPA SOB A ÓTICA DOS CRIMES DE INFRAÇÃO DE DEVER: Uma proposta de normatização dos elementos pessoais nos delitos de corrupção FRANCA 2022 UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUITA FILHO” FACULDADE DE CIÊNCIA HUMANAS E SOCIAIS Giuseppe Cammilleri Falco ACERCA DA NORMATIVIZAÇÃO DOS CONCEITOS DE DOLO E CULPA SOB A ÓTICA DOS CRIMES DE INFRAÇÃO DE DEVER: Uma proposta de normatização dos elementos pessoais nos delitos de corrupção Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Direito da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, para obtenção do título de Mestre em Direito. Área de concentração: Política Criminal e Cidadania. Linha de pesquisa: Cidadania Civil e Política e Sisitemas normativos. Orientador: Prof. Dr. Fernando Andrade Fernandes FRANCA 2022 GIUSEPPE CAMMILLERI FALCO ACERCA DA NORMATIVIZAÇÃO DOS CONCEITOS DE DOLO E CULPA SOB A ÓTICA DOS CRIMES DE INFRAÇÃO DE DEVER: Uma proposta de normatização dos elementos pessoais nos delitos de corrupção Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Direito da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, para obtenção do título de Mestre em Direito. Área de concentração: Política Criminal e Cidadania. Linha de pesquisa: Cidadania Civil e Política e Sisitemas normativos. Orientador: Prof. Dr. Fernando Andrade Fernandes BANCA EXAMINADORA Orientador Prof. Dr. Fernando Andrade Fernandes Universidade Estadual Paulista “Julio de Mesquita Filho” Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, campus de Franca 2º Examinador (a) 3º Examinador (a) Franca, ___janeiro de 20222 A Júlia Bernardes, o verdadeiro motivo deste trabalho. AGRADECIMENTOS As dissertações, teses e trabalhos de conclusão de concurso que passaram pelos anos de 2020 e 2021, certamente, estão marcados pela pandemia de COVID-19 que, mais intensamente, assolou o mundo nesse período. A pandemia, a despeito do irreparável prejuízo humano, nos ensinou que não existimos sozinhos. A grande dificuldade que se estabeleceu nos tempos de mais severo isolamento social foi, justamente, exigir de uma sociedade que tem por definição louvar o individualismo como sinônimo de liberdade um comportamento em prol do coletivo. Não por outro motivo, viu-se tantos conflitos. O isolamento social, a vacinação e o uso de máscaras foram, todos, um desafio, pois exigiram o pensamento em prol do outro. Afinal, não basta não contrair a doença é preciso, também, não transmitir. Particularmente, eu não detenho esperança de que a sociedade tenha absorvido esse pensamento e, agora, passe a desenvolver comportamentos em prol da coletividade. Pelo contrário, me parece que com a retomada da “normalidade”, voltaremos ao estágio de culto ao individualismo. Porém, nesse contexto, seria impensável não redigir, com a chance de esquecer algum nome, algum agradecimento, pois, em definitivo, esse trabalho não é fruto de uma só pessoa, mas de uma coletividade. Em primeiro lugar, agradeço a Júlia Bernardes que, além de minha amada companheira de vida, é verdadeiro motivo deste trabalho; o verdadeiro mote da minha vontade de crescer; aprender e, quem sabe, conseguir ser uma pessoa melhor. Depois, devo agradecer ao meu orientador Prof. Dr. Fernando Andrade Fernandes, a quem detenho profunda admiração e estima e, mais que isso, espero ter satisfeitos as expectativas do desafio que me fizera no início desta jornada. Ademais, neste tempo em que a ciência foi tão contestada e injustamente atacada, o Prof. Fernando persistiu e ainda persiste como um exemplo de pesquisador, professor e cientista, seja pelo rigor metodológico ou pelo constante empenho de responder e provocar questionamento em prol do desenvolvimento científico. Personifico meus agradecimentos a todos os funcionários da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da UNESP, campus de Franca/SP na pessoa do amigo Valter Nailton que, sem sombra de dúvida, mereceria posição de coator em todos os trabalhos deste Programa de Pós-Graduação tamanha a sua dedicação. Não só pelo trabalho que ora se apresenta, mas, em especial, pela conquista do programa de doutoramento desta instituição. Me cabe agradecer A Força Tarefa Revisional deste trabalho composta por Lucas Oliveira Faria, Luis Eduardo Simplício de Lima, Tiago Trindade, Júlia Bernardes, Neiton Geraldo Govea Junior, Gabriel Abboud e Natália Helena Campos Ledo, que me deram a honra e a paciência de ler esse escrito e apontar as falhas, a quem ficam, também meus agradecimentos. Sem essa força tarefa não estaria nem perto deste resultado. Agradeço, ainda, aos que me deram oportunidade para além dos muros da Universidade: Dr. César Augusto Moreira, que me ensinou, além de advogar, a ter fé; Dra. Flávia Ferreira Teles de Sales, cuja força é inspiradora; Dr. Alexandre Durante, que detém a virtude ativa da solidariedade; Inara da Silva Rezio, que colocou meus pés no chão para concretizar esse trabalho. Por fim, ao Dr. Fábio Cunha Loureiro, que me mostrou que as conquistas só veem com o tempo, disciplina e poesia. Ainda, agradeço ao Prof. Ms. Jean Alves que sempre me incentivou e foi um grande amigo com que pude dividir angustias, frustações e conquistas. Ao cabo, aos Prof. Dr. Alamiro Velludo Salvador Netto; Dr. Rodrigo Serafim e Dr. Guilherme Rodrigues da Silva, que cotidianamente são motivo de inspiração e que, mesmo depois de algum tempo, não se esqueceram de mim e me trouxeram para perto, onde gosto de estar. Certamente, esse agradecimento não comtempla a todos que contribuíram com esse trabalho, pois, como dito, dependemos de todos. Aos citados e aos que, mesmo não citados, se sentem parte deste trabalho meus sinceros agradecimentos. FALCO, Giuseppe Cammilleri. Acerca da normativização dos conceitos de dolo e culpa sob a ótica dos crimes de infração de dever: uma proposta de normatização dos elementos pessoais nos delitos de corrupção. Orientador: Prof. Dr. Fernando Andrade Fernandes. 2022. Dissertação (Mestrado em Direito) - Universidade Estadual Paulista (UNESP), Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, 2022. RESUMO A presente investiga tem por objetivo central a reflexão acerca da influência dos elementos pessoais nos crimes de infração de dever, com destaque as propostas de remodelação de dolo e culpa por meio de metodologia atributiva-normativa. A investigação é fruto do encontro de duas tendências das Ciências Jurídico Criminais, em primeiro lugar, de normatização das instituições do Direito Penal, que na investigação refere-se aos elementos pessoais do delito, e o segundo, envolvendo questões criminológicas e político-criminais, a preocupação na tutela e proteção de direitos difusos e coletivos, em especial, os envolvendo o ambiente econômico, o que motiva a abordagem do delito de corrupção. Frente às tendências no sentido da sua normatização e os reflexos decorrentes na compreensão a respeito dos crimes de infração de dever, objetivou-se responder em que medida deve o Direito Penal ser estruturado a partir de critérios subjetivos-descritivos, como os que sempre orientaram a análise a respeito particularmente do dolo. A pesquisa tem como referencial teórico as tendências penais funcionalistas (racional teleológica e sistémica). Nesse sentido, a hipótese de trabalho é que, ainda que sob a ótica normativa, há a necessidade de distinção dos elementos volitivos e cognitivos nos crimes de infração de dever. A investigação propõe que os elementos pessoais do delito, tradicionalmente abordados por uma metodologia psicológico-descritiva, passem a ser objeto de uma metodologia atributiva-normativa. Além disso, propõe-se uma alteração terminológica para tratar de dolo e culpa, que na presente investigação são chamados de “elementos pessoais”. Diante desta metodologia passa-se a analisar cada componente da formação de dolo e culpa, desde a consciência, a vontade, indiferença e fatores de evitação. Estabelecido o conteúdo normativo de dolo e culpa, projeta-se a análise ao âmbito da imputação dos crimes de infração de dever para que se possa melhor compreender como se dá a atribuição de tais elementos às condutas. Neste trecho, aborda-se a metodologia de imputação do delito por meio de infrações de deveres para chegar à abordagem dos elementos pessoais, bem como sua atribuição, nos crimes de corrupção. Palavras chave: dolo, culpa, infração de dever, corrupção. ABSTRACT The present investigation is about de the influence of personal elements at duty infration, with focus in a proposal of a remodle of deceit and guilty by an a atributive-normative metodology. The investigation is product of the encouter of two moviments in the criminal Science, the firt abou the standarization of the institucions of criminal law, the second envolve criminological worries about de social and coletive rights, in particular, thoose envolves economy and consumption, wich leads the investigation to approach corruption. The goal is to answer what the exactly mensure that criminal law supports be estrutured in subjetive elements. The teorical reference is the funcionalists trends in criminal science. The hypostesis is that, even if the criminal law tends to a standarization, it relevant to distinguish willing and conscience in the crimes that envolves infraction of duty. The search proposes a chance for a atributive-normative metodology in prejudice of the tradicional psicological-descritive metedology. Therefore the investigation analises each component of deceit and guilty since conscience until willing, indiference and fator of evitation. Estabilish the standards the search leads to understand theese personal elements in the scopo of imputation of crimes. At the end, the investigation show how theese elements should be operate in the imputation of crimes, in particular, corruption crimes. Key words: deceit, guilty, infraction of duty, corruption. SUMÁRIO. CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO...........................................................................................10 1.1. Referencial jurídico penal..........................................................................................10 1.2. Uma delimitação mínima de conduta para o Direito Penal....................................21 CAPÍTULO 2 - A CORRUPÇÃO COMO PROBLEMA MULTIDIMENSIONAL........30 2.1. A dimensão político criminal.....................................................................................30 2.2. A dimensão criminológica..........................................................................................36 2.3. A dimensão normativa................................................................................................41 CAPÍTULO 3 - OS ELEMENTOS PESSOAIS...................................................................44 3.1. As escolas penais e o elemento pessoal...........................................................................48 3.1.1. O positivismo................................................................................................................49 3.1.2. O neokantismo...............................................................................................................53 3.1.3. O finalismo....................................................................................................................57 3.1.4. As correntes funcionalistas............................................................................................60 3.2. A atual posição do elemento pessoal na Teoria do Delito........................................64 3.2.1. A representação do perigo como premissa de consciência...........................................67 3.2.2. A culpa..........................................................................................................................73 3.2.3. O dolo............................................................................................................................83 3.3. Acerca da relação entre os elementos pessoais e a imputação objetiva e sua importância para a responsabilização penal........................................................................97 CAPÍTULO 4 - OS CRIMES DE INFRAÇÃO DE DEVER............................................102 4.1. A funcionalidade sociológica do dever....................................................................102 4.2. A relevância jurídico penal do dever.......................................................................105 4.3. A imputação dos crimes de infração de dever positivo especial...........................116 4.3.1. A (in)diferença entre comissão e omissão nos delitos de infração de dever...............116 4.3.2. A (ir)relevância do dolo nos crimes de infração de dever positivo especial...............125 4.3.3. A imputação do crime de corrupção sob o fundamento da violação de dever positivo especial....................................................................................................................................139 5. NOTAS CONCLUSIVAS.........................................................................................144 6. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................147 10 CAPÍTULO 1 - INTRODUÇÃO A presente dissertação tem por objetivo refletir acerca da influência do elemento pessoal nos crimes de infração de dever, com o destaque para as propostas de remodelação do dolo. Para isso, usa-se como laboratório os delitos de corrupção, os quais, como se verá, são considerados como integrantes do conjunto dos crimes de infração de dever. Assim, o texto inicia-se por breve delimitação das várias dimensões do problema da corrupção. Nesse ponto, busca-se entender essa categoria de fato punível para além do aspecto dogmático, tratando da questão no âmbito da criminologia e da política criminal. Estabelecido o problema, o texto chega à seção dos conceitos de elemento pessoal (costumeiramente resumidos em dolo e culpa), para, ao final, analisar a influência do elemento pessoal nos crimes de infração de dever, quando se buscará expor também os limites teóricos deste conjunto de crimes. Tal estrutura textual privilegia o método lógico-dedutivo, escolhido para reger esta dissertação, visto que se inicia com conceitos amplos sobre elemento pessoal e crime de corrupção para, assim, projetar-se, de forma lógica, às reflexões que tocam a questão acerca do elemento pessoal e sua influência nos crimes de infração de dever. O texto, então, tem forma de funil, que se inicia do topo, mais amplo e aberto, para chegar – por meio de projeções lógicas – ao ponto específico de maior interesse, qual seja, a estrutura normativa dos elementos pessoais nos delitos de infração de dever. Isto dito, a relevância da presente dissertação surge essencialmente do encontro de dois movimentos do universo das Ciências Jurídico-Criminais. O primeiro, no plano amplo da Teoria do Delito, acerca da tendência de normatização das instituições1 do Direito Penal, o qual toca o entendimento usual acerca dos elementos pessoais do conceito de crime2, e o segundo, envolvendo questões criminológicas e político-criminais, a preocupação na tutela e proteção de direitos difusos e coletivos, em especial, os envolvendo o ambiente econômico. 1.1. Referencial jurídico penal 1A terminologia “instituições”, aqui, não tem vínculo com o significado corporativo do termo, mas sim com o sentido de instituição ser parte da estrutura de funcionamento da sociedade e, mais especificamente, no Direito Penal. Nesse sentido, Sílva Sanchez: “ Las instituciones surgen como consecuencia de la necesidad humana de alcanzar una cierta medida de esperabilidad de las conductas de los demás y pueden definirse como representaciones complejas sobre situaciones tipificadas, relaciones de acciones y procesos.” SANCHEZ, Jesús- María Silva. Instituciones y derecho. Indret Penal, [s. l.], 04 14. Disponível em: https://indret.com/instituciones- y-derecho-2/. Acesso em: 8 jun. 2020. 2“Más bien el elemento aglutinante viene dado por el planteamiento explícitamente normativo y por el rechazo de las construcciones y deducciones puramente conceptualistas, que no estén fundadas normativamente o lo estén en medida insuficiente.” SCHÜNEMANN, Bernd. El sistema moderno del derecho: cuestiones fundamentales. Tradução de Jesús-María Silva Sánchez. Espanha: Tecnos, 1991.p.77. 11 Os citados movimentos, fruto da alteração do modo de vida em sociedade, apontam para a melhoria da técnica jurídica, para melhor compreender novos casos que, com o desenvolvimento da sociedade, tornaram-se merecedores ou deixaram de merecer pena. Em outras palavras, alterando-se a sistemática social, faz-se necessário uma reavaliação do sistema jurídico para adequá-lo à nova realidade3. Tudo isso, pois, por vezes, há necessidade de ajustar a legislação ou sua interpretação à realidade concreta, uma vez que essas podem estar defasadas ou ainda, em função de tamanha juventude, não terem sido objeto de debate na doutrina ou nos tribunais4. Ademais, do ponto de vista prático, “ é para isso que serve uma boa teoria: para evitar que o julgamento acertado do caso dependa de sorte ou da intuição do juiz. ”5 O poder de punir, ou seja, a legitimidade de imposição de uma afetação física a direitos, segundo a Escola Clássica do Direito Penal, se fundamenta na necessidade de resguardar a convivência social6. Porém, o cumprimento deste objetivo demanda que esta afetação seja quantificada pela justa medida para a manutenção do estado de sociabilidade, sob pena de serem consideradas injustas7. 3Nesse sentido: “Si, además, se observa que el tempo y la orientación hacia el futuro son aspectos de la dimensión tiempo que afectan a todo el modo de vivir se verá claramente que también el sistema jurídico como un todo se enfrenta con problemas completamente nuevos, de un modo que no puede compararse con la antigua discusión acerca de si el derecho antiguo es mejor que el moderno o a la inversa”. LUHMANN, Niklas. Sistema jurídico y dogmática jurídica. Tradução Ignacio de Otto Pardo. Madrid, España: Centro de Estudios Constitucionales, 1983. p.22. 4 Nesse sentido, amparado em estudo histórico, encina Silva Sanchez: “Como demuestra un estudio histórico, por superficial que este sea, la dogmática de la teoría del delito ha tratado siempre (a) de reconstruir permanentemente sus instituciones para permitir que éstas abarquen nuevos casos que se van considerando merecedores y necesitados de pena; y (b) de hacer dicha reconstrucción compatible con la redacción de los textos legales, mediante un constante esfuerzo de interpretación teleológica. Así pues, la cuestión no es la expansión o no de una determinada institución, sino la razonabilidad o no de dicha expansión. O, lo que es lo mismo, que la normativización no comporte una desnaturalización que haga de la institución en cuestión algo irreconocible” SÁNCHEZ, Jesús María Silva. Teoría del delito y derecho penal económico. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 20, n. 99, p. 327-356., nov.dez. 2012. p. 332 5GRECO, Luís. A moderna teoria da imputação objetiva: fundamento prático. In: ROXIN, Claus. Funcionalismo e imputação objetiva no direito penal: Tradução de Luís Greco. 3. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. cap. IV, p. 89-104. p.97 6“Cada pena que não deriva da absoluta necessidade, disse o grande Montesquieu, é tirânica, proposição que se pode generalizar assim: cada ato de autoridade de homem para o homem que não deriva da absoluta necessidade é tirânico. Aí está, portanto, sobre o que é fundado o direito do soberano de punir os delitos: sobre a necessidade de defender o depósito da saúde pública das usurpações particulares. Quanto mais justas são as penas, mais sagradas e invioláveis é a segurança, e maior a liberdade que o soberano preserva para os súditos” BECCARIA, Cesare Bonesana. Dos delitos e das penas. Tradução Silene Cardoso. Ícone. São Paulo.2006. p. 31 7“E por justiça não entendo outra coisa que não seja o vínculo necessário para manter unidos os interesses particulares, que sem isso se dissolveriam, voltando ao antigo estado de insociabilidade. Todas as penas que ultrapassam a necessidade de conservar esse vínculo são injustas por natureza. É necessário que não se atreva à palavra justiça de qualquer coisa real, como a de força física ou de um ser existente. Ela é simples maneira de conceber dos homens, a maneira que influi infinitamente sobre a felicidade de cada um. Nem mesmo compreendo aquele outro tipo de justiça que é emanada de Deus e que possui relações imediatas com as penas e recompensas 12 Ora, em resumo, esse é o ponto de diferenciação do Direito Penal dos demais ramos do Direito: a repressão de uma conduta valorada negativamente por um corpo social por meio de pena, sendo somente as tipificadas em legislações de natureza criminal, aptas a culminarem em repressão de natureza penal.8 A consequência do poder de punir, diz a Escola Clássica, é justamente a limitação do soberano em face da legislação, que é o instrumento capaz de autorizar a imposição do poder punitivo. Ou seja, o exercício do poder de punir está limitado às balizas traçadas pela lei penal9. Logo, o princípio da legalidade (nullum crimen sine lege), além de ser tradicionalmente o alicerce para reprimir tão somente as condutas descritas na lei, é, antes de tudo, o meio pelo qual se modera o poder punitivo. Esta é a lição da Escola Clássica que se dimensiona aos tempos atuais. Assim, logo na certidão de nascimento do Direito Penal10 pode-se notar que há profunda ligação entre o Direito Penal e o modelo de Estado11, o que quer dizer que é possível caracterizar um Estado como liberal ou autoritário a partir da análise das normas penais por ele impostas.12 O Processo Penal, que, em resumo rasteiro, é a instrumentalização do Direito Penal, não foge a esta constatação13. Ou seja, o método de apuração de crimes e aplicação de penas está ligado às da vida futura. ” BECCARIA, Cesare Bonesana. Dos delitos e das penas. Tradução Silene Cardoso. Ícone. São Paulo.2006. p. 31. p. 32 8“Según esta posición, delito serían fundamentalmente las relaciones de reconocimiento del constitutivo jurídico de las relaciones de reconocimiento – la lesión del ‘Derecho como Derecho’ (HEGEL) – por medio de lesiones objetivas del Derecho (injusto civil, injusto administrativo). El concepto de delito se halla entonces en intrínseca relación fundamentadora con la pena: la pena no es primariamente una suerte de coacción motivadora, como afirma HOBBES y FUERBACH, sino el restablecimiento necesario e indispensable de aquellas relaciones básicas entre autor y la comunidad que tras la comisión del delito se han visto perturbadas, uniéndolo también con implicaciones preventivas” KÖHLER, Michael. La imputación subjetiva: estado de la cuestión. Tradução de Pablo Sánchez-ostiz Guitiérrez.. In: ROXIN, Claus; JAKOBS, Günther; SCHÜNEMANN, Bernd; FRISCH, Wolfgang; KÖHLER, Michael. Sobre el estado de la teoría do delito: seminario en la Universistät Pompeu Fabra. Madrid, Espanha: Civistas, 2000. cap. II, p.82. 9“A primeira consequência desses princípios é que somente a legislação pode decretar as penas sobre os delitos, e essa autoridade recai a pena sobre o legislador, que representa toda a sociedade, unida por meio de um contrato social” BECCARIA, Cesare Bonesana. Dos delitos e das penas. Tradução Silene Cardoso. Ícone. São Paulo.2006. p.33. 10Ora fazemos esta analogia com a Escola Clássica, pois, historicamente, embora já se tivesse observado primitivas formas de regramento punitivo na história, a Escola liberal clássica foi a primeira a estruturar este pensamento em um modelo científico. 11“Ao que o primeiro aspecto pertine, não é demais recordar as íntimas relações existentes entre o modelo de estado e o respectivo modelo de Direito Penal – em sentido amplo -, de modo a ser inequívoca a influência de uma determinada concepção de estado no conjunto das ideias que se tem acerca do sistema jurídico penal” FERNANDES, Fernando Andrade. Sobre uma opção Jurídico-Política e Jurídico Metodológica de Compreensão das Ciências Jurídico Criminais. Página 53/83. Liber Discipuloum para Jorge Figueiredo Dias. Coimbra Editora. Coimbra (Portugal). 2003. p.54. 12FERNANDES, Fernando Andrade. Sobre uma opção Jurídico-Política e Jurídico Metodológica de Compreensão das Ciências Jurídico Criminais. Página 53 – 83. Liber Discipuloum para Jorge Figueiredo Dias. Coimbra Editora. Coimbra (Portugal). 2003. 13Sobre a expressão Processo Penal e sua definição: “A locução processo penal é uma locução polissêmica, pois designa ao mesmo tempo um ramo do direito com suas leis, normas e princípios; designa também o mecanismo 13 características do modelo político regente.14 Não por outro motivo, muito se diz que o Processo Penal e o Direito Penal são termômetros da democracia15. Porém, mais do que conexo ao modelo de Estado, o Direito Penal está intimamente relacionado à sociedade16. O Direito é o sistema que outorga significado e valor jurídico aos eventos do mundo natural17, que atribui valor jurídico ao dinheiro, a uma transação econômica, a um laço familiar e, enfim, a uma conduta humana que gera dano físico em outrem. Logo, o crime, no plano normativo, é a atribuição de um significado jurídico normativo a um evento do plano da realidade. Sendo assim, sabendo que o Direito Penal é a seção do Sistema Jurídico que atua com maior violência ao direito alheio e, por isso, regido pelo princípio da ultima ratio, entende-se que esse, por meio da atribuição de significados a condutas humanas, expõe os valores mais caros àquela sociedade.18 A leitura do crime de furto (art. 155, do Código Penal) mostra um claro exemplo desta relação entre direito e sociedade, afinal, ao valorar negativamente – atribuindo-se pena – a conduta que atenta contra a propriedade alheia, revela-se que a sociedade de apuração de crimes e imposição de penas; a relação jurídico processual que disciplina esse mecanismo; e, por fim, refere-se ainda à área do saber jurídico que estudo cientificamente as normas, os princípios e as leis processuais penais.” MACHADO, Antônio Alberto. Curso de processo penal. 6 ed. Atlas. São Paulo. 2014. p.1. 14Nesse sentido: “As reflexões sobre os diversos modelos de justiça e sobre as correspondentes doutrinas de justificação externa, além de fornecer, nos planos metaético e metapolítico, os critérios de avaliação dos sistemas penais positivos ou das suas normas e institutos, permitem a identificação das diversas culturas jurídicas e políticas que estão por detrás deles, e que, frequentemente, influenciaram de forma direta a sua produção.” FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. Tradução de Ana Paula Zomer Sica et al. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p.189. 15“Los principios de la política procesal de una nación no son otra cosa que segmentos de su política estatal en general. Se puede decir que la estructura del proceso penal de una nación no es sino el termómetro de los elementos corporativos o autoritarios de su Constitución. Partiendo de esta experiencia, la ciencia procesal ha desarrollado un número de principios opuestos constitutivos del proceso. La mutua lucha de los mismos, el triunfo ya del uno, ya del otro, o su fusión, caracterizan la historia del proceso. El predominio de uno u otro de estos principios opuestos en el Derecho vigente, no es tampoco más que el tránsito del Derecho del pasado al Derecho del futuro.” GOLDSCHIMIDT, James. Problemas Jurídicos y Políticos del Proceso Penal: Conferencias dadas en la Universidad de Madrid en los meses de diciembre de 1934 y de enero, febrero y marzo de 1935. Barcelona, Bosch, 1935. p. 67. 16Quando da elaboração de um conceito de conduta, seguindo o entendimento de que o direito é fruto da sociedade, Günther Jakobs expõe que um conceito de ação não deve ser buscado antes de sociedade, mas si dentro dela: “En este sentido, el concepto de acción no se busca antes de la sociedad, sino dentro de la sociedad.” JAKOBS, Günther. El concepto jurídico penal de acción. Tradução de Menuel Cancio Meliá. Revista peruana de ciencias penales, Lima, Peru, ano II, n. 3, p. 67-98, 1994. p. 69 17“Siempre es el Derecho el que otorga a los datos del mundo aprehensible los sentidos un significado jurídico – lo que parece ser un círculo -, es el concepto de la autonomía del Derecho” JAKOBS, Günther. Sobre la normativización de la dogmática penal. Tradução de Manuel Cancio Meliá y Bernanrdo Feijóo Sánchez. Madrid, Espanha Thomson Civitas, 2003. p. 43. 18“A partir da perspectiva de que partimos, o funcionalismo jurídico-penal se concebe como aquela teoria segundo a qual o Direito Penal está orientado a garantir a identidade normativa, a garantir a constituição da sociedade. (...) A prestação que realiza o Direito Penal consiste em contradizer por sua vez a contradição das normas determinantes da sociedade. O direito penal confirma, portanto, a identidade social.”. JAKOBS, Günther. Sociedade, norma e pessoa: Teoria de um direito penal funcional; tradução de Maurício Antônio Ribeiro Lopes – Barueri, SP, Manole. 2003.p.1/4 14 brasileira atribui significado jurídico-social relevante à propriedade ao ponto de protegê-la com lei penal. Em sentido oposto, em uma sociedade em que inexiste o fenômeno da propriedade privada, o crime de furto, conforme descrito no Código Penal Brasileiro, não faz qualquer sentido, visto que sequer existe – nesta sociedade hipotética – o conceito normativo de propriedade para ser lesado por uma conduta criminosa. Assim, há necessidade de se distinguir o sistema fenomênico do sistema normativo. Enquanto a natureza é marcada pelos fenômenos causais e leis naturais imodificáveis, o mundo normativo é uma construção humana com a intenção prática de prover a convivência social. Logo, o mundo natural é regido pela lógica do ser, ao passo que o mundo normativo se orienta sob a lógica do dever ser. Contudo, deve-se fazer a ressalva que estes dois mundos não são apartados ou sem qualquer interação. Pelo contrário, eles se relacionam mutuamente, afinal, é inegável que o contexto econômico, social, histórico e político influencia o Direito. Veja-se, por exemplo, como a crise socioeconômica, após a primeira Guerra Mundial, influenciou a Alemanha para a elaboração da Constituição de Weimar, a qual dispunha constitucionalmente a possibilidade de um estado de exceção que foi usado pelo partido Nazista para assumir o poder após um acontecimento histórico, qual seja, o incêndio Reichstag. Então, o Direito, em si, somente pode ser entendido por completo quando em referência à realidade. Esto resulta de la constatación, obvia, pero no siempre valorada como se debe, de que el Derecho, y en especial el Derecho Penal, sólo se concibe en relación a la sociedad. Si esto es una vieja verdad desde el aforismo latino del ubi societas ibi jus, y el su correlato ubi ius ibi societas, la que debe ser profundizada es la idea que no solo el Derecho está asociado a la sociedad, sino que está asociado a una determinada sociedad. Es decir, el Derecho, y el Derecho Penal, se vinculan a un determinado contexto social, según las características presentes en un concreto punto temporal y espacial. En esta línea, si hay una expectativa de que el Derecho Penal, en alguna medida, pueda influenciar la configuración de una determinada sociedad, no menos correcto es que el contexto social influye en la configuración del Derecho Penal, teniendo en cuenta que son las normas penales el principal portal de conexión entre el mundo social y el mundo jurídico-penal. 19 No mesmo sentido, Jakobs ensina que se o Direito pretende manter sua capacidade de conexão e, por isso, capacidade comunicativa na vida cotidiana, não pode contradizer as circunstâncias cotidianas consolidadas20. Aliás, esta não é uma vertente adotada somente pelos 19FERNANDES, Fernando Andrade. Corrupción y medios de comunicación. In: GARICA, Nicolás Rodriguez et al. Justicia penal pública y medios de comunicación. Valecia, Espanha: Tirant lo Blanch, 2018. cap. 18. p. 578/579. 20“Sin embargo, si se pretende que el Derecho mantenga su capacidad de conexión en la vida cotidiana, no puede contradecir de manera radical las constataciones cotidianas consolidadas” JAKOBS, Günther. Sobre la 15 teóricos do Direito Penal. Konrad Hesse, por exemplo, destaca que o ordenamento jurídico somente pode ser entendido se analisado diante de sua relação para com realidade21. Partindo deste pressuposto, resta claro que o Direito busca a viabilidade da convivência social22,se preocupando com as relações entre as pessoas. No entanto, no sistema normativo, pessoa é um conceito, de modo que – diferente do mundo natural – nem todo humano é considerado pessoa para o Direito23, de modo que a pessoa é a partícula unitária de deveres e direitos que permite o cumprimento de expectativas para a viabilidade da convivência social. O Direito Penal, em específico, restringe o conceito de pessoa para somente considerar pessoas ativas para o Direito Penal, ou seja, que possam ser agentes de um delito com capacidade de consciência para julgar e processar de forma vinculada às estruturas da sociedade a ordem jurídica. Em outras palavras, para esse ramo do Direito, o conceito de pessoa está vinculado à capacidade cognitiva de conhecimento da norma e da contrariedade que o autor se coloca no momento do crime. Então, a criança, o doente mental ou, ainda, todos com alguma incapacidade cognitiva que impossibilite o entendimento das expectativas normativas não são pessoas para o Direito Penal. Nesse sentido, a esses, não podem ser imputados qualquer delito, afinal, como dito anteriormente, delitos são praticados exclusivamente por pessoas. O Direito Penal moderno, cuja tendência vai na linha da normativização, entende que o funcionamento da sociedade ocorre pelo cumprimento de expectativas construídas por meio da comunicação.24 Em um exemplo simples, o trânsito urbano funciona graças ao cumprimento de normativización de la dogmática penal. Tradução de Manuel Cancio Meliá e Bernanrdo Feijóo Sánchez. Madrid, Espanha Thomson Civitas, 2003. p.44. 21“O significado de ordenação jurídica na realidade e em face dela somente pode ser apreciado se ambas – ordenação e realidade – forem consideradas em sua relação, em seu inseparável contexto, e no seu condicionamento recíproco. Uma análise isolada, unilateral, que leve em conta apenas um ou outro aspecto, não se afigura em condições de fornecer resposta adequada à questão. Para aquele que contempla apenas a ordenação jurídica, a norma “está em vigor” ou “está derrogada”; não há outra possibilidade. Por outro lado, quem considera, exclusivamente, a realidade política e social ou não consegue perceber o problema na sua totalidade, ou será levado a ignorar, simplesmente, o significado da ordenação jurídica. ” HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Sergio Antônio Fabris Editor. Porto Alegre, 1991.p. 13 22A concepção do Direito Penal como ferramenta de garantia da convivência social vai além da doutrina penalista moderna marcada pela normativização, uma vez que, ao menos, esta ideia já aparecia – por exemplo – nos escritos de Franz Von Lizst. A conferir: “Para que não prorompa a guerra de todos contra todos, faz-se mister uma ordem ou estado de paz, a circumscripção da efficiencia de cada um, a protecção de certos interesses e a não protecção de certos outros. ” LISZT, Franz Von. Tratado de direito penal allemão: Tradução de José Hygio Duarte Pereira. Brasilia, DF.Senado Federal. Conselho Federal. Superior Tribunal de Justiça, 2006. v. 1. p. 95/96. 23“Persona es un concepto (...) Por consiguiente, todo ser humano es persona jurídico-penal” JAKOBS, Günther. Sobre la normativización de la dogmática penal. Tradução de Manuel Cancio Meliá e Bernanrdo Feijóo Sánchez. Madrid, Espanha Thomson Civitas, 2003. p. 20/21 24“Partiendo de tal comprensión, el Derecho aparece como estructura de la sociedad, y tanto los deberes como los derechos, hablando en los términos de la teoría de los sistemas: la expectativa normativa, no están dirigidas a individuos, sino a destinos construidos comunicacionalmente que se denominan personas” JAKOBS, Günther. 16 expectativas de comportamento descritas no Código de Trânsito brasileiro, do contrário os carros colidiriam. O pedestre, ao aproximar-se de um ponto de travessia, espera que diante de um sinal de parada os veículos parem, de modo que este pedestre possa atravessar a via com a segurança de que não será atropelado. No entanto, se algum veículo atravessa o sinal de parada sem qualquer frenagem há grande possibilidade de que o pedestre venha a ser atropelado ou que haja uma colisão com outros veículos. Isto porque, os demais personagens (pedestres e motoristas da via transversal) estão se comportando conforme a expectativa de comportamento. Assim, é imanente dessas expectativas sociais a normatividade, visto que não se tratam de meras descrições ou observações de comportamento, mas ordens de deveres e direitos. Esse é o ponto de virada da atual tendência de normatização do Direito Penal, que supera a visão cognitiva dos eventos criminais para que se comece a compreender a sociedade de modo estritamente normativo. Esta tendência doutrinária, liderada pelo pensamento alemão, demonstra que a visão cognitiva25 do Direito Penal regia-se pela pergunta: o que fará determinada pessoa? Provavelmente não delinquir. De outro lado, a atual tendência de normatização rege-se pela afirmação imperativa: aquela pessoa não deve delinquir. Con ello, hemos pasado de un entendimiento cognitivo a una comprensión normativa de lo social: las personas deben cumplir deberes y, como puede añadirse de inmediato, son también titulares de derechos (...) En lugar de la expectativa cognitiva (qué hará x? probablemente no delinquirá) aparece la expectativa normativa institucionalizada (x no debe delinquir!), y cuando esta expectativa es defraudada, no debe seguir un proceso de aprendizaje, a diferencia de lo que sucede en el caso de defraudación de una expectativa cognitiva, sino se trata de mantener la expectativa e imputar el curso perturbador al responsable. (...) En todo caso, hay algo que queda claro: la decisión no depende de hechos psíquicos, de la intensidad del impulso a cometer el hecho o de elemento similares. En el hecho “impulsó para cometer el hecho” puede expresarse, dependiendo de la comprensión social, dicho de otro modo, dependiendo del contexto normativo de la sociedad, una falta de escrúpulos que debe ser condenada o una debilidad que merece condescendencia26 Sobre la normativización de la dogmática penal. Tradução de Manuel Cancio Meliá e Bernanrdo Feijóo Sánchez. Madrid, Espanha Thomson Civitas, 2003. p. 17. 25Ora refere-se, sobretudo, à Escola Finalista, tendência científica cronologicamente anterior à atual, a qual detinha interpretação cognitiva dos eventos criminais. Tanto é assim que esta fundamentava-se na máxima de que a ação humana era um exercício de uma atividade final, que se realizava em duas fases: 1. O pensamento, como antecipação do fim; seleção dos meios e consideração dos efeitos concomitantes à conduta; 2. Execução do pensamento, ou seja, processo causal aferido ao plano da realidade conforme planejado no plano cognitivo. Nesse sentido: WELZEL, Hans. O novo sistema jurídico-penal: uma introdução à doutrina da ação finalista. São Paulo. Revista dos Tribunais. 2001. 26JAKOBS, Günther. Sobre la normativización de la dogmática penal. Tradução de Manuel Cancio Meliá e Bernanrdo Feijóo Sánchez. Madrid, Espanha Thomson Civitas, 2003. p.19/25. 17 Ocorre que, expectativas opostas não convivem em um mesmo sistema social, uma vez que, por logicidade, se inutilizariam. Em outras palavras, para continuar com o exemplo do trânsito de automóveis, não podem coexistir as expectativas de que os carros sigam e parem diante de um mesmo sinal vermelho. Logo, a comunicação normativa, até mesmo por trabalhar no campo do dever ser unitária, deve ser retilínea e precisa27. Nesse sentido, todos os integrantes da sociedade são dotados de um rol de direitos e deveres, os quais ordenam o cumprimento de expectativas de comportamento. Então, por exemplo, para que se possa cumprir a expectativa de integridade física do corpo, todos detêm o dever de não agredir o outro28 e, ao mesmo tempo, o direito de ter sua integridade física garantida de lesões oriundas de condutas alheias29. Essa relação entre direitos e deveres não se limita, evidentemente, ao direito à integridade física, alcançando as demais expectativas sociais, tal qual a manutenção do patrimônio, da dignidade social, da boa gestão do patrimônio público. Ademais, essa lógica não se limita ao Direito Penal, o cumprimento de um contrato, por exemplo, que é questão afeta ao Direito Privado, depende do cumprimento de suas cláusulas, que nada mais que a fixação de direitos e deveres para a satisfação são que acordo de expectativas. Sabendo que o Direito é fruto da convivência social em um tempo histórico, esses direitos e deveres que são atribuídos a cada membro da sociedade alteram-se a depender do sistema social que temos por referência. Como dito, alterando-se o modelo de convívio social, alteram-se, por consequência, os direitos e deveres de cada pessoa. Afinal, as regras de convivência, por exemplo, em uma sociedade teocrática são distintas das sociedades democráticas, fazendo-se necessário a adequação do rol de direitos e deveres30. Deste modo, 27Jakobs entende neste ponto que o delito representa uma falha de comunicação normativa. “O delito não é tomado como princípio de uma evolução nem tampouco como evento que deva solucionar-se de modo cognitivo, mas como falha de comunicação, sendo imputada essa falha ao autor como culpa sua” JAKOBS, Günther. Sociedade, norma e pessoa: Teoria de um direito penal funcional; tradução de Mauricio Antônio Ribeiro Lopes – Barueri, SP, Manole. 2003. p.4. 28 Nesse sentido, Jakobs fundamenta a existência do sistema social no dever mínimo das pessoas não causarem danos às outras, alcançando as demais expectativas das pessoas. Em outras palavras, o sistema social para Jakobs, depende do mínimo cumprimento de que uma pessoa não desrespeite, viole ou decepcione a expectativa alheia. “Todo ordenamento regular da existência de pessoas, isto é, toda ordem social contém como mínimo o dever que se impõe a toda pessoa de não causar danos a outrem” JAKOBS, Gunther. Ação e omissão no direito penal. Tradução de Maurício Antônio Ribeiro Lopes. Manole. Barueri (SP), 2003.p.2. 29“Dever social é a denominação para a relação entre um obrigado e um terceiro que deriva seu direito dessa pessoa. ” JAKOBS, Gunther. Uma teoria da obrigação jurídica. Tradução de Mauricio Antônio Ribeiro Lopes. Barueri, SP: Manole, 2003. p. 6. No mesmo sentido: “En conclusión, cada deber presupone la existencia de un derecho que consiste en organizarse conforme a deber y cada derecho un deber que consiste em la administración inocua del derecho” JAKOBS, Günther. Sobre la normativización de la dogmática penal. Tradução de Manuel Cancio Meliá e Bernanrdo Feijóo Sánchez. Madrid, Espanha Thomson Civitas, 2003. p. 137 30“De qué deberse se trata? Como se ha dicho, la respuesta en gran medida de la cultura en cuestión – un Estado más bien liberal, uno de configuración paternalista y un Estado Cristiano mostrarán con toda certeza diferencias” 18 por logicidade, a resolução dos casos deve se dar por meio normativo sabendo dos direitos e deveres da pessoa, mas, sobretudo, considerando a esfera social em que o caso se insere.31 Isto dito, em resumo, ser pessoa para a norma penal é representar um papel ao qual é atribuído um rol de direito e deveres32. Tais deveres podem ser divididos em deveres gerais, que são atribuídos a todos os integrantes da sociedade, e deveres especiais, que competem somente a uma parcela da sociedade. Os primeiros são entendidos como os deveres negativos, ou seja, prestam a comunicar uma conduta negativa da pessoa. Por exemplo, o dever de não lesar o outro por meio de uma ação humana consciente de domínio causal33. Este é o mínimo de um sistema normativo ancorado em deveres34. Além dos deveres gerais, que importam em deveres de ordem negativa, a algumas pessoas é imposta uma gama de deveres específicos, os quais estão relacionados com o status especial da pessoa para com a sociedade. Estes deveres, específicos em razão da função, têm natureza positiva. Ou seja, para estas pessoas não basta – somente – não violar a norma, mas cabe-lhes também a proteção ativa destes deveres. Sobre este funcionamento da sociedade, por meio de direito e deveres, resume Günther Jakobs: Por un lado, aquel contexto de acuerdo con el cual el derecho general a uma organización libre se corresponde con el deber de no lesionar a otros en el curso de tal organización, y, por otro lado, el contexto entre un status especial y deberes (y derechos) especiales. (...) Ahora interesa con carácter previo que la institución mencionada en primer lugar general los deberes habitualmente denominados negativos: deberes de no lesionar, por ello, “negativos”. La segunda institución genera además deberes positivos, es decir, deberes de auxilio solidario. Un ejemplo de deber negativo está en la JAKOBS, Günther. Sobre la normativización de la dogmática penal. Tradução de Manuel Cancio Meliá e Bernanrdo Feijóo Sánchez. Madrid, Espanha Thomson Civitas, 2003. p.122. 31 “Sólo lesiona el derecho de otro, quien lleva a cabo una conducta para cuyas consecuencias, de acuerdo con el contexto social, es responsables, se solo o junto con otros” JAKOBS, Günther. Sobre la normativización de la dogmática penal. Tradução de Manuel Cancio Meliá e Bernanrdo Feijóo Sánchez. Madrid, Espanha Thomson Civitas, 2003. p. 41. 32“Ser pessoa significa representar um papel”. JAKOBS, Günther. Sociedade, norma e pessoa: Teoria de um direito penal funcional; tradução de Mauricio Antônio Ribeiro Lopes – Barueri, SP, Manole. 2003 33“Assim, pois, o dever negativo é algo evidente enquanto se trata de um ordenamento jurídico; o dever positivo, ao contrário, não. Condição mínima de toda juridicidade (rechtlochkeit) é, como já se explicou, o reconhecimento do outro como pessoa” JAKOBS, Gunther. Ação e omissão no direito penal. Tradução de Maurício Antônio Ribeiro Lopes. Manole. Barueri (SP), 2003. p.4 34Jakobs aponta que os deveres negativos são – sem dúvida – a base de toda a ordem social, mas devendo-se considera-los, assim, como somente a base. Ou seja, há, além desta base, uma complexidade de deveres específicos. São os dizeres do autor alemão: “Ciertamente, los deberes negativos son la base de todo orden social, pero precisamente: sólo la base. Sobre ésta levanta el edifício de deberes positivos” JAKOBS, Günther. Sobre la normativización de la dogmática penal. Tradução de Manuel Cancio Meliá e Bernanrdo Feijóo Sánchez. Madrid, Espanha Thomson Civitas, 2003. p. 123 19 prohibición general de lesionar a otras personas, un ejemplo de deber positivo en el mandato dirigidos a los padres de evitar que su hijos sufra daños.35 Sendo assim, ante esta tendência de normativização do Direito em geral, mas, sobretudo do Direito Penal, toca a este estudo a questão a respeito dos elementos pessoais da conduta e seu entendimento diante desta tendência normativa. Afinal, o Direito Penal sempre guardará seção que se liga à parte subjetiva do agente. Assim, a pergunta reitora deste trabalho é: qual é medida de subjetividade que pode o Direito Penal considerar ante sua normatividade?36 A pergunta transcrita anteriormente, como se verá em capítulo próprio, ganha relevância no atual estado das Ciências jurídico-criminais, onde, por meio de um processo de normativização, buscou-se, quando do processo de imputação, atenuar a análise psicológica do delito para aflorar a análise normativa. Isto porque, como já ficou claro, atualmente o eixo principal da Teoria do Delito é de fundamento normativo, de tal modo que as questões relacionadas ao elemento pessoal (dolo e culpa) dos delitos também ganham esta natureza. Sendo assim, a avaliação dos elementos pessoais quando da análise dos eventos supostamente criminosos tornou-se um problema no Direito Penal atual, uma vez que há divergências quanto ao comportamento e composição desses elementos na Teoria do Delito. Ademais, o problema não se encerra no campo teórico, pois atinge, também, a esfera prática. Afinal, é notório àqueles que já folhearam um processo penal, que o debate acerca dos elementos pessoais do agente é frequente37. Em um exemplo hipotético, muito usado pela doutrina, imagine-se dois sujeitos portando espingardas em uma festa de São João no interior de São Paulo que, ao longe, vêem uma pessoa vendendo o doce conhecido por Maçã do Amor. Os dois sujeitos travam uma aposta, que aquele que acertasse a Maçã, sem atingir ninguém, ganharia quantia em dinheiro. Ao dispararem um deles acerta a fruta, enquanto o outro atinge a vendedora. Faz-se a pergunta: a lesão ao corpo da vendedora promovida pelo projétil deve ser imputada ao atirador? Sem 35JAKOBS, Günther. Sobre la normativización de la dogmática penal. Tradução de Manuel Cancio Meliá e Bernanrdo Feijóo Sánchez. Madrid, Espanha Thomson Civitas, 2003. p.101/102. 36 Nesse sentido: “Por qué puede permitirse el derecho penal este subjetivismo – lo opuesto a la estandarización - ? O dicho, de otra manera, cuál es la tarea de la parte subjetiva del tipo?” JAKOBS, Günther. Sobre la función de la parte subjetiva del delito en derecho penal. Anuario de derecho penal y ciência penales. Crónicas extranjeras. n.2. v.42. 1989.p.633-652.p.633 37 Eduardo Vianna Portela Neves, em tese de Doutorado apresentada perante o Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, salientou a relevância do debate sobre os elementos pessoais do delito frente à problemática do tema, salientando, ainda, a esfera prática deste debate: “ Um dos problemas mais importante do direito penal é a correta determinação do conceito de dolo e os casos anteriormente mencionados evidenciam que esse não é apenas e tão somente um problema teórico. Cotidianamente nos deparamos com situações em que não é possível valorar com clareza se a hipótese consubstancia um comportamento doloso ou um comportamento culposo. ” NEVES, Eduardo Viana Portela. O dolo como inferência: uma contribuição para o dolo sem vontade. Orientador: Profa. Dra. Patrícia Mothé Gloche Béza. 2017. 420 p. Tese (Doutorado) - Universidade Estadual do Rio de Janeiro - UERJ, Rio de Janeiro, 2017. p. 29 20 responder à pergunta neste momento, o que se quer demonstrar é que em um caso aparentemente banal há a clara necessidade de analisar os elementos pessoais do agente, tais como, intenção, vontade, consciência, etc38. Ocorre que a sociedade atual é marcada pela característica da complexidade, ou seja, pela pluralidade e densidade técnica das relações sociais. O que quer dizer que já não se está mais diante de uma sociedade estruturada por relações sociais binárias, mas por uma teia de relações sociais39. Com isso, destaca-se uma diversidade de atividades – lícitas ou não – com potencialidade de riscos40 que, eventualmente, poderão passar por um processo de normatização. Isto para que, como dito, o Direito cumpra sua finalidade de garantia da melhor convivência em sociedade. O recorrente exemplo é o trânsito de veículos automotores que, segundo dados da OMS41, é a causa de morte de aproximadamente 1,35 milhão de pessoas por ano, ou seja, uma atividade produtora de riscos, que, mesmo assim, é lícita e normatizada. Logo, hoje, o Direito Penal lida com estruturas complexas e repercussões supra individuais, as quais demandam dos tribunais, da doutrina e da academia uma constante reformulação das instituições jurídicas. A prova disto é o recente protagonismo do chamado Direito Penal Econômico, criminologicamente definido pelas repercussões de seus crimes e pelo envolvimento de estruturas econômicas42, que, por meio de um processo conhecido com 38Usam de exemplo similar Luís Greco e Ingeborg Puppe em: GRECO, Luís. Dolo sem vontade. In: SILVA DIAS e outros [coords.]. Liber Amicorum de José de Sousa e Brito. Coimbra: Almedina, 2009, p. 887; PUPPE, Ingeborg. Estudos sobre imputação objetiva e subjetiva no direito penal. Organização: Beatriz Correa Camargo e Wagner Marteleto Filho. Tradução: Luís Greco, Beatriz Correa Camargo, Wagner Marteleto Filho e Luiz Henrique Carvalheiro Rosseto. 1 ed. São Paulo. Marcial Pons. 2019. p. 96. 39Nesse sentido: “ Entre esses milhares de amigos do Facebook, as ‘relações significativas’, sejam elas eletrônicas ou vividas off-line, estão restringidas, tal como antes, aos limites intransponíveis do ‘número de Dunbar’. O verdadeiro serviço prestado pelo Facebook e outros sites ‘sociais’ dessa espécie é a manutenção de um núcleo estável de amigos nas condições de um mundo altamente inconstante, em rápido movimento e acelerado processo de mudança”. BAUMAN, Zygmunt. Vigilância Líquida: Diálogos com David Lyon. Rio de Janeiro. Zahar, 2013 p.46. 40“A pós-modernidade traz consigo a potencialização de riscos, tendo em vista o desenvolvimento das relações e interações humanas, políticas, econômicas e sociais. Somado a este fator, temos também o fenômeno da complexidade e os incrementos na área da tecnologia. O mundo é um espaço global, nada está isolado, de modo que, diante tais interações, todas as questões dizem respeito não apenas a uma sociedade, mas a toda sociedade global. ” GOMES, Ana Cristina. Corrupção e Politica Criminal: O processo legislativo e a realidade dos tribunais. Dissertação de mestrado apresentado Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” para a obtenção do título de mestre em Direito. Orientador: Prof. Dr. Fernando Andrade Fernandes. 2014. p.12 41 Dados disponíveis em: https://www.paho.org/bra/index.php?option=com_content&view=article&id=5147:acidentes-de-transito-folha- informativa&Itemid=779. 42Tiedmann expõe visão criminológica sobre o temário convergente à presente dissertação: “Las concepciones que parten de aspectos criminológicos se basan, en parte, en las extensas repercusiones que generan los delitos económicos (en la economía nacional o en sus componentes) y, en parte, en el abuso de la confianza necesaria en el tráfico económico, la cual no debe entenderse como una confianza individual de los agentes del mercado individualmente considerados, sino como una confianza institucionalizada (el consumidor moderno debe confi ar necesariamente en la calidad de los alimentos y objetos de primera necesidad, ya que individualmente no posee 21 expansão do direito penal43, incorporou à legislação penal diversas condutas criminais praticadas no âmbito de estruturas empresariais; governamentais; sob o fundamento de relações de consumo, entre outros. Nesse sentido, os delitos de corrupção, que apesar de não serem fruto deste tempo, sofrem influência destas novas características da sociedade. Por isso, torna-se relevante abordar essa categoria delitiva pela centralidade que vem ocupando no debate jurídico44. No Brasil, em especial, desde o caso Mensalão (Ação Penal 470 que teve trâmite perante o Supremo Tribunal Federal45) a pauta corrupção tomou os jornais e, mais atualmente, com a deflagração da Operação Lava-Jato, os delitos de corrupção centralizaram novamente o debate jurídico penal. No mais, sabendo que o Direito Penal Econômico demanda da Ciência Jurídica atualização e revisão dos seus conceitos tradicionais, o crime de corrupção vem sendo usado como laboratório para o debate de objetos tais como os da presente dissertação, quais sejam, infração de dever e elemento pessoal. Isto porque há ainda um intenso debate acerca do entendimento destes conceitos nesta nova configuração social. Não por outro motivo, o centro do debate aqui erigido é a influência do elemento pessoal para imputação do crime de infração de dever. 1.2. Uma delimitação mínima de conduta para o Direito Penal. A pretensão de buscar um conceito geral de conduta com uma simples proposição linguística extrapola (e muito) os limites deste trabalho. Tal exercício demandaria um mergulho profundo na Filosofia, na Teologia, na Psicanálise, chegando até na Neurociência. Logo, ainda mecanismos de control de esa calidad).” TIEDEMANN, Klaus. Manual de derecho penal económico: parte geral y parte especial. Tradução de Manuel A. Abnato Vásquez et al. Velencia, Espanha: Tirant lo Blanch, 2010. p.57. 43O processo chamado de “Expansão do Direito Penal” fundamenta-se na visão de Sílva Sánchez de que, nos últimos tempos, a sociedade demandou do Estado e, em particular, do Direito Penal a efetivação do direito de segurança. Desta maneira, novos tipos foram incorporados à legislação penal com finalidade preventiva e repressiva . Nesse sentido: “Seja como for, o caso é que, em medida crescente, a segurança se converte em uma pretensão social a qual se supõe que o Estado e, em particular, o Direito penal, devem oferecer uma resposta. ”. SÁNCHEZ, Jesús-Maria Silva. A expansão do direito penal: aspectos da política criminal pós-industriais. Traduzido por Luiz Otávio de Oliveira Rocha. 3 ed. rev. atual. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2013. p.50. 44“La observación de las manifestaciones del fenómeno del delito en la actualidad en muchos contextos culturales revela claramente una fascinación por el tema de la corrupción. En diversos ámbitos, el fenómeno de la corrupción ha adquirido el estatus de tema de la actualidad, con fuertes reflejos en la percepción general y especializada que se tiene sobre ella y en la búsqueda de alternativas al problema.” FERNANDES, Fernando Andrade. Corrupción y medios de comunicación. In: GARCÍA, Nicolás Rodriguez et al. Justicia penal pública y medios de comunicación. Valecia, Espanha: Tirant lo Blanch, 2018. cap. 18. p. 575. 45AP 470, Relator: Joaquim Barbosa. Tribunal Pleno, julgado em 17/12/2012, Acórdão eletrônico DJe-074 Divulg 19-04-2013 Public 22-04-2013 RTJ VOL-00225-01 PP-00011. 22 que qualquer reflexão sobre conduta faça referência a essas áreas do saber, recorta-se tal reflexão à seara do Direito Penal46. Ademais, esclarece-se que a doutrina penal e a jurisprudência não detêm uma unidade terminológica neste temário. Por vezes usa-se o termo “ação”; outras, o termo “conduta”. Deste modo, uma vez que o presente debate busca uma definição genérica, capaz de englobar atos de comissão e omissão, os quais – adianta-se – são considerados como espécies de conduta, ora faz-se opção terminológica pelo vocábulo “conduta” com fincas a maior amplitude. Nesse sentido, ainda que algumas referências que serão utilizadas optem pelo termo “ação”, ora opta- se pelo uso do termo "conduta'', sob o fundamento de que o vocábulo “ação” tem maior precisão quando usado como significante de conduta comissiva. Isto dito, em que pese defenda-se que o objeto do Direito Penal seja a norma jurídica, o afastamento de um conceito - ainda que mínimo - de conduta traria dose insuportável de relativismo conceitual, que – no plano prático – representaria a possibilidade de arbítrio judiciais ou casuísmos47. Então, em primeiro plano, o almejado conceito tem por função a contenção do poder punitivo, pois, ainda que do ponto de vista linguístico, qualquer conceito traz, em si, uma delimitação lógica, qual seja, o que é conceituado como A não pode ser B. Adicionando-se a esta função geral, um conceito de conduta aporta outras três funções que devem ser observadas: 1º) Função de Classificação Significa abarcar de maneira integral todas as formas de manifestação humana que possam interessar ao Direito Penal: fazer ativo ou omisso; doloso ou culposo; consumado ou tentado; a autoria ou participação etc. Em síntese, para cumprir esta tarefa, a conduta deve consistir no denominador comum de todas as formas de manifestação delitiva. 2º) Função de Definição (de alcance ou união) Ademais o conceito de conduta deve possuir a dimensão matéria suficiente para vincular, com critério protagonista, as demais categorias que lhe acompanham: tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade. Sendo assim, além de determinar a si própria, a conduta condiciona o que deve entender por tipicidade, antijuridicidade e culpabilidade, constituindo-se a “coluna vertebral” da teoria do crime. 3º) Função de Delimitação (ou exclusão de indiferentes penais) 46Zaffaroni faz a mesma ressalva: “Naturalmente, estaremos adstritos ao debate penalístico moderno do conceito de ação e de suas raízes filosóficas ou sociológicas mais próximas. Mas convém registrar a tradição de interesse filosófico acerca da ação, que na antiguidade remonta a Aristóteles e na idade média recebeu uma influente contribuição de Tomás de Aquino, e também um interesse sociológico que de Weber seria retomado por Parsons.” ZAFFARONI, E. Raúl. BATISTA, Nilo. ALAGIA, Alejandro. Slokar, Alejandro. Direito penal brasileiro: Segundo volume. Teoria do Delito: Introdução Histórica e metodológica, ação e tipicidade. Rio de janeiro: Revan. 3ª edição, 2006.p.82. 47“Apesar disso, tendo em vista ser a conduta a “pedra angular” ou a “espinha dorsal” de todo o Direito Penal, a sua conceituação é imprescindível para a correta, ordenada e clara sistematização do delito. Por outro lado, tem- se que o abandono do seu estudo autônomo conduziria a dogmática penal ao casuísmo, ao arbítrio judicial, e por fim, ao menoscabo de todo o trabalho científico" SOUZA, Arthur de Brito Gueiros. JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. Direito penal: volume único. 2 ed. rev. atual. ampl. São Paulo, Atlas, 2020.p.134 23 O conceito de conduta ação deve ainda excluir aprioristicamente – ou seja, antes de se adentrar no exame dos demais pressupostos do delito -, o comportamento tido como penalmente irrelevantes. Cuida-s e de função negativa de seleção prévia ou filtragem de certos fatos ou comportamento, como, por exemplo, catástrofes naturais, ações animais, atos de pessoas incapazes ou privadas de voluntariedade, como ocorrem nos casos de vis absoluta ou força maior, atos reflexos, delírios, ataques convulsivos, etc.48 Deste modo, pontua-se que, mesmo dentro da Ciência Jurídico-criminal, o conceito de conduta não tem conteúdo homogêneo. O que quer dizer que, a depender do recorte metodológico feito ao Direito Penal, tem-se entendimento diverso. As primeiras teorias da conduta adotam um fundamento causal, ou seja, uma delimitação de conduta como um movimento corporal provocador de resultado no mundo exterior49. A escola clássica, usando de um método lógico-dedutivo, parte do entendimento de que o sujeito, dotado de livre arbítrio, produz um resultado definido na norma penal como crime. Em suma, percebe-se, neste tempo, um procedimento de subsunção do fato à norma50. Tanto é assim que, em Carrara, percebe-se que a conduta, como substrato do delito, é definida por ser um ato humano livre, inteligente e gerador de um resultado exterior lesivo ao Direito51. Em Fuerbach, a conduta – tida como condição essencial do crime – define-se pela cognição externa, uma vez que somente uma conduta externa que produza um resultado pode lesionar o Direito52. 48 SOUZA, Arthur de Brito Gueiros. JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. Direito penal: volume único. 2 ed. rev. atual. ampl. São Paulo, Atlas, 2020.p.135. 49“ A primeira teoria – e, talvez , a mais seguida na história do Direito Penal – compreende o conceito causal ou clássico de ação. Segundo ele, conduta penalmente relevante é o comportamento humano que causa um resultado no mundo exterior, ou que não o evita, no caso da omissão. A teoria causal se preocupa, única e exclusivamente com o aspecto extrínseco (ontológico ou natural), dizendo que a ação é a causa do resultado. Sinteticamente, para a teoria causal, agir é causar o resultado; agir é, com movimento físicos, dar ensejo à causação de resultados típicos.” SOUZA, Arthur de Brito Gueiros. JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. Direito penal: volume único. 2 ed. rev. atual. ampl. São Paulo, Atlas, 2020.p.136. 50“O método lógico-dedutivo e formal é a maneira pela qual se realiza a subsunção de determinado comportamento a norma. Aqui, mais uma vez, inicia-se do abstrato (lei) em direção ao concreto, permitindo ao intérprete sentenciar acerca da ocorrência ou não da infração legal.” NETTO, Alamiro Velludo Salvador. Finalidades da pena: Conceito material de delito e sistema penal integral. São Paulo: Quartier Latin, 2009. p. 58. 51“Definido o delito como um ente jurídico, estava estabelecendo, de uma vez para sempre, o perpétuo limite da proibição, não se podendo entrever delito fora daquelas ações que ofendam ou ameaçam os direitos dos consórcios. E desde que o direito não pode ser atingido, a não ser por atos exteriores procedentes de uma vontade livre e inteligente, esse primeiro conceito vinha determinar a constante necessidade, em cada delito, das suas forças essenciais: vontade inteligente e livre; fato exterior lesivo do direito, ou a ele ameaçador. ” CARRARA, Francesco. Programa do Curso de Direito Criminal. Parte Geral. Tradução de José Luiz de A. Franceschini e J. R. Prestes Barra. 2. Vol. I. São Paulo: Saraiva, 1956.p.11. 52“Toda vez que el crimen es una injuria contenida en una ley penal (§21), toda acción, para ser juzgada como crimen, debe presuponer: I) La capacidad de ser exteriormente reconocible, puesto que sólo una acción externa puede lesionar el derecho” FUERBACH, Paul Johann Anselm Ritter. Tratado de derecho penal. Tradução de Eugênio Raul Zaffaroni e Irma Hagemeer. 14 ed. Alemã. Hammurabi S.R.L., Buenos Aires, 1989. p. 70. 24 Os positivistas, no mesmo sentido, também defendiam a conduta como um elemento verificável no plano material, cujo efeito tinha relevância jurídica. Neste momento, tentou-se separar a conduta humana de todas outras supostas condutas verificáveis no plano material (eventos naturais ou condutas provocadas por animais). Sendo assim, Lizst defendeu que a conduta repousa na vontade humana e, por isso, somente as circunstâncias que desta decorrem são condições para algum efeito jurídico relevante53. Assim, para o jurista alemão, as condutas e, portanto, os crimes, podem ser resumidos em: ato de vontade e resultado54. Para Beling a conduta é o fundamento da própria punibilidade55, de modo que alguém somente poderia ser punido por conta de sua realização. Assim, a conduta é um comportamento corporal produzido pelo domínio do corpo consciente, tal qual levantar a mão, andar ou falar56. Nesse sentido, este autor exclui do conceito de conduta, e por logicidade de atribuição penal, os atos que advenham: 1) de uma característica do indivíduo (por exemplo, sua periculosidade); 2) de um estado do indivíduo (doença, sonhos, sonambulismo, etc.); 3) do simples querer ou desejar de algo (por exemplo, o genro que deseja que sua sogra ao tomar banho escorregue no banheiro) e 4) de um comportamento do corpo que não detenha voluntariedade, mas somente mecânicas automáticas do corpo humano (movimento reflexos)57. 53“As circumstancias que são a condição para que se siga um effeito jurídico consistem sem exceção alguma em factos juridicamente relevantes, isto é, em mudanças do mundo exterior apreciáveis pelos sentidos. Mas os effeitos do injusto, e consequentemente a pena, só se ligam a certos e determinados factos. As circumstancias constitutivas do injusto não podem ser acontecimentos, que independam da vontade humana, mas somente acções humanas. - Acção é pois o facto que repousa sobre a vontade humana, a mudança do mundo exterior referível à vontade do homem. Sem acto de vontade não ha acção, não ha injusto, não ha crime: cogitationis pcenam nemo patitur. Mas também não ha acção, não há injusto, não há crime sem uma mudança operada no mundo exterior, sem um resultado.” LISZT, Franz Von. Tratado de direito penal allemão: Tradução de José Hygio Duarte Pereira. Brasília, DF.: Senado Federal. Conselho Federal. Superior Tribunal de Justiça, 2006. v. 1.p.193. 54“Dest’arte são dados os dois elementos, de que se compõe a ideia de acção e portanto a de crime: acto de vontade e resultado” LISZT, Franz Von. Tratado de direito penal allemão: Tradução de José Hygio Duarte Pereira. Brasilia, DF.: Senado Federal. Conselho Federal. Superior Tribunal de Justiça, 2006. v. 1. p. 193. 55“Para un individuo, la punibilidad surge siempre solamente de sus propias acciones.” BELING, Ernest Von. Esquema de derecho penal: la doctrina del delito-tipo. Tradução de Sebatián Soler. 11. ed. Buenos Aires: Liberia "El Foro", 2002. p.42. 56“Debe entenderse por "acción" un comportamiento corporal (fase externa, ‘objetiva’ de la acción) producido por el dominio sobre el cuerpo (libertad de inervación muscular, "voluntariedad"), (fase interna, "subjetiva" de la acción); ello es, un "comportamiento corporal voluntario", consistente ya en un "hacer" (acción positiva), ello es, un movimiento corporal, p. ej. levantar la mano, movimientos para hablar, etc., ya en un "no hacer" (omisión), ello es, distensión de los músculos.” BELING, Ernest Von. Esquema de derecho penal: la doctrina del delito-tipo. Tradução de Sebatián Soler. 11. ed. Buenos Aires: Liberia "El Foro", 2002. p.42. 57“De punibilidad sólo puede hablarse en relación con una acción determinada de cierto individuo. El delito sólo en eso puede consistir, y no 1. en una propiedad del hombre (por ej., en su ‘peligrosidad’, ésta es sólo una condición para "medidas de seguridad"); 2. en un estado del hombre (enfermedad, sueño, etc.); 3. en el simple querer o pensar o algo que sea puramente interno. El querer no ejecutado no es punible. Cogitationis poenam nema patitur. El pensamiento no es punible; 4. En un comportamiento del cuerpo que no provenga de la propia voluntariedad, sino que surja mecánica o automáticamente.” BELING, Ernest Von. Esquema de derecho penal: la doctrina del delito- tipo. Tradução de Sebatián Soler. 11. ed. Buenos Aires: Liberia "El Foro", 2002. p. 42. 25 Nesse sentido, tentando suprir as críticas outrora feitas à Escola Clássica de que o conceito causal de conduta poderia ser atribuído a qualquer animal, Beling conclui que somente os humanos – individualmente - podem ser alvos de imputação penal. Isto porque animais e pessoas jurídicas não podem desenvolver condutas de acordo com o panorama supra desenvolvido58. De outro lado, em momento posterior, o finalismo de Hans Welzel, ancorado na vertente filosófica da Fenomenologia, entendeu que a conduta não era definida pela produção de um efeito (conduta causal), mas pela capacidade do humano dirigir seus atos a fins específicos59. Então, delimitou-se a chamada ação final60 sob o fundamento da supremacia da vontade do agente, a qual, segundo esta Escola, integra a própria conduta. A Teoria Final da Conduta (ou ação, como usualmente chamado) representou grande influência no Código Penal Brasileiro, sobretudo quando da reforma de 1984, que – como se verá adiante – ressaltou o dolo como elemento do tipo61. Não por outro motivo, aqueles que têm contato com a prática do processo penal vêm que, comumente, discute-se o que pretendia a conduta do agente quando do fato delituoso. Em resposta às críticas feitas à Teoria finalista elaborou-se um conceito social de conduta, em que, além dos pressupostos finalistas, adicionou-se um referencial social. Então, a conduta penalmente relevante, para a chamada Teoria Social da Ação, carregaria, além de um efeito causal previsível, a relevância social. Jescheck, defensor desta vertente, entende que é possível encontrar um supra-conceito de conduta que englobe os atos omissivos e comissivos, 58“1. Sólo el hombre. No existen acciones penales contra animales, así como no existen contra las fuerzas naturales. 2. Sólo el hombre individualmente. Las personas jurídicas y las sociedades son incapaces de obrar penalmente, no pueden por ello cometer ningún delito y ser punibles.” BELING, Ernest Von. Esquema de derecho penal: la doctrina del delito-tipo. Tradução de Sebatián Soler. 11. ed. Buenos Aires: Liberia "El Foro", 2002. p. 43. 59“ É preciso ter em conta, a esse respeito, que apenas foram produzidas finalisticamente aquelas consequências, cuja realização se estendia a direção final. Assim será sempre os fins e para os meios; para os efeitos concomitantes, isso ocorre na medida em que o autor tenha contado com a sua produção e já os tenha incluído, por isso, em sua vontade de realização. Todos os demais efeitos (concomitantes), que não estavam compreendidos na vontade final de realização, porque o autor não havia pensado neles, ou havia confiado em que não se produzissem, se realizam de um modo puramente causal. ” “A ação humana é o exercício de uma atividade final. ” WELZEL, Hans. O novo sistema jurídico-penal: uma introdução a doutrina da ação finalista. São Paulo. Revista dos Tribunais. 2001. p. 30. 60“A ação humana é o exercício de uma atividade final.” WELZEL, Hans. O novo sistema jurídico-penal: uma introdução a doutrina da ação finalista. São Paulo. Revista dos Tribunais. 2001.p.28. 61“Atente-se, por outro ângulo, que, após travar intensa disputa com os causalistas, a teoria finalista preponderou na dogmática penal, importando numa redefinição dos demais pressupostos do conceito de delito não só no âmbito teórico, mas também legislativo e jurisprudencial. Nesse sentido, a Reforma da Parte Geral do Código Penal, feita em 1984, importou na adoção dos postulados da teoria da ação final, conforme se vê, por exemplo, nas regras dos arts. 20 e 21, do CP. O finalismo é, ainda hoje, a teoria mais comumente adotada no Brasil.” SOUZA, Arthur de Brito Gueiros. JAPIASSÚ, Carlos Eduardo Adriano. Direito penal: volume único. 2 ed. rev. atual. ampl. São Paulo, Atlas, 2020.p.139. 26 desde que se encontre um fino equilíbrio entre o indivíduo e a norma. Deste ponto de vista, definiu-se a conduta humana em função de sua relevância social62. As Escolas funcionalistas, como indica o próprio nome, traçaram um conceito de conduta voltado para as funções atribuídas ao Sistema Jurídico-penal. Nesse sentido, Claus Roxin afirma que a conduta é a manifestação da personalidade do agente, o que significa, em primeiro lugar, que conduta é somente atribuível a um humano como um centro anímico. Nesse sentido, são também excluídas deste conceito condutas que não advêm deste centro de domínio humano. Ou seja, atos reflexos; convulsivos ou, ainda, fruto de delírios, afinal, uma vez que tais atos não podem ser dotados de consciência, tampouco podem representar a personalidade do indivíduo. Os pensamentos e/ou instintos de vontade também não podem, segundo o Funcionalismo Racional-Teleológico, serem tidos como condutas, uma vez que, sem produzir qualquer efeito no mundo exterior ao indivíduo, não representam a manifestação da personalidade do agente63. O entendimento acerca da conduta do funcionalismo de Claus Roxin não é ontológico, naturalístico ou causal, tampouco finalista, mas sim um conceito normativo. Isto porque tal 62Em entrevista concedida em 2007, aos Professores Miguel Polaino Orts e José Antônio Caro John, o Professor Jescheck defendeu a delimitação de conduta por meio de um sentido de relevância social: “Prof.H-H.J: A mí me interesó siempre esa perspectiva social en la construcción de la teoría del delito. Hubo otros autores que anteriormente habían apuntado la conveniencia de un análisis social. Personalmente mi dedicación al estudio de esta materia proviene de antiguo. Ya me ocupé del tema en mi colaboración publicada, en 1961, en el Libro Homenaje al Profesor EBERHARD SCHIMIDT, discípulo y continuador de la obra de VON LISZT, y uno de los más finos defensores de la teoría social de acción. Yo considero personalmente que es posible encontrar un supraconcepto de acción que englobe tanto el hacer activo como el hacer omissivo, siempre que se halle una perspectiva que reúna los elementos del ser y los elementos normativos. Esa síntesis o punto de conexión puede entrarse en la relación de la conducta humana con el entorno, de manera que la acción se denomina en función de su sentido social. Desde ese punto de vista, defiende la postura de que la acción es conducta humana con relevancia social. Por supuesto que las concepciones sociales de la acción se defienden en numerosas versiones en la doctrina penalista, desde VON LISZT y su continuador, EBERHARD SCHMIDT, hasta otros autores más recientes como MAIHOFER. Pero esa veriente social como elemento importante en la definición del injusto si se ha incorporado en la Dogmática actual.” ORTS, Miguel Polaino; JOHN, José Antônio Caro. Entrevista al professor dr. h.c. mult. Hans-Henrich Jeschesck: Tradução de Miguel Polaino Orts. Derecho penal y criminología, Bogotá, Colombia, v. 28, n. 83, p. 13-36, 2007. p. 30. 63“Un concepto de acción ajustado a su función se produce si se entiende la acción como "manifestación de la personalidad", lo que significa lo siguiente: En primer lugar es acción todo lo que se puede atribuir a un ser humano como centro anímico-espiritual de acción, y eso falta en caso de efectos que parten únicamente de la esfera corporal ("somática") del hombre, o "del ámbito material, vital y animal del ser", sin estar sometidos al control del "yo", de la instancia conductora anímico-espiritual del ser humano. Si un sujeto es empujado con fuerza irresistible contra la luna de una ventana, o si durante el sueño, o en un delirio o en un ataque convulsivo, el mismo golpea en tomo suyo, o si reacciona de modo puramente reflejo, todas éstas son manifestaciones que no son dominadas o dominables por la voluntad y la conciencia y por tanto no pueden ser calificadas como manifestaciones de la personalidad, ni imputadas a la capa anímico-espiritual de la "persona". Por otra parte, es evidente que los pensamientos y los impulsos de la voluntad pertenecen a la esfera espiritual-anímica de la persona, pero en tanto permanecen encerrados en lo interno y no se ponen en relación con los sucesos del mundo exterior, no son manifestaciones de la personalidad y por tanto no son acciones.” ROXIN, Claus. Derecho penal parte general: fundamentos de la estructura de la teoría del delito. Tradução Diego-Manuel Luzón Peña, Miguel Diaz y García Conlledo, Javier de Vicente Remensal. Tomo I, Madrid, Espanha, Civitas, 1997. p. 252. 27 conceito fundamenta-se em preceitos axiológicos (valorativos), que, por sua vez, são delineados ante valorações político-criminais. Porém, destaca-se que não se esqueceu do plano fático em que se insere o indivíduo. Em suma, o autor entende que a via normativa, influenciada pela política criminal, engloba tanto elementos concretos (circunstâncias fáticas), quanto da personalidade do agente (centro anímico-espiritual) 64. Ao cabo, em concordância ao referencial teórico delineado no tópico anterior, o Funcionalismo Sistêmico (ou radical), ampliando o conceito jurídico filosófico de Hegel65, cunhou o que se acostumou chamar de conceito negativo de conduta. Günther Jakobs disserta que a conduta é a não evitação de um resultado contra normativo individualmente evitável. Para isso, tal doutrina adota um entendimento de sociedade em que, conforme já relatado no tópico anterior, todos os integrantes detêm um rol de deveres oriundo de expectativas sociais. Logo, a conduta penalmente relevante será aquela que, por meio de uma violação de dever, não evita a ocorrência de um resultado evitável. Em outras palavras, a conduta penalmente relevante tem significado contrário (negativo) à comunicação da norma (positivo) que estabelece o dever66. Assim, pretende se desvencilhar de qualquer vínculo naturalístico por meio de um conceito exclusivamente normativo de conduta. O objetivo é alcançar um conceito de conduta que abarque os eventos dolosos, culposos, omissivos e comissivos. Não por outro motivo, como se verá mais adiante, o evento fático (se comissivo ou omissivo, etc), para esta tendência doutrinária, é menos relevante em face do significado normativo atribuído ao evento67. 64“Por tanto, el concepto personal de acción aquí desarrollado —a diferencia del concepto natural y del final, pero concordando con el social y el negativo — es un concepto normativo. Es normativo porque el criterio de la manifestación de la personalidad designa de antemano el aspecto valorativo decisivo, que es el que cuenta jurídicamente para el examen de la acción. También es normativo en la medida en que en los terrenos fronterizos atiende a una decisión jurídica correspondiente a esa perspectiva valorativa. Pero no es normativista (cfr. nm. 50), ya que acoge en su campo visual la realidad de la vida lo más exactamente posible y es capaz de considerar en todo momento los últimos conocimientos de la investigación empírica. ” ROXIN, Claus. Derecho penal parte general: fundamentos de la estructura de la teoría del delito. Tradução Diego-Manuel Luzón Peña, Miguel Diaz y García Conlledo, Javier de Vicente Remensal. Tomo I, Madrid, Espanha, Civitas, 1997.p. 265. 65Hegel defende que o crime é a negação do direito pela coação: “A primeira coação, exercida como violência pelo ser livre que lesa a existência da liberdade no seu sentido concreto, que lesa o direito como tal, é o crime - juízo negativo infinito em todo o seu sentido (Lógica, ed. 1833, 5a vol., p. 90). Nele são negados não apenas o aspecto particular da absorção da coisa na minha vontade (§ 85a), mas também o que há de universal e infinito no predicado do que me pertence - a capacidade jurídica -, e isso sem que haja a mediação da minha opinião (como na impostura, § 88a). É o domínio do direito penal”. HEGEL, G.W.F. Princípios da filosofia do direito. Tradução de Orlando Vitorino. São Paulo, Martins Fontes. 1997.p.86. De outro lado, Jakobs: “Neste caráter negativo se esgota o direito abstrato em Hegel, o qual somente significa que a relação negativa é uma condição mínima pra que se dê o estado de juridicidade” JAKOBS, Gunther. Ação e omissão no direito penal. Tradução de Maurício Antônio Ribeiro Lopes. Manole. Barueri (SP), 2003.p. 4. 66Este é o fundamento primeiro do chamado de um dever negativo de não danificar, conforme será delimitado em tópico próprio. 67“la definición de los comportamientos jurídico-penalmente imputables no sea una mezcolanza de elementos heterogéneos agrupados de cualquier manera, sino una unidad conceptual.” JAKOBS, Günther. El concepto 28 Por fim, não se pode deixar de demarcar alguma posição acerca do livre-arbítrio no conceito de conduta, primeiro, pois, como visto, este elemento, com mais ou menos intensidade, apareceu em todas as teorias da conduta aqui abordadas. Depois, com o desenvolvimento da Neurociência, o debate acerca do livre-arbítrio, que parecia adormecido, retoma ao palco de debate das Ciências Jurídico-Criminais. Enfim, ao menos uma posição sobre o tema é fundamental para o desenvolvimento da atual dissertação, até porque, nela será inevitável, uma vez que trata sobre os elementos pessoais, a análise sobre os elementos da vontade e da liberdade do querer. Nesse sentido, em que pese o atual desenvolvimento das demais ciências, quer ainda se entender que – atualmente – é impossível conceber uma dogmática jurídico penal que não se sustente sobre o fundamento do livre-arbítrio. Ainda que se entenda o Direito Penal como sistema exclusivamente normativo, é impossível conceber uma conduta humana sem algum nível de liberdade no plano naturalístico. Aliás, vale lembrar que a ausência de liberdade é elemento de desconstituição da conduta. É o caso, por exemplo, do sonambulismo, dos movimentos reflexos e, ainda, da coação irresistível em que se pune somente o autor da coação (art.22 do Código Penal). Logo, sem conseguir vislumbrar uma dogmática jurídica penal descolada do livre arbítrio, ora filia-se no entendimento esposado por Víctor Gabriel Rodríguez, qual seja: A principal conclusão é a de que, embora seja questão intrincada, o futuro do Direito Penal dependa diretamente do posicionamento metafísico sobre o livre arbítrio, pois ele é decisivo para a configuração de seus principais institutos: culpabilidade, função do Direito Penal e função da pena, no mínimo, ainda para as teorias contemporâneas que assem dispensar a diatribe. Portanto, a controvérsia entre arbítrio escravo e livre arbítrio é parte integrante do Direito penal hoje, em especial diante das conquistas neurocientíficas. Isso é o que pretende estar aqui comprovado. Assim, considerando- se a pergunta reitora tal qual formulada [é possível à dogmática penal desenvolver-se independentemente de um posicionamento sobre o livre arbítrio? ], se a responde negativamente: não é possível o desenvolvimento da dogmática penal distante de um claro posicionamento sobre a liberdade de querer. As teorias que dispensam esse posicionamento são falhas. ” 68 Afinal, uma vez que a responsabilização penal traz consigo a imposição de pena, o distanciamento de um referencial, ainda que mínimo, de livre-arbítrio abriria a possibilidade de uma responsabilização penal na simples existência do indivíduo. Em outras palavras, uma jurídico penal de acción. Tradução de Manuel Cancio Meliá. Revista peruana de ciencias penales, Lima, Peru, ano II, n. 3, p. 67-98, 1994.p.70. 68RODRIGUEZ, Victor Gabriel. Livre arbítrio e direito penal: revisão frente aos aportes da neurociência e à evolução dogmática. São Paulo, Marcial Pons, 2018. p. 287. 29 responsabilização penal objetiva, tal como anteriormente desenhada, traria ao Sistema insegurança e, até mesmo, arbítrio. Assim, postos todos os postulados teóricos, tem-se a sequência da investigação, em primeiro lugar, entendendo a relevância do problema da corrupção no contexto das Ciências Jurídico-criminais, bem como as diferentes dimensões do problema, para, depois, buscar um melhor entendimento acerca do papel exercido pelos elementos pessoais nos delitos de infração de dever. 30 CAPÍTULO 2 - A CORRUPÇÃO COMO PROBLEMA MULTIDIMENSIONAL 2.1. A dimensão político criminal Em 1983, Jorge Figueiredo Dias, ao afirmar que aquele seria o “tempo da política criminal”69, convocou os juristas, sobretudo aqueles que se dedicavam às Ciências Jurídicas criminais, a participar do debate acerca das projeções do Direito, em especial do Direito Penal, sobre o contexto da política social70. Com isso, o jurista português mostrou, em primeiro lugar, que o Direito Penal está diretamente interligado à Política Criminal no sentido de que essa política, por ser também uma política social, influencia o Direito Penal. Neste ponto, a nosso entender, melhor seria dizer que o Direito Penal integra a política criminal, afinal, este ramo do Direito é parte das estratégias de concretização desta política.71 A segunda lição de Figueiredo Dias é, justamente, o aceite à sua convocação. Ou seja, pensar o Direito Penal por referência à política criminal. O que não quer dizer que a dogmática penal deve render-se ao clamor punitivo. Pelo contrário, o Direito Penal é, por definição, o meio de contenção do poder punitivo. No entanto, a dogmática deve considerar o tempo e o espaço em que está inserida, até porque é produto deste tempo. Do contrário, realizar-se-á uma dogmática desconexa com seu tempo e que, certamente, não consegue comunicar suas normas, menos ainda trazê-las eficácia. Sendo assim, diferente de Liszt, que entendia o Direito Penal e a Política Criminal como barreiras intransponíveis, a melhor opção, como ensina Roxin, “só pode ser deixar as decisões valorativas político-criminais introduzirem-se no sistema de direito penal”.72 69DIAS, Jorge Figueiredo. Os novos rumos da política criminal e o direito penal português do futuro. Revista da ordem dos advogados, Lisboa, v. 1, n. 43, p. 5-40, Jan.Abr. 1983. Disponível em: https://portal.oa.pt/publicacoes/revista/ano-1983/ano-43-vol-i-jan-abr-1983/doutrina/jorge-de-figueiredo-dias-os- novos-rumos-da-politica-criminal-e-o-direito-penal-portugues/. Acesso em: 31 jul. 2021.p.6. 70 “o tempo presente é, por excelência, o tempo da política criminal.É das suas proposições ou mandamentos fundamentais, encontrados no campo de projeção dos problemas jurídicos sobre o contexto mais amplo da política social, que será lícito esperar um auxílio decisivo no domínio desse flagelo das sociedades actuais (de todas as sociedade atuais acentuo) que é o problema do crime. Uma tarefa, esta, na qual nenhum jurista, mesmo com o entendimento mais estrito da sua função, se poderá decerto recusar a participar. ” DIAS, Jorge Figueiredo. Os novos rumos da política criminal e o direito penal português do futuro. Revista da ordem dos advogados, Lisboa, v. 1, n. 43, p. 5-40, Jan.Abr. 1983. Disponível em: https://portal.oa.pt/publicacoes/revista/ano-1983/ano-43-vol-i- jan-abr-1983/doutrina/jorge-de-figueiredo-dias-os-novos-rumos-da-politica-criminal-e-o-direito-penal- portugues/. Acesso em: 31 jul. 2021.p.6/7. 71“A política criminal é um sector objectivamente delimitado da política jurídica geral: é a política jurídica no âmbito da justiça criminal. Em síntese, “impõe-se especialmente à Política criminal a tarefa de rever e, em caso dado, delimitar novamente a zona penal, assim como medir a forma operativa das sanções segundo a missão da justiça criminal” FERNANDES, Fernando Andrade. O processo penal como instrumento de política criminal. Livraria Almedina. Coimbra. Agosto, 2001.p.47. 72ROXIN, Claus. Política criminal e sistema jurídico penal. Tradução de Luís Greco. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p.20. 31 Logo, antes de ingressarmos no debate precisamente dogmático acerca dos elementos pessoais no delito de corrupção, devemos traçar algum panorama Político Criminal deste(s) delito(s). Até porque, tal panorama é, também, o mote da presente pesquisa, ou seja, é o que lhe confere relevância e justificativa. Afinal, o objetivo é produzir algum efeito para compreensão do problema que Figueiredo Dias apontava, qual seja, o crime. O Direito, em especial o Direito Penal, tem por função impor modelos de conduta. Não por outro motivo, o Direito, neste debate, insere-se como ferramenta capaz de demonstrar a conduta modelo, ainda que, como no caso do Direito Penal, mostrando a conduta proibida. Isto dito, a corrupção, em que pese a diversidade de perspectivas que possa ser analisada, tem por ponto de partida um desvio de referencial ético73. Então, no plano geral, a corrupção é uma conduta que não se enquadra ao modelo ético estabelecido, e, por isso, atribui-se a ela carga de valor negativo. A punição advém, portanto, da conduta que, além de divergir do modelo ético assentado, é proibida pela lei penal. No entanto, “importa dizer que, tratar de corrupção no âmbito do Direito e neste caso, no âmbito do Direito Penal, requer compreendê-la como um fenômeno dinâmico e interdisciplinar”.74 Então, tratar de corrupção no âmbito jurídico, como aqui se faz, é também saber das influências de outros setores do sistema social, tal qual a economia, a política, etc. A corrupção, entendida pelo senso comum como um defeito de Estado, guarda, por isso, aspecto de percepção para com a legitimidade do poder Estatal. Ou seja, o Estado que não funciona tal qual o modelo firmado perde confiabilidade e legitimidade. Segundo a Transparência Internacional, que reúne “dados de diversas fontes que fornecem as percepções do setor privado e de especialistas acerca do nível de corrupção no setor público”75, o Brasil ocupa a 94º posição do ranking com cento e oitenta países, o que demonstra uma sensação de setores da sociedade da ocorrência usual de delitos de corrupção. Essa percepção instiga a população a questionar a própria finalidade do Estado, afinal, em uma visão contratualista, esse não vem seguido com as normas pactuadas. 73“A corrupção pode ser observada sob diversos prismas: jurídico, social, econômico, político, cultural. Entretanto, a única certeza vem da Filosofia: qualquer que seja o referencial, a corrupção sempre será um desvio ético, sempre irá ferir a moralidade.” GOMES, Ana Cristina. FERNANDES, Fernando Andrade. A corrupção como violadora de direitos humanos: como a corrupção pode macular direitos sociais e desvirtuar políticas públicas. Cadernos Prolam/USP, v.16, n.31, p.119-138, jul./dez.2017 DOI: 10.11606/issn.1676-6288.prolam.2017.132570. p.120. 74GOMES, Ana Cristina. FERNANDES, Fernando Andrade. A corrupção como violadora de direitos humanos: como a corrupção pode macular direitos sociais e desvirtuar políticas públicas. Cadernos Prolam/USP, v.16, n.31, p.119-138, jul./dez.2017 DOI: 10.11606/issn.1676-6288.prolam.2017.132570.p.123. 75Relatório da Transparência Internacional sobre Índice da Percepção da Corrupção (p.24), disponível em : encurtador.com.br/egrGS. Acesso em 14/08/2020. 32 A preocupação do senso comum, equivocada ou não, sustenta-se no entendimento de que a corrupção é um delito que lesa o erário público. Segundo a OCDE, ao menos 12% do PIB dos países que fazem parte desta organização internacional (os números chegam a 20% em países em desenvolvimento) são oriundos de contratações públicas. Em 2020, a mesma organização calculou que o governo federal brasileiro gastou cerca de R$ 35.000.000.000 (trinta e cinco bilhões de reais) em contratações públicas.76 Logo, é lógico que a sociedade demande do Direito Penal intervenções para a repressão e prevenção de delitos que criem déficit ao erário77, afinal é o dinheiro da população que é apropriado pelos particulares. Não por outro motivo, seja por força de organizações internacionais ou por indignação da população, que passa a entender as implicações do delito de corrupção, o delito de corrupção passa ser tipo penal em grande parte dos países78 e, mais que isso, passa a ser objeto de discussão do Direito.79 Aqui, percebe-se uma predileção ao Direito Penal como forma mais agressiva de contato da pessoa à norma para prevenção da ocorrência deste delito, gerando um falso ideal de eficácia. 76“In 2020, federal agencies’ public expenditure for the procurement of goods, services and works was around BRL 35.5billion” SECRETARIA GERAL. OCDE. Fighting bid rigging in Brazil: A review of federal public procurement. Paris: Secretaria Geral da OCDE, 2021. Disponível em: https://www.oecd.org/competition/fighting-bid-rigging-in-brazil-a-review-of-federal-public-procurement.htm. Acesso em: 31 jul. 2021. 77“Com a temática do combate à corrupção pela via da justiça penal convive, para além disso, toda uma outra abordagem relacionada sobretudo com a prevenção, mas também com a repressão em moldes penal (de que serão meros exemplos os civis, os financeiros, os contabilísticos ou os administrativos) das práticas corruptivas” SANTOS, Cláudio Cruz. Considerações introdutórias: (ou algumas reflexões suscitadas pela "expansão" das normas penais sobre corrupção). In: SANTOS, Claudia Cruz; BIDINO, Claudio; MELO, Débora Thais de. A corrupção: reflexões (a partir da lei, da doutrina e da jurisprudência) sobre o seu regime jurídico-criminal em expansão no Brasil e em Portugal. Coimbra, Portugal: Coimbra Editora, 2009. p. 7-40.p.9/10. 78“Não obstante, como é conhecido, a partir de meados dos anos noventa, com consequência da atividade das organizações internacionais, a luta contra a corrupção se universalizou. Se nos anos 70, Estados Unidos com a Lei de práticas corruptas no estrangeiro (Foreign Corrupt Practices Act, FCPA) era o único ordenamento em sancionar a corrupção internacional, hoje praticamente todos os países contam com um tipo penal relativo à corrupção nas transações econômicas internacionais”. MARTIN, Adán Nieto; SAAD-DINIZ, Eduardo; GOMES, Rafael Mendes (coord.). Manual de cumprimento normativo e responsabilidade penal das pessoas jurídicas. Florianópolis: Tirant lo Blanch, 2018. p.388. 79Ana Elisa Bechara destaca o ponto de virada da relevância dos crimes de corrupção no Brasil, bem como no plano jurídico como um todo: “ A partir da